mente, poeta (considerações sobre o poeta antônio tavernard)

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15/10/2015 Mente, Poeta (considerações sobre o poeta Antônio Tavernard) http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/m00019.htm 1/11 MENTE, POETA (CONSIDERAÇÕES SOBRE O POETA ANTÔNIO TAVERNARD) Benilton Cruz[ 1 ] Grandes homens suportam grandes dores, os maiores transformam a dor em poesia. É este o caso de Antônio Tavernard, o mais moço dos poetas paraenses, e que não merece ser taxado de “exilado” ou de “mártir” como se reportou Vicente Salles[ 2 ]. A alegria em sua poesia supera a dor de ter sofrido, em toda a sua juventude, do mal de Hansen, doença que o vitimou aos 28 anos de idade. Sua poesia contorna toda essa tragédia para transparecer luminosa e alegre, como a dos grandes poetas que fizeram da juventude o seu entusiasmo. É por isso que eu defendo Antônio Tavernard como o poeta de um entusiasmo vital, aquele que faz da poesia uma condutora da humanidade. O teor de juventude impregnará a poesia de Tavernard com uma dose elevada do vigor de quem trabalha com a criação. Seja “romântica” ou “simbolista”, sua poesia é retrato de um artista amazônico, aquele que vivencia a explosão de mundos e de cores em permanente estado de criação, nesta região marcada por diversidades, riquezas, misérias, e confusas misturas em sua fauna e em sua flora, clima e cultura. Seu nítido Romantismo se estenderá para um Simbolismo acrescido da mística nazarena, da tradição cristã, especificamente paraense, herdado do pai Othílio, funcionário da Santa Casa e também jornalista, roteirista de alguns autos das “pastorinhas”, representação teatral típica do natal. A herança cristã se consolida sob influência da mãe, Marietta, devota de Nossa Senhora de Nazaré. Antônio Tavernard nasceu no dia 10 de outubro de 1908, no mês do Círio de Nazaré e por isso será batizado com o nome de Antônio de Nazareth Frazão Tavernard, filho de Othílio Tavernard e Marieta Frazão Tavernard, na outrora Vila Pinheiro (abreviação de Vila de São João do Pinheiro), atual Icoaraci, distrito de Belém, em um chalé, em estilo português, que ainda pode ser visitado, na rua Siqueira Mendes, número 585. Aos dezenove anos de idade seu talento para a literatura se revelara quando obtém o segundo lugar no concurso de Contos Nacionais da Revista Primeira. A influência para a literatura vem diretamente de seu pai, leitor de Eça de Queirós, Alexandre Herculano, Machado de Assis, Álvares de Azevedo, dentre outros autores da pequena, mas criteriosa biblioteca. O pai, conforme a informação de Maria Anunciada Chaves, era jornalista, homem de letras, autor de peças de teatro, entre as quais pastorinhas, espécie de auto natalino popular, muito usado na época, vivia Othilio Tavernard modestamente, de seus proventos como funcionário da Santa Casa de Misericórdia e como redator de ‘A Província do Pará’.[ 3 ] Mas, o que encanta em Antonio Tavernard é poesia que, sem muitos mistérios, transformou a dor em alegria. Michael Löwy e Robert Sayre, na obra Revolta e Melancolia (1995), já haviam destacado que o Romantismo, de certa maneira, nunca saíra de moda. Por essa visão, não podemos dizer que Tavernard seria um romântico “tardio”, porém, que sua poesia possui algo que ainda não desapareceu na poesia. Ela guardaria uma mistura de tendências e inspirações românticas do século 19 e o Simbolismo. O leitor mais atento pode ver mais do que uma simples conservação do Romantismo.

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Considerações sobre o poeta paraense A. Tavernard

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http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/m00019.htm 1/11

MENTE, POETA(CONSIDERAÇÕES SOBRE O POETA ANTÔNIO TAVERNARD)

Benilton Cruz[1]

Grandes homens suportam grandes dores, os maiores transformam a dor em poesia. É este o caso de

Antônio Tavernard, o mais moço dos poetas paraenses, e que não merece ser taxado de “exilado” ou de “mártir”

como se reportou Vicente Salles[2]. A alegria em sua poesia supera a dor de ter sofrido, em toda a sua

juventude, do mal de Hansen, doença que o vitimou aos 28 anos de idade. Sua poesia contorna toda essa

tragédia para transparecer luminosa e alegre, como a dos grandes poetas que fizeram da juventude o seu

entusiasmo. É por isso que eu defendo Antônio Tavernard como o poeta de um entusiasmo vital, aquele que faz

da poesia uma condutora da humanidade.

