modelo para elaboração do artigo para o connepi 2012 · variabilidade espaço-temporal do campo...

376
- 1 -

Upload: leanh

Post on 14-Dec-2018

324 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

- 1 -

- 2 -

O Seminrio Sustentabilidade, Desenvolvimento Regional e Recursos Naturais,

organizado como parte das aes da II Semana Kirimur, teve como objetivo proporcionar

o debate sobre as relaes entre sustentabilidade,

desenvolvimento regional e recursos naturais, evidenciando limites

e possibilidades do desenvolvimento ambientalmente responsvel.

Comisso Organizadora da II Semana Kirimur

Profa. Dra. Lys Maria Vinhaes Dantas

(Coordenadora)

Prof. Dr. Caio Adan

Prof. Dr. Adriano Oliviera

Profa. Dra. Nubia Moura Ribeiro

Profa. Dra. Vanessa Hatje

Comisso Organizadora do Seminrio

Profa. Dra. Nubia Moura Ribeiro - Coordenadora do evento

Prof. Dr. Armando Tanimoto - Presidente da Comisso Cientfica

Profa. Dra. Ana Maria Menezes - Secretria

Prof. M.Sc. Marcelo Cad - Webdesign

Lais Andrade - Programadora visual

Endereo eletrnico:

www.ifba.edu.br/susder

Os textos apresentados so de inteira responsabilidade de seus autores.

- 3 -

Programao de Seminrio

Dia 29 de outubro de 2012 (Segunda-feira):

08h30 - Credenciamento;

09h - Abertura do evento;

09h30 - Palestra: Desafios do Direito Ambiental na Contemporaneidade. Dr. Jos Claudio

Rocha (Pr-reitor de Pesquisa e Ps-graduao da UNEB);

11h - Palestra: A Participao e Controle Social na Implementao de Polticas Pblicas de

Saneamento. M. Sc. Dora Abreu (Consultora Ambiental- Mestre em Gerenciamento Ambiental);

14h30 - Palestra: Sustentabilidade na Gerao de Biodiesel no Brasil utilizando a

Ferramenta de Avaliao de Ciclo de Vida. Dr. Armando de Azevedo Caldeira Pires

(CDS/UnB);

16h30 - Apresentao oral de trabalhos.

Dia 30 de outubro de 2012 (Tera-feira):

09h - Palestra: Desafios da Sustentabilidade: Aspectos Tecnolgicos e Comportamentais.

Dr. Asher Kiperstok (Rede de Tecnologias Limpas e Minimizao de Resduos -

TECLIM/UFBA);

10h30 - Apresentao oral de trabalhos;

13h30 - Apresentao de psteres;

15h30 - Apresentao oral de trabalhos;

Dia 31 de outubro de 2012 (Quarta-feira):

08h30 - Apresentao de psteres;

10h - Apresentao oral de trabalhos;

11h - Palestra de encerramento: O Conhecimento Acadmico e seu Impacto no

Desenvolvimento e na Sustentabilidade. Dra. Ana Menezes (UNEB).

- 4 -

Sumrio

Anlise dos sistemas de produo vitcola familiar, orgnico e convencional, na serra gacha (RS) .............. 9

As capitanias do Paraguassu e de Itaparica e Tamarandiva e a sua importncia para a ocupao do entorno da

Baa de Todos os Santos .................................................................................................................................. 26

Atual panorama da agricultura da microrregio de Paulo Afonso BA e as perspectivas para os

biocombustveis ............................................................................................................................................... 33

BTS em retalhos: um projeto de aes artsticas em Baiacu, Itaparica, Matarandiba, Coqueiros e Ilha de

Mar, portos da Baa de Todos os Santos ........................................................................................................ 43

Comparao entre as concentraes de ons majoritrios presentes na frao PM2.5 do Material Particulado

Atmosfrico em trs stios do entorno da Baa de Todos os Santos. ............................................................... 58

Contribuio de Georgescu-Roegen ao campo conceitual do desenvolvimento sustentvel .......................... 70

Diversidade Microbiana em Solo de Landfarm e Prospeco de Atividades Surfactante e de Mineralizao

do Dibenzotiofeno ........................................................................................................................................... 82

Gesto do conhecimento e desenvolvimento: um estudo sobre as marisqueiras do Mangue Seco em Valena

(Ba) .................................................................................................................................................................. 96

Impactos da evoluo da poltica ambiental brasileira no controle da emisso de poluentes por fontes

veiculares ....................................................................................................................................................... 105

Influncia da herbivoria e da sedimentao sobre a estrutura da comunidade de algas recifais ................... 116

Macrofauna bentnica introduzida no Brasil: lista de espcies marinhas e dulccolas, distribuio atual e

futuras atividades na BTS. ............................................................................................................................. 128

O Lixo e sua Potencialidade em uma Instituio de Ensino ......................................................................... 136

O mundo do trabalho x qualidade de vida: o exemplo dos trabalhadores informais de fogos no bairro Irm

Dulce em Santo Antnio de Jesus BA. ....................................................................................................... 144

O processo de sistematizao associado construo e difuso de uma tecnologia social em sade ........ 154

Pr-projeto de parcelamento do Assentamento Santa Helena Carinhanha/Bahia ...................................... 162

Produo de frutas desidratadas para o Assentamento Extrativista So Francisco Serra do Ramalho/Bahia

....................................................................................................................................................................... 176

Qualificao do capital humano como forma de impulsionar o desenvolvimento econmico nacional ....... 186

TECNOLOGIAS SOCIAIS PARA A INCLUSO DIGITAL E O DESENVOLVIMENTO DA

ECONOMIA SOLIDRIA (TECSOL) ........................................................................................................ 199

Turismo numa Perspectiva da Sustentabilidade: o uso de reas naturais visando o desenvolvimento do

turismo de base comunitria no Cabula ......................................................................................................... 210

Uma abordagem etnoecolgica de conflitos socioambientais na comunidade pesqueira de Bom Jesus dos

Pobres (Saubara/BA) ..................................................................................................................................... 217

Uso de resduos industriais de eva e fibras de piaava para fabricao e caracterizao de uma argamassa

leve ................................................................................................................................................................ 229

Usos da biodiversidade na bacia hidrogrfica do rio Joanes. Projeto Taboarte de Maracangalha, So

Sebastio do Pass, Bahia. ............................................................................................................................. 239

A competitividade da cadeia produtiva da bovinocultura no Brasil: uma anlise com base no aumento do

consumo de carne bovina. ............................................................................................................................. 247

- 5 -

A construo de um caminho sustentvel em comunidades atravs do fortalecimento do capital social. .... 248

Aes desenvolvidas pela rea de Proteo Ambiental - APA do Litoral Norte do Estado da Bahia como

Auxlio ao Ordenamento Territorial e Gesto da Paisagem. ......................................................................... 250

Anlise da destinao do lucro empresarial em aes socioambientais das empresas brasileiras. ................ 252

As contribuies do ensino de Geografia na formao da Educao Ambiental das crianas. ..................... 253

Aspectos reprodutivos do molusco bivalve comestvel Lucina pectinata (GMELIN, 1791) na Baa de Todos

os Santos (BTS) ............................................................................................................................................. 257

Avaliao do teor de hidrocarbonetos em algas de ocorrncia na Baa de Todos os Santos. ........................ 259

Avaliao preliminar de macroalgas e da fanergama halodule wrightii como biomonitores de elementos

trao na Baa de Todos os Santos, Bahia, Brasil. .......................................................................................... 260

Avaliao preliminar do impacto do vento e mar na disperso de material em suspenso na enseada da

RELAM e Caboto. ......................................................................................................................................... 261

BTS em retalhos: ocultaes e espelhamentos. Arte-vida em Ilha de Mar. ................................................. 263

Caracterizao da assembleia bentnica em plancies de mar e marismas do esturio do Rio Jaguaripe, Baa

de Todos os Santos. ....................................................................................................................................... 265

Caracterizao da ictiofauna obtida por arrastos de praia na Baa de Todos os Santos, Bahia, Brasil. ........ 268

Caracterizao das propriedades mecnicas e de barreira de filmes comestveis de amido de mandioca

incorporados com cacau em p. .................................................................................................................... 270

Caracterizao e anlise da estrutura gentica das populaes de Laeonereis acuta em diferentes sistemas

estuarinos da Baa de Todos os Santos. ......................................................................................................... 272

Competio por espao entre coral invasor Tubastraea tagusensis e corais nativos no recife do Cascos, Baa

de Todos os Santos. ....................................................................................................................................... 275

Concentraes de capsaicina e dihidrocapsaicina em amostras variadas de pimentas utilizadas na culinria

baiana. ............................................................................................................................................................ 277

Desenvolvimento social mediado pela universidade pblica: o Projeto Maria Marisqueira ......................... 279

Determinao de cido flico em farinhas de milho produzidas e comercializadas na Bahia. ..................... 282

Determinao de elementos traos em moluscos bivalves coletados em Madre de Deus, BTS, Bahia. ....... 284

Determinao de espcies metlicas no material particulado (MP 10) coletado na regio de Aratu, Salvador,

Bahia. ............................................................................................................................................................. 286

Determinao de interferentes endcrinos por UFLC-FLU em amostras de gua do entorno da Baa de

Todos os Santos (BTS) ................................................................................................................................ 288

Determinao de metais trao e elementos maiores na Baa de Todos os Santos. ........................................ 290

Determinao de quinonas na Baia de Todos os Santos. ............................................................................... 292

Diagnstico da contaminao por metais pesados em moluscos de municpios de So Francisco do Conde

BA ................................................................................................................................................................. 294

Diagnstico qualitativo dos impactos ambientais no plantio de dend para produo do biodiesel. ............ 296

Dinmica do material particulado em suspenso na BTS ............................................................................. 298

Distribuio de elementos trao em sedimentos e no molusco bivalve Lucina pectinata da Baa de Todos os

Santos, Bahia, Brasil. ..................................................................................................................................... 300

- 6 -

Distribuio do Zoanthus sociatus (Cnidaria, Anthozoa) numa seo da poro sul do plat recifal de Coroa

Vermelha, Bahia, Brasil. ............................................................................................................................... 302

Distribuio espacial do tamanho das conchas nas populaes de Anomalocardia brasiliana da Baa de

Todos os Santos (BTS) .................................................................................................................................. 303

