mariÁtegui, josé c. - dos sonhos às coisas

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8/13/2019 MARIÁTEGUI, José C. - Dos sonhos às coisas http://slidepdf.com/reader/full/mariategui-jose-c-dos-sonhos-as-coisas 1/156  H1iS n q f rx ionisa ac e. orn urn i .V.De ilson c11T8 . sti Do sonho s cois s etratos subersios 1T RIAL

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I S B N : 8 5 7 5 5 9 0 6 1 8

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 Em um a curta e intensa vida, o jornalista, teórico

e dirigente revolucionário peruano José Carlos

M ariátegui 1894-193o)uniupensamento e açào,

arte e polItica, jornalismo e m ilitância, construindo

uma o bra que fez dele o m ais original dos

pensadores m arxistas latino-americanos.

Em penhado em trazer as idéias de Marx para a

realidade d o subco ntinente, Mariategui abriu

caminhos para uma reflexão propria do marxismo,

semp re lutando pelo papel dos povos e culturas

indIgenas na luta de classes e pela transformaçao

social. Sua obra teórica - e sua visâo sobre a form açao

social e étnica da Indo-Am érica - influenciou desde

a Revo luçao Cubana e Che G uevara ate og zapatistas

de Chiapas, e segue inspirando m ovimentos clue

lutam pela igualdade e pela emancipaçao em toda aAm erica Latina. Entre os vários livros que escreveu,

destacam se Stete ensayos de interpretactóri de la

realtdadperuanae La escena contemporánea.

Mariátegui aliava o trabalho teórico ao gosto pelos

debates das van guardas artisticas e o trabalho

com o jornalista, que no início da carreira o levou

a escrever sobre assuntos tao diversos quan to

corridas de cava los e noticias policiais. Publicou

poem as, fundo u revistas de hum or e arte. Mas

logo passou a se dedicar corn convicçao causa

socialista - fundando o Partido Socialista Peruano,

escrevendo como correspondente na Europa

e criando publicacOes corn forte conteüdo de

crItica social. Entre elas, a célebre revistaArnauta,

palavra quIchua que significa sábio, sacerdote, e

clue se tornou uma espécie de alcunha do p róprio

Mariátegui.

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DO SON HO As COIS S

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DO SONHO AS COISAS

retratos subversivos

Jos CARLOS MARIATEGtJI

traduçao organizacão e notas

Luiz Bernardo Pericás

E I T RI AL

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Copyright desta ediçao © Boitempo E ditorial, 2005

Traduçao organiza cáo e notas: Luiz B ernardo Pericás

Coordenaçáo editorial: Ivana JinkingsAluizio Leite

Ass istente: An a Paula Castellani

Revisáo: Elaine Cristina Del Nero

Editoraçao eletrônica

e tratamento de imagens:

Capa:

Produçao gr4fIca:

Fotolitos:

Raquel S allaberiy Brião

David Amid

Marcel Iha

OESP

Todos os direitos reservados. Nen hum a parte deste Iivro pode set utilizadaon reprodu zida sem a expressa autorização da editora.

CIP-BRASIL. CATALO GAçAO-NA-FONTE

SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

M286d

Mariátegui, José Carlos, 1894-1930Do sonho a s coisas: retratos subversivos / José Carlos M ariátegui; traduçao, organi-

zação e notas Lu iz Bernardo Pericás. - São Pau lo: Boitempo, 2005160p. : ii. - (Marxismo e literatura)

Conretido parcial: José Carlos Mariátegui e o marxismo I Luiz B ernardo Pericás

ISBN 85-7559-061-8

1. Mariátegui, José Carlos, 1894-1930. 2. Socialismo. 3. Comu nismo. 4. Politicos.I. Pericás, Lu iz Bernardo, 1969-. II. TItulo. III. Série.

05-0473.

la edicão: marco de 2005

BOITEMPO EDITORIAL

Jinkings Editores Associados L tda.

Rua Eu clides de An drade, 27 Perdizes

05030-030 Sao Paulo SP

Tel/Fax: 11) 3875-7250/ 3872-6869

e-mail: [email protected]

site: www .boitempo.com

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  umário

Introduçao - José Carlos Mariategui e o marxismo

BENITO MUSSOLINI 1

GABRIELE D ANNUNZIO 7

H G WELLS 3

DAVID LLOYD GEORGE 7

JOHN MAYNARD KEYNES 3

THOMAS WOODROW WILSON 7

HERBERT HOOVER 1

EUGENE V DEBS 5

JEAN JAURES 1ANATOLE FRANCE 5

ANDRE GIDE 1

JACQUES SADOUL 5

LEON TROTSKY 1

GRIGORI ZINOVIEV 5

MAXIMO GORKI 01

SUN YAT SEN 5

MAHATMA GANDHI 9

RABINDRANATH TAGORE 15

ALVARO OBREGON 19

TRISTAN MAROF 23

JOSE INGENIEROS 27

OLIVERIO GIRONDO 31

Nota auto biograjIca 35

Cronologia resumida dejose Carlos Maridtegui 37Obras do autor 39

Textos biogr4fIcos 41

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Introducao

JOSE CARLO S MARIATEGUL E 0 MARX SMO

Luiz Bernardo Pericds

Na época em q ue José Carlos Mariátegui publicou La escena conternpordnea

seu prirneiro livro, ele já podia set considerado urn dos rnais importantes inte-

lectuais do Peru e talvez a rnais influente personalidade de esquerda de seu

pals. Jornalista autodidata, dono de urn estilo seco e preciso, M ariátegui desde

jovern se destacou com e, exceleiite cronista de seu tempo, assim corno urn

polérnico debatedor. Durante toda a vida teve de lutar contra enfermidades e

crIticas de adversários, que m uitas vezes o acusavam de ter pouca profundida-

de em suas elaboraçoes e de não possuir forrnacao académica, acusacôes estas

que n ao o incornodavam e q ue somente o estirnulavarn ainda rnais a continuar

produzindo seus diversos artigos e livros. Desde a juventude, qu ando estava

mais ligado aos movimentos literários e estéticos do corneco do século XX do

que polltica, ate sua maturidade, já completamen te envolvido corn a cau sa

do socialismo no Peru, ele foi urna figura extremamente atuante na vida social

de seu pals, assirn come, também fun damental Para a elaboracao de urn pensa-

men to marxista latino-arnericano realmen te original.

José Carlos M ariátegui nasce no dia 14 de junho de 1894, em M oquegua,

filho de Maria Am alia La Chira Ballejos, ama don a de casa mestiça de origem

hum ilde, e Javier Francisco M ariátegui y Req uejo, funcionário do Tribun al

M ayor de Cuen tas. 0 pai, criollo de urna tradicional famIlia de Lima, é trans-

ferido para o norte alguns anos rnais tarde e abandona a farnulia. 0 jovem

Mariátegui e seus dois irmâos, Guillermina e Julio César, são criados pela mae,

que trabaiha corno costureira para poder sustentar os filhos.

0 Peru v ivia urn rnornento conturbado. No ano do nascimento do "funda-

dor do socialismo p eruano" é d eclarada ama greve dos po rtuários de Callao.

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Dois anos m ais tarde, em 1896, SO os trabaihadores das indü strias téxteis e

dos gráficos de Lima que se levantarn em p rotestos. 0 Congresso O perário,

organizado por Ram ón Espinoza, é realizado em 1901, na capital, enquanto

na mesma época é fundada a Assembléia das Sociedades Unidas, responsável

pela publicacao do jornal La Voz Obrera e pela constituição da Biblioteca Po-

pular "Ricardo Palma". A intensidade da atuacao dos trabaihadores aumenta

nos anos subsequen tes, resultando em duras bataihas durante a greve dos po r-

tuários em 1904 e, um ano mais tarde, corn urna série de lutas em Lima e

Callao por uma jornada diana de oito horas de trabalho. Em 1906 , os traba-

lhadores téxteis novamente se levantam em g reve, junto corn os funcionários

das empresas de bondes, seguidos, pouco depois, por novas manifestacoes dos

estivadores de C allao. 0 m ovimento operário peruano naquele perlodo fundao Centro S ocialista 12 de M aio, que mudará de nome para Centro de Estudos

Sociais P de M aio e terá o jornal El Oprimido como seu órgão oficial. E born

lembrar que na época d o nasciinento e da infância de M ariátegui a Segund a

Internacional, fundada em 1889, incentiva em todos os palses os protestos de

P de m aio, as jornadas de oito horas e a discussâo sobre a possibilidade de os

partidos de esquerda participarem de governos nacionais de outras coloraçoes

polIticas. Os debates sobre as idéias revisionistas de Eduard Bernstein e a ques-tao do colonialismo, rnais tarde, também foram assuntos que certamente trans-

cenderam os limites da Internacional na Europa e chegaram a outras regióes

do planeta.

Nos Estados Unidos, por exem plo, o Partido Socialista O perário trabalha

para unit partidos e sindicatos na luta pela revolucao socialista. Daniel DeLeón,

seu principal dirigente, considerado por alguns estudiosos o prime iro teórico

marxista original do continente, escreve urna série de artigos sobre as peculia-

ridades do caso norte-americano, apontando os m elhores caminhos para a m u-

danca de sistema social no pals. E a primeira tentativa de adaptacao do marxismo

a realidade nacional de um pals do h emisfério ocidental. 0 Partido Socialista,

urna cisão do P50, também inicialmente dá apoio a s causas mais radicais e

comeca a ganhar forca na polItica institucional. A revolucao está na ordem do

dia e, em 1905, é fundada, em Ch icago, a IW\XT (Industrial Wo rkers of the

W orld), organizacão sindical formada pelas mais importantes lideranças poll-

ticas de esquerda dos Estados Unidos, como DeLeón, Eugene Debs e W illiam

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Hay wood , corn o objetivo de organizar os trabalhadores mais negligenciados

do pals, como mexicanos, negros, asiáticos, imigrantes do sui e leste europeu,

lenhadores, mineiros, estivadores e migrantes. A IW W cresce enormemen te

nos primeiros anos após sua constituiçáo, incentivando a luta de classes e sen-

do urn elemento importante nos combates do proletariado contra patróes ca-

pitalistas, poilcia e governo. Seus objetivos principais são criar "urn grande

sindicato ünico e tomar o poder por meio de uma greve geral em todas as

fábricas da nação. A central será perseguida pelo governo federal e ira perder

praticamente toda sua influência durante a Primeira Guerra Mundial, mas

seus dirigentes, mesmo presos e expulsos do pals, ajudarão na criacão do Parti-

do Com unista dos E stados Unidos alguns anos depois.

A A merica Latina também presencia o crescimento do m ovimento opera-rio em toda a região. No corneco da década de 1890, num perlodo ainda

marcado p or grande influência de idéias anarquistas, é realizado em Cuba o

Congresso Regional Operário, com a presenca de delegados de diversas orga-

nizaçóes de cinco provincias da ilha - com excecão do O riente -, no qual se

decide defender a implementacao de um a jornada diana de oito horas e um

modelo de organizacão para a classe operária. Tam bém é discutido o trabaiho

feminino e infan til, a discriminacão racial e o incen tivo reuniáo dos traba-

Ihadores em seçóes autônomas organizadas por categorias, que depois integra-

riarn a Federacão dos Trabaihadores de Cuba. A imprensa operária cresce e se

torna cada vez mais atuante, corn diversas publicacoes, como ElArtesano 1886),

ElObrero 1888), ElCiarIn 1889), La Clariclacl 1890), LaAntorcha 1890),

El Obrero Cubano 1890), ElAcicate 189 1) e La Batalla 1891). Ern seguida,

uma série de greves mostra a movimentacão popular por melhores condicoes

de vida Para o proletariado. Assim, em 1907 ocorre greve dos tabaqueiros, em

19 8 dos ferroviários e em 1911 dos operários da construcao. A repressao do

governo da ilha, porém, é dura. 0 periódico El Productor e o CIrculo de

Trabajadores de La Habana já haviam sido fechados em 1891, o mesmo ocor-

rendo corn o Congreso Regional Obrero um ano mais tarde. Já a Sociedad

G eneral de Trabajadores encerra suas atividades após 1898. Mesmo assim, em

1900, surge o Partido Popular, liderado por Diego Vicente Tejera, que ira durar

alguns meses e dar lugar, em 1901, ao Partido Popular Operário, composto de

militantes da F CT. O s socialistas nesse mom ento corneçarn a se tornar cada

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vez mais atuantes em Cuba. Desde a formacao do Clube de Propaganda Socia-

lista, considerado o primeiro grupo marxista cubano - que depois mudou de

nome para Agrupacao Socialista Internacional -, fundado por Carlos Baliño

em 1903, e a criaçâo, urn ano depois, do Partido Operário Socialista e de seu

jornal La Voz Obrera dirigido por Rarnón Rivera, os marxistas comecam a agir

de forma a politizar os trabaihadores e influenciar a luta pelo socialismo no

pals. 0 partido vai se radicalizando aos poucos, incluindo em suas novas teses

a conversão da propriedade individual ou corporativa em propriedade coletiva

ou comum e a emancipacão completa do proletariado, a partir da abolicao das

classes sociais.

No Brasil, mesmo corn o setor industrial relativarnente pouco desenvolvi-

do, o nascente movimento operário comeca a aumentar sua capacidade deorganizacão nesse perlodo. Após a aboliçao da escravatura, o influxo de irni-

grantes europeus é grande. Entre 1890 e 1907, mais de 151.800 pessoas traba-

lhavam nas indüstrias - em sun maior parte nos setores téxtil e alirnenticio,

seguidos pelas confecc6es, mecânica e calçadista - localizadas principalmente

no Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo, os estados

corn os parques industriais mais irnportantes do pals. Para se ter urna idéia, de

1884 a 1893 chegarn ao Brasil em torno de 883.600 irnigrantes europeus; de

1893 a 1903, aproximadamente 862.100 estrangeiros; e entre 1904 e 1914,

quase urn milhão de novos trabaihadores entrarn no pals, vindos de Itália,

Portugal, Espanha, Alemanha e alguns palses da Europa Oriental, trazendo

consigo influências anarquistas e socialistas. Em 1890 é fundado o Centro da

Classe Operária, que, rnesmo sendo urna organizacáo pequena e atuando basi-

camente na capital, ajuda o operariado a participar de várias greves, como a

dos ferroviários, em junho daquele ano. Já em Porto Alegre, irnigrantes ale-

rnães constituem a União do Trabalho, em 1892, enquanto sindicatos e depois

organizaçôes socialistas, em diferentes estados, comecarn a editar seus próprios

jornais. Assirn, surgern, no final do século XIX e comeco do século XX, publi-

cacôes corno 0 Tzx5grafo A Voz do Povo 0 Socialista A Questao Social Liure

Pensador e ProletcIrio entre outras. Em 1889 já havia sido criado o primeiro

CIrculo Socialista Brasileiro, em Santos, dirigido por intelectuais de esquerda

proerninentes, que elaborararn o "Manifesto socialista ao povo brasileiro", de-

fendendo a criação de urn Partido Socialista no pals. Esse grupo será o respon-

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save1, em 1895, por fundar o Centro S ocialista, que urn ano m ais tarde editará

o primeiro nñmero de Socialista seu órgão oficial. 0 "Centro" é a primeira

organizacão que promove urna m anifestacao no 19 de maio no pals, assim

como d ivulga obras de M arx e Engels e incentiva debates, leituras e conferén-

cias. Mesmo que m uitos dos militantes das organizacóes "revolucionárias" nao

tivessem uma formacao poiltica sólida e rnisturassem conceitos e tendéncias

diferentes, como o socialismo utópico , o anarquisrno e o marxisrno, emparte

tentavam imp lementar as diretrizes da Segunda Internacional.