O teor de juventude impregnará a poesia de Tavernard com uma dose elevada do vigor de quem trabalha

com a criação. Seja “romântica” ou “simbolista”, sua poesia é retrato de um artista amazônico, aquele que

vivencia a explosão de mundos e de cores em permanente estado de criação, nesta região marcada por

diversidades, riquezas, misérias, e confusas misturas em sua fauna e em sua flora, clima e cultura. Seu nítido

Romantismo se estenderá para um Simbolismo acrescido da mística nazarena, da tradição cristã,

especificamente paraense, herdado do pai Othílio, funcionário da Santa Casa e também jornalista, roteirista de

alguns autos das “pastorinhas”, representação teatral típica do natal. A herança cristã se consolida sob

influência da mãe, Marietta, devota de Nossa Senhora de Nazaré.

Antônio Tavernard nasceu no dia 10 de outubro de 1908, no mês do Círio de Nazaré e por isso será

batizado com o nome de Antônio de Nazareth Frazão Tavernard, filho de Othílio Tavernard e Marieta Frazão

Tavernard, na outrora Vila Pinheiro (abreviação de Vila de São João do Pinheiro), atual Icoaraci, distrito de

Belém, em um chalé, em estilo português, que ainda pode ser visitado, na rua Siqueira Mendes, número 585.

Aos dezenove anos de idade seu talento para a literatura se revelara quando obtém o segundo lugar no

concurso de Contos Nacionais da Revista Primeira. A influência para a literatura vem diretamente de seu pai,

leitor de Eça de Queirós, Alexandre Herculano, Machado de Assis, Álvares de Azevedo, dentre outros autores

da pequena, mas criteriosa biblioteca. O pai, conforme a informação de Maria Anunciada Chaves, era

jornalista, homem de letras, autor de peças de teatro, entre as quais pastorinhas, espécie de autonatalino popular, muito usado na época, vivia Othilio Tavernard modestamente, de seus proventoscomo funcionário da Santa Casa de Misericórdia e como redator de ‘A Província do Pará’.[3]

Mas, o que encanta em Antonio Tavernard é poesia que, sem muitos mistérios, transformou a dor em

alegria. Michael Löwy e Robert Sayre, na obra Revolta e Melancolia (1995), já haviam destacado que o

Romantismo, de certa maneira, nunca saíra de moda. Por essa visão, não podemos dizer que Tavernard seria

um romântico “tardio”, porém, que sua poesia possui algo que ainda não desapareceu na poesia. Ela guardaria

uma mistura de tendências e inspirações românticas do século 19 e o Simbolismo. O leitor mais atento pode ver

mais do que uma simples conservação do Romantismo.

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Lendo seu único livro de poemas, o Místicos e Bárbaros, publicado postumamente em 1953, dezessete

anos após a sua morte. Uma seleção de poemas deixada pelo poeta como um projeto de livro. O poema de

abertura do livro é Pórtico, uma espécie de poema à maneira dos simbolistas, que, volviam a linguagem em

busca de renovação por completa, a começar pelo instante criador da poesia: inteiramente ligado à natureza, sob

o véu da criação poética como um ato de fé, uma crença, uma postulação.

Eu quisera, em meus versos, a alvoradade todas as belezas triunfais...que eles tivessem a auréola imaculadado sol de madrugada...e que neles cantassem sabiás...que fossem álacres como pensamentosde crianças em férias, mais vibrantesque pendões de palmeiras drapejantesàs carícias brutais, bruscas dos ventose mais ardentes do que dois amantesno seu beijo melhor...deslumbramentosde meios­dias tropicais fulgissemem suas estrofes como luz das gemas...que ora murmurassem, rugissem...e semeassem bênçãos e anátemas...

Este trecho lembra um dos maiores poemas já escritos no Brasil, o Antífona de Cruz e Sousa, o qual tem

por temática o fazer poético na sua essência da criação aquela que se assemelha com o mistério da criação,

principalmente, a fé, o espírito, a evocação típicos dos ritos religiosos em comunhão com a natureza em busca

de uma linguagem nova para a poesia, – essa que teria a criação como um ato de fé.

