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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL MARIVÂNIA DE MELO MOURA CULTURA POLÍTICA, VOTO E ELEIÇÃO EM SÃO LUÍS DO MARANHÃO: uma análise do pleito de 2010 São Luís 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL

MARIVÂNIA DE MELO MOURA

CULTURA POLÍTICA, VOTO E ELEIÇÃO EM SÃO LUÍS DO MARANHÃO:

uma análise do pleito de 2010

São Luís

2013

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MARIVÂNIA DE MELO MOURA

CULTURA POLÍTICA, VOTO E ELEIÇÃO EM SÃO LUÍS DO MARANHÃO:

uma análise do pleito de 2010

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em

História Social do Centro de Ciências Humanas da

Universidade Federal do Maranhão como requisito parcial

para a obtenção do título de Mestre em História Social.

Orientadora: Dra. Regina Helena Martins de Faria.

São Luís

2013

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Moura, Marivânia de Melo.

Cultura política, voto e eleição em São Luís do Maranhão: uma análise do pleito de

2010. / Marivânia de Melo Moura. – 2013.

120 f.

Impresso em computador (Fotocópia)

Orientadora: Regina Helena Martins de Faria.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Maranhão, Programa de Pós-

Graduação em História Social, 2013.

1. Eleição – Aspecto Social – São Luís-MA 2. Cultura Política 3. Voto I. Título.

CDU: 316:324(812.1)

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MARIVÂNIA DE MELO MOURA

CULTURA POLÍTICA, VOTO E ELEIÇÃO EM SÃO LUÍS DO MARANHÃO:

uma análise do pleito de 2010

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em

História Social do Centro de Ciências Humanas da

Universidade Federal do Maranhão como requisito parcial

para a obtenção do título de Mestre em História Social.

Aprovada em: ___/____/____

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Profa. Dra. Regina Helena Martins de Faria (Orientadora)

Doutora em História

Universidade Federal do Maranhão

_____________________________________________________

1º Examinador

Universidade Federal do Maranhão

_____________________________________________________

2º Examinador

Universidade Federal do Maranhão

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Aos meus alunos da escola pública, um dos

sujeitos mais prejudicados com as práticas

oligárquicas reinantes no Estado do Maranhão.

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AGRADECIMENTOS

A realização desse trabalho faz parte do desejo acalentado há algum tempo, de dar

continuidade à minha formação acadêmica, pois estudar sempre foi uma forma de dar sentido

ao mundo social e ao meu próprio mundo, em particular. Por isso, agradeço aos professores

do Departamento de História que se empenharam na aprovação do Programa de Pós-

Graduação em História Social, permitindo-me participar de sua primeira turma como

mestranda. Em especial, à professora Regina Faria por aceitar a tarefa de ser minha

orientadora, sou muito grata a seus ensinamentos querida!

Também quero fazer um agradecimento especial ao professor Wagner Cabral da

Costa, que mesmo ocupado com sua tese de doutoramento aceitou o convite para ser co-

orientador desta pesquisa; sem suas dicas e seu arquivo documental este trabalho não teria

sido possível.

Aos professores que ministraram as aulas no mestrado, obrigada por

compartilharem suas experiências de forma simples, sem a tão detestável arrogância do

mundo acadêmico, divertir-me muito com as leituras e discussões proporcionadas pelos

doutores Alexandre Navarro, Josenildo Pereira, Maria Isabel Oliveira, Antonia Mota, Lyndon

Santos e Regina Faria.

Quero agradecer aos colegas de turma pelas discussões em sala de aula e pela

amizade construída nessa jornada de leituras, escrita e angústias divididas, em especial a

Deborah, Claúdio, Iramir, Gonçalo, Míriam e Daylana.

À minha prima Naruna Melo e à minha filha Sophia Moura, obrigada meninas,

por terem agüentado minha chatice em casa; tenho aprendido coisas muito interessantes com

essas duas adolescentes lindas.

Às minhas queridas amigas e ex-alunas (já mestras) Jeane Carla de Melo e Rita

Nascimento, que me ajudaram a montar o pré-projeto de pesquisa com o qual fui aprovada na

seleção do mestrado, obrigada queridas, vocês são ótimas professoras!

Agradeço a todos os membros da comunidade daimista Centro de Iluminação

Cristã Estrela Brilhante, com quem participei de fantásticas experiências de expansão da

consciência, sempre com muita seriedade, respeito às leis brasileiras e foco na busca

espiritual.

E a todos meus amigos e amigas, novos e antigos, que sempre estiveram na

torcida para que eu terminasse esse trabalho. Obrigada ao Cosmo, por ter colocado pessoas

muito especiais na minha jornada de aprendiz do bem viver.

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"A história é tanto criação consciente como

repetição inconsciente".

Cornelius Castoriadis

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RESUMO

Análise da eleição estadual de 2010, tendo como referência os jornais O Estado do

Maranhão e Jornal Pequeno, vistos como campo de lutas simbólicas e expressão de práticas

sociais por meio das quais manifestam pontos de vistas e projetos políticos distintos para o

Estado do Maranhão. Utiliza-se a categoria de cultura política para investigar motivações e

valores que nortearam o voto de professores do Liceu Maranhense a fim de explorar

elementos constitutivos da cultura política predominante em São Luís do Maranhão. Pretende-

se explicar a vitória do grupo Sarney na capital do Estado, vista pelas oposições como

oponente ao domínio desse grupo político.

Palavras-chave: Cultura política. Voto. Eleição.

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RÉSUMÉ

Analyse de l'élection d'état 2010 en prenant comme référence les journaux ‘O Estado do

Maranhão’ et ‘O Jornal Pequeno’, vus comme le champ de luttes symboliques et l'expression

des pratiques sociales par lesquels s’expriment les opinions et les différents projets politiques

pour l'État du Maranhão. Nous utilisons la catégorie de la culture politique pour enquêter sur

les motivations et les valeurs qui ont orienté le vote des professeurs du ‘Liceu Maranhense’

afin d'explorer les éléments constitutifs de la culture politique qui prévaut à São Luis do

Maranhão. Nous voulons expliquer la victoire du groupe Sarney dans la capitale de l'Etat, et

comment elle est vue par l’opposition comme adversaire à la domination de ce groupe

politique.

Mots-clés: culture politique - vote - élection

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - O progresso e a revolução do Maranhão...................................................... 45

Figura 2 - “Viagem caça-votos” ................................................................................... 46

Figura 3 - “A nova fase” do Maranhão ......................................................................... 47

Figura 4 - Estrela da Campanha ................................................................................... 68

Figura 5 - Mapa das zonas eleitorais de São Luís (MA) .............................................. 74

Figura 6 - Captação ilícita de votos .............................................................................. 81

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Votação para governador do Maranhão de 1982 a 2010 (% dos

candidatos mais votados por partidos) ....................................................

29

Gráfico 2 - Votação de Epitácio Cafeteira em São Luís no período de 1982 a 2006

(em % por cargo eletivo). ........................................................................

31

Gráfico 3 - Votação para Governador em São Luís no período de 1982 a 2010

(candidatos mais votados por partidos). ..................................................

32

Gráfico 4 - Votação para Prefeito em São Luís no período de 1985 a 2012 (% dos

candidatos por partidos). ......................................................................... 35

Gráfico 5 - Votação de Jackson Lago em São Luís de 1985 a 2010 (em % por

cargo eletivo). ..........................................................................................

35

Gráfico 6 - Votação de Roseana Sarney em São Luís de 1994 a 2010 (em % por

cargo eletivo). ..........................................................................................

36

Gráfico 7 - Votação de João Castelo em São Luís de 1982 a 2012 (em % por cargo

eletivo). ....................................................................................................

37

Gráfico 8 - Votação para Senador em São Luís de 1982-2010(% dos candidatos

mais votados por partidos). .....................................................................

38

Gráfico 9 - Votação de Flávio Dino em São Luís de 2006-2010(% dos candidatos

mais votados por partidos). .....................................................................

39

Gráfico 10 - Distribuição de abstenção eleitoral no Brasil e no Maranhão no período

de 1994-2010. ..........................................................................................

40

Gráfico 11 - Pesquisas para Governador do Maranhão, estimulada no 1º turno do

ano de 2010. ............................................................................................

55

Gráfico 12 - Taxa de rejeição do eleitorado para o ex-governador Jackson Lago na

disputa eleitoral de 2010..........................................................................

77

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Zonas Eleitorais de São Luís ................................................................. 75

Quadro 2 - Convênios efetivados de forma irregular entre o governo estadual e as

prefeituras municipais do Maranhão .......................................................

83

Quadro 3 - Ranking do IDH dos Estados Brasileiro em 2005 .................................. 89

Quadro 4 - Dados dos professores ............................................................................ 100

Quadro 5 - Voto dos docentes para governador ........................................................ 101

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Taxas de analfabetismo por faixa etária e cor no Estado Maranhão/ano

2009. ..........................................................................................................

41

Tabela 2 - Número de Pessoas que não sabem ler e escrever em São Luís do

Maranhão ...................................................................................................

41

Tabela 3 - Distribuição de votos por candidato a governador no 1º turno das

eleições estaduais de 2006 no Município de São Luís ..............................

72

Tabela 4 - Distribuição de votos por candidato a governador no 2º turno das

eleições estaduais de 2006 no Município de São Luís ..............................

72

Tabela 5 - Distribuição de votos por candidato a governador nos Municípios de

Imperatriz, Timon, Pedreiras, Balsas, Santa Inês e Caxias .......................

73

Tabela 6 - Resultado do 1º turno da eleição de 2010 das zonas eleitorais de São

Luís ............................................................................................................

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 13

1 TRAÇOS DE UMA CULTURA POLÍTICA BRASILEIRA ....................................... 19

1.1 Heranças culturais ............................................................................................................ 19

1.2 A conjuntura política do Maranhão no tempo presente ............................................... 24

2 ELEIÇÕES EM SÃO LUÍS: uma análise das estatísticas ............................................... 29

2.1 O grupo Sarney na última eleição ................................................................................... 29

2.2 O comportamento da “Ilha Rebelde” nas eleições ......................................................... 34

2.3 Abstenção no Maranhão ................................................................................................... 40

3 A ELEIÇÃO ESTADUAL DE 2010: os principais candidatos na imprensa

escrita .................................................................................................................................. 43

3.1 A retórica da campanha política ..................................................................................... 43

3.2 Perfil dos candidatos ......................................................................................................... 57

3.3 O apoio do PT (Partido dos Trabalhadores) à candidata da oligarquia: uma

nova fase política? ............................................................................................................... 65

4 A ELEIÇÃO ESTADUAL DE 2010: um confronto na imprensa .................................... 69

4.1 O Estado do Maranhão x Jornal Pequeno ....................................................................... 69

4.2 Denúncias de crimes eleitorais no jornal oposicionista ................................................. 78

4.3 A “Lei do Cão” e o desencanto dos professores com Jackson L Reação da

sociedade civil aos casos de abuso de poder político e econômico ................................ 81

5 A ELEIÇÃO ESTADUAL DE 2010: A Cultura Política de Professores ........................ 85

5.1 A memória histórica do político José Sarney ................................................................. 86

5.2 A internalização da cultura política oligárquica ............................................................ 90

5.3 A “Lei do Cão” e o desencanto dos professores com Jackson Lago ............................. 93

5.4 O perfil dos professores entrevistados ............................................................................ 99

6 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 106

.............................................................................................................................................

REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 109

APÊNDICE ......................................................................................................................... 118

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho é uma tentativa de compreensão da eleição de 2010 a partir

das representações contidas nos jornais O Estado do Maranhão e Jornal Pequeno. Propõe-se

uma investigação acerca da cultura política de São Luís, destacando a participação de

professores do Centro de Ensino Liceu Maranhense, como atores do processo de escolha do

governante estadual. Nesse sentido, pretende-se analisar essa disputa eleitoral e apresentar

explicações para a vitória da candidata Roseana Sarney Murad na cidade de São Luís e

circunvizinhanças, locais que, em outros pleitos eleitorais, foram reduto da oposição aos

candidatos do grupo Sarney. Para analisar o resultado da eleição em questão, opera-se com o

conceito de cultura política, entendido, na perspectiva da atual história política, como um

[...] conjunto de valores, tradições, práticas e representações políticas partilhado por

determinado grupo humano, que expressa identidade coletiva e fornece leituras

comuns do passado, assim como fornece inspiração para projetos políticos

relacionados ao futuro (MOTTA, 2009, p. 28).

A respeito desse conceito, Hunt (2007) esclarece como e porque nasce uma

determinada cultura política. Sugere que depende de como as sociedades resolvem seus

problemas diante das grandes crises estruturais. Em estudo sobre a cultura política

revolucionária francesa, a autora assevera que “[...] as origens do republicanismo democrático

e revolucionário têm de ser buscadas na cultura política, onde todos os elementos da

organização política se juntam” (HUNT, 2007, p. 272). Retornando-se ao Maranhão,

compreende-se que, nesse estado, o predomínio de determinados grupos políticos relaciona-se

a regras e valores enaltecedores de uma cultura política oligárquica e clientelística.

A noção de oligarquia que aqui está sendo usada é de um poder político

concentrado nas mãos de um restrito grupo de pessoas, ligadas entre si por vínculos de sangue

ou de interesses, que gozam de privilégios particulares, servindo-se de todos os meios que o

poder pôs ao seu alcance para conservá-los, inclusive, fazendo uso da dominação

patrimonialista do Estado para favorecer economicamente os interesses particulares do grupo

(BOBBIO, 2010; CAMPANTE, 2003).

Torna-se necessário, portanto, questionar o imaginário político dessa sociedade.

De acordo com Castoriadis (2002), o imaginário social está no campo do simbólico, é obra do

imaginário anônimo coletivo, que institui um poder constituinte, ao qual se liga a noção do

político. Desse modo, a sociedade e os poderes nela constituídos são construções do

imaginário social. Para este autor, os poderes constituídos, incluindo o político, fundamentam-

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-se não essencialmente sob coerção, pois há um mínimo de adesão, mesmo que seja de uma

parte da população. Assim, “[...] representações e imaginários misturam-se, e a sua análise

permite apreender melhor os fenômenos de legitimidade, tão determinantes para o historiador

do político quanto os mecanismos e processos de estabelecimento de uma legalidade”

(SIRINELLI, 1998, p. 416).

Desse modo, o poder político se expressa também através da dominação

simbólica, de lutas simbólicas e de representações que os indivíduos ou os grupos têm do

mundo social, classificando-o a ponto de dar sentido à realidade social, percebida através de

signos “que visam a fazer reconhecer uma maneira própria de estar no mundo, a significar um

estatuto, uma ordem, um poder” (CHARTIER, 2002, p. 169).

A temática trabalhada insere-se no que está sendo chamada história do tempo

presente. De acordo com Certeau (1982), o que interessa na investigação histórica é “a

particularidade do lugar social” de onde fala o pesquisador, suas escolhas metodológicas e sua

intenção ao produzir um texto de história. Sem a pretensão filosófica de “descobrir a

verdade”, o trabalho de pesquisa historiográfica revela a subjetividade do autor e seu modo

específico de intervir na realidade social. A escrita historiográfica, a partir dessa perspectiva,

é uma prática social, com a qual se promove uma intervenção crítica nos modelos

socioculturais existentes nas sociedades, desmascarando os poderes constituídos como

fatalidades naturais existentes desde sempre. O texto histórico é, portanto, “[...] uma

arquitetura estável de elementos, de regras e de conceitos históricos” (CERTEAU, 1982, p.

94); apresenta, através da narrativa, um discurso de conteúdo verossímil e nem sempre se

dedica a um passado remoto, podendo ser uma análise do tempo presente, do tempo em que

vive o historiador seja como cidadão, ator ou espectador. Sendo assim, a nova história do

político se constitui na vanguarda da história do presente, donde aquele que escreve a história

é testemunha e historiador ao mesmo tempo, pois está em relação direta com seu tema

(TÉTART; CHAUVEAU, 1999).

Para Sirinelli (1998, p. 78), “[...] o historiador, qualquer que seja sua especialidade

cronológica, bebe em seu presente e, longe de pensar que ‘é de nenhum tempo e, país

nenhum’, ele sabe que está ligado por múltiplas fibras a seu tempo e à sua comunidade à qual

pertence”. Os historiadores de hoje não se angustiam mais numa busca obsessiva pela dupla

objetividade/neutralidade no campo da pesquisa, pois o que conta é o profissionalismo

ancorado nas regras do método e do rigor, que devem ser levadas em consideração acerca de

todas as épocas estudadas. Na tentativa de construir este texto como uma narrativa

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15

historiográfica, recorre-se às lições metodológicas do medievalista Le Goff (1999, p. 101),

que faz as seguintes recomendações para a história do tempo presente:

Ler o presente atentamente, com uma profundidade histórica suficiente e pertinente;

Manifestar-se quanto a suas fontes o espírito crítico de todos os historiadores

segundo os métodos adaptados a suas fontes;

Não se contentar em descrever e contar, mas esforçar-se para explicar;

Tentar hierarquizar, distinguir o incidente do fato significativo e importante, fazer do

acontecimento algo integrado à longa duração e a uma problemática na qual todos os

historiadores de ontem se reúnam.

Ademais, “[...] o historiador do presente está preocupado com o peso esmagador

do passado, às vezes remoto, no qual se situa o princípio de toda explicação histórica”

(MILZA; BERNSTEIN, 1999, p. 40). Entende-se, então, que a história do presente é, antes de

tudo, história, e que o historiador deve buscar conhecer as estruturas a fim de compreender

por quais processos chegou-se a uma determinada situação presente.

Nesse aspecto, interessa fazer uma análise histórica, que identifique o que

permanece e o que muda com o passar do tempo nas práticas políticas em São Luís; ver as

possíveis relações entre a conjuntura do tempo presente e as estruturas de longa e média

duração que concernem à própria formação da sociedade brasileira e suas heranças coloniais.

O fato de ter a eleição estadual de 2010 como objeto de estudo, não restringe a

análise ao efêmero, pois a cultura política praticada nessas paragens remonta a valores e

tradições arraigadas no imaginário, fruto de nossas raízes ibéricas, como assevera Holanda

(2004). No Maranhão, ainda são muito presentes as relações de amizade, os laços familiares e

os interesses particulares no trato da “coisa pública”, em que o personalismo constitui o

núcleo básico da política juntamente com o mandonismo e a herança patriarcal. Personalismo

que está evidenciado na nomeação de 161 escolas públicas com o sobrenome Sarney, segundo

matéria do jornalista Chico Otávio (2012), publicada no jornal O Globo. Essas práticas

políticas estiveram presentes no período colonial, no Império e ainda sobrevivem na

República, tornando a experiência democrática um vir a ser, uma aspiração política, no

sentido da inclusão das camadas sociais no plano político-social. A cultura política vigente,

portanto, vai além da ação política, integrando-se a uma perspectiva multidimensional,

cruzando o tempo curto do acontecimento com uma análise mais estrutural dos fenômenos

retidos no tempo.

Diante do exposto, e com base em Bédarida (1998, p. 151), afirma-se ser a função

do historiador, esclarecer os acontecimentos e fornecer elementos capazes de explicar e

compreender as diversas facetas da vida social. No entanto, neste ofício, “[...] toda busca da

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16

verdade está ligada a um corpo de valores que representa a interface entre história e ética”.

Isso porque a interpretação histórica depende de um sistema de referência no qual se admite a

subjetividade do pesquisador na elaboração de suas perguntas e conjecturas.

Porém não se pode pensar a escrita da História sem uma metodologia, pois os

fatos não se impõem ao historiador, nem as fontes falam por si mesmas. Na tessitura da

História, segundo Albuquerque Júnior (2007), é preciso o suporte dos documentos, das

ferramentas oferecidas pela cultura historiográfica, dos conceitos que ajudam o historiador a

escrever sua narrativa, sua versão dos fatos. Para a concretização desse estudo, adota-se o

caminho oferecido pela análise de discurso, a partir das matérias dos jornais O Estado do

Maranhão e Jornal Pequeno, além das falas dos professores do Centro de Ensino Liceu

Maranhense. Esse viés metodológico concebe “[...] a linguagem como mediação necessária

entre o homem e a realidade natural e social. Essa mediação, que é o discurso, torna possível

tanto a permanência e a continuidade quanto o deslocamento e a transformação do homem e

da realidade em que ele vive” (ORLANDI, 2003, p. 15). Desse modo, o discurso pronunciado

ou escrito traz poderes e perigos que mal se imagina, pois, na perspectiva de Foucault (2004),

toda produção discursiva é controlada, selecionada e organizada por certo número de

procedimentos a fim de conjurar seus poderes e perigos.

Para aqueles que se dedicam ao tempo presente, “[...] ao encontro com seres de

carne e osso que são contemporâneos daquele que lhes narra as vidas” (CHARTIER, 2006, p.

48), a metodologia da historia oral oferece a possibilidade de produzir seu próprio arquivo por

meio do registro de depoimentos orais concedidos em entrevistas. Nesta pesquisa faz-se uso

de entrevistas temáticas, com o objetivo de identificar: como os professores e as professoras

do Liceu Maranhense vêem suas práticas políticas em relação à eleição de 2010; como

receberam as imagens dos candidatos representadas pelos jornais O Estado do Maranhão e

Jornal Pequeno, na época da campanha eleitoral em questão e que elementos da cultura

política teriam sido decisivos na escolha que fizeram dos candidatos. Aos docentes

escolhidos, entregou-se uma ficha de identificação (ver apêndice A), a fim de colher dados

sociográficos, antes da realização de entrevistas temáticas aberta.

A utilização da “palavra-fonte”, alerta Voldman (2006, p.37), requer uma série de

cuidados, pois “[...] a entrevista é um jogo de esconde-esconde entre o historiador e seu

interlocutor”, em que o primeiro representa “‘aquele que sabe’ ou saberá e o segundo possui a

força e a convicção ‘daquele que viveu’”. E continua ensinando:

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17

[...] quando realiza entrevistas, certamente o historiador deve trabalhar segundo suas

técnicas próprias, mas também deve ter em mente dois outros procedimentos,

tomados de empréstimos a disciplinas vizinhas: por um lado, servir-se das

contribuições da sociologia na condução e na formação das pesquisas; por outro, não

negligenciar elementos de psicologia, psicossociologia e psicanálise (VOLDMAN,

2006, p. 37-38).

Nessa perspectiva dialética, foram utilizadas fontes escritas (particularmente os

dois jornais mencionados), os depoimentos orais, além de dados eleitorais referentes às

eleições em São Luís e em todo Maranhão, para avaliar que elementos da cultura política

direcionaram a ação do eleitorado diante do último daqueles processos eleitorais.

Apoiada por esse aparato teórico e metodológico, construiu-se um itinerário de

investigação no qual se analisa, no primeiro capítulo, como foram constituídos os traços de

uma cultura política brasileira, forjada pelas experiências de um passado que ainda se faz

presente nas práticas políticas e sociais. Analisa-se, nesse capítulo, a conjuntura da política

maranhense a partir de outros estudos que contemplam a situação da dominação oligárquica e

suas crises internas.

No segundo capítulo, o foco é a análise das estatísticas eleitorais referentes ao

desempenho do grupo Sarney nas últimas eleições, com destaque para o comportamento

eleitoral da cidade de São Luís, que, mesmo sendo denominada pelas oposições de “Ilha

Rebelde”, apresenta seus momentos de conservadorismo político ao eleger representantes

vinculados a uma prática política oligárquica. Verifica-se, ainda, os altos índices de abstenção

nas eleições.

No terceiro capítulo, destaca-se o modo como os três principais candidatos

daquele pleito eleitoral - Roseana Sarney, Flávio Dino e Jackson Lago - foram apresentados

ao eleitorado de São Luís por meio de dois periódicos diários de circulação local: O Estado do

Maranhão e o Jornal Pequeno. A escolha de O Estado do Maranhão justifica-se por ser este

jornal um veículo pertencente ao grupo Sarney, que tradicionalmente enaltece os candidatos

de seu grupo em detrimento dos oposicionistas. Já o Jornal Pequeno foi escolhido por seu

posicionamento de ferrenho opositor ao grupo Sarney. Estes periódicos ocupam importante

lugar social nas disputas políticas do estado, tornando-se porta-vozes de projetos políticos

distintos, indo além da simples divulgação de informações acerca dos fatos ocorridos.

Utilizando-os como fontes documentais, atenta-se às recomendações de Luca (2012, p. 140)

para

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[...] a importância de se identificar cuidadosamente o grupo responsável pela linha

editorial, estabelecer os colaboradores mais assíduos, atentar para a escolha do título

e para os textos programáticos, que dão conta de intenções e expectativas, além de

fornecer pistas da leitura do passado e do futuro compartilhada por seus

propugnadores. Igualmente importante é inquirir sobre suas ligações cotidianas com

diferentes poderes e interesses financeiros [...].

Levando em consideração essas questões, objetiva-se apreender, no discurso

apresentado nos textos e nas imagens veiculadas nos jornais, as representações construídas de

Roseana Sarney Murad, Flávio Dino de Castro e Jackson Kepler Lago, na campanha eleitoral

para o governo estadual de 2010.

No quarto capítulo, a disputa eleitoral é apresentada como um confronto travado

na imprensa escrita. O Estado do Maranhão apresenta, na pré-campanha de 2010, a aceitação

de Roseana Sarney em São Luís, de modo a colocar em cheque a imagem da “Ilha Rebelde”,

atribuída pela oposição. Nessa seção, analisa-se como a opinião pública foi orientada por esse

veículo de comunicação a fim de provocar a aceitação da candidata governista pelos eleitores

da capital. Também neste capítulo, apresentam-se algumas práticas de clientelismo e compra

de votos na capital, denunciadas pelo Jornal Pequeno, além da reação de alguns setores da

sociedade civil a essas mesmas práticas.

No quinto capítulo, faz-se breve exposição acerca da metodologia da historia oral

e apresenta-se o resultado das entrevistas temáticas, realizadas com docentes do Centro de

Ensino Liceu Maranhense, em que se busca identificar a recepção das imagens dos três

principais candidatos que concorrem à eleição de 2010, e, diante disso, procura-se identificar

que elementos da cultura política teriam direcionado aqueles eleitores na decisão de votar

num ou noutro candidato.

A escolha dos docentes do Liceu Maranhense justifica-se pela importância

atribuída a esta tradicional instituição de ensino na educação de jovens da sociedade

maranhense. Parte-se do pressuposto de que os professores são atores sociais de grande

relevância na construção de valores dos jovens discentes, podendo influenciá-los diretamente

e às suas famílias indiretamente. Discuti-se, neste capítulo, a importância da greve dos

professores no governo Jackson Lago, em 2007, e sua repercussão no posicionamento dos

docentes em relação a esse candidato na campanha eleitoral de 2010.

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1 TRAÇOS DE UMA CULTURA POLÍTICA BRASILEIRA

A ideia de cultura política diz respeito aos valores e práticas comuns

compartilhados por uma determinada sociedade, e revela as regras do comportamento

político, donde valores e expectativas de comportamento dão margem à ação política (HUNT,

2007). A cultura política relaciona-se intrinsecamente com a cultura geral, entendida como

“um processo acumulativo, resultante de toda a experiência histórica das gerações anteriores”

(LARAIA, 2003, p. 49).

De acordo com Berstein (1998, p. 351), há várias possibilidades de compreensão

da cultura política, dentre as quais destacamos: “leitura comum e normativa do passado; visão

institucional que traduz no plano da organização política do Estado os dados filosóficos ou

históricos precedentes; discurso em que ritos e símbolos desempenham representação visual”.

Desse modo, o historiador do político não pode abrir mão da relação entre a política e as

crenças, costumes, normas e tradições dos grupos sociais cujas ações políticas ele analisa.

1.1 Heranças culturais

Um dos primeiros estudiosos a se dedicar a essas questões no Brasil foi Sérgio

Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil, em 1936. Segundo ele, nossas raízes culturais têm

tradição secular e remontam ao processo de colonização do Brasil, no qual se fez presente os

traços da dominação1 tradicional, tais como mandonismo e patrimonialismo.

Outro autor clássico da historiografia nacional a se dedicar às práticas políticas e

suas permanências é Raymundo Faoro. Em Os Donos do Poder (1979), o autor considera ser

o aparelho político nacional controlado por uma camada social, que

[...] impera, rege e controla, em seu nome próprio, num círculo impermeável de

comando. Esta camada muda e se renova mas não representa a nação, senão, que

forçada pela lei do tempo, substitui moços por velhos, aptos por inaptos, num

processo que cunha e nobilita os recém-vindos, imprimindo-lhes os seus valores

(FAORO, 1979, p. 737).

Essa prática de dominação política tem sido uma realidade inexaurível no

Maranhão desde a formação do Estado nacional, atravessando as mudanças estruturais e

adaptando-se aos novos padrões sócio-políticos da realidade do país, sem que se altere

1 A ideia de dominação diz respeito à probabilidade de encontrar obediência para ordens específicas dentro de

um determinado grupo de pessoas (WEBER, 2000).

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substancialmente a estrutura de mandonismo e patrimonialismo, típica dos regimes

oligárquicos, a ponto de sugerir-se que faz parte da cultura política regional esse tipo de

dominação. Mas, afinal a cultura não pode ser entendida como uma prisão perpétua. Ela é

fruto das experiências históricas das gerações anteriores, de representações do mundo, da

ordem moral e valorativa dos diferentes comportamentos sociais. Sendo assim, não pode

haver um determinismo histórico que nos condene a repetir sempre os mesmos padrões

culturais, visto que temos a capacidade de questionar nossos próprios hábitos e valores,

embora a mudança seja lenta, quase impercebível aos olhos de quem não tenha uma visão

diacrônica desse processo.

É praticamente consensual na historiografia brasileira a compreensão de que a

grande extensão da colônia portuguesa na América fez com que a Coroa Lusitana fomentasse

o poder e a independência dos senhores rurais em seus domínios, o que favoreceu a

dominação dos proprietários de terra a partir de um modelo patriarcal e patrimonialista que se

tornou um dos pilares da formação histórico-cultural da sociedade brasileira.

No cenário rural extremamente hierarquizado em que se deu a colonização da

América portuguesa, o patriarcalismo e o personalismo foram se fixando como valores

centrais da nossa cultura política; “a família colonial fornecia a ideia mais normal do poder,

da respeitabilidade, da obediência e da coesão entre os homens”, a vontade de mandar e a

disposição à obediência tornaram-se virtudes das mais apreciadas e difundidas na cultura

política brasileira. Era preciso obedecer ao rei, ao chefe patriarcal, aos valores tradicionais

ligados à posse da terra e ao sistema escravista de produção (HOLANDA, 2004).

No período colonial, os latifundiários exerciam plena autoridade sobre a estrutura

administrativa das Câmaras Municipais, que refletiam o poderio dos senhores rurais e seu

interesse no governo local. Para os chamados “homens bons”, o interesse particular

confundia-se com o interesse público na medida em que a realidade econômica, política e

social da Colônia era controlada pelos proprietários rurais (QUEIRÓZ, 1976).

