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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA N.º 143/2018 – AJC/SGJ/PGR Sistema Único n.º 118723/2018 SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM REQUERENTE: União REQUERIDA: Juíza da 1ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Amazonas INTERESSADA: Via Direta Telecomunicações Via Satélite e Internet Ltda INTERESSADA: Telecomunicações Brasileiras S/A – Telebras INTERESSADA: Viasat Inc RELATORA: Ministra Presidente CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DE LIMINAR. SATÉLITE GEOESTACIONÁRIO BRASILEIRO DE DEFESA E COMUNICAÇÕES ESTRATÉGICAS – SGDC. EXPLORAÇÃO DA BANDA KA. CONTRATAÇÃO DE EMPRESA ESTRANGEIRA PELA TELEBRAS. SUS- PENSÃO DO CONTRATO. LESÃO À ORDEM E À ECONO- MIA PÚBLICAS. INDEFERIMENTO DA CONTRACAUTELA. 1. Pedido de contracautela ajuizado contra decisão que suspen- deu contrato firmado entre a Telebras e empresa estrangeira para a exploração de 100% da capacidade da banda Ka do Sa- télite Geoestacionário Brasileiro de Defesa e Comunicações Es- tratégicas – SGDC. 2. Mesmo exercendo atividade finalística própria de seu objeto social – natural de sua atividade econômica privada –, a Tele- bras não detém discricionariedade irrestrita para a contrata- ção de parceria. Deve a entidade pública pautar-se pelos princípios que regem a Administração Pública, tais como a le- galidade, a impessoalidade, a publicidade, a isonomia e o inte- resse público. 3. Tendo a Telebras promovido procedimento de seleção pú- blica para a comercialização de parte da capacidade satelital, e frustrada a escolha por ausência de interessados e impossibili- tado novo procedimento, a contratação direta – se efetivada – deveria preservar as condições preestabelecidas no regula- mento da disputa concorrencial. 4. O contrato firmado pela Telebras com a empresa Viasat – de compartilhamento de 100% da exploração da banda Ka do satélite brasileiro – constitui verdadeiro esvaziamento da fun- ção da estatal como responsável pela operação da banda civil do SGDC, sem qualquer reserva de exclusividade que garanta a implementação dos objetivos do Programa Nacional de Banda Larga – PNBL. Gabinete da Procuradora-Geral da República Brasília/DF Documento assinado via Token digitalmente por PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE, em 08/05/2018 14:44. Para verificar a assinatura acesse http://www.transparencia.mpf.mp.br/validacaodocumento. Chave F83F45E0.DE9B3359.0612DE31.61CC28F7

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

N.º 143/2018 – AJC/SGJ/PGR Sistema Único n.º 118723/2018

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AMREQUERENTE: UniãoREQUERIDA: Juíza da 1ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do AmazonasINTERESSADA: Via Direta Telecomunicações Via Satélite e Internet LtdaINTERESSADA: Telecomunicações Brasileiras S/A – TelebrasINTERESSADA: Viasat IncRELATORA: Ministra Presidente

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DELIMINAR. SATÉLITE GEOESTACIONÁRIO BRASILEIRODE DEFESA E COMUNICAÇÕES ESTRATÉGICAS –SGDC. EXPLORAÇÃO DA BANDA KA. CONTRATAÇÃODE EMPRESA ESTRANGEIRA PELA TELEBRAS. SUS-PENSÃO DO CONTRATO. LESÃO À ORDEM E À ECONO-MIA PÚBLICAS. INDEFERIMENTO DACONTRACAUTELA.

1. Pedido de contracautela ajuizado contra decisão que suspen-deu contrato firmado entre a Telebras e empresa estrangeirapara a exploração de 100% da capacidade da banda Ka do Sa-télite Geoestacionário Brasileiro de Defesa e Comunicações Es-tratégicas – SGDC.

2. Mesmo exercendo atividade finalística própria de seu objetosocial – natural de sua atividade econômica privada –, a Tele-bras não detém discricionariedade irrestrita para a contrata-ção de parceria. Deve a entidade pública pautar-se pelosprincípios que regem a Administração Pública, tais como a le-galidade, a impessoalidade, a publicidade, a isonomia e o inte-resse público.

3. Tendo a Telebras promovido procedimento de seleção pú-blica para a comercialização de parte da capacidade satelital, efrustrada a escolha por ausência de interessados e impossibili-tado novo procedimento, a contratação direta – se efetivada –deveria preservar as condições preestabelecidas no regula-mento da disputa concorrencial.

4. O contrato firmado pela Telebras com a empresa Viasat –de compartilhamento de 100% da exploração da banda Ka dosatélite brasileiro – constitui verdadeiro esvaziamento da fun-ção da estatal como responsável pela operação da banda civildo SGDC, sem qualquer reserva de exclusividade que garantaa implementação dos objetivos do Programa Nacional deBanda Larga – PNBL.

Gabinete da Procuradora-Geral da RepúblicaBrasília/DF

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5. A garantia de uma faixa mínima de operacionalização dabanda Ka pela própria Telebras, voltada para a prestação dosserviços de conexão da Administração Pública, constitui segu-rança das informações governamentais e, em última análise,proteção da soberania nacional.

6. Possíveis óbices ou atrasos nas ações relativas aos progra-mas de acesso à internet do Governo Federal não constituemfundamento suficiente para o acolhimento da suspensão.

7. O provimento impugnado reveste-se de razoabilidade, deforma que o deferimento da suspensão é que consubstanciarisco de lesão à ordem pública, na acepção jurídico-constituci-onal.

‒ Parecer pelo indeferimento do pedido de suspensão.

Trata-se de pedido de suspensão formulado pela União com o objetivo de sustar

os efeitos de decisão do Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Amazonas,

mantida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que suspendeu o contrato firmado entre

a Telecomunicações Brasileiras S/A – Telebras e a empresa estadunidense Viasat Inc para a

exploração de 100% da capacidade da banda Ka do Satélite Geoestacionário Brasileiro de

Defesa e Comunicações Estratégicas – SGDC.

A liminar que se pretende suspender foi proferida nos autos de ação de obrigação

de fazer e não fazer cumulada com danos morais e materiais ajuizada pelas empresas Via Di-

reta Telecomunicações por Satélite e Internet Ltda e Rede de Rádio e Televisão Tiradentes

Ltda contra a Telebras e a referida empresa estrangeira, com o objetivo de questionar a legali-

dade da parceria firmada para a exploração comercial do satélite brasileiro.

Relata a inicial da ação subjacente que o SGDC foi lançado em 4 de maio de

2017 e deveria ter entrado em operação até o final daquele ano. Narra, ademais, que parte da

capacidade do satélite ficou reservada para uso das Forças Armadas e outra parte deveria ser

negociada entre as empresas do setor de telecomunicações em operação no Brasil.

Segue assinalando que, em outubro de 2017, a Telebras promoveu um leilão para

a comercialização de parte da capacidade satelital do SGDC, cujas regras foram definidas por

meio de edital de chamamento público, restando frustrado o leilão por ausência de interessa-

dos.

Salienta que, no último dia 6 de fevereiro, a Telebras e a Viasat publicaram comu-

nicado informando a celebração do contrato estratégico para uso comercial da capacidade ci-

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vil do satélite brasileiro. As autoras da ação principal questionam as condições do pactuado,

suscitando possível afronta à soberania nacional econômica, em razão da outorga de 100% da

exploração da banda Ka para a citada empresa americana.

A tutela de urgência foi, inicialmente, concedida pelo Juízo da 14ª Vara Cível da

Comarca de Manaus/AM e, com o ingresso da União na lide e o encaminhamento dos autos à

Justiça Federal, confirmou-se a liminar pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do

Estado do Amazonas, para o fim de suspender imediatamente o contrato firmado entre a Tele-

bras e a Viasat.

