mercosul e unasul: a contribuição de um novo ......mercosul e unasul: a contribuição de um novo...

16
MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional via Mercosul Luíza Bárbara Vieira Cidrack 1 RESUMO O presente artigo possui como principal foco analisar o desenvolvimento do Mercosul como modelo de integração regional na América Latina, observando as fases vivenciadas pelo Mercosul, traçando um paralelo entre os momentos políticos pelos quais as democracias latino-americanas passavam em cada uma das fases do processo de integração do bloco em questão, para a partir daí relacionar o momento de criação da Unasul com a guinada dos países da América do Sul à eleições de governos progressistas. Observaremos, portanto, como esse momento político impactou no início de um processo de integração inaugurado pelo Unasul, que privilegiava aspectos sociais e humanos e a forma como este impulsionou também uma mudança de paradigma no Mercosul, que passou a atuar de maneira mais abrangente, que não somente a econômica, promovendo o que podemos classificar como o aprofundamento de um processo de integração regional propriamente dito, não mais tratando-se de um bloco econômico, como em sua fundação. Palavras-chave: Mercosul; Unasul; Integração; Democracia. RESUMEN El objetivo principal de este artículo es analizar el desarrollo del Mercosur como modelo de integración regional en América Latina, observando las fases experimentadas por el Mercosur, trazando un paralelismo entre los momentos políticos a través de los cuales las democracias latinoamericanas estuvieron en cada fase del proceso de integración del bloque en cuestión, para luego relacionar el momento de creación de Unasur con el giro de los países sudamericanos a las elecciones de gobiernos progresistas. Observaremos, por lo tanto, cómo este momento político impactó al comienzo de un proceso de integración inaugurado por Unasur, que privilegió los aspectos sociales y humanos y la forma en que también impulsó un cambio de paradigma en el Mercosur, que comenzó a actuar de manera más amplia, que no solo el económico, promoviendo lo que podemos clasificar 1 Graduada em Direito pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR), Especialista em Gestão Pública Municipal pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), mestranda do Programa de Pós-Graduação em Integração Contemporânea da América Latina (PPG-ICAL) na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). E-mail: [email protected]

Upload: others

Post on 08-Aug-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

via Mercosul

Luíza Bárbara Vieira Cidrack1

RESUMO

O presente artigo possui como principal foco analisar o desenvolvimento do Mercosul como modelo de integração regional na América Latina, observando as fases vivenciadas pelo Mercosul, traçando um paralelo entre os momentos políticos pelos quais as democracias latino-americanas passavam em cada uma das fases do processo de integração do bloco em questão, para a partir daí relacionar o momento de criação da Unasul com a guinada dos países da América do Sul à eleições de governos progressistas. Observaremos, portanto, como esse momento político impactou no início de um processo de integração inaugurado pelo Unasul, que privilegiava aspectos sociais e humanos e a forma como este impulsionou também uma mudança de paradigma no Mercosul, que passou a atuar de maneira mais abrangente, que não somente a econômica, promovendo o que podemos classificar como o aprofundamento de um processo de integração regional propriamente dito, não mais tratando-se de um bloco econômico, como em sua fundação. Palavras-chave: Mercosul; Unasul; Integração; Democracia.

RESUMEN El objetivo principal de este artículo es analizar el desarrollo del Mercosur como modelo de integración regional en América Latina, observando las fases experimentadas por el Mercosur, trazando un paralelismo entre los momentos políticos a través de los cuales las democracias latinoamericanas estuvieron en cada fase del proceso de integración del bloque en cuestión, para luego relacionar el momento de creación de Unasur con el giro de los países sudamericanos a las elecciones de gobiernos progresistas. Observaremos, por lo tanto, cómo este momento político impactó al comienzo de un proceso de integración inaugurado por Unasur, que privilegió los aspectos sociales y humanos y la forma en que también impulsó un cambio de paradigma en el Mercosur, que comenzó a actuar de manera más amplia, que no solo el económico, promoviendo lo que podemos clasificar

1Graduada em Direito pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR), Especialista em Gestão Pública Municipal pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), mestranda do Programa de Pós-Graduação em Integração Contemporânea da América Latina (PPG-ICAL) na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). E-mail: [email protected]

Page 2: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

1

como la profundización de un proceso de integración regional en sí mismo, que ya no es un bloque económico, como en su fundación. Palabras clave: Mercosur; Unasur; Integración; Democracia.

