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MITOS E VERDADES QUE ENVOLVEM O TRABALHO DE ALONGAMENTO E A FLEXIBILIDADE NO COTIDIANO DO PERSONAL TRAINER. PAVELSKI, Pietro Conrado 1 GULAK, Andreia 2 RESUMO Na antiguidade, o trabalho de alongamento e flexibilidade era utilizado para fins benéficos, como promover um ganho de amplitude e melhorar a saúde, e fins maléficos, como a prática de torturas em interrogatórios. Hoje em dia sabemos que a flexibilidade é um componente muito importante da aptidão física, dessa maneira, o presente trabalho tem como objetivo apurar a veracidade dos mitos e verdades sobre alongamento e flexibilidade que acercam o trabalho do personal trainer por meio de uma revisão de literatura. É muito comum a utilização dos termos; flexibilidade, alongamento, mobilidade e amplitude de movimento como sinônimos, mas cada um desses termos tem a sua própria definição e aplicação. A flexibilidade de uma articulação pode ser influenciada pelo tecidos conjuntivos, mecanismos mecânicos e principalmente pela inatividade. Quando o assunto é prevenção de lesões, existem controvérsias que envolvem o assunto; alguns autores defendem o alongamento para esse fim, enquanto outros apontam não ter significância. Da mesma maneira quando se fala em desempenho de força, a maioria dos autores aqui citados colocam que o alongamento feito antes do exercício não tem significância no desempenho, entretanto, encontramos pesquisas de opinião contrária, ressaltando que fazer alongamento antes dos exercícios pode sim, afetar nos resultados. PALAVRAS-CHAVE: Alongamento, flexibilidade, desempenho. 1 Pós-graduando do curso de Especialização Lato Sensu em Personal Trainning, do Programa de Pós-Graduação do Centro Univeristário Assis Gurgacz (FAG). 2 Professor orientador do Programa de Pós-Graduação Centro Univeristário Assis Gurgacz (FAG).

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MITOS E VERDADES QUE ENVOLVEM O TRABALHO DE

ALONGAMENTO E A FLEXIBILIDADE NO COTIDIANO DO

PERSONAL TRAINER.

PAVELSKI, Pietro Conrado1

GULAK, Andreia2

RESUMO

Na antiguidade, o trabalho de alongamento e flexibilidade era utilizado para fins benéficos,

como promover um ganho de amplitude e melhorar a saúde, e fins maléficos, como a prática

de torturas em interrogatórios. Hoje em dia sabemos que a flexibilidade é um componente muito

importante da aptidão física, dessa maneira, o presente trabalho tem como objetivo apurar a

veracidade dos mitos e verdades sobre alongamento e flexibilidade que acercam o trabalho do

personal trainer por meio de uma revisão de literatura. É muito comum a utilização dos termos;

flexibilidade, alongamento, mobilidade e amplitude de movimento como sinônimos, mas cada

um desses termos tem a sua própria definição e aplicação. A flexibilidade de uma articulação

pode ser influenciada pelo tecidos conjuntivos, mecanismos mecânicos e principalmente pela

inatividade. Quando o assunto é prevenção de lesões, existem controvérsias que envolvem o

assunto; alguns autores defendem o alongamento para esse fim, enquanto outros apontam não

ter significância. Da mesma maneira quando se fala em desempenho de força, a maioria dos

autores aqui citados colocam que o alongamento feito antes do exercício não tem significância

no desempenho, entretanto, encontramos pesquisas de opinião contrária, ressaltando que fazer

alongamento antes dos exercícios pode sim, afetar nos resultados.

PALAVRAS-CHAVE: Alongamento, flexibilidade, desempenho.

1 Pós-graduando do curso de Especialização Lato Sensu em Personal Trainning, do Programa de Pós-Graduação

do Centro Univeristário Assis Gurgacz (FAG). 2 Professor orientador do Programa de Pós-Graduação Centro Univeristário Assis Gurgacz (FAG).

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1 INTRODUÇÃO

Desde a antiguidade, o trabalho de flexibilidade e de alongamento é feito por diversas

culturas, com diferentes objetivos. Segundo Riestra e Flix (2003) os primeiros indícios

encontrados de pessoas utilizando a prática do alongamento com o objetivo de se obter uma

maior flexibilidade, datam por volta do ano de 2500 a.C. em tumbas de Beni Hassan, no antigo

Egito.