Educao ambiental e formao de professores conservao de recursos naturais no semirido ................. 305

Ensaios ecotoxicolgicos com o anfpoda Tiburonella viscana em sedimentos de dois esturios da baa de

Todos os Santos, Brasil. ................................................................................................................................ 307

Estrutura vegetal dos manguezais ao longo de gradientes estuarinos na Baa de Todos os Santos, BA. ...... 309

Impactos dos efluentes de carciniculturas sobre as assemblias de poliquetas na Baa de Todos os Santos. 311

Levantamento e importncia da conservao das plantas medicinais no Alto Serto Sergipano. ................. 313

Lixo marinho em Salvador Bahia: pellets de plstico nas praias da Calada Boa Viagem. .................... 315

Moluscos bivalves bioindicadores de contaminao por elementos trao no esturio do Rio Suba. .......... 318

Nutrientes inorgnicos dissolvidos e clorofila-a fracionada na Baia de Todos os Santos (BTS) e plataforma

continental de Salvador, BA. ......................................................................................................................... 320

O modelo de distribuio riqueza para sistemas estuarinos da regio temperada (Remane) pode ser aplicado

para esturios tropicais? ................................................................................................................................ 322

Ocorrncia de Efeito da Contaminao Qumica sobre a Estrutura Ecolgica de Comunidades Zoobentnicas

da Baa de Todos os Santos. .......................................................................................................................... 324

Ocorrncia de peixes de importncia econmica na Baa de Todos os Santos, Bahia, Brasil....................... 326

Padres espaciais das assembleias macrobentnicas de regies entremars dos principais esturios da Baa de

Todos os Santos. ............................................................................................................................................ 328

Padres Espaciais de Assembleias Macrobentnicas ao longo dos Sistemas Estuarinos dos Rios So Paulo e

Mataripe, BTS. .............................................................................................................................................. 331

Perda dos antioxidantes do azeite de dend com aquecimento ..................................................................... 335

Perfis verticais de elementos trao e maiores nos sedimentos da Baa de Camamu, Bahia. ......................... 337

Pesquisa de bibliografia e criao de um banco de dados para uma rea protegida (RESEX Baa do Iguape,

Bahia, Brasil). ................................................................................................................................................ 339

Plantas da caatinga com potencial inseticida para o Zabrotes subfasciatus .................................................. 341

Potencial de energia solar do oeste da Bahia ................................................................................................. 344

Produo de Carvo Vegetal do Extrativismo. .............................................................................................. 346

Proposta de plano de bacia do rio Itapicuru .................................................................................................. 347

Proposta de Programa de Educao Sustentvel no IFBA Campus Simes Filho. ....................................... 349

Quadro Ambiental do Rio Jacupe na Regio de Camaari e Situao Socioeconmica da Populao

Ribeirinha. ..................................................................................................................................................... 351

Sistema para determinao de selnio em amostras de cabelo, unha e gua. ................................................ 353

Tecnologias sociais para a incluso digital e o desenvolvimento da economia solidria (Tecsol) ............... 354

Sustentabilidade e Desenvolvimento Regional atravs do aproveitamento dos leos de fritura (OGR) para

obteno de biodiesel. ................................................................................................................................... 356

Sustentabilidade e turismo: ndice de radiao ultravioleta e preveno do cncer de pele em Salvador. ... 358

- 7 -

Alexandre Boleira Lopo 1, 2,*, Maria Helena Constantino Spyrides1, Paulo Srgio Lucio1. .............. 358

Uso de C. variopedatus, tubo e caranguejo simbionte (Polyonyx gibbesi) no monitoramento de

ambientes marinhos. .................................................................................................................................... 360

Validao de uma metodologia de anlise de perfil de cidos graxos e a relao mega 6/mega 3 em

pescados adquiridos em Salvador Bahia. ................................................................................................... 362

Variabilidade espao-temporal do campo de densidade na BTS e seu impacto na circulao gravitacional. 364

Variabilidade Isotpica do C, H e O em guas da Baia de Todos os Santos. ................................................ 366

Variao espao-temporal da comunidade fitoplanctnica na Baa de Todos os Santos. ............................. 368

- 8 -

Apresentaes

sob a forma de

comunicaes orais

- 9 -

ANLISE DOS SISTEMAS DE PRODUO VITCOLA FAMILIAR,

ORGNICO E CONVENCIONAL, NA SERRA GACHA (RS)

Alexandre Troian1, Alessandro Porporatti Arbage

2

1Bacharel em Desenvolvimento Rural e Gesto Agroindustrial, Msc. Em Extenso Rural - UFSM. E-mail: [email protected]

2Prof. Dr. do Departamento de Educao Agrcola e Extenso Rural - UFSM. E-mail: [email protected]

RESUMO

As estratgias de desenvolvimento rural, associadas ao debate sobre agricultura familiar, tm destacado

formas alternativas de produo agrcola para os territrios agrrios do Rio Grande do Sul. Na Regio

Serrana, significativa a produo de uva, com base orgnica, bem como convencional. Embora os sistemas

coexistam, eles apresentam caractersticas peculiares ao modus operandi dos produtores rurais. As decises

so basicamente orientadas por objetivos estratgicos e dependentes das potencialidades e limitaes das

organizaes para trazer benefcios e a minimizao das incertezas. Destarte, a pesquisa visa identificar qual

dos sistemas de produo apresenta o melhor resultado econmico, uma vez que ele pode influenciar na

adoo de um ou outro sistema. Para tanto, a pesquisa possui abordagem quantitativa com objetivos

exploratrios e procedimentos de levantamento de informaes, atravs de entrevista semiestruturada.

Operacionalmente, a classificao dos custos evidenciou um comportamento semelhante na distribuio das

despesas nos dois sistemas produtivos, sendo que as maiores despesas concentram-se nos custos fixos, com

significativa representatividade da mo de obra familiar. Apesar de a composio dos custos apresentar

dinmicas similares, no sistema convencional a renda bruta, total e operacional so maiores que no sistema

orgnico. O mesmo acontece com a margem lquida, ainda que seja negativa, indicando uma possvel

descapitalizao dos sistemas produtivos, no longo prazo. Devido s particularidades da produo

agropecuria, o processo de tomada de deciso sobre o quanto, o que e como produzir condicionado pela

disponibilidade de recursos, pelos objetivos econmico-financeiros e pelas implicaes destas aes no bem-

estar dos membros da famlia. Portanto, identificar a condio mais prxima do ideal que condicione o

agricultor adotar um ou outro sistema produtivo pode ser um dos desafios.

Palavras-chave: Produo vitcola; Produo Orgnica; Produo Convencional; Tomada de deciso.

ANALYSIS OF FAMILY WINE PRODUCTION SYSTEMS, ORGANIC AND CONVENTIONAL,

IN SERRA GACHA (RS)

ABSTRACT

The rural development strategies, associated to the debate on family farms, have emphasized alternative

ways of farming land to the territories of Rio Grande do Sul. In the Regio Serra, it is significant to grape

production, on the organic and conventional basis. While systems coexist, they show characteristics peculiar

to the modus operandi of farmers. The decisions are primarily driven by strategic goals and dependents of

the potential and limitations of organizations to benefit and minimization of uncertainties. Thus, the research

aims to identify which production systems presents the best results, since it can influence the adoption of one

or another system. Therefore, the research has a quantitative approach, with exploratory objectives and

procedures of gathering information through semi-structured interviews. Operationally, the classification of

costs revealed a similar behavior in the distribution of costs in both production systems, with the largest

- 10 -

expenditures are concentrated in fixed costs, with significant representation of family labor. Although the

costs composition present dynamics similar for the conventional gross income, total operating and are larger

than the organic system. The same occurs with the net margin, even if it is negative, indicating a possible

disinvestment of production systems, in the long term. Due to the peculiarities of agricultural production, the

process of making decisions about how, what and how to produce is influenced by the availability of

resources, the economic and financial objectives and the implications of these actions on the well-being of

family members. So, identifying the condition closest to the ideal that conditions the farmer to adopt one or

another production system may be one of the challenges.

Keywords: Wine production; Organic production, Conventional production, Decision making.

1 INTRODUO

Esse artigo fruto da dissertao de mestrado defendida no ms de agosto do ano de 2011 no

Programa de Ps-Graduao em Extenso Rural da Universidade Federal de Santa Maria.

A viticultura, enquanto atividade produtiva do setor primrio tem experimentado forte dinmica no

que tange ao desenvolvimento de novas regies produtivas, reconverso de vinhedos, redefinio do foco da

produo, entre outras mudanas. Sobretudo, vem se demonstrando apta a estabelecer fatores condicionantes

da sustentabilidade econmica e social s pequenas propriedades de agricultura familiar (MELLO,

GARAGORRY e FILHO, 2007).

Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro do Vinho - IBRAVIN (2009), atualmente a

viticultura ocupa rea de aproximadamente 77 mil hectares, com vinhedos constitudos em distintas regies

do Brasil. A produo de uvas da ordem de 1,2 milhes de toneladas/ano. Deste volume, cerca de 45%

destinado ao processamento, para a fabricao de vinhos, sucos e demais derivados e 55% transacionado

como uvas de mesa.

No Rio Grande do Sul, a atividade produtiva se desenvolve com base no emprego de tecnologias

modernas, capital humano qualificado e empreendimentos pioneiros (SOUZA, 2005). Com significativa

relevncia socioeconmica, os cultivos gachos representam 68% da produo de uva e 90% da produo de

vinhos brasileiros.

Eventos provenientes da produo de uvas e seus derivados, como a criao de novas demandas

mercadolgicas e da percepo de oportunidades de gerao de emprego e renda, por meio da agregao de

valor dos produtos, tem motivado um ambiente de complexidade para o setor. Destarte, organizaes

setoriais objetivam a estruturao e estabilidade da atividade produtiva, via aes afirmativas e

minimizadoras das incertezas e variaes bruscas nos indicadores do setor.

Como implicaes das provocaes suscitadas acima, em especial, pela economia globalizada,

percebem-se alteraes no modus operandi da agricultura familiar produtora de uvas. Em presena dessa

conjuno, novos desafios so apresentados ao setor, sendo um deles a consolidao da produo orgnica,

que vem sendo incentivada, pelo lado da demanda, por consumidores cada vez mais interessados em

alimentos saudveis e, pelo lado da oferta, por cooperativas do setor, atravs da assistncia tcnica e polticas

de preos diferenciados.

