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MIGRAÇÃO RURAL E MEMÓRIA NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DA POPULAÇÃO URBANA

Autora: Dirce Salete Sviderski1 Orientadora: Dra. Liliane da Costa Freitag2

Resumo

Este estudo teve como objetivo estudar aspectos da constituição da identidade social de famílias que vivenciaram o processo migração campo-cidade na localidade denominada Coronel Vivida, situada no Estado do Paraná. Cabe destacar que tal movimento migratório foi pauta de uma pesquisa já realizada por nós na década de 1990, por ocasião da pesquisa monográfica que apresentamos para a obtenção do titulo de Especialista em Metodologia no Ensino de História. O pressuposto desta proposta de pesquisa consistiu em mapear e entender a formação de novos agrupamentos identitários, quer seja no âmbito religioso, social ou nos laços de solidariedade. Esse acontecimento é compreendido na pesquisa como novas territorialidades. A materialização dos pressupostos teóricos se deu por ocasião da implementação de uma Unidade Didática no espaço escolar Colégio Estadual Tancredo Neves. Tal Unidade consiste em um instrumento resultante da aplicação de um projeto de pesquisa sobre o tema supracitado relacionando-o com o projeto de Implementação na Escola, o Plano de Ação com os seus objetivos, Resultados esperados e as suas Atividades. Quanto ao enfoque metodológico a pesquisa lançou mão da imagem fotográfica já existente nos acervos pessoais das famílias migrantes e também de novas imagens obtidas por ocasião da implementação do projeto naquele espaço escolar. As últimas são de autoria dos discentes participantes do projeto efetuadas após as oficinas teórico-metodológica. Ressalta-se que o recurso fotográfico teve a anuência dos fotografados e foi fundamental para captar os momentos em que as novas territorialidades se apresentam naquela comunidade. A materialização das ações concorreu para que os pesquisadores envolvidos vivenciassem o que reconhecemos como pesquisa-ação. O coroamento das atividades deu-se com a confecção de murais explicativos os quais foram devidamente apresentados pelo grupo para a comunidade.

Palavras chaves: Migração Rural; Urbano; Fotografia; Memória; Identidade.

1 Professora de História do Colégio Estadual Tancredo Neves de Coronel Vivida, Núcleo de Pato

Branco. Licenciada em História pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Palmas, PR – FAFI; Pós Graduada em Metodologia do Ensino de História pela mesma Faculdade. 2 Professora Doutora Liliane da Costa Freitag, do Departamento de História - UNICENTRO-

Guarapuava, PR.

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1 Introdução

O tema deste estudo teve como escopo a identidade social de famílias que

vivenciaram o processo de migração do campo para a cidade na localidade de

Coronel Vivida, Paraná. Tal movimento migratório foi pauta de uma pesquisa que

realizamos na década de 1990, por ocasião da pesquisa monográfica que

apresentamos para a obtenção do titulo de Especialista em Metodologia no Ensino

de História. Aquela monografia teve como objetivo compreender o êxodo rural no

referido município. Foi analisada a realidade dos trabalhadores rurais que

permaneciam no campo em uma conjuntura onde apontam os estudos de grande

processo de saída de famílias do meio rural para o urbano. Os dados que foram

obtidos foram coletados junto a pequenos proprietários de uma extensão de até 10

alqueires de terra as quais foram vendidas no período de agosto de 1994 a agosto

de 1995.

Constatamos um número de 280 imóveis rurais vendidos, sendo que muitas

foram vendidas para um único proprietário. Na ocasião localizamos 33 famílias que

deslocaram suas moradias do campo para áreas periféricas da cidade de Coronel

Vivida. Do grupo entrevistado, destacaram-se homens e mulheres com mais de 35

anos. As famílias possuíam 3 a 5 filhos os quais estudaram até a 4ª série do ensino

fundamental. Outra característica do grupo foi o fato de obterem residência no

Município a mais de três décadas. Os instrumentos de pesquisa constaram,

sobretudo, de entrevistas semi-estruturadas. Com tal estudo foram identificados

causas e aspirações do coletivo dos entrevistados bem como o montante de terras

transferidas para os novos proprietários.

Cabe referendar que respostas obtidas tais como “não podiam pagar

empréstimos bancários”, “falta de técnicas apropriadas”, “falta de incentivo”, “safras

frustradas”, “inexistência de empregos nas áreas rurais”, entre outras, demonstraram

ainda que migração campo-cidade naquela localidade não foi um fenômeno

descontextualizado e, cuja falta de uma política pública para as pequenas

propriedades do campo resultou na criação de novas formas cotidianas do viver.

Aquela experiência de pesquisa nos levou para o tema que ora

apresentamos como sendo a necessária recriação das identidades daquele grupo

pesquisado a partir da inserção social em um novo espaço cujas relações de

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trabalho, as vivências e as redes sociais certamente são outras e ainda hoje seguem

em transição.

Atualmente entendemos que o processo migratório anteriormente estudado

resultou na desterritorialização daquelas famílias de pequenos proprietários de

terras.

O pressuposto que ora apresentamos consiste no entendimento das

estratégias de re-territorialização identitária quer seja no âmbito religioso, social e

nos laços de solidariedade. Estes indicativos revelam que com a desterritorialização

ocorre a nova territorialização e, por sua vez, novas identidades em construção.

Territorialidade é um conceito criado para o entendimento dos vínculos

existentes entre lugar e identidade.

Essa linha de interpretação do espaço em uma vertente cultural-simbólica caracteriza-se por leituras acerca dos espaços a partir de dimensões subjetivas. Essa leitura ou paradigma interpretativo da chamada geografia cultural, ao privilegiar interpretações dos espaços a partir do campo das representações, está voltada, portanto, para questões socioculturais e construção de identidades sociais em determinados espaços. Tal encaminhamento teórico pretende destacar que, tanto as práticas, referentes à apropriação, valorização ou construção simbólica do espaço regional extremo-oeste paranaense, quanto às maneiras com que os sujeitos interpretam o espaço ocorrem, por consequência, em relação ao espaço do outro (FREITAG, 2007, p. 16).

Partindo dessas acepções, o texto que segue destaca os trabalhos aplicados

no projeto de intervenção realizado no espaço escolar Colégio Estadual Tancredo

Neves assim como a avaliação de seus resultados.

2 As ações do projeto de intervenção

Para as atividades propostas no Projeto de Intervenção Pedagógica, por

meio da orientação da Doutora LIliane da Costa Freitag, docente-pesquisadora do

Departamento de História, da Universidade Estadual do Centro-Oeste

(UNICENTRO) de Guarapuava, ficou estabelecido que buscaríamos um tratamento

diferenciado para o conteúdo migração campo-cidade ou êxodo rural tendo como

eixos da análise os conceitos identidade, memória, territorialidade, identidade social.

Foi assinalado também que o escopo das ações tinha como premissa a

compreensão das dinâmicas identitárias do coletivo de migrantes e, cujo conceito de

desterritorialização seria fundamental para compreensão das novas territorialidades

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criadas pelo grupo após os eventos migratórios identificado no período de 1994 a

1995.

Por sua vez, a reflexão sobre a as novas identidades a partir desta

compreensão esteve entabulada na compreensão de que a história é uma criação,

narrativa-científica, temporal e, sobretudo, conceitual.

A fim de levar a diante tais intentos, optamos pela utilização do recurso

fotográfico como suporte técnico acrescido de referencial teórico-metodológico

pertinente a este tipo de documento.

Sabe-se que a disciplina história nascera no século XIX e, suas bases

buscavam a verdade através das investigações circunscritas na escrita da história

oficial dos Estados Nação. Já nascia, portanto, como um conhecimento científico,

porém, restrito a documentos oficiais e a temas diplomáticos.

Esta operação científica veio, no entanto, ao longo do tempo sendo reescrita.

Ao longo do tempo ampliaram-se os debates epistemológicos em torno do próprio

objeto da história. De uma história político-diplomática, o início do século XX passa a

vivenciar a chamada nova história na qual March Bloch conceituava história como

ciência dos homens no tempo. De lá para cá, a ciência da história passou a dialogar

com as demais ciências sociais concorrendo para a expansão do campo de

pesquisa do historiador.

