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MICHELE DE MESQUITA CAMPOS Banalização dos pleitos compensatórios do dano moral Rio de Janeiro 2011

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MICHELE DE MESQUITA CAMPOS

Banalização dos pleitos compensatórios do dano moral

Rio de Janeiro 2011

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MICHELE DE MESQUITA CAMPOS

Banalização dos pleitos compensatórios do dano moral

Monografia apresentada à Faculdade Integrada Vez do Mestre como requisito para obtenção do título de pós graduação do Curso de Direito

Privado e Civil. Orientador: Professor Francis Rajzman

Rio de Janeiro Campus Carmo

2011

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DEDICATÓRIA

A meu pai Sergio Campos, exemplo de probidade, retidão de caráter, que sempre me incentiva a estudar cada vez mais. A minha mãe Sueli Campos, demonstração incansável de perseverança e fé.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por todos os instantes da minha vida. Aos meus pais que sempre me incentivam.

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RESUMO

Este estudo objetivou esclarecer a banalização do instituto do dano moral, bem como sua configuração, de forma que mantenha a sua preservação e principalmente a segurança na relação jurídica, pois não é qualquer aborrecimento cotidiano que caracteriza o dano moral. Inicialmente fez-se uma abordagem sobre a responsabilidade civil, essencial para a reparação do dano moral e a evolução do instituto através dos tempos até os dias atuais, onde a função primordial do dano moral é compensar o sofrimento da vítima, já que é impossível avaliar economicamente o dano suportado, pois este tipo de dano é algo subjetivo e está ligado a valor. Destacou-se as espécies de responsabilidade civil e os seus elementos caracterizadores e em especial o dano, elemento principal neste estudo. Abordou-se sobre o direito da personalidade trazido pelo atual Código civil, contudo fazendo menção a Carta Magna que já abordava o instituto do dano moral, bem como o direito da personalidade. Destacou-se a dignidade da pessoa humana consagrado pela Constituição Federal e sua relevância para o estudo do dano moral. A análise dos critérios para o seu arbitramento e principalmente a restrição dos pleitos aventureiros com o intuito de se locupletar as custas de terceiros. A exposição do tema foi ilustrada com exemplos corriqueiros, presentes no cotidiano do judiciário, assim, abordou-se o controle do judiciário, em especial do STJ nas verbas indenizatórias, bem como a correta configuração do dano moral como violação aos direitos da personalidade como forma de resguardar o instituto do dano moral e fomentar mudanças no critério de avaliação para efeito de indenização por dano moral.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 7 CAPÍTULO I – RESPONSABILIDADE CIVIL........................................................ 9 1.1 CONCEITO...............................................................................................................12 1.2 RESPENSABILIDADE CONTRATUAL................................................................13 1.3 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL..................................................13 1.4 RESPONSABILDADE OBJETIVA.........................................................................14 1.5 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA......................................................................16 CAPITULO II – ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL.....................18 2.1 CONDUTA................................................................................................................18 2.2 DANO........................................................................................................................18 2.3 NEXO DE CAUSALIDADE....................................................................................19 2.4 O DANO E SUAS DISTINTAS CATEGORIAS.....................................................20 2.5 CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL COMO VIOLAÇÃO A DIREITOS DA PERSONALIDADE........................................................................................................21 2.6 DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL E A TUTELA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.......................................................................................................25 CAPITULO III - CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO DO DANO MORAL..29 3.1 EVOLUÇÃO ............................................................................................................30 3.2 CRÍTICA ..................................................................................................................35 3.3 ESTÁGIO ATUAL DO ARBITRAMENTO ...........................................................36 CAPÍTULO IV – A NECESSIDADE DE CONTENÇÃO DA DENOMINADA INDÚSTRIA DO DANO MORAL ..............................................................................40 4.1 PLEITOS AVENTUREIROS E A NECESSIDADE DE CONTROLE PELO JUDICIÁRIO DA CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE PELO DANO EXTRAPATRIMONIAL................................................................................................42 4.2 A CORRETA CONFIGURAÇÃO DOS DANOS MORAIS COMO VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ....................................................................45 4.3 O PAPEL DO STJ NO CONTROLE DAS VERBAS INDENIZATÓRIAS DO DANO MORAL..............................................................................................................48 CONCLUSÃO ...............................................................................................................52 REFERÊNCIAS.............................................................................................................54

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INTRODUÇÃO

A moral do homem é um direito de personalidade que está

intrinsecamente ligado a individualidade, à pessoa. Portanto, quando se dá a ocorrência

de ofensa a este direito,o ofendido busca uma indenização correspondente ao seu

prejuízo.

Sendo assim, o presente estudo visa explanar o que seja realmente o dano

moral e para poder gerar uma indenização, tendo em vista que, atualmente, ele tem sido

pleiteado aleatoriamente junto aos órgãos jurisdicionais, por membros da sociedade que

visam locupletar-se ás custas alheias.

Versará este presente trabalho monográfico sobre a banalização dos

pleitos compensatórios do dano moral, tema hoje muito discutido na esfera jurídica

devido à falta de parâmetros para se arbitrar a compensação para satisfazer quem sofre

este tipo de dano.

Esse instituto, com advento da Constituição Federa de 1988 que consagra

a dignidade humana fizeram com que a perspectiva sobre qualquer tipo de dano relativo

ao direito da personalidade é indenizado provocasse uma grande demanda aos órgãos

jurisdicionais.

A razão norteadora deste tema foi devido a proliferação dessas ações,

que move a máquina judiciária com tipos de pleitos banais, prejudicando as ações que

realmente tem relevância jurídica.

A relevância deste estudo está vinculada ao esclarecimento do que seja

dano moral e quando se configura, bem como o ofendido deve ser compensado pelo

dano suportado a fim amenizar a sua banalização.

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Este trabalho monográfico trará em seus capítulos a evolução da teoria da

responsabilidade civil, passando pelo ato ilícito, abordando as espécies de

responsabilidade, bem como os seus elementos caracterizadores.

Explanará ainda, as categorias do dano, dando enfoque ao dano moral e

sua correta configuração como violação aos direitos da personalidade.

Analisará o novo foco dado ao direito civil e a tutela da dignidade da

pessoa humana, e o que diz respeito aos direitos da personalidade e a forma em que

foram contemplados pela Carta Magna e mais precisamente com o advento do Código

Civil de 2002.

Outro tópico a ser abordado é o que diz respeito aos critérios adotados

para o arbitramento do dano moral.

Adentrar-se-á ao capitulo destinado na contenção da denominada

indústria do dano moral, enfatizando a resistência do judiciário no tocante a reparação

como forma de preservar o instituto e o papel do Superior Tribunal de Justiça no

controle das verbas indenizatórias do dano moral, como forma de se evitar o

enriquecimento sem causa.

Por fim, o presente trabalho demonstrará a crescente demanda por este

tipo de pleito e consequentemente sua banalização devido à falta de parâmetros para se

arbitrar o quantum indenizatório.

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CAPITULO I RESPONSABILIDADE CIVIL

Atos humanos podem lesionar direitos alheios, havendo assim, a

necessidade de reparação. Os comportamentos ajustados ao direito, em consonância

com o que prescreve o ordenamento jurídico, são comportamentos lícitos. Ao contrário,

o comportamento em desacordo com o direito configura o ilícito.

A idéia do ilícito sempre esteve relacionada à responsabilidade do agente

desde os tempos mais remotos. Naquela época existia a composição por meio da

vingança a qual importava na reparação de um dano com prática de outro, equiparando-

se um delito a outro, tendo como base à lei de Talião (olho por olho, dente por dente).

Devido a estes fatos fez-se necessário a interferência do ordenamento

jurídico estabelecendo deveres para não prejudicar ninguém e assim conter o ilícito. O

direito corresponde um dever jurídico, o descumprimento deste dever causará uma lesão

ao direito de outrem e, normalmente, acarretará um dano, um prejuízo a alguém, que

merecerá reparação.

Nesse sentido, todos têm o dever jurídico que diz respeito a uma conduta

externa imposta pelo Direito Positivo para se viver em sociedade, devemos nos

comportar de determinado modo, sob pena de agindo ilicitamente, recebermos

determinadas sanções e ainda, ficarmos obrigados a recompor os danos decorrentes da

atuação antijurídica.

A existência de comandos obrigatórios acarreta o surgimento de deveres a

serem cumpridos, estes são os deveres jurídicos originários. Ocorre que da violação da

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norma surge, na maior parte das vezes, um prejuízo que atinge a terceiros, prejuízo este

ao qual denominamos “dano”.1

Assim, da violação de um dever jurídico obrigatório que acarreta dano a

outrem, gera um novo dever jurídico, qual seja, o de reparar, configurando o dever

jurídico sucessivo.

Esta é a noção de responsabilidade civil, ou seja, constata-se um dever

jurídico originário que, se violado, determina um dever jurídico sucessivo, que é o de

indenizar o dano.

Este instituto é exatamente o âmbito de estudo das obrigações decorrentes

do dever jurídico sucessivo de indenizar o prejuízo causado pela atuação ilícita, não há

obrigação de indenizar se o prejuízo não deriva da violação de uma obrigação

originária.

A par disso, responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo que surge

para recompor o dano da violação de um dever jurídico originário.2

Inobstante isso, é importante distinguir que, a responsabilidade é um dever

jurídico sucessivo e a obrigação é um dever jurídico originário, que em decorrência da

violação deste, gera o instituto da responsabilidade.

Mas algumas questões têm provocado infindáveis discussões, mormente, a

da indenização e quem é o responsável.

Para se chegar à indenização deste prejuízo suportado é necessário conhecer

a responsabilidade civil, que tem o objetivo de reparar.

As interações sociais e as rejeições à perdas, fazem com que a

responsabilidade civil gere fórmulas eficientes para a satisfação dos interesses dos

lesados. Condutas comissivas ou omissivas podem romper o equilíbrio dessas interações 1 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 24 2 Ibidem, CAVALIERI FILHO. p. 24

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sociais, onerando materialmente ou moralmente os lesados. Diante disto, o agente

causador deve suportar através deste instituto os efeitos que lhe são imputados a sua

conduta lesiva.

Para sabermos quem é o responsável, é necessário identificar a quem a

norma atribuiu a obrigação, o dever jurídico originário, pois ninguém pode ser

responsabilizado, dever jurídico sucessivo, por algo sem ter violado um dever jurídico

preexistente.

E ainda, é preciso saber se o prejuízo experimentado pela vítima deve ou

não ser reparado por quem causou o dano. Em caso positivo, deve ser verificado em que

condições e de que maneira este prejuízo deve se reparado. A isto se presta a teoria da

responsabilidade civil.

