monitoramento em aterro sanitario

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MONITORAMENTO EM ATERROS SANITÁRIOS DURANTE A OPERAÇÃO: DESEMPENHO MECÂNICO E AMBIENTAL Mario Cepollina Engenheiro Civil, MSc. DIC. Endereço: - Cepollina Engenheiros Consultores – Rua Roque Petrella, 314 - 04581-050 – São Paulo - SP – Fone: 11 55431044 – 11 55321726 – e-mail: [email protected] Luis Sérgio Akira Kaimoto Engenheiro Civil. Endereço: - Cepollina Engenheiros Consultores – Rua Roque Petrella, 314 - 04581-050 – São Paulo -SP – Fone: 11 55431044 – 11 55321726 – e-mail: [email protected] Mario J. Motidome Geólogo, MSc consultor . Endereço: Núcleo Projetos e Consultoria – Rua Cordeiro Galvão, 416 - 05450-020 – São Paulo --SP – Fone: 11 30232336 – e-mail: [email protected] Eduardo Ferreira Leite Engenheiro Civil. Endereço: - Cepollina Engenheiros Consultores – Rua Roque Petrella, 314 - 04581-050 – São Paulo -SP – Fone: 11 55431044 – 11 55321726 – e-mail : [email protected] Resumo Com base na experiência desenvolvida no Aterro Sanitário Bandeirantes, do município de São Paulo, o trabalho apresenta diretrizes para o monitoramento de aterros de grandes proporções e tece comentários e questionamentos sobre como deveriam ser efetuados os monitoramentos para aterros menores. Abstract The paper presents guidelines for geotechnical and environmental monitoring of large waste landfills based on the experience on the A.S.Bandeirantes, which is one of São Paulo county landfill. It also includes comments and questioning about the monitoring plan for smaller landfills. 1. INTRODUÇÃO Somente os aterros de grandes cidades brasileiras são monitorados seguindo um programa regular de acompanhamento, ainda assim, com diferenças nos procedimentos adotados. Entre estes pode-se citar os aterros sanitários em operação no município de São Paulo, que são o Bandeirantes e o Sítio São João e outros, como por exemplo o de Extrema de Porto Alegre (RS), de Gramacho do município do Rio de Janeiro (RJ), o de Salvador (BA), de Camaçari (BA), Muribeca (Recife).

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Monitoramento Em Aterro Sanitario

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Page 1: Monitoramento Em Aterro Sanitario

MONITORAMENTO EM ATERROS SANITÁRIOS DURANTE A OPERAÇÃO: DESEMPENHO MECÂNICO E AMBIENTAL

Mario Cepollina

Engenheiro Civil, MSc. DIC. Endereço: - Cepollina Engenheiros Consultores – Rua Roque Petrella, 314 - 04581-050 – São Paulo -SP – Fone: 11 55431044 – 11 55321726 – e-mail: [email protected]

Luis Sérgio Akira Kaimoto

Engenheiro Civil. Endereço: - Cepollina Engenheiros Consultores – Rua Roque Petrella, 314 - 04581-050 – São Paulo -SP – Fone: 11 55431044 – 11 55321726 – e-mail: [email protected]

Mario J. Motidome

Geólogo, MSc consultor . Endereço: Núcleo Projetos e Consultoria – Rua Cordeiro Galvão, 416 - 05450-020 – São Paulo --SP – Fone: 11 30232336 – e-mail: [email protected]

Eduardo Ferreira Leite

Engenheiro Civil. Endereço: - Cepollina Engenheiros Consultores – Rua Roque Petrella, 314 - 04581-050 – São Paulo -SP – Fone: 11 55431044 – 11 55321726 – e-mail : [email protected]

Resumo

Com base na experiência desenvolvida no Aterro Sanitário Bandeirantes, do município de São Paulo, o trabalho apresenta diretrizes para o monitoramento de aterros de grandes proporções e tece comentários e questionamentos sobre como deveriam ser efetuados os monitoramentos para aterros menores.