ANTÍFONA (TRECHO)

Que o pólen de ouro dos mais finos astros Fecunde e inflame a rime clara e ardente... Que brilhe a correção dos alabastros Sonoramente, luminosamente.

Forças originais, essência, graça De carnes de mulher, delicadezas... Todo esse eflúvio que por ondas passe Do Éter nas róseas e áureas correntezas...

Cristais diluídos de clarões alacres, Desejos, vibrações, ânsias, alentos, Fulvas vitórias, triunfamentos acres, Os mais estranhos estremecimentos...

Flores negras do tédio e flores vagas De amores vãos, tantálicos, doentios... Fundas vermelhidões de velhas chagas Em sangue, abertas, escorrendo em rios.....

Tudo! vivo e nervoso e quente e forte, Nos turbilhões quiméricos do Sonho, Passe, cantando, ante o perfil medonho E o tropel cabalístico da Morte...

Essa fecundação do “pólen de ouro dos mais finos astros“ para fazer a “rima clara e ardente” seria essa

criação poética como um ato de fé[4] da qual fizemos referências. A inspiração na própria acepção da palavra, o

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espírito é quem cria. Na poesia de Antonio Tavernard será acrescida de uma "herança renascentista", a da

conciliação, como afirmou o romancista Dalcídio Jurandir em um artigo que leva o nome do poeta. "Tavernard foi

um dos últimos artistas com espírito voltado para o Renascimento"[5]. Ou seja, ao lembrarmos da postura

conciliadora da Renascença, na qual o Humanismo pagão se imiscui às exigências do Cristianismo, Tavernard

se inclui no rol desses artistas que procuraram fazer da poesia um espírito de conciliação.

Não custar lembrar que poucos poetas transformaram a juventude em tema para a poesia, Hölderlin, na

Alemanha, por exemplo, foi poeta que aproximou o herói à juventude. Vale lembrar que os heróis da literatura

romântica serão, em sua maioria, jovens sensíveis, introspectivos e apaixonados. Comparo a atitude de

Tavernard a Hölderlin para dar a Tavernard o lugar que ele merece, o de estar entre os poetas que escreveram

sobre o difícil tema da juventude, o difícil tema da alegria e do entusiasmo na poesia brasileira.

Quais são os poetas paraenses antes de Antônio Tavernard? Dos poucos que serão lembrados pela

posteridade, apenas Bruno de Menezes. Antonio Tavernard aparecerá como o um domador de alma, como

ensina a tradição órfica, e domar a alma é como domar as feras. Além do mais, o poeta cultiva alguma fé – e

isto é um de seus segredos ou um de seus milagres. O certo é que nenhum outro poeta paraense cantou a lua

como Tavernard. A lua, símbolo da solidão em Safo, no célebre poema Ego de Mona Kateudo (Eu, deitada estou

sozinha), mãe­mística que os acolhe diante da penumbra da noite, a hóstia e “comunga” com os mais puros à

“conexão” perdida (a connexité, de Verlaine, no Prólogo do livro Poemas Saturnianos). A lua parece ser a triste

face de Deus meditativo, ou o seu único “olho” a iluminar o que já não mais sabemos.

CANTO CHEIO DE LUZ

Melancolia de um luar de agostoAberto em pálio sobre o meu desgosto.Luz que me unge, que me faz mais puro,E põe brilhos de gema no monturo,E dá ilusões de lírios ao marnel*...Luz, alma de tudo que cintila:Áscua, raio, rubi, rocio ou pupila...Luz de veludo, límpido, docelDo catafalco desta vida...Aurora boreal para a mirada erguida,Nas trevas frias procurando DEUS...Luz,Fluindo que vem da alma de JesusPara a alma sem luz dos fariseus...Fogos fátuos, estrelas, pirilampos,Por mortórios, nos cosmos, pelos campos,Fragmentos de luz que se espalharam...Luz apagada, luz extinta, morta,Que só o anhelo** de rever exorta,Luz dos olhos daqueles que cegaram...Luz de santelmos, de faróis, de círios,Tão diferentes pelos seus destinos,Iluminando não se sabe o quê.* pântano** anseio