Em 1896 é fundado, no Rio de Janeiro, o Partido Socialista Operário,

seguido, alguns anos mais tarde, pela estruturacão do Clube Internacional,

dirigido por Euclides da Cunha, que defende a pro ibicao do trabaiho infantil,

o cuidado corn os inválidos, a luta contra o alcoolismo, a melhoria das condi-cóes de moradia, a igualdade de direitos para as muiheres, o ensino básico

obrigatório, a justica defacto para toda a populacão, a irnplernentacão de bol-

sas de trabalho, os tribunais de arbitragem Para disputas trabaihistas, a jornada

de trabalho de o ito horas, a proibicao dos empréstimos do exterior, a naciona-

lizacao do crédito, a utilizacao das riquezas da Igreja para resolver os proble-

mas e a instituicão de urn exército popular de milIcias. Enquanto isso,

as greves são constantes. Em 1900, ocorrern greves dos estivadores, sapateiros,

pedreiros e cocheiros na capital, onde, em 1903, é fundada a Federação de

Associaçóes de Classe, mais tarde reorganizada como F ederacao Operária da

Capital, que incentivará ainda mais as manifestaçoes dos trabaihadores. Já em

1904 , no Rio de Janeiro e em S ão Paulo, diversas greves pela jornada de oito

horas são responsáveis por combates violentos corn a polIcia. Nesse mom ento,

categorias diferentes, como gráficos, construtores, portuários, tecelóes, man-

nheiros, ferroviários, metalürgicos e funcionários das ernpresas de bondes de-

cidem deixar seus postos e com bater a repressão, inclusive contra tropas do

exército. Em 1906, então, é finalmente convocado o P rirneiro Congresso Ope-

rário, que reñne uma grande quantidade de organizacôes sindicais e defende o

uso de técnicas corno boicote, sabotagem , manifestaçoes, den6ncias p6blicas

a continuidade das atividades grevistas no pals.

nesse ambiente social tenso, tanto dentro de seu pals como em todo o con-

tinente, que M aniátegui passa sua infância. Em 1901, dois anos após ter se

mudad o para Huach o - ao lado de Sayán, cidade de sua famIlia materna -, o

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pequeno e frágil José Carlos comeca seus estudos. Entretanto, urn ano m ais

tarde, numa brincadeira na escola, o menino recebe urn violento golpe no

joelho da perna esquerda que o deixará coxo pelo resto de seus dias. Levado a

Lima para tratamento, é internado na cilnica Maison de Sante, dirigida por

freiras francesas da congregacão de São José de Cluny. 0 tratamento dura qua-

tro meses e o obriga a largar provisoriamente os estudos. Nesse difIcil perlodo

de convalescenca, após várias cirurgias, numa solidão precoce, tendo que ficar

horas sozinho ern quartos de hospital, ele adquire o gosto pela leitura e torna-

se urn arguto observador de tudo que se passa a sua volta. Começa a aprender

frances e recebe forte influência religiosa, tanto dos padres com o principal-

men te de sua avó e tios maternos, que ihe contam h istórias repletas de misti-

cismo. Por conta própria, comeca a let tudo que chega a s suas mãos, hábitoque cultivará a vida inteira. Ficará imob ilizado em tratamento, em casa, por

mais dois anos.

A partir de 1909 corneca a trabaihar corno entregador, linotipista e co rre-

tor de provas do jornal La Prensa dirigido por Alberto Uloa Cisneros. E urn

trabalho ingrato: mesmo m ancando, sua funcão, entre outras, é levar enco-

mendas e entregar provas dos textos aos seus autores a pé, pelas ruas da capital.

Mas, no La Prensa fica fascinado corn o am biente jornalIstico e trava amiza-

de corn Felix del Valle, César Falcon, Abraham Valdelornar e corn vários

outros jornalistas locais. Apenas dois anos após ingressar no periOdico, envia

urn a,rtigo anonimamente para o editor, utilizando o pseudOnimo de Juan

Cronique r. Para sua surpresa, o texto é aceito e ele passa, a partir dal, a cola-

borar regularmente Para aquela publicacão. Desse mom ento em diante, in-

gressa na redação, ajudando também a classificar diferentes telegramas enviados

das outras provIncias do pals. Será considerado por seus colegas, contudo,

apenas urn comentarista da vida cotidiana do Peru e autor de artigos leves

e irônicos.

De 1912 a 1916 seu trabalho é essencialmente jornalistico, colaborando

corn diferentes revistas peruanas, com o Mundo Limeño e Lu1r. Juntamente

corn seus amigos Felix del V alle, César Falcon e Ab raham V aldelomar, apOs

longas discussôes no café Palais Concert, funda a revista m odernista Colónida

que sO chega a ter quatro nümeros e na qual publica alguns poemas. Dentre os

editores, quern talvez marque mais o estilo da publicacao é V aldelornar, muito

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influenciado na época por D'Annunzio e pelo futurismo italiano. 0 poeta

peruano certamente é naquele perlodo urna inspiracáo para Mariátegui.

Em 1916 torna-se redator-chefe e cronista politico do jornal El Tiempo

pub icacao considerada pelos crIticos corno "liberal", "maxirnalista" e

"boichevique", assim corno assum e o cargo de co -diretor da revista El Turf

Nesse mesmo ano tambérn escreve a peca La ma riscala "poema dramático en

seis jornadas y un verso", em parceria corn V aldelomar.

Nessa época, os artigos de Mariátegui, de forma g era , discutem b asica-

rnente aspectos da vida social da capital peruana, desde co rrida de cavalos no

joquei-clube e notIcias policiais ate cornentários sobre arte e textos para o pü-

blico feminino. A peca teatral Las tapadas escrita corn Julio Baudo in, "poema

colonial" em urn ato e quarto quadros, que é representado no Teatro Colon erecebe criticas desfavoráveis da irnprensa, tambérn marca o periodo de desco-

brimento estético e literário do jovem jornalista.

Em 1916 M ariátegui ddica muitas horas semanais rezando e meditando

no Convento dos Descalcos, o que possivelmente pode ter influenciado seus

textos posteriores, já que, ern 1917 ano da revolucao de Outubro, ganha urn

concurso literário promovido pela municipalidade de Lima com sua crônica

"La procesiOn tradicional", sobre o Senh or dos milagres. 0 jovem jornalista

tern rnomentos so itários e melancOlicos, ern algurna rnedida explicitados nurn

livro de po emas, inédito, intitulado Tristeza escrito por ele pouco tempo an-

tes. Em outras situaçóes, contudo, pode set identificado corn o entusiasrno e as

atitudes dos boém ios da época. Corn os seus amigos C ésar Falcon e Carlos

Guzrnán, funda La Noche urna pub icacao humorIstica de curta duracao. Aquele

ano tarnbérn é rnarcado pelo "escândalo" da bailarina suIca Norka Rouskaya,

episódio pitoresco que dernonstra uma certa dose de excen tricidade do periodista

peruano - a dancarina clássica, seminua, ofereceu urn "espetáculo" para urn gru-

po de amigos, no qual se encontrava Mariátegui, no cernitério de Lima, ao

som de Chopin e Saint-Saens. Ato considerado pelos conservadores da capital

corno urn "sacrilegio", levou todos os envolvidos a serern presos pe a policia.

0 periodo de "juventude" de M ariátegui, designado por e e próprio de "a

idade da pedra", termina em 1918 quando renuncia solenemente ao pseudo-

nimo de Juan Croniquer e funda, corn César Falcon - já bastante influenciado

por Tolstói, Jaurés e Kropotkin -, Felix del Valle, Humberto del Aguila,

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Valdelomar e César Vallejo, a revista N uestra Epoca na qual será anunciada

"oficialmente" por seus editores a rnudanca de estilo e atitude do jovem jorna-

lista e sua nova posicão socialista. 0 editorial da revista afirmava que José

Carlos pedia perdao a D eus e ao piliblico pelos pecados que havia cornetido

corn os seus textos dos anos anteriores, o que pode dernonstrar mais uma vez a

forte influência do elemento religioso na obra do "pai do marxismo peruano".

Essa pub licacao, inspirada na revista España editada por José Ortega y G asset

e depois por Luis Araquistáin, não tern urn programa definido, serve basica-

mente Para divulgar as idéias de seus colaboradores e so chega ao n iimero dois.

De acordo corn o editorial da prirneira edicao, o "programa" da publicacao

seria "dizer a verdade", insistindo q ue náo se faria literatura da politica nem

politica da literatura. Urn artigo antiarmarnentista polérnico de Mariátegui,que sai no prirneiro nümero, provoca a ira de alguns setores dentro do exérci-

to. 0 fato toma proporcoes graves quando ele é agredido fisicamente ao carni-

nhar na rua e, em seguida, quarido urn grupo de soldados invade a redaçao do

jornal El Tiempo - onde tambérn se editava o N uestra Epoca - e violentarnente

espanca o jovern autor. Protestos de vários órgãos de irnprensa se seguern, obri-

gando o ministro da G uerra a renunciar. Por causa desse incidente, o jornalista

autodidata e o IIder dos m ilitares insatisfeitos, o tenente José V ásquez Benavides,

decidem duelar. Os amigos escoihidos Para representar os dois contendores no

embate, seus "padrinhos", porém, conseguem reverter a complicada situacao e,

após algumas discussôes, chegam a urn termo de conciliacao.

M ariátegui também é urn dos elernentos importantes na criacao, logo em

seguida, do Com ité de Propaganda e Organizacao So cialista, que depois se

tornou o primeiro Partido Socialista do Peru. Mas o com ité tern em seus qua-

dros urn grupo heterogéneo de militantes - desde anarcossindicalistas e "agita-

dores" operários ate urn decorador italiano e jornalistas da capital -, e

periodista dele se afasta pouco tempo depois. Em realidade, durante boa parte

de sua juventude M ariátegui está longe de ter urna idéia exata do que realmen-

te quer como jornalista ou militante politico. Influenciado pelo catolicismo

fervoroso de sua farnIlia e por movimentos literários da época, é basicamente

urn esteta, urn jovem mais preocupado corn a fé religiosa, a mistica, a literatura

e a poesia do que necessariamente corn a poiltica, apesar de já sofrer uma nitida

influéncia de Gonzalez Prada e G eorges Sore .

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M esmo qu e ja viesse ocorrendo lentamente urn processo de politizacao e

amadu recimento teórico, corn urn envolvimento gradual dentro do meio ope-

rário e c orn parte da intelectualidade radical local, e que grande parte de sua

producao jornalIstica fosse sobre politica, podemos dizer que gr ndemudan-

ça na vida de Mariátegui ocorre em 1919, quando recebe uma bolsa do go-verno Para viver na E uropa durante alguns ano s. Esse fato tern repercussóes

impo rtantes no pensame nto do jornalista, já que é no Velho Co ntinente que

aprofunda suas concepcóes e com pleta sua formacao poiltica.

Ainda q ue a m ajor parte de seus textos anteriores fosse sobre temas diver-

sos, a partir da criacâo d e Nuestra Epoca seu nom e come ca a set identificado

com o o de urn agitador. Ma riátegui mo difica aos poucos sua postura polItica

e tenta rnostrar que é sincero em suas novas conviccöes, explicitando sua atitu-de corn a p ublicacao de alguns artigos atacando instituicóes governam entais.

Por mo tivos ideológicos, José Carlos abandona El Tiempo publicacao corn a

qual ainda colaborava, e, em 14 de m aio de 1919, ajuda a fundar o La R azón.

Esse jornal pretendia ser a voz do povo peruano, o primeiro periódico inde-

pendente de esquerda d o pals, editado na gráfica alugada do arcebispado de

Lima dono do jornal católico La Tradición - e corn a participacao de o pe-

rários em sua redaçao.

Nesse m omento quem está no poder é José Pardo, que já fora presidente

entre 1904 e 1908, e que retornara como máx imo m andatário em 1915, sem

gozar de prestlgio entre as classes populates. 0 Peru vive urna grave crise eco-

nôm ica. Essa é uma época em que os investimentos norte-arnericanos aumen-

tam sub stancialrnente, ultrapassando o capital investido pelos ingleses no pals.

Enquanto a econornia peruana se modifica e se rnoderniza , tambérn comeca

a set controlada por diversas empresas dos E stados Unidos qu e se instalarn na

região. De 19 15 a 1 920, a entrada de capital estrangeiro, que era de U S$ 28

milhôes, passa a US 79 milhóes, enquanto a salda de dólares passa de

US $ 29 m ilhóes Para US$ 69 m ilhôes. 0 fato é que de 1913 a 1917 as transa-

cóes corn a Inglaterra diminuem de 32% a 17% , ao rnesmo tempo em que as

relacóes comerciais corn os Estados Unidos aum entam de 31% a 61% . Em

1914, por exemplo, os ingleses haviarn investido no Peru em torno de

US$ 166 m ilhôes. Já as inversôes norte-americanas chegararn a apenas US$ 80

milhóes. Em 1916, contudo, a International Petroleum Co., subsidiária da

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Standard Oil, compra a London Pacific Petroleum Co., e, em 1917, corn a

declaracao de guerra do governo peruano contra a A lemanha, são confiscadas

propriedades e navios alemães nos portos do Peru, que os arrendou a grandes

empresas do "Colosso do Norte". No setor m ineiro, o governo cria a Cerro de

Pasco C orporation, que constrói urna rede ferroviária independente que com -

pete corn a Peruvian Railway Com pany Limited, inglesa, aurnentando muito a

exploracao de m inérios em grande escala no pals. 0 setor produtivo se torna

mais especializado e voltado para a exportacão. V ários produtos tern sua pro-

duçao incremen tada, como os m etais estratégicos, o petróleo, o algodao e o

açiicar. Contudo, dirninui a producao de artigos como o arroz e o trigo, fato

que resulta em escassez desses itens no mercado interno e em subsequente

aumento de precos. 0 rnovimento operário decide it a s ruas para protestarcontra essa situacao, assim com o Para pressionar o governo a impor a jornada

diana de oito horas de trabalho. E criado o Comité Pró-Barateamento das Sub

sisténcias, que comeca a mobilizar o proletariado contra os abusos do governo

e culmina corn um a greve de oito dias, ern maio de 1919 , o que acarretará a

prornulgação de uma lei marcial, a criacão da Guarda Urbana e a prisão de vários

dirigentes operários.

Augusto Legula, que havia governado o Peru de rnaneira personalista entre

1908 e 1912 , e que retornara da Europa em janeiro daquele ann Para set can-

didato do P artido N acional Democrático Reformista a presidéncia, é apoiado

naquele momento por alguns setores supostamente progressistas do Peru, corno

o P artido Socialism, o jornal El Tiempo e a Fed eracao de Estudantes, assirn

como integrantes da pequena b urguesia e do exército. Legula ganha as eleicôes

de 19 de m aio, mas, temendo que os civilistas - que apoiavam o antigo presi-

dente e cram rnaioria no Parlarnento - impedissem sua posse, dá urn golpe de

Estado preventivo em 4 de julho, corn o apoio de militates amigos, fecha o

Parlarnento, deporta José Pardo e alguns correligionários e corneca a governar

o Peru de forma autoritária. A partir dal, os editores do La Razón como se

pode imaginar, comeca rn a atacar veementemente o novo governo, o que será

urn dos m otivos para que sejam perseguidos pelo presidente, presos ou m an-

dados para o exIlio. 0 fato é que, logo após a posse de Legula, o Comité Pró-

Baratearnento das Subsisténcias decreta uma greve geral em Lima e Callao, que

ocorre ern 8 de julho corn urna grande rnanifestacao no Parque Neptuno e

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conta corn a presenca de Adalberto Fonkén, Carlos Barba e N icolás Gutarra,

os principais Ilderes do movimento operário na época, que haviam acabado de

set libertados da prisão. Por causa do apo io irrestrito do La Razón aos grevis-

tas, ern tomb de trés rnil manifestantes vão para a frente da redaçao do jornal

demonstrar sua gratidao a seus editores.

Logo após a tomada do poder por Legula, tambérn ocorre uma intensa

carnpanha pela reforma da Universidade de San Marcos, corn urna greve que

dura quarto meses. Essa greve é conseqüéncia das lutas pela reforma universi-

tária que vinham ocorrendo em outros paIses da região, inspiradas pelo movi-

mento que havia se originado na A rgentina, em 1918, explicitado no Manifesto de

Córdoba que proclarnava o direito insurreicão e urn programa de emancipa-

ção "espiritual" da juventude de todo o continente. Mesmo sendo antia-

cadérnico, Mariátegui também dá seu apoio ao m ovirnento, já que considera a

Universidade de San M arcos uma instituicao antiquada, que necessita de major

dernocratizaçao do ambiénte acadérnico, da abertura de seu espaco a todos

aqueles interessados em aprender, da renovação ampla das forrnas do ensino,

da participacão estudantil na gestao das faculdades e de autonomia em relacao

ao governo.