Abstract

The paper presents guidelines for geotechnical and environmental monitoring of large waste landfills based on the experience on the A.S.Bandeirantes, which is one of São Paulo county landfill. It also includes comments and questioning about the monitoring plan for smaller landfills.

1. INTRODUÇÃO

Somente os aterros de grandes cidades brasileiras são monitorados seguindo um programa regular de acompanhamento, ainda assim, com diferenças nos procedimentos adotados.

Entre estes pode-se citar os aterros sanitários em operação no município de São Paulo, que são o Bandeirantes e o Sítio São João e outros, como por exemplo o de Extrema de Porto Alegre (RS), de Gramacho do município do Rio de Janeiro (RJ), o de Salvador (BA), de Camaçari (BA), Muribeca (Recife).

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Não se pode deixar de mencionar, entretanto, alguns exemplos de cidades não tão populosas como de Caxias do Sul (RS) , de Joinville (SC), de Santo André (SP).

Não há normas ou critérios consagrados para monitoramentos mecânico e ambiental, mesmo para os aterros de maiores dimensões, quer no que diz respeito ao tipo de instrumentação, quer quanto a freqüência de leituras de instrumentos e inspeções.

Para aterros de centros urbanos menores, digamos com populações de 50 000 a 200 000 habitantes, ou seja aterros menores, a situação é mais complexa já que a imposição de um plano de monitoramento similar ao efetivado para os aterros de maior porte seria irreal e oneroso e, como conseqüência, não se faz, via de regra, praticamente nenhum tipo de acompanhamento. As ações fiscalizadoras são basicamente decorrentes de denúncias da população atingida.

O presente trabalho apresenta de forma resumida a prática de monitoramento do A.S. Bandeirantes, e propõe reflexões para monitoramentos de aterros sanitários de menores dimensões.

2. MONITORAMENTO GEOMECÂNICO

O monitoramento do comportamento geomecânico de um aterro de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU) é efetuado através de inspeção visual e da leitura de instrumentos nele instalados, conforme descrito mais adiante.

Para aterros em operação, de grandes dimensões, este monitoramento é mensal.

O objetivo pode ser simplificadamente descrito como:

a. Obter dados que permitam avaliar a segurança do maciço contra instabilidades e promover as ações que se mostrem necessárias,

b. Permitir que sejam feitas previsões quanto a recalques futuros visando a avaliação da vida útil do aterro ou a utilização futura da área,

c. Permitir o desenvolvimento da ciência fornecendo parâmetros para que se possa produzir procedimentos, normas técnicas, melhorar novos projetos e otimizar a operação dos aterros.

Com relação a questão de segurança, deve ser comentado que instabilidades de maciços de RSU não são tão raras como se pode pensar. Benvenuto (1992), e de Santayana (2002) relatam casos de rupturas.

Sabe-se ainda de outros casos como do aterro de Philipinas em junho de 2000, La Coruña em 1996 e Itaquaquecetuba em 2000.

Estas rupturas são extremamente perigosas pois, de modo geral as massas rompidas se liquefazem deslocando-se por grandes distâncias e em grandes velocidades podendo colocar em risco vidas ou propriedades. Ademais, um acidente deste tipo acarreta prejuízos ambientais graves.

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2.1. Inspeções Visuais

Não é raro que as primeiras manifestações de problemas geotécnicos sejam percebidas visualmente. Assim, é imperioso que sejam estabelecidas rotinas para este tipo de exame.

Técnicos treinados deverão percorrer a pé bermas, caminhos e elementos de drenagem para observar sinais de comportamentos anômalos como:

• movimentação que se manifesta através da abertura de fissuras e trincas na cobertura das células, pavimentos, canaletas, guias, empoçamentos, etc.;

• ocorrência de erosões na cobertura que podem expor o resíduo;

• surgência de chorume nos taludes ou na drenagem superficial.

