microcrédito produtivo orientado - um estudo sobre políticas públicas no brasil e na frança

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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO MARIA ALICE CABRAL MAIA MICROCRÉDITO PRODUTIVO ORIENTADO: um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França SÃO PAULO - SP 2013

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Page 1: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO

MARIA ALICE CABRAL MAIA

MICROCRÉDITO PRODUTIVO ORIENTADO:

um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

SÃO PAULO - SP

2013

Page 2: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

MARIA ALICE CABRAL MAIA

MICROCRÉDITO PRODUTIVO ORIENTADO:

um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

Coordenadoria do curso de Administração

Pública da Escola de Administração de

Empresas de São Paulo como requisito parcial

à obtenção do título de Bacharel em

Administração.

Orientadora: Profª Dra.Zilma Borges de Souza

SÃO PAULO - SP

2013

Page 3: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

MARIA ALICE CABRAL MAIA

MICROCRÉDITO PRODUTIVO ORIENTADO:

um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

Coordenadoria do curso de Administração

Pública da Escola de Administração de

Empresas de São Paulo como requisito parcial

à obtenção do título de Bacharel em

Administração.

Orientadora: Profª Dra.Zilma Borges de Souza

Data da Aprovação:

____/____/______

Banca Examinadora:

Profa. Dra. Zilma Borges de Souza

(Orientadora)

FGV – EAESP

Prof. Dr. Marco Antonio Carvalho Teixeira

FGV – EAESP

SÃO PAULO - SP

2013

Page 4: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

DEDICATÓRIA

A meus pais e avós,

meus primeiros e eternos exemplos, motivação para chegar até aqui.

Ao meu afilhado Henrique,

motivação para que eu seja, a cada dia, exemplo para alguém.

Page 5: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

“Que situação extraordinária é a nossa, mortais! Cada um de nós está aqui para uma breve

estadia; para um propósito que não conhece, apesar de algumas vezes pensar que sente. Mas

do ponto de vista da vida cotidiana, sem ir a fundo, nós existimos para nossos semelhantes –

em primeiro lugar para aqueles de cujos sorrisos e bem-estar nossa felicidade depende, e em

seguida para todos aqueles desconhecidos com cujos destinos nós estamos ligados pelo laço

de simpatia. Cem vezes todos os dias lembro a mim mesmo que minha vida interior e exterior,

depende dos trabalhos de outros homens, vivos ou mortos, e que devo esforçar-me a fim de

devolver na mesma medida que recebi.”1

(The World As I See It – Albert Einstein)

1 Tradução própria: “What an extraordinary situation is that of us mortals! Each of us is here for a brief sojourn;

for what purpose he knows not, though he sometimes thinks he feels it. But from the point of view of daily life,

without going deeper, we exist for our fellow-men – in the first place for those on whose smiles and welfare all

our happiness depends, and next for all those unknown to us personally with whose destinies we are bound up by

the tie of sympathy. A hundred times every day I remind myself that my inner and outer life depend on the

labours of other men, living and dead, and that I must exert myself in order to give in the same measure as I have

received and am still receiving.”

Page 6: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

AGRADECIMENTOS

Hoje, quando olho para trás, não vejo histórias, mas pessoas. Pessoas que me

ajudaram, orientaram e deram comigo cada um dos passos para chegar até aqui. Para mim, a

GV foi muito mais que uma escola de administração. Nos últimos quatro anos, eu vivi no

maior centro potencializador de talentos que já conheci. A cada dia, uma nova experiência

enriquecedora era oferecida. E por cada uma dessas oportunidades, eu devo muitos

agradecimentos.

Em primeiro lugar, aos meus pais e avós. Vocês foram meu primeiro exemplo de

trabalho duro e dedicação, e são meu apoio fundamental em todas as horas. A toda a minha

família e meus amigos, que compreenderam minhas ausências e sempre me deram energia

quando eu precisei. Aos meus amigos de sala, que fizeram cada dia mais alegre, e foram

motivação quando sobrava cansaço. À Keka, que me compreendeu da forma mais profunda

possível, e me ensinou a sempre entregar meu melhor, no que quer que eu fizesse. Aos

professores, que me orientaram. Pelo apoio e, principalmente, dedicação, agradeço à

professora Zilma Borges, que me acompanha desde o primeiro semestre de curso, e seguiu de

perto o desenvolvimento da pesquisa de campo da experiência francesa. Aos colegas e ex-

colegas de trabalho e gestores e ex-gestores, que me ensinaram o valor do profissionalismo.

Aos funcionários da FGV, por sua constante simpatia e prestatividade. Meu agradecimento

especial àqueles que, anonimamente, acreditaram na educação e me apoiaram como

filantropos, oferecendo oportunidades que antes eu somente sonhava em conquistar.

Finalmente, meu agradecimento especial a Deus, por ter orquestrado lá de cima para que

todas essas bênçãos se concretizassem.

Por fim, este trabalho só se tornou viável pelo suporte de tantas pessoas, tantas

vozes e tantas mãos, que permitiram que as primeiras hipóteses se transformassem em

respostas, as primeiras percepções formassem ideias, e as ideias então, se transformassem em

texto e pesquisa. Sinceros agradecimentos aos professores responsáveis pelo Conexão Local e

à equipe do GV Pesquisa, que se esforçaram para que cada uma das investigações se tornasse

possível. Aos entrevistados e aos que abriram suas casas, suas histórias e suas mais sinceras

reflexões, espero tê-las retratado de forma justa e com o merecido respeito, atendendo à

responsabilidade que me incumbiram.

Page 7: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

RESUMO

Este trabalho aborda a interação entre poder público e sociedade civil para a implementação

de microcrédito produtivo orientado para agricultores familiares, microempreendedores e

empreendedores informais. A pesquisa traz uma descrição da realidade local e dos atores

envolvidos para analisar os desafios da viabilização do desenvolvimento socioeconômico a

partir da oferta de politicas públicas de apoio ao crédito. Ao longo deste trabalho são

abordados temas como o impacto de tal interação para os processos de formulação e de

implementação da política pública, além de sua influência na realidade local. Além disso, são

abordadas as principais lições ou melhores práticas reveladas pelos casos estudados. A

metodologia de pesquisa de vertente qualitativa foi realizada por meio de pesquisa

documental e de investigação de campo no Brasil e na França, e é fundamentada em

referencial teórico sobre microcrédito, especialmente focalizando agricultores e pequenos

empreendedores como públicos alvo destas políticas.

Palavras-chave: poder público, microcrédito, crédito público, agricultura familiar,

microempreendedores, empreendedores informais, Brasil-França.

Page 8: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

ABSTRACT

This plan deals with relevant issues over the interaction between public policies and society in

the implementation of productive oriented microcredit for family agribusiness, micro-

entrepreneurs and informal entrepreneurs. The research briefly describes the local reality and

the actors involved to, finally, analyze the challenges of fostering socioeconomic development

through credit-based public policies. Throughout this work, it discusses the impact of this

interaction for public policies’ formulation an implementation processes and its influence in

the local context. Nonetheless, it studies the main lessons or best practices revealed by the

cases studied. The qualitative research methodology was performed by the use of

documentary research and field investigation, both in Brazil and France. Nonetheless, it is

based in the conceptual framework regarding microcredit, especially the ones targeting

farmers and entrepreneurs.

Keywords: public sector, microcredit, public credit, family agribusiness, micro-entrepreneurs,

informal entrepreneurs, Brazil-France

Page 9: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BNB – Banco do Nordeste do Brasil

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

DAP – Declaração de Aptidão ao Pronaf

DLOC – Desenvolvimento Local Orientado à Comunidade

ERDF – Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

JASPERS – Assistência Conjunta para o Apoio a Projetos nas Regiões Europeias

JEREMIE – Recursos Europeus Conjuntos para Micro e Médias Empresas

JESSICA – Apoio Europeu Conjunto para Investimentos Sustentáveis em Áreas Urbanas

MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário

MTE – Ministério do Trabalho e Emprego

OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

PAA – Programa de Aquisição de Alimentos

PDT – Partido Democrático Trabalhista

PIB – Produto Interno Bruto

PITCE – Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior

PMEs – Pequenas e Médias Empresas

PNMPO – Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado

PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

PSB – Partido Socialista Brasileiro

SEDETUR – Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo

STTRT – Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Timon

TIC – Tecnologia da Informação e Comunicações

Page 10: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 11

1.1 Apresentação do tema e sua relevância 11

1.2 Objetivos do trabalho 14

1.2.1 Objetivo Geral 14

1.2.2 Objetivos Específicos 15

1.3 Metodologia 15

2 REFERENCIAL TEÓRICO 18

2.1 O Crédito Público e o Financiamento da Produção 18

2.2. Produção agrícola no Brasil 20

2.3. Pequenas Empresas, Microempreendedorismo e Empreendedorismo Informal 23

3. RESULTADOS DA PESQUISA DE CAMPO 25

3.2. As políticas de microcrédito na França 25

3.2.1. O contexto estudado 25

3.2.2. O Modelo da Política Pública Delegativas 27

3.2.3. A percepção e o impacto do Modelo Delegativo pelos Atores Entrevistados 30

3.3. As políticas de microcrédito no Brasil 31

3.3.1. O Contexto estudado 31

3.3.2. O Projeto de Política Pública 39

3.3.3. A Percepção e o Impacto da Formulação da Política de Microcrédito em Timon 41

3.4. Análise comparada das duas experiências estudadas 43

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 47

5. REFERÊNCIAS 49

Page 11: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

11

1 INTRODUÇÃO

1.1 Apresentação do tema e sua relevância

O tema deste Trabalho de Conclusão de Curso é o crédito público, em especial o

Microcrédito Produtivo Orientado para microempreendedores, empreendedores informais e

agricultores familiares. Propõe-se como objetivo geral analisar a formulação e a

implementação de políticas públicas de microcrédito, visando à compreensão da interação

entre poder público e sociedade civil para alcançar resultados mais positivos na aplicação

destas políticas ao nível local.

A escolha de microempreendimentos, produtores informais e pequenos produtores

agrícolas, como público alvo para estudo neste TCC tem como justificativa a ênfase dada

pelas políticas públicas de microcrédito para tais tipos de público e a oportunidade de

realização de pesquisa de campo dentro dos projetos Ciência sem Fronteiras e Conexão Local,

pela autora. Este direcionamento será mais bem explicado na metodologia deste trabalho e

envolve o estudo de casos de interação em duas realidades distintas: a França e o Brasil. O

estudo da experiência francesa se refere a um modelo já implementado e direcionado para a

produção agrícola e pequenos empreendedores, que atuam no beneficiamento de produtos

agrícolas ou em outros mercados relacionados ao meio ambiente e à sustentabilidade

ambiental. Já o estudo brasileiro aborda um caso específico, que envolve a política pública

ainda em processo de formulação. Neste caso, a política tem seu direcionamento inicial

voltado para microempreendedores e empreendedores individuais (no formato de um projeto

piloto), mas com o planejamento de também atender a pequenos produtores agrícolas.

O conceito de microcrédito surgiu nas últimas décadas, e é definido pelo Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como, “[...] a concessão de

empréstimos de pequeno valor a microempreendedores formais e informais, normalmente sem

acesso ao sistema financeiro tradicional.” (BNDES, 2013, p.33). Conforme o exposto, o

microcrédito se torna, com frequência, uma alternativa de crédito para o público que, por

razões particulares, são excluídos de outras modalidades de financiamento. Essas razões

incluem questões como baixa renda, incapacidade de fornecer garantias, informalidade do

negócio ou, até mesmo, por não possuírem conta bancária em uma instituição financeira

tradicional.

Destaca-se, aqui, a modalidade do microcrédito produtivo orientado, que se

apresenta com grande frequência entre os programas e políticas públicas e os projetos sociais.

Page 12: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

12

Na modalidade de microcrédito produtivo, o crédito se destina a uma finalidade específica

(como microempreendimentos ou produção agrícola, por exemplo), sendo, comumente

destinado à compra de insumos ou de bens de capital para a produção. Já quando definido

como “orientado”, a modalidade supõe a existência de um agente de orientação, que, em

alguns casos, pode ser o próprio agente de crédito, que, além de avaliar a concessão do crédito,

acompanha a sua utilização pelo tomador, garantindo que o mesmo seja realizado. O papel do

agente de orientação pode, aqui, limitar-se à avaliação macro da concessão de crédito e do

plano de negócios ou do projeto apresentado ou pode, em outra vertente, abranger o nível

mínimo de detalhe, acompanhando com frequência o tomador e orientando-o sobre estratégias,

produtos (ou culturas, no caso da agricultura) e monitorando seu resultado financeiro. Em

alguns casos, o agente orientador alcança, inclusive, o nível de “semeador”, capaz de

impulsionar uma aproximação entre o tomador e seu mercado consumidor ou mesmo

potenciais parceiros.