As ampliações dos debates ao longo do século XX levaram os historiadores

para o campo do imaginário, do simbólico, da cultura e, por consequência para o

campo das identidades sociais. A história na contemporaneidade teve

redimensionada a leitura de seu próprio objeto. A possibilidade de refletir a

sociedade pelo método retrospectivo, ou seja, através da proposta de que a história

deve ser estudada indo do presente ao passado e do passado para o presente

colocou por terra o mito de que as origens explicam a história.

Foi, portanto com este olhar sobre a história, seu objeto e suas

temporalidades que foram desenvolvidas as ações que ora vem ao público sob

formato de artigo.

Entabulado na perspectiva que acabamos de apresentar na prática das

ações escolares buscou-se desenvolver entre professores, alunos e comunidade o

que denominamos de consciência histórica. Outro ponto foi o direcionamento dos

temas migração e urbanização a partir da abordagem de ensino proposta pelo

Estado do Paraná. A perspectiva adotada residiu no entendimento de que a história

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é uma escrita e que, portanto, o termo história não é um dado natural, algo que

existe a priori da vontade do pesquisador e que supostamente explica a verdade

sobre certos fatos.

No que tange ao assunto migração, ficou ajustado que o mesmo deveria

pautar-se em uma abordagem que extrapolasse os limites das produções textuais já

existentes para o trabalho docente em sala de aula. Necessitava-se, portanto, de ser

pesquisado in loco. O recurso da pesquisa de campo possibilitaria dessa forma o

trato com as experiências das memórias e das identidades daquelas famílias que

vivenciaram a migração rural na década de 1990, conforme expusemos

anteriormente.

Diante do desafio, a primeira atividade realizada consistiu na apresentação

do projeto de pesquisa e do programa PDE para a turma objeto da intervenção

pedagógica. Na mesma oportunidade foram expostas as estratégias de ação a fim

de que os alunos obtivessem o conhecimento da dimensão do programa que

estavam participando. Tal exposição foi realizada por meio de aula com o recurso de

slides na TV Pendrive. O objetivo dessa apresentação foi conhecer os fundamentos

da pesquisa promovendo uma análise de sua importância. Em seguida fez-se uma

breve abordagem da Migração Rural e Urbanização contextualizada na história.

Durante a referida exposição foram listadas as atividades propostas para a

turma, visando os esclarecimentos necessários para o andamento das atividades

bem como o comprometimento por parte dos discentes nas atividades de coleta de

dados tais como fotografias para posterior interpretação.

Já quanto ao resultado da coleta fotográfica foi evidenciado a importância do

mesmo na composição do acervo histórico do Município de Coronel Vivida-Pr. Outra

forma de incentivar o compromisso dos alunos foi a possibilidade de os mesmos

participarem da Feira Cultural no Colégio Estadual Tancredo Neves, que ocorreria

ao final das estratégias de ação. Evento que conforme constatamos foi motivador do

grupo. Acrescenta-se a esse expediente a existência de um espaço importante para

o desenrolar das ações. Referimo-nos ao Laboratório de Informática, espaço que foi

utilizado pelos alunos após agendamento.

Outro formato adotado visando atender aos propósitos de nossas ações

pedagógicas naquele espaço escolar foi a formação de grupos de trabalho como

segunda atividade. Cada grupo contou de três a quatro componentes que se

incumbiram de leituras, interpretações de textos, coleta e produção de fotografias,

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bem como a interpretação das imagens. A finalidade ultima consistiu em ampliar e

criar conhecimento histórico com bases científicas em diálogo com a comunidade.

Antes de seguirmos a diante, é importante destacar que o conjunto de temas

foi estabelecido previamente e, após esse expediente foi realizado o sorteio publico

dos mesmos. Constaram do sorteio os seguintes assuntos: 1)Teoria e ensino de

história; 2) Migração Rural e Urbanização no Brasil; 3) Contrastes nas cidades; 4)

Migração Rural e Urbanização no Paraná; 5) Migração Rural e Urbanização em

Coronel Vivida.

Com o rol de encaminhamentos acreditamos que os alunos adquiriram

status de pesquisadores de fato e de direito no processo ensino-aprendizagem,

deixando de lado, portanto, o papel de receptores de conteúdos.

Após essas colocações acerca do conjunto dos encaminhamentos das

ações pedagógicas, passaremos a discutir os temas supracitados seguindo as

temáticas estabelecidas na ordem que foram trabalhadas no decorrer da

implementação do Projeto. Para tanto são apresentados na sequência o rol dos

cinco textos que proporcionamos aos alunos por ocasião das ações

intervencionistas. Alguns temas foram divididos em itens a fim de sustentar as

análises, outros, no entanto, não tiveram o mesmo formato, contudo estiveram em

diálogo, assegurando um encaminhamento didático em harmonia. Os textos

serviram como o incentivo para novos questionamentos apresentados por parte dos

discentes. Tais indagações já demonstravam que o grupo passava a interagir com

os temas em pauta possibilitando assim uma ação educativa de cunho participativo.

Texto 1

1 Teoria e Ensino de História

A disciplina de História proporciona uma ampliação do debate sobre temas

contemporâneos, e serve como base para a reflexão, sempre objetivando a busca

da compreensão de grandes para temas atuais, sem, no entanto, se desvincular das

experiências individuais e de grupos em determinadas sociedades assim como sem

colocar em risco a sua cientificidade. Ao contribuir no mundo das ciências para o

debate em torno dos grandes temas, a história redimensiona aspectos da sociedade

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e da ação humana na construção de relações de poder, de trabalho e culturais que

levam o homem ao patamar de agentes ativos nos processos históricos.

A interação dos discursos do passado e sobre o presente desenvolve a

consciência histórica e pode contribuir para uma concepção histórica e de

sociedade.

Destarte, entendemos que o método usado para que se concretize uma

nova consciência histórica entre professores e alunos no âmbito das ações

pedagógicas implementadas deve partir da abordagem dos conteúdos de História do

Paraná dentro da revisão dos conceitos e do papel dos sujeitos na construção da

história.

Comungamos do conceito de March Bloch para o qual a História é a “ciência

dos homens, no tempo” (BLOCH, 2001, p.26). Este autor estudou os homens, a sua

produção e suas relações sociais, políticas, econômicas e culturais em um

determinado espaço e inclui ao objeto da história o tempo. Diz também que o

historiador escolhe o tema, o seu objetivo, o período, o lugar e o foco de suas

pesquisas.

Com isso podemos perceber a importância da memória em nossa

sociedade. Bloch (2001) vê a História como a disciplina que estuda, compreende e

preserva a memória.

A abordagem à memória requer, no entanto uma definição. Assim, busca-se

nos registros de Kalina V. Silva que:

A memória é a propriedade de conservar certas informações, propriedade que se refere a um conjunto de funções psíquicas que permite ao indivíduo atualizar impressões ou informações passadas ou reinterpretadas como passadas (SILVA, 2010, p.275).

Por ser assim, a memória está presente na criação da História, e se

confunde com o documento, assim como o monumento e a oralidade, tornando-se

na contemporaneidade o objeto de reflexão da historiografia (SILVA, 2010).

Para Bloch o fascínio humano para conhecer o passado é a curiosidade

infinita pelo conhecimento. O passado é usado constantemente para explicar o

presente e o historiador tem que ter a sensibilidade para compreender esses fatos e

fazer fluir a pesquisa.

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Enquanto ciência, a História deveria gerar compreensão não se atendo a

enumerar datas e fatos, mas, através da interdisciplinaridade e entender o homem e

sua relação com o tempo. Isto porque: “O passado foi empregado tão ativamente

para explicar o presente no desígnio do melhor justificar ou condenar” (BLOCH,

2001, p.58).

O autor considera que o historiador não deve se desprender do presente

para entender o passado. Vê a história como algo em movimento, desfavorável às

certezas. Luta por uma história “maior e mais humana”.

Os alunos poderão compreender a história a partir dos encaminhamentos

que a história não é o estudo do passado, mas uma escrita e portanto, uma prática

que se faz em um tempo e momento específicos. A historiografia segue portanto,

segundo as preocupações dos historiadores do seu tempo.

Os resultados possíveis com um trabalho como esse podem proporcionar,

sem dúvida, a formação e consciência histórica ao vivenciarem novas práticas

pedagógicas.

