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MARÇO 1,50 NRP “ÁLVARES CABRAL” MISSÃO CUMPRIDA

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Page 1: MISSÃO CUMPRIDA · MISSÃO CUMPRIDA. D e acordo com aquilo que é a tradição num vasto con-junto de Marinhas, muitos navios ostentam na roda-do--leme o respectivo nome, acompanhado

MARÇO € 1,50

NRP “ÁLVARES CABRAL”

MISSÃO CUMPRIDA

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De acordo com aquilo que é a tradição num vasto con-junto de Marinhas, muitos navios ostentam na roda-do--leme o respectivo nome, acompanhado de uma divisa

simbólica. Na maior parte dos casos, esta tem por objectivo estabelecer uma ligação perene, entre aqueles que se encon-tram embarcados e o alto desígnio que deve nortear a sua acçã o e conduta enquan-to Marinheiros ao serviço do seu país.

A bordo dos navios da Marinha Portuguesa, vi-gora, desde 1863, a divisa «A PATRIA HONRAE QUE A PATRIA VOS CONTEM-PLA», decretada pelo en-tão Ministro da Marinha, José da Silva Mendes Leal (1820-1886). Conforme referimos anteriormente1, o navio-escola Sagres é presentemente o único a exibir estas palavras nas respectivas rodas-do-leme, uma vez que nos demais navios da Marinha o lema se encontra aplicado na superstrutura da ponte.

Nas anteriores vidas – como Albert Leo Schla-geter (1937-1948) e Gua-nabara (1948-1962) –, o navio ostentou igualmen-te, em ambas as rodas-do--leme, na principal e na de emergência, as divisas então em vigor na Mari-nha Alemã e na Marinha Brasileira.

No segundo caso, as pa-lavras eram Guanabara e, diametralmente oposto, Tudo pela Pátria, em letras directamente aplicadas nas cintas de latão. Mui-to embora estes vestígios ainda se encontrem pre-sentes, só os mais curiosos terão tido oportunidade de os identificar e observar.

Há alguns anos, durante o longo processo de inves-tigação dedicado à histó-ria do navio-escola Sagres, identificámos, através de algumas fotografias do período ale-mão, a presença da divisa que o navio exibia enquanto Albert Leo Schlageter2. Entretanto, pelo cotejo de idênticos vestígios a bordo dos outros navios-escolas alemães da mesma classe, designada mente o Eagle – ex-Horst Wessel (1936-1945) – e o Tovarisch – ex-Gorch Fock (1933-1945) e actual Gorch Fock I –, já há alguns anos havíamos intuído que estes também se en-

contrariam gravados, em baixo relevo, no verso das cintas das rodas-do-leme do navio-escola Sagres, como de resto referi-mos em artigo publicado por ocasião do septuagésimo aniver-sário do navio3.

Muito recentemente, durante os últimos fabricos, foi final-mente posta a descoberto a divisa referente ao período ale-

mão, pelo que, doravante, todos os visitantes po-derão admirar mais este precioso testemunho his-tórico, que, pelas nossas contas, terá estado longe dos olhares para cima de sessenta anos, entre 1948 e finais de 2009. Resta acrescentar que além da referida gravação, em que aparece a identificação do navio como Segelschul-schiff (navio-escola velei-ro) A lbert Leo Schlageter, surge igualmente grava-do, no diâmetro oposto, o lema adoptado pelos na-vios da então Kriegsmari-ne (Marinha de Guerra), que propositadamente es-colhemos para título des-te artigo – Gott Mit Uns –, cujo si gnificado é «Deus está connosco».

Em boa verdade, parece--nos particularmente feliz o facto da divisa alemã ter voltado a estar visível aos olhos de todos, no preci-so momento em que o na-vio encetava preparativos para a sua maior viagem de sempre, isto é, a tercei-ra circum-navegação, que se irá prolongar por mais de 11 meses, num total de 339 dias. Que Deus esteja convosco, pois, fazendo fé num provérbio que é tão nosso – e em vésperas da largada oportuna e efusiva-mente apregoado –, a sorte protege os audazes!

António Manuel GonçalvesCTEN

[email protected]

Notas:1 Ver «Valores, Identidade e Memória, n.º 16 – A PATRIA HONRAE», Revista

da Armada, n.º 420, Junho de 2008, p. 4.2 Ver Sagres – Construindo a Lenda, Lisboa, Comissão Cultural da Marinha,

2008, p. 87, fotografia superior.3 Ver «O Primeiro Motor da Sagres – Coração do Navio, Núcleo de uma Ex-

posição», Revista da Armada, n.º 412, Setembro/Outubro de 2007, p. 11.

Gott Mit UnsRoda-do-leme da Sagres

A célebre divisa na roda-do-leme do navio-escola Sagres.

Vestígios do nome e divisa do Guanabara.

O nome e divisa do Albert Leo Schlageter.

Gott Mit UnsRoda-do-leme da Sagres

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Publicação Oficial da Marinha

Periodicidade mensal

Março 2010

DirectorCALM EMQ

Luís Augusto Roque Martins

Chefe de RedacçãoCMG Joaquim Manuel de S. Vaz Ferreira

Redacção1TEN TSN Ana Alexandra Gago de Brito

Secretário de RedacçãoSAJ L Mário Jorge Almeida de Carvalho

Colaboradores PermanentesCFR Jorge Manuel Patrício Gorjão

CFR FZ Luís Jorge R. Semedo de MatosCFR SEG Abel Ivo de Melo e Sousa1TEN Dr. Rui M. Ramalho Ortigão Neves

Revista da ArmadaEdifício das Instalações

Centrais da MarinhaRua do Arsenal

1149-001 Lisboa - PortugalTelef: 21 321 76 50Fax: 21 347 36 24

http://www.marinha.pt

[email protected]

Paginação electrónica Macfinal, Lda.

Rua Lalande, 17 - 7º Esq.Lisboa

Tiragem média mensal:6000 exemplares

Preço de venda avulso: € 1,50Registada na DGI em 6/4/73

com o nº 44/23Depósito Legal nº 55737/92

ISSN 0870-9343

SUMÁRIO

da.

GOTT MIT UNS. RODA-DO-LEME DA SAGRES 2ESPÍRITO DE CORPO. O CIMENTO DO SERVIÇO À PÁTRIA 4VISITA DO MINISTRO DA DEFESA NACIONAL AO INSTITUTO HIDROGRÁFICO / ACADEMIA DE MARINHA 5VISITA DO COMANDANTE DO CORPO DE FUZILEIROS ÀS FND’s NO AFEGANISTÃO 9NRP “BARTOLOMEU DIAS”. A PRIMEIRA UTILIZAÇÃO OPERACIONAL DO SONAR “ANACONDA” / PASSEX 11REFERÊNCIAS GEOGRÁFICAS 5 12A MARINHA DE D. SEBASTIÃO (6) 14DUAS VIAGENS DE INSTRUÇÃO À VOLTA DO MUNDO 15ALM CEMA DESPEDE-SE DO NRP “BARRACUDA” NO MAR 23ALGARVES D’AQUÉM E D’ALÉM-MAR / EXPOSIÇÃO 24RECORDANDO ... 25ACADEMIA DE MARINHA 27O OBSERVATÓRIO REAL DA MARINHA DO COMANDANTE ANTÓNIO ESTÁCIO DOS REIS 29HISTÓRIAS DA BOTICA (72) 30VIGIA DA HISTÓRIA 19 31QUARTO DE FOLGA / NOTÍCIA 33NOTÍCIAS PESSOAIS / CONVÍVIO / NOTÍCIA 34NAVIOS DA REPÚBLICA CONTRACAPA

REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 3

Levantamento Hidrográfico das Ilhas Selvagens

18

A Última Viagem do “Barracuda” e o fim da 4ª Esquadrilha

20

Navio-Escola “SAGRES” Volta ao Mundo 2010

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NRP “Álvares Cabral” Missão cumprida

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MARÇO € 1,50

NRP “ÁLVARES CABRAL”

MISSÃO CUMPRIDA

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4 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

Espírito de CorpoO cimento do serviço à Pátria

Espírito de CorpoO cimento do serviço à Pátria

Caros cadetes, hoje falo-vos do espírito de corpo, que é o senti-mento de pertença à Marinha e

de comunhão dos mesmos ideais, que cimenta cada um de nós em torno de um propósito comum: servir a nossa amada Pátria com empenho, dedica-ção e esforço.

O espírito de corpo revela-se de duas formas principais. Em primeiro lugar, na partilha de aspirações e desejos co-muns, e na adopção de ideais, de tradi-ções e de atitudes colectivas. Em con-junto, dão corpo à personalidade pró-pria dos militares, militarizados e ci-vis da Marinha, tão distintiva no rela-cionamento com os outros, quaisquer que sejam as activi-dades. Em segundo lugar, na natureza e solidez dos laços de camaradagem, e no respeito da diversi-dade de convicções e opiniões. Em con-junto, dão corpo à postura própria dos militares, militari-zados e civis da Marinha, tão distintiva no cumprimento das suas tarefas, quais-quer que sejam as circunstâncias.

Na prática, o espírito de corpo traduz--se no apoio e na estima, que fundamen-tam as características básicas dos laços de afecto que nos começam a unir quan-do ingressamos na Marinha, e que são nutridos, em primeira instância, pela vida a bordo dos navios. Esta vivência profundamente marinheira, também desenvolve a harmonia peculiar que, colectivamente, patenteamos nas tri-vialidades do dia-a-dia, ou nas ocasiões mais difíceis da nossa carreira profis-sional. A vida a bordo dos navios leva, igualmente, a que o espírito de corpo se traduza na elevação e no denodo que colocamos na defesa dos ideais colecti-vos. Para além disso, também desenvol-ve a confiança que cada um de nós tem na competência dos seus superiores, na coragem dos seus pares e na solidarie-dade dos seus subordinados.

Caros cadetes, a prática desta virtu-de militar é extremamente exigente.

Requer respeito e consideração entre os membros da Marinha, para que per-maneçam unidos, como se de uma só família se tratasse, de forma a ultrapas-sarem os obstáculos ligados ao cumpri-mento das suas obrigações. Também re-quer inteligência e ponderação na sua utilização, para que ligado a desvios à disciplina e aos deveres militares, não galvanize eventuais comportamentos anárquicos e fracturantes, mais ou me-nos graves, mas todos eles capazes de desvirtuarem a natureza e a função so-

cial da Marinha, e cause prejuízos à sua imagem e reputação.

O espírito de corpo, sendo um sen-timento de pertença e de comunhão, também requer de cada um de nós de-terminação e contenção: determinação, para suportar as contrariedades com resignação; contenção, para desfrutar das facilidades com alegria. É esta du-pla exigência que confere intensidade ao sentimento de pertença e de comu-nhão que existe entre os membros da Marinha. A tonificação deste sentimen-to é uma responsabilidade particular-mente relevante para os oficiais, porque no exercício do comando dos homens e das mulheres que servem a Marinha, lidam permanentemente com factores que influenciam o estado psicológico que leva os subordinados a ter a sensa-ção de fazer parte, de ser merecido, de estar unido e de viver numa comunida-de como é a nossa.

É inegável que servimos uma organi-zação dotada de um excelente espírito de corpo. Todavia, este não é um bem

definitivamente conquistado! Precisa de ser continuamente alimentado pela vida a bordo dos navios, como atrás foi dito. Para além disso, também necessita de ser vivificado pelo exemplo dos com-portamentos de cada um de nós e pelos actos litúrgicos do cerimonial marítimo. O exemplo consagra os gestos de soli-dariedade e consideração entre camara-das, através: da expressão de sentimen-tos de simpatia e ternura relativamente a quem tem dificuldades ou sofre; dos actos de cooperação ou assistência que

se manifestam nas circunstâncias boas ou más; da forma atenta como se ana-lisam os problemas de pares e subordi-nados, ou como se expõem os argu-mentos aos supe-riores. As práticas rituais proclamam a honestidade de propósito da Mari-nha e os princípios sadios da conduta dos seus membros, através: de apelos ao amor, ao traba-lho e à Pátria; da

evocação de glórias passadas; da exal-tação de actos e figuras do presente; da congregação do pessoal no activo, na reserva e na reforma em eventos signi-ficativos; da abertura das unidades, em ocasiões especiais, a familiares e aos ci-dadãos em geral.

Caros cadetes, o espírito de corpo é extremamente importante para o su-cesso da Marinha, porque permite tirar pleno partido das qualidades individu-ais dos nossos efectivos, levando-os a desempenhos excepcionais. Para além disso, alimenta e solidifica as restantes virtudes militares, com ênfase especial para a disciplina e os deveres. Também gera os estímulos adequados para que, cada um de nós, contribua para recriar todos os dias uma Marinha melhor e cada vez mais forte, dinâmica e res-peitada no seio da nossa amada Pátria, que servimos com empenho, dedicação e esforço.

António Silva Ribeiro

CALM

AOS CADETES DA ESCOLA NAVAL 11

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 5

Visita do Ministro da Defesa Nacional ao Instituto Hidrográfico

Visita do Ministro da Defesa Nacional ao Instituto Hidrográfico

O Instituto Hidrográfico (IH) recebeu, no passa-do dia 3 de Fevereiro,

o Ministro da Defesa Nacional, Prof. Doutor Augusto Santos Silva e o Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos As-suntos do Mar, Dr. Marcos Pe-restrello.

Esta visita foi precedida por uma curta passagem pelas Ins-talações Centrais da Marinha, onde foi recebido pelo Chef e do Estado-Maior da Armada, Almirante Melo Gomes e onde foram prestadas Honras Mi-litares. No auditório do Esta-do-Maior da Armada foi apre-sentado um briefing sobre a actividade operacional da Ma-rinha, designadamente sobre as acções do Comando Naval e da Autoridade Marítima.

Já no Instituto Hidrográfico o Ministro da Defesa Nacional e o Secretário de Estado da Defe-sa Nacional e dos Assuntos do Mar tiveram a oportunidade de observar in loco as capacidades técnico-científicas e logísticas do IH, através da visita às ins-talações e das várias apresenta-ções organizadas para o efeito.

A visita iniciou-se, assim, por um briefing feito pelo Director--Geral do IH, VALM Augusto de Brito e pelo Director Téc-

nico, CMG Ventura Soares, no qual foram explicitados a mis-são, visão e objectivos estratégi-cos a médio prazo, assim como as características mais marcan-tes dos meios e capacidades do Instituto Hidrográfico, que as-sume uma posição sui generis no contexto técnico-científico do País, já que é simultanea-mente um órgão da Marinha e um Laboratório do Estado vo-cacionado para as ciências e as técnicas do Mar.

No decorrer do percurso às instalações do Convento das Trinas do Mocambo, sede do IH, foram visitadas as divisões de Navegação, Hidrografia – onde são produzidas as cartas náuticas e as cartas electrónicas de navegação – o Laboratório de Geologia Marinha, a Escola de Hidrografia e Oceanografia e a Loja do Navegante. Após o almoço, e finda a visita, o Minis-tro da Defesa Nacional assinou o Livro de Honra agradecendo a visita proporcionada ao Insti-tuto Hidrográfico onde referiu …enquanto Laboratório do Esta-do nas áreas das ciências e técni-cas do mar, desempenha um papel central no conhecimento e aprovei-tamento de um dos recursos mais importantes da Nação Portugues a, o Mar…

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PRÉMIO “ALMIRANTE TEIXEIRA DA MOTA” 2010

Está aberto o concurso na Academia de Marinha, até ao dia 1 de Outubro de 2010, para atribuição do Prémio “Almirante Teixeira da Mota”.

Este Prémio destina-se a incentivar e dinamizar a pesquisa e a investigação científica nas áreas de Artes, Letras e Ciências liga-das ao Mar e às Marinhas, e é constituído por um diploma e por uma quantia pecuniária no valor de 5000 (cinco mil euros).

Podem concorrer a este Prémio os cidadãos nacionais e estrangeiros que apresentem trabalhos originais nos domínios refe-ridos. Consideram-se originais os trabalhos inéditos ou cuja publicação tenha sido concluída no ano a que se refere o concurso ou, no ano anterior.

O Regulamento do Prémio está à disposição dos concorrentes na Academia de Marinha.Para mais pormenores pode ser contactada directamente a Academia pelos telefones:213255493 e 213255496, ou fax 213427783 ou por escrito para: Academia de Marinha, Edifício da Marinha, Rua do Arsenal,

1100-038 Lisboa, e-mail: [email protected].

ACADEMIA DE MARINHA

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6 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

“DE REGRESSO A CASA”

O relato desta missão prossegue no porto de Salalah, cidade do Sulta-nato de Omã, onde a “Álvares Ca-

bral” esteve atracada entre os dias 23 e 26 de Dezembro. Esta segun-da visita a Salalah coincidiu com a celebração do dia de Natal, quadra que foi devida-mente assinalada com a reali-zação da tradicional Ceia de Natal no hangar, que permi-tiu juntar toda a guarnição e que incluiu uma singela tro-ca de prendas entre todos os militares. Atracado também em Salalah esteve o navio da Marinha do Irão, IRIS “Al-borz”, com o qual a “Álvares Cabral” teve a oportunidade de trocar cumprimentos e vi-sitas a bordo. O planeamen-to de actividades ainda con-templou um jogo de futebol com uma equipa do navio da Marinha de Omã, o SNV “Dhofar”.

No dia 26 o navio largou do porto de Sa-lalah, com destino ao IRTC (Internationally Recommended Transit Corridor) para prosse-guir a sua missão de patrulha naquele corre-dor de navegação, que percorre a totalidade do Golfo de Áden, ao longo de cerca de 500 milhas náuticas. Este corredor foi concebido especificamen-te para combater a ameaça da pirataria, concentrando as ro-tas de navegação e afastando os navios mercantes da cos-ta norte da Somália. Durante o trânsito, o navio efectuou tiro com a peça de 100mm e com armamento portátil, rotina que é normalmente executada após a largada de cada porto e que tem como objectivo verificar o estado de funcionamento do armamen-to em causa antes de iniciar a patrulha na área atribuída, proporcionando, ainda, o ne-cessário treino à guarnição.

Na JOA (“Joint Operations Area”) operam várias forças empenhadas no combate ao flagelo da pirataria. Para além da força-tare-fa 508 (operação “Ocean Shield”), da qual a “Álvares Cabral” é o seu navio-almirante, também a força-tarefa 465 (operação “Ata-lanta”) da EUNAVFOR (“European Union

Naval Force”) e a força-tarefa 151 da CMF (“Combined Maritime Force”) integram o teatro de operações. O facto destas três for-ças operarem na mesma área e com mis-sões muito semelhantes, obriga a regulares reuniões de coordenação entre os seus Co-

mandantes, com o objectivo de melhorar a sua interoperabilidade e melhorar o resulta-do operacional conjunto. No dia 28 de De-zembro, o navio americano USS “Chosin”, navio-almirante da força-tarefa 151 foi o an-fitrião de mais uma destas reuniões de coor-

denação, na qual esteve presente o CTF 508, CALM Pereira da Cunha.

A entrada no novo ano foi celebrada a na-vegar, em ambiente de festa, onde não falta-ram os doces tradicionais da época, como

os sonhos e o bolo-rei. Apesar de simples, estes pequenos mimos conseguem encurtar bastante os milhares de quilómetros que nos separam de casa. Mesmo em festa a missão continua, tendo o Rogue descolado aos pri-meiros alvores do dia 1 de 2010 para nova

missão de patrulha. Nestes primeiros dias do

ano, a “Álvares Cabral” na-vega tranquilamente nas águas quentes do Golfo de Áden. Indiferente a essa cal-ma, o Centro de Operações continua a monitorizar toda a navegação circundante, transmitindo directivas para a Ponte, onde é levada a cabo a condução do navio. Enquan-to isso, os serviços técnicos aproveitam o dia para reali-zar manutenções periódicas aos vários sistemas e equipa-mentos, de modo a assegurar o seu correcto funcionamen-to e fiabilidade. Ao final da manhã e ao final da tarde, a azáfama transfere-se para a cozinha, onde se concluem

os últimos preparativos para mais uma re-feição. O treino também faz parte da rotina de bordo, tanto na sua componente teóri-ca de refrescamento de valências, como na sua componente prática, caracterizada, so-bretudo, por exercícios internos de que são

exemplo os regulares treinos de combate a incêndios ou a alagamentos. Quando não estão de quarto, os militares da guarnição aproveitam o tempo disponível para des-cansar, ou para descomprimir um pouco, sendo o hangar, transformado em ginásio, um dos locais mais concorridos do navio.

No dia 9 de Janeiro o na-vio atracou no porto de Sa-lalah para mais uma curta paragem logística. A última estadia neste porto da penín-sula arábica foi aproveitada pela guarnição para nova ro-maria aos hotéis disponíveis, para desfrutar de uns banhos de sol, mas também para as últimas compras no mercado

local. Ao fim de três dias de descanso, a “Ál-vares Cabral” largou para a sua última pa-trulha na operação “Ocean Shield”, a qual culminaria com o trânsito final até ao porto omanita de Muscate.

NRP “Álvares Cabral”Navio-Almirante da SNMG1

NRP “Álvares Cabral”Navio-Almirante da SNMG1

PARTE VI

Abordagem a uma dhow durante uma acção de visita consensual com recurso ao helicóptero e à semi-rígida.