Tal situao vem sendo identificada com frequncia na cadeia produtiva da uva e tem apontado para

um aumento no nmero de agricultores que transitam entre o sistema de produo orgnico e o sistema de

produo convencional. Todavia, tornam-se necessrios estudos que diagnostiquem a viabilidade econmica

desses distintos sistemas, uma vez que esta uma dimenso prerrogativa do contexto relativo tomada de

deciso dos agricultores entre a adoo de um ou outro sistema produtivo (GASSON, 1973). Portanto, esta

pesquisa se fundamenta na busca de respostas para as seguintes questes: Qual dos sistemas de produo

apresenta os melhores resultados econmicos? No contexto do estudo, os resultados econmicos tm

influncia na adoo do sistema produtivo utilizado?

- 11 -

Alm desta introduo, a investigao est organizada em cinco sesses. A segunda e a terceira

tratam do referencial terico. A quarta engloba os procedimentos metodolgicos, seguido pelos resultados e

discusses, enquanto a sexta sesso trata das consideraes estabelecidas.

2. A GESTO DA UNIDADE DE PRODUO NO CONTEXTO DA AGRICULTURA FAMILIAR

O processo de modernizao da agricultura brasileira trouxe em sua raiz a maximizao dos fatores

produtivos com a inteno de aumentar a produtividade e a rentabilidade, atravs da eficincia produtiva.

Nesse vis, a administrao rural se tornou uma das alternativas para gerar informaes e contribuir na

racionalidade das decises (VIANA, 2008).

A baixa quantidade de informaes e a inexistncia de registros de dados da atividade agrcola

familiar fazem com que os agricultores tomem suas decises com base na experincia, tradio e na

disponibilidade de recursos (OLIVEIRA, 2007). Em outras palavras, nem sempre a melhor escolha, diante

das condies, a mais ideal financeiramente para o negcio. Nesse panorama agrcola, associado aos

cenrios globalizados e cada vez mais competitivos, preciso, antes de tudo, conhecer detalhadamente o

negcio. S assim, os recursos existentes e disponveis na propriedade rural sero melhor aproveitados e

estaro em harmonia com as atividades, estabelecendo metas, definindo objetivos e direcionando a tomada

de decises em busca da rentabilidade desejada.

A eficincia organizacional, de modo geral, depende de muitos elementos, tendo a administrao

papel fundamental. Segundo Maximiano, (2002, p.26).

Administrao o processo de tomar e colocar em prtica decises sobre objetivos e

utilizao de recursos. O processo administrativo abrange quatro tipos principais de

decises, tambm chamados de processos ou funes: planejamento, organizao, execuo

e controle.

A tomada de deciso est ligada a todas as organizaes, na agricultura, porm, se observa o ato

administrativo com maior complexidade. Em evento que se refere ao ambiente, no qual o pequeno produtor

no responde a critrios simples de otimizao, as decises so baseadas, na maioria dos casos, no bom

senso e no conhecimento emprico acumulado. Por, outro lado, se baseia tambm na viso global de seu

meio, que o faz considerar um complexo de consequncias, de acordo com os objetivos que pretende atingir.

Passa ento, a agir e a gerir seu sistema de produo, conferindo-lhe uma lgica, uma racionalidade que lhe

so prprias, condicionadas por um ambiente fsico, social, cultural, institucional, poltico e econmico

(LIMA et al. 2005).

Segundo Lima et al. (2005), para concretizar seus projetos, os produtores tomam uma srie de

decises e implementam vrias aes. As decises so basicamente orientadas por seus objetivos estratgicos

e dependentes das potencialidades e limitaes de sua situao. Na agricultura familiar, geralmente, a

estratgia adotada consiste em diversificar a produo de acordo com a disponibilidade de recursos,

garantindo a subsistncia, reduzindo os riscos e elevando a renda total da famlia, mesmo que isso no

signifique a melhor remunerao do capital investido e a maximizao dos lucros.

A existncia de um problema consiste em elemento principal, da tomada de deciso, que por sua vez

compe o ato administrativo (CONTINI et al., 1984). Na agricultura, problemas como quando, onde e qual a

forma de plantar, orientam o resultado agrcola. Desta forma, as informaes so imprescindveis para

resoluo de tais questionamentos, mas necessrio que, a priori de qualquer atitude, o agricultor tenha

conscincia das conseqncias de suas aes. Deste modo, torna-se relevante um estudo de alguns elementos

do processo decisrio na cadeia produtiva vitcola da regio, para compreender as estratgias diferenciadas

- 12 -

de produo dentro deste grupo de agricultores. Em outras palavras, se a opo o modelo de produo

convencional ou o orgnico.

A deciso do agricultor complexa, nela esto presentes componentes da tradio, de aprendizado,

de infraestrutura, psicolgicos, sociais e econmicos. A fora ou a influncia destes elementos na deciso

depende tambm dos tipos de agricultores. Os que so orientados pela tradio, tero dificuldades em mudar

de culturas, mesmo que o preo do produto no seja to compensador. A infraestrutura de uma propriedade

rural (mquinas, instalaes e equipamentos) tambm tem fora acentuada na deciso (CONTINI et al.

1984).

Diante de um ambiente de complexidade, as organizaes procuram estar estruturadas e

estabilizadas, para que suas decises possam trazer benefcios e minimizao das incertezas, e mudanas.

Esta dinmica estrutural, tambm observada nas organizaes agropecurias, em decorrncia dos desafios

gerados pela economia globalizada.

CLASSIFICAO DOS CUSTOS E REFERENCIAL DE CLCULOS

Entende-se por custo de produo a soma monetria de todos os inputs alocados para a obteno de

uma utilidade ou de um servio de carter oneroso. Os custos so classificados pela literatura de diferentes

formas e suas nomenclaturas apresentam ampla diversidade, assim como so vrios os modelos de

contabilidade e registros. O modelo, o tipo e a magnitude dos registros dependero dos objetivos e da

disponibilidade de organizao (HOFFMANN et al., 1978).

A anlise de um sistema de custos leva em conta duas situaes: uma a avaliao se o tipo de

informao gerada importante para as necessidades de quem demanda. O outro est ligado ao processo

utilizado para aquisio das informaes, ou seja, a metodologia. Portanto, o mtodo de custos fundamental

para determinar o sistema de custeio mais acertado a ser aplicado conforme os dados coletados e as

informaes que se deseja gerar (BORNIA, 2001).

Em uma unidade de produo agrcola, os diversos tipos de gastos e suas diversas naturezas atendem

a uma variedade de objetivos no processo de produo agrcola, ou de transformao desse produto. A

necessidade de informaes para adequar a gesto de custos, recursos, processos, produtos e servios impe

um estudo detalhado dos gastos na UPA e, consequentemente, a classificao conforme a origem do gasto e

objetivo do levantamento.

Segundo Padoveze (2006), no pode ser feita uma gesto de custos tratando todos os gastos de uma

nica forma. O processo de classificao de custos objetiva reunir os gastos de mesma natureza facilitando as

anlises posteriores. Em suma, custos e despesas so classificados quanto origem (despesas fixas ou

variveis), ou quanto ao objeto (despesas diretas e indiretas).

Para a realizao da anlise dos custos de produo, necessria a escolha de uma sequncia lgica a

fim de se chegar a um resultado pr-determinado. O mtodo de clculo adotado pela Companhia Nacional de

Abastecimento (CONAB, 2010) separa os componentes dos custos de acordo com sua natureza contbil e

econmica. Esse mtodo busca contemplar todos os itens de dispndio no decorrer da safra, sendo eles

explcitos ou no.

Em termos econmicos, os componentes do custo so agrupados, de acordo com sua funo no

processo produtivo, nas categorias de custos variveis e custos fixos. Segundo a metodologia de custos de

produo seguido pela CONAB (2010, p.28):

Nos custos variveis so agrupados todos os componentes que participam do processo, na

medida em que a atividade produtiva se desenvolve, ou seja, aqueles que somente ocorrem

ou incidem se houver produo.

- 13 -

Nos custos fixos, enquadram-se os elementos de despesas que so suportados pelo

produtor, independentemente do volume de produo, tais como depreciao, seguros,

manuteno peridica de mquinas e outros.

A descrio dos itens que compem o custo de produo desta pesquisa, considerando a situao

acima, para os clculos de indicadores de resultado da produo de uva referente ao dispndio da safra de

2008/2009, a seguinte:

Custos Variveis - fertilizantes e corretivos, herbicidas e secantes, fungicidas, inseticidas,

formicidas, combustveis e lubrificantes, servios de mquinas e equipamentos, outros insumos e

mo de obra contratada.

Custos Fixos - manuteno e reparo de mquinas, equipamentos e pomares, energia eltrica,

impostos, telefone, gua, depreciao de mquinas, equipamentos e pomar, custo de oportunidade do

pomar e mo de obra familiar;

Os custos variveis so representados pelas despesas reais referentes safra 2008/09. No caso dos

custos fixos so necessrias algumas ponderaes para entendimento da metodologia utilizada.

Entende-se por manuteno de mquinas e equipamentos o conjunto de dispndios necessrios

conservao das mesmas. A CONAB estima que, ao longo de sua vida til, o produtor dispenda o

correspondente a 50% do valor da mquina nova (ou 5% ao ano, considerando-se a vida til de 10 anos).

Neste caso optou-se por trabalhar com os valores de manutenes reais, levantados em campo no perodo em

questo para cada UPA analisada.

Sobre a depreciao consideram-se aqui as despesas dos bens materiais (imveis, mquinas e

equipamentos e pomar) utilizados pelo agricultor. O mtodo utilizado para o clculo das depreciaes foi o

linear, que considera a depreciao como uma funo linear da idade do ativo, variando uniformemente ao

longo da vida, exceto para a depreciao de mquinas e equipamentos, onde foi utilizado o mtodo dos

saldos decrescentes; qual representado pela formula:

T = 1 - ((R / C) ^ (1 / VU))

Onde: T= Taxa; R= Recuperao; C= Custo; VU= Vida til.