O microcrédito produtivo orientado surge, portanto, como alternativa de política

pública para enfrentar a exclusão do sistema financeiro. A longo prazo, sua importância se

estende pela possível redução da desigualdade, aumento da renda e, consequentemente,

combate à pobreza. O estudo da formulação de políticas públicas de microcrédito se faz

necessário, portanto, para compreender suas formas mais efetivas e eficazes, trazendo lições

relevantes a longo prazo.

Neste sentido, a participação da sociedade civil representando atores interessados,

as organizações do terceiro setor e de origem comunitária têm um papel relevante no

desenvolvimento político e econômico das sociedades, atuando na construção de iniciativas

voltadas para o bem público. Geralmente, este tipo de organização aparece em contextos de

interação com o poder público. Em menor nível, essa interação pode ocorrer na

implementação da política, buscando facilitar o acesso ao público alvo. Em nível maior, tais

organizações conseguem interagir com o poder público desde o momento da formulação das

políticas públicas, reestruturando seu modelo e impactando seus resultados. No contexto do

microcrédito, essas organizações auxiliam na formulação de estratégias e no direcionamento

das ações. Em seu movimento, aceleram a tendência de mudança do cenário do microcrédito,

viabilizando o financiamento para micro e pequenos projetos, que buscam por apoiadores

econômicos nos mais diversos meios. Do lado do governo, no caso do Brasil, vem ocorrendo

o aumento da oferta de programas de crédito e financiamento e, adicionalmente, a necessidade

de viabilizar sua aplicação em realidades distintas.

Page 13: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

13

O financiamento de produção agrícola, por exemplo, envolve alternativas de

crédito que se originam de fontes públicas, de organização popular e ainda de fontes privadas,

como grandes bancos que vem se interessando pelo tema. A complexidade relacionada ao

financiamento da produção agrícola é crescente e apresenta novas variáveis que precisam ser

compreendidas para que as inovações e novas perspectivas representem soluções adequadas à

realidade brasileira inserida em um mercado global. Revelam-se, no cenário atual, novas

oportunidades de inserir pequenos produtores em cadeias de valor que gerem riqueza e

desenvolvimento social com compromisso com as questões ambientais. Tais oportunidades

precisam ser consideradas e podem trazer benefícios para que a agricultura se estruture de

forma planejada e eficaz. Considera-se que a interação entre políticas públicas, organizações

populares e organizações do terceiro setor, quando efetiva, é capaz de maximizar os impactos

positivos da ação governamental. Paralelamente, é possível mitigar ou reduzir riscos, como

demonstra o caso da Cooperativa Cresol, que será abordado mais adiante durante o presente

trabalho.

O presente trabalho de pesquisa busca também agregar experiências internacionais

que possam contribuir de forma comparativa aos programas desenvolvidos no Brasil. O

levantamento da realidade na França sobre um dos modelos de política pública de

microcrédito é de relevância para o campo de pesquisa por existirem casos de referência em

diversos tipos de políticas pública para a produção agrícola e para o desenvolvimento de

microempreendimentos no país. O financiamento de experiências de natureza tão distinta

requer o conhecimento de quais demandas são registradas no contexto atual brasileiro, e de

como soluções já desenvolvidas em outros países podem acrescentar parâmetros comparativos

de atenção às especificidades detectadas.

Compreender todos os aspectos envolvidos para a definição e análise de

programas de financiamento neste campo é de grande relevância, não somente para o Brasil,

mas também em âmbito global. Os interesses em expandir espaços de comercialização para os

pequenos produtores se integram dessa forma ao atendimento de necessidades globais de

produção de alimentos e a questões sociais relevantes em diversos países.

Já no campo do empreendedorismo individual e do microempreendedorismo, a

tendência percebida é relativa à crescente preocupação acerca de seu impacto para o

desenvolvimento econômico, incluindo as perspectivas de desdobramento, a longo prazo, das

mudanças econômicas geradas, fator especialmente articulado em países em desenvolvimento.

No Brasil, as políticas públicas relacionadas ao empreendedorismo são concentradas, ainda,

no estímulo ao desenvolvimento de micro e pequenas empresas, havendo sobreposição de

Page 14: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

14

programas entre as três instâncias de governo e, inclusive, de políticas com diferentes focos

estratégicos e setoriais. O mesmo acontece com a questão do financiamento, envolvendo

programas de financiamento do próprio Estado, de fundações públicas e outras autarquias e,

inclusive, linhas de crédito oferecidas por bancos públicos (SARFATI, 2013).

O Brasil tem programas inovadores de origem estatal em diversas linhas de

financiamento e também vem apresentando experiências importantes com crédito originado

de organização popular com base em associativismo e cooperativas. É necessário identificar

as diferentes demandas que as regiões brasileiras apresentam e analisar a adequação da

aplicação do crédito a estas demandas. As contribuições que as Instituições de Ensino,

Pesquisa e Extensão podem trazer para este campo são diversas e entende-se que os estudos

da Administração como campo de conhecimento são cruciais para entender as melhores

formas de gestão e de estratégia que atendam as necessidades dos agricultores e de cada

região específica.

1.2 Objetivos do trabalho

1.2.1 Objetivo Geral

Considerando o exposto, a presente pesquisa tem como objetivo analisar a

formulação e a implementação de políticas públicas de microcrédito, abrangendo a

compreensão da interação entre poder público e sociedade civil para alcançar resultados mais

positivos na aplicação destas políticas ao nível local. Como resultados pretendidos, buscou-se

trazer visibilidade para pontos importantes acerca do relacionamento entre o poder público e

órgãos representantes de comunidades locais e sociedade civil, bem como organizações do

terceiro setor, valorizando aquelas experiências reconhecidas por aumentar a entrega de

resultados e seu impacto por meio dessa articulação.

Para isto foi verificada a interação entre setor público e organismos representantes

da comunidade local na França e buscou-se observar pontos convergentes e divergentes com a

experiência brasileira estudada. Com isso, espera-se apontar resultados trazidos por essa

interação e apresentar lições para o aprimoramento da mesma para outros contextos

brasileiros, por meio de adaptação de práticas e criação de novas políticas públicas que se

façam necessárias e viáveis. Por fim, espera-se que a comparação entre modelos de

financiamento por microcrédito no Brasil e na França permita identificar lições sobre a

relação entre sociedade civil e programas da área pública orientados para a oferta de crédito,

Page 15: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

15

visando à compreensão e à disponibilização de informações acerca de modelos de interação

que produzam resultados positivos capazes de mitigar dificuldades recorrentes nos modelos

de atuação existentes.

1.2.2 Objetivos Específicos

1. Identificar formatos de interação entre políticas públicas de microcrédito e

organizações da sociedade civil (representantes de públicos interessados e do terceiro setor);

2. Analisar a capacidade destas interações em gerar impacto positivo para

iniciativas empreendedoras;

3. Compreender de que modo essas interações mitigam possíveis dificuldades

enfrentadas pelas políticas públicas atualmente;

4. Estabelecer uma base comparativa entre o modelo estudado na França e o caso

brasileiro;

5. Disponibilizar informações sobre as relações estudadas para permitir futuras

análises de consequências resultantes dessas relações.

1.3 Metodologia

Para este trabalho, realizou-se pesquisa de abordagem qualitativa (CRESWELL,

2010) envolvendo a análise de dados secundários por meio de estudo bibliográfico e análise

documental e, adicionalmente, pesquisa qualitativa primária, com entrevistas de atores

relevantes para o contexto, como cidadãos, professores, autoridades locais, presidentes de

organizações de origem popular, gestores de organizações do terceiro setor, formuladores de

políticas públicas e outros funcionários públicos. A vantagem de se realizar uma pesquisa por

meio da observação do contexto local está na maior possibilidade de compreender influências

e forças, uma vez que se tem acesso às diferentes impressões de cada um dos atores sobre o

tema tratado (SPINK, 2008).

Para o referencial teórico foram buscados autores que tratam deste tema com uma

visão tanto da formulação, como da implementação de políticas públicas de microcrocrédito.

Desta forma, pode-se compreender avanços e desafios colocados para a efetividade destas.

Durante a análise de dados secundários, buscou-se, em primeiro lugar, pesquisas quantitativas

e qualitativas que pudessem contribuir com uma compreensão mais abrangente sobre o

Page 16: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

16

contexto dos ambientes estudados. Complementarmente, utilizou-se bibliografia acerca de

casos franceses e brasileiros de políticas públicas de microcrédito, envolvendo a interação

entre poder público e organizações da sociedade civil ou do terceiro setor.

A primeira etapa de pesquisa in loco realizou-se na França, como parte do

programa Ciência sem Fronteiras, realizado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (CNPq), sob financiamento do Governo Federal. Esta etapa realizou-

se durante o primeiro semestre de 2012, e envolveu o acompanhamento de professores

franceses, com o objetivo de compreender o modelo francês de políticas públicas, no âmbito

do microcrédito. A etapa envolveu participação em cursos e eventos relacionados, como a

Sustainable Business Conference (Conferência de Negócios Sustentáveis) 2012, sediada no

Campus da Hautes Études Commerciales de Paris (HEC Paris), onde foi possível obter uma

compreensão abrangente dos principais temas tratados em relação à sustentabilidade e

desenvolvimento econômico, e abordar a visão dos atores sobre o microcrédito.

Complementarmente, foram realizadas entrevistas com gestores de organizações como o

projeto de Finanças Solidárias Finansol2 e de uma das organizações populares do cluster de

Rhônes-Alpes, uma das regiões francesas, e oficiais do Parlamento e da Comissão da União

Europeia, em Bruxelas (Bélgica), visando à maior compreensão do papel da União Europeia

no contexto estudado. Para vivência e conhecimento do contexto agrário francês, realizou-se

visita a agricultores e produtores da região de Reims e Champagne, que permitiu a coleta de

informações acerca da característica de atuação coletiva dos agricultores franceses. Essa etapa

visou à compreensão do contexto político e social local, formando assim o corpus para análise

de boas práticas nas políticas públicas (BAUER; AARTS, 2007). Ao longo da pesquisa, para

obter uma maior compreensão do modelo francês, se abordou o modelo de política pública de

microcrédito no país, preterindo o aprofundamento em um caso exclusivo, mas realizando o

contato com diversos atores e casos relevantes. O resultado da participação no programa

Ciência sem Fronteira foi apenas um relatório técnica, indicando os atores entrevistados e

relatos sobre disciplinas estudadas durante a estadia na França. Desta forma, em acordo com a

orientadora, decidiu-se elaborar a análise aprofundada do estudo, para utilização no presente

Trabalho de Conclusão de Curso.

O segundo momento da pesquisa de campo realizou-se em Julho de 2013, no

Brasil, por meio da observação do processo de formulação de uma política pública municipal

2Finansol é uma associação responsável por campanhas de comunicação, conscientização e promoção de

produtos da econômica solidária – investimentos que, além de retorno financeiro, geram retorno social,

comoprojetos de habitação, emprego, energia renovável, sustentabilidade e agricultura. Além de produzir um

selo de certificação pela associação, o Finansol também é um coletivo de atores do setor. (FINANSOL, 2013)

Page 17: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

17

de microcrédito no município de Timon, no Maranhão. Nesse contexto, foram realizadas

entrevistas semiestruturadas e observações não participantes com atores (FLICK, 2009)

relevantes para os casos estudados, como formuladores e implementadores das políticas

públicas e gestores de organizações populares, além de líderes comunitários, autoridades

religiosas, servidores públicos e a comunidade local, que seria, potencialmente, beneficiada

pela implementação da política. A pesquisa em campo no Brasil envolveu também, além de

entrevistas, visitas a comunidades rurais e participação em reuniões entre gestores públicos do

município e reuniões entre membros de organizações da sociedade civil.

Assim, durante a pesquisa foram catalogados informações e materiais sobre

relações entre programas públicos e organizações populares ou do terceiro setor, em ações

orientadas ao microcrédito produtivo orientado, buscando, exclusivamente, iniciativas que,

por meio de seu modelo de atuação, almejem contribuir para o atendimento das necessidades

financeiras de empreendimentos produtivos. A partir dos dois primeiros momentos de

pesquisa, a terceira etapa constituiu-se, então, da análise das observações e materiais

coletados, a fim de elaborar conclusões relevantes acerca da formulação e implementação dos

modelos de políticas de microcrédito.

Page 18: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

18

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Nesta etapa, são abordados conceitos relevantes sobre o crédito público, a

produção agrícola de pequeno porte no Brasil e o empreendedorismo, abrangendo os

microempreendedores, as pequenas e médias empresas e o empreendedorismo informal. Com

esta análise, pretende-se trazer contribuições do debate teórico sobre as políticas de

microcrédito e também sobre os dois públicos-alvo principais destas políticas, que são foco de

análise neste trabalho. O referencial teórico inclui ainda pesquisas de outros autores que

estudaram a interação entre poder público e sociedade civil e seus resultados, além de dados

secundários sobre a eficácia de políticas públicas de crédito. O objetivo é fornecer uma base

conceitual para a compreensão do tema e a análise dos casos abordados a seguir.