Assim se constrói a história na relação passado-presente-passado, momento

em que as ações praticadas transformam os seus agentes em cidadãos atuantes em

sua comunidade. Isto se dá pelo reconhecimento de si e do outro, bem como das

pluralidades, e tendo no conhecimento histórico um instrumento para as ações de

políticas pública e o respeito às diferenças.

É relevante, portanto que o professor se empenhe muito para que possa

contribuir na formação do aluno. Partir de situações cotidianas e comunitárias pode

ser uma via pedagógica importante para que o mesmo tome consciência de que é

sujeito ativo dentro da própria e de outras histórias de vida.

Segundo Burke (1992) a nova história se diferencia da tradicional; o

paradigma da história tradicional pensa na história como uma narração dos grandes

fatos e olha de cima para baixo; a nova história se preocupa em analisar as

estruturas de cima, de baixo, de todos os ângulos possíveis, aceita qualquer

documento. A nova história preocupa-se com os movimentos sociais; as tendências

novas apresentadas por especialistas.

É oportuno pensarmos em novos caminhos da história e da produção

histórica sem esquecer-se das estruturas elaboradas por outros historiadores. Na

segunda metade do século XIX se impôs o paradigma de uma história que se

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chamou tradicional ou Rankeana, derivada do nome do historiador Leopold Von

Ranke (1795-1886), que propalava a neutralidade na pesquisa historiográfica.

Para Burke (1992) a história consiste em um campo de conhecimento

cientificamente neutro cuja principal forma de expressar a verdade dos fatos seria

através do viés político. Peter Burke tece criticas ainda ao fato de que a história

ciência propalada por Ranke incidia somente à política: visão de cima posto que

versasse sobre os feitos dos grandes homens dirigentes de grandiosas nações.

Baseada em documentos, postulava que a sociedade consistia em uma coletividade

de espíritos cuja expressão maior era a nação alemã.

Em relação às estruturas, o autor percebe problema de explicação estrutural,

apesar de aumentar a interdisciplinaridade, muitas vezes, não toma conta do tempo,

o qual é uma preocupação do historiador.

Os historiadores precisam se interessar pela memória, considerando-a como

fonte histórica e como fenômeno histórico. Sob o primeiro aspecto, além de

estudarem a memória como fonte para a história, os historiadores devem elaborar

uma crítica no momento de analisar esses documentos históricos como qualquer

outro.

No que diz respeito ao outro aspecto que Burke denomina de “história social”

identifica-se os princípios de seleção e observação, de como os mesmos variam de

um lugar para outro, ou de um grupo para outro, e como se transformam na

passagem do tempo.

O desafio de romper com um ensino cujas características contemplam

aspectos ora metódico ora positivistas, que infelizmente, em muitas situações

permeiam o ensino de História é grande. Torna-se necessário uma reflexão sobre as

novas correntes filosóficas, para o ensino de História, bem como uma revisão nos

procedimentos metodológicos da disciplina história visando desnaturalizar as

verdades concebidas nos documentos e nas obras históricas.

Esta concepção histórica tem como ponto de partida a realidade do aluno e

a investigação histórica uma vez que o aluno participa do processo ensino-

aprendizagem, na medida em que a história passa a ser vista como uma escrita

criada pelos historiadores e não como algo a priori da produção de uma escrita.

Acrescenta-se ao fato de que essa descoberta é realizada a medida que passa a

diferenciar história de vida, historiografia e história ensinada tendo como escopo o

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entendimento da trajetória histórica da comunidade envolvente e a valorização das

diferenças.

É oportuno destacar a importância dos sujeitos históricos que parecem

invisíveis na história oficial; é recompor a história dos próprios sujeitos envolvidos.

Numa sociedade que perde suas referências para o mundo do trabalho e da

comunicação, valorizar a memória enquanto objeto da história e as experiências

sociais enquanto possibilidade de compreender o modo em que vivem, oferece ao

sujeito o entendimento histórico.

1.1 A Iconografia na História

Na contemporaneidade, após a emergência do grupo conhecido como

Annales, e, sobretudo após o fim da década de 1960 o campo da história vivencia

novas transformações. Jacques Le Goff (1996) sugere a ampliação do conceito de

documento. Todo e qualquer vestígio é passível de vir a se tornar um documento

para o historiador. Podemos hoje, por exemplo, utilizar a fotografia, como uma fonte

para a reconstrução de eventos do passado e também do presente. Não é o intuito

de buscar totalidade do vivido, mas somente fragmentos de experiências. Ao

pesquisador o momento presente impõe “[...] a tarefa de desvendar uma intricada

rede de significações, cujos elementos – homens e signos – interagem

dialeticamente na composição da realidade” (CARDOSO, 1997, p. 405).

A fotografia nos revela, portanto, através da produção da imagem, pistas

sobre dado evento que pode remeter a memória de um tempo e de um espaço que

constroem sentidos à medida que nos debruçamos nesse suporte com sendo nosso

objeto de pesquisa.

Para Cardoso (1997), a imagem fotográfica é compreendida como

documento e nos revela aspectos de um determinado tempo onde a descrição

verbal não daria conta de detalhar. Revela, também, a ação do homem sobre a

natureza e o seu relacionamento com o grupo.

A mais nova geração de historiadores vem usando a iconografia com muita

frequência:

A iconografia é tomada agora como registro histórico realizado por meio de ícones, de imagens pintadas, desenhadas, impressas ou imaginadas e, ainda, esculpidas, modeladas, talhadas, gravadas em material fotográfico e cinematográfico (PAIVA, 2002, p. 17).

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Segundo Paiva (2002) são registros que os historiadores e professores de

História devem estabelecer diálogo contínuo, em razão da importância dos registros

que mantêm ao longo do tempo.

Nessa direção o uso da imagem pelo historiador vem propiciando a

apresentação de trabalhos renovadores para a história. Como se trata de um

procedimento muito recente e restrito são necessários esclarecimentos sobre como

investigar esse tipo de fonte. É importante saber que a imagem não se esgota em si

mesma, isto é, há mais a ser compreendido. A imagem é uma espécie de ponte

entre a realidade que foi retratada e outras realidades, no passado ou no presente.

Por isso ela não se esgota em si mesma.

Para Paiva (2002) a história e os diversos registros históricos sempre são

resultados de escolhas, seleções e olhares de seus produtores e dos demais

agentes que influenciaram essa produção. Também são vistos e compreendidos de

maneiras diferentes pelos historiadores, professores de História e pelos alunos. Isso

significa que as fontes nunca são completas e nem as versões históricas são

definitivas.

Acerca de fontes e versões e de sua importância, é possível registrar que:

“fontes e versões carregam em si temporalidades distintas, porque são construídas e

reconstruídas a cada época” (PAIVA, 2002, p.20).

Outro ponto que precisa ficar claro é a observação das permanências e

rupturas que compõem a base do campo de estudo das imagens. Na atualidade, a

imagem ocupa um enorme na construção da ideia do real, talvez, maior do que os

vestígios escritos, devido a universalização da imagem. A televisão, a fotografia e

todas as manifestações visuais possíveis estão presentes no nosso cotidiano, cada

vez com mais intensidade. Sendo a iconografia o estudo da criação da imagem, logo

se torna essencial à educação pois leva ao entendimento de que documento não é

somente algo escrito e que a imagem é também um documento que como qualquer

outro não revela a verdade mas uma construção de verdade, de momento vivido.

1.2 A Questão do Uso de Documentos Históricos em Sala de Aula

Atualmente, o desafio de usar diferentes documentos como porta de entrada

para o conhecimento histórico é uma prática que vem sendo amplamente debatida.

O atual contexto da produção de saberes busca também diversificar o uso de

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documentos históricos em sala de aula com o objetivo de construir propostas de

ensino identificadas com as expectativas e com a cultura do aluno. Segundo

Schimidt (2004), um interessante locus documental é aquele que se encontra

guardado “[...] na casa do próprio aluno” (SCHMIDT, 2004, p.105).

Para a pesquisadora os documentos devem ser selecionados de maneira

que provoque o interesse dos alunos e contribuam para a construção de novos

argumentos. Essa estratégia pode ajudar a desenvolver no aluno a capacidade de

estabelecer relações e generalizações, perceber localizações históricas, observar

mudanças e permanências, semelhanças e diferenças, construir conceitos e

hipóteses históricas.