Atravs desse mtodo o valor da depreciao diferente para cada ano de vida do bem

(COSENTINO, 2004). Enquadram-se nesse mtodo os bens que a depreciao no incio da vida til maior

e as despesas com manutenes so menores. Foram utilizados 20 anos para a vida til e valor residual de

20% do capital investido do bem, porque o desgaste fsico baixo e o programa de manuteno verificado

constante. J para a depreciao do pomar foi utilizada a depreciao linear: vida til de 40 anos e valor

residual de 10% do gasto para implantao do pomar embasado as situao colocada pelos prprios

produtores.

Para os clculos referentes ao custo de oportunidade ou remunerao da terra, a metodologia

empregada foi embasada na identificao, durante o processo de investigao in loco, de casos reais em que

pomares eram arrendados. Para os demais pomares utilizou-se de 20% da renda bruta. Para as demais reas e

construes e instalaes no foram considerados os custos de oportunidade, mesmo que a CONAB utilize a

remunerao esperada sobre o capital fixo o equivalente aplicao da taxa mdia real de 6% ao ano

(remunerao paga s aplicaes em caderneta de poupana) sobre o valor do capital fixo.

- 14 -

Nesta pesquisa, optou-se por no utilizar essa remunerao por dois motivos: o primeiro, pelo fato

que na agricultura familiar o carter da produo repercute no s na maneira como organizado o processo

de trabalho, mas tambm nos processos de transferncia hereditria e sucesso profissional (ABRAMOVAY,

2001). E tambm, porque a opo por no considerar o custo de oportunidade de capitais na agricultura

familiar pode ser justificada pela averso ao risco que essa categoria carrega consigo (MENDRAS, 1976).

Diferente de outros ramos e atividades, o agricultor familiar no um exmio investidor, onde o interesse

econmico e pessoal realizado ao mesmo tempo.

De acordo com a metodologia de clculo, so considerados dois tipos de mo-de-obra: o trabalho

familiar e o contratado. A despesa com mo de obra familiar foi considerada custo fixo, pois independente

do volume de produo para o ano, ela se manter constante, contrabalanceando as variaes na contratao

de mo de obra no familiar. Sabe-se que para a realizao de determinadas prticas em culturas anuais, o

trabalhador mais bem remunerado, seja pelos cuidados requeridos na sua execuo, seja pela oportunidade

da realizao das mesmas, onde o desempenho pode implicar em queda de produtividade e prejudicar a

qualidade do produto colhido. Neste particular, feita uma diferenciao. O preo do dia de servio de

R$40,00 para atividades que no exige qualificao apurada. J para atividades como poda e operao de

maquinrios o valor passa para R$50,00. Esse custo foi considerado tanto para o trabalho contratado quanto

para o familiar e no clculo no foram considerados a rubrica dos encargos sociais.

3.1 Indicadores econmicos agrcolas

Aps compilao dos custos de produo e receita, do perodo em questo, os dados sero

desmembrados em indicadores econmicos para a anlise de rentabilidade da produo de vitcola.

Atravs da mdia aritmtica simples foram comparados os sistemas de produo de uva

convencional e orgnica, Os indicadores econmicos utilizados para comparao foram:

Custo Operacional (CO), Custo total (CT), Renda Bruta Total (RBT), Margem Bruta (MB), Renda

Operacional Agrcola (ROA) e Margem Lquida (ML).

O Custo Operacional resultante da soma de todos os itens do custo varivel despesas

desembolsadas diretas no perodo (CONAB, 2010). Alm disso, adicionam-se ao custo operacional as

despesas com manuteno e reparo de mquinas, equipamentos e pomares, energia eltrica, impostos,

telefone e gua. A opo justificada por considerar que os custos supracitados fazem partes das despesas

correntes e esto intimamente ligadas aos gastos do perodo.

O Custo Total igual a Custo Operacional mais o custo de oportunidade do pomar, ou seja, a

remunerao atribuda e considerada aos fatores de produo. Ainda foi atribudo ao Custo Total o valor da

mo de obra familiar, pois a mesma foi considerada como um custo fixo. Resumindo o Custo Total a soma

dos Custos Fixos e Variveis.

A Renda Bruta Total (RBT) oriunda da multiplicao do produto vendido pelo preo recebido.

A Margem Bruta Total (MBT) obtida atravs da diferena entre a RBT e o Custo Operacional. O

resultado demonstrar se a propriedade em anlise est cobrindo os gastos correntes com a produo, sem

levar em conta parte dos custos fixos e de oportunidade (VIANA, 2008). Para o MBT na presente pesquisa

preferiu-se considerar no calculo a MBT menos os custos variveis e parte dos custos fixos, a saber:

manuteno e reparo de mquinas, equipamentos e pomares, energia eltrica, impostos, telefone e gua. Esse

mtodo foi utilizado com o mesmo argumento do utilizado no Custo Operacional, ou seja, por considerar que

os custos supracitados fazem partes das despesas correntes e esto intimamente ligadas aos gastos do

perodo. A MBT representa a capacidade de a empresa rural remunerar os custos desembolsados, no ano

agrcola, com a produo e manter sustentabilidade de curto prazo.

O resultado da subtrao da RBT pelo Custo Operacional (CO) e pela depreciao e mo de obra

familiar d origem Renda Operacional Agrcola (ROA). O valor da ROA indicar a lucratividade sem o

clculo de retorno de investimentos dos capitais. Representa uma medida de lucratividade para unidades de

produo cujos proprietrios no estejam preocupados em buscar a melhor alternativa de aplicao de seus

capitais e manter-se na atividade (LAMPERT, 2003).

- 15 -

Por ltimo, a Margem Lquida (ML), ou lucro, o que indica a se a unidade de produo agrcola est

remunerando todos os custos subentendidos a produo. obtida atravs da RBT menos o Custo Total. A

Tabela 02 apresenta resumidamente os indicadores.

Tabela 02 - Especificao das equaes de custos empregados na pesquisa

Custo Operacional (CO) Custo Varivel (CV) + manuteno e reparo de mquinas,

equipamentos e pomares, energia eltrica, impostos, telefone e gua.

Custo Total (CT) Custo Varivel (CV) + Custo Fixo (CF)

Renda Bruta Total (RBT) Preo de Venda (P) X Quantidade Vendida (Q)

Margem Bruta (MBT) Renda Bruta Total (RBT) - Custo Operacional (CO)

Renda Operacional Agrcola

(ROA)

Renda Bruta Total (RBT) - [Custo Operacional (CO) +

Depreciao (D) + Mo de obra Familiar (MF)

Margem Lquida (ML) Renda Bruta Total (RBT) - Custo Total (CT)

A Figura 01 exibe a amostra e composio das medidas de desempenho, ressaltando quais custos so

necessrios, em diferena receita total, para se obter cada indicador econmico.

Figura 01 Medidas de desempenho no gerenciamento agrcola

Fonte: Adaptado de Viana (2008).

Aps serem calculadas as medidas de desempenho, busca-se caracterizar as situaes encontradas

para cada sistema nas situaes pontuadas por Lampert (2003), onde:

1) ML > 0 e MB > 0: a RBT da explorao maior que o custo total, ou seja, a atividade obtm lucro, pois est remunerando o capital e esta situao pode caracterizar atrao de investimento na atividade;

2) ML = 0 e MB > 0: a RBT da atividade e o custo total so iguais. Essa situao demonstra que a atividade encontra-se estabilizada;

3) ML < 0 e MB > 0: a RBT menor que o custo total da atividade do perodo. Nessa situao so garantidos custos variveis e parte dos custos fixos. Dessa forma evidencia-se descapitalizao em longo

- 16 -

prazo, pois medida que se esgotam a vida til dos ativos fixos, o agricultor no consegue repor todo o

capital investido.

4) ML < 0 e MB = 0: a RBT remunera apenas os custos variveis. Esse caso parecido com a situao trs, entretanto a descapitalizao mais rpida, visto que no haver condies de repor o capital fixo

consumido. Est no limite entre o prejuzo econmico e o prejuzo financeiro.

5) ML < 0 e MB < 0: a RBT no cobre todos os custos variveis, nessa situao evidencia-se o prejuzo financeiro. A descapitalizao se dar no curto prazo. A atividade s ser mantida mediante subsdio externo.

A atividade poder ser abandonada caso a essa situao econmica se repita por perodos consecutivos.

4. PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

Este tipo de investigao est em sintonia com o mtodo indutivo, o qual parte do particular para o

geral. Pretende-se analisar indicadores a partir da observao do campo emprico, derivando da novos

conceitos e novas hipteses que sero submetidas comprovao pelo modelo estabelecido (GERHARDT et

al. 2009).

O tipo de pesquisa adotado, quanto abordagem, classificado como quantitativo/qualitativo. Tanto

a pesquisa quantitativa quanto a qualitativa apresentam diferenas com pontos fracos e fortes. Contudo, com

a soma dos mtodos, os elementos fortes de um complementam as fraquezas do outro e possibilita ampliar as

concluses a respeito do objeto de estudo. Quanto aos objetivos, a pesquisa considerada descritiva, e ela

seguiu a modalidade de levantamento, quanto aos procedimentos. A coleta dos dados foi realizada atravs de

questionrios e entrevistas.

4.1 Pblico alvo, coleta de dados e levantamento de informaes

Foi feito o levantamento patrimonial e de capital investido na atividade vitcola, a fim de comparar e

analisar os custos de produo de uvas em parreirais conduzidos atravs de ambos os sistemas convencionais

e orgnicos. Sua execuo teve incio em outubro de 2008 e se prolongou at agosto de 2009.

O grupo de agricultores foi determinado com auxlio de lideranas locais. Em especfico, com a

colaborao da (Federao das Cooperativas Vincolas do Estado do Rio Grande do Sul, cooperativas locais,

Sindicatos dos Trabalhadores Rurais e o Centro Ecolgico de Ip. A escolha do pblico alvo se fez,

basicamente, pelos seguintes critrios:

a. Ser agricultor familiar produtor de uva; b. Ser cooperativado ou associado ao sidicado dos trabalhadores rurais; c. Ter interesse em participar da pesquisa. Foram entrevistadas 36 famlias com as caractersticas acima, distribuidas no seguintes municpios:

Antnio Prado, Caxias do Sul, Farroupilha, Flores da Cunha, Ip, Nova Pdua e So Marcos. Deste total, 19

familias produzem com princpios orgnicos e 17 de maneira convencional. So cinco as Unidades de

Produo que fazem uso das duas tipologias. Sumariamente, das 36 Unidades Familiares que foram

investigadas, formaram-se 41 sistemas de produo, sendo 24 orgnicos e 17 convencionais. Vale a ressalva

que para o Teste t-independente foram utilizados 15 sistemas de produo convencional e 17 sistemas de

produo orgnica, totalizando 32 sistemas. A excluso deve-se ao critrio de seleo de outlier do programa

Statistical Package for the Social Sciences (SPSS1) .