Com o se pode perceber, o La Razón apóia os trabaihadores, estudantes etodos aqueles que se opöem ao novo regime, o que certamente desagrada os

rnandatários peruanos. Q uaisquer sinais de oposicão são interpretados pelo

governo comb desrespeito autoridade instituIda. Assim, no d ia 8 de ag osto

de 1919, após o arcebispado de Lima já ter comunicado que nab iria mais

permitir que editores do jornal socialista utilizassem sua gráfica - por incompa-

tibilidade poiltica" -, o governo proIbe oficialmente a publicacao do La Razón

que é ob rigado a encerrar suas atividades. Ate rnesmo periódicos como La

Prensa eEl Comercio considerados "respeitáveis", são fechados. Legula não admite

que ninguém conteste sua legitimidade no poder. Nesse momento, M ariátegui

recebe o convite para it Europa, para "servir" o governo peruano como agen-

te de imprensa, o que seria, na prática, urna forma de ex Ilio disfarcada. Legula,

viiivo de Julia Sw ayne y M ariátegui (prima-irma do pai de M ariátegui), pode-

na ter ordenado a prisão do jovern periodista, mas, influenciado por Enrique

Piedra e Fócion M ariátegui (tio de J osé Carlos), decide mandar o futuro teóri-

co social ista para bern longe, achando que assim estaria resolvendo parte de

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Corn eles, cria urn ridcleo socialista seria a primeira célula corn unistape

ruana" - , que nao consegue se estruturar e não dura m uito tempo. N a I tália,

M ariátegui presencia a ascensão do fascism o, e as demo nstracoes dosfasci di

combattimento de Mussolini, assim corno conhece pessoalmente personalidades

importantes, como o próprio Benedetto Croce. Durante sua permanén cia na-

quele pals, escreve artigos e tenta cuidar da famIlia com os parcos recursos que

recebe. Por causa da crise econôm ica peruana, sua "bolsa", proveniente de par-

te do orcam ento do corpo diplomático peruano na Itália, enviado pelo M inis-

tério das Relacoes Exteriores, é cortada abruptarnente. Depois de algumas

tentativas e certa insisténcia, com eca a receber novam ente seu soldo m ensal.

na Itália também que fica sabendo corn m ais detalhes o que está aconte-

cendo no resto do rnundo. A im prensa italiana em geral é mais rica em infor-

m acóes e análises que a peruana n a época, e através de várias publicacoes,

como L Ordine Nuo vo, Avanti, It Soviet, Critica Sociale, Um anità Nuova e La

Rivoluzione Liberate, M ariátegui pode acomp anhar o desenvolvimento da re-

volucao russa, as lutas operárias na A lernanha, a luta pela independência na

Ir landa e o utros eventos im portantes do mo m ento. Na I tália, conversa corn

intelectuais e lé uma série de obras literárias clássicas. questionável que algu-

m a vez tenha ocorrido urn encontro entre Gramsci e M ariátegui, como afir-marn alguns autores. possIvel que tenharn se cruzado no congresso de Livorno,

o que não caracterizaria necessariamente urn "encontro". De qualquer m anei-

ra, nao houve uma influência direta do teórico italiano no jovem jornalista

peruano, ou vice-versa, mesmo que se possa tracar urn paralelo entre a vida e

a obra desses dois autores. José Carlos será bastante influenciad o, de form a

geral , pelas posicôes po lit icas do grupo do L Orctine Nuovo e em particular

pelas idéias de Croce, Giova nni Gen tile, Piero Gobetti, A chille Loria e An -tonio L abriola.

Entre junho e juiho de 1922, M ariátegui, sua esposa e seu filho vão a Paris -

onde o jornalis ta encontra novarnente Barbusse Para um a entrevista - e em

agosto a famIlia chega Aleman ha, indo primeiro a M unique e depois a B erlim.

Corn o dinheiro que havia econom izado, por viver de forma au stera na Itália,

consegu e ficar seis meses no pals. Estuda alernão corn urn p rofessor particular,

encontra amigos e intelectuais peruanos que vâo visitá-lo em seu aparta-

m ento, lé intensamente revistas e jornais, cria qualquer p retexto nas ruas para

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falar corn as p essoas e praticar a lingua, vai a museus e assiste a pecas de teatro.

M ariátegui acreditava que a A lemanha provav elmente seria o segund o pals

onde ocorreria um a revolucão socialista. Naquela ocasião, tambérn v isita as

cidades de Hambu rgo e Essen.

No m és em que chega Alemanha decide fazer uma viagem d e barco corn

o am igo Falcon pelo rio Dani.iibio, saindo de Passau e percorrendo rapidamen-

te cidades como Viena, Praga e Budapeste. Ainda se encontra de novo corn

FalcOn em Colônia, no comeco de 1 9 2 3 para discutir as possibilidades de se

preparar urna organizacão socialista peruana e, em 1 9 2 3 Mariátegui retorna

ao Peru corn a m ulher e o fliho a bordo do navio N egada, saindo do po rto de

Am beres em fevereiro e chegando a Callao no dia 1 8 de marco daquele mesmo

ano. Nesse m omen to comecaria uma no va etapa na vida do jornalista, que ja se

tornara fam oso em seu pals.

0 fato é que M ariátegui ainda é criticado po r alguns elemen tos oposicio-

nistas dentro do Peru, que insistem em acusá-lo pela viagem e perm anéncia

na E uropa, o que faz corn que ele tempo rariam ente se afaste das at ividades

pOblicas, ainda que recebesse antigos amigos em sua càsa. Chega a organizar

uma exposicão de pintores italianos, sem sucesso. 0 nascimento d e seu S egun-

do fllho, logo apOs seu retorno ao Peru, também será urn fato importante nesseperlodo. Em seguida, recebe urn convite de Victor Haya de la Torre, a quem

conhecera em 1 9 1 8 Para colaborar corn uma jornada de protestos contra a

dedicacao do Peru ao Sagrado Coraçao de Jesus pelo arcebispo de Lima e pelo

presidente Legu la. Somente no final de rnaio - quando as lutas se intensificam

e dois m anifestantes, urn operário e urn estudante, são assassinados pela poll-

cia - é que M ariátegui decide participar. Isso faz corn que Haya o leve para dar

paleStras nas Universidades Populates Gonzalez Prada, aproximando o jorna-l is ta dos estudantes e de seu grupo poli tico. Essa at i tude estava em sintonia

corn o que acontecia na época em outras partes daAm érica Latina. E born lern-

brar que em Cuba havia sido fundada por Julio Antonio M ella, entre outros, a

Universidade Popular José Marti e no Chile, a Universidade Popular Lastarria,

arnbas incentivand o a luta antiimp erialista e a reforrna universitária. Os ele-

rnentos m ais progressistas do continente, os lideres estudantis e, e alguns casos,

os futuros fundadores dos respectivos partidos comunistas estavarn extre-mam ente envolvidos nessa em preitada, que surgia como um a nova alternativa

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de luta poiltica dentro do p ainel classista tradicional desses pa Ises. E corn-

preensIve , portanto, que M ariátegui tam bém pa rticipasse dessa experiéncia.

Em outubro, Haya e preso e, logo em seguida, em janeiro de 1924, numa

reuniâo entre inte ectuais e alunos universitários, M ariátegui também é detido

pelas autoridades. Corn o exIl io de Haya d e la Torre, Mariátegui se torna o

principal intelectual de esquerda peruano , trabalhando em estreita colabora-

ção corn v ários futuros dirigentes da A PRA (Alianza Popular Revolucionaria

Am ericana), corn estudantes e corn Ilderes do m ovimen to operário, partici-

pando de conferéncias e continuand o a escrever Para várias pub icacoes da

capital. E urn co aborador constante de várias revistas, desde a Variec/ades -

que, apesar de set governista, não censura seus textos - ate a Claridad, fundada

por Haya de la Torre (e born lembrar que havia outras revistas corn o m esmo

nome na A rgentina e no Chile nessa época) e que era considerada o "órgão da

juventude ivre do Peru". Mariátegui assum e a função de diretor interino da

lariclad após a partida de Haya de a Torre.

José Carlos continua se dedicando intensam ente a construir o socialism o

em seu pals . Sua preocup acão principal nessa instância é estudar profunda-

m ente a realidade peruana a partir do método m arxista. Os trabalhos, porérn,

são extremamente fatigantes Para o frágil jornalista. Em maio de 1924 ele

desmaia e é levado a s pressas Para o hospital, onde é internado. Sua satide se

deteriora. Chega a ficar corn 42 graus de febre. 0 m edico qu e trata da enferrni-

dade, o doutor Gastañeda, descobre urn tumor na perna direita e insiste que a

ünica ma neira de salvar José Carlos é fazer um a amp utacao. A rude do jorna is-

ta se opóe por motivos religiosos, mas a esposa Anna dá sua permissão. Quan-

do fica sabendo que sua Perna havia sido amputada e que se tornaria urn inválido

definitivarnente, Mariátegui entra em extremo desespero, mas é consolado pelarnulher. Ao sair da clInica, encontra-se numa situação eco nôrnica com plicada,

já que ganhava pouco pe os artigos e tinha de pagar as muitas despesas do

hospital. Os amigos organizam uma campanha na capital para ajudar a arreca-

dar fundos Para o jorna ista, corn sucesso. A guns m eses ma is tarde, ele já es-

crevia novam ente Para a imprensa peruana, enquanto sua casa voltava a set

local de reuniôes de traba hadores e intelectuais progressistas.

Em 1925, Mariátegui, junto corn seu irmão Julio César, funda a editoraM inerva. Nesse mesmo ano, pub ica La escena contempordnea, seu primeiro

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livro, considerado um a obra "européia" - colecäo d e artigos sobre arte e poilti-

Ca, editados originalmente em Varieclades e Mundial, sobre personalidades e

acontecirnentos em sua maioria do Velho Continente daquele perlodo. Outros

escritores peruanos importantes, como Mariano Iberico Rodriguez, Luis

Valcárcel, José Maria Eguren e Panait Istrati, também terão suas obras publicadas

pela M inerva.

Durante m uito tempo, M ariátegui quis fundar um a revista influente, que

pude sse divulgar as artes e as idéias socialistas. Por sugestâo do pintor peruan o

José Saboga l, que se com prorneteu a preparar a capa da publicacao, nome

escoihido foi Amauta, palavra quéchua que significa sacerdote, sábio, de acor-

do corn antigas tradicoes populates do pals. Assirn, em setem bro de 1926 é

publicado o primeiro n6rnero da Amauta, corn urna tiragem de 3.000 exern-

plares, na qual colaboram os m ais importantes intelectuais de vanguarda d o

Peru da época, assim como opositores deportados do regime Legula. Alguns

anos m ais tarde, o próprio M ariátegui começ ará a set chama do tarnbérn de

"Am auta" pelos intelectuais progressistas e socialistas de todo o continente.

De acordo c orn o editorial, que fazia a apresentacão do prirneiro nümero , a

revista náo representaria urn grupo , mas, sirn, urn rnovim ento, urn espirito,

com posto de autores ideológ ica, estética e psicologicarnente diferentes, mas

corn o objetivo cornum de construir urn Peru novo dentro de urn mundo

nov o. AAm auta, porérn, náo seria urna "tribuna livre". Para seus editores, teria

urn caráter beligerante, polémico, que nao faria concessôes nern rena tolerân-

cia a idéias con trárias; toda retórica seria retirada da revista para que tivesse

apenas con teüdo, "espIrito". Ou seja, a publicacao não teria prograrna, somen-

te urn destino, urn objeto, que seria o de esclarecer e conhecer os prob lernas

peruan os de pon tos de vista doutrinários e cientificos. Portanto, o Peru seria

visto a partir de um a perspectiva rnundial. E então o grande objetivo da revis-

ta, que seria aproxirnar os "hornens nov os" do Peru aos outros povos da Arné-

rica e do resto do planeta.

Em junho de 1927, bastante preocupado corn a repercussao da revista,

o governo L egula utiliza o argurnento de urna conspiracão com unista - prin-

cipalmente basead o em docu rnentos confiscados da APRA , entre des a corres-

pondéncia entre Haya e Mariátegui apreendida pela poilcia - Para prender

seus editores. Nessa ocasiáo, Jose Carlos fica seis dias detido no hospital

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militar de San Bartolorné, enquanto sua residéncia é invadida pela polIcia,

que rem exe sua biblioteca e leva vários de seus livros.

Apó s a prisao, M ariátegui é mand ado para casa, onde com eça a trabalhar

novam ente, escrevendo Para vários jornais em protesto contra os abusos e arbi-

t rariedades do regime, sendo ainda vigiado pelas autoridades. Durante todo

aquele periodo, m ostra-se urn duro crItico do governo. Assim, em novemb ro

de 1928, lança Labor, "quinzenário de informacao e idéias", que se torna o

mais importante periódico socialista da época, corn urna tiragem de 5.000

exernplares. Menos de urn ano rnais tarde, Labor seria fechado pelo governo.

Em 1928 tarnbém publica seus Siete ensayos de interpretación de la realidad

peruana, urna das obras rnais criativas e originais sobre a form açao étnica e

social do Peru ate en tâo. Cornpilacao de artigos publicados anteriorrnente no

Mundial e na Amauta, o l ivro cria um a eno rrne polémica. M uitos crIt icos,

principairnente apristas, na ocasião, acusarn-no de set apenas urn "jornalista",

ainda corn tracos "europeizantes", sern profundidade nern conhecirnentos aca-

dém icos. M as os anos mostraram que aqu ele era urn trabalho de grande im-

portância e fundamental Para a com preensâo da forrnaçao social peruana. Na

atualidade, esse talvez seja o livro peruano corn m ais edicoes no exterior, corn

traduc6es em diversas lInguas, assim corno provavelmente a obra teórica m ar-xista m ais importante produzida no continente.

No comeco de 1928, urn grupo de apristas no Mexico propóe que a APRA

se tom e urn partido politico naciona lista no Peru, a partir da estrutura que a

organizacão já possuIa. Quand o recebe a notIcia, Mariátegui fica indignado .

Escreve um a carta Para Haya de la Torre e Para a célula mexicana da A PRA que

havia feito a sugestao, afirm ando q ue aquilo era u rna atitude eleitoreira detes-

tável, ao estilo do velho regime, e que isso transformava urn movirnentoantiimperialista numa mentira. Para ele, Haya fazia parte de uma boémia

revolucionária" e havia se tornad o de direita. E born recordar que Haya havia

sido urn dos principais fundadores das U niversidades Populates Gonzalez Prada,

urn centro irnportante de discussáo e difusão de idéias antiimperialistas no

Peru. Quando vai Para o exilio no M exico, ele funda a A PRA, que seria urn

"partido internacional", tendo corno po ntos principais o antiirnperialisrno, a

unidade da A m erica Latina, a estatizaçao das riquezas rninerais e das proprie-dades agrárias, a internacionalizaçao do Can al do Panarná e a solidariedade

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corn Os povos o prirnidos. 0 lIder estudantil argum entava que a A PRA seria

uma "adaptacao" do marxismo a s condicoes locais, ou seja, que o aprismo seria

a forma d e m arxisrno a set aplicada na A merica Latina. Para ele, esse "marxis-

mo latino-americano náo poderia ficar preso somente a s categorias euro-

péias, deveria set elaborado a partir de uma perspectiva do No vo M undo , ter

liberdade rnetodologica e ter a capacidade de estar constanteme nte se mod ifi-

cando e se renovan do. Por isso, Haya recorre tanto a obra de Marx quanto ao

"relativismo" de Einstein, por exemplo, para desenvo lver sua concepcão - ele

discute a inter-relacão do "espaco histórico" corn o "tempo histórico", que

teriam caracterIsticas próprias e seriam diferentes dependen do de cada regiâo

do planeta. Para o caso peruano, haveria urn "espaco-temp o histórico" indo-

americano próprio, diferente do europeu. Assim, a concepcão marxista da his-

tória não teria validade absoluta. As diretrizes marxistas, portanto, teriam de se

moldar ac, novo ambiente social e histórico da America Latina e set reelaboradas

a partir de novas perspectivas Para Haya, por exem plo, enquanto o imp erialis-

mo poderia set visto como a fase superior do capitalismo na Europa, na A rné-

rica Latina seria apenas a fase inicial. Ele também achava que a divisão dos

perlodos históricos, corno a Idade Med ia ou Contem porânea, seria arbitrária e

construlda a pa rtir de referenciais europeu s. Ou seja, essas con strucóes n ao

seriam un iversais. A A PRA , portanto, seria uma orga nizacão politica e tarn-

bern um a "filosofia", uma tentativa de adaptacao do marxismo a America Lati-

na, assim com o um a suposta "superacão" do m arxisrno, corn a intenção clara de

se contrapor a determinadas idéias defendidas por alguns socialistas na épOca.