Nesse sentido, para se chegar à responsabilidade civil é necessário que

ocorra o dano. Induz este instituto a demonstração do resultado lesivo, a ocorrência do

dano, para se buscar a justiça e assim, a sua reparação.

Dano é, neste contexto, a lesão causada a um patrimônio ou ofensa a um

bem juridicamente protegido, quer seja contratual, quer seja extracontratual, causado

por dolo ou por culpa do agente, genericamente.3

Havendo dano, ocorrido na esfera alheia, surge a necessidade de reparação,

como imposição natural da vida em sociedade e para o desenvolvimento tranqüilo das

relações sociais.

Nesse sentido, a responsabilidade civil encontra suas raízes no princípio

fundamental do “neminem laedere” (não prejudicar a outrem), justificando-se diante da

liberdade e da racionalidade humana, como imposição, portanto, da própria natureza das

coisas. Ao escolher as vias pelas quais atua na sociedade, o homem assume os ônus

3 ZENUN, Augusto. Dano moral e sua reparação. 6ºed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p.68.

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correspondentes, apresentando-se a noção da responsabilidade como corolário de sua

condição de ser inteligente e livre.4

1.1 CONCEITO

A teoria da responsabilidade civil tem grande importância no direito

brasileiro, conforme Nelson Godoy Bassil afirma:

A responsabilidade civil consiste na obrigação de uma pessoa indenizar o prejuízo causado a outrem quando há prática do ato ilícito. A teoria da responsabilidade civil foi criada para alcançar as ações ou omissões contrarias ao direito, que geram para o seu autor a obrigação de reparar o dano ocasionado. Nasce, assim, a teoria da responsabilidade civil, que constitui a obrigação pelo qual o agente fica obrigado a reparar o dano causado a terceiro.5

E ainda, segundo Maria Helena Diniz:

A palavra responsabilidade, segundo vocabulário jurídico, origina-se do vocábulo responsável, do verbo responder, do latim respondere, que tem o significado de responsabilizar-se, vir garantindo, assegurar. Assumir o pagamento do que se obrigou, ou do ato que praticou. O termo “civil” refere-se ao cidadão, assim considerado nas suas relações com os demais membros da sociedade, das quais resultam direitos a exigir e obrigações a cumprir. Assim, responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ele mesmo praticado, por pessoa por quem ele responde, por alguma coisa a ele pertencente ou simples imposição legal. Portanto, verifica-se a existência de requisitos essenciais para a apuração da responsabilidade civil, como ação ou omissão, a culpa ou dolo do agente causador e o nexo de causalidade existente entre o ato praticado e o prejuízo decorrente.6

Assim, para este instituto, sendo comprovado o dano, cabe a

responsabilização civil do agente causador, devendo ser reparado o dano sofrido, pois a

conseqüência jurídica do ato ilícito é a obrigação de indenizar. Desta forma, a

responsabilidade civil é o ressarcimento dos prejuízos causados a quem sofreu a lesão.

4 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais. 7ºed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 20-21. 5 MOLON apud MONTEIRO, Carlos Edison do Rego Filho. Elementos de responsabilidade civil por dano moral. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 21 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil. 16.ed. São Paulo:Saraiva, 2004. p.33 e 34

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1.2 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL

A responsabilidade civil, por ter como fato gerador o ato ilícito, divide-se

em responsabilidade contratual e extracontratual.

Assim, a obrigação de reparar o dano surge a partir do descumprimento

obrigacional, seja porque o devedor deixa de cumprir um contrato, ou ainda, por não

observar o sistema normativo que regulamenta a sua vida em sociedade.

A responsabilidade contratual advém de uma relação contratual, ou seja,

existe um vínculo obrigacional, e uma vez descumprido esta obrigação, há o dever de

indenizar. O agente descumpriu o acordado tornando-se um inadimplente, nesta, a

ilicitude consiste na quebra deste contrato.

1.3 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL

Já no tocante a responsabilidade extracontratual ou aquiliana, esta ocorre em

virtude de um descumprimento de um dever jurídico imposto por lei, ou seja, quando há

inadimplemento normativo, que por sua vez pode ser subjetiva (com culpa do devedor)

ou objetiva (sem culpa do devedor), que veremos na seção a seguir.

Assim, quando houver conduta em desconformidade com um dever previsto

no ordenamento jurídico, causando dano a outrem, configura-se a responsabilidade

extracontratual, em razão deste ato ilícito, haverá reparação.

Na responsabilidade extracontratual infringe-se um dever legal, não

existindo nenhum vínculo jurídico entre as partes, o dever de indenizar surge da

violação de dever originário estabelecido pelas normas em função do interesse social e

da preservação de determinados bens jurídicos.

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A responsabilidade extracontratual, em nosso ordenamento se ampara nos

artigos 186 e 187 do Código Civil, “aquele que, por ação ou omissão voluntária,

negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que

exclusivamente moral, comete ato ilícito”.7

“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede

manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou

pelos bons costumes”. 8

Os supracitados artigos em conjunto com o artigo 927 do referido diploma

legal, encerram qualquer argüição existente sobre a responsabilidade extracontratual,

assim, ocorrendo o ato ilícito, o agente causador do dano, agindo com culpa (lato sensu)

ou independente deste, deverá repará-lo.

1.4 RESPONSABILIDADE OBJETIVA

Conforme referido anteriormente, o descumprimento de um preceito legal

faz com que ocorra um ilícito e, conseqüentemente o dever de reparação em prol

daquele que suportou o dano. Ocorre que, a transgressão deste dever jurídico pode ser

por culpa do agente ou independentemente de culpa, trata-se da responsabilidade

subjetiva primeiramente e, por conseguinte a responsabilidade objetiva.

Com o advento do novo código civil, surgiu responsabilidade objetiva ou

teoria do risco, assim, lei impõe a certas pessoas, em determinadas situações, a

reparação de um dano cometido sem culpa.

Quando isto acontece, diz-se que a responsabilidade é objetiva, porque

prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria 7 BRASIL. Constituição Federal, código Civil, código de processo civil.Organizado por Yussef Said Cahali. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 8 Ibidem, p. 299

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dita objetiva, ou do risco, tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser

reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independentemente de

culpa.9

Logo, a culpa é irrelevante para configurar o dever de indenizar, sendo que

em alguns casos ela é presumida pela lei, ou seja, sob o prisma do dever de não

prejudicar, porém, é indispensável a relação de causalidade, uma vez que não pode

responsabilizar a quem não tenha dado causa ao evento danoso.10

Neste sentido, entende Rui Stocco:

A doutrina objetiva, ao invés de exigir que a responsabilidade civil seja resultante dos elementos tradicionais (culpa, dano, vínculo de causalidade entre uma e outro) assenta-se na equação binária cujos pólos são o dano e a autoria do evento danoso. Sem cogitar a imputabilidade ou investigar a antijuricidade do fato danoso, o que importa para assegurar o ressarcimento é a verificação se ocorreu o evento e se dele emanou prejuízo. Em tal ocorrendo, o autor do fato causador do dano é o responsável.11

O Código Civil, em seu artigo 927, Parágrafo único, in verbis, não deixa

dúvidas a respeito da adoção de uma cláusula geral de responsabilidade objetiva.

Artigo 927 - Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.12

A teoria da responsabilidade objetiva sustenta que, o agente é responsável

por riscos que sua atividade possa causar, mesmo que tenha todo o dever de cuidado

para evitar o dano, pois, este obtém vantagens em razão dessa atividade desenvolvida, e

em contrapartida nada mais justo que suportar o dever de indenizar os danos que

possam ocorrer.

9 STOCCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p. 39 10 CAVALIERI, Sérgio Filho. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p.143 11 Ibidem,STOCCO. p. 52 12 Ibidem, BRASIL. P. 385

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Outrossim, a responsabilidade objetiva veio cumprir plenamente a omissão

que a responsabilidade pela culpa ou subjetiva deixou, permitindo reparar o dano

sofrido, independentemente de culpa.

1.5 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA

Já no tocante a responsabilidade subjetiva, esta é fundamentada na culpa,

ou seja, para o agente ser responsabilizado pelo seu ato ilícito, faz-se necessário a

comprovação da culpa, esta em sentido amplo, assim, incluindo o dolo, assim, a conduta

do agente deve ser contrária ao ordenamento jurídico, isto é, reprovável, para que possa

ser responsabilizado, e esta conduta pode ser uma ação ou omissão.

Assim dispõe a doutrina:

A culpa, para os defensores da teoria da responsabilidade civil subjetiva é o elemento fundamental para determinar o dever do ofensor de reparar o dano. Assim, para que determinada pessoa seja obrigada a indenizar o prejuízo causado a outrem, por sua atitude, é necessário que esta tenha emanado de sua consciência, ou seja, que tenha sido intencional, caracterizando o dolo; ou ainda, que esta pessoa tenha descumprido seu dever de bom pater familiae, agindo, com negligência, imprudência ou imperícia.13

Para esta teoria, se o dano não estiver origem em um comportamento

culposo ou doloso do agente, não se perfaz a obrigação de indenizar.

Essa teoria está confirmada no artigo 186 do Código Civil, o qual

conceituou a culpa em um sentido amplo: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária,

negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que

exclusivamente moral, comete ato ilícito”.14

13 Ibidem,STOCCO. p.55 14 Ibidem, BRASIL. P. 299

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Portanto, na responsabilidade subjetiva, o comportamento do agente

contrário a norma jurídica, deverá ressarcir o prejuízo, se for provado pelo lesado o dolo

ou culpa nesta conduta.

Posto isso, a grande decorrência da responsabilidade fundada na culpa, de

caráter subjetivo, é que a vítima só lograria configurar a responsabilidade do

transgressor, imputando-lhe a obrigação de indenizar, caso conseguisse provar a sua

culpa, o que, pela dificuldade, nem sempre é possível.

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CAPITULO II ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

A regra geral do direito é no sentido de não causar dano, uma vez este

ocorrendo, o causador tem o dever de reparar. Assim, a responsabilidade civil impõe a

obrigação de reparar o prejuízo suportado pela vitima, ainda que não envolva a

responsabilidade contratual ou extracontratual.

Com isso, para a caracterização do direito a reparação depende da

ocorrência de alguns elementos: a conduta, o nexo causal e o dano, que são os

pressupostos da responsabilidade civil, uma vez estes elementos não ocorrendo, não há

que se falar em responsabilidade, ou seja, no dever de reparar.

2.1 CONDUTA

A responsabilidade do ofensor configura-se em sua conduta, conduta esta

que deve interferi no direito de outrem, ou seja, um comportamento lesivo voluntário ou

não.