Para facilitar a apresentao dos dados ser utilizado o rtulo de Sistema A para sistema de

produo convencional e Sistema B para o orgnico.

Cerca de 80% da produo de uvas na Serra Gacha de origem americana (V. labrusca, V.

bourquina) e hbridas, sendo a Isabel o cultivar de maior expresso. Por sua expressividade apenas essa

categoria foi avaliada, separando-a por sistema: orgnico ou convencional. Na amostra, podem ainda ser

1 Programa de desenvolvido por Franz Faul, Universitt Kiel, Germany.

- 17 -

caracterizadas outras duas tipologias de produo, a de uvas finas vinferas - representadas principalmente

pelas variedades Cabernet Sauvignon e Merlot -, e a produo de uvas finas de mesas, especialmente a

variedade Rainha Itlia. Estas duas ltimas tipologias no entraram na anlise.

Para o levantamento dos dados e informaes foram necessrias duas visitas tcnicas por famlia,

sendo que a durao mdia de cada visita foi de duas horas e trinta minutos. Na ocasio, foram realizadas

entrevistas individuais aprofundadas referentes safra de 2008/09.

Primeira visita. Foi realizado um diagnstico da atividade vitcola na propriedade, contemplado por

um levantamento patrimonial relacionado atividade, como: valorao da rea, capital investido

(infraestrutura, mquinas e equipamentos), entre outros. Tambm foi levantada a situao financeira (ativos e

passivos) do negcio, alm da realizao de um exame dos recursos humanos existentes e, destes, quais esto

disponveis na lgica da Unidade de Produo, tais como: a mo de obra contratada e a do grupo familiar.

Segunda visita. Nesta ocasio foi realizada a continuao dos trabalhos iniciados na primeira visita

com uma avaliao e refinamento dos dados relativos aos custos de produo. Foram examinadas as questes

pertinentes que puderam contribuir para o clculo do custo. Entre os fatores de produo trabalhados (capital,

terra e trabalho) esto:

Ativos, que representam o patrimnio investido na atividade vitcola, como: mquinas e equipamentos, construes e instalaes.

Uso da terra, representado pelas reas de parreiral, por sistema de conduo e variedade cultivada. Trabalho, representado pela mo de obra familiar ou de terceiros.

Assim, operou-se um acompanhamento detalhado na obteno do custo de produo, diferenciando

uvas produzidas via sistema orgnico, ou convencional, seguindo a metodologia de detalhamento de receitas

e despesas.

Oportunamente, para validao dos dados e informaes significativas na obteno do custo de

produo das uvas nos sistemas orgnico e convencional, foi traado um comparativo entre os dois, a partir

de uma tica que contemple a viabilidade econmica.

Destaca-se que no se buscaram apenas informaes financeiras da propriedade, porm tambm foi

um momento de visualizao da Unidade de Produo Agrcola (UPA), de forma holstica e integrada, de

maneira que os recursos existentes e disponveis na propriedade rural fossem relevantes para a anlise do

resultado.

Em conversa com os produtores, abordou-se entre outras questes, a atual situao interna do setor e

seus elementos do contexto econmico, social, ambiental e, principalmente, os familiares e culturais, que

condicionam as perspectivas quanto ao futuro da atividade na Serra Gacha, mais especificamente, no que se

refere reproduo socioeconmica do viticultor, isto , sua sucesso na atividade. Ressalta-se que tal

situao compartilhada pelos diferentes setores da indstria dependentes da produo primria, onde se

problematizam as caractersticas de propriedades de agricultura familiar, na perspectiva do envelhecimento

do produtor e do xodo do jovem das atividades rurais.

4.2 Ferramentas analticas A ferramenta utilizada para avaliar a distribuio dos dados foi o Kolmogorov-Smirnov (K-S). Essa

uma ferramenta que diz se a distribuio como um todo se desvia da normal. Se o teste no significante

(p>0,05) isto diz que a distribuio da amostra no significativamente diferente da distribuio normal, ou

seja, a distribuio amostral provavelmente normal. Resumindo, de acordo com Field (2009)

Para anlise dos dados, alguns testes estatsticos foram empregados com intuito inferencial, de

comparao de mdias. Para esses (Custo Fixo; Custo Varivel; Custo Operacional; Custo Total; Renda

Bruta Total; Margem Bruta Total; Renda Operacional Agrcola; e Margem Lquida) apresentam-se as

seguintes hipteses:

H0 No h diferena entre as variveis em questo, entre o sistema convencional e o orgnico;

- 18 -

H1 H diferena entre as variveis em questo entre o sistema convencional e o orgnico;

5. RESULTADOS E DISCUSSES

Uma das estratgias de desenvolvimento rural e fortalecimento da agricultura familiar a prtica de

modelos produtivos mais sustentveis, principalmente nas dimenses ambiental, social e econmica. A busca

por formas alternativas de produo tem gerado algumas consideraes, inclusive na cadeia produtiva da

uva. Existem grupos adeptos s idias de ruptura total com os modelos convencionais, independente dos

impactos socioeconmicos que esta ao poder gerar. Por outro lado, h os que defendem o argumento de

que a agricultura orgnica, em sua essncia, no difere dos modelos de pacotes oferecidos pela agricultura

convencional. Tambm so identificadas opinies intercessoras que avaliam o processo de produo

orgnica e convencional como simultneos.

Os entrevistados demonstraram capacidade de discernir sobre a atual situao interna do setor e dos

elementos do contexto socioeconmico, ambiental e, principalmente, familiar e cultural, que condicionam as

perspectivas quanto ao futuro da atividade. Ainda, os dados amostrais demonstram nveis de escolaridade

superiores mdia nacional e estadual para residentes no meio rural. Do total de entrevistados, 26% cursam

ou j cursaram o Ensino Mdio (antigo Segundo Grau) e quase 10% cursam ou j completaram uma

graduao. Alm do mais, cerca de 90% participam de atividades sociais frequentemente (canto, dana,

esportes coletivos, etc.).

A agricultura da regio caracteriza-se por ser praticada em pequenas unidades de produo, de

regime econmico familiar, geralmente proprietrios do imvel. Na maioria dos casos, foram identificadas

pequenas lavouras destinadas subsistncia da famlia. Os agricultores tm, em geral, na viticultura a

atividade principal e, muitas vezes, a nica destinada a gerar renda, atravs da venda do produto indstria

processadora, principalmente no Sistema A. No Sistema B, nem sempre a produo de uvas a atividade

principal da unidade de produo, s vezes dividindo espao com outras atividades, por exemplo, a produo

de tomates, pssegos, nectarinas, entre outras frutas e verduras. Este fato pode justificar a diferena entre o

tamanho das reas com uva dos dois sistemas, onde no Sistema B a rea mdia dos pomares de 1,29 ha, j

no outro a mdia de 6,10 ha.

Quando multiplicadas a rea produtiva mdia das UPAs pela renda operacional agrcola mdia (R$

2.642,85/ha no Sistema A e 1.224,71/ha no Sistema B) evidencia-se que os referidos resultados so

aproximadamente dez vezes mais elevados no sistema de produo A (R$ 16.121,39 contra R$ 1.579,88 no

Sistema B). Eis aqui mais um indicativo das diferentes estratgias produtivas.

Os dados revelam, conforme sntese do Quadro 01, que a produo comercializada em cooperativas

de 36% no sistema de produo A e de 63,7% no sistema de produo B. Neste contexto, destaca-se que

agricultores do Sistema B inserem-se nos distintos mercados a partir de maior participao relativa em

organizaes cooperativadas, sendo que as principais atuaes envolvem a colocao de produtos na

merenda escolar, oferta de produtos em feiras e venda direta ao consumidor final.

Ainda no Sistema B, a grande maioria da uva transformada em sucos, vinhos e vinagre orgnico,

respectivamente. O sistema de processamento da matria-prima descentralizado em algumas unidades de

processamento, distribudas na zona rural, onde grupos com aproximadamente cinco agricultores usam as

instalaes para o processamento da uva. A venda coletiva e atingem mercados que vai desde o Rio Grande

do Sul at o Estado de So Paulo, e o lucro partilhado proporcionalmente entre o grupo produtor. Esse

retorno econmico, embora no mensurado na investigao, aparentemente maior no Sistema B,

diminuindo a diferena dos resultados proporcionados pela produo de uvas.

J no Sistema A, o produtor perde o vnculo com seu produto no momento da comercializao com

cooperativas e cantinas particulares. Neste contexto, a produo diretamente transferida entre propriedade

rural e agroindstrias, sendo de responsabilidade do produtor a logstica do produto. Entretanto, existem

casos em que o agricultor processa a uva, transformando-a em vinhos e sucos. Logo, a venda direta se

configura, alm da distribuio em mini-varejos e lojas especializadas.

A cadeia de produo de uva na Serra Gacha est composta por todos os elos que contribuem

diretamente para a obteno do produto final. Os elos essenciais da cadeia so os viveiros e os importadores

- 19 -

de muda de videira, devido ao alto investimento em pesquisa gentica. As vincolas (inclui aqui as

cooperativas e cantinas) tm contribudo na organizao e no funcionamento da cadeia. Para frente da cadeia,

ela atua no sentido de fomentar a aumento de consumo e a abertura de novos mercados. Para traz da cadeia,

regula a produo atravs da transmisso tecnolgica para as unidades de produo, direciona o tipo de

produto que atende s necessidades de mercado (entram aqui as variedades de uva, no modo de produo

orgnico ou no) e na determinao do preo.

Os custos fixos so mais elevados que os custos variveis em ambos os sistemas. A proporo das

despesas fixas de 2,09 vezes superiores aos custos variveis no Sistema A, e no Sistema B a diferena

ainda maior, 2,65 vezes.