INTRODUÇÃO

Analisar os processos de integração regional pelos quais vem passando

a América Latina é fundamental para que possamos compreender outros aspectos

e fenômenos que aproximam e que disntanciam os países latino-americanos. O

primeiro deles é o fato de que este processo, que envolve e une países, está

intimamente relacionado com o crescimento e desenvolvimento econômico, político

e social dos países membros (BALASSA, 1961), ou seja, é um processo que vai

além da abordagem econômica.

O presente estudo tem como pressuposto de integração na região da

América Latina o Mercosul, sendo este um dos principais focos da análise, tendo

também por escopo a necessidade de verificar de que maneira a adoção de

políticas neoliberais, bem como o giro ao progressismo nos governos dos países

pertencentes ao bloco refleriram na atuação do mesmo bem como nas fases pelas

quais passou a integração regional nesses períodos.

Ao analisarmos o Mercosul, verificamos inicialmente a necessidade de

haver uma transformação progressiva de modelo de governo em um modelo de

Estado, ou modelo de sociedade, que teria como condição indispensável para que

se alcance de fato este modelo de sociedade, o conceito de integração regional

arraigado na formação deste bloco, que fora concebido com o conceito do Livre

Mercado.

Foi justamente o que apregoou o Tratado de Assunção, de 26 de

março de 1991, que não tratou de estabelecer em seu texto a previsão da

cidadania do Mercosul, já que se resguardava a observar normas econômicas e

comerciais a serem praticadas pelos países parte do Bloco que acabara de ser

criado. Na verdade, as pessoas foram tratadas na constituição do Mercosul apenas

Page 3: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

2

como habitantes de um território de Mercado Comum, mas não pertencentes de

uma região comum.

É necessário , porém, que se evolua, de modo que a integração por

meio do Bloco Mercosul, ao passo que é questionada por determinados setores de

países membros, pode ser considerada um grande instrumento responsável por

transformações internas em seus países originários, uma vez que este processo de

integração nada mais foi do que a convergência de países com interesses e

projetos comuns políticos e sociais, o que permutiu alavancar um projeto de

deselvolvimento econômico, sobretudo para os países da América do Sul, mas que

não apresentam efetivamente este âmago.

Analisaremos também a maneira como dialogaram as dimensões

política e social do Mercosul com a criação da Unasul e seus pressupostos de

existência, observando a maneira como o intercâmbio de pensamento auxilou na

mudança de paradigma do Mercosul e a forma como o fortalecimento da integração

via Mercosul impulsinou fortalecimento da Unasul enquanto bloco regional.

MERCOSUL: conceito e antecedentes históricos

Para realizar uma contextualização mais coerente acerca da análise,

ao notar que o tema preponderante é a integração latino-americana constituída,

acima de tudo, por meio do Mercosul, faz-se necessário uma conceituação básica

do que vem a ser esse bloco econômico que será tão fartamente citado a seguir.

Pode-se utilizar o conceito trazido pelo prórpio Mercosul para designar

o seu nascedouro, no qual:

Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai assinaram, em 26 de março de 1991, o Tratado de Assunção, com vistas a criar o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). O objetivo primordial do Tratado de Assunção é a integração dos Estados Partes por meio da livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, do estabelecimento de uma Tarifa Externa Comum (TEC), da adoção de uma política comercial comum, da coordenação de políticas

Page 4: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

3

macroeconômicas e setoriais, e da harmonização de legislações nas áreas pertinentes.2

O Mercosul surge então, como uma tentativa de liderança diante do que

chamamos de processo de liberalização da América Latina.Argentina, Brasil,

Paraguai e Uruguai celebraram, em 26 de março de 1991, o Tratado de Assunção,

com o objetivo de se criar o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL).

Atualmente, os Estados Parte do Mercosul são: Brasil, Argentina,

Paraguai, Uruguai e Venezuela, que está suspensa desde 2016, cumprindo

atualmente duas suspensões3. Temos como Estados Associados o Chile, Peru,

Colômbia, Equador, Guiana e Suriname, estes últimos, desde o ano de 2013.

