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ESTUDO DE CASO - O PROCESSO DE DOCUMENTAÇÃO DE COLEÇÕES PARTICULARES: QUANDO A COLEÇÃO É UM INSTRUMENTO DE TRABALHO BARBOSA, MARIA PAULA PESTANA Mestre em Museologia. Universidade de São Paulo Escritório de Arquitetura Eduardo Carlos Pereira Rua Francisco Carlos Pereira Neto, nº 12 - CEP: 13215-465 - Jundiaí São Paulo. e-mail: [email protected] RESUMO As questões alusivas à gestão de informações em instituições públicas ou privadas, relacionadas aos arquivos de arquitetura, nos levam a considerar fatores multidisciplinares que envolvem aspectos históricos, sociais e econômicos além de concepções artísticas e culturais. Portanto, este trabalho tem como objetivo apresentar o processo de documentação da coleção de exemplares da Revista Acrópole, publicados entre 1938 e 1965, de propriedade do Escritório de Arquitetura Eduardo Carlos Pereira, adquirida do espólio do arquiteto Vasco Antonio Venchiarutti, em 1995 e utilizada como fonte de consulta pela empresa. Por meio da análise dos instrumentos de catalogação, preservação e difusão, a finalidade, neste caso, é resgatar a produção dos anos 1950 e 1960 desse arquiteto, mostrando sua inserção no contexto da modernidade brasileira. Trata-se de tornar visível ao público a influência do ambiente de produção de Oscar Niemayer e seus contemporâneos paulistas e cariocas nos projetos do arquiteto Vasco Venchiarutti, construídos na cidade de Jundiaí, Estado de São Paulo. A Revista Acrópole, periódico mensal lançado em maio de 1938, apresentou seu último exemplar em dezembro de 1979. A publicação é considerada um valioso documento histórico e um importante testemunho de época, principalmente dos anos 50 e 60. Nesse sentido, o trabalho concentra-se na preservação dos exemplares que estão sob a guarda do Escritório, uma vez que a digitalização e disponibilização de seu conteúdo pela web já foi realizada pela FAUUSP. Assim, foi necessário estabelecer critérios para a elaboração de uma metodologia específica visando constituir essas fontes documentais. O procedimento baseou-se na organização de um inventário e ordenação dos periódicos, e na criação de um modelo específico de ficha catalográfica. Simultaneamente, realizou- se um diagnóstico do estado de conservação de cada exemplar, a fim de se estabelecer linhas de ações, prioritárias e emergenciais, nos processos de conservação e preservação. A estrutura dos campos das fichas catalográficas foi elaborada para permitir a criação de metadados que serão incluídos em base informatizada para posterior recuperação das informações. As fichas serão arquivadas em envelopes identificados contendo imagens digitalizadas da capa e do sumário de cada exemplar. Ao final desse processo, será possível efetuar um comparativo da obra do arquiteto e as relações e referenciais de seus trabalhos encontrados no contexto da revista. As estratégias definidas no âmbito da documentação, salvaguarda e recuperação de informações, por meio de práticas adequadas de acondicionamento, catalogação e indexação garantem a preservação física das fontes documentais do patrimônio arquitetônico em ambientes privados. Futuramente, a mesma metodologia será aplicada a outros periódicos da empresa com o objetivo de criar um arquivo para pesquisa. Em uma conjuntura real, o processo de documentação dessa tipologia de acervo em coleções particulares colabora para a preservação da memória, tanto institucional quanto da sociedade. Palavras-chave: Gestão de informação; Vasco Venchiarutti; arquitetura moderna; coleções particulares.