Estruturava-se, assim, uma forma de dominação tradicional que marcou a

experiência política brasileira em vários aspectos. Este tipo de dominação, segundo Weber

(2000), apoia-se na crença da santidade dos poderes senhoriais, segundo a qual, o poder é

pessoal, emana da crença na dignidade do senhor e responde à lógica da fidelidade, em que o

individuo é súdito, servo e não cidadão.

Faoro (1979) entende que a dominação estava respaldada em um patrimonialismo

estamental, transplantado de Portugal para Colônia, no qual se tutelam interesses particulares,

concedendo benefícios e cargos aos privilegiados, sendo o personalismo, inspirado no

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individualismo aristocrático, dependente das forças e virtudes pessoais do senhor, marca

profunda das estruturas mentais da cultura brasileira, ratificando a crença de que o poder

político é um direito sagrado das famílias patriarcais. Isso porque o poder local foi se

estruturando com base na existência da família patriarcal e de seus interesses particulares,

que, nesse caso, confundiam-se com a própria administração pública colonial.

De acordo com Queiróz (1976), o grupo familial não se limitava aos pais e filhos,

agregados e escravos, era muito maior, incluía filhos biológicos e políticos, de maneira a

formar um sistema parental poderoso de dominação política e econômica, que se estendeu da

Colônia à República brasileira, marcando profundamente nossa identidade político-social.

A ruptura da Colônia em relação à metrópole, no início do século XIX, pouco

alterou a estrutura do mandonismo patrimonialista no novo Estado Nacional. No Império,

eram ainda os fazendeiros e seus filhos educados nas profissões liberais quem

monopolizavam a política num inconteste domínio local e, agora, também provincial.

No que tange às mudanças político-administrativas, deu-se a subordinação das

Câmaras Municipais às Assembléias Provinciais, e isso só aumentou o poder dos senhores

rurais, pois poderiam expandir seu domínio por toda a Província, como assevera Queiróz

(1976, p. 66-67):

Ao examinar a subordinação da Câmara Municipal aos governos provinciais, não se

pode deixar de lado o fato de dever trazer a Independência inteira mudança de

personagens nos quadros administrativos, com o afastamento dos funcionários

portugueses e a sua substituição por outros brasileiros. Esta circunstância tendia a

reforçar o sentimento dos senhores rurais de que não havia separação ou diferença

entre seus interesses e o interesse público [...] Agora, ocupados muitos cargos da

administração pública por estes mesmos senhores rurais, isto é, por seus parentes e

afilhados, constituída a Assembléia de representantes deles, um novo sentimento de

poder os invadia, que não se confiava mais aos limites do município e da província,

mas que cobria todo o país, em todos os setores da vida.

Outra novidade administrativa no Império, a criação da Guarda Nacional em todos

os municípios, em 1831, contribui em muito para reforçar o poder dos mandões locais,

transformados agora em “coronéis”, legítimos chefes militares a exercerem as funções de

segurança e controle político-eleitoral em seus domínios.

A partir da década de 1840, com o processo de centralização política em

andamento no Segundo Reinado, a nomeação dos oficiais da Guarda Nacional ficou a cargo

do Ministério da Justiça e dos presidentes de província. Essa medida fomentou o

fortalecimento das lideranças regionais com trânsito na Câmara Geral e nos ministérios, assim

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como a legitimação das práticas de clientelismo2, utilizadas pelos políticos imperiais no

âmbito das relações com o governo central. Com base nas relações clientelistas, os políticos

efetuavam, na esfera regional, a troca de nomeações, verbas e favores pelo apoio dos núcleos

de poder municipais; no âmbito nacional, os líderes regionais estabeleciam o vínculo entre a

província e o governo central, na perspectiva de ter acesso aos cargos e possíveis ajudas

financeiras (REIS, 2007).

Estudando as práticas políticas no Maranhão nesse período, Reis (2007) identifica

a formação de oligarquias políticas, a partir da década de 1840. Quanto às disputas políticas

anteriores, são caracterizadas por ele como lutas entre famílias de importantes proprietários

rurais pelo controle político da Província, tratando-se de oligarquias familiares. De acordo

com esta análise, a formação das oligarquias políticas iniciou-se, portanto, entre as décadas de

1840 e 1860,

[...] cujas funções primordiais no processo mais amplo de construção do Estado

Nacional eram a organização das disputas políticas no âmbito regional, aglutinando

as facções e permitindo o funcionamento do jogo partidário, estabelecendo, enfim, a

mediação entre a corte imperial e a província (REIS, 2007, p. 51).

O historiador inglês Richard Graham, em Clientelismo e política no Brasil do

século XIX (1997), destaca valores que nortearam as práticas clientelistas no Império

brasileiro, tais como: lealdade, fidelidade, gratidão, amizade, parentesco, relações familiares,

respeito, confiança. Esses valores estiveram presentes, sobretudo, nas disputas eleitorais,

muitas vezes decididas através da força econômica e da fraude eleitoral, práticas que ainda

são utilizadas na atual conjuntura política nacional e, em especial, no estado do Maranhão.

A abordagem da história política pelo víeis da cultura política permite observar as

permanências e rupturas que tais práticas têm atravessado na longa duração da política

brasileira, com algumas alterações, é verdade, mas sempre se reatualizando e fazendo-se

presentes de alguma forma.

Durante a chamada Republica Velha (1889-1930), a exemplo do que acontecera

no Segundo Reinado, as oligarquias exerceram de forma sistemática a mediação entre os

governos estaduais e federal. Foi a época áurea do coronelismo, segundo Leal (1975). Para

ele, não se tratava de uma mera sobrevivência do poder privado da era colonial e sim, “uma

forma peculiar de manifestação do poder privado, ou seja, uma adaptação em virtude da qual

2 Clientelismo: rede de fidelidades pessoais; uso pessoal por parte dos políticos dos recursos estatais

(MATROPAOLO, 2010, p. 177).

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os resíduos do nosso antigo e exorbitante poder privado tem conseguido coexistir com um

regime de extensa base representativa” (LEAL, 1975, p. 20).

Na análise desse autor, o coronelismo representou a decadência do poder privado

diante do fortalecimento do Estado. Porém, a força do poder estatal ainda não se fazia

presente em todos os municípios da federação, dai a relação de compromisso entre o poder

privado decadente e o poder público que estava se fortalecendo, mas não conseguia estar

presente nos mais distantes rincões do país de forma efetiva.

Nessa perspectiva, o coronelismo constituiu-se num sistema político de caráter

nacional, baseado em barganhas entre o governo e os coronéis, que unia interesses dos

poderes municipal, estadual e da presidência da República. As oligarquias estaduais apoiavam

os coronéis, concedendo-lhes cargos públicos municipais, em troca, recebiam apoio em forma

de votos, enquanto as oligarquias estaduais hipotecavam seu apoio ao presidente da república.

Em retribuição este, garantia-lhes apoio político e outras benesses.

Analisando esse sistema de dominação política, é comum usar como sinônimos os

conceitos de coronelismo e mandonismo. Ambos são estruturas personalistas de poder, só que

o mandonismo é um conceito mais amplo que o coronelismo. Aquele remete a uma

característica da política tradicional, existente desde o início da colonização e que sobrevive

ainda hoje em regiões atrasadas, tendendo ao desaparecimento mediante o processo de

maturação da democracia (CARVALHO, 1997). Na visão de Leal (1975), o coronelismo é um

momento particular do mandonismo, aquele em que os chefes locais começariam a perder

espaço para a presença do Estado burocrático.

Outra distinção oportuna dá-se em relação aos conceitos de coronelismo e

clientelismo, uma vez que podem ser correlacionados, mas não são sinônimos. Existem

relações de barganha politico-eleitoral na prática do coronelismo, porém o fenômeno do

clientelismo é muito mais amplo que o coronelismo. Este, predominante na República Velha,

assentava-se no predomínio da estrutura agrária e rural, em que o voto é uma “doação” do

eleitor ao candidato indicado pelo coronel. O clientelismo atual mostra-se perfeitamente

compatível com as práticas da democracia liberal (FARIAS, 2000), em que a ideia de

liberdade, associada ao mercado, faz com que o eleitor se sinta “livre” para negociar o voto,

que passa a ser, portanto, uma mercadoria.

Na atual conjuntura, políticas sociais como o Programa Bolsa Família, por

exemplo, podem ser compreendidas como instrumentos de práticas clientelistas em virtude da

predominância de uma cultura política marcada por relações paternalistas de dominação, na

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qual direitos são tratados como favores, fortalecendo assim a prática clientelista e os padrões

tradicionais de dominação (BURSZTYN; CHACON, 2011).

Não se pretende apontar aqui uma cultura política única para a realidade brasileira

e a maranhense, pois pode haver múltiplas culturas políticas no interior de uma nação

(BERSTEIN, 1998). Porém, considera-se que a identidade política brasileira é

acentuadamente marcada pelo peso dos valores tradicionais, sendo válido questionar a

viabilidade do que Holanda (2004) afirmou, na década de 1930, que haveria entre nós uma

“incompatibilidade absoluta com os ideais democráticos”.

Sobre a propagação das ideias liberais e democráticas3 há de se levar em

consideração que as mesmas são apropriadas pelas elites políticas, de maneira a garantir uma

democracia liberal extremante restrita, tornando-se um eficiente instrumento de dominação da

população. O ranço do mandonismo das antigas oligarquias tem sobrevivido no estado do

Maranhão com o apoio do clientelismo estatal, em que se negocia a concessão de benefícios

sociais (Luz para todos; Bolsa família; Minha casa, minha vida) por voto e apoio político aos

candidatos governistas. Esse cenário corrobora o “caráter farsesco da história brasileira, de

patrimonialismo disfarçado de ‘modernidade’ no que lhe interessa e desprezando sua

característica fundamental, ainda não implantada [...] o estabelecimento efetivo do Estado de

direito” (CAMPANTE, 2003, p. 186).

1.2 A conjuntura política do Maranhão no tempo presente

A experiência política do estado do Maranhão tem sido marcada pela permanência

de práticas tradicionais impregnadas de mandonismo, clientelismo e patrimonialismo no trato

da “coisa pública”. Tais práticas resultam da cultura política brasileira constituída desde os

tempos coloniais, que ainda povoam o imaginário político daqueles que vivem o tempo

presente.

O termo “experiência” aqui é tomado de empréstimo do historiador inglês

Thompson (1981, p. 189), o qual considera que

3 Liberalismo e democracia são ideologias políticas diferentes, fundidas no final do século XIX em virtude da

intensificação dos movimentos populares de inspiração socialista e comunista. A aliança

liberalismo/democracia, portanto, tem a ver com a pressão das camadas populares. Como estas não tiveram

poder de pressão no Brasil, a associação do liberalismo com a democracia e com o estabelecimento universal

de direitos e garantias fundamentais é, quando muito, uma mera promessa (CAMPANTE, 2003, p. 185).

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“[...] as pessoas não experimentam sua própria experiência apenas em ideias, no

âmbito do pensamento. [...] Elas também experimentam sua experiência como

sentimento e lidam com esses sentimentos na cultura, como normas, obrigações

familiares e de parentesco, e reciprocidades, como valores [...].

A temática das práticas oligárquicas reinantes no Maranhão tem sido objeto de

análise de historiadores e cientistas sociais comprometidos em entender e explicar a

conjuntura política local. Em A Reinvenção do Maranhão Dinástico, Gonçalves (2000)

constata que, a partir da oligarquia promovida por José Sarney, tem-se reinventado uma

dinastia de filhos biológicos e políticos, sustentada por relações de parentesco e de alianças

políticas. Na perspectiva de Reis (2007), o termo oligarquia identifica um grupo que se

apodera das instâncias superiores do poder político regional e se reproduz pela utilização

desses postos de mando.

A oligarquia Sarney começou a articular seu mando a partir de 1965, com a

eleição de José Sarney ao governo do Estado, comprometendo-se a erradicar os “anos de

atraso” referentes ao período de mandonismo do grupo liderado pelo senador Victorino Freire

(1945-1965). Desde o episódio da Greve de 1951, que representou a rejeição da capital à

diplomação do governador Eugenio Barros, “eleito de forma fraudulenta” com apoio da

oligarquia vitorinista, são encenadas no Maranhão “campanhas de libertação” desse estado.

Aquele episódio deu inicio à representação de São Luís como Ilha Rebelde, segundo a

construção imagética das oposições.

Na análise de Costa (2009a), as elites políticas locais têm instrumentalizado o

discurso da libertação e da Ilha Rebelde a fim de legitimarem-se no “teatro do poder”. Desde

então, o estado do Maranhão tem sido palco de campanhas libertadoras. A primeira, como já

destacado, a Greve de 1951, a segunda, em 1965, com a eleição de José Sarney, e a terceira,

na eleição de Jackson Lago, em 2006, sem que se altere de fato a estrutura de dominação

oligárquica patrimonialista.

A passagem do mandonismo vitorinista para a fase de domínio de José Sarney não

representou, na análise de Costa (2004), uma ruptura histórica com as práticas oligárquicas,

pois Vitorino e Sarney, como “irmãos siameses”, são produtos do apoio do poder federal e da

utilização patrimonialista da máquina pública. Em recente entrevista concedida ao jornal Vias

de Fato, o ex-deputado federal pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), Domingos

Freitas Diniz (2012) – histórico opositor de José Sarney no Maranhão e um dos fundadores do

Partido dos Trabalhadores (PT), membro da primeira direção nacional desse partido –,

assevera que a vitória de Sarney em 1965 se dá diante do enfraquecimento de Vitorino Freire,

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que estava rompido com o então governador Newton Belo e sofria as pressões que o Regime

Militar fazia para desarticular os partidos de sustentação do governo deposto, o PSD e o PTB.

A posse de José Sarney no Palácio dos Leões, com um discurso moralizador e

cheio de promessas salvacionistas, significou, para Costa (2002, p. 15):

[...] a incorporação do Maranhão ao projeto autoritário, excludente e repressor do

regime militar, ao seu projeto de modernização conservadora. Significou ainda uma

maior abertura ao processo de expansão do capitalismo monopolista na Amazônia, o

qual aprofundou as desigualdades sociais, acelerou o processo de concentração

fundiária, assim como a violência, a grilagem e a expulsão dos trabalhadores de suas

terras, aumentando os conflitos no campo em toda região. Por outro lado, o governo

Sarney (1966/1970) anunciava um Maranhão Novo, uma nova época de

prosperidade e modernização.

A cultura política em que a oligarquia Sarney está inserida se expressa por meio

de práticas simbólicas, como a constante repetição de palavras-chave como “progresso”,

“desenvolvimento”, “modernidade”, constitutivas da retórica de que foi ela que fundou um

“novo” Maranhão, mesmo que estes símbolos de modernidade não atinjam todos os quadros

sociais, e o Estado ainda desponte no ranking dos piores indicadores sociais do país.

Nesta perspectiva, concorda-se com Hunt (2007, p. 78) quando diz:

O exercício do poder sempre requer práticas simbólicas. Não há governo sem rituais

ou sem símbolos, por mais que possa parecer isento de mística ou mágica. Não é

possível governar sem histórias, sinais e símbolos que, de inúmeros modos tácitos

transmitem e reafirmam a legitimidade de governar.

A simbologia construída em torno de José Sarney, como político sagaz, capaz de

transitar em todos os governos na esfera federal, fundador do “Maranhão Novo”, é divulgada,

de certo modo, como uma qualidade, uma virtude transmitida à sua herdeira política, como

continuadora dessa saga de “modernidade”, que dura quase meio século na base da retórica

propagandística, divulgada pelo sistema de comunicação pertencente ao grupo. Eis um

exemplo, veiculado no jornal O Estado do Maranhão, na matéria de capa que tem o seguinte

título: “Roseana afirma: quero administrar o Maranhão que ajudei a desenvolver’”.

Depois de ressaltar os grandes projetos econômicos: Refinaria Premium da

Petrobrás; fabrica da Suzano Celulose; siderurgia em Açailândia e a Usina do

Estreito: ‘O MA voltou a crescer, voltou a se desenvolver e há muitos investimentos

vindo para nosso estado. E agora, com a descoberta da reserva de gás natural,

literalmente o Maranhão bombou. Quero continuar sendo governadora para

assegurar que esses investimentos que estão chegando sejam usados para combater a

pobreza, para melhorar a vida das pessoas e dos municípios (ROSEANA..., 20 ago.

2010, p. 3).

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A retórica do desenvolvimento é praticamente a mesma do candidato José Sarney,

na disputa pelo governo estadual, em 1965, prometendo a redenção do Maranhão através das

riquezas naturais do Estado. Veja-se a semelhança dos discursos:

O Maranhão começa a divisar o seu grande futuro e devemos estar preparados para

esta tarefa: essa a convocação, que na qualidade de candidato lancei como tônica de

minha campanha. E não o fiz por outro motivo senão o conhecimento da imensa

riqueza potencial do nosso solo e subsolo e pela confiança na inteligência e

capacidade empreendedora de nossa gente. A nota oficial da Petrobrás distribuída ao

Brasil inteiro, dando conhecimento da ocorrência de petróleo na perfuração de São

João, município de Primeira Cruz em nosso Estado, confirmando a existência da

Bacia de Barreirinhas, a maior bacia petrolífera da América do Sul, não poderia

passar em silêncio de minha parte. Devo como candidato, a governador, com a

bandeira de construir um Estado mais limpo, com justiça social saudar a nova era do

Maranhão que vem chegando: O Maranhão de costumes políticos saneados, o

Maranhão da Boa Esperança e do petróleo que está jorrando no poço pioneiro de

São João. Com mais vibrante entusiasmo, quero congratular-me com os

maranhenses e com o Governo Federal e especialmente com meu órgão de trabalho

– a Petróbras – pelo histórico comunicado, que nos deu a inquestionável notícia da

grande riqueza. Vamos, pois, meus conterrâneos, a 3 de outubro, romper também,

com as amarras do velho Maranhão dos atrasados (sic) o novo Maranhão, o grande

Maranhão, o Maranhão do futuro que está aflorando no petróleo da bacia de

Barreirinhas e na barragem da Boa Esperança. (Telegrama do candidato José Sarney

publicado no Jornal do Dia. 17 ago.1965. p.1 apud PACHÊCO FILHO, 2001, p. 45-

46).

Há décadas o grupo Sarney vive prometendo a redenção do Maranhão através dos

projetos econômicos do governo federal do momento. Foi assim com os grandes projetos da

ditadura militar nos decênios de 1960 e 1970, com o neoliberalismo na fase de Fernando

Henrique Cardoso, na década de 1990, e na atual gestão do governo petista em que o discurso

da hora é a inclusão social e o combate à pobreza.

Esse tipo de dominação política caracteriza-se, como lembra Reis (2007), pelas

crises intraoligárquicas, havendo fragmentação do grupo com o surgimento de novos nomes

na disputa pelo controle da máquina pública. Aceitando essa perspectiva, diz um analista:

O personalismo sarneísta tem relações diretas e indiretas com todos os nomes [...]

[dos que o sucederam no governo do Maranhão], vejamos: Pedro Neiva de Santana,

indicado governador pelo general Médici, foi secretário de fazenda do governo

Sarney; Osvaldo da Costa Nunes Freire, indicado pelo general Geisel, como

candidato consenso para acabar com a disputa entre Sarney e Vitorino, posiciona-se

contra o grupo de José Sarney desde o início; João Castelo Ribeiro Gonçalves,

indicado pelos militares com apoio de Sarney, rompe com o sarneísmo depois do

mandato; Luís Alves Coelho Rocha, eleito com apoio de José Sarney, sua família

rompe com o grupo depois do mandato; Epitácio Afonso Pereira Cafeteira,

adversário regional em alguns momentos (1994 e 1998), hoje aliado político; Edison

Lobão, apresenta-se como aliado incondicional do grupo Sarney; Roseana Sarney

Murad, filha biológica e herdeira política; José Reinaldo Tavares, vice-governador

em dois mandatos de Roseana Sarney Murad, aliado do grupo Sarney até o

rompimento político em 2003 quando se aproxima da oposição ao grupo dominante;

Jackson Kepler Lago, apesar de representar oposição ao sarneísmo, foi apoiado por

Roseana Sarney Murad na eleição municipal de São Luís no ano de 2000; Roseana

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Sarney Murad, assume o governo após a cassação do governador Jackson Lago pelo

Supremo Tribunal Federal em 2009 por abuso de poder político, em 2010 Roseana é

eleita em primeiro turno com grande apoio do governo federal (COUTO, 2009, p.

122-124).

Como se vê, a estrutura de dominação oligárquica segue seu curso sofrendo

algumas mudanças a partir de conflitos internos, frutos de desavenças entre seus membros,

como a que provocou a ruptura do antigo aliado do grupo Sarney, o ex-governador José

Reinaldo Tavares, a ser tratada no próximo capítulo.

Nesse contexto, pode-se dizer que a vitória do médico Jackson Lago na eleição de

2006, reeditando a “frente de libertação” do Maranhão, “foi antes fruto do racha provocado no

grupo situacionista [...] que uma alternativa criada contra os esquemas tradicionais da política

oligárquica” (REIS, 2012, p. 76). Mesmo que tenha utilizado elementos da tradição liberal-

democrática, como eleições livres, instituições livres, e tenha buscado o ideal de resistência da

“Ilha Rebelde”, o discurso da libertação serviu para manter o domínio oligárquico no

Maranhão.

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2 ELEIÇÕES EM SÃO LUÍS: uma análise das estatísticas

2.1 O grupo Sarney na última eleição

O domínio político do grupo Sarney tem apresentado uma impressionante

capacidade de adaptação aos novos tempos em que o controle estreito do voto é mais difícil.

Mesmo assim, para o historiador maranhense Costa (1997), a oligarquia Sarney vivencia, a

partir dos anos 90, uma crise de legitimidade política relacionada ao aumento da

competitividade eleitoral, evidenciada pelo fortalecimento da oposição e pelo processo de

organização e luta dos movimentos sociais e populares. É importante ressaltar que a oposição

ao grupo Sarney divide-se em duas vertentes, uma conservadora e outra mais no âmbito

democrático-popular, representada pelos partidos de centro e de esquerda. Tais partidos não

possuem firmeza ideológica, pois se coligam com o grupo oligárquico dependendo das

circunstâncias do momento.

Para comprovar a hipótese da perda de hegemonia eleitoral do grupo Sarney no

Maranhão desde a década de 1990, vejamos o resultado das eleições a partir do processo de

abertura democrática até o ano de 2010.

Gráfico 1 – Votação para Governador do Maranhão de 1982 a 2010 (% dos candidatos mais

votados por partidos)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

As duas primeiras eleições são ganhas com facilidade, Luís Rocha (77% dos

votos) e Epitácio Cafeteira (81% dos votos), garantem ao grupo Sarney uma hegemonia

eleitoral no Estado nos anos 1980. Quanto à aliança entre Sarney e Cafeteira, na eleição

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majoritária de 1986, o acordo fazia parte da articulação da Aliança Democrática (a coligação

que unificou o PMDB, partido do qual Cafeteira era membro, com os dissidentes do PDS, do

qual Sarney era representante) para lançar a candidatura de Tancredo Neves à Presidência do

Brasil em 1985.

O pacto entre a Frente Liberal (antigos dissidentes do PDS) e o PMDB para

chegar à presidência da República foi bem sucedido. Foram eleitos Tancredo Neves e José

Sarney para presidente e vice-presidente da República, respectivamente. Com a morte de

Tancredo Neves, José Sarney assume como presidente do Brasil.

Em 1990, com a saída de José Sarney da Presidência da República com altos

índices de rejeição entre o eleitorado, seus opositores políticos no Estado começam a

dificultar a chegada de seu grupo ao Palácio dos Leões, sede do governo estadual. O então

candidato da oposição conservadora, João Castelo, antigo aliado do grupo Sarney, mesmo

perdendo a eleição estadual para Edison Lobão, no segundo turno, obteve vitória em São Luís

tanto no primeiro turno (42,6%) quanto no segundo turno (55,7%), demonstrando o índice de

rejeição da capital à oligarquia Sarney.

Mesmo dispondo da utilização patrimonialista da “máquina” pública estadual,

com controle sobre os Poderes Executivo (via governadores), Legislativo (maioria dos

parlamentares) e Judiciário (indicação política de juízes) e com o Sistema Mirante de

Comunicação (que detém a hegemonia da informação na maioria dos municípios

maranhenses), o grupo Sarney não ganhou a eleição de 1994 com “tranquilidade”. A

popularidade de Epitácio Cafeteira levou a decisão para o segundo turno, dando uma pequena

margem de vantagem para a candidata da oligarquia Sarney. Epitácio Cafeteira, embora não

tenha ganho a eleição estadual de 1994, teve um alto índice de preferência do eleitorado de

São Luís, comprovado no gráfico a seguir.

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Gráfico 2 – Votação de Epitácio Cafeteira em São Luís de 1986 a 2006 (em % por cargo

eletivo)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

Já a reeleição de Roseana Sarney Murad, em 1998, não ofereceu dificuldades para

a oligarquia, a qual, tendo o aparato da máquina pública e o apoio do governo de Fernando

Henrique Cardoso, venceu com folga Epitácio Cafeteira, fazendo uso da publicização da

saúde frágil da governadora ao fabricar a imagem da “mulher guerreira”, que enfrenta com

coragem e confiança as dificuldades e os desafios da vida, imagem analisada por Gonçalves

(2008). Essa eleição foi marcada por uma prática muito comum na cultura política

oligárquica, a cooptação de setores historicamente identificados com a esquerda para apoiar a

candidatura de Roseana Sarney, no caso, o PC do B (Partido Comunista do Brasil) e o PSB

(Partido Social Brasileiro), indicando a falta de firmeza ideológica dos partidos políticos.

A popularidade alavancada pela governadora Roseana Sarney quebra, pela

primeira vez, a resistência da “Ilha Rebelde” ao seu grupo político, sendo a mais votada em

São Luís para o governo do Estado, mesmo que não tenha alcançado os 50% dos votos, como

mostra o gráfico abaixo.

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Gráfico 3 – Votação para Governador em São Luís de 1982 a 2010 (candidatos mais votados

/ partidos)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

Em 2002, embalada pela imagem positiva de Roseana Sarney Murad, a oligarquia

sonhou em aterrissar novamente no Palácio do Planalto com a pré-candidatura da então

governadora à Presidência da República pelo PFL. O projeto foi abortado pelos escândalos

advindos do caso Lunus, operação da Polícia Federal que invadiu a empresa Lunus de

propriedade da governadora e de seu cônjuge Jorge Murad, na qual foram apreendidos R$

1,34 milhão de reais e documentos que ligavam a empresa do casal ao desvio de verbas da

Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). Esse episódio causou a

desistência da pré-candidatura à Presidência de Roseana Sarney Murad, que precisou se

conformar com uma vaga no Senado Federal. Naquele ano, o governo do Estado foi assumido

por mais um filho político da oligarquia Sarney, José Reinaldo Tavares.

Como já mencionado, as crises intra-oligárquicas constituem-se uma característica

desse tipo de dominação política. Repetiram-se mais uma vez com a dissidência do

governador José Reinaldo Tavares. Uma das explicações para essa ruptura aponta o

desentendimento dentro do próprio grupo acerca da indicação do nome para a sucessão

estadual de 2006. José Reinaldo Tavares não teria concordado com a indicação do nome da

então senadora Roseana Sarney Murad, preferindo o nome de Sarney Filho ou Edison Lobão,

dentre outros integrantes do grupo. De acordo com Costa (2009c, p. 97),

[...] pode-se afirmar que José Reinaldo Tavares não podia, não sabia e nem queria

romper com a estrutura de poder existente no Maranhão, pois forjado como um

quadro técnico do grupo Sarney desde os anos 1960 e educado na cultura política

patrimonialista, seu horizonte era limitado, se mantendo preso a uma reestruturação

do poder político.

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Desse modo, a derrota de Roseana Sarney Murad para Jackson Kepler Lago, em

2006, não representou o fim do mando oligárquico no Maranhão, uma vez que a lógica

patrimonialista foi um dos elementos constitutivos daquele pleito eleitoral. Tratou-se, ainda

segundo Costa (2009c), de um processo de reestruturação do domínio oligárquico de poder,

formado por outro grupo político, comandado pelo PDT e PSDB, que aglutinou o

descontentamento das oposições ao grupo dominante e dos vários movimentos sociais

marginalizados pelas décadas de hegemonia do grupo Sarney. Repetiu-se o mesmo

estratagema utilizado em 1965 para eleger José Sarney governador do Estado. A história se

repetiu, mesmo sendo como farsa (MARX, 2008). A reinvenção das oposições coligadas

alimentou mais uma vez o discurso da “cultura política da libertação”, através da reunião de

diversos partidos políticos (PDT/PSDB/PT/PSB/PCdoB) no segundo turno, fazendo uso de

relações patrimonialistas e clientelistas com as prefeituras municipais, por meio de assinatura

de inúmeros convênios com caráter eleitoreiro, que garantiram a vitória do candidato da

oposição, mas isso não foi suficiente para por fim à estrutura oligárquica. Assim, concorda-se

com Reis (2012), para quem Jackson Lago foi eleito por dentro da estrutura oligárquica e dela

fez uso para repetir o mesmo padrão de dominação tradicional: utilização da máquina

governamental, nepotismo, distribuição de cargos entre aliados, corrupção, insensibilidade

diante de reivindicações trabalhistas. Possivelmente tudo isso provocou o desencanto do

eleitorado em relação a sua candidatura nas eleições de 2010.

O grupo Sarney não aceitou a derrota nas urnas e acusou o governador Jackson

Lago de ter cometido abuso de poder político e econômico durante a campanha eleitoral de

2006. Usando suas relações na esfera do poder federal, conseguiu agilizar a votação no

Tribunal Superior Eleitoral e cassou o mandato do opositor.

No entanto, o uso e abuso da máquina governamental por aqueles que estão no

poder é prática política corriqueira no estado do Maranhão, em tempos de campanha eleitoral.

O fato de Jackson Lago ter se beneficiado dos convênios realizados pelo governador José

Reinaldo Tavares, com as prefeituras, não é uma exceção, mas a regra, tratando-se dos

candidatos que são apoiados por quem está à frente do governo. Nas eleições de 2010, a

candidata situacionista também foi acusada de ter recorrido aos mesmos mecanismos de

abuso de poder político e econômico, favorecida pelo poderio político que seu grupo

desfrutava nas esferas de poder estadual e nacional.

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2.2 O comportamento da “Ilha Rebelde” nas eleições

Em São Luís do Maranhão há uma tradição cultivada de que a cidade não se curva

ao domínio de grupos oligárquicos. O episódio que fundou essa ideia foi a Greve de 1951, o

protesto das Oposições Coligadas contra a posse do governador Eugênio Barros.

De acordo com a análise de Costa (2006, p.96-97),

Vários epítetos foram utilizados no decorrer do processo político para representar a

ilha de São Luís e o próprio movimento das oposições – tais como Ilha Heróica,

Ilha Indomável, Ilha Insubmissa -, contudo, a ideia imagem que prevaleceu até os

nossos dias foi a de Ilha Rebelde, breve instante de cristalização no interior do

magma formador dos imaginários sociais (grifo do autor).