Pode ser observado no quadro abaixo que no geral a mdia das despesas por hectare do sistema de

produo A so mais elevadas, porm quando se comparam as mesmas despesas por quilograma de uva a

situao se inverte, isto , a relao despesa/produo maior no sistema de produo B, exceto para a

utilizao de fungicidas. Esse elemento indica que no Sistema A os gastos so mais elevados, entretanto a

produtividade tambm maior.

Sistema convencional Sistema Orgnico

Atividade principal viticultura pluriatividade

Destino da produo vinhos sucos

Idade do responsvel pela Unidade de Produo

Agrcola (mdia) 39,76 44,58

Unidade de Trabalho Homem/Unidade de

Produo Agrcola (mdia) 2,87 2,13

rea total (mdia) 36,21 19,61

rea com uvas (mdia) 6,10 1,29

Nmero de plantas por hectare (mdia) 2.236,16 1.589,52

Produo por hectare (mdia) 13.349,87 4.564,29

Produo por planta (mdia) 9,24 3,06

Preo recebido pelo quilograma de uva (mdia) 0,46 0,79

Comercializao em cooperativa (mdia) 36,00 63,71

Custos Variveis Mdia/h

mdia/100 kg

de uva Mdia/h

mdia/100

kg de uva

Mo de obra contratada 762,84 5,71 214,26 4,69

Fungicidas 655,05 4,91 517,32 11,33

Fertilizantes e Corretivos 490,87 3,68 333,98 7,32

Combustvel e Lubrificante 268,01 2,01 183,81 4,03

Outros Insumos 107,77 0,81 74,15 1,62

- 20 -

Herbicidas e Secantes 86,59 0,65 17,65 0,39

Servios de Mquinas/Equipamentos 44,90 0,34 88,80 1,95

Inseticidas e Formicidas 28,26 0,21 14,68 0,32

Custos Fixos

Mo de obra familiar 2.230,11 16,71 1.489,03 32,62

Depreciaes 1.355,02 10,15 697,49 15,28

Custos de Oportunidade da parreira 1.032,75 7,74 1.324,41 29,02

Manutenes e Reparos 460,49 3,45 234,40 5,14

Outras Despesas 26,55 0,20 86,82 1,90

Total dos Custos Variveis 2.444,29 18,31 1.444,65 31,65

Total dos Custos Fixos 5.104,92 38,24 3.832,15 83,96

Custo Operacional 2.931,33 21,96 1.765,85 38,69

Custo Total 7.549,21 56,55 5.276,78 115,61

Renda Bruta Total 7.260,73 54,39 4.735,65 103,75

Margem Bruta Total 4.329,40 32,43 2.969,79 65,07

Renda Operacional Agrcola 2.642,85 19,80 1.224,72 26,83

Margem Lquida -288,48 -2,16 -541,13 -11,86

Quadro 01 - Sntese das principais caractersticas e resultados dos sistemas de produo

orgnico e convencional

A mo de obra familiar representa os maiores custos de produo em ambos os sistemas de

produo, apresentando valor mdio por hectare de R$ 2.230,11 no Sistema A e R$ 1.489,03 no Sistema B.

Os gastos mais elevados da mo de obra familiar no primeiro sistema so decorrentes da maior exigibilidade

de horas de trabalho, provvel em consequncia do maior nmero de plantas por hectare e da maior produo

por hectare.

A depreciao por hectare representa R$ 1.355,02 e R$ 697,49 nos sistemas A e B, respectivamente.

Esse custo fixo, ou seja, independente da produo esses valores sero abatidos para cada hectare com uva.

As regras impostas no modelo de produo orgnica uniformizam os produtos, mas no uniformizam da

mesma forma os mtodos produtivos. Por outro lado, a impresso que os mtodos de produo

convencional so mais uniformizados, pois utilizam os mesmos produtos qumicos, as mesmas receitas e

intervalos de aplicao. Todos os produtores possuem tratores, os mesmos equipamentos (por exemplo,

pulverizadores com altas potncias) frutos do pacote tecnolgico. Diante desse contexto, os valores da

depreciao so considerados 100% superiores ao outro modelo e essa uniformizao parece se justificar. A

representao de custo no foi mensurada diretamente por unidade de produto, por isso no tm uma

identificao clara no oramento do produtor rural.

- 21 -

Nos custos variveis destaca-se a utilizao de mo de obra contratada no sistema de produo A,

sendo 3,5 vezes superior ao outro sistema e representa 31% do custo varivel. Como a produtividade maior

e a disponibilidade de UTH no to superior no Sistema A, consequentemente a contratao de mo de

obra externa superior.

O uso de fungicidas, os de base sinttica, no caso do Sistema A, representa 26,79% do custo varivel

(R$ 655,05/ha). No muito diferente em termos de valores e representatividade, o uso de fungicidas de base

no sinttica (caldas) est presente no Sistema B, representando 35,80% do montante de custo varivel (R$

517,32/ha). O mtodo de produo predominante a latada, dificultando a ventilao e o acesso ao sol nas

frutas, aliado s quantidades de chuvas dos meses de setembro e outubro e o calor da poca proporciona o

desenvolvimento de fungos, principalmente em pomares menos favorecidos pela localizao solar.

Segundo relatos de tcnicos da EMBRAPA Uva e Vinho, os produtores de uva da Serra Gacha

costumam exceder na utilizao de fertilizantes. O uso de fertilizantes de base orgnica representa 23,11%

(R$ 333,98/ha) das despesas variveis no perodo. No Sistema B a representao de 20,08% da mesma

categoria de despesa (R$ 490,87/ha). O Quadro 02, responde a um dos objetivos da pesquisa, referente

comparao da representatividade das despesas em cada sistema de produo.

Despesas

Porcentagem (%) das despesas em

relao ao Custo Total

Custos Variveis

Fertilizantes e Corretivos 6 6

Herbicidas e Secantes 1 0

Fungicidas 9 10

Inseticidas e Formicidas 0 0

Outros Insumos 1 1

Combustvel e Lubrificante 4 4

Servios de Mquinas/Equipamentos 1 2

Mo de obra contratada 10 4

Manutenes e Reparos 6 5

Outras Despesas 0 2

Custos Fixos

Mo de obra familiar 30 28

Custos de Oportunidade da parreira 14 25

Depreciaes 18 13

Quadro 021 Representatividade das despesas em relao ao Custo Total

Os itens que apresentam as maiores diferenas dos gastos, em cada sistema, em relao ao custo total

so a mo de obra familiar, seguida pelo custo de oportunidade do pomar, depreciaes e uso de fungicidas.

- 22 -

O resultado econmico dos sistemas apresentado pelos ndices de Renda Bruta, Margem Bruta

Total, Renda Operacional Agrcola e Margem Lquida (Grfico 01). A Renda Bruta Total oriunda da

multiplicao do produto vendido, pelo preo recebido, sendo que na pesquisa o resultado 35% superior no

Sistema A em relao ao B.

J a Margem Bruta Total (MBT), representa a capacidade de a empresa rural remunerar os custos

diretos com a produo e manter sustentabilidade de curto prazo. Neste ndice, os sistemas apresentam

diferenas de aproximadamente 30%. Na mdia, os valores so 1,45 superiores no Sistema A, conforme se

observa no Grfico a seguir.

Grfico 011 Indicadores de resultado dos sistemas de produo analisados

Legenda: Sistema de produo A = convencional; B = orgnico.

O valor da ROA indica a lucratividade sem o clculo de retorno de investimentos dos capitais, sem

ser a melhor alternativa de aplicao de seus capitais. O mesmo se mostrou positivo em ambos os sistemas,

sendo que o Sistema A 1,42 vezes superior ao B.

Conforme pode ser conferido no Grfico 01, A Margem Lquida (ML), apesar de ser negativa nos

dois sistemas, ela 1,8 vezes maior no Sistema B.

Ambos os sistemas de produo apresentam a seguinte situao: ML0. Segundo Reys

(2009), quando isso ocorre est havendo descapitalizao no longo prazo, pois o produtor no consegue

repor parte dos ativos com a depreciao. So indcios de prejuzo econmico. Destaca-se que o ponto de

equilibrio, ou seja, a quantidade de uva produzida para cobrir toodos os custos de produo de 16.411,33

quilogramas no Sistema A e 6.679,46 quilos de uva no Sistema B.

Para assumir que os grupos possuem diferenas significativas, no que tange ao resultado econmico,

aplicou-se o teste t-independente para as variveis: Custo Fixo; Custo Varivel; Custo Operacional; Custo

Total; Renda Bruta Total; Margem Bruta Total; Renda Operacional Agrcola; e Margem Lquida. A hiptese

H0, ou seja, de que no h diferena nas variveis em questo, entre o sistema convencional e o orgnico, foi

confirmada em custos fixos; custos variveis; custo operacional; custo total; e renda bruta total. Todavia, a

hiptese H1 - h diferena entre as variveis em questo entre o sistema convencional e o orgnico - foi

confirmada para a margem bruta; renda operacional agrcola; e margem lquida.

O teste demonstrou ainda que as variveis que apresentam o resultado da atividade, como a renda

operacional agrcola e a margem lquida, no exprimem diferenas entre os sistemas. Vale relembrar que

esse teste visa identificar apenas as diferenas dos resultados econmicos entre os sistemas. Para concluir se

um sistema difere de outro em termos mais gerais, outras variveis devem ser consideradas, inclusive

algumas subjetivas em relao percepo de cada grupo sobre o que est produzindo.

- 23 -

6. CONSIDERAES FINAIS

Buscando a insero nos mercados e canais de comercializao de produtos agrcolas, a agricultura

familiar vem implementando estratgias direcionadas segmentao de mercados, diferenciao dos

produtos e diversificao produtiva. Devido s particularidades da produo agropecuria, o processo de

tomada de deciso sobre o quanto, o que e como produzir condicionado pela disponibilidade de recursos,

pelos objetivos econmico-financeiros dos empreendedores e pelas implicaes destas aes no bem-estar

dos membros da famlia. As unidades de produo familiares so distintas das empresas capitalistas, pois os

produtores familiares fundem o processo produtivo e a famlia com o objetivo de reproduo associada de

ambos.

No Rio Grande do Sul, grande parte da oferta agrcola advm de produtores familiares, os quais so

responsveis por parcela significativa do abastecimento do mercado alimentar local. Dentre as principais

atividades pode-se citar o feijo, o leite, a fruticultura, cujos sistemas de produo expressam o know-how e

as experincias desenvolvidas durante longos anos de interao entre a terra e o bioma.