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ESTUDO DE CASO - O PROCESSO DE DOCUMENTAÇÃO DE COLEÇÕES PARTICULARES: QUANDO A COLEÇÃO É UM

INSTRUMENTO DE TRABALHO

BARBOSA, MARIA PAULA PESTANA

Mestre em Museologia. Universidade de São Paulo Escritório de Arquitetura Eduardo Carlos Pereira

Rua Francisco Carlos Pereira Neto, nº 12 - CEP: 13215-465 - Jundiaí – São Paulo. e-mail: [email protected]

RESUMO

As questões alusivas à gestão de informações em instituições públicas ou privadas, relacionadas aos arquivos de arquitetura, nos levam a considerar fatores multidisciplinares que envolvem aspectos históricos, sociais e econômicos além de concepções artísticas e culturais. Portanto, este trabalho tem como objetivo apresentar o processo de documentação da coleção de exemplares da Revista Acrópole, publicados entre 1938 e 1965, de propriedade do Escritório de Arquitetura Eduardo Carlos Pereira, adquirida do espólio do arquiteto Vasco Antonio Venchiarutti, em 1995 e utilizada como fonte de consulta pela empresa. Por meio da análise dos instrumentos de catalogação, preservação e difusão, a finalidade, neste caso, é resgatar a produção dos anos 1950 e 1960 desse arquiteto, mostrando sua inserção no contexto da modernidade brasileira. Trata-se de tornar visível ao público a influência do ambiente de produção de Oscar Niemayer e seus contemporâneos paulistas e cariocas nos projetos do arquiteto Vasco Venchiarutti, construídos na cidade de Jundiaí, Estado de São Paulo. A Revista Acrópole, periódico mensal lançado em maio de 1938, apresentou seu último exemplar em dezembro de 1979. A publicação é considerada um valioso documento histórico e um importante testemunho de época, principalmente dos anos 50 e 60. Nesse sentido, o trabalho concentra-se na preservação dos exemplares que estão sob a guarda do Escritório, uma vez que a digitalização e disponibilização de seu conteúdo pela web já foi realizada pela FAUUSP. Assim, foi necessário estabelecer critérios para a elaboração de uma metodologia específica visando constituir essas fontes documentais. O procedimento baseou-se na organização de um inventário e ordenação dos periódicos, e na criação de um modelo específico de ficha catalográfica. Simultaneamente, realizou-se um diagnóstico do estado de conservação de cada exemplar, a fim de se estabelecer linhas de ações, prioritárias e emergenciais, nos processos de conservação e preservação. A estrutura dos campos das fichas catalográficas foi elaborada para permitir a criação de metadados que serão incluídos em base informatizada para posterior recuperação das informações. As fichas serão arquivadas em envelopes identificados contendo imagens digitalizadas da capa e do sumário de cada exemplar. Ao final desse processo, será possível efetuar um comparativo da obra do arquiteto e as relações e referenciais de seus trabalhos encontrados no contexto da revista. As estratégias definidas no âmbito da documentação, salvaguarda e recuperação de informações, por meio de práticas adequadas de acondicionamento, catalogação e indexação garantem a preservação física das fontes documentais do patrimônio arquitetônico em ambientes privados. Futuramente, a mesma metodologia será aplicada a outros periódicos da empresa com o objetivo de criar um arquivo para pesquisa. Em uma conjuntura real, o processo de documentação dessa tipologia de acervo em coleções particulares colabora para a preservação da memória, tanto institucional quanto da sociedade.

Palavras-chave: Gestão de informação; Vasco Venchiarutti; arquitetura moderna; coleções particulares.

4º Seminário Ibero-Americano Arquitetura e Documentação Belo Horizonte, de 25 a 27 de novembro

Introdução

Este trabalho é baseado em um projeto do Escritório de Arquitetura Eduardo Carlos Pereira

em fase de desenvolvimento, que visa à organização do conjunto que envolve o capital

intelectual da empresa, incluindo, nesse processo, o resgate de nomes da arquitetura que

foram pioneiros em sua época, ressaltando sua sincronicidade com as novas tendências de

cada período.

Deste modo, apresenta-se aqui o processo de documentação da coleção de revistas

Acrópole, periódico especializado em arquitetura. A coleção foi adquirida do espólio do

arquiteto jundiaiense Vasco Antonio Venchiarutti em 1995 e compreende os exemplares de

1938 a 19651.