Alter (1999) classifica, dentro do contexto histórico, a utilização do alongamento em;

uso construtivo e uso prejudicial, onde o uso construtivo era feito de maneira benéfica ao corpo

com objetivo medicinal, terapêutico ou até mesmo atlético, como os gregos utilizavam em suas

ginásticas, e o uso prejudicial era utilizado com o objetivo de torturar pessoas em interrogatórios

e punições.

Flexibilidade pode ter várias definições, e o conceito pode ser aplicado de diferentes

formas, isso vai depender da disciplina em questão. Na área da educação física, medicina do

desporto e ciências da saúde, uma das definições mais simples encontradas é amplitude de um

movimento disponível em uma articulação (ALTER 1999). Mas ela pode ser definida também,

como a máxima amplitude de movimento realizado em uma ou mais articulação de forma

voluntária (ACHOUR JUNIOR, 1998).

Já o alongamento é um termo utilizado para descrever os exercícios que proporcionam

o ganho ou a manutenção da flexibilidade (ACHOUR JUNIOR, 1998) por meio do

desenvolvimento da elasticidade muscular e da mobilidade articular (RIESTRA e FLIX 2003).

Dentro da área do personal training, muito se fala sobre o trabalho de alongamento e

flexibilidade, mas ainda existem muitas dúvidas em relação à sua aplicabilidade, como por

exemplo; se deve ser feito antes ou depois de uma sessão de exercício, qual o melhor método a

ser utilizado, como periodizar o treinamento de flexibilidade e se o alongamento previne lesões.

Sendo assim, o objetivo deste artigo é procurar esclarecer os mitos e verdades, por meio

de uma revisão de literatura, sobre o trabalho de alongamento e flexibilidade desenvolvido pelo

personal trainer.

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para a realização deste trabalho, foram feitas pesquisas de artigos científicos indexados

nas bases de dados Scielo, Pubmed, Medline, Google Acadêmico, Cochrane, considerando o

período de 1998 a 2018, e consultado livros na biblioteca do Centro Universitário Fundação

Assis Gurgacz. A busca pelos artigos foi feita combinando as palavras-chaves: flexibilidade,

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alongamento, prevenção, desempenho, lesão. Foram encontrados 63 artigos, dos quais 13

foram selecionados para a elaboração deste estudo. Na biblioteca do Centro Universitário

Fundação Assis Gurgacz, foi consultado livros da área de fisioterapia e educação física que

abrangem assuntos relacionados a fisiologia, flexibilidade, alongamento, biomecânica e

definições técnicas das áreas citadas.

3 DESENVOLVIMENTO

Para que se possa ter uma compreensão melhor do assunto, é necessário saber o

significado dos termos utilizados, isto é essencial para o desenvolvimento do estudo. Muitos

acreditam que o alongamento é uma prática que trabalha apenas os componentes musculares, e

a flexibilidade nada mais é, que uma prática mais intensa, ultrapassando os níveis do trabalho

de alongamento (ACHOUR JUNIOR, 2009).

Riestra e Flix (2003) ressaltam que, mesmo não causando problemas de compreensão,

é muito comum a utilização de termos como; alongamento, mobilidade, flexibilidade, soltura,

stretching, amplitude articular como sinônimos.

Estes termos são, algumas vezes, confundidos tanto pelos fisioterapeutas, como pelos

profissionais de educação física, que utilizam esses recursos em seu dia-a-dia. Neste estudo

buscamos esclarecer as diferenças desses conceitos, objetivando contribuir para as discussões

e aplicações dessas técnicas dentre os acadêmicos e os profissionais que delas se utilizam.

3.1 Flexibilidade

Definir flexibilidade não e uma tarefa fácil, pois envolve vários conceitos de diferentes

áreas, representando situações conflitantes quando considerada nos âmbitos clínico, desportivo

ou pedagógico. Atualmente vários são os autores que se posicionam de diferentes formas

quando se referem a flexibilidade (BODARO et al, 2007).