Eis os termos essenciais do pronunciamento:

[…]

2. Defiro, ainda, o pedido de segredo de justiça, restrito aos documentos que acompa-nham as petições, ressaltando, porém, que a própria requerida entregou contrato, senhase coordenadas do único ‘Satélite de Defesa Estratégica’ brasileiro à empresa estrangeira,de modo que eventuais pulverizações de informações sensíveis à segurança devem serapuradas com esse destaque.

3. Neste ponto, impende destacar circunstância fática e jurídica inusitada, a causar per-plexidade ao Magistrado encarregado de interpretar e aplicar a Constituição (em controledifuso) e as leis do país, qual seja o fato de um equipamento de telecomunicação gover-namental, que envolveu gastos públicos estimados nos autos em 4 (quatro) bilhões de re-ais, e denominado de “Satélite de Defesa Estratégica”, ter sido entregue para uso eexploração exclusiva a uma empresa estrangeira – a requerida VIASAT INC[1].

4. Somente o fato mencionado no item 3 já atenta contra a Constituição Federal, do seupreâmbulo aos seus fundamentos e princípios, em especial no ponto referente à segu-rança e soberania, dois dos sustentáculos do Estado Democrático de Direito previsto noart. 1º da Carta Maior.

5. Quanto ao único ato judicial com conteúdo decisório nos autos, qual seja a decisãoproferida pelo juízo estadual antes do ingresso da União na sua condição pleiteada - a deassistente simples – passo a analisar a possibilidade de sua ratificação, à luz da presençados requisitos legais referentes à plausibilidade do argumento e o risco se a decisão fortomada somente ao final do processo, tudo nos termos do art. 300 do NCPC.

6. O noticiado esvaziamento do procedimento licitatório que deveria escolher 3 (três)empresas do ramo de telecomunicações para operar o satélite brasileiro não autoriza a re-querida TELEBRÁS a optar por formalizar um contrato de exclusividade com a reque-rida VIASAT INC[2], entregando à empresa de capital estrangeiro o Satélite,inegavelmente um patrimônio do povo brasileiro, com violação dos Princípios da Legali-dade, Moralidade, Transparência e Isonomia.

7. Não há a menor plausibilidade da tese (a ser por óbvio desenvolvida pelas requeridas)no sentido de que o procedimento licitatório teria sido frustrado por suposta ausência deinteressados. Tal circunstância, a ser apurada oportunamente nos autos, não tem o condãode autorizar a requerida TELEBRÁS a fazer escolha aleatória por uma única empresapara explorar comercialmente o satélite brasileiro em banda KA[3].

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8. No ponto do item 7, o art. 29 da chamada Lei das Estatais (lei 13.303/2016), mesmanorma que faculta a dispensa de licitação em situações de ausência de competidores,prevê expressamente que a dispensa tem que obedecer as condições preestabelecidas noedital.

9. Disse o legislador que:

Art. 29. É dispensável a realização de licitação por empresas públicas e sociedades deeconomia mista:

(...).

III - quando não acudirem interessados à licitação anterior e essa, justificadamente,não puder ser repetida sem prejuízo para a empresa pública ou a sociedade de econo-mia mista, bem como para suas respectivas subsidiárias, desde que mantidas as con-dições preestabelecidas;

10. Em assim sendo, se o edital de Chamamento Público n. 2 que estabeleceu as regrasoriginais do leilão público previa o leilão de 3 (três) lotes, para contemplar 3 (três) em-presas do ramo de telecomunicação, não se identifica norma vigente que autorize a re-querida TELEBRÁS a escolher ao seu alvedrio uma empresa com exclusividade,utilizando critérios sem transparência e sem a devida publicidade, a contrariar os princí-pios da legalidade, moralidade, publicidade e isonomia entre interessados em contratarcom a administração pública. Mais grave ainda quando a empresa é cem porcento estran-geira.

11. Mesmo que este juízo fizesse um esforço argumentativo imensurável, não haveriacomo encontrar nas leis e na Constituição do país uma norma ou princípio que susten-tasse a entrega da exploração do único satélite de defesa estratégica à uma empresa es-trangeira, sem qualquer previsão mínima nem mesmo em Edital.

12. A escolha da requerida TELEBRAS, mediante exclusividade, por uma empresa es-trangeira para operar o satélite 100% brasileiro, revela ao mesmo tempo ilegalidade eanomalia administrativa, mediante a inobservância do dever de garantir a eficácia do fun-damento da soberania (art. 1º da CF), demonstrando ainda violação à Lei das Licitações edas Estatais. […]

15. Todos os itens acima denotam a presença da plausibilidade do argumento da(s) re-querente(s), sendo que a presença do risco de ineficácia da medida - caso concedida so-mente ao final - se revela pela proximidade da exploração exclusiva por empresaestrangeira do único satélite brasileiro de defesa nacional, o que expõe a grave risco a se-gurança e a soberania do país.

16. Não há risco de dano inverso, seja porque o satélite aguarda operação inédita e suautilização deve servir à nação brasileira e não ao capital estrangeiro (na forma como de-terminam a Constituição e as leis do país), seja porque todas as unidades militares estãoprotegidas por sistema próprio, não tratado nesses autos. […]

Ajuizado e indeferido pedido de contracautela perante o Tribunal Regional Fede-

ral da 1ª Região, aviou a União o presente pedido de suspensão, que, inicialmente formulado

junto à Presidência do Superior Tribunal de Justiça, foi encaminhado à Suprema Corte, ao

fundamento de que a controvérsia é de índole constitucional.

A União afirma risco de grave lesão à ordem e à economia públicas, asseverando

que a eventual procedência dos pedidos contidos na ação principal acarretará impactos dele-

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térios em uma série de políticas públicas do Governo Federal, entre elas os programas Go-

verno Eletrônico, Educação Conectada, Internet para todos e Programa Nacional de Banda

Larga.

Sustenta que o SGDC foi lançado com sucesso em 4 de maio de 2017, após pes-

quisas e investimentos de aproximadamente R$ 3 bilhões, encontrando-se em órbita para ex-

ploração de duas capacidades: uma militar (Banda X) e uma civil (Banda Ka).

Consigna que a Banda X já foi cedida ao Ministério da Defesa por meio de con-

trato de cessão de direito de uso pelo prazo de 15 anos e a capacidade da Banda Ka deverá

destinar-se à utilização civil para a prestação de serviços de conexão à internet em banda

larga, que será explorada, diz, de acordo com a premissas comerciais da própria Telebras, de

forma conjunta com empresa parceira do setor privado.

Assinala que a capacidade civil do satélite brasileiro será integralmente destinada

ao interesse público, propiciando o atendimento de demandas da Administração Pública, em

especial projetos de educação e saúde, bem como possibilitando o provimento de infraestru-

tura de telecomunicações à parceria privada para atendimento de usuários finais em localida-

des desassistidas ou com atendimento precário.

Nessa linha, ressalta que a manutenção da decisão concessiva de liminar poderá

inviabilizar a concretização das mencionadas políticas públicas, impedindo, em última aná-

lise, que se leve internet de alta velocidade para comunidades desassistidas ou residentes em

áreas rurais e remotas do país.

Alega, ainda, risco de lesão à economia pública, explicitando que, caso a decisão

impugnada não seja suspensa, autorizando o início da execução do contrato firmado entre o

Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e a Telebras – para a qual, diz,

é imprescindível a participação da empresa Viasat –, a União deixará de executar as referidas

políticas públicas com aumento de qualidade e menor preço.