O trabalho pretende destacar, no conteúdo das edições, o momento que conta a história da

formação patrimonial dos projetos de arquitetura e urbanismo modernos especialmente no

Brasil, que compreende o período entre 1945 e 1960. A partir do SPHAN e dos seus atores -

arquitetos Lúcio Costa, Eduardo Corona, Oscar Niemeyer, os modernistas Mario de

Andrade, Gustavo Capanema - todos participantes desses periódicos, conteúdo este em

que está inserido Vasco Venchiarutti.

Em um contexto específico, podemos enfatizar as particularidades que levam os escritórios

de arquitetura, assim como outras empresas, a produzir diferentes tipos de materiais de

informação. Um deles é aquele produzido e acumulado em função de sua própria atividade.

O outro é aquele que precisam obter a partir de fontes externas e que se agregam ao capital

intelectual da organização.

Para cada modalidade, é importante que se adote um padrão de gestão adequado,

utilizando métodos de classificação de informação, visando à otimização do tempo e a

conscientização de seus valores funcionais ou culturais.

A informação proveniente de fontes externas, ou seja, aquelas que são adquiridas visando

à informação constituem conjuntos denominados não orgânicos e podem, em alguns

aspectos, ser caracterizados como coleções.

1 Os exemplares iniciais da coleção pertenceram ao pai, Giácomo Venchiarutti, construtor e

fachadista italiano radicado em Jundiaí na década de 20.

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Camargo e Goulart analisam esse sistema sob o ponto de vista da complexidade das

empresas:

"a informação se apresenta multiforme, como reflexo inevitável do crescimento e da

complexidade a que chegaram as organizações contemporâneas [...] quanto mais dinâmica

a entidade, mais premente é a demanda por informações qualificadas [...] Nesse sentido, a

qualidade de informações, seja por meio de referenciais próprios (livros, manuais, artigos,

publicações) ou consulta a fontes externas, confirmam a qualidade dos produtos e a

eficiência dos serviços prestados". (Camargo e Goulart, 2015, p.51)

Os periódicos aqui estudados mostram, no ambiente da arquitetura moderna, o mesmo

ambiente conceitual do trabalho de Vasco Venchiarutti, reflexo de um momento importante

da arte, da política e do desenvolvimento econômico de Jundiaí e do Estado de São Paulo.

A identificação, organização e catalogação dessa coleção, por meio da elaboração de uma

ficha específica onde serão inseridos dados físicos e informações que qualificam seu valor

histórico, permitem determinar ações de recuperação, preservação e acondicionamento do

material e a valorização do patrimônio arquitetônico. Desse modo pretende-se ressaltar seu

caráter enquanto instrumento de conhecimento, informação e pesquisa, e posteriormente

também como instrumento de difusão, disponibilizando as informações do material

catalogado ao público, proporcionando a oportunidade de reconhecer em alguns projetos do

arquiteto Vasco Venchiarutti, a influência da arquitetura moderna na Jundiaí das décadas de

50 e 60.

Instituindo o capital intelectual

O caso da coleção das Revistas Acrópole, envolve dois aspectos que devemos considerar:

o primeiro deles é que a coleção já estava estruturada quando foi adquirida pela empresa,

portanto já havia uma intenção pré-determinada de seu antigo proprietário em adquirir os

exemplares, para compor o capital intelectual ligado à sua atividade de arquiteto. O

segundo, é que ela permaneceu com a mesma função dentro da empresa, agora com seu

potencial de informação ampliado, se levarmos em conta as possibilidades de comunicação

e informação conseguidas por meio do procedimento de catalogação.