Antes disto, porém, houve diversas tentativas de consolidar blocos de

integração para o hemisfério sul como tentativa de superar questões que se

agravavam após a segunda guerra mundial, como o subdesenvolvimento, a

ausência de controle de mercado e a imposição da política econômica estabelecida

pelos países do centro do capitalismo.

Tais esforços foram empreendidos, cronologicamente, pela Comissão

Econômica para a América Latina e o Caribe – CEPAL, criada por decisão da

Assembleia Geral das Nações Unidas, em 25 de fevereiro de 1948 que possuía

estrutura que fora bastante questionada pelo governo norte-americano, pelo forte

receio de que pudesse mitigar sua influência na política econômica nos países

periféricos em plena Guerra Fria, bem como pela própria Organização dos Estados

Americanos (FURTADO, Tomo 1, 1997).

Ocorre que, o final deste processo culminou com a resistência sendo

vencida e desempenhou importante papel na formulação de estratégias e de

políticas públicas para o desenvolvimento com o fito de promover o que

conhecemos, posteriormente por cooperação regional, pois além de tratar de

2 Disponpivel em: http://www.mercosul.gov.br/saiba-mais-sobre-o-mercosul; acessado em 20/05/2017. 3 Informação obtida em: http://www.mercosul.gov.br/saiba-mais-sobre-o-mercosul. Acesso em 28.07.2019

Page 5: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

4

maneira específica da política econômica, tratou também de buscar a construção

de uma identidade regional entre os países latino-americanos.

Foi a partir desta nova perspectiva de integração, alinhada a um

comportamento de identificação não somente econômica, mas também cultural

regional que se insurgiram outras formas de organização baseadas neste modelo

de integração, a exemplo da Associação Latino-Americana de Livre Comércio –

ALALC (1960), do Pacto Andino (1969), da Associação Latino-Americana de

Integração (1980) e do Tratado de Buenos Aires (1990), este último, assinado por

Brasil e Argentina, o qual pode ser considerado o precedente mais próximo do que

vem a ser o Mercosul, tendo sido apenas complementado no ano seguinte pelo

tratado de Assunção, com a entrada do Paraguai e Uruguai.

A finalidade do Tratado de Assunção, porém, é a integração dos Estados

Partes por meio da livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, do

estabelecimento de uma Tarifa Externa Comum (TEC), da adoção de uma política

comercial comum, da coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais, e da

harmonização de legislações nas áreas pertinentes. Ou pelo menos deveria ser, o

que discutiremos mais adiante, em conformidade com o que o bloco vem passando

atualmente.

ETAPAS DA INTEGRAÇÃO REGIONAL POR MEIO DO MERCOSUL

A partir do Protocolo de Ouro Preto, em 1994, o Mercosul adquiriu uma

personalidade jurídica perante a sociedade internacional e, ainda que hajam

debilidades a serem vencidas em termos de organização de bloco, não se pode

negar a sua importância, principlamente no processo de desenvolvimento das

economias de seus Estados Partes.

A consolidação do Mercosul enquanto bloco, porém, ainda não implicou

em um processo de integração regional propriamente dita, uma vez que são

pressupostos de um processo de integração a convergência de ideais políticos,

Page 6: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

5

econômicos e sociais e, sobretudo, a elaboração conjunta de políticas públicas que

resultem no desenvolvimento do bloco de maneira equiparada.

Com um modelo claro de desenvolvimento capitalista, podemos aqui,

inferir que o processo de liberalização na América Latina, começa com o

MERCOSUL – Mercado Comum do Sul. Iniciar-se-ia através da adoção de práticas

distintas das presentes no anterior GATT, que eram de caráter protecionista e, para

tanto, seria necessária uma outra dinâmica econômica no bloco regional através de

uma integração econômica cujo começo se daria por práticas liberais.

Isto, fatalmente, é reflexo do modelo de desenvolvimento escolhido

pelos países da América Latina, a partir da assinatura do Consenso de

Washington, em 1989 na capital norte-americana, apropriando-se da política

neoliberal na tentativa de assegurar o crescimento econômico de seus Estados.

Ocorre que, como um paradoxo disto, a política econômica neoliberal não tratou de

resguardar ou garantir avanços em quaisquer outras searas de atuação do Estado

em detrimento de sua regulação quase exclusiva pelo Mercado.