Operações de voo e manobra de semi-rígida na asa da ponte, durante uma acção de visita consensual a uma dhow regional.

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 7

Pelo interesse que as operações de com-bate à pirataria têm suscitado no Brasil, o navio, nesta última patrulha, embarcou dois jornalistas da TV Globo, aos quais foi dada a oportunidade de efectuar a cobertura jor-nalística da actuação da “Álvares Cabral”. Para além do empenhamento operacional, as rotinas do navio e as particularidades da vivência a bordo de um navio de guerra aca-baram por também merecer a atenção desta equipa da TV Globo.

No dia 16 de Janeiro, enquanto patru-lhava a área que lhe estava atribuída, a “Álvares Cabral” detectou uma dhow1 de carga indiana, através do seu helicóptero Rogue, que tinha visível no convés uma skiff2 com uma escada. Após análise do registo fotográfico efectuado pelo Rogue, o navio foi incumbido pelo CTF 508 de efectuar uma visita consensual3 à embar-cação suspeita. Nesta visita não foi iden-tificado nenhum indício que a pudesse relacionar com a actividade de pirataria, pelo que a dhow seguiu a sua viagem, tendo o navio retomado a patrulha.

Um dos principais vectores de actua-ção delineados para a operação “Ocean Shield” é o apoio aos vários países e or-ganizações da região, com o propósito de aumentar as suas capacidades de com-bate à pirataria, até que deixe de ser ne-cessária a presença dos navios da NATO nestas águas. Nesse sentido, a “Álvares Cabral” levou a cabo outra acção no âm-bito do Capacity Building, à semelhança do que já tinha acontecido a 16 de Dezem-bro. Assim, no dia 17 de Janeiro, o navio ru-mou para junto da Costa da Somália, mais propriamente para a entrada do porto de Boosaaso, para novo contacto com as auto-ridades de Puntland, uma das províncias da Somália, localizada no nordeste deste país. Desta vez o navio recebeu a visita de dois oficiais da Guarda Costeira de Puntland, a quem foram ministradas ac-ções de formação nas áreas de comunicações, navega-ção, AIS4 e procedimentos de vistoria. Foram ainda ofe-recidos cerca de 250 litros de combustível apreendido a embarcações piratas, apoio muito apreciado pelos referi-dos oficiais, contribuindo-se, assim, para a sustentação lo-gística das operações levadas a cabo pelas embarcações da Guarda Costeira. Após o de-sembarque dos dois oficiais no porto de Boosaaso, o na-vio prosseguiu para leste jun-to a costa para efectuar nova missão de reconhecimento da costa norte da Somália, com o seu heli-cóptero Rogue. Estas missões têm como ob-jectivo a identificação e registo de possíveis pontos de apoio logístico para a actividade de pirataria, quer pela visualização de mate-rial ou padrões de vida suspeitos, quer pelo

reconhecimento de novas infra-estruturas ao longo da costa.

Na manhã do dia 22 de Janeiro a “Álvares Cabral” entrou o porto de Muscate, capital do Sultanato de Omã. O porto está locali-zado na zona mais antiga da cidade, onde também se encontram o palácio do Sultão Qaboos, um forte de origem portuguesa, um mercado tradicional de rua e diversos edifícios governamentais. A zona nova de

Muscate faz lembrar uma cidade europeia, com edifícios modernos, onde o fast-food ocidental e a cultura islâmica se misturam. Como principal atractivo nesta zona salien-ta-se a Grande Mesquita, que se destaca sobretudo pela sua imponência e estilo ar-quitectónico.

No dia 25 de Janeiro realizou-se, a bordo da “Álvares Cabral”, a cerimónia de entre-

ga do Comando do SNMG1, do Contra-al-mirante Pereira da Cunha para o Comodoro Christian Rune, da marinha dinamarquesa e, em simultâneo, o handover das funções de navio-almirante para o HDMS “Absalon”. Terminava assim a participação do nosso

navio nesta importante missão da NATO. Ao largar de Muscate nessa mesma noite, era evidente pelo navio a satisfação pelo re-gresso a casa, mas também pelo sentimento de dever cumprido, nesta importante missão para a nossa Marinha e para o nosso país, e pela oportunidade que nos foi concedida de desfraldar a nossa bandeira nestas para-gens remotas que em tempos idos nos foram muito familiares.

O trânsito de regresso pelo Golfo de Áden foi efectuado em patrulha ao longo do IRTC. Antes da passagem pelo estrei-to de Bab-el Mandeb, e do adeus final ao Golfo de Áden ainda houve oportunidade para um reabastecimento com o USNS “Kanawha”, que permitiu assegurar os mínimos de combustível até à chegada a Catânia.

A agitação marítima sentida no Mar Vermelho trouxe à memória outros ma-res, já meio esquecidos pelas boas con-dições de vento e mar que normalmente caracterizam estas paragens. Mesmo as-sim, a navegação até ao canal do Suez foi aproveitada para conduzir um voo de familiarização com elementos da guarni-ção e para efectuar treino de tiro de ar-mamento portátil. No dia 31 de Janeiro o refeitório de praças serviu de palco para um concerto levado a cabo por alguns militares da guarnição, que proporcionou alguns momentos de descontracção, par-ticularmente relevantes em missões lon-gas como esta.

O primeiro dia de Fevereiro começou com uma singela cerimónia no hangar para impo-sição de distintivos de navegação, para o ju-ramento de fidelidade de algumas praças da guarnição e para o descerrar da placa evoca-tiva da 7ª guarnição. Nesta ocasião, foi ainda lembrada a Primeiro-marinheiro E Galvani-to, militar que fez parte da nossa guarnição e que faleceu há um ano atrás.

No dia seguinte, o navio fundeou em Port Suez, para evacuar uma praça com sus-peita de apendicite aguda, a qual viria a ser confirmada nos exames efectuados no Hospital Dar El-foud (Cai-ro, Egipto). Contou-se com a excelente colaboração da Embaixada de Portugal no Egipto, na pessoa do Dr. Car-los Pires, cujas diligências permitiram assegurar que a militar fosse evacuada e tra-tada em tempo, assim como garantir o seu posterior re-patriamento. Poucas horas depois e já durante a madru-gada, a “Álvares Cabral” ini-

ciou o trânsito pelo canal do Suez. Ao fim de 12 horas, o navio passa por Port Said, terminando mais uma etapa do seu trajec-to de regresso a Lisboa. À saída do canal, confirmaram-se as previsões de mau tem-po na zona leste do Mar Mediterrâneo, com

Fuzileiro no seu posto de Force Protection do navio.

Encontro com a Guarda Costeira da Somália a bordo do NRP “Álvares Cabral”.

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ondulação de noroeste com 4 m e vento de noroeste força 8, na escala de Beaufort. As condições meteorológicas no Mediterrâ-neo costumam variar com alguma rapidez, afectando do mesmo modo as condições oceanográficas. Este facto foi mais uma vez constatado durante o trânsito até Catânia, pois a diminuição da intensidade do ven-to trouxe consigo uma redução significati-va da agitação marítima num curto espaço de tempo.

O dia 7 de Fevereiro acordou com pouco sol. A maior novidade da entrada na Catânia, foi mesmo o frio, ao qual já ninguém estava habituado depois de vários meses a navegar no Golfo de Áden. Catânia é uma comu-na italiana5, situada na ilha da Sicília, com pouco mais de 300 mil habitantes, e que se estende por uma área de cerca de 180 km2. A Sicília é uma região autónoma italiana, cuja capital é Palermo. De entre as variadas atracções turísticas desta ilha mediterrânica, salienta-se o vulcão Etna, que ainda se en-contra activo e que é o mais alto da Europa, com 3340 m de altura.

As horas passam e a ansiedade aumenta. O dia 9 começa com o frenesim habitual dos dias de largada. Ao meio-dia o navio já nave-ga orientado a sul, para contornar a ilha da Sicília. As cartas de tempo indicavam que o dia 10 iria ser o pior para o trânsito que agora começava, e de facto essa expectativa veio a confirmar-se. Durante a madrugada e ma-nhã o vento forte de oeste chegou a atingir

os 60 nós, trazendo consigo uma forte agita-ção marítima, com a ondulação a atingir os 6 metros. A passagem do sistema frontal trouxe consigo uma diminuição da intensidade do vento e consequentemente da ondulação. A travessia do Estreito de Gibraltar assinala o regresso ao “nosso” Atlântico, e entramos em águas nacionais, a sul do Algarve, na tarde do dia 12 de Fevereiro, iniciando a singra-dura final até Lisboa.

A “Álvares Cabral” chegou a Lisboa na manhã de 13 de Fevereiro, onde recebeu as visitas dos Ministro da Defesa Nacional, Se-cretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, General Chefe do Estado--Maior General das Forças Armadas, Almi-rante Chefe do Estado-Maior da Armada e Vice-Almirante Comandante Naval, entida-des que manifestaram o apreço e o reconhe-cimento pelo desempenho do navio. Prestes a entrar na BNL, foi apresentado o balanço de 185 dias de missão, 3409 horas de nave-gação, 173 horas de voo, 35947 milhas per-corridas, com 13 visitas a portos em 9 países, navegando pelo Atlântico, no Mediterrâneo e pelo Índico. Concluída a visita, o navio se-guiu para a Base Naval de Lisboa. À entrada no canal do Alfeite já se conseguia vislum-brar o mar de gente que aguardava ansiosa-mente a chegada dos seus familiares e ami-gos. O navio atracou no Cais de Honra, sob os sorrisos e os acenos, tanto a bordo como em terra. Com o apito de volta à faina che-gam finalmente os tão aguardados abraços

e beijos de boas vindas, com o sentimento de “Missão cumprida!”.

Ao longo de seis artigos demos testemu-nho do contributo da “Álvares Cabral” para que se satisfizessem os compromissos assu-midos internacionalmente por Portugal, dan-do corpo a uma participação activa no qua-dro da Aliança Atlântica. A Marinha actuou, uma vez mais, ao serviço da política externa do Estado, assumindo funções de grande re-levo na salvaguarda da segurança marítima e da liberdade de navegação. A eficácia das actuações das unidades navais empenhadas e a acção de comando da SNMG1 foi una-nimemente reconhecida, atestando do brio e da qualidade dos homens e mulheres que servem sob o “botão de âncora”, fazendo cumprir, no mar, a Marinha.

(Colaboração do COMANDO NAVAL)

Notas1 Tipo de embarcação utilizada por alguns países da

região, como a Índia e o Iémen, e que é utilizada prin-cipalmente para transporte de carga e para pesca.

2 Pequena de embarcação com casco de fibra, tradi-cionalmente ligada à pesca, mas que também é muito utilizada pelos piratas nos seus ataques.

3 Visita conduzida com autorização do Comandante ou Mestre do navio ou embarcação.

4 AIS (“Automatic Identification System”) – sistema que permite o intercâmbio de informação diversa entre navios nomeadamente, identificação, rumo e velocida-de, tipo de carga transportada e porto de destino.

5 A comuna italiana é a unidade básica de orga-nização territorial da Itália, equivalente ao concelho em Portugal.

8 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

Cerimónia da Entrega de Comando.

O Ministro da Defesa Nacional usando da palavra.

O CALM Pereira da Cunha e o novo Comandante da SNMG1, Comodoro Christian Rune.

O Ministro da Defesa Nacional cumprimenta o Comandante do navio, CMG Nobre de Sousa.

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Entre os dias 16 e 17 de Dezembro de 2009, uma delegação do Estado-Maior- General das Forças Armadas (EMGFA) e dos três

Ramos, Marinha, Exército e Força Aérea visitou as Forças Nacionais Destacadas (FNDs) no Afeganis-tão. A delegação era chefiada pelo MGEN Martins Ribeiro do EMGFA e incluía o Comandante do Cor-po de Fuzileiros, CALM Cortes Picciochi, da Mari-nha e, outros Oficiais representando o EMGFA, o Exército e a Força Aérea. Encontram-se em missão no Afeganistão 104 militares portugueses dos três Ramos das FAs, dos quais 35 da Marinha, sendo 29 Fuzileiros.

Em pouco mais de 24 horas, o Comandante do Corpo de Fuzileiros, CALM Cortes Picciochi, teve oportunidade de inteirar-se acerca dos tra-balhos que estão a ser realizados pela Equipa de mentores da Operational Mentor and Liaison Team (OMLT) GSU, que assessoria a Garrison HQ do Corpo de Exército 201 em Pol-e-Charki, pela Equipa de mentores da OMLT KCD, que presta assessoria à Kabul Capital Division (KCD), pelos militares do Destacamento médico português, em serviço em Kaia no Hospital Mul-tinacional ROLE 3 e, pelos militares do Módulo de Apoio, que asseguram tarefas ao nível da manutenção, das comunicações e de Force Protection.

Foi um Programa de Visita intenso, tendo permitido ao Comandan-te do Corpo de Fuzileiros estar com todos os militares Fuzileiros e da Marinha em missão no Afeganistão bem como contactar com diversas entidades da International Security Assistance Force (ISAF/NATO) e do Exército Afegão.

No âmbito deste Programa teve a oportunidade de visitar Camp Wa-

rehouse, a KCD e o Hospital Multinacional ROLE 3 em Kaia.

Em Camp Warehouse o Comandante do Corpo de Fuzileiros contactou com os militares Fuzilei-ros e da Marinha que integram a 4ª OMLT GSU e o Módulo de Apoio. Acompanhou as rotinas e apercebeu-se das dificuldades, dos riscos e dos desafios dos “marinheiros” que estão em missão, permitindo assim ficar com uma nova perspectiva acerca do que verdadeiramente se faz no Teatro do Afeganistão. No final dirigiu algumas palavras de

incentivo e apreço a todos os Fuzileiros e militares da Marinha, desejando votos de continuação de uma boa missão e de um Bom Ano 2010.

Na visita à KCD foi reconhecido o trabalho desenvolvido pelos militares portugueses e, os rasgados elogios a Portugal foram uma constante. A KCD é a principal responsável pela segurança na cidade e província de Cabul.

No Hospital Multinacional ROLE 3, em Kaia, visitou as instalações e constatou a importância do Destacamento médico português para o bom funcionamento deste Hospital. Portugal tem o 2º maior contingente em missão, 16 militares dos 3 Ramos das FAs, dos quais 5 são da Marinha, prestando apoio permanente em cuidados de saúde aos militares da ISAF, do Exército do Afeganistão e à população carenciada da cidade de Cabul.

O Programa da Visita da delegação culminou com um almoço em Kaia, onde estiveram presentes os Comandantes das FNDs, onde de seguida fo-ram trocadas algumas lembranças.

(Colaboração do COMANDO DO CORPO DE FUZILEIROS)

Visita do Comandante do Corpo de Fuzileiros às FNDs no Afeganistão

Visita do Comandante do Corpo de Fuzileiros às FNDs no Afeganistão

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10 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

Após um período de três meses de reparação, manuten-ção e abastecimento, o NRP “Sagres” largou de Lisboa no dia 19 de Janeiro de 2010 para uma missão histórica

há muito desejada e esperada. Raros, são os “homens do mar” que não sonham em fazer uma circum-navegação, contudo tal privilégio apenas se encontra ao alcance de muito poucos.

Durante esta viagem de onze meses, o navio e os seus ho-mens irão ter a enorme responsabilidade de fazer com que to-das as metas, propostas e delineadas no início da missão, sejam cumpridas segundo a divisa do Infante D. Henrique, “talant de bien faire” – vontade de bem fazer.

A primeira meta a ser cumprida será a participação nos Fes-tivais de Grandes Veleiros - Velas Sudamérica 2010 - come-morativos dos duzentos anos de independência da Argentina e do Chile. Para tal, a barca irá visitar os mais diversos portos na Argentina, Uruguai, Chile, Peru e Equador. Salienta-se que pela primeira vez irá dobrar o Cabo Horn (23 a 27 de Março de 2010).

Finda a presença no festival, o navio navegará rumo a San Diego (EUA) de forma a estar presente nas comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Será neste porto, onde os cadetes do curso “Padre Fernando

Oliveir a” irão embarcar com vista a colocar em prática os co-nhecimentos apreendidos na Escola Naval.

Tóquio e Tanegashima (Japão) serão outros portos a visitar, marcando assim presença portuguesa nas comemorações dos cento e cinquenta anos do Tratado de Paz, Amizade e Comér-cio entre Portugal e o Japão.

A presença da Sagres na Ásia será aproveitada para estrei-tar as relações entre Portugal e os Países Asiáticos. De todos os eventos previsto nestes países salienta-se a presença da Sa-gres na Expo 2010 em Xangai (China) no período de 17 a 22 de Agosto de 2010. Após esta participação o navio irá visitar os antigos territórios nacionais (Macau, Díli e Goa) de forma a contactar com o público em geral e em especial com as fortes comunidades Portuguesas que ainda se encontram actualmen-te nesses locais. Os cadetes da Escola Naval terminarão a sua viagem de instrução em Macau, voltando para Lisboa a 28 de Agosto de 2010.

O regresso a Lisboa está previsto para 23 de Dezembro de 2010, 8100 horas após a largada, das quais 5700 horas serão passadas no mar.

(Colaboração do COMANDO DO NRP “SAGRES”)

Navio-Escola “Sagres”Volta ao Mundo 2010

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 11

Durante o período de treino próprio, que decorreu entre 5 e 9 de Dezembro de 2009, o NRP “Bartolomeu Dias” efec-

tuou a sua primeira utilização operacional do sonar, Towed Array, Anaconda.

Um Towed Array é um conjunto de hidrofo-nes (no caso do Anaconda, são 270), dispos-tos em linha, rebocados pelo navio e que per-mitem a detecção de fontes de ruído (navios, embarcações, animais) e a sua posterior clas-sificação (tipo de navio, submarino, animal) e identificação (ex.: NRP “Barracuda”).

O Anaconda é um sonar de detecção passi-va que equipa os navios da classe Bartolomeu Dias. Permite a detecção de sinais acústicos com frequências entre os 10 e os 4000 Hz. Constituído por um cabo de reboque com o comprimento aproximado de 2500 metros e por um array (conjunto de hidrofones) com cer-

ca de 313 metros, pode operar até uma pro-fundidade máxima de 700 metros. É do tipo CATAS (Critical Angle Towed Array System) sen-do a profundidade de operação definida pela velocidade do navio e pelo comprimento do cabo de reboque.

De facto, um contacto pode ser classifica-do através do seu ruído próprio que surge, por exemplo, do normal funcionamento dos equi-pamentos essenciais a uma navegação em se-gurança, tais como: propulsão nuclear, diesel ou eléctrica, maquinaria auxiliar, movimento dos lemes ou o simples deslocamento sobre ou debaixo de água.

Esse ruído define uma assinatura acústica, própria de cada navio (fingerprint), sendo assim possível a sua classificação e identificação.

Esta operação decorreu numa área, a sul da costa algarvia, onde passam diariamente diver-

sos navios mercantes e embarcações ligeiras.Na área encontrava-se também o NRP “Bar-

racuda” a efectuar treino próprio. Este facto permitiu uma interacção entre os dois navios e a efectivação de testes operacionais ao To-wed Array.

Os testes contaram com a colaboração do CMG Gouveia e Melo, Comandante da Es-quadrilha de Submarinos, embarcado no NRP “Bartolomeu Dias”.

O Comandante Gouveia e Melo, com a sua vasta experiência na operação de sistemas pas-sivos, permitiu optimizar a operação do equi-pamento e aprofundar os conhecimentos da equipa de bordo.

O equipamento demonstrou ser extrema-mente eficaz e discreto permitindo a detecção a grandes distâncias (mais de 20 milhas).

NRP “BARTOLOMEU DIAS”A primeira utilização operacional

do sonar “Anaconda”A primeira utilização operacional

do sonar “Anaconda”

NRP “BARTOLOMEU DIAS”

PASSEXPASSEX

No passado dia 5 de De-zembro, o NRP “Bar-tolomeu Dias” largou

da BNL para mais uma mis-são com o objectivo, entre ou-tros, de efectuar um exercicio de treino com uma força na-val francesa que se encontrava de passagem por águas nacio-nais. Estes exercícios de opor-tunidade (designados por PAS-SEX na terminologia NATO) são comuns e proporcionam treino naval em várias áreas. Contribuem para uma melhor relação e conhecimento entre marinhas e para o fortaleci-mento da camaradagem entre todos os que andam no mar.

Nesta saída, a força naval que efectuou o trânsito em direcção a Casablanca era constituída pelo porta-helicópteros “Jeanne D’Arq” (agora navio-escola) e pela fraga-ta “Courbet” da classe Lafayette. Após um exercício de luta anti-superfície nocturno (muito apreciado pelos cadetes embarca-dos no “J eanne D’Arq”), foram efectuados exercícios variados que incluíram aproxi-mações RAS e exercícios de morse lumino-so. Aproveitando o facto de ambos os navios terem helicópteros orgânicos, foi combinado efectuar uma troca de elementos (2 oficiais e 1 sargento) entre a “Bartolomeu Dias” e o “Jeanne D’Arq”, tendo-se esta oportunidade

revelado excelente para conhecer mais inti-mamente a Marinha francesa e a sua organi-zação. Este último evento permitiu também ao navio operar pela primeira vez com aero-naves do tipo Alouette III e Gazele.