Adentrando ao mérito da ação subjacente, defende a União, com fundamento no

art. 28–§ 3º–II da Lei 13.306/16, a legalidade do contrato de parceria celebrado entre a Tele-

bras e a Viasat, sustentando a inaplicabilidade das regras de licitação para a exploração de ati-

vidade econômica com fundamento no art. 173–§ 1º da Constituição.

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O Sindicato Nacional das Empresas de Telecomunicações por Satélite – SINDI-

SAT peticionou nos presentes autos, requerendo a juntada de cópia da inicial de ação civil pú-

blica proposta pela entidade sindical, distribuída por dependência ao processo originário, em

que também formulado pedido de anulação do contrato firmado entre a Telebras e a Viasat.

Na sequência, em atenção ao despacho do último dia 24 de abril, vieram os autos

à Procuradoria-Geral da República para parecer no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.

II

Preliminarmente, a matéria evidencia a competência do Supremo Tribunal Fede-

ral para examinar o presente pedido de suspensão, uma vez que seu fundamento é de índole

constitucional, envolvendo discussão acerca de possível ofensa aos princípios constitucionais

da soberania, da legalidade, da moralidade, da publicidade e da isonomia.

Reconhecida a competência da Suprema Corte, passa-se ao exame do incidente.

Sabe-se que o deferimento dos pedidos de suspensão de segurança, de liminar e

de antecipação de tutela tem caráter notoriamente excepcional, sendo imprescindível perqui-

rir a potencialidade de a decisão concessiva ocasionar lesão à ordem, segurança, saúde e eco-

nomia públicas, não cabendo nesta sede, em princípio, a análise do mérito.

O Supremo Tribunal Federal, entretanto, firmou orientação no sentido de ser pos-

sível um juízo mínimo acerca da matéria de fundo analisada na origem, para concluir-se pela

viabilidade ou inviabilidade da suspensão da decisão concessiva.

Na espécie, procedendo-se a um exame perfunctório da questão, próprio das me-

didas de contracautela, resta evidenciado que o provimento impugnado reveste-se de razoabi-

lidade, de forma que o deferimento da suspensão é que consubstancia risco de lesão à ordem

pública, na acepção de ordem jurídico-constitucional.

O Satélite Geoestacionário Brasileiro de Defesa e Comunicações Estratégicas –

SGDC foi instituído pelo Decreto 7.769/2012, estabelecendo o ato normativo que o satélite

deveria ser implantado até o dia 31 de dezembro de 2017 e que a Telebras e o Ministério da

Defesa seriam os responsáveis pela gestão da operação do satélite após o seu lançamento.

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A outorga da licença para a exploração do satélite efetivou-se por deliberação do

Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, que reconheceu a

desnecessidade de licitação para o Ministério da Defesa e a inexigibilidade de licitação para a

Telebras, de maneira a conferir diretamente o direito de exploração do satélite àqueles entes

públicos. A exploração da capacidade militar (Banda X) foi cedida ao Ministério da Defesa e

a da capacidade civil (Banda Ka) foi outorgada à Telebras para a prestação de serviços de co-

nexão à internet em banda larga.

A ANATEL levou em consideração, no momento da análise da concessão da li-

cença, as políticas públicas a serem ptomovidas pela Telebras, estabelecidas nos Decretos

7.175/2010 e 7.769/2012.

Assim, o Conselho Diretor da agência reguladora, por meio do Ato 76/2014, con-

feriu à Telebras o direito de exploração do SGDC, com vistas à promoção do Plano Nacional

de Banda Larga – PNBL, cujos objetivos estão previstos no referido Decreto 7.175/2010: (i)

massificar o acesso a serviços de conexão à Internet em banda larga; (ii) acelerar o desenvol-

vimento econômico e social; (iii) promover a inclusão digital; (iv) reduzir as desigualdades

social e regional; (v) promover a geração de emprego e renda; (vi) ampliar os serviços de go-

verno eletrônico e facilitar aos cidadãos o uso dos serviços do Estado; (vii) promover a capa-

citação da população para o uso das tecnologias de informação; e (viii) aumentar a autonomia

tecnológica e a competitividade brasileiras.

Ainda de acordo com a mencionada legislação, para a consecução daqueles obje-

tivos, caberá à Telebras: (i) implementar a rede privativa de comunicação da administração

pública federal; (ii) prestar apoio e suporte a políticas públicas de conexão à Internet em

banda larga para universidades, centros de pesquisa, escolas, hospitais, postos de atendi-

mento, telecentros comunitários e outros pontos de interesse público; (iii) prover infraestru-

tura e redes de suporte a serviços de telecomunicações prestados por empresas privadas,

Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos; e (iv) prestar serviço de

conexão à Internet em banda larga para usuários finais, apenas e tão somente em localidades

onde inexista oferta adequada daqueles serviços.

Para tanto, fica a estatal autorizada a usar, fruir, operar e manter a infraestrutura e

as redes de suporte de serviços de telecomunicações de propriedade ou posse da administra-

ção pública federal.

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Na condição de gestora da exploração do satélite, a Telebras promoveu, em 2017,

um chamamento de interessados para a comercialização de parte da capacidade satelital. O

chamamento tinha por objeto a seleção de empresas concessionárias, permissionárias ou au-

torizatárias de serviços de telecomunicações para tornarem-se cessionárias de capacidade sa-

telital em banda Ka do SGDC, mediante a cessão de capacidade satelital e locação dos

teleportos.

No edital de chamamento, estabeleceu a Telebras que a seleção de empresas ocor-

reria de acordo com os princípios da impessoalidade, da moralidade, da igualdade de acesso,

da publicidade, da eficiência, da economicidade e da competitividade, tendo o procedimento

como objetivo a obtenção da proposta mais vantajosa para o ente público.

Referido edital de convocação foi objeto de questionamento perante o Tribunal de

Contas da União, tendo o órgão de contas julgado improcedentes as alegações de irregulari-

dade no chamamento promovido pela Telebras. Para tanto, fez o TCU relevantes considera-

ções.

Ponderou, por exemplo, que não haveria irregularidade na cessão da capacidade

satelital pela entidade estatal, desde que garantidos e levados a efeito pela Telebras os objeti-

vos do Programa Nacional de Banda Larga – PNBL. Neste aspecto, assinalou a Corte de

Contas que, na oportunidade, a Telebras assegurou “mais de 20% da faixa de frequência to-

tal disponível para utilização própria, de maneira a atender a prestação dos serviços de go-

verno eletrônico, escolas, postos de saúde e pequenos provedores ao longo da vida útil do

satélite SGDC, conforme orientação emanada no Decreto nº 7.175/2010 e salientado no item

2 do Anexo D5 – Compromissos Mínimos de Rede da minuta de edital”.1

Consignou o TCU, ademais que, mesmo exercendo atividade finalística própria

de seu objeto social – natural de sua atividade econômica privada –, a empresa estatal não

detinha discricionariedade irrestrita para a escolha do parceiro, mesmo sendo dispensável a

licitação.

Registrou, ainda, que atuação da Telebras deverá sempre pautar-se pelos princí-

pios constitucionais e legais que regem a Administração Pública, tais como, a legalidade, a

impessoalidade, a publicidade, a isonomia e o interesse público, de forma que, no caso de não

haver motivos que justifiquem a escolha de um parceiro em detrimento de outrem, um pro-

1 Acórdão TCU 2033/2017 – Plenário.

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 8

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cesso competitivo isonômico, impessoal e transparente deveria ser obrigatoriamente adotado,

em observância aos referidos princípios constitucionais.

