memoria dos objetos

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  • 7/25/2019 Memoria Dos Objetos

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    A Memria dos objetos *

    Foi em 1991 quando primeiro me senti fazendo parte de uma instalao, dessas queas artes plsticas j nos acostumaram a entrar !ra fim de in"erno # inicio de prima"era# em $aris, e eu arrisquei a materializar#me, sem a"iso pr%"io, na porta de entrada do

    apartamento de !dson de &ousa e !lida 'essler (epois do impacto ao abrir a porta, aale)ria do reencontro e a instalao+ de mina cama noturna entre as telas de !lida,naquele que era seu atelier !nto s "ezes acontecia de sonar durante o dia e acordardurante a noite, com os umores dos ferros torcidos e os "apores da ferru)em daistria, dos restos dos metais europeus recolidos para produzir a s%rie de trabalosdenominados por !lida de -nstert.cios+

    !nto ela me dizia que era a cor dos metais, naqueles desenos que eu "iaformarem#se em )randes pain%is brancos ! eu tenta"a entender como os traos dadecomposio /ferru)em0 poderiam )estar al)o no"o 'al"ez intersticios+ pudessemesmo representar essa passa)em entre dois estados dois mundos dois tempos !m

    todo caso, eu me encontra"a com a 2istria pela primeira "ez eu sentia mesmo oeni)ma da passa)em do tempo passeando pelas ruas de $aris topa"a com pe)adas,tra)os corporais daqueles que at% ento eram somente id%ias abstratas, penduradas numc%u limpo e eterno $ara eles, no teria a"ido nem comeo, nem fim, no teria a"idointerst.cios, passa)ens !nto, tropecei na obra de 3amille 3laudel, naqueles corpos emdecomposio que desafia"am a escultura 4essa noite, no conse)ui dormir, sufocada

    pela ferru)em da passa)em de 3amille a !lida

    1999, barrac5es do anti)o (!$6!3, mais uma passa)em que !lida nos apresentaum corredor Faz parte de seu mais recente trabalo e7posto na 8ienal do Mercosul,denominado (oador+ a e7posio, nas paredes de um corredor, de uma s%rie deobjetos cujos nomes terminam em dor+, pedidos como doao pela autora !ntrei nocorredor procurando o meu+ objeto, aquele que eu teria doado, que supostamente teriase desprendido de mim e no mais precisaria representar#me ! a. fui me perdendo nas

    pe)adas dos objetos, nas memrias dos recantos que les teriam ser"ido de suporteFreud "eio socorrer#me do despedaamento das d%cadas e das casas que sematerializa"am naquele corredor, lembrando#me do jo)o de seu neto com o carretel,compondo a fon%tica da memria do lao com a me alter 8enjamin tamb%m metomou pela mo, falando#me de seu 6ua de Mo :nica+** , na construo narrati"a #de inspirao proustiana# de memrias de sua inf;ncia 8enjamin apia#se no que, emoutros te7tos, denomina memria do objeto+ &eus escritos partem da m.mesis a

    elementos discretos, a objetos ou tra)os que recortam um ponto a partir do qual anarrati"a % construida /o dedal da cai7a de costuras de sua me, por e7emplo0 < assimque ele carre)a o leitor pelas passa)ens da "ida passa)em entre tempos passa)em entrel.n)uas passa)em entre culturas passa)em entre representa5es

    Foi dessa forma que naquele corredor de tantas portas, tantas sa.das porsi)nificantes que escorriam das paredes, desses que fazem a )ente sonar e brincar, euesquecera o fio que me conduzia !ncontrei#o do lado de fora, na s%rie de plaquinas,onde cada uma indica"a (oador+ acima do nome, tamb%m com a indicao do objeto! assim encontrei#me com o nome que era eu, mas que no me pertencia, que a autoratransformara nos fios in"is."eis dos objetos ! assim reconeci a e7peri=ncia de um

    corredor da inf;ncia, quando a e"ocao # o apelo do nome # sempre me traziacompania

  • 7/25/2019 Memoria Dos Objetos

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    *'e7to ori)inalmente publicado no 3aderno de 3ultura, do >ornal ?ero 2ora, $ortoAle)re em 11@1@99 por Ana M Medeiros da 3osta

    ** 8enjamin, 6ua de mo Bnica -nCCCC Dbras !scolidas &o $aulo

    8rasilense,199E