Por seu turno, as Diretrizes Curriculares do ensino de História (2008)

enfatizam a importância de uma metodologia que contribua para que os alunos

possam se apropriar os fundamentos teóricos necessários para pensar

historicamente. Para o ensino fundamental, direciona os conteúdos, de forma que

seja articulado, partindo da história local e do Brasil, relacionando e comparando

com a história geral. Este processo pedagógico tem por objetivo desenvolver a

consciência histórica.

Os processos históricos tornam-se abrangentes, quando se prioriza as

concepções de aprendizagem histórica aliadas aos conteúdos escolares.

As continuidades históricas são apresentadas como um processo no qual a

alteração dos modos de vida permite a constituição de uma identidade por meio da

alteridade. De acordo com os encaminhamentos da política publica de ensino do

estado do Paraná, a “identidade é a constituição dos sujeitos pelo Outro. [...] “o

Outro” significa os sujeitos que viveram em outros espaços e outros tempos

históricos” (PARANÁ, 2008, p.60). Nessa perspectiva apontada o tempo é encarado

como um princípio sustentado pelas relações de temporalidade, ou seja, as

permanências, mudanças, simultaneidades ou recorrências.

No que tange a temática identitária, Silva (2010, p.202) recorrendo a

Dominique Wolton define identidade a partir da seguinte colocação:

O caráter do que permanece idêntico a si próprio; como se uma característica de continuidade que o Ser mantém consigo mesmo. Partindo dessa idéia podemos compreender a identidade pessoal como a característica de um indivíduo de se perceber como o mesmo ao longo do tempo. Tanto para a Antropologia quanto para a Psicologia, a identidade é um sistema de representações que permite a construção do ‘eu’, ou seja,

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que permite que o indivíduo se torne semelhante a si mesmo e diferente dos outros.

Tal sistema de representações do eu concorre para definir as diferenças

entre o eu e o outro. Essa premissa é válida tanto para as condições cotidianas

assim como para as perspectivas de futuro. A transformação entre a identidade

pessoal para a identidade cultural se caracteriza como a partilha de uma mesma

essência no contexto de diferentes indivíduos (SILVA, 2010). Nesse sentido, o

tempo é encarado como um princípio sustentado pelas relações de múltiplas

temporalidades, e de eventos que são únicos e, que, portanto, não se repetem

jamais.

Freitag (2007) por sua vez, destaca que o tema identidade é um assunto

ambivalente. A autora, em consonância com o pensamento de Bauman (2005, p. 19)

infere que os sentimentos de pertencimento e, por extensão as identidades, não

possuem a resistência de uma rocha. Tais sentimentos:

Não são garantidos por toda a vida, são bastante negociáveis e revogáveis e, de que as decisões que o próprio indivíduo toma os caminhos que percorre, a maneira como age [...] são fatores cruciais tanto para o pertencimento quanto para a identidade (apud FREITAG, 2007, p. 18).

A reflexão do autor ressalta que, enquanto o sentimento de pertencimento for

um destino para os indivíduos, a identidade - sentimento de pertencimento a um

grupo que o defina - não vai ocorrer. Segundo essa linha de pensamento, as

identidades, portanto podem flutuar no ar, conforme algumas de nossas escolhas.

Outras, no entanto, podem ser lançadas a nossa volta por ter encontrado ali um

terreno fértil para levar a cabo tal tarefa.

Algumas questões podem ser registradas, por exemplo: quais as teorias

existentes nesse texto que o grupo considera importante para que os demais

colegas da sala se apropriem desse conhecimento para posteriormente utilizarem na

pesquisa de campo; qual a importância da imagem para o ensino de história; o que

Maria Auxiliadora Schimidt escreve sobre a importância dos alunos se envolverem

em trabalhos de pesquisa.

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Texto 2

2 Migração Rural e Urbanização

O processo de urbanização é um fato mundial, condicionado pelo

desenvolvimento da economia de mercado e pela divisão do trabalho cada vez mais

intensa. Nesse processo a economia rural de acordo com as necessidades do

mercado urbano.

O processo de urbanização no Brasil apoiou-se essencialmente no êxodo rural, ou seja, na transferência da população do meio rural para as cidades. [...] Ainda hoje é grande o êxodo rural. Um indicador desta afirmação é o fato de que, somente no período do governo Sarney, aproximadamente 100.000 propriedades rurais foram entregues a bancos para saldar dívidas não pagas (SVIDERSKI, 1998, p.104-105).

A migração rural também tem como motivo o trabalho excedente, que

perdeu lugar para as máquinas. A concentração de propriedades nas mãos e

poucos causa a carência de terras para a maioria dos trabalhadores rurais, estes

vão para as cidades aumentando o processo de urbanização e marginalização.

1.1 Vida urbana e industrialização no Brasil: algumas informações

Até 1.850, os ritmos das transformações que a sociedade brasileira passava

eram bastante lentos. As cidades eram pacatas e provincianas, suas construções

eram simples, ruas lamacentas, sem iluminação.

Com os lucros gerados pela cafeicultura possibilitou o capital necessário

para investir na criação das indústrias no Brasil.

Até 1.930, as indústrias brasileiras voltaram-se principalmente á produção de

bens não duráveis, como tecidos e alimentos.

As indústrias localizavam-se de modo disperso pelo território nacional,

surgindo nos maiores aglomerados urbanos devido à concentração nesses espaços

de serviços e de facilidade administrativas ligadas à exportação como, por exemplo:

meios de transporte e comunicação, estabelecimentos comerciais e financeiros.

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O crescimento das indústrias levou ao processo de urbanização, que foi

exigindo uma série de obras, como: instalação de energia elétrica, limpeza pública,

saneamento básico e linhas de telégrafo.

Após 1.870 o capital industrial provocou mudanças sobre o crescimento e a

fisionomia das cidades, ou seja, os contrastes entre centro e periferia.

Dentro do contexto de transformações que ocorreram no Brasil, decorrentes

do processo de industrialização e urbanização é necessário situar as construções de

casas populares.

A introdução maciça de capitais valorizou o espaço urbano e abriu caminho

para a especulação imobiliária. O aumento crescente do valor fundiário fazia com

que aumentasse os valores dos alugueis e reduzia as possibilidades de uma melhor

habitação para as famílias operárias. A forma ou alternativa para se livrar do alto

preço dos aluguéis foi a busca de moradia nos bairros operários.

Os cortiços de São Paulo, as favelas cariocas e os mocambos de Recife

foram os exemplos de habitação dos operários e demais setores explorados.

Construções simples de madeira e de outros materiais mais baratos, situadas em

terrenos de risco, essas habitações populares constituíam uma espaço típico na vida

das massas trabalhadoras.

A partir da década de 50 do século XX, ocorre o chamado processo de

modernização da sociedade brasileira pelo desenvolvimento da indústria de bens e

consumo, pelo aceleramento da urbanização e aumento de pessoas que deixaram

de viver no espaço rural para viver no espaço urbano.

Nesse período o automóvel, a geladeira, a televisão, máquina de lavar

roupa, batedeira de bolo, toca discos, ventilador, todos estes produtos encheram as

lojas brasileiras e produzidos por empresas estrangeiras aqui instaladas.

Na década de 70, do século XX sob o governo da Ditadura Militar, houve o

predomínio e grandes empresas monopolistas, sendo estas sustentadas com capital

internacional, com isso ocorreu também a proletarização de uma parcela maior da

população e o aumento da sociedade de consumo.

Neste período o país se consolidou como efetivamente urbano. Ocorreu uma

expansão urbana considerada o caos, as cidades inchavam e cresceram

desordenadamente sem poder oferecer condições básicas de vida para seus

habitantes. Isto provocou um contraste nas cidades: de um lado o luxo, beleza,

grande riqueza e abundância, caracterizado pela vida de consumo nos shoppings

16

centers e sofisticados condomínios de luxo e mansões, de outro, a aumento de

favelas, cortiços, bairros de periferia com problemas de infra-estrutura urbana, como

por exemplo, ruas, rede de esgoto e água.