Assim, essa conduta culposa é o primeiro elemento da responsabilidade

civil, uma vez que sem este elemento não poderá ser caracterizado um comportamento

passível de reparação.

Portanto, a partir do momento desta conduta, que causa dano a outrem,

ocorre o ato ilícito, assim, o dever de indenizar, consoante artigo 186 c/c 927 do Código

Civil.

2.2 DANO

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O segundo elemento caracterizador da responsabilidade civil é, o dano,

assim, a interferência indevida de alguém nos direitos alheios, trazendo-lhe lesões,

configura o dano.

O dano é, o elemento primordial deste instituto, pois a sua não ocorrência,

não há que se falar em responsabilidade, logo, em reparação.

A indenização sem dano importaria em enriquecimento ilícito, e o intuito do

instituto da responsabilidade civil, é reparar o prejuízo sofrido pela vitima, e se esta não

sofreu nenhum prejuízo, não há o que indenizar.

Nesse sentido, conceitua Cavalieri:

O dano é subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, que se trate de um bem integrante da própria personalidade da vitima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc.15

Assim, este elemento é essencial para fixar o dever de indenizar.

2.3 NEXO DE CAUSALIDADE

O último elemento a ser analisado é o nexo de causalidade, ou seja, se o

agente deu causa ao resultado danoso, vale dizer, se existe relação de causalidade entre

o dano experimentado pela vitima e a conduta do agente, uma vez que ninguém pode ser

responsabilizado por algo que não fez.

Assim, não é suficiente que alguém tenha cometido um ato ilícito e outrem

tenha sofrido um dano, mister, que este dano tenha sido causado pela conduta ilícita

deste agente, logo, uma relação de causa e efeito.

15 Ibidem, CAVALIERI FILHO. p. 89

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Para Carlos Roberto Gonçalves, o nexo de causalidade pode ser

conceituado:

É a relação de causa e feito entre a ação ou omissão do agente e o dano verificado. Vem expressa no verbo "causar", utilizado no art. 186. Sem ela, não existe a obrigação de indenizar. Se houve o dano, mas a sua causa não está relacionada com o comportamento do agente, inexiste a relação de causalidade e também a obrigação de indenizar.16

Assim, uma vez ocorrido o prejuízo, mas sua razão não tem relação com a

conduta do agente, inexiste relação de causalidade, ou seja, nexo causal, logo, obrigação

de indenizar.

2.4 O DANO E SUAS DISTINTAS CATEGORIAS:

2.4.1 Dano material e Dano moral

Após a definição do que seja o dano, é importante distinguir o dano moral e

o dano material, estes são categoria dos danos reparáveis.

O dano material é o dano passível de avaliação econômica, ou seja, é a lesão

a um bem integrante do patrimônio do ofendido, e conseqüentemente sua redução

patrimonial, e este tem como dizer o quanto perdeu pela conduta ilícita do agente, é o

dano que causa uma perda pecuniária.

Assim, o dano material atinge bens do patrimônio da vitima e, esta categoria

de dano pode ser reparado diretamente quando o agente restitui o bem deteriorado a

vítima ou, indiretamente através de indenização em dinheiro, pois é possível auferir o

valor do bem.

Já no tocante ao dano moral, e no momento é o que nos interessa, traçarei

alguns conceitos, que entendo ser relevante para o desenvolver do trabalho.

16 GONÇALVES, Carlos Alberto. Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p.27

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Para Yussef Said Cahali, dano moral é “tudo aquilo que molesta gravemente

a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua

personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado”.17

Já para Cavalieri, dano moral é “a lesão de um bem integrante da

personalidade; violação de um bem personalíssimo, tal como a honra, a liberdade, a

saúde, a integridade psicológica, causando dor, vexame, sofrimento, desconforto e

humilhação à vitima”.18

Contudo, o conceito de dano moral deve ser visto pelos olhos da Carta

Magna vigente, que colocou o ser humano no ponto culminante do nosso ordenamento

jurídico, assim, os seus direitos são tutelados pela norma jurídica e conseqüentemente

valorizados.

Logo, não se pode olvidar, que a Constituição por ser a lei maior da Nação

sinaliza a interpretação e aplicação de toda a legislação infraconstitucional, não sendo

possível sua aplicação em desarmonia com a Lei Maior.

Neste sentido, o dano moral por estar inserido no Título II – Dos Direitos e

Garantias Fundamentais da Constituição Federal, esta amplamente amparado na sua

compensação, ainda que seja difícil arbitrar um valor para indenizar a vítima que

suporta esta categoria de dano.

2.5 CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL COMO VIOLAÇÃO A DIREITOS DA

PERSONALIDADE

Após definir o dano moral, é necessário esclarecer o que é Direito da

Personalidade, direito este, que passou a ser tutelado efetivamente com o advento do 17 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 21-22 18 Ibidem, CAVALIERI FILHO. p. 93

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Código Civil de 2002, que acolheu de forma precisa e derradeira o instituto da

compensação dos danos morais ao introduzir o Direito da Personalidade e reiterando a

reparação por dano moral quando houver violação desses direitos, excluindo toda e

qualquer dúvida acerca do assunto.

Assim, para a configuração do dano moral é necessário a violação desses

direitos que estão tutelados no Capítulo II do Código Civil de 2002, juntamente com a

cláusula geral de tutela da pessoa humana consagrado na Constituição vigente.

Inobstante isso, o direito da personalidade e o dano moral já estavam unidos

a partir do advento da Constituição, uma vez que a Carta Magna tratou destes institutos

em seu artigo 5, incisos V e X, que assim dispõe:

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou a imagem; (grifo nosso) X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (grifo nosso) 19

O direito da personalidade ao ser introduzido na Constituição é pelo fato de

se tratar de direitos não patrimoniais, por se tratar de direitos inerente à pessoa, assim,

estando tutelado na Lei Maior como fundamento na Dignidade da pessoa Humana, que

é a cláusula geral de tutela da personalidade.

Assim, a Constituição Federal visa proteger os cidadãos de qualquer ofensa

ao direito da personalidade.

O instituto do dano moral esta definitivamente envolvido na personalidade

do indivíduo, uma vez que a pessoa é valor fundamental para o nosso ordenamento

jurídico, e sendo a pessoa tutelada pela Constituição, a sua ofensa gera o dever de

compensar.

19 Ibidem, BRASIL. p. 21 - 22

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Assim, o direito da personalidade constitui um conjunto de bens integrantes

da personalidade, em que pese, bens que é próprio do ser humano, como a vida, a

liberdade, a honra, a intimidade..., cuja ofensa enseja o dano moral, logo, este instituto

atinge a pessoa, o seu psicológico, pois devido a agressão a este bem integrante da

personalidade, causa-lhe humilhação, sofrimento, vexame, contudo não se restringe

somente a estes sentimentos, abrangendo todos os bens personalíssimos intrínseco e

essencial à pessoa, ligados ao ser humano como tal.

Bom é dizer que, aquele que sofre um dano moral tem direito a uma

compensação, uma vez que não é possível no caso deste instituto ser indenizado, pois a

indenização diz respeito ao dano material, pois tem valor pecuniário, assim, a

compensação por dano moral não tem como atribuir um valor pecuniário, pois trata-se

de bens da esfera do ser humano, não sendo possível mensurar a extensão do dano

sofrido.

Como se nota, o direito da personalidade são direitos subjetivos, assim o

instituto do dano moral visa tutelar objetos que são exclusivamente interiores à

personalidade, sem condicioná-los à expressão econômica.

Com efeito, Maria Celina Bodin de Morais assim conceitua o dano moral:

O dano moral é aquele que independentemente do prejuízo material, fere direitos personalíssimos, isto é, todo e qualquer atributo que individualiza cada pessoa, tal como a liberdade, a honra, a atividade profissional, a reputação, as manifestações culturais e intelectuais, entre outros. O dano é ainda considerado moral quando os efeitos da ação, embora não repercutam na órbita de seu patrimônio material, originam angustia, dor, sofrimento, tristeza ou humilhação à vitima, trazendo-lhe sensações e emoções negativas. Neste último caso, diz-se necessário, outrossim, que o constrangimento, a tristeza, a humilhação, sejam intensos a ponto de poderem facilmente distinguir-se dos aborrecimentos e dissabores do dia-a dia, situações comuns a que todos se sujeitam, como aspecto normais da vida cotidiana.20

20 BODIN DE MORAIS, Maria Celina. Dano à Pessoa Humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 157-158

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Outrossim, a indenização compensatória que resulta da configuração do

dano moral não deve levar ao entendimento de ser a violação dos direitos da

personalidade o objeto exclusivo da tutela jurídica, há de se medir por um padrão

objetivo, ou seja, apreciar cada caso concreto, para ter certeza que aquele dano deve ser

de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária.21

Assim, corroborando o acima exposto, entendem nossos Tribunais:

DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – DIREITO DA PERSONALIDADE. Dispensa-se a prova do prejuízo para demonstrar a ofensa ao moral humano, já que o dano moral, tido como lesão a personalidade, ao âmago e à honra da pessoa, por sua vez é de difícil constatação, haja vista os reflexos atingirem parte muito própria do indivíduo – o seu interior. De qualquer forma, a indenização não surge somente nos casos de prejuízo, mas também pela violação de um direito. STJ – RESP 85.019 – 4º Turma – Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA. Julgado em 10/03/98. 22

Em suma o direito da personalidade juntamente com Constituição, tutelam

valores essenciais da pessoa, assim os ordenamentos jurídicos norteiam normas de

conduta a todos os seres humanos, e uma vez infringindo estas normas jurídicas e

conseqüentemente trazendo danos à pessoa humana, tem o direito de ser compensado.

Contudo, o direito da personalidade não esta só inserida no capitulo II,

artigos 11 a 21 do atual Código Civil, o rol de direitos da personalidade não deve ser

visto como taxativo, uma vez que a ofensa a qualquer modalidade de direito da

personalidade, dentro da variedade que a matéria propõe conforme o caso concreto, e,

em consonância com o que prescreve a Carta Magna, que proclama a dignidade da

pessoa humana como princípio fundamental, ensejara o dano moral.

Neste sentido, deverá o judiciário romper com a visão dada pelo Código

Civil, e ampliar a tutela da pessoa humana não apenas no sentido de admitir uma

ampliação de hipóteses de ressarcimento, mas de maneira muito mais ampla, no intuito

21 VARELA apud CAVALIERI FILHO. p. 98 22 STJ, 4º Turma, Recurso Especial 85019, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 10 mar.1998.

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25

de promover a tutela da personalidade mesmo fora do rol de direitos subjetivos

previstos pelo legislador codificado.