Após mais uma série de exercícios foram efectuadas as despedidas e o navio seguiu para mais um dos objectivos desta missão: operar com o sonar passivo Anaconda - ti-rando partido do facto de se encontrar a na-vegar o submarino “Barracuda”. Esta nova experiência para a guarnição (e para a Ma-rinha Portuguesa) desempenhou um factor de motivação e de empenho para todos que directa ou indirectamente contribuiram para alcançar os objectivos finais.

Em resposta a uma avaria inopinada do

Lynx, foi necessário testar o apoio logístico. Após umas curtas diligências, foi possível num curto espaço de tempo fornecer o artigo necessário a repor a operacionalidade deste importante meio: helicóptero continuou a desempenhar um papel central no treino próprio do navio.

De uma forma constante as várias áreas foram sendo treina-das. Foi efectuado, entre outras acções de treino, passagem a postos de emergência, exercí-cios de limitação de avarias, de homem ao mar, palestras diver-

sas, simulacros de emergência médica e de avaria na propulsão, diversos carregamentos de armas e tiro com a peça de 76mm. Objec-tivo? Treinar o maior número de padrões de prontidão possíveis, dentro o tempo disponí-vel, dando especial atenção à integração dos elementos mais recentes da guarnição.

Quando no dia 9 de Dezembro o navio se fez ao Cais 4S da BNL, após mais de 1000 milhas náuticas percorridas, fê-lo, novamen-te, com o sentimento de dever cumprido e com a consciência de mais um passo dado no sentido de maximizar a eficiência de uti-lização, em todos os ambientes, do navio.

(Colaboração do COMANDO do NRP “BARTOLOMEU DIAS”)

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12 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

PólosREFERÊNCIAS GEOGRÁFICAS 5

Os lugares que designamos como pólos1 geográficos resultam da intersecção da linha fictícia que constitui o eixo de ro-

tação da Terra com a superfície do planeta. É nos pólos que convergem todos os meridianos, sen-do igualmente os lugares onde a latitude atinge o valor máximo, 90 graus Norte ou Sul. Conquanto possa à primeira vista parecer estranho, para uma pessoa que esteja exactamente sobre o Pólo Nor-te2, tudo quanto se encontra à sua volta está a Sul, pelo que esta é a única direcção que existe partir daquele ponto3.

A estrela Polar4, que se constitui actualmente como a grande referência no que respeita aos aspectos da orientação nocturna no hemisfério Norte, deve o seu nome ao facto de se encontrar muito próxima do Pólo Norte Celeste, ponto imaginário em torno do qual aparenta girar o céu noc-turno setentrional. No entanto, devido ao movimento de precessão5 do eixo da Terra, o Pólo Norte, tal como sucede com um pião a girar, descreve igualmente um trajecto quase circular em torno de um ponto médio6, dele distando um valor angular que coincide com a inclinação da órbita em relação à Eclíptica, isto é, cerca de 23,5 graus. O ciclo de preces-são, que tem uma duração de cerca de 25.780 anos, faz com que o astro mais próximo do Pólo Norte não seja o mes-mo ao longo do tempo, pelo que, em determinadas épocas, não haverá ne-nhuma estrela suficientemente próxima para efeitos da obtenção da latitude de forma expedita7. Neste particular, recor-damos que em meados do século XV a declinação da estrela Polar era aproxima-damente 86,5 graus, pelo que a determi-nação da respectiva altura nem sempre conduzia, de imediato, à latitude do lu-gar. Para o efeito, e na maior parte dos casos, havia que proceder a um cálculo simples, tendo como base o estabelecido na regra empírica conhecida como Regimento do Norte.

Ainda no que respeita à estrela Polar, a sua de-clinação continuará a aumentar até cerca do ano 2100, o que significa que até lá se aproxima do Pólo Norte8. Por essa altura atingirá o valor máxi-mo, próximo dos 89,5 graus, afastando-se progres-sivamente a partir de então.

Como é sabido, em relação ao Pólo Sul não existe nenhuma estrela próxima, o que, convém recordar, acarretou problemas no que concerne ao posicionamento dos navios quando os Portugue-ses se estrearam a navegar no hemisfério Sul, na segunda metade do século XV. O Sol, cuja altura da passagem meridiana cedo se constituiu como elemento chave para a determinação da latitude em ambos os hemisférios, obriga a um cálculo onde intervêm a declinação do astro e a altura observada (a) ou, mais frequentemente, a distân-cia zenital ( )9.

No hemisfério Sul, ainda antes de 1500, co-

meçou também a ser utilizada como referência a constelação10 do Cruzeiro do Sul, designadamen-te as estrelas Acrux e Gacrux em passagem meri-diana, muito embora estas se encontrem bastante afastadas do Pólo11. De referir que a famosa missi-va redigida por Mestre João a D. Manuel, em Por-to Seguro, a 1 de Maio de 1500, é o documento onde pela primeira vez aparece a representação gráfica desta famosa constelação, aí identificada como «la crus».

Ao mencionado ciclo de precessão, sobrepõem--se, ainda, o movimento de Nutação Astronómica e um outro conhecido como Círculo de Chandler.

O primeiro, a que já nos referimos anteriormente, é provocado pela acção do campo gravítico da Lua sobre a Terra, sendo o seu ciclo de 18,6 anos12. Desta ténue oscilação do eixo da Terra, resulta uma minúscula elipse, cujos semi-eixos medem, ape-nas, cerca de 9,21 e 6,86 segundos de arco13.

Relativamente ao segundo movimento, cujo período varia entre os 416 e os 435 dias, deve o seu nome ao astrónomo norte-americano Seth Chandler (1846-1913), que em 1891 identificou esta subtil oscilação do eixo da Terra, tendo como base os estudos desenvolvidos pelo matemático suíço Leonhard Euler (1707-1783), em 1758, bem como as observações astronómicas realizadas em 1884 pelo astrónomo alemão Friedrich Küstner (1856-1936)14.

Devido à existência de um núcleo ferroso no seu interior, a Terra, além dos pólos geográficos, dispõe também de pólos magnéticos, que não coincidem com os primeiros. Estes constituem os pontos através dos quais, tal como num íman, fluem as linhas de força do campo magnético ter-restre. No seu conjunto, estas linhas de força dão

forma ao escudo conhecido como magnetosfera, que protege a vida da componente nefasta da ra-diação solar.

Contrariamente ao que sucede com o eixo de-finido pelos pólos geográficos, que passa exacta-mente pelo centro da Terra e cujos extremos ocu-pam posições opostas na superfície terrestre, a linha imaginária que une os pólos magnéticos, que não são antípodas, passa a uns 530 Km daquele local. De resto, o Pólo Norte magnético ( =82º 42’ N; L=114º 24’ W) dista, presentemente, cerca de 900 Km do Pólo Norte geográfico, ao passo que o Pólo Sul magnético (● – =64º 53’ S; L=137º

86’ E) se encontra 2.800 Km afastado do Pólo Sul geográfico.

Como é sabido, as agulhas magnéti-cas ou bússolas alinham-se com o cam-po magnético terrestre, apontando, não fora a existência de outras influências, na direcção do Pólo Norte magnético. No entanto, devido a perturbações mag-néticas que variam de lugar para lugar, em grande medida fruto da existência de elementos ferrosos na composição da crosta terrestre, na realidade a agulha magnética aponta numa direcção que não é exactamente o Norte magnético. Surge assim o conceito de declinação magnética (D), que expressa o ângulo, num determinado local e momento, en-tre o Norte geográfico e o Norte magné-tico, valor esse que não só varia de lugar para lugar, mas também ao longo do tem-po15. À linha que une lugares com igual declinação magnética dá-se o nome de isogónica ou isógona16. No caso particu-lar da linha que une pontos da superfície terrestre com declinação magnética nula, isto é, os lugares onde o Norte magnético coincide com o Norte verdadeiro, esta re-cebe o nome de linha agónica17. Embo-

ra não se saiba quem descobriu a existência des-te fenómeno, o certo é que os pilotos Portugueses do século XV já tinham em conta esta grandeza, designadamente na longa volta pelo Atlântico Sul, no sentido de terem uma ideia da distância a que os seus navios se encontravam do cabo da Boa Esperança. Isto porque um pouco a leste daquele mítico lugar, passava, naquela época, uma linha agónica, num local que, coerentemente, foi bap-tizado como cabo das Agulhas18.

Quanto à chegada do Homem aos lugares ex-tremos que constituem os pólos, ela só se verificou no século XX. Convém em qualquer dos casos su-blinhar, que o Pólo Norte se situa sobre a calota de gelo do Oceano Glacial Árctico, podendo dizer-se que está praticamente ao nível do mar. Contu-do, o Pólo Sul encontra-se em pleno continente da Antárctida, a uma altitude de 2.835 metros, o que, só por si, justifica as maiores dificuldades para o alcançar.

Embora envolto em alguma polémica, tudo in-dica que tenham sido o Comandante Robert Pea-ry (1856-1920) e Matthew Henson (1866-1955),

Pólos

Os movimentos do eixo da Terra.

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acompanhados por quatro esquimós, os primei-ros exploradores a alcançar o Pólo Norte, no dia 6 de Abril de 1909. O primeiro sobrevoo do Pólo Norte foi efectuado a 9 de Maio de 1926, pelo Comandante da Marinha dos Estados Uni-dos Richard Byrd (1888-1957) e pelo pilo-to Floyd Bennett (1890-1928), a bordo de um trimotor Fokker. Quanto a submarinos, o primeiro a passar no Pólo Norte foi o USS “Nautilus”, a 3 de Agosto de 1958, enquan-to o primeiro a emergir naquele local foi igualmente um submarino nuclear norte-americano, o USS “Skate”, no dia 17 de Março de 195919. Prosseguindo em termos de estreias, a 3 de Maio de 1952, um avião C-47 Skytrain, onde seguiam o Coronel Jo-seph Fletcher, o Tenente William Benedict e o cientista Albert Crary, foi a primeira aero-nave a aterrar no Pólo Norte. Por seu turno, o primeiro navio a chegar àquele local seria o quebra-gelo nuclear soviético “Artika”, no dia 17 de Agosto de 1977.

Relativamente à corrida para alcançar o Pólo Sul, esta deixaria as suas marcas. De facto, depois do Comandante Robert Peary se ter antecipado ao norueguês Roald Amundsen (1872-1928) relativa-mente ao Pólo Norte, este apostou tudo na corrida ao Pólo Sul, na qual também se envolveu o rival inglês Robert Scott (1868-1912). Iniciada a viagem a 20 de Outubro de 1911 com trenós puxados por cães, Amundsen chegaria com a sua equipa ao Pólo Sul no dia 14 de Dezembro. Regressaram a 25 de Janeiro ao local donde haviam partido três meses antes, depois de percorrer cerca de 3.000 Km. Presume-se que o grupo liderado por Scott, seguindo um trajecto identificado por Sir Ernest Shackleton (1874-1922), tenha atingido o Pólo Sul a 17 ou 18 de Janeiro de 1912, um mês depois de Amundsen lá ter estado. No entanto, nenhum deles sobrevi-veu ao frio e à falta de comida, tendo todos falecido na viagem de regresso ao acampa-mento de base.

Em homenagem aos dois intrépidos ex-ploradores, a estação científica norte-ameri-cana do Pólo Sul foi baptizada com o nome Amundsen-Scott, sendo o local habitado ( =89º 59’.8 S; L=139º 16’.4 E) mais próxi-mo daquele pólo.

Richard Byrd (1888-1957), oficial da Marinha dos Estados Unidos, foi o primei-ro a sobrevoar o Pólo Sul, no dia 29 de Novem-bro de 1929. Resta acrescentar, no entanto, que o ponto mais inacessível e inóspito da Antárctida (● – =82º 06’ S; L=54º 58’ E) se situa a cerca de 880 Km do Pólo Sul, a uma altitude de 3.718 metros. Foi pela primeira vez alcançado a 14 de Novembro de 1958, por uma expedição sovié-tica liderada por Yevgeny Tolstikov (1913-1987), que no local deixou um busto de Vladimir Leni-ne (1870-1924).

Em virtude do achatamento20 que se verifica nestas regiões, a forma da Terra, a exemplo do que sucede com todos os planetas, também não é uma esfera perfeita21. Embora conhecido como acha-tamento dos pólos, na realidade este fenómeno consiste antes de mais na dilatação da região do Equador, em grande medida causado pelo movi-mento de rotação do planeta, devido à maior for-ça centrífuga que aí se regista, além da força de atracção, em menor escala, provocada pelo Sol,

pela Lua e pelos planetas mais próximos. Em con-sequência disso, o raio da Terra oscila, aproxima-damente, entre os 6.378 Km, na região do Equa-dor, e os 6.357 Km, nos pólos.

Quando aplicadas ao Sol, cuja declinação varia ao longo do ano, as noções de astro circumpolar visível e astro circumpolar invisível atingem nos pólos os seus limites, encontrando-se na origem, naqueles lugares, da conhecida alternância entre seis meses dia e seis meses noite. Com efeito, no Pólo Norte é sempre dia no período compreendi-do entre o equinócio de Março e o equinócio de Setembro, ao passo que no período remanescen-te o Sol está continuamente abaixo do horizonte. Como se depreende, no Pólo Sul ocorre a situação

inversa, sendo de sublinhar que apenas em torno dos equinócios o Sol é visível, em simultâneo, em ambos os pólos da Terra.

António Manuel GonçalvesCTEN

[email protected]

Notas:1 Do grego pólo, que significa eixo em torno do qual

gira qualquer coisa.2 O mesmo que Pólo Norte verdadeiro ou Pólo Nor-

te geográfico.3 Para um observador no Pólo Sul verifica-se o in-

verso.4 A estrela Polar, também conhecida como estrela do

Norte, é a estrela da constelação Ursa Menor. Na reali-dade, o pequeno ponto luminoso a que chamamos estrela Polar é constituído por um par de estrelas super gigantes situadas a uma distância de 430 anos-luz, cuja luminosi-dade é 2.500 vezes maior do que a do Sol. A designação radica no latim medieval polaris, muito embora só em me-ados do século XVI tenha entrado no nosso léxico, através

do francês polaire. O termo «polar» é usado para caracte-rizar algo que se situa num pólo.

5 Em bom rigor, trata-se do movimento circular uni-forme do pólo da esfera celeste, no sentido este-oeste, em torno do pólo da Eclíptica. Em consequência disso,

o Ponto Vernal também se desloca, fazendo com que as coordenadas equatoriais celestes dos astros variem, muito lentamente, ao longo do tempo. O Ponto Vernal desloca-se sobre a Eclíptica, no sen-tido retrógrado, cerca de 50 segundos de arco por ano. Esta retrogradação do Ponto Vernal faz com que a data em que o Sol entra em cada constelação do Zodíaco seja sucessivamente antecipada, isto é, as estações do ano iniciam-se cada vez mais cedo. Como consequência, daqui a cerca de 13.000 anos o solstício de verão no hemisfério Norte ocorrerá em Dezembro. Por essa altura, a estrela Vega será a mais próxima do Pólo Norte. Este fenómeno é também conhecido como Precessão dos Equinó-cios. O termo radica no latim praecessio, que é a acção de preceder.

6 Também conhecido como Pólo da Eclíptica.7 Foi o astrónomo grego Hiparco (190-126 a.C.)

quem descobriu o fenómeno da precessão em 129 a. C.. No entanto, foi preciso esperar até 1543 para que Nicolau Copérnico (1473-1543) explicasse

que este era uma consequência da mudança de dire cção do eixo da Terra.

8 Actualmente a declinação da estrela Polar é 89º 18’ N.9 Trata-se da coordenada horizontal que corresponde ao

ângulo entre o zénite e o astro, medido no seu círculo verti-cal, que é complementar da altura, isto é, ( = 90º – a).

10 Radica no latim constellatio, que significa estado do céu, mas também posição relativa das estrelas ou plane-tas no céu.

11 Acrux ( = 63º S) e Gacrux ( = 57º S).12 Foi o astrónomo britânico James Bradley (1693-1762)

quem em 1729 descobriu o movimento a que deu o nome de Nutação Astronómica, que aparece muitas vezes desi-

gnado de forma abreviada como movimento de nutação.

13 1 grau = 60 minutos de arco e 1 minuto de arco = 60 segundos de arco.

14 Os semi-eixos da elipse resultante deste movi-mento têm 0,7 e 0,5 segundos de arco.

15 Por definição, a declinação magnética, que ex-pressa o ângulo entre o Norte magnético e o Norte Verdadeiro, tem sinal leste se o primeiro se situa a les-te do Norte Verdadeiro, ou sinal oeste sempre que o Norte Magnético fica a oeste daquela referência.

16 O significado é «com o mesmo ângulo».17 Em geometria chama-se agónico a algo que

não forma ângulo. Deriva do grego ágonios, que significa não anguloso.

18 O nome deve-se ao facto de nas suas proxi-midades as agulhas magnéticas indicarem o Norte Verdadeiro. No planisfério dito de Cantino aparece um golfo das Agulhas, mas não o cabo.

19 No Pólo Norte o mar tem uma profundidade de 4.261 metros.

20 O achatamento de uma elipse varia entre 0 (círculo) e 1 (segmento de recta), sendo dado pela fór-mula f = (a – b) / a, em que a e b são, respectivamente, o comprimento dos semieixos maior e menor. Também a órbita da Terra é uma elipse – a exemplo do que su-cede com as órbitas de todos os astros –, mas a sua ex-centricidade é muito pequena (e = 0,01675), pelo que é quase circular.

21 A forma da Terra é definida por recurso ao modelo físico denominado geóide. Trata-se de uma superfície de nível que coincide, aproximadamente, com o nível médio do mar. No entanto, devido aos acidentes orográficos dos continentes, subsistem grandes diferenças entre o geóide e os modelos elipsoidais da Terra, também conhecidos como elipsóides de revolução. No sentido de permitir o posicio-namento global, foram desenvolvidos modelos matemáti-cos com a forma e dimensões tão próximas quanto possível das da Terra, nomeadamente o elipsóide Hayford 1909 e o World Geodetic System 1984, vulgo WGS 84. Este último é presentemente o datum geodésico mais utilizado pelos sistemas electrónicos de posicionamento global, como é o caso do GPS. Recordamos que em geodesia, o datum consiste num conjunto de parâmetros que constituem a referência de um sistema de coordenadas geográficas.

REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 13

Trajectória do Pólo Norte magnético ao longo do tempo.

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O Pólo Sul Magnético (●) e ponto mais inacessível da A ntárctida (●), bem como os caminhos percorridos pelas expedições de Amundsen (–) e Scott (–).

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14 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

A MARINHA DE D. SEBASTIÃO (6)

A expedição ao reino de Jaffna (Jafanapatão)A expedição ao reino de Jaffna (Jafanapatão)

Terminadas as chuvas da monção de 1560, D. Constantino de Bragança leva-va já dois anos de governo na condição

extraordinária de vice-rei, inerente à sua alta estirpe. Nunca a Índia vira de perto uma fi-gura de tão elevada nobreza, sendo de realçar que essa condição lhe permitiu uma autorida-de que não seria fácil noutras condições. Mas o mandado aproximava-se do fim. Era pre-visível que no ano seguinte chegasse alguém para o substituir, e a entrega de poder teria lugar sob o espectro de uma problema grave para resolver no sul do Indostão, onde não se conseguira dominar o permanente estado de guerra alimentada pe-las comunidades mu-çulmanas e apoiada pelo Samorim. Havia, contudo, um outro foco de instabilidade na ilha de Ceilão, arrastando--se há décadas um as-sunto que já merecera a intervenção de alguns dos seus antecessores, sempre sem resultados significativos (Marinha de D. João III (46)).

Diogo do Couto, num dos diálogos do seu Soldado Prático, de-senvolve um conjunto de considerações inte-ressantes sobre a situa-ção dessa ilha e a rela-ção que poderia ter com o poder português na Índia. O texto está fei-to de forma muito inteligente, colocando na boca de um experiente “soldado” da Índia, em conversa com um “vice-rei”, a observação de que a guerra de Ceilão “é mais longa que perigosa”, sendo melhor que quem governa a Índia nela se empenhasse durante dois ou três anos, de forma permanente, com dois ou três mil homens, em vez de enviar expedições de três meses com sete ou oito mil. Mas acrescenta que nada disso se poderá fazer, porque teme o governante ficar dois anos “fora da Índia, e a sotavento dela”, sempre sob a ameaça do “nor-te”, seja directamente sobre Goa, seja sobre o conjunto de todos os interesses portugueses na península. Diz ainda que nenhum vice-rei o fará porque sabe que o seu mandato é de três anos, tempo em que deverá colher os be-nefícios pessoais que não obterá numa guerra prolongada. Provavelmente, Diogo do Couto toca no ponto fulcral da questão que se prende, não só com a guerra de Ceilão, como com toda a pirataria que prolifera na costa do Malabar. Tratava-se de um problema que exigia uma

acção prolongada e persistente, a exigir a pre-sença e o comando directo de quem governa-va a Índia, obrigando o vice-rei a prescindir de alguns proveitos e riquezas, mas afastando-o também dos territórios do norte durante muito tempo, concentrando demasiados meios numa posição táctica desfavorável, em relação aos inimigos que se tinham revelado mais pode-rosos e ameaçadores. Repare-se que durante a estação seca – quando se pode navegar – os ventos predominantes são de norte e nordes-te, e quem está a sul está sempre a sotavento e em desvantagem para qualquer combate. Se

“Diu está a barlavento de toda a Índia” e daí lhe vinha a sua importância estratégica – como realçava Lopo de Sousa Coutinho –, todo o sul e especialmente Ceilão ficava a sotavento, com todos os inconvenientes que isso tinha.

