memórias paroquiais de braga

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AS FREGUESIAS DO DISTRITO DE BRAGA NAS MEMRIAS PAROQUIAIS DE 1758A construo do imaginrio minhoto setecentista

Ttulo As freguesias do Distrito de Braga nas Memrias Paroquiais de 1758.A construo do imaginrio minhoto setecentista

Autor Jos Viriato Capela

Edio integrada no Projecto A Descrio do Territrio Portugus do Sculo XVIII, apoiada pela F.C.T. (Fundao para a Cincia e a Tecnologia) e pelo Mestrado de Histria das Instituies e Cultura Moderna e Contempornea (Universidade do Minho)

Design grfico Lus Cristvam

Composio, impresso e acabamentos Barbosa & Xavier, Lda. - Artes Grficas Braga

Data de sada Dezembro de 2003

Tiragem 750 exemplares

Depsito legal 202732/03

Apoio Governo Civil de Braga

Nota Prvia

Publicam-se no presente volume as Memrias Paroquiais de 1758 referentes s freguesias dos concelhos do actual Distrito de Braga. Fica assim ao dispor de um pblico alargado um nmero muito significativo de Memrias Paroquiais, textos relativamente aos quais, por razes compreensveis, tem havido uma geral curiosidade local, mas que se revelam um importantssimo acerbo documental para o conhecimento mais de perto do Portugal de meados do sculo XVIII que a investigao cientfica e historiogrfica pode assim utilizar mais largamente. As Memrias Paroquiais tm vindo a ser publicadas de um modo muito fragmentado e sem critrio ou sem critrio de conjunto. Entendemos que para atingir e explorar mais profundamente o contributo das Memrias era necessrio proceder a um certo agrupamento que por um lado condensasse um volume maior de informaes possvel de confronto e at de tratamento quantitativo que as respostas conduzidas pelos itens do inqurito permitem, e por outro lado, ganhassem maior pregnncia relativamente aos quadros geogrficos e administrativos em que as parquias se inscrevem. A agregao da edio das Memrias num qualquer quadro no pe problema porque os textos foram produzidos em obedincia ao quadro estreito da parquia. Mas a agregao para sobre elas produzir um estudo que as valorize no seu conjunto que coloca desde logo problemas, a saber, a que nvel colocar essa agregao para um estudo de conjunto pertinente. Tem-se optado na publicao das Memrias quando se no publicam isoladas, pela sua reunio adentro dos territrios dos actuais concelhos. No deixa evidentemente de se correr riscos ao fazer essa opo porque o quadro das referncias geogrfico-administrativas, quer as civis quer as religiosas a que os procos se cingiram em 1758 para situar as suas parquias e que portanto condicionaram a redaco dos textos, est longe de se apresentar suficientemente desenvolvido. Apesar de tudo o quadro das referncias concelhias que foi o mais citado aquando da redaco das Memrias, continua a ser tambm o mais pregnante, apesar da transformao que sofreu a carta dos concelhos. E isto at porque os actuais concelhos esto no todo ou na sua parte principal, na continuao dos antigos concelhos reformados e reorganizados pela reforma administrativa e territorial de 1832-1836. Por outro lado e em desabono da opo pela sua reunio num quadro da diviso eclesistica liga-se o facto de o ordenamento administrativo eclesistico, a saber, o quadro da Visita eclesistica e do Roteiro de visitao que era rea de correio religiosa e pastoral da administrao eclesistica e que serviu para a distribuio dos Inquritos das Memrias, no ter constitudo qualquer constrangimento e quadro de orientao das respostas, embora os procos entre si trocassem informaes, especialmente os mais vizinhos. Acresce o facto de a estas reas de Visitao e Roteiro de visitas no corresponderem quaisquer unidades geogrficas ou sociais de vida das parquias que se articulavam mais directamente aos seus superiores no quadro da Diocese. Por isso as reas de Visitao no sobreviveram s reformas da administrao e diviso

territorial civil e eclesistica do sculo XIX e estes territrios de superviso eclesistica e pastoral vieram a adaptar-se e moldar-se carta dos novos concelhos no mbito dos novos arciprestados. Na falta deste quadro intermdio da administrao eclesistica para a organizao deste estudo e publicao das Memrias, a alternativa era a opo pelo quadro diocesano, atendendo por um lado articulao mais forte das parquias ao tempo no quadro diocesano e ao fundo da cultura comum dos eclesisticos que muito condiciona a redaco das Memrias que organizada e veiculada neste contexto pelas autoridades diocesanas. Mas no quadro da diocese bracarense tal programa de estudo apresentava algumas dificuldades, decorrentes da vastido e elevado nmero de parquias distribudas por um territrio para o qual a administrao diocesana desenvolveu j instrumentos de governao desconcentrada a inviabilizar estudo e tratamento de conjunto pertinente. Optamos por isso pela agregao da publicao destas Memrias adentro do quadro territorial do actual Distrito de Braga. No por razes de pertinncia de quadro cientfico de abordagem e insero dos textos que obviamente no tem, at porque a diviso distrital uma realidade posterior a 1758 e totalmente nova. Mas porque privilegiando de algum modo o espao concelhio do tratamento e abordagem das Memrias Paroquiais, o Distrito permitiu-nos proceder composio de um volume de dimenso razovel de Memrias, num quadro que historicamente desde o sculo XIX mais intensamente aproximou estes concelhos. Outra questo que logo se colocou foi o dos termos da edio dos textos das Memrias. A tentao era a de tendo em vista a curiosidade e interesse das populaes por estes testemunhos que lhe dizem respeito, actualizar, sem grandes limites, o texto. Contivemo-nos porm nesta tentao, fixando-nos nos termos de uma edio paleogrfica com as regras que vo fixadas, de modo a que estes textos possam servir e ser utilizados no s por um pblico mais vasto e sirvam programas de animao histrica, animao cultural, escolar e social local, mas tambm o da Histria em geral, o da Lngua e da Cultura Portuguesa. A outra questo relacionada com a edio das Memrias Paroquiais prende-se com a redaco de um texto que suportasse a compreenso destes textos e permitisse tambm a sua lio histrica. Poderamos ter seguido o caminho mais corrente, o de anteceder as Memrias de um Estudo Introdutrio, do gnero dos que vimos produzindo para a edio monogrfica concelhia das Memrias Paroquiais. Entendemos que este caminho no era o melhor, j que a publicao neste quadro distrital ultrapassa de longe o quadro monogrfico concelhio, que naquela organizao e naqueles estudos introdutrios eram particularmente relevantes. Recorremos antes elaborao de um Dicionrio, que permite a elaborao de textos mais breves e mais dirigidos s temticas tratadas nas Memrias, portanto mais adaptados leitura e explorao das Memrias que o que aqui se pretende. Trata-se certamente de um esboo de dicionrio que pretende adaptar-se aos contedos gerais e aos prprios do seu espao geogrfico e institucional, o do territrio das parquias e concelhos minhotos e do Arcebispado e Igreja Bracarense. seguramente um dicionrio ainda relativamente frustre, certamente desequilibrado aqui e acol com algumas faltas mais patentes de entradas, mas que se ir aperfeioando medida da publicao de outras Memrias Distritais.

A publicao das Memrias segue a ordem alfabtica no interior de cada concelho. E a cada Memria juntou-se um referencial documental de fontes do Igrejrio Bracarense particularmente pertinentes ao aprofundamento do estudo das parquias. A presente obra vai tambm acompanhada de ndices e Roteiros que nos pareceram os mais relevantes, elaborados com o intuito no s de permitir um acesso global s informaes mas tambm sua localizao nos textos das Memrias. Esta obra foi realizada no mbito do Projecto A Descrio do Territrio Portugus do Sculo XVIII. Os Distritos de Braga, Viana do Castelo e Vila Real nas Memrias Paroquiais, apoiado pela Fundao para a Cincia e a Tecnologia e contou com a colaborao dos tcnicos e investigadores que integraram aquele programa: das tcnicas Sandra Maria Castro (a preparar a edio das Memrias de Guimares no mbito da sua dissertao de Mestrado, tendo facultado para aqui os textos das Memrias) e Clarisse Arajo que so responsveis pela primeira leitura e processamento dos textos, elaborao de algumas tabelas e ndices e recolha do referencial documental; e dos investigadores Rogrio Borralheiro e Henrique Matos que colaboraram na reviso dos textos das Memrias e na elaborao de alguns ndices. Somos tambm debitrios da contribuio destes e de outros investigadores no quadro de elaborao dos Estudos de algumas monografias concelhias contendo as Memrias Paroquiais de concelhos do Distrito de Braga que de algum modo aqui foram utilizados: Rogrio Borralheiro (Memrias de concelho de Barcelos, 1998 e do concelho de Vieira do Minho, 2000); de Antnio Joaquim Pinto (Memrias do concelho de Vila Nova de Famalico, 2001); de Ana Cunha Ferreira (Memrias do concelho de Braga, 2002); de Fernanda Rocha (Memrias do concelho de Amares, 2003). E tambm pelos alunos da 5. edio do Mestrado de Histria das Instituies e Cultura Moderna e Contempornea (Departamento de Histria, Universidade do Minho) que apoiou a presente edio. Neste trabalho colaborou tambm intensamente a minha famlia, a Marta, o Carlos, o Jos Jorge e a Maria da Conceio.

As Memrias Paroquiais de 1758Um programa nacional de descrio paroquial do pas

A DESCRIO DO TERRITRIO PORTUGUS. A GNESE DAS MEMRIAS PAROQUIAIS DE 1758

Portugal faz ao longo do sculo XVIII, um enorme esforo de mais profundo conhecimento do seu territrio, das suas gentes, dos seus costumes, da sua civilizao. Como o fizera com idntico esforo no sculo XVII, do seu esprito, do seu destino e do seu futuro 1. Nesse esforo de conhecer Portugal, de o conhecer mais de perto, faz parte a descrio memorialstica das parquias do Reino esse quadro mais longnquo do centro poltico, mas o mais prximo da vida das populaes para que foi lanado a meio de sculo, o grande Inqurito Paroquial de 1758. Esse esforo de conhecer Portugal no seu conjunto e por inteiro em todas as suas partes antes de mais um esforo e um movimento da governao monrquica, que ter em D. Joo V (para a 1. metade do sculo), em D. Jos I, para o 3. quartel, e em D. Maria I e D. Joo Prncipe, depois rei D. Joo VI, para o ltimo quartel desse sculo XVIII e em seus mais brilhantes ministros, os principais impulsionadores. Fixa-se por ento muito clara e constantemente a ideia de que para governar para bem governar preciso conhecer o objecto da governao, mas tambm o seu uso moderno pelas naes mais polidas da Europa. Se pretendermos de algum modo sintetizar em trs palavras o sentido mais global (ltimo) dos objectivos destes monarcas na recolha de informaes para o conhecimento de Portugal, ele poderia ser resumido s seguintes: conhecer para cultivar, para reformar, para ilustrar e socorrendo-se para tal do mtodos e dos instrumentos de que os monarcas europeus lanam mo para modernizar e civilizar os seus povos e as suas instituies. Este esforo de conhecimento e avaliao das realidades nacionais um programa rgio, mas tambm um esforo intelectual e cientfico individual e das instituies. No sculo XVIII, o intervencionismo rgio e estadual fez porm com que estas iniciativas se congraassem e se reunissem todas num esforo comum de conhecimento para o desenvolvimento, a prosperidade e felicidade geral da Monarquia e de seus vassalos. Essa tarefa foi em grande medida cometida por Soberanos no plano cultural e cientfico s Academias que para tal fundaram e protegeram com particulares privilgios rgios e pblicos. Neste contexto certamente conhecido o significado e o papel da Academia Real da Histria, fundada em 1720 por D. Joo V, virada sobretudo para o estudo e o conhecimento da Histria Antiga e Moderna de Portugal. Ento a Histria com as demais cincias literrias e humansticas, ganhar um importante papel poltico como Cincia do Passado para abrir as