Para BRESSER-PEREIRA (1991, p. 4):

De acordo com a abordagem de Washington as causas da crise latino-americana são basicamente duas: a) o excessivo crescimento do Estado, traduzido em protecionismo (o modelo de substituição de importações), excesso de regulação e empresas estatais ineficientes e em número excessivo; e b) o populismo econômico, definido pela incapacidade de controlar o déficit público e de manter sob controle as demandas salariais tanto do setor privado quanto do setor público. A partir dessa avaliação, as reformas no curto prazo deveriam combater o populismo econômico e lograr o equilíbrio fiscal e a estabilização. A médio prazo ou estruturalmente a receita é adotar uma estratégia de crescimento market oriented ou seja, uma estratégia baseada na redução do tamanho do Estado, na liberalização do comércio internacional e na promoção das exportações.

Tal modelo ocasionou nos países da América Latina, que adentraram ao

processo de globalização em absoluta desvantagem em relação ao Hegemon do

momento – Estados Unidos da América, uma verdadeira assimetria no que tangia

ao desenvolvimento dos Estados, visto que falar de crescimento econômico não

necessariamente implica em desenvolvimento (ESPINOSA, 2007, p. 122 e 123).

Page 7: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

6

Explica o autor ainda, ao analisar os países latino-americanos que

aderiram às regras do consenso, que estas não refletiram no que apostavam os

estudiosos que o propuseram, que era a superação da crise econômica e social,

que deu inicio nos anos 80. Segundo ele:

a abordagem de Washington sugere que é suficiente estabilizar a economia, liberalizá-la e privatizá-la, para que o país retome o desenvolvimento. As evidências, entretanto, não comprovam a hipótese. Países que lograram estabilizar-se e empreenderam reformas liberalizantes, como a Bolívia e mais recentemente o México, não retomaram o crescimento. (BRESSER-PEREIRA, 1991, p. 5)

Com reflexos causados a partir da assinatura do Consenso de

Washington, em 1989, cujos números apresentados pelo Produto Interno Bruto não

correspondiam necessariamente com o do crescimento da renda per capta da

população, observava-se um verdadeiro paradoxo estabelecido pela política

econômica neoliberal, que não tratou de observar os aspectos regionais e

resguardou somente os avanços que poderiam ser garantidos pela regulação

exclusiva do mercado sobre a economia, em detrimento da atuação da atuação do

Estadoem diversas outras searas de construção de uma sociedade equilibrada

(ESPINOSA, 2007).

Outro aspecto importante a ser mencionado é que após graves crises

econômicas no início dos anos 2000, com a saturação do sistema capitalista nas

regiões periféricas, um novo panorama se construiu na América Latina que ficou

conhecido como novo socialismo ou socialismo do século XXI, cuja orientação

política ideológica se opunha ao que até então vinha se edificando.

Isto propiciou uma maior aproximação dos países do sul, fazendo com

que seus panoramas políticos e a localização geográficas mais próximas

fortalecessem a ideia de bloco e, consequentemente, o modelo do que

conhecemos hoje como Mercosul, do qual todos os países da América do Sul

participam, seja como Estado Parte, seja como Estado Associado.

Apesar deste processo de homogeinização política e ideológica que

vinha acontecendo na América Latina como um todo, percebia-se que os países

Page 8: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

7

atentavam mais para a reconstrução de suas economias, devastadas pelas

políticas neoliberais da década anterior, e para a busca da retomada do

crescimento econômico do que para unificação da América Latina e sua

consolidação como um modelo de integração, que caminhou a passou largos, mas

sem dúvidas já se encontrava num estágio mais avançado do que em sua

constituição.

A partir de uma análise elaborada ainda no ano de 2007, já se apontava

para a necessidade de uma nova perspectiva de integração que privilegiasse a

todos os países do hemisfério sul não somente enquanto bloco de livre comércio,

mas que propiciasse para o bloco o que se chamou de aprofundamento ou

verdadeira integração, nas palavras de BORDAZAR e CONSANI (2007, p. 55 e

56):

(…) El mercosur también ha mostrado carências en áreas estratégicas como: producción, desarrollo industrial, coordinación de políticas monetárias, financeiras y cambiarias, y enalgunas cuestiones sociales que hacen a la ‘verdadeira’ integración, como por ejemplo la coordinación de políticas migratórias e de frontera (…) (grifo nosso).

