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Instituto Superior Técnico Departamento de Engenharia Civil e Arquitectura Secção de Urbanismo, Transportes, Vias e Sistemas Construção e Manutenção de Infra-estruturas de Transportes Mestrado em Engenharia Civil MÓDULO B: PAVIMENTOS Folhas da disciplina (versão provisória) Prof. José Neves Dezembro de 2009

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Page 1: Mestrado em Engenharia Civil - Autenticação · da engenharia civil, mas com a particularidade de serem constituídas por camadas sobrepostas e construídas com materiais de características

Instituto Superior Técnico Departamento de Engenharia Civil e Arquitectura Secção de Urbanismo, Transportes, Vias e Sistemas

Construção e Manutenção de Infra-estruturas de Transportes Mestrado em Engenharia Civil

MÓDULO B: PAVIMENTOS Folhas da disciplina (versão provisória)

Prof. José Neves Dezembro de 2009

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NOTA PRÉVIA

Disponibiliza-se aos alunos uma primeira versão das folhas da disciplina de

Construção e Manutenção de Infra-estruturas de Transportes relativas ao Módulo B de

Pavimentação. Estas folhas baseiam-se integralmente no Capítulo X – Pavimentação –

das Folhas de Estradas da disciplina de Vias de Comunicação, elaboradas pelo autor e

editadas pela primeira vez em 1999. Espera-se que o presente documento seja a génese

de umas folhas mais adequadas ao conteúdo programático da actual disciplina e que

possa reflectir os desenvolvimentos mais recentes no domínio não só das estradas mas

também das restantes infra-estruturas de transportes.

IST, Lisboa, 2 de Janeiro de 2009.

Prof. José Neves

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PAVIMENTAÇÃO

1 – Função e características gerais dos pavimentos rodoviários

A superfície que resulta das terraplenagens não possui, em geral, características

compatíveis com as condições necessárias à circulação dos veículos nem adequadas

para fazer face à acção dos agentes atmosféricos. Assim, o pavimento é a estrutura

(superestrutura) constituída por camadas de materiais apropriados que se constrói sobre

o terreno (infra-estrutura), de forma a suportar directamente as acções do tráfego e dos

agentes atmosféricos.

Segundo o Vocabulário de Estradas e Aeródromos [1], o pavimento é a “parte

da estrada, rua ou pista que suporta directamente o tráfego e transmite as respectivas

solicitações à infra-estrutura: terreno, obras de arte, etc. Pode ser constituído por uma

ou mais camadas, tendo no caso mais geral uma camada de desgaste e camadas de

fundação. Cada uma destas camadas pode ser composta e construída por várias

camadas elementares.”

Esta definição é, fundamentalmente, de natureza estrutural. Contudo, o aumento

verificado nas últimas décadas dos volumes de tráfego, quer de ligeiros quer de

pesados, e das velocidades de circulação praticadas, fizeram ressaltar a importância de

que o pavimento deve constituir, também, uma adequada superfície para que a

circulação dos veículos se processe com qualidade (conforto, segurança, etc.) para os

seus utentes.

No âmbito da disciplina dá-se maior ênfase aos pavimentos rodoviários

(estradas, áreas de estacionamento, etc.), embora existam outros tipos de pavimentos

como, por exemplo, os pavimentos de aeródromos.

De acordo com o atrás referido, as funções de um pavimento devem satisfazer

critérios de comportamento estrutural e de comportamento funcional: o pavimento deve

ser concebido para proporcionar a capacidade de carga correspondente às solicitações

previsíveis e constituir uma superfície onde o tráfego possa circular de forma segura,

cómoda e eficiente, dentro de limites de custo de construção e conservação aceitáveis, e

para um determinado período de vida.

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Os pavimentos são, genericamente, estruturas como outras estudadas no âmbito

da engenharia civil, mas com a particularidade de serem constituídas por camadas

sobrepostas e construídas com materiais de características mecânicas mais difíceis de

quantificar do que as dos materiais tradicionalmente utilizados noutros tipos de

estruturas, nomeadamente o aço, o betão armado ou mesmo a madeira. De facto, os

materiais usados na pavimentação exibem comportamentos diversos, como sejam, do

tipo visco-elástico (função da temperatura e dos tempos de aplicação de carga), no caso

dos materiais betuminosos, ou função do estado de tensão, como é o caso dos módulos

de deformabilidade dos materiais granulares.

Na fig. 1 apresenta-se o corte esquemático de uma estrutura tipo de pavimento

indicando-se a designação dada às diversas camadas que a constituem e também à sua

fundação, de acordo com terminologia adoptada em Portugal [2, 3]. De um modo geral,

o pavimento é constituído por camadas de superfície (camada de desgaste e camada de

regularização ou ligação) e camadas de fundação (camada de base e camada de sub-

base). A fundação do pavimento é constituída pela camada de leito do pavimento e pelo

conjunto dos terrenos subjacentes (até à profundidade de cerca de 1,0 m abaixo da cota

do pavimento para efeitos de dimensionamento) que condicionam o seu comportamento

[3]. A superfície superior da camada de leito do pavimento onde assenta o pavimento

designa-se por plataforma de apoio do pavimento.

Camada de desgasteCamada de regularização ou de ligação

Camada de base

Camada de sub-base

Leito do pavimento

Aterro ou terreno natural 1 m

Superfície do pavimento

Plataforma

Pavimento

Fundação dopavimento

Fig. 1 - Constituição de um pavimento tipo (adaptado de [13])

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A camada de desgaste é a camada superior do pavimento que está directamente

sujeita ao tráfego e aos agentes atmosféricos. Assim, esta camada deve garantir a

circulação dos veículos em condições de segurança (resistência à derrapagem,

visibilidade, etc.), conforto (óptico, acústico e dinâmico) e economia (em termos de

consumo de combustíveis, desgaste de veículos, consumo de pneus e tempo de viagem).

A camada de base e a camada de sub-base têm como função principal a

degradação das cargas transmitidas directamente à camada de desgaste, de modo a que

cheguem à fundação do pavimento com valores compatíveis com a capacidade de carga

desta.