2.1 O Crédito Público e o Financiamento da Produção

Por parte do Governo Federal brasileiro, foi criado, em 2005, o Programa

Nacional do Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), que visava à aproximação entre

instituições financeiras e de microcrédito, vinculando outros serviços complementares que

facilitassem o acesso a informações e orientação direcionada para consultoria e

acompanhamento dos pequenos produtores familiares. Este programa definiu o marco legal

para o microcrédito produtivo, incluindo a regulamentação para o repasse de recursos dos

bancos para instituições de microcrédito. O programa prevê o atendimento das necessidades

financeiras de pessoas físicas e jurídicas empreendedoras de atividades produtivas de pequeno

porte, e inova na proposição de uma metodologia baseada no relacionamento direto com os

empreendedores no local onde é executada a atividade econômica. Em 2010 este programa foi

revisado, na busca pela ampliação do número de agentes financeiros que atuam com a

população de baixa renda, com fortalecimento da relação com os bancos comunitários, que

serão comentados mais à frente neste texto. Atualmente, mais da metade (57,27%) da carteira

ativa de microcrédito é fornecida por Bancos de Desenvolvimento e outros 12,12%, por

Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), segundo o Ministério do

Trabalho e Emprego (MTE, 2013). Já as cooperativas de crédito representam 4,34% do valor

total da carteira ativa.

A partir de meados da década de 90, a operacionalização de linhas de crédito, o

surgimento de novos espaços produtivos e a criação de conhecimento e tecnologia por parte

de Universidades e grupos organizados de agricultores, vêm, junto com legislação específica e

Page 19: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

19

medidas tomadas pelo Governo Federal, concretizando oportunidades de geração de riqueza e

trazendo à luz o debate da agricultura familiar. No contexto brasileiro registra-se a existência

de um número crescente de bancos comunitários e novas intervenções governamentais que

ampliam a oferta de soluções, mas ampliam também a complexidade dos modelos de

financiamento e crédito para o agronegócio familiar sustentável. Os Bancos Comunitários são

uma das principais formas de microcrédito reconhecidas no país. Segundo o MTE, Bancos

Comunitários são projetos de apoio a economias populares de municípios de baixo IDH, e

incentivam a geração de trabalho e renda, promovendo a economia solidária. Desde 2004 o

MTE apoia tais projetos e incentiva o alinhamento junto a bancos públicos, debatendo

alternativas de crédito para a economia solidária. Segundo a Rede Brasileira de Bancos

Comunitários, atualmente são 103 bancos comunitários no Brasil, dentre os quais se destaca o

Banco Palmas, considerado referência no país, e que estruturou o hoje denominado Instituto

Palmas, cujo objetivo é contribuir com a gestão do conhecimento das boas práticas entre tais

bancos. Poucos estudos recentes se voltaram à análise dos setores aqui descritos, havendo

ainda um gap de informação relativa a seus impactos sociais e sua relação com as políticas

públicas e governamentais.

Dentro das linhas de crédito do Plano Safra, destacam-se as linhas ECO e

Agroecologia, principais beneficiadas com os investimentos em assistência técnica, que de

2003 para 2010 aumentaram de 46 milhões de reais para 626 milhões de reais. Segundo o

Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), desde a sua criação, a maior conquista do

programa foi o aumento da assistência para dois milhões de famílias, abrangendo todo o país.

Além disso, o programa apresenta a menor taxa de juros para o crédito rural e a inclusão de

famílias de baixa renda e distribuição de custos e riscos entre o sistema financeiro e o governo

federal. No ano de 2006, 781 mil estabelecimentos familiares praticaram a captação de

recursos, sendo o custeio a principal finalidade (405 mil estabelecimentos), seguido da

finalidade de investimento (344 mil estabelecimentos), além da comercialização (8 mil

estabelecimentos) e manutenção do estabelecimento (74 mil estabelecimentos). Por outro

lado, o Censo Agropecuário 2006 registrou mais de 3,5 milhões de estabelecimentos da

agricultura familiar que não obtiveram financiamento, especialmente porque “não precisaram”

ou por “medo de contrair dívidas” (MDA, 2009).

A experiência entre o Sistema Cresol de Cooperativas de Crédito Rural e o

Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar demonstra que uma

organização de microfinanças pode fundamentar sua atuação em sua relação com políticas

governamentais relacionadas, interagindo e contribuindo para a produção agrícola sustentável

Page 20: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

20

(ABRAMOVAY e JUNQUEIRA, 2004). Desde a prestação de serviços financeiros à

intermediação de transferência de renda ou subsídios, essas articulações entre os diferentes

setores da economia são capazes de fortalecer ambas as instituições, fortalecendo, inclusive,

possibilidades para a expansão da organização não governamental sem comprometer sua

sustentabilidade financeira.

Uma das poucas publicações que contrariam tal afirmação, trazendo uma análise

comparada entre beneficiários e não beneficiários, é o estudo do Centro de Políticas Sociais

publicado em 2008, que comparou indivíduos semelhantes de dois grupos: clientes e não

clientes do Crediamigo. No âmbito do microcrédito para empreendedorismo, o Crediamigo,

oferecido pelo Banco do Nordeste do Brasil (BNB), é um dos programas mais conhecidos do

país, recebendo, inclusive, reconhecimentos internacionais. O que os principais resultados se

revelaram quanto à probabilidade de mobilidade social: A probabilidade de ascensão social

para o cliente do Crediamigo é de 54,72%, 36,92% e 9,95%, dentre as classes E, D e C,

respectivamente. Já para o grupo controle, de microempresários de Recife e Salvador, a

probabilidade foi de 38,82%, 34,03 e 7,55%. Tais resultados reforçam a importância do

estudo das políticas de microcrédito para o público empreendedor, assim como o estudo do

seu impacto e de sua operacionalização.

2.2.Produção agrícola no Brasil

Criar um modelo de desenvolvimento agrícola que propicie formas sustentáveis

de produção e amplie a representação do Brasil no contexto internacional é um dos desafios

postos na agenda para o planejamento econômico do país. Requer desenvolver propostas de

modelos que equilibrem a geração de riqueza com outros objetivos, inclusive a conservação

ambiental. A questão, no entanto, não é tão simples, e apresenta uma complexidade inerente à

multiplicidade de interesses em jogo. Envolve a mudança de padrões sedimentados por

projetos de geração de riqueza no meio agrícola, como os disseminados pelo modelo de

“modernização da agricultura” que é uma referência ao processo mais intensivo de

desenvolvimento capitalista do meio rural ocorrido no Brasil no período pós 1964 (BORGES,

2012). As transformações pertinentes a esse padrão de crescimento econômico no meio rural

foram fortemente impulsionadas pelo Estado brasileiro, mediante uma série de políticas

setoriais e instrumentos específicos (crédito, seguro agrícola, assistência técnica, pesquisa

pública, investimentos em infraestrutura, subsídios ao preço dos combustíveis), que tiveram

como objetivo principal a adequação da estrutura de produção agrícola nacional ao

Page 21: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

21

crescimento econômico planejado pelo governo militar. Entre os efeitos sociais do modelo de

modernização agrícola utilizado no Brasil até aproximadamente final a década de 1980,

citam-se: a redução da oferta de empregos agrícolas e o consequente êxodo rural, o aumento

do trabalho temporário, a intensificação da pobreza rural, o aumento da concentração de terras

no país, entre outros (BEDUSCHI FILHO e ABRAMOVAY, 2004).

Na década de 1990, a diminuição do papel do Estado “na regulação da competição

do campo, bem como a reestruturação do setor agropecuário em direção às normas de

mercado” levaram a “uma nova rodada de modernização da estrutura produtiva desse setor,

visando adequá-lo rapidamente ao contexto da reinserção econômica do Brasil no cenário

internacional” (POCHMANN, 2008, p. 149). Como consequência desse processo ocorreu

uma difusão de novos métodos de gestão voltados a parâmetros de competitividade, maior

mecanização e uso de insumos químicos. Os investimentos ocorreram com capital

internacional e se obteve uma intensificação do agronegócio, com aumento de produtividade

em detrimento do emprego no meio rural, fator que abre espaço para o produtor familiar e

remete a discussões sobre a caracterização deste como categoria e a especificidade de sua

condição (BORGES, 2012).

Um dado significativo é a mudança na composição das ocupações, ocorrida no

final da década de 1980 em diante, com o crescimento da “participação de moradores na área

rural que exercem atividades não-agrícolas” (POCHMANN, 2008:154). Essa mudança

sinaliza um perfil que tende a adquirir a produção agrícola mais voltada a mercados

específicos e segmentados e a uma nova percepção do meio rural pela sociedade, cada vez

menos como um espaço estritamente produtivo. Suas funções de preservação ambiental, de

criação de um quadro favorável ao lazer, ao contato com a natureza e com um estilo de vida

diferente do característico das cidades são cada vez mais valorizadas. “Não há qualquer razão

técnica que afaste em tese os agricultores familiares do imenso potencial representado pelos

mercados de qualidade e pelas novas funções - preservação ambiental e lazer - que o meio

rural preenche para a sociedade.” (ABRAMOVAY, 1996:10).

O Ministério do Desenvolvimento Agrário (2009) divulgou os resultados do

Censo Agropecuário 2006, o primeiro censo a contar com estatísticas oficiais sobre a

agricultura familiar. Este censo permitiu visualizar, entre outras questões, a concentrada

estrutura agrária brasileira, na qual a agricultura familiar representa 84,4% de

estabelecimentos, mas apenas 24,3% da área total. De acordo com o censo, a área média de

estabelecimentos familiares era de 18,37 ha, enquanto a dos não familiares era de 309,18 ha.

O documento divulgado pelo MDA explica também que o número total de pessoas ocupadas

Page 22: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

22

pela agricultura familiar, 12,3 milhões de pessoas, é duas vezes maior que o número de

ocupações geradas pela construção civil. Em relação a número de propriedades por região, as

regiões Nordeste, Sul e Sudeste detêm, respectivamente, 50%, 19% e 16% dos

estabelecimentos familiares do país. Já em relação à área, se destacam as regiões Nordeste,

Norte, Sudeste e Sul, com 35%, 21%, 16% e 16%, respectivamente. Segundo o censo, a área

com matas, florestas ou sistemas agroflorestais ocupavam 24% das terras, enquanto as

pastagens ocupavam 45% e as lavouras representavam 22% do total de 80,25 milhões de

hectares. Apesar de pequena área destinada a lavouras, a agricultura familiar responde por 70%

dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros, representando 10% do Produto Interno

Bruto do País. O Censo Agropecuário 2006 também revelou que a agricultura familiar é 89%

mais produtiva que a agricultura patronal, destacando a renda de R$667,00 da agricultura

familiar, contra R$358,00 da agricultura patronal. A partir de tais dados, constata-se a grande

representatividade da agricultura familiar para a geração de riqueza e renda no país, assim

como para o abastecimento de alimentos (Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2009).

O agronegócio familiar representa, nesse contexto, um caminho relevante para a

estruturação de práticas sustentáveis no âmbito social, econômico, ambiental e ético.

Considerando-se os desafios enfrentados por esse público, o fator financeiro destaca-se,

principalmente quando se considera a impossibilidade de competição por mercado com o

agronegócio de maior escala e pela resposta adequada a uma produção contínua que atenda as

prerrogativas ambientais. Esse cenário implica, então, na demanda de crédito orientado para o

atendimento das necessidades específicas dos pequenos produtores (MDA, 2009).

No Brasil, no âmbito do microcrédito para a agricultura familiar, as principais

iniciativas estão relacionadas ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura

Familiar), ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que liga a oferta de crédito ao

acesso ao mercado, e ao Plano Safra. Ambos completaram dez anos em 2013. Segundo o site

da CONAB, as ações do PAA resultaram em um aumento de 130% na renda média das

famílias beneficiadas, que passou de R$1.972,41 para R$4.553,95 de 2003 para 2012. Outros

resultados do Pronaf são revelados também pela Agência Carta Maior (2012): nos últimos dez

anos, o segmento da agricultura familiar cresceu 52%, sendo que cerca de 3,7 milhões de

pessoas ascenderam à classe média. Segundo o Anuário Estatístico do Crédito Rural (2013),

77,86% dos contratos de crédito rural fornecido a produtores e cooperativas é oferecido por

bancos federais. Já as cooperativas de crédito representam 12,34%. Em valores, os dois tipos

de instituição representam 54,15% e 9,85% do total do país, respectivamente.

Page 23: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

23

2.3.Pequenas Empresas, Microempreendedorismo e Empreendedorismo Informal

Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (2013),

Microempreendedor Individual (MEI) é a pessoa que trabalha por conta

própria e que se legaliza como pequeno empresário. Para ser um

microempreendedor individual, é necessário faturar no máximo até R$

60.000,00 por ano e não ter participação em outra empresa como sócio ou

titular. O MEI também pode ter um empregado contratado que receba o

salário mínimo ou o piso da categoria.

No Brasil, o termo se popularizou a partir da Lei Complementar 128 de 2008, que

formalizou a figura jurídica do Microempreendedor individual.