Uma das definições mais simples encontradas é; amplitude de um movimento

disponível em uma articulação (ALTER, 1999), no Dicionário Médico Ilustrado (DORLAND,

1999) a flexibilidade é definida como; a capacidade da articulação de ter maleabilidade e ser

facilmente flexionada sem se romper. Já Achour Junior (1998) define a flexibilidade como a

máxima amplitude de movimento realizado em uma ou mais articulações de forma voluntária.

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3.2 Alongamento

Segundo Achour Junior (1998), enquanto flexibilidade é um termo utilizado para

descrever um componente de aptidão relacionado ao bem estar físico, a palavra alongamento é

usada para descrever a técnica utilizada para melhora da flexibilidade, por meio da elasticidade

muscular, ao colocar o músculo alongado além do seu tamanho habitual. Ainda segundo o autor,

o alongamento é um termo utilizado para descrever os exercícios que proporcionam o ganho

ou a manutenção da flexibilidade.

Pode ser utilizado de maneira terapêutica com o objetivo de aumentar a mobilidade dos

tecidos moles, já que quando executa-se um exercício, promove-se um aumento do

comprimento das estruturas que tiveram um encurtamento causado por alguma adaptação

(KISNER e COLBY, 1998).

Há várias formas descritas na literatura para executar o alongamento, algumas delas são

mais utilizadas e descritas a seguir.

3.2.1 Métodos de alongamento

Devido à grande variedade de esportes e atividades físicas, surge necessidades

específicas para cada público, desta maneira, ao longo dos anos foram desenvolvidas algumas

técnicas de alongamento para se atingir níveis de flexibilidade ideais dentro de cada

modalidade, as principais técnicas utilizadas são: alongamento estático, dinâmico, balístico,

passivo e Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva (FNP).

O alongamento estático consiste em segurar uma postura por um determinado tempo,

onde o próprio indivíduo irá conduzir o movimento até uma amplitude que cause uma certa

tensão, desta maneira o indivíduo tem capacidade de controlar a intensidade em baixa, média e

forte tensão (ACHOUR JUNIOR, 2009).

No trabalho do alongamento dinâmico, a execução do movimento é determinada pelo

alcance máximo do movimento voluntário realizado pelos músculos agonistas e o relaxamento

dos antagonistas, sendo assim, na execução do movimento, o grupamento alongado será dos

músculos antagonistas. Essa técnica deve ser feita de forma ritmada e suave em todo o percurso

do movimento (ACHOUR JUNIOR, 2010).

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O alongamento balístico geralmente é confundido com o dinâmico, porém fundamenta-

se em um movimento composto de alongamentos ativos, com várias insistências no final da

amplitude do exercício executado. Na primeira fase, o indivíduo irá empregar uma força

contínua com o objetivo de acelerar uma contração concêntrica dos músculos agonistas sem

que os antagonistas possam impedir o movimento, já na segunda fase temos a inércia, sem

nenhuma contração muscular (RIESTRA & FLIX 2003).

De acordo com Kisner e Colby (1998), no alongamento passivo é preciso o auxílio de

um profissional, o qual irá exercer uma força externa, levando o membro relaxado do praticante

a uma tensão de baixa e média intensidade, nesse método pode ser utilizado instrumentos para

provocar uma maior tensão durante o alongamento.

Já a Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva (FNP) é uma prática que surgiu entre os

anos 1940 e 1950 utilizada na área da fisioterapia, com o objetivo de reabilitar pessoas com

paralisia, e nos anos 1980 alguns terapeutas esportivos levaram esse conhecimento para dentro

da área esportiva com o intuito de melhorar o desempenho dos atletas (McATEE, 1998). O FNP

é uma técnica que utiliza a contração isométrica antes da execução do alongamento feito por

um outro indivíduo, existe dois tipos de métodos dentro do FNP, o contração-relaxamento e a

contração-relaxamento contração agonista (ACHOUR JUNIOR, 2009). No método contração-

relaxamento, o profissional deve conduzir o membro que será alongado até o limite fisiológico

da articulação, neste momento o indivíduo deverá fazer uma força contrária, com o objetivo de

inibir o órgão tendíneo de Golgi, executando uma contração isométrica durante alguns

segundos, em seguida o mesmo irá relaxar a musculatura, e o profissional irá aumentar a

amplitude do movimento (ACHOUR JUNIOR, 2009). No método contração-relaxamento

contração agonista, o profissional irá conduzir o membro que será alongado até seu limite

fisiológico, neste momento é feita uma contração deste músculo, após este procedimento, o

praticante irá ativar uma contração muscular contrária e o profissional também irá inverter o

ponto de resistência, mantendo a isometria do músculo, feito isto, o praticante relaxa a

musculatura e o profissional aumenta a amplitude do movimento (ACHOUR JUNIOR, 2010).