Caso sejam constatadas estas anomalias elas serão registradas, fotografadas e devidamente analisadas para que sejam tomadas medidas de intervenção necessárias ou para que seja instalada instrumentação específica.

2.2. Marcos Superficiais

No seu histórico de desenvolvimento, a instrumentação de aterros sanitários teve como base os aterros compactados de barragens de terra.

Maciços de RSU têm, entretanto, deformações muito maiores que aterros compactados e a presença do chorume, que é altamente agressivo a instrumentos.

Assim, por exemplo, o instrumento constituído de placas sobrepostas ligadas a haste telescópica para medir recalques em várias profundidades, que é simples e cujo emprego é comum em aterros de maciços terrosos, não pode ser empregado em aterros sanitários, pois teria uma vida útil muito curta, sendo perdido em função dos enormes deslocamentos horizontais e verticais a que estaria sujeito.

Há registro de emprego de inclinômetros no exterior (Coduto & Huitric (1990)), mas não se conhece casos em nosso país. Os deslocamentos são de tal ordem que em pouco tempo danificam os tubos guia e ademais, o chorume é agressivo ao torpedo que faz as leituras. Trata-se portanto de uma instrumentação onerosa para instalação, leitura e manutenção.

Isto posto, chegou-se a conclusão que a forma mais eficiente e econômica de monitorar as deformações é através da instalação e leitura dos deslocamentos de marcos superficiais.

As leituras são feitas com aparelhos topográficos de estação total medindo-se as componentes verticais e horizontais dos deslocamentos.

Antes do advento de aparelhos de estação total, havia preocupação em relação a precisão das leituras de deslocamentos horizontais feitas com teodolito. Atualmente consegue-se uma precisão plenamente satisfatória para aterros sanitários, para os quais a ordem de grandeza dos deslocamentos e de recalques é de dezenas de centímetros.

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2.2.1. Tratamento dos dados

As leituras são plotadas em gráficos de deslocamentos (verticais e horizontais) x tempo, recalque/espessura compressível x tempo, velocidade do deslocamento x tempo.

São apresentadas em anexo, como exemplo, alguns destes gráficos de deslocamentos do A.S. Bandeirantes.

Na Fig. 1 é mostrado um gráfico de recalque/espessura de lixo, ou seja espessura compressível sob o marco. Escolheu-se propositadamente um marco antigo e com maior espessura de aterro para se transmitir uma idéia da compressibilidade destes maciços.

Figura 1. recalque / espessura x tempo

Na Fig. 2 é mostrada a velocidade de recalque com o tempo. Neste caso, foi escolhido um marco instalado mais recentemente para que se tenha idéia da elevada magnitude das velocidades de recalque.

Os gráficos que analisam os deslocamentos horizontais são similares a esses apresentados, não cabendo reproduzi-los.

Em alguns casos, principalmente quando se tratam de taludes de grandes dimensões, as velocidades dos deslocamentos são desenhadas em planta e em seção na forma de vetores, permitindo-se conhecer ao mesmo tempo, a magnitude e a direção dos deslocamentos, conforme mostrado nas Fig. 3 e 4.

12/09/98 28/08/99 12/08/00 28/07/01 13/07/02 28/06/03 12/06/04

-60,00

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-30,00

-20,00

-10,00

0,00

Rec

alqu

e/H

i (%

)

MS501

MS 510B

ATERRO SANITÁRIO BANDEIRANTESAS 5 - MS501 e MS510B

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Figura 2. velocidade x tempo

Figura 3. vetores de velocidade de deslocamento horizontal

13/07/02 04/01/03 28/06/03 20/12/03 12/06/04

-16,00

-12,00

-8,00

-4,00

0,00

Velo

cida

de d

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calq

ue (m

m/d

ia)

MS546

MS548

MS554

ATERRO SANITÁRIO BANDEIRANTESAS 5 - MS546, MS-548 e MS-554

3.80

0

3.60

0

3.400

3.200

3.400

3.80

0

3.60

0

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Figura 4. vetor resultante recalque x deslocamento

2.2.2. Análise dos resultados

• Com relação a estabilidade do maciço

Não há critérios que definam valores absolutos de deslocamentos e velocidade de deslocamentos que poderiam permitir uma avaliação da segurança do maciço.