As oposições ao domínio oligárquico, em São Luís, têm instrumentalizado essa

imagem de rebeldia da capital maranhense para alavancar movimentos políticos, buscando

promover algumas mudanças na sociedade. Durante o processo de redemocratização política,

ocorrido no final dos anos de 1970 e começo da década de 1980, vários movimentos com este

objetivo tomaram conta da cidade de São Luís, tais como:

Movimento estudantil e a greve pela meia passagem; o Movimento de Oposição pra

Valer, organizado no seio do MDB autêntico; a atuação de setores progressistas da

Igreja Católica, especialmente a Pastoral da Juventude; Movimento contra a

Carestia; atuação da entidade de apoio Sociedade dos Direitos Humanos e a seção

estadual do Comitê Brasileiro pela Anistia (BORGES, 2008, p. 47).

Desses movimentos, a luta dos estudantes pela meia passagem, cuja culminância

ocorreu com a Greve de 1979, representou um reforço significativo na construção imagética

da Ilha Rebelde. Este episódio contou com o apoio de setores da população, descontentes com

o terceiro aumento do ano na tarifa dos transportes coletivos, sancionado pelo prefeito Mauro

Fecury (BORGES, 2008). O movimento foi tratado com grande repressão e violência por

parte do então governador, João Castelo Ribeiro Gonçalves (PDS- Partido Democrático

Social), naquela época aliado de José Sarney.

É essa tradição histórica que alimenta a resistência da população de São Luís ao

domínio das oligarquias políticas, sendo que tal resistência depende muito da conjuntura

política do momento, sobretudo no que diz respeito às eleições majoritárias. Quanto às

eleições municipais, nenhum candidato apoiado pelo grupo Sarney foi eleito na capital, como

pode-se comprovar no gráfico abaixo.

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Gráfico 4 – Votação para Prefeito de São Luís de 1985 a 2012 (% dos candidatos mais

votados por partidos)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

Na primeira eleição direta para prefeitos das capitais, em 1985, Luís Rocha era o

governador do Estado e José Sarney presidente da República, nem assim o grupo conseguiu

eleger seu candidato, Jaime Santana. Quem ganhou a eleição foi Gardênia Ribeiro Gonçalves,

esposa de João Castelo, que já havia rompido com o grupo Sarney.

Gráfico 5 – Votação de Jackson Lago em São Luís de 1985 a 2010 (em % por cargo eletivo)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

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O cenário das eleições municipais foi, durante décadas, campo de disputa de

grupos de oposição à oligarquia Sarney, liderados por João Castelo e Jackson Lago, este,

eleito três vezes prefeito da capital como mostra o gráfico acima.

Considerado uma importante liderança política das oposições democráticas na

capital, o político Jackson Lago teve uma impressionante queda nas intenções de voto do pela

segunda vez uma vantagem nesse eleitorado, de modo que podemos afirmar que o caráter de

“rebeldia” da Ilha depende das circunstâncias conjunturais. Veja-se, agora, a votação de

Roseana Sarney em São Luís durante sua carreira política.

Gráfico 6 – Votação de Roseana Sarney em São Luís de 1994 a 2010 (em % por cargo

eletivo).

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

Contando com toda estrutura do domínio oligárquico, Roseana Sarney foi eleita

deputada federal mais votada no Maranhão, em 1990, sendo a terceira colocada na capital. No

seu primeiro mandato, como governadora do Estado, a cultura popular foi utilizada como

forte marketing político visando à renovação da imagem de seu grupo. Em 1996, há uma

priorização de ações do governo nessa área. A partir de 1997, a Secretária de Cultura do

Estado passa a contar com verbas regulares para os festejos juninos (NOGUEIRA, 2005).

No ano da eleição da reeleição da governadora Roseana Sarney, 1998, o Estado

passa a ser o patrocinador oficial dos festejos juninos, de modo, que se pode afirmar:

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A institucionalização da cultura popular neutraliza a crítica e dá vazão ao espetáculo

voltado para o show e o prazer das massas, elevando a destaque a governadora e as

manifestações folclóricas e seus atores, numa sequência de produção de

acontecimentos que se sucedem com o pré-São João, os festejos Juninos, o Natal e o

Carnaval (NOGUEIRA, 2005, p. 10)

Com o manejo da cultura popular e de outras atividades artísticas, através da

liberação de verbas públicas, o grupo político dominante consegue obter certo grau de

aceitação na capital. Mesmo cultivando o imaginário social da “Ilha Rebelde”, São Luís tem

seus momentos de conservadorismo nas eleições, pois a capital não escapa das práticas da

cultura política oligárquica. Pode-se supor que haja um continuum entre uma cultura política

liberal democrática, inspirada nos ideais de liberdade, igualdade e participação popular e, por

outro lado, haja uma prática política em que predominam o empreguismo, o favoritismo, o

personalismo, típicos da cultura política oligárquica.

Como exemplo desse conservadorismo político pode-se, fazer referência também

aos índices de popularidade do político João Castelo, que mesmo tendo sua carreira iniciada

sob os auspícios da Ditadura Militar, tendo sido, inclusive, o governador a autorizar a violenta

repressão aos manifestantes na histórica luta pelo direito à meia passagem, em 1979, teve a

preferência de parte do eleitorado da cidade nas eleições em que disputou. Veja-se seu

desempenho eleitoral.

Gráfico 7 – Votação de João Castelo em São Luís de 1982 a 2012 (em % por cargo eletivo)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

As imagens sobre a cidade vão sendo construídas e reconstruídas constantemente,

pode-se perceber que há uma São Luís progressista e outra conservadora. Nas eleições para o

Senado, por exemplo, a partir dos anos de 1990, a cidade tende a votar nos representantes das

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oposições, seja a oposição conservadora (representada por João Castelo e Epitácio Cafeteira),

seja a oposição à esquerda (Haroldo Sabóia e Bira do Pindaré), com exceção do último pleito,

em que foram mais votados os candidatos ligados à oligarquia Sarney (Edison Lobão e João

Alberto), como mostra o gráfico seguinte.

Gráfico 8 – Votação para Senador em São Luís de 1982 a 2010 (% dos candidatos mais

votados por partidos)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

Nos tempos recentes, no âmbito da oposição à esquerda, surge no cenário político

maranhense uma nova liderança, o ex-juiz federal Flávio Dino de Castro e Costa, que

concorreu a uma vaga na Câmara Federal com apoio do ex-governador José Reinaldo Tavares

e outras lideranças conservadoras do Estado. A campanha desse político apresentou diferentes

estratégias de representação em 2006. Veja-se.

A primeira diz respeito a um tipo de apresentação do candidato que traz benefícios

para uma determinada ‘região’ e assim estabelece o vínculo de identidade com os

eleitores e a comunidade [...] Uma segunda modalidade se referiu à campanha

voltada para a identidade profissional, no caso, o mundo do direito. Aqui a

campanha de Flávio Dino é endereçada aos eleitores da ‘comunidade jurídica

maranhense’. A terceira modalidade de campanha se relacionou ao chamado ‘voto

ideológico’, caracterizado como ‘voto de opinião’, originário da ‘classe média’ dos

centros urbanos do Estado, principalmente de São Luís (BARROS FILHO, 2008,

p. 189).

A imagem política de Flávio Dino transita tanto entre aspectos da cultura política

oligárquica, quanto da cultura política liberal democrática. Sua base eleitoral, construída na

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cidade de Caxias, com apoio do político Humberto Coutinho, o aproxima das práticas

tradicionais da política maranhense, a exemplo da mediação entre os poderes locais e a esfera

federal de governo, base da sustentação oligárquica. Em se tratando do eleitorado de São Luís,

a imagem desse político é associada ao campo jurídico e ao voto consciente, livre das amarras

da política clientelística e associado à ideia de justiça social. Veja-se o desempenho eleitoral

de Flávio Dino nas campanhas eleitorais que disputou.

Gráfico 9 – Votação de Flávio Dino em São Luís em 2006 e 2010 (em % por cargo eletivo)

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

Na eleição de 2006, Flávio Dino foi o quarto candidato mais votado em todo

Maranhão. Durante seu mandato foi eleito, pelo site Congresso em Foco, um dos melhores

parlamentares do país, por quatro anos consecutivos. A boa avaliação de sua atuação na

Câmara Federal o habilitou a disputar a prefeitura de São Luís, em 2008, perdendo a disputa

no segundo turno para o político João Castelo. Em 2010, na reta final da campanha para o

governo do Estado, obteve um bom desempenho nas intenções de voto, alcançando o segundo

lugar na disputa eleitoral.

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2.3 Abstenção no Maranhão

O não comparecimento do eleitor ao processo eleitoral é um fenômeno mundial.

Nos regimes democráticos, a média gira em torno de 20% (PASQUINO, 2010). No estado do

Maranhão a abstenção do eleitorado é bem elevada, ultrapassando tanto a escala mundial

quanto a nacional, como demonstra o gráfico abaixo.

Gráfico 10 – Abstenção eleitoral no Brasil e no Maranhão (1994-2010)

Fonte: TSE, 2010.

O conceito de eleitor no Brasil é uma construção jurídico-política, que estabelece

requisitos a serem preenchidos para que se possa participar do processo de escolha de

representantes políticos. O “eleitor potencial” é aquele que deve se alistar, maior de 18 anos e

alfabetizado, e o que pode alistar-se, os jovens entre 16 a 17, os maiores de 70 anos e os

analfabetos (BARRETO, 2008).

Acerca dos eleitores, que estando aptos à participação não se fazem presentes no

pleito, é possível levantar-se algumas explicações, nenhuma delas conclusivas, pois são

apenas conjecturas na busca de compreender o fenômeno da ausência deliberada dos votantes.

Pode-se apontar a questão da vulnerabilidade social do eleitorado como um dos

motivos para a ausência nos dias de pleito. A falta de recursos também dificulta a participação

na vida pública. A baixa escolaridade é outro importante motivo dessa marginalização, uma

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vez que os índices de analfabetismo são bastante elevados em todo o Estado, segundo os

dados apresentados a seguir.

Tabela 1 – Taxas de analfabetismo etária e cor no Estado do Maranhão – 2009.

Faixa etária e cor Porcentagem

15 anos ou mais de idade – cor branca 15,5%

15 anos ou de mais idade – cor preta 20,1%

15 anos ou de mais idade – cor parda 20,0%

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional de Saúde Escolar, 2009.

Em São Luís, o índice de pessoas que não sabem ler e escrever é relevante, o que

contradiz o mito da Atenas Brasileira, construído no século XIX, em referência à produção

cultural da elite escravocrata, mito cultivado ainda hoje. Veja-se o que informa a esse respeito

o censo de 2010 os dados abaixo.

Tabela 2 – Número de pessoas que não sabem ler e escrever em São Luís – 2010.

Faixa etária Total Porcentagem

Grupos de idade de 15 anos ou mais 36.158 4,7%

Grupos de idade de 15 a 24 anos 2.776 1,3%

Grupos de idade de 25 a 39 anos 7.257 2.6%

Grupos de idade de 40 a 59 anos 12.652 6,1%

Grupos de idade de 60 anos ou mais 13.473 17,3%

Fonte: IBGE, Censo Demográfico, 2010.

Ainda em se tratando de vulnerabilidade social, o baixo nível de renda da

população pode atuar como fator desestimulador da participação política, uma vez que os

indivíduos sentem-se marginalizados da vida pública em geral. Na capital do estado do

Maranhão, é crescente o número de famílias nessa situação e, por isso, são dependentes de

programas sociais, como o Programa Bolsa Família, do Governo Federal. Em 2010, a

transferência de renda atingiu um total de 79.929 famílias, sendo o repasse acumulado até o

mês de dezembro no valor de R$ 92.599.854, 00, segundo as informações do Ministério de

Desenvolvimento Social (2012).

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Outra variável para explicar o abstencionismo na eleição de 2010 pode ser

associada à falta de mobilização e motivação do eleitorado, uma vez que a participação varia

em função do momento de cada conjuntura política (BARRETO, 2008). Em 2006, por

exemplo, como o grupo Sarney pela primeira vez não contava com a estrutura da máquina

pública a seu favor, possibilitando, assim, que o candidato que lhe fazia oposição se

articulasse com o apoio do governador em exercício, a abstenção diminui, ficando em 20,8%

no primeiro turno e 24,2% no segundo turno, próximo da média mundial.

Não há, portanto, um padrão único para análise do fenômeno da abstenção

eleitoral nos regimes democráticos. Entre os americanos, os percentuais de participação são

mais elevados nas eleições presidenciais. Na França, a participação do eleitor é mais relevante

nas decisões de segundo turno, quando o nível de competitividade aumenta (PASQUINO,

2010). No Maranhão e em todo o Brasil, a participação do eleitor diminui no segundo turno

das eleições majoritárias. Na última eleição municipal, realizada em 2012, constatou-se que o

alto índice de abstenção tem relação com a falta de atualização dos cadastros eleitorais, já que

acumulam nomes de eleitores falecidos e\ou transferidos de domicílio eleitoral sem que a

Justiça Eleitoral seja informada. Em São Luís, por exemplo, novos cadastros não eram

realizados desde 1986 (ARRUDA, 2012).

Porém, uma coisa é certa, o abstencionismo representa o desencanto com a

política tradicional, sobretudo no Maranhão (campeão nacional de abstenção eleitoral), onde a

estrutura de dominação oligárquica se petrificou ao longo dos tempos, de modo que este

fenômeno pode provocar a deslegitimação dos governantes, da classe política e até do sistema

democrático, pois, se democracia significa, entre outras coisas, a participação dos cidadãos,

uma participação insuficiente debilita-a (PASQUINO, 2010).

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3 A ELEIÇÃO ESTADUAL DE 2010: os principais candidatos na imprensa escrita

Ao escrever sobre a construção da imagem do rei francês Luís XIV, Burke (1994)

analisou as tentativas de moldar ou manipular a opinião pública com o uso da propaganda (em

pleno século XVII), para exaltar os rituais que cercam o poder real (através da pintura,

escultura, teatro, música), além de outras técnicas de persuasão para legitimar o poder

absoluto do rei. Atualmente, são até mais refinadas as estratégias utilizadas para fabricar

imagens e manipular informações. Ao usar o termo “fabricação”, Burke (1994, p. 22) não quis

dizer que a imagem desse rei francês tenha parecido artificial em relação a dos outros

monarcas. Como afirma o autor, “[...] todos nós construímos a nós mesmos. Luís só foi

excepcional no auxílio que recebeu nesse trabalho de construção”.

3.1 A retórica da campanha política

Nos dias de hoje, conta-se com sofisticadas e eficientes formas de fabricação de

imagens, que manipulam elementos do imaginário social, contribuindo para preservar certas

práticas políticas tradicionais na sociedade brasileira. No Maranhão, a família Sarney é dona

do maior sistema de comunicação do Estado. Controla a retransmissora da TV Globo e o

jornal de maior circulação, O Estado do Maranhão. Estima-se que o clã e aliados controlem

cerca de 150 jornais e emissoras de rádio e tevê, que cobrem mais de 80% do território

maranhense (LÍRIO, 2005, p. 31). O suporte tecnológico disponível lhe facilita uma eficiente

divulgação de valores e crenças. As informações passadas de forma contínua, diversas vezes

por dia, são um instrumento eficiente para a fabricação da imagem dos políticos ligados a essa

hegemonia midiática, que constrói verdades e naturaliza relações de dominação e

expropriação, como se poderá ver mais adiante, neste capítulo.

Analisa-se, portanto, as matérias de O Estado do Maranhão e do Jornal Pequeno

como idealizadoras e divulgadoras de imagens concernentes aos principais candidatos do

pleito eleitoral de 2010. A escolha da mídia impressa como objeto de estudo deve-se ao

entendimento de que a imprensa pode ser um

instrumento de manipulação de interesses e de intervenção na vida social; nega-se,

pois, aqui, aquelas perspectivas que a tomam como mero ‘veículo de informações’,

transmissor imparcial e neutro dos acontecimentos, nível isolado da realidade

político-social na qual se insere (CAPELATO; PRADO apud LUCA, 2012, p.118).

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Parte-se da concepção de que, nos meios de comunicação, constrói-se carismas,

competências e eficiência, os quais, para o senso comum são inerentes e incontestáveis a uma

determinada personagem. Ter o controle desses meios de comunicação resulta na

possibilidade de direção, de comando da sociedade por um determinado grupo, que faz uso da

mídia para impor regras, padronizar hábitos e constituir normas. Há até quem afirme que “[...]

os meios de comunicação se transformaram em novos órgãos de poder, em órgãos político-

partidários, e é por isso que eles precisam recriar a realidade na qual exercem esse poder, e

para recriar a realidade precisam manipular as informações” (ABRANO apud COUTO, 2009,

p. 26).

Porém, a ideia de “coisa” fabricada, artificial, corre o risco de ser desafiada,

desacreditada. É nesse aspecto que se acredita que os imaginários estabelecidos possam ser

questionados, desmantelados e reconstruídos, já que não são estruturas petrificadas e

congeladas no tempo e no espaço. Os poderes constituídos estão sempre sendo questionados,

e é exatamente em épocas de crise que se intensifica a produção de imaginários sociais

concorrentes e antagonistas, é nessa ocasião que as “[...] representações de uma nova

legitimidade e de um futuro diferente proliferam e ganham difusão e agressividade”

(BACZKO, 1985, p. 15).

Na disputa eleitoral travada no Maranhão em 2010, cabe ao jornal O Estado do

Maranhão a fabricação da legitimidade da candidatura da governadora Roseana Sarney

Murad, (re) construindo e manipulando o imaginário político em torno do grupo Sarney. Esse

periódico, pertencente à família da governadora, possui “liderança incontestável” e o maior

número de leitores dentre todos os jornais com circulação diária na grande São Luís, e foi um

dos precursores no uso da cor em todo Norte e Nordeste, “o que aumentou o volume de

vendas avulsas do jornal”, segundo consta em sua página na internet, onde é apresentado

como “um órgão a serviço da verdade” (HISTÓRICO, 2012).

O Jornal Pequeno, por sua vez, apresenta-se na internet como um periódico “de

tamanho restrito e feição gráfica modestíssima”, defensor da “liberdade, dos anseios e da

vontade popular” (HISTÓRIA, 2012). Na condição de jornal oposicionista, busca desconstruir

o discurso do periódico situacionista e apoia as candidaturas de Jackson Lago e Flávio Dino.

O jornal O Estado do Maranhão já inicia o ano de 2010 em ritmo de campanha

pela reeleição da governadora Roseana Sarney Murad, estampando em suas páginas os

empreendimentos financiados pelo governo federal para o Maranhão e as promessas de

redenção para os graves problemas sociais do Estado, que se arrastariam desde o começo do

século XX. A fotografia a seguir, por exemplo, é matéria de capa da edição de sexta feira, 15

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de janeiro de 2010, noticiando o início da realização da terraplanagem para a construção da

obra da refinaria da Petrobrás, assunto que tem grande destaque nas páginas internas, nas

sessões de política e economia. Dessa forma, o jornal fazia campanha pela eleição da

candidata do presidente Lula à presidência da República e pela reeleição da governadora

Roseana. É importante lembrar que se está ainda em janeiro de 2010 e a data oficial para o

início da campanha eleitoral é o dia 5 de junho desse ano. As presenças do presidente Lula e

da ministra da Casa Civil e candidata ao Palácio do Planalto, Dilma Roussef, reforçam o

prestígio da governadora junto ao governo federal. A afirmação de que a refinaria faria uma

“revolução” no Maranhão, gerando 150 mil empregos diretos e indiretos, consolida a visão de

ser o grupo Sarney capaz de trazer o “desenvolvimento” e o “progresso” para o Maranhão.

Figura 1 - O progresso e a revolução do Maranhão

Fonte: INICIADA..., 15 jan. 2010.

A imagem do trator simbolizando o progresso trazido pelas obras financiadas pelo

governo federal é recorrente na trajetória da oligarquia Sarney. A disposição das personagens

para fazer a foto não é à toa. Reflete a intenção de mostrar ao público leitor que há uma

intrínseca relação entre o governo federal e a mandatária local, que essa relação será mantida

com a reeleição da governadora Roseana Sarney e a eleição da candidata do Presidente Lula,

que aparece entre a governadora e o ministro Edison Lobão, aliado fiel da oligarquia Sarney.

A matéria de capa do Jornal Pequeno (Figura 2) publicado numa edição de

domingo, acerca do mesmo fato, utiliza a mesma foto, num ângulo panorâmico, mas enfatiza

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o caráter eleitoreiro da visita. O artigo é do jornalista Oswaldo Viviani, que destaca que o

presidente Lula faz a segunda viagem ao Maranhão em pouco mais de um mês, com intuito de

propagar a realização de obras federais para divulgar as candidaturas de Roseana Sarney e

Dilma Rousseff.

Figura 2 - “Viagem caça-votos”

Fonte: VIVIANI, 17 jan. 2010.

Mais uma observação é pertinente na comparação das notícias apresentadas

acima. A qualidade gráfica de O Estado do Maranhão, fruto do lugar social de seus

proprietários, deixa mais atraente o visual das informações que veicula, podendo torná-las

mais convincentes aos olhos do grande público. Já o Jornal Pequeno, dispondo de menores

recursos técnicos e financeiros, não tem uma aparência chamativa e procura compensar com a

força dos ataques o menor apelo visual.

No mês de fevereiro de 2010, este periódico destaca que um dos motivos que

levou à cassação do governador Jackson Lago, no ano anterior, foi a acusação de propaganda

antecipada na ocasião em que o então governador José Reinaldo Tavares anuncia a

candidatura do médico Jackson Lago, no município de Codó, três meses antes do início oficial

da campanha. Vejam-se trechos desse discurso, para relembrar o caso:

O doutor Jackson Lago é um homem lutador, médico. Foi prefeito três vezes em São

Luís é um homem credenciado. Nós temos que acabar com esse negócio de uma

família mandar no Maranhão, gente [...] Nós estamos trazendo essa parceria [...],

com alguns milhões de reais. E digo para vocês que vou fazer ainda muito, mas os

nossos candidatos – ou o Vidigal ou o Jackson – vão continuar e vão fazer ainda

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mais do que eu fiz [...] Vocês vão ter aqui a condição de escolher entre dois homens

do maior gabarito desse Estado. Um é o doutor Jackson Lago [...]. O outro é nosso

amigo de infância Edson Vidigal (TSE..., 1 fev. 2010).

Para o periódico da oposição, em 2010 o presidente Lula apresenta suas

candidatas Dilma Rousseff e Roseana Sarney do mesmo modo que José Reinaldo Tavares

apresentou Jackson Lago em 2006. Ainda sobre a repercussão da vinda do presidente Lula ao

Maranhão para dar início à obra de terraplanagem no município de Bacabeira, visando à

construção da refinaria da Petrobrás, o jornal O Estado do Maranhão (Figura 3), do dia 16 de

janeiro de 2010, destaca que este empreendimento será uma “nova fase da história do

Maranhão”. Nas palavras do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, será uma “segunda

revolução do Maranhão, considerando que a primeira revolução do Maranhão foi há mais de

40 anos, quando José Sarney assumiu o governo do Estado.

Figura 3 - “A nova fase” do Maranhão

Fonte: LULA..., 16 jan. 2010.

Nesta imagem, a candidata à reeleição aparece numa postura de líder carismática,

receptiva, de braços abertos, pronta para receber a todos. Desde o mandato do governador

José Sarney, com o slogan Maranhão Novo, até os primeiros mandatos de sua filha Roseana

Sarney Murad, apresentados como Novo Tempo, o grupo Sarney procura associar suas

administrações com a ideia de que traz “modernização” e “prosperidade” para o Maranhão.

No governo de José Sarney, as bandeiras eram o Porto do Itaqui, a Barragem do Bacanga, a

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Hidrelétrica de Boa Esperança, entre outros. Nas administrações do final dos anos 1970 e nos

anos de 1980, a esperança de progresso era a instalação de grandes projetos, como o Programa

Grande Carajás (com destaque para a ferrovia da Vale do Rio Doce) e a multinacional

ALUMAR. Em 2010, o discurso do progresso e da salvação do Maranhão alardeia a

construção da refinaria Premium, da Petrobrás.

O ex-presidente José Sarney se utiliza de seu jornal para rebater as críticas ao seu

mando político, em particular aquelas que o relacionam aos péssimos indicadores sociais do

Maranhão. Às vésperas das eleições, manifestou-se anunciando a vitória de sua filha. Veja-se.

[...] estamos passando por um novo momento de virada como já aconteceu em outras

épocas, mas com a diferença que desta vez os olhos do desenvolvimento estão

voltados para o Norte e Nordeste. Temos a refinaria, temos a descoberta de recursos

naturais como o gás e o petróleo. Esse é o momento do Maranhão e nada melhor

do que continuar com um governo que está dando certo. E esse governo é o de

Roseana, que em menos de um ano e meio no comando do Estado já trabalhou

com o presidente Lula para trazer o desenvolvimento para o nosso Maranhão.

É por isso que digo que a vitória da governadora é certa’, afirmou o senador

(SARNEY, 28 set. 2010, p. 3, grifou-se).

Analisando a fala do senador José Sarney, pode-se ver que ele busca revestir sua

filha Roseana Sarney Murad com dois importantes princípios de legitimidade – a dominação

tradicional e a dominação carismática –, que se encontram combinados. Dominação

tradicional, porque baseada na crença de uma autoridade pré-existente, autoridade pessoal

pelo status herdado; dominação carismática porque inspirada no heroísmo, no caso aqui

destacado, a façanha da governadora, “[...] que em menos de um ano e meio no comando do

Estado já trabalhou para trazer o desenvolvimento para o Maranhão”.

Segundo Bendix (1996, p. 238), a “[...] liderança carismática é especialmente

requisitada nos períodos de crise, embora, ocorra também nos sistemas de dominação

permanente, produto da crise e do entusiasmo”. Não se pretende com esse conceito weberiano

afirmar que a governadora Roseana Sarney Murad seja portadora de dom, poderes mágicos ou

missão divina, mas destacar como O Estado do Maranhão procura cultivar uma imagem

carismática dela no imaginário social dos leitores, possíveis eleitores.

O jornal exibe sempre aparições da governadora visitando municípios,

inaugurando obras públicas em grandes festividades e, sobretudo, confirmando o apoio do

presidente Lula à sua gestão. E destaca falas em que ela anuncia que seu “[...] governo

trabalha para garantir mais qualidade de vida com obras de saúde, infraestrutura, educação,

trabalho e renda para a população” (ROSEANA..., 6 maio 2010, p. 3).

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As visitas constantes aos municípios são uma estratégia adotada por ela em seus

dois mandatos anteriores (1995 - 1998; 1999 - 2002). Segundo Gonçalves (2008, p. 144), o

governo itinerante é “[...] uma possibilidade no jogo político para congregar forças políticas

nos municípios do Estado e arregimentar mão de obra específica para esse trabalho, através do

apoio explícito dos prefeitos e políticos aliados dos municípios do Maranhão”.

Dessa maneira, o grupo Sarney se utiliza de um “clientelismo moderno”, exercido

por políticos profissionais, o qual, à semelhança de práticas clientelistas tradicionais, tem

como resultado não uma forma de consenso institucionalizado, mas uma rede de fidelidades

pessoais entre os políticos que lhes possibilita dispor dos recursos estatais

(MASTROPAOLO, 2010).

Numa edição de O Estado do Maranhão, antes do período permitido para a

campanha eleitoral desse ano, o jornal noticiava que

[...] nesse governo itinerante Roseana vai costurando apoio político dos prefeitos à

sua reeleição [...] durante uma semana, ela visitou obras nos municípios com

recursos estaduais e ouviu das lideranças locais novas reivindicações que serão

analisadas pelo governo federal [...] (ROSEANA..., 8 maio 2010).

Ao passar pelo município de Barra do Corda, Rigo Teles, deputado pelo PV

(Partido Verde) e aliado da governadora faz a seguinte declaração: “Quando eu estou aliado,

estou mesmo. Não há um prefeito que me apoie e que não apoie a governadora. Todos foram

confirmar a aliança com Roseana” (ROSEANA.., 8 maio 2010, p. 3). A fala do parlamentar

caracteriza perfeitamente a relação clientelística estabelecida entre ele e os prefeitos de sua

região em relação ao “apoio” ao governo estadual. Com discursos desse tipo, o jornal quer

convencer seus leitores de que a liderança da governadora é inconteste a ponto de obter apoio

de quase todos os municípios do estado, ou seja, que é legítima sua dominação, seu lugar no

poder. Tais procedimentos, como diz Charaudeau (2008, p. 63), comprovam que

[...] o discurso midiático encontra-se entre um enfoque de cooptação, que o leva a

dramatizar a narrativa dos acontecimentos para ganhar a fidelidade de seu público, e

um enfoque de credibilidade, que o leva a capturar o que está escondido sob as

declarações dos políticos para justificar seu lugar na construção da opinião pública.

O Estado do Maranhão visa promover, em curto prazo, a crença na popularidade

de sua candidata. Muitos de seus argumentos indicam a realização de práticas

patrimonialistas, elemento presente há muito na cultura política do nosso país. No dia 4 de

junho de 2010 é divulgado que “Roseana conquista o apoio de prefeitos de oposição no

Maranhão: PDT, PSDB, PSB e até do PC do B”. Essa notícia procura mostrar que não há

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oposição ao seu governo e à sua reeleição, pois prefeitos dos principais partidos da oposição

estão apoiando a governadora. Logo, sua reeleição é legítima. Para enfatizar o peso dessa

notícia, recorre-se a uma reflexão de Charaudeau (2008, p. 67): “[...] a legitimidade é o

resultado de um reconhecimento, pelos outros, daquilo que dá poder a alguém de fazer ou

dizer em nome de um estatuto (ser reconhecido em função de um cargo institucional), em

nome de um saber, em nome de um saber fazer [...]”.

Sobre o apoio dos prefeitos à candidatura oficial, matérias do Jornal Pequeno

alertam que se trata de “assédio moral”, por meio de convênios firmados entre o governo e as

prefeituras municipais. Um artigo do deputado federal Domingos Dutra (PT) afirma:

[...] é chantagem mesmo. É o preço que Roseana está pagando pela submissão dos

prefeitos. Essa chantagem é uma prática da oligarquia Sarney ao longo de toda

existência [...] Onde está a Justiça Eleitoral, o Ministério Público, que não fazem

nada contra isso? (PARA OPOSIÇÃO..., 27 jun. 2010, p. 3).

Em várias matérias de capa, O Estado do Maranhão anuncia os números das

verbas conseguidas pelo governo estadual junto ao governo federal, demonstrando assim a

capacidade da gestão da governadora em trazer recursos necessários ao crescimento e

desenvolvimento da região. É o governo do “Maranhão - de volta ao trabalho”, slogan da

administração de Roseana Sarney quando assumiu após a cassação de Jackson Lago,

anunciando à população que sua gestão é melhor do que a anterior. Porém, para o Jornal

Pequeno (OPOSIÇÃO..., 19 set. 2010, p. 3), a governadora “[...] promove-se às custas da

máquina do estado, em grave violação ao princípio da impessoalidade, base da administração

pública [...]”. Acusações dessa natureza motivaram a coligação “Muda Maranhão” – formada

pelos partidos PC do B (Partido Comunista do Brasil), PSB (Partido Socialista Brasileiro) e

PPS (Partido Popular Socialista) com Flávio Dino como candidato ao governo – a formular

uma representação junto ao Tribunal Regional Eleitoral contra a candidata Roseana Sarney,

com base em denúncia de abuso de poder político.