Especificamente na regio serrana do estado gacho, destaca-se a produo vitcola, realizada em

estabelecimentos familiares, de origem italiana e que se desenvolve por meio das estreitas relaes existentes

entre os distintos agentes econmicos da cadeia de produo. Neste sentido, o estudo props uma avaliao

econmica para determinar a reproduo dos sistemas de cultivo de uva convencional e orgnico em sete

municpios do Rio Grande do Sul.

Os sistemas de produo orgnica determinado pelo processo certificao e fiscalizao da empresa

Certificadora Ecocert, tem como princpio a no utilizao insumos que tenham como base recursos minerais

no-renovveis ou compostos sintticos. Esse sistema diversificado, a uva divide importncia econmica

com outras atividades agrcolas na unidade de produo. O nmero de estabelecimentos de produo nesse

sistema restrito, apresenta menores ndices de produtividade e considervel grau de risco, condicionado

pelos fatores climticos.

Por outro lado, a produo denominada convencional faz uso de insumos, tem como finalidade

principal atingir ndices elevados de produtividade. Nesse sistema, os agricultores so especialistas e a

principal fonte de renda advm da produo de uvas. Ressalta-se que a maioria dos estabelecimentos

produtores de uvas na serra gacha possui essas caractersticas.

Todavia, considerando a alocao dos recursos produtivos e sua respectiva classificao frente aos

centros de custos, evidencia-se um comportamento semelhante na distribuio das despesas nos dois

sistemas produtivos. As maiores despesas concentram-se nos custos fixos, onde a maior poro

representada pela mo de obra familiar e pela depreciao. Embora os custos variveis sejam menos

representativos no custo de produo, o uso de fungicida, fertilizante e corretivo acentua o custo total.

Apesar da composio dos custos de produo apresentar dinmicas similares, no sistema

convencional a renda bruta, total e operacional so maiores que no sistema orgnico. O mesmo acontece com

a margem lquida, ainda que seja negativa, indicando uma possvel descapitalizao dos sistemas produtivos

no longo prazo.

Destarte, observa-se que ambos os sistemas de produo competem pelo mercado local atravs de

diferentes estratgias de produo e comercializao. Com a finalidade de atenuar os gargalos produtivos, o

acompanhamento tcnico, o emprego de ferramentas de gesto e tecnolgica so mecanismos utilizados por

estes agentes econmicos.

No obstante o esforo analtico em mensurar as diferentes fontes de despesas dos sistemas

produtivos de uva na serra gacha, destaca-se a relevncia da renda no monetria, aqui no contabilizadas.

A produo da uva, suco e vinho voltada para o autoconsumo considerada um elemento estratgico do

desenvolvimento sustentvel da agricultura, porque diminui as despesas da famlia e contribui com a

manuteno da segurana alimentar. Assim, a produo para o consumo familiar pode minimizar a

vulnerabilidade e contribuir para a autonomia da agricultura familiar.

- 24 -

Outra considerao a ser feita que na investigao no foram considerados custos ambientais.

reconhecida a importncia de analisar os aspectos que envolvam o processo de preservao de riscos ou

danos ambientais. Dentre os passivos ambientais pode ser citada a necessidade de correo de impactos

ambientais existentes, como matas ciliares e despesas com a sade do agricultor entre outras.

Assim, estudos posteriores podem aprofundar a anlise de impactos ambientais e mensurar os

valores referentes ao autoconsumo. Tambm necessrio considerar que, na agricultura familiar, a questo

econmica no unanimemente decisiva no nvel de satisfao. Isso provoca certa autonomia da agricultura

familiar perante o capitalismo, nesse sentido, a tomada da deciso entre produzir uvas orgnicas ou uvas de

modo convencional no meramente baseada na rentabilidade da atividade. As estratgias, as decises

adotadas pelos agricultores levam em consideraes outros fatores, como: a estratgia da famlia em garantir

a segurana alimentar, a minimizao de riscos de qualquer natureza, a melhora das condies de trabalho e

produo, e tambm no aumento da renda.

Portanto, identificar a condio mais prxima do ideal para o agricultor adotar um ou outro sistema

produtivo pode ser um dos desafios dos pesquisadores do setor, j que o retorno financeiro, a realizao

pessoal, o bem-estar da famlia, entre outras variveis, condicionam as aes e as decises.

REFERNCIAS

ABRAMOVAY, R. et all. Os Impasses Sociais da Sucesso Hereditria na Agricultura Familiar.

Florianpolis: Epagri; Braslia: Nead, 2001

ARBAGE, A. P. Custos de transao e seu impacto na formao e gesto da cadeia de suprimentos:

Estudo de caso em estruturas de governana hbridas do sistema agroalimentar no Rio Grande do Sul. Tese

(Doutorado em Administrao) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004.

COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO. Metodologia de clculo de custos de produo, 2010.

Disponvel em: .

Acesso em: 27 de set. 2011.

CONTINI, E.; ARAJO, J. D.; GARRIDO, W. E. Instrumental Econmico para a Deciso na Propriedade

Agrcola. In: CONTINI, E.; ARAJO, J. D.; OLIVEIRA, A. J.; GARRIDO, W. E. Planejamento da

Propriedade Agrcola: modelos de deciso. 2 ed. Braslia: EMBRAPA-DDT, 1984.

FIELD, A. descobrindo a estatstica usando o SPSS/ Andei Field; traduo Lor Viali. 2 ed. Porto Alegre:

Artemed, 2009.

GASSON, R. Goals and values of farmers. Journal of Agricultural Economics, v. 24, p. 521-538, 1973

GERHARDT, T. E.; SILVEIRA, D. T. Mtodos de pesquisa. Coordenado pela Universidade Aberta do

Brasil UAB/UFRGS e pelo Curso de Graduao Tecnolgica Planejamento e Gesto para o

Desenvolvimento Rural da SEAD/UFRGS. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009.

HOFFMANN, R. et al. Administrao da empresa agrcola. So Paulo: Pioneira, 1978.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATSTICA - PNAD - Pesquisa Nacional por

Amostra de Domiclios, 2009. Disponvel em: . Acesso em: 02 de mar de

2011.

_____Censo Agropecurio 2006. Disponvel em: http://www.ibge.gov.br/home/>. Acesso em: 25 de jun.

2009.

http://www.ibge.gov.br/home/http://www.ibge.gov.br/home/

- 25 -

INSTITUTO BRASILEIRO DO VINHO. Dados Estatsticos. .

Acesso em: 22 de jun. 2009.

LAMPERT, J.A. Caderno didtico de administrao rural. In: Administrao Rural. Santa Maria:

DEAER/UFSM, 2003.

LIMA, A. P; BASSO, N.; NEUMANN, P, S.; SANTOS, A. C; MLLER, A. G. Administrao da unidade

de produo familiar: modalidades de trabalho com agricultores. 3 ed. Iju: Uniju, 2005.

MAXIMIANO, A. C. A. Teoria Geral da Administrao: da revoluo urbana revoluo industrial. 3 ed.

So Paulo: Atlas, 2002.

MENDRAS, H. Socits paysannes. Paris: A Colin, 1976

MELLO, L. M. R.; GARAGORRY, F.L.; HOMERO CHAIB FILHO, C. H. Evoluo e dinmica da

produo de uva no Brasil no perodo de 1975 a 2003. Embrapa Uva e Vinho, ISSN 1808-4648; 62. Bento

Gonalves, 2007.

MELO, V. L. F. Influncia das caractersticas dos sistemas de gesto no processo sucessrio de

unidades de produo familiares em So Luiz Gonzaga, RS. Dissertao (Mestrado em Agronegcio) -

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003.

PADOVEZE, C. L. Curso bsico gerencial de custos. 2. ed. So Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2006.

REYS, M. Disciplina de docncia orientada - Administrao Rural e Projetos Agropecurios - EAD 1007.

Notas de aula. Curso de Ps-Graduao em Extenso Rural. UFSM. 2009.

SCHNEIDER, S. Agricultura Familiar e Desenvolvimento Rural Endgeno: Elementos Tericos e um

Estudo de Caso. In: FROEHLICH, M. DIESEL, V. Desenvolvimento Rural Tendncias e Debates

Contemporneos. Ed. UNIJUI, Iju, 2006.

SOUZA, F. A.Z. Mudanas promovidas no setor vitivincola do Rio Grande do Sul pela insero de

profissionais especializados nas reas de viticultura e enologia. Dissertao de Mestrado (Mestrado em

Cincias). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005.

VIANA, J. G. A. Governana da cadeia produtiva da ovinocultura no Rio Grande do Sul:

estudo de caso luz dos custos de transao e produo. 2008. Dissertao (Mestrado em Extenso

Rural) Programa de Ps-Graduao em Extenso Rural, Universidade Federal de Santa Maria,

Santa Maria, 2008.

- 26 -

AS CAPITANIAS DO PARAGUASSU E DE ITAPARICA E TAMARANDIVA E

A SUA IMPORTNCIA PARA A OCUPAO DO ENTORNO DA BAA DE

TODOS OS SANTOS

Alexandre Gonalves do Bonfim

1

1 UEFS Universidade Estadual de Feira de Santana. E-mail: [email protected];

Resumo: Este um trabalho inserido na rea de Histria, no campo de estudo da Histria Poltica e

Institucional. A pesquisa tem como objeto de estudo as capitanias do Paraguassu e de Itaparica e

Tamarandiva instaladas no entorno da Baa de Todos os Santos na segunda metade do sculo XVI. O

objetivo geral do trabalho estudar a influncia da instalao dessas duas estruturas administrativas para a

ocupao territorial da regio no perodo. Para tanto, o enquadramento terico-metodolgico estruturou-se a

partir da leitura de obras que tratam das estruturas administrativas utilizadas pelo Imprio portugus do

Antigo Regime. O enquadramento foi necessrio para a consulta de documentos administrativos relativos ao

objeto e perodo em questo. Ao seguir essa metodologia, contribui para a obteno de alguns resultados.