Ao se ler este poema, fica a pergunta: tanta luz no universo e para quê, se estou só? Deus aqui não

conta por que é uma procura, e “Jesus” seria talvez essa luz. Entretanto, o rigor religioso dos simbolistas se

estende por uma natureza sem ligação com o eu. Esse rigor simbolista, na verdade, foi herdado de uma longa

tradição que tem Hermes Trismegistos a sua raiz. O deus egípcio criador da linguagem, teria criado os

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hieróglifos, e assim, toda uma concepção sagrada da linguagem, que vai sobreviver no Ocidente, talvez, por

causa de Emannuel Swedenborg, filósofo, teólogo e cientista sueco, místico, filólogo a ponto de procurar

interpretar o Apocalipse com base em todo o conhecimento lingüístico de então. As correspondências de

Baudelaire são nítidas influências de Swedenborg. Para um iniciado, o poeta é o purificador da linguagem, a ele

cabe toda a conduta da pureza que só pode aproximar­se da luz, e, no caso de Tavernard, da luz dos místicos.

A língua que o escreveu marca­se pela mística e pelo ardor, e como poeta, foi aquele que logrou,

inevitavelmente, o vaticínio, o canto do vate, o predizer limitado, a catástrofe que abalou a sua família (o poeta

morrerá nos braços da mãe aos 28 anos incompletos): sua tragédia pessoal, a condição de um doente do mal de

Hansen em plena juventude.

LACRIMÁRIO

(Do diário de um tísico)

Quando eu era criança...(Parece incrível que eu já tenha sidocriança como parece incrível a tormentaque já fora bonança).Quando eu era criança,e tinha febre leve ou violenta,e o doutor vinha, grave majestoso,mamãe dizia: – “Se o filhinho,tomar o seu remédio direitinho,papai comprar­lhe­á um brinquedo mimosoe mamãe há de dar­lhe um beijinho gostoso!”

Mamãe dizia...E os líquidos amargos, forçando o meu desejoeu depressa bebia...Por causa do brinquedo, e pelo beijo...Também parece um sonho, um sonho lindo,que pai e mãe eu haja possuído...Pena é que o sonho tenha terminado,e que agora eu passe as noites acordadoescrevendo e tossindo!

Estou muito doente. Os médicos vieramSacudiram a cabeça, receitaram,E se foram depois... e não voltaram...Mas bebi tudo que me deram,E, se é demais a dor que às vezes vemO peito me rasgar, choro baixinho...Não vá meu choro incomodar alguém!

A dar­me água quando estou com sede,Mamãe já não estáJunto de mim, a balançar­me a redePra lá, pra cá...Abençôo, contudo, este abandono,Esta vida infeliz de cão sem dono,Porque, se aqui estivesse,Mamãe de dor se tornaria louca,

Se ao menos percebesseO lenço rubro, com que enxugo a bocaQue todos temem, que ninguém mais quere que ela seriaa única mulher

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que para ungir, para suavizar,talvez tivesse – sim teria! –coragem de beijar...(E o poeta morreu. Morreu sozinho,rosa sem haste, pássaro sem ninho.E, morto, ele sorria, como, quando,Ia, criança, as pálpebras cerrandoNo colo maternal).

Assim, como Mário Faustino, em vários poemas como Sinto que o mês presente me assassina, o

predizer, mas não necessariamente, o fato em si, não assinala, necessariamente, uma poesia profética. Muito

pelo contrário, a linguagem escrita não teria esse poder de nomear com clareza o quando e o onde. A linguagem

escrita é linear e opcional diante da realidade, simultânea e complexa. A poesia pode mostrar situações de

vaticínios, mas nunca demonstrá­las com clareza.

Tavernard escreveu místico porque viveu místico. Poderíamos também acrescentar, escreveu sofrido

porque viveu sofrido, mas nunca se limitou à dor. O que é mais bonito é que sua poesia extrapola a dor e

encontra na alegria sua expressão. Algo impossível, não? Sim, por que sua vida familiar reforçava uma certa

felicidade e uma educação de um menino, gênio em tenra idade, e um homem maduro ainda jovem. Daí, até a

mística da música do “Rancho Fundo” lhe pertencer sem que saibamos, realmente, se a autoria desta música

lhe pertencera (O professor Vicente Salles teria levantado a hipótese de a letra de “Rancho Fundo” [6] ter sido

escrita por Antônio Tavernard, ou ter sido inspirado nele, uma vez que a letra retrataria o drama de um jovem

exilado no Rancho Fundo. Engraçado é que Rancho Fundo é nome de um chalé de madeira construído pela

família do poeta por uma questão de segurança e higiene, uma vez que, à época achava­se que a hanseníase

seria altamente contagiosa).