Desde o período que antecede a campanha autorizada pela Justiça Eleitoral, o

jornal situacionista procura deslegitimar a candidatura do médico Jackson Lago, ao pleito de

2010, seja destacando a aliança do PDT (Partido Democrático Trabalhista) ao PSDB (Partido

da Social Democracia Brasileiro), atrelando o nome do ex-governador ao do candidato José

Serra, seja explorando a cassação de Jackson Lago pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ou

alardeando o problema de saúde de seu oponente, como demonstra o artigo de Marco Aurélio

D’Eça (7 maio 2010, p. 3):

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O ex-governador disputou as eleições municipais de 1996 e 2000 e as estaduais de

2002 e 2006, sempre sob suspeita de estar doente e sempre negando a informação.

Ele só tocou no assunto, mesmo assim de forma superficial, após deixar o governo

em 2009, cassado pela justiça eleitoral.

O argumento discursivo do periódico faz uso de dois campos de saber para por em

cheque as condições de Jackson Lago em concorrer ao governo do Estado: impedimento

médico, a doença do candidato; impedimento jurídico, a possível impugnação de sua

candidatura por ser considerado candidato “ficha suja” (referência à Lei da Ficha Limpa ou

Lei Complementar nº 135 de 2010, que prevê a inelegibilidade de políticos com histórico de

condenações eleitorais).

Do mesmo modo, o jornal do grupo dominante aposta na desqualificação do

candidato do PC do B, como demonstra o trecho a seguir:

O deputado federal Flávio (PC do B), candidato da coligação ‘Muda Maranhão’ que

tem o PSB do ex-governador José Reinaldo Tavares como aliado político e eleitoral,

sofreu oscilações para mais e para menos, mas não o tirou da terceira posição,

segundo as pesquisas Escutec e Ibope. O candidato do PC do B perde muito na

maioria das regiões, tendo bom desempenho apenas em São Luís, onde consegue

ultrapassar Jackson Lago e se colocar como segundo nome na preferência do

eleitorado. Na avaliação dos políticos envolvidos no processo eleitoral, essa posição

se deve à sua participação recente na eleição para prefeito de São Luís, em que foi

para o segundo turno e ficou em segundo lugar (CAMPANHA..., 12 set. 2010, p. 3).

A ênfase na aliança política de Flávio Dino com José Reinaldo Tavares,

certamente aposta no possível descrédito em que o ex-governador estaria após ter sido preso

pela Polícia Federal, em 20074, acusado de integrar esquema de fraudes em licitações

ocorridas em seu governo, que desviara recursos públicos para “estradas fantasmas”, que não

teriam sido construídas. Outra mensagem do texto é de que o candidato não tem bom

desempenho em grande parte do Estado, mas apenas na capital porque concorreu à prefeitura

de São Luís em 2008.

Aqui, não cabe especular se as colocações expressas nessa matéria jornalística têm

ou não fundamento, pois, como afirma Charaudeau (2008, p. 84), o discurso político é uma

mistura do logos, do ethos e do pathos, de modo a promover uma encenação que oscila entre a

ordem da razão e da paixão: “[...] as mídias compreendem bem que o mundo da política tem

necessidade de dramaturgia, e que essa dramaturgia consiste, para uma grande parte, em

guerra de imagens para conquistar imaginários sociais”.

4 Operação Navalha – realizada pela PF em nove estados – (PE, AL, BA, SE, PI, MA, GO, MT, SP) e no DF. O

objetivo foi desmontar um esquema de fraude em licitações e desvio de recursos públicos do Programa de

Aceleração do Crescimento (PAC) e do programa Luz para todos (PF PRENDE..., 2007).

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Enquanto O Estado do Maranhão fabrica uma imagem de legitimidade da

governadora Roseana Sarney Murad, o Jornal Pequeno atua como um contrapoder diante das

estratégias de convencimento e persuasão do jornal governista. Na edição de 3 de janeiro de

2010, o editorial é um texto intitulado “Previsões para 2010”, assinado pelo deputado federal

Roberto Rocha, filho do ex-governador Luís Rocha e oposicionista ao grupo Sarney:

O Maranhão vai dar um salto de qualidade e desenvolvimento, pelo menos na

propaganda do governo, e quem puder, sugiro que se mude para dentro da

publicidade governamental, onde o Maranhão é rico e próspero, o povo tem trabalho

e o ano inteiro todos os governantes vivem rindo [...] A refinaria de Bacabeira será

anunciada pela trigésima vez como a redenção do Estado. Vai sobrar emprego, pelo

menos na propaganda do governo. Sugiro que se crie o Dia da Redenção do

Maranhão, declarando feriado estadual [...] (ROCHA, 3 jan. 2010, p. 3).

Em tom de ironia, o texto ridiculariza a imagem defendida pelo governo de

Roseana Sarney Murad ao repetir o discurso de desenvolvimento e progresso, utilizado pela

oligarquia Sarney para justificar seu domínio no Maranhão.

Além de utilizar ironia para se referir aos anúncios do governo, o Jornal Pequeno

estampa em suas páginas escândalos envolvendo a família Sarney no cenário da política

nacional, a exemplo do caso dos atos secretos do Senado Federal, nos quais o presidente do

Senado José Sarney foi personagem de destaque:

[...] o generoso guarda-chuva sarneysista aberto em Brasília abriga gente que, na

maioria dos casos, sequer mora na capital do país [...] O Jornal Pequeno divulga a

lista das pessoas no esquema dos atos secretos do Senado: 1- Amaury de Jesus

Machado (espécie de mordomo de Roseana Sarney) – salário de R$ 12, mil mensais,

cumpre expediente na mansão de Roseana no Lago Sul de Brasília; 2 – Rosângela

Terezinha Michels Gonçalves – (ex-miss, foi namorada do superintendente do

Sistema Mirante, Fernando Sarney, com quem tem um filho), cargo comissionado

(secretária parlamentar,) salário R$ 7.600, substitui o filho João Fernando Michels

Gonçalves no gabinete de Epitácio Cafeteira; 3 – Nathalee Rondeau Cavalcanti Silva

filha do ex- ministro de Minas e Energia Silas Rondeau – assistente parlamentar, R$

2,5 mil; 4 – Juliane Nunes Escórcio Lima e Alba Leide Nunes Lima- (filha e mulher

de Francisco Escórcio), Juliane – assistente parlamentar no gabinete de Mauro

Fecury e Alba no gabinete do próprio Sarney, como assistente parlamentar [...]

(PEQUENO..., 6 jan. 2010, p. 7).

A matéria acima citada exemplifica um dos mais recentes casos de práticas de

nepotismo ainda reinantes no país, demonstrando que aqui não se concretizou plenamente o

aparato do Estado Burocrático de acepção weberiana, tornando válida para o Maranhão do

século XXI a análise feita por Sérgio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil. Para esse

autor, no Brasil, o que importa são as relações sociais inspiradas na família patriarcal,

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[...] em que a própria gestão política apresenta-se como assunto de seu interesse

particular; as funções, os empregos e os benefícios que deles aufere relacionam-se a

direitos pessoais [...] e não a interesses objetivos, como sucede no verdadeiro Estado

Burocrático, em que prevalecem a especialização das funções e o esforço para se

assegurarem garantias jurídicas aos cidadãos (HOLANDA, 2004, p. 146).

Pode-se dizer, portanto, que a cultura política do Brasil ainda mantém muito das

normas, crenças e valores políticos constituídos em tempos passados. Os laços familiares, as

relações de clientelismo ou a recompensa da lealdade partidária são muito fortes; a

democracia despersonalizada é um vir-a-ser longe do alcance dos cidadãos comuns.

A experiência política no estado do Maranhão recorre às práticas de clientelismo

como se fossem naturalizadas, como se o favorecimento de amigos, parentes e

correligionários fosse um direito inquestionável de quem está no poder. Tais práticas são uma

herança cultural herdada das raízes luso-espanholas da sociedade brasileira, de acordo com a

tese defendida por Holanda (2004) e partilhada por muitos outros autores, como Graham

(1997, p. 271), que as coloca na gênese da história pátria:

[...] o mais antigo relato da descoberta do Brasil, escrito como carta ao rei português

por Pero Vaz de Caminha em 1500, terminava com um rogo de clemência em favor

de seu genro. Esse pedido foi a marca de nascença da política brasileira, e a troca de

apadrinhamento por serviços e lealdade continua sendo um sinal visível até nossos

dias.

Mas a prática do clientelismo não é uma exclusividade do Maranhão, embora

nesse estado tenha uma sobrevivência mais forte devido a uma série de questões

socioeconômicas e culturais. Enquanto O Estado do Maranhão silencia diante das denúncias

referentes aos integrantes do grupo Sarney ou as coloca como perseguição dos opositores, o

Jornal Pequeno se encarrega de ser o porta-voz desses escândalos, como na seguinte matéria:

O jornal francês ‘Le Monde’, que circula nesta quarta-feira (13) publica uma

reportagem que trata sobre a corrupção na América Latina. O título da matéria é ‘As

esquerdas da América Latina confrontadas com a corrupção’. O presidente do

Senado, José Sarney foi flagrado com a mão na botija em alguns casos de corrupção,

de empregos fictícios, e de outras ‘indelicadezas’[...]. O ‘Le Monde’ acrescenta que

o presidente Lula salvaguardou o senador da coalizão governamental, ‘mesmo ele

representando o que há de pior na classe política brasileira’ (‘LE MONDE’..., 13

jan. 2010, p. 3).

A participação do presidente Lula na campanha eleitoral de 2010 foi um

importante trunfo político utilizado pela oligarquia Sarney para legitimar a candidatura da

governadora Roseana Sarney Murad à reeleição ao Palácio dos Leões. O uso dos programas

sociais do governo federal, nomeados como Viva Luz, Viva Água, Viva Gente, Leite é Vida,

entre outros, constitui-se em importante moeda de troca junto ao eleitorado mais humilde,

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numa reatualização do clientelismo. Na perspectiva de José Sarney, Roseana Sarney Murad é

a melhor opção nas eleições de 2010 porque tem “[...] a competência na administração do

estado e a amizade com o presidente Lula e com a candidata à Presidência da República,

Dilma Roussef” (SARNEY, 28 set. 2010, p. 3).

No dia do escrutínio eleitoral, a Coluna do Sarney, em O Estado do Maranhão,

traz um artigo, do qual se transcreve alguns trechos:

Ela merece ficar

[...] Nós do Maranhão vivemos, hoje, uma das eleições mais importantes de nossa

democracia. Perdemos o bonde de nossa história na República, na Revolução de

30, no desenvolvimentismo que aqui não passou. Agora não podemos deixar

passar essa grande mudança de rumo, a maior de todas que tivemos... Roseana

fez excelente trabalho. Agora com a mudança do Brasil com Lula e Dilma não

vamos perder mais uma vez o bonde da história. Roseana está entrosada com

Dilma, já trabalharam juntas e vão fazer um grande governo [...] é a hora de

aproveitar nossos prestígios, Roseana, Lobão, João Alberto e eu, todos nós da

bancada federal para darmos o grande salto. O petróleo vem aí, as plataformas já

estão perfurando no mar. Tudo nos enche de euforia. O nosso povo deve nos ajudar

com uma grande votação. Ela merece ficar, com sua ajuda, seu voto, seu apoio

(SARNEY, 3 out. 2010, p. 1, grifou-se).

Nesse discurso dramático e apelativo, José Sarney explica, num claro ato falho5 ,o

caráter patrimonialista, personalista e clientelista de sua dominação ao dizer “é a hora de

aproveitar nossos prestígios”, afinal, quem se beneficia dessa estrutura de dominação são

aqueles que partilham diretamente do poder.

Enquanto O Estado do Maranhão assume uma postura pró-Roseana Sarney e

contrário às candidaturas Jackson Lago e Flávio Dino na campanha, o Jornal Pequeno assume

postura inversa, combatendo a oligarquia Sarney e defendendo os candidatos da oposição.

O ex-governador Jackson Lago, em artigo publicado no dia 6 de fevereiro de

2010, cujo título é “Unidade já”, expressa o desejo de reeditar a união das oposições

realizadas em 2006. Veja seu argumento.

[...] As oposições reunidas já demonstraram que é possível derrotar o poder

oligárquico. E o caminho para isso é o caminho da unidade, da conjugação de

esforços, da união de forças. Nenhum de nós é maior que todos nós juntos. O povo

sabe disso e exige que nós da oposição estejamos unidos e solidários entre nós.

Desde o ano passado, quando começaram as discussões sobre os caminhos de 2010,

venho defendendo a unidade oposicionista. O nome que representará é

conseqüência. Será o nome indicado pela própria população, através de consultas a

ela por meio de pesquisas de opinião pública (LAGO, 6 fev. 2010, p.3).

5 Ato falho: “lapsos de linguagem, exprimem impulsos e intenções que devem ficar ocultos à própria

consciência, ou emanam justamente dos desejos reprimidos [...] através deles o homem trai, em regra, os mais

íntimos segredos” (FREUD, 1997).

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O ex-governador tinha esperanças de que sua candidatura fosse aceita pelos

representantes das oposições, uma vez que seu nome aparecia em segundo lugar nas pesquisas

de intenção de voto, como demonstra o gráfico a seguir.

Gráfico 11 – Pesquisas para Governador do Maranhão, estimulada no 1º turno do ano de

2010.

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

Na tentativa de construção de uma candidatura de oposição capaz de enfrentar a

força e o poderio da oligarquia Sarney, o Jornal Pequeno começa a anunciar a articulação dos

grupos que poderiam lançar nomes à disputa de 2010. Vejam-se as possibilidades anunciadas:

Lideranças dos principais partidos de oposição, reunidas em São Luís para festejar

os 30 anos de fundação do PT, firmaram ontem a noite o esboço de um pacto para

enfrentar o grupo Sarney [...] Falando na condição de representante do PDT, o

economista Cândido Lima observou a necessidade de união dos partidos de

oposição, dizendo que desde já devem ser construídas alianças para assegurar

avanços nas políticas sociais iniciadas pela gestão do ex-governador Jackson Lago

[...] Em seu pronunciamento, o presidente da Assembléia Legislativa deputado

Marcelo Tavares, também defendeu a unidade das forças de oposição, dizendo que

chegou a hora da luta pela redenção final do povo maranhense [...] Flávio Dino

pregou a importância da eleição da ministra Dilma como sucessora do presidente

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Lula: ‘Temos agora a obrigação de manter o Brasil no rumo certo. Porque é isso que

o Brasil e o mundo esperam de nós’, declarou o deputado, chamando as demais

lideranças para o compromisso de consolidar a unidade do campo democrático e

popular no Maranhão (NA CELEBRAÇÃO..., 11 fev. 2010, p. 3).

Enquanto o representante do PDT, Cândido Lima, ratifica o nome de Jackson

Lago como candidato das oposições, Marcelo Tavares (PSB) e Flávio Dino (PC do B)

parecem não conjugar da mesma intenção. Tavares, então presidente da Assembléia

Legislativa, evoca a cultura política da libertação pela “redenção final do povo maranhense”,

sem citar nomes, enquanto Flávio Dino apega-se ao projeto de reeleição da candidatura do PT

à presidência da República, ratificando um dos elementos da dominação oligárquica, que é o

incondicional apoio do governo federal.

No mês de junho, é publicada notícia sobre a homologação da candidatura de

Flávio Dino. É assim que o Jornal Pequeno (2010) refere-se a esse fato: “a candidatura de

Flávio Dino é a expressão do sentimento de mudança que está disseminado em todo

Maranhão”. Nas edições de julho noticia mais de uma vez, as dificuldades de Jackson Lago

em legitimar sua candidatura junto à Justiça Eleitoral por conta da Lei da Ficha Limpa (Lei

Complementar nº 135 de 2010).

A partir de agosto, com o crescimento de Flávio Dino nas pesquisas de intenção

de voto, este candidato passa a ocupar lugar de destaque nas páginas do jornal de oposição ao

grupo Sarney e assume uma imagem de “honestidade” e de “luta pelos menos favorecidos”,

como se pode observar por suas próprias palavras:

Nunca ninguém viu meu nome envolvido em denúncias de corrupção. Nunca

ninguém me viu acusado de roubar dinheiro do povo. E posso garantir que essa

honestidade vai permear todo o meu governo. Vou continuar trabalhando pelo povo

e olhando para o povo como fiz em toda minha carreira [...] Eu fui juiz por dez anos,

mas deixei de julgar para ser julgado. É a minha história que eu coloco agora à

disposição do povo do Maranhão. Uma história de honestidade e de luta pelos

menos favorecidos (A MUDANÇA..., 24 ago. 2010).

Ao se colocar como tendo reputação ilibada, o candidato do PC do B atingia de uma vez

só os demais concorrentes. Jackson Lago e Roseana Sarney tiveram questões a acertar com a Justiça

Eleitoral até ás vésperas das eleições. Flávio Dino era a própria personificação da Justiça, apresentada

nas imagens veiculadas pelo Jornal Pequeno.

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3.2 Perfil dos candidatos

Esse é o título da matéria de O Estado do Maranhão, de 3 de outubro de 2010, dia

da eleição aqui analisada, apresentando os candidatos ao cargo de governador do estado. Os

cinco concorrentes foram assim retratados no jornal situacionista:

Roseana Sarney

Roseana Sarney nasceu em São Luís e formou-se em Sociologia pela Universidade

de Brasília (UnB). Investindo na qualificação profissional, cursou mestrado em

Ciências Políticas na Suíça. Em 1984, atuou como assessora política na campanha

das “Diretas Já”, que culminou com a eleição de Tancredo Neves e José Sarney para

presidente e vice-presidente da República e marcou o fim do período de ditadura

militar no Brasil. Em 1990, foi eleita a deputada federal mais votada do Maranhão.

Em 1992, foi apontada como a "musa do impeachment" por coordenar as

articulações no Congresso que culminaram com o afastamento do ex-presidente

Fernando Collor de Mello. Em 1994, Roseana foi eleita a primeira governadora do

Maranhão e em 1998 foi a primeira mulher reeleita governadora no Brasil, com 66%

dos votos. Ao fim de seu segundo mandato de governadora, em 2002, elegeu-se

senadora pelo Maranhão. Em 2006, disputou o governo e ficou em segundo lugar no

pleito com diferença de 2% dos votos. De volta ao Senado, em 2007, foi líder do

Governo Lula no Congresso. Com a cassação pela Justiça, em abril de 2009, do

então governador Jackson Lago, assumiu o Governo do Maranhão.

Jackson Kepler Lago Jackson Kepler Lago nasceu em Pedreiras, em 1934. Formou-se em Medicina no

Rio de Janeiro e iniciou sua vida política na década de 60, pelo antigo MDB, então

partido de resistência ao regime militar. Em 1979, junto com Leonel Brizola, foi um

dos fundadores do PDT. Em 1974, foi eleito deputado estadual e prefeito de São

Luís por três mandatos: 1989-1992, 1997-2000 e 2001-2002. Candidatou-se ao

governo em 1994 e 2002, mas foi em 2006 que foi eleito governador, com 51,82%

dos votos contra 48,18% da segunda colocada Roseana Sarney. Em 16 de abril de

2009, teve o mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em 2010,

Jackson Lago, mais uma vez, se candidata ao Governo do Estado.

Flávio Dino Flávio Dino é deputado federal, candidato ao Governo do Maranhão pela Coligação

Muda Maranhão (PCdoB/PSB/PPS). É maranhense de São Luís, casado e pai de

dois filhos. É professor universitário desde 1993, é advogado e está, atualmente, no

seu primeiro mandato como deputado federal. Foi professor da Faculdade de Direito

da Universidade de Brasília (UnB) entre os anos de 2001-2006. É candidato ao

Governo do Maranhão e em 2008 disputou a Prefeitura de São Luís. Flávio Dino foi

secretário da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MA, no período de 1991 a

1993; juiz federal, Maranhão e Distrito Federal (1994-2006); juiz convocado do

Tribunal Regional Federal da 1ª Região (2004-2005); juiz do Tribunal Regional

Eleitoral do Maranhão (1995-1997). Na Câmara Federal é membro da Comissão de

Constituição e Justiça de Cidadania. Flávio Dino é autor de vários livros e artigos

jurídicos.

Marcos Silva Marcos Silva é trabalhador urbanitário concursado da Companhia de Saneamento

Ambiental (CAEMA) no cargo de operador de elevatória desde 2007. Ex-militante

do Sindicato dos Trabalhadores em Indústria de Laticínios e Carnes. Durante 10

anos trabalhando como autônomo, ajudou a organizar desempregados e sem tetos na

capital São Luís. Já participou da direção da CUT-MA, mas rompeu com a entidade

junto com diversos militantes sindicais para construir a Conlutas em 2003. Sua

candidatura defende um governo da classe trabalhadora, que implemente as

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necessárias mudanças na estrutura econômica, política e social, abrindo caminho

para uma transição socialista. Visa mostrar que não há saída para os trabalhadores

nos limites do sistema capitalista.

Saulo Arcangeli O candidato do PSOL Saulo Arcangeli, 38 anos, é formado em Ciências da

Computação. Trabalhou na área administrativa do Hospital do Ipem e como

programador de computador na Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Atualmente é analista de informática do Ministério Público da União (MPU),

militante do movimento sindical e professor do Departamento de Matemática e

Informática da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). Iniciou sua militância

no movimento estudantil, sendo um dos coordenadores do DCE/UFMA. Foi

fundador do PSOL/MA, primeiro presidente estadual do partido de 2005 a 2007 e,

atualmente, é presidente do Diretório Municipal de São Luís. Hoje, está licenciado

dos cargos da Secretaria Executiva Nacional da Central Sindical e Popular -

Conlutas e de Coordenador Geral da Federação Nacional dos Trabalhadores no

Judiciário Federal e MPU – Fenajufe e do Sintrajufe/MA. (SEIS, 3 out. 2010).

A descrição do perfil de cada candidato tráz elementos enfatizados por eles

próprios nos seus discursos de campanha, e permite-se vislumbrar muitos outros elementos

utilizados por eles e por seus apoiadores na construção de suas imagens ou na desconstrução

da de seus oponentes.

Em estudo sobre a construção da imagem política de Roseana Sarney Murad,

Gonçalves (2008) analisou os períodos referentes à campanha por uma vaga na Câmara

Federal em 1990, à corrida ao governo do estado em 1994 e a reeleição de 1998. Em cada

campanha é enfatizada uma imagem especifica, fabricada e divulgada nas páginas do jornal O

Estado do Maranhão. No ano de sua aparição na política partidária, em 1990, a imagem mais

forte é a da socióloga, filha do ex-presidente José Sarney, preparada para assumir funções

públicas tanto pelo título adquirido em uma instituição reconhecida, como pela herança

genética e política. Em 1994, a “preparação” da candidata é atribuída às suas funções

parlamentares no Congresso, sobretudo, o título adquirido como “musa do impeachement”

que resultou na cassação do presidente Collor de Melo. Em 1998, ano da primeira reeleição, a

governadora se encontrava convalescente de uma enfermidade que a afastou fisicamente da

campanha, e que permitiu fortalecer a imagem de mulher “guerreira”, capaz de enfrentar todas

as dificuldades com grande força e coragem.

Já a carreira política do médico Jackson Kepler Lago se inicia no contexto de luta

contra o Regime Militar ao lado de lideranças nacionais, como Leonel Brizola, com quem

fundou o PDT, em 1979. Deputado estadual e prefeito de São Luís por três vezes, Jackson

Lago concorreu duas vezes ao governo do estado (1994 e 2002), sem obter vitória, somente

obtendo êxito em 2006 com a formação da “Frente de Libertação do Maranhão”, em que o

PDT e os demais partidos de oposição ao grupo Sarney “foram os grandes condutores da

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vitória do povo maranhense”, na qual Jackson Lago é convertido em “herói da libertação do

Maranhão” (MOREIRA, 2007). Sobre essa representação ligada ao político Jackson Lago,

Costa (2009c) assevera que o discurso da libertação é recorrente na história das oligarquias

maranhenses. Foi usado na década de 1950, contra a oligarquia de Vitorino Freire, e na

eleição de José Sarney em 1965. A vitória do médico pedetista em 2006 seria, então, a terceira

libertação do estado do Maranhão. Porém, para esse historiador e analista político, tal

episódio não significou o “[...] fim da oligarquia Sarney”, mas um “processo de reestruturação

da estrutura oligárquica de poder semelhante ao ocorrido em meados de 1960, com a ascensão

de Sarney sob a tutela militar” (COSTA, 2009c, p. 98).

Em períodos de campanha eleitoral, a confrontação no campo da política torna-se

uma guerra entre forças antagônicas, na qual todos os golpes são permitidos, desde a omissão

de informações à desqualificação dos concorrentes, são armas da disputa que ambos os jornais

se permitem acionar. O Estado do Maranhão, enquanto enaltece sua heroína, aproveita suas

páginas para desacreditar seus concorrentes diante dos leitores. Nos primeiros meses do ano

de 2010, o alvo preferido é o ex-governador Jackson Lago, segundo colocado nas pesquisas

de intenção de votos até meados do mês de agosto. Esse candidato foi execrado inúmeras

vezes por conta da cassação de seu mandato pelo TSE e acusado de atrapalhar o progresso e

desenvolvimento do Maranhão, como atesta a seguinte matéria:

O Maranhão correu o risco de perder a refinaria da Petrobrás por absoluto

desinteresse do governo Jackson [...] correu risco também de perder a Suzano. A

fábrica de celulose, que dará mais de 10 mil empregos na região de Imperatriz, não

teve suas demandas atendidas à época e o seu projeto já focava os estados do Pará e

Tocantins. As negociações foram reabertas por Roseana e o investimento já está

assegurado, com obras em andamento (DOCUMENTO..., 2 set. 2010, p. 3).

Em outra matéria, o candidato Jackson Kepler Lago, do PDT, é associado à

candidatura nacional de José Serra, do PSDB, e ao “projeto neoliberal” deste partido: “Eleitor

poderá agora escolher de um lado o projeto de poder do PSDB defendido pelo PDT, do outro,

a aliança Roseana/Dilma/Lula, representado por Dilma Rousseff” (DEFINIÇÃO..., 10 maio

2010, p. 3). Segundo aquele jornal, são três as opções para o eleitor: 1 -

Jackson/Serra/Fernando Henrique Cardoso; 2 - Roseana/Dilma/Lula; 3 - Dissidentes dos dois

lados agrupados à candidatura de Flávio Dino. A opção do eleitor por Lula/Roseana/ Dilma é

retratada como a maneira de garantir para o povo do Maranhão os programas Bolsa Família,

Luz para Todos e Minha Casa, Minha Vida. Enquanto a opção política

Jackson/Serra/Fernando Henrique Cardoso é associada ao ideário do Estado mínimo, redução

de gastos com programas sociais. Pelo exposto, o jornal oficial da oligarquia omite sua

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própria ligação com o “projeto neoliberal”, que agora demoniza como se fosse a origem de

todo mal da sociedade brasileira.

Porém, nos governos anteriores de Roseana Sarney Murad, as promessas de

desenvolvimento e progresso eram associadas à gestão do presidente Fernando Henrique

Cardoso. Nas campanhas de 1994 e 1998, Roseana Sarney Murad fora eleita com o apoio do

projeto político que agora demoniza. Vejamos a carta de apoio que Fernando Henrique lhe

escreveu em 1994:

Brasília, 10 de novembro de 1994.

Roseana,

Concordo com você quanto ao fato de que o Maranhão é, hoje, um dos mais viáveis

Estados do País.

Desejo ajudar o Maranhão e, por isso, peço ao povo maranhense que me ajude a

ajudar o Estado, votando em você para governadora.

Sua eleição significa que teremos um excelente clima de trabalho. Conheço você, sei

de sua competência, do seu trabalho, da sua experiência, da sua determinação. O

povo maranhense saberá reconhecer essas qualidades com sua eleição.

Receba o abraço amigo e solidário do Fernando Henrique Cardoso (O ESTADO DO

MARANHÃO, 11 nov. 1994 apud GONÇALVES, 2008, p. 308).

Na campanha de 1998, quando a governadora concorria à reeleição, convalescente

numa cama de hospital em São Paulo, o jornal de sua família noticiava a preocupação do

presidente Fernando Henrique Cardoso com seu estado de saúde, como mostra o seguinte

trecho da matéria: “[...] Fernando Henrique telefonava quase diariamente para o INCOR,

pediu à esposa, dona Ruth, que a visitasse por duas vezes, e ele próprio foi a São Paulo para

uma visita especial” (O ESTADO DO MARANHÃO, 1998 apud GONÇALVES, 2008, p.

202).

Pode-se afirmar, portanto, que a oligarquia do grupo Sarney no Maranhão é capaz

de qualquer estratégia discursiva para compor aliança com o governo federal e assim, garantir

as benesses governistas que sustentam o mandonismo desde a formação do Estado nacional.

Na campanha eleitoral de 2006 para o governo estadual, a imagem de Roseana

Sarney incorpora a proximidade com o então presidente Lula, procurando capitalizar a

popularidade dele para renovar a feição do domínio do seu grupo político através da

“vermelhização” da oligarquia, ou seja, apropriando-se da simbologia da cor vermelha,

tradicionalmente utilizada pela esquerda, para reinventar o mando oligárquico. A novidade do

pleito de 2010 foi a oficialização do apoio político do PT à candidata da oligarquia Sarney,

em meio a uma série de protestos de petistas históricos, contrários a esse “pacto de

governabilidade” assumido entre o diretório nacional do PT e o grupo dominante da política

estadual. Esse acordo deu, à governadora Roseana Sarney Murad, uma nova imagem pública

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atrelada ao partido político do presidente Lula, que durante muitos anos teve significativo

papel no meio da esquerda no Brasil. O jornal situacionista fez questão de propagar:

Para Roseana Sarney, a aliança PT/PMDB é um momento histórico para o

Maranhão. ‘Juntos poderemos fazer uma revolução neste estado’, afirma a

governadora [...] A governadora Roseana Sarney sempre sonhou com a aliança com

o PT. Segundo ela, pela sua própria história política, muito próxima da de Lula. Em

1989, Roseana apoiou a candidatura de Lula à Presidência contra o candidato

da elite paulista, Fernando Collor de Mello. ‘Em 1992, eu fui coordenadora do

processo de impeachment do Collor e participei de muitos atos ao lado de Lula

e do PT’, acrescentou ela (PT.., 17 maio 2010, p. 3, grifou-se).

Na elaboração de uma nova identidade, a estratégia discursiva utilizada por este

grupo oligárquico, em seu jornal, faz uso da ideia de “revolução” - palavra-símbolo dos

movimentos de esquerda - para dar prosseguimento às práticas patrimonialistas. Na mesma

edição de O Estado do Maranhão que trouxe a matéria transcrita acima, outra reportagem dá

voz à declaração da governadora, em relação aos integrantes do PT: “Queremos uma aliança

em pé de igualdade. Eu não tenho vergonha de vocês e vocês não têm que ter vergonha de

mim” (PT..., 17 maio 2010, p. 3). No dia 13 de junho, o jornalista D’Eça (2010) publica a

construção da trajetória de José Sarney e de Roseana Sarney Murad junto à esquerda.