A camada de leito do pavimento visa adaptar as características aleatórias e

dispersas dos materiais existentes nas camadas superiores dos aterros, ou dos materiais

“in situ” nas escavações, às características mecânicas, geométricas, hidráulicas e

térmicas, consideradas como hipóteses no projecto da estrutura do pavimento. As

camadas de leito do pavimento podem ser realizadas em solos arenosos seleccionados,

seixos, e material granular de granulometria extensa [3]. Pode-se, ainda, considerar a

hipótese de construir camadas de leito do pavimento em solos tratados com cal ou com

ligantes hidráulicos (cimento), para obter a fundação pretendida.

Os terrenos subjacentes ao pavimento ou existem em escavação (terreno

natural) ou em aterro. Em escavação, a fundação inclui os terrenos encontrados “in situ”

que, nalguns casos, poderão não ter características geotécnicas adequadas e, portanto,

necessitarem de ser substituídos ou tratados. Os terrenos em escavação deverão ser

caracterizados até uma profundidade abaixo da cota da rasante que seja suficiente para

conhecer todos os materiais que irão condicionar o comportamento do pavimento. Em

aterro, os terrenos ou materiais em que irá assentar a camada de leito do pavimento

constituem a chamada parte superior do aterro. Pela posição que estes materiais ocupam

no aterro, devem utilizar-se os de melhor qualidade de entre os disponíveis em obra, de

modo a conseguirem-se as melhores características possíveis para a fundação do

pavimento a um baixo custo.

Os tipos de pavimentos mais frequentes (fig. 2) são os pavimentos flexíveis,

rígidos e semi-rígidos. Esta classificação baseia-se, essencialmente, no tipo de materiais

utilizados na construção das camadas. Nos pavimentos flexíveis utilizam-se materiais

granulares tratados com ligante hidrocarbonado (betume asfáltico) nas camadas de

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superfície e também, com frequência, na camada de base (fig. 2-a). Os pavimentos

rígidos são constituídos, essencialmente, por uma laje de betão de elevada resistência

(armada ou não armada), com as funções atribuídas às camadas de desgaste e de base,

assente normalmente sobre camada tratada com ligante hidráulico (cimento) (fig. 2-b).

Os pavimentos semi-rígidos são constituídos por camada superior tratada com ligante

hidrocarbonado sobre camada tratada com ligante hidráulico.

12

3

4 456

7

89

10

1112

13

14

a) b)

Legenda

1 - superfície do terreno natural2 - aterro3 - leito do pavimento4 - berma (camadas de base e de superfície)5 - camada de sub-base6 - camada de base7 - camadas de desgaste e de regularização

8 - laje de betão (armada ou não)9 - plataforma de apoio do pavimento10 - terreno natural11 - pavimento12 - valeta13 - faixa de rodagem14 - plataforma (da estrada)

Fig. 2 - Constituição da estrutura de um pavimento: a) flexível; b) rígido (adaptado de [14])

A principal diferença entre os dois primeiros tipos de pavimentos - flexíveis e

rígidos - baseia-se no modo como é suportada e distribuída a carga sobre a fundação

(fig. 3). Nos pavimentos flexíveis são, fundamentalmente, a camada de base e a camada

de sub-base que suportam as cargas transmitidas pelos veículos. A deformabilidade

destas camadas traduz-se numa certa concentração e intensidade das pressões no solo de

fundação. No caso dos pavimentos rígidos, é a laje de grande resistência e rigidez que

desempenha a função de suporte e, por isso, as pressões no solo são, em geral, menores

que nos pavimentos flexíveis, embora actuando numa área maior. Os pavimentos semi-

rígidos apresentam comportamento de pavimento rígido e flexível, atendendo à

composição das respectivas camadas.

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Os pavimentos em calçada, constituídos por blocos de pedra assentes à mão e

batidos com maço manual, também considerados de tipo flexível, estão actualmente em

desuso, com excepção no que se refere à sua utilização em passeios.

Pavimento flexível Pavimento rígido

Fig. 3 - Distribuição aproximada de tensões verticais na fundação de um pavimento [4]

Na fase de concepção do pavimento são definidas soluções estruturais possíveis

para o pavimento, que depois serão analisadas na fase de dimensionamento. A opção

por determinada solução de pavimentação deve resultar da ponderação de diversos

factores externos, como por exemplo: o tipo e importância da via, o tipo e intensidade

do tráfego, as características geomorfológicas e geológicas da região, as características

geotécnicas dos materiais disponíveis, as condições de aprovisionamento, as condições

climáticas e condições económicas.

Uma vez seleccionado um dado tipo de pavimento, o dimensionamento do

pavimento consiste em calcular as espessuras das camadas e especificar as

características dos materiais dessas camadas, de forma a limitar, durante a vida de

projecto, a ocorrência de degradações estruturais.

Os pavimentos são dimensionados para um determinado período de

dimensionamento que é o período de tempo durante o qual o pavimento deve assegurar

adequadas condições de circulação do tráfego (segurança, economia e conforto),

minimizando a necessidade de obras de grande conservação nesse período. Para os

pavimentos flexíveis e semi-rígidos consideram-se períodos de dimensionamento da

ordem de 20 anos. Para os pavimentos rígidos, o período adoptado é em geral superior

(30 anos).

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Os primeiros métodos de dimensionamento de pavimentos eram métodos

empíricos, baseados na aplicação directa de resultados obtidos na observação do

comportamento de pavimentos em trechos piloto. O desenvolvimento de técnicas de

ensaio para caracterização mecânica dos materiais e de meios de cálculo automático

criou as condições necessárias ao aparecimento de métodos do tipo racional baseados

na análise estrutural, também conhecidos por métodos estruturais ou analítico-

empíricos. Estes métodos utilizam modelos de comportamento estrutural que, a partir da

geometria e das características mecânicas das camadas constituintes do pavimento, e do

tipo de carga aplicada à superfície do pavimento, calculam as tensões, deformações e

deslocamentos em qualquer ponto da estrutura do pavimento. Os valores obtidos

deverão satisfazer determinados critérios de dimensionamento com o objectivo de evitar

que o pavimento atinja certos estados de ruína durante o período de dimensionamento.

As principais fases do dimensionamento estrutural de pavimentos são esquematizadas

na fig. 4.