A ilha, porém, produzia grande quantidade de canela e tinha um lugar privilegiado para o domínio das rotas que iam e vinham de Ma-laca e, sobretudo, de acesso à costa do Coro-mandel, onde havia algumas comunidades cristãs que requeriam a protecção portuguesa. Além disso, existiam ali pequenos potentados que se fizeram aliados dos portugueses, facili-tando a exploração da canela, mas exigindo o apoio militar numa guerra desgastante e dis-pendiosa. Foram talvez estes os factores que D. Constantino pesou quando decidiu levar a cabo uma intervenção de monta em Ceilão. Ele próprio explica numa carta que escreveu à regente Dona Catarina que pretendia tomar conta da ponta norte, fechando o acesso ao continente e preparando o terreno para aí se estabelecerem os cristãos de S. Tomé e da Cos-

ta da Pescaria. Ou seja, a guerra que afronta-va a região de Colombo há anos seria vencida cortando a principal via de reabastecimento dos inimigos, através de uma operação anfí-bia que permitisse a tomada e ocupação de Jafanapatão, colocando aí uma fortaleza que, entre outras coisas, conferiria as condições de segurança necessárias ao estabelecimento das comunidades cristãs.

A armada saiu de Goa em Setembro de 1560, com destino ao sul. O vice-rei ia embarcado numa das 12 galés, a que se juntavam “dez galeotas, e setenta navios de remo, antre fus-

tas e catures”. Entrou em C ochim, onde o bis-po D. Jorge Temudo se juntou a ela, com uma galeota, e seguiram em direcção ao Cabo Co-morim e ao Golfo de Mannar. As galés não podem passar nos bai-xos da Ponte de Adão (Adam’s Bridge) e, por isso, foram mandadas de regresso ao norte, transferindo-se o pesso-al para as embarcações mais miúdas. O de-sembarque teve lugar na noite de 8 para 9 de Outubro, com algumas dificuldades causadas pela falta de conheci-mento do terreno e dos canais de acesso a terra, pelo meio dos múlti-plos baixos e escolhos. Um dos objectivos era

a captura do rei de Jaffna, obrigando-o a um exercício de poder tutelado, sob a vigilância de um capitão português, mas esse foi o primei-ro de vários incidentes que não correram de feição aos portugueses. A resistência foi mais forte do que pensara D. Constantino e o rei, quando se apercebeu que não conseguia de-ter o ataque português, mandou pôr fogo ao palácio e retirou para o mato. Depois disso, os nossos sofreram mais flagelações que não lhe permitiram ficar em segurança na península, preferindo retirar para a pequena ilha de Man-nar (vide fig.) onde foi feita a fortaleza. O vice--rei apressou-se a regressar a Cochim, pensan-do que era preciso dar instruções para carregar a armada para o reino, fazendo-a seguir em meados de Janeiro com a dita carta à regente Dona Catarina, onde relatava com pormenor a empresa de Jafanapatão e algumas das cir-cunstâncias que a determinaram.

J. Semedo de MatosCFR FZ

Mapa da ilha de Ceilão, orientado com o norte para a esquerda da figura, onde se pode ver a cidade de Jafanapatão.“Livro de Plataforma das Fortalezas da Índia”.

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 15

Duas Viagens de Instrução à Volta do Mundo

1910 e 1960

Duas Viagens de Instrução à Volta do Mundo

No século XX foram reali-zadas duas

viagens de instru-ção à volta do mun-do, separadas en-tre si por cinquenta anos. Ambas foram realizadas em perío-dos conturbados da vida nacional, ante-cedendo importan-tes acontecimentos na nossa História, marcantes para os Portugueses: a pri-meira, iniciada em finais de Dezembro de 1909, cerca de um ano antes da mudan-ça de regime político em Portugal, passando de Monarquia a República, foi protagonizada pelo cruza-dor “S. Gabriel”; a segunda, realizada em 1960, num período em que eram previsí-veis conflitos nos territórios ultramarinos, foi concluída em Julho do mesmo ano, cerca de um ano e meio antes da invasão da Índia Portuguesa pela União Indiana. Nesta viagem participaram os Avisos de 1ª Classe “Afonso de Albuquerque”, (de Lisboa a Goa), e “Bartolomeu Dias”, (de Goa a Lisboa).

A guarnição do “S. Gabriel” e os as-pirantes embarcados realizaram uma V iagem de Circum-Navegação. Na via-gem realizada em 1960 nenhuma das g uar nições dos dois navios efectuou a via-gem completa: apenas realizaram a via-gem de volta ao mundo os 48 cadetes do curso “D. Lourenço de Almeida”, os pro-fessores da Escola Naval que os acompa-nharam e um sub-tenente.

Dos muitos portos visitados pelos na-vios que participaram nas duas viagens de circum-navegação apenas oito foram visitados pelo cruzador “S. Gabriel” e pelo aviso de 1ª classe “Afonso de Albu-querque”: Panamá, S. Francisco, Honolu-lu, Yokoama, Hong-Kong, Macau, Singa-pura e Goa.

VIAGEM DE 1909/1911

O cruzador “S. Gabriel” largou de Lisboa em 11 de Dezembro de 1909 e regressou em 20 de Abril de 1911, 16 meses e nove dias de-pois, tendo percorrido 41.981 milhas.

Só em 29 de Outubro, estando funde-ado em Dili, antes de suspender, é que o

comandante mandou içar a nova bandei-ra nacional – republicana, com uma salva de 21 tiros.

VIAGEM DE 1960

A viagem de 1960, estando inserida nas comemorações do V Centenário da Morte do Infante D. Henrique, foi realizada com um duplo objectivo: por um lado, contac-tar as comunidades portuguesas espalha-

das pelo Mundo, há muitos anos longe da sua Pátria, que contavam já com muitos descenden-tes nascidos nessas terras longínquas, mas que nunca dei-xaram de se sentir portugueses; por outro, proporcionar aos cadetes do 2º ano da Escola Naval o necessário treino de mar estabeleci-do no seu currículo escolar.

O objectivo da via-gem e o simbolismo que a envolvia, no

ano em que ocorriam as Comemorações Henriquinas, foram salientados pelo Mi-nistro da Marinha, Almirante Fernando Quintanilha Mendonça Dias, na alocução que proferiu a bordo do “Afonso de Albu-querque”, fundeado no Tejo, no dia 18 de Março de 1960, momentos antes da larga-da para a viagem, na qual se dirigiu aos

Aviso “Bartolomeu Dias”

Estiveram embarcados os 14 Aspi-rantes da Escola Naval a seguir in-dicados:

Aspirantes de marinha- Mário Sena Barcelos Nascimento- Fernando de Oliveira Pinto- Luís Augusto M. Ferreira de Castro- Francisco Penteado- Eugénio de Barros Soares Branco- Henrique Owen Pinto- Armando Perestrello Botelheiro- Raúl Queimado de Sousa- Fernando Fábio Teixeira Diniz- Carlos Frederico Elston Dias

Aspirante de 1ª classe a maquinista naval - Artur Caetano Dias

Aspirante a maquinista de 1ª classe - João Sequeira de Castro

Aspirantes a maquinista de 2ª classe- Aníbal José de Figueiredo Júnior - Alberto Dias da Silva

Aviso “Afonso de Albuquerque”

Cruzador “S. Gabriel”

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cadetes da seguinte forma: “Comemoran-do-se este ano o V Centenário da morte do Infante D. Henrique quis aproveitar mais uma oportunidade para assinalar o acon-

tecimento aproveitando o treino de mar que os cadetes do 2º ano da Escola Naval têm de efectuar, transformando-o numa viagem de circum-navegação.”

“Durante a viagem que ides iniciar, en-contrareis, espalhados em diversos pontos, grupos populacionais – Colónias Portu-guesas - e em todos eles vereis que, apesar

16 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

Participaram nesta viagem 3 professores da Escola Naval, 1 Oficial AN e os 48 Cadetes do 2º ano da Escola Naval do Curso “D. Lourenço de Almeida”:- Capitão-Tenente Eugénio Eduardo da Silva Gameiro- 1º Tenente António Cid de Jusarte Lopes Jonet - 1º Tenente Carlos Alberto de Oliveira Lemos- Sub-Tenente AN Rogério Henrique de Matos Rodrigues

Cadetes Classe de Marinha:- José Baião do Nascimento- João Leite de Novais- António Oliveira Bento- Alfredo Ribeiro Reis- Alexandre da Silva Anacleto- Carlos Mota dos Santos- António Sarmento Coelho- José Manuel Baptista da Silva- António Santarém da Cruz- Pedro Monteiro Fiadeiro- Nelson Ventura Trindade- José Manuel Silva Dias- Manuel Dias Figueiredo- Augusto Catarino Salgado- Adolfo Esteves de Sousa- Carlos Alberto Ferreira Gonçalves- Luís Amaro de Oliveira- Luís Medeiros Ferreira- Fernando Bernardino Pinto- Edgar Machado Ramos- Rodrigo Mennig Pombeiro

- Elder Martins Viegas- José Jorge Carvalho Pereira- Adriano Beça Gil- Romeu Bentes Marcelo- José Manuel de Oliveira Monteiro- Eduardo Nogueira de Magalhães- José Alexandre Duarte Reis- José Júlio Abrantes Serra- Artur Junqueiro Sarmento- José Rodrigues de Oliveira- Carlos Alberto Fernandes Maia- Luís Tenório de Figueiredo- Luís Vidigal Aragão Classe de Engenheiros Maq. Navais - João Duarte Filipe- Luís Roque Martins- Domingos Mateus Guerreiro- Guilherme Castro Pacheco- Carlos Nelson Silva Sousa- José Manuel Socorro Domingues- João Lourenço Leite de Castro- João Azevedo Antunes- Carlos Maldonado Machado- Júlio Silva Coelho- Jorge Santana da Silva- Sérgio Cruz Ferreira

Classe de Administração Naval- José Leal Camões Godinho- José António Aguiar Cardoso

S. Francisco - 1910 S. Francisco - 1960

Honolulu - 1910 Honolulu - 1960

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de há muitos anos longe da sua Pátria, e alguns deles por lá terem nascido, nunca deixaram de ser portugueses…”

Terminou dizendo:” Eu não queria deixar de vos entregar um roteiro espiritual para esta viagem. Mais tarde, oportunamente, cada um dos cadetes receberá um exemplar de “Os Lusíadas”. … Boa viagem.”

No regresso, o aviso “Bartolomeu Dias” fundeou na Baleeira, junto de Sagres, em 19 de Julho de 1960. Os cadetes do curso “ D. Lourenço de Almeida” desembarca-ram a fim de tomarem parte nas cerimó-nias em honra do Infante D. Henrique, conjun tamente com os cadetes do 1º ano da Escola Naval que os aguardavam.

Nas palavras que dirigiu aos cadetes que terminavam a sua viagem de instrução o Ministro da Marinha reiterou a importân-cia de transformar o treino de mar numa viagem de circum-navegação, permitindo aos cadetes o contacto com as comunida-des de portugueses em terras distantes.

Por seu lado, o Director e 1º Comandante da Escola Naval, Comodoro Manuel Ma-ria Sarmento Rodrigues, manifestou aos cadetes o seu grande apreço pela forma como tinham representado Portugal no estrangeiro e junto das colónias de portu-gueses espalhadas pelo mundo, dizendo: “Regressaram da sua viagem à volta do mundo os cadetes do Curso “D. Lourenço de Almeida” …. “Pelas notícias que foram recebidas dos países visitados pelos navios que conduziram os cadetes, primeiro o avi-so “Afonso de Albuquerque” de Lisboa a Goa pelo Canal do Panamá, e depois o

NRP “Bartolomeu Dias” de regresso pelo Suez, se pode verificar como as autorida-des e gentes estrangeiras amigas aprecia-ram o contacto com os nossos navios e admiraram o porte e correcção das guar-nições. Mas há especialmente que destacar dois aspectos que sobrelevam os outros: o fervor patriótico manifestado pelos portu-gueses ou seus descendentes que habitam vários países estrangeiros e a exemplar e dignificante conduta dos cadetes do curso “D. Lourenço de Almeida”.

A viagem, realizada totalmente no he-misfério norte, demorou 4 meses e 5 dias: largada de Lisboa em 18 de Março de 1960 no NRP “Afonso de Albuquerque” e regresso em 20 de Julho do mesmo ano, no NRP “Bartolomeu Dias”. Foram per-corridas 24.864 milhas em 74 dias de na-vegação.

Esta viagem foi motivo de diversos re-latos escritos de que se destacam “As Me-mórias de uma Viagem de Circum-Nave-gação”, da autoria do cadete Nelson dos Santos Ventura Trindade, apresentado na cerimónia de Abertura Solene do Ano Lec-tivo da Escola Naval, em 28 de Novembro de 1960, e o artigo da autoria do cadete Al-fredo Ribeiro Reis, publicado nesse mes-mo ano na Revista Defesa Nacional. Pos-teriormente, a viagem da Volta ao Mundo foi recordada na Revista da Armada, em artigo da autoria do CALM EMQ Luís Ro-que Martins, publicada na edição de Março de 2000 e no Livro do 50º Aniversário do Curso “D. Lourenço de Almeida”, editado em 2 de Dezembro de 2008.

A viagem realizada proporcionou aos cadetes contactos com marinhas estran-geiras, designadamente dos EUA, da In-glaterra e do Japão, contactos com novas civilizações, culturas e religiões e, em es-pecial, um contacto estreito com as comu-nidades de portugueses espalhadas pelo mundo.

O período de embarque consolidou en-tre todos os cadetes do Curso “D. Louren-ço de Almeida” o humanismo, espírito de grupo e amizade que tem perdurado ao longo dos anos.

DUAS VIAGENS, DUAS ÉPOCAS.

Estas viagens proporcionaram aos futu-ros oficiais um intenso treino de mar e o contacto com a vida a bordo. Proporciona-ram, igualmente, o contacto com diferentes povos e culturas, o encontro com comuni-dades de portugueses nos mais longínquos lugares no mundo e revisitar o legado dos nossos antepassados navegadores em ter-ras do Oriente.

Estas viagens comprovaram ainda a im-portância das missões de presença naval, para divulgação e prestígio do País no es-trangeiro, e para o estreitamento das rela-ções com as comunidades de portugueses espalhadas pelos cinco continentes.

(Colaboração do CURSO D. LOURENÇO DE ALMEIDA)

Agradecimento: Ao Luís Gomes pela oferta dos postais da “Volta ao

Mundo” de 1910, que serão enviados para o Arquivo de Marinha.

Hong-Kong - 1910 Hong-Kong - 1960

Macau - 1910 Macau - 1960

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18 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

A Marinha, através do Instituto Hi-drográfico (IH), assegura a produ-ção e actualização da cartografia

náutica dos espaços marítimos de inte-resse e de responsabilidade nacionais. Este processo de produção é contínuo e baseia-se na realização sistemática de levantamentos hidrográficos portuários, costeiros e oceânicos.

Com o objectivo de adquirir os dados necessários à actualização da carta náu-tica que cobre as ilhas Selvagens, largou da Base Naval de Lisboa, em 23 de No-vembro de 2009, para uma missão de 3 semanas, o NRP “Almirante Gago Cou-tinho”. A bordo seguiam, para além da guarnição, uma equipa de 7 elementos da Brigada Hidrográfica, um oficial alu-no do curso de engenheiro hidrógrafo e uma equipa de 2 mergulhadores do des-tacamento de mergulhadores sapadores nº 2 da Esquadrilha de Submarinos.

As Selvagens são duas ilhas, Selvagem Grande e Selvagem Pequena, rodeadas de alguns ilhéus; pertencem ao Arquipé-lago da Madeira; e encontram-se a cer-ca de 170 milhas náuticas a sul da ilha da Madeira e cerca de 80 milhas a norte das ilhas Canárias. Correspondem à par-te do território nacional mais meridional e assumem uma importância particular dado que a sua localização permitiu que Portugal estendesse o limite sul da sua ZEE até às proximidades daquele arqui-pélago espanhol.

Estas ilhas e as águas adjacentes estão classificadas como reserva natural, fazen-do parte do Parque Natural da Madeira. O desembarque nas ilhas só pode ser reali-zado após autorização prévia do Governo Regional e a pesca não pode ser exerci-da nos locais com profundidade inferior a 200 metros. A vigilância das ilhas é as-segurada por uma equipa de 2 elemen-tos em permanência, do Parque Natural, rendida de 3 em 3 semanas com recurso ao meio naval da Marinha em missão na Zona Marítima da Madeira.

A cartografia náutica actualmente em vigor das Selvagens (2ª edição em 1972 e reimpressão em 2005) baseia-se em levantamentos hidrográficos realizados em 1936, em que se recorreu ao uso de prumo para a determinação das profun-didades e ao sextante para o posiciona-mento horizontal (posição geográfica das observações).

Os objectivos da missão constavam da realização de um levantamento hi-drográfico oceânico e costeiro até aos 50 metros de profundidade, o levanta-mento hidrográfico dos fundeadouros das duas ilhas, o estabelecimento de

dois marégrafos de campanha, o geo-referenciamento dos farolins das ilhas e a realização de observações GPS para estabelecimento de uma rede geodési-ca de ligação entre as ilhas Selvagens, a Madeira e o Porto Santo.

A primeira acção realizada foi a ins-talação de uma estação GPS diferencial na Selvagem Grande para que as correc-ções de posicionamento passassem a ser transmitidas para bordo e pudesse ser iniciada a sondagem oceânica. As obser-vações necessárias para a obtenção das coordenadas de instalação da antena fo-ram previamente realizadas por elemen-tos da Direcção Regional de Informação Geográfica e Ordenamento do Território do Governo Regional da Madeira (DRI-GOT) e processadas no Instituto Hidro-gráfico. Foram montados dois marégra-fos de campanha com o objectivo de reduzir a sondagem do efeito da maré (todas as sondas batimétricas inferiores a 200 metros de profundidade têm de ser reduzidas da maré), determinar a locali-zação do nível médio do mar e calcular o desvio em tempo e em amplitude da maré das ilhas Selvagens em relação ao porto do Funchal. Um dos marégrafos foi desmontado no final da missão enquan-to o segundo irá funcionar até Janeiro de 2010 a fim de se obter dados ao longo de um ciclo mensal de marés.

Neste processo foram ainda colocadas várias marcas e realizado um nivelamen-to geométrico de modo a se obterem as cotas de referência para as observações realizadas.

O estabelecimento de uma rede geo-désica entre as diversas ilhas do arquipé-lago da Madeira foi realizado através de observações simultâneas com GPS geo-désico (GGPS - GPS de alta precisão por observações em série temporal), durante um período de 24 horas, em 5 estações na Selvagem Grande, 1 estação na Sel-vagem Pequena, 1 estação no Funchal e 1 estação no Porto Santo. Estas observa-ções foram possíveis de sincronizar com a colaboração da DRIGOT e o apoio lo-gístico e técnico dos elementos do Par-que Natural da Madeira em serviço nas Selvagens. Para este trabalho de terra foi necessário transportar baterias, material e equipamentos até aos marcos geodé-sicos existentes nas Selvagens; montar e estabelecer os sistemas GPS; manter uma equipa na Selvagem Grande e des-mobilizar tudo no final do processo. Na acção estiveram envolvidos elementos do navio, elementos da Brigada Hidro-gráfica, os dois mergulhadores da Mari-nha, dois elementos do Parque Natural

Levantamento Hidrográfico das Ilhas Selvagens

Levantamento Hidrográfico das Ilhas Selvagens

NRP “Almirante Gago Coutinho” ao largo da ilha Selvagem Grande.

Selvagem Grande.

Selvagem Pequena.

Transferência dos dados de maré para PC.

Transporte de baterias, de equipamentos e de material para as estações GGPS.

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 19

da Madeira e dois elementos da DRI-GOT, constituindo uma equipa coesa, eficiente e eficaz.

A sondagem oceânica e costeira (até à batimétrica dos 50 metros) foi reali-zada pelo navio, com recurso aos seus sondadores multifeixe de grandes e mé-dias profundidades, calibrados duas ve-zes por dia com perfis de velocidade de propagação do som na coluna de água, obtidos com equipamentos SVP (Sound Velocity Profiler). Ao largo das ilhas foram realizadas fiadas paralelas à direcção dominante da batimetria. Nas proximidades das ilhas, por razões de se-gurança da navegação, foram realizadas fiadas de contorno desde os 150 metros aos 50 metros de profundidade.

A sondagem do fundeadouro da Selva-gem Grande, junto à baía das Cagarras, zonas sul e sudoeste, foi realizada com a embarcação de sondagem “Cagar-ra” equipada com sondador multifeixe e com um bote de sondagem equipa-do com sondador de feixe simples (este meio realizou essencialmente fiadas de contorno em zonas mais perigosas por existência de baixos rochosos).

A sondagem do fundeadouro da Sel-vagem Pequena foi realizada em exclu-sivo pela embarcação “Cagarra”, não sendo viável a utilização do bote por razões de segurança do pessoal e de material. Nesta ilha, para além do fun-deadouro, foi também sondado o “canal da Selvagem Pequena” entre a ilha e o ilhéu de fora.