Adiante, depois de alguns avanços percebidos na política externa tanto

do Brasil como dos demais países membros do Mercosul voltados para a

cooperação Sul-Sul, o próximo passo desses governos progressistas, alinhados

politicamente, seria a decisão política que colocaria a integração regional em outro

patamar, desenvolvento, a partir de meados dos anos 2000 uma concepção política

e social na agenda do Bloco.

Vale dizer que agregar temáticas de cunho político e social ao Mersocul

se por decisões políticas dos governantes dos países membros como uma forma

de reparar as consequências de uma integração meramente econômica e

comercial, como também os efeitos das crises neoliberais do começo do século

XXI e da correção do modelo de desenvolvido no Mercosul de 1991 (MIRZA, 2013).

Nesse contexto de transformações de paradigmas, várias iniciativas são

realizadas tanto no âmbito do Mercosul, quanto fora dele, todas visando fortalecer

Page 9: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

8

e aprofundar o processo de integração regional na América Latina, cujos resultados

puderam ser observados mais adiante.

A primeira delas foi a reunião dos Chefes de Estado do Mercosul e da

Comunidade Andina das Nações – CAN dentro de um único organismo, o qual

discutiremos em breve, depois surgiram dentro do próprio Mercosul, debates

acerca da sua dimensão social e política, que culminaram com a criação de

diversos organismos internos que passaram a atuar na construção de políticas e

em estudos acerca dos Direitos Humanos, combate às desigualdades sociais,

dentre outros.

Os dois principais organismos que surgiram neste momento foram o

Instituto Social do Mercosul – ISM e o IPPDH, ambos com suas sedes inauguradas

no ano de 2009, completanto, portanto 10 anos no vigente ano. Dentro desse

contexto nasce também a Unasul, cujo tratado constitutivo é datado de 2008 e traz

para o âmbito da integração regional, esse caráter político e social em forma de

bloco, como veremos a seguir.

A CRIAÇÃO DA UNASUL E A COEXISTÊNCIA DOS BLOCOS

Podemos dizer que a criação da Unasul possui como antecedente

histórico da criação da Comunidade Sul-Americana de Nações – CASA, no ano de

2004, que constitui uma iniciativa brasileira, visando fortalecer o processo de

integração regional e tem como membros os países do Mercosul e da Comunidade

Andina das Nações, além do Chile, Guiana e Suriname4.

Segundo GOMES, 2007, p. 06:

O projeto de formação da CASA busca concretizar uma integração pautada por objetivos que não sejam os meramente econômicos e comerciais, como foi o caso do MERCOSUL e da Comunidade Andina de Nações, no final do século passado. Mais do que isso, busca-se um fortalecimento do processo integracionista, com políticas que tenham por finalidade inserir o cidadão no contexto das políticas de aproximação entre os Estados, notadamente porque são eles, os

4Dispinível em: https://www.unasursg.org/es/historia. Acesso em: 28.07.2019

Page 10: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

9

cidadãos, os principais destinatários das políticas adotadas no contexto sul-americano.

Posteriormente, no ano de 2007, durante a reunião dos Chefes de

Estado em Isla Margarita, na Venezuela, os membros da CASA ou CSN, decidiram

por mudar seu nome para União das Nações Sul-Americanas – UNASUL, que

ainda não se constituia como bloco regional, mas já dava os seus primeiros

passos.

Posteriormente, no ano de 2008, foi aprovado o seu tratado constitutivo,

no qual se elegeu Quito, capital do Equador, como sede de sua Secretaria Geral e

Cochabamba, na Bolívia, como sede de seu Parlamento. Seu tratado constitutivo,

porém entrou em vigor somente no ano de 2011, dando esta dimensão política,

social, humana e de respeito à natureza que foram, em sua constituição, os

assuntos com quais o Mercosul não dialogou, pois sua agenda econômica estava

em primeiro plano.

A Unasul, por sua vez, trazia como objetivos específicos5, dentre outros,

o fortalecimento do debate político entre os países membros, o desenvolvimento

social e humano, a superação das desigualdades sociais, o respeito ao meio

ambiente e à biodiversidade, a erradicação do analfabetismo, e promoção da

diversidade cultural e dos saberes dos povos originários, o respeito irrestrito aos

direitos humanos, bem como outros fundamentos que diferenciam a sua atuação

enquanto bloco.