Recolha de dadosConcepção do pavimento

Modelo de comportamentoestrutural. Cálculo σ/ε.

Análise dos modos dedegradação.

Avaliação de resistência Critérios de dimensionamento

Alterar geometriaAlterar materiais

Não

Sim

Análise do projecto

σ, εsatisfaz critério?

Fig. 4 - Principais fases do dimensionamento estrutural de pavimentos [2]

Os principais dados para o dimensionamento estrutural são: o tráfego que irá

utilizar o pavimento durante o período de dimensionamento; as condições climáticas; as

condições de fundação; e as propriedades dos materiais a utilizar nas várias camadas do

pavimento.

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As estradas são utilizadas por uma grande diversidade de veículos com

diferentes dimensões e tipos de suspensão, circulando a velocidades diferentes e

transportando cargas variadas. No dimensionamento de pavimentos rodoviários é

usualmente considerado apenas o efeito do tráfego de veículos pesados.

As condições ambientais mais importantes no dimensionamento de pavimentos

são a temperatura e a pluviosidade. Estas condições, para além de afectarem as

propriedades mecânicas dos materiais, podem também constituir uma solicitação a

considerar no cálculo, como é o caso da temperatura no dimensionamento dos

pavimentos semi-rígidos e rígidos.

As condições de fundação, em especial da camada de leito do pavimento, são

importantes no comportamento da estrutura do pavimento e na escolha do tipo de

pavimento a construir, como já se referiu. É sempre recomendável optar-se pelas

melhores soluções de fundação, segundo critérios técnicos e económicos razoáveis,

mesmo que tal exija a substituição ou tratamento dos materiais locais. Este

procedimento permitirá não só reduzir a espessura das camadas superiores do

pavimento, que são construídas com materiais mais nobres e caros, à custa de materiais

mais baratos, mas também tornar eficientes as intervenções de alterações ou reforços

das camadas superiores após a construção.

Na fase de estudo prévio é possível recorrer a manuais de concepção de

pavimentos na forma de catálogo, com o objectivo de apoiar e orientar a concepção das

estruturas de pavimentos e respectivas fundações. É o caso do “Manual de Concepção

de Pavimentos para a Rede Rodoviária Nacional” da Junta Autónoma de Estradas [3]

em que se propõem estruturas tipo para pavimentos flexíveis, semi-rígidos e rígidos, a

considerar em novos traçados da rede rodoviária nacional. Estas estruturas foram

estabelecidas para determinadas condições relativas ao tráfego, condições climáticas,

condições de fundação e materiais de pavimentação. Entre as diversas soluções de

pavimentação propostas, deve ser escolhida a mais adequada a cada caso concreto, com

base em considerações técnico-económicas, prazos de execução e exigências futuras do

pavimento. Apresenta-se em anexo, como exemplo, algumas das estruturas tipo

propostas pelo referido manual.

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A importância fundamental que os pavimentos têm na estrada é devida, também,

quer ao investimento que representam em relação à totalidade da obra (seja uma obra

nova, seja uma obra de beneficiação), quer à avaliação da qualidade de estrada que é

feita pelos utentes, baseada fundamentalmente na regularidade do pavimento e no seu

estado de conservação. O planeamento e acompanhamento da construção assumem,

portanto, primordial importância na perspectiva de garantia de qualidade dos

pavimentos. Parte das degradações que ocorrem nos pavimentos podem ser evitadas se

se acompanhar a sua construção com a realização de estudos adequados, referentes aos

materiais e aos processos construtivos. Nos anos mais recentes, a necessidade de

optimização das características dos pavimentos e dos custos tem motivado a aplicação

de novos materiais e processos construtivos, que fazem apelo a uma nova filososfia de

qualidade

A observação do comportamento do pavimento após a sua entrada em serviço,

por vezes acompanhada de instrumentação, é importante para permitir não só adoptar

atempadamente as medidas de conservação necessárias, mas também para calibrar

métodos de dimensionamento e modelos de comportamento utilizados no projecto de

pavimentos.

A chamada gestão da conservação dos pavimentos enquadra-se nestas

preocupações e visa, em suma, garantir a qualidade dos mesmos ao longo da sua vida

útil, utilizando-se da melhor forma os recursos financeiros das administrações

rodoviárias.

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2 – Elementos sobre pavimentos flexíveis

Os pavimentos flexíveis são constituídos em geral por camadas de superfície em

materiais granulares aglutinados com ligante hidrocarbonado (betume asfáltico), e

camadas de base e de sub-base em materiais granulares não tratados. É frequente

adoptarem-se duas camadas de superfície de constituição diferente: uma camada

inferior, camada de regularização ou de ligação, constituída por agregado de maiores

dimensões e menos rica em ligante; e uma camada superior, a camada de desgaste

propriamente dita. Entre estas camadas aplica-se uma rega de colagem betuminosa para

assegurar a aderência. Actualmente, assiste-se à construção de camadas de base em

material granular tratado com ligante hidrocarbonado, como se verá adiante.

Os materiais utilizados na construção das camadas dos pavimentos flexíveis são

predominantemente materiais granulares, ligados ou não com ligante hidrocarbonado.

No caso de ser utilizado ligante, os materiais designam-se por misturas betuminosas.

A maior parte dos materiais granulares utilizados nas camadas de base e de

sub-base são materiais naturais obtidos a partir de diferentes rochas, através de britagem

ou não. O comportamento mecânico destes materiais depende, sobretudo, das suas

características intrínsecas (natureza, forma, propriedades físicas, granulometria, e

quantidade de elementos britados) e das condições de estado (compacidade, teor em

água e estado de tensão). Os materiais granulares mais utilizados são, então, designados

por: material britado de granulometria extensa recomposto em central; material britado

de granulometria extensa sem recomposição designado correntemente por “tout-

venant”; material não britado de granulometria extensa [3]. Admite-se, ainda, que

possam ser utilizados solos granulares seleccionados na camada de sub-base.