Conforme consta no Documento 1:

Entretanto, a rua lá fora povoava-se de um modo admirável. Construía-se mal, porém muito; surgiam chalés e casinhas da noite para o dia. Montara-se uma fábrica de massas italiana e outra de velas. Não obstante as casinhas do cortiço, à produção que se atamancavam, enchiam-se logo. Noventa e cinco casinhas comportou a imensa estalagem. E naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a minhocar, a esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, e multiplicar-se como larvar no esterco (apud AZEVEDO, 1981 p.20-21)

3.

E, no Documento 2, assim está registrado:

Exatamente no dia em que começava a primavera, uma boa notícia chamava nossa atenção ao folhear o jornal: ‘Está nascendo um oásis em São Paulo’. Uma grande e famosa construtora anunciava ao leitor que havia criado e já estava desenvolvendo um lugar fantástico para ele e sua família morarem: Um bairro calmo, tranquilo, arborizado, florido, planejado nos mínimos detalhes. Um local de rara beleza, onde o verde é o principal personagem, fruto de um rico projeto paisagístico. Um verdadeiro oásis com toda infra-estrutura: ruas largas, avenidas com iluminação de mercúrio, asfalto, segurança motorizada 24 horas por dia e tudo o que você exige por perto (apud ALVES, 1992, p.70)

4.

Para o Texto 2, também surgem questionamentos, assim dispostos: como a

realidade é descrita nos textos; como interpretar a imagem e as relações com os

textos de Azevedo (1981) e Alves (1992); a partir da análise dos textos trabalhados,

de que modo pode ser discutida a relação Industrialização e Urbanização, e quanto

ao processo do êxodo rural, industrialização e urbanização que, sem o devido

planejamento trouxeram inúmeros problemas que ainda não foram solucionados

pela maioria das cidades como as favelas e poluição, que medidas deveriam adotar

os nossos governantes para solucionar esses problemas.

3 AZEVEDO, Aluísio. O Cortiço. São Paulo: Ática, 1981.

4 ALVES, Júlia FALIVENE. Metrópoles: cidadania e qualidade de vida. São Paulo: Moderna, 1992.

AUTORES, Vários. História: Ensino Médio. Curitiba: SEED-PR, 2006.

17

Texto 3

3 Os Contrastes das Cidades

E fácil identificar nas cidades os territórios diferenciados como por exemplo o

bairro das mansões e palacetes, o centro de negócios, o bairro boêmio onde rola a

vida noturna, o bairro industrial e os bairros periféricos.

As cidades são vistas como um quebra-cabeça, feito de peças diferenciadas,

onde cada qual reconhece seu lugar. Esse movimento de separação das classes

sociais e as funções no espaço urbano que os estudiosos chamam de segregação

espacial.

A segregação também é percebida pela separação entre os locais de

trabalho e moradia. Com isto, bairros inteiros ficam completamente fechados durante

o dia, os bairros dormitórios, em contrapartida algumas regiões comerciais parecem

cenários ou cidades fantasmas para quem percorre a noite.

Alem de todas essas separações entre os locais de moradia e trabalho a

segregação também é visível a desigualdade de tratamento por parte das

administrações locais. Por exemplo, existem setores da cidade onde o lixo é

recolhido diariamente enquanto outros setores a coleta é feita uma vez por semana.

Em todos esses exemplos mencionados, fica evidente os muros visíveis e

invisíveis que dividem a cidade, ou seja, o contraste existente entre o território de

poder e dinheiro e o território popular.

Na cidade as moradias passam a não ser mais uma unidade de produção

como é o espaço rural, porque os bens que se produzia no interior, no espaço

urbano se compram no mercado. Os bairros residenciais são exclusivos para a

burguesia enquanto a superdensidade dos bairros de trabalhadores porque a terra

urbana é mercadoria e quem tem dinheiro compra vários lotes na cidade e quem não

tem precisa dividir o espaço pequeno com muitos.

Para Schorner “Do ponto de vista político, a segregação é o produto e

produtora do conflito social. Separa-se porque a mistura é conflituosa e quanto mais

separada é a cidade, mais visível é a diferença, mais acirrado poderá ser o

confronto.” (SCHORNER, 2009, p. 17)5.

5 SCHÖRNER, Ancelmo. Paranaenses em movimento: trajetórias e travessias migratórias (1980-

2000). Guarapuava: Unicentro, 2009.

18

Essas diferenças são visíveis quando observamos a vida social da burguesia

que se retira da rua para se organizar à parte, ou seja em grupos homogêneos de

famílias iguais a ela. Em relação a este isolamento que redefine a noção do espaço

privado e público. Para a burguesia, o espaço público deixa de ser a rua, ou seja, as

festas religiosas e bailes que engloba a participação da maior variedade possível de

pessoas e condições sociais. A burguesia considera que a rua é o espaço de

ninguém, perigosa que mistura várias classes sociais, portanto é pouco frequentada.

Para a burguesia, o espaço público passa a ser a sala de visitas, ou o salão.

A casa é o território de intimidade e exclusividade. Assim esse grupo se considera

totalmente protegido da grande diversidade de pessoas que compõem a cidade.

É interessante observar também a segregação existente dentro do espaço

de moradia que predomina a vida privada do núcleo familiar e da sua exclusividade.

Isto pode ser considerado como uma micropolítica familiar que define os espaços

públicos e privados. Dentro da casa há uma espécie de zoneamento dos cômodos

segundo o número de ocupantes e a posição social – sala de jantar, sala de visitas,

quarto do casal, dos filhos e de visitas, portanto espaços já selecionados.

As crianças também estão passando por mudanças de ambientes e

construindo uma nova identidade. Até a pouco tempo elas viviam desde o

nascimento incluídas no mundo do trabalho dos adultos aprendendo na prática o

que necessitam para sobreviver e a sua cultura. Elas passam a ser separadas por

grupos de idade e mandadas para creches e escolas que os segregam nos pátios e

em salas de aula com o objetivo de curar, educar ou punir.

Sobre o texto 3 foram apontados os seguintes questionamentos e instruções

aos alunos: você conhece sua cidade? Procure observar como ela está organizada.

Existem bairros industriais, bairros periféricos e áreas onde predominam apenas

estabelecimentos comerciais? Há áreas onde se localizam os bairros residenciais?

Qual sua função? c) Localizar a existência ou não dessas situações descritas no

texto na sua cidade, se existir fotografar e comentar.

Texto 4

4 Migração Rural e Urbanização no Paraná

Leitura do texto página 25 a 27.

19

http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/1641-6.pdf

Responder as questões:

1) Descrever como ocorreu o processo de modernização da agricultura no

Paraná.

2) De que maneira a modernização do campo influenciou o êxodo rural no

Paraná?

3) Quais os outros fatores que contribuíram para a intensa migração do

campo?

Texto 5

5 O Caso de Coronel Vivida

A história do Município de Coronel Vivida, Paraná, está ligada ao

descobrimento dos campos de Palmas, fato resultante da expedição que, no século

XVIII, partiu de Curitiba sob o comando de Zacarias Dias Cortes.

Da descoberta da região conhecida por Campos de Palmas, resultou anos

mais tarde, a fundação da Freguesia de Palmas, que deu origem aos Municípios de

União da Vitória, Mangueirinha, Chopinzinho e Coronel Vivida.

A primeira denominação do Município foi Barro Preto, devido a coloração

escura do solo, próximo a pequenos córregos em baixadas. Mais tarde foi

denominado Coronel Vivida, em homenagem ao Coronel Fermino Teixeira Batista,

considerado o grande desbravador da região.

Com 55 anos de emancipação política, o Município constitui parte da história

do Sudoeste do Paraná, criado pela Lei Estadual nº 253, de 02 de dezembro de

1954, tendo sido instalado em 14 de dezembro do ano seguinte.

Este Município foi colonizado por catarinenses e riograndenses, que

chegaram a partir de 1920 abrindo novas fronteiras. Ao iniciarem suas atividades

nesta região, surgiu como atividade principal a extração da madeira e alguns anos

depois começaram a preparar o solo para a produção agropecuária.

Até a década de setenta, os vividenses geravam seu desenvolvimento na

exploração da madeira comercializando-a, principalmente, em São Paulo, Rio de

Janeiro e no próprio Paraná (Ponta Grossa). Atualmente o Município sobrevive da

agricultura e pecuária.

20

Coronel Vivida pertence à Microrregião n º 16, no Terceiro Planalto de

palmas, localizado na bacia hidrográfica da Rio Iguaçu, delimitado de Pato Branco e

Itapejara D’Oeste pelo rio Chopim.