Um dos aspectos mais importantes é a variação da velocidade dos deslocamentos (ou seja a aceleração-positiva ou negativa) e a sua relação com a operação da deposição do lixo.

A interpretação destas leituras será sempre efetuada de forma conjugada com o exame do comportamento da piezometria e das análises de estabilidade, conforme comentado a seguir.

Ao longo do tempo, a medida em que os dados vão sendo coletados, desenvolvem-se critérios particulares para cada aterro em função de suas dimensões, das características e quantidade dos resíduos, do plano operacional e do balanço hídrico da região. Por exemplo, tendências de aumento de velocidades de deslocamento horizontal ou de recalque sem a influência da deposição de resíduos nas proximidades de algum marco superficial indicarão a necessidade de maiores preocupações e avaliações acuradas da região.

• Com relação a previsão de recalques

A interpretação dos resultados foi detalhadamente estudada por de Abreu (2002), trabalho que pode ser citado como referência básica.

A grande dificuldade para se fazer previsões de recalque com base nas leituras é a separação dos recalques imediatos dos que ocorrem ao longo do tempo.

Deve-se ter em mente que, durante a operação, os marcos são colocados somente nas bermas das células, e que a carga representada pela célula seguinte provoca recalques imediatos na espessura compressível de lixo que há sob o marco instalado nas bermas das células anteriores.

100

110

120

130

140

150

100

110

120

130

140

150

MS-545

MS-544

MS-585r h (mm/dia)

r v (mm/dia)9,589

4,7931,287

2,0001,775

2,552

TRÁFEGO

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2.3. Pressões de Fluidos

Ainda devido aos problemas decorrentes das grandes deformações e a agressividade do chorume, a medição de pressões dos fluidos de um aterro sanitário sempre se apoiou no emprego de instrumentos simples como o piezômetro tipo Casagrande (“stand-pipe”).

Ocorre que a geração de biogás faz com que se tenha pressão de gases dentro do maciço, que também precisa ser medida.

Além do problema relacionado com a necessidade de se medir estas pressões, a geração do biogás faz como que os piezômetros simples sofram um “borbulhamento” com a saída do gás. Esse borbulhamento provoca a saída de jatos na extremidade do aparelho, além de espuma que dificultam a leitura do verdadeiro nível piezométrico. Esta medição é efetuada com um “pio” elétrico que acusa um falso nível de chorume quando o instrumento toca a espuma ionizada, que fecha o circuito do instrumento.

Foram desenvolvidos “pios” especiais que minimizaram, porém não resolveram o problema.

A maior contribuição para solucionar esta questão foi o piezômetro “Vector” (do Val & Antoniutti (1994)) que separa a fase gasosa da líquida por meio de um sifão. Isto, além de melhorar substancialmente o problema da espuma, também permite que sejam feitas leituras da pressão de gases.

Na Fig. 5 é mostrado em um desenho simplificado o conceito de funcionamento e também como é o instrumento real, que utiliza tubos concêntricos formando câmaras independentes para gases e líquidos.

Figura 5. piezômetro vector e esquema de seu funcionamento

Estes instrumentos são instalados a partir de bermas dos taludes, em função das condições de acesso e de maneira a se evitar interferências com os equipamentos que executam o aterro sanitário.

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Eles são instalados dentro de furos feitos por trados mecânicos e, como a operação de perfuração é onerosa, procura-se instalar duas câmaras piezométricas por furo.

Em função dos recalques, é comum a perda dos piezômetros. Quando isto ocorre, eles têm, de modo geral, que ser substituídos.

2.3.1. Tratamento dos dados

Da mesma forma como é feito para os deslocamentos, os valores das leituras dos piezômetros são plotados contra o tempo, conforme mostra a Fig. 6.

