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MODERNISMO I FASE (1922 – 1930) Comentários: Prof. Flávio Brito CONTEXTO HISTÓRICO No Brasil, o termo Modernismo envolve aspectos ligados ao movimento, propriamente dito, à estética e ao período histórico. Desde o início do século, a literatura tradicional, acadêmica e elitizante se mantém ao lado de tendências renovadoras, representadas por escritores como Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Lima Barreto. Com o passar do tempo, a busca pelo novo e as tentativas de renovação da arte brasileira se multiplicam com a promoção de exposições de pintura, esculturas modernas e artigos nos jornais, dedicados às tendências vanguardistas européias. Na Europa, essa vanguarda tem como marca o avanço tecnológico e científico do início do século XX. Nesse período, o cotidiano das pessoas sofre uma verdadeira revolução com a supervalorização do progresso e da máquina. O capitalismo entra em crise, dando início à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), encerrando a chamada belle époque. A seguir, a crise financeira, oriunda do conflito, leva à Segunda Guerra Mundial (1939-1945), e nos anos intermediários, conhecidos como "os anos loucos", as pessoas passam a conviver com a incerteza e com o desejo de viver somente o presente. Tais experiências despertam o anseio de interpretar e expressar a realidade de forma diferenciada, dando origem aos movimentos da vanguarda européia. Os mais importantes foram: o futurismo, liderado pelo italiano Marinetti, exalta a velocidade e a máquina; o cubismo, oriundo da pintura, fraciona a realidade, remontando-a, a seguir, por meio de planos geométricos superpostos; o dadaísmo, com seu líder Tristan Tzara, nega totalmente a lógica, a coerência e a cultura, como forma de oposição ao absurdo da guerra. Tzara toma o termo dadá, que não significa nada, e o aplica à arte que produz, afirmando não reconhecer nenhuma teoria e declarando a morte da beleza; o surrealismo, lançado em 1924, por André Breton, com o Manifesto do Surrealismo, prega o apego à fantasia, ao sonho e à loucura, além da utilização da escrita automática em que o artista, provocado pelo impulso, registra tudo o que lhe vem à mente, sem preocupação com a lógica. Essa vanguarda passa a exercer influência sobre os artistas e intelectuais brasileiros. Dessa forma, vão surgindo obras de autores jovens que, descontentes com a tradição acadêmica e parnasiana, demonstram que a literatura brasileira está sofrendo um processo dinâmico de transformação. Três datas (1922,1930 e 1945) marcam as diferentes fases desse movimento, iniciado com a Semana de Arte Moderna. Contexto histórico da primeira fase (1922-1930) - Certas transformações foram responsáveis pela criação do ambiente propício à instalação das novas idéias, ressaltando-se: o Centenário da Independência e a Guerra Mundial (1914-1918), que favoreceu a expansão da indústria brasileira, promoveu novas relações políticas, além de abrir espaço para a renovação na educação e nas artes. Deu origem, também, ao questionamento do sistema político vigente, até então comandado pela oligarquia ligada à economia rural. Há, ainda, a grande influência da mão-de-obra imigrante, instalada no Sul, centro de poder da vida econômica e política do país. Outros fatos importantes foram: o triunfo da Revolução de Outubro de 1930, cujo levante se deu em 1922, e a fundação do Partido Comunista Brasileiro. Igualmente relevante, foi a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929, levando à queda do café brasileiro na balança de exportação, nessa mesma data. Tal fato, desestabiliza, no Brasil, o grupo dirigente e abre espaço para o novo, dando legitimidade à arte e à literatura modernas, entendidas, a princípio, como "capricho". O país vive os últimos anos da República Velha, caracterizada pelo domínio político das oligarquias, formadas pelos grandes proprietários rurais. Em 1922, com a revolta do Forte de Copacabana, o Brasil entra num período revolucionário de fato, culminando com a Revolução de 1930 e a ascensão de Getúlio Vargas. CARACTERÍSTICAS O Modernismo tem como característica unificadora o desejo de liberdade de criação e expressão, aliados aos ideais nacionalistas, visando, sobretudo, emancipar-se da dependência européia. Esse anseio de independência inclui: o vocabulário, a sintaxe, a escolha de temas e a maneira de ver o mundo. Ao rejeitarem os padrões estilísticos portugueses, seus criadores cobrem de humor, ironia e paródia as manifestações modernistas, passando a utilizar as expressões coloquiais, próximas do falar brasileiro, promovendo a valorização diferenciada do léxico. O mais importante é a atualidade, por isso centram o fazer literário na expressão da vida cotidiana, descrita com palavras do dia-a-dia, afastando-se da literatura tradicional, consagrada ao padrão culto. Um exemplo de incorporação da linguagem oral, na criação poética e descrição de coisas brasileiras, valorizando o prosaico, recoberto de bom humor, é o poema de Mário de Andrade, O poeta come amendoim (1924). Contudo, é preciso ressaltar que não havia imposição de normas e nem tratamento unificado dos temas. Os modernistas revelam o nacionalismo, através da etnografia e do folclore. O índio e o mestiço passam a ser considerados por sua "força criadora", capaz de provocar "a transformação da nossa sensibilidade, desvirtuada em literatura pela obsessão da moda européia". Cantam, igualmente, a civilização industrial, destacando: a máquina, a metrópole mecanizada, o cinema e tudo que está marcado pela velocidade, aspecto preponderante no modo de vida da nova sociedade. Ao comporem o perfil psicológico do homem moderno, expõem angústias e infantilidades como forma de demonstrar o caráter e a complexidade do ser humano, apoiando-se, para tanto, na psicanálise, no surrealismo e na antropologia. VANGUARDAS BRASILEIRAS

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Page 1: MODERNISMO I FASE (1922 – 1930) CONTEXTO HISTÓRICO€¦ · Após a Semana, surgem propostas variadas que dão origem aos grupos: Pau-Brasil, lançado por Oswald de Andrade. O nome

MODERNISMO I FASE (1922 – 1930) Comentários: Prof. Flávio Brito

CONTEXTO HISTÓRICO

No Brasil, o termo Modernismo envolve aspectos ligados ao movimento, propriamente dito, à estética e ao período histórico. Desde o início do século, a literatura tradicional, acadêmica e elitizante se mantém ao lado de tendências renovadoras, representadas por escritores como Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Lima Barreto. Com o passar do tempo, a busca pelo novo e as tentativas de renovação da arte brasileira se multiplicam com a promoção de exposições de pintura, esculturas modernas e artigos nos jornais, dedicados às tendências vanguardistas européias.

Na Europa, essa vanguarda tem como marca o avanço tecnológico e científico do início do século XX. Nesse período, o cotidiano das pessoas sofre uma verdadeira revolução com a supervalorização do progresso e da máquina. O capitalismo entra em crise, dando início à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), encerrando a chamada belle époque. A seguir, a crise financeira, oriunda do conflito, leva à Segunda Guerra Mundial (1939-1945), e nos anos intermediários, conhecidos como "os anos loucos", as pessoas passam a conviver com a incerteza e com o desejo de viver somente o presente. Tais experiências despertam o anseio de interpretar e expressar a realidade de forma diferenciada, dando origem aos movimentos da vanguarda européia.

Os mais importantes foram: o futurismo, liderado pelo italiano Marinetti, exalta a velocidade e a máquina; o cubismo, oriundo da pintura, fraciona a realidade, remontando-a, a seguir, por meio de planos geométricos superpostos; o dadaísmo, com seu líder Tristan Tzara, nega totalmente a lógica, a coerência e a cultura, como forma de oposição ao absurdo da guerra. Tzara toma o termo dadá, que não significa nada, e o aplica à arte que produz, afirmando não reconhecer nenhuma teoria e declarando a morte da beleza; o surrealismo, lançado em 1924, por André Breton, com o Manifesto do Surrealismo, prega o apego à fantasia, ao sonho e à loucura, além da utilização da escrita automática em que o artista, provocado pelo impulso, registra tudo o que lhe vem à mente, sem preocupação com a lógica.