Existem dois tipos principais de ligantes betuminosos: o betume e o alcatrão

[4]. O betume é, basicamente, uma mistura de hidrocarbonetos de origem natural ou

artificial, ou de ambas, frequentemente acompanhados pelos seus derivados não

metálicos. Entre os diversos betumes, o betume utilizado para fins rodoviários é o

betume asfáltico de origem petrolífera. O alcatrão é um produto betuminoso semi-sólido

ou líquido, resultante da pirogenação de materiais orgânicos (hulha, lenhite, madeira,

etc.).

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A aplicação dos betumes asfálticos às temperaturas ordinárias só é possível na

forma fluída por aquecimento, fluxagem (betumes fluidificados) ou emulsionamento

(emulsões betuminosas). Os betumes fluidificados resultam da dissolução dos betumes

em solventes adequados. As emulsões betuminosas obtêm-se por dispersão do betume

em água através de um agente emulsionante que garante a estabilidade da emulsão.

Recentemente, tem-se verificado a incorporação de certos polímeros no betume dando

origem a betumes modificados, que se caracterizam por menor susceptibilidade térmica

e maior resistência às deformações permanentes e fadiga. A escolha do tipo de betume a

utilizar em cada caso depende de múltiplos factores, tais como o objectivo a atingir, o

clima e o tipo de agregado a usar.

As misturas betuminosas são constituídas por agregado, por betume com a

função de ligante e de impermeabilização, e por ar existente nos vazios. As suas

propriedades dependem fortemente das proporções volumétricas relativas destas três

componentes, bem como das características específicas do agregado e do ligante. A

viscosidade é uma das propriedades mais importantes do betume, pelo que o

comportamento mecânico das misturas betuminosas depende, entre outros aspectos, da

temperatura a que estas se encontram e do tempo de actuação das cargas. As principais

misturas betuminosas, aplicadas tradicionalmente nas camadas de regularização e de

desgaste e, mais recentemente, nas camadas de base, são misturas betuminosas a quente

[3]. Existem, ainda, as misturas betuminosas a frio constituídas por inertes e emulsão

betuminosa, para as quais não é necessário aquecer previamente os inertes. A mistura é

colocada à temperatura ambiente.

Dado que a camada de sub-base se encontra relativamente afastada da

superfície de aplicação das cargas, aceita-se que esta camada seja construída com

materiais de qualidade inferior à dos materiais utilizados nas camadas superiores dos

pavimentos e, portanto, mais baratos. É vulgar utilizar na sub-base materiais como o

saibro, a areia ou materiais granulares de granulometria extensa sem recomposição

(“tout-venant”) [3]. Em algumas situações, poderá ser considerado técnico-

economicamente justificado construir camadas de sub-base em solos tratados com cal

ou em solos tratados com cimento (eventualmente também com cal).

A camada de base deve ser constituída por agregados de natureza e

granulometria compatíveis com a resistência aos esforços tangenciais e ao esmagamento

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devido às solicitações do tráfego. Esta resistência é conferida não só pelo agregado mas

também pelo efeito da adição de saibro ou de betume. No primeiro caso, têm-se os

macadames hidráulicos, e no segundo caso a aplicação de betume dá origem às

penetrações betuminosas, impregnações betuminosas e macadames betuminosos.

As camadas de base em macadame hidráulico, actualmente em desuso, são

constituídas por uma ou duas camadas de brita de granulometria uniforme, compactadas

e estabilizadas com saibro que é espalhado sobre as mesmas. A penetração betuminosa

consiste numa camada compactada de agregado de granulometria adequada em que se

faz penetrar em toda a espessura da mesma o betume, espalhando-se posteriormente

areia ou um agregado de recobrimento (gravilha) e compactando. Quando o ligante não

atinge toda a espessura da camada, tem-se uma semi-penetração betuminosa. As

impregnações betuminosas consistem na rega superficial de betume, suficientemente

líquido, sobre a camada de base em agregado de granulometria extensa compactada.

Este tratamento favorece a adesão entre a base e a camada superior e aglutina e

impermeabiliza a parte superior da camada. As camadas de base em misturas

betuminosas são designadas correntemente por macadames betuminosos.

Na camada de regularização ou de ligação utilizam-se, sobretudo, misturas

betuminosas densas, caracterizadas por uma baixa porosidade.

A camada de desgaste pode ser um revestimento superficial betuminoso ou um

betão betuminoso. No primeiro caso, a camada de desgaste destina-se apenas a garantir

uma superfície regular e impermeável. No segundo caso, sobretudo para camadas

espessas, a camada assegurará já uma repartição importante das cargas.

Os revestimentos superficiais betuminosos são obtidos por espalhamento

sucessivo do ligante betuminoso e agregado de dimensões apropriadas (areia ou

gravilha), seguido de compactação. Esta técnica aplica-se sobre bases em semi-

penetração betuminosa.

O betão betuminoso é uma mistura betuminosa de porosidade baixa, constituída

por agregado grosso (pedra britada), finos (areia ou finos de pedreira) e “filler”

(cimento ou pó de calcário) uniformemente misturados, utilizando-se betume asfáltico

como ligante.

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A necessidade de aumentar a durabilidade dos pavimentos face à acção

agressiva do tráfego e das condições atmosféricas, associada ao grande incremento da

construção rodoviária, determinou o desenvolvimento de novos materiais para camadas

de superfície, recorrendo quase sempre a ligantes modificados [5]. Entre estes materiais,

figuram as misturas betuminosas drenantes, as misturas betuminosas rugosas e os

microaglomerados betuminosos a frio. As misturas betuminosas drenantes visam

essencialmente melhorar o comportamento funcional, garantindo a drenagem da água

superficial para as bermas e condições de conforto óptico (ausência de projecção de

água) e acústico (no exterior e no interior do veículo) face à circulação dos veículos. As

misturas betuminosas rugosas garantem, sobretudo, uma elevada aderência entre o pneu

e o pavimento, melhorando, por isso, a resistência à derrapagem em tempo chuvoso e

para velocidades elevadas. Os microaglomerados betuminosos a frio são aplicados na

recuperação das características superficiais dos pavimentos, em alternativa a soluções

de conservação superficial tradicionais, em que o objectivo da intervenção não é o

reforço estrutural.