Diante disso, de fato, causa estranheza o contrato celebrado, poucos meses depois

do edital de chamamento, entre a Telebras e a Viasat para a operação de 100% da banda Ka

do SGDC. Ao se levar em conta as premissas assentadas pelo Tribunal de Contas da União no

citado Acórdão 2033/2017, fica muito difícil não notar irregularidades na parceria em ques-

tão, restando claro que a estatal não adotou as recomendações do órgão de contas.

Isso porque, embora a União insista na afirmação de que – na realização de sua

atividade finalística – não está a Telebras obrigada a licitar, tendo o acordo com a Viasat sido

firmado com base nos arts. 173 da Constituição e 28–§3º da Lei 13.303/20162, efetivamente

houve, antes da contratação direta, a tentativa de se promover uma seleção pública para a co-

mercialização da capacidade satelital do SGDC.

Assim, ainda que não se queira denominar licitação, fato é que se promoveu um

procedimento concorrencial, com regras definidas por meio do edital de chamamento pú-

blico, cujo objeto era a seleção de empresas concessionárias, permissionárias ou autorizatá-

rias de serviços de telecomunicações para tornarem-se cessionárias de capacidade satelital em

banda Ka do satélite brasileiro.

Nesse contexto, diferente da contratação feita com dispensa de licitação prevista

no invocado art. 28–§3º da Lei 13.303/2016, parece mais aplicável à hipótese o disposto no

art. 29–III daquela mesma norma3, no sentido de que dispensável a licitação quando não acu-

direm interessados à licitação anterior e essa, justificadamente, não puder ser repetida sem

prejuízo para a empresa pública ou a sociedade de economia mista, desde que mantidas as

condições preestabelecidas.

2 Art. 28 Os contratos com terceiros destinados à prestação de serviços às empresas públicas e às sociedadesde economia mista, inclusive de engenharia e de publicidade, à aquisição e à locação de bens, à alienação debens e ativos integrantes do respectivo patrimônio ou à execução de obras a serem integradas a esse patrimô-nio, bem como à implementação de ônus real sobre tais bens, serão precedidos de licitação nos termos destaLei, ressalvadas as hipóteses previstas nos arts. 29 e 30. § 3º São as empresas públicas e as sociedades de economia mista dispensadas da observância dos dispositi-vos deste Capítulo nas seguintes situações: I - comercialização, prestação ou execução, de forma direta, pelas empresas mencionadas no caput, de pro-dutos, serviços ou obras especificamente relacionados com seus respectivos objetos sociais; II - nos casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculada aoportunidades de negócio definidas e específicas, justificada a inviabilidade de procedimento competitivo.

3 Art. 29. É dispensável a realização de licitação por empresas públicas e sociedades de economia mista: III - quando não acudirem interessados à licitação anterior e essa, justificadamente, não puder ser repetidasem prejuízo para a empresa pública ou a sociedade de economia mista, bem como para suas respectivassubsidiárias, desde que mantidas as condições preestabelecidas;

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 9

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Nos termos da mencionada legislação, verifica-se que a Telebras não adotou qual-

quer das determinações legais: não demonstrou a impossibilidade de repetição da seleção e

tampouco manteve as condições estabelecidas no leilão anterior para a contratação direta.

Diferentemente disso, optou por celebrar o contrato diretamente com a empresa

americana, cedendo o compartilhamento da exploração de 100% da banda Ka do satélite bra-

sileiro, promovendo, dessa forma, sensíveis alterações no regime de parceria.

É que, embora parte das regras do contrato tenham sido mantidas em sigilo, em

razão da invocada segurança e estratégia empresarial, a significativa modificação na forma de

repartição da capacidade satelital a ser comercializada impressiona e é suficiente para se en-

tender descumprido o referido art. 29–III da Lei 13.303/2016. O edital de chamamento pú-

blico previa o leilão em lotes, de forma setorizada, para contemplar empresas do ramo de

telecomunicações. Já a contratação posterior e direta, como dito, ocorreu com o compartilha-

mento da totalidade da banda civil entre a empresa Viasat e a Telebras.

Dessa maneira, por mais que sejam desconhecidas as disposições contratuais, a

outorga de 100% da operacionalização da banda de responsabilidade da estatal causa perple-

xidade e gera dúvidas acerca de possíveis privilégios ao particular, tratamento desigual entre

os interessados e prejuízo ao erário.

Tais indagações corroboram a assertiva da decisão impugnada, no sentido de que

“se o edital de Chamamento Público n. 2 que estabeleceu as regras originais do leilão pú-

blico previa o leilão de 3 (três) lotes, para contemplar 3 (três) empresas do ramo de teleco-

municação, não se identifica norma vigente que autorize a requerida TELEBRÁS a escolher

ao seu alvedrio uma empresa com exclusividade, utilizando critérios sem transparência e

sem a devida publicidade, a contrariar os princípios da legalidade, moralidade, publicidade

e isonomia entre interessados em contratar com a administração pública”.

Além disso, neste ponto, o contrato em questão constitui esvaziamento da função

da Telebras como responsável pela exploração da banda Ka do satélite brasileiro, com verda-

deira transferência da prestação dos serviços de conexão à internet, sem qualquer reserva de

exclusividade que garanta a implementação dos objetivos do Programa Nacional de Banda

Larga – PNBL.

Há, aqui, novamente, inobservância às premissas estabelecidas pelo Tribunal de

Contas da União, tendo em vista que o órgão de controle ressaltou a necessidade de que fos-

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 10

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sem garantidos e efetivados pela Telebras os objetivos do Programa Nacional de Banda Larga

– PNBL, assinalando a Corte a importância de a estatal assegurar uma faixa mínima de ope-

racionalização da banda Ka para utilização própria, voltada, sobretudo, para a prestação dos

serviços de governo eletrônico, escolas e postos de saúde.

Esta reserva mínima de exclusividade, além de assegurar a implementação do

PNBL, consubstancia segurança das informações governamentais e, em última análise, prote-

ção da soberania nacional. E não se está falando, in casu, de segurança no âmbito das comu-

nicações militares ou de defesa nacional e, portanto, de dados relacionados à Banda X do

satélite brasileiro.

Como explicitado pela própria requerente, a banda civil do SGDC será integral-

mente voltada para o interesse público, destinando-se parte de sua capacidade ao atendimento

das demandas da Administração Pública, em especial os projetos da educação e da saúde.

A soberania, fundamento próprio do conceito de Estado e também princípio da

ordem econômica (art. 170–I da Constituição), significa poder político supremo e indepen-

dente. Na lição da doutrina, supremo porque não está limitado por nenhum outro na ordem

interna; independente, porque, na ordem internacional, não tem de acatar regras que não se-

jam voluntariamente aceitas e está em pé de igualdade com os poderes supremos de outros

povos4.

Assim, tomando-se por base um entendimento mais abrangente do citado pre-

ceito, é sim temerário que 100% dos dados operacionalizados na banda Ka do satélite brasi-

leiro – incluindo as referidas demandas da Administração Pública – estejam sendo

compartilhados com a empresa americana Viasat, principalmente levando-se em consideração

que as regras de confidencialidade das informações firmadas entre as parceiras não são co-

nhecidas. Tampouco sabe-se acerca das obrigações da organização estrangeira para com o seu

Estado-nação.

Por fim, embora a verificação minuciosa das condições da contratação direta deva

acontecer nos autos do processo principal, a suspensão dos efeitos da decisão impugnada até

o trânsito em julgado daquele feito, tendo em vista o longo prazo contratual, pode significar o

prosseguimento e até a completa execução do pactuado, tornando sem utilidade a ação subja-

4 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37ª ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p.106.

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 11

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cente, bem como a conclusão pela legitimidade ou não da parceria firmada entre a entidade

pública brasileira e a empresa estadunidense.