A relação entre os níveis de empreendedorismo de um país e seu desenvolvimento

econômico tem sido objeto frequente de estudos. Muito se discute sobre o impacto do

empreendedorismo sobre indicadores como geração de empregos, aumento da produtividade e

geração de riqueza em uma nação. Estudos mais recentes, contudo, discutem a questão como

um ciclo virtuoso: o empreendedorismo como fomentador do desenvolvimento econômico e o

desenvolvimento econômico como fomentador do empreendedorismo, ao propiciar um

ambiente mais favorável ao mesmo. (CARREE e THURIK, 2005) Dados do Instituto

Empreender Endeavor (2005, prefácio), “[...] as pequenas empresas geram grande parte dos

postos de trabalho no nosso país, mas têm um impacto social pouco duradouro e significativo.

[...] 60% dos novos empreendimentos não passa dos cinco anos de vida.”.

As políticas públicas para o pequeno e o micro empreendedorismo no Brasil são

de uma variedade extensa, mas segundo Sarfati (2013), ocorrem seguindo dois grandes eixos

principais: o primeiro, no âmbito regulatório, e o segundo na instituição da Política Industrial,

Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), que passou a priorizar pequenas e médias

empresas (PMEs) como alvo de ações de políticas públicas. Ainda segundo o autor, há,

contudo, gaps a serem preenchidos na coordenação das políticas: novas mudanças no

ambiente regulatório, fomento à cultura empreendedora e, finalmente, a coordenação de

políticas de financiamento, hoje ainda praticadas de forma sobreposta pelos mais diversos

órgãos públicos.

Em seu trabalho de pesquisa, Andreassi (2004), que analisou 88 questionários

respondidos por empreendedores tomadores de crédito do Bancri, um banco de crédito

popular intermunicipal de Santa Catarina, concluiu que “o microcrédito recebido teve um

impacto positivo no negócio do empreendedor, dado que 100% dos entrevistados afirmaram

Page 24: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

24

ter havido um incremento nas vendas após o recebimento do microcrédito. Grande parte

[96,6%] do crédito recebido é destinada ao financiamento do capital de giro da empresa.”.

Nesta mesma pesquisa, 88,1% declaram que o crédito possibilizou a expansão dos negócios.

Acerca da destinação do crédito, 62,3% afirmaram que o crédito possibilitou o aumento no

estoque de matéria prima e 61,3% a compra de ativos. A contratação de mais trabalhadores foi

mencionada por 43,8% dos empreendedores.

Neri (2008) estudou o caso do Crediamigo, programa do BNB, para entender os

impactos do microcrédito para autônomos e microempresários. Dentre os resultados,

percebeu-se o aumento real de 30,7% no lucro operacional (equivalente à renda do trabalho,

para autônomos). Já o lucro bruto aumentou 35,1%. Além disso, 60,8% dos beneficiários que

se situavam abaixo da linha da pobreza ascenderam, saindo dessa condição. No mesmo estudo,

o autor aborda o potencial do Nordeste para o microcrédito: com mais de 4 milhões de

profissionais autônomos ou microempresários empregadores, a região se destaca por seu

crescimento do acesso ao crédito produtivo: de 3,97% para 6,27%, taxa de crescimento

superior a outras cidades do país.

A oferta de microcrédito à atividade empreendedora e ao empreendedorismo

individual é capaz, portanto, de trazer impactos relevantes para sua produtividade, sua

sustentabilidade a longo prazo e, inclusive, sua capacidade de expansão. Por consequência,

esse estímulo resulta em consequências positivas para o desenvolvimento da economia, por

meio de geração de empregos e renda, aumento da produção interna e redução da

desigualdade. O estudo do microcrédito como estímulo ao micro e pequeno empreendedor e

mesmo ao empreendedor informal vem, nesse sentido, potencializar as oportunidades de

crescimento e revelar novas alternativas de métodos e modelos.

Para a aplicação de políticas públicas, as organizações da sociedade civil e do

terceiro setor podem funcionar como elemento facilitador. Devido à sua grande compreensão

da realidade local, sua maior proximidade de atores locais e, inclusive, ao seu nível de

influência, tais organizações podem se tornar elemento relevante para todas as etapas da

política pública: da formulação à avaliação dos resultados. Quando se fala do microcrédito, e,

especialmente, no âmbito dos bancos comunitários, essas organizações já estruturadas podem

se tornar fundamentais, pela formação do senso de coletivo.

Page 25: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

25

3. RESULTADOS DA PESQUISA DE CAMPO

Nesta etapa serão apresentados os resultados de pesquisa, seguindo primeiramente

uma linha descritiva acerca da realidade local, do contexto investigado e do processo de

implementação (na experiência francesa) ou do processo de formulação (no caso brasileiro)

da política pública.

Os casos de estudo franceses envolvem a organização de clusters e redes de

pequenos produtores com as mais diversas finalidades produtivas e histórico de programas

integrados para o financiamento da produção agrícola sustentável. Dentro do quadro de crise

econômica atual os encaminhamentos dados a tais questões e o desafio de manter a

continuidade das operações e programas trazem novas contribuições ao quadro. O país

destaca-se também por políticas públicas delegativas, envolvendo intensamente os níveis

locais, inclusive por meio da participação de organizações do terceiro setor ou de

organizações da sociedade civil.

O caso brasileiro, como se verá adiante, envolve a implementação de projetos-

piloto em duas realidades distintas. Por essa razão, a etapa descritiva buscará trazer

observações mais detalhadas dos dois públicos beneficiários. Após essa descrição, será

realizada a análise, apresentando uma comparação entre os dois casos.

3.2.As políticas de microcrédito na França

3.2.1. O contexto estudado

O contexto político francês é constituído, historicamente, por uma forte presença

do Estado, como “protetor” da sociedade, tendo os servidores o importante papel de garantir

que a implementação atenda às necessidades de todos. Apesar de um regime

semipresidencialista, o papel do presidente é fortalecido, sendo esse instituído de um mandato

de cinco anos. No Estado francês, os assuntos de defesa e política externa são tratados pelo

presidente, enquanto o primeiro ministro, nomeado pelo presidente, foca a política interna.

Para compreender o serviço público francês, considera-se dois grupos principais: os

servidores da linha de frente e o alto escalão, sendo este último formando nas Grandes Écoles

e com posterior experiência nos “Grands Córps”, geralmente compondo altos escalões de

ministérios ou conselhos, além de corpos diplomáticos ou de Prefeitos, por exemplo.

Page 26: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

26

Politicamente, a França se divide em 26 regiões e 100 departamentos, sendo que

cada um destes possui um conselho eleito e um representante do poder executivo (prefeito).

Há, finalmente, a subdivisão em 329 distritos (arrondissements), com seus subprefeitos

indicados por Paris, em 3879 distritos eleitorais (cantons) e, finalmente, em 36782 comunas

(municípios), cada uma com um conselho eleito e um prefeito. Das regiões, quatro estão

localizadas em outros continentes, como a Guiana Francesa, por exemplo. Cada uma dessas

divisões abrange um nível de responsabilidade, conforme sua extensão territorial. As regiões,

por exemplo, atuam sobre o desenvolvimento econômico e social, enquanto as comunas têm

atuação sobre assuntos mais pontuais de seu território. E é a nível local que se articulam

adaptações das decisões do Estado francês, para uma implementação mais adequada à

realidade.

Finalmente, quando se fala em Estado francês, um dos pontos de maior impacto é

a influência da União Europeia. A investigação de campo da França ocorreu durante o

primeiro semestre de 2012, momento em que a União Europeia enfrentava,

concomitantemente aos efeitos da crise econômica de 2008, o problema dos excedentes

agrícolas (discutindo, inclusive, o sistema de cotas), que resultou em uma queda dos preços

dos produtos. Na ocasião, ocorriam também as eleições presidenciais. E o que se viu foi um

Estado que, ainda em recuperação econômica, tentava atender às principais dificuldades

enfrentadas pela população, como o desemprego e a recente migração para o campo. A

combinação dessas variáveis macroeconômicas foi uma redução do financiamento público,

principalmente no âmbito da produção de produtos primários. O bloco econômico desdobrava

a PAC3, ou Política Agrícola Comum. Seguindo as diretrizes do bloco econômico, com

reduzida autonomia para tomar decisões sobre o volume de produção, o Estado francês passou

a mudar suas políticas de crédito para o agricultor, incentivando-o a diminuir sua produção e

buscar novas fontes de receita. Tal movimento influenciou a agricultura francesa, alternando

de produtos alimentícios, como vinho, cereais e suínos, para a revitalização do meio rural, por

meio do incentivo à prática de novas atividades econômicas, como o beneficiamento de

commodities, o turismo rural ou mesmo campos mais distantes, como a produção de energia.

3 Política que visava ao aumento do valor agregado e ao desenvolvimento de novas atividades econômicas pelos

agricultores A ideia principal era manter o agricultor na propriedade rural, mas movê-lo para além da produção

de produtos primários.

Page 27: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

27

3.2.2. O Modelo da Política Pública Delegativas

Por meio de análise documental, conversas e entrevistas semiestruturadas, o que

se buscou compreender, em primeiro lugar, foi o modelo de implementação das políticas

públicas de microcrédito do Estado francês. A PAC, por exemplo, implicava na oferta de

crédito aos produtores rurais que se dispusessem a direcionar seus esforços para o

beneficiamento de produtos primários, mais do que à simples comercialização de

commodities.

Desde meados da década de 90 o Estado francês vem se baseando em uma

metodologia de Desenvolvimento Local Orientado à Comunidade (DLOC) que, conforme

informativo da própria Comissão Europeia (2013a), tem como objetivos principais: 1)

incentivar as comunidades locais a desenvolver abordagens integradas participativas; 2) gerar

capacidade comunitária e incentivar a inovação; 3) promover a propriedade comunitária; e 4)

apoiar a governança multinível. Este último objetivo é explicado, no mesmo informativo,

como “[abrir] caminho à total participação das comunidades locais no desenvolvimento da

implementação de objetivos da UE em todas as áreas”. Essa descrição vem a introduzir o

modelo apresentado posteriormente como “Política Pública Delegativa” ou “Finanças

Delegativas”, por um dos professores entrevistados, do Instituto de Estudos Políticos de Paris

(Science Po Paris).

A Comissão Europeia se reúne com os representantes de seus países membros, e

as negociações entre cada governo e a Comissão resultam no desdobramento da estratégia

europeia em programas públicos nacionais, coesos com a estratégia do bloco e capazes de

atingir os objetivos do mesmo. A essência da política pública delegativa está no

desdobramento das reponsabilidades e da tomada de decisão em diversas instâncias, do

Estado às comunas. O Estado francês, ao adotar uma estratégia macro ou implementar um

programa, o desdobra para suas regiões, que, por sua vez, indicam os departamentos em que o

DLOC será aplicado. Finalmente, são indicadas as comunas e os programas que serão

beneficiados. E é a nível local que se definem os critérios de seleção para beneficiários e as

estratégias de implementação do programa. Uma estratégia de desenvolvimento que parte da

instância maior de governo alcança a qualidade, então, de estratégia de desenvolvimento local.

Na prática, é como se a instância maior de governo inferisse apenas sobre as diretrizes gerais,

permitindo uma certa ‘margem de manobra’ para abordagens locais. Para os fundos

estruturais, por exemplo, cada Prefeito Regional age como Autoridade Administrativa dos

programas. A exceção é para a região de Alsace, onde o Conselho Regional atua como

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28

Autoridade Administrativa (COMISSÃO EUROPEIA, 2007). Assim, cada instância para a

qual o programa é desdobrado possui capacidade de inferir sobre as melhores condições de

implementação, o melhor público beneficiário e, em alguns casos, até os perfis de atividades

mais adequados à região ou à categoria.