portas do Futuro. O conhecimento histrico volve-se ento suporte do Progresso. conhecida tambm a criao por D. Maria I da Academia de Cincias de Lisboa em 1778 que nas suas diferentes classes procura o conhecimento cientfico das nossas realidades e recursos com que se pretende agora promover o progresso e a felicidade dos povos. Elas so duas instituies fundamentais, em que para o futuro assentar o desenvolvimento do conhecimento histrico-cultural, literrio, tcnico e cientfico de Portugal e que melhor ento revelariam Portugal aos Portugueses, num legado e trabalho que continua ainda actuante. Este Academismo do sculo XVIII assumir pois agora tarefas pblicas e envolver de um modo geral a Sociedade e as Terras portuguesas nesse esforo conjunto de conhecimento, valorizao e desenvolvimento 2. Exprimir-se- territorialmente na constituio de correspondentes locais, no estmulo aos trabalhos e investigaes particulares que aspiram ao reconhecimento Acadmico e at na constituio de Academias locais, imagem e semelhana das de Lisboa. conhecida esta articulao local e territorial com as Academias lisboetas a partir da nomeao de correspondentes locais, em especial no que diz respeito ao corpo de comissrios e correspondentes da Academia Real da Histria. Registaria aqui to s os nomes e as obras de 3 das mais importantes contribuies regionais para o projecto nacional da escrita de uma Histria Geral do Reino que a Academia Real da Histria perseguia e que resultaram em estudos e referncias fundamentais para o territrio Minhoto, a saber, a obra de Francisco Xavier Craesbeeck e as suas Memrias Ressuscitadas da Provncia de Entre Douro e Minho no ano de 1726 (reed. de Ponte de Lima, 1992); a obra de D. Jernimo Contador de Argote, Memria para a Histria Eclesistica de Braga (17321744); e a obra de A. Machado Vilas Boas, Catlogo dos Vares ilustres da notvel vila de Viana, 1724 (reed. Viana do Castelo, 1984), esta mais especificadamente dirigida ao territrio, sociedade e instituies limianas e alto-minhotas. Estas obras volver-se-iam trabalhos de referncia para o futuro, porque nelas se fixariam os lugares histricos e imaginrios regionais que constituiriam o fundo a que sempre recorrem mais ou menos criticamente a Historiografia Geral e os eruditos locais busca e recolha de informaes. A elas recorreriam, directa ou indirectamente, os Memorialistas dos Inquritos de 1758 para tratar matrias histricas, literrias, das Antiguidades e Ilustres da terra inquirida. E no poder deixar de se referir a constituio da Sociedade Econmica de Ponte de Lima dos Bons Compatriotas Amigos do Bem Pblico constituda em simultneo com a Academia das Cincias de Lisboa, integrada por ilustres locais e que pretendia levar a cabo para o Minho o que a Academia se prope levar a cabo para Portugal, a saber, um programa ilustrado de desenvolvimento do Pas (isto , da regio) que assentava em largo esforo na Educao e Fomento da Indstria Popular ao modo das Sociedades ilustradas dos Amigos do Pas, espanholas e galegas, com grande actividade e relativo sucesso 3. A descrio do pas e do territrio no sculo XVIII e ao tempo das Memrias Paroquiais de 1758 seguindo a tradio antiga uma tarefa que cabe s Histrias, s Geografias, s Corografias, mas tambm literatura Genealgica e Hagiogrfica, que precisa de bem localizar os santos, as imagens, os locais das romarias, as casas, os solares, os domnios e territrios das famlias ilustres fixadas nesta genealogia nobre e fidalga.

As Corografias volver-se-o no sculo XVIII, descries de parquias abandonando o quadro regional ou provincial em que se inscreveram no sculo XV e XVI na poca do Humanismo Renascentista 4. Fixam-se definitivamente com a grande Corografia Portuguesa do Padre Carvalho da Costa de 1708 no quadro da freguesia ou parquia, por efeito certamente do ascendente do quadro paroquial na nossa vida social e local e do desenvolvimento da erudio e memorialista eclesistica, no quadro do forte envolvimento das populaes pela administrao eclesistica, mas tambm da dominao da cultura e erudio eclesistica da Contra-Reforma ou Reforma Catlica desde a 2. metade do sculo XVI. Nesta corografia paroquial se concentrar o universo dos conhecimentos em que se encerrar a descrio das terras os histricos, os demogrficos, os geogrficos, os genealgicos e os hagiogrficos perdendo-se de vista os enquadramentos gerais e o sentido e o movimento de conjunto. Seria essencialmente por efeito do desenvolvimento da nova geografia que iria ser possvel romper com o enclausuramento topogrfico e cultural em que a corografia fechara a descrio do territrio e das sociedades. Ela recorreria com grande intensidade Matemtica, Astronomia, s Cincias Fsicas e Naturais e naturalmente s Artes do Desenho e Debucho para proceder a descries novas e mais completas do territrio, mas tambm elaborao de Mapas e Roteiros que agora so peas obrigatrias s Geografias. A nova geografia em Portugal tem 2 nomes maiores: Joo Baptista de Castro e Caetano de Lima. Com o Mapa de Portugal (1745-48) e o Roteiro Terrestre de Portugal (1748) de Baptista de Castro e a Geografia Histrica da Europa (1734-36) de Caetano Lima a descrio geogrfica de Portugal e suas terras adquire novos contedos e horizontes. Por elas o territrio deixou de se isolar e circunscrever ao minidiscritivismo paroquial, para se organizar na articulao e hierarquizao do territrio paroquial ao nvel concelhio ou da comarca, ao do bispado e ao da provncia, ligando-se ao todo nacional pelo Porto (para o Norte) a Lisboa; a posio de cada um dos lugares no territrio vai agora perfeitamente colocada nas distncias e coordenadas aos centros maiores de articulao e centralizao do territrio, s ss dos bispados, cabeas de comarca e Provncias, aos postos do correio. E os tempos de durao das viagens vo fixados em tabelas ou cartografados nos mapas e nos roteiros. Os procos Memorialistas nas respostas aos itens sobre a serventia dos correios e as distncias das terras recorrem certamente aos dados numricos fornecidos por estas obras geogrficas ou valores numricos colhidos noutras informaes. Mas nas Memrias Paroquiais ainda h procos presos s referncias antigas, que se referem durao do tempo em termos da durao da reza da Ave-Maria ou do Padre-Nosso e distncia, em termos de corrida de cavalo ou tiro de espingarda, como continuam presos s concepes mais arcaicas da descrio geogrfica. As Memrias Paroquiais de 1758, vo construir uma descrio do territrio muito mais de perto, mas focalizada do todo nacional e do centro poltico lisboeta. O objectivo do seu inspirador o Padre Cardoso produzir um Dicionrio Geogrfico, de certo modo actualizar a velha e desactualizada Corografia Portuguesa de 1708. A nova corografia paroquial e a nova geografia fixar-lhes-ia ambos os horizontes e as articulaes possveis. A ideia foi assumida pelo governo pombalino e seu ministro Pombal que com o Inqurito pretende recolher um grande volume de informes sobre as parquias que interessam ao Governo e administrao geral e local do territrio. As Memrias Paroquiais recolhem pois

um vasto leque de informaes sobre as terras e as parquias: a sua localizao e insero poltico-administrativa, a sua populao, o seu governo civil e religioso, os seus recursos, os seus procos, as suas instituies, os seus equipamentos (igrejas, capelas, edifcios pblicos), os seus santos, as suas devoes, os seus homens ilustres, as suas antiguidades. E inquirem tambm em 2 apartados prprios, sobre os seus montes e sobre os seus rios, matrias essenciais por ento ao funcionamento e sobrevivncia destas comunidades. Um ponto de crucial importncia tem a ver com o Inqurito propriamente dito, isto , o de saber, como e com que objectivos se fixaram aqueles itens e seus contedos. O que em rpida sntese se pode afirmar que este Inqurito o resultado de uma progressiva agregao de itens que se organiza numa espcie de conglomerado onde se juntam elementos de origem histrica, institucional e cultural diversificada, dirigido ao conhecimento e descrio territorial que se foram associando e estratificando para a configurao de um conjunto central de questes e objectivos: interesses e preocupaes da Monarquia e da administrao rgia; da ordem e da administrao eclesistica e at dos concelhos; das diferentes cincias com maior envolvimento na temtica com relevo para a Geografia, a Histria, a Hagiografia, a Literatura de Viagens; das diferentes espessuras culturais do Humanismo e do Renascimento, mas sobretudo do Seiscentismo e da cultura Barroca, e s em menor grau, da emergente cultura das Luzes 5. Porqu a edio hoje das Memrias Paroquiais de um modo sistemtico como o que com esta edio se pretende fazer? Deve referir-se desde logo que as Memrias Paroquiais vm sendo publicadas de modo avulso por iniciativa de investigadores e autarquias locais. A edio sistemtica nunca foi levada a cabo, com a excepo da explorao sistemtica de algumas das suas informaes parcelares: o que foi feito para a recolha da informao demogrfica (entre outras eventuais informaes) para as parquias a que Pinho Leal recorre no seu Portugal Antigo e Moderno (1873-1890), dicionrio histrico-geogrfico que est na continuidade das corografias tradicionais e tambm das Memrias Paroquiais; o que foi feito pelo Arquelogo Portugus (1897-1903) que intentou recolher por proposta de Leite de Vasconcelos sistematicamente as informaes contidas nas Memrias Paroquiais sobre stios e restos arqueolgicos 6 para elaborar uma carta arqueolgica do territrio nacional; o que foi feito para a elaborao de uma carta de riscos ssmicos levada a cabo por um grupo de investigadores da sismicidade de Portugal 7, que pretendem aproveitar as respostas referentes ao item que pergunta sobre os danos do Terramoto de 1755. Hoje h indiscutivelmente um renovado e mais alargado interesse pelo acesso a estas fontes, que em grande medida se pode correlacionar com o alargamento das temticas e campos historiogrficos e tambm com o interesse pela Histria e expresses artsticas e culturais locais, interesse esse desenvolvido nos meios acadmicos, escolares e tambm pelos poderes locais nos perodos mais recentes. No diremos nada de mais se ligarmos esse renovado interesse aco convergente do alargamento das perspectivas historiogrficas da Histria Total e mais recentemente de Micro Histria e valorizao do quadro local promovido pelas correntes da administrao descentralizadora, regionalista e municipalista e mais recentemente pelas autarquias locais que pretendem legitimar e valorizar historicamente os seus territrios e instituies. A aproximao da Historiografia histria local e regional

indiscutivelmente tambm o resultado do contgio da Histria por disciplinas que se configuram mais prximas do terreno, designadamente a Economia, a Geografia, a Sociologia e a Antropologia. De facto a Historia Econmica, a Geografia Histrica, a Sociologia Histrica, a Etnologia e a Antropologia vem prestando uma maior ateno aos espaos, s economias locais, s comunidades, aos povos. A Histria Local foi por outro lado profundamente estimulada pelas doutrinas e experincias descentralizadoras, municipalistas e regionalistas do sculo XIX e XX. Ela volveu-se mesmo arma de combate das figuras mais marcantes destas correntes que dela fizeram particular uso, entre outros, Alexandre Herculano, H. Flix Nogueira e Antnio Sardinha. A instituio municipal e o quadro concelhio tm sido quem mais tem beneficiado da Histria Poltica, mas tambm da Histria Institucional, a mais antiga e a mais recente. Em contrapartida a instituio e o quadro paroquial tem sido o parente pobre destas investigaes apesar da alternativa soluo municipal proposta pelos pioneiros da investigao da freguesia civil e da parquia que foram Alberto Sampaio 8 e Miguel de Oliveira 9. A publicao destas Memrias tambm um contributo para ajudar a situar a investigao histrica portuguesa no quadro da parquia e da freguesia, por muitos considerada instituio matricial da nossa constituio histrico-social e por onde entendem dever passar a revitalizao da nossa vida colectiva.