Na sondagem dos fundeadouros, foi embarcado um elemento do Parque Natural da Madeira, conhecedor dos perigosos baixos existentes à volta das ilhas, que facilitou informações sobre a localização e a forma das rochas mais traiçoeiras.

Os resultados preliminares dos levan-tamentos hidrográficos realizados per-mitem verificar que, para fora da bati-métrica dos 50 metros, existem algumas diferenças com a actual carta náutica mas com pouca relevância para a se-gurança da navegação à superfície. De-tectaram-se muitos baixos, não cobertos na sondagem de1936 e portanto não cartografados, na zona norte da Selva-gem Grande. No entanto, o maior peri-go para a navegação – a baixa de “São João” com uma sonda reduzida de 2.6 metros – já na altura tinha sido detecta-do. As diferenças dos resultados estão intimamente associadas à orografia do fundo e diferença tecnológica disponí-vel em 1936 (data do levantamento hi-drográfico da carta editada em 1938) e no século XXI. Refira-se que a sondagem a prumo é um método pouco eficiente, em que se obtém uma amostra discreta das profundidades, havendo assim uma elevada probabilidade de não detectar variações orográficas abruptas como as

existentes nas Selvagens, ao contrário do que acontece com a sondagem com sistemas sonoros multifeixe, em que praticamente se garante a cobertura to-tal do fundo.

A penúltima figura mostra, em pers-pectiva, um modelo digital de terreno dos levantamentos hidrográficos realiza-dos. As zonas mais profundas estão em tons de azul, as zonas menos profundas em tons de vermelho. As ilhas estão a cor escura e as zonas não sondadas es-tão a branco (zonas com menos de 50 metros de profundidade fora de área de fundeadouro). É perceptível a existência de uma estrutura geológica com a direc-ção NE-SW, com duas elevações onde surgem as duas ilhas. A área coberta cor-responde a um quadrado com cerca de 70 km de lado.

No regresso da missão, o navio atra-cou no porto do Funchal, tendo sido palco da assinatura de um protocolo de colaboração entre o Instituto Hidrográfi-co e a DRIGOT a que se seguiu um “Ma-deira de Honra”. Os signatários do pro-tocolo foram o VALM Augusto de Brito, Director-Geral do Instituto Hidrográfico e a Dra. Maria João Seixas Neves, Direc-tora Regional de Informação Geográfica e Ordenamento do Território da Região Autónoma da Madeira. Estiveram ainda presentes neste evento o Engº Luís San-tos Costa, Secretário Regional do Equi-pamento Social, o Major-General Rosas Leitão, Comandante Operacional da Ma-deira e o CMG Amaral Frazão, Coman-dante da Zona Marítima da Madeira.

Nesta estadia, o navio foi apoiado lo-gisticamente pelo Comando da Zona Marítima da Madeira e visitado por ele-mentos dos Serviços de Investigação da Pesca, da Câmara Municipal do Funchal e do Departamento de Biologia da Uni-versidade da Madeira.

O cumprimento com sucesso desta missão foi não só importante pela aqui-sição dos dados necessários à actuali-zação da cartografia náutica das Ilhas Selvagens, e portanto para a segurança da navegação nesta área, como também pelo exercício de presença naval, por um período relativamente prolongado, numa área próxima dos limites do es-paço marítimo sob soberania e jurisdi-ção nacionais.

O NRP “Almirante Gago Coutinho” é comandado pelo CTEN Bessa Pacheco e tem uma guarnição de 6 oficiais, 7 sar-gentos e 21 praças. A equipa técnica da Brigada Hidrográfica foi chefiada pelo 1TEN Pires Vicente.

Está prevista durante o ano de 2010 a nova edição da carta náutica das Ilhas Selvagens.

L. Bessa PachecoCTEN

(Colaboração fotográfica da BH e mergulhadores)

Casa dos guardas do Parque Natural da Madeira – ponto de apoio logístico para as acções em terra.

Baía das Cagarras vista da casa dos guardas.

Tolda do navio com a embarcação de sondagem “Cagarra”, a embarcação de sondagem “Trinas” (não utilizada) e o bote de sondagem da BH.

Modelo digital de terreno com base nos dados preliminares do levantamento hidrográfico das Ilhas Selvagens.

Assinatura do protocolo entre o IH e a DRIGOT.

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20 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

É propósito desta crónica, em jeito de epitáfio, relatar a última grande navegação do submarino “Barracuda”, conhecido na gí-ria submarinista como “SUBCUDA”, o último submarino do tipo “Da-phné” ainda operacional a nível mundial, decorri-da entre 16 de Novem-bro e 11 de Dezembro de 2009.

OS “DAPHNÉ” PORTUGUESES – CLASSE “ALBACORA”

O NRP “Barracuda” é o 2º submarino da clas-se “Albacora”. Foi en-

comendado pelo Estado por-tuguês, no dia 24 de Setembro de 1964, ao estaleiro francês Ateliers Dubigeon - Nor-mandie, sediado na cidade de Nantes. No ano seguinte, a 19 de Outubro de 1965, assentou a sua quilha e foram necessários mais 2 anos para que fosse lançado a água, o que viria a ocorrer no dia 24 de Abril de 1967. Por fim, concluído o processo de construção, a sua 1ª imersão estática teve lugar a 23 de Abril de 1968 nas águas de St. Nazaire.

A 9 de Outubro de 1968 foi aumentado ao “Efectivo dos Navios da Armada” e poucos dias depois sulcou as águas do rio Tejo pela primeira vez, rumo ao seu porto de arma-mento, a Base Naval de Lis-boa. Chegava a casa aquele que nos quarenta e dois anos subsequentes constituiria o “acantopterígio” marinho de corpo alongado, boca gran-de e dentes fortes da Marinha Portuguesa.

O mesmo sucedera tam-bém com o “Albacora” en-tregue à Marinha em Outu-bro de 1967. À chegada do “Barracuda” suceder-se-ia a do “Cachalote”, ocorrida em Janeiro de 1969, e por fim, a do último submarino desta classe, o “Delfim”, em 1970. A esta-da do “Cachalote” em águas portuguesas duraria poucos anos, pois, após a revolu-ção dos cravos em 1974 este submarino vi-ria a ser devolvido à sua nação de origem, a qual o venderia ao Paquistão, onde foi

baptizado de “Ghazi”. Das plácidas águas do Tejo para as cálidas águas do Indico. Já com a nova identidade, o “Cachalote” as-sistiria a um dos marcos da história naval indo-paquistanesa, do qual resultaria o

afundamento da fragata indiana “Khukri” (tipo 14 de fabrico inglês) a 9 de Dezem-bro de 1971, torpedeado pelo seu irmão “Hangor”. Os restantes submarinos conti-nuaram a sua vida operacional ao serviço da Armada Portuguesa.

Derradeiro sobrevivente da 4ª Esquadri-lha, o “Barracuda” está prestes a conhecer o destino dos restantes navios da classe, uma vez que, em breve, viverá o término

da sua vida operacional, findos 42 anos de intensa actividade.

Esta paragem anunciada será um marco quer a nível nacional quer internacional. Com efeito, não só cessará a 4ª Esquadri-lha de Submarinos da Marinha Portugue-sa, mas também se encerrará um capítulo da história universal dos submarinos. Na

verdade, nos seus tempos áureos, a família “Daphné” chegou a contar com 23 subma-rinos no activo em simultâneo, 4 em Por-tugal, 4 em Espanha, 4 na África do Sul e 11 em França.

Nem todos os “Daphné” conheceram o heróico desti-no do “Hangor”. Em memória dos submarinistas franceses, recorde-se o trágico destino do FS “Minerve” e do FS “Eu-rydice”, cujas guarnições, no dealbar, de operação desta classe, pereceram no final dos anos 70, respectivamente, de-vido a falhas técnicas.

Mais venturosa foi a expe-riência ibérica com este tipo de submarino. Dizemos ibéri-ca porque, no início dos anos setenta, os submarinistas es-panhóis vieram aprender com os seus congéneres portugue-ses, que já operavam estes na-vios há alguns anos.

No contexto português, a 4ª Esquadri-lha revelou-se uma significativa revolução tecnológica face à realidade anterior, bem como um modo diferente de operar subma-rinos com a introdução do sistema snort.

O “Barracuda”, no decurso da sua vida operacional, cumpriu muitas missões re-ais, de treino próprio – cooperando acti-vamente na formação de alunos da Escola de Submarinos – e tendo participado em

diversos exercícios nacionais e internacionais, com espe-cial destaque para CONTEX´s, SWORDFISH´s, TAPON´s, JMC´s, INSTREX´s, SPONTEX e diversas colaborações com a organização de treino ope-racional da Marinha Real Bri-tânica, o OST (Operacional Sea Training).

Das muitas missões reais rea lizadas, salientam-se a vi-gilância de espaços estraté-gicos de interesse nacional permanente, o primeiro afun-damento por torpedo realiza-do por um submarino portu-guês a um navio mercante, o M V “Bandim”, em 15 de De-zembro de 1982, os 31 dias

de missão continua e o reabastecimento de combustível no mar.

Desde que entrou em funções, no já lon-gínquo ano de 1968, até ao passado mês de Dezembro de 2009, o “Barracuda” efec-tuou um total de 52411 horas de navega-ção, das quais 35725 em imersão tendo percorrido 262140 milhas náuticas.

A última viagem do “Barracuda” e o fim da 4ª Esquadrilha

A última viagem do “Barracuda” e o fim da 4ª Esquadrilha

Lançamento à água do “Barracuda” nos Estaleiros Dubigeon-Normandie, Nantes, em 24 de Abril de 1967.

O “Barracuda” a navegar à superfície.

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 21

EM MEMÓRIA DA ÚLTIMA NAVEGA-ÇÃO DO NRP “BARRACUDA”

A última grande navegação do egrégio “Bar-racuda” decorreu entre os dias 16 de Novem-bro e 11 de Dezembro de 2009, no decurso da qual foram visitadas as cidades de Carta-gena e Toulon. O dia da largada foi assinala-do pela presença a bordo do CALM Pires da Cunha, Comandante da Flotilha de Navios, acompanhado pelo CMG Gouveia e Melo, Comandante da Esquadrilha de Submarinos. A presença destas entidades conferiu ao início des-ta missão o brilhantismo digno de tão significativo momento. Este dia ficou igualmente mar-cado pela integração de dois re-pórteres da RTP na guarnição do “Barracuda”. O seu objectivo era realizar uma peça para o progra-ma “Linha da Frente”, destinado a explicar ao grande público a ligação entre os actuais subma-rinos e os submarinos da futura geração.

O início da viagem foi bastan-te atribulado. O próprio mar, en-capelado, parecia querer reagir ao anunciado fim do submari-no, obrigando homens e máqui-na a excederem as suas forças face ao desafio imposto pelos elementos. O desembarque do CALM FLOTNAV havia sido agendado para o final da tarde do 1º dia de navegação, ao lar-go da baia de Sesimbra, no entanto, Neptuno, Deus romano dos mares, não diminuiu a sua ira e as condições meteorológicas que se fa-ziam sentir impossibilitaram o cumprimento do plano previsto. Alternativamente, escolheu-se o porto de Setúbal, por este apresentar carac-terísticas morfológicas que lhe conferem maior abrigo. Após o desembarque, o submarino reto-mou o seu trânsito com destino a Cartagena. Como diz o adágio popular, depois da tempestade, a bonança. Com efeito, as boas condições meteorológicas e a calmaria ajudaram a dar conti-nuidade à missão.

Apesar desta ser a última via-gem, o trajecto entre Setúbal e Cartagena foi dedicado a activi-dades de treino intenso, destina-do a avaliar e elevar os exigentes padrões de prontidão que carac-terizam as unidades navais sub-marinas, sob o olhar atento do Comandante da Esquadrilha e da equipa de reportagem da RTP.

A passagem do estreito de Gibraltar ocor-reu no dia 18 de Novembro ao final da tarde. Apesar do espírito festivo da última navegação, manteve-se um elevado nível de vigilância, de forma a detectar, seguir, identificar e rela-tar qualquer embarcação com um comporta-mento suspeito de ligação a actividades ilícitas, realidade comum naquelas águas. A visão de

Gibraltar permitiu evocar nos presentes a me-mória da II Guerra Mundial. Tal como há ses-senta anos, este “choke point” erguia-se terrifi-camente ante os olhos de todos, revelando-se de novo, um verdadeiro obstáculo, quase in-transponível para os submarinistas.

A aproximação ao porto de Cartagena ocor-reu na manhã do dia 20 de Novembro. No ar, uma neblina matinal opaca velava a cidade. Durante a entrada, o submarino foi acompa-nhado pela embarcação dos pilotos, na qual

seguia um sargento-mor submarinista espa-nhol, que recolheu mais de 200 fotografias do “Barracuda”. Mais tarde foi possível apu-rar tratar-se de um militar com mais de 30 anos de experiencia profissional nos submari-nos, últimos dos quais dedicados ao estudo e publicação de trabalhos sobre os submarinos espanhóis.

A calorosa recepção sentida à chegada do “Barracuda”, foi testemunho dos fortes laços

de camaradagem que unem as duas Marinhas ibéricas. A escolha do Porto de Cartagena não ocorreu por mero acaso. O COMSUBMAR – Comandante da Esquadrilha de Submarinos Espanhola – constitui, certamente, o SUBO-PAUTH (Autoridade Nacional de Submarinos) com o qual a Esquadrilha nacional manteve e mantém as melhores e mais próximas relações

pessoais e profissionais, decorrentes do facto de terem partilhado, durante mais de 3 déca-das, o mesmo tipo de plataforma.

Em todos os anos decorridos, muitos foram os momentos em que ambas as Esquadrilhas operaram juntas, conduzindo a relações pes-soais que vão para além da mera interacção de natureza profissional. No cais encontrava -se o Comandante da Esquadrilha de Espanha e todo o seu Estado-Maior e ainda o Chefe do Treino e Avaliação e os Comandantes do SPS “Mistral”

e SPS “Tramontana”.Durante os 3 dias de esta-

da neste porto, verificou-se um aprofundamento dos laços já existentes, bem como a assun-ção de um forte compromisso de dar continuidade a esta histórica colaboração e intercâmbio entre as duas forças de submarinos. A provar o anteriormente referido, foi oferecida, pelo Comandante da Esquadrilha Espanhola, uma recepção ao Comandante da Es-quadrilha Portuguesa, Coman-dante e Oficiais do “Barracuda” no Salão Nobre, imediatamen-te após a chegada. Simultane-amente, o Sargento-Mor da Es-quadrilha Espanhola ofereceu uma recepção análoga aos sar-

gentos de bordo. Ainda no dia da chegada, à noite, o Co-

mandante Espanhol formulou um convite ao CMG Gouveia e Melo e ao CTEN Baptista Pe-reira para um jantar na sua residência oficial, no qual estiveram também presentes a esposa do COMSUBMAR, o Comandante e a esposa do SPS “Mistral”. Estes foram certamente mo-mentos altos da estadia em Espanha.

Em retribuição por toda esta hospitalidade de que havia sido alvo, foi ofere-cida uma recepção a bordo a 30 submarinistas espanhóis no Do-mingo, dia 22 de Novembro, os quais se fizeram representar pela sua estrutura de topo.

Na 2ª feira, dia 23 de Novem-bro, foi com a costumeira tenaci-dade que o “Barracuda” rompeu uma vez mais o mar em direcção ao porto de Toulon. Para trás, em Cartagena, ficou o CMG Gou-veia e Melo que, por motivos de agenda, não pode continuar a viagem. A largada de Cartage-na foi igualmente o momento de a equipa da RTP abandonar o submarino, depois de recolhi-do o material necessário para a reportagem.

A viagem entre Cartagena e Toulon foi mais curta do que a precedente, tendo sido neces-sários apenas 3 dias para percorrer este trajec-to. No dia 26 de Novembro, pela manhã, já o “Barracuda” atracava em Toulon, regressando uma última vez ao país onde fora construído, para, desta forma se despedir do seu solo natal. No ponto mais alto da viagem de despedida,

Aproximação a Cartagena.

Chegada a Cartagena, em 22NOV09.

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22 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

nada poderia ser mais especial do que Toulon, cidade da nação construtora desta classe de na-vios e com a qual, durante todo o período de actividade, Portugal manteve relações opera-cionais e logísticas profundas. A despedida da actividade operacional do NRP “Barracuda”, com a passagem num porto francês, foi motivo para recordar e reforçar as exce-lentes relações existentes, e indi-ciar o mútuo desejo e disponibi-lidade para renovadas afinidades operacionais e de treino a terem lugar num futuro próximo.

A estadia neste porto foi re-pleta de eventos protocolares que se iniciaram logo no dia seguinte à chegada, 27 de No-vembro, uma vez que se come-morava, a nível nacional, o dia do submarinista francês. O pro-grama de actividades iniciou-se com uma conferência que abor-dou a história da arma subma-rina e a sua importância para a França. Esta conferência, à qual assistiram algumas centenas de pessoas, foi proferida por diver-sas personalidades que se destacaram, ao lon-go dos anos, na operação e no estudo desta capacidade militar naval, estruturante para a defesa e segurança de uma nação marítima.

Seguidamente, foi oferecido um almoço a toda a família submarinista, durante o qual transpareceu a alegria e satisfação face à pre-sença dos seus congéneres portugueses. A tar-de foi dedicada a visitas ao NRP “Barracuda” e ao FS “Rubis”, os quais foram agraciados com algumas centenas de visitantes. Muitos foram aqueles que serviram em submarinos do tipo “Daphné” e que aproveitaram para relembrar velhas aventuras neles passadas. Houve mesmo quem revivesse intensamente as rotinas diárias de outrora. Muitos não conse-guiram esconder os sentimen-tos de saudade com os olhos brilhantes que denunciavam a emoção sentida.

No recinto envolvente, esta-va em exposição um conside-rável conjunto de bancadas, mostrando objectos pertencen-tes aos submarinos franceses, sendo permitido aos visitan-tes adquirirem uma recorda-ção dos mesmos. De entre este conjunto de bancadas emergia uma pequena “feitoria” que se demarcava das demais. Era a bancada do submarino por-tuguês. Com efeito, o “Barra-cuda” colocara uma pequena “ilha” de divulgação nacional no meio das bancadas francesas, para que quem passasse pudesse ter um contacto com a cultura por-tuguesa, num esforço de diplomacia naval em terras francesas.

Entre a Bandeira Nacional, material de representação e panfletos do navio em lín-

gua francesa, colocou-se também uma boa garrafa de vinho do Porto, a qual despertou grande curiosidade, pois muitos foram os que quiseram provar o internacionalmente céle-bre produto.

Paralelamente, foi oferecida uma recepção aos representantes da Direction des Construc-

tions Navales Services (DCNS), sinal de reco-nhecimento pela estreita mas eficaz colabo-ração na área da manutenção ao longo dos últimos 40 anos. Esta recepção contou com o actual Chefe da Divisão de Submarinos da Direcção de Navios e o seu adjunto, os CFR EMQ Costa Campos e CFR EMQ Viveiros da Costa. Após este almoço, o “Barracuda” foi longamente visitado pelo VALM CECMED (Co-mandante Naval Francês Mediterrâneo) e pelo CMG COMESNA (Comandante da Esquadrilha de Submarinos Nuclea res de Ataque).

O dia seguinte foi mais calmo em termos de agenda mas não menos marcante. Os

submarinistas franceses, em mais um gesto de reconhecimento pelos submarinistas que morreram ao serviço da Pátria procederam à inauguração de um monumento alusivo. Este monumento, para além de simbolizar o sacrifício dos submarinistas caídos em com-bate ou em acidentes, teve ainda o mérito

de ter sido financiado pela própria comuni-dade submarinista. O monumento, situado junto ao mar nos arredores de Toulon, foi inaugurado com toda a pompa e circunstân-cia, contando com a presença de centenas de pessoas e de responsáveis pela estrutura politica da Defesa Nacional Francesa. Em

representação de Portugal mar-caram presença o comandante, um sargento e uma praça do “Barracuda”, situação que foi muito apreciada. De facto, ter tido a oportunidade de presen-ciar tão nobre e importante ce-rimónia constituiu, certamente, um momento único na vida de um submarinista.

O dia da largada despertou saudade e nostalgia, pois a for-ma como a guarnição do “Bar-racuda” foi recebida pelos ca-maradas franceses, incansáveis na sua hospitalidade, retirou-lhe o desejo de partirem, ain-da que com destino a Lisboa. Depois de 3 dias intensos em Toulon, urgia voltar ao mar,

para um último e derradeiro mergulho no Mediterrâneo, em direcção ao Estreito de Gibraltar e ao Atlântico. Avizinhava-se mais uma patrulha e um último exercício com a “Bartolomeu Dias” e o seu novo “towed ar-ray”. Apesar dos quase 42 anos de idade, não constituiria surpresa a já habitual “su-perioridade” do submarino, mesmo peran-te um navio equipado com a mais recente tecnologia de guerra anti-submarina. Antes do encontro com a FRADIAS, o SUBCUDA teve de enfrentar, talvez pela última vez na sua vida, um verdadeiro temporal mediter-rânico no Golfo de Leão, com ondulação de

WNW de 5 metros.A viagem de regresso pros-

seguiu. Finalmente, Gibrlatar de novo à vista…E uma nova patrulha de Maritime Security Operations teve então o seu início. O peixe de corpo alon-gado, cor preta e dentes fortes prestava mais um nobre servi-ço à Pátria. A vigilância e segu-rança de um espaço marítimo de elevado interesse nacional permanente intervalada de dois CASEX´s com a FRADIAS. O “Barracuda” acabava a sua vida com um fortíssimo sinal para a comunidade operacional. A melhor forma de terminar a vida de um submarino é com a realização de uma patrulha…E assim foi!