Essa vanguarda passa a exercer influência sobre os artistas e intelectuais brasileiros. Dessa forma, vão surgindo obras de autores jovens que, descontentes com a tradição acadêmica e parnasiana, demonstram que a literatura brasileira está sofrendo um processo dinâmico de transformação. Três datas (1922,1930 e 1945) marcam as diferentes fases desse movimento, iniciado com a Semana de Arte Moderna.

Contexto histórico da primeira fase (1922-1930) - Certas transformações foram responsáveis pela criação do ambiente propício à instalação das novas idéias, ressaltando-se: o Centenário da Independência e a Guerra Mundial (1914-1918), que favoreceu a expansão da indústria brasileira, promoveu novas relações políticas, além de abrir espaço para a renovação na educação e nas artes. Deu origem, também, ao questionamento do sistema político vigente, até então comandado pela oligarquia ligada à economia rural. Há, ainda, a grande influência da mão-de-obra imigrante, instalada no Sul, centro de poder da vida econômica e política do país. Outros fatos importantes foram: o triunfo da Revolução de Outubro de 1930, cujo levante se deu em 1922, e a fundação do Partido Comunista Brasileiro.

Igualmente relevante, foi a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929, levando à queda do café brasileiro na balança de exportação, nessa mesma data. Tal fato, desestabiliza, no Brasil, o grupo dirigente e abre espaço para o novo, dando legitimidade à arte e à literatura modernas, entendidas, a princípio, como "capricho". O país vive os últimos anos da República Velha, caracterizada pelo domínio político das oligarquias, formadas pelos grandes proprietários rurais. Em 1922, com a revolta do Forte de Copacabana, o Brasil entra num período revolucionário de fato, culminando com a Revolução de 1930 e a ascensão de Getúlio Vargas.

CARACTERÍSTICAS O Modernismo tem como característica unificadora o desejo de liberdade de criação e expressão, aliados aos ideais

nacionalistas, visando, sobretudo, emancipar-se da dependência européia. Esse anseio de independência inclui: o vocabulário, a sintaxe, a escolha de temas e a maneira de ver o mundo. Ao rejeitarem os padrões estilísticos portugueses, seus criadores cobrem de humor, ironia e paródia as manifestações modernistas, passando a utilizar as expressões coloquiais, próximas do falar brasileiro, promovendo a valorização diferenciada do léxico.

O mais importante é a atualidade, por isso centram o fazer literário na expressão da vida cotidiana, descrita com palavras do dia-a-dia, afastando-se da literatura tradicional, consagrada ao padrão culto. Um exemplo de incorporação da linguagem oral, na criação poética e descrição de coisas brasileiras, valorizando o prosaico, recoberto de bom humor, é o poema de Mário de Andrade, O poeta come amendoim (1924). Contudo, é preciso ressaltar que não havia imposição de normas e nem tratamento unificado dos temas.

Os modernistas revelam o nacionalismo, através da etnografia e do folclore. O índio e o mestiço passam a ser considerados por sua "força criadora", capaz de provocar "a transformação da nossa sensibilidade, desvirtuada em literatura pela obsessão da moda européia". Cantam, igualmente, a civilização industrial, destacando: a máquina, a metrópole mecanizada, o cinema e tudo que está marcado pela velocidade, aspecto preponderante no modo de vida da nova sociedade. Ao comporem o perfil psicológico do homem moderno, expõem angústias e infantilidades como forma de demonstrar o caráter e a complexidade do ser humano, apoiando-se, para tanto, na psicanálise, no surrealismo e na antropologia.

VANGUARDAS BRASILEIRAS

Page 2: MODERNISMO I FASE (1922 – 1930) CONTEXTO HISTÓRICO€¦ · Após a Semana, surgem propostas variadas que dão origem aos grupos: Pau-Brasil, lançado por Oswald de Andrade. O nome

Após a Semana, surgem propostas variadas que dão origem aos grupos: Pau-Brasil, lançado por Oswald de Andrade. O nome adotado faz referência à primeira riqueza brasileira exportada e o movimento tem como princípios: a exaltação do Carnaval carioca como acontecimento religioso da raça, o abandono dos arcaísmos e da erudição, a substituição da cópia pela invenção e pela surpresa; o Verde-Amarelo, se colocando em oposição ao Pau-Brasil, prega o nacionalismo ufanista e primitivista. Mais tarde, transforma-se no grupo da Anta, escolhida como símbolo da nacionalidade por ter sido o totem da raça tupi; o Regionalista, iniciado no Recife, prega o sentimento de unidade do Nordeste; o Antropofágico, liderado por Oswald de Andrade, inspirado no quadro Abaporu, (aba, "homem"; poru, "que come"), de Tarsila do Amaral, propõe a devoração da cultura importada com intuito de reelaboração, transformando o que veio de fora em produto exportável. As obras ligadas a esse movimento são Cobra Norato, de Raul Bopp, e Macunaíma, de Mário de Andrade.

Manifesto da Poesia Pau-Brasil - O manifesto escrito por Oswald de Andrade foi inicialmente publicado no jornal Correio da Manhã, edição de 18 de março de 1924; no ano seguinte, uma forma reduzida e alterada do manifesto abria o livro de poesias Pau-Brasil. No manifesto e no livro Pau-Brasil (ilustrado por Tarsila do Amaral), Oswald propõe uma literatura extremamente vinculada à realidade brasileira, a partir de uma redescoberta do Brasil.

Manifesto Verde-Amarelo - Em 1926, como uma resposta ao nacionalismo do Pau-Brasil, surge o grupo do Verde-Amarelismo, formado por Plínio Salgado, Menotti del Picchia, Guilherme de Almeida e Cassiano Ricardo. O grupo criticava o "nacionalismo afrancesado" de Oswald de Andrade e apresentava como proposta um nacionalismo primitivista, ufanista e identificado com o fascismo, que evoluiria, no início da década de 30, para o Integralismo de Plínio Salgado. Parte-se para a idolatria do tupi e elege-se a anta como símbolo nacional.

Manifesto Regionalista de 1926 - Os anos de 1925 a 1930 marcam a divulgação do Modernismo pelas vários estados brasileiros. Assim é que o Centro Regionalista do Nordeste, com sede em Recife, lança o Manifesto Regionalista de 1926, em que procura "desenvolver o sentimento de unidade do Nordeste" dentro dos novos valores modernistas. Apresenta como proposta "trabalhar em prol dos interesses da região nos seus aspectos diversos: sociais, econômicos e culturais". Além de promover conferências, exposições de arte, congressos, o Centro editaria uma revista. Nessa primeira fase, o rompimento com o velho, a necessidade de chocar o público e de divulgar novas idéias estão marcados pelo radicalismo. Enquanto várias revistas são criadas por escritores renomados e por iniciantes, o movimento vai se estruturando de forma mais vibrante no Rio e em São Paulo, estendendo-se a Minas e ao polêmico regionalismo nordestino. As publicações variadas são fundamentais para o movimento que, extremamente ativo, se estende até 1930, quando menos agressivo, muda de rumos, principalmente, com referência à prosa, dominada, tradicionalmente, pela literatura oficial, ligada à Academia

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Brasileira de Letras, agora as revistas regionais ou nacionais tomam uma função nobre, de popularização desta cultura. Algumas delas são:

A revista Klaxon - Mensário de Arte Moderna foi o primeiro periódico modernista, fruto das agitações do ano de 1921 e da grande festa que foi a Semana de Arte Moderna. Seu primeiro número circulou com data de 15 de maio de 1922; a edição dupla, de números 8 e 9, a última da revista, saiu em janeiro de 1923.