A HISTRIA LOCAL E REGIONAL PORTUGUESA NAS MEMRIAS PAROQUAIS

O estado actual da nossa reflexo e estudo com base nas Memrias j estudadas dos concelhos do Distrito de Braga permite fixar as seguintes linhas de fora e horizontes que percorrem a histria local/paroquial e regional portuguesa a meados do sculo XVIII 10.

Uma viso do territrio numa perspectiva paroquial e regional As Memrias fornecem uma viso de base e partida local do territrio. Constituem talvez a mais completa descrio da nossa diviso e administrao territorial vista da perspectiva dos administrados. Se os efectivos populacionais e sua distribuio espacial so contados no quadro estritamente paroquial, alguns casos h em que se refere os ausentes, que parece se deve entender ausentes temporrios no muito afastadas do local de nascimento e que a qualquer momento podem integrar os efectivos da populao, podendo assim desenhar um quadro mais vasto de articulao e vida paroquial. Mas a parquia por fora dos itens que mandam descrever as serras e os rios, mas tambm as distncias, os correios e at os limites das parquias e as suas vistas e alcances, as suas ligaes administrativas e at os ilustres da terra, vai muitas vezes inserida num quadro de relaes de continuidades geogrficas e referncias histrico-culturais mais vastas. As continuidades e os enquadramentos geogrficos vo especificamente fixados para as serras

mas sobretudo para os rios que so aqui descritos como quadros de articulao por excelncia, expresso no cuidado da enumerao das suas pontes e barcos de passagem ao longo de um percurso que por vezes descrito da nascente foz, na sua articulao com rios, afluentes e caminhos transversais. Este parece o principal quadro da articulao paroquial-regional, que vai feito a partir dos grandes enquadramentos e limites geogrficos, as serras e o mar; e das ligaes e distncias s maiores vilas e cidades. O horizonte do mar em Viana, Fo, Esposende, Porto; os limites e continuidades das serras do Gers e outras maiores formaes serranas em que se integra a terra; as distncias s vilas de Barcelos, Guimares e cidade de Braga vo em geral por todos os Memorialistas referenciadas como pontos de um limite, de um contacto e de uma articulao regional. Mas de todas as parquias se alcanam, independentemente da sua posio no terreno, importantes monumentos de referenciao tais como, os santurios do Bom Jesus em Braga, Nossa Senhora de Porto dAve, Nossa Senhora da Abadia em Amares, entre outros, que so um horizonte histrico-patrimonial que todas as aldeias pretendem ver e alcanar e que definem, por excelncia, os pontos de referncia paroquial que as articulam a um quadro comum, identitrio, regional ou diocesano e constituem tambm os seus principais pontos de encontro regional. No mesmo sentido vai a referenciao como ilustres da terra da ilustrao de um territrio mais vasto concelhio, provincial ou diocesano, para fixar o quadro das referncias regionais de um patrimnio histrico-cultural comum, por sobre os limites da parquia. O quadro das referncias administrativas de um modo geral seguro para a insero concelhia. No ultrapassa, porm esse patamar no que diz respeito administrao civil e mal caracteriza os concelhos. Poucas referncias relativamente administrao eclesistica, que alis no pedida, mas o quadro e a superviso eclesistica-diocesana sobre a parquia um dado imanente a todos os relatos paroquiais.

A descrio da economia local Os horizontes da descrio econmica so os da parquia rural e da economia agrcola. Os demais sectores no vo descritos mesmo quando se tratam de parquias urbanas. No que diz respeito economia agrcola, o comum das referncias permite fazer a fixao e distribuio paroquial das principais culturas, a partir to s de informaes qualitativas porque as quantitativas so escassas. E por elas mas s pela sua agregao possvel atingir a sua configurao regional e conhecer assim da posio relativa dos milhos entre si, destes com o centeio e o trigo e dos cereais com as outras culturas, o vinho, o azeite, a castanha, as frutas. A apreciao da cultura e qualidade dos vinhos em geral negativa que um claro testemunho da desvalorizao em que so tidos os vinhos verdes ao tempo, assente na comum aceitao da superioridade dos vinhos maduros. Se que no h tambm em muitos eclesisticos preconceitos assentes em critrios morais decorrentes do excesso com que alguns paroquianos se dedicam ao consumo do vinho! De um modo geral so muito escassas e raras as referncias aos condicionalismos e enquadramentos scio-jurdicos das culturas e economia agrcola. So mais frequentes as referncias aos efeitos do clima, da natureza dos solos, ou at da aplicao dos lavradores e costumes agrrios. Os procos (como elementos da comunidade) exprimem algumas vezes os

diferentes graus de auto-suficincia das suas comunidades. A cuidada enumerao dos moinhos faz parte desta preocupao, como o faz tambm a referncia a comrcios e indstrias que podem complementar a lavoura. Especial desenvolvimento tem nestas Memrias a descrio e informao do valor econmico das serras e dos rios, nveis de sua fruio individual, colectiva, municipal e senhorial. Tal decorre naturalmente da expresso social e econmica que estes espaos e recursos ento assumem para a economia domstica, municipal, pblica e senhorial em funo sobretudo do crescimento demogrfico e agrcola que atravessa a economia e a sociedade minhota em desenvolvimento desde cerca de 1720. No admira pois que a Coroa introduza os itens relativos s serras e aos rios no novo Inqurito de 1758 para conhecer os contornos desta matria mas que relevam tambm da vontade de directamente pela administrao central e/ou indirectamente pela administrao municipal rgia assumir o controlo administrativo destes recursos e conter, limitar e at extinguir jurisdies e domnios senhoriais (sobretudo dos coutos e seus donatrios) nestes territrios. Muitos memorialistas exprimem vivamente o elevado grau de conflitualidade que ento se desenha volta do domnio e fruio destes espaos e recursos, e alguns deles fazem mesmo crticas intensificao da sua utilizao privatstica e rentstica em defesa da sua utilizao comunitria. So posies que parecem relevar sobretudo da clara percepo das razes poltico-sociais destas disputas, integrados por alguns no reforo do regime senhorial, e no parecem estar em relao com a emergncia ou aproximao a novos iderios econmicos (fisiocratismo ou pr-liberalismo) que iro propor solues no quadro do liberalismo e individualismo para o desenvolvimento agrrio econmico e regional, atacando as instituies e as prticas do colectivismo agrrio tradicional. As Memrias so praticamente nulas de informaes no que diz respeito economia das parquias urbanas, certamente por causa do horizonte rural e agrcola em que so formulados os itens que inquirem sobre a economia e produes. Pela mesma razo as actividades comerciais e industriais autnomas da agricultura no vo descritas.

A sociedade paroquial. Nveis de integrao Como de esperar as Memrias Paroquiais so particularmente ricas de informao quanto sociedade e ordem eclesistica na parquia, com informaes sobre os padroeiros das igrejas e das capelas, procos e pensionrios, aos benefcios paroquiais. Por elas possvel tambm atingir aquele leque da sociedade civil agregada aos beneficios eclesisticos. No que sociedade e benefcios eclesisticos diz respeito, por vezes possvel atingir a distribuio dos rendimentos paroquiais (dos dzimos e dos outros); mas a maior parte das vezes s a parte que fica aos procos, abades, reitores, curas ou vigrios. Deste ponto de vista uma fonte de informao importante. De resto muito frustre para a identificao dos senhorios polticos e tambm dos senhorios fundirios. Por causa dos itens que perguntam sobre os ilustres que da terra saram e se afirmaram nas Letras, Armas ou Religio possvel atingir alguma desta ilustrao da terra, que o foi por ter sado da terra e atingido a

Universidade, os altos postos da Igreja, do Exrcito, dos Tribunais e Conselhos da Coroa. Porque as elites locais das cmaras ou do funcionalismo mal vem a esta colao. E muito menos a sociedade popular ainda que em algumas Memrias surjam por vezes importantes trechos relativos caracterizao da ordem e sociedade paroquial e comunitria. A Sociedade local aparece-nos, com efeito, nestas Memrias pouco articulada Sociedade Portuguesa em geral, a no ser pelo lado do ordenamento eclesistico, porque no que diz respeito ao ordenamento e articulao civil e poltica os informes so muito frustres. Para se integrarem no todo Nacional os Memorialistas necessitam de recorrer ao apoio dos ilustres de regio em que a terra se insere, ou s biografias histricas escritas de outros horizontes que no o paroquial e regional, em regra para fazer a histria das instituies e da ordem social a que pertenceram, religies, genealogias nobres. De modo que a integrao da sociedade paroquial e at provincial na trama das foras do ordenamento poltico e da sociedade do tempo manifestamente dbil, mais dbil ainda que as realidades do ordenamento social. Maior integrao e articulao ser feita, nalguns casos para algumas parquias urbanas onde sedeiam famlias ligadas Sociedade de Corte e tambm para aquelas parquias ou terras de forte presena e domnio de um grande senhorio ou titular ou de uma importante comunidade religiosa, servindo neste ponto sobretudo a fixao das ligaes das famlias e das comunidades, ordem civil e poltica ou eclesistica.

Religio e comunidade As Memrias so particularmente ricas de informao sobre os suportes materiais e devocionais da religio dos portugueses no quadro das parquias numa altura em que atingiam o seu mximo desenvolvimento correspondente ao fim do perodo barroco da formulao desta Sociedade de Antigo Regime e da sua mais forte conformao e configurao eclesistica, nobilirquica e dos valores e referentes religiosos vindos da Reforma Catlica em que se integra profundamente. O numeroso devocionrio serve para articular cultural e religiosamente a parquia ao todo da Igreja Portuguesa e diocese mas tambm para identificar as devoes que individualizam a parquia. Os equipamentos, igrejas e capelas na sua dimenso e volume medem a extenso da parquia, tipo de povoamento e a acessibilidade e desenvolvimento social. Particular indicador do desenvolvimento social e riqueza da terra o maior ou menor volume de confrarias pelos encargos a que obrigam. A estrutura mais individualista ou mais comunitria da parquia pode medir-se inclusive pela presena de padroados ou administraes colectivas de alguns equipamentos sobre as capelas ou corpos das igrejas, fora da autoridade dos procos. Mas a parquia est longe de ser um campo fechado de prticas religiosas. O volume de devoes de mbito supra-paroquial, concelhio ou mesmo supra-concelhia muito frequente e medem e so a expresso por excelncia dos mais activos quadros e suportes de uma articulao e vida regional que no se confina ao estreito quadro da parquia. E que umas vezes se configuram e reforam nos quadros polticos existentes designadamente os concelhos onde se inserem, quando eles prprios no estimulam essa articulao outras

vezes se articulam fora e para alm dos concelhos do tempo, configurando outros espaos de articulao, muitas dos quais prefiguraro ou contribuiro para definir os quadros das futuras reformas e arranjos polticos concelhios do territrio. nestas que as romagens se transformam em festas, como nelas tambm que se configuram prticas tradicionais de cunho popular e pago que permitem atingir este fundo e manifestaes da cultura popular rural que a cultura letrada e eclesistica dos procos memorialistas por regra no fixa ou f-lo de um modo muito crtico.