Figura 6. leituras piezométricas

2.3.2. Análise dos resultados

A experiência mostra que quando não há deposição de lixo nas proximidades do piezômetro, as leituras praticamente não sofrem alteração em períodos curtos, como os que há entre duas leituras. Com o passar do tempo, a tendência que se observa é uma diminuição dos valores de pressão, conforme mostra a Fig. 6. Vale comentar que escolheu-se propositalmente um piezômetro dos mais antigos para mostrar esta tendência.

Assim, a primeira questão a ser analisada é a variação dos valores das leituras. Se houver alguma elevação, tem que se procurar avaliar suas causas potenciais.

05/02/96 30/04/97 24/07/98 17/10/99 09/01/01 04/04/02 28/06/03 20/09/04

0

4

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12

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PIEZÔMETRO 211AS-2

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Além dessa análise inicial quanto a variação dos valores medidos, os resultados das leituras de pressão de fluidos são empregados para se avaliar as condições de estabilidade dos maciços.

Para isto são efetuadas análises de estabilidade por equilíbrio limite, nas quais as pressões piezométricas medidas constituem-se em parâmetros fundamentais.

Os outros parâmetros são os de resistência e o peso específico do resíduo, além de, obviamente, a geometria.

Como se sabe, não se consegue ensaiar este material como se faz com solo. Assim, os parâmetros de resistência são fundamentalmente deduzidos de retroanálises de rupturas ocorridas, da análise de comportamento do maciço sanitário ou de alguns poucos ensaios em corpos de prova de grandes dimensões que já foram executados.

Os resultados das análises de estabilidade devem ser sempre comparados e correlacionados com os valores de deslocamentos. Por exemplo, uma redução de fator de segurança, devido a elevação dos níveis piezométricos ou a alteração da geometria do talude se manifesta, invariavelmente, através do aumento na velocidade dos deslocamentos.

Na fig. 7 é apresentado o resultado da análise de estabilidade para um talude do A.S. Bandeirantes.

Figura 7. análise de estabilidade

Quando se faz estas análises deve-se ter em mente alguns aspectos:

• a geometria do aterro muda sensivelmente ao longo do tempo em função dos recalques,

• a resistência do resíduo pode sofrer redução ao longo do tempo, em função de sua essência orgânica e dependendo das soluções de drenagem interna,

• a composição do resíduo pode sofrer alterações em função da implantação de novas formas de recolhimento e tratamento intermediário tais como a imposição de coleta seletiva, o desvio da matéria orgânica para compostagem, ou então o início de recebimento de um grande volume de algum tipo novo de resíduo, como por exemplo de lodos de estações de tratamento de esgotos sanitário. Uma mudança deste tipo pode se refletir na alteração dos parâmetros de resistência.

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3. MONITORAMENTO AMBIENTAL

O monitoramento ambiental envolve ações voltadas para a avaliação de alterações do meio físico direto (lençol freático, águas superficiais, solos, atmosfera) e antrópico. Este artigo aborda somente o meio físico.

Estas alterações são medidas para fins de comparação com critérios ambientais já estabelecidos de forma absoluta, ou de forma relativa, em função de padrões particulares, determinados pelos órgãos ambientais para cada aterro e localidade.

O monitoramento mais comum, objetivo, prático e obrigatório, a ser efetuado, é o da qualidade de águas subterrâneas e superficiais, tendo em vista grande carga poluidora do efluente líquido de aterros sanitários, o chorume, onde dentre vários outros parâmetros, apresenta elevados valores de DBO, DQO, nitratos, nitritos e nitrogênio amoniacal, além de metais, que são particularmente danosos à saúde humana.

Este monitoramento visa, também, avaliar a eficiência de todo o sistema de proteção de fundo com impermeabilizações e de drenagem desses líquidos.

Monitoramentos da qualidade do ar (odor e concentração de gases) ainda são incipientes.