Nas áreas em que os Estados-Membros indiquem que o DLOC pode ser

utilizado, tanto estes como as Autoridades Locais terão de se envolver em

atividades de desenvolvimento de capacidades para garantir que as

comunidades locais, em especial as que se encontram em áreas vulneráveis

com capacidade limitada, gozem de total participação. Isto pode ser

alcançado através da criação de grupos de ação local e da formulação de

estratégias viáveis. Numa fase inicial, os potenciais grupos de ação local

terão de encetar diálogo com as Autoridades de Gestão competentes para

garantir que as suas necessidades e preocupações são conhecidas e que

podem ser contempladas na concessão dos programas. (COMISSÃO

EUROPEIA, 2013)

Segundo esse modelo, os Estados-Membros e a União Europeia dividem sua

responsabilidade, sendo a Comissão Europeia responsável pela definição das diretrizes dos

programas e das linhas de avaliação, além do controle da execução orçamentária. Os Estados-

Membros e suas instâncias inferiores se tornam responsáveis pelas parcerias locais e regionais,

além da seleção dos projetos apoiados. Um dos fundos envolvidos no programa de 2007 a

2013 foi o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (no inglês, ERDF), que atendeu, ao

todo, 31 programas operacionais. No período, três instrumentos foram criados para estreitar as

relações dos Estados-Membros com instituições financeiras como o Banco Europeu de

Investimento: Assistência Conjunta para o Apoio a Projetos nas Regiões Europeias, Recursos

Europeus Conjuntos para Micro e Médias Empresas e Apoio Europeu Conjunto para

Investimentos Sustentáveis em Áreas Urbanas (do inglês, denominados de JASPERS,

JEREMIE e JESSICA, respectivamente). A promoção do empreendedorismo recebeu cerca de

10% dos recursos da Comunidade Europeia (aproximadamente 1,4 bilhões de Euros), e três

regiões francesas incluíram o JEREMIE4 em seus programas. Conforme comunicação da

Comissão Europeia (2007), o país desenvolveu, na época, quatro programas multi-regionais,

na intenção de explorar a possiblidade de definir estratégias e prioridades relacionadas ao

território, ultrapassando fronteiras político-administrativas e de elaborar propostas para

questões referentes ao território, como bacias hidrográficas, por exemplo. Ainda em 2007, a

4 Através do JEREMIE, os Estados-Membros da União Européia podem utilizar (na instância nacional ou

regional), parte dos recursos dos fundos estruturais da Comissão Européia para financiar PMEs. Por ser flexível,

o programa prevê o uso de diferentes maneiras, que vão além do simples subsídio, como garantias, microcrédito,

seguro de crédito e fundos de transferência de tecnologia. O funcionamento de fundo permite que, com as

amortizações, o capital seja re-investido.

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29

Comissão Europeia apresentou o Grupamento Europeu de Cooperação Territorial, que

forneceu a base jurídica para as cooperações territoriais, por meio de convenções entre

autoridades das diversas instâncias e territórios, sendo um incentivo ao surgimento de redes,

estabelecimento de cooperações e, inclusive, parcerias entre o poder público e organizações

do segundo e terceiro setor.

Na apresentação dos Resultados das Negociações para a Política de Coesão 2007-

2013, a Comissão Europeia (2007, tradução própria) argumenta:

Os Prefeitos Regionais também organizaram a parceria regional para

preparação dos programas 2007-13. As autoridades públicas, atores

socioeconômicos e representantes de associações relevantes e organizações

financeiras foram convidados a participar. Uma melhoria comparada aos

períodos anteriores de formulação de programas foi a ênfase dada à

importância de associar empresas e seus representantes na preparação dos

tópicos relacionados diretamente a eles, como Inovação, Pesquisa,

Tecnologia da Informação e Comunicações (TIC), apoio a PMEs, etc.

Algumas regiões organizaram grupos de trabalho bem sucedidos,

envolvendo uma ampla seleção de parceiros do setor público e privado no

desenvolvimento das prioridades do programa.5

Durante o cascateamento das políticas públicas a nível local, nas comunas, além

de projetos específicos, outros atores podem pertencer ao grupo de beneficiários dos fundos

europeus. Tais atores são as organizações da sociedade civil e as organizações do terceiro

setor. Surgem então as cooperativas de crédito e as organizações coletivas. Um exemplo

estudado foi o cluster da região de Rhones Alpes, por meio de entrevista com Nicolas

Bertrand, Diretor de Desenvolvimento e Ações Internacionais. O cluster atua no apoio a micro

e pequenos empreendimentos de beneficiamento de produtos primários, produções orgânicas,

energia, tecnologia e outros mercados relacionados à sustentabilidade. A organização coletiva

recebe o financiamento dos fundos europeus, caracterizando o apoio financeiro regional, e

então se organiza para orientar mais de 180 MPEs participantes, analisando tendências de

consumo e gaps da oferta e organizando feiras e eventos para a promoção de seus membros.

Seu foco é a capacitação e o acesso à comercialização (inclusive para exportação), e no

âmbito da agricultura atendem àqueles que desejam deixar de ser simples produtores.

Segundo Bertrand, são mais de 2600 agricultores, que iniciam seus próprios empreendimentos,

5 “The Regional Prefects also organized the regional partnership for preparation of the 2007-13 programmes.

The public authorities, socio-economic actors, and representatives of relevant associations

and financing organisations were invited to participate. An improvement compared to the previous programming

period was the emphasis given to the importance of associating enterprises and their representatives in preparing

topics that relate to them directly (innovation, research, ICT, SME support, etc). Some regions organized

successful thematic working groups, involving a wide selection of public and private partners to develop

programme priorities” (COMISSÃO EUROPEIA, 2007).

Page 30: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

30

abrangendo diferentes modelos de negócio, como linhas de cosméticos orgânicos. Até 2012, o

cluster havia recebido mais de 900 mil Euros de auxílio financeiro das regiões, diretamente

repassados às empresas participantes.

3.2.3. A percepção e o impacto do Modelo Delegativo pelos Atores Entrevistados

O modelo delegativo sugere, então, uma releitura ao modelo tradicional de

implementação de políticas públicas: as organizações coletivas se tornam, a nível local,

cogestoras da política ou do programa, ganhando importância política ao adquirir o direito à

tomada de decisão sobre a implementação da política no nível local. Ao delegar a tomada de

decisão sobre o financiamento, o Governo Francês flexibiliza as ações, aumentando a

visibilidade de atores menores, como agricultores familiares, micro empresários e PMEs. Para

aqueles que atuam coletivamente, por meio de organizações do terceiro setor ou sociedade

civil organizada, o espaço se torna ainda maior, com representativo ganho em autonomia de

tais organizações.

O que se percebeu nas falas dos entrevistados, também, foi o ganho em

capilaridade e escala, uma vez que, a nível local, as organizações são capazes de atingir

públicos mais remotos ou com pouca representatividade nacional, mas grande

representatividade local. Além disso, a percepção dos entrevistados é de que as organizações

agregam, à implementação, maior conhecimento da realidade local, permitindo uma

adequação da mesma, e um direcionamento capaz de atender melhor às necessidades de seu

público e do mercado local, quando aplicável.

Segundo publicação da Comissão Europeia (2009), um exemplo de projetos

beneficiados por tais políticas regionais é o Energivie, que visa à introdução e promoção do

uso de energias sustentáveis em setores como turismo e agricultura, além de projetos em

temáticas como inovação, apoio a empresas, meio ambiente, desenvolvimento urbano e rural,

turismo e cultura e energia. Ao todo, foram apoiados 140 mil projetos franceses, sendo

destinados 4,2 bilhões de Euros a Pesquisa e Desenvolvimento e Inovação e 1,4 bilhões de

euros para a promoção do empreendedorismo e de pequenas e médias empresas. Dentre os

resultados mensurados no documento, estão a criação de 200 mil empregos e o aumento

médio de 1,5% no PIB per capita de algumas regiões, entre os anos de 2000 e 2006.

Apesar da percepção positiva e dos resultados demonstrados pelo DLOC, foi

possível notar também, nas falas e entrevistas, práticas de microfinanças e políticas

concorrentes aos programas públicos, o que pode indicar a existência de gaps na oferta

Page 31: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

31

pública de microcrédito, em suas diretrizes ou em seu modelo de implementação. O primeiro

exemplo vem do próprio cluster de Rhones Alpes, mencionado anteriormente. Durante a

entrevista, além de encontros e orientações voltadas para o recebimento do crédito público,

foram mencionadas parcerias com bancos privados, direcionadas à oferta de linhas de

financiamento a taxas mais baratas. Além disso, durante as conversas com participantes e

palestrantes da Sustainable Business Conference 2012, realizada na penúltima semana de

Março de 2012, surgiu também o conceito de investimentos de alto impacto e finanças

solidárias. O modelo de finanças solidárias promove investimentos em empresas ou projeto

cujo negócio (ou finalidade) beneficie, diretamente, a sociedade, prezando pelo

desenvolvimento sustentável. Foi possível entrevistar, durante a permanência na França,

Thomas Brebion, responsável pela Missão de Financiamento Solidário no Finansol. Na época

o modelo, ainda incipiente no Brasil, já começava a ganhar espaço na França, e, segundo

Brebion, a crise econômica era um estímulo para seu crescimento, utilizando-se do argumento

de que, em um momento em que a maioria dos investimentos é de retorno incerto, as finanças

solidárias garantem, além do retorno financeiro, o retorno em capital social para comunidades

necessitadas. Por fim, um último conceito de financiamento concorrente ao financiamento

público, discutido tanto por Bertrand como por participantes da Sustainable Business

Conference 2012, foram os fundos de Venture Capital (em francês, Societé de Capital Risque).

Bertrand chegou a mencionar, como exemplo, a Garrigue, organização de Venture Capital

que apoia a criação ou o desenvolvimento de empresas que tenham como preocupações

principais o desenvolvimento social ou do meio ambiente. A Garrigue é também um dos

membros-fundadores do Finansol.

3.3.As políticas de microcrédito no Brasil

3.3.1. O Contexto estudado

A experiência brasileira aqui abordada aconteceu na região do município de

Timon, no estado do Maranhão. Localizado a aproximadamente 430 quilômetros da capital, o

município é o quarto maior de seu estado em Produto Interno Bruto (PIB), e o mais populoso,

com 155.460 habitantes em uma área de 1.743 km², conforme o Censo 2010 do Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O censo ainda traz informações sobre a

economia do município, essencialmente fundamentada no setor de serviços, responsável por

aproximadamente 80% de seu PIB. O crescimento do comércio, contudo, também é

Page 32: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

32

considerável. Em artigo à revista Informe Econômico, Rocha Filho (2010) destaca o

crescimento do setor em mais de 47% durante o período de 2003 a 2008. No mesmo artigo, o

autor responsabiliza os programas sociais do governo por tais resultados. Em 2008, quase 16

milhões de reais foram inseridos no município pelos programas de transferência de renda do

governo federal. Como o dinheiro destes programas deve, obrigatoriamente, ser gasto em

alimentação, remédios, material escolar e vestuário, o comércio da cidade se vê estimulado. O

crescimento do comércio e as perspectivas de que o mesmo se perpetue são indicadores

positivos, mas deixam de mostrar pontos relevantes da economia local. Ainda segundo o

Rocha Filho (2010), somados aos benefícios do INSS em 2008, o valor inserido no município

alcança 79 milhões de reais, valor próximo às despesas de pessoal da prefeitura, estimada em

R$78 milhões em 2008. O peso do setor produtivo para a massa salarial do município,

portanto, não alcança 6% (cerca de R$ 8 milhões).

As informações econômicas trazem também outra perspectiva: em 2008, havia

cerca 26 mil famílias em situação de miséria ou extrema pobreza no município, cerca de 70%

do total de famílias). Na época, 24 mil famílias eram cadastradas no Cadastro Único para

Programas Sociais, e 19 mil eram beneficiárias do Bolsa Família. Cerca de 76 mil pessoas,

“um número assustador, considerando que [a população total de Timon é de pouco mais de

150 mil habitantes] [...] – uma massa de cidadãos e cidadãs sem emprego e que sobrevivem da

ajuda do governo” (ROCHA FILHO, 2010). Dois anos depois, em 2010, o município

apresentava um IDH6 de 0,649 e um índice de Gini

7 de 0,42, com cerca de 40 mil habitantes

matriculados em algum nível de ensino, e aproximadamente 48% da sua população na faixa

de 0 a 24 anos de idade. O Censo 2010 revelou, também, que o município possuía 60% de

incidência de pobreza.

A atenção para a necessidade de geração de emprego e renda em Timon é

influenciada, também, por um aspecto geográfico do município: Timon se localiza a apenas 3

quilômetros da capital do estado vizinho, o Piauí. Com um nível de desenvolvimento

econômico superior e sendo considerada o pólo de saúde da região, Teresina tem impacto

fundamental sobre as finanças e a economia de Timon. Separados apenas pelas margens do

Rio Poty (cruzados de “barca”, por apenas R$1,00, ou pela ponte, a pé, de carro, motocicleta,

bicicleta ou ônibus), os fluxos entre municípios vão das mercadorias ao capital humano e

6 IDH: Indíce de Desenvolvimento Humano, medida comparativa composta por dados como expectativa de vida

ao nascer, educação e PIB per capita. No índice, 1 representa o completo desenvolvimento humano e 0

representa o completo não-desenvolvimento humano. 7 Índice (ou Coeficiente) de Gini é uma medida de desigualdade, em que 0 representa a completa igualdade de

renda, e 1 representa a completa desigualdade de renda. O cálculo utiliza a proporção acumulada da renda e a

proporção acumulada da população.

Page 33: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

33

recursos financeiros. No âmbito do capital humano, foi possível perceber que parte da força

de trabalho de Timon (inclusive no setor público) é residente em Teresina, assim como grande

parte dos moradores de Timon desloca-se até Teresina para trabalhar, principalmente nos

setores de construção civil, limpeza e segurança privada.