Diante de todo o exposto, óbices ou atrasos nas ações referentes aos programas de

acesso à internet desenvolvidos pela União não constituem fundamento suficiente para o aco-

lhimento da suspensão.

Conforme acertadamente consignou a Presidência do Tribunal Regional Federal

da 1ª Região, ao indeferir o anterior pedido de suspensão da requerente, não obstante num

primeiro momento a decisão questionada possa impactar, negativamente, a execução imediata

de algumas políticas públicas, tal consequência é ditada pela necessidade de, cautelarmente,

preservarem-se bens maiores, como a lisura da ação administrativa, o patrimônio público e a

defesa da soberania nacional.

A ponderação dos valores discutidos, na hipótese, portanto, leva ao indeferimento

do pedido de contracautela, uma vez que a suspensão dos efeitos do provimento concessivo

de liminar permitiria o compartilhamento de 100% dos serviços de exploração outorgados à

Telebras, mostrando-se revestido de plausibilidade o pronunciamento impugnado e despro-

vida, em contrapartida, de razoabilidade a suspensão requerida.

Assim, opino pelo indeferimento do pedido de suspensão.

Brasília, 8 de maio de 2018.

Raquel Elias Ferreira DodgeProcuradora-Geral da República

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 12

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N.º 143/2018 – AJC/SGJ/PGR Sistema Único n.º 118723/2018

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AMREQUERENTE: UniãoREQUERIDA: Juíza da 1ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do AmazonasINTERESSADA: Via Direta Telecomunicações Via Satélite e Internet LtdaINTERESSADA: Telecomunicações Brasileiras S/A – TelebrasINTERESSADA: Viasat IncRELATORA: Ministra Presidente

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DELIMINAR. SATÉLITE GEOESTACIONÁRIO BRASILEIRODE DEFESA E COMUNICAÇÕES ESTRATÉGICAS –SGDC. EXPLORAÇÃO DA BANDA KA. CONTRATAÇÃODE EMPRESA ESTRANGEIRA PELA TELEBRAS. SUS-PENSÃO DO CONTRATO. LESÃO À ORDEM E À ECONO-MIA PÚBLICAS. INDEFERIMENTO DACONTRACAUTELA.

1. Pedido de contracautela ajuizado contra decisão que suspen-deu contrato firmado entre a Telebras e empresa estrangeirapara a exploração de 100% da capacidade da banda Ka do Sa-télite Geoestacionário Brasileiro de Defesa e Comunicações Es-tratégicas – SGDC.

2. Mesmo exercendo atividade finalística própria de seu objetosocial – natural de sua atividade econômica privada –, a Tele-bras não detém discricionariedade irrestrita para a contrata-ção de parceria. Deve a entidade pública pautar-se pelosprincípios que regem a Administração Pública, tais como a le-galidade, a impessoalidade, a publicidade, a isonomia e o inte-resse público.

3. Tendo a Telebras promovido procedimento de seleção pú-blica para a comercialização de parte da capacidade satelital, efrustrada a escolha por ausência de interessados e impossibili-tado novo procedimento, a contratação direta – se efetivada –deveria preservar as condições preestabelecidas no regula-mento da disputa concorrencial.

4. O contrato firmado pela Telebras com a empresa Viasat –de compartilhamento de 100% da exploração da banda Ka dosatélite brasileiro – constitui verdadeiro esvaziamento da fun-ção da estatal como responsável pela operação da banda civildo SGDC, sem qualquer reserva de exclusividade que garantaa implementação dos objetivos do Programa Nacional deBanda Larga – PNBL.

Gabinete da Procuradora-Geral da RepúblicaBrasília/DF

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5. A garantia de uma faixa mínima de operacionalização dabanda Ka pela própria Telebras, voltada para a prestação dosserviços de conexão da Administração Pública, constitui segu-rança das informações governamentais e, em última análise,proteção da soberania nacional.

6. Possíveis óbices ou atrasos nas ações relativas aos progra-mas de acesso à internet do Governo Federal não constituemfundamento suficiente para o acolhimento da suspensão.

7. O provimento impugnado reveste-se de razoabilidade, deforma que o deferimento da suspensão é que consubstanciarisco de lesão à ordem pública, na acepção jurídico-constituci-onal.

‒ Parecer pelo indeferimento do pedido de suspensão.

Trata-se de pedido de suspensão formulado pela União com o objetivo de sustar

os efeitos de decisão do Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Amazonas,

mantida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que suspendeu o contrato firmado entre

a Telecomunicações Brasileiras S/A – Telebras e a empresa estadunidense Viasat Inc para a

exploração de 100% da capacidade da banda Ka do Satélite Geoestacionário Brasileiro de

Defesa e Comunicações Estratégicas – SGDC.

A liminar que se pretende suspender foi proferida nos autos de ação de obrigação

de fazer e não fazer cumulada com danos morais e materiais ajuizada pelas empresas Via Di-

reta Telecomunicações por Satélite e Internet Ltda e Rede de Rádio e Televisão Tiradentes

Ltda contra a Telebras e a referida empresa estrangeira, com o objetivo de questionar a legali-

dade da parceria firmada para a exploração comercial do satélite brasileiro.

Relata a inicial da ação subjacente que o SGDC foi lançado em 4 de maio de

2017 e deveria ter entrado em operação até o final daquele ano. Narra, ademais, que parte da

capacidade do satélite ficou reservada para uso das Forças Armadas e outra parte deveria ser

negociada entre as empresas do setor de telecomunicações em operação no Brasil.

Segue assinalando que, em outubro de 2017, a Telebras promoveu um leilão para

a comercialização de parte da capacidade satelital do SGDC, cujas regras foram definidas por

meio de edital de chamamento público, restando frustrado o leilão por ausência de interessa-

dos.

Salienta que, no último dia 6 de fevereiro, a Telebras e a Viasat publicaram comu-

nicado informando a celebração do contrato estratégico para uso comercial da capacidade ci-

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 2

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vil do satélite brasileiro. As autoras da ação principal questionam as condições do pactuado,

suscitando possível afronta à soberania nacional econômica, em razão da outorga de 100% da

exploração da banda Ka para a citada empresa americana.

A tutela de urgência foi, inicialmente, concedida pelo Juízo da 14ª Vara Cível da

Comarca de Manaus/AM e, com o ingresso da União na lide e o encaminhamento dos autos à

Justiça Federal, confirmou-se a liminar pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do

Estado do Amazonas, para o fim de suspender imediatamente o contrato firmado entre a Tele-

bras e a Viasat.

Eis os termos essenciais do pronunciamento:

[…]

2. Defiro, ainda, o pedido de segredo de justiça, restrito aos documentos que acompa-nham as petições, ressaltando, porém, que a própria requerida entregou contrato, senhase coordenadas do único ‘Satélite de Defesa Estratégica’ brasileiro à empresa estrangeira,de modo que eventuais pulverizações de informações sensíveis à segurança devem serapuradas com esse destaque.

3. Neste ponto, impende destacar circunstância fática e jurídica inusitada, a causar per-plexidade ao Magistrado encarregado de interpretar e aplicar a Constituição (em controledifuso) e as leis do país, qual seja o fato de um equipamento de telecomunicação gover-namental, que envolveu gastos públicos estimados nos autos em 4 (quatro) bilhões de re-ais, e denominado de “Satélite de Defesa Estratégica”, ter sido entregue para uso eexploração exclusiva a uma empresa estrangeira – a requerida VIASAT INC[1].

4. Somente o fato mencionado no item 3 já atenta contra a Constituição Federal, do seupreâmbulo aos seus fundamentos e princípios, em especial no ponto referente à segu-rança e soberania, dois dos sustentáculos do Estado Democrático de Direito previsto noart. 1º da Carta Maior.