Não vamos tratar aqui de arquivos correntes (Bellotto, 2006, p.30), nem de arquivos que são

designados a instituições públicas, como museus, bibliotecas e centros de documentação,

mas de arquivos pessoais. Uma vez que não são documentos gerados por uma empresa e

sim reunidos por meio de processos seletivos, "os arquivos pessoais [...] quando reunidos

por pessoas ou famílias acabam por sugerir a adoção de critérios alheios ao sentido ou à

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sua lógica de acumulação" (Camargo e Goulart, 2007, p.36). Do mesmo modo, Burke (apud

Camargo e Goulart, 2007, p. 36) afirma que "o curador de arquivos pessoais tem total

liberdade para organizá-los de forma a atender ás demandas da pesquisa".

Ainda quanto aos usos e representações dos conjuntos de documentos, Heymann observou

que:

"Trata-se não de descurar das relações que conectam atividades desempenhadas e

registros documentais, e sim de atentar para a relação que cada titular mantém com seus

papéis, de levar em consideração os usos que deram aos documentos uma vez guardados,

os atributos que lhe foram conferidos, capazes de explicar configurações, ordem,

'desordens', marcas." (Heymann, 2012, p.63)

Nesse caso especificamente, o conjunto envolve uma configuração de caráter técnico, pois

tem como função dar apoio as atividades-meio e às atividades-fim da empresa e ao mesmo

tempo possui um teor colecionista, pois uma das propostas da empresa, como veremos

adiante, é a valorização da memória e do conhecimento. Isso permite que o tratamento

documental seja organizado por item, compondo assim, uma coleção. Ainda

Conforme Bellotto (2006), o tipo de conjunto existente em um sistema de informação

estrutura-se a partir de coleções e documentos unidos pelo conteúdo, produzidos pela

atividade humana, no sentido de buscar ou selecionar as fontes de informação. A princípio,

possuem caráter científico com o objetivo de informar e podem ser adquiridos ou

pesquisados. O processamento dessas informações é feito por meio de classificação e

catalogação (em fichas ou informatizado).

A preservação patrimonial deve ainda ser norteada por princípios normalizadores e as

instituições que promovem a guarda de documentos, sejam elas de caráter cultural ou

corporativo, têm a responsabilidade por sua preservação.

Arquiteturas revistas

O Escritório de Arquitetura Eduardo Carlos Pereira foi criado em 1974, e desde o início tem

como característica a relação com uma linguagem próxima à arte e cultura, influenciada pela

convivência de seu proprietário, o arquiteto Eduardo Carlos Pereira, com Pietro Maria Bardi2,

2 Além das artes plásticas, outros dois temas caros a Bardi são a arquitetura e o design, e

muito contribui para a consolidação de ambas as áreas no Brasil. A arquitetura moderna

brasileira lhe interessa desde os primeiros anos passados no país. Em 1950, publica na

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colaborando com algumas de suas edições, no MASP de 1980 a 1987. A produção do

escritório, no entanto, prioriza projetos que não visem apenas o lado artístico, mas que

comtemplem principalmente o uso.

O espaço do escritório é composto, além dos elementos técnicos, por um ambiente onde há

a interação de conjuntos de referência, provenientes de coleções do arquiteto, tais como

objetos, ferramentas, livros, revistas, iconografia, pinturas, esculturas, mobiliário, todos de

épocas e significados diversos e instigantes. Alguns itens dessas coleções fizeram parte de

exposições como Design no Brasil, no Sesc Pompéia em São Paulo e Itália Brasil, no

Museu de Arte de São Paulo (MASP). Como consequência, a produção do escritório é

também alimentada e inspirada por esse acervo.

A atenção se volta também para projetos que visam à recuperação do valor patrimonial de

construções de relevância histórica, revertendo muitas vezes seu destino de demolição,

como é o caso do Complexo CICA, apresentado neste Simpósio (Pereira, 2015) e da

restauração da Fazenda Cachoeira em Itatiba (sede, terreiros de café e tulha), hoje tombada

e inserida em uma área de preservação ambiental.