Nesse contexto, podemos dizer que a criação da Unasul se deu como

uma variável do processo histórico pelo qual passava a América Latina naquele

momento, através do qual seu contexto político permitia que outros debates fossem

travados, além dos debates anteriormente alicerssados no âmbito do Mercoul.

Segundo HOFFMANN, 2016, p. 52:

A Unasul foi criada em 2008, em um contexto de mudanças de paradigma de modelos de integração regional na América do Sul, onde

5 Disponível em: https://www.unasursg.org/es/objetivos-especificos. Acesso em 29.09.2019

Page 11: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

10

o livre-comércio perdeu a centralidade para outras atividades de cooperação nas áreas de infraestrutura e políticas sociais. A estrutura institucional da Unasul reflete essa mudança, dispondo de Conselhos

para tratar de temas como desenvolvimento social, saúde, educação e cultura, além do Conselho de Economia e Finanças.

Podemos dizer também que a uma consequência lógica da criação da

Unasul foi a guinada que o próprio Mercosul deu na sua atuação, pois o momento

não mais permitia que se constuíssem políticas econômicas sem que se analisasse

o contexto social e político nos quais aquelas sociedades estavam inseridas para a

implementação dessas políticas.

A dimensão social e política do Mercosul foram, portanto, importantes

parceiras da concretização do projeto da Unasul, pois os debates que de

introduziram dentro do Mercosul nestes campos permitiu que houvesse ambiência

política para que se construísse um diálogo mais aprofundado em busca de um

modelo de integração que de fato levasse em consideração a realidade da América

do Sul, trazendo base para que fosse construída uma perspectiva de

desenvolvimento que abarcasse as reais necessidades dos povos sul-americanos,

diferente que foi pautado pelo Consenso de Washington, cujo modelo fora importo

pela hegemonia do grande capital internacional.

Ou seja, cabe aqui mencionar o fato de que a coexistência de ambos os

blocos é fundamental para que se fortaleça as políticas externas econômicas de

Cooperação Sul-Sul, estabelecidas no âmbito do Mercosul, a partir da primeira

metade dos anos 2000, voltando seus olhares para negociações comercial que não

geram tantas assimetrias, ou seja, que sejam mais igualitárias e competitivas para

os países que nela se encontram.

Faz-se também fundamental que a Unasul e o Mercosul não só

coexistam como também atuem de mãos dadas para que esse norte social e

político estabelecido desde a CASA, não se veja novamente dominado por

propósitos que naão servem de fato à realidade sul-americana, permitindo que se

discuta no âmbito da américa latina alternativas a este sistema que caminha para a

exaustão.

Page 12: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

11

Ocorre que, no início da década de 2010 houve uma grande guinada na

política interna dos países da América Latina, na qual governos conservadores

começaram a ser eleitos progressivamente, alastrando o que ficou conhecida como

onda conservadora ou onda azul, fazendo contraponto ao vermelho dos partidos de

esquerda de haviam governado na última década e capitaneado todo este histórico

aqui mencionado de construção do aprofundamento da integração regional.

Este fenômeno fez com que os países fossem gradativamente

suspendendo suas atuações no âmbito do bloco a partir de 2018 e recemtemente,

no ano de 2019 vários países formalizaram a sua saída do bloco, que hoje, conta

com somente 5 países membros e possui seu projeto, que se construiu na tentativa

de afastar as influências políticas das grandes potências do norte nos países da

América do Sul, absolutamente fragilizado.

Outra iniciativa toma este lugar com o discurso da não interferência

política e da aproximação a partir de questões pragmáticas: o Foro para o

Progresso da América do Sul – PROSUL. Este se propõe a ser o lugar de debates

deste novos líderes que emergem na América Latina, prometendo fazer o debate

da integração sem que este seja permeado por um viés ideológico, ainda que a

aproximação ideológica tenha sido a sua própria razão de existir, visto que fora

criado para se contrapor a uma iniciativa marcada pelo ciclo de governos

progressistas.