Klaxon foi inovadora em todos os sentidos: desde o projeto gráfico (tanto da capa como das páginas internas) até a publicidade das contracapas e da quarta capa (propagandas sérias, como a dos chocolates Lacta, e propagandas satíricas, como a da "Panuosopho, Pateromnium & Cia." - uma grande fábrica internacional de... sonetos!). Na oposição entre o velho e o novo, na proposta de uma concepção estética diferente, enfim, em todos os aspectos, era uma revista que anunciava a modernidade, o século XX buzinando (Klaxon era o termo empregado para designar a buzina externa dos automóveis), pedindo passagem.

A Revista - A Revista foi a publicação responsável pela divulgação do movimento modernista em Minas Gerais. Circularam apenas três números, nos meses de julho e agosto de 1925 e janeiro de 1926; contava entre seus redatores com Carlos Drummond de Andrade. Em seu manifesto afirmavam: "(...) Somos, finalmente, um órgão político. Esse qualificativo foi corrompido pela interpretação viciosa a que nos obrigou o exercício desenfreado da politicagem. Entretanto, não sabemos de palavra mais nobre que esta: política. Será preciso dizer que temos um ideal? Ele se apóia no mais franco e decidido nacionalismo. A confissão desse nacionalismo constitui o maior orgulho da nossa geração, que não pratica a xenofobia nem o chauvinismo, e que, longe de repudiar as correntes civilizadoras da Europa, intenta submeter o Brasil cada vez mais ao seu influxo, sem quebra de nossa originalidade nacional:

Revista de Antropofagia - A Revista de Antropofagia teve duas fases (ou "dentições", segundo os antropófagos). A primeira contou com 10 números, publicados entre os meses de maio de 1928 e fevereiro de 1929, sob a direção de Antônio de Alcântara Machado e a gerência de Raul Bopp. A segunda apareceu nas páginas do jornal Diário de S. Paulo foram 16 números publicados semanalmente, de março a agosto de 1929, e seu "açougueiro" (secretário) era Geraldo Ferraz. Em sua primeira "dentição", iniciada com o polêmico Manifesto Antropófago, assinado por Oswald de Andrade, a revista foi realmente um espelho da miscelânea ideológica em que o movimento modernista se transformara: ao lado de artigos de Oswald, Alcântara Machado, Mário de Andrade, Drummond, encontramos textos de Plínio Salgado (em defesa da língua tupi) e poesias de Guilherme de Almeida, ou seja, de típicos representantes da Escola da Anta. Já a segunda "dentição" apresenta-se mais definida ideologicamente - houve, até mesmo, uma ruptura entre Oswald de Andrade e Mário de Andrade. Afinal, vivia-se uma época de definições. Continuam antropófagos Oswald, Raul Bopp, Geraldo Ferraz, Oswaldo Costa, Tarsila do Amaral e a jovem Patrícia Galvão, a Pagu. Os alvos das "mordidas" são Mário de Andrade, Alcântara Machado, Graça Aranha, Guilherme de Almeida, Menotti del Picchia e, naturalmente, Plínio Salgado.

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Outra revista - Além das revistas e manifestos já citados, deve-se mencionar ainda a Revista Verde de Cataguazes, de Minas Gerais, que teve cinco edições entre setembro de 1927 e janeiro de 1928, trilhando o caminho aberto por A Revista. No Rio de Janeiro, em 1924, circulou a revista Estética; em São Paulo, no ano de 1926, havia a revista Terra Roxa e Outras Terras, de pequena expressão, apesar de contar com a colaboração de Mário de Andrade e de Rubens Borba de Moraes. Em 1927, no Rio de Janeiro, circulou a revista Festa, fundada por Tasso da Silveira, que tentava revalorizar a linha espiritualista de tradição católica e tinha Cecília Meireles como colaboradora.

PROGRAMA DO PRIMEIRO FESTIVAL Segunda - feira, 13 de fevereiro

1ª PARTE

Conferência de Graça Aranha: "A emoção estética na arte moderna", ilustrada com música executada por Ernani Braga e poesia de Guilherme de Almeida e Ronald de Carvalho.

Música de câmara: Villa-Lobos, Sonata II para violoncelo e piano (1916), com Alfredo Gomes e Lucília Villa-Lobos; Trio Segundo para violino, violoncelo e piano (1916), com Paulina d'Ambrósio, Alfredo Gomes e Fructuoso de Lima Vianna.

2ª PARTE

Conferência de Ronald de Carvalho: "A pintura e a escultura moderna no Brasil". Solos de piano por Ernani Braga: "Valsa Mística" (1917, da Simples Coletânea); "Rodante" (da Simples Coletânea); A

fiandeira. Octeto (Três danças africanas): "Farrapos" (1914, "Danças dos moços"); "Kankukus" (1915, "Danças dos velhos");

"Kankikis" (1916, "Danças dos meninos"). Violinos: Paulina d'Ambrosio, George Marinuzzi. Alto: Orlando Frederico. Violoncelos: Alfredo Gomes; baixo: Alfredo Corazza. Flauta: Pedro Vieira; clarinete: Antão Soares. Piano: Fructuoso de Lima Vianna.

PROGRAMA DO SEGUNDO FESTIVAL Quarta - feira, 15 de fevereiro

1ª PARTE

Palestra de Minotti del Picchia, ilustrada com poesias e trechos de prosa por Oswald de Andrade, Luiz Aranha, Sérgio Milliet, Tácito de Almeida, Ribeiro Couto, Mário de Andrade, Plínio Salgado, Agenor Barbosa e dança pela senhorita Yvonne Daumerie.

Solos de piano por Guiomar Novaes: a. Blanchet: Au jardin du vieux Sérail. b. Villa-Lobos: O ginete do pierrozinho. c. Debussy: La soirée dans Grenade. d. Debussy: Minstrels.

INTERVALO

Palestra de Mário de Andrade no saguão do Teatro

2ª PARTE

Conferência de Ronald de Carvalho: "A pintura e a escultura moderna no Brasil". Palestra de Renato Almeida:"Perennis poesia". Canto e piano por Frederico Nascimento Filho e Lucília Villa-Lobos: Festim Pagão(1919); Solidão (1920); Cascavel

(1917). Quarteto terceiro (cordas, 1916).

Violinos: Paulina d'Ambrosio, George Marinuzzi. Alto: Orlando Frederico. Violoncelos: Alfredo Gomes.

PROGRAMA DO TERCEIRO FESTIVAL Sexta - feira, 17 de fevereiro

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1ª PARTE

Villa-Lobos:Trio Terceiro para violino, violoncelo e piano (1918), com Paulina d'Ambrosio, Alfredo Gomes e Lucília Villa-Lobos.

Canto e piano por Maria Emma e Lucília Villa-Lobos. Historietas, de Ronald de Carvalho (1920): "Lune d'octobre"; "Voilà la vie"; "Jouis dans retard, car vite s'sécoule la vie". Sonata II para violino e piano (1914), com Paulina d'Ambrosio e Fructuoso de Lima Vianna.

2ª PARTE

Solos de piano por Ernani Braga: "Camponesa cantadeira" (1916, da Suíte floral); "Num berço encantado" (1919, da Simples Coletânea); Dança infernal (1920).

Quarteto Simbólico (expressões da vida mundana): flauta, saxofone, celesta e harpa ou piano com vozes femininas em coro oculto (1921), com Pedro Vieira, Antão Soares, Ernani Braga e Fructuoso de Lima Vianna.