Talvez urn dos p rirneiros m ili tantes latino-americanos a contestar Haya

tenha sido Julio Antonio Mella, urn dos fundadores do Partido Comunista

Cuban o, que defendia uma linha mais ortodoxa e em d iversos artigos atacouveementemente o dirigente peruano. De alguma forma, a APRA podia set

vista corno um a ame aca, urna nova alternativa aos jovens PCs da região. Para

M ella, os apristas defendiam o antiimperialismo como uma luta pela indepen-

déncia nacional, quando na realidade a ordem do dia seria a revolucao socialis-

ta. 0 imperialismo Para ele teria uma dinâmica internacional, e, portanto,

independ entem ente de "espaco e tempo históricos", todos os palses estariam

dentro do m esmo p rocesso determinante. Em todos os palses haveria proleta-riado, as formas de exp loracao seriam parecidas e as "leis" do m arxismo seriam

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universais. Para Mella, a APRA seria uma justificativa de alianca corn os refor-

mistas e corn as burguesias nacionais do continente. Sornente os operários

estariam ap tos a fazer a revolucáo so cialista na Arnérica.Latina. Isso significa

que nem os carnpon eses estariarn incluldos corno agentes principais da luta.

Para ele, náo se poderia discutir a questao de racas nern m ais especificarnente

a questao do indio. Enquanto Haya acreditava na necessidade incontestável da

resolucao do problerna indIgena e considerava tanto a ernancipaçâo quanto a

própria afirmacao da identidade dos Indios com o precondicoes fundam entais

Para a revolucao social, Mella insistia em que den tro do sisterna capitalista já

nao haveria m ais espaco Para a questão étnica nem Para outros protagonistas

revolucionários. 0 im perialismo teria transform ado a discussão sobre a raca

em questao econôm ica. Ou seja, os Indios, a partir dessa interpretacao, deve-

riarn ser vistos apenas corno trabaihadores. E a reso ucâo Para esse problerna

econô rnico seria sornente a revolucao feita pelo proletariado. Já Para Haya,

deveria haver urna alianca interc assista, urna frente ünica, corn classe m edia,

inte e ctuais, estudantes, campo neses, trabalhadores industriais e outros setores

interagindo Para irnpulsionar a luta contra o impe rialismo e Para as rnudancas

estruturais dentro de urn deterrnina do pals. Por isso, Mella insiste ern que a

APR A seria indo-arnericanista, populista e nacionalista.

Nesse contexto, Mariátegui tam bém se rnostra urn crItico da APRA e de

suas concepcó es. 0 "Arnauta" certarnente defende as tradiçoes indo-arnerica-

nas, rnas não considera que estas possam superar o rnarxisrno. Ern outras pala-

vras, o m arxismo seria urn "rnétodo", que deveria ser utilizado de forma criativa

e original pelos teóricos do continente Para adaptá-lo a realidade local. N ão

haveria o intuito de superacao per se da dou trina, rnas, sirn, sua continuaçao,

evo ucão e desenvolvimento. On seja, saber usa-la corn sua "flexibilidade

dialética" em quaisquer circunstâncias. Justamente por isso, ele poderá analisar

as questôes especIficas da regiao, respeitando suas peculiaridades, e, ao m esmo

tempo , tam bém terá a capacidade de observar essas rnesrnas questoes dentro de

urn painel rnais arnplo das relacoes po ilticas e econôrnicas internaciona is e do

próprio processo histórico do capitalisrno. Os intelectuais da APRA tentarn

acusá-lo de "europeizmte", nao s o por sua estada no Veiho Continente corno

tambérn por utilizar prioritariarnente o rnétodo rnarxista - Para eles europeu -ern ccntraposicao ao aprisrno, supostam ente defensor das tradiçoes e form as

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de pensar indIgenas locals. Mariátegui certamente usa urn instrumental "euro-

peu" para criar urn "nacionalism o peruano" pleno - p ara ele fundam ental - e

levar adiante urna "tarefa am ericana". Ou seja, ele "m ariateguiza" M arx, torna

as idéias marxistas mais flexiveis, adaptando a do utrina a seu pals. De acordocorn o "Arnauta", não haveria salvacao para a Indo-América sem a ciéncia e o

pensam ento europeus. Ao m esmo tem po, porérn, ele usa urn arcabouco teóri-

co ocidental Para elaborar urn socialismo corn caracteristicas próprias de sua

região. A diferenca entre os dois pensad ores parece suti , rnas é profunda . Para

Haya, a descentra izacao do m arxisrno teria sido provocada de "fora", saindo

de urn centro, a Europa, e sendo reinterpretada em ou tro, a A m erica Latina,

enquan to, de acordo corn Mariátegui, a "descentralizaçao" do rnarxismo não

partiria de urn centro ao outro, mas ale clentro clopróprio marxismo, que deveria

ter em si mesmo essa flexibilidade teórica Para se adaptar a s diferentes realida-

des e ter a po ssibilidade d e se expressar de diversas rnaneiras distintas. Ou seja,

a superacâo não é do rnétodo m arxista, que seria correto, mas apenas da pers-

pectiva européia. Urn m arxismo "n acional", portanto, estaria de acordo corn a

doutrina rnarxista, m esm o que adaptado a um a outra realidade.

De qualquer forma, por discordar dos rumos da APRA , que abriam carni-

nho para o populismo, no dia 7 de outubro de 1928 Mariátegui ajuda a

fundar o Partido Socialista do Peru, que, de acordo corn algun s dirigentes da

Terceira Internacional, seria urna mistura de aprismo corn comunismo.

Na ocasião, é eleito secretário-geral da o rganizaçao. E irnportante lem brar que

Mariátegui não funda urn partido cornunista , mas, sirn, explicitarnente,

urn agrupam ento corn a designacao de "socialista". 0 "Arnauta" é grande ad-

rnirador de Lenin e da revo ucão russa, mas nern por isso aceita manter-se

dentro das norm as rIgidas im postas pelo Com intern. A decisão do periodista

peruano, portanto, foi pensada e teve com o objetivo dar major m ob ilidade e

flexibilidade a sua organizacão e trabalhar para a construçao de urn soc ial ismo

corn caracterIsticas próprias e contra, corno ele mesm o dizia, os pedantes pro-

fessores tedescos da mais-valia, assim corno contra a burocracia dos p artidos e

sindicatos repletos de m esurados ideologos e prudentes funcionários impreg-

nados de ideologia burguesa. Em ou tras pa avras, se Mariátegui se define com o

ma rxista e "cornunista", nâo é por aderir aos preceitos do Com intern, mas sim

por sua trajetória intelectual e suas exp eriências polfticas m uito particulates.

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A fundacao do Partido Socialista tern com o o bjetivo possibilitar a organizacão

de um a "m oral dos produtores", aumentando a base diretiva das classes popu-

lares em outros setores, na grande tarefa de construir urn socialismo indo-

americano co rn caracterIsticas próprias. Sua intencâo é criar urn novo Estado

nacional que tenha a am pla participacão não s o do proletariado como também

do cam pesinato indIgena, o que era uma posicáo rnuito diferente daquela de-

fendida por boa p arte dos m arxistas da época. 0 indigenism o, portanto, seria

revolucionário.

No inlcio de 1929 ele também ajuda a organizar a Confederacao Geral dos

Trabaihadores do Peru, que tern seu cornité provisório escoihido em 17 de

maio daquele ano. 0 Partido Socialista, naquela ocasião, recebe convites e

envia cinco mem bros da nova CGTP Para o Con gresso Sindical Latino-Am e-

ricano, que seria realizado naquele m és em M ontevidéu. A Primeira Conferén-

cia Comunista Latino-Americana, em Buenos Aires, que ocorre em junho,

conta ainda corn a p resenct de dois m ilitantes da central. Mesmo assirn, o Biró

Sul-Americano da Terceira Internacional tern uma opinião desfavorável sobre

o partido que acaba de ser criado por M ariátegui, já que este deveria obrigato-

riarnente estar subm etido ao mando irrestrito do Com intern. E nesse mornen-

to que a sañde do "Am auta" piora novam ente. Em marco de 1930, ele é levado

mais uma vez ac, hospital, onde fica por trés semanas. Uma junta médica,

encabecada pelo Dr. Fortunato Quesada e composta pelos medicos Constantino

Carvallo, Guillermo Gastañeta, Eduardo Goicochea, Hugo Pesce e Carlos R oe,

tenta salvar o teórico socialista. M esrno corn duas operacoes de em ergéncia e

urna breve m elhora, a infeccao estafilocócica volta a se espaihar, fazendo corn

que sua satlide piore. Ainda tern tempo de renunciar oficialmente como secre-

tario-geral do partido, indicando E udocio Rav ines para o cargo, mas náo resis-te a enfermidade. No dia 16 de abril de 1930, Mariátegui rnorre na ClInica

Villarán, na capital do pals. Seu corpo é levado no d ia seguinte pelas ruas de

Lim a, seguido por mem bros da CGTP e por m ilhares de trabalhadores, estu-

dantes, ar tis tas e intelectuais , cantando e e m punhando bandeiras verm elhas

durante todo o p ercurso do cortejo. 0 lIder revolucionário näo chegou a corn-

pletar 36 anos de idade. A doenca, ate hoje, é mo tivo de controvérsias. Alguns

estudiosos afirmam que José Carlos Mariátegui poderia ter sofrido de umaosteomielite crônica, enquanto outros sugerern um a tuberculose inflam atória.

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Ele deixa dois Iivros quase prontos - que não puderam set publicados naquele

mornento - outros dois em projeto escritos parcialmente e urna série de

tarefas polIticas em andam ento.

A presente ediçao reüne textos significativos da obra de Mariátegui, que

incluern temas fundam entais discutidos por ele na imprensa d e seu pals. Utili-

zando personalidades e acontecimentos de sua época como temas destes breves

artigos, o Am auta aborda assuntos como o fascismo, a democracia , a arte e

a politica em geral. Corn eles podem os conhecer suas irnpressôes sobre Mussolini

e sua m udanca de atitude em relaçao fIgura de D'Annunzio; sua desconfian-

ça em relacão demo cracia norte-americana, explicitada nos textos sobre

W ilson e H oover; sua admiracao - ainda que em mom entos fizesse ressalvas -

por figuras como E ugene Debs, Jean Jaurès, Leon T rotsky, Zinoviev, Obregon,

Ma róf, Gan dhi, Tagore e Jose Ingenieros - que, rnesmo m uito diferentes entre

si, possulam traços que ele adm irava - e seu co ntinuo interesse pela literatura,

corn os artigos sobre Máximo Gó rki, André Gide, Anatole France e O liverio

Girondo Estes artigos mostram o estilo ousado e polmico de Mariátegui e

sua visão original de fatos e personagens do inicio do século XX , o que denuncia

a que distância estava em relacao a alguns rnarxistas ortodoxo s de sua época.

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Mariategui na iriauguracao da sede da editora Minerva

em 31 de outubro de 1925.

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A benévola insisténcia de alguns amigos me fez decidir a coligirnurn livro urna parte de m eus artigos dos tltirnos anos

sobre 7iguras e asp ectos da vida mundial .

1...]

Penso que nao épossIvel apreender em um a teoria o panorama com pleto

do m undo conternpoáneo e qu e, sobretudo, náo epossIvelfixar em urna

teoria seu movirnento: temos de explord-lo e conhecé-lo,

episódio por episódio, faceta porfaceta. Nosso juIzo e no ssa irnagina cáo

se sentiräo sempre atrasados em relação a totalidade do fenôrneno.

Por conseguinte, o meihor rnétodo para explicar e traduzir nosso tempo

e, talvez, urn m étodo urn pouco jornalIstico e urn pouco cinernatograjIco.

1...]

Náo sou u rn espectador ind/èrente do dram a hurna no. Sou, pelo contrdrio,

urn hornem corn uma fihiacao e urnafe. Este livro náo tern mais valor

do que o de ser urn reg istro leal do espIrito e da sensibilidade

de minha g era cáo. Eu o dedico, por isso, aos homens novo s,

aos hornens jovens da America indo-ibérica.

Jose Carlos Mariátegui, prefácio de La escena contempordnea, Lima, 1925)

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BEN ITO MU SSOLINI'

Fascismo e Mussolini são duas palavras consubstanciais e solidárias.

M ussolini é o anirnador, o lider, o duce m áxirno do fascismo, que p or sua vez é

sua plataforma, tribuna e veIculo. Para explicarm os urna parte desse episódio da

crise européia, recorrarnos rapidarnente a história dosfasci e de seu caudilho.

Mussolini, corno se sabe; é urn politico de origem socialista. Não teve

dentro do socialisrno urna posicão cen trista nern rnoderada, m as sirn extrernis-

ta e incand escente. Teve urn papel cond izente corn seu temp erarnento, já que

e espiritual e organicam ente, urn extrernista: está na ex trerna esqu erda ou na

extrerna direita. De 1910 a 1911, foi urn dos lideres da esquerd a socialista

e, ern 1912, dirigiu a exp ulsão do seio socialista de quarto dep utados p arti-

dários da colaboracao ministerial: Bonomi, Bissolati, Cabrini e Podrecca.

Pa ssou então a d irigir o jornal Avanti. Vierarn ern seguida 1914 e a Gue rra.

o socialisrno italiano exigiu a neutralidade do pais, rnas M ussolini, invaria-

veirnente inquieto e beligerante, se rebelou contra o pacifismo de seus corre-

ligioná rios e defendeu a interven cao da Itália no co nflito. Inicialrnente deu

a seu intervencionisrno urn enfoque revolucion ário, sustentando que estend er

e radicalizar a guerra significaria apressar a revolucao européia. M as, na rea-

l idade, em sua po stura intervencionista havia um a psicologia guerreira que

não co rnbinava corn a ati tude tolstoyana e passiva de neutralidade. Ern no-

vembro de 1914, Mussolini abandonou a direcao do Avanti e fundou ern

Milão II Popolo d Italia Para defender o ataque a Austria. A Itália se uniu

Pub licado originalmente corn o tItulo "M ussolini y el fascisrno", no livro La es cena

contem pora nea, Lima, Minerva, 192 5.

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a Entente. Mussolini, o propagandista da intervencâo, foi também, conse-

qüentem ente, urn soldado da intervençâo.

Ch egaram a vitória, o arm isticio e a desrnobilizaçao. Tudo isso trouxe tam -

bern urn p erlodo de oc iosidade Para os intervencionistas. D'Ann unzio, nostál-

gico de gestas e epopéias, realizou a aventura de F iume , enquanto M ussolini

criou osfasci di combatt imento: lancas ou feixes de com batentes. Mas na Itália

o m om ento era revolucion ário e socialista. Para aquele pals, a guerra havia sido

urn rnau negóc io. A Entente ihe havia concedido u rna mag ra participacão no

butirn. Esquecida da co ntribuiçao das arrnas italianas para a vitória, Ihe hav ia

regateado teimosarnente a possessão de Fium e. A Itália, ern sum a, havia saldoda guerra corn urna sensacao de descon tentame nto e de desencanto. Realiza-

rarn-se, sob essa influéncia, as eleiçoes, e os socialistas acabararn co nqu istando

155 cadeiras no Parlam ento. Mu ssolini, candidato por M ilão, foi estrondosa-

m ente derrotado pelos vo tos socialistas.

M as esses sentimen tos de decepçao e de dep ressáo nacionais erarn propi-

cios a urna violenta reação nacionalista. E foram a raiz do fascisrno. A classe

m edia ern geral é peculiarmen te suscetivel aos m ais exaltados rnitos patrióti-

cos, e a italiana, particularrnente, sentia-se distante e adv ersária da classe prole-

tária socialista: nao perdo ava su a atitude de ne utralidade, seus altos salários, os

subsIdios do Estado e as leis sociais que durante e de pois da guerra havia con -

seguido pelo m edo da revolucao. A classe rnédia padecia e sofria corn a idéia de

que o proletariado, neutro e ate rnesrno derrotista, acabasse usufruindo de

urna gue rra que hav ia rejeitado e cujos resultados desvalorizava , dirninula e

desdenhava. Esse m au hum or da classe media encontrou urn lar no fascism o.

M ussolini atraiu, assim, a classe m edia a seus fasci di com batt im ento.