O desafio do poeta que nasce na Amazônia é saber lidar com a perigosa exuberância da maior

biodiversidade do planeta, inclusive, a “biodiversidade” lingüística de heranças afro­americana, indígenas e dos

imigrantes, que, por aqui, deixaram suas contribuições culturais. Esta “biodiversidade lingüística” pode ser

danosa, quando mal empregada à poesia que se escreve em terras amazônicas. A poesia, mesmo a que se diz

regional, quando bem escrita, torna­se universal, que é em si um dos papéis da própria poesia: mostrar o homem

de todas as realidades, de todas as culturas e todas as línguas em uma só língua, a que é chamada de poesia.

O desafio natural do poeta nascido na Amazônia é de se superar, fazer vingar por si mesmo o que não

pode ser feito pelos leitores, pois que, poucos e mal aproveitados, estes desconhecem, em sua maioria, o nome

de um Ruy Barata, um Paulo Plínio Abreu, um Mário Faustino, um Max Martins ou um Antônio Tavernard. Um

paraense que visita a Casa do Governador e se senta à ilharga daquela estátua ali ao lado do Restô do Parque e

não sabe que se trata de Ruy Barata, autor do poema Nativo de Câncer, realmente, é porque a nossa Escola,

aliás, as diversas escolas públicas e privadas de nosso Estado, falharam ao lidar com a nossa própria literatura.

Então, onde está a cultura amazônica? Ou a cultura paraense? Se a cultura amazônica (ou pelo menos sua

linguagem) está fora da escola é porque ela não existe para o Estado.

Ao falhar o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, não caberá ao ensino universitário corrigir essa falha.

Por outro lado, a crítica literária, quase inexiste no Pará, pouco responderá pela expansão de autores e obras

paraenses. Resta, portanto ao próprio poeta se superar. É o caso de Antônio Tavernard, que mesmo após,

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quase setenta anos de sua morte, continua sendo lembrado pelos seus leitores e pelas novas gerações de

poetas que lhe atribuem um entusiasmo especial: o de ser um poeta da juventude, o de sinalizar com poemas

irradiantes da alegria superando a dor.

Antônio Tavernard ainda é o mais conhecido, o mais recitado, o mais cantado. “Foi Boto Sinhá” é tão

cantado quanto “Foi Assim” na interpretação de Fafá de Belém. Aqui, junta­se a Ruy Barata, como os dois

maiores letristas da nossa música. E sempre me pareceu o poeta da juventude ou o poeta da alma jovem porque

sua poesia revela um legado da alegria sobre o sofrimento, através da poesia feita de espontaneidade e

sentimento, duas características que lhe fazem cair no gosto popular.

O que impressiona, e não cansaremos de repetir, em Tavernard é essa transformação da dor em alegria,

de projetar em seus versos o vigor de uma juventude física e espiritual eterna. Talvez seja o caso único na

poesia que se escreveu no Pará. Outra coisa que nos impressiona muito é a experiência aberta de sua poesia,

nela vemos diálogo com a poesia de Paul Verlaine, com a força mística e criadora de Cruz e Sousa, com o

Romantismo indianista de Gonçalves Dias e a exasperação emotiva de Álvares de Azevedo.

Ao ler a sua obra, é impossível não sentir saudades de Tavernard, mesmo para aqueles que não o

conheceram. No poema Norte do meu amor, o poeta, como no épico finlandês Kalevalá, transforma a família em

um tema épico, uma saga a revigorar a luta das pequenas conquistas no seio da família emoldurados pelos

"assombros naturais ultrapassados só/ pelo titã das águas: o Amazonas". Melhor ainda é a aproximação da

poesia de Antônio Tavernard com uma das características da poesia lírica moderna: a fusão do lírico com o

épico.

NORTE DO MEU AMOR

Vovô, dá­me tua benção! Vou falar de ti,Norte do boi­bumbá, do putirum, do coco,da pimenta e do mel, do cabra e do caboco,da mixira, do angu, do aluá, do açaí,da fibra de uacima, do sebo de uccuba,da baunilha, do uirapuru, do bacuri,do Jesus vegetal – a carnaúba;simbiose de raças e de zonas,Norte da Paulo Afonso, Norte do Marajó,assombros naturais ultrapassados sópelo titã das águas: o Amazonas;Norte da pororoca e do crivo de rendas,de mulheres fecundas e dos corcéis sem brida,de existência.........................................................................