*No conjunto esta Memorialstica transmite claramente a ideia de um mundo e uma ordem paroquial e rural que atinge um ponto alto de crescimento de base demogrfica e agrcola, com expresso ao nvel dos seus equipamentos sociais (igrejas e instalao de sacrrios e fundaes de confrarias e vida religiosa) e que se exprime tambm no reforo da sua organizao e identidade poltica que se pretende autonomizar na constituio e reforo dos seus prprios rgos de governo. A esta luz se deve com efeito ler a vontade da ordem rgia, directa ou indirectamente atravs da aco dos municpios, de nela constituir um ordenamento civil e poltico que permita limitar o tradicional enquadramento da parquia na ordem eclesistica e construir um poder rgio e uma ordem pblica mais extensa. Mais do que em qualquer outro estdio histrico, a parquia pelos anos de 1758 um extenso campo e palco de fortes tenses que ento se desenhou entre a ordem rgia, a eclesistica e a senhorial que medem foras e se ajustam tambm adentro do quadro comunitrio e paroquial.

Notas1. Eduardo Loureno, Portugal como Destino seguido de Mitologia da Saudade, Gradiva, 1999. 2. Joaquim Verssimo Serro, A Historiografia Portuguesa. Doutrina e Crtica, vol. III: Sculo XVIII, Coleco de Documentos, Editorial Verbo, Lisboa, 1974. 3. Miguel Roque dos Reys Lemos, Anais Municipais de Ponte de Lima, 3. edio revista e apresentada por Antnio Matos Reis, Ponte de Lima, 2003. 4. Joaquim Romero de Magalhes, As descries geogrficas de Portugal: 1500-1650. Esboo de problemas, in Revista de Histria Econmica e Social, n. 5, Lisboa, S da Costa Editorial, 1980. 5. Mria Jos Bigote Choro, Inquritos promovidos pela Coroa no sculo XVIII, in Revista de Histria Econmica e Social, n. 21, Livraria S da Costa, 1987, pp. 93-130. 6. O Arquelogo Portugus (vols. I a VIII) (1895-1903). Transcries de Pedro de Azevedo e A. Mesquita Figueiredo. 7. 8. M. R. Themudo Barata e outros, Sismicidade de Portugal. Estudo da documentao dos sculos XVII e Alberto Sampaio, As villas do Norte de Portugal, in Estudos Histricos e Econmicos, Porto, 1923

XVIII, 2 vols., Lisboa, 1989. (1. ed., Portugalia, 2, 1899-1903). 9. Miguel de Oliveira, As parquias rurais portuguesas. Sua origem e formao, Unio Grfica, Lisboa, 1950. 10.Mais extensa utilizao das Memrias Paroquiais, neste contexto: Joo Nunes de Oliveira, A Beira Alta de 1700 a 1840. Gentes e subsistncias, Palimage Editores, Viseu, 2002. Um primeiro esforo para a elaborao das monografias locais minhotas: Armando Malheiro da Silva, O Minho nas Monografias, in Bracara Augusta, vol. 43, Braga, 1994/1995.

MEMRIAS PAROQUIAIS

Edio das MemriasSegue-se a publicao das Memrias Paroquiais disponveis relativas s parquias/freguesias dos concelhos do actual Distrito de Braga. A leitura e a fixao do texto foi feita a partir das Memrias depositadas no IAN/TT de Lisboa. Algumas das Memrias j foram objecto de publicao, a saber, as que dizem respeito aos concelhos de Vila Verde, Amares e Terras de Bouro (Domingos M. da Silva, Entre Homem e Cvado em meados do sculo XVIII Memrias Paroquiais, Braga, 1985; Idem, As terras de Vila Verde do Minho no Dicionrio Geogrfico do Reino de Portugal at 1758, Cmara Municipal de Vila Verde, Vila Verde, 1985); Pvoa de Lanhoso (Maria Henriqueta C. R. Teixeira da Mota Norton, Terras de Lanhoso. Monografias I. O Inqurito de 1758, Cmara Municipal da Pvoa de Lanhoso, Pvoa de Lanhoso, 1987) e Esposende (Antnio Losa, Terra de Esposende em 1758 (segundo os manuscritos da Torre do Tombo), Esposende, 1985). Mas uma fixao do texto mais rigorosa, a sua uniformizao para explorao histrico-paleogrfica justifica de novo a sua edio que alis seguindo este critrio ns prprios (em colaborao) iniciamos, por concelhos, para Barcelos (1998), Vieira do Minho (2000), Terras de Bouro (2001), Vila Nova de Famalico (2001), Fafe (2001), Braga (2002), Amares (2003) do Distrito de Braga, e tambm Boticas (2001) do Distrito de Vila Real e Valena (2003) e Mono (2003) do Distrito de Viana do Castelo. A fixao dos textos segue as regras que adiante vo explicitadas. O objectivo foi introduzir s as intervenes consideradas mais necessrias a uma mais ampla leitura e compreenso das Memrias. A edio mais compactada das memrias no permite o recurso aos pargrafos, ainda que se actualizasse sempre que necessrio a pontuao. Um corpo final de referncias documentais contm a referncia colocao arquivstica da Memria no IAN/TT volume e memria respectiva e tambm a alguns documentos essenciais colhidos no Igrejrio - Registo Geral da S de Braga (ADB/UM) que dizem respeito ao Tombo da parquia e outros documentos referentes s igrejas, capelas, confrarias das freguesias. As Memrias vo agrupadas concelho a concelho. No se abriu um campo para o concelho de Vizela porque ele veio a ser composto por parquias vindas do Distrito do Porto, que escapam pois a este agrupamento pelo Distrito de Braga. As parquias do nvel concelho de Vizela vo ainda agregadas no concelho de Guimares. Nesta publicao enumeram-se todas as freguesias actualmente existentes seguindo a listagem do Censo 20001 (Resultados preliminares. Norte. INE, Lisboa, Portugal, 2001). Relativamente s freguesias criadas ps 1758 que no tm pois Memria, vo tambm referidas e assinaladas. Vo tambm publicadas as Memrias das parquias que no constituem hoje freguesias civis, que vo integradas ou anexadas a outras e vo assinaladas com (*). Desapareceram ou no se localizaram algumas Memrias. Para cobrir tal lacuna j o compilador dos 42 volumes das Memrias Paroquiais produziu breves resumos que foram tambm aqui publicados. Para a fixao dos textos destas Memrias das terras do Distrito de Braga seguimos as seguintes regras de transcrio, que vimos seguindo na edio de outras Memrias Paroquiais: 1. Suprime-se o uso de consoantes duplas, salvo quando entre vogais; 2. As vogais duplas iniciais ou finais, equivalentes a uma vogal aberta, transformam-se numa s vogal acentuada. Exemplo: pee = p; soo = s; 3. As letras i e j, l e y, c e , u e v, transcrevem-se segundo o seu valor na respectiva palavra;

4. O n final converte-se em m e o m antes de consoante converte-se em n exceptuando-se quando antes de p ou b; o s e o z finais convertem-se para o uso do portugus actual; 5. A forma u nasalado convertida em um; 6. Actualizam-se as maisculas e as minsculas segundo o portugus actual; 7. Desdobram-se as abreviaturas seguindo-se a forma mais frequente no texto. Corrigem-se os lapsos de escrita evidentes; 8. Ligam-se as partes fraccionadas da mesma palavra: a cerca = cerca; 9. Separam-se as partes unidas diferentes: dis seque = disse que; hifenizam-se as palavras quando necessrio; 10. Acentuam-se de um modo geral os vocbulos agudos polissilbicos e actualiza-se a acentuao existente; 11. Usa-se o apstrofe em casos como os seguintes: dEste; dAjuda; 12. Insere-se dentro de parntesis rectos a reconstituio ou supleco hipottica de letras ou palavras ilegveis ou omissas no documento; 13. Actualiza-se a pontuao e introduz-se a paragrafao necessria. Aplicam-se os sinais da pontuao considerados indispensveis melhor leitura e compreenso do texto; 14. No se transcrevem frases ou palavras repetidas. 15. Actualizaram-se as grafias das formas verbais. Os casos no contemplados nestas normas, incluindo dvidas de leitura, falta de elementos e casos particulares sero devidamente assinalados, visando o seu esclarecimento. A publicao das Memrias segue a ordem alfabtica.

Itens do Inqurito de 1758 para a redaco das Memrias ParoquiaisO QUE SE PROCURA SABER DESSA TERRA O SEGUINTE Venha tudo escrito em letra legvel, e sem abreviaturas1. Em que provncia fica, a que bispado, comarca, termo e freguesia pertence? 2. Se do rei, ou de donatrio e quem o ao presente? 3. Quantos vizinhos tem (e o nmero de pessoas)? 4. Se est situada em campina, vale ou monte e que povoaes se descobrem da e qual a distncia? 5. Se tem termo seu, que lugares ou aldeias compreende, como se chamam e quantos vizinhos tem? 6. Se a parquia est fora ou dentro do lugar e quantos lugares ou aldeias tem a freguesia todos pelos seus nomes? 7. Qual o orago, quantos altares tem e de que santos, quantas naves tem; se tem irmandades, quantas e de que santos? 8. Se o proco cura, vigrio, reitor, prior ou abade e de que apresentao e que renda tem? 9. Se tem beneficiados, quantos e que renda tem e quem os apresenta? 10. Se tem conventos e de que religiosos ou religiosas e quem so os seus padroeiros?

11.

Se tem hospital, quem o administra e que renda tem?

12. Se tem casa de misericrdia e qual foi a sua origem e que renda tem; e o que houver notvel em qualquer destas coisas? 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. Se tem algumas ermidas e de que santos e se esto dentro, ou fora do lugar e a quem pertencem? Se acodem a elas romagem, sempre ou em alguns dias do ano e quais so estes? Quais so os frutos da terra que os moradores recolhem em maior abundncia? Se tem juiz ordinrio, etc., cmara ou se est sujeita ao governo das justias de outra terra e qual esta? Se couto, cabea de concelho, honra ou behetria? Se h memria de que florescessem, ou dela sassem alguns homens insignes por virtudes, letras ou armas? Se tem feira e em que dias e quantos dura, se franca ou cativa?

20. Se tem correio e em que dias da semana chega e parte; e se o no tem, de que correio se serve e quanto dista a terra aonde ele chega? 21. 22. Quanto dista da cidade capital do bispado e de Lisboa capital do reino? Se tem alguns privilgios, antiguidades, ou outras coisas dignas de memria?

23. Se h na terra ou perto dela alguma fonte, ou lagoa clebre e se as suas guas tm alguma especial qualidade? 24. Se for porto de mar, descreva-se o stio que tem por arte ou por natureza, as embarcaes que o frequentam e que pode admitir? 25. Se a terra for murada, diga-se a qualidade de seus muros; se for praa de armas, descreva-se a sua fortificao. Se h nela ou no seu distrito algum castelo ou torre antiga e em que estado se acha ao presente? 26. 27. Se padeceu alguma runa no Terremoto de 1755 e em qu e se est reparada? E tudo o mais que houver digno de memria, de que no faa meno o presente interrogatrio.