As coordenadas geográficas são de 26° de latitude de Sul e 52° de longitude

Oeste de Greenhich. Possui 718,70 metros de altitude média e seu clima é

subtropical.

Coronel Vivida possui uma área de 701,016 Km, com uma população de

21.692 habitantes.

1.1 Aspectos Econômicos do Município

O setor primário é uma das principais fontes de arrecadação do Município e

mesmo assim a economia agropecuária passa dificuldades, pois observa-se que,

com o passar dos anos os proprietários venderam suas propriedades e mudaram-se

para a cidade.devido as dívidas contraídas com financiamentos junto aos bancos.

Do total da área produtiva, observou-se que 75% da terra do Município é utilizada

para as atividades agrícolas e 25% para as atividades pecuárias.

Nas atividades agrícolas, as plantações de verão mais significativas são: o

milho e soja e as de inverno são: trigo e aveia. Planta-se em menor escala o feijão,

cevada e arroz.

As culturas de verão tiveram um aumento de produtividade nos últimos anos,

em virtude de investimentos e tecnologia nas culturas, com correção, adubação e

conservação do solo. Na cultura de feijão, houve uma estagnação da área plantada,

bem como da produtividade, devido aos preços de comercialização serem baixos.

As atividades pecuárias acontecem principalmente nas médias e grandes

propriedades onde observa-se o predomínio de rebanho cruzado (gado de corte e

gado leiteiro). O rebanho bovino é o de maior significado dentro das atividades

pecuárias e utilizado para corte, o qual abastece parte dos frigoríficos locais. O gado

leiteiro também é bem expressivo e abastece os laticínios locais.

O transporte do interior do Município para os armazéns da zona urbana é

realizado por caminhões de propriedade de pessoas autônomas ou dos próprios

armazéns e cooperativas. Nas regiões de divisa, alguns produtores comercializam

sua produção com o Município vizinho porque a distancia é menor, ou por ter preços

melhores, ou por serem associados de cooperativas desses locais.

21

1.2 Questão Agrária e Agropecuária no Município

Ao longo da década de 70, houve grande expansão da lavoura comercial de

soja com estímulos oficiais à produção voltada para a exportação, inserida num

contexto mais amplo do capitalismo no processo de acumulação de capital. Esta

expansão da lavoura influenciou decisivamente nas transformações da agricultura

da região Sul, que até meados dos anos 80, se caracterizou como produtora de

alimentos para o mercado interno.

A difusão acelerada da mecanização do campo, elemento que marcou a

década de 70, trouxe mudanças na estrutura fundiária, uma vez que o processo de

acumulação de terras acompanhou as alterações na escala de produção. A

modernização da agricultura e a concentração fundiária tiveram consequências

diretas sobre o contingente de pessoas ocupadas em atividades agropecuárias e

sobre as formas de exploração dos estabelecimentos rurais. Houve redução da

capacidade de absorção da mão de obra na agricultura, acentuação da condição de

exploração direta pelo proprietário e redução das formas de exploração indireta,

como a parcela de arrendamento. Com isto, formou-se um excedente de

trabalhadores, que se dirigiram para os grandes centros de Santa Catarina e São

Paulo pressionados pela redução crescente da garantia de sobrevivência no

Município.

1.3 O Rural No Município de Coronel Vivida - PR

“O êxodo rural é o movimento transladativo do campo para a cidade, este

fato é próprio dos paises em desenvolvimento e de industrialização tardia” (BRUM,

1988, p.98).

A introdução da tecnologia agrícola nas lavouras, juntamente a outros

fatores, como a política econômica, a industrialização além de outros motivos são

responsáveis pelo movimento migratório do Município.

A partir de mais ou menos 1970, a saída das famílias da área rural em

direção aos centros urbanos se acelerou no Município de Coronel Vivida-Pr,

envolvendo todos anos um grande número de pessoas. Assim em um período de

vinte anos, a porcentagem da população rural declinou em relação à população

urbana.

22

Segundo dados do IBGE, a população rural de Coronel Vivida-Pr, em 1971

era de aproximadamente 20.000 habitantes, tendo decaído em 1981 para

aproximadamente 15.000 habitantes, e em 1991 a população rural do Município era

de apenas 12.802 habitantes.

Com a população urbana observa-se o inverso, em 1971, era

aproximadamente 5.000 habitantes, subindo para 9.5000 habitantes em 1981 e, em

1991, a população urbana era de 12.338 habitantes.

A aplicação da tecnologia nas áreas agrícolas, consistindo na mecanização

do campo, seleção das espécies animais, seleção de sementes, uso de defensivos

agrícolas, melhoramento dos meios de transporte e armazenamento dos produtos,

permite aplicar a oferta dos produtos agrícolas para satisfazer a procura. Porém, o

uso da tecnologia é feito apenas em áreas maiores, pelos médios e grandes

proprietários, excluindo os pequenos produtores. Isto torna a situação dos pequenos

agricultores mais difícil e menos rentável, pois este, não tem condições de fazer uso

da tecnologia e pouco produz, desencadeando a sua saída para outras regiões ou

para as periferias das cidades.

De acordo com levantamento feito no Cartório de Imóveis de Coronel Vivida-

Pr, verificou-se o número de famílias que migrou do interior do Município, de agosto

de 1994 a agosto de 1995, sendo que no levantamento constam 280 propriedades

transferidas. Encontramos 50 famílias que residiam em Coronel Vivida-Pr, das quais

33 foram entrevistadas.

As respostas dos entrevistados foram; “não podiam pagar os empréstimos

bancários”, “falta de técnicas apropriadas”, “falta de incentivo”, “safras frustradas” e a

“inexistência de empregos na área rural”, demonstram a situação dos pequenos

agricultores que vendem suas terras e saem em busca de uma nova vida e novas

oportunidades6.

Para o Texto 5 foram elaboradas questões e aplicadas aos alunos: de

acordo com o texto, quais são as causas do êxodo rural? De que maneira o

processo histórico desencadeia o êxodo rural?

Durante essa terceira atividade os grupos realizaram a leitura e análise dos

textos e em seguida socializaram com os demais alunos da turma os assuntos

6 SVIDERSKI, D. S. A questão do êxodo rural no Município de Coronel Vivida- Pr (1994 - 1995).

Palmas: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Palmas – Pr. - FAFI. 1998.

23

estudados. Logo após responderam juntos algumas questões disponíveis ao final da

cada texto.

A quarta atividade consistiu na pesquisa de laboratório onde os alunos foram

para o Laboratório de Informática da escola para pesquisarem as políticas públicas

federais, estaduais e municipais que definem o espaço urbano. Encontramos apenas

as políticas municipais no Plano Diretor onde contatamos a lei que determina a infra-

estrutura para os bairros e o centro também a preocupação ambiental com o plantio

de arvores á margem das ruas para que a população tenha mais conforto.

Após a realização da pesquisa tendo como fonte a internet, a quinta

atividade foi a pesquisa de campo onde a turma de alunos da 3ª série se mantiveram

em grupo para iniciar a pesquisa.

Um dos grupos encarregou-se de fotografar os contrastes existentes na

cidade de Coronel Vivida-Pr, tendo como base o texto “Contrastes urbanos”. Os

demais grupos pesquisaram as dez famílias que viveram a migração rural, que

fizeram parte da pesquisa anterior e que permanecem no local. Foram cinco grupos

de três pessoas e cada um visitou duas famílias para coletar imagens sobre a

memória e construção da identidade dos mesmos.

Lembrando que a memória é um fenômeno que traz em si um sentido de

continuidade e coerência e identidade é como a imagem que a pessoa adquire ao

longo da sua vida referente a ela própria. (SILVA, 2010, p 5).

Foram pesquisados três aspectos da vida cotidiana: alimentação, laser e

religiosidade e ocupação do tempo. Para registrar estes aspectos os alunos

utilizaram-se de máquinas fotográficas e celulares para coletar as informações.