Aparentemente um “épico familiar” como o do poema Kalevalá da epopéia finlandesa, exemplo do “cantar

a família” (Meira, 1988: 49), as relações mútuas como lembra o termo “putirum”, palavra que do tupi poti’rõ vai

dar no termo “mutirão”, tão usado pelo Brasil afora, em seu significado de auxílio gratuito que, antigamente,

prestavam os lavradores uns aos outros, hoje, mais generalizado devido o mau uso do sentido da solidariedade.

Mas, nos chama atenção outro tema na poesia de Antônio Tavernard: a metapoesia sob uma ótica bem

peculiar. Percebemos que a metapoesia tornou­se o inevitável caminho sem volta da poesia, espécie de

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metafísica de um discurso que não se contamina tão fácil assim, pois a poesia parece ser sempre um discurso

neutro diante dos discursos. Assim, a língua pensaria a si mesma através daquilo a que se convencionou

chamar de metapoesia. A língua refletiria a si mesma e indo mais além, daí o prefixo META (além,

transcendência) como o da Metafísica, o depois da Física; como o da Metáfora (tropo que consiste na

transferência de uma palavra para um âmbito semântico que não é o do objeto que ela designa).

A metapoesia, ou seja a poesia que retrata o fazer poético, em seus mistérios, que, para quem escreve

poesia, vez ou outra, mergulha nessa tarefa. De Horácio, em sua Carta aos Pisões aos poemas de Olavo Bilac

(Inania Verba), a João Cabral de Melo Neto e de Carlos Drummond de Andrade, que souberam afirmar um novo

gênero para a poesia, a metapoesia) a poesia torna­se uma confissão?, uma oração? Um épico? O estado

“abstrato da poesia”? ou sua voz abafada para dentro?, ou o como se faz, através de um. “Esforço vão” dirá

Antônio Tavernard em mais um de seus sonetos.

ESFORÇO VÃO

No limiar da criação, fremefremindoO meu pensamento pára...É a hora maga...Hora fecunda, benéfica ou aziaga...:A idéia, lenta, pouco a pouco, vai surgindo,

Tímida, arisca, vacilante, vaga...Definida, depois...Então, reunindoOs vocábulos vou para a ir vestindoCom a pompa lapidar da forma... chaga

De luz é a inteligência nesse instante...Dela escorrem, qual sangue fulgurante,As frases tracejadas a correr...

Mas o ponto final tomba gelado...E eu sinto, então, como um desencantado,Toda a inutilidade de escrever.

Belém, 20/10/29

Comparamos ao soneto Inania Verba de Olavo Bilac, poema que mostra a imperfeição da palavra e a sua

condição “vã” de expressar verbalmente e literariamente, neste caso, uma condição tão aversa aos ideais

parnasianos, que primavam pela forma, pela correção e pela clareza.

INANIA VERBA

Ah! Quem há de exprimir, alma impotente e escrava,O que a boca não diz, o que a mão não escreve?­ Ardes, sangras, pregada à tua cruz e, em breve,Olhas, desfeito em lodo, o que te deslumbrava...

O pensamento ferve, e é um turbilhão de lava:A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve...E a Palavra pesada abafa a Idéia leve,Que, perfume e clarão, refulgia e voava.

Quem o molde achará para a expressão de tudo?Ai! Quem há de dizer as ânsias infinitasDo sonho? E o céu que foge à mão que se levanta?

E a ira muda? E o asco mudo? E o desespero mudo?

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E as palavras de fé que nunca foram ditas!E as confissões de amor que morrem na garganta?!

Olavo Bilac

O poeta é aquele que se debruça não apenas sobre o segredo das palavras, mas também sobre esse

vazio que é a linguagem, essa “casca” de uma mangueira colossal sob a qual o poeta costumava passear ali

pela avenida Generalíssimo Deodoro, da qual mereceu destaque no poema de Manuel Bandeira sobre Belém. E

voltando á poesia: como dizer sobre um comportamento “camaleônico” das palavras como se reportou o crítico

russo Yuri Tinianov? Esta inquietação aproxima a poesia de Tavernard com as inquietações de Olavo Bilac, em

Inania Verba ("palavra em vão", em latim).