Na era dos meios audiovisuais, para além das imagens intensas que permanecem in-delevelmente na memória, pela força dos eventos vividos, é possível guardar registo por meio de imagens e sons. Estes suportes são preciosos, pois permitirão às futuras gerações testemunhar a dádiva daqueles que prestaram

Visita do Almirante CECMED e do Comandante da Esquadrilha Francesa.

Recepção à Direction des Constructions Navales pelo sucesso da manutenção da Classe Albacora.

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No passado dia 26 de Janeiro, o Almi-rante Chefe do Estado-Maior da Ar-mada visitou o NRP “Barracuda” no

decurso da sua derradeira missão. Esta visita ganhou um significado muito especial por ter ocorrido no mar, em ambiente operacional, e por constituir ao mesmo tempo, a última navegação dos submarinos da Classe “Albacora”.

O embarque decorreu em Setú-bal, tendo o almirante CEMA sido acompanhado pelo Comandan-te da Flotilha e pelo Comandante da Esquadrilha de Submarinos. O planeamento do embarque pre-viu, entre outras actividades, a na-vegação em águas restritas e em imersão, bem como a participação num exercício com o NRP “Barto-lomeu Dias”.

Durante o período em que o submarino esteve em imersão, o ALM CEMA contactou de perto com os procedimentos de bordo, seja a nível operacional de com-pilação do panorama de superfí-cie e da produção da solução de fogo com métodos passivos, seja de controlo da plataforma. Percor-

reu demoradamente os vários compartimentos de bordo, observando o funcionamento dos Motores Eléctricos Principais, dos Geradores,

do Posto de Controlo da Plataforma, do Posto de Comando e do Sistema de Armas. A opor-tunidade foi também de contacto com alguns

dos equipamentos mais recentes, só existentes a bordo do Barracuda, como o gónio acústico VELOX e o sonar LOPAS, este último respon-sável pelo “salto” qualitativo nos conhecimentos e experiência do pessoal torpedeiro-detector, deter-minante na aquisição de valências para a exploração operacional da Classe “Tridente”.

A oportunidade foi também de contacto com a guarnição, permi-tindo diversas interacções com todo o pessoal num sinal de comunhão gratificante para todos.

O Almirante CEMA desembar-cou a meio da tarde, deixando a bordo um sentimento de agrade-cimento a todos os submarinistas, mas também de emoção por ter partilhado os últimos momentos de vida operacional dos submari-nos da Classe “Albacora” e em par-ticular do “Barracuda”, o qual tem em comum com o Almirante Melo Gomes o mesmo número de anos ao serviço da Marinha.

serviço nos submarinos da classe “Albacora”. Concebido na déca-da de sessenta do século XX, na 1ª década do século XXI ainda se encontrava operacional.

Foi com o propósito de guar-dar para a posteridade e testemu-nhar a complexidade da vida a bordo deste tipo de plataforma concebida há quase meio sécu-lo que embarcou, na tarde do dia 10 de Dezembro, ao largo de Portimão, com o apoio da Poli-cia Marítima, uma equipa de re-portagem do SIRP- GABCEMA. Durante a manhã do dia 11, já ao largo do cabo Espichel, foi o “Barracuda” sobrevoado por um P3P da FAP que, na véspera, tendo tido conhecimento da última navega-ção deste seu playmate, decidiu bater asas e voar, para com ele partilhar seus últimos momentos de glória.

Pelas 13h30 do dia 11 de Dezembro, úl-timo dia desta missão, a equipa do SIRP foi reforçada por uma embarcação da Policia Marítima com came-ramen, os quais recolheram para a posteridade imagens e testemu-nhos de vidas literalmente entre-gues aos submarinos. Imagens do NRP “Barracuda” regressando a Lisboa. Lisboa…o melhor porto

do mundo. O navio perfez em 2009, 122 dias de maré 2408 horas de navegação tendo per-corrido mais de 13000 milhas, atingindo a 4ª melhor marca da sua vida operacional, pois os já longínquos anos de 1987 e 2001 haviam sido os anos de “prata” e “ouro” respectiva-

mente. De referir que toda a acti-vidade operacional de 2009 teve sob pano de fundo uma Esquadri-lha em profunda transformação de pessoal e infra-estruturas.

Vogando as águas do Tejo, avis-tou-se ao longe, por fim, o canal do Alfeite. A tristeza e melancolia tomaram conta de todos os sub-marinistas que assistiam às derra-deiras jardas de navegação do seu “Barracuda”.

Com o fim da missão do NRP “Barracuda” ao serviço da Ma-rinha Portuguesa, no dia 11 de Dezembro, volvidos 42 anos, encerra-se um palco de inco-mensurável esforço, dedicação e empenho de inúmeras gerações

de marinheiros que serviram durante muitos anos de actividade no derradeiro submari-no da classe “Albacora”, do tipo “Daphné”, ainda ao activo com grande sacrifício para a guarnição e respectivas famílias.

Bem hajam todos aqueles que neste subma-rino serviram a Marinha e se os na-vios têm alma poder-se-á dizer:

– Descansa NRP “Barracuda” pois cumpriste como poucos a tua missão.

(Colaboração da ESQUADRILHA DE SUBMARINOS)

REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 23

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A última guarnição do “Barracuda”.

NRP “BARRACUDA”

HORAS NAVEGAÇÃO ............................................52 411HORAS IMERSÃO ...................................................35 725MILHAS PERCORRIDAS ........................................262 140

ALM CEMA despede-se do NRP “Barracuda” no marALM CEMA despede-se do NRP “Barracuda” no marFo

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24 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

No dia 6 de Janeiro, iniciou-se, na Es-cola de Tecnologias Navais (ETNA), o “Curso de Português Língua Es-

trangeira” (PLE) para os 8 militares argelinos, que se encontram no nosso país, ao abrigo das relações bilaterais Portugal-Argélia no âmbito da Defesa. Este protocolo insere-se no Programa Indicativo de Cooperação, o primeiro no Magrebe, que foi assinado em Argel pelo Ministro da Defesa Prof. Doutor Augusto Santos Silva.

Para desenhar, implementar e ministrar o curso em questão, privilegiou-se o recurso às três professoras de Português do QPCM, de acordo com o despa-cho do VALM Superintendente dos Serviços do Pessoal.

A fim de traçar o perfil lin-guístico dos alunos foi consul-tado o Documento Orientador – Português Língua Não Materna no Currículo Nacional (vide www.dgidc.min-edu.pt), no qual es-tão delineados os princípios bá-sicos e objectivos estratégicos e se estabelecem medidas de aco-lhimento e de escolarização para falantes de línguas genética e ti-pologicamente muito diversas.

O curso de PLE dotará os alunos com com-petências para interagir num conjunto variado de situações de comunicação do quotidiano e relacionadas com o trabalho, com utilizadores nativos ou não nativos, permitindo-lhes traba-lhar em contextos em que o português é língua de comunicação e de trabalho.

Este curso está estruturado em três ní-veis, de acordo com os Níveis de Referência do Quadro Europeu Comum de Referência do Conselho da Europa, respectivamente: A1 – Nível Iniciação; A2 – Nível Elementar; B1/B2 – Nível Intermédio. O curso tem a duração de 3 meses (de Janeiro a Março de 2010), 60 dias úteis (20 dias úteis para cada nível), num total de 360 tempos, e tem ca-rácter intensivo.

Construir um curso de raiz para alunos dos quais nada conhecíamos, excepto o fac-to de serem árabes e terem como língua se-gunda o francês, não foi tarefa fácil. Quando o Português não é a Língua Materna, que me-

todologias e que materiais escolher? Foi este o desafio! O nosso objectivo era oferecer aos alunos um conjunto de situações relevantes e diversas de modo a que a sua aprendizagem fosse abrangente, envolvendo-os em actos comunicativos que os conduzissem a uma maior interacção e integração.

Deste modo, para além dos manuais adoptados, tivemos a preocupação de selec-cionar e reunir, sempre que possível, no âm-bito dos conteúdos programáticos a minis-

trar, textos autênticos, reais, que replicassem a forma como a língua é usada na realidade porque pensamos que o que melhor adqui-rimos é o que tem significado para nós. Sur-giram, assim, actividades complementares dos manuais adoptados, privilegiando situa-ções do quotidiano, sejam elas outdoors, spots publicitários, folhetos de supermercado, fo-lhetos turísticos, artigos de jornais, ou textos relacionados com a Marinha, como foi o caso das ementas da Messe e da recente viagem de circum-navegação da “Sagres”.

Privilegiámos também, a partir do nível A2, a leitura extensiva, a melhor forma de assegu-rar que as frases ou palavras são contextuali-zadas. Os alunos lêem, mas não há gramática, não há actividades. Construímos uma peque-na antologia com lendas (mouras e outras), pequenos contos de autores portugueses e histórias sobre a História de Portugal.

A inclusão das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) no curso foi uma das

nossas apostas, não só como forma de es-timular nos alunos as suas capacidades de pesquisa e aumento de conhecimento, mas também como forma de estes examinarem e compararem valores que diferem dos seus, ajudando-os a modelar as ideias.

Vem no Alcorão que o primeiro manda-mento da vida em comum é conhecermo--nos uns aos outros. Porque o conhecimento é condição de entendimento. Foi este um dos nossos propósitos ao prepararmos as acti-

vidades extra-curriculares. Dar experiência aos alunos levan-do-os para fora da sala de aula. Por isso, organizámos várias vi-sitas temáticas: umas, inseridas no âmbito dos conteú dos pro-gramáticos do curso, como foi o caso de Sintra, Chiado, Baixa Pombalina e Belém; e outras, interculturais que mostrassem e patenteassem, entre outros aspectos, o património históri-co islâmico no nosso país, um legado da convivência de que a Península Ibérica foi palco, e de que são exemplo a Cerca Al-Usbuna, vulgo Cerca Moura, e a Alcáçova Islâmica de Lisboa no Castelo de S. Jorge.

Se por um lado queremos ensinar o nosso idioma através da nossa cultura, não pode-mos esquecer que uma parte dela tem as suas origens na cultura árabe. Todo o nosso esfor-ço se tem centrado em criar um ambiente de aceitação do outro, tentando sempre que a língua de união seja o português.

Diz o Sheikh David Munir, Imam da Mes-quita Central de Lisboa, que é através do diá-logo que se constroem as pontes entre as culturas e as religiões, mas é cada vez mais importante que esse diálogo fomente também o impulso para as atravessar.

Esperamos que os nossos alunos cruzem essas pontes de uma forma tão aliciante e entusiástica quanto foi para nós a edificação deste curso.

Assalamu Aleikum, que a Paz esteja com todos.

Ana Paula Duarte e SilvaDirectora do Curso

Algarves d’ Aquém e d’ Além-marAlgarves d’ Aquém e d’ Além-mar

EXPOSIÇÃO

“CORREIO EM TEMPO DE GUERRA - II GUERRA MUNDIAL”No âmbito da comemoração do aniversário do Clube Militar de Oficiais de Setúbal, vai ser realizada nessas instalações, en-

tre 9 e 18 de Abril uma exposição subordinada ao tema “Correio em tempo de guerra - II Guerra Mundial”, na qual serão exi-bidos objectos postais circulados durante o conflito.

Após o encerramento em Setúbal, esta exposição será transferida para o Museu do Combatente, em Lisboa (Forte do Bom Sucesso – junto à Torre de Belém), onde estará patente ao público entre 26 de Abril e 31 de Maio.

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 25

Menino e moço, passava as férias grandes na praia da Costa Nova, aonde a minha família veraneava

e recuperava das anuais lides em Aveiro, minha terra natal.

Foi precisamente na ria daquela praia que aprendi a nadar, remar, velejar e até pescar, coisas úteis que não se ensinavam no liceu de José Estêvão.

Isto passava-se nos anos 30 do século passado.

Em frente ao casario de madei-ra (designado por palheiros) com faixas verticais pintadas de co-res vivas, havia e ainda há (mais estreito e menos profundo) um braço da ria entre a Costa Nova e a Gafanha da Nazaré.

Neste troço labutavam os bar-cos moliceiros na apanha do mo-liço com que adubavam as terras da margem Leste, enquanto que a Oeste alguns veraneantes uti-lizavam os seus barcos de recreio (bateiras e vougas) quando o vento estava de feição.

Barcos a motor eram muito poucos.Ora, na ria, na baixa-mar e suas proximi-

dades, a altura das águas deixava muito a desejar, mas havia a possibilidade de se na-vegar pelo Canal do Desertas que mantinha sempre uns bons metros de profundidade e dava para nos deslocarmos desde a Vaguei-ra ao Forte da Barra, assim soubéssemos aproveitar o vento e a corrente.

Achava tudo isto normal e o nome de Desertas não me des-pertava qualquer curiosidade, até que um dia, reparei que no Café da terra, existia um quadro com uma foto de um grande na-vio a poucos metros das casas, mesmo em frente à Costa Nova. Indaguei então do sucedido e al-guém me contou que se tratava do “Desertas” o navio que em 1916 fora atacado por um subma-rino alemão e se tinha esquivado, indo encalhar na praia, perto da Vagueira.

Depois fora salvo através de um canal dragado até à barra. Que na altura do ata-que de artilharia do submarino, toda a gen-te tinha fugido espavorida, etc., etc.

Muito mais tarde, falando de velhos tem-pos, com o Comandante Guerra Corujo, (na-tural de Ílhavo, chefe do meu curso e colega do Liceu e que também passava as férias na Costa Nova), informou-me que havia um livro na biblioteca do I.S.N.G, da autoria do

Engº António Mendes Barata, com o título O salvamento do DESERTAS dos Transportes Marítimos do Estado, datado de 1920.

Graças à Internet e tendo sido infor-mado que os livros da referida biblioteca passaram à Biblioteca Central da Mari-nha, consegui confirmar que de facto o tal livro estava lá.

Verifiquei, então, pela sua consulta, que as coisas não se passaram exactamente como me tinham contado.

De facto, pela leitura do livro pude ve-rificar que o salvamento do “Desertas” foi empresa muito complicada e que o tal sub-marino, embora aparecendo na peça, nada teve a ver com o encalhe do navio.

Apesar de não ser fácil, vou tentar sinte-tizar o que o Engº Mendes Barata relata no livro citado:

O “Desertas” era afinal um ex-navio alemão de nome “Hochfeld” de 3.689 ton. brutas, capacidade de carga de 6.693 ton. e 112 m de comprimento, 12,7 m de boca, 7,8 m de pontal, dotado de 2 caldeiras que forneciam vapor a uma máquina de 1300 cavalos, que permitia uma velocidade de 11 nós.

Fora apresado no Funchal quando da nossa entrada na 1ª Guerra Mundial e de-

pois de reparado da sabotagem provocada pela guarnição alemã, seguiu para Lisboa com o acordo do Governo Inglês e ficou ao serviço da casa “Furness” em 9 de Novem-bro de 1916.

Saiu então de Lisboa em 15 de Novem-bro para Leixões onde ia carregar toros de pinho, com lastro nos respectivos tanques

de água e 500 toneladas de car-vão nos paióis.

O navio chegou já ao anoitecer do dia 16 à entrada de Leixões, mas não poude entrar porque dado o estado de guerra, estavam proibidas as entradas de noite.

Começou entretanto a levantar--se forte temporal de WSW e pela descrição do Comandante (José Guerreiro Jorge) decidiu afastar--se da costa, mas às tantas o na-vio deixou de obedecer ao leme, devido à falta de pressão nas cal-deiras. A guarnição não devia ser

muito experiente e estava toda enjoada. Ain-da se tentou, com auxílio de uma vela trian-gular, aproar ao largo.

O certo é que devido ao forte temporal o navio continuou sem governo. Pelas 14 ho-ras do dia 18 avistou-se o farol de Aveiro a cerca de 14 milhas, continuando-se a cair para terra. Às 18 horas içou-se o sinal de pedido de socorro e depois de ter avisado a guarnição, o comandante decidiu aproar o navio à costa, onde houvesse menos reben-

tação, encalhando pelas 2020H na Vagueira, cerca de meia milha a Sul dos palheiros das armações de pesca da Costa Nova.

Começou então a “saga” buro-crática do eventual salvamento do navio com troca de telegra-mas e correspondência vária, en-tre as entidades intervenientes, o que iria durar 2 anos. Tal não é de admirar dado o estado de guer-ra, frequentes revoluções, conse-quente queda de governos e mu-dança de intervenientes, etc.

Não cabe aqui neste simples artigo entrar em grandes pormenores neste campo e apenas direi que dado que o navio mantinha o casco em bom estado, pensou--se primeiro em safá-lo para o mar. Foi para lá enviado o navio “Patrão Lopes” sob co-mando do 1TEN Álvaro Nunes Ribeiro e tanto ele como o Capitão do Porto de Avei-ro, CFR Jayme Afreixo, chegaram à conclu-são que embora o casco estivesse intacto, era difícil, mas não impossível, a salvação

O curioso caso do salvamento do navio “Desertas”

O curioso caso do salvamento do navio “Desertas”

RECORDANDO…

A Costa Nova nos anos 30.“Costa Nova do Prado. 200 Anos de História e Tradição”, Senos da Fonseca.

O “Desertas” encalhado.

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pelo mar, dado que o navio tinha entrado bastante no areal, ficando praticamente a seco na baixa-mar.

O relatório sobre a situação do navio e possível salvamento, inicialmente apre-sentado pelo Comando do “Patrão Lo-pes”, demorou a ser enviado à Direcção dos Transportes Maritinos, que respon-deu ao Ministro da Marinha nes-tes termos:

“Da posse da copia da comu-nicação do Comando do “Patrão Lopes” cumpre-me dizer a V.Exª que todo o trabalho de salvamen-to pertence à firma “Furness Wi-thy & C. Lm.ª” ou às companhias de seguros conforme as condições de fretamento de vapores do go-verno inglês.”

De facto apareceu uma missão inglesa de salvamento (Salvage As-sociation) que trouxe um forte cabo de aço e três ferros com intenção de alar o navio para o mar em altura de marés vivas. Houve no entanto desentendimento com o maquinista de bordo sobre porme-nores de actuação, o que originou troca de notas diplomáticas e consequente destitui-ção do maquinista.

Quando mais tarde se tentou usar os fer-ros e o cabo de aço, este rebentou e ficou tudo no fundo do mar.

O autor do livro, que pelos vistos estava ao serviço dos Transportes Marítimos do Estado, foi inicialmente nomeado em 6 de Julho de 1917, para substituir o maquinis-ta demitido e seguiu para Aveiro na mesma data juntamente com o novo comandante José Casimiro do Rosário..

Encontrou o navio atravessado e en-terrado na praia, com chapas e rebites aluí dos.

O pessoal encarregado do salvamento já não aparecia há mais de 15 dias.

Averiguou-se que o desentendimento do maquinista com o representante inglês, fora devido a este ter decidido despejar as caldeiras.

Entretanto, o Engº Mendes Barata e o Co-mandante Rosário foram de novo chama-dos a Lisboa em 20 de Julho e substituídos a bordo pelo Comandante Álvaro Camacho e o maquinista Júlio Santiago.

Com estas substituições a missão inglesa regressou e os trabalhos reiniciaram-se.

Houve mais tentativas sem sucesso, até que, em 21 de Janeiro de 1918, o mar perdeu a paciência, desencadeando-se forte tempo-ral que causou graves danos no casco.

A partir desta altura as entidades ingle-sas resolveram desistir do salvamento e opinaram que o navio devia ser declara-do como perdido e entregue à companhia de seguros.

Tudo parecia perdido, mas o Engº M. Ba-rata, perante os seus superiores, foi de opi-nião que ainda era possível salvar o navio e acabou por ser recebido já em Fevereiro de 1918 pelo Ministro da Marinha, junta-

mente com o Comandante Camacho, dos Transportes Marítimos e com o represen-tante inglês, Captain Mail, presente.

Comunicou então ao Ministro que desde que lhe fossem dadas condições, considera-va possível salvar o navio pela ria dentro!

O Ministro respondeu: “Pois muito bem, vamos tornar a tentar salvar o navio por

nossa conta” e voltando para o Sr. Mail, participou-lhe a resolução que acabava de tomar.

De notar que na altura tinha havido mais uma alteração na Administração Nacional o que acabou por ser favorável à resolução do problema. De facto, por um lado a Di-recção Transportes Marítimos do Estado passou do Ministério do Trabalho ao Mi-nistério das Subsistências, cujo ministro era o VALM Machado dos Santos e o Director dos Transportes Marítimos passou a ser o ALM Macedo e Couto.