O Prosul, que tem o seu processo presidido inicialmente pelo Chile,

conta com os seguintes objetivos iniciais para a sua instalação6:

(i) que este espaço deverá ser implementado gradualmente, ter estrutura flexível, leve, que não seja custosa, com regras de funcionamento claras e com mecanismo ágil de tomada de decisões; (ii) que este espaço abordará de maneira flexível e com caráter prioritário temas de integração em matéria de infraestrutura, energia, saúde, defesa, segurança e combate ao crime, prevenção de e resposta a desastres naturais; (iii) que os requisitos essenciais para participar deste espaço serão a plena vigência da democracia e das respectivas ordens constitucionais,

6 Dispinível em: http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-externa/integracao-regional/688-prosul. Acesso em: 29.07.2019.

Page 13: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

12

o respeito ao princípio de separação dos poderes do estado, e a promoção, proteção, respeito e garantia dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, assim como a soberania e a integridade territorial dos estados, em respeito ao direito internacional. O Chile exercerá a Presidência Pro Tempore (PPT) deste processo durante os próximos 12 meses, devendo ser sucedido pelo Paraguai.

Observamos, portanto, que não há como prever quais são os proximos

capítulos do livro da integração regional na América Latina, visto que essa

mudança de perspectiva política acabou por enfraquecer um projeto que havia sido

exitoso em analisar a realidade sul-americana e partir dela elaborar políticas

regionais que atendesse à realidade aqui estabelecida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se concluir, em verdade, que a América Latina necessita de uma

política de desenvolvimento que seja propriamente latino-americana, uma vez que

em um mundo de crescente complexidade e competitividade, não se pode admitir

que os países latino-americanos possuam uma inserção internacional que se dê de

maneira isolada.

Podemos observar também que a criação da Unasul e o fortalecimento

do pensamento latino-americano na formulação das políticas a serem praticadas

em seus países, resultou no fortalecimento do próprio Mersocul, que além de

elaborar e implementar políticas de cunho econômico, passou também a observar

suas dimensões política e social.

As realidades, sobretudo dos países fundadores do Mercosul foram

drásticamente alteradas a partir da consolidação do Instituto Social do Mercosul e

do Instituto de Políticas Públicas de Direitos Humanos do Mercosul, pois estes

foram responsáveis por implementar e coordenar políticas públicas de transferência

de renda e enfrentamento às desigualdades sociais, que resultaram na alteração

do Coeficiente de Gini, principalmente no Brasil, Argentina e Uruguai, bem como

por retirar milhões de pessoas da linha da pobreza extrema.

Page 14: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

13

Podemos, dessa forma, afirmar que este foi um importante caminho para

que se alcançasse um tipo de desenvolvimento se pretende América Latina ou uma

alternativa ao desenvolvimento imposto de maneira imperialista a partir de um

consenso elaborado fora da américa latina, que não apontava para a complexidade

da abordagem que abarcasse perspectivas sociais, humanas, políticas, culturais,

tecnológicas etc.

Os diversos cenários políticos pelos quais passou a América Latina

culminou na vivência de verdadeiros ciclos, que são responsáveis por promover,

além de mudanças relativas à sua organização institucional e política, verdadeiras

rupturas que atingem diratamente a vida dos cidadãos, por tomarem rumos

totalmente distintos e por serem sustentados por ideários que se contrapõem,

fazendo com que se dissolvam as soluções outrora apresentadas.

Por isso, considerando o atual cenário de retomada da política neoliberal

e da total desestabilização das democracias, sobretudo de seu aspecto material, é

bastante provável que o Mercosul retroceda nas pautas sociais e políticas, com o

dissolvimento da Unasul, já que os debates que aconteceram a partir dela foram

fundamentais para o fortalecimento desses setores dentro do Mercosul.

É possivel também que o aprofundamento da integração regional que

contava necessariamente com demais fatores que somente os econômicos sofra

um retrocesso de modo que a Cooperação Sul-Sul seja prejudicada por um novo

olhar que não entende a América Latina como protagonsita de seus processos e

observe tudo que não esteja comtemplado por questões comerciais como não

importantes para a nova agenda do Bloco.