É a segunda vez que a governadora Roseana Sarney terá um partido de esquerda em

sua coligação e no seu governo. Além do PT, o próprio PC do B – que hoje tem

como candidato o deputado federal Flávio Dino – já apoiou Roseana. Tanto que, nos

dois primeiros mandatos, ocupou importantes cargos relacionados à política agrária

no Maranhão. A relação de Roseana Sarney com a esquerda vem desde a época em

que foi assessora do pai, José Sarney, na Presidência da República. O PC do B,

inclusive, assim como outros partidos de esquerda, saíram da clandestinidade por ato

político do então presidente. Por conta do gesto, Sarney tem hoje o reconhecimento

e o apoio nacional das principais lideranças comunistas, como o senador Ignácio

Arruda (CE), e o presidente da legenda, Renato Rabelo, que chegaram a cogitar a

presença do PC do B maranhense, juntamente com o PT, no palanque do PMDB. Ao

eleger-se deputada federal em 1990, Roseana estreitou os laços de amizade com

petistas importantes, com o ex-ministro José Dirceu e o deputado José Genoíno.

Com eles, teve atuação importante no episódio que resultou no impeachment do

presidente Fernando Collor de Mello (PRN). Eleita governadora em 1994, iniciou

um processo de avanço na política administrativa e nas relações políticas, que

culminaram no apoio do PC do B e no reconhecimento de lideranças de esquerdas

no Maranhão como os ex-deputados Luiz Vila Nova, Juarez Medeiros, dentre

outros. O próprio Domingos Dutra, hoje o principal adversário da aliança

PT/PMDB, reconheceu, em meados dos anos 90, que o esforço do governo Roseana

na política agrária era difícil atacar (D’EÇA, 13 jun. 2010, grifou-se).

No enunciado em que é dito que os petistas não devem ter vergonha do apoio à

Roseana Sarney fica evidenciado o estranhamento da aliança PT/PMDB no Maranhão,

mostrando como a linguagem é afetada pela ideologia e como a ideologia se manifesta na

língua, de modo que “o sujeito discursivo funciona pelo inconsciente” (ORLANDI, 2003). No

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texto do jornalista D’Eça, o PC do B é citado quatro vezes: a primeira, para dizer que esta

agremiação já apoiou o governo de Roseana Sarney em outra ocasião; a segunda, para lembrar

que a legalidade do partido tem a ver com ato do ex-presidente José Sarney; a terceira faz

referência a um possível apoio dos comunistas no pleito de 2010 e a quarta, para rememorar o

apoio de lideranças locais de esquerda ao governo de Roseana Sarney. Por que esse interesse

em associar a imagem da governadora como candidata à “esquerda”, qual o ganho político

eleitoreiro dessa estratégia?

Segundo Bobbio (1995), os conceitos de “direita” e “esquerda” têm um sentido

histórico-descritivo e axiológico, em que a “direita” se associa ao modelo liberal democrático,

mas com restrições de igualdade, sendo a “esquerda” mais propensa aos movimentos

igualitários e libertários. Por conta disso, nenhum político hoje se reconhece pertencente à

direita, como destaca Bucci (2012), “[...] os antigos caciques, como José Sarney, acharam

melhor sair de mudança, transmigrar para a esquerda, apoiar o governo Lula”. No embate da

disputa eleitoral maranhense em 2010, esse discurso se mostrou presente nos jornais,

sobretudo a respeito de quem teria histórica e moralmente a legitimidade de contar com o

apoio político do PT.

O candidato Flávio Dino – que durante sua trajetória no movimento estudantil

teve ligações com o PT, chegando a coordenar a campanha à presidência de Lula, em São

Luís, em 1989, e a ocupar a vice-presidência do Diretório Municipal do PT em 1990

(BARROS FILHO, 2008) – é apresentado no começo do ano de 2010, nas páginas do Jornal

Pequeno, como o candidato com mais apoio do PT. Na coluna semanal que mantinha e ainda

mantém nesse jornal, Dino afirma, no início de 2010: “Temos uma longa relação com o PT,

enquanto partido político, já que o PC do B e o PT estão juntos desde 1989 nas disputas

nacionais, mas também pessoalmente, pois fui do PT e lá tenho muitos companheiros e

amigos” (FLÁVIO..., 5 fev. 2010, p. 3). Em outro artigo, ele procura mostrar que também tem

proximidade com o presidente Lula:

PT 30 anos, Maria Aragão 100 anos

[...] É assim que encaramos o PT: um grande aliado do nosso partido e das boas lutas

sociais. Juntos disputamos e perdemos as eleições presidenciais de 1989, 1994 e

1998. Sofremos nas derrotas, aprendemos com elas, juntos. Desde 2002,

enfrentamos de mãos dadas o imenso desafio de governar o Brasil. Sob a liderança

do presidente Lula, fundador do PT, mostramos que é possível um novo projeto

nacional de desenvolvimento, cuja marca tem sido a ampliação de direitos sociais,

como políticas públicas voltadas para aqueles que sempre foram esquecidos pelas

forças do atraso. O governo Lula mostrou que outro Brasil é possível, e que a

esperança nunca deve sucumbir diante do medo, da opressão, da submissão, do

discurso do pragmatismo [...] (NA CELEBRAÇÃO..., 11 fev. 2010, p. 3).

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Na disputa pelo imaginário político de esquerda, é travada uma batalha entre o

candidato comunista e a candidata da oligarquia Sarney para mostrar ao leitor/eleitor quem é

mais capacitado para dispor do apoio do presidente Lula. Para Singer (2002), no Brasil a

localização à esquerda está vinculada às lutas sociais que visam promover transformações na

sociedade em direção da igualdade, contestando a ação do Estado na sua função repressiva em

relação aos movimentos sociais. Em entrevistas concedidas recentemente a Barros Filho

(2008), pessoas da família do candidato Flávio Dino se autodefiniram integradas a concepções

políticas de esquerda. Seu pai, Sálvio Dino, foi preso e teve os direitos políticos cassados

pelos governos militares, acusado de ser comunista.

Na campanha de 2010, inicialmente o combate de Flávio Dino à oligarquia Sarney

é feito de forma indireta, “em nome da renovação na política” (FLÁVIO..., 1 jul. 2010, p. 3).

É somente a partir do momento em que ele cresce nas intenções de voto, entre o final de

agosto e o começo de setembro de 2010, que intensifica um discurso mais diretivo contra a

candidata da oligarquia. Recorre à imagem-símbolo de “probidade” e “confiança” em

contraposição aos escândalos que envolvem a família Sarney.

Diante do crescimento de sua candidatura, Flávio Dino assume uma postura mais

aguerrida na disputa eleitoral não apenas contra a governadora Roseana Sarney, mas também

contra a do médico Jackson Lago, pois ambos esperavam decisão da Justiça para concorrer ao

pleito de 2010:

Sou o único candidato completamente ficha limpa, porque não respondo a nenhum

processo na justiça. Nunca menti, nunca enganei e nunca roubei. O povo pode

depositar em mim o seu voto de confiança, e é por isso que a minha candidatura

cresce [...] A governadora discursa e diz que vai fazer uma revolução no Maranhão.

O que nós devemos nos perguntar é porque ela não fez antes, se ela já contabiliza

dez anos no governo do Estado [...] O Brasil todo acompanha as eleições do

Maranhão. Isso porque eles querem saber se é dessa vez que vai cair a última

oligarquia do Brasil: o grupo do atraso, do passado e da escuridão [...] (FLÁVIO...,

21 set. 2010, p. 3).

Naquele ano eleitoral, batalhas são travadas em diversos tribunais do Brasil para

validar candidaturas ameaçadas pela Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135). No

Maranhão, as candidaturas de Roseana Sarney e Jackson Lago constavam na lista de

impugnação do Tribunal Superior Eleitoral. Ela fora condenada pelo Tribunal de Justiça do

Maranhão, em 2009, por batizar logradouros públicos com seu próprio nome e por ser ré em

processos que tramitam na Justiça Federal6. O ex-governador Jackson Lago corria o risco de

6 Processo nº 2009.34.00021663-8, nova numeração: 21534-05.2009.4.01.3400 – ação impetrada em junho de

2009 pelo advogado Jorge Alberto Beux. Figuram como réus, além de Roseana, seu mordomo Amaury de

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não participar da disputa eleitoral por ser considerado “ficha suja”. Seus advogados

argumentaram que a Lei da Ficha Limpa não pode atuar retroativamente, prejudicando o

candidato. As duas candidaturas são aprovadas pelo TRE-MA e a questão vai parar no TSE,

que somente às vésperas da eleição as ratificada, como mostram notas divulgadas na imprensa

local:

[...] os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) liberaram ontem (30/09), por

4 a 3, o registro de candidatura do ex-governador do Maranhão Jackson Lago (PDT).

O Ministério Público do Estado pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF)

(TSE.., 1 out. 2010, p. 3, grifo nosso).

O TSE deferiu ontem à tarde, por 6 votos a 1, o registro da candidatura da

governadora Roseana Sarney. Com a decisão, a Corte mandou para o espaço o

factóide criado pelo ex-deputado Aderson Lago contra a candidata do PMDB. Na

verdade, Lago primo impugnou a candidatura de Roseana apenas para gerar notícias.

Mas errou na dose e acabou frustrado (ESCUTEC..., 2 out. 2010, p. 3, grifo nosso).

O Estado do Maranhão usa a notícia da ratificação da candidatura do médico

Jackson Lago para atacar o candidato Flávio Dino, por meio da seguinte nota: “[...] Fracasso –

A confirmação, ontem, pelo TSE, do registro da candidatura do pedetista Jackson Lago, teve

o poder de uma forte ducha de água fria nos projetos de Flávio Dino” (ESTADO..., 1 out.

2010, p. 3).

A primeira pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística

(IBOPE) mostra o candidato da coligação “O Povo é Maior” (PDT, PSDB) em segundo lugar:

“Roseana Sarney – 47%; Jackson Lago – 25 %; Flávio Dino – 13%” (IBOPE.., 28 ago. 2010,

p. 3). Na segunda consulta do IBOPE, “Roseana Sarney manteve-se estável, variando apenas

dentro da margem de erro. Ela tinha 47% e agora tem 46%. Jackson Lago perdeu quatro

pontos – tinha 25% e agora tem 21%. O candidato do PC do B, Flávio Dino, cresceu de 13%

para 21%” (IBOPE..., 18 set. 2010, p. 3).

O crescimento do candidato comunista na campanha faz com que O Estado do

Maranhão mude o foco de seus ataques, tornando-o seu maior alvo. A principal crítica

direciona-se aos apoios políticos que ele estava recebendo:

Flávio Dino não quer divulgar seus aliados: Em uma festa fechada, em Caxias, o

candidato ao governo do Estado Flávio Dino, PC do B, foi filmado dizendo que

tinha orgulho de ser parceiro político do prefeito da cidade, Humberto Coutinho

(PDT), e do ex-governador José Reinaldo Tavares (PSB) (FLÁVIO..., 29 set. 2010,

p. 2).

Jesus Machado, conhecido com ‘Secreta’, e a União reivindica a devolução ao erário. Caso Usimar – Processo

nº 2001.37.00.008085-6, nova numeração: 8018-66.2001.4.01.370. Esse processo resultou da investigação da

Polícia Federal e do Ministério Público Federal sobre o desvio de R$ 44,2 milhões da extinta SUDAM para

uma indústria de autopeças, USIMAR, que nunca foi constituída (JULIÃO..., 29 set. 2010, p. 3).

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No interdiscurso desse texto, vê-se a intenção de anunciar que aquele que é

apresentado como “a renovação na política” tem fortes ligações com políticos de tradição

patrimonialista e clientelística.

Enquanto promove a deslegitimação dos oponentes de Roseana Sarney, O Estado

do Maranhão afirma que ela promete “[...] fazer a campanha mais limpa da história do

Maranhão” (ROSEANA..., 25 jun. 2010, p. 3), e a associa à cor vermelha da esquerda. O

criador da versão “vermelha” da herdeira da oligarquia é o marqueteiro Duda Mendonça, que

utiliza a cor símbolo do Partido dos Trabalhadores nas bandeiras de campanha de Roseana

Sarney tanto na eleição de 2006 quanto na de 2010, construindo uma imagem renovada da

oligarquia a partir da popularidade do presidente Lula. A substituição da estrela do PT pelo

número 15 do PMDB, nas bandeiras da campanha da candidata situacionista, visa anunciar

aos eleitores o “prestígio”, a “competência” e o “merecimento” de Roseana Sarney junto ao

governo federal, ressaltando assim sua capacidade de realizar a mediação de interesses entre

as esferas de poder estadual e central.

Os discursos dos jornais assumem um mecanismo de exercício de poder, que se

faz presente nas informações, na perspectiva de persuasão e convencimento, pouco

importando se o enunciado é sincero ou não. De acordo com Barthes (1978, p. 11), “[...] o

poder está presente nos mais finos mecanismos do intercâmbio social [...] até mesmo nos

impulsos liberadores que tentam contestá-lo [...]”. Assim, do ponto de vista da linguagem, os

dois periódicos são “lugares diferentes de fala”, onde se anunciam projetos políticos que

visam convencer seu público leitor. O Estado do Maranhão representa a força política,

econômica e midiática do grupo oligárquico que domina o Estado há quase meio século,

utilizando-se dos mecanismos da cultura política oligárquica, patrimonialista e clientelista

para se manter no poder. O Jornal Pequeno e sua postura oposicionista é uma voz

discordante, a qual, no plano discursivo, aproxima-se de uma cultura política liberal de defesa

dos interesses coletivos e das liberdades democráticas, defendendo seus interesses e pontos de

vista.

3.3 O apoio do PT (Partido dos Trabalhadores) à candidata da oligarquia: uma nova fase

política?

No tempo do Império, no século XIX, os partidos políticos eram uma associação

de indivíduos unidos por laços pessoais, com identificação ideológica pouco consistente, cujo

interesse maior era angariar prestígio e benefícios junto aos Gabinetes Ministeriais. De acordo

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com Graham (1997, p. 220), “[...] quando um partido conquistava o poder, raras vezes fixava-

se a seu programa pré-anunciado [...] Dever político não tinha nada a ver com programa, mas

com lealdade, e em última instância a lealdade pessoal”. Pode-se imaginar que essas práticas

tivessem sido abandonadas com a implantação da República no Brasil, mas a permanência

dessa cultura política impregna as estruturas do Estado Republicano até o presente.

Determina, inclusive, a experiência política do Maranhão, marcada profundamente por

estruturas oligárquicas que se sustentam na relação entre os poderes local, estadual e da

União, donde “[...] o verdadeiro centro da política maranhense, o palco onde os lances

decisivos se efetivam, sempre esteve fora: no Rio de Janeiro nos tempos de Urbano Santos e

Vitorino Freire; em Brasília, nos tempos de José Sarney” (REIS, 2012, p. 65).

Podemos afirmar que, no pleito de 2010, um dos elementos que dá sustentação à

oligarquia, no plano do discurso, é a roupagem esquerdizante adotada pela governadora

Roseana Sarney por meio das relações com o então presidente Luís Inácio da Silva. O indício

mais forte dessa sustentação política foi a determinação do diretório nacional do Partido dos

Trabalhadores para cancelar o apoio do diretório regional à candidatura do deputado federal

Flávio Dino, passando a apoiar a candidata da oligarquia Sarney. Esse fato gerou protestos de

petistas que historicamente se posicionaram contra as práticas oligárquicas no estado, e

contrariou a orientação do partido nos primeiros tempos, tanto na esfera nacional quanto na

estadual, quando a sigla do PT esteve associada aos movimentos sindicais, estudantis e

sociais.

No Maranhão, segundo Borges (2008, p. 47), dentre os movimentos e

organizações que podem ser relacionados com a criação do PT, por estarem sendo gestados no

mesmo contexto, estão:

[...] o Movimento Estudantil e a greve pela meia passagem, em 1979; o Movimento

de Oposição pra Valer, organizado no seio do MDB autêntico; a atuação de setores

progressistas da Igreja Católica, especialmente a Pastoral da Juventude; Movimento

contra a Carestia; atuação da entidade de apoio Sociedade Maranhense de Defesa

dos Direitos Humanos e a seção estadual do Comitê Brasileiro pela Anistia.

A conjuntura nacional da gênese do Partido dos Trabalhadores está associada ao

processo de redemocratização, ocorrido no final dos anos de 1970, mais precisamente à

reforma partidária ocorrida em 1979, que impôs o fim do bipartidarismo da ARENA (Aliança

Renovadora Nacional - apoiava a ditadura militar) e do MDB (Movimento Democrático

Brasileiro - a oposição consentida pelos militares). Da ARENA surgiu outra agremiação de

caráter conservador, o PDS (Partido Democrático Social). Do MDB surgiram forças mais à

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esquerda, como o PDT (Partido Democrático Trabalhista), o PMDB (Partido do Movimento

Democrático Brasileiro), o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) e o PT.

A chegada do PT ao governo federal, em 2002, tem relação direta com fracasso

social do neoliberalismo do PSDB – partido fundado em 1988, como dissidência à esquerda

do PMDB, ligado inicialmente com o programa da social democracia européia – nos dois

governos do presidente Fernando Henrique Cardoso. Atualmente o PT transita

confortavelmente entre a direita e a esquerda brasileiras. Usufrui das credenciais dos anos de

militância nos movimentos sociais, tem a confiança dos mais ricos por não tomar medidas

contra as grandes fortunas e o aval dos setores de baixa renda, por promover uma reforma

social sem rupturas com a ordem estabelecida, recorrendo a programas de redistribuição de

renda (SECCO, 2012).

Essa posição do PT, mais à direita, facilita a aproximação com setores políticos

conservadores, como o representado pelo grupo Sarney no Maranhão, sendo uma interessante

estratégia de reprodução política dessa oligarquia em um momento de crise de legitimidade.

Os principais nomes da articulação entre o PT local e a oligarquia foram o presidente estadual

do partido, Raimundo Monteiro, e o ex-deputado Washington Oliveira, atual vice governador,

que alegremente ladeiam Roseana na capa de O Estado do Maranhão, após a decisão do

Diretório Nacional do PT de anular o encontro estadual do partido que havia definido, em

março de 2010, o apoio à coligação integrada pelo PC do B, do deputado federal Flávio Dino

(Figura 4).

De nada adiantaram os protestos do grupo petista formado pelo deputado federal

Domingos Dutra, pelo histórico líder camponês Manoel da Conceição, pelo deputado estadual

Bira do Pindaré, pelo jornalista Franklin Douglas, entre outros, contrário à aliança com a

oligarquia Sarney. O Diretório Nacional justificou a aliança com os seguintes argumentos:

Documento: Resolução DN 10/06/2010 – Política de Alianças no Maranhão

Considerando as diretrizes estabelecidas no 4º Congresso Nacional do PT que

definiu como objetivo principal de 2010 a vitória na eleição presidencial, com a

candidatura da companheira Dilma Rousseff, para dar continuidade aos avanços

do projeto democrático e popular liderado pelo Presidente Lula. Considerando

que o 4º Congresso estabeleceu, ainda a respeito das eleições estaduais, que é de

competência da direção nacional a deliberação, em última instância, sobre as

questões de tática nos Estados; Considerando a importância do PMDB na eleição na

base aliada do nosso governo e na composição da coligação eleitoral nacional para

as eleições de 2010; O Diretório Nacional Resolve: 1 – Aprovar a coligação do

PMDB no Estado do Maranhão à candidata ao governo do Estado, Roseana Sarney

Murad; 2 – Determinar à Comissão Executiva Estadual do PT do Maranhão para a

escolha de candidatos e aprovação às próximas eleições gerais, a observância das

diretrizes estabelecidas na presente resolução, em consonância às normas legais,

bem como às normas estatutárias definidas no Capítulo I do Título V do Estatuto do

PT.

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Brasília, 11 de junho de 2010. Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores

(CONFIRMADA..., 12 jun. 2010, p. 3, grifou-se).

FIGURA 4: Estrela da campanha

Fonte: PT, 13 JUN. 2010

Em nome de um pragmatismo político eleitoral, Roseana Sarney havia trocado o

PFL pelo PMDB no ano de 2009, para poder contar com o apoio do presidente Lula naquele

ano eleitoral. Estrategicamente, a oligarquia Sarney vincula-se ao personalismo do presidente

Lula e ao seu programa de combate à desigualdade social e à pobreza sem alterar a ordem

política constituída. Não é a toa que Roseana Sarney Murad declarou durante campanha:

“Aprendi muito com Lula, este nordestino metalúrgico que venceu na vida. Eu tenho orgulho

de estar ao seu lado” (ROSEANA..., 25 jun. 2010, p. 3). Mais uma vez a oligarquia utiliza-se

da cooptação política para reproduzir suas estratégias de dominação no Maranhão.

De acordo com Singer (2009), o voto em Lula a partir do segundo mandato (2006)

não representa o voto de opção ideológica, seria fruto da despolitização do eleitorado,

seduzido pela manutenção da estabilidade econômica e pela ação distributiva do Estado, a

exemplo do Bolsa Família, destinado em maior proporção às regiões e aos municípios de

menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). O autor denomina esse fenômeno de

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Lulismo, pois representa uma nova configuração ideológica com elementos que misturam as

categorias esquerda e direita numa prática de combate à desigualdade dentro da ordem.

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4 A ELEIÇÃO ESTADUAL DE 2010: um confronto na imprensa

Os periódicos impressos sempre fizeram parte da vida política brasileira,

constituindo-se em instrumento de luta política, dando margem a um jornalismo partidário

interessado em influenciar a opinião pública, na perspectiva de transformar algumas

demandas setoriais numa vontade geral (MOREL, 2012).

Mesmo com a transformação de uma imprensa artesanal numa produção

empresarial, inspirada na ideia de que “o jornal cumpre a nobre função de informar o leitor o

que se passou, com o rigoroso respeito à ‘verdade dos fatos’, [...] os jornais não deixaram de

se constituir em espaço de luta simbólica, por meio do qual diferentes segmentos digladiam-se

em prol de seus interesses e interpretações sobre o mundo” (LUCA, 2012, p. 153).

4.1 O Estado do Maranhão x Jornal Pequeno

Ao se analisar os posicionamentos expressos nos periódicos O Estado do

Maranhão e Jornal Pequeno, acerca da campanha eleitoral, verificou-se a intenção de ambos

influenciarem a opinião dos leitores na disputa eleitoral ao governo do Maranhão, de maneira

que há, sim, uma intencionalidade na veiculação de determinadas notícias, há, sim, o interesse

de convencer e persuadir o leitor a respeito de determinados pontos de vista. No entanto, até

que ponto é possível a manipulação, o condicionamento da opinião pública?

Para o historiador Becker (2003, p. 192, 193), “pode-se definir a manipulação

como uma tentativa de provocar de maneira artificial uma reação da opinião pública,

divulgando uma notícia falsa”, porém tal estratégia só se mostra eficiente quando “acompanha

as tendências profundas da opinião pública”. Quanto ao condicionamento, o referido

historiador estabelece dois níveis específicos: curto prazo – resultado da propaganda,

conscientemente organizada de maneira obsessiva; longo prazo – convicções ideológicas

enraizadas no inconsciente de forma profunda.

Em estudo sobre a trajetória do político José Sarney, Pachêco Filho (2001) destaca

o papel dos jornais na “construção midiática” da candidatura desse político na campanha ao

governo estadual do ano de 1965. Naquela ocasião, quase todos os periódicos da capital

maranhense apoiaram e divulgaram a candidatura intitulada “Libertação do Maranhão”, em

referência ao jugo mandonista do senador Victorino Freire. A derrota da oligarquia vitorinista

deveu-se, entre outros fatores, ao golpe civil-militar deflagrado em 1964, mas a propaganda

em torno da candidatura Sarney foi uma eficiente estratégia de construção imagética de um

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Maranhão “moderno”, de modo a cristalizar no imaginário político, social e cultural dos

maranhenses a retórica do desenvolvimento industrial, do progresso e modernização atrelados

à figura política de José Sarney, discurso inúmeras vezes reinventado nas décadas seguintes

no decorrer das campanhas eleitorais do novo grupo oligárquico que se constituiu,

capitaneado por esse político.

A administração de José Sarney como governador do Maranhão foi marcada por

grandes obras financiadas com recursos do governo federal, dentre as quais destacam-se:

asfaltamento da estrada São Luís-Teresina, construção de estradas ligando o Nordeste à

Amazônia (BR 135, BR 316 e a rodovia Belém-Brasília); hidrelétrica Boa Esperança; Porto

do Itaqui (SOUSA, 2009).

Por conta disso, é notório que no estado do Maranhão haja uma campanha

permanente de enaltecimento do grupo Sarney, divulgada nos veículos de comunicação

controlados por este grupo e visualizada, sobretudo, na escolha dos nomes para prédios

públicos. Como já foi dito, até pouco tempo havia 161 escolas estaduais batizadas com o

sobrenome Sarney, segundo pesquisa do jornalista Chico Otávio (2012). Esse é um modo,

uma tentativa de naturalizar esse domínio oligárquico.

Durante a campanha de 2010 observou-se como o jornal O Estado do Maranhão,

buscou orientar a opinião pública em favor da candidatura de Roseana Sarney Murad. Em

relação a São Luís, houve a intenção de dissociá-la da imagem de rebeldia dessa cidade. As

matérias de capa do periódico sempre destacavam como a candidata governista era bem quista

na capital, como no trecho a seguir:

A governadora Roseana Sarney demonstrou sua popularidade em São Luís no fim de

semana. Estando ou não presente nos eventos, a simples menção do seu nome como

candidata levou milhares de simpatizantes ao delírio nos eventos realizados pelos

seus aliados (LUDOVICENSES, 10 ago. 2010, p. 2).

Esta alocução na primeira página do periódico reporta-se à declaração de apoio de

líderes comunitários à campanha de reeleição da governadora, atribuindo-lhe tamanho

“carisma”, que não haveria a necessidade de ela fazer-se presente nos eventos. Só precisava

ter seu nome mencionado e todos a ovacionavam. Nesse caso, a intenção da matéria vai além

da simples informação, há uma explícita intenção de condicionar a opinião do leitor. Como

instrumento de luta política, o jornal reverbera o poder do grupo político-econômico que

representa e, ao utilizar a palavra impressa, faz uso do poder da linguagem para promover a

aquiescência de seu público, buscando assim o reconhecimento e a legitimação do domínio do

referido grupo, como algo natural e incontestável.

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Por isso é importante lembrar o que Baczko (1985, p. 314) ensina: “Aquilo que o

mass media fabricam e emitem, para além das informações centradas na atualidade, são os

imaginários sociais: as representações globais da vida social, dos seus agentes, instâncias e

autoridades, as imagens dos chefes [...]”.

Não é por acaso que os grupos oligárquicos controlam importantes canais

midiáticos no Brasil desde a inauguração da imprensa, no século XIX. Tal controle tornou-se

hegemônico, sobretudo, durante a concessão da radiodifusão ocorrida no governo do então

presidente da República José Sarney, em 1985, o que garantiu o controle da informação na

mão de poucos grupos empresariais no Nordeste brasileiro, com destaque para a família

Sarney, no Maranhão; a família Magalhães, na Bahia; a família Collor, em Alagoas.

De acordo com Mendonça e Rebouças (2009, p. 6), “as concessões foram

utilizadas como moeda de troca em torno das votações do quinto ano de mandato do

presidente Sarney e do presidencialismo como sistema de governo”.Tal barganha evidenciou

o auto-favorecimento na distribuição das outorgas de rádio e televisão, que no Brasil são

concedidas pelo governo.

No que tange ao Maranhão, observa-se uma tentativa, por parte da mídia

controlada pelo grupo Sarney, de transferência do carisma do líder oligárquico à sua herdeira

política, em que pese à constante crise política observada quando da indicação dos sucessores

ao governo estadual, na qual Roseana Sarney tem assumido, nos últimos tempos, a “missão”

de dar continuidade ao domínio do grupo. O papel dos seus meios de comunicação é dar

sustentação ao carisma fabricado e sustentado com base, entre outros artifícios, na retórica de

desenvolvimentismo e do progresso para o Estado, em especial para a capital São Luís, palco

de uma intensa campanha do jornal O Estado do Maranhão no sentido da aceitação do grupo

em São Luís, como se pode ver numa matéria sobre a pesquisa de intenção de votos, realizada

no mês de agosto de 2010, com a seguinte manchete: “Pesquisa Escutec indica que Roseana

poderá ter maior votação em São Luís”.

Roseana Sarney manteve o prestígio eleitoral em São Luís nas eleições de 2006,

mesmo diante da violenta campanha de destruição da sua imagem, perpetrada por

José Reinaldo. A então candidata, que havia vencido no primeiro turno, obteve cerca

de 30% dos votos dos ludovicenses no segundo turno, mas não consegui vencer o

patamar de 25% em Imperatriz (PESQUISA ESCUTEC, 1 ago. 2010, p. 2).

Compare-se, agora, os números da eleição de 2006 com o que é dito pelo jornal

(Tabelas 3 e 4).

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Tabela 3 - Distribuição de votos por candidato a governador no 1º turno das eleições

estaduais de 2006 no Município de São Luís.

Candidato Partido Votação Porcentagem

Aderson de Carvalho Lago PSDB 10.871 2,357

Antonio Augusto Silva Aragão PSD 830 0,180

Carlos Saturnino Filho PSOL 3.480 0,755

Edson Carvalho Vidigal PSB 58.391 12,661

Jackson Kepler Lago PDT 233.323 50,590

João Melo Sousa Bentivi PRONA 5.512 1,195

Roseana Sarney Murad PFL 148.794 32,262

Fonte: TRE-MA, 2006.

Tabela 4 - Distribuição de votos por candidato a governador no 2º turno das eleições

estaduais de 2006 no Município de São Luís.

Candidato Partido Votação Porcentagem

Jackson Kleper Lago PDT 311.634 66,598

Roseana Sarney Murad PFL 156.299 33,402

Fonte: TRE-MA, 2006.

Tanto no pleito de 2002 quanto no de 2006, os candidatos da oligarquia Sarney

foram derrotados na capital São Luís. Na eleição de 2002, José Reinaldo Tavares, embora

tenha garantido a vitória no primeiro turno com 51,055% dos votos válidos, perdeu a eleição

na capital para o médico Jackson Lago, que obteve 56, 372% (TSE, 2002). Mesmo perdendo a

eleição em 2006, Roseana Sarney obteve quase um terço dos votos em São Luís,

demonstrando seu prestígio na capital como afirma o jornal O Estado do Maranhão. A

campanha do jornal na disputa de 2010 a favor da candidata governista visa também diminuir

a rejeição de seu nome no colégio eleitoral de Imperatriz, o segundo maior do estado, depois

da capital, como se pode ver na matéria:

As pesquisas Escutec mostram uma Roseana vencedora [...] em todas as regiões do

Maranhão. E com um dado muito favorável ao seu projeto eleitoral: tem larga

vantagem em São Luís e liderança na região sul, que inclui o colégio de Imperatriz,

onde não obteve bom resultado nas eleições de 2006 (AS PESQUISAS, 9 set. 2010,

p.3, grifou-se).