Alguns dissidentes do socialism o e do sindicalismo se a listararn nos fasci,

contribuindo , corn sua experiéncia e sua destreza, na organizaçäo e captacao d e

rnassas. 0 fascismo nao era, todavia, uma seita program ática e conscientem ente

reacionária e conservadora: ele se considerava revolucionário. Sua propagandatinha rnatizes subversivos e d em agógicos. Posicionava-se, por exem plo, contra

Os nov os ricos. Seus princlpios - de tendén cias republicanas e an ticlericais -

estavarn im pregnados de um a confusão m ental da classe media que, instin-

t ivarnente descontente e desgostosa corn a burguesia, era vagarnente hostil ao

proletariado. Os socialistas italianos cometerarn o erro de não usar armas

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polIticas sagazes para m odificar a atitude espiritual da classe m edia. Mais am -

da, acentuararn a inimizade entre o proletariado e a picco la bor ghesia - assim

cham ada e tratada de forma desdenhosa por alguns solenes teóricos da ortodo-

xia revolucionária.A Itália entrou num periodo de guerra civil. Assustada pelas chances da

revolucao, a bu rguesia, solIcita, arrnou, abasteceu e estim ulou o fascism o; e o

ernpurrou perseguicão truculenta do socialismo, destruicao dos sindicatos

e coop erativas revolucionárias, a queb ra de greves e insurreicóes. 0 fascism o se

converteu, assirn, num a m ilIcia num erosa e aguerrida e acabo u por set m ais

forte que o próprio Estado. Entâo reclamou o poder. As brigadas fascistas

conqu istararn Rom a, e M ussolini, em " cam isa negra", ascendeu ao governo ,

obrigando a m aioria do Parlarnento a Ihe obed ecer e inaugurand o urn regime

e urna era fascista.

Sobre M ussolini se escreveu m uita ficcao e pouca realidade. Pot causa de

sua beligerancia politica, qu.ase não é po ssIvel um a definicao ob jetiva e nitida

de sua personalidade e sua Ligura. Algum as definicoes são ditirârnbicas e cor-

tesãs; outras, rancorosas e p anfletárias. Mu ssolini é conhecido, episodicarnente,

através de aned otas e fotografias. Diz-se, por ex em plo, qie ele é o artifice do

fascism o. Acredita-se que M ussolini "fez" o fascismo. O ra, Mussolini é urn

agitador treinado, urn organizador exp erimentado, urn p ersonagern vertigino-

sam ente ativo. Sua atividade, seu dinamism o e sua tensão influiram eno rrne-

m ente no fenôrneno fascista. Mussolini, durante a cam panha fascista, falava

em trés ou quarto cidades num rnesmo d ia: usava o aviâo para i t de Rom a aPisa, de Pisa a Bolonha, de Bolonha a Milão. Ele é voluntarista, dinâmico,

verborrágico, italianhssirno, singularrnente dotado para agitar as rnassas e exci-

tar rnultidóe s: foi o organizad or, o anima dor, o condottiere do fascismo. M as

nao foi seu criador, nao foi seu artifice. Extraiu de urn estado de ânim o u rn

rnovirnento politico; rnas não rnode ou esse m ovimento a sua irnagern e sem e-

Ihanqa , nern deu urn espIrito oem u rn program a ao fascisrno. Ao con trário, foi

o fascisrno clue deu seu espIrito a Musso lini. Sua con substanciaca o e identifi-

cacao ideológica corn os fascistas o obrigou a exo nerar e a purgar seus d1timo s

residuos socialistas. Mussolini precisou assirnilar o anti-socialismo e o

chauvinismo da classe m edia para enq uadrá-la e organizá-la nas f ileiras dos

fasci di combat t imento , assirn corno teve de definir sua polftica como rea-

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cionária, anti-socialista e anti-revo lucionária. 0 caso d e M ussolini se distin-

gue nesse sentido dos casos de Bonorni, de Briand e outros ex-socialistas.

Bon orni c Briand nun ca se virarn forcados a rom per explicitarnente corn sua

origern socialista. AtribuIram-se, isto sim, urn so cialismo rnInimo, hom eo-

pático. Mu ssolini , ao contrário, chegou a d izer que se envergonhav a de seu

passado socialista, com o urn hornem rnaduro se envergonha de suas cartas de

am or de adolescente, e saltou do socialisrno m ais extrem e, ao conservadorisrno

m ais radical . Não atenuou n ern reduziu seu socialismo: abando nou-o total e

integralrnente. Seus rum os econôrnicos, por exernp lo, são adversos a urna po ll-

tica de intervencionismo, de estatisrno, de fiscalismo. N ão aceitarn o tipo transa-

cional de Estado capitalista e ernpresário: tendern a restaurar o tipo clássico de

Estado arrecadad or e policial. Seus pon tos de vista de hoje são diam etralrnente

opostos aos de on tern. M ussolini era convicto de suas idéias ontern com o é

hoje. Qual foi, então, o rnecanismo ou processo de sua conversão de urna

doutrina a outra? Não se trata de urn fenôrneno ce rebral; trata-se de urn fenô-

rneno irracional. 0 m otor dessa rnudanca de atitude ideologica não foi a idéia;foi o sentirnento. M ussolini não se desernbaraco u de seu socialism o, nern inte-

lectual, nern conceitualrnente. 0 socialismo n ão era nele urn co nceito, rnas sirn

urna ernocão, do m esrno rnodo que o fascismo tampouco é nele urn conceito,

rnas sirn tarnbérn um a ernoção. Observernos urn dado p sicológico e fisionôrnico:

M ussolini nunca foi urn intelectual, rnas sim urn sentimental. Na p olItica e na

imprensa não foi urn teórico nem urn £ilósofo, mas sirn urn retórico e urn

condutor. Sua linguagern n ão foi p rograrnática, nem principista, nern cientifI-

ca, ma s sirn passional e sentime ntal. Os discursos rnais fracos de M ussolini

foram aqueles em que tentou definir a fil iacao e a ideologia do fascisrno. 0

prograrna do fascisrno é co nfuso, contraditório, heterogéneo: contérn, rnescla-

dos pêle-méle   , conc eitos liberais e sindicalistas. Meiho r dizendo, M ussolini

não deu ao fascismo urn verdadeiro program a; ditou- he urn plano de ação.

M ussolini passou do soc ialisrno ao fascismo e d a revolucão reacão por

um a via sentimen tal e não con ceitual . Todas as ap ostasias históricas foram ,

Todos os nomes destacados em negrito estão no anexo "Tex tos biograficos" a partir

dapagina 141.

2 Confusamente.

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provav elmen te, urn fenôm eno espiritual. Mussolini, extremista da revolucao

ontern, extrem ista da reacao hoje, nos lem bra Juliano. Com o esse imperador,

personagem de Ibsen e de M erechkov ski, Mussolini é urn ser inqu ieto, teatral,

alucinado, supersticioso e m isterioso q ue se sentiu eleito pelo D estino para

decretar a perseguicâo do novo deus e repor em seu altar os moribundos

deuses an tigos.

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POster da Mostra della Rivoluzione Fascista, 1932.

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GABRIELE D ANNUNZIO

D'Annunzio não é fascista. M as o fascism o é d'annunziano. 0 fascism o usa

costumeiram ente urna retórica, um a técnica e um a postura d 'annunzianas. 0

grito fascista de "Eia, eia, alalá" é urn grito da epop éia de D'Annu zio. As on-

gens espirituais do fascismo estão na literatura e na vida d e D'Ann unzio. Ele

pode, portanto, renegar o Tascismo; mas o fascismo nao pode renegá-lo.

D'Ann unzio é urn do s criadores, urn dos artifices do estado de ânim o no qu alse incubou e Se m odelou o fascisrno.

M ais ainda: todos os cap itulos recentes da h istória italiana estão saturados

de d'annunzianismo . Adriano Tilgher, num den so ensaio sobre a Terza Italia,

define o perIodo pré-bélico de 1905 a 1915 como o reino incontestado da

m entalidade d'annunziana, nutr ida de recordacO es da Rom a imperial e das

comunas italianas da Idade Media, forrnada de naturalismo pseudopagao,

de aversâo ao sen timentalismo cristão e hurnan itário, de culto a violéncia, de

desprezo p elo vulgo profano curv ado sobre o trabalho servil, de diletantism o

.quilometrofágico corn urn vago delfrio de grandes palavras e de gestos im po-

nentes". Durante esse perIodo, constata Tilgher, a pequen a e a m edia burgue-

sia italiana se alim entaram da retórica de um a imp rensa dirigida por literatos

fracassados, totalmente irnpregnados de d'annunzianismo e de nostalgias

irnperiais.

E na gu erra contra a Austria - urna gesta d'annun ziana - se gerou o fascis-

m o - também um a gesta d'annunziana. Todos os lIderes e capitães do fascism o

Publicado originalmente corn o tItulo "D'Annunzio yel fascisrno" no livro La escena

con tempordnea , Lima, Minerva, 192 5.

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provém da faccao que se envolveu corn o governo neutralista de Giolitti e

cond uziu a Itália a guerra. As brigadas do fascism o se cham aram inicialmente

feixes dc combate. 0 fascismo foi urna emanacão da guerra. A aventura de

Fiume e a organizaco dosfasci foram dois fenômenos gém eos e sincrônicos.

Os fascistas de M ussolini e os arditi de D'Annunzio confraternizavam. Uns e

outros se lançavam a suas em presas ao grito de "Eia, eia, alalá" 0 fascism o e o

fiumanismo se am amentavam nas tetas da m esma loba, como Rôm ulo e Remo.

M as, assim com o Rôm ulo e Rem o, o destino queria que urn m atasse o outro.

O fiumanism o sucum biu ern Fium e afogado em sua retórica e em sua poesia.

E o fascismo se desenvolveu, livre da concorréncia de todo mo vimento similar,

a expensas dessa imolaçao e desse sangue.

0 fiurnanismo resistia em desc er do m undo astral e olImp ico de sua utopia

ao m undo co ntingente, precário e prosaico da realidade. Sentia-se por cim a da

luta de classes, por cim a do con flito entre a idéia individualista e a idéia socia-

lista, por cima da eco nom ia e de seus problem as. Isolado da terra, perdido no

éter , o fium anismo estava conden ado a evaporacão emorte. 0 fascismo,

no entanto, tornou po sicäo na luta de classes e, explorando a o jeriza da classe

media contra o proletariado, a enquadrou em suas fileiras e a levou luta

contra a revolucao e co ntra o socialismo. Tod os os elem entos reacionários e

conservadores que estavam m ais ansiosos por urn com ando decidido a comba-

ter a revolucâo do q ue po r urn politico inclinado a pactuar co m ela, se alista-

ram e se con centraram nos quadros do fascismo. Exteriorm ente, o fascism o

conservou seus ares d'annunzianos; mas interiormente seu nov o conteñdo e

estrutura social desalojararn e sufocaram a rarefeita ideologia d'annunziana. 0

fascismo cresceu e venceu, näo com o m ovirnento d'annunziano, mas sim com o

m ovirnento reacionário; náo com o interesse superior luta de classes, m as sim

com o interesse de um a das classes beligerantes. 0 fiuman ismo era m ais um

fenômeno literário do que politico. 0 fascismo é urn fenôrneno eminente-

mente politico. 0 condotiere do fascismo tinha q ue set , por conseguinte, urn

politico, urn cau dilho agitador, plebiscitário, dem agógico. E por isso o fascis-

mo encontrou em Benito Mussolini - e náo em Gabriele D'Annunzio - seu

duce, seu anim ador. 0 fascismo necessitava de urn lider pronto a usar, contra o

proletariado socialista, o revolver, o bastão e o O leo de rIcino. E po esia e óleo

de rIcino são du as coisas incon ciliáveis e d issIrniles.

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A p ersonalidade de D'Ann unzio é arbitrária, versátil e não cabe de ntro de

urn partido: ele é urn ho mern scm fihiacao ou disciplina ideológica. Aspira a ser

urn grande ator da história. Não ihe preocupa sen ão sua grandeza , seu desta-

que, sua estética. Nâo obstante, D'Ann unzio m ostrou, apesar de seu elitisrno e

seu aristocratisrno, um a frequente e instintiva tendéncia a esquerda e a revolu-

cão. Ern D'Ann unzio nâo ha u m a teoria, uma d outrina, urn conc eito: ha so-

bretudo urn ritrno, urna rnüsica, urna forrna, que tiverarn, entretanto, ern alguns

sonoros episódios da história do grande poeta, urn rnatiz e urn sentido revolu-

cionários. E que D'Annunzio am a o passado; m as arna ainda m ais o presente.

o passado o pro ve e o abastece de elem entos decorativos, de esm altes arcaicos,de cores raras e de hieróglifos misteriosos. Ma s o presente é a vida. E a vida é a

fonte da fantasia e da arte. E, enquanto a reacâo é ü instinto de c onservacão, o

estertor agonizante do passado, a revo ucão é a gestacao dolorosa, o parto san-

grento do presente.

Quand o, ern 190 0, D'Annunzio ingressou na C ârnara italiana, sua caréncia

de filiacao e falta de ideologia o levararn a urn assen to entre os conservad ores.M as, nurn dia de polérnica emoc ionante entre a maioria burguesa e dinástica e

a extrerna esquerda so cialista e revolucionária, D'An nunzio, ausente d a contro-

vérsia teórica, sensIvel sornente ao pulsar e a em ocão da v ida, se sentiu atraldo

m agneticarnente para o cam po de gravitacão da m inoria. E falou assirn a extre-

m a esquerda: "No espetáculo de hoje vi, de urn lado, rnuitos mo rtos que gritarn

e, de outro, poucos v ivos e eloqüentes. Com o hornem de intelecto, carninho

para a vida". D'Annunzio nâo carninhava p ara o socialismo nern para a revolu-

cáo. Nada sab ia nern queria saber de teorias nern de do utrinas. Carninha va sirn-

plesmente para a vida. A revolucão exercia nele a mesrna atracäo natural e orgânica

que o m ar, que o carnp o, que a rnulher, que a juventude e qu e o cornb ate.

E, depois da guerra, D'Annunzio voltou a aproxirnar-se várias vezes da

revolucao. Quando ocupou Fiume, disse clue o fiurnanisrno era a causa de

todos O s pov os oprirnidos e irredentos 2 . E enviou urn telegrama a Lenin. Pare-

Em 1919, D'Annunzio e mais trezentos homens, indo contra as determinaçoes do

Tratado de Versalhes, ocuparam o porto de Fiume - atualmente Rijeka, na Croácia -,

argumentando que este pertencia a Itália. Ele governou Fiume como um ditador ate

dezembro de 1920, quando teve de renunciar.

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H. G. WELLS'

o julgarnento sobre o presente de urn hornem hábil em traduzir o passado

e em imaginar o futuro tern sernpre urn interesse conspIcuo, sobretudo se esse

hom em é M r. H. G. Wells, conhecido no rnundo inteiro com o urn me tódico

explorador da história e da utopia. Wells, em sua posicáo de historiador e

rornancista, se pôs a observar "cem o anda o m undo" e a com unicar ao pi.iblico,

através de art igos, suas impress6es. Urn de seus textos m ais cornentados ate

hoje é o que se propóe a responder a pergunta: 0 que é o fascism o?

Wells decidiu julgar e defmnir o fascisrno quando acreditou já dispor de mate-

rial abundante para esse exam e. Teve m ais pressa e m enos prudéncia, contudo,

para estudar a revolucao bolchevique. A experiéncia soviética e o cenário

rnoscovita provav eirnente o atrafram rnais por suas rniragens rornanescas de

utopia social. Seu livro de im pressôes sobre a R ussia de Lenin, relido a certa

distância, Ihe deve hav er revelado a diferenca que existe entre suas especu lac6es

habituais de historiador e rom ancista e o excepcion al ernpreen dim ento de corn-

preender e julgar urna revolucao, seu espIrito e seus hom ens.

o fascismo ja nao é rnais a m esrna nebulosa dos dias da rnarcha a Rom a,

quando se dobravam perante ele muitos erninentes liberais que certamente

tinham grande estirna pelo autor de The Outline of History. 0 trabalho de

estudar o terna se apresenta, portanto, bastante facilitado. 0 estudioso co ntahoje corn urn farto conjunto d e conceitos que definern os diversos fatores da

forma ção do fascismo: o expe rirnento governarne ntal de Benito Mussolini já

Publicado originalmente corn tItulo "H. G. Wells ye fascismo" em Variedades, Lima,

14 de maio de 1927.

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chegou a seu quarto aniversário. 0 julgarnento de H. G. W ells se m ove, assim,

sobre urna base am pla e segura.