Os métodos empíricos de dimensionamento de pavimentos flexíveis permitem

estimar a espessura das camadas do pavimento em função do solo de fundação,

caracterizado por meio de um ensaio de resistência, como é o caso do Método de CBR

(“California Bearing Ratio”), apresentado em 1938, ou apenas por ensaios de

identificação geotécnica, como é o caso do Método do Índice de Grupo, desenvolvido

em 1945 [6, 7]. Na década de 50, começaram a surgir outros métodos que, embora

empíricos, são baseados nos resultados de ensaios experimentais, como por exemplo, o

Método do “Road Research Laboratory” (“Road Note 29”) e o Método do “Asphalt

Institute” [2, 6], incorporando já explicitamente as solicitações acumuladas do tráfego.

Actualmente, o dimensionamento de pavimentos flexíveis baseia-se em métodos

do tipo racional. Um dos modelos de comportamento estrutural mais utilizado em

pavimentos flexíveis é o modelo de multi-camadas apresentado por Burmister, em 1945,

que assimila o pavimento a um conjunto de camadas horizontais, contínuas,

homogéneas, isotrópicas e elásticas, assentes num meio semi-infinito, em cuja

superfície actua uma carga uniformemente distribuída numa área circular (fig. 5).

Page 15: Mestrado em Engenharia Civil - Autenticação · da engenharia civil, mas com a particularidade de serem constituídas por camadas sobrepostas e construídas com materiais de características

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Os programas de cálculo

automático baseados no modelo de

Burmister são os meios de cálculo

mais utilizados pela sua facilidade de

utilização e por serem menos

exigentes em termos computacionais.

O método dos elementos finitos,

muito utilizado em investigação, tem

sido reconhecido como a técnica

mais adequada à análise estrutural de

pavimentos, pois permite ter em

conta aspectos não contemplados

pelos métodos tradicionais.

r

p

h1, E1, ν1

h2, E2, ν2

En, νn

Camadas elásticas

Simetria de revolução

σz

σrσθ

Interface:aderênciaoudeslizamento

Fig. 5 - Modelo de Burmister [15]

Os critérios de dimensionamento considerados em pavimentos flexíveis são o

fendilhamento por fadiga das camadas betuminosas e o aparecimento de deformações

permanentes à superfície dos pavimentos (fig. 6). A ruína por fadiga manifesta-se pelo

aparecimento de fissuração em malha sensivelmente regular, designada por “pele de

crocodilo” [1] e é consequência da aplicação repetida de extensões de tracção nas

camadas betuminosas provocadas pela passagem dos veículos. A ocorrência de

rodeiras (sulcos longitudinais produzidos pelas rodas dos veículos nos pavimentos [1])

é considerada o outro estado de ruína dos pavimentos flexíveis e resulta da acumulação,

à superfície do pavimento, de deformações permanentes que ocorrem na fundação, nas

camadas granulares e nas camadas betuminosas.

Fendilhamento

Camadas betuminosas

Camadas granulares

Fundação

Def

orm

açõe

spe

rman

ente

s

Fig. 6 - Estados de ruína considerados no dimensionamento de pavimentos flexíveis [16]

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15

A caracterização dos materiais é feita através de relações tensões-extensões

obtidas por via experimental em ensaios realizados em condições que se possam

considerar representativas do pavimento a dimensionar.

A fig. 7 exemplifica, simplificadamente, o tipo de diagramas de distribuição de

tensões e temperaturas em profundidade que é possível ter num pavimento flexível

solicitado à superfície pela carga de uma roda.

pCompressão Tracção Compressão

eixo neutro

P

Temperatura

(aumento)

Camadas betuminosas

Camadas granulares

Fundação

a) b) c) d)

a) Estrutura do pavimentob) Distribuição de tensões verticais segundo a vertical da rodac) Distribuição de tensões horizontais segundo a vertical da rodad) Distribuição de temperaturas em profundidade

Fig. 7 - Distribuição de tensões e temperaturas em profundidade num pavimento

flexível [17]

Os aspectos mais importantes da execução de pavimentos flexíveis estão

relacionados com a construção de camadas de materiais granulares e de camadas de

misturas betuminosas.

As operações de espalhamento e compactação são fundamentais na execução de

camadas granulares [8]. O espalhamento deve ser feito a toda a largura da plataforma,

sem juntas de trabalho, e de forma a evitar a segregação dos agregados, o que pode ser

conseguido através da molhagem dos agregados antes do espalhamento. A compactação

das camadas granulares é feita com cilindros vibradores de rasto liso.

As fases principais de execução de camadas de misturas betuminosas a quente,

quer sejam misturas tradicionais quer sejam misturas especiais, são o fabrico,

Page 17: Mestrado em Engenharia Civil - Autenticação · da engenharia civil, mas com a particularidade de serem constituídas por camadas sobrepostas e construídas com materiais de características

16

transporte, espalhamento e compactação das misturas [9, 10]. O fabrico das misturas

betuminosas é realizado em centrais onde se processa o pré-doseamento, o aquecimento

e a secagem dos agregados, bem como o controlo granulométrico, doseamento e mistura

dos constituintes. O transporte das misturas betuminosas das centrais para a obra é feito

em camiões basculantes de caixa metálica. Antes do espalhamento, é feita a preparação

da superfície que consiste, primeiramente, na limpeza para facilitar a acção do

aglutinante e, posteriormente, na aplicação de um tratamento betuminoso. Sobre camada

granular, esse tratamento é uma rega de impregnação, e sobre camada betuminosa, é

uma rega de colagem.

O espalhamento das misturas betuminosas pode ser manual ou com máquina

pavimentadora que assegura simultaneamente o espalhamento, segundo uma certa

largura e espessura da camada, e o acabamento. A escolha do processo de espalhamento

mais adequado a cada caso deverá ter em conta o tipo de obra, o perfil longitudinal e

transversal, o tipo de camada a construir e, consequentemente, o tipo de nivelamento a

utilizar para atingir a regularidade pretendida.

A máquina pavimentadora é constituída por uma barra vibradora que assegura,

durante o espalhamento, uma compactação ligeira da mistura. Na fase de compactação

são utilizados cilindros, escolhidos em função do tipo de mistura, da espessura da

camada, da temperatura externa e da intensidade do vento. Na compactação de misturas

betuminosas convencionais utilizam-se cilindros de rasto liso, com possibilidade de

vibração, e cilindros de pneus.