O ESTADO DE SÃO PAULO

São Paulo, 15/02/1922 Ex.mos Srs. Membros do Comitê Patrocinador da Semana de Arte Moderna - Saudações. Em virtude do caráter bastante exclusivista e intolerante que assumiu a 1ª festa de Arte Moderna realizada à noite de 13, no teatro Municipal, em relação às demais escolas de música das quais sou intérprete e admiradora, não posso deixar de aqui declarar o meu desacordo com este modo de pensar. Sinto-me sinceramente contristada com a pública exibição de peças satíricas alusivas à música de Chopin. Admiro e respeito as grandes manifestações de arte independentes das escolas a que se filiam, e foi de acordo com este meu modo de pensar que, atendendo ao convite que me foi feito, tomarei parte num dos festivais de Arte Moderna. Com toda consideração, Guiomar Novaes

CARACTERÍSTICAS MODERNISTAS

1) LIBERDADE DE EXPRESSÃO - A importância maior das vanguardas residiu no triunfo de uma concepção inteiramente libertária da criação artística. O pintor, o escritor ou o músico não precisa se guiar por outras leis que não as de sua própria interioridade e seu próprio arbítrio. A liberdade só poderá ser cercada por regimes autoritários que proíbem a circulação dos objetos artísticos.

2) INCORPORAÇÃO DO COTIDIANO - A valorização da vida cotidiana traz para uma abertura temática sem precedentes pois, até então, apenas assuntos "sublimes" tinham direito indiscutível ao mundo literário. A aventura do cotidiano leva o artista a romper com os esquemas de vida burguesa. Ele descobre o folclórico e o popular, elementos dos quais se apropriará, muitas vezes indevidamente

3) LINGUAGEM COLOQUIAL - Liberto da escrita "nobre", o artista volta-se para um estilo prosaico, que admite "erros" gramaticais e palavras comuns.

4) INOVAÇÕES TÉCNICAS - O rompimento com os padrões culturais do século XIX implicaria no surgimento de novas técnicas de escritura, tanto no domínio da poesia, quanto no da ficção. As principais conquistas foram:

- O verso livre: o verso já não está sujeito ao rigor métrico e as formas fixas de versificação, como o soneto, por exemplo. Também a rima se torna desnecessária.

- A destruição dos nexos: os chamados nexos sintáticos, preposições, conjunções, etc. São eliminados da poesia moderna, que se torna mais solta, mais descontinua e fragmentária e, fundamentalmente, mais sintética. No plano da prosa, essas elipses geraram o estilo telegráfico: frases curtas e sincopadas.

- A enumeração caótica: consiste no acúmulo de palavras que designam objetos, seres, sensações, vinculados a uma idéia ou várias idéias básicas, sem ligação evidente entre si.

- O fluxo de consciência: técnica narrativa estabelecida por Edouard Dujardin e sacramentada por James Joyce. Trata-se de um monólogo interior levado para o texto de ficção sem qualquer obediência à normalidade gramatical, à lógica e mesmo à coerência. É a mente do personagem revelada por ele próprio, sem nenhum tipo de barreira racional.

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- A colagem e montagem cinematográfica: ainda no campo da narrativa, valoriza-se a fragmentação do texto, sua montagem em blocos, a "colagem" de notícias de jornais, cartazes, telegramas, etc. No corpo dos romance, como o fez Jonh dos Pasos na trilogia U.S.A . Ou ainda a utilização de várias vozes narrativas (1ª, 2ª, 3ª pessoas no mesmo livro) nas experiências de Faulkner (Enquanto agonizo, O som e a fúria).

- A eliminação dos sinais de pontuação: os sinais tornam-se facultativos, com o escritor subordinado ao uso de pontos, vírgulas, travessões, etc. A uma disposição estilístico- -psicológica e não a regras gramaticais. Sua eliminação freqüente, visa dar ao texto um aspecto de caótico ou febril.

5) AMBIGÜIDADE - O discurso literário perde o sentido "fechado" que geralmente possuía no século passado. Ou seja, ele oferecia ao leitor apenas um sentido, uma interpretação. Agora, ele tem um caráter variado e polissêmico. Uma rede de significações, que permite múltiplos níveis de leitura. É a chamada obra aberta, obra que não apresenta univocidade.

6) PARÓDIA - Os modernistas realizam um releitura de textos famosos do passado, reescrevendo-os em forma de paródia. Um dos livros de crítica literária de Mário de Andrade chama-se A escrava que não é Isaura, numa evidente alusão ao conhecido relato de Bernado Guimarães.

PRINCIPAIS AUTORES:

MÁRIO DE ANDRADE - BIOGRAFIA

Mário Raul de Morais Andrade nasceu na rua Aurora, na cidade de São Paulo, em 9 de outubro de 1893. Seu pai, o Dr. Carlos Augusto de Andrade, de origem humilde, conseguira uma situação financeira estável através do próprio esforço e muito trabalho. Sua mãe, dona Maria Luísa, com quem Mário morou até o fim da vida, descendia de bandeirantes, mas não era rica. Quando adolescente, era um estudante dispersivo, que tirava notas baixas e só se destacava em Português. Enquanto seus irmãos Carlos, mais velho e Renato, mais novo – pianista de talento, falecido ainda menino - eram elogiados, Mário era considerado a ovelha negra da família. De repente, começou a estudar. Estudava música até nove horas por dia, lia muito e logo começou a ganhar fama de erudito. A família passou a admitir o seu talento, mas achava esquisitas suas preferências literárias. Em 1917, morre seu pai. Mário conclui, neste mesmo ano, o curso de piano no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, publica seu livro de estréia Há uma Gota de Sangue em cada Poema e conhece Anita Malfatti e Oswald de Andrade. Metódico e estudioso, torna-se Catedrático de História da Música, no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, em 1922, e, para sobreviver, ainda dá muitas aulas particulares de piano e escreve artigos de crítica para diversas publicações. Em 25 de fevereiro de 1945, aos 51 anos de idade, Mário de Andrade sofre um ataque cardíaco fulminante e morre, deixando inacabado o livro Contos Novos (1946) em que se destacam narrativas de inspiração freudiana, como “Vestida de Preto” e “Frederico Paciência”, e contos de preocupação social, como “O Poço” e “Primeiro de Maio”.

Considerado o "Pai do Modernismo" ou "papa do novo credo".

Um dos melhores escritores brasileiros. Escreveu poesias, romances, contos, crônicas e crítica literária. Apresenta renovação formal e lingüística. Presença de coloquialismos e neologismos. Sua obra mostra fortes críticas à burguesia paulistana. Tendência ao psicologismo freudiano. Nacionalismo e brasilidade: valorização da língua, cultura e temáticas populares.

SELEÇÃO DE TEXTOS

PREFÁCIO INTERESSANTÍSSIMO

"Dans mon pays de fiel et d'or j'en suis la loi."

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(No meu país de fel e de ouro, eu sou a lei)

E. Verhaeren

Leitor: Está fundado o Desvairismo.

Este prefácio, apesar de interessante, inútil...

Alguns dados. Nem todos. Sem conclusões. Para quem me aceita são inúteis ambos. Os curiosos terão prazer em descobrir minhas conclusões, confrontando obra e dados. Para quem me rejeita trabalho perdido explicar o que, antes de ler, já não aceitou.

Quando sinto a impulsão lírica escrevo sem pensar tudo o que meu inconsciente me grita. Penso depois: não só para corrigir, como para justificar o que escrevi. Daí a razão deste prefácio interessantíssimo.

Aliás, muito difícil nesta prosa saber onde termina a blague, onde principia a seriedade. Nem eu sei.

E desculpe-me por estar tão atrasado dos movimentos artísticos atuais. Sou passadista, confesso. Ninguém pode se libertar dumo só vez das teorias avós que bebeu; e o autor deste livro seria hipócrita si pretendesse representar orientação moderna que ainda não compreende bem.

Ode ao Burguês

Eu insulto o burguês! O burguês-níquel, o burguês-burguês! A digestão bem-feita de São Paulo! O homem-curva! o homem-nádegas! O homem que sendo francês, brasileiro, italiano, é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!

Eu insulto as aristocracias cautelosas! Os barões lampiões! os condes Joões! os duques zurros! que vivem dentro de muros sem pulos; e gemem sangues de alguns mil-réis fracos para dizerem que as filhas da senhora falam o francês e tocam os "Printemps" com as unhas!