5. Quanto ao único ato judicial com conteúdo decisório nos autos, qual seja a decisãoproferida pelo juízo estadual antes do ingresso da União na sua condição pleiteada - a deassistente simples – passo a analisar a possibilidade de sua ratificação, à luz da presençados requisitos legais referentes à plausibilidade do argumento e o risco se a decisão fortomada somente ao final do processo, tudo nos termos do art. 300 do NCPC.

6. O noticiado esvaziamento do procedimento licitatório que deveria escolher 3 (três)empresas do ramo de telecomunicações para operar o satélite brasileiro não autoriza a re-querida TELEBRÁS a optar por formalizar um contrato de exclusividade com a reque-rida VIASAT INC[2], entregando à empresa de capital estrangeiro o Satélite,inegavelmente um patrimônio do povo brasileiro, com violação dos Princípios da Legali-dade, Moralidade, Transparência e Isonomia.

7. Não há a menor plausibilidade da tese (a ser por óbvio desenvolvida pelas requeridas)no sentido de que o procedimento licitatório teria sido frustrado por suposta ausência deinteressados. Tal circunstância, a ser apurada oportunamente nos autos, não tem o condãode autorizar a requerida TELEBRÁS a fazer escolha aleatória por uma única empresapara explorar comercialmente o satélite brasileiro em banda KA[3].

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 3

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8. No ponto do item 7, o art. 29 da chamada Lei das Estatais (lei 13.303/2016), mesmanorma que faculta a dispensa de licitação em situações de ausência de competidores,prevê expressamente que a dispensa tem que obedecer as condições preestabelecidas noedital.

9. Disse o legislador que:

Art. 29. É dispensável a realização de licitação por empresas públicas e sociedades deeconomia mista:

(...).

III - quando não acudirem interessados à licitação anterior e essa, justificadamente,não puder ser repetida sem prejuízo para a empresa pública ou a sociedade de econo-mia mista, bem como para suas respectivas subsidiárias, desde que mantidas as con-dições preestabelecidas;

10. Em assim sendo, se o edital de Chamamento Público n. 2 que estabeleceu as regrasoriginais do leilão público previa o leilão de 3 (três) lotes, para contemplar 3 (três) em-presas do ramo de telecomunicação, não se identifica norma vigente que autorize a re-querida TELEBRÁS a escolher ao seu alvedrio uma empresa com exclusividade,utilizando critérios sem transparência e sem a devida publicidade, a contrariar os princí-pios da legalidade, moralidade, publicidade e isonomia entre interessados em contratarcom a administração pública. Mais grave ainda quando a empresa é cem porcento estran-geira.

11. Mesmo que este juízo fizesse um esforço argumentativo imensurável, não haveriacomo encontrar nas leis e na Constituição do país uma norma ou princípio que susten-tasse a entrega da exploração do único satélite de defesa estratégica à uma empresa es-trangeira, sem qualquer previsão mínima nem mesmo em Edital.

12. A escolha da requerida TELEBRAS, mediante exclusividade, por uma empresa es-trangeira para operar o satélite 100% brasileiro, revela ao mesmo tempo ilegalidade eanomalia administrativa, mediante a inobservância do dever de garantir a eficácia do fun-damento da soberania (art. 1º da CF), demonstrando ainda violação à Lei das Licitações edas Estatais. […]

15. Todos os itens acima denotam a presença da plausibilidade do argumento da(s) re-querente(s), sendo que a presença do risco de ineficácia da medida - caso concedida so-mente ao final - se revela pela proximidade da exploração exclusiva por empresaestrangeira do único satélite brasileiro de defesa nacional, o que expõe a grave risco a se-gurança e a soberania do país.

16. Não há risco de dano inverso, seja porque o satélite aguarda operação inédita e suautilização deve servir à nação brasileira e não ao capital estrangeiro (na forma como de-terminam a Constituição e as leis do país), seja porque todas as unidades militares estãoprotegidas por sistema próprio, não tratado nesses autos. […]

Ajuizado e indeferido pedido de contracautela perante o Tribunal Regional Fede-

ral da 1ª Região, aviou a União o presente pedido de suspensão, que, inicialmente formulado

junto à Presidência do Superior Tribunal de Justiça, foi encaminhado à Suprema Corte, ao

fundamento de que a controvérsia é de índole constitucional.

A União afirma risco de grave lesão à ordem e à economia públicas, asseverando

que a eventual procedência dos pedidos contidos na ação principal acarretará impactos dele-

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térios em uma série de políticas públicas do Governo Federal, entre elas os programas Go-

verno Eletrônico, Educação Conectada, Internet para todos e Programa Nacional de Banda

Larga.

Sustenta que o SGDC foi lançado com sucesso em 4 de maio de 2017, após pes-

quisas e investimentos de aproximadamente R$ 3 bilhões, encontrando-se em órbita para ex-

ploração de duas capacidades: uma militar (Banda X) e uma civil (Banda Ka).

Consigna que a Banda X já foi cedida ao Ministério da Defesa por meio de con-

trato de cessão de direito de uso pelo prazo de 15 anos e a capacidade da Banda Ka deverá

destinar-se à utilização civil para a prestação de serviços de conexão à internet em banda

larga, que será explorada, diz, de acordo com a premissas comerciais da própria Telebras, de

forma conjunta com empresa parceira do setor privado.

Assinala que a capacidade civil do satélite brasileiro será integralmente destinada

ao interesse público, propiciando o atendimento de demandas da Administração Pública, em

especial projetos de educação e saúde, bem como possibilitando o provimento de infraestru-

tura de telecomunicações à parceria privada para atendimento de usuários finais em localida-

des desassistidas ou com atendimento precário.

Nessa linha, ressalta que a manutenção da decisão concessiva de liminar poderá

inviabilizar a concretização das mencionadas políticas públicas, impedindo, em última aná-

lise, que se leve internet de alta velocidade para comunidades desassistidas ou residentes em

áreas rurais e remotas do país.

Alega, ainda, risco de lesão à economia pública, explicitando que, caso a decisão

impugnada não seja suspensa, autorizando o início da execução do contrato firmado entre o

Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e a Telebras – para a qual, diz,

é imprescindível a participação da empresa Viasat –, a União deixará de executar as referidas

políticas públicas com aumento de qualidade e menor preço.

Adentrando ao mérito da ação subjacente, defende a União, com fundamento no

art. 28–§ 3º–II da Lei 13.306/16, a legalidade do contrato de parceria celebrado entre a Tele-

bras e a Viasat, sustentando a inaplicabilidade das regras de licitação para a exploração de ati-

vidade econômica com fundamento no art. 173–§ 1º da Constituição.

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O Sindicato Nacional das Empresas de Telecomunicações por Satélite – SINDI-

SAT peticionou nos presentes autos, requerendo a juntada de cópia da inicial de ação civil pú-

blica proposta pela entidade sindical, distribuída por dependência ao processo originário, em

que também formulado pedido de anulação do contrato firmado entre a Telebras e a Viasat.

Na sequência, em atenção ao despacho do último dia 24 de abril, vieram os autos

à Procuradoria-Geral da República para parecer no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.

II

Preliminarmente, a matéria evidencia a competência do Supremo Tribunal Fede-

ral para examinar o presente pedido de suspensão, uma vez que seu fundamento é de índole

constitucional, envolvendo discussão acerca de possível ofensa aos princípios constitucionais

da soberania, da legalidade, da moralidade, da publicidade e da isonomia.

Reconhecida a competência da Suprema Corte, passa-se ao exame do incidente.