Por todo o exposto, insta salientar que o ordenamento jurídico zela pela

tutela à pessoa humana e à sua dignidade, assim, o objetivo da nossa legislação é

oferecer prioridade máxima à pessoa humana, seja em qualquer situação que diz

respeito a sua personalidade.

Assim, o dano moral não pode ser reduzido à lesão um direito da

personalidade, deve sempre estar relacionado a violação da cláusula geral de tutela da

pessoa humana, seja causando-lhe um prejuízo material, seja violando direito

extrapatrimonial, enfim, praticando, qualquer conduta que traga dano à dignidade.23

Vale ratificar, que o objetivo do instituto do dano moral é a proteção da

pessoa em relação à sociedade no qual esta inserida, logo, qualquer lesão à dignidade

humana será considerada violadora da personalidade e conseqüentemente ensejara

reparação.

Inobstante isso, para configuração do dano moral, não é necessário lesão de

algum direito subjetivo da pessoa, ou causar algum dano a ela, basta a simples violação

de uma situação jurídica subjetiva extrapatrimonial em que esteja envolvida a vítima,

porém, merecedora da tutela jurídica, assim, será suficiente para garantir a sua

reparação.

2.6 DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL E A TUTELA DA DIGNIDADE DA

PESSOA HUMANA

23 Ibidem, BODIN DE MORAIS. p. 184

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Com o advento das Constituições dos Estados democráticos, os princípios

fundamentais dos diversos ramos do Direito, e também os princípios fundamentais do

direito privado, passaram a fazer parte dos textos constitucionais de alguns países.

Assim, o texto básico do código civil transportou-se para o texto da Lei

Maior, com isso, uma das mais promissoras tendências nos estudos de direito civil

aponta para a necessidade em ter a pessoa como fundamento das relações civis,

perdendo o patrimônio a prioridade que sempre desfrutou nas grandes codificações.

Nesse sentido, o patrimônio ou os bens econômicos, assumem o papel

secundário previstos nas normas jurídicas ressaltando que em qualquer fato jurídico que

enseje direito há a necessidade de ter a pessoa afetada por este fato.

Assim, a Constituição vigente é um marco importante no que diz respeito o

reconhecimento da tutela dos direitos da pessoa humana, englobando neste sentido os

direitos da personalidade e os danos morais, pois ambos institutos visam à proteção da

pessoa sem condicioná-los valoração econômica.

Posta assim a questão, o direito civil deve ser interpretado junto com a Carta

Magna, onde traz como principio fundamental a Dignidade da Pessoa Humana, assim, a

lei infraconstitucional deve ser interpretado e aplicado seguindo os delineamentos do

texto constitucional, que visa à proteção da pessoa humana.

Vale confirmar, que a Constituição vigente consagra como fundamento do

seu Estado Democrático de Direito a Dignidade Humana, sendo um principio absoluto,

pois a Dignidade é a expressão de valor da pessoa humana.

Assim, o Direito Civil deve se sustentar em face da ordem constitucional,

devendo ocupar o primeiro plano a dignidade da pessoa humana.

Por Direito Civil Constitucional deve-se entender, na definição de

FLORES-VALDÉS:

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como um sistema de normas e princípios institucionais integrados na Constituição, relativos à proteção da pessoa em si mesma e suas dimensões fundamentais familiar e patrimonial, na ordem de suas relações jurídico-privadas gerais, e concernentes àquelas outras matérias residuais consideradas civis, que tem por finalidade firmar as bases mais comuns e abstratas da regulamentação de tais relações e matérias, nas que são suscetíveis de aplicação imediata, ou que podem servir de ponto de referência da vigência, da validez e da interpretação da norma aplicável da pauta para o seu desenvolvimento.24

Outrossim, assinala Francisco Amaral o fenômeno da constitucionalização

do Direito Civil:

essa constitucionalização significa que os princípios básicos do direito privado emigram do Código Civil para a Constituição, que passa a ocupar uma posição central no ordenamento jurídico, assumindo o lugar até então privilegiadamente ocupado pelo Código Civil, transformando-se este num satélite do sistema constitucional.25

Ademais, cumpre ressaltar que devido a vulnerabilidade da pessoa e

conseqüentemente os direitos da personalidade, há necessidade de normatização dos

direitos das pessoas em prol do princípio da Dignidade Humana, desta maneira

tutelando onde quer que se faça presente essa necessidade, assim, a constitucionalização

do direito civil é essencial. 26

Outrossim, é cediço que os direitos da personalidade esta inserido no

princípio constitucional da Dignidade, uma cláusula geral de tutela da pessoa humana,

vislumbra-se assim, a amplitude deste princípio que juntamente com o instituto do dano

moral, visa a proteção da autoridade moral do indivíduo.

Eis aí a razão pela quais as hipóteses de dano moral são tão freqüentes,

porque a sua reparação está posta para a pessoa como um todo, sendo tutelado o valor

da personalidade humana. Os direitos das pessoas estão, assim, todos eles, garantidos

24 DALLAGNOL, Deltan Martinazzo. A Constitucionalização do Direito Civil. Disponível em: http://www.jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3263. Acesso em: 18 de set. 2010. 25 Ibidem, DALLAGNOL. 26 Ibidem, BODIN DE MORAIS. p. 117

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pelo princípio constitucional da Dignidade Humana, e vêm a ser concretamente

protegidos pela cláusula geral de tutela da pessoa humana. 27

Em suma, segundo a professora Maria Celina Bodin de Moraes a

transposição das "normas-diretivas" do sistema codificado para o interior do texto

constitucional representou nítida relevância:

A transposição das normas diretivas do sistema de Direito Civil do texto do Código Civil para o da Constituição acarretou relevantíssima conseqüência jurídicas que se delineiam a partir da alteração da tutela, que era oferecida pelo Código ao ‘indivíduo’, para a proteção, garantida pela Constituição, à dignidade da pessoa humana, elevada à condição de fundamento da República Federativa do Brasil. O princípio constitucional visa garantir o respeito e a proteção da dignidade humana não apenas no sentido de assegurar um tratamento humano e não-degradante, e não conduz exclusivamente ao oferecimento de garantias à interidade física do ser humano. Dado o caráter normativo dos princípios constitucionais, princípios que contém os valores ético-jurídicos fornecidos pela democracia, isto vem significar a completa transformação do Direito Civil. 28

Assim, pelo exposto é necessário explorar, cada vez mais a extensão dada

pela Carta Magna vigente ao princípio da Dignidade da Pessoa Humana e,

conseqüentemente este princípio conferirá mais valor ao Direito Civil e, por conseguinte

ao ser humano.

27 Ibidem, BODIN DE MORAIS. p. 127 28 Ibidem, BODIN DE MORAIS. p. 74

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29

CAPÍTULO III CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO DO DANO

MORAL

No capítulo anterior, conceituamos o dano moral, inobstante isso, devemos

mencionar que este instituto esta relacionado na esfera da subjetividade, pois atingem os

aspectos íntimos da personalidade humana, reveste-se de caráter atentatório à

personalidade, pois configura-se através de lesões a elementos essenciais da

individualidade.

O dano moral tem como fundamento na necessidade de preservação da

individualidade, a fim de que se mantenham íntegros os valores individuais e sociais da

pessoa humana.

Por lesionar bens integrantes da personalidade a reparação do dano moral

envolve por sua natureza, em qualquer tempo e lugar, uma dificuldade séria em se

estabelecer um equivalente patrimonial ao sofrimento experimentado pela vítima, pois

na sua reparação o dinheiro não assume função de equivalência, uma avaliação

pecuniária como no dano patrimonial.

Assim, a esfera íntima da personalidade não admite esse tipo de

recomposição, pois o mal causado a esse direito, em princípio é irreversível. A

reparação assume o papel apenas de sanção à conduta ilícita do causador do dano,

atribui-se um valor à reparação, com objetivo de atenuar o sofrimento injusto do lesado

e de coibir a reincidência do agente, mas não como eliminação do dano moral. 29

O ordenamento jurídico não estabelece ou fixa um parâmetro previamente

definido para se apurar o valor da indenização por dano moral, devido a este fato deve

29 THEODORO JUNIOR, Humberto. Dano Moral. 4 ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 3

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30

ser verificado cada caso concreto e assim, traçar indenizações que compensem o

prejuízo suportado pela vítima, já que é impossível restabelecer o estado anterior.

3.1 EVOLUÇÃO

Antes da Constituição Federal de 1988, o instituto do dano moral não estava

positivado em nenhum diploma legal, o que levava ao entendimento de que não era um

direito legalmente reconhecido. E, inexistindo direito reconhecido, não havia que se

falar em violação.

Contudo, temos como primeiro indício histórico sobre dano moral nos

Códigos de Hamurabi e de Manu,

O Código de Hamurabi foi o primeiro instrumento codificado de leis que

tratava do dano e de sua reparação, previa ao agressor uma pena na mesma relação de

equivalência do dano causado, “olho por olho, dente por dente” e se admitia também, a

reparação da ofensa mediante pagamento de certo valor em dinheiro, e no Código de

Manu, que preconizou a facultar à vitima de lesões, a oportunidade de ressarcimento

através de pena pecuniária para certos danos extrapatrimoniais. A partir da Lei Aquilia

(286 a.C.) e principalmente com a legislação de Justiniano, houve uma ampliação no

campo da reparabilidade do dano moral.30

Assim, ao longo da história do direito, revelou-se penosa à elaboração da

reparação por dano moral e muito se debateu na doutrina sobre a possibilidade do

ordenamento civil tutelar bens de cunho extrapatrimonial.

Nesse sentido, existiam posições diferenciadas no tocante a reparação do

dano que afeta o direito da pessoa humana, ora o direito da personalidade.

30 Ibidem, p. 3

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31

Assim, existem correntes doutrinárias que defendem a reparação do dano

moral, ora corrente positivista e, outra que rejeita, corrente negativista.

Os negativistas, afirmam que não há normas que garantam a reparação por

dano moral, uma vez que o artigo 159 do Código Civil de 1916 não tratou

expressamente do dano, condenam a existência dos direitos da personalidade,

argumentando que a norma jurídica oferece tutela somente no campo do direito penal,

pois há risco do juiz ao julgar este tipo de dano, uma vez que pode haver uma aparência

enganadora que não se conseguiria desmascarar.

Por fim, argumentam a impossibilidade de se obter qualquer quantia em

dinheiro para compensar este tipo de dano.

Já no tocante a corrente positivista, esta argumenta que o artigo 159 do

código supramencionado, tratou do dano de forma universal, estando o dano moral

incluído, assim, o legislador tratou amplamente da reparabilidade do dano, não cabendo

ao intérprete retirar da lei o que ela não excluiu.31

Assim, é de verificar que para atender os reclames da sociedade ampliou os

bens extrapatrimonais, cuja proteção mostrava-se mais do que necessária. Assim, a idéia

a respeito dos direitos da personalidade passou a ser o principal fundamento do

ordenamento jurídico.