3.3 Mobilidade

Cada vez mais sendo utilizado na área da educação física, e por ser um assunto recente,

ainda muitos equívocos ocorrem na hora de definir este termo, confundindo mobilidade com

alongamento, flexibilidade e até mesmo com amplitude de movimento. Sendo assim, podemos

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definir mobilidade como a capacidade de explorar nossas articulações em todo sua amplitude,

onde um único movimento pode envolver mais de uma articulação, e a mobilidade pode ser

afetada por tensões musculares, aderência, tecidos moles e cápsula articular, adaptações

neuromusculares e propriocepção (ACHOUR JUNIOR, 2009).

Existe uma relação entre mobilidade e estabilidade de natureza inversa, onde uma

articulação com excesso de mobilidades provavelmente terá uma menor estabilidade, e uma

articulação que não é muito móvel irá apresentar uma estabilidade maior (KONIN, 2006).

3.4 Amplitude de Movimento

Amplitude de movimento (ADM) é o movimento angular máximo de uma articulação,

este é medido em graus (TORTORA e DERRICKSON, 2016). Ainda segundo os autores, a

amplitude de movimento (ADM) pode ser influenciada por alguns fatores; como resistência e

tensão dos ligamentos, distribuição e tensão dos músculos, estruturas ou formato dos ossos,

contato de partes moles, desuso e até mesmo fatores hormonais.

3.5 Fatores que podem influenciar a flexibilidade

A mobilidade de uma articulação depende diretamente das estruturas que a compõem e

circundam, como ossos, cápsula articular, tendões, ligamentos, músculos, gordura e pele

(PRENTICE e VOIGHT, 2003).

O tecido conjuntivo proporciona uma grande resistência na hora de desenvolver a

flexibilidade, sendo assim, os componentes contráteis, ligamentos, tendões, restrição neural,

formato das superfícies articulares, aderência, contraturas e cicatrizes nos tecidos moles

poderão ser fatores determinantes. Além desses fatores citados, também temos as limitações

mecânicas, como o excesso de massa muscular e de gordura; pessoas com um grande volume

muscular tem dificuldades de executar uma maior flexão do cotovelo, devido ao volume do

bíceps braquial, e o excesso de volume abdominal causado pelo acumulo de gordura dificulta

a aproximação do tronco na direção dos membros inferiores (ACHOUR JUNIOR, 2010).

A idade também é um fator, menos agravante, que irá influenciar, o qual pode ser

combatido com a prática regular de exercícios, já que a perda de flexibilidade está mais atrelada

à inatividade do que com o processo de envelhecimento (NIEMAN, 1999).

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Comparando as capacidades físicas entre homens e mulheres encontramos grandes

diferenças, desta maneira percebemos que as mulheres tendem ser mais flexíveis que os homens

e isso ocorre em todas as idades, um dos motivos para que isso ocorra é a grande quantidade de

estrogênio nas mulheres, o qual implica em um menor desenvolvimento muscular e maior

acúmulo de polissacarídeos e água, diminuindo o atrito entre as fibras musculares (ACHOUR

JUNIOR, 2009).

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Alongamento e prevenção de lesão

É muito comum a utilização de exercícios de alongamento antes de uma prática

esportiva ou uma atividade física recreativa, baseado na ideia de que o exercício irá diminuir

as chances de uma lesão ou diminuir a intensidade e a duração de uma futura lesão músculo

tendinosa e articular (ALTER, 1999).

Achour Junior (2010) relata que os exercícios de alongamento evitam encurtamentos

musculotendíneos, melhoram a circulação sanguínea e aumentam o relaxamento muscular,

reduzem a tensão muscular antagonista, o que possibilita uma economia energética dos

músculos agonistas e diminuem os riscos de alguns tipos de lesões.