Portanto, seria imperativo que, ao invés de adequar-se à política

internacional se apropriando de política hegemônica, a América Latina formulasse

seu próprio modelo de desenvolvimento, que tratasse de avançar tanto no que

concerne ao aprofundamento da integração regional, quanto no que se refere ao

poder político latino-americano em esfera global, para que as instituições se

mantessem sólidas, bem como as suas políticas não fossem catrastoficamente

Page 15: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

14

desmontadas, ainda que não se vislumbre um horizonte em que seja possível a

retomada deste pensamento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMORIM, C. A integração sul-americana. Revista DEP Diplomacia, Estratégia e

Política, 2009, p. 5-26.

BALASSA, Bela. The theory of economic integration. Abingdon (England):

Routledge revivals, 2011;

BRASIL. Decreto Nº 350, de 21 de novembro de 1991. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0350.htm>. Acessado

em: 19/08/2017;

BRESSER-PEREIRA, Luis Carlos. A crise da América Latina: Consenso de

Washington ou crise fiscal?. In: Pesquisa e Planejamento econômico. 21 (1). Abril:

1991, p. 03 a 23.

CEPAL. Anuario Estadístico de América Latina y el Caribe 2013. Santiago: CEPAL,

2014. Disponível em: <http://www.cepal.org/>. Acessado em: 24/08/2017.

______. Anuario Estadístico de América Latina y el Caribe 2008. Santiago: CEPAL,

2009. Disponível em:<http://www.cepal.org/>. Acessado em: 24/08/2017.

______. Anuario Estadístico de América Latina y el Caribe 2000. Santiago: CEPAL,

2001. Disponível em: <http://www.cepal.org/>. Acessado em: 23/08/2017.

CONSANI, Norberto; BORDAZAR, Laura B. Mercosur: perspectivas a 16 años de

integracion. In: CONSANI, Norberto; ALMARZA, Alberto A.; ZERAOUI, Zidane.

(Org.). Transitando los inicios delsiglo XXI: las relaciones inernacionales de

Argentina, Chile y México. Buenos Aires: Grupo Editor Latinoamericano, 2007.

ESPINOSA, Juan Guilhermo. La economía de américa latina a principios del silgo

XXI: una visón de economía política (marzo de 2007). In: CONSANI, Norberto;

ALMARZA, Alberto A.; ZERAOUI, Zidane. (Org.). Transitando los inicios del siglo

XXI: las relaciones inernacionales de Argentina, Chile y México. Buenos Aires:

Grupo Editor Latinoamericano, 2007.

FURTADO, Celso. Obra Autobiográfica: Contos da Vida Expedicionária; A Fantasia

Organizada. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997, Tomo 1.

Page 16: MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo ......MERCOSUL E UNASUL: a contribuição de um novo paradigma de integração regional para o aprofundamento da integração regional

15

HOFFMANN, Andréa Ribeiro. As Organizações Regionais E A Promoção E

Proteção Da Democracia: reflexões a partir das práticas de intervenção

democrática na América do Sul. In: Caderno CRH, Salvador, v. 29, n. SPE 03, p.

47-57, 2016.

MERCOSUL. Saiba mais sobre o MERCOSUL. Disponível em:

<http://www.mercosul.gov.br/saiba-mais-sobre-o-mercosul>. Acessado em

20/08/2017;

MIRZA, Ch.; BANGO, J.; LORENZELLI, M. ¿Es posible um nuevo Estado de Bienestaren América Latina? :la reconfiguración de lasmatrices de bien estar em el Mercosur. Madrid: Fundación Carolina, 2010.

MIRZA, Christian Adel. NASCONE, Mariano.Integración regional e inclusión social:

los itinerarios del MERCOSUR. RevIU. Disponível em:

<https://ojs.unila.edu.br/ojs/index.php/IMEA-UNILA> Vol. 1, Num. 2, p. 88-99, 2013.

NISBERT, Robert A. The quest for community. London: Oxford University Press – A

galaxy book, 1953.

PROSUL. Dispinível em: http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-

externa/integracao-regional/688-prosul. Acesso em: 29.07.2019.

SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigação sobre sua natureza e suas

causas. Trad. Luiz João Baraúna. São Paulo: Nova Cultural, 1996. Vol. I e II.

UNASUL. História. Dispinível em: https://www.unasursg.org/es/historia. Acessado em:

28/07/2019;

_________. Objetivos específicos. Disponível em:

https://www.unasursg.org/es/objetivos-especificos. Acessado em: 28/07/2019.