Embora tenha havido abordagem deste instituto já no Código de Hamurabi e

de Manu, foram lentos os passos para que se firmasse a regra da reparabilidade.

No Direito brasileiro, o Código Brasileiro de Telecomunicações – Lei

4.117/62 art. 84 e a Lei de Imprensa 5.250/67 art. 49, I são os primeiros marcos

expressivos, praticando indenizações oriundas de dano moral, essas leis indicavam

parâmetros na reparação neste tipo de dano.

31 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o Direito do Trabalho. 2 ed. São Paulo: LTr, 1996. p. 36

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Outrossim, outras leis tiveram um papel significativo no tocante a reparação

do dano moral, como o Código Eleitoral (Lei 4.737/65 art. 234, §§ 1º, 2º, 3º) e Lei dos

Direitos de Autor (Lei 5.988/73 art. 25 e ss.).

Mas, foi com a promulgação da Constituição Federal de 1988 que

consagrou a regra da reparabilidade, segundo seu art. 5º, incisos V e X.

A importância da cláusula geral de proteção da dignidade da pessoa

humana, contida no art. 1º, inciso III não só estabeleceu a necessidade da reparação

como ainda afastou o tipo de compensação feita pelas Leis mencionadas, deixando o

arbitramento do valor da reparação do dano moral ao bom senso do julgador.

Vale ratificar que após a descoberta dos direitos da personalidade, cresceu a

corrente dos defensores dos direitos essenciais da pessoa humana, em cujo seio assumiu

posição de destaque a plena reparabilidade das lesões à pessoa, na esfera

extrapatrimonial.32

E ainda, a reparação por dano moral tornou-se ainda mais clara quando o

Superior Tribunal de Justiça formulou a súmula 37, que diz: “São cumuláveis as

indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”.33

Logo, tornou-se indiscutível a cumulatividade entre o dano moral e

material, colocando um ponto final acerca deste fato.34

E finalmente com a promulgação do novo Código Civil de 2002,

estabeleceu definitivamente a tutela preventiva e repressiva aos direitos da

personalidade em seu Capítulo II, artigos 11 a 21.

Assim, em consonância com o já prescrito pela Lei Maior e com as novas

relações sociais que reclamam a necessidade da tutela dos valores essenciais da pessoa,

32 Ibidem,THEODORO JUNIOR. p. 4 33 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 37. São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato. In: Vade Mecum. 2 ed. São Paulo: Rideel, 2005. p. 1197 34 Ibidem, CAVALIERI FILHO. p. 97

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dedicou esses artigos supramencionados a proteção aos direitos da personalidade, logo,

cuidam-se de normas que não prescrevem uma certa conduta, mas, simplesmente,

definem valores e parâmetros hermenêuticos. Servem assim como ponto de referência

interpretativo e oferecem ao intérprete os critérios axiológicos e os limites para a

aplicação das demais disposições normativas.35

Outrossim, a doutrina e a jurisprudência auxiliam a todo o momento os

magistrados a encontrar parâmetros para determinar essas indenizações de forma clara,

objetiva e completa, afirmando que o direito da personalidade constitui em direitos

essenciais ao exercício da dignidade da pessoa humana.

Insta salientar que para o arbitramento do dano moral a doutrina e a

jurisprudência preceitua a observância de alguns critérios e, nas palavras do doutrinador

e professor Cavalieri se resume em:

Não resta outro meio mais eficiente do que o arbitramento judicial para a fixação do valor indenizatório do dano moral. O juiz, com prudência, deve atentar para a repercussão do dano e para a possibilidade econômica do ofensor, estimando uma quantia a título de reparação pelo dano moral. Deve ainda o juiz ter em mente o princípio de que o dano não pode ser fonte de lucro. Quantia a maior importará enriquecimento sem causa, ensejador de novo dano. A quantia arbitrada deve ser compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido e as demais circunstâncias que se fizerem presentes.36

Outrossim, esse arbitramento, conforme Maria Helena Diniz, deve-se

pautar em dois critérios:

uma de ordem subjetiva, pelo qual o juiz deverá examinar a posição social ou política do ofendido e do ofensor, a intensidade do animus leadere (ânimo de ofender) determinado pela culpa ou dolo; e outro de ordem objetiva, como a situação econômica do ofensor e do ofendido, o risco criado com a ação ou omissão, a gravidade e a repercussão da ofensa. 37

Nesse sentido, fala-se na doutrina e na jurisprudência em um caráter

punitivo que a reparação do dano moral teria, assim, ao condenar o ofensor a 35 TEPEDINO, Gustavo. A tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional. 4 ed. Rio de Janeiro: Renovar. p. 29 36 Ibidem, CAVALIERI FILHO. p. 106 e 108 37 Ibidem, DINIZ. p. 41

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indenização, o ordenamento jurídico teria em mente não só o ressarcimento do prejuízo

acarretado ao psiquismo do ofendido, mas também estaria impondo uma sanção contra

o culpado com o intuito de inibir ou desestimular a repetição daquele ato.38

E ainda, a Constituição Federal exige a integral proteção da dignidade

humana, afastando qualquer estipulação tarifária, conforme retrata a súmula 281 do STJ.

Assim, o julgador tem o poder de decidir sobre a existência e configuração do dano

moral tendo sempre o bom senso e avaliando o caso concreto.

Como visto, não há critérios objetivos para o arbitramento do dano moral,

este tópico sempre foi deixado ao arbítrio do juiz.

E, nas palavras de Pablo Stolze:

O juiz, investindo-se na condição de árbitro, deverá fixar a quantia que considere razoável para compensar o dano sofrido. Para isso, pode o magistrado valer-se de quaisquer parâmetros sugeridos pelas partes, ou mesmo adotados de acordo com sua consciência e noção de equidade, entendida esta na visão aristotélica de justiça no caso concreto.39

Assim, o arbitramento do dano moral está subordinado ao principio da

motivação das decisões judiciais, consagrado no artigo 93, IX da Carta Magna e ao

princípio da razoabilidade.

Em fim, a doutrina e a jurisprudência adotaram a função punitiva da

reparação do dano moral, embora o Código Civil de 2002 não tenha adotado em

nenhuma de suas disposições. Assim, afirmam que a satisfação do dano moral visa,

além de atenuar o sofrimento injusto, visa prevenir ofensas futuras, fazendo com que o

ofensor não deseje repetir tal comportamento e servir de exemplo, para que tampouco se

queira imitá-lo. A reparação do dano moral detém duplo aspecto, constituindo-se por

meio de um caráter compensatório, para conforta a vítima, ajudando-a a enaltecer as

aflições e tristezas decorrentes do dano injusto, e de um caráter punitivo, cujo objetivo é

38 Ibidem, THEODORO JUNIOR. p. 33 39 STOLZE GAGLIANO, Pablo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 400

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35

impor uma penalidade exemplar ao ofensor, consistindo esta na diminuição de seu

patrimônio material e na transferência da quantia para o patrimônio da vítima.40

3.2 CRÍTICA

A crítica que se tem feito a respeito do critério punitivo para a quantificação

da reparação do dano moral, é no tocante ao princípio constitucional do Devido

Processo Legal garantido na Lei Maior, assim, inviabilizando a garantia da ampla

defesa, também garantido na Carta Magna, logo, gera a insegurança jurídica por não

existir preceito cominatório especifico, não é razoável que se imponha uma sanção

pecuniária a terceiro, sem lhe dar conhecimento do valor da penalidade infligida.

Ao se adotar sem restrições o caráter punitivo, deixando-o ao arbítrio

unicamente do juiz, corre-se o risco de violar o multissecular princípio da legalidade,

segundo o qual nullum crimem, nulla poena sine lege, além disso, em sede civil, não se

colocam à disposição do ofensor as garantias substanciais e processuais.41

Assim, a legislação deve voltar-se para a busca do instrumento que

permitirá alcançar a reparação integral pelo dano sofrido. Se sua dignidade foi

lesionada, tornar-se-ão mais objetivamente apreciáveis os fatores individuais a serem

levados em consideração pelo juízo de reparação. Logo, ficam excluídos os critérios que

tenham como parâmetros às condições econômicas ou nível social da vítima, não se

coadunando com a noção de dignidade, extrapatrimonial na sua essência, quaisquer

critérios patrimoniais para compor o juízo de reparação. Os critérios que não devem ser

utilizados são aqueles próprios do juízo de punição ou de retribuição, isto é, as

condições econômicas do ofensor e a gravidade da culpa. Tais elementos dizem respeito

40 Ibidem, BODIN DE MORAIS. p. 219 41 Ibidem, p.260

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ao dano causado, e não ao dano sofrido. Os critérios indenizatórios dos danos morais

baseados em condições econômicas ou no nível social da vítima ou agressor, bem como

na gravidade da culpa, devem ser substituídos justamente por elementos atinentes às

condições pessoais da vítima e à repercussão social do dano, com vistas a atingir a

reparação integral.42

3.2 ESTÁGIO ATUAL DO ARBITRAMENTO

Atualmente, no estágio da matéria envolvendo a reparação civil do dano

moral, a doutrina vem se orientando no sentido da admissibilidade do sancionar ao

ofensor de maneira diversa do que a obrigação de pagar certa soma em dinheiro desde

que adequada e razoável no caso concreto.

sempre que o agente não tenha bens, ou sejam insuficientes, frustrando-se a reparação do lesado, pode-se lançar mão de sanção não pecuniária, com a submissão pessoal do lesante a obrigações de fazer, ou de não fazer, como, por exemplo, a prestação de serviços, a abstenção de certas condutas, o cerceamento de certos direitos, já utilizadas, há mais tempo, no plano penal como penas restritivas de direito.43

Assim, a medida coercitiva imposta ao ofensor neste tipo de dano deverá ser

objeto de escolha por parte da vítima dentro de certos limites em obediência aos

princípios da razoabilidade. Contudo, o modo mais freqüente de reparação civil do dano

moral, ou seja, o pagamento de prestação pecuniária será através da observância de

certos parâmetros, à luz da Constituição de 1988.

Ao se arbitrar o quantum indenizável ao dano moral, o juiz irá analisar a

situação particular da vítima e a condição pessoal do ofensor para encontrar um valor

42 Ibidem, p. 332 43 NOGUEIRA DA GAMA, Guilherme Calmon. Critérios para a fixação da reparação do dano moral abordagem sob a perspectiva civil-constitucional. Disponível em:<http://www.gontijafamilia.adv.br/tex046htm>. Acessado em: 01 out. 2010.