Porém, quando fazemos uma análise do material existente sobre o assunto, vários

estudos e revisões não apresentam uma correlação entre a flexibilidade e a prevenção de lesões

(POPE et al, 1998; POPE et al, 2000; THACKER et al, 2004; ALMEIDA et al, 2009;

FARINATTI, 2000; ALMEIDA e JABUR, 2005).

Um trabalho realizado por Pope et al. (1998), estudo que contou com a participação de

1.093 recrutas militares, teve como objetivo analisar os efeitos do alongamento de sóleo e

gastrocnêmio realizado antes da prática de exercícios sobre a incidência de lesão. Durante 11

semanas, cada participante realizou o treinamento físico em dias alternados, totalizando 40

sessões. No estudo foi concluído que a prática do alongamento não teve uma redução

significativa na incidência de lesão.

Em uma outra pesquisa de Pope et al. (2000), realizado com 1538 recrutas do exército,

do sexo masculino, foi examinado a eficiência do alongamento em membros inferiores na

redução de lesões. Durante as 12 semanas seguintes de treinamento, ambos os grupos

realizaram exercícios de aquecimento ativo antes das sessões de treinamento físico. Além disso,

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um dos grupos realizou alongamentos estáticos de 20 segundos sob supervisão, focando seis

músculos dos membros inferiores. Nos resultados finais, foram registrados 333 lesões de

membros inferiores, sendo 158 identificadas no grupo que realizou o alongamento e 175 no

grupo controle, o qual não realizou alongamento antes do treinamento. Os alongamentos

executados antes do treinamento físico não produziram reduções clinicamente significativas no

risco de lesões.

Com base no resultado de ambos os estudos citados acima, pode-se constatar que o

alongamento não tem significância, e que a incidência de lesão pode estar atrelada aos níveis

de condicionamento físico e à idade.

Amako et al. (2003) realizou uma pesquisa composta por recrutas militares da

nacionalidade japonesa, com uma amostra de 901 indivíduos, onde foi analisado o efeito do

alongamento sobre a prevenção de lesões. Neste estudo, os recrutas foram divididos em dois

grupos, onde um dos grupos foi submetido a um programa de exercícios de alongamentos antes

e depois do treinamento físico, e o grupo controle foi submetido apenas ao treinamento físico.

Neste estudo os resultados foram contrários aos estudos citados anteriormente, onde o grupo

que realizou os alongamentos teve uma incidência menor de lesão musculoesquelético

comparado ao grupo controle.

Em uma revisão de literatura, Almeida e Jabur (2005) constataram que alguns autores

defendem o alongamento antes da prática de exercícios com o intuito de prevenir lesões e outros

autores dizem não existir uma comprovação científica que o alongamento antes do exercício

tenha esse poder, porém os autores que defendem o alongamento feito previamente, ressaltaram

a importância do alongamento no treinamento, com objetivo de ganho de flexibilidade, e não

sendo apenas um exercício com objetivo preparatório.

Farinatti (2000) diz em seu trabalho de revisão que em suma não existe evidências

suficientes que sustente a ideia de que a flexibilidade diminua a incidência de lesões, mas o

autor coloca que isso não quer dizer que o trabalho de flexibilidade não contribua neste sentido,

e que devemos reconhecer que as lesões acontecem por múltiplos fatores atrelados com o acaso

o que torna praticamente impossível isolá-los.

Thacker et al. (2004) concluiu em sua revisão de literatura; por mais que os resultados

dos estudos sejam conflituosos, e que não exista uma comprovação científica que o

alongamento realmente previna lesões, está clara a evidência que o alongamento aumenta a

flexibilidade e na medida em que a flexibilidade possa beneficiar o desempenho ou diminuir o

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risco de lesão, o alongamento pode ser utilizado. Também é evidente que o treinamento de

força, o condicionamento e o aquecimento têm um papel importante na prevenção de lesões,

pois as lesões estão diretamente relacionadas ao acumulo de massa gorda, desequilíbrio de força

muscular e diminuição da aptidão física.

4.2 Alongamento e desempenho da força

A realização do alongamento antes dos exercícios sempre foi motivo de discussão, não

só na questão da prevenção de lesões, como também na performance relacionada aos exercícios

de força, desta forma, ainda é comum a recomendação por parte dos profissionais que se faça

o alongamento antes e depois das atividades físicas.