O impacto maior, porém, encontra-se no fluxo de recursos financeiros. Durante as

entrevistas, foi possível notar que é comum o hábito de realizar compras em Teresina, mesmo

para aqueles que trabalham ou residem em Timon. Dentre as potenciais causas, destacam-se:

1) O comércio em Timon, em geral, é caracterizado por pequenos

estabelecimentos com baixo giro de estoque, que compram em Teresina e

revendem em Timon. Isso faz com que os produtos cheguem com preços

mais altos aos Timonenses; 2) Muitos habitantes de Timon trabalham em

Teresina, e aproveitam a ida diária para realizar compras para a família e; 3)

Muitos serviços ainda não existem em Timon (como a contratação do

CrediAmigo [e do AgroAmigo], um dos produtos do Banco do Nordeste do

Brasil [um dos programas de crédito mais populares da região]) ou tem

maior qualidade em Teresina. [...] Durante a visita à CEASA (Central de

Abastecimento de Alimentos) de Timon, alguns dos comerciantes revelaram

que até mesmo os itens comercializados ali são comprados na CEASA de

Teresina. O comércio local de Timon, segundo relatos de alguns dos

comerciantes, é estimulado principalmente por aqueles que vêm da zona

rural e essencialmente realizam suas compras em Timon. (MAIA e

MOLINAR, 2013).

Tal aspecto é ressaltado, principalmente, nos discursos dos gestores públicos do

município. O atual prefeito tem 33 anos e uma história política precoce, tendo sido eleito aos

22 anos o deputado federal mais jovem do país, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT).

Durante os dois encontros com o prefeito, foi possível perceber um forte esforço de

reestruturação do modus operandi da administração pública. Atual presidente do Partido

Socialista Brasileiro (PSB) no estado, o prefeito afirma buscar um governo inovador e capaz

de gerar soluções mais eficazes e eficientes, demonstrando um desejo de que seu governo se

torne caso de sucesso para políticas públicas. Em seu governo, ele nomeou secretários

municipais e gestores públicos com títulos de mestres ou doutores, sendo alguns deles

profissionais do setor privado ou do meio acadêmico, que nunca antes atuaram no setor

público. As visitas a algumas das secretárias, como Planejamento, Tecnologia,

Desenvolvimento e Finanças, revelou que, já entre os cargos técnicos, há uma maior

experiência de atuação no setor. Em campo, foi possível verificar também que o município

possui muitos cargos comissionados ou terceirizados, resultado de um extenso período sem a

realização de concursos públicos.

Page 34: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

34

Para compreender melhor o contexto dos dois projetos pilotos da política pública,

é necessário compreender mais profundamente as características de dois locais de Timon: a

região do Parque Alvorada e as comunidades da zona rural.

3.3.1.1.O Parque Alvorada

O Parque Alvorada se localiza a cerca de 15 minutos (de carro ou moto) do centro

da cidade. Mas, por estar próximo a uma das pontes sobre o Rio Poty, o tempo de

deslocamento até Teresina, também de carro ou moto, é de apenas 5 minutos. Durante a

investigação de campo foi possível notar a existência de duas vias principais, sendo que uma

delas concentra a maior parte do comércio da região, abrigando também uma feira local. Nas

proximidades das vias principais, percebe-se vias asfaltadas, casas de alvenaria e uma grande

concentração de estabelecimentos comerciais, principalmente de vestuário. Na região como

um todo, contudo, é possível encontrar outra realidade: ao visitar as casas de cinco famílias de

alunos de uma das escolas do bairro, a Escola Mãos Dadas, a realidade encontrada foi de

casas de pau-a-pique, algumas vezes com um único cômodo para toda a família e até mesmo

com redes ao invés de camas. Em três das cinco famílias, havia um único celular (pré-pago)

na casa. No bairro, o principal meio de transporte é a bicicleta, e muitas pessoas pedalam

diariamente até Teresina, onde trabalham.

Um ponto crucial para o desenvolvimento da região do Parque Alvorada é a

Escola Mãos Dadas, mencionada anteriormente. Localizada nas vias principais do bairro, a

escola é reconhecida como a melhor da região e uma das melhores da cidade. O idealizador

do projeto é um Padre português, que vive no Brasil há cerca de quarenta anos, a maioria

deles no Maranhão. Além da oferta de roupas e materiais escolares aos alunos mais

necessitados, a escola se diferencia pelo acompanhamento da realidade familiar de cada aluno

(em campo, foi possível notar que os funcionários conheciam de perto a história e a estrutura

familiar dos alunos) e pelo corpo docente, qualificado e dedicado às suas atividades. Além

disso, a escola oferece uma infraestrutura que foge do estereotipo de escolas públicas: além

das salas de aula, há um auditório onde ocorrem apresentações de balé e capoeira dos alunos,

campo de futebol, horta e padaria. Em conversa com o fundador da escola, este afirmou que

sua chegada em Timon foi seguida de um grande esforço para quebrar a cultura do

“coronelismo” e da subordinação existente na região. Segundo ele explicou, a quebra dessa

cultura aumentou, em certa medida, a violência na região, pois se antes havia um grande

individualismo e competição por oportunidades, era o coronelismo que ditava as regras para

Page 35: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

35

essa competitividade, evitando que chegasse a extremos violentos. Quando se quebrou o

coronelismo, só restou então a competitividade e o individualismo. Por essa razão, com a

intenção de despertar o senso de coletivo, a escola exige dos pais o envolvimento na vida

escolar do aluno, a presença em reuniões de pais (que são precedidas por apresentações e

discussões, no auditório, de temas relevantes para a comunidade) e o engajamento cívico,

determinando um número mínimo de horas de trabalho para a comunidade.

A escola é um projeto da Associação Daniel Comboni, também idealizada pelo

padre português, seu atual presidente. A associação tinha o objetivo de discutir assuntos

relevantes para a comunidade, reunindo os moradores interessados em contribuir com tais

questões. Durante as entrevistas, os discursos de moradores e professores da escola frisaram a

grande importância da Associação para o desenvolvimento do bairro. Segundo os relatos, a

região antes tinha uma imagem associada à violência, incluindo crimes hediondos, como

extermínio, e somente após o projeto ganhou visibilidade, recebendo recursos e melhorias em

infraestrutura. Até o asfaltamento das vias principais são atribuídos aos resultados do projeto.

Vale ressaltar que, além do apoio do poder público, o projeto recebeu auxílio financeiro de

filantropos (o Padre desenvolveu relações principalmente na Europa). Os relatos de

professores indicaram, também, que por consequência da crise econômica estes recursos têm

diminuído.

3.3.1.2.As Comunidades Rurais

O município de Timon possui, em seus arredores, cerca de 300 comunidades

rurais, com aproximadamente 15 famílias por comunidade. As realidades das comunidades

são bem parecidas entre si, havendo apenas 3 casos de maior diferencial, por seu

desenvolvimento econômico. Durante as visitas ao Sindicato dos Trabalhadores e

Trabalhadoras Rurais de Timon (STTRT), foi possível entrevistar presidentes e representantes

de associações de moradores de algumas destas comunidades. Na maioria, os relatos trazem

uma cultura de produção individualizada (cada família produz em seu próprio quintal) e

problemas comuns, como irrigação, falta de capacitação, falta de orientação sobre culturas

adequadas, acesso a crédito e perda da safra por questões climáticas e de infraestrutura. Para a

maioria das comunidades, os únicos meios de transporte existentes são o ônibus e a bicicleta.

Em alguma delas, tomar o ônibus para vir a Timon significa realizar um trajeto de quatro

horas por trecho. Quando questionados sobre meios de comunicação, os agricultores

revelaram que possuem de 1 a 2 celulares pré-pagos por família e que utilizam o celular

Page 36: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

36

somente para chamadas, pois têm medo de enviar SMS por não compreender o modelo de

cobrança das mesmas. Disseram também que utilizam o serviço principalmente quando vêm a

Timon, pois em muitas comunidades há problemas de infraestrutura, não havendo sinal, ou

este sendo restrito a áreas mais altas. Em relação à organização coletiva, os relatos também

foram semelhantes, mencionando dificuldades para desenvolver projetos coletivos e, até

mesmo, para conseguir quórum para reuniões de rotina. Dentre os motivos apontados estão o

desinteresse espontâneo (e a mentalidade de progresso individual, sem necessidade de

associação a semelhantes) e a descrença em soluções coletivas, devido a um histórico de

promessas do poder público não cumpridas e de projetos descontinuados ou mal sucedidos.

Dentre as comunidades, São João dos Marrocos e Bambu têm perfis muito

distintos. A primeira é considerada por servidores públicos e outros líderes comunitários

como um caso de sucesso entre as comunidades, tida como a mais desenvolvida da região,

enquanto a segunda é o retrato da realidade mais comum, de pobreza e abandono. De fato,

São João dos Marrocos apresenta características impressionantes: os jovens trabalham em

uma cerâmica que foi construída há cerca de 20 anos por “Seu Mundico”, o líder da

comunidade. Os mais velhos trabalham no campo: os homens pescam (há um tanque de

peixes na comunidade) e são responsáveis pela produção de quiabo, e as mulheres cuidam de

uma horta. Toda a produção é feita em área coletiva (em uma terra arrendada), e os custos,

como eletricidade, são divididos entre todos, e cada morador cede uma parte da produção para

a associação. As casas da comunidade são de alvenaria, com construções complexas, de mais

de 2 cômodos. Muitos dos residentes são jovens (que deixam de procurar emprego na cidade,

uma vez que podem trabalhar na cerâmica). Ao conversar com Seu Mundico e os habitantes

locais, percebe-se uma forte influência do líder na construção do senso do coletivo. Firme, o

discurso dele sobre a participação da comunidade parece nem presumir a abstenção de

membros. Uma das senhoras da comunidade explicou: “Pode não ir na presença, mas tem que

ir no dinheiro.” (sic). E, ao serem questionados sobre as razões para o desenvolvimento, os

habitantes afirmam com frases como “É a união”. Um dos habitantes (que mora somente com

sua esposa) afirmou possuir uma renda familiar de 700 a 1500 reais, conforme produção.

A primeira diferença para a comunidade do Bambu se encontra no modelo de

produção: cada família planta sua cultura em seu próprio quintal (terreno geralmente inferior a

um hectare), e não coletivamente. A cultura na maioria das casas é o feijão, com espaço para a

mandioca em algumas delas, que possuem também o moedor para a produção de farinha. O

presidente da associação da comunidade queixou-se sobre as dificuldades em unir os

habitantes em um projeto ou ação coletiva. As casas são de pau-a-pique, sendo que a maioria

Page 37: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

37

possui apenas um cômodo. De carro, o tempo de deslocamento até o centro de Timon é de 30

minutos, mas somente um dos moradores possui veículo próprio. Para o restante, o trajeto até

a cidade é feito de ônibus ou bicicleta. Na comunidade havia também um comércio local, com

itens de necessidade básica. Em entrevista, o comerciante afirmou que comprava as

mercadorias no supermercado do Parque Alvorada. Alguns outros moradores também

informaram que fazem compras mensais no bairro, pois possuem familiares morando ali.

3.3.1.3.A Relação com o Crédito e com o Sistema Financeiro

Durante a pesquisa de campo, foi possível entrevistar comerciantes e agricultores

sobre sua relação com o crédito, na intenção de compreender questões culturais e potenciais

oportunidades ou barreiras já existentes na região. Na região central do município há agências

de grandes bancos nacionais, como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Itaú,

além de uma agência do Banco do Nordeste do Brasil, um ponto de atendimento do

CrediAmigo e uma grande concentração de estabelecimentos de oferta de crédito (anunciando,

em alguns casos, a disponibilização de crédito para negativados e, inclusive, para o

pagamento de outras dívidas). Tudo isso em meio a um intenso comércio (especialmente de

vestuário), que inclui lojas como Armazém Paraíba e Comercial Carvalho, duas das maiores

redes de varejo e supermercado do Brasil, com forte atuação na região nordeste do país. Na

cidade, ainda foi possível encontrar pessoas sem inserção no sistema financeiro, mas a grande

maioria dos entrevistados possui ao menos conta poupança. A maioria destes, para

recebimento de aposentadoria ou outros benefícios governamentais, como programas de

transferência de renda. Os bancos mais citados foram Caixa Econômica Federal e Banco do

Brasil, além do BNB.

Durante as entrevistas com comerciantes dessa região, foi possível encontrar

muitos tomadores de microcrédito. Entre os ambulantes foi possível identificar um evento

frequente: o comerciante possui o capital de giro para seu negócio, mas toma o crédito para

utilizar como tal e gastam o capital próprio com consumo. Na prática, o valor do capital de

giro se mantém, e gera-se a situação de dependência da constante renovação do crédito, sem

que ocorra impacto efetivo no negócio ou na renda do tomador. Nestes casos, a adesão ao

crédito geralmente ocorre por incentivo de pessoas próximas ou por excesso de ofertas de

crédito recebidas. Uma das comerciantes chegou a comentar “É pior que crack isso aí” (sic).

Os depoimentos revelaram também que é comum a tomada de um segundo empréstimo

Page 38: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

38

(inclusive com agiotas) para o pagamento do primeiro, evitando o pagamento de juros por

atraso, mas aumentando o custo do capital.