O QUE SE PROCURA SABER DESSA SERRA O SEGUINTE1. Como se chama? 2. Quantas lguas tem de comprimento e de largura; onde principia e onde acaba? 3. Os nomes dos principais braos dela? 4. Que rios nascem dentro do seu stio e algumas propriedades mais notveis deles: as partes para onde correm e onde fenecem? 5. Que vilas e lugares esto assim na serra, como ao longo dela? 6. Se h no seu distrito algumas fontes de propriedades raras? 7. Se h na terra minas de metais; ou canteiras de pedras ou de outros materiais de estimao? 8. De que plantas ou ervas medicinais a serra povoada e se se cultiva em algumas partes e de que gneros de frutos mais abundante? 9. Se h na serra alguns mosteiros, igrejas de romagem ou imagens milagrosas? 10. 11. 12. 13. A qualidade do seu temperamento? Se h nela criaes de gados ou de outros animais ou caa? Se tem alguma lagoa ou fojos notveis? E tudo o mais houver digno de memria?

O QUE SE PROCURA SABER DESSE RIO O SEGUINTE1. Como se chama assim o rio, como o stio onde nasce?

2. Se nasce logo caudaloso e se corre todo o ano? 3. Que outros rios entram nele e em que stio? 4. Se navegvel e de que embarcaes capaz? 5. Se de curso arrebatado ou quieto, em toda a sua distncia ou em alguma parte dela? 6. Se corre de norte a sul, se de sul a norte, se de poente a nascente, se de nascente a poente? 7. Se cria peixes e de que espcie so os que trs em maior abundncia? 8. Se h neles pescarias e em que tempo do ano? 9. Se as pescarias so livres ou de algum senhor particular, em todo o rio ou em alguma parte dele? 10. 11. Se se cultivam as suas margens e se tem arvoredo de fruto ou silvestre? Se tem alguma virtude particular as suas guas?

12. Se conserva sempre o mesmo nome ou o comea a ter diferente em algumas partes; e como se chamam estas ou se h memria de que em outro tempo tivesse outro nome? 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. Se morre no mar ou em outro rio e como se chama este e o stio em que entra nele? Se tem alguma cachoeira, represa, levada ou audes que lhe embarassem o ser navegvel? Se tem pontes de cantaria ou de pau, quantas e em que stio? Se tem moinhos, lagares de azeite, pises, noras ou outro algum engenho? Se em algum tempo ou no presente, se tirou ouro das suas areias? Se os povos usam livremente das suas guas para a cultura dos campos ou com alguma penso? Quantas lguas tem o rio e as povoaes por onde passa, desde o seu nascimento at onde acaba? E qualquer outra coisa notvel que no v neste interrogatrio.

Esboo de um Dicionrio para a leitura e explorao das Memrias Paroquiais de 1758.Freguesias do Distrito de Braga.

O presente dicionrio destina-se a apoiar a leitura e compreenso das Memrias. Pelo grande desenvolvimento que se deu aos textos de algumas entradas, ele pretende substituir-se ao estudo de enquadramento geral que a temtica requer. Seleccionaram-se pois entradas-chave para a leitura e compreenso geral dos textos das Memrias que por esse motivo sero objecto de mais largo tratamento. E tambm palavras do lxico mais antigo e especfico da poca e das matrias abordadas nas Memrias. Um especial desenvolvimento tm nalguns casos as entradas referentes a autores e obras citadas em apoio dos textos produzidos, que se justificam pela importncia e volume das referncias que tais obras tm no fundo de cultura histrica, geogrfica e cientfica da poca e tambm na conformao dos horizontes culturais e intelectuais dos procos memorialistas. Para a elaborao deste dicionrio recorreu-se a algumas obras que neste contexto consideramos fundamentais, que pelo seu recurso to insistente nem sempre vo sistematicamente citadas e que aqui se referem portada, a saber: para as definies textuais mais breves o Antnio de Morais Silva, Grande Dicionrio da Lngua Portuguesa (10. ed., 1949-1958); para a definio histrico-jurdica das principais instituies do Direito e administrao cannica e civil, o Bernardino J. da Silva Carneiro, Elementos da Direito Eclesistico Portugus (Coimbra, 1863) e Joaquim Jos Caetano Pereira de Sousa, Esboo de um dicionrio jurdico, theortico e prtico remissivo s leis compiladas e extravagantes () (Lisboa, 1825-1827); para as entradas dos autores e obras recorreu-se longamente a Inocncio Francisco da Silva, Dicionrio Bibliographico Portuguez (Lisboa, 1858-1923) e tambm a Joaquim Verssimo Serro, em A Historiografia Portuguesa. Doutrina e Crtica (Editorial Verbo, Lisboa, 1972-1974, particularmente os volumes II e III, respeitante a obras e autores dos sculos XVII e XVIII). A demais bibliografia utilizada vai numerada no texto e referenciada conjuntamente no final. As obras citadas no texto vo referenciadas ao autor quando referido ou no o sendo, no cause dvida pelo ttulo da(s) obra(s) citada(s). Faz-se sempre de qualquer modo remisso para o ttulo da obra. No caso de se referir o autor de diversas obras que nenhuma se especifica, registam-se as obras mais significativas e com ligao matria em causa. Nas referncias bibliogrficas seguem-se os elementos fornecidos pelo Dicionrio de Inocncio ainda que abreviando algumas informaes relativas edio e local de edio das obras que se tornam menos relevantes para este trabalho. De qualquer modo a intitulao feita na ntegra porque a largueza de alguns ttulos fornece desde logo muitas vezes larga informao para uma primeira aproximao ao contedo das obras. Mantm-se a ortografia dos autores e ttulos e actualizam-se as maisculas e minsculas, bem como a pontuao.

A Abade Titular e proco de um benefcio paroquial a abadia. Benefcio paroquial. Abade de Sever Diogo BARBOSA MACHADO. Ab-intestato Herdeiro abintestado se diz aquele que chamado pela lei para a sucesso de algum que morreu sem testamento [154] Testamento. Aboletamento Se diz o aquartelamento das tropas nas casas dos paisanos em virtude do boleto militar ou civil [154]. Absolutismo Toma a designao de Absolutismo o regime poltico monrquico do sculo XVIII que tende para a definio terica de um poder absoluto do monarca e para a realizao de uma prtica poltico-social que absorve cada vez mais as autonomias e os espaos da Sociedade face Poltica. Ainda fortemente limitado no campo da doutrina e das realizaes na poca de D. Joo V (apesar dos novos recursos econmicos e burocrticos) [9] a monarquia far importantes avanos para a sua definio e afirmao terica no campo do Absolutismo ou do Despotismo Esclarecido, mas tambm na capacidade das realizaes politicas governativas no reinado de D. Jos I e com o Ministro Pombal [ 71, 89]. Absolutismo pombalino em Braga. Absolutismo pombalino em Braga O Absolutismo que se afirma desde a 2. metade do sculo XVIII como projecto e prtica poltica com D. Jos e seu ministro Pombal [71], contender e afrontar essencialmente as formaes sociais com mais espao e fora de afirmao autonmica, como a Igreja, com sua doutrina, direito, jurisdio e organizao social. A interveno abusiva do poder Real na ordem eclesistica, toma a designao de Regalismo. Este afrontamento vai ser particularmente violento nas terras de maior compleio e envolvimento social do poder e ordem eclesistica, como o caso de Braga, onde a ordem eclesistica dominava os mais diversos planos da vida da Cidade o Arcebispo era tambm senhordonatrio ou tambm em outras terras onde a ordem eclesistica tinha tambm um papel social relevante em particular no ensino, como era o caso das cidades universitrias de Coimbra, vora e tambm Braga onde a influncia dos Jesutas, era tambm forte. O intervencionismo rgio na cidade de Braga, segundo o testemunho de Incio Jos Peixoto, memorialista bracarense coevo e crtico da obra pombalina [119], desenvolve-se desde logo no plano da afirmao de uma ordem pblica na cidade e senhorio em relao com o alargamento de aplicao do Direito Rgio e consequente diminuio da ordem e direito cannico e eclesistico, bem como na limitao dos privilgios senhoriais (em especial a jurisdio secular e eclesistica) de que os Arcebispos eram donatrios. Ele regista e acentua o papel e impacto do Verdadeiro Mtodo de Antnio Vernei, iniciando-se com ele o perodo irreversvel (ele escreve por 1790) da decadncia da Igreja, da ordem eclesistica e do senhorio bracarense, dos Jesuitas e do seu Ensino pblico. Ele seguir em Braga os seus principais passos e desenvolvimento desde 1750, ano em que refere se entrou a divulgar o famoso livro, Novo Mtodo por Frei Barbadinho. E refere-se Incio Jos Peixoto entre outros pontos: s reformas da ordem e foro cannico e eclesistico no sentido da melhoria da justia e resposta aos reptos e criticas da ordem rgia; aos abusos e intromisses da Relao do Porto que pretende limitar e diminuir a jurisdio do Auditrio e Relao Eclesistica Bracarense; no plano doutrinrio, expanso em Braga dos credos e doutrinas do pr-pombalino Padre Antnio Pereira de Figueiredo e seu impacto no plpito e em algumas reformas da doutrina, religiosidade e da piedade bracarense e sobretudo expulso dos jesutas bracarenses que Peixoto considera a principal causa da futura decadncia da cidade. Mas tambm se refere, aos principais desenvolvimentos bracarenses da oposio e confronto anti-regalista e anti-reformista, vindos sobretudo de alguns sectores aristocrticos, do clero e de algumas ordens religiosas. E regista como em Braga se sentiu mais que em qualquer outro lugar, o sentido do despotismo e dirigismo politico cultural pombalino, em particular pelos excessos da sua interveno incluindo a militar, para cercar e conduzir os Jesutas de cidade e regista o sentimento popular e estudantil muito generalizado contra Pombal expresso no dito, que circulava em Braga boca pequena, contra o despotismo e a censura pombalina: eu quero desabafar [26, 37, 139]. Auditrio e Relao Eclesistica Bracarense; Relao do Porto. Academia Real da Histria Sob o impulso da criao das academias rgias europeias, seguindo o modelo francs e tambm o castelhano, cria D. Joo V em Lisboa a Academia Real da Histria em 8 de Dezembro de 1720 com o objectivo de se escrever a histria eclesistica destes Reinos, e depois tudo o que pertencesse histria deles e de suas conquistas. A Academia ficar associada a um notvel perodo de desenvolvimento da nossa investigao histrico-documental tendo entre 1729 e 1760 poca de maior apogeu publicado e estimulado a publicao de obras de erudio fundamentais para a Histria de Portugal. De entre os seus membros conta-se D. Jernimo Contador de Argote que foi incumbido da recolha dos materiais e da escrita das partes relativas Diocese de Braga de que resultaram as Memrias Eclesisticas do Arcebispado de Braga, 4 vols., 1732-1747. A aco da Academia e de alguns dos seus mais notveis intervenientes acadmicos para alm do seu prprio labor na investigao e fixao da disciplina cientfica da Histria, estimularam por todo o pas o interesse e a investigao da Histria Nacional e da Histria das Terras (local) que os investigadores e eruditos locais promoveram para corresponder aos desafios da Academia e promover a Histria das suas terras e das suas ilustraes [137]. D. Jernimo Contador de ARGOTE; D. Lus Caetano de LIMA; Padre Jos Matos FERREIRA. Ad-nutum Apresentao. Aforamento Contrato pelo qual uma das partes contratantes cede e transfere para a outra o domnio til de um prdio, para o possuir, e desfrutar como prprio, debaixo da condio de lhe pagar certa penso anual em reconhecimento do seu domnio directo [154]. Emprazamento. Agasalho Visitaes. Agiolgio Lusitano Jorge CARDOSO.