O Engº Mendes Barata apresentou então um orçamento para ser aprovado, que ul-trapassava os 298 contos (na época) e que acabou, segundo ele, por ser largamente excedido, devido a vários atrasos no for-necimento dos materiais necessários, in-cluindo o pequeno rebocador “Formiga” e

a draga “Mondego “ que se encontrava em Viana do Castelo, já que a “Aveiro ”, draga do porto local, estava ocupada. Foram ain-da requisitadas bombas, chaparia e rebites e até entrou em acção pessoal do Arsenal da Marinha nas reparações do navio.

O plano de salvamento era simples:1º Reparar as avarias no casco e restante

material de bordo incluindo cal-deiras e toda a maquinaria (fora de estaleiro).

2º Endireitar o navio e abrir um poço à sua proa para onde desceria, ficando em condições de flutuação (fácil de dizer mas muito complexo e difícil de concretizar).

3º Abrir um canal de cerca de 1km de comprimento de forma a levar o navio até à ria.

4º Dragar a passagem à frente do navio, através da ria, e rebocá-lo até à barra.

O livro atrás referido é na rea-lidade um extenso relatório que contem todos os passos da realização do planea-mento, com larga descrição das operações desenvolvidas e pormenorizando as dificul-dades que foi necessário vencer.

Tratou-se de uma verdadeira odisseia que levou cerca de dois anos a concretizar, com grande esforço e dedicação de todos os que nela se empenharam em vencer as inúme-ras vicissitudes.

De facto, houve vários percalços a ultra-passar que resumidamente foram:

Temporais que causaram estragos e atra-sos.

Dificuldades de dragagem em partes da ria cujo fundo era de barro duro e não de lodo, frente à Costa Nova, o que originou o pedido de draga mais potente.

Demoras na entrega dos materiais pe-didos para Lisboa e que, por vezes, eram descarregados em V. Nova de Gaia e não em Aveiro.

Necessidade de abater a ponte do Forte para o navio passar.

A própria saída da barra de Aveiro foi uma operação perigosa, pois na altura a barra era estreita, pouco profunda e com rebentação na parte final. Valeu a acção do rebocador “Cabo da Roca” chamado para dar ajuda.

De registar o último artigo do autor do livro, dedicado ao p essoal.

“O pessoal que esteve às minhas ordens, durante largo tempo, trabalhou em turnos de 12 horas, sendo bastante penoso, como é fácil calcular, o trabalho de noite num areal junto ao Oceano nos meses frios e chuvosos dos Invernos de 1918 a 1920.”

Destaca depois os nomes do maquinis-ta Ernesto Júlio Santiago como tendo sido o seu braço direito nos trabalhos de enge-nharia e ainda o Comandante Álvaro Ca-macho que se desempenhou na parte dis-ciplinar e administrativa do pessoal com a maior competência e honorabilidade. Chegou a haver mais de 200 trabalhadores

26 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

Trajecto do canal dragado.

No canal a caminho da Ria.

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 27

contratados, incluindo algumas mulheres, alem de bateiras e até carros de bois.

Termina o Engº M. Barata, com grande simplicidade, da forma seguinte:

“Como se verifica pela exposi-ção que fiz, esta empresa apesar de grande, não apresentou gran-des problemas de alta engenharia e só foi levada a cabo pelo mui-to empenho e confiança no êxi-to final.”

Note-se que afinal sempre houve um submarino metido no assunto, pois que como é relatado, o navio e a dra-ga “Mondego” foram mais tarde alvejados, em 26-8-1918, com 36 tiros dum submarino alemão o que fez fugir toda a gente na Cos-ta Nova e que só furou um tubo de descar-ga da draga.

Isto levou a que fosse enviado para jun-to do local uma bateria de artilharia, que apenas retirou quando da revolução mo-nárquica no Porto.

Valeu a pena? (quando a alma não é pe-quena…)

Sabe-se que o navio esteve ainda alguns

anos ao serviço, foi posterior-mente vendido, mudou de nome e acabou finalmente no ferro ve-lho, como quase todos os navios que se prezam…

Adriano de CarvalhoVALM REF

Anexos:1-Retirado de um blog:Era tão, tão popular a visita ao an-

damento das obras, junto do navio, por turistas e residentes, que até surgi-ram algumas versalhadas e cantilenas tais como:

“O Desertas arrolou, numa praia tão tamanha. Foi p’ra dar que fazer à gentinha da Gafanha.O Desertas arrolou, num dia de muito frio.É, por isso, meus senhores, que o Desertas “tá”

no rio.O Desertas encalhou, ó pistotira, ó pistotira, com

a proa p’rás Gafanhas, ó pistotira, ó pistotira, quan-do o barco foi embora, ó pistotira, ó pistotira, muitas mulheres ficaram pranhas.”

O “Desertas” saindo a barra com o rebocador “Cabo da Roca”.

Teve lugar no dia 21 de Janeiro, na Biblioteca Almirante Teixeira da Mota, da Academia de Marinha, em cerimónia presidida pelo Almirante CEMA, a tomada de posse dos novos titulares

dos cargos estatutários no triénio 2010/2012, eleitos em 10 de Janeiro na Assembleia dos Académicos convocada para o efeito.

O Conselho Académico ficou assim constituído:- Presidente – Almirante Nuno Gonçalo Vieira Matias- Vice-presidente da Classe de História Marítima - Prof. Doutor Francisco José Rosado Contente Domingues- Vice-presidente da Classe de Artes, Letras e Ciências - Profª Doutora Raquel Soeiro de Brito- Secretário-geral – CMG Adriano M anuel de Sousa Beça Gil- Vice-secretário da classe de História Marítima - Dr. João Abel Rodrigues Baptista da Fonseca- Vice-secretário da Classe de Artes, Letras e Ciências - CMG José Manuel Malhão Pereira

No seu discurso de tomada de posse, o Presidente da Academia agradeceu a presença do Almirante CEMA e manifestou o seu apre-ço pela total disponibilidade dos membros reconduzidos e ao novo secretário-geral.

Referindo-se ao Comandante Cyrne de Castro disse estar seguro de que ele continuará o seu trabalho e o seu muito saber em prol da Academia.

Após uma breve síntese das actividades académicas, no período iniciado quando assumiu funções, afirmou a sua ambição de “levar

aos mais diversos centros de saber a ideia de que é imperioso, vital mesmo, desenvolver e incrementar o poder do Estado no mar, no seu sentido mais amplo”.

Ao terminar, o Presidente disse estar certo de que a Academia dará um contributo para todas as medidas que levem à mudança do actual “status quo”, contando para tal desiderato com toda a rede de boas vontades ligadas ao mar.

Na alocução que então proferiu, o Almirante Melo Gomes afirmou que a Academia constitui um importante pilar na afirmação da Mari-nha junto da sociedade civil, mas também um terreno fértil para, junto daqueles que decidiram escolher servir o país na Marinha, fazer germi-nar o gosto pela investigação, estudo e aprofundamento dos assuntos do mar e a sua indelével relação com Portugal. Ao terminar o ALM. CEMA expressou uma palavra especial de reconhecimento ao Coman-dante Cyrne de Castro pelo trabalho que desenvolveu na Marinha ao longo de tantos anos, e em particular, nos últimos 12 neste órgão.

A concessão da Medalha Militar de Serviços Distintos-Prata cuja cerimónia decorreu na biblioteca Teixeira da Mota, antes da posse dos novos titulares dos cargos estatutários, “é elucidativo do meu apreço e reconhecimento do seu empenho notável e por uma vida de dedicação à Marinha”.

A cerimónia terminou com a apresentação de cumprimentos e fe-licitações aos membros do Conselho Académico e ao Comandante Cyrne de Castro.

(Colaboração da ACADEMIA DE MARINHA)

ACADEMIA DE MARINHA

Conselho Académico para o triénio 2010/2012Conselho Académico para o triénio 2010/2012

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MAN Ferrostaal Portugal, Lda. Rua do Campo, 16 – S.Pedro de Sintra 2710-476 SINTRA/PORTUGAL Phone: +351 21 9248223 Fax: +351 21 9248225 [email protected] www.manferrostaal.com

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 29

O Observatório Real da Marinha do Comandante António Estácio dos Reis

Muito embora a expressão País de Mari-nheiros seja amiúde utilizada para nos definir enquanto nação, também não

é menos verdade que, fruto de vicissitudes vá-rias, nem sempre as coisas relacionadas com o Mar receberam a atenção adequada. Em certa medida é esta última situação que o Co-mandante Estácio dos Reis retrata ao lon-go da sua última obra – O Observatório Real da Marinha –, recentemente edita-da pelos CTT1.

Segundo o autor, num país de tantas e tão fortes tradições marinheiras, custa até a acreditar que o Observatório Real da Marinha tenha tido tamanha dificulda-de em impor-se, constituindo facto ainda mais extraordinário a sua curta existência – entre 1798 e 1874 –, menos de um sé-culo, portanto, por comparação com ou-tros observatórios europeus. Ainda assim, cumpre recordar que neste período os tempos foram por demais atribulados, de-signadamente com as invasões francesas, a ida da corte para o Brasil, a independência da mais rica das colónias, as lutas liberais, a extinção das ordens religiosas, além das revoluções e sublevações várias. No con-texto referido, é de sublinhar a acção de D. Rodrigo de Sousa Coutinho (1755-1812), a quem se ficou a dever a criação do Observatório Real da Marinha a 15 de Março de 1798, tendo sido designado para primeiro director o Capitão-de--fragata Manuel do Espírito Santo Limpo.

Quanto às instalações que ocupou, nunca as teve dignas da sua relevante função, ocupando, inicialmente, um reduto contíguo à face sul do edifício onde se encontrava instalada a Sala do Risco, no antigo Arsenal da Marinha. Na sequên-cia da viagem da corte para o Brasil, com a qual seguiu a quase totalidade dos instrumentos do Observatório, este «manteve-se numa situação deplorável, quase sem instrumentos e […] sem actividade […], até que em 1824 foi transferido para as águas-furtadas das instalações dos lentes da Academia Real da Marinha». Aquando do incêndio que aí lavrou em 1843, o «Observa-tório regressa ao Arsenal e é metido no vão de uma janela da Sala do Risco, onde fica humilha-do até 1847», passando então a depender da recém-criada Escola Naval. Tal decisão deveu--se ao facto de, por esta altura, o Observatório se destinar, no essencial, «ao ensino das práticas da astronomia náutica e da pilotagem» dos cadetes, uma vez que, entretanto, havia sido construído o Observatório da Tapada da Ajuda, que não se encontrava na tutela da Marinha.

Curiosamente, algumas das relevantes ques-tões para os marinheiros desta época só foram em definitivo resolvidas após a extinção do Ob-servatório da Marinha em 1874, nomeadamen-te a definição da Hora Legal e a construção do chamado Balão do Arsenal, através do qual os navios fundeados no Tejo aferiam a marchas dos

respectivos cronómetros, prática que só extinguiu no início do século XX com o advento da TSF. A este propósito, aliás, deixa o Comandante Estácio dos Reis uma preciosa sugestão, de resto plena de oportunidade – no momento em que a Ribei-ra das Naus parece querer constituir-se como e x-

-libris da capital –, e que passa pela construção de uma réplica do famoso Balão do Arsenal, «que diariamente anuncie as 13 horas, como lembran-ça do Observatório Real da Marinha».

Na sua segunda versão, que entrou em fun-cionamento a 1 de Agosto de 1885, o Balão do Arsenal era constituído por uma esfera em

chapa galvanizada com um metro de diâmetro, enfiada num mastro com sete metros de altura. Nas imediações, encontrava-se uma peça de artilharia de calibre 38. De acordo com a in-vestigação do Comandante Estácio dos Reis, a sua operação respeitava o seguinte preceito: 15

minutos antes das 13 horas um funcioná-rio dava início ao içar do balão, para que 10 minutos antes daquela hora este esti-vesse a meia haste. Cinco minutos mais tarde era içado a tope. Às 13 horas exac-tas, através dos sinais transmitidos elec-tricamente pelo Observatório da Ajuda, era cortada a corrente do mecanismo do balão, o que provocava a sua queda por acção da gravidade, ao mesmo tempo que a peça de artilharia disparava um tiro de pólvora seca.

Para terminar esta recensão ao mais re-cente livro do Comandante Estácio dos Reis, elegemos precisamente as mesmas palavras de Filipe Folque (1800-1874), o último director do Observatório Real da Marinha, que além de lente da Academia de Marinha também foi mestre de mate-mática dos filhos de D. Maria II, com que o autor inicia esta sua magnífica obra:

«Desenganados por experiência pró-pria, que no nosso país não há coragem para de repente se criarem instituições de certa ordem, e que só se conseguem pouco a pouco à força de perseverança, trabalho e paciência, do que temos alguns exemplos».

Na nossa despretensiosa opinião, se na frase acima transcrita o leitor substituir «instituições» por «obras», estas mesmas palavras assentam que nem uma luva na produção bibliográfica e intelectual do Comandante Estácio dos Reis, que, com regularidade e a devoção que é apanágio dos grandes Marinheiros, sem com isso pretender qualquer tipo de mercê, nos vem, paulatinamen-te, restituindo muito do saber e cultura navais, em grande medida olvidados devido à proverbial fal-ta de visão relativamente àquilo que, nos tempos actuais de crescente indefinição e temor, é ver-dadeiramente importante preservar: as tradições, os conhecimentos e os valores mais nobres da Marinha, que pela acção e inteligência dos seus quadros sempre soube estar na vanguarda da mo-dernização e do desenvolvimento do país.

Confessamos, pois, senhor Comandante António Estácio dos Reis, que é com certa an-siedade que aguardamos a publicação da sua próxima obra. Bem-haja, pois, pela sua perse-verança e dedicação em prol da divulgação da nossa cultura naval e científica!

António Manuel GonçalvesCTEN

[email protected]

Nota:1 António Estácio dos Reis, O Observatório Real da

Marinha, Lisboa, CTT Correios de Portugal, 2009.

O Observatório Real da Marinha do Comandante António Estácio dos Reis

Capa do livro Observatório Real da Marinha, da autoria do Comandante Estácio dos Reis.

O mastro com o segundo Balão do Arsenal, instalado na extremidade sueste do telhado do edifício da Sala do Risco.

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Arquivo Museu de Marinha

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30 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

Ouvi outra vez, por acaso, aquela velha canção do Caribe. Senti, como que por milagre e por um instante, o calor

sufocante, o verde das margens – exuberante – e um pôr-do-sol que nunca mais acabava. Fiz há muitos anos uma viagem integrada em missão NATO que abordou a América Central. Um dos oficiais presentes na guarnição, ago-ra com funções de grande responsabilidade e que há muito não vejo, comprou um disco local, de música alegre, típica daquela zona do mundo…Ouviram-se aquelas canções ve-zes e vezes sem conta na Câmara de Oficiais, durante os longos períodos de navegação. Já sabíamos soletrar as letras, num espanhol com sotaque, que se colava à memória. Uma me-mória boa é como um agasalho quente, em dia ventoso. Faz-nos bem, em modos que a ciên-cia médica ainda tem que desvendar…Com aquela memória, com a música e o ritmo, re-cordei um divertido acontecimento que mar-cou aquela viagem…e a história surgiu, ainda mais esta vez…

Acontece que em determinado porto, aque-la força militar-naval ficou em doca paralela à de outros navios. Navios muito diferentes – de grandes dimensões, com nomes sonantes, como princesa “disto e daquilo”, “maravilha dos mares”, “beleza cintilante” e outros no-mes no mesmo tom de grandiosidade. Eram os grandes navios de cruzeiro, que carregados de europeus e americanos, cruzam o oceano Atlântico em busca de paragens quentes e be-las. Ora, cumprindo com a mais correcta tra-dição naval, um determinado Aspirante, que nesta história designarei como o Sr. Aspirante A, saiu em missão de cortesia. Assim que o na-vio terminou as tarefas da faina, foi incumbido de levar a tradicional cresta e os cumprimentos do comando ao capitão daquele outro navio, belo, grande e exótico. O Sr. Aspirante A foi e veio, silencioso. Ao jantar nesse dia, de acor-do com a sua verdadeira natureza, faladora e expressiva, impressionou-nos com o relato da opulência interior do navio, dos múltiplos res-taurantes, piscinas e ginásios…

Ao outro dia, logo após o pequeno-almoço, atendi um telefonema na Câmara de Oficiais. Era o Sr. Marinheiro de Serviço à prancha, que dizia então:

- Doutor, está uma senhora a procurar pelo Sr. Aspirante A.

- Pergunte-lhe ao que vem, respondi eu cauteloso.

Responde inquieto o Sr. Marinheiro- Ela falou em inglês que não é bem o meu

copo de água ó Sr. Doutor…Chamei o Sr. Aspirante A. Pedi-lhe para rece-

ber a visita à prancha, uma vez que ela pare-

cia conhecê-lo. Ele convidou a jovem senhora para a Câmara de Oficiais. A bordo só estava o “grupo de serviço”, pois depois de uma pro-longada navegação tinham sido concedidas li-cenças. Eu próprio estava de “Guarda Médica”, àquela força de sete navios. A jovem, soube-se imediatamente, era a “animadora” de bordo daquele monstro do lazer, que nos fazia som-bra. Tinha nascido na Rússia e era muito bela. Falava um inglês quase perfeito. Trazia uma garrafa de Rum e um quadro com uma foto do navio. Cumpria a missão de retribuir a cortesia prestada pelo navio de guerra português.

Ocorreu então que, enquanto eu fazia sala com a tal jovem, o Sr. Aspirante A perdia-se em comentários, com outro Aspirante da guarnição, sobre a beleza física da jovem representante do Leste e de como o Doutor parecia feliz… Admo-estei-o imediatamente, da forma mais discreta e cortês possível. Dis-se-lhe que, provavel-mente, ela também percebia português. Respondeu-me, cheio de certezas, que não podia ser, afinal ela era russa…. Mandei que nos servissem um refri-gerante. O grumete da taifa, que não percebia uma palavra de inglês, volta-se então para ela e perguntou descon-traidamente:

-Quer gelo?Ela respondeu qua-

se imediatamente e num português com sotaque brasileiro re-torquiu:

-Dois pedácinhos, por favorr…Ouvindo aquilo, o Sr Aspirante A, que tei-

mava em não se calar, mudou várias vezes de cor. A partir daí a nossa conversa continuou na língua lusa. A jovem desculpou-se airo-samente por ter usado inicialmente o inglês, pois não sabia quão diferente seria o português brasileiro, que ela tinha aprendido, do portu-guês europeu (o que me pareceu então uma pobre e matreira desculpa). Não falei mais do assunto. Contudo, outros dois aspirantes pica-vam incessantemente o Sr Aspirante A, com a “Russa Poliglota”…

Escusado será dizer que, quando soube des-ta história, o Imediato determinou que a Câma-ra precisava de melhorar a sua cultura literária e para tal foi necessário que o Sr. Aspirante A recitasse poesia, antes de cada refeição, du-

rante toda a missão e em bom português, sem-pre com sotaque brasileiro…Este facto elevou aquele quase banal acontecimento, ao estatu-to de mito naval.

Tenho muitas mais destas imagens que são histórias. Muitos outros, que também conhecem o som do nevoeiro e o abismo infinito preso no azul do mar, saberão cantar o sorriso dos mari-nheiros, no país longínquo das suas próprias re-cordações. Estes poetas, anónimos, terão certa-mente muitas outras histórias da vida naval, que poderiam contar com grande arte, engenho e sensibilidade. Pois se estas histórias têm algum mérito é a de demonstrarem que Santos de Casa podem fazer milagres, ainda que os próprios he-róis raramente disso se convençam…

Fiquei grande amigo daquele aspirante, que tem tido uma bela carreira naval. Já comandou

um navio e teve a amabilidade de me convidar para almoçar. No final do almoço, tinha um li-vro para me oferecer. Era o livro de poesia a par-tir do qual recitara naquela longínqua missão, as poesias com o sotaque brasileiro forçado…Momentos como estes fazem parte da mística naval e estão na memória de muitos. Classi-ficam-nos por aquilo que somos. Não somos melhores, nem piores, somos apenas diferentes, pois a maior riqueza da Marinha está nos seus homens e mulheres. Esses continuarão sempre a impressionar quem os procura conhecer.

Que agradável música aquela, que conti-nuei a ouvir e que simpática era a Russa Po-liglota. Que bela memória. Que bom foi po-der tê-la vivido e reservado para os dias frios, da vida…

Doc

HISTÓRIAS DA BOTICA (72)

A memória da velha canção e a jovem poliglota…

A memória da velha canção e a jovem poliglota…

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REVISTA DA ARMADA JANEIRO 2003 11REVISTA DA ARMADA DEZEMBRO 2009 31

VIGIA DA HISTÓRIA 19

Piratas

Com excepção do capitão Gancho, personagem da história do Peter Pan, sempre que se fala em piratas a imagem que logo ocorre é a de um indivíduo de má catadura, venda num olho e perna de pau.

Esta personagem, que integra o imaginário colectivo, tem resistido ao passar do tempo desde, pelo menos, há mais de 50 anos, numa canção popular brasileira até aos nossos dias em que um tipo de gelado e a res-pectiva campanha publicitária, fazem uso da figura de um pirata.

Estou em crer que, mais do que ao cinema, a existência de tal ima-gem se encontra alicerçada na tradição decorrente de factos ocorridos há muito, como é o caso da campanha de terror que, no século XVII, o corsário holandês Cornelis Jol semeou nas costas brasileiras e que se julga ser a origem da canção atrás citada já que o corsário era conheci-do pela alcunha de “Pé de Pau”.