Mas há, ainda, casos de sucesso. Um dos entrevistados é dono de uma loja de

bicicletas e acessórios, e deixou de tomar crédito há cerca de dois anos. Ele revelou que, no

início do seu negócio, possuía apenas cinco bicicletas, e que o crédito forneceu capital de giro

para que ele comprasse mais produtos e aumentasse sua oferta. Durante a nossa visita, havia

cerca de 20 bicicletas novas e seminovas no local, além de outros produtos. O comerciante

disse que prestou serviço militar, e que por essa razão aprendeu a se disciplinar com tudo,

inclusive com as finanças de seu estabelecimento. O empreendedor disse que, no início,

tomava crédito em uma modalidade coletiva, em grupos de pelo menos 4 pessoas, mas que em

seu grupo alguns não pagavam, e como todos eram responsabilizados pela divida, decidiu

passar a utilizar o crédito individual logo que conseguiu autonomia para isso: “Eu quis o

crédito com um objetivo, e só usei pra isso. Mas tem gente que pega (sic) o crédito e gasta,

não se planeja. Aí na frente [se referindo ao outro lado da rua, onde havia uma concentração

de comerciantes ambulantes] deve ter alguns assim”. A narrativa do comerciante reforçou um

dos apontamentos ouvidos de membros da Associação Daniel Comboni, “tem gente que pega

crédito junto e depois fica endividado por culpa dos outros” (sic).

Já no caso rural, durante as conversas no STTRT e na comunidade do Bambu,

alguns moradores chegaram a relatar o uso do crédito público pelo PRONAF, especialmente

por meio do AgroAmigo. Mas para grande parte, especialmente entre os mais velhos, a

palavra “crédito” foi recebida com perceptível surpresa e receio. Quando perguntados sobre a

razão, a justificativa é sempre a mesma: medo de endividamento. Outro discurso dos

moradores do campo era referente à oferta e ao acesso ao crédito. Segundo eles, há pouca

oferta e, quando esta é existente, os requisitos são muitos, dificultando o acesso. Segundo

técnicos da Secretaria da Agricultura, porém, o principal requisito para acesso ao crédito é a

DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf), que é um documento exigido pelo Governo Federal,

e muitos agricultores têm conseguido acesso ao mesmo. Ainda segundo a visão dos técnicos,

o que falta é o interesse em produzir, a dedicação e o emprego correto do auxílio recebido.

Chegaram a relatar alguns casos, como o de uma comunidade que recebeu da secretaria kits

de irrigação, e ao invés de instala-los, revendeu. Contaram também de uma comunidade que

recebeu subsídios para a compra de equipamentos e insumos para a produção de Caju, e

aproveitavam somente o suco para a cajuína, descartando outras partes como a castanha, que

poderiam ser beneficiadas e ser revendidas com ainda maior valor agregado. Segundo os

técnicos, neste mesmo caso houve também desinteresse na continuidade do negócio: uma vez

Page 39: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

39

que a produção acabou, não houve parte da receita reinvestida para a compra de mais insumos,

e esta foi gasta com fins não produtivos.

Mas também no campo é possível encontrar casos de sucesso, como o da

comunidade de São João dos Marrocos, já mencionado anteriormente. No caso, iniciado há

cerca de 20 anos, Seu Mundico uniu cerca de 10 moradores para a tomada de um valor maior

de crédito. Ao invés de cada um tomar os quase 2 mil reais e investir individualmente, o líder

comunitário investiu os 20 mil reais para preparar a terra e organizar a produção, que é feita

coletivamente, além da construção da cerâmica. A partir daí, os agricultores continuaram

renovando o crédito, mas para a expansão da produção e da cerâmica.

3.3.2. O Projeto de Política Pública

O projeto de Política Pública estudado era uma proposta da Secretaria Municipal

de Desenvolvimento Econômico e Turismo (SEDETUR). Confirmando as características do

governo, a SEDETUR tem, entre seu pessoal, técnicos muito jovens, mas já com experiência

prévia no setor público. Já entre os altos gestores é possível encontrar mestres, como o então

secretário, com ainda pouca experiência profissional relacionada ao setor público. A gestora

responsável pela política é a Diretora de Acesso ao Crédito e Comercialização. Com

experiência no setor privado, mas sem atuação prévia no setor público, ela foi convidada a

participar do corpo da SEDETUR pelo secretário nomeado.

Como gestora pública do município de Timon, um dos primeiros desafios

apresentados à gestora foi a ideia do Banco Comunitário. Natural de Timon, o secretário já

conhecia a questão da mobilidade de recursos financeiros entre o município e Teresina, e

encarava isso como uma das discussões prioritárias do governo, tendo imaginado o Banco

Comunitário como um potencial mitigador do problema. A proposta do secretário considera o

Banco Comunitário como um potencializador do desenvolvimento econômico regional, e

acredita que, uma vez que este esteja estabelecido como agente de microcrédito local, será

possível inserir na economia uma moeda social. Moeda social é uma moeda com circulação e

poder de compra restritos a uma localidade específica. Em grande parte dos casos ela é criada

como modo de incentivar que a renda de uma determinada comunidade se mantenha

circulando dentro da mesma. Ao assumir a diretoria, a gestora se tornou responsável, portanto,

pelo desenvolvimento do projeto do Banco Comunitário e da moeda social. No caso estudado,

há ainda uma característica particular do projeto, que o diferencia de outros projetos com o

mesmo objetivo: a moeda social seria eletrônica. Para o secretário, essa restrição se deve ao

Page 40: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

40

alto custo do papel moeda (segundo ele, de R$0,05 a R$0,10 por nota) e aos riscos de

danificação do papel, que podem comprometer a relação lastro/circulação. Legalmente, a

proposta tem seu embasamento na Medida Provisória 615/20138, que dá autonomia ao Banco

Central para regulamentar os “arranjos de pagamento”, abrindo espaço para meios de

pagamento eletrônicos.

A partir das diretrizes dadas pelo secretário, a diretora de comercialização e

acesso ao crédito passou a se aprofundar no desenvolvimento do projeto. A intenção,

conforme verificado pelas entrevistas em campo, seria o desenvolvimento de dois bancos

comunitários piloto: um em um bairro da zona urbana, o Parque Alvorada, e outro para a zona

rural (sem comunidade ou área definidos até então). O Banco comunitário, além de agente de

microcrédito, teria uma função a mais: a orientação do uso do crédito, que abrangeria,

inclusive, a capacitação em gestão para os empreendedores e agricultores beneficiados. A

moeda social eletrônica circularia por meio de celulares e smartphones, mas ainda não havia

consenso sobre o formato definitivo dessa circulação: se por meio de SMS9, aplicativo mobile

ou se pela utilização de créditos de celular pré-pago como moeda, seguindo o modelo

queniano da Safaricom10

, que se tornou caso de sucesso em microcrédito e mobile payment.

Outra característica até então sem definição se refere à qualidade do crédito: se este seria

oferecido somente para fins produtivos ou se abrangeria também fins não produtivos.

Segundo a gestora, a expectativa é de que o modelo entrasse em funcionamento

em um prazo de um ano, e que em mais um ano estivesse funcionando perfeitamente para a

tomada de crédito. Os recursos para seu funcionamento (inclusive para o lastro) seriam

provenientes de órgãos internacionais e federais, e a operação seria realizada pela comunidade

local e pela SEDETUR, prevendo um gradual desligamento da secretaria e aumento da

autonomia à comunidade.

8

Câmara dos Deputados. Projetos de Lei e outras Proposições.

<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=577468> Acesso em 25 de

Setembro 2013 9 Short Message Service, ou Serviço de Mensagens Curtas, padrão de comunicação de texto entre celulares.

10 Após perceber o comportamento de consumo dos usuários de celulares pré-pago Safaricom, empresa de

telefonia celular queniana, lançou a primeira conta de celulares, a M-PESA, que aumentou o acesso da

população a serviços financeiros formais. (FSD KENYA, 2011) Disponível em:

<http://www.fsdkenya.org/finaccess/documents/11-06-27_finaccess_09_results_analysis.pdf>. Acesso em 16 de

Novembro de 2013.

Page 41: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

41

3.3.3. A Percepção e o Impacto da Formulação da Política de Microcrédito em Timon

A formulação da política pública iniciou-se, como explicado anteriormente, pelo

trabalho do secretário, sendo assumida pela gestora logo no início do mandato. Segundo os

relatos da gestora, os primeiros meses tinham sido utilizados para pesquisa e aquisição de

contatos, por meio de presença em eventos e cursos, por exemplo. Além disso, ela trabalhou

no desenvolvimento da formulação do projeto e seu planejamento estratégico, interagindo

também em outras ações da SEDETUR. Durante esta etapa, a gestora fez contato com

organizações dos diversos setores, como universidades, centros de pesquisa, órgãos federais

para o desenvolvimento econômico e organizações internacionais de financiamento de

projetos para o desenvolvimento econômico. Em Julho, foi possível acompanhar a segunda

etapa do processo: a visita da gestora às organizações da sociedade civil para a apresentação

do projeto. A primeira organização visitada foi o STTRT. A diretora realizou uma palestra no

local, onde apresentou dois vídeos: um fazia referência ao Banco Palmas e outro à

comercialização de produtos agrícolas. Após os vídeos, ela explicou a proposta do banco

comunitário e como isso poderia desenvolver a comunidade e fomentar o acesso à

comercialização. A apresentação foi seguida de uma discussão com os agricultores, e houve

pouco interesse em discutir a proposta específica, com foco maior na discussão da atenção

dada pelo poder público em geral. O que se pôde perceber, pela discussão, é que, para muitos

que participaram não há uma diferenciação entre as instâncias ou entre os diferentes órgãos

públicos. As críticas revelaram, principalmente, uma descrença em relação à eficácia do poder

público, seja devido ao número de projetos apresentados e não cumpridos, ou pelo difícil

acesso e complexidade dos requisitos exigidos pelos que se realizam de fato. Já os presidentes

de associações demonstravam interesse na proposta, com esperança de que esta pudesse

mudar a realidade de sua comunidade.

A segunda apresentação do projeto foi na Associação Daniel Comboni, grupo

estratégico para a apresentação do projeto. Muitas vezes a importância do papel do Padre foi

ressaltada pelos atores do poder público, em frases como “Se o Padre não quiser, esse projeto

não sai do papel.”. Na ocasião, a apresentação era somente um dos itens da pauta da reunião.

Um dos primeiros itens, contudo, tinha relação com o projeto formulado: era a aprovação do

planejamento estratégico da associação, que incluía a criação do Banco Comunitário. Segundo

apresentado no dia, alguns dias antes, a SEDETUR teria se reunido com membros da

Associação e professores da Escola Mãos Dadas para a formulação do planejamento

estratégico, com missão, visão, valores e eixos de atuação. Após a apresentação, no momento

Page 42: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

42

da votação, a vice-presidente da associação se manifestou, questionando a representatividade

dos associados na reunião de formulação, perante tantos outros participantes não associados.

A discussão se seguiu brevemente, com alguns outros associados se manifestando, mas logo

foi interrompida para a votação do planejamento, que foi aceito pela maioria. Ao fim da

votação, a vice-presidente declarou seu desligamento. Este acontecimento pode indicar a

existência de pontos de tensão na tomada de decisão e no diálogo entre as duas vozes: a

SEDETUR, representando o poder público, e a Associação Daniel Comboni, uma organização

da sociedade civil. O desenvolvimento da relação entre os dois grupos de interesse se torna

fundamental para a implementação da política e, principalmente, de quaisquer parcerias que

venham a ocorrer.

Por fim, a Escola Mãos Dadas foi a última apresentação pública do projeto

presenciada (houve ainda algumas apresentações individuais, que serão tratadas adiante). Ali,

duas professoras apresentavam o projeto a um grupo de cerca de 400 pais de alunos,

acompanhadas pela diretora da SEDETUR e pelo Padre. Era o dia de reunião de pais e

professores, e cada período (matutino e vespertino) se iniciava com a fala do Padre no

auditório. A apresentação pelas professoras foi bem recebida pelos pais. Ao questionar sobre

o apoio ao projeto, poucas mãos não se levantaram. As questões apresentadas eram pontuais,

e especificamente sobre o funcionamento do Banco Comunitário. Apesar de positiva, é

preciso tomar a aceitação com cautela. Quando solicitado que aqueles que não levantaram a

mão se manifestassem, ninguém se apresentou. O apontamento, aqui, é para a relação de

dependência que se tem: as regras da escola são rígidas, e as vagas são disputadas por alunos

de toda a região. Muitos pais vêem a escola como a oportunidade de acesso de seus filhos a

uma formação de qualidade. E talvez por essa razão, possa haver uma construção de respeito e

influência que seja limítrofe à obediência e subordinação, influenciando a discussão de

projetos como esses.