Alcaide Alcaide-mor o oficial militar encarregado do governo e defesa de alguma praa ou castelo alcaide simplesmente o oficial de justia que usa de vara, insgnias de autoridade pblica. Exerce este oficial o seu cargo nas diligncias em que for necessrio defender a autoridade judicial e rebater a violncia de algum, como nos actos de penhora, embargos, prises, etc. [154]. Almas, devoes e invocaes O nascimento do Purgatrio est na origem e desenvolvimento do importante culto Almas do Purgatrio, na multiplicao e celebrao dos sufrgios a seu favor. Ostestamentos so, sem dvida, uma das melhores fontes onde se regista os legados e ultimas vontades dirigidas busca da salvao da alma e sua libertao do fogo do Purgatrio. Mas os painis votivos, pintados e tambm os altos-relevos em madeira e outros materiais so os testemunhos iconogrficos por excelncia do suporte desta devoo aonde se teatralizam as almas a penar no fogo dos infernos, a sua libertao por fora da intercesso da Virgem, dos Santos, com S. Miguel cabea, da Misericrdia Divina que a orao e devoo das populaes deve fazer mover e intervir e mostram tambm cenas do Juzo Final. Tambm aqui a Reforma e a piedade e religiosidade ps-tridentina tero um papel essencial no desenvolvimento desta devoo. O suporte da difuso por excelncia deste culto viria a constituir-se, para alm naturalmente da pregao (em especial do ms das Almas), nas confrarias do Escapulrio do Carmo e nas numerosssimas confrarias das Almas. Estas seriam impostas pelas Constituies dos bispados, mas tambm pelo empenho de pregadores e ordens missionrias, a saber, carmelitas (sobretudo para as do escapulrio), franciscanos, jesutas, dominicanos e agostinhos. A devoo e invocao das Almas, o piedoso costume de ementao ou encomendao de almas, acabaria alis por se enraizar fortemente na piedade popular. E por isso as devoes e os suportes da sua invocao saltam para fora da igreja e capelas e estendem-se a todos os lugares de encontro, passagem e viagem das populaes nas mltiplas pinturas e nichos de Almas. Por este facto as Memrias Paroquiais que circunscrevem o registo destas devoes e invocaes aos suportes pictricos e imaginrios dos interiores das igrejas ou capelas, ou simplesmente a dedicao dos altares, s nos do um pequeno inventrio das referncias que devoo das Almas possvel localizar nos espaos de parquias, muitas delas colocadas nos exteriores das igrejas e capelas nos seus nichos. O culto das almas viria certamente a sofrer uma relativa quebra, sobre a influncia do Iluminismo e com Pombal, quando se limitam os bens dalma nos testamentos e se probe a instituio da alma por universal herdeira e impede a instituio de novas capelas, instituies perptuas sobretudo de missas pelos defuntos a que se vinculavam bens e rendimentos [96]. Bens d'alma; Capela; Devoes e Invocaes; Iluminismo; Reforma; Testamentos. Aforamento Se define o contrato pelo qual uma das partes contratantes cede e transfere para a outra o domnio til de um prdio, para o possuir e desfrutar como prprio, debaixo da condio de lhe pagar certa penso anual, o foro em reconhecimento do seu domnio directo []. Deste contrato se fala na Ordenao em diversos livros e em mltipla legislao que regula os aforamentos dos bens do concelho, dos bens reais, dos bens prprios da Coroa, da Universidade, dos reguengos, das Comendas das Ordens e ultimamente das propriedades destrudas pelo Terramoto de 1755. A jurisdio sobre os aforamentos de terrenos baldios de competncia dos tribunais declarados nos Alvars de 23 de Junho de 1766 e 27 de Novembro de 1804 e decreto de 2 de Julho de 1779. O aforamento dos bens eclesisticos regula-se por clusulas mais particulares, nos termos das Constituies Eclesisticas [154]. Emprazamento; Foro. Agravo o recurso que se interpe de um magistrado graduado contra a sentena, ou despacho por ele proferida, em que se recebe gravame. D-se este recurso assim das sentenas interlocutrias como das definitivas daqueles juzes de quem pela sua graduao se no apela [154]. Apelao. Alcaide Alcaide-mor o oficial militar encarregado do governo e defesa de alguma praa ou castelo. ofcio antigo neste Reino [], contem-se o seu Regimento na Ord. Liv. 1., tit. 74. [] Alcaide simplesmente o ofcio de justia que usa de vara, insgnia de autoridade pblica. Exerce este oficial o seu cargo nas diligncias em que for necessrio defender a autoridade judicial e rebater a violncia de algum, como nos actos de penhores, embargos, prises [] [154]. Alfndega a casa pblica em que se do ao manifesto e ao registo as fazendas que entram e saem de algum porto e onde se arrecadam os direitos de entrada e sada determinados pelos forais e regimentos [154]. Foral. Almas Pessoas de Sacramento Fogos e Moradores. Almotaaria Almotacs. Almotacs Oficiais camarrios para o governo econmico do concelho. Nos termos das Ordenaes (L. 1., Tit. 67) os almotacs servem aos pares, pelos meses do ano; no 1. os juzes do ano passado; no 2., 2 vereadores mais antigos, no 3., os outros 2 vereadores; no 4. o procurador do concelho com outra pessoa eleita. Para os demais meses do ano a cmara eleger 9 pares de homens bons dos melhores que houver no concelho que nesse ano nele no forem oficiais, que sero pautados e depois votados para servirem. Fica patente a importncia e nobreza destes oficiais que essencialmente servem o governo e fiscalizao econmica do concelho, no que diz respeito ao abastecimento, preos, mercados, medidas, servios e actividades mecnicas, limpeza e qualidade dos produtos, gados soltos e transviados, edifcios, servides. No seu tribunal da almotaaria julgam as causas tocantes a estas matrias nos feitos que no ultrapassarem certo montante em que se no pode intrometer acmara, onde despacharo os feitos com brevidade, de que podero as partes apelar ou agravar para os juzes, para ojuiz ordinrio, geral da cmara, fazendo-lhes relao do feito por palavra, isto , sem processo escrito. Cmara; Elites locais; Juiz ordinrio; Procurador do concelho; Vereadores. Almoxarifado Almoxarife. Almoxarife Oficial rgio que num certo quadro territorial, o almoxarifado, organiza e promove a arrecadao das rendas do patrimnio rgio e das outras casas reais. Dele trata a Ord. Liv. 2. Tit. 51. Os almoxarifes eram juzes dos Direitos Reais e Executores das suas receitas de que competia apelao para o Contador da Cidade. Em 1752 com a criao da Tesouraria

Geral das Sisas, esta instituio e os seus recebedores locais viro substituir os antigos almoxarifados. Depois das leis de 1761, 1765 e 1776 os almoxarifados ficaro sendo meros Recebedores [154]. Cmara; Sisas. Alodial Quer dizer livre de encargos. Terra alodial se diz aquela de quem algum tem a propriedade absoluta e em razo da qual o proprietrio dela no reconhece algum senhor, nem tem que pagar alguma penso [154]. Dzima a Deus. Altar Lugar elevado para sacrificar Divindade. []. Para poder servir o sacrifcio, necessrio que seja sagrado pelo Bispo ou pelo seu delegado. Chama-se altar privilegiado aquele a que esto anexas algumas indulgncias [154]. Alternativa Colao. Ambulatria Diz-se de ordem, carta circular que para comunicao e publicitao e tambm recolha de informaes percorre um certo circuito fixado pela ordem administrativa civil e eclesistica. Roteiro de visita. Anata a renda de um ano. Diz-se tambm a taxa em que se fixou a renda de um ano dos benefcios consistoriais providos pelo Papa, que se pagam Cmara Apostlica quando se tiram as Bulas. O Papa Joo XXII foi quem introduziu as anatas e Bonifcio VIII as fez gerais [154]. Aniversrio uma cerimnia da igreja ou uma festa que se celebra todos os anos em certo dia []. Em acepo mais comum [] sufrgio que se faz pela alma de um defunto, no dia em que se cumpre o ano do seu falecimento e consta comummente de oficio e missa [154]. Apelao a provocao legitimamente interposta pela parte vencida do juzo inferior para o superior, para se anular, ou reformar o julgado [154]. Agravo. Apresentao Apresentao o direito de propositura que em muitos casos pode caber a outra entidade que no o titular do direito de Colao, nos termos do Direito de Padroado. A apresentao anual, de aprovao ou sem dependncia do ordinrio. Distinguem-se as seguintes situaes: apresentao ad nutum, ad nutum perpetuo, ad nutum removvel (ao Arcebispo ou Ordinrio) [154]. Colao; Padroado. Aquilgio Medicinal Dr. Francisco FONSECA HENRIQUES. Antiquitatibus (de) Conventus Bracharaugustanus D. Jernimo Contador de ARGOTE. Antiquitatibus (de) Lusitaniae Andr de RESENDE. Arcebispado de Braga (territrio) Territrio onde se exerce o poder e o governo do Arcebispo de Braga e demais autoridades e instituies de governo da diocese bracarense. Trata-se de uma diocese com um vastssimo territrio, sem equivalente no restante ordenamento eclesistico nacional, no essencial assim configurada na Idade Mdia, sofrendo algumas adaptaes ao longo dos Tempos Modernos (sculos XV-XVIII). Nos finais do sculo XV, em 1472, a diocese passou a integrar e administrar o Arcediago de Olivena, com os territrios da vila de Olivena e de Campo Maior e Ouguela, desanexados do Bispado de Ceuta. Em 1512 este territrio foi trocado por contrato de permuta entre o Arcebispo D. Lus Pires e D. Afonso V, pela regio de Entre Minho e Lima, chamada da comarca de Valena. Depois em 1545, deste vasto territrio ser desmembrado uma parte para a criao de diocese de Miranda do Douro. Outros desmembramentos teriam lugar de 1881 a 1987 sendo porm de maiores consequncias o de 1922 que lhe retira o territrio do distrito de Vila Real para a nova diocese e o de 1987 que lhe retira o territrio para a criao da diocese de Viana do Castelo. Fica assim substancialmente reduzida a dimenso da diocese antiga, agora com uma extenso mais aproximada das restantes dioceses portuguesas [97]. Arcebispado de Braga (organizao). Arcebispado de Braga (organizao) Na sua primitiva organizao a diocese de Braga dividia-se em arcediagados e arciprestados. Posteriormente estas divises foram integradas em circunscries de maior amplitude, as Comarcas eclesisticas. Em 1460 referem-se s 2 comarcas: a de Trs-os-Montes e Braga. No tempo de D. Diogo de Sousa (15051532) a comarca de Trs-os-Montes subdividiu-se nas comarcas de Bragana, Chaves e Vila Real e a nova comarca de Valena. Com a criao da diocese de Miranda, a maior parte da comarca de Bragana seria integrada na nova diocese, ficando o restante territrio integrado na comarca de Torre de Moncorvo. Para efeitos de administrao pastoral a rea da diocese vai dividida em 25 visitas e reas visitacionais. Em 1709 contam-se para as 5 comarcas eclesisticas, 25 visitas e um total de 1288 parquias, nmero superior ao da Provncia do Minho, 1182. Deste modo, a diocese , com efeito, o nico quadro administrativo que mais se aproxima e se configura no quadro da Provncia do Minho a que confere certa armadura administrativa. Para alm da extenso e riqueza de benefcios do territrio diocesano, a maior dignidade e hierarquia da diocese bracarense tambm afirmada pela sua Histria e Privilgios concedidos aos seus Bispos e rgos de governo da diocese, designadamente ao Cabido e ao Auditrio e Relao eclesistica bracarense com jurisdio civil. Essa primazia e maior dignidade firma-se e afirma-se na dignidade e centralidade de Braga como cabea da Provncia eclesistica, de que so sufragneos os bispados do Porto, Coimbra, Viseu e Miranda, onde se renem e realizam Conclios Provinciais [146]. reas visitacionais; Auditrio e Relao Eclesistica Bracarense; Cabido; Comarcas eclesisticas; Provncia do Minho; Visitas. Arqueologia (stios, monumentos e peas arqueolgicas) S de um modo indirecto nas Memrias Paroquiais se inquire sobre a matria em epgrafe, designadamente nos itens 22 e 25 ao perguntar se a terra tem antiguidades ou outras coisas dignas de memria (item 22) ou quando se pergunta se a terra murada ou se ela tem fortaleza, se h castelos ou torres antigas (item 25). Neste contexto os memorialistas ao referir-se a estes factos podem tambm faz-lo a outros com eles conexos, dignos de memria presente e futura. Relativamente aos elementos arqueolgicos h muito que a Histria, a Memorialstica, a Geografia histrica, as Corografias, na tradio do legado das descries Humanistas e Renascentistas das