Sabe-se que o deferimento dos pedidos de suspensão de segurança, de liminar e

de antecipação de tutela tem caráter notoriamente excepcional, sendo imprescindível perqui-

rir a potencialidade de a decisão concessiva ocasionar lesão à ordem, segurança, saúde e eco-

nomia públicas, não cabendo nesta sede, em princípio, a análise do mérito.

O Supremo Tribunal Federal, entretanto, firmou orientação no sentido de ser pos-

sível um juízo mínimo acerca da matéria de fundo analisada na origem, para concluir-se pela

viabilidade ou inviabilidade da suspensão da decisão concessiva.

Na espécie, procedendo-se a um exame perfunctório da questão, próprio das me-

didas de contracautela, resta evidenciado que o provimento impugnado reveste-se de razoabi-

lidade, de forma que o deferimento da suspensão é que consubstancia risco de lesão à ordem

pública, na acepção de ordem jurídico-constitucional.

O Satélite Geoestacionário Brasileiro de Defesa e Comunicações Estratégicas –

SGDC foi instituído pelo Decreto 7.769/2012, estabelecendo o ato normativo que o satélite

deveria ser implantado até o dia 31 de dezembro de 2017 e que a Telebras e o Ministério da

Defesa seriam os responsáveis pela gestão da operação do satélite após o seu lançamento.

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A outorga da licença para a exploração do satélite efetivou-se por deliberação do

Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, que reconheceu a

desnecessidade de licitação para o Ministério da Defesa e a inexigibilidade de licitação para a

Telebras, de maneira a conferir diretamente o direito de exploração do satélite àqueles entes

públicos. A exploração da capacidade militar (Banda X) foi cedida ao Ministério da Defesa e

a da capacidade civil (Banda Ka) foi outorgada à Telebras para a prestação de serviços de co-

nexão à internet em banda larga.

A ANATEL levou em consideração, no momento da análise da concessão da li-

cença, as políticas públicas a serem ptomovidas pela Telebras, estabelecidas nos Decretos

7.175/2010 e 7.769/2012.

Assim, o Conselho Diretor da agência reguladora, por meio do Ato 76/2014, con-

feriu à Telebras o direito de exploração do SGDC, com vistas à promoção do Plano Nacional

de Banda Larga – PNBL, cujos objetivos estão previstos no referido Decreto 7.175/2010: (i)

massificar o acesso a serviços de conexão à Internet em banda larga; (ii) acelerar o desenvol-

vimento econômico e social; (iii) promover a inclusão digital; (iv) reduzir as desigualdades

social e regional; (v) promover a geração de emprego e renda; (vi) ampliar os serviços de go-

verno eletrônico e facilitar aos cidadãos o uso dos serviços do Estado; (vii) promover a capa-

citação da população para o uso das tecnologias de informação; e (viii) aumentar a autonomia

tecnológica e a competitividade brasileiras.

Ainda de acordo com a mencionada legislação, para a consecução daqueles obje-

tivos, caberá à Telebras: (i) implementar a rede privativa de comunicação da administração

pública federal; (ii) prestar apoio e suporte a políticas públicas de conexão à Internet em

banda larga para universidades, centros de pesquisa, escolas, hospitais, postos de atendi-

mento, telecentros comunitários e outros pontos de interesse público; (iii) prover infraestru-

tura e redes de suporte a serviços de telecomunicações prestados por empresas privadas,

Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos; e (iv) prestar serviço de

conexão à Internet em banda larga para usuários finais, apenas e tão somente em localidades

onde inexista oferta adequada daqueles serviços.

Para tanto, fica a estatal autorizada a usar, fruir, operar e manter a infraestrutura e

as redes de suporte de serviços de telecomunicações de propriedade ou posse da administra-

ção pública federal.

SUSPENSÃO DE LIMINAR 1.157/AM 7

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Na condição de gestora da exploração do satélite, a Telebras promoveu, em 2017,

um chamamento de interessados para a comercialização de parte da capacidade satelital. O

chamamento tinha por objeto a seleção de empresas concessionárias, permissionárias ou au-

torizatárias de serviços de telecomunicações para tornarem-se cessionárias de capacidade sa-

telital em banda Ka do SGDC, mediante a cessão de capacidade satelital e locação dos

teleportos.

No edital de chamamento, estabeleceu a Telebras que a seleção de empresas ocor-

reria de acordo com os princípios da impessoalidade, da moralidade, da igualdade de acesso,

da publicidade, da eficiência, da economicidade e da competitividade, tendo o procedimento

como objetivo a obtenção da proposta mais vantajosa para o ente público.

Referido edital de convocação foi objeto de questionamento perante o Tribunal de

Contas da União, tendo o órgão de contas julgado improcedentes as alegações de irregulari-

dade no chamamento promovido pela Telebras. Para tanto, fez o TCU relevantes considera-

ções.

Ponderou, por exemplo, que não haveria irregularidade na cessão da capacidade

satelital pela entidade estatal, desde que garantidos e levados a efeito pela Telebras os objeti-

vos do Programa Nacional de Banda Larga – PNBL. Neste aspecto, assinalou a Corte de

Contas que, na oportunidade, a Telebras assegurou “mais de 20% da faixa de frequência to-

tal disponível para utilização própria, de maneira a atender a prestação dos serviços de go-

verno eletrônico, escolas, postos de saúde e pequenos provedores ao longo da vida útil do

satélite SGDC, conforme orientação emanada no Decreto nº 7.175/2010 e salientado no item

2 do Anexo D5 – Compromissos Mínimos de Rede da minuta de edital”.1

Consignou o TCU, ademais que, mesmo exercendo atividade finalística própria

de seu objeto social – natural de sua atividade econômica privada –, a empresa estatal não

detinha discricionariedade irrestrita para a escolha do parceiro, mesmo sendo dispensável a

licitação.

Registrou, ainda, que atuação da Telebras deverá sempre pautar-se pelos princí-

pios constitucionais e legais que regem a Administração Pública, tais como, a legalidade, a

impessoalidade, a publicidade, a isonomia e o interesse público, de forma que, no caso de não

haver motivos que justifiquem a escolha de um parceiro em detrimento de outrem, um pro-

1 Acórdão TCU 2033/2017 – Plenário.

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cesso competitivo isonômico, impessoal e transparente deveria ser obrigatoriamente adotado,

em observância aos referidos princípios constitucionais.

Diante disso, de fato, causa estranheza o contrato celebrado, poucos meses depois

do edital de chamamento, entre a Telebras e a Viasat para a operação de 100% da banda Ka

do SGDC. Ao se levar em conta as premissas assentadas pelo Tribunal de Contas da União no

citado Acórdão 2033/2017, fica muito difícil não notar irregularidades na parceria em ques-

tão, restando claro que a estatal não adotou as recomendações do órgão de contas.

Isso porque, embora a União insista na afirmação de que – na realização de sua

atividade finalística – não está a Telebras obrigada a licitar, tendo o acordo com a Viasat sido

firmado com base nos arts. 173 da Constituição e 28–§3º da Lei 13.303/20162, efetivamente

houve, antes da contratação direta, a tentativa de se promover uma seleção pública para a co-

mercialização da capacidade satelital do SGDC.

Assim, ainda que não se queira denominar licitação, fato é que se promoveu um

procedimento concorrencial, com regras definidas por meio do edital de chamamento pú-

blico, cujo objeto era a seleção de empresas concessionárias, permissionárias ou autorizatá-

rias de serviços de telecomunicações para tornarem-se cessionárias de capacidade satelital em

banda Ka do satélite brasileiro.