A sexta atividade foi a apresentação dos materiais coletados na pesquisa de

campo. Cada grupo exibiu as fotos coletadas para os demais alunos da turma na TV

pendrive, permitindo que todos fizessem leitura das mesmas. Esta etapa agregou o

conhecimento da teoria e metodologia da pesquisa. Os grupos realizaram na leitura

das imagens a critica da produção imagética e responderam as questões que

seguem: quem produziu? Quando? Um acervo com imagens dessa envergadura

pode ser utilizado como fonte para a história? O que as imagens têm a ver com a

memória coletiva?

Em relação às imagens que se referem aos contrastes urbanos na cidade de

Coronel Vivida identificamos os territórios diferenciados como, por exemplo, os

bairros nobres com mansões e palacetes (Bairro Frizon, Bairro Líder), o centro de

24

negócios, os bairros de moradia (Bairro São Cristóvão, Bairro São Cristóvão II,

Bairro Fleck, Industrial) e os bairros periféricos (Bairro São José Operário, Bairro

Jardim Maria da Luz e Imaribo). Percebe-se também o contraste entre os locais de

trabalho e moradia, ruas inteiras ficam completamente fechadas durante o dia, são

as residências dormitórios; em contrapartida o centro da cidade é bem

movimentado.

Figura 1 - Avenida Generoso Marques – Coronel Vivida - PR Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011

7.

Figura 2 - Rua Antonio Rochembak – Bairro Jardim Maria da Luz – Coronel Vivida - PR

Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

7 As fotografias que seguem ao longo do texto foram cedidas devidamente através de livre

consentimento.

25

Foi fotografada também a desigualdade de tratamento por parte da

administração pública. Por exemplo, existem setores da cidade onde o lixo é

recolhido diariamente enquanto que outros setores a coleta é feita uma vez por

semana.

Comprovamos ainda as estratégias usadas pelos proprietários dos terrenos

que estão sendo loteados, sendo que os primeiros lotes colocados à venda foram os

do fundo e os da frente serão os últimos a serem vendidos, após a instalação da

infra-estrutura para super valorização do espaço.

Afirmamos que as famílias alvo desta pesquisa não residem nos bairros

nobres e nem no centro da cidade, mas sim nos bairros de moradia. Enfatizamos a

memória coletiva do grupo pesquisado que reside no Bairro São Cristóvão.

A migração e urbanização quebram o isolamento das comunidades

tradicionais, a crise do sistema produtivo rural, a negação de velhos valores e a

adoção de novos padrões de comportamento (SCHONER, 2009, p.105).

1.3.1 Lazer e Religiosidade em Coronel Vivida

No que diz respeito ao lazer e a religiosidade do grupo pesquisado

percebemos que as festas e comemorações religiosas fazem parte da cultura da

população local, em especial as festas dos padroeiros da Paróquia São Roque e as

demais comunidades. Como observa Silva (2011, p116): “a religião passa a ser

entendida como a expressão de valores coletivos de uma sociedade, como produto

e instrumento de uma cultura”.

Devido a grande parte das famílias pesquisadas residirem no Bairro São

Cristóvão em Coronel Vivida-Pr, destacamos a memória coletiva com enfoque em

um evento religioso que é a Festa de São Cristóvão.

26

Figura 3 - Noite de jogo de bingo Julho de 2009 Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

Figura 4 - Encenações da Via Sacra 22/04/2011 Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

Esta ocorre todos os anos no mês de julho, pois dia 25 está registrado no

calendário cristão como dia do padroeiro dos motoristas. A festa tem início uma

semana antes da data com um jantar italiano, onde é oferecido um cardápio bem

variado com comidas típicas: macarronada, polenta, carnes, tortéis (massa recheada

com moranga), linguiças, queijos, omeletes e saladas. Estes pratos são

acompanhados por um bom vinho.

Durante a semana são realizadas algumas celebrações religiosas na Igreja

que se inicia na quarta-feira com o tríduo (três celebrações), a missa festiva e a de

ação de graças.

27

Paralelo às celebrações no centro comunitário acorre o bingo que acontece

durante a semana da festa. Os objetos sorteados no jogo são arrecadados no

comércio local, onde os comerciantes doam um produto da loja para ser usado como

prêmio.

Durante as festividades a população residente na comunidade confecciona

bolos, pães, cucas, biscoitos e salgados na cozinha do centro comunitário onde se

comercializa esses produtos. As mulheres são as que mais se dedicam, pois, por

duas semanas esquecem-se de suas casas para trabalham em favor da

comunidade.

A festa do Padroeiro São Cristóvão é um aspecto importante da fé católica

da população residente no bairro, pois reforça o sentido de comunidade, ocasião de

encontro fraterno, de convívio alegre e sadio, de valorização cultural e humana, de

divertimento e de continuidade, pois os jovens, filhos e netos de ex-agricultores

participam efetivamente dos trabalhos comunitários.

No dia da festa, 25 de julho a comunidade desperta com foguetórios a partir

das seis horas da manhã um grande grupo de pessoas tem que iniciar outro dia de

trabalho, vender e assar a carne, arrumar lugares para os visitantes almoçar,

preparar as saladas para vender na cozinha.

A celebração festiva inicia as 8:30 hs da manhã em honra ao padroeiro São

Cristóvão com a grande procissão para a benção dos carros que sai do centro da

cidade e segue até a Comunidade do Bairro São Cristóvão. A imagem do padroeiro

é trazida à frente da procissão em carro aberto e decorado para ser bem visualizado.

Nessa procissão envolvem-se praticamente toda população católica do município

que trazem seus veículos para receberem a benção.

A tarde encerra-se a festa com matinê, que é animado por uma banda

musical, que mantém a musica no ambiente o tempo todo, onde jovens e adultos se

divertem com danças típicas, principalmente as gauchescas.

Destacamos também como lazer, ligados a religiosidade, bailes, jogos de

futebol, onde o lucro é revertido para a comunidade local. Esses eventos são

realizados com a ajuda da mídia local que é o rádio, onde se faz a divulgação,

gerando mais participação da população.

Outro momento importante vivenciado pelo grupo são as encenações da

Via-Sacra na sexta feira santa onde os jovens trazem à memória a Paixão e Morte

de Jesus Cristo. As encenações iniciam na igreja e percorre as ruas do bairro.

28

Esta junção entre o lazer e a religiosidade não deixará de existir tão cedo,

pois os eventos são vistos como uma forma de valorizar e firmar a união entre as

famílias devotas de várias comunidades.

Podemos dizer que as festas e celebrações religiosas são momentos de

celebrar a vida, romper o ritmo monótono do cotidiano, de se divertir e de se

encontrar.

Sendo assim, a religião é analisada como um fenômeno social, expressão da

vida coletiva, a qual faz parte do cotidiano da sociedade em estudo, sendo não mais

que uma criação da sociedade humana (SILVA, 2011, p. 116).

1.3.2 Alimentação

Figura 5 - Churrasqueira localizada no Bairro São Cristóvão Coronel Vivida PR Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

Figura 6 - Pães caseiros 19/07/2011 Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

29

Os hábitos alimentares mantidos por essas famílias pesquisadas são os que

são trazidos na memória e continua constituindo a identidade, como por exemplo, o

uso de carne assada “tradicional churrasco”, assado em churrasqueiras comunitárias

ou nos pátios das casas, as famílias desfrutam seu assado.

Também é comum o uso de pão caseiro feito com fermento de batata ralada.

Esse pão demora dois dias para ficar pronto. O grupo pesquisado consome pão em

duas refeições diárias, ou seja, no café da manhã e no jantar. O pão é considerado

símbolo de toda espécie de alimento e do esforço necessário para consegui-lo.

O bolo é um componente que não pode faltar nas festas comunitárias,

aniversários e casamentos. Estes bolos são tradicionais com receitas que passaram

de geração em geração.

Outros pratos típicos que são consumidos em larga escala são o feijão e

arroz, no almoço café com leite na primeira refeição do dia e biscoitos consumidos

nos lanches da tarde com chimarrão.

A alimentação, organizada como uma cozinha, torna-se símbolo de uma identidade [...] através da qual os homens podem se orientar e se distinguir. Mais que hábitos e comportamentos alimentares, as cozinhas implicam formas de perceber e expressar um determinado “modo ou estilo” de vida que se quer particular a um determinado grupo. Assim o que é colocado no prato, mais do que alimentar o corpo, alimenta uma certa forma de viver. (MACIEL, 2004, p.36).