Talvez p or isso nao contenh a propo sicoes originais a respeito das origens

do movimento fascista. H. G. Wells, nesse estudo, segue mais on menos o

m esm o itinerário que outros crIticos do fascism o: encontra as raizes espirituais

deste no d'annunzianism o e no " futurismo" m arinettiano, já classificados com o

fenômenos analogos.

E, logicam ente, tamp ouco em suas conclusôes Wells oferece qualquer on-

ginalidade. Sua atitude é a caracteristica de urn reformista, de urn dem ocrata,

ainda que atorm entado por urna série de "düvidas sobre a dernocracia" e deinquietudes a respeito da reforma. 0 fascisrno lhe parece algo assim m ais corno

um cataclism o do que com o a conseqüência e o resultado da quebra da dem o-

cracia burgue sa e da derrota da revoluçao p roletánia na Itália. Ev olucionista

convicto, Wells não pôde conceber o fascism o com o urn fenôm eno possIvel

dentro da lógica da história. Tern que entendé-lo corno urn fenômeno de exce-

ção. Para ele, o fascismo é urn m ovim ento m onstruoso, teratológico, passIve1

de ocorrer somente entre urn povo de educacao defeituosa, propenso a todas as

exub erâncias da açâo e da palavra. M ussolini, diz W ells, "é urn produ to rnórbi-

do da Itália". E a povo italiano, urn povo que nâo estudou devidamente a

geografia nern a história universais.

Nessa, como quase em todas as atitudes intelectuais de H. G. Wells, se

identificam facilmen te as qu alidades e OS defeitos do pedagogo, do evolucionista

e do inglés.

Pod e-se perceber o pedago go nao sornente pelo corte didático da exp osi-

ção, mas tam bém pelo próprio fundo de seu julgarnento. We lls pensa que urna

das causas do fascismo é o deficiente desenvolvimen to do ensino secundánio e

superior na nação italiana. As escolas de m a qualidade e as universidades, insufi-

cientes, foram a seu juIzo o prirneiro fator Para criar a sentimen to fascista. M as

esse conceito não tern o sentido geral que necessitaria Para set admitido e sancio-nado . Wells parece localizar a problerna nos ensinos secun dário e universitário

e, m ais especificamente ainda, no ensino de geografia e história universais.

E esse gesto d enuncia a inglés. 0 Im pério bri tânico não seria conc ebIvel

sobre a base de u rn povo p ouco instruldo na geografia universal. Para o inglés,

a geografia é obrigatoriamente a disciplina q ue tern m ajor irnportância. Urn

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hom ern culto da Belgica ou da SuIça po de ignorar essa ciência; urn inglés nao.

Sem urn sdlido conhec imen to da geografia, a Inglaterra não conseguiria con-

servar nem o dom Inio dos m ares nem seu império colonial em todos os con ti-

nentes. Explica-se, assim, que urn p rofessor inglés con sidere escassarnente

instruldos em geografia a todos os hom ens de outras nacionalidades. E o rnes-

rno acontece ern relaçao a história. A h istória e a sociologia, no con ceito de urn

inglés, quase nao tern outro propósito senão o de demonstrar corno todo o

progresso hurnano culrnina no Irnpério britânico e com o a evolucao da espécie

hum ana culmina no inglés.

Ha ou tra razão pa ra que o fascismo p areca a urn professor inglés o resulta-do d e urna p articular ignorância da geografia e história universais: o fascismo

é im perialista. Os fascistas se propôem a restaurar o Irnpério roman o. 0 sonho

de M ussolini é a reconstrução da Roma im perial. Con sequentem ente, ele in-

com oda particularmente o sentimen to im perialista de todo cidadão b ritânico,

que não consegue explicar o.ideal fascista senão corno o fruto de um a incipiente

e retardada instruçao em geografla e história.

0 evo lucionista, certamente, não está m enos presente e visfvel em H . G.

Wells e em suas opiniOes, assim com o é co m patIvcl corn o seu lado inglCs e

pedagogo . Toda a pedagogia do anteguerra repousa em urna fé absoluta no

dogma do progresso. E o evolucionismo, em todos seus pianos, se deiineia

cada dia m ais nitidam ente com o urn produto tIpico da men talidade britânica.

Todas as teses evolucionistas tendem a provar fundarnentairnente que o futuro

hurnano será urna co ntinuação da história inglesa, que coroa o esforco de to-

das as raças e cuituras.

Se a Grã-Bretanha e o ev olucionisrno não e stivessern em crise e se muitos

dos sintomas nao assinalassem a sua decadéncia, as opinióes de Mr. H. G.

Wells sobre o fascism o seriarn m uito mais consideráveis e transcendentes. M as

em nossos dias, o fascism o rem pouco a temer da critica reformista e dem ocrá-

tica, ainda qu e cia venha d e urn escritor da estatura de Wells. Corn o sim ples edesgastado arsenal evolucionista e liberal já nâo é rnais possIvel urna séria ofen-

siva teórica contra o fascisrno e seu condottiero. 0 pensarnento e a acao revolu-

cionários, como o p róprio Mr. Wells reconhece corn as suas "düvidas sob re a

dernocracia", tern arrnas m ais rnodernas e rnais contunden tes.

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DAVID LLOYD GEORGE'

Lenin é o politico da revoluçao; Mussolini é o politico da reacâo; e

Lloyd Geo rge é o politico do com prom isso, da transacao e da reforma. Eclé-

t ico, equilibrado e m ediador, igualmen te distante tanto da esqu erda quanto

da direita, Lloyd George náo é urn construtor nem da nova nem da velha

ordem . Desprovido de qualquer. adesáo ao passado e de toda a imp aciéncia

do futuro, Lloyd Geo rge nâo d eseja set senão urn artesâo, urn construtor do

presente. Ele é urn pe rsonagem sem filiacao dogrnatica, sectária, rigida. Nâo

é individualista nem coletivista; não é internacionalista nern nacionalista:

por isso, arregimenta o liberalismo britânico. Mas esse rótulo de liberal

corresponde mais a uma razão de classificaçao eleitoral do que de diferen-

ciacão program ática. Liberalismo e co nservadorismo são hoje duas escolas

poli ticas superadas e deform adas. Atualm ente não assistimo s a urn co nflito

dialético entre o conceito liberal e o conservad or, mas sim a urn contraste real,

a urn choque histórico entre a tendência a manter a organizacão capitalista

da sociedade e a tendéncia a substituI-la corn uma organização socialista

e p roletária.

Lloyd George não é urn teórico, urn hierofante de qualquer dogm a eco-

nôm ico, nem urn politico; é urn conciliador quase agnóstico. Carece de pon -

tos de vista rigidos. Seus pontos d e vista são provisórios, m utáveis, precáriosrnóveis. Lloyd Geo rge se apresenta em constante retificaçáo, em permanen te

revisão de suas idéias. A apostasia supoe translaçao de um a posicão ex tremista

Pub licado originalmente co rn o titulo "L loyd George" no livro La escena contem

pordnea, Lima, Minerva, 19 25.

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a outra posicão antagônica, também extrernista. E L loyd George ocupa in-

variavelmente um a posicão centrista, transaciona , interrnediária. Seus mov i-

mentos de translação não são por conseguinte radicais e violentos mas

sirn graduais e minirnos. Lloyd George é estruturalmente urn politico

possibilista. Pensa que a linha reta é, na polItica como na geometria, urna linha

teórica e irnaginária. A superficie da realidade poiltica é acidentada corno

a superficie da Terra. Sobre ela nao se podem tracar linhas retas, senão linhas

geodesicas. Lloyd George, por isso, não busca na poiltica a rota ideal, rnas sim

a rota mais geodesica.

Para esse cauteloso e perspicaz politico o hoje é urna transação entre

o ontern e o arnanhã. Lloyd G eorge não se preocupa corno foi nern corno será,

rnas sim como é.

Nern douto nern erudito, Lloyd George é, antes de tudo, urn tipo refratário

erudicão e ao pedantisrno. Essa condicao e sua falta de fé ern toda doutrina o

preservam da rigidez ideológica e dos principismos sisternáticos. AntIpoda do

catedrático, Lloyd George é urn politico de fina sensibilidade, dotado de ó r-

gaos ágeis P ara a percepcão original, objetiva e cristalina dos fatos. Não é urncomentador, nern urn espectador, mas sirn protagonista, urn ator consciente

da história. Sua retina polItica é sensIvel irnpressão veloz e estereoscópica do

panorama circundante. Sua falta de apreensôes e de escriIpulos dogrnáticos lhe

perrnite usar os rnétodos e os instrumentos mais adaptados a seus objetivos.

Lloyd George assirnila e absorve instantaneamente as sugestôes e as idéias üteis

a sua orientaçáo espiritual. discreto, sagaz e flexivelrnente oportunista. Nãose obstina jamais. Trata de modificar a realidade contingente, de acordo corn

suas previsôes, mas, se encontra nessa realidade excessiva resisténcia, se con-

renta em exercitar sobre ela urna influência minima. N ão se obceca em urna

ofensiva irnatura. Reserva sua insisténcia, sua tenacidade, Para o instante pro-

picio, Para a conjuntura oportuna. E está sernpre pronto transacão, ao corn-

promisso. Sua tá tica de governante consiste ern não reagir bruscarnente contra

as impressôes e as paixôes populates, rnas sirn se adaptar a elas para canalizá-las

e dominá-las rnanhosarnente.

A colaboracao de Lloyd George na Paz de Versalhes, por exemplo, está

saturada de seu oportunismo e seu possibilisrno. Lloyd George compreen-

deu que a Alemanha não podia pagar urna indenizacão excessiva. Mas

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ambiente delirante frenetico e histerico da vitoria o obrigou a aderir pro-

visoriamente a tese contraria. 0 contribuinte ingles desejoso de que os

gastos belicos nao pesassem sobre sua renda, mal informado da capacidade

economica da Alemanha, queria que esta pagasse o custo integral da guerra.

Sob a influencia desse estado de animo, se efetuaram as eleicoes, apressada-

mente convocadas por Lloyd George imediatamente depois do armisticio.

Para nao correr o risco de um a derrota, Lloyd George teve de incluir em seu

programa eleitoral essa aspiracao do eleitor ingles. Teve q ue fazer seu o pro-

grama de paz de Lord Northcliffe e do Times adversarios encarnicados de

sua politica.

Lloyd George era igualmente contra que o Tratado mutilasse e desmem -brasse a Alemanha e engrandecesse territorialmente a Franca. Percebia o perigo

de desorganizar e desarticular a economia alema. Combateu, por conseguinte,

a ocupacao militar da faixa esquerda do R eno. Resistiu a todas as conspiracoes

francesas contra a unidade •da Alemanha. M as acabou tolerando que estas se

infiltrassem no Tratado. Quis, antes de tudo, salvar a Entente e a Paz . Pensou

que nao era o m omento de frustrar as intencoes francesas e que, a medida queos espiritos se iluminassem e que o delirio da vitoria se extinguisse, o caminho

para a retificacao paulatina do Tratado se abriria automaticamente, enquanto

suas consequencias, prenhas de ameacas P ara o futuro europeu, induziriam a

todos os vencedores a aplica-lo corn prudencia e tolerancia. Keynes, em suas

Novas consideracoes sobre as consequencias econom icas da paz comenta assim

essa gestao: "Lloyd George assumiu a responsabilidade de um tratado insensa-to inexecutavel em parte que constituia um perigo Para a propria vida da

Europa. Pode-se alegar, uma vez admitidos todos seus defeitos, que as paixoes

ignorantes do publico desempenham no mundo um papel que deve ser levado

em conta por aqueles que conduzem um a democracia. Pode-se dizer que a Paz

de Versalhes constitufa a melhor regulamentacao provis6ria que permitiam as

reclamacoes populaces e o carater dos chefes de E stado. Pode-se afirmar que,

para defender a vida da Europa, consagrou durante dois anos sua habilidade

e sua forca Para evitar e moderar o perigo".

D epois da paz, de 1920 a 1922 , Lloyd George fez sucessivas concessoes

formais, protocolares, ao ponto de vista frances: aceitou o dogma da intan-

gibilidade da infalibilidade do Tratado. Mas trabalhou perseverantemente

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para atrair a Franca a uma polItica tacitarnente revisionista. E para conse-

guir o esquecimento das condiçoes mais duras e o abandono das cláusulas

mais imprevidentes.

Perante a revolucao russa, Lloyd George teve uma atitude elástica. Algumas

vezes se ergueu, d rarnaticarnente, contra ela; outras vezes flertou corn cia furti-

vamente. A princIpio, subscreveu a polItica do bloqueio e d a intervencao mi-

litar da Entente. Ern seguida, convencido da consolidacao das instituicoes russas,

preconizou seu reconhecirnento. Posteriorrnente, corn d iscursos inflarnados e

enfáticos, denunciou os boicheviques como inimigos da civilizacao. -

Lloyd G eorge tern, ern relacão ao setor burgués, urna visão rnais européia

que b ritânica - ou britânica e por isso européia - da guerra social, da luta declasses. Sua poiltica se inspira nos interesses gerais do capitalisrno ocidental.

E recomenda a rnelhoria do nIvel da vida dos trabalhadores europeus, a

expensas das popuiacóes coloniais da Asia, Africa etc. A revoluçao social

é urn fenô rneno da civiiizacao capitalista européia. 0 regime capitalista - no

juIzo de L loyd George— deve adormecé-la, distribuindo entre os trabalhadores

da Europa uma parte dos ganhos obtidos dos dernais trabalhadoresdo mund o. D evem-se extrair do trabalhador b racal asiático, africano, austra-

liano ou americano os xeiins necessários para aurnentar o conforto e o bern-

estar do trabaihador europeu e debilitar sua aspiracão de justica social. Deve-se

organizar a exploracao das nacoes coioniais para que abastecam de m atérias-

prirnas as nacöes capitalistas e absorvarn integrarnente sua producao indus-

trial. A L loyd G eorge, adernais, não Ihe repugna nenhurn sacrifIcio da idéia

conservadora, nenhuma relacao corn a idéia revolucionária. Enquanto os rea-

cionários querern reprirnir rnilitarmente a revolucao, os reformistas querern

pactuar e negOciar corn ela. Créern que náo é possivel asfixiá-la, derrotá-la,

mas, sirn, dom esticá-la.

Entre a extrema esquerda e a ex trema direita, entre o fascismo e o b olche-

visrno, existe todavia urna heterogênea zona interrnediária, psicologica e orga-

nicarnente dernocrática e evolucionista, que aspira a urn acordo, a uma transacao

entre a idéia conservadora e a idéia revolucionária. Lloyd G eorge é urn dos

lideres substantivos dessa zona temperada d a polItica. A lguns lhe atribuern urn

Intirno sentimento dernagó gico e o definern como urn politico nostalgico de

uma posicão revolucionária. M as esse juizo foi feito corn base em dados super-

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ficiais sobre sua

ser urn caudi h

tismo, d ogrnat

relativista, tern

Ca, urn pouco i

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Os quatro grandes ca Conferência de Paris:

Lloyd George, Orlando, Clemenceau e Wilson.

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JOHN MAYNARD KEYNES

Keynes nâo é lider, nao é politico, nem sequer é deputado. apenas diretordo Manchester Guardian e professor de economia da Universidade de

Cam bridge. M esmo assim, é um a figura de primeiro nivel da politica euro-

péia. Ainda que não tenha descoberto a decad éncia da civilizacao ocidental,

a teoria da relatividade, nem o enxerto da glandu a de macaco, é urn homem

tao ilustre e influente como Spengler, Einstein e Voronoff. Urn livro de éxito

estrondoso, As conseqüências económicas da paz, difundiu em 1919 o nome d eK eynes para o mund o inteiro.

Esse livro é a história Intima, descarnada e enxuta da conferéncia de P az c

de seus bastidores. E é, ao mesmo tempo, uma sensacional denimncia contra o

tratado d e Versaihes e seus protagonistas. Key nes denuncia em sua obra as

deformacoes e erros desse pacto e suas conseqüéncias para a Europa.

0 tratado de Versalhes é ainda um tópico de atualidade. Os politicos

economistas da reconstruçáo européia reclamam peremptoriamente sua revisão,

sua retificacao e talvez ate o seu cancelamento. A aceitacão d esse tratado é

apenas condicional e provisória: os Estados U nidos se recusaram a assiná-lo; e a

Inglaterra nao d issimulou, em algumas ocasióes, seu desejo d e aband oná-lo.

Para K eynes, o tratado seria urna regulamentaçao temporária da rendiçao alemã.