A fig. 8 mostra a

execução da camada de

base em macadame

betuminoso com máquina

pavimentadora, no IC19

(1993).

Fig. 8 - Construção de pavimento flexível

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17

3 – Elementos sobre pavimentos rígidos

Os pavimentos rígidos consistem basicamente numa laje de betão (que assegura

as funções das camadas de desgaste e de base), assente sobre camada de sub-base ou

directamente no leito do pavimento.

Os tipos de pavimentos rígidos mais correntes são [11]: pavimento em lajes de

betão simples com juntas; pavimento em lajes de betão armado com juntas; pavimento

em betão armado contínuo; pavimento em betão armado pré-esforçado; e pavimento em

betão armado reforçado com fibras metálicas. Subjacente a esta classificação está,

essencialmente, o tipo de mecanismo utilizado no controlo da fissuração do pavimento,

aspecto extremamente importante nos pavimentos rígidos.

O pavimento constituído por lajes de betão simples possui juntas transversais de

contracção cujo espaçamento, da ordem dos 3 a 5m, é definido de forma a que o

comportamento do pavimento não seja influenciado pelas tensões devidas a variações

de temperatura e/ou humidade no seu interior. Este tipo de pavimento é o que apresenta

menor custo inicial e maior facilidade de construção.

A utilização de armadura (malhas em aço normalizadas) nos pavimentos em

lajes de betão armado com juntas tem como principal função controlar o aparecimento

das fissuras e, consequentemente, a sua abertura. Neste tipo de pavimento, as juntas

transversais de contracção estão mais espaçadas (da ordem dos 10 a 15m).

No pavimento em betão armado contínuo, correntemente designado por BAC, a

existência de armadura longitudinal contínua a todo o comprimento do pavimento,

juntamente com o atrito entre a laje e a sub-base do pavimento, assegura o controlo da

abertura das fissuras, pelo que não existem juntas transversais de contracção. Como no

caso anterior, esta armadura não é considerada para efeitos estruturais.

Os pavimentos em betão armado pré-esforçado e em betão armado reforçado

com fibras metálicas têm utilização pouco frequente.

Uma das principais características dos pavimentos rígidos é a existência de

descontinuidades transversais ou longitudinais - juntas ou fissuras - impostas ou não

durante a construção, tal como se representa na fig. 9. Estas juntas têm como objectivo

permitir a contracção e a dilatação do betão, sob a acção de variações de temperatura e

de humidade, de modo a limitar a fendilhação - juntas de contracção e de dilatação - e

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ligar partes do pavimento betonadas em tempos diferentes - juntas de construção. As

juntas são dimensionadas e construídas de modo a garantir uma adequada capacidade de

transferência de cargas, de uma para outra laje, o que pode ser conseguido através de

várias soluções construtivas, como por exemplo, a interpenetração do agregado nos

bordos das lajes, ligação tipo macho-fêmea ou varões de ligação / barras de transmissão

de carga (“passadores”), actuando em conjunto ou isoladamente. Para além destas

juntas, há ainda a considerar juntas de dilatação em determinadas situações particulares,

como é o caso da vizinhança de obras de arte com algum desenvolvimento e no início

de curvas de pequeno raio. Todas estas juntas são correntemente seladas com produtos

adequados, de forma a ser garantida a estanqueidade relativamente à água exterior e a

evitar a acumulação de detritos sólidos. Nos pavimentos em BAC não existem juntas

transversais o que tem a vantagem de reduzir o risco de fissuração por atraso na

serragem das juntas e de diminuir os custos de conservação essencialmente dependentes

da reparação das juntas. Ao mesmo tempo, os níveis de conforto e economia para o

utente são mais elevados.

Junta longitudinal

Junta transversal

Lajes armadas

Junta longitudinalcom varões de ligação

Junta transversalde contracção

Junta transversalde contracção com passadores

Lajes em betão simples

Fig. 9 - Juntas típicas em pavimentos rígidos [11]

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Os pavimentos rígidos têm por um lado um custo mais elevado, pois exigem um

maior investimento inicial, mas por outro lado apresentam encargos de manutenção

mais reduzidos do que pavimentos flexíveis equivalentes, para um período de vida

maior. Por este facto, estes pavimentos são recomendados para vias de tráfego muito

intenso, situação corrente em auto-estradas metropolitanas, em que é desejável reduzir

ao mínimo as operações de conservação e, consequentemente, minimizar os custos e os

incómodos para os utentes. Em vias sujeitas a tráfego intenso de veículos pesados, a

solução de pavimento rígido poderá ser adequada por razões estruturais.

Os materiais de pavimentação mais utilizados nos pavimentos rígidos são as

misturas com ligantes hidráulicos, nomeadamente os agregados de granulometria

extensa com cimento, o betão pobre e, sobretudo, o betão de cimento com fins

rodoviários, correntemente designado por betão “rodoviário” [3]. O ligante hidráulico

normalmente utilizado é o cimento que deverá obedecer a características específicas,

como por exemplo, a classe de resistência e o tempo de presa.

Quando o material tratado com ligante hidráulico é um agregado seleccionado

que satisfaz a uma dada granulometria, obtém-se um agregado de granulometria

extensa tratado com cimento. A mistura do agregado com o ligante pode ser feita “in

situ” ou em central.

O betão pobre é um betão com teor em cimento inferior ao do betão utilizado

em camada de desgaste e, como consequência, é caracterizado por ter menor resistência

mecânica. A tecnologia de fabrico e os ensaios de controlo são idênticos aos utilizados

no caso do betão convencional, o que o distingue de um agregado de granulometria

extensa tratado com cimento. A sua colocação em obra faz-se, em geral, por vibração ou

por compactação.

O betão “rodoviário” é um betão constituído por inertes finos (areia natural ou

misturada com areias de britagem em determinadas proporções), agregados médio e

grosso, cimento, água e, ainda, aditivos a considerar em cada caso, como por exemplo,

plastificantes (maior trabalhabilidade) e modificadores de presa e do endurecimento.