Nesse contexto, diferente da contratação feita com dispensa de licitação prevista

no invocado art. 28–§3º da Lei 13.303/2016, parece mais aplicável à hipótese o disposto no

art. 29–III daquela mesma norma3, no sentido de que dispensável a licitação quando não acu-

direm interessados à licitação anterior e essa, justificadamente, não puder ser repetida sem

prejuízo para a empresa pública ou a sociedade de economia mista, desde que mantidas as

condições preestabelecidas.

2 Art. 28 Os contratos com terceiros destinados à prestação de serviços às empresas públicas e às sociedadesde economia mista, inclusive de engenharia e de publicidade, à aquisição e à locação de bens, à alienação debens e ativos integrantes do respectivo patrimônio ou à execução de obras a serem integradas a esse patrimô-nio, bem como à implementação de ônus real sobre tais bens, serão precedidos de licitação nos termos destaLei, ressalvadas as hipóteses previstas nos arts. 29 e 30. § 3º São as empresas públicas e as sociedades de economia mista dispensadas da observância dos dispositi-vos deste Capítulo nas seguintes situações: I - comercialização, prestação ou execução, de forma direta, pelas empresas mencionadas no caput, de pro-dutos, serviços ou obras especificamente relacionados com seus respectivos objetos sociais; II - nos casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculada aoportunidades de negócio definidas e específicas, justificada a inviabilidade de procedimento competitivo.

3 Art. 29. É dispensável a realização de licitação por empresas públicas e sociedades de economia mista: III - quando não acudirem interessados à licitação anterior e essa, justificadamente, não puder ser repetidasem prejuízo para a empresa pública ou a sociedade de economia mista, bem como para suas respectivassubsidiárias, desde que mantidas as condições preestabelecidas;

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Nos termos da mencionada legislação, verifica-se que a Telebras não adotou qual-

quer das determinações legais: não demonstrou a impossibilidade de repetição da seleção e

tampouco manteve as condições estabelecidas no leilão anterior para a contratação direta.

Diferentemente disso, optou por celebrar o contrato diretamente com a empresa

americana, cedendo o compartilhamento da exploração de 100% da banda Ka do satélite bra-

sileiro, promovendo, dessa forma, sensíveis alterações no regime de parceria.

É que, embora parte das regras do contrato tenham sido mantidas em sigilo, em

razão da invocada segurança e estratégia empresarial, a significativa modificação na forma de

repartição da capacidade satelital a ser comercializada impressiona e é suficiente para se en-

tender descumprido o referido art. 29–III da Lei 13.303/2016. O edital de chamamento pú-

blico previa o leilão em lotes, de forma setorizada, para contemplar empresas do ramo de

telecomunicações. Já a contratação posterior e direta, como dito, ocorreu com o compartilha-

mento da totalidade da banda civil entre a empresa Viasat e a Telebras.

Dessa maneira, por mais que sejam desconhecidas as disposições contratuais, a

outorga de 100% da operacionalização da banda de responsabilidade da estatal causa perple-

xidade e gera dúvidas acerca de possíveis privilégios ao particular, tratamento desigual entre

os interessados e prejuízo ao erário.

Tais indagações corroboram a assertiva da decisão impugnada, no sentido de que

“se o edital de Chamamento Público n. 2 que estabeleceu as regras originais do leilão pú-

blico previa o leilão de 3 (três) lotes, para contemplar 3 (três) empresas do ramo de teleco-

municação, não se identifica norma vigente que autorize a requerida TELEBRÁS a escolher

ao seu alvedrio uma empresa com exclusividade, utilizando critérios sem transparência e

sem a devida publicidade, a contrariar os princípios da legalidade, moralidade, publicidade

e isonomia entre interessados em contratar com a administração pública”.

Além disso, neste ponto, o contrato em questão constitui esvaziamento da função

da Telebras como responsável pela exploração da banda Ka do satélite brasileiro, com verda-

deira transferência da prestação dos serviços de conexão à internet, sem qualquer reserva de

exclusividade que garanta a implementação dos objetivos do Programa Nacional de Banda

Larga – PNBL.

Há, aqui, novamente, inobservância às premissas estabelecidas pelo Tribunal de

Contas da União, tendo em vista que o órgão de controle ressaltou a necessidade de que fos-

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sem garantidos e efetivados pela Telebras os objetivos do Programa Nacional de Banda Larga

– PNBL, assinalando a Corte a importância de a estatal assegurar uma faixa mínima de ope-

racionalização da banda Ka para utilização própria, voltada, sobretudo, para a prestação dos

serviços de governo eletrônico, escolas e postos de saúde.

Esta reserva mínima de exclusividade, além de assegurar a implementação do

PNBL, consubstancia segurança das informações governamentais e, em última análise, prote-

ção da soberania nacional. E não se está falando, in casu, de segurança no âmbito das comu-

nicações militares ou de defesa nacional e, portanto, de dados relacionados à Banda X do

satélite brasileiro.

Como explicitado pela própria requerente, a banda civil do SGDC será integral-

mente voltada para o interesse público, destinando-se parte de sua capacidade ao atendimento

das demandas da Administração Pública, em especial os projetos da educação e da saúde.

A soberania, fundamento próprio do conceito de Estado e também princípio da

ordem econômica (art. 170–I da Constituição), significa poder político supremo e indepen-

dente. Na lição da doutrina, supremo porque não está limitado por nenhum outro na ordem

interna; independente, porque, na ordem internacional, não tem de acatar regras que não se-

jam voluntariamente aceitas e está em pé de igualdade com os poderes supremos de outros

povos4.

Assim, tomando-se por base um entendimento mais abrangente do citado pre-

ceito, é sim temerário que 100% dos dados operacionalizados na banda Ka do satélite brasi-

leiro – incluindo as referidas demandas da Administração Pública – estejam sendo

compartilhados com a empresa americana Viasat, principalmente levando-se em consideração

que as regras de confidencialidade das informações firmadas entre as parceiras não são co-

nhecidas. Tampouco sabe-se acerca das obrigações da organização estrangeira para com o seu

Estado-nação.

Por fim, embora a verificação minuciosa das condições da contratação direta deva

acontecer nos autos do processo principal, a suspensão dos efeitos da decisão impugnada até

o trânsito em julgado daquele feito, tendo em vista o longo prazo contratual, pode significar o

prosseguimento e até a completa execução do pactuado, tornando sem utilidade a ação subja-

4 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37ª ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p.106.

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cente, bem como a conclusão pela legitimidade ou não da parceria firmada entre a entidade

pública brasileira e a empresa estadunidense.

Diante de todo o exposto, óbices ou atrasos nas ações referentes aos programas de

acesso à internet desenvolvidos pela União não constituem fundamento suficiente para o aco-

lhimento da suspensão.

Conforme acertadamente consignou a Presidência do Tribunal Regional Federal

da 1ª Região, ao indeferir o anterior pedido de suspensão da requerente, não obstante num

primeiro momento a decisão questionada possa impactar, negativamente, a execução imediata

de algumas políticas públicas, tal consequência é ditada pela necessidade de, cautelarmente,

preservarem-se bens maiores, como a lisura da ação administrativa, o patrimônio público e a

defesa da soberania nacional.

A ponderação dos valores discutidos, na hipótese, portanto, leva ao indeferimento

do pedido de contracautela, uma vez que a suspensão dos efeitos do provimento concessivo

de liminar permitiria o compartilhamento de 100% dos serviços de exploração outorgados à

Telebras, mostrando-se revestido de plausibilidade o pronunciamento impugnado e despro-

vida, em contrapartida, de razoabilidade a suspensão requerida.

Assim, opino pelo indeferimento do pedido de suspensão.

Brasília, 8 de maio de 2018.

Raquel Elias Ferreira DodgeProcuradora-Geral da República

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