terras, fixaram as referncias queles elementos arqueolgicos, epigrficos e monumentais um lugar obrigatrio, em especial os ligados cultura e civilizao da Antiguidade Clssica Greco-Romana [91]. Por outro lado os inquritos do sculo XVIII, designadamente os promovidos pela Academia Real da Histria, inscreveram nos seus itens questes directamente dirigidas a estas matrias. Com efeito, o Inqurito de 1721, mandava inquirir em concreto sobre os letreiros das sepulturas e capelas, sobre castelos, torres antigas ou edifcios notveis e sobre pontes [90]. E os Memorialistas e historiadores que redigiam ento as Memrias e Histrias alargaram-se de um modo geral no inventrio destes monumentos, sendo as obras produzidas no mbito da composio de Histria Eclesistica destes Reinos encomendada por D. Joo V Academia Real da Histria, particularmente ricas de informes sobre esta matria, designadamente sobre as epgrafes, que os eruditos em geral e o clero em particular, estavam particularmente vocacionados para ler e recolher. Este ambiente de maior sensibilidade pela defesa do patrimnio arqueolgico e epigrfico ganhar particular eco junto da figura do monarca, D. Joo V, que encarregar as cmaras e as instituies cientficas de proteger, salvaguardar e defender os restos arqueolgicos, contra o abandono, a delapidao ou o roubo a que esto sujeitos estes e outros monumentos, publicando-se para tal efeito um diploma rgio no sentido da defesa e preservao, definindo-se pela 1. vez entre ns o princpio do interesse pblico destes monumentos arqueolgicos. De um modo geral a recolha de elementos arqueolgicos circunscreve o Memorialista descrio e inventariao destas Antiguidades relativamente poca Clssica, aos primrdios da Cristianizao que entre ns se justape ao das origens da Nacionalidade e tambm ao perodo que lhe anterior que vai genericamente associado ao tempo do domnio dos Mouros, da Berbria, dos Maometanos. Escapa-lhes o sentido do valor e interesse dos monumentos e restos arqueolgicos dos Tempos Medievais e muito mais ainda dos Tempos Modernos, com a excepo das epgrafes e dos monumentos da Arqueologia Crist, mais antiga, e no aspecto civil, s pontes, s fortalezas e s muralhas. Da perodo romano uma ateno e tratamento muito especial assumir a descrio da via romana da Geira, suas epgrafes, suas pontes, que absorvero quase por completo as informes dos procos do concelho de Terras de Bouro e tambm de Amares por onde ela se desenvolve. De resto a referncia a restos e marcas da arqueologia romana praticamente inexistente. Maior relevo adquirem as referncias aos elementos da Arqueologia Paleo-crist, relativa s etapas da Cristianizao dos povos brbaros e implantao dos seus monumentos e smbolos. Recolhem-se a referncias a sepulturas antigas e restos de igrejas e outros edifcios religiosos (Memrias de Campo, concelho de Barcelos, Cunha, concelho de Braga, Infantas, concelho de Guimares); a restos de igrejas e estruturas monacais e conventuais antigas (Adafe, concelho de Braga, Moure, concelho de Vila Verde, Cepes, concelho de Fafe); a sepulturas de santos e cavaleiros militares (Brito e Sande, concelho de Guimares e Arentim, concelho de Braga) a colunas e a letreiros (Dume e S. Jos de S. Lzaro, concelho de Braga e Veade, concelho de Celerico de Basto). H tambm algumas referncias a monumentos da Arquitectura civil, sobretudo s estruturas militares e defensivas da ordem senhorial, das cidades, dos concelhos que nos transportam aos primrdios da Nacionalidade, Alta e Baixa Idade Mdia. So em geral notas e referncias muito breves. No que diz respeito s referncias a muralhas, fortalezas e torres da arquitectura militar, vem colao: o Castelo de Faria (Faria, concelho de Barcelos), o Castelo de Lanhoso (Galegos e Pvoa de Lanhoso, concelho de Pvoa de Lanhoso e Figueiredo, concelho de Vila Verde); o Castelo de Arnia (Celorico de Basto). No respeitante s muralhas, algumas descries mais desenvolvidas, como a que diz respeito s da vila de Barcelos e Paos dos Duques (Barcelos -vila); s muralhas (muro de fortificao) da cidade de Braga (Cividade, concelho de Braga) e s muralhas e Castelo de Guimares (S. Miguel do Castelo, concelho de Guimares). E um leque de referncias tambm a torres e fortes de casas grandes e senhoriais, a saber, ao Forte e Castelo de Barbudo (Esqueiros, concelho de Vila Verde), Torre de Penegate (Carreiras, concelho de Vila Verde); Torre de Passos (S. Vtor, concelho de Braga), Torre do Conde de Unho (Cepes, concelho de Fafe); Torre de Vermil (Vermil, concelho de Guimares); Torre do lugar da Mota (Campo, concelho de Pvoa de Lanhoso); Torre do couto e honra de Serzedo (Serzedo, concelho de Pvoa de Lanhoso). Muito maior desenvolvimento ganham as referncias aos monumentos, stios, castros, castelos atribudos genericamente ao tempo ou domnio dos Mouros e que de um modo geral envolve todas as marcas das civilizaes anteriores romanizao e cristianizao dos povos brbaros. Procede-se de seguida fixao das principais referncias, concelho a concelho. de assinalar o fundo da cultura, mais popular que eclesistica, que a todos os restos arqueolgicos do passado associa o domnio rabe ou mouro que os procos no esto tambm, na maior parte dos casos, em condies de deslindar e distinguir. E por isso no deixam de referir que transmitem a ideia que sobre tais monumentos, reais ou fantsticos, faz a sua populao. Eles so, sem dvida, por isso um testemunho do estdio do desenvolvimento cultural dos povos, mas tambm dos conhecimentos histricos e cientficos que o clero paroquial do sculo XVIII tem relativamente aos povos e civilizaes que no passado ocuparam o territrio nacional. No concelho de Amares: em Amares, eminente vila, est o chamado Crasto de Amares, monte acastelado e fragoso; em Caires, a Poente do monte S. Flix, um cabeo e rochedo chamado Castelo e o monte de S. Sebastio, que foi castelo de mouros e ainda hoje tem trincheiras; em Dornelas, uma torre de que h tradio ser do tempo dos Mouros. No concelho de Barcelos: na freguesia de Alheira, no monte Louvado se vm ainda vestgios de uma cidade chamada civitas Magnas com vestgios de muralhas e atalaias; em Baluges, ainda se divisam vestgios na Carmona de uma cidade de Mouros; em Campo, no lugar de Crasto, vestgios de fortificao antiga, com restos de fossos de um castelo; em Roriz, a cidade de Sanoane, com vestgios de muralhas e trincheiras, onde h tradio de assistirem os Mouros; em S. Martinho de Galegos, restos da antiga cidade de S. [Nani], habitada pelos mouritanos; em Silveiros, a citnia e o campo de ouro, com indcios de castelo e casas, com seus alicerces e tijolos. No concelho de Esposende: na freguesia de Antas, nos campos Redondos consta por tradio que os Mouros tiveram uma cidade no monte da Cividade, com pedras que mostram ter sido de castelo; na Gandra, os chamados muros de Fo, que se diz, por tradio, foram obra fabricada pelos Mouros; em Vila Ch, no alto de um outeiro, vestgios de alicerces de um forte que por tradio dizem dos tempos dos Mouros onde se vm pedras toscas, a que os moradores chamam mamoinhas e outros sepulturas dos Mouros. No concelho de Guimares: a principal referncia a citnia de Briteiros, na freguesia de Salvador de Briteiros, entre o lugar do Mato e o de Carvalho d princpio uma calada para o monte citnia na coroa do qual se conservam vestgios evidentes de que foi grande povoao (de) 3 muralhas que cercam o monte e por entre os muros muitos alicerces de casas que ao que parece eram