Este betão deverá garantir requisitos de resistência à flexão compatíveis com o

dimensionamento estrutural, de durabilidade suficiente para suportar todas as

solicitações durante a sua vida útil e de trabalhabilidade e composição adequadas ao

equipamento de construção.

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O comportamento das misturas com ligantes hidráulicos depende,

essencialmente: da dosagem e do tipo de ligante; do tipo de agregado, das suas

características físicas e da sua granulometria; da compacidade da mistura, e das

condições de cura.

As exigências relativas à fundação dos pavimentos rígidos, nomeadamente no

que se refere à camada de leito do pavimento, devem ser muito rigorosas por forma a

assegurar-se a uniformidade no suporte do pavimento (evitando-se os indesejáveis

assentamentos diferenciais e consequentemente os esforços na laje a eles associados), a

controlar-se a expansibilidade dos solos de fundação e a limitarem-se os efeitos da

existência de água no pavimento. Estas mesmas funções podem ser desempenhadas por

uma camada de sub-base, construída com mistura de agregados com cimento ou em

betão pobre.

Neste tipo de pavimentos é a laje de betão que, pela sua elevada rigidez,

assegura a maior parte da resistência estrutural às cargas aplicadas à superfície pelas

rodas dos veículos e que, simultaneamente, mais contribui para a degradação das

tensões transmitidas ao solo de fundação. A contribuição da camada de sub-base e da

fundação para a capacidade de suporte dos pavimentos rígidos é secundária. É corrente

a intercalação de material entre a laje e a camada de sub-base, como por exemplo uma

camada fina de material betuminoso, para evitar-se a transmissão à laje de betão das

fendas existentes na camada de sub-base, evitar-se a erosão desta camada e obter-se

uma plataforma com a regularidade geométrica que garanta boas condições de

espalhamento e uma adequada execução da laje.

As características superficiais de um pavimento rígido são conferidas pela

textura superficial (micro e macro-textura) e pela regularidade geométrica da laje de

betão. Estas características são extremamente importantes de forma a serem asseguradas

quer a drenagem superficial quer a resistência à derrapagem adequada para as

velocidades de tráfego esperadas. A micro-textura é normalmente obtida impondo uma

certa percentagem de areia siliciosa na composição do betão. A macro-textura, que é

fundamental para garantir a aderência dos pneus principalmente quando o pavimento

está molhado, pode ser conseguida por vários processos como a ranhuragem transversal

(regular ou irregular), a ranhuragem longitudinal, a escovagem transversal, a

decapagem química ou a incrustação de gravilha dura no betão fresco. A opção técnica

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de uma destas soluções implica um compromisso entre o conforto e a segurança,

atendendo a que uma superfície mais rugosa é mais segura mas provoca mais ruído.

O comportamento dos pavimentos rígidos é controlado fundamentalmente pelos

níveis de tensões devidos ao tráfego, à retracção e às condições climatéricas, e pela

existência de água no pavimento. Os métodos de dimensionamento de pavimentos

rígidos têm como objectivo principal determinar a espessura mínima da laje, de modo a

que as tensões de tracção por flexão na sua base sejam inferiores às tensões máximas

admissíveis do betão, para o período de dimensionamento [11]. O Método da “Portland

Cement Association” (P.C.A.) e o Método do “Centre de Recherches Routières”

(C.R.R.) são exemplos de métodos de dimensionamento de pavimentos rígidos [11].

À semelhança do dimensionamento dos pavimentos flexíveis, a verificação da

resistência de um pavimento rígido com base na análise estrutural assenta no cálculo

dos estados de tensão, deformação e deslocamentos induzidos na laje do pavimento e na

sua comparação com valores limites impostos pelos critérios de dimensionamento.

O modelo de laje de Westergaard,

inicialmente desenvolvido em 1925, é

considerado o modelo de comportamento

estrutural mais adequado para a análise

estrutural de pavimentos rígidos. Este

modelo considera o pavimento como uma

laje apoiada sobre apoios elásticos, tal

como se representa na fig. 10. O método

dos elementos finitos aplicado a este tipo

de pavimentos é também uma poderosa

ferramenta de cálculo alternativa, com a

vantagem de permitir contemplar

algumas das limitações impostas pelos

meios de cálculo tradicionais, como por

exemplo a existência de

descontinuidades.

r

p

h

σv=K w

LajeE, ν

w=E h3 / (12 (1-ν2))

σv – tensão vertical no solow – deslocamento vertical da lajeK – módulo de reacção do solo

Fig. 10 - Modelo de Westergaard [11]

Um dos critérios de dimensionamento de pavimentos rígidos está associado ao

fendilhamento por fadiga do betão, que resulta da aplicação repetida de tensões de

tracção na face inferior da laje causada pela passagem dos veículos. As tensões internas

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devidas quer à retracção (desenvolvidas durante e após o endurecimento do betão) quer

às variações de temperatura e humidade no interior da própria laje, controlam a

concepção das juntas de contracção e o dimensionamento da armadura longitudinal de

controlo da fissuração.

O fenómeno de bombagem é a outra principal causa de degradação, que

consiste na expulsão, sob pressão, da água existente na sub-base, no leito de pavimento

ou sob o material das bermas através das juntas transversais, das fissuras ou da interface

pavimento/berma (fig. 11). Este fenómeno é responsável pela erosão da fundação na

zona das juntas que origina, consequentemente, o escalonamento das lajes (deformações

permanentes) e o aparecimento de fendas transversais e de canto, por deficiência de

apoio da laje.

Laje anterior Laje posterior

Finos acumulados Cavidade

Escalonamento

Fig. 11 - Fenómeno de bombagem em juntas de pavimentos rígidos [11]

A execução de pavimentos rígidos engloba, essencialmente, as operações de

fabrico, transporte, colocação, compactação e acabamento do betão das camadas de

desgaste e de sub-base [11, 12].

As recomendações a seguir no fabrico e transporte do betão estão relacionadas,

entre outros aspectos, com o armazenamento e dosagem dos materiais componentes,

amassadura do betão, e modo de transporte. O betão é fabricado em central e

transportado em camiões.

As operações de colocação, compactação e acabamento do betão devem ser

executadas de modo a satisfazerem as tolerâncias em termos de espessura, resistência e

regularidade compatíveis com os valores preconizados em projecto.