O resultado da eleição desmente o divulgado do jornal quanto à vantagem da

candidatura da governadora à reeleição, em Imperatriz, em 2010, visto que o candidato do

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PDT obteve 73, 63% dos votos nesse município contra 14, 48% da candidata do PMDB

(TRE-MA, 2010). Em virtude da poderosa estrutura midiática, do poderio econômico e

político a seu favor, a governadora obteve sucesso em quase todas as regiões na eleição de

2010, inclusive em São Luís. As únicas exceções foram os municípios de Imperatriz, Timon,

Pinheiro e Pedreiras, nos quais o candidato do PDT obteve maior percentual de votos, além

dos municípios de Balsas, Santa Inês e Caxias, onde Flávio Dino obteve vantagem, como se

pode ver na tabela a seguir:

Tabela 5 - Distribuição de votos por candidato a governador nos Municípios de Imperatriz,

Timon, Pedreiras, Balsas, Santa Inês e Caxias

Município Jackson Lago (PDT) Roseana Sarney (PMDB) Flávio Dino (PC do B)

Imperatriz 86.442 (73,637%) 16.997 (14,487%) 13.497 (11,5%)

Timon 30.806 (44,3%) 29.366 (42,23%) 9.042 (13%)

Pinheiro 15.573 (44,76%) 13.725 (39,45%) 5.358 (15,45)

Pedreiras 8.378 (42,55%) 7.158 (36,35%) 4.82 (20,73%)

Balsas 5.197 (14,486%) 13.056 (36,392%) 17.548 (48,913%)

Santa Inês 3.415 (8,96%) 16.426 (44,31%) 18.166 (47.67%)

Caxias 6.114 (9.21%) 29.426 (44,31%) 30.308 (45,63%

Fonte: TRE – MA, 2010.

De acordo com Becker (2003, p. 198), “uma eleição é um fenômeno complexo

resultado de uma variedade de fatores, dos quais aqueles ligados à ‘longa duração’ tem muitas

vezes tanta ou mais importância que os relacionados à conjuntura”. Quanto à ideia de longa

duração, neste caso, entende-se que a permanência das práticas políticas atreladas ao modelo

de dominação oligárquica, a valoração das trocas clientelares, a captação ilícita de votos, o

uso patrimonial da máquina pública são recursos que garantem a permanência de um mesmo

tipo de mandonismo político, o qual é visto como natural e está sedimentado no imaginário

coletivo.

A reeleição da representante da oligarquia Sarney, obtendo apoio da maioria das

zonas eleitorais de São Luís, demonstrou o quanto o jornal O Estado do Maranhão foi

eficiente em sua estratégia de forjar a opinião pública. Porém, tal eficiência só foi possível

porque a opinião pública da capital mostrou-se favorável às práticas da cultura política

oligárquica.

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Veja-se, a seguir, o mapa das zonas eleitorais da capital de suas respectivas

descrição e número de eleitores.

Figura 5 – Mapa das zonas eleitorais de São Luís (MA)

Fonte: TRE – MA 2010 (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

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Quadro 1 - Zonas Eleitorais de São Luís

Zona Áreas / Bairros Eleitorado

1ª Centro / Madre Deus / Canto da Fabril 55.295

2ª Monte Castelo / João Paulo / Filipinho / Fátima / Coroado / Sacavém 53.840

3ª Monte Castelo / Camboa / Liberdade / Alemanha / Ivar Saldanha /

Caratatiua / João Paulo / Jordoa / Outeiro da Cruz (Filipinho) / 57.145

10ª

Ipase / Maranhão Novo / Bequimão / Rio Anil / Angelim / Vila

Palmeira / Anil / Aurora / Radional / Santo Antonio / Cruzeiro do

Anil / João de Deus / Vila Lobão / Santa Cruz / Cohab Anil III / Vila

Isabel Cafeteira / Santa Bárbara / São Cristóvão / Cidade Operária /

Rio Grande / São Bernardo / São Raimundo / Jardim América / Santa

Clara / Vila Cascavel / Cidade Olímpica / Vila Janaína / Estiva /

Quebra-Pote / Tibiri / Itapera / Tajaçoaba / Tajipuru / Vila Magril

101.033

76ª São Francisco / Renascença / Cohafuma / Vinhais / Recanto dos

Vinhais / Cohama / Vicente Fialho / Cohaserma 65.127

88ª Turu / Olho d'água / Divinéia / Sol e Mar / Vila Luizão / Cohatrac /

Cohab Anil / Forquilha 73.114

89ª

Santa Bárbara / Rio Grande / São Bernardo / São Raimundo / São

Cristóvão / Jardim São Cristóvão / Cidade Olímpica / Cidade

Operária / Jardim América / Vila Janaína / Santa Clara / Vila

Cascavel / Estiva / Quebra-Pote / Tibiri / Itapera / Tajaçoaba /

Tajipuru / Vila Magril

103.219

90ª

Parque Timbiras / Coheb / Sacavém / Coroadinho / Ilha de Tauá-

Mirim / Vila Esperança / Maracanã / Pedrinhas / Estiva / Vila Itamar /

Vila Maranhão / Coqueiro / Porto Grande / Vila Nova República /

Rio Grande / Bom Jesus / Vila dos Frades

60.736

91ª

Vila Bacanga / Fumacê / Anjo da Guarda / Vila Nova / Bonfim / Sá

Viana / Vila Embratel / Vila Isabel / Vila Mauro Fecury / Vila São

Luís / Cidade Nova / Alto da Esperança / São Raimundo

67.405

TOTAL 636.914

Fonte: TRE-MA, 2010.

Veja-se, também, o resultado do 1º turno da eleição de 2010 nessas zonas

eleitorais.

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Tabela 6 – Resultado do 1º turno da eleição de 2010 das zonas eleitorais de São Luís

Zonas 1a 2a 3a 10a 76a 88a 89a 90a 91a TOTAL

Ro

sea

na

Sa

rney

21.091

50,9%

19.308

47,42%

20.661

47,36%

33.570

42,24%

21.035

39,54%

24.538

40,46%

34.698

41,78%

19.471

42,56%

21.419

41,91%

215.791

43,24%

Flá

vio

Din

o

12.859

31,03%

14.161

34,78%

13.941

31,96%

30.286

38,11%

23.041

43,32%

24.495

40,38%

31.302

37,69%

18.284

39,96%

21.067

41,22%

189.436

37,96%

Ja

ckso

n

La

go

6.020

14,53%

5.843

14,35%

7.294

16,72%

12.718

16%

7.680

14,44%

9.581

15,8%

13.975

16,83%

6.817

14,9%

7.180

14,05%

77.108

15,45%

Ma

rco

s

Sil

va

826

1,99%

826

2,03%

1.101

2,52%

1.741

2,19%

760

1,43%

1.148

1,89%

2.128

2,56%

777

1,7%

954

1,87%

10.261

2,06%

Sa

ulo

Arc

an

gel

i

591

1,43%

535

1,31%

582

1,33%

1.093

1,38%

651

1,22%

846

1,39%

896

1,08%

365

0,8%

437

0,86%

5.996

1,2%

Jo

siv

ald

o

Co

rrêa

51

0,12%

47

0,12%

47

0,11%

68

0,09%

26

0,05%

47

0,08%

45

0,05%

39

0,09%

50

0,1%

420

0,08%

TOTAL 41.438 40.720 43.626 79.476 53.193 60.655 83.044 45.753 51.107 499.012

Fonte: TSE, 2010.

Roseana Sarney obteve o maior percentual de votos na primeira zona eleitoral.

Esta abrange a Madre de Deus, “bairro representativo da diversidade cultural do Estado e

reduto de, pelo menos, 30 diferentes tipos de brincadeiras artísticas, culturais e religiosas

(NOGUEIRA, 2005, p. 12), que são financiadas pelo tesouro estadual, transformando-se em

marketing político, promovendo uma visibilidade midiática da governadora. Nesse espaço da

cidade, Roseana Sarney é vista como “protetora e provedora das manifestações da cultura

popular do Maranhão”, reforçando, desse modo, uma relação de dependência entre os

representantes da cultura popular e a detentora do mandato político. Nessa mesma zona

eleitoral, foram denunciadas várias irregularidades relacionadas à compra de votos por

políticos pertencentes à coligação da governadora reeleita, como se pode conferir mais

adiante.

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A única zona eleitoral da capital em que Flávio Dino, o segundo colocado, obteve

uma pequena vantagem em relação à governadora reeleita foi a76ª, que compreende os bairros

do São Francisco, Renascença, Cohafuma, Vinhais, Recanto dos Vinhais, Cohama, Vicente

Fialho e Cohafuma Essa zona congrega um eleitorado de classe média e de maior

escolarização, com acesso a outras informações, além dos meios de comunicação do grupo

dominante e por isso, esteja mais propenso ao chamado voto plebiscitário, em que a disputa

eleitoral fica polarizada entre a candidata da oligarquia e a nova oposição.

No pleito de 2006, o candidato Jackson Kepler Lago obteve a maioria dos votos

em todas estas zonas eleitorais de São Luís tanto no primeiro, quanto no segundo turno. O que

houve de um pleito para o outro? Seu fraco desempenho nas urnas da capital, nas eleições de

2010, deveu-se, entre outras razões, à forte campanha midiática contra seu governo, à greve

da categoria de professores da rede pública que se arrastou durante meses (será abordada no

próximo capítulo), aos escândalos de corrupção envolvendo parentes do governador e ao

processo de cassação por abuso de poder político e econômico que desgastou sua imagem de

candidato apto a concorrer ao pleito de 2010, fato demasiadamente explorado na campanha

pelo jornal O Estado do Maranhão. Todos esses fatores contribuíram para a grande rejeição

do eleitorado ao nome do ex-governador Jackson Lago nessa disputa. Veja-se, a partir do

gráfico abaixo, o alto índice de rejeição desse candidato.

Gráfico 12 – Taxa de rejeição do eleitorado para o ex-governador Jackson Lago na disputa

eleitoral de 2010

Fonte: TRE-MA (Arquivo do professor Wagner Cabral da Costa).

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Observa-se que a governadora Roseana Sarney apresentava também um

considerável índice de rejeição. No entanto, dispunha dos mecanismos inerentes à dominação

oligárquica, tais como: poder político, econômico e midiático, uso da máquina pública, apoio

do governo federal, além de relações privilegiados no Judiciário. Pôde, então, ser reeleita para

comandar pela quarta vez o estado do Maranhão.

4.2 Denúncias de crimes eleitorais no jornal oposicionista

As práticas sociais predominantes em tempo de disputas eleitorais são inspiradas

na concepção de que as eleições são sempre decididas por quem tem mais poder econômico e

político a seu dispor, uma vez que os velhos recursos de compra de voto, aliciamento do

eleitor e distribuição de benesses aos aliados são regras que fazem parte de uma cultura

política enraizada na consciência da maioria do eleitorado maranhense.

Na arena da luta política travada entre o periódico situacionista e o oposicionista,

coube ao Jornal Pequeno o papel de denunciar a existência da prática de crimes eleitorais

atribuídos ao grupo da governadora Roseana Sarney, como a notícia divulgada no dia 22 de

setembro de 2010:

Na manhã de ontem, atendendo a uma requisição do Ministério Público Eleitoral do

Maranhão, policiais federais se deslocaram até a um imóvel na rua Tadeu Pálacio,

S/N – área do Recanto dos Vinhais, para apurar denúncia de que ali estariam sendo

feitas consultas médicas gratuitas supostamente em troca de votos para os

candidatos Roseana Sarney, Ricardo Murad, Luciano Moreira e Manoel Ribeiro [...]

A Polícia Federal efetuou a prisão da proprietária do imóvel e de uma mulher que

estava sendo atendida no momento da operação policial. Com a dona da casa, foram

encontradas duas carteiras de Trabalho e Previdência Social com a foto dela e nomes

de outras pessoas, além de títulos eleitorais (POLÍCIA FEDERAL, 22 set. 2010, p.

3).

A médica presente na cena descrita era Silvana Teixeira, filha do ex-deputado

estadual Theophistes Teixeira, casada com um primo de Roseana Sarney, o ex-vereador e ex-

presidente da Câmara de São Luís, Deco Soares, filho do tabelião Tito Soares e de Conceição

Sarney Soares, esta, irmã do senador José Sarney. Mesmo com toda essa rede de parentesco

comprovada e das evidências encontradas, a governadora declarou não ter nada a ver com o

episódio. O periódico pertencente ao grupo Sarney não faz nenhuma menção ao caso e sua

manchete de capa, no mesmo dia em que o Jornal Pequeno faz a denúncia, anuncia a quarta

pesquisa de opinião de voto em que sua candidata é a opção preferida do eleitorado.

Outra importante denúncia publicada também no mês de setembro diz respeito à

utilização do efetivo militar do Estado para fazer segurança de apadrinhados políticos da

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governadora Roseana Sarney. O coronel Francisco Melo da Silva afirma, em carta enviada ao

Jornal Pequeno, que a família Lobão fazia uso de policiais militares para serviços

particulares. Eis a carta-denúncia enviada ao jornal.

Mais uma imoralidade ocorre no serviço público estadual. Um cabo da Polícia

Militar do Estado do Maranhão trabalha há mais de um ano como motorista para

uma empresa privada, com sede em Imperatriz. O policial é o cabo Marinho e seu

chefe é o empresário Luciano Lobão, proprietário da empresa Haitec. Este não é o

único caso. Pasmem! O coronel Caetano, que está classificado no Gabinete Militar

da governadora - cujo chefe é de posto inferior ao seu - trabalha para o senador

Lobão. Isso não é permitido, porque o artigo 1º, da Lei 8.507/2006, diz que os ex-

governadores tem direito a uma segurança pessoal no período correspondente ao que

estiveram no exercício do mandato. O senador Lobão deixou o Palácio dos Leões

em 1994. O coronel e outro PM não têm atividades nem no Gabinete Militar nem na

PMMA, mas sim em empreendimentos da família do senador. Tornou-se um hábito

reprovável neste governo, pessoas que não têm nenhum vínculo com a

administração pública do Estado ou exercem qualquer atividade de risco,

desfrutarem de privilégios de terem policiais militares trabalhando em atividade

particular, com custas para o Estado, em detrimento do serviço público. Enquanto

isso, vários municípios maranhenses, como Serrano do Maranhão, Cedral, Bacuri e

tantos outros, têm apenas dois policiais militares para darem segurança a milhares de

pessoas. Se isso não for uma imoralidade para a administração pública, pelo menos é

uma vergonha para aqueles que juram de pés juntos defenderem os interesses do

Estado e de seu povo. Hoje, o Gabinete Militar da governadora abriga mais do que

seu efetivo previsto na legislação estadual, exatamente para atender a seus

correligionários políticos.Enquanto a governadora disponibiliza policiais militares

para a atividade particular de seus aliados, os índices de criminalidade só aumentam

em todo o Estado, embora sua propaganda insista em mostrar o contrário. Mas,

como dizem os matemáticos, “os números não mentem jamais”. Ou como ensina o

ditado popular: “a mentira só dura enquanto a verdade não chega”. Como se

observa, neste governo acontece de tudo. Até mesmo desrespeitar uma decisão

da Corte da Justiça do Estado. No dia 25 de agosto do corrente ano, o TJMA,

por unanimidade de votos do Pleno, tornou nulo o ato da governadora que me

exonerou do mandato de Conselheiro do Cetran, me concedendo o direito

pleiteado, mas até a presente data a governadora não cumpriu a decisão do

Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Aqui é assim. Eles fazem tudo e

desrespeitam a todos, não cumprem a Lei e tampouco os princípios constitucionais

da administração pública, e, ainda se acham no direito de dizerem que tudo é por

conta da política. Nada disso, pois não sou candidato a nada, até a Lei me proíbe a

filiação partidária na atividade policial militar. Agora, o que a Lei não me proíbe,

aliás ela me assegura, como um direito fundamental é o direito de participação na

vida política do Estado, o que estou exatamente fazendo como cidadão. Não é pelo

fato de ser funcionário público estadual que devo me calar diante dos fatos ilegais

praticados por aqueles que tem por dever de ofício zelar pela coisa pública.

Finalmente ou infelizmente já dizia Kant: “As coisas têm preços e o ser humano tem

dignidade”. Portanto, todo ser humano é digno de ter as informações necessárias

para sua convivência em sociedade. Aliás, a dignidade de pessoa humana é mais do

que um direito, é um atributo (GOVERNADORA, 26 set. 2010, p. 3, grifou-se).

Pelo teor da carta, o coronel denunciante fora exonerado do cargo de conselheiro

do Conselho Estadual de Trânsito (CETRAN) e, só então, resolveu tornar público o fato de

policiais militares estarem fazendo a segurança de apadrinhados da governadora Roseana

Sarney. Mas não interessam as motivações da denúncia e sim o seu conteúdo.

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Numa realidade marcada pelo patrimonialismo, em que predominam as relações

pessoais, o Estado torna-se uma extensão da casa, da família, dos amigos. Os governantes

agem com base na “cordialidade”, como defende Holanda (2004). No sentido etimológico, a

palavra cordial é relativa ao coração, às preferências subjetivas, em que os correligionários

são tratados com grande benevolência, em prejuízo dos interesses da coletividade. Tal

cordialidade, de “fundo emotivo transbordante”, é capaz de fazer uso da inimizade e de

hostilidade em se tratando de adversários políticos, a ponto de se garantir proteção aos amigos

e perseguição aos inimigos com a mesma diligência.

Às vésperas do pleito, outra denúncia. O periódico oposicionista publica matéria

com o seguinte título: Coligação de Roseana distribui combustível no posto Araçagy. Quem

anunciou esse caso de abuso de poder econômico foi a coligação “O Povo é Maior”, que

apoiava o candidato Jackson Lago. De acordo com a publicação, mais de cem veículos faziam

fila para abastecer nesse posto, localizado em de São José de Ribamar, município onde, não

por acaso, Roseana Sarney obteve 53,5% dos votos, enquanto no pleito de 2006 obtivera

apenas 37,9% da preferência do eleitorado (TRE, 2006, 2010).

Outro forte indício de que houve abuso de poder econômico na eleição de 2010

aconteceu no centro da cidade de São Luís, gerando a denúncia de que eleitores tiveram suas

contas de água, luz e telefone pagas em troca de votos a candidatos pertencentes à coligação

da governadora Roseana Sarney. O episódio foi narrado, da seguinte maneira, pelo jornalista

Oswaldo Viviane, nas páginas do Jornal Pequeno:

A pedido do Ministério Público Eleitoral do Maranhão, a Polícia Federal está

investigando um suposto pagamento de contas de luz, água e telefone de pessoas

pobres em troca de votos em candidatos da coligação ‘O Maranhão não pode parar’

[...] o dono da lotérica aceitou falar ontem com o Jornal Pequeno, e confirmou o

caso. Seu nome não vai ser divulgado para não atrapalhar as investigações. Ele

informou que, por ocasião do pagamento da segunda remessa, o dinheiro que a

pessoa – um rapaz - trazia (R$ 10 mil) não foi suficiente. Então, ele foi buscar mais

R$ 10 mil. Mesmo assim o dinheiro não deu. “Ai, ele deixou um calhamaço de

contas aqui na casa lotérica e disse que ia pegar mais dinheiro, mas quando voltou

foi só para levar as contas”, disse o proprietário. Segundo ele, o rapaz ficou

desconfiado porque no momento em que somava os valores das contas, no

escritório, surgiu na sala uma repórter do jornal Folha de São Paulo (Elvira Lobato),

que investiga o caso. A repórter aproveitou a ausência do rapaz para conferir os

dados e fotografar contas e endereços de alguns dos moradores do Bairro do Lira,

ela chegou a suas casas. Confirmou que nessas residências e em várias outras do

bairro havia cartazes de Roseana Sarney e de Ricardo Murad (POLÍCIA

FEDERAL..., 3 out. 2010, p. 3).

Esta área pertence à Primeira Zona eleitoral, onde Roseana Sarney obteve o

melhor resultado eleitoral em São Luís. As imagens das contas de luz e da residência de um

dos beneficiados, divulgadas pela jornalista da Folha de São Paulo, são essas.

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Figura 6 - Captação ilícita de votos

Fonte: Jornal Pequeno, 3 out. 2010.

Enquanto esteve em São Luís para investigar o caso, a jornalista Elvira Lobato foi

alvo de alguns constrangimentos, teve sua foto e número de telefone celular publicados no

blog do jornalista Aldenísio Décio Leite Sá, ligado ao grupo da governadora Roseana Sarney.

Segundo relatou ao Jornal Pequeno (2010), ela passou a receber mensagens ofensivas em seu

celular, tais como: “Você envergonha a classe”, “Bandida, deixe o Maranhão em paz!”

(BLOGUEIRO, 3 out. 2010).

Nesse tempo de disputa eleitoral, os jornais constituem-se num campo de luta

simbólica e de expressão das práticas sociais. No município de São Luís, os leitores/eleitores

são receptores de visões de mundo distintas, marcadas pela visão do jornal governista, que

manipula a opinião pública em favor de seus interesses oligárquicos, ou por visões

oposicionistas, como a expressa pelo Jornal Pequeno, que tenta condicionar os leitores a uma

perspectiva mais republicana de gerência da coisa pública.

4.3 Reação da sociedade civil aos casos de abuso de poder político e econômico

Embora as práticas relacionadas a uma cultura oligárquica sejam muito forte na

capital do estado do Maranhão, estas não são consensual, uma vez que a dinâmica das

relações sociais é permeada pela correlação de forças antagônicas. Por isso, destaca-se a

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tentativa de setores da sociedade civil7 maranhense em coibir práticas abusivas cometidas

pela estrutura de poder patrimonial no ano eleitoral de 2010. Com este fim realizou-se no dia

20 de setembro, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Maranhão, uma

reunião para discutir ações a serem desenvolvidas pelo Movimento de Combate à Corrupção

Eleitoral, na qual estiveram presentes as seguintes entidades sociais: Cáritas Brasileira

Regional Maranhão; Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; Observatório Social de São

Luís; Associação do Ministério Público do Estado do Maranhão; Associação dos Magistrados

do Maranhão (ENTIDADES, 21 set. 2010).

O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral foi instituído no período eleitoral

de 2002, como movimento nacional, resultado da Campanha da Fraternidade de 1996,

“Fraternidade e Política”, dando origem à Lei 9840/99, “Lei da Compra de Votos”, de

iniciativa popular, que permite a cassação de registros e diplomas eleitorais daqueles que

desvirtuam o exercício da cidadania através de práticas irregulares de captação de votos

(SUBSÍDIO..., 2010). Como se vê, a existência de uma lei de combate à compra de votos é

recente em nosso país e ainda não se cristalizou no imaginário político nacional, carecendo de

um tempo de maturação para que possa se sedimentar nas consciências individuais e

coletivas.

Contribui para esse processo de maturação político-democrático a

mobilização/organização da sociedade civil, no intuito de questionar as práticas oligárquicas

petrificadas ao longo dos tempos, pois, “a sociedade civil representa o lugar onde se formam,

especialmente nos períodos de crise institucional, os poderes de fato que tendem a obter uma

legitimidade própria [...] o lugar onde, em outras palavras, desenvolvem-se os processos de

deslegitimação e de relegitimação” (BOBBIO, 2011, p. 37).

Nesta perspectiva, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a Associação de

Saúde da Periferia do Maranhão (ASP) e a Cáritas Brasileira Regional Maranhão promoveram

ação jurídica em desfavor da governadora Roseana Sarney Murad por abuso de poder,

captação ilícita de sufrágio, gastos ilícitos de campanha e fraude eleitoral cometidos no pleito

de 2010.

Por abuso de poder político, fora constatada a celebração de inúmeros convênios

com as prefeituras municipais às vésperas do período eleitoral, em desrespeito à norma da

moralidade administrativa, como consta da petição protocolada na Procuradoria Regional

7 Entende-se por sociedade civil, “grupos sociais independentes do Estado e que como tais limitam e restringem

a esfera do poder político” (BOBBIO, 2011).

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Eleitoral do Estado do Maranhão por aquelas entidades. Os convênios mencionados na

petição, que teriam sido efetivados de forma irregular, entre o governo estadual e as

prefeituras municipais aliadas são mais de quinhentos, havendo no documento a listagem dos

que constam no quadro a seguir:

Quadro 2 – Convênios efetivados de forma irregular entre o governo estadual e as prefeituras

municipais do Maranhão

Convenente

Nº de

convênios

celebrados

Período de liberação

dos recursos

Total de recursos

recebidos em R$

1. Prefeitura Municipal de Governador Edson Lobão 4 10.05 a 30.06.10 680.000,00

2. Prefeitura Municipal de Bacabal 5 10.05 a 14.09.10 2.727.396,66

3. Prefeitura Municipal de Presidente Dutra 6 11.05 a 01.07.10 725.000,00

4. Prefeitura Municipal de Lagoa do Mato 11 24.06 a 17.08.10 3.419.823,80

5. Prefeitura Municipal de Guimarães 3 24.06 a 01.07.10 445.284,00

6. Prefeitura Municipal de Santa Inês 15 02.02 a 21.09.10 3.146.521,23

7. Prefeitura Municipal de Governador Nunes Freire 4 23.06 a 30.06.10 275.000,00

8. Prefeitura Municipal de Barra do Corda 6 30.06 a 11.08.10 2.430.251,90

9. Prefeitura Municipal de Igarapé Grande 6 24.02 a 11.08.10 1.528.675,19

10. Prefeitura Municipal de Lago dos Rodrigues 5 11.05 a 30.06.10 644.854,76

11. Prefeitura Municipal de Itapecuru-Mirim 9 19.04 a 28.09.10 2.688.540,00

12. Prefeitura Municipal de Poção de Pedra 4 17.06 a 01.07.10 703.498,22

13. Prefeitura Municipal de Lajeado Novo 7 07.05 a 24.06.10 1.012.450,00

14. Prefeitura Municipal de Loreto 8 25.05 a 14.09.10 627.500,00

15. Prefeitura Municipal de Paraibano 7 24.05 a 01.07.10 1.316.000,00

16. Prefeitura Municipal de Mata Roma 9 07.06 a 29.09.10 4.121.666,68

17. Prefeitura Municipal de Parnarama 8 19.04 a 29.09.10 3.491.116,68

18. Prefeitura Municipal de Pedreiras 6 24.05 a 01.07.10 1.898.015,00

19. Prefeitura Municipal de Pinheiro 9 12.02 a 30.06.10 2.618.687,50

20. Prefeitura Municipal de Pirapemas 6 04.02 a 29.09.10 865.257,60

21. Prefeitura Municipal de Santa Quitéria 2 05.02 a 11.08.10 3.000.000,00

22. Prefeitura Municipal de Rosário 8 24.02 a 21.09.10 2.397.000,00

23. Prefeitura Municipal de São José de Ribamar 3 14.04 a 30.06.10 6.125.000,00

24. Prefeitura Municipal de Passagem Franca 9 09.06 a 21.09.10 3.527.743,90

25. Prefeitura Municipal de Miranda do Norte 8 28.04 a 01.07.10 2.912.877,21

26. Prefeitura Municipal de Magalhães de Almeida 11 09.06 a 16.08.10 2.905.000,00

27. Prefeitura Municipal de Coelho Neto 23 30.03 a 28.09.10 11.737.406,31

28. Prefeitura Municipal de Paço do Lumiar 3 11.05 a 01.07.10 1.694.201,68

29. Prefeitura Municipal de Governador Newton Bello 5 09.06 a 01.07.10 989.250,30

30. Prefeitura Municipal de Paulo Ramos 8 17.05 a 28.09.10 1.552.325,20

31. Prefeitura Municipal de Zé Doca 5 04.06 a 16.08.10 1.990.638,16

32. Prefeitura Municipal de Vitória do Mearim 6 24.06 a 14.09.10 2.032.790,19

33. Prefeitura Municipal de Dom Pedro 13 24.04 a 29.09.10 6.206.104,03

34. Prefeitura Municipal de João Lisboa 3 22.06 a 30.06.10 1.299.996,67

35. Prefeitura Municipal de São Luiz Gonzaga 5 16.04 a 10.08.10 1.850.000,00

36. Prefeitura Mun. de São Raimundo das Mangabeiras 3 23.06.10 1.230.000,00

37. Prefeitura Municipal de São Mateus 3 23.06 a 29.09.10 1.620.000,00

38. Prefeitura Municipal de São Pedro da Água Branca 9 09.06 a 30.09.10 2.025.325,20

39. Prefeitura Municipal de Lago da Pedra 10 20.05 a 16.09.10 3.811.746,86

40. Prefeitura Municipal de Pastos Bons 8 30.03 a 16.08.10 2.25.842,67

41. Prefeitura Municipal de Timon 11 23.06 a 01.09.10 3.176.752,55

42. Prefeitura Municipal de Codó 9 22.06 a 24.09.10 3.898.971,58

43. Prefeitura Municipal de Duque Bacelar 10 23.06 a 29.09.10 1.870.668,32

44. Prefeitura Municipal de Timbiras 5 23.06 a 29.09.10 1.890.000,00

45. Prefeitura Municipal de Gonçalves Dias 6 24.06 a 13.08.10 719.428,58

46. Prefeitura Municipal de Urbano Santos 4 21.06 a 02.07.10 1.230.000,00

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47. Prefeitura Municipal de Sta. Filomena do Maranhão 7 18.06 a 21.07.10 1.662.500,00

48. Prefeitura Municipal de Estreito 3 18.06 a 29.09.10 1.408.333,32

Fonte: ASSELIN, 2010.

Segundo o advogado responsável pela ação, o Pe. Victor Asselin, num período de

menos de 48 horas, os convênios foram assinados e publicados no Diário Oficial; foi feito o

empenho do valor, emitida a ordem bancária e creditado o dinheiro nas contas dos

municípios, que efetuaram saques diretamente “na boca do caixa”. De acordo com a petição,

tais convênios não objetivaram promover um fim público, mas somente cooptar lideranças

municipais a apoiar a reeleição da governadora Roseana Sarney, uma vez que as obras para as

quais o montante era liberado não haviam sido iniciadas até o dia 05 de julho de 2010. No

total foi liberado mais de um bilhão de reais a prefeituras, associações de moradores,

organizações não governamentais (ONG’s) e associações de classe.

É ainda atribuída à governadora Roseana Sarney, a utilização do programa social

Viva Casa durante a campanha eleitoral para angariar prestígio junto ao eleitorado, além de

usar a máquina pública para promoção pessoal ao utilizar a expressão “Governo do Maranhão

– De volta ao trabalho” como logomarca ao assumir o governo em 19 de abril de 2009 após

decisão do TSE de cassar o mandato do governador Jackson Lago, acusado de cometer

irregularidades muito parecidas com as que são denunciadas pelas entidades sociais.

Também foi denunciado, na emblemática eleição de 2010 para o governo

estadual, evidências de fraude eleitoral, com manipulação do sistema eletrônico de votação.

Com base na análise dos boletins das urnas, verificou-se um grande número de votos inseridos

após o horário das 17 h, chegando a verificar-se que algumas urnas ficaram abertas até após as

20h, sendo inseridos nesse horário 18.719 votos, dos quais 67,21% eram destinados à

governadora Roseana Sarney.