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justo e que atinja o patrimônio deste, de forma a existir um forte fator de desestimulo

para que não volte a cometer tais erros.

Outrossim, nunca poderá o juiz arbitrar a indenização do dano moral

tomando como base somente o patrimônio do devedor, uma vez que a dor moral é

insuscetível de uma avaliação pecuniária.

A fixação do valor de uma indenização por dano moral corresponde a uma

matéria de aspecto subjetivo, em que caberá ao juiz estabelecer os critérios necessários a

análise do caso concreto, assim, diante da necessidade de proteção à dignidade da

pessoa humana, o magistrado de usar sempre o princípio da razoabilidade e

proporcionalidade ao arbitrar o dano moral.

Quando ocorre lesão ao direito sem aspecto patrimonial, a vitima deve

receber uma soma que compense a dor ou o sofrimento sofrido a título de dano moral.

Nessa linha de princípios, juízes de todo o Brasil, em busca de critérios

mais ou menos uniformes para a determinação do dano moral, unanimemente

aprovaram a seguinte recomendação: “Na fixação do dano moral, deverá o juiz levar em

conta critérios de proporcionalidade e razoabilidade na apuração do quantum, atendidas

as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado”.44

É cediço que no estágio do atual, não qualquer norma legal que possa ser

aplicada, seja através de uma interpretação extensiva, seja de maneira analógica para o

arbitramento do dano moral, de modo a se chegar a um padrão aplicável

indiscriminadamente, em qualquer hipótese de dano moral.

Enveredando por este mesmo caminho, o professor Rodolfo Pamplona

Filho, versando sobre o presente tema, afirma com perfeição: “O que é importante

deixar claro, porém, é que não existe um único critério absoluto, pelo menos no vigente

44 Ibidem, CAVALIERI FILHO. p.109

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ordenamento jurídico positivo, para a quantificação da compensação pecuniária do dano

moral”.45

Outrossim, os critérios adotados na compensação do dano moral variam

muito, contudo, são presenças reiteradas nas decisões judiciais o critério da extensão do

prejuízo, o critério do grau de culpa e o critério relativo à situação econômico-

financeira, tanto do ofensor quanto da vítima.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça chamou para si o controle e

fiscalização do valor arbitrado nas indenizações por dano moral, em razão dos

manifestos e freqüentes abusos na estipulação das verbas indenizatórias. A posição

desta Corte é no sentido de que o valor da condenação deve ser fixado em termos

razoáveis, recomenda-se que o arbitramento deva operar-se com moderação,

proporcionalmente ao grau de culpa, a capacidade econômica das partes e, ainda, ao

valor do negócio, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela

jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento

à realidade da vida e as peculiaridades de cada caso.46

Corroborando o acima exposto assim entendem os tribunais:

DIREITO CIVIL. ATROPELAMENTO COM MORTE. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO. CONTROLE PELO STJ. I – O arbitramento do valor indenizatório por dano moral se sujeita ao controle desta Corte. II – Inexistindo critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação e atendendo às peculiaridades do caso concreto, o que, na espécie, não ocorreu, distanciando-se o quantum arbitrado da razoabilidade. III – Nas reparações por dano moral, como o juiz não fica jungido à importância pretendida pelo autor, ainda que o valor fixado seja inferior ao pleiteado pela parte, não há falar-se em sucumbência recíproca, se os honorários foram fixados com base no valor da condenação, em percentual inferior ao máximo. Recurso especial provido, em parte.47

45 Ibidem, PAMPLONA FILHO. p. 400 46 STJ, Recurso Especial 171084/MA, 4 Turma, Relator Ministro Sálvio Figueiredo Teixeira. Julgado em 05 out. 1998 47 Ibidem, Recurso Especial 615939/RJ, 3 Turma, Relator Ministro Castro Filho. Julgado em 18 nov. 2004

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Pelo exposto, o arbitramento sempre está à mercê de uma apreciação

judicial que levará em conta a proporcionalidade e a razoabilidade para a sua fixação,

assim como que o valor dos danos morais arbitrados na sentença obedeceu o critério do

proporcional/razoável, segundo os parâmetros da Corte.

Outrossim, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o julgador não está

obrigado a fundamentar sua decisão, segundo os interesses e conveniência da parte e

que não há omissão por falta de exame de todas as questões que lhe foram submetidas,

bastando referir-se ao que seja o adequado à decisão proferida.48

48 Ibidem, Recurso Especial 138.376RS, 2 Turma, Relator Ministro Francisco Peçanha Martins. Julgado em 10 abr. 2000

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CAPÍTULO IV A NECESSIDADE DE CONTENÇÃO DA

DENOMINADA INDÚSTRIA DO DANO MORAL

As dificuldades em não se ter parâmetros específicos para a valoração do

dano moral, faz com que surjam incertezas ao ser arbitrar as indenizações neste tipo de

pleito.

O magistrado tem o livre arbítrio para exarar sua decisão, usando sempre o

bom senso prático e os princípios da proporcionalidade e razoabilidade no caso

concreto.

Contudo, mesmo usando desses atributos para se fixar um quantum

debeatur neste tipo de dano, tem ocorrido uma proliferação de demandas assoberbando

o poder judiciário, sendo assim, de tarefa árdua para os magistrados no arbitramento da

indenização do dano moral.

Insta salientar que por ser o arbitramento da indenização do dano moral ato

exclusivo do juiz, ocorre reiteradamente abusos na estipulação das verbas

indenizatórias.

Assim, o instituto transformou-se em um objeto de inúmeras ações que

visam unicamente o enriquecimento e não a compensação do dano sofrido.

Bom é dizer que essa procura desregrada por este pleito configura a

chamada “indústria do dano moral”, onde há um alto número de demandas nas quais

pessoas alegam a lesão ao direito da personalidade por qualquer situação cotidiana

buscando um lucro indevido e outro no sentido altíssimo de indenizações baseadas em

decisões com valores absurdos.

Neste sentido, tudo passou a ser matéria de reparação por dano moral, não

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servindo o instituto para compensação e sim para o enriquecimento sem causa, gerando

enorme desagregação social.

Assim, o doutrinador Paulo Maximilian em sua obra afirma:

O direito de todo cidadão acessar o Poder Judiciário se vê atualmente manchado por um incontável número de ações absurdas e ridículas, em que os autores postulam as mais exóticas providencias do julgador. Tais demandas mais servem ao anedotário jurídico do que à efetiva satisfação de interesses da sociedade. Daí por que é de se festejar o surgimento de decisões jurisprudenciais que vêm repelindo as inviáveis ações de indenização por dano moral, sob a alegação de que pequenos desconfortos do cotidiano não constituem motivos suficientes para esta pretensão. Advogados, juízes e professores devem trabalhar para pôr fim a indústria do dano moral, reservando a sua aplicação para as hipóteses devidamente justificadas. 49

Outrossim, mister se faz ressaltar que a exposição de que todo e qualquer

contratempo, aborrecimentos por motivos irrelevantes vividos dia-a-dia pelo cidadão

são indenizáveis, faz com que o instituto perca sua credibilidade, logo, esta enxurrada

de ações impede que o judiciário julgue casos importantes trazendo prejuízo para quem

realmente detém o direito.

Neste sentido, para que haja a real necessidade do pleito compensatório do

dano moral, se faz necessária à conscientização da sociedade e o caráter punitivo-

pedagógico deste instituto. Deve-se pedir ressarcimento tão-somente quando houver

efetivamente o dano, a agressão à dignidade humana.

Cumpre destacar o posicionamento do doutrinador Cavalieri:

A prevalecer à tese de que sempre que houver mora ou qualquer contratempo num contrato, haveria o dano moral respectivo, estaríamos gerando uma verdadeira indústria dessas ações. Em breve teríamos um Tribunal para decidir causas, e um Tribunal especializado, talvez denominado Tribunal do Dano Moral. A vida vai ser insuportável. O direito existe para viabilizar a vida, e a vingar a tese generosa do dano moral sempre que houver contratempo, vai culminar em truncá-la, mercê de uma criação artificiosa. Num acidente de trânsito haverá dano material, sempre seguido do moral. No atraso do vôo haverá a tarifa, mas o dano moral será maior. Nessa nave do dano moral em praticamente todas as relações

49 SCHONBLUM, Paulo Maximilian Wilhelm. Dano Moral: questões controvertidas. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p.130

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humanas, não pretendo embarcar. Vamos atingir os namoros desfeitos, as separações, os atrasos nos pagamentos. Ou seja, a vida, o serviço dos profissionais do direito. Se a segurança jurídica também é valor supremo do direito, devemos pôr em prática mecanismo tal que simplifique a vida, sem se estar gerando um estado generalizado de neurose do suspense. 50

Por oportuno, vale lembrar que a industrialização deste instituto agravou-se

com o surgimento dos Juizados Especiais Cíveis, pois a facilidade de pleitear “supostos

direitos” sem ter que pagar custas e honorários advocatícios e, mesmo que venha a

perder o processo pagar a parte contrária, desde que não apresente recurso, faz com

cresça a demanda pleiteando este tipo de dano.

Assim, qualquer situação que o cidadão ache que foi ferido em seu direito

da personalidade e que veja que não tem nada a “perder” e, que pode até “ganhar”,

ingressa com ação pleiteando a compensação por danos morais, assim, banalizando o

instituto.

4.1 PLEITOS AVENTUREIROS E A NECESSIDADE DE CONTROLE PELO

JUDICIÁRIO DA CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE PELO DANO

EXTRAPATRIMONIAL

Devido a grande divulgação deste instituto, através dos profissionais da área

jurídica e dos veículos de reportagem, bem como a Lei que protege o consumidor, que

de forma equívoca revelam que da ocorrência de um contratempo, transtorno que seja

vivenciado pelo cidadão será indenizável na órbita da justiça e em valores bastante

elevados, fez criar uma expectativa de um direito que não existe.

É cediço, que pessoas de caráter duvidoso, que procuram levar vantagem em

tudo, usam do instituto do dano moral, como forma de enriquecer, ou pelo menos

50 Ibidem, CAVALIERI FILHO. p. 98

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adquirir um ganho. Assim, transformam o Poder Judiciário em um balcão de negócios,

onde profissionais insaciáveis inventam ações com o intuito auferir lucros, ora receber

seus honorários.