Batista et al. (2013) constatou em seu estudo que o alongamento feito antes de um

exercício de força pode sim, influenciar de maneira significativa no desempenho. Na pesquisa

foram analisados 21 indivíduos do sexo masculino, com experiência em treinamento resistido.

Os voluntários fizeram o teste de 1RM para o exercício supino reto, todos os participantes

realizaram um aquecimento de 10 minutos em esteira elétrica na primeira fase do teste, e 72

horas após o aquecimento em esteira, foi executado seguido de três séries de 30 segundos de

alongamentos passivos-estáticos para peitoral. O alongamento feito junto com o aquecimento

proporcionou uma diminuição significativa da força no teste de 1RM. Com base neste resultado,

os autores do estudo desencorajam a prática do alongamento antes de exercícios de força de

alto rendimento.

Porém, encontramos estudos científicos que dizem o contrário, que a influência do

alongamento não tem significância em relação ao exercícios de força (CÉSAR et al, 2015;

BASTOS et al, 2014; FERMINO et al, 2005).

César et al. (2015) além de analisar a influência do alongamento sobre o desempenho

da força, também analisaram se houve ganho de amplitude de movimento de forma aguda da

cintura escapular com os alongamentos realizados antes do teste de 10RM no supino horizontal

em duas angulações articulares diferentes, amplitude total e 90° de flexão de cotovelo. O estudo

foi realizado em 11 indivíduos do sexo masculino, e os testes de 10RM foram feitos de forma

randômica para as diferentes angulações de cotovelo. Após 48 horas da coleta dos primeiros

dados, foi demonstrado o protocolo com o alongamento antes dos testes. Neste protocolo foi

aplicado primeiro a medição da amplitude de movimento sem alongar, depois foram realizados

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alongamentos estáticos para peitoral e tríceps duas vezes com duração de 30 segundos, após,

medido a amplitude novamente, em seguida um teste de 10RM no supino, podendo ser com

amplitude total ou 90° do cotovelo, o protocolo de alongamento foi repetido para que se fizesse

o teste de 10RM da angulação que restou. Com base nos resultados do estudo, César et al.

(2015) concluíram que os alongamentos realizados antes dos testes de repetição máxima

proporcionaram um ganho na amplitude de movimento de forma aguda, e que tanto para a

amplitude total e para o ângulo de 90° do cotovelo, este ganho não provocou prejuízo na força

obtida através do teste de 10RM.

Podemos perceber, que cada terminologia citada no trabalho, tem sua própria definição,

diferente do que se escuta de alguns profissionais, esses termos não são sinônimos, e que existe

inúmeros fatores que influenciam a flexibilidade, porém, a inatividade é o fator mais agravante

do que qualquer outro.

Quanto à prevenção de lesões, analisando a literatura existente, percebemos que há

controvérsias nos resultados encontrados, alguns defendem a eficiência do alongamento nesse

sentido, outros dizem não existir comprovações científicas suficientes para sustentar essa ideia,

porém, os autores que defendem a ideia de que o alongamento previne lesões deixam bem claro

a importância do alongamento como parte do treinamento, e não somente um exercício

preparatório. No âmbito do treinamento personalizado, o exercício de alongamento no início

do treinamento, pode não ser uma boa estratégia a ser adotada, devido ao fato, que o profissional

deve otimizar o tempo de treinamento de seu cliente, para se ter um melhor aproveitamento,

exercícios de aquecimento localizado ou global seriam uma melhor estratégia a se adotar.

5 CONCLUSÃO

Apesar de existir controvérsias à respeito do assunto, a maioria dos autores aqui

descritos acreditam que o alongamento realizado antes do treinamento de força não tem

significância no desempenho da força, e se o objetivo do profissional com seu cliente for o

ganho de amplitude articular aguda, o alongamento antes do treinamento pode ser uma

estratégia a ser adotada.

Mesmo existindo muitos estudos sobre essas áreas, ainda são necessários mais trabalhos

científicos de alta evidência, afim de elucidar melhor as controvérsias que existem em torno

das temáticas; alongamento e prevenção de lesões musculares, alongamento e desempenho da

força.

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