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5 A ELEIÇÃO ESTADUAL DE 2010: A Cultura Política de Professores

O desejo de investigar que valores e crenças norteiam as intenções de voto nasceu

de uma intensa discussão na sala dos professores do Liceu Maranhense, no dia seguinte ao

resultado do pleito da eleição estadual de 2010. Alguns professores questionavam por que a

governadora fora reeleita, sobretudo, quais motivos teriam levado as zonas eleitorais da

capital a garantir a vitória da oligarquia Sarney naquele pleito. Como parte do corpo docente

daquela escola, naquele ano, percebeu-se que alguns professores que declarara seu voto à

Roseana Sarney o faziam com certo constrangimento, até mesmo com um sentimento de

vergonha, alguns tentando se desculpar diante dos colegas. Desse episódio, veio a ideia de

investigar o imaginário político da capital maranhense a partir da participação daqueles atores

sociais, homens e mulheres que se expressam através de imagens e discursos, práticas e

sistemas de representação. A idéia de representação é aqui empregada, conforme já foi dito,

como compreensão do mundo social, exibição do ser social ou do poder político, com a qual

os indivíduos, os grupos, os poderes constroem e propõem uma imagem de si mesmos e da

sociedade (CHARTIER, 2002).

Optou-se, então, por ouvir alguns docentes do Liceu Maranhense, acerca do pleito

de 2010. E, com base nos seus depoimentos, procurar identificar ideias, crenças e valores que

norteiaram suas escolhas naquela eleição. De acordo com Garrido (1992/1993, p. 34), “as

fontes orais estão na base da mais antiga e da mais recente forma de fazer história”,

possibilitando, assim, não só incorporar indivíduos comuns na construção historiográfica, mas

também conhecer e compreender situações insuficientemente estudadas.

A intenção inicial era de entrevistar, no mínimo, dez professores. Porém, notando-

-se que as respostas começaram a ficar parecidas restringiu-se a apenas oito entrevistas.

Foram ouvidos seis professores e duas professoras, que serão mencionados com nomes

fictícios a fim de preservar suas identidades. A faixa etária dos entrevistados está assim

distribuída: três deles entre 31 a 40 anos; dois entre 41 a 50 anos; dois entre 51 e 60 anos; um

acima de 61 anos.

O fato de a autora desta dissertação pertencer à categoria profissional dos

entrevistados facilitou a abordagem aos colegas, embora alguns tenham demonstrado

desconfiança em relação à temática, e, por conta disso, tenham se recusado a participar da

pesquisa. De modo geral, a relação entrevistadora e entrevistados deu-se de forma tranquila,

embora no começo da gravação todos tenham tido uma postura mais tensa, preocupados com

a elaboração de um discurso que tivesse uma lógica, uma coerência. De acordo com

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Montenegro (1993, p.56-58), “essa postura de muitos entrevistados pode ser associada à

preocupação em evitar que o caráter contraditório e fragmentado da memória (e em última

instância das experiências interiorizadas) se torne do conhecimento público”. Ainda de acordo

com o autor citado, o que faz alguém registrar determinados acontecimentos, fatos e detalhes

diz respeito à cultura, ao inconsciente, à história individual e coletiva de cada um.

5.1 A memória histórica do político José Sarney

Seguindo a reflexão de Pollak (1992), pode-se afirmar que a memória não é

exclusivamente um fenômeno individual, estritamente íntimo, próprio da pessoa. Mas algo

construído coletivamente como fenômeno social, passível de flutuações, transformações,

mudanças constantes. O entendimento da memória como fenômeno social e coletivo é

atribuído ao estudo sociológico de Maurice Halbawachs (2006, p. 69), para quem “a sucessão

de lembranças, mesmo as mais pessoais, sempre se explica pelas mudanças que se produzem

em nossas relações com os diversos ambientes coletivos”.

Na fala dos professores e professoras entrevistados, essa relação dialética entre

memória individual e memória coletiva é bem significativa, sobretudo, a respeito da memória

histórica construída em torno da imagem do político José Sarney. Entende-se por memória

histórica, segundo Halbawachs (1992), a sequência de eventos cuja lembrança é conservada

nos livros e ensinada nas escolas, é portanto, uma memória organizada segundo critérios

metodológicos, políticos, inerente à operação historiográfica.

A professora Lindalva tinha dezoito anos em 1966, ano em que o então

governador José Sarney tomou posse no governo estadual do Maranhão. Ao se referir à

lembrança dessa época afirma:

As pessoas falam muito do Sarney, etc e tal, mas nós sabemos que essa credibilidade

que as pessoas antigas têm, tem um fundo de verdade. Quando ele sai da política do

mentor dele, o Victorino Freire, que ele é governador pela primeira vez no

Maranhão [...] a gente sabe que ele transformou o Maranhão, ele trouxe muita coisa

ele renovou, modernizou [...] (Entrevista realizada em 12 abr. 2012).

Essa memória histórica sobre a figura do ex-governador do Maranhão José Sarney

é cultivada pela historiografia tradicional, que o apresentada como ruptura em relação ao

período político anterior, como bem expressa este discurso sobre a campanha eleitoral de

1965 e o governo de José Sarney (1966-1970):

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Usando com habilidade e competência os veículos de comunicação, especialmente

nos centros urbanos, a mensagem de renovação, modernização, mudanças e

desenvolvimento varria o Estado inteiro, como um poderoso vento de liberdade,

levando de roldão todos quantos tentaram opor-se à sua candidatura [...] o

vitorinismo, como sistema de prática política e administrativa, estava

definitivamente aniquilado no Maranhão inteiro. O seu criador, Vitorino de Brito

Freire [...] faleceu, no Rio de Janeiro, a 27 de agosto de 1977, onze anos depois da

posse de José Sarney, quando o Maranhão retomava o caminho do desenvolvimento

econômico e social e abria novas perspectivas para ultrapassar o atraso cultural e

político (BUZAR, 1998, p. 497-499).

Tal interpretação, repetida tantas vezes, torna-se memória histórica e, ao mesmo

tempo, memória coletiva, permanecendo no imaginário do grupo social que a tem, sendo

transmitida às gerações mais jovens.

Na fala da professora Lindalva, quando afirma: “nós sabemos que essa

credibilidade que as pessoas antigas têm, tem um pouco de verdade”, há uma tentativa de

transferir a crença na credibilidade existente na figura de José Sarney às “pessoas antigas”, ou

seja, a professora transfere a outrem uma credibilidade e admiração, que ela mesma nutre a

essa personagem da história política maranhense. A mesma credibilidade e admiração foi

expressada pelo professor Francisco, de 37 anos, que, embora não tenha vivenciado a época

do governo Sarney (1966-1970), reproduz um discurso parecido. Veja-se: “Porque no

começo, Sarney, pelo menos eu encontro gente assim daquela época [...] alguém que viveu

aquela época, até hoje diz que o melhor governador do Estado foi Sarney, naquele tempo”

(Entrevista realizada em 11 mar. 2012).

Essa fala expressa um processo de socialização política, no qual ocorre um

fenômeno de projeção ou de identificação com determinado passado, tão forte que podemos

falar numa memória quase herdada (POLLAK, 1992). Nas entrevistas realizadas, somente

dois docentes não expressaram essa identificação com a referida imagem do governo Sarney.

Tanto a memória individual quanto a memória coletiva são organizadas de modo

que, “o que a memória individual grava, exclui, relembra, é evidentemente o resultado de um

verdadeiro trabalho de organização” (POLLAK, 1992, p. 204). Sendo assim, pode-se

asseverar que o imaginário político maranhense é fortemente marcado pela lembrança das

“grandes obras” perpetradas pela gestão do ex-governador José Sarney, e mesmo uma

categoria de profissionais como os professores se deixam enredar pelo discurso de

“desenvolvimento” e “progresso”, construído pela oligarquia Sarney a partir dos anos de seu

domínio político.

Esse discurso modernizador presente no depoimento de Lindalva, quando a

mesma diz: “ele transformou o Maranhão, ele trouxe muita coisa, ele renovou, modernizou

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(Entrevista realizada em 12 abr. 2012), faz menção às obras financiadas pelo Regime Militar,

tais como os empreendimentos que transformaram o Estado num pólo exportador de alumínio,

minérios, ferro-gusa. Opção por um modelo de desenvolvimento e expansão capitalista

favorecedor do grande capital nacional e estrangeiro sob o patrocínio do Estado.

Seguindo a linha de análise de Montenegro (2001, p.15, 16), “todo programa

político esta associado à reconstrução do passado [...] é sempre a partir de como se institui o

passado que são criadas as condições imaginárias para definições dos projetos políticos”.

Nesse caso, podemos supor que a gestão do ex-governador José Sarney (1966-1970) tornou-se

um marco importante na invenção do Maranhão Contemporâneo, tornando-se um modelo de

referência a seu grupo político na manutenção do domínio oligárquico.

Um único professor a fazer uma análise mais crítica a respeito da imagem do

governo Sarney foi José, professor de filosofia, que assim se manifestou sobre as

conseqüências da política oligárquica:

O Sarney no Maranhão é uma espécie de mito, as pessoas admiram como se ele

fosse genial, observe o nível nosso de achar genialidade no gênio do mal! Porque

nós somos incapazes de mudar nossa própria realidade, então nós achamos genial

aquilo que o sujeito faz, ainda que essa genialidade seja para a maldade e nós

paguemos por isso. Então, são várias as pessoas ditas esclarecidas que tem essa

admiração, uma certa veneração pelo Sarney, inclusive no seio de setores ditos de

esquerda (Entrevista realizada em 5 set. 2012).

O que se observa é que a memória constitui um objeto de disputa importante. O

grupo político dominante acaba por fazer um “enquadramento da memória”, como diz Pollak

(1992), a fim de privilegiar sua interpretação a respeito dos acontecimentos, possibilitando

que “a memória coletiva ou individual, ao reelaborar o real, adquire uma dimensão em uma

certa construção imaginária e nos efeitos que essa representação provoca social e

individualmente (MONTENEGRO, 2001, p. 201).

Ao chamar o senador José Sarney de “gênio do mal”, o docente possivelmente

tem em mente as conseqüências sociais das práticas políticas oligárquicas para o conjunto da

população, uma vez que o Maranhão ocupa a penúltima posição no ranking que mede o índice

de desenvolvimento humano dentre os estados da federação brasileira, como mostra o quadro

abaixo.

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Quadro 3 – Ranking do IDH dos Estados Brasileiro em 2005

1 Distrito Federal 0,874

2 Santa Catarina 0,840

3 São Paulo 0,833

4 Rio de Janeiro 0,832

5 Rio Grande do Sul 0,832

6 Paraná 0,820

7 Espírito Santo 0,802

8 Mato Grosso do Sul 0,802

9 Goiás 0,800

10 Minas Gerais 0,800

11 Mato Grosso 0,796

12 Amapá 0,780

13 Amazonas 0,780

14 Rondônia 0,776

15 Tocantins 0,756

16 Pará 0,755

17 Acre 0,751

18 Roraima 0,750

19 Bahia 0,742

20 Sergipe 0,742

21 Rio Grande do Norte 0,738

22 Ceará 0,723

23 Pernambuco 0,718

24 Paraíba 0,718

25 Piauí 0,703

26 Maranhão 0,683

27 Alagoas 0,677

Fonte: PNUD, 2008.

Ao responder o que pensava sobre a experiência política maranhense ao longo do

tempo, esse mesmo docente respondeu:

Olha, a prática política do Maranhão nesses últimos 50 anos não mudou em nada, só

aprofundou aquelas práticas nocivas à democracia, ao respeito às regras, porque aqui

as regras quem determina é quem está no poder. E isso, se a gente comparar o

período do Sarney ao período vitorinista a gente vai perceber que só houve um

aprimoramento das práticas. O Vitorino era mais troglodita e não escondia isso, o

outro é tão troglodita quanto, só que ele disfarça isso muito bem sob os auspícios da

literatura [...] só que usando o fardão da ABL, ele é bem sutil nessas coisas, só que é

uma sutileza que arrebenta o Estado, se você for ver a parte da grilagem [...] as terras

nossas foram loteadas e entregues aos grandes grupos nacionais [...] o Maranhão, eu

estou dizendo porque vivi no interior, produzia arroz e exportava para o Nordeste

todo, para boa parte do Sudeste, hoje o arroz que nós consumimos vem de onde?

Produzíamos feijão, milho, nada disso se produz mais. Produz soja, carvão, nossa

área verde dando lugar à soja e ao gado! (Entrevista realizada em 5 set. 2012).

O discurso desse professor coaduna-se com as análises realizadas por estudiosos

que se distanciam da versão oficiosa que cristalizou o discurso de que Sarney colocou o

Maranhão no “caminho do desenvolvimento econômico e social” (BUZAR, 1998). Como

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exemplo, cita-se o estudo de Gonçalves (2000, p. 183), para quem a Lei nº 2. 979/79,

conhecida como Lei de Terras do governo Sarney, deu posse legal de milhares de hectares a

grandes empresas que se alojaram em terras maranhenses de modo a promover a expansão do

agronegócio e do latifúndio, a devastação ambiental e a falta de incentivo à agricultura

familiar.

Ao abordar a questão agrária, o professor José diz conhecer a situação da

agricultura com o seguinte argumento: “vivi no interior”. Seus pais eram lavradores e essa

experiência, de certa forma, marcou a memória desse docente, pois ele viu muitos lavradores

deixando o interior do Maranhão por falta de perspectivas de sobrevivência no campo. A

referência à relação do senador Sarney com a literatura, importante capital cultural na

construção da imagem pública desse político, na visão do docente é parte de uma estratégia de

dominação simbólica que suaviza a imagem de oligarca desse líder político.

Porém, essa versão da “modernização” oligárquica é restrita a um grupo de

pessoas, como o professor de filosofia, que dos oito entrevistados foi o único a lembrar dessa

triste realidade da sociedade maranhense.

Para Eagleton (1997, p. 13), “o opressor mais eficiente é aquele que persuade seus

subalternos a amar, desejar e identificar-se com seu poder”, a dominação mais eficiente é

aquela em que os que estão submetidos passam a julgar seu próprio comportamento pelos

critérios de seus governantes. Assim, conjectura-se que haja uma cultura oligárquica

introjetada no cotidiano das práticas sociais maranhenses.

5.2 A internalização da cultura política oligárquica

“Há duas gerações de maranhenses que não

conhecem a liberdade política, nasceram sob o

domínio do ‘vitorinismo’ e provavelmente

morreram ou morrerão sob o domínio do

sarneysmo”. (PACHECO FILHO, 2001).

No Maranhão tem sido assim, o processo de socialização política é fortemente

estruturado na crença de que as práticas políticas consistem no domínio de um grupo

específico que se utiliza dos recursos estatais para favorecer seus próprios interesses e de seus

protegidos.

O paradoxal dessa realidade “consiste no fato do homem ser capaz de produzir um

mundo que em seguida experimenta como algo diferente de um produto humano (BERGER;

LUCKMAN, 2007, p. 87), como se a realidade social e histórica fosse uma fatalidade, uma

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condenação imposta pelos deuses, da ordem do sagrado. Uma sociedade para ser autônoma,

deve ser capaz de questionar suas leis, seus costumes, suas práticas políticas, do mesmo

modo, que o indivíduo para conquistar sua autonomia, deve instaurar outra relação entre seu

inconsciente e seu passado, como forma de superação de si mesmo (CASTORIADIS, 2002).

A maioria dos professores, que participaram desta pesquisa, mostraram certa

resignação quanto ao tipo de dominação política existente na sociedade, como se tal realidade

fosse naturalizada, fizesse parte da “tradição” presente nas estruturas morais e sociais,

incorporadas na atividade social diária dos indivíduos.

Ao falar de suas lembranças do município em que nasceu, a professora Lindalva

relatou, como se fosse um processo “natural”, o que ocorre em terras maranhenses desde a

formação do Estado Nacional até os dias de hoje.

O nome [do município] foi dado em homenagem a meu pai, [...], se pegar os livros

dos municípios, IBGE, na Biblioteca Pública, tu vai ver que a história do[

município] é misturada à história de meu pai, o nome [do município] é porque meu

pai era chamado [assim], então foi dado em homenagem a ele. O primeiro grupo,

estabelecido de ensino comum, que foi um grupo escolar foi o nome do meu irmão

mais velho [...] foi ele que construiu a casa, o primeiro sobrado, que foi a primeira

casa de mais de um andar de toda região, tem a casa de pedra dos meus pais, foram

eles que construíram o primeiro mercado público do [município], foi construído por

eles, então foi dado em homenagem a ele, meu pai foi o fundador da cidade [...] tem

uma escola muito linda que inauguraram há dois anos atrás, a mais moderna de lá,

linda a escola, uma estrutura linda! Que deram o nome dele, nós fomos para a

inauguração, e eu que puxei o laço, aquelas coisas todas, foi chique, ah, foi bom! [...]

O primeiro prefeito foi o meu irmão [...], ele era político, [...], os filhos dele foram

prefeitos, vereadores. Depois foi o [...], que é meu sobrinho, a mulher dele foi não

sei quantas vezes, foi até deputada também, e hoje quem ta lá é um representante

dela [...], um candidato dela que ganhou e agora já vai ser [ela] de novo, que é

esposa do meu sobrinho, que vai ser candidata. Se você for fazer uma análise da vida

[do município], ou é da família, ou é descendente ou é agregado (Entrevista

realizada em 12 abr. 2012).

Na perspectiva de Hunt (2007), a política é moldada pela cultura. No caso da

cultura política oligárquica, as crenças, os ideias, as normas e as tradições que dão significado

à vida política maranhense são fundadas no personalismo, no patrimonialismo e na

perpetuação de um grupo familiar/político no controle da máquina pública, como demonstra a

fala dessa docente do Liceu Maranhense. O republicanismo democrático não faz parte dos

valores e costumes da grande maioria da população maranhense. O velho hábito de nomeação

dos prédios públicos com o nome dos governantes representa uma faceta da dominação

oligárquica que se exerce de maneira sutil, eficiente, capaz de mostrar a todos, de forma

simbólica, quem é que manda, quem exerce o poder político.

Segundo Chartier (2002), esta estratégia de dominação simbólica tem como

objetivo “o ordenamento do mundo social” capaz de produzir, “sem apelo a nenhuma

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violência, a obediência e a submissão” dos indivíduos perante o poderio de um determinado

grupo social.

Uma das perguntas feitas aos professores foi como eles abordavam os temas

políticos na sala de aula. Veja-se as respostas dadas por Francisco e João, os professores de

geografia entrevistados:

Eu acho que falar de política é necessário, mas assim, falar no sentido de despertar o

senso crítico, não a crítica pela crítica, jamais fiz isso, ir para a sala de aula falar mal

da família Sarney, da família Jackson Lago. Não, eu acho que o caminho não é esse,

mas falar da política verdadeira, da necessidade de você se posicionar, de você

votar, de você tentar mudança, acho que isso é necessário e isso eu faço em minhas

aulas [...] eu não fiz muito comentário desse eleição na sala de aula porque a gente

tem praticamente os mesmos personagens, né? Você vê surgindo aí o Flávio Dino, e

algum outro a mais, mas você vê que os personagens são praticamente os mesmos

[...] eu não tive oportunidade, talvez por falta de interesse mesmo, de fazer

comentários mais aprofundados acerca dessa eleição (Entrevista realizada em 6

ago. 2012, grifo-se).

A minha disciplina, ela nos dar esse suporte, para você ta buscando sempre a política

como solução para esses problemas, então nós abordamos o seguinte, citamos

partidos políticos, mas não defendemos partidos políticos. O que se faz? Tenta-se

mostrar que o ser humano por si só é um ser político, aquele que decide, aquele que

discursa, necessariamente você não precisa ter atrelamento a um partido para ser

político, o ser humano tem esse dom de ser político por nascença, e eu abordo o

seguinte, criticando o que tem sido feito, mas não dizendo que é por ‘A’, por ‘B’,

por ‘C’. Mas criticando o que tem sido feito e mostrando que poderia ser feito mais,

ser de fato alguém preocupado com as condições sociais, com as condições

econômicas, ta certo? Então nós criticamos o sistema, digamos que há vinte anos

atrás, o Maranhão está melhor do que a vinte anos, São Luís está melhor. Não

criticamos ideologias, não criticamos partidos. Nós falamos muito isso, o Brasil hoje

está melhor do que há vinte anos atrás, então, o mérito se dar ao processo evolutivo

de tudo, o que acontece hoje. Hoje eu estou melhor do que meu pai, meu pai tava

melhor do que meu avô, então é uma evolução normal, gradativa, ta certo? Não

devemos dizer que o Brasil tá melhor em função dos atuais gestores, é um processo

evolutivo, e melhorou de fato (Entrevista realizada em 4 jun. 2012, grifo nosso).

De modo geral, a significação mais comum do termo política é de “arte ou ciência

do governo”, como a utiliza o cientista político Norberto Bobbio (2010, p. 958), para quem

Toda história da filosofia política está repleta de definições normativas, a começar

pela aristotélica: como é bem conhecido, Aristotéles afirma que o fim da política não

é viver, mas viver bem. Mas em que consiste uma vida boa? Como é que ela se

distingue de uma vida má? E, se uma classe política oprime os seus súditos,

condenando-os a uma vida sofrida e infeliz, será que não faz Política, será se o poder

que ela exerce não é um poder político?

A resposta do professor João expressa uma visão de que a política é necessária

para a organização social, é uma espécie de “dom” que acompanha os homens desde o

nascimento, sem que isso os desperte para os conflitos sociais, já que, a sociedade se ajusta

pelo “processo evolutivo de tudo”. Essa compreensão talvez se explique pela resignação com

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a sua realidade, a sua prática educacional, como ato de fala, como exercício retórico e ato

performativo, represente um anseio de perenidade em relação à ordem estabelecida

(GOLDENBERG, 2006).

Nas palavras de Castoriadis (2002, p. 73),

uma sociedade autônoma, uma sociedade verdadeiramente democrática, é uma

sociedade que questiona qualquer sentido pré-dado, e na qual, por isso mesmo, está

liberada à criação de novas significações. E, numa tal sociedade, cada indivíduo é

livre para criar o sentido que quiser (e puder).

Esse projeto de autonomia individual e coletivo, defendido pelo autor, passa

necessariamente pela educação, aposta na criação de um sujeito imaginador e reflexivo, capaz

de imaginar outra realidade possível. Ao ver as mudanças sociais como um mero processo

evolutivo, o docente não exerce o papel transformador que poderia ter.

6.3 A “Lei do Cão” e o desencanto dos professores com Jackson Lago

A julgar pela fala de Antonio, outro docente entrevistado, a eleição do governador

Jackson Lago, em 2006, contou com a colaboração de grande parte da categoria de

professores da rede pública estadual, contagiados pela vontade de romper com os anos da

oligarquia Sarney. Esse docente comentou: “carreguei bandeira no meu carro, tinha adesivo,

algo espontâneo [...] nunca fui partidário, mas tive aquela esperança, assim como tinha o

adesivo do Lula, tinha o adesivo do Jackson Lago, eu acreditava, tinha esperança de

mudança” (Entrevista realizada em 5 nov. 2012).

A esperança de mudança é um dos elementos da “cultura política da libertação”

propagada no Maranhão desde o cenário político dos anos de 1950, como defende Costa

(2009a). Tal cultura política libertadora carrega os ideais liberais democráticos como bandeira

de luta contra o governo oligárquico de plantão.

Em linhas gerais, a eleição de 2006 representou a disputa de duas facções

oligárquicas pelo controle da máquina pública (COSTA, 2009b). Uma facção formada pela

oligarquia Sarney, com fortes laços junto ao governo federal, sua base de sustentação. A

outra, em gestação, representada pelo ex-governador José Reinaldo Tavares, antigo aliado do

grupo Sarney, agora na oposição, apoiando a candidatura do médico pedetista Jackson Lago,

figura importante no cenário político maranhense no âmbito da oposição ao Regime Militar.

Sendo um histórico representante dos anseios das demandas democráticas

(participação popular, ampliação de direitos, controle social, combate à corrupção), a

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candidatura Jackson Lago representou, pelo menos no plano discursivo, a possibilidade de um

governo “democrático e popular”. Tal perspectiva mostrou-se totalmente frustrada diante das

atitudes do seu governo, ao repetir as mesmas práticas clientelistas e patrimonialistas, que

configuraram o modus operandi do grupo oligárquico alijado do poder no pleito de 2006.

Para os professores da rede pública estadual, a medida do novo governo que mais

causou descontentamento foi a mudança na política salarial, as transformar os salários dos

servidores em subsídio, sem consultá-los. O subsídio é uma forma de retribuição pecuniária

prevista na Constituição Federal, no artigo 39, parágrafo 4º. Podem recebê-lo:

O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os

Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio

fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional,

abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória (BRASIL,

1988, p. 45).

Através da Lei estadual nº 8.592, de 2007, o governo Jackson Lago quis impor a

todo o funcionalismo público estadual o pagamento dos salários através do subsídio. A

intransigência do governo levou os professores a declararem uma greve, que durou 87 dias,

contra a “Lei do Cão”, como ficou conhecida a referida lei. A greve, nas palavras do professor

Antonio, foi difícil de ser construída porque a maioria dos docentes não entendia as

conseqüências da Lei e o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública no Estado do

Maranhão (SINPROESSEMA) era da base de apoio do governo.

Olha, a greve de 2007 foi uma greve difícil de ser construída, de ser montada porque

todas as greves anteriores, que eu participei, que a classe participou era para

reivindicar algo mais concreto como melhoria salarial, como reposição de perdas

[...]. Mas a greve específica de 2007 foi um objeto um pouco abstrato e meio que

incompreensivo na cabeça de grande parte da nossa classe, que era a questão do

subsídio [...]. O que era o subsídio, quais eram as conseqüências, quais eram as

perdas que por ventura poderiam ter? E a gente entendia naquele momento, que a

forma de subsídio é uma forma específica para determinadas carreiras, como

ministros, juízes, pessoas que têm certas vantagens que compõem aquele benefício

mensal, os proventos. Mas, no caso de uma classe trabalhadora, com pouca

valorização, certamente que viriam perdas futuras, né? Pessoas que estavam por se

aposentar, uma vez tendo contribuído a vida toda, estavam com medo de perder

benefícios [...] e vendo este tipo de sofrimento, as pessoas nessa situação, a gente

teve que parar, refletir, analisar, e tentar dar um basta naquilo tudo, né? Mobilizar a

categoria, mas volto a dizer, muito difícil! A gente percebia pessoas idosas

preocupadas com o que iria acontecer, e nós tentamos de todo modo abrir um canal

de diálogo com o então governador Jackson Lago para que a gente pudesse fazer um

bom combate, uma boa discussão, retornar à situação inicial, para que voltássemos o

que era, e aí sim, apresentar as suas justificativas, os seus porquês, lembro-me que

algumas vezes ele chegou a dizer que era para o bem da categoria, que a Lei do

Subsídio queria pegar os peixes grandes, os altos salários, mas nós não nos

enquadrávamos nessa situação, uma vez que historicamente temos sido uma classe

desvalorizada, desfavorecida e com pouco valor dado pelos nossos governantes!

(Entrevista realizada em 5 nov. 2012).

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As preocupações elencadas pelo professor tinham suas razões, uma vez que as

desvantagens do subsídio superavam as suas vantagens para essa categoria profissional. Como

vantagem, a Lei 8.982/2007 poderia ter incorporado a gratificação ao salário base dos

professores, o qual, à época, era de R$ 589,14 e a gratificação de R$ 765,88. Porém, os

professores perderiam a possibilidade de implantação de adicionais de localidade inóspita, de

periculosidade, insalubridade, de risco, além do pagamento de adicional de serviço

extraordinário, a hora extra. Sem falar que as carreiras que recebem por subsídio, em geral,

possuem limitações de quantidade de vagas em cada faixa salarial, condicionando a promoção

à existência de vaga, o que certamente dificultaria as progressões, pois, nesse caso, para

atingir o teto da carreira o servidor teria que esperar a aposentadoria de outro. Outra questão a

preocupar os docentes era quanto ao reajuste dos salários, que geralmente é feito de acordo

com o salário mínimo. Com a implantação do subsidio, não havia garantias de reajustes

periódicos (SUBSÍDIO..., 2010).

O que tornou emblemática a greve de 2007, foi o fato de o governador Jackson

Lago ter sido eleito com o apoio de grande parte desses profissionais, e a forma autoritária

com que os professores foram tratados, com corte de ponto, desconto nos salários, ameaça de

demissão, substituição dos docentes em greve por professores contratados. Tais medidas

enfraqueceram demasiadamente a imagem do governo que havia prometido libertar o

Maranhão do jugo e da opressão da oligarquia Sarney.

Esta, por sua vez, soube instrumentalizar a seu favor a inoperância do governo

Jackson Lago, em lidar com a insatisfação dos professores grevistas. De uma hora para outra,

o Sistema Mirante de Comunicação (rádio, TV e jornal) passou a apoiar a greve e o principal

partido controlado no Maranhão pela oligarquia, o PMDB, assumiu a defesa dos direitos dos

trabalhadores, entrando com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) no Superior

Tribunal de Justiça (STJ), onde a “Lei do Cão” foi finalmente revogada (COSTA, 2009b).

Esse episódio ficou tão marcado na memória dos docentes que, nas entrevistas

sobre a eleição de 2010, muitos confundiam-na com o pleito de 2006. A imagem registrada

sobre o governo Jackson Lago pode ser assim representada na fala da docente Maria, de

língua portuguesa: “foi doloroso em todos os aspectos, primeiro, a greve nos atingiu

diretamente, e segundo, a cassação [...] não sei se foi injusto, para mim eu tenho uma

decepção ver alguém que eu acreditei, que eu apostei num mar de lamas” (Entrevista realizada

em 30 abr. 2012).

Dos oitos professores entrevistados, seis votaram em Jackson Lago em 2006,

desses seis, só um repetiu o voto no mesmo candidato em 2010. O único professor a votar em

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Jackson Lago em 2010 havia sido militante do PDT e, depois, do PT, bases aliadas do

governo deposto em 2009 pelo TSE. Quanto às motivações que levam à escolha dos

candidatos, percebe-se que as relações de amizade com o candidato escolhido e o prestígio

deste com o governo federal foram as mais significativas, além do desencanto com as

promessas de mudanças do governo Jackson. A questão das ideias políticas é o menos

significativo em tais motivações dos votantes.

Um dos docentes de geografia, por exemplo, votou em Jackson Lago em 2006

“porque a esposa era Jackson Lago”. Em 2010, votou no candidato do PCB, Josivaldo Correa,

porque, entre outras questões, foram colegas na universidade, como explica o professor:

O Josivaldo foi aluno da UFMA e foi meu colega de turma desde o primeiro período

até o período da formatura, ele é geógrafo e professor do Estado e do município de

São José de Ribamar, mora até hoje em Ribamar, por essa proximidade e pela

amizade acabei votando com ele [...] ele sempre foi uma pessoa atuante na política,

nos movimentos sociais, nos movimentos de bairro, no movimento da UFMA

(Entrevista realizada em 4 jun. 2012).