Também os factos que seguidamente se relatam terão contribuído para manter a imagem que hoje ainda temos dos piratas

Em Setembro de 1552, Sebastião Gonçalves informava, do Funchal, que algum tempo atrás haviam entrado naquele porto navios ingle-ses. À chegada informaram que andavam em busca de uns desertores que se haviam passado para o serviço de um corsário francês de nome “O Pé de Pau”.

É muito provável que tivessem sido os navios deste corsário os que haviam atacado navios de Lagos e de Portimão e que haviam tentado assaltar navios fundeados no Funchal e pilhado Porto Santo, tudo isto num período 3/4 meses.

Não consta que este corsário, que espalhou o terror na zona, fosse algum dos vários corsários franceses apresados e condenados à mor-te naquele período.

Quanto aos navios ingleses não será de estranhar que integrassem as hostes do corsário já que, tendo sido bem recebidos, voltaram dias depois a entrar no Funchal cometendo assaltos e roubos, vindo a fugir quando atacados por navios portugueses.

Também com o mesmo nome de Pé de Pau, mas este de nacionali-dade inglesa, existia um outro corsário, no início do século XVII. Este corsário tornara-se um renegado, vivendo na Berberia, onde tinha a sua base de operações e onde vendia, como escravos, todos os cristãos que capturava no assalto a navios ou nas incursões em terra, em especial no Algarve e no Sul de Espanha.

No princípio do Verão de 1606 uma armada de 7 galeões portugue-ses, sob o comando do conde de Alba, saiu de Lisboa com destino a Sevilha.

Desconhece-se quando, mas possivelmente no regresso, a armada dos galeões deparou-se, na costa do Algarve, com o famigerado cor-sário dando-lhe logo combate, combate esse que terá sido renhido, tendo os portugueses, apesar de alguns mortos e feridos, entrado no galeão inimigo.

Todos os sobreviventes, incluindo o corsário Pé de Pau, foram enfor-cados nas vergas do galeão.

Com. E. Gomes

Fontes:Códice 8570 Biblioteca Nacional de LisboaCorpo Cronológico da Torre do Tombo 1ª Parte, maço 88 doc. 6, 12, 70 e 122 “Salvador Correia de Sá e Benevides e a reconquista de Angola em 1648” por

Charles R. Boxer

Piratas

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REVISTA DA ARMADA MARÇO 2010 33

QUARTO DE FOLGA

JOGUEMOS O BRIDGEJOGUEMOS O BRIDGEProblema Nº 127

Todos vuln. Após uma abertura de W em 1 , S vai jogar o contrato de 4 recebendo a saída de A, e tendo W mudado o flanco para D logo que viu o morto e o par-ceiro lhe sinalizou 3 cartas no seu naipe jogando o 4, para impedir que S pudesse querer cortar uma . Perante este ataque, qual deve ser a linha de jogo de S para tentar cumprir o seu contrato, podendo adiantar que os trunfos e os estão 3-2?

(Solução neste número)

TAPE AS MÃOS DE E – W PARA TENTAR RESOLVER A 2 MÃOS.

SOLUÇÕES: PROBLEMA Nº 127S ficou assim com 3 perdentes a e vai ainda ter de perder um trunfo, não tendo forma de evitar esta perdente, face às cartas que lhe faltam. O ataque a matou a possibilidade de cortar uma no morto, havendo, no entanto, a hipótese de baldá-la no , desde que a mão que tiver 3 trunfos tenha igualmente 3 cartas de

, o que terá sido bem pensando mas não é o caso, e se foi por aí cabidou. A solução será deixar W fazer a D de trunfo, já que tem sempre de a perder. Repare que W fica sem defesa, pois se joga outro trunfo S faz e destrunfa, e nos balda as perdentes a acabando mesmo por fazer 11 vazas.

Nunes MarquesCALM AN

Oeste (W):

ARV103

DV9

32

R32

Este (E):

874

87

765

D9876

Norte (N):

D2

102

D10984

AV105

965

Sul (S):

AR6543

ARV

4

PALAVRAS CRUZADASProblema Nº 410

PALAVRAS CRUZADAS

123456789

1011

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

HORIZONTAIS: 1 – Golpe de zagunchos. 2 – Que ou o que alaga; o sol en-tre os egípcios. 3 – Trena, na confusão; debaixo de. 4 – Que tem duas asas. 5 – Grito; monte vulcânico da Anatólia, que, segundo a Bíblia pousou a arca de Noé. 6 – Agora; mil duzentos e dois romanos; graceja. 7 – É quase espalha; prefixo de novo (inv). 8 – Que tem cor de amora. 9 – Soberano, nivelai com a rasoira. 10 – Letra grega (inv); joeirar com ciranda. 11 – Vaso, recipiente para conter o sabonete.

VERTICAIS: 1 – Planta oleácea (pl). 2 – Ice; Nota musical (pl); estava. 3 – Ga-lhardia; progenitor. 4 – Igualai; três de amalgama; símb. quím. do cobalto. 5 – Creme; célebre pianista e compositor de música, nascido em Varsóvia, de origem francesa. 6 – Símb. quím. do cádmio; revestir de laca; nota musical. 7 – É quase horário; perda de valor de uma mercadoria (inv). 8 – Aspecto; contracção da prepos. de e do advérbio aí; irrite (fig). 9 – Ribeira de Portu-gal; idoso na confusão. 10 – Anel; medida de superfície; rio da Suíça. 11 – Relativo a sabatina.

SOLUÇÕES: PALAVRAS CRUZADAS Nº 410HORIZONTAIS: 1 – Zagunchadas. 2 – Alagador; Ra. 3 – Nerat; Sob. 4 – Bialado. 5 – Ulo; Ararat. 6 – Já; MCCII; Ri. 7 – Esplha; Oen. 8 – Amorado. 9 – Rei; Rasai. 10 – Or; Cirandar. 11 – Saboneteira.

VERTICAIS: 1 – Zanbujeiros. 2 – Ale; Las; Era. 3 – Garbo; Pai. 4 – Ugai; Mlm; Co. 5 – Nata; Chopin. 6 – Cd; Lacar; Re. 7 – Horari; Arat. 8 – Ar; Dai; Dane. 9 – Sor; Oosdi. 10 – Aro; Are; Aar. 11 – Sabatineira.

Carmo Pinto1TEN REF

O PRIMEIRO MESTRE DE HISTÓRIA MARÍTIMAO Mestrado de

História Marítima iniciado no passado ano de 2007 teve o seu primeiro aluno

a defender a sua dissertação no passado dia 7 de Janeiro. Tratou-se do Dr. Carlos Manuel Montalvão de Sousa, licenciado e pós-gradua-do em Filosofia, que apresentou uma disser-tação intitulada O Livro da Fábrica das Naus de Fernando Oliveira. Princípios e procedimentos de construção naval.

As provas tiveram lugar no anfiteatro 3 da Faculdade de Letras, pe-rante uma numerosa assistência e um júri presidido pelo Prof. Doutor António Dias Farinha, com a arguição da Profª Doutora Maria Isabel Vicente Maroto, da Universidade de Valladolid, e integrando o Prof. Doutor Viriato Soromenho Marques e o Prof Doutor Francisco Con-

tente Domingues, na qualidade de orientador da respectiva dissertação.

Está de parabéns o novo Mestre, pelo seu esforço e pelo êxito alcançado com um bri-lhantismo invulgar, a merecer a extraordinária

classificação final de 19 valores. O Mestrado de História Marítima resul-

tou de um protocolo assinado entre a Ma-rinha e a Faculdade de Letras da Universi-dade de Lisboa, em 2007, numa iniciativa que teve uma primeira fase escolarizada a funcionar na Escola Naval, com semi-nários da responsabilidade de docentes de ambas as instituições. Com a apresen-

tação das primeiras provas públicas, começam agora a colher-se os primeiros frutos de uma iniciativa de sucesso.

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No passado dia 11 de Dezembro a guarnição do N.R.P. “D. Car-los I”, visitou o Palácio Nacional da Ajuda, procurando assim conhe-cer a vida de um patrono distinto que marcou a história de Portugal, o Rei D. Carlos I. No âmbito das muitas iniciativas que desenvolveu, não podemos deixar de mencionar os estudos oceanográficos e da fauna marítima, que desenvolveu ao longo das várias campanhas a bordo dos iates reais “Amélia”, que lhe granjearam reconhecimento internacional. Estes estudos são consideradas as bases da moderna oceanografia portuguesa.

Esta visita que contou com uma preciosa e entusiasmante parti-cipação da Dr.ª Mafalda Portugal e do Sr. Paulo Silvestre, que para além da descrição do espólio do Palácio, deram-nos a conhecer uma visão pormenorizada, dos interesses e conhecimentos do monarca, que desde a sua infância se revelou um óptimo estudante e pintor, onde o mar e tudo o que lhe dizia respeito lhe inspirava um inte-resse especial.

O Comando e a guarnição do NRP “D. Carlos I”, agradecem ao Palácio Nacional da Ajuda o apoio a esta iniciativa.

34 MARÇO 2010 REVISTA DA ARMADA

NRP “D. CARLOS I” “CONHECENDO O SEU PATRONO”

NOTÍCIAS PESSOAIS

RESERVA

CMG Carlos Nelson Lopes da Costa ● CMG Augusto Castro Garcia ● CMG Rui Manuel Martins de Carvalho ● CMG António Manuel Ferreira de Campos ● CMG João Carlos do Amaral Lourenço ● CMG António José Aguiar de Jesus Cos-ta e Castro ● CMG Nuno Miguel Teixeira Esteves ● CMG EMQ Franclim Silva Loução Vítor ● CTEN SEM António Pedro Gouveia Araújo ● 1TEN ST MEC José António Claro Alves ● 1TEN STC José Tomás Bento Grazina Martinho ● SMOR ETC António Mateus de Oliveira Henriques ● SCH M Eduardo António Abraços Alhinho ● SCH CM Manuel dos Santos Anacleto ● SAJ R Augusto do Nascimento Seixas ● SAJ B Fernando Gonçalves Pereira ● SAJ ETI Carlos Manuel de Olivei-ra Faria ● 1SAR B Victor Hugo Dias Franco ● 1 SAR TF Carlos Manuel Mendes Martins ● 1SAR M António Manuel Viana da Silva ● 1SAR TF Joaquim Fernando Rodrigues Alves Gago ● 1SAR T João Maria dos Santos Nunes ● 2SAR C Pedro Jorge Cristóvão Rodrigues ● CAB A Daciano Duarte Ferreira ● CAB L Miguel Marques Varunca ● CAB B José Fernando Barbosa Ferreira.

REFORMA

CMG Roberto Figueiredo Robles ● CFR OT Manuel Serra Biscaia ● SMOR FZ Carlos Eduardo Lencastre e Meneses Pereira ● SMOR T Serafim de Azevedo Cabral Pereira ● SMOR A Manuel Pacheco Domingos ● SMOR H Manuel João Rebola Martins ● SAJ TF Elvino de Jesus Gonçalves ● SAJ L Gilberto de Almei-da Monteiro ● SAJ A Alfredo António Fernandes Madeira ● 1SAR L José Ma-nuel Melo Teixeira ● CAB TFD António Ildefonso Dias Costa ● CAB A Carlos Manuel Marques Vieira ● CAB TF H Manuel Silvestre Nobre ● CAB R Antó-nio José Rodrigues ● CAB CM Carlos Ferreira de Freitas ● CAB E José Alberto Silveira de Carvalho.

FALECIMENTOS

CALM REF Armando Eugénio de Castro Rodrigues Filgueiras Soares ● CMG FZ REF Francisco Isidoro Montes de Oliveira Monteiro ● CFR RES João Carlos Agostinho Velez ● 1TEN SG REF Jaime de Jesus Barão ● SCH L REF António Dias Pinheiro ● SAJ A REF Nuno do Couto Pinto Cardoso ● SAJ T REF Mário Orlando Soares Pimenta ● SAJ R REF Álvaro Ribeiro ● 1SAR FZ REF João Manuel Vin-tém Nunes ● 1SAR MQ REF Humberto de Miranda Cabral ● 1SAR A REF José Fernandes Vinhas ● 1SAR H REF José dos Reis Monteiro ● 1SAR C REF Barto-lomeu Matos Ferreira ● CAB CM REF José de Freitas ● CAB CM REF António José R odrigues ● CAB FZ REF Joaquim Marcelino Duarte Rodrigues ● 1MAR DFA REF António Martins Ribeiro ● 2GR RC Fábio Miguel Lourenço Antunes ● MAQ 1/AC QPMM APOS Carlos da Conceição Baptista Travassos ● FAROL CH QPCM APOS David Manuel Sousa e Silva.

COMANDOS E CARGOSNOMEAÇÕES

VALM José Joaquim Gomes Baguinho nomeado para Vice-Chefe do Estado--Maior da Armada ● VALM RES Carlos Alberto Viegas Filipe nomeado Direc-tor-Geral da DGAIED ● CMG FZ António da Silva Campos nomeado Adido de Defesa junto da embaixada de Portugal em Bissau, República da Guiné/Bis-sau acumulando idênticas funções em Conacry República da Guiné e em Dacar Repú blica do Senegal.

CORRECÇÕES

CONVÍVIO

“FILHOS DA ESCOLA” JANEIRO DE 1973

Por lapso, no artigo ARRASTÕES DO ALTO/ARRASTÕES MILITARIZADOS da RA nº 438, saíram algumas imprecisões que se corrigem. Assim, onde se lê:

- “Augusto Castilho” deve ler-se “Augusto de Castilho”- “Sam Miguel” deve ler-se “San Miguel”- FY deve ler-se FY 246 e FY 185.

No passado dia 16 de Janeiro, os “Filhos da Escola” de Janeiro de 1973 realizaram o seu 8º almoço-convívio em Évora, na Quinta do Calhetas, reunindo cerca de 140 pessoas, a fim de se comemorar o 37º aniversário da entrada na “Briosa”.

De novo foi lida a ordem OP2 no seu texto integral de quando todos as-sentaram praça na Escola Alunos Marinheiros, em Vila Franca de Xira.

O almoço decorreu em ambiente de sólida camaradagem, recordan-do os bons momentos vividos na Marinha.

No final do convívio ficou a promessa de que para o ano, novo en-contro será marcado.

A comissão organizadora agradece à Marinha a gentileza de dispo-nibilizar o transporte para este tipo de evento.

(Colaboração do SMOR E José Armada)

NOTÍCIA

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3. O CRUZADOR “ALMIRANTE REIS”

Navios da RepúblicaNavios da República

Construído em Inglaterra nos estaleiros da casa Armstrong, em Newcastle on Tyne, é lançado à água a 5 de Maio de 1898. Passa à situação de armamento completo a 8 de Julho e com a designação de cruzador “D. Carlos I” demanda, pela primeira vez, a barra do Tejo no dia 20 do mesmo mês.

O casco era de aço e as suas características principais as seguintes:Deslocamento ......................................................... 4.253 toneladasComprimento entre prependiculares ..........................110,00 metrosBoca .............................................................................14,40 “Calado máximo..............................................................5,33 “

Do aparelho propulsor constavam 12 caldeiras arquibulares, tipo Yarrow, e máquinas a vapor de tríplice expansão, 4 cilindros com a potência de 12.729 cavalos que correspondiam à velocidade de 20 nós. O armamento era constituído por: 4 peças Armstrong de 150 mm e 8 de 120; 16 peças Hotchkiss de 47 mm e 2 de 37, 4 metralha-doras Nordenfelt de 6,5 mm; 2 tubos lança torpedos amoviveis aci-ma da linha de flutuação e 2 submersos. A guarnição era composta de 442 elementos (20 oficiais, 46 sargentos e 376 praças).

O navio esteve operacional até 1916 e o seu historial pode-se di-vidir em dois períodos distintos: o primeiro até à queda do regime monárquico e o segundo durante a República.

Na vigência da Monarquia fo-ram atribuídos ao cruzador es-pecialmente missões de repre-sentação no estrangeiro. Assim, em Abril de 1900 larga rumo à América do Sul para participar no IV Centenário da Descoberta do Brasil. Em Agosto desloca-se ao Ferrol a fim de prestar homena-gem à Família Real Espanhola. Escala o porto inglês de Portsmouth, em Fevereiro de 1901, para participar nas solenidades fúnebres da Rainha Victória.

Em Junho e Julho faz parte da Divisão Naval que acompanha a visi-ta de D. Carlos e de D. Amélia à Madeira e aos Açores. Está presente, em Agosto de 1902, na Revista Naval realizada na baía de Spithead, quando da coroação do rei Eduardo VII. Em Outubro participa, no Rio de Janeiro, nas cerimónias de investidura do presidente eleito da República do Brasil, filho de um cidadão português.

No ano seguinte, ano de 1903, em Abril escala Alger e em Junho Cartagena, prestando respectivamente homenagem a Émile Loubet, Pre-sidente da República Francesa e a D. Afonso XIII, Rei de Espanha.

Ainda no âmbito das missões de representação o cruzador está em Lagos, nos meses de Agosto de 1903 e de 1905 e em Junho de 1909, para receber as esquadras inglesas do Atlântico e do M editerrâneo.

A sua última viagem de representação foi de Abril a Julho de 1910, para tomar parte nas festas do 1º Centenário da Independência da Argentina, tendo na ocasião praticado os portos do Rio de Janeiro, Montevideu e Buenos Aires.

Durante uma década o cruzador tinha-se tornado uma presença indispensável nos eventos em que era necessário, no mar, represen-tar condignamente Portugal.

Neste período, além das missões de representação já citadas, ou-tros factos ocorreram.

A pretexto da disciplina ser considerada a bordo demasiadamente rigorosa, dá-se, em 8 de Abril de 1906, uma insubordinação. A ordem é restabelecida passados três dias, após o desembarque da guarnição e do comandante ter reassumido o seu comando.

Larga de Lisboa em Agosto de 1906 rumo a Newcastle para ser

submetido a grandes fabricos. Regressa a Lisboa em Setembro do ano seguinte.

Durante a vigência da Monarquia integra, durante curtos períodos, a Divisão Naval de Defesa e Instrução nas águas do Continente e Ilhas Adjacentes, excepto de Janeiro a Abril de 1909, com aspirantes da Escola Naval, em que visita portos do Mediterrâneo.

Destaque-se ser o segundo navio onde foi instalada, em Janeiro de 1910, uma aparelhagem de TSF. O primeiro tinha sido o cruzador “S. Gabriel”, em Dezembro de 1909.

Às primeiras horas do dia 4 de Outubro de 1910, vários navios da Esquadra revoltam-se tendo o cruzador “Adamastor” dado tiros de salva, sinal do começo do que seria a implantação da República. Porém, o “D. Carlos I” iça, como habitualmente às 8 horas da ma-nhã, a bandeira azul e branca da Monarquia. Apenas pelas 22 horas desse dia e após a entrada a bordo de alguns revolucionários che-fiados pelo 2º tenente José Carlos da Maia, que toma o comando, o cruzador adere à revolta.

Em 1 de Dezembro o navio passa a chamar-se cruzador “Al-mirante Reis”, iniciando o se-gundo e último período da sua história.

À semelhança do sucedido no período anterior continua a inte-grar a Divisão Naval quando esta é periodicamente a ctivada.

Entretanto a Grande Guerra tem o seu início sendo então for-madas expedições militares para reforçar as fronteiras sul de An-gola e norte de Moçambique. O cruzador larga em Setembro es-

coltando navios com os expedicionários embarcados, tendo escala-do Luanda, Cidade do Cabo, Lourenço Marques e Porto Amélia. Re-gressa em Fevereiro de 1915.

A situação política era então muito instável, sucedendo-se por isso os governos e os movimentos revolucionários. Na madrugada de 14 para 15 de Maio de 1915 dá-se a revolta contra o Governo do Ge-neral Pimenta de Castro. O comandante do “D. Carlos I”, Capitão--de-mar-e-guerra Joaquim Neves da Silva é ferido e vem nesse dia a falecer no Hospital da Marinha.

A última saída para o mar foi um cruzeiro às Berlengas. Larga de Lisboa em 29 de Janeiro de 1916 e demanda, pela última vez, a bar-ra do Tejo no dia seguinte.

A 9 de Março a Alemanha declara guerra a Portugal e em 18 de Maio o cruzador “Almirante Reis”, à testa da Divisão Naval de Defesa e Instrução, toma parte na Revista Naval que então se efectua peran-te o cruzador “Vasco da Gama”, a bordo do qual se encontravam o Presidente da República, o Governo e o Corpo Diplomático.

Os fabricos, significativamente onerosos que o cruzador necessi-tava, foram-se protelando, principalmente por dificuldades financei-ras. A Grande Guerra aproxima-se do fim assim como o cruzador “Almirante Reis”.

Passa ao estado de desarmamento completo em Fevereiro de 1918 e em 22 de Janeiro de 1925 é abatido ao “Efectivo dos Navios da A rmada” aquela unidade naval que, dotada de um moderno e com-pleto armamento para a época, excelente velocidade, apreciáveis di-mensões e desenho de verdadeira unidade de combate, é considerada o único “autentico cruzador” que a Marinha teve ao seu serviço.

J. L. Leiria PintoCALM

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3. O CRUZADOR “ALMIRANTE REIS”

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