O Poeta da Vila (outro epíteto para Antônio Tavernard) escreveu um poema que sintetiza muito bem a sua

habilidade em jogar com as palavras (e não apenas jogar), no caso: a mentira e a verdade. Há, no poema Mente

Poeta , uma inversão de valores, em que o poeta acaba por exaltar a mentira e abominar a verdade, e nos

convence disso, pois que a mentira é um dos assuntos fundamentais na criação artística, pois teria, com

certeza, um propósito. Tudo isso em nome da criação que, segundo o poema, necessitaria da mentira para a

uma espécie de plenitude, de sensatez.

As questões são estas: é possível criar sem “mentir”? Qual é o grau da mentira na ficção? Como ver isso

na poesia? Já que o poeta foi além do jogo de palavras, este artigo pretende ir além, no sentido de verificar

nessas questões, o problema da criação na poesia. Justifica­se esse problema uma vez que a poesia moderna é

toda ela marcada por uma inquietação da palavra que é escrita, ou melhor: um dos temas preferidos da poesia

moderna é a própria poesia que se reflete.

A poesia guarda um dos mistérios da linguagem. Há algo de misterioso na linguagem. A ficção tão

necessária a criação passa por um mentir consciente. Impossível não ver Autopsicografia de Fernando Pessoa

(inconscientemente) no poema abaixo:

MENTE, POETA

Mente, poeta! A vida apenas valePela mentira que nos faz feliz.Que nunca jamais teu verso caleA mistificaçãoOu a burla que desdizA dúvida infernal de um coração!

Mente, poeta, mente! Não existeIsso a quem chamam de sinceridade.Gargalha, se tua alma chora triste,E, se vives em grande alacridade,Põe soluços nos versos que escreveres.

Faze de engano a trama que teceres!O poeta é uma aranha, e as emoçõesDos que o lêem, inseto multicoresQue se deixam ficar nas suas dores,e alegria, na sua ventura ou pena,pelo invisível fio das ilusõesque existem no aranhol de algum poema.

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Mente! A mentira, qual couraça,Abrouquela e defende o nosso sonhoNesse combate hórrido e medonhoQue a existência é. Mente e, empós, passa!...Hão de seguir­te bençãos e evoés!O que ganhou MoisésEm ser sincero? Morrer sem CanannA verdade é malsã.Lembra­te de Jesus!Foi ela que o pregou naquela cruz.

Mente, poeta! Desfolha os malmequeresDas estrofes falsas que criaresSobre o colo de todas as mulheresQue amares!As mulheres, que são?Uma linda mentira em encarnação.

Mente às tontas, a esmo...A todos e a ti mesmo!...

Se és casto, louva o vício!Se és bom, prega a maldade!Se amas, nega o amor!Egoísta, aconselha o sacrifício!Mísero, canta a felicidade!Feliz, descreve a dor!

Faze de engano a trama que teceres!Que nunca a burla a tua lira cale,Pois a verdade mais límpida não valeDos versos que escreveres!

(1931)

Por que isolar Antônio Tavernard com a estigma de Poeta Paraense, uma vez que os perigos da

regionalização são muitos. A literatura em si já é um exílio, e quanto melhor a literatura, mais o exílio acena

como um castigo. Este artigo pretende também divulgar Brasil afora este poeta que morrera na juventude e

escrevera em torno de duzentos poemas.

Selecionei seu soneto mais bonito que a meu ver, para finalizar este artigo. É o Duplicidade, obra­prima

do seu Romantismo místico, delicado e sublime, sensual e espiritual, essencialmente lírico, como a substância

da poesia, em seus paradoxos:

Minha linda boneca de pelúcia,Com sutis redondezas de mulherTens um nome romântico — Alba MuciaE um perfume que canta — Chanteclair.

Roubaste às gatas a felina astúciaQue alcança tudo o que almeja e querEsse jeito de andar, essa fidúciaE essas unhas de um jaspe rosicler.

À noite, quando sais do inexistenteE vens viver alucinadamenteEntre um grande soluço e um grande beijo

Nas páginas do livro onde te lançoSinto que és carne porque te desejo

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Sinto que és sonho porque não te alcanço.