Apesar de mencionar a atuação política do candidato e sua participação nos

movimentos sociais, a fala do professor é enfática em afirmar os laços de proximidade e

amizade que acabam determinando sua opção pelo candidato do PCB. Isso reforça o que

afirma Orlandi (2003, p. 20): “o sujeito de linguagem é descentrado, pois é afetado pelo real

da língua e também pelo real da história, não tendo o controle sobre o modo como elas o

afetam. Isso redunda em dizer que o sujeito discursivo funciona pelo inconsciente e pela

ideologia”.

Ideologia, vista como o conjunto de ideias que orienta determinados grupos

políticos e instiga à luta pela conquista do poder, relaciona-se com a idéia de cultura política.

De acordo com Motta (2009, p. 27-28):

Pode-se até dizer que muitas das culturas políticas consistentes possuem ideologias,

entendidas como um sistema de ideias que constitui seu cerne. Mas é importante não

resumir uma coisa à outra, e perceber que a cultura política transcende e vai além da

ideologia, ao mobilizar sentimentos (paixões, esperanças, medos), valores (moral,

honra, solidariedade), representações (mitos, heróis) e ao evocar a fidelidade a

tradições (família, nação, lideres).

Entende-se, portanto, porque as questões pessoais na cultura política do Maranhão

sejam um importante elemento definidor das relações entre os sujeitos sociais e seus

representantes políticos.

Veja-se agora o caso da professora Lindalva, eleitora de Roseana Sarney em 1994,

1998, quando a representante da oligarquia Sarney foi eleita e reeleita governadora estadual.

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Em 2006 a professora votou em Jackson Lago, mas em 2010 voltou a depositar sua confiança

na candidata do grupo Sarney.

Nós tivemos uma discussão na reunião que nós fomos. Nós fazemos uma reunião em

família que é uma vez por mês, nós nos juntamos, a gente faz um lanche, todo

mundo conversa, faz uma oração. [...] E nessa reunião, nós discutimos muito [...]

uma tia que é procuradora, falou que dessa vez ela ia dar um voto para

Roseana pela primeira vez porque as dificuldades da gente ir [ao município em que

nasceu], com aquelas estradas horrorosas. Quando ela imagina que ela pega o carro

dela agora e vai, parece um tapete a estrada! Aquilo tudo para a gente dela, para os

agricultores, as pessoas que moram naquela cidade que ela amava, que ela via a

felicidade deles com aquela estrada. Então dessa vez ela ia votar [...] aí eu disse que

dessa vez eu também iria votar [...] e também pelo jeito que estava encadeada a

questão política, a Dilma Roussef lá em cima, o pai dela lá em cima, então se ela

ficar aqui, vai ter tudo para melhorar isso aqui. Se eles quiserem fazer de acordo

com que ela promete, que a gente não acredita tanto, eu acho que vai ser a chance

que ela tem de resgatar muita coisa [...] As pessoas falam muito do Sarney, etc. e tal,

mas nós sabemos que essa credibilidade que as pessoas antigas têm, tem um fundo

de verdade [...] a gente sabe que ele transformou o Maranhão, ele trouxe muita coisa,

ele renovou, modernizou. [...] E eu pensei assim, eu vou votar nela agora justamente

porque ela tem todas as chances de fazer um bom governo (Entrevista realizada em

12 abr. 2012, grifo nosso).

Pelo discurso apresentado, há uma intenção de acentuar que sua família não é

adepta incondicional da oligarquia Sarney. Mas “o inconsciente não se deixa trair” (RICCI,

2005), e em outro momento da entrevista havia dito que votou em Roseana Sarney em 1994 e

1998. Agora, julgava que a candidata iria “resgatar” o clima de euforia desenvolvimentista

vivenciado nos anos de 1960, quando da posse de José Sarney no Palácio dos Leões, imagem

constantemente explorada pelo jornal O Estado do Maranhão, na campanha de 2010, ao

anunciar que os “grandes empreendimentos” financiados pelo governo federal voltariam,

sobretudo, com a aliança com a então candidata Dilma Rousseff, com destaque para a

instalação da refinaria da Petrobrás.

Em outra entrevista, há uma clara contradição. O professor Francisco afirma que

as práticas oligárquicas prejudicam o estado:

Nós, no Maranhão, temos uma marca antiga, que é exatamente a marca da oligarquia

[...] que há muitos anos, já há algumas décadas vem sendo colocada em prática em

nosso Estado e a gente tem percebido que talvez por conta desse predomínio, dessa

dominação o Estado não tenha conseguido avançar tanto quanto poderia, a prova

disso é que a gente vê o Maranhão aí como uma das unidades da federação brasileira

de menor poder aquisitivo, uma das unidades da federação brasileira de menor poder

aquisitivo, uma das mais pobres na realidade [...] (Entrevista realizada em 6 ago.

2012).

Porém, ao ser perguntado, em quem votou para governador em 2006, o mesmo

professor respondeu:

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(risos) ai, ai, ai, eu acho, não tenho certeza [...] mas eu tenho a impressão que votei

para Roseana, eu tenho a impressão, não tenho certeza, mas eu lembro que teve um

período desse ai que eu votei para Roseana, e não está muito distante não. Acho que

foi essa eleição, eu votei para ela, que contradição, né? (Entrevista realizada em 6

ago. 2012).

Assim como na clínica psicanalítica, não basta uma explicação racional do

problema enfrentado para que o analisando mude suas atitudes, o entendimento sobre os

malefícios provocados pelas práticas oligárquicas não basta para que o sujeito modifique seus

atos e deixe de reproduzir os valores de uma cultura política oligárquica.

Outro trecho da fala da professora Lindalva resume bem o que seja a cultura

política oligárquica:

Infelizmente nós, brasileiros, não somos politizados, a gente, a maioria defende seus

interesses, eles votam porque alguém deu emprego, porque alguém é bonito, por

alguma promessa que foi feita, que vai pagar a luz, vai pagar a água, porque é amigo

não sei de quem, né? (Entrevista realizada em 12 abr. 2012).

Apesar de usar o pronome na primeira pessoa do plural, “nós”, para afirmar a falta

de formação política da maioria da população, quando se refere às motivações do voto o

pronome utilizado é “eles”, na terceira pessoa do plural, para comunicar que são os outros que

se utilizam das práticas oligárquicas. Isso porque não é comum assumir, que a cultura do

favor, do paternalismo, das relações clientelistas e personalistas façam parte das práticas

político sociais de um segmento da classe média, como os professores do Ensino Médio.

No entanto, é voz corrente ser uma prática das campanhas eleitorais no estado do

Maranhão, a compra de votos. Em 2010, essa “tradição” teria sido celebrada de forma abusiva

e explícita por parte da candidata da oligarquia Sarney, como comentou Antonio, um dos

docentes entrevistados:

[...] a compra de votos foi descarada, a compra de vereadores, sobretudo em São

Luís. Tínhamos 21 vereadores, e ela chegou a ter 16 dos vereadores nas mãos, então

é algo assim muito grave! Não se comprou o voto, comprou-se aquele que tem o

voto, as lideranças, aquele que caminha, aquele que leva um cano, aquele que fura o

poço, os ditos vereadores comunitários (Entrevista realizada em 10 out. 2012).

É importante esse comentário para mostrar que, apesar do controle da informação

exercido pelos canais de mídia do grupo dominante, esta não é a única voz, há sempre a

possibilidade de refutar as “informações” veiculadas pela mídia oficiosa.

Mas, enquanto todos os cidadãos maranhenses tomaram conhecimento do

processo de cassação do ex-governador Jackson Lago, por ter sido um episódio

espetacularizado de todas as formas pelas mídias local e nacional, pouco se fala do processo

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em tramitação para a cassação da governadora Roseana Sarney, acusada de cometer os

mesmos abusos político e econômico pelos quais o ex-governador foi acusado, julgado e

condenado.

Dos docentes entrevistados, seis sabiam da existência do processo que tramita no

Tribunal Superior Eleitoral, pedindo a cassação da governadora eleita em 2010, mas não

acompanhavam a tramitação; um não sabia da existência do processo, e achava que não exista

nenhuma acusação à governadora; e somente um professor tinha informações mais detalhadas

sobre essa questão.

5.4 O perfil dos professores entrevistados

Os professores do Liceu Maranhense cultivam certo orgulho de pertencerem a esta

instituição escolar em virtude da memória histórica desse estabelecimento de ensino, fundado

em 1838, como uma das mais importantes escolas secundárias brasileiras, cujo modelo foi

inspirado no Colégio D. Pedro II, o Liceu da Corte. Como parte da rede pública estadual de

ensino do Maranhão, atualmente o Liceu tem a melhor estrutura física dentre as demais

escolas, com a seguinte composição: 20 salas de aulas (com ar refrigerado); salas da direção,

de reunião, da coordenação, da secretaria, dos professores, de artes e da secretária do diretor;

laboratórios de física, química, matemática, biologia e de artes visuais; biblioteca; cantina;

núcleo de informática; quadra coberta; 11 banheiros; cantina e herbário.

Não há concurso público específico para esta escola, oficialmente não há distinção

entre os docentes da rede estadual, mas os professores liceístas gostam de dizer que fazem

parte da “elite da escola pública” do Maranhão. Nesse sentido, cultiva-se um imaginário de

glória e esplendor vivenciado no período Imperial, época de grande evidência da produção

cultural maranhense. Sendo o Liceu a escola dos filhos da elite agrária e escravista, com um

professorado composto pelos nomes mais ilustres da intelectualidade maranhense, a exemplo,

de Francisco Sotero dos Reis, homem de família abastada, um dos primeiros maranhenses a

estudar em Coimbra, catedrático de Latim (MONDEGO, 2005)

Por conta dessa memória histórica e do fato de a autora desta dissertação ter

ministrado aulas de história nessa instituição, entre os anos de 2007 a 2010, esta escola foi

escolhida como lócus para se observar práticas da cultura política vigente na cidade de São

Luís do Maranhão, uma vez que o espaço da escola representa também o espaço das

correlações de forças vigentes na sociedade.

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Atualmente, o Liceu Maranhense atende aos filhos da classe média baixa da

capital que vislumbram ingressar no ensino público universitário através do Exame Nacional

do Ensino Médio (ENEM) e do Programa Universidade para Todos (PROUNI), ambos do

governo federal, sendo o segundo a concessão de bolsas integrais e parciais aos alunos de

escolas públicas em instituições privadas de ensino superior. O corpo docente é formado por

professores concursados, que, geralmente, possuem mais de uma nomeação e, por isso, às

vezes trabalham também em outra escola da rede de ensino público. Os entrevistados

representam um perfil de classe média, têm formação cristã e, alguns, possuem cursos de pós

graduação, como mostra o quadro abaixo.

Quadro 4 - Dados dos professores

Nome Residência Graduação Curso Pós-Graduação Religião

Lindalva Recanto dos Vinhais UFMA História UFMG (Lato sensu) Católica

Francisco Maiobão UFMA Geografia Católica

Maria São Francisco UFMA Letras Católica

Raimundo Sol e Mar UFMA Química UFMA(Lato sensu) Protestante

José Renascença UFMA Filosofia Católica

Luis Maranhão Novo UFMA História Kardescista

Antônio Vivendas do Turu UFMA Matemática FAMA (Lato sensu) Católica

João Cohab UFMA Geografia Católica

Fonte: Entrevistas concedidas à autora em 2012.

Em estudo sobre “A decisão do voto nas eleições presidenciais brasileiras”,

Carreirão (2002) sustenta a tese de que os principais fatores considerados pelos eleitores são

certas imagens políticas que os votantes têm dos candidatos e partidos (sejam relacionadas às

dimensões de esquerda e direita, sejam relacionadas aos interesses que eles defendem), assim

como avaliação de desempenho administrativo e a avaliação que fazem de certos atributos

pessoais dos candidatos. Para esse analista, as formas como os eleitores votam variam muito,

de acordo com a escolaridade, mas, de modo geral, não há um “eleitor altamente informado e

que vota ideologicamente no partido cujas posições políticas mais se aproximem das suas”.

Veja-se como foi o voto dos entrevistados nas últimas eleições para o governo estadual, de

acordo com o quadro abaixo.

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Quadro 5 - Voto dos docentes para governador

Nome 2010 2006 2002

Lindalva Roseana Sarney (PMDB) Jackson Lago (PDT) 1º turno

Roseana Sarney (PMDB) 2º turno

Jackson Lago (PDT)

Francisco Marcos Silva (PSTU) Roseana Sarney (PMDB)

1º e 2º turnos

José Reinaldo Tavares (PFL)

Maria Saulo Arcangeli (Psol) Carlos Saturnino (Psol) 1º turno

Jackson Lago (PDT) 2º turno

Francisco Chagas (PSTU)

Raimundo Roseana Sarney (PMDB) Roseana Sarney (PMDB)

1º e 2º turnos

Voto nulo

José Jackson Lago (PDT) Jackson Lago (PDT) 1º e 2º turnos Raimundo Monteiro (PT)

Luis Voto nulo Jackson Lago (PDT) 1º e 2º turnos Jackson Lago (PDT)

Antônio Marcos Silva (PSTU) Jackson Lago (PDT) 1º e 2º turnos Jackson Lago (PDT)

João Josivaldo Correa (PCB) Jackson Lago (PDT) 1º e 2º turnos Jackson Lago (PDT)

Fonte: Entrevista concedida à autora em 2012.

De acordo com o quadro, na eleição de 2002, Lindalva votou em Jackson Lago,

durante a entrevista disse ter votado nesse candidato, por conta de um vizinho que trabalhava

com o médico do PDT e a convenceu. Nota-se que as relações pessoais representam um dos

elementos que direciona o voto numa cultura política do tipo oligárquica. Na eleição de 2006,

esta docente votou em Jackson Lago no primeiro turno, pois, segundo relatou, estava

descontente com a política salarial promovida pelos governos da oligarquia Sarney. Porém, no

segundo turno, acabou votando mesmo em Roseana Sarney, prevalecendo o voto na

“tradição” oligárquica. Em 2010, alegando a questão da continuidade optou pela reeleição da

governadora Roseana Sarney por acreditar que o apoio do governo federal poderia “resgatar

muita coisa”, veja-se o seu argumento:

[...] a Dilma Roussef lá em cima, o pai dela lá em cima, então se ela ficar aqui vai

melhorar isso aqui, vai ter tudo para melhorar isso aqui. Se eles quiserem fazer de

acordo com o que ela promete, que a gente não acredita tanto, eu acho que vai ser a

chance que ela tem de resgatar muita coisa [...] (LINDALVA, 12 abr. 2012).

Nesse caso, não parece que a questão do desempenho administrativo apontado por

Carreirão (2002), na análise das eleições presidenciais, tenha alguma influência nesse tipo de

voto, pois a governadora Roseana Sarney já havia ocupado o governo estadual três vezes. E a

professora, mesmo “não acreditando tanto” resolveu dar mais um voto de confiança para a

candidata do grupo Sarney, pois com o apoio de Dilma Roussef, de Lula, com seu pai, José

Sarney, na Presidência do Senado Federal, acreditou que a candidata da oligarquia Sarney,

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mesmo já tento governando o Estado outras vezes, dessa vez faria mesmo o melhor governo

de sua vida, como anunciava em sua propaganda eleitoral.

Na campanha de reeleição da governadora, uma das mídias utilizadas, o jornal O

Estado do Maranhão, veiculava cotidianamente que a governadora faria o melhor governo de

sua vida, pois, dentre outras razões, era a única candidata na disputa eleitoral a dispor do

apoio irrestrito do governo federal petista. Nas entrevistas constatou-se que o jornal impresso

mais lido entre os professores é O Estado do Maranhão.

Pode-se ver, também que alguns eleitores não apresentam uma constância

ideológica na hora de decidir o voto. Este é o caso do professor Francisco, eleitor da

oligarquia Sarney em 2006 e 2002, que optou pelo candidato do PSTU em 2010. O voto desse

docente representa o eleitor sem consistência ideológica, que decide o voto por questões

emocionais. Ele relatou, na entrevista, que achava o programa desse partido criativo,

divertido.

A personalização da política é outro traço muito forte na cultura política

predominante no Maranhão, onde o peso das relações familiares e a tradição de mando de um

determinado grupo fazem com que seja estabelecida uma espécie de fidelidade política como

a expressa pelo professor Raimundo. Em sua entrevista afirmou que era preferível votar no

grupo Sarney porque este havia trazido grandes projetos econômicos para o Estado. Disse,

ainda, não estar arrependido de ter votado na governadora, e que Roseana Sarney sempre terá

o seu voto, quando concorrer a uma eleição.

As práticas políticas em São Luís, portanto, transitam num continuum entre a

cultura política oligárquica e a cultura política liberal democrática, esta embasada na ideia de

libertação do Maranhão do domínio oligárquico. Os votantes contrários ao grupo Sarney, de

alguma forma, expressam essa “cultura política da libertação”. Um exemplo é o professor

Antônio, que votou em Jackson Lago em 2006. E só não repetiu o voto no candidato do PDT,

em 2010, por conta do desencanto com esse governo em virtude da greve dos docentes da

rede pública estadual, em 2007, mas afirmou que, se tivesse havido segundo turno no

Maranhão, não teria votado em Roseana Sarney. Ao ser perguntado o que achava da

participação do ex-presidente Lula na campanha disse:

Olha, o Lula, a figura do Lula tem vários momentos, eu na minha adolescência, um

pouco mais de juventude, querendo também que o país tivesse aquela coisa de um

trabalhador chegar ao poder, então fiz parte também da bandeira de defesa, e até

meados do segundo mandato ainda acreditava muito no governo Lula, mas muito de

nós nos decepcionamos, uma vez que pessoas que num passado histórico eram

adversários políticos com um histórico de usurpação do dinheiro público e também

de alguns nichos políticos de caciques políticos, que muitos, ou quase todos ele

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colocou debaixo do braço, inclusive o guerreiro Sarney. E a nossa governadora, que

outrora era uma adversária ferrenha, e que as críticas eram visíveis e bastantes

acaloradas, a gente percebeu que esse discurso ficou no vazio, esqueceu-se, passou-

se uma borracha. E aí vem defendendo, a melhor governadora. Então, a gente se

decepciona um pouco com essas coisas, claro que tinha um pouco de mágoa do

outro governador, mas tinha outras opções também, não queríamos a Roseana, não

queríamos o Jackson por alguns motivos... Não falo por mim, falo pela categoria

nesse aspecto, que a categoria pode ter pensado que não era o melhor porque pela

experiência que teve, mas tinha outras opções. Então, a gente avalia que foi um

retrocesso, sobretudo na nossa capital onde ela conseguiu ganhar. Então a gente fica

questionando, a Ilha que era rebelde acabou transferindo para Imperatriz o título de

rebelde (Entrevista realizada em 10 out. 2012).

O discurso de Antônio condiz com o perfil do eleitor que deixou de votar no PT a

partir do segundo mandato do presidente Lula, em função das alianças dessa agremiação com

partidos de centro direita e com caciques políticos, além dos escândalos de corrupção

envolvendo políticos petistas. Alegou que a mágoa em relação ao governo Jackson Lago,

devido à greve de 2007, foi um dos motivos de os colegas não terem votado nesse candidato e

que,“a Ilha que era rebelde”, acabou perdendo o título para Imperatriz. Mas, mesmo com toda

a decepção dos docentes em relação ao governo Jackson Lago, somente dois professores

votaram na candidata da oligarquia. Quanto à ideia de Ilha Rebelde, em outras situações São

Luís já apresentara sinais de certo conservadorismo político, como na eleição da governadora

Roseana Sarney, em 1998, em que obteve 47,7% dos votos na capital (TRE, 1998).

Observou-se, ainda, nas entrevistas que os professores que mantinham certa

constância de votação em Jackson Lago, votaram em outros representantes da oposição ao

grupo Sarney, ou optaram pelo voto nulo, como fez Luis:

Eu voto desde 1994, eu tirei meu título aos 17 anos para votar. Na época eu votei

em Brizola e votei em Jackson aqui, ele era candidato a governador. [...] Agora, eu

vou te dizer, ser franco. Naquela eleição (2010), eu anulei o meu voto pela primeira

vez. Eu tava desiludido, não estava satisfeito com os candidatos [...] Então, eu estava

desiludido com o candidato, com o Jackson [...] eu trabalho aqui nessa escola desde

2002, ta fazendo dez anos, então foi o único momento [...] a greve que mais durou e

só foi resolvida na Justiça [...] Chegou professor aqui nessa escola, na época, para

me substituir , eu tava na greve, não só eu, como outros colegas nossos. E nesse

momento, o Jackson era governador, o Flávio Dino também não nos apoiou [...]

Então eu tava desiludido e não quis participar daquele processo (Entrevista realizada

em 5 ago. 2012).

Outra constatação, o voto que representa uma “identificação ideológica” é pouco

estruturado do ponto de vista das ideias políticas. É o caso da professora Maria que tem um

histórico de votação nos partidos de esquerda. Na eleição de 2006, para governador do

Maranhão, votou no candidato do PSOL, Carlos Saturnino, no primeiro turno, e em Jackson

Lago, no segundo turno. No pleito de 2010, votou novamente no candidato do PSOL (Saulo

Arcangeli) para o governo estadual. Ao ser questionada por que votava nos candidatos do

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PSOL, a professora disse ter simpatia pelas propostas desse partido e revelou que não votaria

em Roseana Sarney, se tivesse havido segundo turno, afirmando:

Não sou daqueles que tem ódio da família Sarney, mas acho que quando fica restrito

a um só grupo é prejudicial para a sociedade, porque passa a ser um domínio em

todas as esferas, não votaria para não se perpetuarem no poder, mas já se

perpetuaram no poder! (Entrevista realizada em 5 ago. 2010).

Esse tipo de voto não garante que o eleitor tenha conhecimento das concepções

políticas representadas pelos partidos. De acordo com o relato dessa docente, seu desejo é que

haja alternância de poder no Estado, que não perdure o domínio de um único grupo político,

ou seja, suas ideias expressam uma cultura política liberal democrática.

Dos oito docentes entrevistados, nenhum votou no candidato Flávio Dino. A

professora Maria o mencionou em sua fala dizendo: “eu acho que ele é mais interessante no

Legislativo [...] para a sociedade é melhor ter o Flávio no Legislativo porque é um homem

que conhece que as leis são falhas, e no Legislativo poderia fazer leis mais justas”.

A fala dessa docente reflete uma das imagens divulgadas pelo Jornal Pequeno a

respeito de Flávio Dino, de ser este candidato uma espécie de personificação da Justiça. Desse

modo, mesmo tendo um currículo que o tornava um candidato apto a concorrer naquela

eleição (2010), Flávio Dino parece não ter conseguido imprimir confiança na intenção de voto

dos professores do Liceu. Veja-se o depoimento do professor Francisco.

Embora a gente tenha o Flávio Dino, candidato altamente qualificado, mas eu não

senti confiança, eu não senti confiança nesse candidato. Até porque ele tava atrelado

a Jackson Lago. Quando ele viu o barco do Jackson Lago afundando, aí parece que

ele tava contra, parece que tava a favor, ficou no meio termo, ele perdeu muito

comigo [...] Eu acho que o Flávio Dino ainda não está preparado para ser governador

do Estado [...] Eu acho que ele ainda vai ser [...] Eu acho que o Flávio Dino será o

novo Sarney. (Entrevista realizada em 11 de mar. 2012)

De acordo com este professor, que vota em Roseana Sarney sempre que esta

concorre a um cargo eletivo, a rejeição a Flávio Dino se explica pela proximidade dele com

Jackson Lago no início da campanha eleitoral e era forte, entre os docentes, a lembrança da

forma como o governo Jackson tratou os professores no episódio da greve de 2007. Ao

afirmar que “Flávio Dino será o novo Sarney”, o professor Francisco aposta na manutenção

das práticas oligárquicas mesmo com a derrota do grupo político dominante, como se esta

condição fosse um trágico destino para o estado do Maranhão.

Diante do perfil dos professores que fizeram parte desta pesquisa, pode-se dizer

que o conjunto de elementos que definiram o voto na eleição de 2010, na capital do

Maranhão, foi composto por uma memória histórica atrelada à imagem de José Sarney como

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construtor do Maranhão moderno, memória diariamente alimentada pelos canais de mídia

pertencentes à oligarquia Sarney, com destaque para O Estado do Maranhão, o jornal mais

lido pelos professores entrevistados. Outro elemento importante diz respeito à experiência

social dos indivíduos, sobretudo, aquela relativa às práticas de uma cultura oligárquica,

introjetada no inconsciente dos cidadãos como se fosse naturalizada. Um exemplo disso é a

quase ausência das denúncias dos crimes eleitorais nas entrevistas, somente dois docentes

mencionaram haver práticas abusivas no pleito de 2010.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

“A cultura política, como a própria cultura, se inscreve no quadro das

normas e dos valores que determinam a representação que uma sociedade

faz de si mesma, do seu passado, do seu futuro”. (BERSTEIN, 1998, p. 353).

A prática política vivenciada no estado do Maranhão, desde a formação do Estado

Nacional, relaciona-se ao domínio de grupos políticos que se apropriam do aparelho estatal

em proveito de seus próprios interesses e de seus apaniguados. No processo de socialização

política dos maranhenses, o apadrinhamento, a troca de favores, a perseguição aos adversários

e a apropriação dos recursos públicos fazem parte das normas e valores da maioria da

população. Nem mesmo a capital do estado, a cidade de São Luís, escapa dessas práticas

nocivas ao espírito público.

Num processo político dessa natureza, em que um determinado grupo se apropria

dos poderes político, econômico e midiático, estabelecendo praticamente as regras eleitorais,

torna-se quase impossível à oposição tornar-se vitoriosa. Assim, “mesmo que alguém alegue

haver eleições nas quais a oposição pode concorrer, não se pode falar seriamente em

democracia. É de oligarquia que se trata” (COUTO, 2010, p. 11).

A vitória da candidatura “O MARANHÃO NÃO PODE PARAR”, representada

pela governadora Roseana Sarney, deveu-se aos artifícios de desvirtuamento da organização

político democrática, uma vez que o grupo oligárquico lança mão de sua capacidade

organizacional para ganhar as eleições, mesmo que para isso tenha que recorrer a meios

ilegítimos, como, por exemplo, ao uso do poder político e econômico para garantir apoio de

lideranças políticas em todo Estado, manipulação da opinião pública, uso dos programas

sociais do governo federal como moeda de troca junto ao eleitorado mais vulnerável

socialmente, compras de votos comprovadas com farta prova documental e ainda não

apuradas em virtudes das fortes relações do grupo oligárquico com membros do Judiciário do

Maranhão e das instâncias federais.

O grupo Sarney, mesmo perdendo a hegemonia eleitoral nas últimas eleições,

devido ao aumento da competitividade eleitoral, das crises intraoligárquicas, do

fortalecimento das oposições e do processo de organização dos movimentos populares e

sociais, tem conseguido manter-se no poder estadual amparado pela estrutura de apoio do

governo federal e das velhas práticas do patrimonialismo e clientelismo, bases da cultura

política oligárquica.

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Desse modo, temos a institucionalização das práticas oligárquicas em todo o

estado do Maranhão, inclusive na cidade de São Luís, onde a governadora Roseana Sarney

obteve, no pleito de 2010, uma pequena vantagem de votos em relação aos candidatos da

oposição. Apesar da memória histórica construída pelas oposições e movimentos sociais em

torno da rebeldia da Ilha de São Luís, a cidade apresenta certo conservadorismo ao eleger

representantes políticos com tradição oligárquica. Na eleição de 2010, além do desencanto do

eleitorado em relação ao governo Jackson Lago, há que se reconhecer que existe uma

memória histórica positivada em torno da imagem do político José Sarney, que é enaltecida

diariamente por seus veículos de comunicação como o criador do Maranhão moderno.

A campanha eleitoral de 2010 foi uma verdadeira guerra entre os jornais O Estado

do Maranhão e Jornal Pequeno. O primeiro, manipulando informações a respeito da

popularidade de Roseana Sarney na capital, na perspectiva de combater a conhecida rebeldia

da cidade aos representantes do grupo Sarney. O segundo, como principal periódico da

oposição, tentava condicionar seus leitores a embarcar em mais uma edição da “libertação do

Maranhão”. Esses jornais representaram, no campo da luta simbólica, as práticas sociais

existentes no Estado.

Quanto às motivações para o voto dos docentes que participaram dessa pesquisa,

constatou-se que as relações de amizade, as questões pessoais e o prestígio do candidato junto

ao governo federal são elementos definidores das relações entre os sujeitos sociais e seus

representantes políticos. Pode-se afirmar, então, que a cultura política predominante em São

Luís do Maranhão agrega elementos que transitam em variados tempos históricos,

assentando-se, sobretudo, nos seguintes valores: lealdade, fidelidade, gratidão, amizade,

parentesco, relações familiares, respeito, confiança.

Nesse contexto, pode-se dizer que o Estado, ao invés de seguir o modelo

burocrático x racional defendido por Weber (2000), permanece sendo visto como uma

extensão da casa, da família, dos amigos. E que predomina o espírito do “homem cordial” do

qual nos fala Sérgio Buarque de Holanda (2004), do homem que age movido pelas

preferências subjetivas, que age com o coração, protegendo os amigos e perseguindo os

inimigos políticos com a mesma presteza.

Dos oito professores que participaram dessa pesquisa, somente dois votaram em

Roseana Sarney, no pleito de 2010, o que corrobora a idéia de que o grupo da governadora

passa por um grande desgaste junto ao eleitorado. No entanto, de acordo com as entrevistas

realizadas, há uma crença de que as práticas oligárquicas continuem a vigorar no estado do

Maranhão, mesmo sem a presença do grupo Sarney. Isso porque, tal cultura política

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oligárquica faz parte das práticas e valores não só dos políticos em época de disputas

eleitorais, mas definem as regras das relações sociais que atravessam o cotidiano de grande

parte da população maranhense.

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APÊNDICE A - Ficha de identificação do entrevistado

NOME COMPLETO: _______________________________________________________

LOCAL E DATA DO NASCIMENTO: _________________________________________

____/____/______

PROFISSÃO: _______________________________________________________________

PROFISSÃO DOS PAIS:

PAI: ______________________________________________________________________

MÃE: _____________________________________________________________________

LOCAL DE NASCIMENTO DOS PAIS:

PAI: ______________________________________________________________________

MÃE: _____________________________________________________________________

CÔNJUGE

LOCAL DE NASCIMENTO: __________________________________________________

ESCOLARIDADE: ___________________________________________________________

PROFISSÃO: _______________________________________________________________

LOCAL DE TRABALHO: _____________________________________________________

FORMAÇÃO ESCOLAR:

FUNDAMENTAL:___________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

ENSINO MÉDIO: ____________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

CURSO SUPERIOR: ________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

PÓS-GRADUAÇÃO: _________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

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EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL ( LOCAIS ONDE TRABALHOU):

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

ENDEREÇO ATUAL: TELEFONE DE CONTATO

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___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

ENDEREÇOS ANTERIORES:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

RELIGIÃO:________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

JORNAIS IMPRESSOS LIDOS: ______________________________________________

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PROGRAMAS DE TV PREFERIDOS: _________________________________________

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COMO SE INFORMA ACERCA DA POLÍTICA LOCAL, NACIONAL E MUNDIAL:

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