A Revista Acrópole

Lançada em maio de 1938, como periódico mensal, sob a

direção de Roberto A. Corrêa de Brito, passou a ser dirigida

por Max M. Gruenwald de 1953 até sua última edição nº

390/391 de novembro/dezembro de 1971. Embora tenha

sido criada com propósitos comerciais - constatado pela

grande quantidade de anunciantes encontrados nas

edições - a Revista Acrópole adquiriu grande importância

ao longo de mais de três décadas de existência, entre

estudantes e profissionais de arquitetura, principalmente

revistainteressa desde os primeiros anos passados no país. Em 1950, publica na revista

Habitat o artigo Leitura Crítica de Le Corbusier. É também importante seu papel como

divulgador da moderna arquitetura brasileira no exterior, principalmente na Itália, por meio

de textos como I Giardini Tropicali di Burle Marx, editado em Milão em 1954, ou do capítulo

sobre tema redigido para o livro introdução à Arquitetura, de Eduardo Benevolo, em 1972.

Fonte Enciclopédia Itaú Cultural/ www.enciclopedia.itau.org.br . Acesso em novembro de

2015.

Janeiro/Fevereiro-1945 Acervo/coleção

Eduardo Carlos Pereira

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nos anos 50 e 60, compondo hoje "um impressionante e surpreendente testemunho de

época" (Segawa, 2014).

Vale ressaltar que ao longo de sua trajetória, também podemos observar a evolução dos

materiais e equipamentos empregados nas construções desse período em que a revista

esteve ativa. No final da década de 50, além da proposta comercial, podemos notar a

mudança na postura da Revista Acrópole. Até a edição de Outubro do mesmo ano, as capas

mostravam a imagem do templo de Parthenon, na Grécia, como alusão ao nome da revista,

mudando-se apenas suas cores. A partir da edição de Novembro de 1950, no mês em que

se instituía o Dia do Urbanismo, o padrão da imagem da capa foi alterado. A edição, em sua

maior parte dedicada ao primeiro dia do Urbanismo, com divulgações de eventos, ocorridos

na "Semana do Urbanismo". A partir dessa data, as capas tomaram uma configuração

diferenciada, enfatizando projetos, design e ambientes. Isso coincidiu com a mudança do

grupo editorial, fator que pode ter exercido influência nessa transformação e também com a

mudança no pensamento da linguagem da arquitetura.

Em 2014 a FAUUSP concluiu um projeto de digitalização e

disponibilização do conteúdo da Revista Acrópole e

conseguiu por meio de doações, completar as edições, que

foram restauradas e estão acondicionadas atualmente em

sua biblioteca.

A coleção objeto de estudo, que pertence ao Escritório de

Arquitetura Eduardo Carlos Pereira, é composta, como já foi

mencionado por exemplares que datam de 1938 (o primeiro

lançado) até 1965, totalizando cerca de 300 exemplares,

pois alguns eram impressos em edições bimensais. Dessa

série, consta que os primeiros números pertenciam ao

projetista Giácomo Venchiarutti, pai de Vasco Venchiarutti.

A partir do número 174 de outubro de 1952, os exemplares

passaram a ser adquiridos pelo arquiteto Vasco.

Além dos projetos de Vasco Venchiarutti, vários foram

publicados nas edições das revistas, tais como o Prédio da

Caixa Econômica Estadual de Jundiaí em 1943, edifícios municipais (Velório Municipal em

1964), um mural do arquiteto jundiaiense Ariosto Mila, em 1955, escolas (Escola Senai em

1959), e uma residência em 1970.

Outubro-1952 Acervo/coleção Eduardo Carlos Pereira

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Vasco Venchiarutti: modernidade e contemporaneidade

Vasco Antonio Venchiarutti (1920 – 1980) nasceu em

Araraquara, SP. Filho de Giácomo Venchiarutti (construtor e

fachadista de origem italiana radicado em Jundiaí) e de Antonieta

Gáspari Venchiarutti, ingressou na Faculdade de Arquitetura da

Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro, em 1942.