Foi publicado na revista paraense A Semana, nº 700, em 20 de fevereiro de 1932. Nele fica registrada a

habilidade de Tavernard com o soneto, este texto lírico por excelência, pois tem que ser conciso como a poesia:

poucas palavras; poucas linhas. Observamos o místico­amoroso, entre os planos físico e espiritual, como os

simbolistas, extensões sub­reptícias dos românticos. Belo é ver neste soneto a vida como um livro, onde o

poeta escreve a carne e o sonho, o corpo e o espírito, duas substâncias feitas pela mesma matéria: a poesia.

Tavernard foi o mais corajoso poeta que Belém já teve, e é também o mais saudoso porque ninguém

mais será feliz diante de tão temerário sofrimento, esse sofrimento contido pela força e pela beleza de sua

poesia. Finalizemos à maneira de Tavernard:

Cada um dá o que tem!– Diz o adágio, evangelista da sinceridade!...E eu digo tambémPensando nos meus sonhos vãos, dispersos...Cada um dá o que tem!Ah! Que verdade!...A vida deu­me a dor, eu dou­lhe versos...

BIBLIOGRAFIA

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COSTA, Ferreira. A Enciclopédia do Futebol Paraense. Belém : Smith, 2000.

LÖWY, Michael. Revolta e Melancolia: o romantismo na contramão da modernidade. Trad. por Guilherme Joãode Freitas Teixeira. Petrópolis: Vozes, 1995.

MEIRA, Cécil. Introdução ao Estudo da Literatura. 5ª ed. Belém: Imprensa Oficial do Estado, 1988.

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VERLAINE, Paul. Poemas Saturnianos e Outros. Trad. Fernando Pinto do Amaral. Lisboa: Assírio e Alvim,1994.

[1] Doutorando em Teoria e História Literária pela UNICAMP e professor da UFPA. E­mail: [email protected]

[2] SALLES, Vicente. O Exilado do Rancho Fundo. In. ASAS DA PALAVRA ­ v.4, n.9, out.1998. Belém: Unama,1998.

[3] CHAVES. Maria Annunciada Ramos. Apresentação In: TAVERNARD. Antônio. Edição comemorativa do

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15/10/2015 Mente, Poeta (considerações sobre o poeta Antônio Tavernard)

http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/m00019.htm 11/11

Cinqüentenário da morte do poeta. 1986. p. 14.

[4] Interessa mostrar aqui como a poesia era concebida por um poeta simbolista. No caso de Cruz e Sousa háum texto seu em prosa chamado "A Musa Moderna" que diz "Não há poesia onde não houver fôlego, sentimento,paixão pela natureza sempre farta de assuntos para os espíritos empreendedores. Não há poesia onde houverconvenção, onde a espontaneidade e a fé individual do cantor, não se revele com força" SOUSA, Cruz e.Dispersos: poesia & prosa, 1998, p. 126.

[5] JURANDIR, Dalcídio. Antônio Tavernard. Asas da Palavra, p.43.

[6] No Rancho Fundo, Ary Barroso & Lamartine Babo (1931).No rancho fundo/ Bem pra lá do fim do mundo/Onde a dor e a saudade / Contam coisas da cidade.../ No rancho fundo/ De olhar triste e profundo/ Um morenoconta as "mágua"/ Tendo os olhos rasos d'água / Pobre moreno / Que de tarde no sereno /Espera a lua noterreiro /Tendo o cigarro por companheiro / Sem um aceno/ Ele pega da viola /E a lua por esmola/ Vem proquintal desse moreno /No rancho fundo / Bem pra lá do fim do mundo /Nunca mais houve alegria /Nem de noitenem de dia/ Os arvoredos/ Já não contam mais segredos /E a última palmeira/ Já na cordilheira/ Os passarinhos/Internaram­se nos ninhos / De tão triste esta tristeza/ Enche de trevas a natureza/ Tudo por que? / Só porcausa do moreno / Que era grande, hoje é pequeno/ Para uma casa de sapê / Se Deus soubesse/ Da tristeza láserra/ Mandaria lá pra cima / Todo o amor que há na terra / Porque o moreno/ Vive louco de saudade/ Só porcausa do veneno /Das mulheres da cidade / Ele que era O cantor da primavera/ Que até fez do rancho fundo / Océu maior que tem no mundo/ O sol queimando/ Se uma flor lá desabrocha /A montanha vai gelando /Lembrandoo aroma da cabrocha.