Demais eventuais influências no meio ambiente, tais como a proliferação de vetores (moscas ratos, etc.), poeira e o carreamento de detritos pelo vento são monitoradas por rotinas da operação do aterro, mas também associadas a uma “fiscalização” exercida pela população na área de influência do empreendimento.

3.1. Inspeções Visuais

Da mesma forma como foi descrito para o monitoramento mecânico, a inspeção visual é uma ferramenta básica para se verificar a ocorrência de algum problema.

Nesta inspeção, o técnico treinado, ou acostumado a examinar o aterro fará observações sobre eventuais surgências de chorume, eventual presença de vetores, odores, etc.

Estas observações serão anotadas e transmitidas para que se tomem todas as medidas corretivas ou se implante um sistema de observação baseado em instrumentação.

3.2. Águas Subterrâneas

A finalidade deste monitoramento é verificar eventuais alterações da qualidade da água de sub-solo em decorrência das atividades do aterro sanitário.

Para isto coletam-se amostras de água de poços de monitoramento do lençol freático instalados especificamente para este fim.

No caso do A.S. Bandeirantes, existem 16 poços distribuídos a jusante bem como a montante do aterro, sendo estes para coleta de água sem a influência do aterro.

Os resultados dos ensaios trimestrais sobre essas amostras são analisados e comparados entre si (montante-jusante) e com os anteriores, consubstanciando um vasto histórico de dados, que

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já perfaz um período de 8 anos.

Tendo em vista a condição do AS Bandeirantes cercado de residências em áreas invadidas, de cercas de redes elétricas instaladas em toda a periferia do aterro e a grande profundidade do lençol freático, a utilização de métodos indiretos como a geofísica foi descartada, entretanto poderia ser considerada em outros aterros livres dessas interferências.

Entretanto vale ressaltar que métodos não invasivos podem auxiliar no diagnóstico da presença de plumas de contaminação, porém a instalação de poços de monitoramento, a coleta e a análise de amostras de águas subterrânea é imprescindível.

Finalmente deve-se comentar que a experiência tem mostrado que é importante contar-se com tarimba na aquisição das amostras. As análises químicas devem discriminar elementos com concentrações da ordem de partes por milhão ou até partes por bilhão. Dessa forma é fundamental contar-se com equipes que dominem os protocolos e procedimentos de coleta e contem com os equipamentos adequados para esses fins. Isso é particularmente importante para equipes que não contam com amostradores descartáveis, que devem seguir uma rigorosa rotina de descontaminação do equipamento entre uma coleta e outra. Além disso é importante se coletar dos poços menos contaminados aos poços mais contaminados, minimizando o risco de contaminação cruzada.

3.2.1. Tratamento dos dados

Os dados de concentrações dos diversos elementos analisados são sempre comparados com o Padrão de Potabilidade estabelecido pelo Ministério da Saúde, tendo em vista a necessidade de preservação da qualidade ambiental das águas subterrâneas que devem servir como fonte de abastecimento humano.

Além disso são traçadas curvas de iso-concentração de determinados elementos para que se conheça a distribuição dessas concentrações, identificando áreas fonte e o deslocamento de eventuais plumas de contaminação.

Importante mencionar que para se efetuar previsões sobre o deslocamento futuro de plumas de contaminação, estudos hidrogeológicos complementares devem ser realizados, como por exemplo buscando a determinação do coeficiente de permeabilidade do aqüífero, gradientes hidráulicos, porosidade efetiva, velocidades de deslocamentos, etc.

3.2.2. Análise dos resultados

Os resultados obtidos devem mostrar que as águas subterrâneas se enquadram dentro dos padrões exigidos pelos órgãos ambientais. A despeito de toda a variabilidade potencial representada pelos distintos tipos de litologias presentes, que podem influenciar as concentrações absolutas, alguns elementos ou íons devem ser observados mais atentamente.