Em paralelo a essas apresentações, durante o mês de julho houve também reuniões

com outros gestores da SEDETUR, outros secretários municipais e com o prefeito, para a

apresentação do projeto. De modo geral, todos apresentaram aceitação e disposição para

discutir o projeto. Contudo, grande parte afirmou não ter conhecimento do projeto até o

momento, mesmo que em linhas gerais. Em uma das secretarias, o gestor explicou que o

município era altamente dependente de recursos federais, e que por essa razão um projeto

desse porte deveria ser amplamente comunicado entre as secretarias.

Page 43: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

43

3.4.Análise comparada das duas experiências estudadas

Como foi explicitado na descrição dos casos, a experiência francesa se dá em um

momento de recuperação econômica e de contenção dos excedentes agrícolas, em que o

estímulo ao empreendedorismo é utilizado, inclusive, como modo de deslocar a atividade

econômica do campo da produção primária para o beneficiamento de produtos e

desenvolvimento de tecnologias. O modelo de política pública do país se constitui, portanto,

de um processo de formulação centralizado na União Europeia ou no Estado, que se desdobra

para as regiões, comunas e, finalmente, tem seus efeitos em projetos de origem comunitária.

Verificou-se que, apesar de gerar uma percepção positiva acerca da autonomia das comunas e

regiões para a alocação dos recursos, permitindo uma adequação à realidade local, o contexto

francês revela o fortalecimento de alternativas de financiamento concorrentes às políticas

públicas, o que pode indicar que ainda existe espaço para desenvolvimento destas.

O caso brasileiro, por outro lado, traz a realidade de um município cuja economia

é altamente dependente de recursos do Estado, mais especificamente dos programas de

transferência de renda. O caso estuda a formulação de uma política pública que busca, por

meio da criação de uma moeda social que concentre o consumo da população no próprio

município, fomentar o desenvolvimento econômico local. Em Timon, o processo de

formulação se iniciou com o planejamento e contato com organizações para o financiamento

de projetos de desenvolvimento, além de outras organizações de ensino e pesquisa. A etapa

seguinte ao planejamento envolveu a interação com outros agentes do poder público e com

atores da sociedade civil, como meio de divulgar a política e de buscar apoio que fortalecesse

a implementação da mesma.

Portanto, a partir dos casos investigados, é possível identificar três principais

fatores de diferenciação entre as políticas francesa e brasileira, sendo eles: as diretrizes da

política pública quanto ao seu público alvo e suas consequências; o momento da primeira

interação Estado-sociedade; e a finalidade deste contato e a accountability.

A primeira diferença, portanto, diz respeito às diretrizes da política pública. Na

França, a experiência estudada se volta especificamente para públicos determinados,

conforme direcionamento estratégico do governo. Considerando a questão dos excedentes,

por exemplo, há um direcionamento do financiamento para negócios e projetos que não se

limitem à simples produção agrícola. Já no Brasil, o caso estudado previa uma concessão

generalizada de crédito, para diferentes públicos e negócios, sem um direcionamento

específico por parte do poder público. Quanto às estruturas de generalização ou especificação,

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44

ainda não é possível inferir qual o melhor caminho para a política pública, mas esse tópico

merece a continuidade de estudos. Mas o modelo brasileiro revela uma menor intervenção do

estado no direcionamento da economia, permitindo inferir, inclusive, que para a política

pública brasileira o impacto da atuação da linha de frente, a nível local, é maior do que na

experiência francesa, cujas diretrizes fornecidas pelo Estado são restritamente específicas.

O segundo ponto de contraste percebido nas diretrizes da política é relativo ao seu

impacto sobre a construção do senso de coletivo. O crédito no modelo francês não é cedido a

indivíduos, mas a projetos coletivos, que distribuem os recursos entre seus membros ou os

utilizam para financiar as ações do próprio coletivo, como capacitação, promoção e acesso e

fomento à comercialização. Portanto, há o estímulo à ação coletiva, incentivando o

estabelecimento de organizações profissionais e associações, além de coletivos e redes. Esse

formato fortalece o desenvolvimento regional, uma vez que tais redes estimulam a troca de

experiências, o estabelecimento de novas relações comerciais e o compartilhamento de

tecnologia.

Já no Brasil, o foco existente é o crédito para indivíduos ou projetos individuais.

Apesar de se basear na construção do Banco Comunitário, a política pública formulada prevê

que a concessão do crédito por meio deste será realizada para microempreendedores,

pequenas empresas ou a agricultores familiares, individualmente. O individualismo é

característica também em outros programas e políticas de crédito público, como o programa

CrediAmigo, frequentemente mencionado durante as entrevistas. Apesar de exigir a

organização de um coletivo para a tomada de crédito, é requerido que os projetos de cada

indivíduo sejam diferentes, deixando ao coletivo uma relação de simples obrigação financeira.

Por meio dos discursos do poder público e das entrevistas com outros atores,

como funcionários do Banco do Nordeste, é possível levantar hipóteses sobre os fatores que

levam à distribuição da oferta de crédito entre indivíduos. A primeira é do lado da oferta, e se

refere à diminuição do risco decorrente da inadimplência: uma vez que se distribui o crédito

em diferentes projetos individuais, o risco da carteira de crédito diminui. Uma segunda

hipótese é relativa à demanda, e se baseia na construção cultural e histórica da região. As

entrevistas com a comunidade e líderes comunitários se referiam, com frequência, a uma

construção cultural marcada pela subordinação e pela competitividade entre iguais. Segundo

tais relatos, a subordinação se enfraqueceu com a construção da sociedade moderna, mas se

manteve a competitividade, evoluindo para graus mais altos de individualismo.

Um último efeito das diretrizes passível de ser analisado é relacionado à

elaboração de programas e ações complementares e não concorrentes. As iniciativas

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45

JEREMIE, JASPERS e JESSICA, abordadas durante a descrição da experiência francesa, são

exemplo de políticas complementares, tendo públicos alvos e perfil de oferta de crédito

diferentes entre si. Por ser de formulação centralizada, as políticas francesas tendem a se

ocupar papéis complementares, totalizando uma ação do poder público capaz de atender

diferentes demandas. Já a distribuição da formulação em diferentes instâncias e órgãos da

administração direta e indireta pode gerar concorrência entre diferentes programas públicos e,

inclusive, resultar em uma multiplicidade de oferta para um mesmo beneficiário, fator que, a

curto prazo, concentra e diminui o número de beneficiários da totalidade dos programas

públicos. No caso estudado, por exemplo, a proposta de política pública apresentava, no

âmbito da oferta de crédito, uma forte concorrência com outros dois programas muito fortes

na região: o Crediamigo e Agroamigo. A elaboração de programas complementares se torna,

portanto, um desafio aos formuladores de política pública, como uma outra questão de

investigação que mereça o desenvolvimento de novos estudos.

Quanto ao momento da primeira interação, no caso brasileiro, o poder público

interage com a sociedade desde a formulação da política pública, mantendo uma relação de

proximidade com a comunidade. Já no caso francês, o contato é realizado somente no

momento da execução da política, e somente a nível regional ou local. É possível que esse

contraste seja consequência da diferenciação entre as instâncias estudadas: uma prefeitura, no

caso brasileiro, e o Estado Nacional, no caso da França. Mas a finalidade da interação também

diferencia as duas experiências: se no Brasil o alinhamento é buscado como meio de verificar

a aceitação e comunicar o projeto, divulgando a ação do poder público, na França o contato é

realizado com o objetivo de obter uma maior assertividade na execução da política pública,

permitindo ao nível local uma “customização” da mesma. Ambas as posturas revelam pontos

de atenção, conforme acompanha-se na etapa descritiva. Na França, sabe-se que essa

participação está limitada dentro do escopo já definido pela instância maior, permitindo

somente a tomada de decisão sobre a execução em si, como critérios de escolha dos projetos

beneficiários e, em alguns casos, a metodologia de monitoramento e acompanhamento. No

Brasil, a proximidade antecipada, por meio da divulgação, pode gerar uma perda da

credibilidade ou mesmo afetar a confiança (como relatos abordados durante a etapa

descritiva), uma vez que o projeto ainda demoraria a ser implementado.

Por fim, tem-se a comparação da accountability das duas experiências. Por se

basear em critérios mais customizáveis de concessão do financiamento e mesmo de

acompanhamento e monitoramento de sua eficácia, existe a possibilidade de que sejam

geradas especificidades que dificultem a accountability das políticas e programas. Enquanto

Page 46: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

46

isso, a padronização do projeto mesmo em diferentes públicos poderia facilitar a centralização

da accountability no caso brasileiro. Durante a pesquisa, contudo, foi possível verificar uma

situação contrária. O modelo francês de concessão de crédito, apesar de descentralizar a

operação, apresentou uma maior publicidade das informações. Há, por exemplo, guias com

descrições completas dos projetos financiados, que podem auxiliar, inclusive, a cobrança da

prestação de contas por parte da população. As informações quantitativas também estão

presentes, com informações sobre distribuição do financiamento por diferentes áreas

temáticas de projetos, países e regiões, além de informações sobre indicadores

socioeconômicos desenvolvidos durante a implementação do programa. No Brasil, como a

política de crédito se baseia, majoritariamente, em indivíduos, se torna inviável a publicidade

da prestação de contas por beneficiário. Além disso, as avaliações encontradas em pesquisas e

outras literaturas sobre o tema dissertam, majoritariamente, sobre aspectos qualitativos.

Quando se trata de resultados quantitativos, o sucesso de um programa é relacionado,

frequentemente, ao aumento no número de beneficiados ou no valor total de crédito oferecido.

Para ambos os casos, contudo, quando encontrados indicadores relacionados à eficiência,

eficácia ou efetividade da política, estes são superficiais, dificultando, por exemplo, a análise

comparativa entre beneficiários e não beneficiários do programa, ou seja, uma análise com

grupo controle, capaz de diferenciar efeitos macroeconômicos dos resultados reais.

Page 47: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

47

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho foi o de produzir uma análise das etapas de formulação e

implementação de políticas públicas brasileira e francesa no âmbito do microcrédito produtivo

orientado. Ao apontar aspectos relevantes acerca do relacionamento entre o poder público e a

sociedade civil e seus resultados na aplicação das políticas a nível local, pretendeu-se

valorizar aprendizagens que aumentassem a entrega de resultados por meio de tal interação.

Foi possível compreender o contexto em que se desenvolveu cada experiência,

além de um detalhamento dos modelos construídos para formulação, no caso brasileiro, e para

a execução, da política pública, no caso francês. Por fim, a análise abordou os principais

pontos de contraste entre as duas experiências, com foco naqueles relacionados ao

entendimento do público-alvo e à interação entre este, como sociedade civil, e o poder público.

Estas análises permitiram o apontamento de questões para estudo posterior e que podem

revelar oportunidades para melhoria e mitigação de risco na gestão de políticas públicas.

Dentre os pontos observados, deu-se destaque para três questões principais: as

diretrizes da política pública em relação ao seu público, o momento e a finalidade da primeira

interação Estado-sociedade e a accountability. Da primeira questão, se desdobraram três

dicotomias, que apresentam caminhos para a construção da política pública: 1) crédito

individual x crédito coletivo; 2) generalização x especificidade do público; e 3) centralização

x descentralização da formulação.

Em relação aos tópicos mencionados, as observações revelam que há pontos

adequados e pontos a desenvolver em ambos os casos. No caso brasileiro, foi possível

perceber avanços na busca do poder público por parcerias com a sociedade civil,

demonstrando um movimento de conscientização quanto à importância da mesma para a

eficácia e a efetividade de políticas públicas. Além disso, a inserção da sociedade civil desde a

formulação e a menor rigidez das diretrizes demonstram que há espaço para uma maior

inserção da sociedade civil como ator ativo na construção de políticas e programas públicos.

Há porém, como mencionado, pontos ainda a desenvolver. Dentre estes, o principal se refere à

accountability das políticas públicas, que deve ser melhorada a ponto de permitir análises de

eficácia e de efetividade, possibilitando, inclusive, a comparação de indicadores entre

beneficiários e não beneficiários do programa.

Finalmente, conforme descrito nos capítulos anteriores, o estudo da experiência

francesa trouxe, a este estudo, uma perspectiva diferenciada sobre políticas de microcrédito,

com um formato quase oposto ao desenvolvido no caso brasileiro. Conforme apresentado na

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análise final da avaliação dos resultados de pesquisa, a comparação intensificou, por fim, o

entendimento da importância de modelos que estabeleçam formas de diálogo entre as ações da

comunidade e as do governo.

A complexidade relacionada ao financiamento da produção agrícola de pequeno

porte e de empreendedores é crescente e apresenta novas variáveis que precisam ser

compreendidas para que as inovações e novas perspectivas representem soluções adequadas à

realidade brasileira. Considera-se que compreender os aspectos envolvidos para a formulação

e a implementação de programas de financiamento de produtores agrícolas e empreendedores

de pequeno porte é de grande relevância, não somente para o Brasil, mas também em âmbito

global.

Page 49: Microcrédito Produtivo Orientado - um estudo sobre políticas públicas no Brasil e na França

49

5. REFERÊNCIAS

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