redondas, tambm vai referida na Memria de Santo Estvo de Briteiros que diz ser-lhe fronteiro o monte chamado da Citnia. Para o adro da igreja fora transportada uma grande pedra de vrios lavores trazida da Citnia com muito trabalho e se acha suspensa em colunas; na freguesia de Balazar, junto ermida de Santa Marta valos grandes de terras redondos a modo de fortalezas refere o memorialista que tradio fora habitao de mouros; em Meso Frio, no monte Bustelo, vestgios ao que parece grande cidade destruda antigamente pelos brbaros bracarenses (sic). No concelho da Pvoa de Lanhoso: sobretudo referncia torre ou castelo antiqussimo que se diz ter sido habitao dos Mouros, fbrica de Mouros (Memrias de Calvos, Galegos e S. Tiago de Lanhoso); e se contesta tambm a Corografia de C. da Costa que se refere a um monte de Crasto que foi fortificao dos romanos (sic) mas relativamente ao qual o memorialista de S. Joo de Rei diz que no v sinais nem sobre tal ouviu falar os seus paroquianos; e em Serzedelo fala-se de um castelo por natureza que so trs penedos muito altos de que se compe o dito castelo. No concelho de Terras de Bouro: na freguesia de Carvalheira, por cima do lugar de Padrs, o Castro, penhasco de muita abundncia de penedos onde o Memorialista no encontrou casas nem alicerces delas, mas onde encontrou alguns brelhos ou tijolos que s poderia ser habitada pela nao brbara dos Maometanos no tempo em que estavam senhores desta Provncia; em Covide, na serra de Lamas, a cidade de Calcednia, antigamente feita pelos Mouros e na serra do Castelo, onde h muitos penedos e grandes a que chamam o Castelo. No concelho de Vila Verde: na freguesia de Azes, no stio do Reduto, ao p da capela do lugar de Sobradelo, algum dia houve Castelo de Francos que dizem habitavam antigamente neste monte, segundo tradio que corre entre os naturais (sic); em Santiago da Carreira, o monte chamado do Castelo, com vestgios de um castelo e indcios de praa ou fortaleza, que os moradores dizem por tradio, fora castelo de mouros; em S. Martinho de Escariz, no monte Zido ou Izidio houvera povoao de mouros no tempo dos Godos (sic) onde ainda hoje aparecem vestgios de estradas e tijolos; em Goes, uma torre arruinada, que dizem ser antiguidade de Mouros; no Pico dos Regalados, junto capela de S. Sebastio h vestgios de uma trincheira ou muros de mouros e tambm de casas muito juntas e pequenas e de pedra mida e se acham tijolos grossos e fragmentos de telha e tradio habitarem ali os Mouros. Na freguesia de S. Martinho de Moure, h um monte que chamam a Torre dos Mouros, onde houve antigamente uma cidade que se chamava Milmendes e no meio tinha uma torre dos Mouros que houvera 90 anos pouco mais ou menos que existindo a metade, se desfez para o concerto da ponte de Prado e onde se divisam ainda 3 reas ou muralhas; em Turiz, tijolos do que fora antigamente uma vila, de Touditanes; em S. Martinho de Valbom, vestgios no monte de S. Faustino de muralhas e brelhas de tijolos; em Laborinho, no monte de Santa Ceclia, que se conta antigamente foi cidade mauritnia. No concelho de Vila Nova de Famalico: na freguesia de Santa Maria de Vermoim e Requio, h tradio de que na serra do Corvi, h um stio que se chama o Castelo de Vermoim, fora cidade, em que habitaram os mouros, tambm chamado o Castelo de Berberia, de cujo castelo de que h testemunhos fora habitado, se trouxe pedra com que se fez a igreja de alguns edifcios que se diz havia em tal castelo. Num contexto novo, o do ltimo quartel do sculo XIX, mas seguindo ainda as coordenadas da recolha de dados e informaes do sculo XVIII, muitos curiosos e eruditos locais se lanaram de novo descoberta de castros, epgrafes, mamoas cujas informaes podem ser confrontadas com as dos Memorialistas, mas tambm com as investigaes recentes [7, 47, 85, 103, 121] Geira, entrada da. Auditrio e Relao Eclesistica Bracarense (instituio e jurisdio) Tribunal superior da diocese, ele o principal suporte do poder e jurisdio dos Arcebispos e do Senhorio temporal da igreja bracarense. Compete-lhe as causas tocantes jurisdio eclesistica de Braga e dos bispados sufragneos da Provncia eclesistica bracarense e tambm no secular, as da jurisdio temporal da Mitra. Preside ao tribunal o Arcebispo e na sua ausncia, o Provisor, o Vigrio Geral, o Chancelermor e em ltimo lugar o Desembargador mais antigo. Haveria no Desembargo do Tribunal at 12 desembargadores. Cabelhes despachar, por distribuio, todos os feitos processados no Auditrio, os vindos por apelao das comarcas eclesisticas, dos bispados sufragneos e da Colegiada de Guimares; e as apelaes e agravos das causas da jurisdio temporal da Mitra, as cveis e as crimes dos seus coutos e as cveis da cidade e seu termo que findavam na Relao. Vai do seguinte modo descrito pelo Padre Lus Cardoso [48]. H nesta Cidade uma Relao, em que de ordinrio assistem doze at dezoito Desembargadores, da qual tem sado muitos homens doutos para diversas ocupaes e lugares deste Reino, como diz Fr. Lus de Sousa, na Vida do grande Arcebispo D. Fr. Bartolomeu dos Mrtires e Gabriel Pereira, em uma das suas Decises, e o confessa tambm Caldas Pereira em muitos lugares das suas obras, que escreveu a maior parte delas sendo Desembargador da mesma Relao. Nesta se determinam sem apelao nem agravo todas as causas cveis de qualquer qualidade que sejam, dos moradores desta Cidade e seu Termo, e dos Coutos todos, por terem nestas terras os Arcebispos toda a jurisdio cvel independente dos Tribunais de El Rei. Conhece mais esta Relao de todas as causas crimes dos moradores dos Coutos, as quais nela se finalizam, sem apelao para os Tribunais de El Rei, e h na mesma Relao Breve de Sua Santidade para Desembargadores dela votarem de morte, ainda que sejam clrigos, nas causas crimes dos moradores dos Coutos; e esta prerrogativa de terem os Arcebispos nos ditos Coutos esta jurisdio, sem apelao para os Tribunais de El Rei, uma regalia to grande, que nenhum Donatrio da Coroa a tem, nem se achar facilmente, seno em Prncipes absolutos; porm nas causas Crimes de todos os moradores desta Cidade, e seu termo, no tem os Arcebispos mais que a primeira instncia, que diante do seu Ouvidor, e dele se apela, e agrava para a Relao do Porto, e para a de Lisboa. Finalmente esta Relao no somente eclesistica para todas as causas eclesisticas, (como o so todas as mais Relaes das Metrpoles, que tem sufragneos) mas tambm Relao Secular, porque julga, e sentencia todas as causas Cveis dos moradores desta Cidade, e seu termo, e dos Coutos, como acima dissemos [26, 29). O quadro de pessoal e as respectivas jurisdies, o processo e o funcionamento deste Tribunal vai detalhado no Regimento da Relao e Auditrio Ecelesiastico do Arcebispado de Braga, ordenados pelo Ilustrssimo Senhor D. Joo de Souza, Braga, 1699. Ao longo da sua Histria o Auditrio e Relao Eclesistica Bracarense teve que se bater para a defesa da sua jurisdio e foro contra as incurses e avocaes da Relao e Casa do Porto que se considerava seu superior hierrquico e que entre outros pontos jurisdicionais lhe disputava sobretudo a apelao das causas crimes que o Tribunal bracarense diz julgar em ltima instncia. O Auditrio e Relao eclesistica a ltima instncia e assim vai descrita por alguns memorialistas das terras inscritas em jurisdies da Igreja de Braga (Mitra ou

Cabido). Como se lhe refere o Memorialista do Couto de Cambeses, couto da S, donatrio o Cabido, as causas e litgios correm todas diante do juiz deste couto como primeira instncia e vo por apelao e agravo para o reverendo Deo de Braga, Ouvidor dele como segunda instncia e desta segunda instncia vo para a Relao de Braga como terceira instncia (Memria de S. Tiago de Cambeses, c. Barcelos). Chanceler-mor; Provncia Eclesistica Bracarense; Provisor; Relao e Casa do Porto; Vigrio Geral. Auditrio e Relao Eclesistica Bracarense (reforma) A lei da Boa Razo de 18 de Agosto de 1769, que aplica em Portugal ao campo das cincias jurdicas e da jurisprudncia os princpios do jus naturalismo racionalista dos juristasfilsofos europeus e portugueses (Verney), teve consequncias decisivas sobre as Fontes do Direito e a ordem judiciria portuguesa. Naquela primeiro plano submeteu ao imprio da Razo toda a autoridade, direito e jurisprudncia antiga, fixando o uso moderno dessas leis e prticas. No plano da ordem judiciria e dos tribunais no que diz respeito s relaes entre foros -designadamente entre o civil e o cannico separa-os decisivamente, afastando por completo o Direito Cannico dos tribunais civis, os seculares que deixa mesmo de ser usado como direito subsidirio limitando-o ao foro exclusivo dos tribunais e direito cannico dos eclesisticos. A lei da Boa Razo ser expressamente assumida em muita legislao pombalina. E na prtica jurdica dos tribunais, o perodo pombalino significa j aplicaes nalguns casos muito desenvolvidas daquela separao dos direitos e tribunais, com uma geral diminuio das competncias da ordem e tribunais cannicos. Com D. Maria I (dec. De 31 de Maro de 1778) em sequncia daquelas medidas, do Compndio Histrico (1771) e dos Estatutos da Universidade de Coimbra (1772) cria-se uma Junta de Ministros com o objectivo de proceder reforma da legislao das Ordenaes e por ela da ordem jurdica. O resultado salda-se essencialmente pelo trabalho de Pascoal de Melo Freire (1783) com a redaco do projecto de Direito Pblico, correspondente reviso do Livro Segundo das Ordenaes e do de Direito Criminal sobre o Livro Quinto. De 1789 data a constituio da Junta de Censura e Reviso daquele Projecto de Direito Pblico, de que faz parte Ribeiro dos Santos. A se acentuaro as disputas entre tericos de Despotismo Esclarecido e as novas ideias do Liberalismo que dividem os tericos e professores de Direito mas tambm recobrem j fortes clivagens polticas e sociais no Governo, no Estado e na Sociedade Portuguesa. Este o pano de fundo em que se desenvolve desde Pombal (e mesmo antes) a prtica do Direito dos Tribunais em Portugal, com limitaes ao Direito particular e cannico. Em Braga o senhorio eclesistico que tem como um dos seus pilares fundamentais o seu Tribunal da Relao, fixado modernamente pelo contrato de 1472 entre o Arcebispo D. Lus Pires e o monarca D. Afonso V, ser fortemente afectado, por virtude da forte diminuio e constrangimentos colocados sobre a ordem, a jurisdio e as competncias da Relao ou Auditrio Eclesistico Bracarense. A partir desse tribunal, o senhorio bracarense dos Arcebispos integra e exerce a jurisdio eclesistica ordinria dos Bispos (para alm da jurisdio da sua primazia metropolitana), como tambm a jurisdio secular, que lhes confere o exerccio do poder secular sobre a populao da cidade e termo (concelho de Braga) e sobre os coutos da Mitra. O senhorio e sobretudo a jurisdio secular da Igreja Bracarense iria sofrer a mais forte diminuio e concorrncia por parte das leis, da actuao das magistraturas rgias na cidade e sobretudo da actuao da Relao do Porto, desde o governo de D. Jos que agora com as novas doutrinas iria dar corpo a todos os esforos histrica e ciclicamente retomados desde 1472, para limitar aquela jurisdio. E isto apesar de os Arcebispos do tempo das Luzes e do Regalismo pombalino D. Jos e D. Gaspar de Bragana, fazerem um esforo pela separao dos tribunais e aplicao do direito civil nos casos temporais, limitando e condicionando a, por motu prprio, a aplicao do Direito cannico. E chegando ao ponto, inclusive, de pugnar pela aplicao do direito civil por desembargadores e juzes leigos, no eclesisticos, defendendo e promovendo os espaos prprios da aplicao do direito civil, na cmara de Braga, na ouvidoria e nas mesas do Auditrio Geral da Relao Bracarense. A reforma do Auditrio Bracarense est pois em marcha acelerada com as medidas da governao iluminada de Pombal e de D. Maria, vindo a ser duplamente afectada com o fim da iseno do direito rgio de correio (entregues a donatrios civis e eclesisticos) e sobretudo com o total afastamento e proibio da aplicao do Direito Cannico nos tribunais e foro civil. A lei de D. Maria I de 1790 dita da abolio das donatarias, suprimiria em Braga, de um s golpe, a Relao secular e a Ouvidoria como se disse baluartes e suportes do senhorio eclesistico e temporal dos Arcebispos de Braga. Refractrio ao movimento das Luzes, mas percebendo-lhe bem o alcance e o significado, um dos mais cultos e prticos desembargadores da Relao e auditrios bracarenses, Incio Peixoto faz assentar no desprezo da Igreja e no pouco em que na Universidade se tem a jurisdio eclesistica, depois que as luzes modernas entraram a notar os abusos infinitos nos procedimentos seculares, a causa essencial da abolio do senhorio. Do ponto de vista da poltica doutrinria e das reformas pblicas, o fim das jurisdies dos donatrios est efectivamente em marcha com o plano de estudo de reformas do sistema jurdico e politico desencadeado por D. Maria ao mandar pelo dec. De 31 de Maro de 1778 proceder ao exame das muitas Leis dispersas e extravagantes [] mas tambm as do corpo das Ordenaes do Reino para se constituir um novo cdigo que depois se consubstanciar no que diz respeito organizao senhorial na publicao da Lei de 1790. No titulo LIV, relativo jurisdio dos do