Ainda na faculdade associou-se a quatro colegas que

organizaram um escritório de desenho de arquitetura, auxiliados

pelo arquiteto Sérgio Bernardes. O escritório ocupava uma sala

contígua a de Sérgio. Ali se reuniam artistas e arquitetos e em

pouco tempo,

além de desenhar os projetos de Sérgio Bernardes, passou a desenhar para Oscar

Niemayer, Afonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Roberto Burle Marx e outros arquitetos de

tendência moderna, convivendo em ambiente artístico de vanguarda. Nessa época projetou

o edifício Nicolau Carderelli, primeiro edifício de características modernas de Jundiaí.

Formou-se em 1946, retomando a Jundiaí, quando projetou e construiu 3 sobrados

demolidos em 1982 (um desses sobrados foi sua residência), que vieram quebrar a linha e

as tendências seguidas até então pelos projetistas de residências em Jundiaí, introduzindo

novos conceitos arquitetônicos e construtivos, que tiveram ampla aceitação.

Foi prefeito de Jundiaí por dois mandatos (1948-1951; 1956-1959). Nesse período projetou

e executou diversas obras públicas, que marcam a aparência urbana de Jundiaí até hoje: o

viaduto da Ponte São João, a Avenida Jundiaí, o Parque Municipal Comendador Antônio

Carbonari (que a partir de 1953 passou a abrigar a Festa da Uva) a Praça Municipal de

Esportes Dr. Nicolino de Lucca (Bolão), o edifício Antônio Farina, o edifício e galeria

Bocchino, ambos no centro de Jundiaí e os conjuntos industriais da CICA, além de outros

edifícios, residências e hospitais em Jundiaí e São Paulo (para a Fundação Anita Pastore D'

Ângelo).

Em 1965 presidiu a Comissão do Plano Diretor do Município e a Comissão do Código de

Obras. Em 1966 recebeu o título de "Cidadão Jundiaiense", conferido pela Câmara

Municipal. Em 1967 participou da implantação do Núcleo de Jundiaí, do Instituto de

Arquitetos do Brasil (IAB), sendo eleito presidente da primeira diretoria.

Projetou também nesse período o complexo turístico Lago Azul, em Louveira (Via

Anhanguera). Em 1969 projetou o Centro Esportivo da Vila Rami (rua Cica), e outras obras

para a administração do Prefeito Walmor Barbosa Martins.

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Entre seus últimos projetos podemos citar: a ampliação da Casa de Saúde Dr. Domingos

Anastácio, diversos prédios comerciais e residenciais e ampliações em diversas indústrias.

Em 1983, a Escola Técnica Estadual de Jundiaí passou a ser denominada de Escola

Técnica Estadual Vasco Antonio Venchiarutti, por iniciativa do Professor Engenheiro Ruy

Luiz Chaves, com o endosso dos docentes da Escola Técnica Estadual de Jundiaí, e com

apoio do Deputado Estadual Randal Juliano Garcia, que apresentou o projeto na

Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo3.

Ao longo de sua trajetória, o arquiteto Vasco Venchiarutti foi contemplado com a citação de

alguns de seus projetos na Revista Acrópole. Podemos constatar, no decorrer da análise,

que são projetos com características marcantes e em consonância com a arquitetura

moderna brasileira.

A imagem abaixo mostra o Viaduto São João Batista, publicada na Revista Acrópole em

março de 1962, na seção denominada Dicionário da Arquitetura Brasileira. A foto está

localizada no vocábulo V, verbete VIADUTO e cita o nome do arquiteto Vasco Venchiarutti.

Publicação Revista Acrópole, março de 1962, p.108

Elaborado pelos arquitetos Eduardo Corona e

Carlos Lemos, o dicionário consistia em uma seleção de verbetes publicados nas edições

das revistas, com o objetivo de orientar e normalizar a linguagem técnica usada na

arquitetura. No início do prefácio que abrui a publicação dos verbetes, pode-se notar a

preocupação dos arquitetos com a linguagem normatizada usada pelos profissionais da

área:

"A ideia da elaboração de um dicionário que reunisse de modo mais completo possível os

termos relativos à nossa arquiteturanos surgia desde há muito. Contrapondo-se à amplitude

do campo da atividade do arquiteto, à profundidade que atinge a qrquitetura em todos os

setores da cultura de um povo e ao extraordinário e rápido desenvolvimentodaquela arte

3 Baseado na pesquisa e texto do Professor Arquiteto Luciano Carlos Christ. Fonte Google. Acesso em janeiro

de 2015.