Eu insulto o burguês-funesto! O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições! Fora os que algarismam os amanhãs! Olha a vida dos nossos setembros! Fará Sol? Choverá? Arlequinal! Mas à chuva dos rosais o èxtase fará sempre Sol!

Morte à gordura! Morte às adiposidades cerebrais! Morte ao burguês-mensal! ao burguês-cinema! ao burguês-tílburi! Padaria Suissa! Morte viva ao Adriano! "Ai, filha, que te darei pelos teus anos? Um colar... Conto e quinhentos!!! Mas nós morremos de fome!"

Come! Come-te a ti mesmo, oh gelatina pasma! Oh! purée de batatas morais! Oh! cabelos nas ventas! oh! carecas! Ódio aos temperamentos regulares! Ódio aos relógios musculares! Morte à infâmia! Ódio à soma! Ódio aos secos e molhados! Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,

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sempiternamente as mesmices convencionais! De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia! Dois a dois! Primeira posição! Marcha! Todos para a Central do meu rancor inebriante Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio! Morte ao burguês de giolhos, cheirando religião e que não crê em Deus! Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico! Ódio fundamento, sem perdão!

Fora! Fu! Fora o bom burgês!...

Lundu do Escritor Difícil Eu sou um escritor difícil Que a muita gente enquizila, Porém essa culpa é fácil De se acabar duma vez: É só tirar a cortina Que entra luz nesta escurez.

Cortina de brim caipora, Com teia caranguejeira E enfeite ruim de caipira, Fale fala brasileira Que você enxerga bonito Tanta luz nesta capoeira Tal-e-qual numa gupiara.

Misturo tudo num saco, Mas gaúcho maranhense Que pára no Mato Grosso, Bate este angu de caroço Ver sopa de caruru; A vida é mesmo um buraco, Bobo é quem não é tatu!

Eu sou um escritor difícil, Porém culpa de quem é!... Todo difícil é fácil, Abasta a gente saber. Bajé, pixé, chué, ôh "xavié" De tão fácil virou fóssil, O difícil é aprender!

Virtude de urubutinga De enxergar tudo de longe! Não carece vestir tanga Pra penetrar meu caçanje! Você sabe o francês "singe" Mas não sabe o que é guariba? - Pois é macaco, seu mano, Que só sabe o que é da estranja.

OSWALD DE ANDRADE - BIOGRAFIA

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Oswald de Andrade foi o mais radical dos modernistas. Manteve-se sempre fiel às propostas da Semana de 22, da qual foi um dos principais organizadores, em especial quanto ao rompimento com os cânones do passado. Formou-se em Direito em 1919. Antes mesmo disso já tinha feito uma de suas muitas viagens à Europa, onde tomou contato com os movimentos vanguardistas da época, como o Futurismo de Marinetti. Após a Semana de 22, iniciou os movimentos Pau-Brasil e da Antropofagia. Com o crack da bolsa de Nova York e a revolução de 30, perdeu tudo o que tinha, tendo que recorrer a agiotas - experiências que foi registrada em sua peça O Rei da Vela. Filiou-se então ao Partido Comunista, com o qual romperia anos mais tarde. Sofreu perseguições políticas, sendo preso várias vezes. Dentro de sua idéia de "monogamia sucessiva", envolveu-se com muitas mulheres, uma após a outra. A partir da década de 40 dedicou-se à vida acadêmica, inclinando-se para a problemática espiritual e para os temas essenciais da vida. Foi um homem polêmico no seu tempo, nem só na área artística, mas também na área política. Suas obras não podem ser estudadas separadamente de sua vida.

Considerado um dos líderes do Modernismo de 22.

Renovador, rebelde e sarcástico. Sua obra é marcada pela extrema criatividade: poema-piada, poema-paródia, poema-minuto, romances caleidoscópicos. Humorismo e irreverência. Dessacraliza a poesia e a prosa. Foi um genial criador de idéias e movimentos. Lançou os manifestos Pau-Brasil e Antropofagia. Empregou neologismos, coloquialismos e oralidade. Estilo telegráfico. Dinamismo.

SELEÇÃO DE POEMAS

Pronominais Dê-me um cigarro Diz a gramática Do professor e do aluno E do mulato sabido Mas o bom negro e o bom branco Da Nação Brasileira Dizem todos os dias Deixa disso camarada Me dá um cigarro

Canto de Regresso à Pátria Minha terra tem palmares Onde gorjeia o mar Os passarinhos daqui Não cantam como os de lá Minha terra tem mais rosas E quase que mais amores Minha terra tem mais ouro Minha terra tem mais terra Ouro terra amor e rosas Eu quero tudo de lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte para lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte pra São Paulo

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Sem que veja a Rua 15 E o progresso de São Paulo.

Erro de Português Quando o português chegou Debaixo de uma bruta chuva Vestiu o índio Que pena! Fosse uma manhã de sol O índio tinha despido O português.

O Capoeira - Qué apanhá sordado? - O quê? - Qué apanhá? Pernas e cabeças na calçada.

Oferta Quem sabe Se algum dia Traria O elevador Até aqui O teu amor

MANUEL BANDEIRA - BIOGRAFIA

Manuel Bandeira (Recife PE, 1886 - Rio de Janeiro RJ, 1968) teve publicado de seu primeiro poema, um soneto em

alexandrinos, na primeira página do Correio da Manhã, em 1902, no Rio de Janeiro. Cursou Arquitetura, na Escola Politécnica, e Desenho de Ornato, no Liceu de Artes e Ofícios, entre 1903 e 1904; precisou abandonar os cursos, no entanto, devido à tuberculose. Nos anos seguintes, passou longos períodos em estações climáticas, no Brasil e na Europa. No sanatório de Clavadel (Suíça), onde esteve entre 1913 e 1914, travou amizade com Paul Éluard e tomou contato com a literatura de vanguarda francesa. Voltando ao Brasil, passou a viver no Rio de Janeiro, onde publicou A Cinza das Horas, em 1917. No mesmo ano, teve publicada sua primeira crônica, no periódico carioca Rio Jornal. Apoiou a Semana de Arte Moderna, em 1922; seu poema Os Sapos foi lido por Ronald de Carvalho, em uma das sessões do Teatro Municipal de São Paulo. Nas décadas seguintes, aliou à produção poética a colaboração em periódicos, como cronista e crítico literário, e a tradução de mais de 30 obras. Lecionou no Colégio Pedro II, entre 1938 e 1943, e na Faculdade Nacional de Filosofia, entre 1943 e 1956. Foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras em 1940. Fazem parte de sua obra poética os livros Libertinagem (1930), Mafuá do Malungo (1948) e Estrela da Vida Inteira (1966), entre outros. Manuel Bandeira, cuja obra vincula-se à primeira geração do modernismo, é um dos maiores poetas brasileiros. Sua poesia, marcada pela experiência trágica da tuberculose, trata da morte, do amor e do cotidiano, em versos livres nos quais se destacam o humor, a melancolia, por vezes a amargura diante da vida. Como cronista, “foi um observador atento e lúcido dos fenômenos de uma época em que se desenvolveram tantos fatos notáveis para a história da Humanidade”, segundo o crítico Stephan Baciu.

PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

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Foi um dos líderes do Modernismo, , mesmo não tendo comparecido à Semana de Arte Moderna. Considerado um dos melhores poetas brasileiros. Simplicidade. Presença de lirismo: intimismo e introspecção. Espontaneidade emocional. Liberdade e formalismo convivem em vários momentos de sua poesia. Recebeu influência parnaso-simbolista (1ª fase). Humorismo. Pessimismo: temática constante da morte e da doença. Um "tísico profissional". Seus principais temas foram a morte, a doença, a infância, a evasão, a solidão, a melancolia, o amor (erótico), o tédio. No início, influências simbolistas com ligações parnasianas. Fez poemas autobiográficos. Tom melancólico e lírico. É muito triste em seus textos. Temas relacionados a doenças e mortes, principalmente a tuberculose. Linguagem coloquial, tese social e folclore negro. As vezes usa a ironia. Versos livres. Rebeldia e sátira como no poema “Os sapos”. Temas populares. Saudade da infância. Desejo de libertação.