Mister demonstrar casos exemplares a seguir:

Um indivíduo que foi processado por fingir-se de policial, após ser absolvido, tentou extorquir um milhão e meio de reais de empresa às quais acusava de causadora de danos morais. O individuo, que na inicial se autoqualificava como “desportista amador”, acusado até de tentativa de assassinato, encontrou quem patrocinasse sua aventura jurídica, como se não fosse o advogado o “primeiro juiz da causa” e pudesse esquecer-se do solene juramento que fez ao ingressar na profissão que a Carta Magna diz ser indispensável à administração da Justiça. Certo consumidor, fraudando a embalagem de um produto, nela introduziu um inseto e, bem depressa, cuidou de processar a industria, pleiteando enorme indenização. Repórteres desavisados e sensacionalistas logo cuidaram de dar grande destaque à farsa, como se fato fosse, denegrindo impunemente o nome de tradicional empresa. Corrigir os danos causados por tal tentativa de extorsão custou uma pequena fortuna à empresa, o que, provavelmente, teve que ser repassado aos seus custos. Em síntese: pela ação de um aventureiro sem caráter, muitos outros consumidores foram transformados em vítimas, quando o preço da mercadoria teve que absorver o custo do episódio. 51

Neste sentido, indivíduos que se valendo da Lei e profissionais sem

reputação ingressam com aventuras jurídicas milionárias abalando o crédito do instituto

do dano moral, que é uma das ferramentas do direito privado que serve para a tutela dos

direitos de personalidade, que tem a função punitivo-pedagógico, preservando a

dignidade da pessoa.

Diante da possibilidade de um “ganho fácil”, pessoas se colocam vítimas de

danos morais e tudo fazem com o intuito principal, que é a indenização. Outrossim,

provocam situações para se tornarem ofendidas, criando, assim, condições para o pleito

ressarcitório.

Essas situações do uso indiscriminado do dano moral são agravadas perante

os Juizados Especiais, uma vez que estes concedem os pedidos da parte sem qualquer

51 HAIDAR, Raul. Como os aventureiros acampam no Palácio da Justiça. Consultor Jurídico, 16 jun.2004. Disponível em: <http://conjur.estadão.com.br/static/text/36481,1>. Acessado em 19 out.2010

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critério, pois o que se pretende é a celeridade processual, recomenda-se, na verdade, que

o valor seja fixado desde logo, buscando dar solução definitiva ao caso e evitando

inconvenientes e retardamento na solução jurisdicional, assim, banalizando o instituto.

Assim, num enorme universo de pessoas, há indivíduos que se socorrem do

poder jurisdicional cuja falta de padrões éticos faz com que tentem melhorar sua

situação por meio de temerárias aventuras jurídicas.52

A par disso, o Judiciário tem controlado as indenizações por este tipo de

pleito, fixando verbas proporcionais ao caso em si, deixando claro o caráter punitivo-

pedagógico do instituto do dano moral.

O pedido indenizatório deve ser moderado por uma pretensão justificada,

marcada pela razoabilidade, e se assim não for, poderá correr os sérios riscos dos efeitos

de ser condenado em litigância de má-fé, além, da improcedência do pedido.

Para corroborar a matéria supramencionada, mister mencionar recente

decisão:

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SERVIÇO POSTAL. CORRESPONDÊNCIA DEVOLVIDA. ALEGAÇÃO DO AUTOR DE QUE TERIA HAVIDO EQUÍVOCO DA PRESTADORA. CARTA ENDEREÇADA DE FORMA INCOMPLETA. FALHA DO SERVIÇO NÃO CONFIGURADA. LITIGANTE HABITUAL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CARACTERIZADA. SENTENÇA MANTIDA.53

Outrossim, o que busca o Judiciário é a preservação do instituto, impedindo

que absurdas indenizações convertam o causador do dano à condição de nova vítima ao

ter que suportar uma reparação excessiva e assim, recorrer novamente ao Poder.

Com isso, os magistrados ficam avessos a concessão da indenização, pois

causas absurdas ocupam seu tempo, quando a sua real finalidade é fazer justiça, bem

como, levam a inúmeras reformas de sentença devido ao indiscriminado número de

52 Ibidem, SCHONBLUM. p. 131 53 JFRJ. Turma Recursal, Recurso Inominado de sentença cível nº 2005.51.68.005055-0/01. Rel Juíza Federal Jane Reis Gonçalves Pereira. Julgado em 09 ago.2006

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ações pleiteando o dano moral, vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. SITUAÇÃO VEXATÓRIA.COMPROVAÇÃO. A Constituição Federal consagrou a proteção ao Dano Moral, entretanto, é preciso que a circunstância causadora de tal dano seja comprovadamente vexatória, fugindo a normalidade, interferindo intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflição, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar, de modo a evitar sua BANALIZAÇÃO. Recurso desprovido.54

Com razão o Judiciário, tem se mostrado irredutível no tocante as

indenizações pelo dano moral, pois o que se pretende é preservação do instituto, bem

como corrigir eventuais distorções a respeito da sua aplicabilidade.

Assim, cabe trazer a orientação prolatada pelo STJ: É de repudiar-se a

pretensão dos que postulam exorbitâncias inadmissíveis com arrimo no dano moral, que

não tem por escopo favorecer o enriquecimento indevido.55

Os demais Tribunais pátrios são unos ao prescreverem o mesmo

posicionamento: dano moral arbitrado como prudente arbítrio, não sendo fonte de

enriquecimento.56

Nesse sentido, o Poder Judiciário vem procurando conscientizar a população

ao pleitear indenização por dano moral, pois desafogará o judiciário e permitirá que

questões relevantes sejam tratadas e dirimidas, melhorando cada vez mais as relações

entre a Justiça e o cidadão, assim, beneficiando a todos.

4.2 A CORRETA CONFIGURAÇÃO DOS DANOS MORAIS COMO VIOLAÇÃO

AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Vários são os conceitos do instituto do dano moral e a maneira de que como

pode ser projetado na esfera pessoal do indivíduo, e o que caracteriza este tipo de dano é

54 TJ-RJ, 8ª Câmara Cível, Apelação Cível 2000.001.11773. Rel. Des. Jorge Luiz Habib. Julgado em 10 out.2002. 55 STJ. 4ª Turma. Ag 108923/SP. Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Julgado em 29 out. 96. 56 TJ-SP, Câm.Cível. apelação Cível 016.547-4. Rel. Des. Ney Almada. Julgado em 01 abr. 97

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a conseqüência de algum ato que cause dor, angustia, aflição física ou espiritual ou

qualquer padecimento infligido à vítima em razão de algum evento danoso. Contudo, o

dano moral, não pode ficar circunscrita à vulneração de sentimentos, sob pena de que

todo comportamento humano possa ensejar indenização.57

Assim, para a correta configuração do dano moral como violação dos

direitos da personalidade, o dano tem que ocorrer além do afetivo e da lesão aos

sentimentos, pois alterações de espírito, como tristeza, angústia, vergonha, são formas

comuns e constantes de se expressar, logo, o dano moral não deve ficar preso na aflição

e as modificações do ânimo do ser humano, pois se este estiver em dia “deprimido”,

qualquer fato que ocorra com ele será motivo para pleitear indenização por dano moral.

O dano moral é a afetação espiritual do sujeito que devido a um ato ilícito, o

nexo causal e o dano, que é o elemento mais importante, ocasione a obrigação de

indenizar.

A apreciação do dano deve ser feita diante do que realmente aconteceu, ou

seja, avaliação do caso concreto, considerando a índole do fato lesivo e sua repercussão

na tranqüilidade da vítima.

Visto dessa forma, não é qualquer constrangimento, qualquer percalços da

vida comum, que enseje a configuração do dano moral.

Vejamos o posicionamento dos Tribunais a respeito da configuração do

dano moral:

DIREITO DO CONSUMIDOR. OFERTA DE PRODUTO. MALA DIRETA. PROPAGANDA ENGANOSA. NÃO CONFIGURAÇÃO. O consumidor apenas recebeu correspondências do fornecedor contendo oferta de produto por mala direta e ainda a chance de participar em concursos de distribuição gratuita de prêmios, se sorteado. O contexto de cada correspondência a despeito de incitar o consumidor a adquirir o produto, não se afigura propaganda enganosa do fornecedor (não violação das normas do artigo 37, §§ 1 º, 2º e 3º, da lei nº 8.078/90), porquanto esclarece na oferta, com bastante clareza, que o consumidor concorreria ao prêmio se aceitasse a oferta de aquisição da assinatura da revista Seleções do Reader's Digest

57 SANTOS, Antônio Jeová. Dano moral indenizável. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.109

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Demais, ainda que se considerasse o consumidor induzido a erro, por violação da boa fé subjetiva e/ou objetiva faculta-lhe a lei a desistência de aquisição do produto adquirido a longa distância, mediante a utilização de mala direta, por simples arrependimento ancorado em frustração da expectativa do consumidor (art. 49, da lei nº 8.078/90). Por outro lado, o suporte fálico da demanda não evidencia trauma psicológico, nem transcende os limites de aborrecimentos, transtornos, desconfortos, que configurasse situação de danos morais, porquanto tais prejuízos imateriais pressupõem efetiva lesão de sentimento ou malferimento do direito da personalidade. A prova oral no caso sub judice não teria o condão de afastar a improcedência patente, haja vista a prova documental acostada, não havendo prejuízo para o autor, aplicando-se, no caso, o principio pas de nullite sans grief disciplinado no art. 250, parágrafo único, do Código de Processo Civil. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 58 RESPONSABILIDADE CIVIL ABALROAMENTO DE VEÍCULOS. DANOS MATERIAIS. LESÕES CORPORAIS. INEXISTÊNCIA. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO. O desconforto temporário - stress psicológica menor causando aborrecimentos, não constitui lesão a direito da personalidade. A reparação de danos morais pressupõe efetiva lesão corporal ou ofensa a direito de personalidade, situação que não configura lesão de sentimento na previsão da norma do artigo 5º. X da CRFB/88, nem se caracteriza com os aborrecimentos decorrentes dos danos materiais resultantes da colisão de veículos e atraso no pagamento da indenização correspondente aos prejuízos materiais, em valor atualizado, mais juros legais. Não se afigurando, no caso, violação de direito de personalidade, visto que os aborrecimentos experimentados pelos autores, inconformados pelo não ressarcimento dos prejuízos materiais em período razoável, mais o susto no evento, o responsável deve satisfação aos postulantes na esfera moral, pelo conforto da vitória sobre a impunidade, e, na ótica jurídica, apenas a indenização por perdas, e danos à titular do veículo abalroado no campo exclusivo das sanções patrimoniais. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. 59

Assim, para que configure o dano moral é necessário que a ofensa tenha

alguma grandeza e esteja revestida de certa importância e gravidade.