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entre nós, encontramos uma acentuada pobreza de vocabulário técnico e artístico, entre o

povo, arquitetos e críticos de arte. Entre os estudantes, então, o desconhecimento de nomes

justos dos pormenores arquitetônicos é grande, senão total". (Eduardo Corona e Carlos

Lemos, Revista Acrópole, nº 222,1957, p.197-198).

Inaugurado em 1950, o viaduto São João Batista foi construído para servir de ligação entre o

centro da cidade e o Bairro da Ponte São João e até hoje é um importante elemento de

acesso entre os dois setores da cidade de Jundiaí. Nas imagens seguintes, podemos ver o

viaduto no início da construção e a seguir como se apresenta hoje.

Foto/Acervo Centro de Memória de Jundia

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Foto: Reprodução/ Prefeitura de Jundiaí

Foi o primeiro viaduto construído na cidade e fez parte de um amplo conjunto de obras da

primeira gestão do prefeito Vasco Antonio Venchiarutti (1948-1951). Conforme dados da

Secretaria de Meio Ambiente do município de Jundiaí, o viaduto possui 300 metros de

extensão e foi executado em concreto armado, sem vigas, com fundações sobre estacas de

concreto de 15 metros de comprimento.

Outro projeto da autoria de Vasco Venchiarutti executado na cidade de Jundiaí e citado na

Revista Acrópole, é o Ginásio de Esportes Dr. Nicolino de Lucca. Construído sob a forma de

cúpula, foi naugurado em 1953. Possui um vão de 53 metros de diâmetro e integra um

conjunto poliesportivo.

Ginásio de Esportes Dr. Nicolino de Luca - Projeto premiado no Salão Paulista de Belas Artes

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O vão é comparado ao projeto do Palácio das Exposições (Oca), no Parque Ibirapuera-SP,

projetado por Oscar Niemayer, Zenon Lotufo, Eduardo Knesse de Mello e Hélio Uchoa,

umas das edificações idealizadas para as comemorações do IV Centenário de São Paulo.

Na imagem acima, temos parte do texto que descreve o projeto do Palácio das Exposições

no Parque Ibirapuera. No primeiro parágrafo, a referência ao "Ginásio de Jundiaí": "Só por

curiosidade, façamos uma ligeira comparação com os que existem no Brasil: Quitandinha,

42 metros de diâmetro por 15 centímetros de espessura; Ginásio de Jundiaí, 53 por 12;

Palácio das Exposições, 54 por 8".(Revista Acrópole, agosto, 1954, p.495). Uma cúpula

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semelhante foi executada em Bauru: o Ginásio da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil,

projeto do arquiteto Ícaro de Castro Mello.

Entre as obras mais relevantes executadas por Vasco Venchiarutti em Jundiaí, temos a

Avenida Jundiaí, inaugurada em 1953, que foi projetada para complementar o acesso da

Rodovia Anhanguera até o centro da cidade e melhorar o acesso ao bairros do Anhangabaú

e do Retiro.

Na imagem abaixo, além da Avenida (ao centro) podemos ver, à direita, a cúpula do ginásio

e logo abaixo os três pavilhões do Parque Comendador Antonio Carbonari, onde foi

realizada a Festa da Uva de 1953.

Foto/Acervo Centro de Memória de Jundiaí

O Edifício Carderelli, primeiro com características modernistas na cidade, foi construído por

Vasco Venchiarutti, com a participação de Giácomo Venchiarutti e Odil Campo Saes. A obra

foi iniciada em 1948 e inaugurada em 1950. Na imagem abaixo, já em fase final de

construção, podemos destacar a placa informativa da Indústria de Elevadores Atlas. Consta

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que foi o primeiro edifício com elevador na cidade. Inicialmente projetado com finalidade

residencial, hoje o edifício abriga salas comerciais.