Primeiramente, o objeto em estudo as ditas capitanias revela um fenmeno singular: elas foram elevadas

condio de capitanias, aps terem sido doadas em sesmaria aos seus respectivos donos, que se tornaram

assim capites donatrios daqueles territrios. Esse processo dialoga com o contexto de normatizao

poltico-administrativa da Amrica Portuguesa. Afinal, no mesmo perodo, foi implantado no Brasil o

Governo Geral, tendo como sede a cidade de Salvador, prxima s duas capitanias alvo desse estudo. A

concesso das duas capitanias demonstra que ambos os sistemas administrativos Governo Geral e

Capitanias no foram instituies contrrias e sim colaborativas na administrao portuguesa de sua poro

americana. Por fim, a instituio dessas duas capitanias demonstra como as primeiras aes polticas e

institucionais relacionadas administrao do territrio do Brasil no perodo colonial possuem influncia no

processo de ocupao territorial do entorno da Baa de Todos os Santos.

Palavraschave: Capitania Donatrias. Histria do Brasil. Histria da Bahia.. Paraguassu e Itaparica. Perodo

Colonial.

1 INTRODUO

Este estudo fruto de um projeto de iniciao cientfica denominado SINGULARIDADES DAS

CAPITANIAS DO PARAGUASSU E DE ITAPARICA: elementos para a compreenso do processo de

formao territorial da Bahia (sculos XVI-XVIII).. Este projeto por sua vez est inserido em um plano de

trabalho maior chamado FORMAO TERRITORIAL DA BAHIA: subsdios para a construo de um

Atlas Histrico da Bahia Colonial (sculos XVI-XVIII). A relevncia do objeto de estudo em questo, as

capitanias do Paraguassu e de Itaparica e Tamarandiva surgiu em momento anterior da pesquisa, que tinha

por objeto as estruturas administrativas implantadas no territrio atual do Estado da Bahia durante o perodo

colonial. Percebeu-se, nesse momento, a falta de estudo acerca dessas duas capitanias, que se resumia ao

trabalho de Antonieta Aguiar Nunes, Reminiscncias da capitania de Paraguau: memria histrica de

Jaguaripe (1996). Assim, decidiu-se por pesquisar as duas capitanias, relacionando suas singularidades

posterioridade das duas doaes em relao s capitanias de 1530 e o processo de elevao dos dois

territrios de sesmaria a capitanias, algo que no se tinha visto na Amrica Portuguesa ao processo de

ocupao do territrio das terras do Brasil (GNDAVO, 2006) e da Baa de Todos os Santos, uma das

principais regies daquele territrio poca. As capitanias do Paraguassu e de Itaparica e Tamarandiva

foram concedidas na segunda metade do sculo XVI. A capitania de Itaparica e Tamarandiva foi doada em

1556 para Antnio de Atade, o Conde de Castanheira, enquanto a capitania do Paraguassu foi doada para

Dom lvaro da Costa em 1562 (FREIRE, 1998, p. 16; NUNES, 1996, p 267-286.).

mailto:[email protected]

- 27 -

Esse trabalho tem por objeto de estudo as capitanias hereditrias, instituies utilizadas pela Coroa

portuguesa para a administrao de suas terras americanas. Lembrar o carter poltico-administrativo das

capitanias necessrio para entender que este um trabalho inserido no campo da Histria Poltica. A

grande revoluo de paradigmas historiogrficos ocasionada pelos Annales (CAIRE-JABINET, 2003) teve

como principal alvo os trabalhos chamados de Histria Poltica, que ganharam de forma pejorativa as

alcunhas de tradicionais, factuais e positivistas. Esses trabalhos priorizavam a histria dos grandes nomes

que desempenharam papis dentro do mbito do poder do Estado, esquecendo-se do processo histrico e das

implicaes sociais das aes estatais. Porm, novas abordagens, inspiradas, por exemplo, nas pesquisas de

Michel Foucault (1978), alargaram o objeto de pesquisa da Histria Poltica, no se reduzindo este ao estudo

das estruturas poltico-administrativas, mas de como a ao do poder estatal dialoga e interfere em outras

instncias da sociedade. Valorizando o processo histrico e no os mitos de origem (FOUCAULT, 1978, 15-

37), as abordagens de Foucault permitiram que os historiadores pudessem enxergar novas tramas e conflitos

dentro da anlise das estruturas administrativas territoriais (HESPANHA, 2006, pp. 17-20). Este estudo tem

como principal objeto estruturas polticas e administrativas, porm apresenta como objetivo entender a

importncia destas para a ocupao de um espao importante: o entorno da Baa de Todos os Santos.

Para isto, a investigao no se resumiu ao entendimento das funes das capitanias, mas tambm ao

como, por meio destas, o governo do Portugal Monrquico se relacionou com a nobreza em seus diversos

nveis e com a elite colonial em formao no Brasil (RICUPERO, 2009) e importncia dessas estruturas

para a ocupao territorial da regio em questo. Antonio Carlos Robert de Moraes, por exemplo, ao buscar,

no dilogo entre a Histria e a Geografia, entender a formao territorial brasileira, deixa claro que o

territrio no algo imutvel. Sua conformao est sujeita arbitrariedade humana e aos processos sociais

que se espacializam nele (MORAES, 2000). Essa noo de mutabilidade promovida pelos processos sociais

importante para a pesquisa em tela, pois teve como objeto de estudo os dispositivos polticos utilizados

para a administrao territorial, esfera que tem uma grande importncia na conformao de um territrio,

ainda mais em se tratando de um contexto colonial.

2 METODOLOGIA

Em uma etapa anterior do projeto de iniciao cientfica que permitiu o desenvolvimento desse

trabalho, foram coletados dados relativos s estruturas poltico-administrativas do territrio do atual Estado

da Bahia no perodo colonial. Esses dados foram coletados em documentao histrica, primria e

secundria, tais como as cartas de doao e os forais das capitanias do Paraguassu e de Itaparica e

Tamarandiva. No segundo momento, essas fontes histricas foram utilizadas para definir os textos lidos para

o enquadramento terico e metodolgico da pesquisa. Foram escolhidos trabalhos oriundos da historiografia

do Antigo Regime portugus e que versassem sobre as estruturas polticas e administrativas do Brasil no

perodo colonial. Esses trabalhos foram importantes na medida em que ajudaram na definio de conceitos

essenciais apresentados mais abaixo para o desenvolvimento da consulta s fontes e a posterior discusso

sobre a importncia das capitanias em questo para a ocupao territorial do entorno da Baa de Todos os

Santos.

Tanto o enquadramento terico-metodolgico como a coleta e cotejo de dados seguiram duas

estratgias de anlise: uma anlise em perspectiva macropoltica, no sentido de entender o funcionamento

jurdico e institucional das instncias administrativas portuguesas, e outra perspectiva micropoltica, voltada

para os agentes envolvidos no processo de constituio das capitanias do Paraguassu e de Itaparica.

A anlise macropoltica necessitou de uma compresso mais ampla acerca das estruturas

administrativas utilizadas pelo Portugal Monrquico para o governo de seu Imprio. As capitanias eram uma

dentre as vrias estratgias do reino para o governo de seu imenso imprio. O pluralismo administrativo

(HESPANHA, SANTOS; In: MATTOSO, 1998) tornou-se a tnica do governo imperial, e na Amrica

Portuguesa no foi diferente, tanto que, ao longo do perodo colonial, a estrutura poltico-administrativa

passou por diversas mudanas, desde o estabelecimento do Governo Geral, passando pela instaurao dos

Vice-Reinos e das Capitanias Reais (pertencentes ao rei). Esta noo de pluralidade e mudana foi tambm

essencial para a montagem do arcabouo terico da pesquisa.

- 28 -

A pesquisa tem como objeto a instituio das capitanias, para o que foi necessria a leitura de textos

que versassem sobre tal instituio. Referncia obrigatria para o estudo da matria, , a leitura do livro As

capitanias do Brasil: antecedentes, desenvolvimento e extino de um fenmeno atlntico (2000) do

historiador do direito portugus, Antnio Saldanha, foi essencial para o trabalho. Atravs dessa leitura

compreende-se a capitania como um mecanismo jurdico utilizado pela monarquia portuguesa na qual o rei,

dono das terras, doava a seus vassalos o domnio poltico de uma determinada base territorial dentro do

reino. As cartas de doao e os forais eram os documentos legislativos que constituam as doaes das

capitanias. A carta de doao garantia a transferncia da capitania ao donatrio, alm de estabelecer o limite

da terra doada. Nesse documento, o monarca confirmava o ttulo de Capito e Governador, garantia o direito

de fundar vilas e povoaes ao Capito Donatrio, alm de definir o esquema de sucesso e punio caso o

capito-donatrio cometesse alguma ilegalidade. J o foral fixava as normas para a administrao das

capitanias e garantia o direito do capito-donatrio de doar sesmarias, nomear magistrados, fiscalizar o

comrcio e a navegao e de tomar posse das terras a que tinha direito. Determinava tambm os tributos

rgios sobre os produtos provenientes da capitania. O rei dava a capitania ao donatrio, o que transformava

essa doao em bem particular do agraciado. Porm, o monarca no desistia da soberania sobre as terras

doadas; na verdade, o soberano previa ao donatrio uma srie de obrigaes, como a distribuio das terras

das capitanias em diversas sesmarias, a responsabilidade na defesa do territrio e a montagem de um aparato

jurdico-administrativo que devia obedecer ao corpo legislativo da Coroa. Alm disso, o monarca tinha o

direito de revogar a concesso caso o donatrio no cumprisse suas obrigaes.

Para a instalao dessas estruturas administrativas, o rei contava com diversos agentes, vindos ou

no da nobreza, a quem competia o aproveitamento econmico da terra e/ou o desempenho das funes

administrativas na colnia. A leitura de Hespanha e Xavier (In: MATTOSO, 1998, pp. 351-366) foi de suma

importncia para entender os processos sociais que funcionavam como critrio para a ocupao dos cargos

na malha administrativa da Coroa. Estes eram obtidos atravs da merc real, geralmente concedida aos

nobres. Esses nobres formavam no entorno do monarca, a chamada rede clientelar (HESPANHA,

XAVIER; In: MATTOSO, 1998, pp. 339-349), composta por diversos sditos espera de mercs garantidas

pelo rei, tais como terras, cargos e ttulos nobilirquicos providos pela Coroa. Esta rede, movida por uma

espcie de economia do dom, foi essencial para que o rei mantivesse a nobreza ao seu lado, sustentando

assim a monarquia no poder. Trazendo essa anlise para a Amrica Portuguesa, o historiador brasileiro