Assim, salvo exceções que devem ser bem documentadas nos poços de monitoramento de montante, ou seja, isentos da influência do aterro sanitário, deve-se observar com atenção os níveis de concentração de cloreto, pois trata-se de um íon que ocorre com concentração relativamente baixa em ambientes naturais, mas que aparece em grandes concentrações no chorume.

Os níveis das diversas formas de Nitrogênio e do Fosfato, pela relação com a decomposição de

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matéria orgânica também devem ser acompanhados.

Finalmente é imprescindível que se analise com rigor os metais, em especial Alumínio, Cádmio, Cobre, Cromo, Chumbo, Ferro, Manganês, Mercúrio, Níquel, Zinco frente aos riscos à saúde que podem representar alguns desses metais.

Caso o controle da origem dos resíduos seja adequado, ou seja, caso se tenha segurança que apenas lixo doméstico esteja sendo disposto, as análises podem ser simplificadas.

3.3. Águas Superficiais

O monitoramento das águas superficiais permite averiguar as eventuais alterações da qualidade de corpos de água considerando os seus enquadramentos em relação ao que determina a Resolução Conama 03 e o Decreto Estadual 8648.

Esse monitoramento é feito através da análise de água coletada a montante e a jusante dos corpos de água, considerando os parâmetros definidos pela Resolução CONAMA 20/86 ou aqueles especificamente determinados pelo órgão de controle ambiental.

As alterações poderiam se dar através da percolação e contribuição de água do lençol freático, caso ele estivesse contaminado, ou pelo escoamento de águas superficiais que passam sobre o aterro e sofreriam contaminação.

Além dos corpos d’água receptores, é efetuada a coleta e análise de águas que provêm de nascentes captadas e drenadas sob o sistema de impermeabilização.

Essas análises devem comprovar que as águas superficiais coletadas atendem aos limites de lançamento e são compatíveis com o enquadramento do corpo d’água em que ocorre o lançamento.

3.4. Gases

O monitoramento de emissões gasosas implementado até recentemente no A.S. Bandeirantes considerou, principalmente, a sua influência como poro-pressão e, conseqüentemente, na estabilidade do maciço sanitário.

Nesse sentido, cabe citar ocorrências com pressões superiores a 10 tf/m2, chegando a caso com até 17 tf/m2. A conseqüência de níveis de pressão dessa magnitude sobre a estabilidade do maciço é óbvia.

Avaliadas as ocorrências em magnitude de pressão e definidas as ações necessárias para o seu controle, garantidas as condições de estabilidade necessárias para o empreendimento, passou-se a se analisar o biogás como fonte de aproveitamento energético e em termos de controle de gases promotores do efeito estufa.

Assim, essa captação do biogás a sucção forçada, além de promover benefícios ambientais claros à atmosfera, converte-se em energia limpa, afora os benefícios correlatos do ponto de vista de redução dos níveis de poro-pressão no maciço sanitário.

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3.5. Qualidade Do Ar

O monitoramento da qualidade do ar é uma matéria ainda em consolidação, principalmente do ponto de vista de avaliação de um aterro sanitário.

A primeira análise que se aporta é a de geração de odores e, neste sentido, a própria sistemática de captação, drenagem e queima em poços isolados, além da rigorosa cobertura contínua dos resíduos, faz com que gases como o dióxido de enxofre (SO2), além de mercaptanas, sejam eliminados antes de emitidos à atmosfera.

Isto significa que boa técnica executiva tem compensado esta deficiência de critérios para a amostragem e análise de odores.

4. OUTRAS GRANDEZAS MONITORADAS

Além dos aspectos acima descritos, há ainda necessidade de se monitorar o seguinte:

4.1. Volume e composição química do chorume

Este monitoramento visa o equacionamento do tratamento ou destino do chorume.

Quando ele é encaminhado para co-tratamento com esgotos sanitários, o conhecimento de sua composição é fundamental para a otimização do tratamento.

Quando o tratamento (ou pré tratamento) é feito em estações específicas para isto, o monitoramento é essencial para a definição do tipo e fases de tratamento e o controle dos efluentes.