1ª FASE - PRÉ-MODERNISMO: influência parnaso-simbolista - A Cinza das Horas, Carnaval, Ritmo Dissoluto. 2ª FASE - MODERNISMO: apresenta apenas 2/3 de versos livres - Libertinagem, A Estrela da Manhã. 3ª FASE - PÓS-MODERNISMO: formalismo, experiências com haicais e com o concretismo.

SELEÇÃO DE POEMAS

Vou-me Embora pra Pasárgada Vou-me embora pra Pasárgada Lá sou amigo do rei Lá tenho a mulher que eu quero Na cama que escolherei Vou-me embora pra Pasárgada Vou-me embora pra Pasárgada Aqui eu não sou feliz Lá a existência é uma aventura De tal modo inconseqüente Que Joana a Louca de Espanha Rainha e falsa demente Vem a ser contraparente Da nora que nunca tive E como farei ginástica Andarei de bicicleta Montarei em burro brabo Subirei no pau-de-sebo Tomarei banhos de mar! E quando estiver cansado Deito na beira do rio Mando chamar a mãe-d'água Pra me contar as histórias Que no tempo de eu menino Rosa vinha me contar Vou-me embora pra Pasárgada Em Pasárgada tem tudo É outra civilização Tem um processo seguro De impedir a concepção

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Tem telefone automático Tem alcalóide à vontade Tem prostitutas bonitas Para a gente namorar E quando eu estiver mais triste Mas triste de não ter jeito Quando de noite me der Vontade de me matar — Lá sou amigo do rei — Terei a mulher que eu quero Na cama que escolherei Vou-me embora pra Pasárgada. Teresa A primeira vez que vi Teresa Achei que ela tinha pernas estúpidas Achei também que a cara parecia uma perna Quando vi Teresa de novo Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo (Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse) Da terceira vez não vi mais nada Os céus se misturaram com a terra E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas. A morte absoluta Morrer. Morrer de corpo e de alma. Completamente. Morrer sem deixar o triste despojo da carne, A exangue máscara de cera, Cercada de flores, Que apodrecerão - felizes! - num dia, Banhada de lágrimas Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte. Morrer sem deixar porventura uma alma errante... A caminho do céu? Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu? Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra, A lembrança de uma sombra Em nenhum coração, em nenhum pensamento, Em nenhuma epiderme. Morrer tão completamente Que um dia ao lerem o teu nome num papel Perguntem: "Quem foi?..." Morrer mais completamente ainda, - Sem deixar sequer esse nome. Os sapos Enfunando os papos, Saem da penumbra, Aos pulos, os sapos. A luz os deslumbra.

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Em ronco que aterra, Berra o sapo-boi: — "Meu pai foi à guerra!" — "Não foi!" — "Foi!" — "Não foi!". O sapo-tanoeiro, Parnasiano aguado, Diz: — "Meu cancioneiro É bem martelado. Vede como primo Em comer os hiatos! Que arte! E nunca rimo Os termos cognatos! O meu verso é bom Frumento sem joio Faço rimas com Consoantes de apoio. Vai por cinqüenta anos Que lhes dei a norma: Reduzi sem danos A formas a forma. Clame a saparia Em críticas céticas: Não há mais poesia, Mas há artes poéticas . . ." Urra o sapo-boi: — "Meu pai foi rei" — "Foi!" — "Não foi!" — "Foi!" — "Não foi!" Brada em um assomo O sapo-tanoeiro: — "A grande arte é como Lavor de joalheiro. Ou bem de estatuário. Tudo quanto é belo, Tudo quanto é vário, Canta no martelo." Outros, sapos-pipas (Um mal em si cabe), Falam pelas tripas: — "Sei!" — "Não sabe!" — "Sabe!". Longe dessa grita, Lá onde mais densa A noite infinita Verte a sombra imensa; Lá, fugindo ao mundo, Sem glória, sem fé, No perau profundo E solitário, é Que soluças tu, Transido de frio, Sapo-cururu Da beira do rio

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Pneumotórax Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse. Mandou chamar o médico: — Diga trinta e três. — Trinta e três . . . trinta e três . . . trinta e três . . . — Respire. ............................................................................................................... — O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. — Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? — Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino. O bicho Vi ontem um bicho Na imundície do pátio Catando comida entre os detritos. Quando achava alguma coisa, Não examinava nem cheirava: Engolia com voracidade. O bicho não era um cão, Não era um gato, Não era um rato. O bicho, meu Deus, era um homem.

ANITA MALFATTI - BIOGRAFIA

Anita Catarina Malfatti nasceu na cidade de São Paulo, em 1889, filha de pai italiano e mãe norte-americana,que foi ela quem foi sua primeira professora de pintura.

Com a ajuda de um tio e padrinho, Anita pôde viajar para a Europa e Estados Unidos, desenvolvendo sua técnica pictórica de acordo com as tendências contemporâneas, principalmente cubistas e expressionistas.

Sua primeira mostra individual no Brasil acontece em 1914, com pouca repercussão, e a segunda em 1917, em que é duramente criticada pelo escritor Monteiro Lobato.

Apesar de sua defesa pelos futuros modernistas, principalmente Oswald de Andrade, ela preferiu dedicar-se, nos anos seguintes, ao estudo da pintura acadêmica.

Convidada pelos modernistas, participa da Semana de 22. A nova exposição lhe garante uma bolsa de estudos, e ela muda-se para Paris, de onde só voltaria em 1928 para dedicar-se ao ensino da pintura no curso normal.

Da década de 1930 em diante, além da atividade docente ( professora ), a artista estaria engajada nos movimentos de classe dos artistas plásticos, ajudando a fundar a SPAM (Sociedade Pró-Arte Moderna), e se tornando a presidente do Sindicato dos Artistas Plásticos.

Suas mostras individuais, de 1937 e 1939, chamam a atenção pelo ecletismo do estilo, que revela influências primitivistas, acadêmicas e modernistas, desconcertando críticos e colegas.

Nas décadas seguintes, participaria de várias mostras comemorativas e homenagens, obtendo reconhecimento inquestionável dentro do panorama artístico brasileiro.

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Após a morte da mãe, retira-se para uma chácara em Diadema, dedicando-se menos à pintura. Sua ausência nada contribui com o seu esquecimento: a artista seria sempre lembrada, inclusive com uma sala especial na VII Bienal de São Paulo, em 1963.

Anita Malfatti Falece em 6 de novembro de 1964, deixando aos nossos olhos e corações o orgulho por ela ter existido.

SELEÇÃO DE PINTURAS

A boba

O Farol

Retrato (Mário de Andrade)

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MENOTTI DEL PICCHIA - BIOGRAFIA .

Paulo Menotti Del Picchia nasceu em São Paulo, em 20 de março de 1892. Filho de Luiz del Picchia e Corina del Corso del

Picchia, Menotti foi agricultor, advogado, editor, industrial, banqueiro, deputado estadual e federal, chefe do Ministério Público do Estado de São Paulo, jornalista, poeta, romancista, ensaísta, teatrólogo e primeiro diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado de São Paulo.

Menotti Del Picchia inicia seus estudos no Grupo Escolar de Itapira. Em 1903 faz o curso ginasial em Campinas, de onde se transfere para Pouso Alegre (MG). Nesta cidade, aos 14 anos, funda o periódico "Mandu", nele publica suas primeiras produções literárias. Aos 16, já tinha escrito um romance, que, segundo ele, não passou de um "terrível pastiche do Conde de Monte Cristo".