O perfeito entendimento sobre a configuração do dano moral está,

exatamente, no verificar a intensidade do ato ilícito. A figura do homem médio, pode

ser separado daquele que tem uma sensibilidade aguçada da pessoa normal, que não se

gasta facilmente, há de ser buscada nesse tema. Aquele mal infligido no dia-a-dia, não

pode ser considerado dano moral apto a ingressar no mundo jurídico como a prática de

um ilícito suscetível de dar ensejo à indenização.60

58 TJ-RJ, 9ª Câmara Cível. Apel. Cível 2006.001.26928. Des. Rel. Roberto de Abreu e Silva. Julgado em 22 ago.2006 59 Ibidem, 2005.001.41751. Julgado em 31 jan.2006 60 Ibidem, SANTOS. p.112

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O dano moral somente será indenizável, quando houver gravidade no ato

considerado ofensivo ao direito da personalidade. Assim, se o ato gerador do dano

extrapatrimonial não possui capacidade para lesionar sentimentos ou causar dor e

padecimento da esfera íntima, não configura o dano moral passível de ressarcimento.

Para evitar, bem como amenizar abundância de ações que tratam deste tipo

de pleito, pois existe uma verdadeira confusão do que seja a lesão que atinge a pessoa e

do mero aborrecimento, os Tribunais tem orientado que não é qualquer sensação de

desagrado, contrariedade, mágoa que causará indenização, necessário que se prolongue

durante algum tempo e que seja a justa medida de insulto a pessoa humana, ferindo sua

dignidade como pessoa no ambiente em que vive.

Outrossim, existem riscos cotidianos que o ser humano tem capacidade para

tolerar, sem que exista a configuração do dano moral.

Logo, para a configuração do dano moral, este deve atacar um bem jurídico

da personalidade, e deste fato ocorrer uma lesão nos sentimentos, alterando o seu bem-

estar geral, seu ânimo de viver.

4.3 O PAPEL DO STJ NO CONTROLE DAS VERBAS INDENIZATÓRIAS DO

DANO MORAL

Nas quantias fixadas a título de dano moral tem o Superior Tribunal de

Justiça exercido o controle dos valores, ora reduzindo importâncias excessivas, ora

aumentando indenizações consideradas irrisórias.

O STJ entre suas funções tem a de exercer o controle das importâncias

indenizatórias no País, este controle visa evitar exageros ou mesmo aumentar valores

em que não haja proporcionalidade, uma vez que o magistrado ao exarar sua decisão,

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fixou-a sem análise dos parâmetros mencionados, ora a extensão do prejuízo, o grau de

culpa e a situação econômico-financeira do ofensor e da vítima.

Assim, o STJ ao realizar essa função que é também um artifício que

busca a fixação de valores razoáveis, corrige eventuais distorções, evitando que o

ofendido seja reparado insatisfatoriamente da lesão que sofreu, bem como, evitar um

enriquecimento exagerado.

Outrossim, essa mesma Corte, ao estipular quais os valores razoáveis

para cada caso envolvendo o dano moral, buscam fixar um teto para certas lesões,

servindo de referência para os juízos de 1ª e 2ª instancia. Esse sistema é o mais

adequado, pois possibilita um aumento ou redução da verba indenizatória pela mudança

de opinião de julgadores.

No entanto, o STJ decide fundamentalmente no princípio da

razoabilidade e proporcionalidade, com o intuito primordial de caráter punitivo-

pedagógico da reparação.

Assim, são as palavras do Ministro Relator Pádua Ribeiro:

Deve-se atentar aos parâmetros da razoabilidade, ou seja, ponderar as peculariedades do caso concreto e estabelecer valores que possam significar uma compensação à vítima - ainda que precária, pois a dor não se contabiliza - e, ao mesmo tempo, um incentivo para que o ofensor não venha a incidir novamente na conduta indesejada.61

Com isso, o STJ tem norteado as indenizações, verificando caso a caso,

no qual insere a idéia de adequação entre meio e fim.

Há se falar que assim, evitará que a apuração do valor indenizatório se

converta em medida abusiva exagerada. Por tudo isso, o STJ tem atuado nos controles

das indenizações por dano moral, vejamos alguns julgados:

PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - NEGATIVA DE PROVIMENTO - AGRAVO REGIMENTAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - MANUTENÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO - INDENIZAÇÃO -

61 BRASIL, STJ, 3ª Turma, Resp. 168.945. Rel. Min. Pádua Ribeiro. Julgamento em 06 set.2001

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QUANTUM - RAZOABILIDADE - DESPROVIMENTO. 1 - Como cediço, o valor da indenização sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que, na sua fixação, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores e, ainda, ao porte econômico dos réus, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. In casu, o valor fixado pelo Tribunal a quo, a título de reparação de danos morais, mostra-se razoável, limitando-se à compensação do sofrimento advindo do evento danoso. 2 - Agravo regimental desprovido. 62 PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – DANOS MORAIS - QUANTUM - VALOR EXCESSIVO - REDUÇÃO PELO STJ - POSSIBILIDADE REFORMATIO IN PEJUS NÃO CARACTERIZADA - ANÁLISE DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL - USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO STF – AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO - REJEIÇÃO. 1 - Ao estabelecer o montante devido a título de indenização, o Magistrado não fica adstrito ao pedido da parte, tendo em vista que, como é cediço, o valor arbitrado sujeita-se ao controle deste Superior Tribunal de Justiça, quando constatado evidente exagero ou manifesta irrisão na sua fixação, pelas instâncias ordinárias, como ocorrido in casu. Desta forma, não há que se falar em decisão extrapetita. Ademais, devidamente justificada a redução do quantum indenizatório. 2 - Cumpre asseverar que, em sede de recurso especial, a competência desta Corte Superior de Justiça se limita a interpretar e uniformizar o direito infraconstitucional federal, a teor do disposto no art. 105, III, da Carta Magna. Assim sendo, resta prejudicado o exame de eventual violação ao art. 5º, incisos LIV e LV, da CF, sob pena de usurpação da competência atribuída ao Supremo Tribunal Federal. Precedente (AgRg Ag 690.560/MG). 3 - A admissibilidade do recurso especial fundamentado na alínea “a” da Constituição Federal tem natureza especial, porquanto depende do exame da plausibilidade das alegações do recorrente, vale dizer, do mérito da controvérsia, o que, à toda evidência, não implica contradição no julgado. 4 - Embargos de declaração rejeitados.63 ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE – CIVIL – ATO ILÍCITO PRATICADO POR AGENTE PÚBLICO – DANO MORAL – AUMENTO DE VALOR DE INDENIZAÇÃO. 1. O valor do dano moral tem sido enfrentado no STJ com o escopo de atender a sua dupla função: reparar o dano buscando minimizar a dor da vítima e punir o ofensor, para que não volte a reincidir. 2. Fixação de valor que não observa regra fixa, oscilando de acordo com os contornos fáticos e circunstanciais. 3. Aumento do valor da indenização para 300 salários mínimos. 4. Recurso especial provido.64

Em suma, o valor da indenização por dano moral está a mercê desta

Corte, devido ao total descontrole em seu arbitramento, pois este instituto é de suma

62 BRASIL, STJ, 4ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 644512 / RS, 2004/0171368-9. Rel. Min. Jorge Scartezzini. Julgamento em 05 set. 2006 63 Ibidem, EDcl no Resp 537687 64 Ibidem, Resp 839053

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importância por estar associado a insultos à pessoa, ferindo sua dignidade, logo, o que

visa é compensar a vítima, desestimular o ofensor e a sociedade a não cometerem atos

dessa natureza.

Assim, o STJ tem sustendo a importância de o valor da indenização

por dano moral submeter-se sempre ao seu controle, vejamos:

Por maiores que sejam as dificuldades, e seja lá qual for o critério originariamente eleito, o certo é que, a meu ver, o valor da indenização po9r dano moral não pode escapar do controle so Superior Tribunal de Justiça. Urge que esta Casa, à qual foi constitucionalmente cometida tão relevante missões, forneça disciplina e exerça controle, de modo a que o lesado, sem dúvida alguma, tenha reparação, mas de modo também que o patrimônio do ofensor não seja duramente atingido.65

Por tudo isso, esta é uma opção de atuação construtiva do Judiciário

para a produção do melhor resultado, ainda que não seja o único ou mesmo aquele que

mais obviamente resultaria da aplicação mais justa da lei.

65 Ibidem, Resp 53321

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CONCLUSÃO

Com o estudo deste tema, conclui-se que o dano moral é um

instituto de suma importância para ter seu conceito deturpado pela sociedade e pelos

profissionais de má índole da área jurídica.

O dano moral é evidenciado por atos que agridem os direitos da

personalidade, mais especificamente a dignidade da pessoa, assim, o instituto do dano

moral não foi criado para garantir interesses particulares de indivíduos que visam obter

algum tipo de vantagem pecuniária, mas sim garantir os bens supremos valorados na

esfera subjetiva do indivíduo.

No entanto, verifica-se um alto índice de pleitos compensatórios do

dano moral, não com o intuito de amenizar o sofrimento do ofendido e sim como um

meio de se locupletar as custa do ofensor.

Devido este fato, o instituto em questão, vem perdendo sua

credibilidade junto aos órgãos jurisdicionais, uma vez que a indenização por dano

extrapatrimonial está sendo pleiteada pela sociedade de forma vã, por meros

aborrecimentos e que prejudicam o julgamento de decisões de grande relevância

jurídica.

Não é qualquer ultraje que configura o dano moral, este deve

ocorrer além dos percalços da vida cotidiana, deve ser grandioso a ponto de abalar

profundamente a esfera íntima da pessoa, atingindo a sua segurança enquanto indivíduo.

Faz-se necessário a conscientização da parte ofendida o

entendimento do quem vem a ser realmente o dano moral, pois nota-se um equívoco

muito grande por parte deste, em confundir fatos que são comuns no cotidiano com

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fatos que poderá dar ensejo a indenização por dano moral.

Hoje, a facilidade de acesso à justiça faz com que um enorme

número de pessoas demande uma suposta pretensão para ser satisfeita pelo poder

judiciário, e, devido a falta de critérios para se arbitrar o pleito por dano moral, o

instituto vem sendo banalizado de tal forma que qualquer situação do dia-a-dia que

aborreça o indivíduo é motivo para se pleitear a indenização por dano moral.

O que se pretende com o instituto do dano moral é atenuar o

sofrimento, já que não tem como quantificar, atribuir um valor aos direitos da

personalidade.

Por fim, para que haja a real necessidade do pleito compensatório

do dano moral o órgão jurisdicional tem tentado demonstrar através de seus julgados as

hipóteses de dano moral, a forma que caracteriza o instituto e principalmente como

pleiteá-lo, a fim de evitar pedidos aleatórios de indenização por supostas ofensas à

moralidade.

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