Mas como esse tratado disforme e teratologico foi preparado e ern que

circunstâncias apareceu? Keynes, testemunha inteligente de sua elaboraçao,

nos explica. A Paz de Versalhes foi construlda por trés homens: Wilson,

Clemenceau e L loyd G eorge (Orlando teve ao lado desses trés estadistas urn

Publicado originalmente no livro La escena contempordnea, Lima, Minerva, 1925 .

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papel secundário, anódino, intermitente e opaco. Sua intervencao se limitou a

uma defesa sentimental dos d ireitos da Itália). W ilson amb icionava seriamente

urna Paz edificada sobrc seus quatorze pontos e nutrida de sua ideologia de-

rnocrática; Clemenceau lutava para obter urna Paz vantajosa P ara a Franca,

que fosse dura, áspera, inexorável; enquanto Lloyd George era empurrado em

sentido análogo pela opiniáo inglesa: seus compromissos eleitorais o forcavam

a tratar a A lemanha sern clemência. Os povos da Entente estavam demasiada-

mente perturbados pelo prazer e pela amnesia da vitória e atravessavarn urn

periodo de febre e de tensâo nacionalistas. Sua inteligncia estava obscurecida

pelo pathos. E, enquanto Clemenceau e Lloyd G eorge representavam d ois po-

vos possuIdos, morbidamente, pelo desejo d e espoliar e oprimir a A lemanha,

W ilson não simbolizava urna nação realmente convertida a sua doutrina, nem

solidam ente mancomunada corn seu beato e demag ógico prograrna. So inte-

ressava a rnaioria da populacao forte-americana o térrnino da guerra da forma

mais prática e menos onerosa pbssIvel. Por isso, sua tendéncia era a de abando-

nar completamente tudo o que o prograrna wilsoniano tinha de idealista. 0

ambiente aliado, bélico e truculento, carregado de ódio, rancor e gases asfixian-tes, era adverso a uma Paz wilsoniana e altruIsta. 0 próprio presidente dos

Estados U nidos náo pod ia escapar da influéncia e dos cond icionamentos da

"atrnosfera pantanosa de Paris". 0 estado de ânirno aliado era extrernarnente

hostil ao prograrna w ilsoniano de P az sern anexacóes nern indenizacoes. Alérn

disso, W ilson, corno diplornata e politico, era assaz inferior a Clemenceau e a

Lloyd George. A figura politica de Wilson nâo sai rnuito bern no livro deK eynes, que retrata a atitude do lider norte-arnericano na conferéncia de P az

como rnistica, sacerdotal. Ao lado de L loyd G eorge e de Clernenceau, cautelo-

sos, defensivos e sagazes estrategistas da polItica, Wilson se rnostrava urn ingé-

professor universitário, urn utópico e hierático presbiteriano. Wilson,

fInalmente, levou a conferéncia de Paz principios gerais, rnas nâo idéias con-

cretas sobre sua aplicacao. Ele não conhecia as questoes europé iasa s quais

estavam d estinados seus princIpios. Foi fácil aos aliados, por isso, camuflar

corn urna roupagern idealista a solucao que lhes convinha. Clernenceau e Lloyd

George, ágeis e perrneáveis, trabaihavam assistidos por urn exército de técnicos

e especialistas. Já Wilson, rIgido e herrnético, quase nâo tinha contato corn sua

própria delegacao. Nenhurna pessoa de sua entourage exercia influéncia sobre

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seu pensamento. As vezes uma redacao astuta e urna m anobra grarnatical fo-

ram suficientes para esconder dentro de urna cláusula de aparncia inócua

uma intencao transcendente. Wilson não pôde defender seu programa do

torpedeamento sigiloso d e seus colegas da conferéncia.

Entre o programa wilsoniano e o tratado de Versaihes existe, por essa e

outras razóes, um a contradicao sensIvel. 0 programa w ilsoniano garantia a

A lemanha o respeito sua integridade territorial, Ihe assegurava urna paz sern

multas nem indenizacôes e proclamava enfaticamente o d ireito dos povos

autodeterminacao. M as o tratado separa da A lemanha a região do Sarre, habi-

tada por seiscentos mil teutônicos genulnos; confere Polônia e Tchecoslovaquia

outras porcôes de território alemao; autoriza a ocupacão durante quinze anos

da faixa esquerda do R eno, onde habitam seis rnilhôes de alemaes; e fornece a

Franca o pretexto para invadir as provIncias do Rhur e se instalar nelas. 0

tratado neg a a Austria, reduzida a urn pequeno Estado, o direito de se associar

ou se incorporar a A lemanha. A A ustria não pode invocar esse direito sern a

permissâo da Sociedad e das Nacoes, que so pode ihe d ar sua permissão por

unanimidade d e votos. 0 tratado obriga a A lemanha - além d a reparacao dosdanos causados a populacôes civis e de reconstruçao de cidades e campos de-

vastados - a reembolsar as pensóes de guerra dos paIses aliados, que estão sa-

queando todos seus bens negociáveis, tanto de suas colônias corno de sua bacia

carbonifera do Sarre, assim como de sua marinha m ercante e ate da proprieda-

de privada d e seus süditos em território aliado. Também Ihe impóe a entrega

anual de uma quantidade d e carvâo, equivalente diferença entre a produçaoatual das minas de carvão francesas e a producao de antes da guerra. E a obriga,

sern nenhum direito reciprocidad e, a conceder uma tarifa aduaneira minima

para as mercadorias aliadas e a permitir a invasão da p roduçao dos palses alia-

dos sem nenhuma com pensaçao. Resumindo, o tratado empobrece, mutila e

desarma a A lemanha, ao mesmo tempo que lhe exige uma enorme indenizacao

de guerra.

K eynes prova que esse pacto é uma violacao das condicoes de paz ofereci-

das pelos aliados a A lemanha, para induzi-la a render-se. A A lemanha capitu-

lou sobre a base dos quatorze pontos de Wilson. As condicoes de paz não

eviam, portanto, ter se afastado nem se diferenciado dessa proposta. A confe-

réncia de Versalhes deveria ter se limitado formalizaçao e aplicaçao d aque-

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las condicoes; entretanto, impôs Alemanha urna paz diferente daquela ofere-

cida solenernente por Wilson. Keynes qualifica essa conduta corno urna

desonestidade monstruosa.

A dernais, esse tratado, que arrulna e mutila a Alernanha, nâo é sornente

injusto e insensato, mas também perigoso e fatal para seus autores. A Europa

necessita de solidariedade e cooperacâo internacionais, para reorganizar sua

producao e restaurar sua riqueza. 0 tratado a anarquiza, a fraciona, a conflagra

e a inocula de nacionalismo e jingoismo. A crise européia tern no pacto de

Versaihes urn de seus maiores estImulos doentios. Keynes adverte para a exten-

são e a profundidade dessa crise. E não cré nos planos de reconstrucão "dem a-

siadamente complexos, sentimentais e pessirnistas". 0 doente", diz, "não tern

necessidad e de d rogas, nem d e rernédios. 0 que Ihe faz falta é um a atrnosfera

sã e natural na qual possa dar livre curso a sua recuperacão . Seu plano

de reconstrução européia se resume, por isso, em duas proposicóes lacônicas:

a anulaçao das dIvidas interali'adas e a reducao d a indenizacao alemã a 36 bi-

lh6es de m arcos. Keynes considera que esse é, tambérn, o rnáxirno que a Ale-

manha pode pagar.0 pensarnento economicista de K eynes localiza a solucao da crise européia

na regularnentacão econôm ica da paz. Em seu primeiro livro escrevia, não

obstante, que "a organizacão econômica, que a Europa O cidental vivenciou

durante o ültirno rneio século, é essencialmente ex traordinária, instável, corn-

plexa, incerta e ternporária". A crise, portanto, não se reduz existéncia da ques-

tao das reparacóes e das dIvidas interaliadas. Os problemas econôrnicos da pazexacerbarn e exasperarn a crise; rnas não a causarn integralmente. A raiz da crise

está nessa organizacão econôrnica "instável, cornplexa etc.". M as Keynes é urn

econornista burgués, de ideologia evolucionista e de psicologia britânica,

que precisa injetar confianca e otirnismo no espIrito da sociedad e capitalis-

ta. E deve, por isso rnesrno, assegurar-Ihe que urna solucao sábia, sagaz e pru-

dente dos problernas econômicos da paz rernoverá todos os obstáculos

que obstruem, na atualidade, o carninho do progresso, da felicidade e do

bern-estar humanos.

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THOMAS WOOD ROW WI LSON  

Todos os setores da poiltica e do pensarnento coincidem em reconhecer em

W oodrow W ilson uma inteligéncia elevada, urn temperamento austero e uma

orientacao generosa, m esmo tendo, corno é natural, opinióes divergentes so-

bre a transcendéncia de sua ideologia e sobre sua posicão na história. Os ho-

mens da direita - talvez os mais distahtes da doutrina de W ilson - o classificarn

come, urn grande iludido, como urn grande utópico; os homens da esquerda

o consideram o tilitimo caudilho do liberalisrno e da dernocracia; e os ho-mens d o centro o exaltam com o o apóstolo de uma ideologia clarividente que,

contrariada ate hoje pelos egoismos nacionais e as paixOes bélicas, conquistará

por firn a consciéncia da humanidade.

Essas diferentes opinióes e atitudes apontarn W ilson come, urn ilder cen-

trista e reforrnista. Ele não foi, evidenternente, urn politico do tipo de

Lloyd George, de Nitti, nern de Caillaux. Mais que contextura de politico,

teve contextura de ideologo, mestre e pregador. Seu idealismo rnostrou,

sobretudo, urna base e orientacão éticas. M as essas são rnodalidad es de ca-

rater e educacao. Wilson se diferenciou, por seu ternperarnento religioso e

universitário, dos outros lideres da democracia. Por sua filiaçao, ocupou a

mesm a zona poiltica: foi urn representante genulno da rnentalidad e dem ocrá-

tica, pacifista e evolucionista, tentando conciliar a velha ordern corn a que

nascia, o internacionalismo corn o nacionalismo, o passado corn o futuro.

W ilson foi o verdadeiro generalissimo da vitória aliada. Os rnais profundos

Publicado ori g inalmente corn o tItulo "W ilson" no livro La escena contempordnea,

Lima, Minerva, 1925.

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analistas da guerra mundial pensarn que a vitória foi uma obra de estratégia

polItica e nao d e estratégia militar. Os fatores psicológicos e politicos tiverarn

na guerra mais influéncia e mais irnportância que os militates. Adriano T ilgher

escreve que a guerra foi ganha "For aqueles governos que souberam conduzi-la

corn urna mentalidad e adequad a, dando-ihe fins capazes de converter-se em

mitos, estados de ânimo, paixóes e sentirnentos populates" e que "ninguém

mais que W ilson, corn sua pregacão quaker-democrática, contribuiu para re-

forçar nos povos da Entente a convicçâo da justeza d e sua causa e o propósito

de continuar a guerra ate a vitória final". Wilson, realrnente, fez da guerra

contra a Alemanha urnagu erra santa.Antes de Wilson, os estadistas da Entente

haviam batizado a causa aliada como a causa da liberdade e do direito. Tardieu,

em seu livro A pa z, cita algum as declaracoes de Lloyd G eorge e Briand que

continharn cis germens do programa w ilsoniano. M as na linguagem d os politi-

cos da Entente havia uma entonacao convencional e diplornática. A lingua-

gem de W ilson teve, ao cont'rário, todo o fogo religioso e o timbre profetico

necessários para emocionar a humanidade. Os Quatorze Pontos ofereceram

aos alemães urna paz justa, eqüitativa, generosa, uma paz sem anexacôes nem

indenizacoes, urna paz que garantiria a todos os povos igual direito a vida e a

felicidade. Em suas declaraçoes e em seus d iscursos, W ilson dizia que os alia-

dos não combatiam contra o povo alemâo, rnas sim contra a casta aristocrática

e militar que o governava.

E essa propaganda demagógica, que ribombava contra as aristocracias, anun-

ciava o governo das multidóes e proclamava que "a vida brota da terra", de urnlado fortaieceu nos paises aliados a adesão das rnassas a guerra e de outro lado

debiiitou na Alernanha e na Austria a vontade de resisténcia e de luta. Os

Quatorze P ontos prepararam a dissolucao d a frente russo-alemá m ais eficaz-

rnente que os tanques, os canhóes e os soldados d e Foch e d e D iaz, de H aig e

de P ershing. A ssim o provam as mem órias de L udendorff e de Erzeberger

outros documentos da derrota aiernâ. 0 programa wilsoniano estimulou oespirito revolucionário que fermentava na A ustria e na A lemanha; d espertou

na Boérnia e na Hungria antigos ideais de independéncia; criou, em suma, o

estado d e ânimo que engend rou a capitulacao.

M as W ilson ganhou a guerra e perdeu a paz. Foi o vencedor da guerra, mas

foi o vencido da paz. Seus Q uatorze P ontos minaram a frente austro-alemã,

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deram a vitdria aos aliados; mas não conseguirarn inspirar e d ominar o tr

de paz. A Alernanha se rendeu aos aliados sobre a base do prograrna de W

mas os aliados, depois de desarrná-la, ihe impuserarn uma paz diferen

que, pela boca de W ilson, ihe haviam prometido solenernente. K eynes e

sustentam, por isso, que o tratado de Versaihes é desonesto.

Por que W ilson aceitou e assinou esse tratado q ue viola sua palavr;

livros de Keynes, de Lansing, de Tardieu e de outros historiadores da coni

cia de Versaihes explicam de maneiras diferentes essa atitude. Keynes diz

pensamento e o caráter de W ilson "erarn mais teológicos do que filos

corn toda a forca e debilidade que implica essa ordern de idéias e sentimei

Sustenta que W ilson não pôde lutar contra Lloyd George e C lemenceau,

ágeis, flexIveis e astutos, alegando que carecia de urn piano tanto para a

dade das Naçoes como para a execucão de seus quatorze pontos. "Teria p

pregar urn serrnáo sobre todos seus princIpios ou dirigir urna magnIfic

gacâo ao T odo P oderoso para sua realizaçao. M as não podia adaptar sua

cação concreta ao estado d e coisas europeu. Náo s o não podia fazer quo

proposicáo concreta senão que a muitos respeitos se encontrava malrnado sobre a situacao européia." A gia orgulhosam ente isolado, quas

consuitar os técnicos de seu séquito, sem conceder a nenhum de seus lu

tenentes, nern mesmo ao coronel House, urna influéncia ou urna colabo

reais ern sua obra. A ssim, os trabalhos da conferéncia de V ersalhes ti

corno base urn piano frances ou urn piano inglés, aparentemente ajusta

programa w ilsoniano, mas na prá tica dirigidos prevaiéncia dos interesFranca e d a Inglaterra. W ilson, finalmente, nao se sentia respaidado pc

povo solidarizado corn sua ideologia. Todas essas circunstâncias o condu

a urna série de transacoes. Seu ü nico empenh o consistiu em saivar a id

Socieclade das Naçoes. A creditava que a criacáo da S ociedade d as Nacoes

guraria autornaticarnente a correcáo do tratado e de seus d efeitos.

Os anos que se passararn desde a assinatura da paz foram ad versosa

de W ilson. A Franca não s o fez do tratado d e Versalhes urn uso prudentc

tambérn excessivo. Poincaré e sua maioria pariarnentar não o ernpregaram c

a casta aristocrática e m ilitar alerná, rnas sirn contra o povo d aquele

ainda exasperaram a tal ponto o sofrimento da A lemanha que alirneni

neia urna atmosfera reacionária e jingoIsta, propIcia a urna restau

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moná rquica ou a uma ditadura m ilitar. A Sociedade d as Nacoes, impotente

e anêm ica, nOn conseguiu se desenvolver. A d emocracia, assaltada simulta-

neamente pela revolução e pela reacâo, entrou nurn perlodo de crise aguda.

A burguesia renunciou em alguns palses a defesa legal de seu domfnio, renun-

ciou sua fé dem ocrática e enfrentou corn sua ditadura a teoria da d itadura do

proletariado. 0 fascismo adrninistrou, no m ais benigno d os casos, uma d ose

de urn litro de óleo de rIcino a rnuitos defensores da ideologia wilsoniana.