Em 1913, lança o livro de poemas "Poemas do Vício e da Virtude". Nesse mesmo ano forma-se advogado pela Faculdade de Direito de São Paulo. Logo depois da conclusão de seus estudos em São Paulo, volta para Itapira, onde exerce as atividades de agricultor e dirige o jornal "Cidade de Itapira". Algum tempo depois funda o jornal político "O Grito", no qual foram publicados o romance "Laís" e os poemas "Moisés" e "Juca Mulato", sua obra de maior repercussão, que já teve dezenas de edições. O poema "Juca Mulato", publicado em 1917, foi tão importante e fez tanto sucesso que Menotti afirmou que era um autor perseguido por um personagem. (A força de "Juca Mulato" é tanta que Itapira, para homenagear Menotti, deu o nome de "Juca Mulato" a um parque. As homenagens de Itapira não param por aí. O nome do poeta foi dado a uma praça e foi criado o memorial "Casa de Menotti Del Picchia".)

Algum tempo depois, muda-se para Santos, onde dirige o jornal "A Tribuna". Ao regressar à cidade de São Paulo, exerce a função de redator em diversos jornais como "A Gazeta" e o "Correio Paulistano". Ainda em São Paulo funda o jornal "A Noite", dirige, com Cassiano Ricardo, os mensários "São Paulo" e "Brasil Novo". Em 1920 e 1921, Menotti Del Picchia, utilizando o pseudônimo de Helios, publica no jornal Correio Paulistano, vários artigos que divulgavam as novas estéticas modernistas e promoviam o grupo vanguardista.

Em 1922, junto com Oswald de Andrade, Mário de Andrade e outros jovens, participa ativamente da Semana de Arte Moderna. Nessa época já era considerado um poeta de prestígio. Após a SAM, junto com Cassiano Ricardo e Plínio Salgado, é um dos mentores do movimento nacionalista e literário do verde-amarelismo. Depois, com Cassiano Ricardo e Mota Filho, chefia o movimento cultural da Bandeira.

Em 1º de abril de 1943 é eleito para a cadeira 28 da Academia Brasileira de Letras, na sucessão de Xavier Marques. Em 20 de dezembro de 1943 é recebido na ABL pelo acadêmico e amigo Cassiano Ricardo.

Em 1982, é proclamado Príncipe dos Poetas Brasileiros. Esse título só havia sido concedido a mais três poetas: Olavo Bilac, Alberto de Oliveira e Olegário Mariano.

Em 1988, no dia 23 de agosto, o poeta morreu em São Paulo.

TEXTOS SELECIONADOS

PRAÇA DA REPÚBLICA

Os chorões lavaram seus cabelos verdes nas piscinas de cimento dentadas de rochedos feitos por marmoristas e desenhados por Debugras

Há peixes dispépticos que só comem pão-de-ló servidos pelos dedos lunares das Salomés-normalistas que sabem de cor as façanhas de Tom-Mix e Tiradentes.

As astúrias cortaram suas tranças "à la garçonne" e ouvem lições de geometria no espaço de sábios buxos cubistas...

Praça da República cheia de mulheres públicas de detritos humanos, como um porto cosmopolita onde os táxis atracam,

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velhas catraias urbanas que vogam nos canais de asfalto das alamedas.

Álvares de Azevedo, o último Romântico, condenado às galés da imortalidade, cospe na praça noturna, do alto de sua herma, o seu desdém de bronze.

AVENIDA PAULISTA

Todos os estilos ancoraram no cais mole do asfalto fidalgo... Dentro daquele parque fuma goiano um califa enriquecido com uma fábrica de alpargatas da rua 25 de Março.

O sr. Conde está bebendo Chianti servido por um criado de libré.

Até as colunas de mármore são de cimento armado.

E domingo, em Roles Royce ou em Ford passaremos em revista na parada do corso todos os candidatos à consagração da Avenida.

TARSILA DO AMARAL - BIOGRAFIA

Tarsila do Amaral (Capivari SP 1886 - São Paulo SP 1973) faz escultura com Zadig e Mantovani em 1916 na capital paulista.

No ano seguinte estuda pintura e desenho com Pedro Alexandrino. Tem aulas com o pintor Georg Elpons. Viaja em 1920 para Paris, estuda na Académie Julien e com Emile Renard. Em 1922, em São Paulo, forma o Grupo dos Cinco, com Anita Malfatti, Mário de Andrade, Menotti Del Picchia e Oswald de Andrade. Em 1923, em Paris, estuda com André Lothe, Fernand Léger e Albert Gleizes. No ano seguinte acompanha o poeta Blaise Cendrars, com Oswald de Andrade, Olívia Penteado, Mário de Andrade e outros, em viagem as cidades históricas de Minas Gerais. Realiza uma série de trabalhos baseados em esboços feitos durante a viagem. Nesse período, inicia a chamada fase pau-brasil. Em 1925 ilustra o livro de poemas Pau-Brasil, de Oswald de Andrade, publicado em Paris. Em 1928, pinta Abaporu, tela que inspira o movimento antropofágico, desencadeado por Oswald de Andrade e Raul Bopp. Em 1933, após viagem a União Soviética, inicia uma fase voltada para temas sociais com as obras Operários e 2a Classe. Em 1936 colabora no Diário de S. Paulo. Entre 1940 e 1944 cria ilustrações para a série Os Mestres do Pensamento, dirigida por José Perez. Realiza, em 1945, uma série de gravuras para o livro Poesias Reunidas de O. Andrade, a pedido do autor. Nos anos 50 volta ao tema "pau Brasil". Participa em 1951 da I Bienal de São Paulo. O convite da Comissão do 4o Centenário de São Paulo faz em 1954 o painel Procissão do Santíssimo. Em 1963 tem sala especial na VII Bienal de São Paulo e no ano seguinte participação especial na XXXII Bienal de Veneza. Faleceu em São Paulo no dia 17 de janeiro de 1973.

Tarsila foi, certamente, uma criatura rara, excepcional, superior, reunindo em si um complexo de qualidades e virtudes que a tornaram, não só em seu meio como em seu tempo, uma dessas culminâncias quase fenomenais com que a Humanidade parece às vezes querer superar-se a si mesma, aproximando-se da perfeição. Tudo nela era de alta qualidade: o talento, a cultura, a sensibilidade, a bondade, a educação e a beleza.

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Oriunda de tradicionais e opulentas raízes (José Estanislau do Amaral, seu avô, era cognominado o Milionário, como se pode ver em Silva Leme), Tarsila conheceu todos os confortos, esplendores e prazeres da vida. Teve mansões, fazendas, Automóveis. Viajou. Vestia-se com modelos especiais de Poiret, o grande modista parisiense da época. Sua beleza espetacular ficou famosa. Quando Sanson Flexor veto para o Brasil, um crítico de arte francês, se não me engano Christian Zervos, disse-lhe: "Voce vai conhecer a mulher mais bela do mundo Chama-se Tarsila". Sérgio Milliet contava a sensato o que ela causava quando aparecia num camarote de teatro, em Paris: todos os olhares se voltavam para aquela criatura radiosa e fascinante.

Quanto ao talento, não é necessário celebra-lo, para um público que a admira e disputa seus quadros a peso de ouro. Não é necessário relembrar as suas exposições em Paris, em Moscou, em São Paulo e no Rio de Janeiro, a Antropofagia, a fase Pau-Brasil. O papel que representou na renovação da arte brasileira. Sob certos aspectos, Tarsila é o nosso pintor mais importante, neste século. Mas não se limitava a pintar: também escrevia - e muito bem.