Compreende-se, assim que a memória é um elemento de identidade tanto

individual como coletiva, na medida em que ela é um fator importante no sentimento

de continuidade de uma pessoa ou do grupo na construção de si mesmo, ou seja, na

formação de sujeitos históricos.

1.4 Uso do Tempo dos Migrantes

As principais atividades que as famílias se envolvem, são a participação no

Programa Paraná Alfabetizado, programa este que visa garantir a alfabetização de

jovens e adultos residentes no Estado do Paraná como direito elementar à

cidadania.

Ocupam o tempo também com ações voluntárias desempenhadas na

comunidade local. As atividades variam desde a organização de festas, casamentos,

e celebrações, onde o lucro é revertido para manutenção da própria comunidade.

30

Outra atividade que o grupo se envolve é nos exercícios físicos. Pagam um

professor para vir duas noites por semana para orientá-los. Isto nos revela que o

grupo se preocupa com a qualidade de vida, com a longevidade, pois todos desejam

viver muito, mas com saúde.

Em suas casas todas as famílias pesquisadas ocupam parte do tempo para

o cultivo de verduras, legumes, temperos e ervas medicinais. A horta além de ser

uma fonte alimentar é um local de relaxamento, pois proporciona o contato com a

terra e o prazer de continuar produzindo algo.

Todas as famílias pesquisadas cultivam pomar, até no jardim, movidos pelas

lembranças da infância de subir em arvores e comer as frutas, mesmo sem lavar. Os

espaços grandes que possuíam no interior foram reduzidos ou substituídos por

pequenos quintais. Eles fazem a opção pelo plantio de arvores frutífero de pequeno

porte devido à redução do espaço de cultivo. Também criam pequenos animais nos

fundos dos quintais, principalmente galinhas para consumo próprio.

Figura 7 - Horta quintal de um ex-agricultor 15/09/2011 Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

31

Figura 8 - Casal de ex-agricultores tomando chimarrão 12/09/2011 Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

Outro hábito importante é o uso do tempo com o chimarrão, pois o clima frio

favorece a pratica do costume, que além de ser gostoso, é fraterno, pois a cuia

passa de mão em mão, dando sequência a momentos de conversa entre amigos e

familiares. Segundo a opinião do grupo, o chimarrão é um ótimo parceiro do

churrasco, uma vez que é diurético e digestivo. O chimarrão tem um significado

social importante, representando o símbolo da hospitalidade e da saudação.

Maciel aponta que existem funções essenciais a serem desenvolvidas pela

memória, que seriam a manutenção da coerência interna e a defesa das fronteiras

daquilo que é comum ao grupo (2004, p.238).

No contexto das mudanças ainda continuam alguns hábitos que são trazidos

da experiência das gerações e esses costumes produzem um sentido, ou seja,

constroem identidades.

A sétima atividade oportunizou os alunos para que apresentassem os textos

e imagens em murais existentes no colégio. Foram confeccionados quatro murais

com os assuntos pesquisados: Os contrastes existentes na cidade de Coronel

Vivida-Pr; Alimentação; Lazer e Religiosidade; O uso do tempo dos ex-agricultores.

Com o trabalho exposto em painéis viabilizou uma leitura mais dinâmica e

eficiente permitindo a integração entre a comunidade escolar e os grupos de alunos

da 3ª série que realizaram a pesquisa.

32

Figura 9 - Painel com resultados da pesquisa Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

Figura 10 – Painel com resultados das pesquisas Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

Na oitava atividade apresentamos o resultado da pesquisa para a

comunidade vividense em um evento que marcou a abertura da semana cultural do

Colégio Estadual Tancredo Neves. Para este trabalho de divulgação convidamos os

repórteres das rádios locais que compareceram para fazer cobertura do evento, as

autoridades, coordenação do PDE do Núcleo Regional de Educação de Pato

Branco, as famílias pesquisadas e a comunidade escolar.

33

Para iniciar o evento foi montada a mesa de honra com os seguintes

componentes; eu, como professora PDE, direção do estabelecimento, representante

do núcleo, representante das famílias pesquisadas, representante dos alunos e na

platéia estavam os demais convidados.

Figura 11 - Mesa de Honra apresentação da pesquisa 13/10/2011 Fonte: Dados do projeto de intervenção, 2011.

Figura 12 - Grupo de estudo e comunidade envolvida 13/10/2011 Fonte: Dados do projeto de intervenção 2011

Foi apresentado o resultado da pesquisa com o uso de recursos midiáticos

(data show) para visualizar melhor as imagens e os textos produzidos. A

apresentação seguiu os quesitos estabelecidos na oitava atividade que contou com

depoimento das pessoas presentes no evento.

Para concluir as estratégias de ação, foi realizada uma avaliação das

atividades realizadas, ocasião na qual os grupos de estudo responderam aos

seguintes questionamentos.

34

1- Qual a opinião do grupo sobre a realização das atividades desenvolvidas

durante a implementação das estratégias de ação no nosso projeto?

2- O que mais chamou sua atenção nos estudos realizados?

3- Os recursos utilizados ajudaram na compreensão dos conteúdos?

4- Na opinião do grupo, os alunos estão prontos para atuar como agentes de

produção do conhecimento?

5- Quais as sugestões e criticas que vocês podem fazer para melhorar a

implementação de projetos dessa natureza?

3 Conclusão

Após o desenvolvimento do projeto de intervenção que contou inicialmente

com a elaboração de pré-projeto, projeto de pesquisa, definição de estratégias de

ação e implementação de intervenção pedagógica, ao concluir este artigo considera-

se que três fatores foram fundamentais em nossa pesquisa: primeiramente o

encontro com um referencial teórico que possibilitou que compreendêssemos a

importância das reflexões sobre memória e identidade da população que vivenciou a

migração rural, o uso das imagens como metodologia de pesquisa; em segundo

lugar, as experiências feitas com os estudantes e as famílias pesquisadas no

decorrer do processo de intervenção didático-pedagógica e destacamos também, a

série de encontros e eventos proporcionados pelo Governo do Estado através da

Secretaria de Estado da Educação (SEED/PR) e do Programa PDE.

No desenrolar da aplicação do projeto de intervenção os estudantes

conseguiram sair da posição de alunos passivos para assumir a condição de

agentes da produção do conhecimento, principalmente quando essas mídias dizem

respeito a celulares, máquinas fotográficas, internet e a TV Pen-drive, recursos que

os jovens dominam com tranquilidade e agilidade.

Acredita-se que dessa forma, com a conclusão desta intervenção na escola,

oportuniza-se uma nova condição e um novo espaço não apenas para os nossos

alunos, mas também para os nossos companheiros de magistério, em sua maioria,

carentes de métodos e práticas que possam ser vivenciadas em seu cotidiano.

Pretende-se que as estratégias utilizadas e os resultados apresentados

neste artigo sejam um estímulo para que os professores convidem o corpo discente

para participar da produção do conhecimento de um modo simples e objetivo.

35

Esta proposta de investigação partiu, pois da necessidade de refletir as

novas identidades sociais tendo como ponto de partida uma leitura ampla que leve

em conta as dinâmicas locais estabelecidas pelo coletivo dos antigos pequenos

proprietários de terras em apreço. Para realização dessas atividades utilizamos

dezesseis aulas em quatro semanas, com a proposta de leituras, observação de

mapas e fotografias, pesquisa de campo e demonstração pelos alunos da

apropriação do conteúdo.

Entendemos que o estudo ora realizado concorreu para valorizar os sujeitos

uma vez que redescobrem a sua história de vida e, por consequência a sua cultura.

A partir de relatos de antigos moradores, por exemplo, foi possível

descortinar continuidades e rupturas bem como novos arranjos sociais e identitários.

Esses foram significativos posto que o passado não é um dado morto, esquecido,

mas vivo e atual. Ele não contém apenas o limite do que aconteceu, mas pode

anunciar uma possibilidade de vir a ser.

Ao falar e ouvir, narrar experiência de vida, referir-se ao tempo, os sujeitos

ressignificaram-se e, por consequência, ressignificaram a sua própria história de

vida. Por fim, pode-se dizer que na dinâmica estabelecida na proposta

implementada ocorreu o estreitamento das relações escola – comunidade pois se

edificou a partir da interação das experiências vividas entre pesquisadores

discentes, escola que agregou o projeto e grupo social pesquisado.

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