Acervo Centro de Memória de Jundiaí

Ao fazer uma análise da obra do arquiteto e prefeito Vasco Venchiarutti, podemos observar

que pouca coisa se perdeu ou se transformou. A arquitetura moderna é atemporal. Ela se

destaca em qualquer ambiente. Como arquiteto, Vasco Venchiarutti planejou a fisionomia da

cidade dos anos 50 e como prefeito teve a possibilidade de executá-las. Até os dias de hoje,

suas obras são funcionais, evoluem com a cidade, valorizam sua aparência. O viaduto

continua ali. Não sendo mais a única via de acesso que corta a linha de trem, pois outra

passagem foi construída – ao lado – sem interferir em sua presença.

A metodologia aplicada a este trabalho de catalogação dos exemplares da Revista Acrópole,

consistiu, em uma primeira fase, na realização de um diagnóstico baseado na elaboração de

um inventário que considerou a ordenação cronológica dos mesmos, onde foi possível

efetuar a quantificação, o estado de conservação e identificar possíveis falhas na sequência

de numeração. Simultaneamente, analisou-se cada exemplar em relação ao seu estado

físico com o objetivo de determinar procedimentos de reparos ou mesmo de restauro em

algumas capas e páginas. Na segunda fase, foi realizada a análise dos sumários dos

exemplares, que servirá de escopo para pesquisas posteriores. Com base nesses dados, foi

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elaborada uma Ficha Catalográfica onde estão campos relativos aos dados físicos e

históricos das publicações, imagem da capa do periódico, localização, e ainda

procedimentos de pesquisa efetuados em cada revista. Como o trabalho ainda está em

andamento, pretende-se com a análise dos exemplares, recolher a maior quantidade de

dados possíveis, para a organização de uma base informatizada. Será elaborado, ainda, um

relatório contendo a quantidade exata dos exemplares, as ações necessárias de

conservação e acondicionamento.

A etapa do processamento de catalogação tem como finalidade desenvolver a pesquisa

sobre o acervo, baseada em uma abordagem individual de cada item ou objeto, organizando

informações em dossiês, obedecendo a processos padronizados. (Barbosa, 2015, p.100)

A realização da pesquisa sobre o arquiteto Vasco Venchiarutti foi desenvolvida

paralelamente, uma vez que a coleção estava inserida em seu processo de trabalho e

relacionada à sua profissão. Foi feita uma pesquisa inicial de sua biografia e identificados os

projetos de maior relevância. Em seguida estes foram confrontados com as publicações e

analisados conforme as diretrizes do período proposto – entre 1945 e 1960.

Considerações

Esta análise propôs resgatar a obra do arquiteto Vasco Antonio Venchiarutti através da

catalogação dos exemplares da Revista Acrópole, coleção pertencente ao Escritório de

Arquitetura Eduardo Carlos Pereira. Nesse processo foi possível, além do objetivo proposto,

constatar a atemporalidade de suas obras e a importância de sua trajetória para o

desenvolvimento da cidade. O procedimento de trabalho poderá ser estendido a outras

coleções sob a guarda da empresa.

Referências

HEYMANN, Luciana Q.. O Lugar do Arquivo: a construção do legado de Darcy Ribeiro

Rio de Janeiro. Contra Capa/Faperj, 2012. 338p.

BELLOTTO, Heloísa Liberalli. Arquivos Permanentes: Tratamento documental. 4. ed. Rio

de Janeiro. Ed. FGV, 2006. 320p.

CAMARGO, Ana Maria de Almeida. Tempo e Circunstância: a abordagem contextual

dos arquivos pessoais. São Paulo, Instituto Fernando Henrique Cardoso, 2007. 316p.

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