As medições de vazão de efluente gerado e o seu correlacionamento com os índices pluviométricos são fundamentais para se montar e aferir o modelo de geração.

Para se ter uma idéia da complexidade do assunto, cabe citar que a vazão de chorume gerado no A.S.Bandeirantes é de cerca de 2.000.000 a 2.500.000 de litros por dia, com taxas de DBO de 10.000 a 30.000 mg/l, enquanto um esgoto doméstico apresenta valores de 100 a 200 mg/l. Desta forma o chorume pode exigir fases de tratamento primário ao terciário, dependendo dos parâmetros de descarte do efluente tratado.

Estas medições associadas a piezometria, ademais, constituem-se indicadores complementares para o monitoramento de eventual perda de eficiência da drenagem interna.

4.2. Pluviometria

A pluviometria da área do aterro é de fundamental importância para a análise do comportamento geomecânico e ambiental de aterros.

A instalação de um posto no próprio aterro é importante para monitoramento de aspectos meteorológicos como ventos predominantes e críticos, temperatura e evaporação, sendo esta última de capital importância em regiões áridas.

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5. REFLEXÕES SOBRE O PLANO DE MONITORAMENTO

Não existem critérios ou padrões que determinem especificamente qual deverá ser o plano de monitoramento geomecânico ou ambiental de todos os aterros sanitários, inclusive porque dependem das características e quantidades de resíduos, do balanço hídrico, dentre outros.

Deve-se entender por plano de monitoramento o seguinte conjunto: sistemática de observação, instrumentação instalada, freqüência de medições, análise e apresentação ao órgão gestor.

A questão é extremamente complexa face às diferenças de cada caso, entretanto todo aterro sanitário tem que ter um plano de monitoramento.

Os fatores que devem ser levados em conta na elaboração do plano de monitoramento geomecânico são:

• tipo de aterro: vala, trincheira ou área,

• características topográficas da área,

• características geotécnicas do solo de apoio do aterro (fundação),

• geometria , ou seja altura e inclinação dos taludes,

• demanda, ou velocidade de subida dos taludes,

• tipo de resíduo,

• drenagem interna,

• pluviosidade,

• conseqüências de eventuais comportamentos desfavoráveis,

• etc.

Para se ter uma idéia somente da questão “geometria”, apresentamos na Fig. 8 um esquema que representa de forma sobreposta os taludes do sub aterro 5 do A.S. Bandeirantes e do aterro de Ribeirão Preto. A diferença entre os dois é tão acentuada que fica claro que os critérios válidos para um caso, podem não se aplicar para o outro.

Para o plano monitoramento ambiental, além dos acima listados, devem ainda ser levados em conta os seguintes fatores:

• características hidrogeológicas do subsolo,

• proximidade e características dos corpos de água,

• características de condutividade hidráulica do solo de apoio do aterro (fundação),

• proximidade de núcleos urbanos

• projeto de impermeabilização,

• etc.

Page 15: Monitoramento Em Aterro Sanitario

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Figura 8. seção a.s. bandeirantes x a.s. ribeirão preto

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

6.1 O monitoramento geomecânico e ambiental de maciços de aterros sanitários é obrigatório. Medidas corretivas de comportamentos anômalos ou desfavoráveis podem ser tomadas em tempo.

6.2 Tendo como base a experiência angariada ao longo de mais de 10 anos no A.S. Bandeirantes, o trabalho apresenta um resumo de como é feito o monitoramento deste aterro.

6.3 São feitas algumas considerações sobre planos de monitoramento de aterros de “menores dimensões”.

6.4 Mesmo em aterros de “menores dimensões” é obrigatória a elaboração de um plano de monitoramento. Dependendo das características específicas de cada aterro se estabelecerá quais os itens que compõem o monitoramento terão que ser implantados e qual a freqüência de leitura/análise. Não necessariamente terão que ser seguidas as diretrizes acima descritas que são aquelas adotadas em um grande aterro.

7. BIBLIOGRAFIA

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