A infinita bondade, a recatada modéstia, a extrema polidez, a extraordinária simplicidade, a grande generosidade, eram atributos que completavam a notável personalidade dessa criatura de exceção. E a coragem, o estoicismo, a resignação. A única neta, ainda adolescente, foi-lhe arrebatada pela morte. Anos depois, perdeu a filha única. Depois, foi a cruel, impiedosa enfermidade: há muitos anos, Tarsila vivia numa cadeira de rodas. E nunca se queixou nunca se lamentou nunca se revoltou. Pelo contrário. Sua atitude diante da vida era uma constante, inalterável e comovente lição de otimismo, de coragem, de alegria de viver.

São Paulo e o Brasil reconheceram-lhe o valor muito tarde. Durante anos, Tarsila viveu quase esquecida e ignorada. A importância da sua obra era negada ou diminuída. Tarsila passou dias difíceis. Mas sempre sorridente sempre amável com todo o mundo, sempre contente consigo mesma e com a Humanidade. Agora, que está morta, é que podemos avaliar sua grandeza.

SELEÇÃO DE PINTURAS

abapuru

paisagem com touro

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operários

EXERCÍCIOS DE APROFUNDAMENTO

1. (UFAC-AC) Leia o poema de Oswald de Andrade. Pronominais Dê-me um cigarro Diz a gramática Do professor e do aluno E do mulato sabido Mas o bom negro e o bom branco Da Nação Brasileira Dizem todos os dias Deixa disso camarada Me dá um cigarro Das alternativas abaixo, uma não corresponde ao poema. Marque-a. a) Exaltação do falar coloquial brasileiro. b) A presença do humor. c) A liberdade da métrica. d) Discriminação racial. e) Nacionalização da língua portuguesa. 2. (UNIUBE-MG) Considere as seguinte afirmações sobre Mário de Andrade e sua obra. I. Figura de grande importância no Modernismo brasileiro, Mário de Andrade incorporou, em sua linguagem, contribuições populares da língua e da cultura nacionais. II. Influenciada pelos parnasianos e pelos simbolistas, a poesia de Mário de Andrade compõe-se nos moldes da tradição clássica e recusa inovações de forma. III. Na obra poética do Autor encontra-se tanto o tom introspectivo e intimista como o engajamento em temas e problemas sociais de seu tempo. IV. Além de dedicar-se à literatura, o Autor produziu estudos sobre folclore brasileiro, cujas contribuições se encontram, por exemplo, em seu romance Macunaíma. Dentre essas afirmações, estão corretas somente: a) II, III e IV b) I e IV c) I, II e III

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d) III e IV e) I, III e IV 3. (ITA-SP) “Na macumba do Encantado Nego véio de santo fez mandinga No palacete de Botafogo Sangue de branca virou água Foram vê estava morta.” (Manuel Bandeira) Qual das afirmações a seguir, referentes ao texto anterior, esta incorreta? a) Ausência de preconceitos contra os chamados elementos “apoéticos”. b) Enumeração caótica, ou seja, acúmulo de palavras sem ligação evidente entre elas. c) Infração das normas de pontuação e eliminação de nexos sintáticos. d) Busca de uma expressão mais coloquial, próxima do modo de falar brasileiro. e) Incorporação do cotidiano, do prosaico, do grosseiro, do vulgar. 4. (FMTM-MG) “Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportado Do lirismo funcionário público com o livro de [ponto expediente protocolo e [manifestações de apreço ao sr. Diretor.” (Manuel Bandeira) O trecho de Manuel Bandeira explicita uma das propostas da escola literária a que pertenceu. Essa proposta é a: a) volta ao lirismo cultivado no arcadismo. b) crítica à indolência dos funcionários públicos. c) crítica ao sistema altamente burocrático das repartições públicas. d) rebeldia em relação às normas estabelecidas para a produção artística. e) proposta de extinção da correspondência oficial, em protesto à burocracia. 5. (UNEB-BA) Atente para o seguinte poema de Manuel Bandeira: O último poema Assim eu quereria o meu último poema Que fosse terno dizendo as mais [simples e intencionais Que fosse ardente como um soluço sem [lágrimas Que tivesse a beleza das flores quase sem [perfume A pureza da chama em se consomem os [diamantes mais límpidos A paixão dos suicidas que se matam sem [explicação. (Libertinagem, 1930) Considere as seguintes afirmações sobre o poema: I. Com o Modernismo, a lírica de Bandeira não amadureceu a forma do verso livre como também atingiu um ponto de depuração dos sentimentos, como o indicam as expressões “menos intencionais”, “soluço sem lágrimas”, “flores quase sem perfume”, entre outras. II. Definitivamente desencantado em seu livro Libertinagem, o poeta já não quer senão a morte, incapaz de ainda fruir algum instante mágico do cotidiano.

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III. Abdicando dos ideais modernistas, Bandeira aqui retorna a uma poesia de forma convencional, na qual outra vez freqüenta o verso de medida clássica, da preferência de um neoparnasiano. A leitura do poema permite afirmar que é verdadeiro apenas o que está em: a) I. b) II. c) III. d) I e II. e) II e III. 6. (UNIFOR-CE) Senhor feudal Se Pedro Segundo Vier aqui Com história Eu boto ele na cadeia O poema acima é representativo das convicções de Oswald de Andrade: a) na poesia pau-brasil. b) nas experiências de Memórias sentimentais de João Miramar. c) na lírica do Cântico dos cânticos para flauta e violão. d) no manifesto em que se tornou o “Prefácio Interessantíssimo”. e) expressas em Serafim Ponte Grande. 7. (ITA-SP) Declarações a Manuel “Teu verso límpido, liberto de todo sentimento falso; teu verso em que Amor, soluçante, se retesa e contempla a morte com a mesma forte lucidez de quem soube enfrentar a vida; teu verso em deslizam sombras que de fantasmas se tornaram nossos amigos sorridentes;” (Carlos Drummond de Andrade) Qual dos aspectos abaixo não é comentado por Drummond em seu poema – homenagem a Manuel Bandeira? a) A preocupação com a morte. b) A presença de familiares. c) O lirismo. d) O conformismo. e) O purismo no sentimento. 8. (UFPB-PB) Considere o seguinte fragmento: “Vou lançar a teoria do poeta sórdido.

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Poeta sórdido: (...) O poema deve ser como a nódoa no birm: Fazer o leitor safisfeito de si dar o desespero.” (Nova poética – Manuel Bandeira) Tal fragmentos se filia ao modernismo literário, entre outros motivos, porque: I. critica o conformismo e a insensibilidade burguesa. II. manifesta preocupação de natureza metalingüística. III. sugere o desprezo ao rigor formal. IV. incorpora o preceito parnasiano do realismo no poesia. Das afirmativas acima, estão corretas: a) I e II. b) I e III. c) I e IV. d) II e III. e) I, III e IV. 9. (CEAP-AP) Assinale a afirmativa que não corresponde à leitura dos poemas de Manuel Bandeira: Evocação do Recife, Pasárgada, Profundamente e Os Sapos. a) Em “Evocação do Recife” e “Profundamente” estão presentes as recordações da infância. b) Em “Pasárgada”, a poesia modernista de Bandeira retoma o tema da evasão tão caro aos poetas românticos. c) O poema “Os Sapos” “satiriza a preocupação parnasiana com as rimas, com a métrica, com o vocabulário precioso”. d) A linguagem poética nesses poemas valoriza as expressões coloquiais do falar brasileiro. e) Nesses poemas predomina o abandono aos efeitos melódicos e rítmicos do verso, numa aproximação com a prosa. 10. (UFPI-PI) A alternativa em que todas as características correspondem ao Modernismo é: a) Concepção lúdica da arte, rigor formal. b) Moralismo, idealização da mulher. c) Verso livre, experimentalismo. d) Jogo antitético, culto da natureza. e) Senso do mistério, liberdade formal. Gabarito 01 - D 02 - E 03 - B 04 - D 05 - A 06 - A 07 - D 08 - A 09 - E 10 - C .