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A laje em betão pode ser construída por dois processos: com a utilização de

cofragens fixas; ou com recurso a equipamento de cofragens deslizantes. A utilização de

cofragens deslizantes é recomendada em obras de certo volume e/ou extensão. O

equipamento para execução da laje consiste, no essencial, numa espalhadora, com ou

sem cofragens deslizantes e equipada com sistema de guiamento, com a função de

espalhar, compactar, nivelar e regularizar uniformemente o betão,. A compactação do

betão é feita por vibração. Após a construção da laje e antes de ser aplicado o

tratamento de cura, é dada à superfície do pavimento uma textura homogénea, capaz de

proporcionar ao tráfego boas condições de aderência.

Para retardar a perda de água durante a presa e o endurecimento do betão,

controlando-se ao mesmo tempo a elevação excessiva da temperatura à superfície do

betão resultante da exposição aos raios solares, são utilizados determinados produtos de

cura.

Na fig. 12 apresenta-se a execução da laje em betão armado contínuo (BAC) do

pavimento rígido do IC17 (1992). Esta laje foi construída sobre camada de sub-base em

betão pobre.

Fig. 12 - Construção de pavimento rígido

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BIBLIOGRAFIA

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investigador-coordenador. Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Lisboa.

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Junta Autónoma de Estradas.

[4] PEREIRA, O. A. (1971). Pavimentos Rodoviários. Volume 1. Laboratório Nacional

de Engenharia Civil, Lisboa.

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camadas de superfície. Instituto Superior Técnico, Lisboa.

[6] BARBOSA, L. F. (1984). O dimensionamento de pavimentos flexíveis, de estradas e

de aeródromos e dos seus reforços. Dissertação apresentada à Universidade Nova

de Lisboa para obtenção do grau de Mestre em Mecânica dos Solos.

[7] ROQUE, C. A. (1978). Estradas e Pavimentos. Elementos de estudo da disciplina

de Vias de Comunicação. Instituto Superior Técnico, Lisboa.

[8] BARROS, R. (1996). Processos construtivos: fabrico, espalhamento e compactação.

Materiais granulares e misturas com ligantes hidráulicos e pozolânicos. Curso de

Formação Avançada no Âmbito do Protocolo para a Formação JAE/IST. Instituto

Superior Técnico, Lisboa.

[9] BARROS, R.; FONSECA, P. (1996). Processos construtivos: fabrico, espalhamento e

compactação. Misturas betuminosas. Curso de Formação Avançada no Âmbito do

Protocolo para a Formação JAE/IST. Instituto Superior Técnico, Lisboa.

[10] CARDOSO, M. (1992). Misturas betuminosas a quente. Curso de Concepção e

Projecto de Infra-estruturas Rodoviárias. Instituto Superior Técnico, Lisboa.

[11] CARDOSO, M. (1992). Dimensionamento de pavimentos rígidos. Curso de

Concepção e Projecto de Infra-estruturas Rodoviárias. Instituto Superior Técnico,

Lisboa.

[12] BARROS, R.; FONSECA, P. (1996). Processos construtivos: fabrico, espalhamento e

compactação. Betões de cimento rodoviários. Curso de Formação Avançada no

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25

Âmbito do Protocolo para a Formação JAE/IST. Instituto Superior Técnico,

Lisboa.

[13] SETRA/LCPC (1994). “Conception et dimensionnement des structures de

chaussée”. Guide Technique.

[14] AASHTO (1986). “AASHTO Guide for Design of Pavement Structures”.

[15] ANTUNES, M. L. (1993). Avaliação da capacidade de carga de pavimentos

utilizando ensaios dinâmicos. Dissertação apresentada à Universidade Técnica de

Lisboa para obtenção do grau de Doutor em Engenharia Civil.

[16] AZEVEDO, M. C. (1996). Materiais de pavimentação: propriedades físico-químicas

e mecânicas. Misturas betuminosas. Curso de Formação Avançada no Âmbito do

Protocolo para a Formação JAE/IST. Instituto Superior Técnico, Lisboa.

[17] FHWA (1984). “A program of study in pavement management” The Center for

Transportation Research, University of Texas at Austin.

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ANEXO

EXEMPLOS DE ESTRUTURAS DE PAVIMENTO propostas pelo

Manual de Concepção de Pavimentos para a Rede Rodoviária Nacional da JAE (elementos extraídos do Capítulo 6)

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Elementos do manual relativos às classes de tráfego, classes de fundação e materiais de pavimentação, necessários à interpretação das estruturas de pavimento: Classes de Tráfego (Quadro 2.1)

Classe (TMDA)p T7 T6 T5 T4 T3 T2 T1 T0

<50 50-150 150-300 300-00 500-800 800-1200 1200-2000

>2000 (TMDA)p - tráfego médio diário anual de veículos pesados no ano de abertura,

por sentido e na via mais solicitada. Classes de Fundação (Quadro 4.1) Classe de Módulo da fundação (MPa) Classe de tráfego fundação Gama Valor de cálculo

F1 F2 F3 F4

>30 a ≤50 >50 a ≤80 >80 a ≤150

>150

30 60 100 150

T5, T6 T3, T4, T5, T6

T1, T2, T3, T4, T5, T6 T1, T2, T3, T4, T5, T6

Materiais de Pavimentação (Quadros 5.1, 5.3 e 5.5) Símbolo Designação

Materiais granulares

BGr BG SbG GN SS

Material britado recomposto em central Material britado sem recomposição (“tout-venant”) (base) Material britado sem recomposição (“tout-venant”) (sub-base) Material não britado Solo seleccionado

Misturas betuminosas fabricadas a quente

MB MB

MBD BD

Macadame betuminoso em camada de base Macadame betuminoso em camada de regularização Mistura betuminosa densa em camada de regularização Betão betuminoso em camada de desgaste

Misturas com ligantes hidráulicos

BC BP1 BP2

AGEC Sc

Betão de cimento Betão pobre de reduzida erodibilidade (vibrado ou cilindrado) Betão pobre (agregado recomposto em central) Mistura com agregado não recomposto em central Solo-cimento fabricado em central

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