R enasceu ferozrnente na hum anidade o culto do herói e da violéncia. 0 pro-

grama wilsoniano aparece na história desses tempos corno a iiltima mani-

festacao vital do pensam ento democrático. W ilson nâo foi, de form a alguma,

o criador de uma ideologia nova, mas sirn o frustrado renovador de urna

velha ideologia.

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HERBERT HOOVER'

o Sr. Herbert Hoover, candidato do Partido Republican

dos Estados Unidos, dirige sua campanha eleitoral corn a mes

estratégia corn que dirigia urna campanha econômica desde o

de Comércio, ou, meihor ainda, desde sua escrivaninha de bus,

que tudo indica, o meihor candidato que o Partido Republi

enfrentar Al Smith, o qual, como já vimos, e por sua vez, o rn

que o Partido Democrata poderia escolher entre seus dirigentetro candidato permitiria aos democratas mobilizar seus eleitoi

mas probabilidades de vitória. Contra qualquer ourro oposit

republicano estaria absolutamente seguro de sua e eicao. Os d

tidos confrontam seus meihores homens, como se diz na liii

americana, de rnaneira urn tanto esportiva.

J a tive a oportunidade de comentar2corno, ao eleger Al

cracia forte-americana se manteria mais próxima de sua tra

sequentemente se mostraria, em certo sentido, mais conservad

escoihesse Hoover, já que o prirneiro corresponderia ao m odeic

dor, governante e estadista que a repdblica de Washington Lin

adotou invariavelmente como seu tipo presidencial, ainda que

rigorosa poiltica imperialista e plutocrática.

Publicado originalmente corn o tItulo "Herbert Hoover y la camp

em Variea ades, Lima, 3 de novembro de 1928.

2 M ariátegui está se referindo ao artigo "Al Smith y la batalla demo

em Variedades, Lima, 28 de outubro de 1928.

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Hoover procede diretarnente do estado major da indilistria e das financas. E

pessoalmente urn capitalista, urn hornem de negócios e tern a formacao es-

piritual rnais completa e caracterIstica de urn lider industrial e fmnanceiro do

irnpério ianque. Não vern de urna faculdade de hurnanidades ou de direito: é

urn engenheiro, rnodelado d esde sua juventude pela d isciplina tecnológica do

industrialisrno. Fez, recérn-forrnado da universidade, seu aprendizado de cob-

nizador nas minas da A ustralia e da C hina. Na maturidade, come, d iretor de

assisténcia, ampliou e cornpletou na Europa sua experiéncia corno defensor

dos interesses irnperiais dos Estados U nidos.

Esse ültirno foi o cargo que impulsionou sua carreira polItica. Porque, sern

ter passado pelo serviço p6blico nern ter se rnostrado cornpetente nele, é evi-

dente que nenhurn bu siness man norte-arnericano - ainda que numa época d e

extrerna afirrnaçao capitalista - estaria ern condicoes de obter o voto de seus

correligionários para a Presidéncia da R ep6blica.

Por professar corn entusiasino e énfase ilimitados o rnais norte-arnericano

individualismo, Hoover pertence sem düvida - muito mais que Smith -

estirpe do pioneer, do colonizador, do capitalista. Seu protestantismo tambérn

faz d e H oover urn homem da rnais cabal fihiacao capitalista. Ele reivindica,

corn intransigéncia, a doutrina do Estado liberal, contra as inclinacóes inter-

vencionistas e humanitárias do dernocrata Smith. M as isso, nos tempos atuais,

náo significa propriamente fidelidade economia liberal clássica: o individua-

lismo de Hoover nâo é o da economia da livre concorréncia, rnas sirn o da

econornia do rnonopólio, da cartelizacão. Contra as empresas, negócios e res-triçóes estatais, Hoover defende as grandes em presas privadas. Por sua boca

nao fala o capitalismo liberal do perIodo da livre concorréncia, rnas sirn o

capitalismo dos trusts e dos rnonopólios.

Hoover é urn dos ilderes da "racionalizacao da producao". Com o urna de

suas rnaiores realizaçoes, lembramos d e sua acão no D epartarnento de Corner-

cio para conseguir a maxima econornia na producão industrial, mediante adirninuicâo dos tipos de manufaturas e produtos. 0 mais cabal éxito de H oover,

como secretário do Cornércio, consiste em ter conseguido reduz ir de 66 para 4

as variedad es de paralelepIpedos; de 88 para 9 as de tipos de asfalto; de 1.35 1

para 496 as de limas e lixas; de 78 para 12 as de cobertores etc. Paradoxal

destino o d o g overnante individualista, nesta idad e d o capitalismo: trabaihar,

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EUGENE V. DEBS  

a Waldo Frank

Eugene V. Debs, o veiho Gene, corno o charnavarn seus carnaradas norte-

arnericanos, teve o elevado destino de trabaihar pelo socialismo no pals onde

o capitalismo é mais vigoroso e próspero e onde, por conseguinte, suas ins-

tituiçoes e suas teses se apresentarn mais sólidas e vitais. Seu norne preenche

urn capitulo inteiro do socialismt) norte-arnericano, que, provavelmente con-

tra a crença de muitos, não tern carecido de figuras heróicas. Daniel DeLeón

rnarxista brilhante e agucado que dirigiu durante vários anos o SocialistLabour Party' e John Reed, militante de grande envergadura, que acornpa-

nhou Lenin nas primeiras jornadas da revolucão russa e da Prirneira Interna-

Publicado originalmente em Variedades, Lima, 30 de outubro de 1926.

2 Em 1876, foi fundado o W orking M en's Party of the United States, que em 1877

mudou de nom e para Socialist Labor Party. Na época de sua criaçao, o partido tinhaem torno de 2.500 m emb ros e era formado basicam ente por imigrantes alemães,

m esmo que sua intençao fosse penetrar no movim ento operário norte-arnericano.

Q uando Daniel DeL eón entrou no Partido Socialista Operário, no começo da déca-

dade 1890, este possuIa apenas 1.500 membros, corn sedes em 26 estados, mas corn

a maioria dos militantes se concentrando em Nov a York. Em 1891, das 100 seçóes

do partido, 88 cram alemas, seguidas pelos judeus e por uma minoria de grupos de

militantes norte-americanos nascidos no pals. N o Com ité E xecutivo Nacional, ape-

nas dois rnembros falavam inglés. Corn a entrada de D eLeón no partido, houve urn

crescimento considerável de m ilitantes e de influéncia no rnovim ento operário do

pals. Em 1893, o partido proibiu a aliança corn os populistas. N o final do século

XIX e com eço do século XX , urn grupo saiu do partido e deu origem ao Partido

Socialista. 0 Partido Socialista Ope rário ainda chegou a participar na fundaçao e

consolidaçao da IW W , rnas perdeu sua influéncia ao longo do tem po.

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Q uando a guerra mu ndial produziu nos Estados U nidos uma crise do socia-

lismo - pela adesão de uma parte de seus elementos ao programa de reorgani-

zação mundial em norne do qua Wilson lançou seu povo na contenda -, Debs

foi urn dos que sern vacilacôes ocuparam seu posto de cornbate.

Por sua propaganda antibélica, Deb s, encarcerado e processado com o derro-

tista, foi Linalm ente condenado a dez ano s de prisâo 5 . Ate onde a censura havia

permitido, Debs havia impugnado a guerra e denunciado seus motivos através

da imprensa socialista. Mais tarde, havia continuado sua cam panha em reunióes

e com icios. Seus juIzes encontraram m otivo para ihe aplicar a lei de espionagem .

Desdenhoso e altivo, Debs náo quis defender-se. "Não me importa o que

foi deposto contra mim", declarou ao tribunal. "Não me preocupo em evadir-

me de urn veredito desfavorável, assim como não retiro nenhuma palavra de

tudo que disse em Canton (localidade de Ohio onde pronunciou o discurso

pacificista que precedeu sua prisão), ainda que soubesse que fazendo isso me

salvaria de urna pena de morté. 0 imputado não sou eu E a liberdade da

palavra. Diante do j6ri estão hoje as instituicOes republicanas. 0 veredicto

corresponde ao futuro." 6

O velho agitador escutou, sem comover-se corn a sentenca de seus juIzes.

Despediu-se de seus amigos presentes na audiéncia corn estas palavras: "Di-

Iho. A AF L nao apoiou a candidatura de Eugene D ebs a Presidéncia do pals. A

Central, porém, apoiou a entrada dos E stados Unidos na P rimeira G uerra Mundial.

Em 1920, a AFL tinha em tomb de 3.250.000 filiados. Foi a major central sindicaldo pals na época.

Em 29 de maio de 1918, o procurador federal de Ohio E . S. Wertz conseguiu jndjcjar

Debs por dez violaçoes da Lei de Espionagem. Detido em Cleveland, Debs passou

uma nojte encarcerado, sendo solto em seguida, após pagar uma fiança

de US $ 10.000. 0 julgam ento foi m arcado para 9 de setembro. Debs foi acusado,

na ocasião, por apenas duas v iolaçoes. Durante todo o julgamento, Debs insistiu em

man ter suas posicoes politicas, exaltando os lIderes boicheviques e defendend o

o direito a ljberdade de expressao. Foi cons jderado culpado, e no dja 14 de setembro

recebeu do juiz D. C. Westenhaver a pena de dez anos de prisäo. Debs não teve que

cumprir toda a sentença. Foi libertado da pnisâo federal de Atlanta em dezembro

de 1921.

Referência ao djscurso pronunciado por Eugene D ebs na Con vençao Estadual do

Partido Socialista para m il pessoas em Canton, Oh io, no dia 15 de junho de 1918.

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gam aos cama radas que entro no cárcere como ardente revolucionário, a Ca-

beca erg uida, o espIrito intacto, a alma inconquistada".

N a prisão, Deb s recebeu honrosas demonstraçOe s de solidariedade de ho-

mens livres e excepcionais e das massas proletárias da Europa. Urna ve z per-

guntado sobre os mo tivos pelos quais se negav a a visitar os Estados U nidos,

Bernard Shaw respondeu que nesse pals o ünico lugar digno dele era o mesmo

em que se encontrava seu amigo e correligionário Eugene D ebs: o cárcere. A

prisao de Deb s foi considerada, por todas as consciências honradas do m undo,

corno a m ajor mancha do governo W ilson.

Nas eleiçoes de 1920, Eug ene Debs foi mais umavez o candidato presiden-

cial dos socialistas norte-americanos. As forcas socialistas se encontravam d ivi-

didas pela crise pás-bélica que hav ia acentuado o con flito entre os partidários

da reforma e os instigadores da revoluçao. Nâo obstante, o nome de Debs

recebeu no pals cerca de urn rnilhâo de votos. Esse rnilhão de eleitores pratica-

rnente nâo votava. A luta pela presidéncia estava limitada a Harding, candida-

to dos republicanos, e Cox, candidato dos dem ocratas. Os que votavam em

Deb s protestavam contra o Estado capitalista. V otavam contra o presente, epelo futuro.

Finalmente anistiado, Deb s encontrou virtualrnente conclulda sua missâo.

O s espiritos e as coisas haviarn sido rnudados p ela guerra. Na E uropa discutia-

se o problema da revoluçao. Nos E stados U nidos se formava urna corrente

com unista sob urn capitalisrno ainda onipotente. Hav ia comecad o urn novo

capitulo da história do mu ndo. Debs não estava em tempo de recomeçar. Eraum sobrevivente da velha guarda. Seu d estino hjstórico havia terminado corn

o heróico episódio de sua prisão.

M as isso nâo dim inui a irnportância de Debs. Seu d estino não era o de urn

triunfador. E ele o sabia m uito bern, desde os distantes e neb ulosos anos em

que, consciente de seu fardo, o aceitou corn alegria. Abracou o so cialismo, a

causa de Espartacus, numa época em que a estrela do capitalismo brilhava

vitoriosa e espléndida. N äo se v islurnbrava o dia da revolucao. M ais do que

isso, sab ia-se que estava rnuito rem oto. Porérn era necessário que houv esse

aqueles que acreditassem nele. F. D ebs quis set urn de seus confessores, urn de

seus enun ciadores.

Para os cortesâos do éxito, uma vida de textura tao heróica talvez não tenha

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sentido. Eugene Debs pode nâo ser para eles nada mais que urna figura "pito-

resca", corno ha poucos dias assirn o charnou urn jornalista qualquer. Mas o

veredicto sobre esses hornen s felizrnente não é pronu nciado pelos jornalistas e

rnenos ainda pelos jornalistas norte-americanos. Como já disse Debs,

corresponde ao futuro.

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JEAN JAURES  

Jaurès é a mais elevada, nobre e digna figura da Troisième R épub lique. Ele

provinha de urna fam Ilia burguesa, debu tando na politica e no Parlamento nos

quadros do radicalismo. Mas a atmosfera ideológica e moral dos partidos bur-

gueses nao demorou a desencantá-lo, enquanto o socialismo exercia sobre seu

espIrito forte e com bativo um a atracão irresistIvel. Jaurés se alistou nas f'ileiras

do proletariado, embora sua atitude, nos primeiros tempos, tenha sido cola-

boracionista: acreditava clue os socialistas nao deviam excluir de seu program a

a colaboracao corn urn ministério da esquerda burguesa. Mas, desde que aSegunda Internacional, em seu Congresso de Amsterdam, rechaçou essa tese

sustentada por vários M etes socialistas, Jaurés acatou disciplinadamen te a de-

cisão. Leon Trotsky, em urn sagaz ensaio sobre a personalidade do grande

tribuno, escreve o seg uinte: "Jaures havia entrado no partido já hornem m adu-

to, corn uma filosofia idealista comp letamente forrnada. Isso não o irnpediu de

curvar seu potente pescoco (Jaurès era de uma cornplexão atlética) sob o jugo

da disciplina orgânica, e várias vezes teve a obrigaca o e a ocasião de dernon strar

que não somente sabia rnandar, mas tarnbém subrneter-se".

J aurès dirigiu as rnais brilhantes bataihas parlam entares do socialismo fran-

cês. Contra seu parlarnentarismo e democratismo, insurgiram-se os tedricos

e os agitadores da extrema esquerda proletária. Georges Sorel e os sindica istas,

por exernp o, denunciararn essa praxis corno urna deforrnacao do espirito re-

volucionário do rnarxisrno. Mas o movirnento operário, nos tempos pré-béli-

Publicado origina mente corn o tItu o "Jaurês y la Tercera Rept'ib ica" no livro La

escena c ontempordnea, Lima, Minerva, 1925.

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cos, corno foi dito muitas vezes, não se inspirou em Marx nern em Lassaile.

N ão foi revoiucionário, mas sim reform ista. 0 socialism o se desenvolveu inse-

rido na dernocracia. Não pôde, conseqüenternente, deixar de influenciar-se

pela mentalidade dernocrática. Os ilderes socialistas tinham que propor a s

massas urn prograrna de ação imediato e concreto, como ilnico meio de

enquadrá-ias e educá-las dentro do socialismo. Muitos deles acabararn per-

dendo , nessa tarefa, toda a energia revo lucionária. Aprax is os afastou da teoria.

M as não é possIvel confundir Jaurès com esses revolucionários dom esticados.

Urna personalidade tao forte como a sua näo podia se deixar corromper

nem irritar por aquele ambiente democrático. Jaurès foi reformista corno o

socialismo de seu tempo, mas deu sempre a sua obra reformista uma meta

revolucionária.

Pôs sua inteligéncia profunda, sua rica cultura e sua indomável vontade a

serviço da revolucao social. Sua V ida foi entregue com pietamen te a causa dos

hum ildes. T odas as tribunas do pen sarnento, com o livros, jornais, o P arlam en-

to e o comIcio foram usadas por Jaures em sua longa carreira de agitador:

fundou e dirigiu o diário L'Humanité, pertencente na atualidade ac, Partido

Comunista; escreveu muitos volumes de crItica social e histórica; e produziu,

corn a ajuda de alguns estudiosos do socialisrno e de suas raIzes, urna obra

poderosa: a História socialista do Revoluçáo Francesa.

Nos oito volumes dessa histdria, Jaurès e seus colaboradores enfocam os

episódios e o panorama da Revoluçao Francesa de pontos de vista socialistas.

Estudam a revolucao como fenômeno social e econôrnico scm contudo igno-

rar ou diminuir seu aspecto espiritual. Jaurès nessa obra, como ern toda a sua

Vida, conserva sua atitude e posicão idealista. Ninguém mais infenso, nem

mais adverso a urn rnateriaiisrno frio e dogmático que Jaures. Sua crItica pro-

jeta sobre a Revoluçao de 89 uma nova luz. Assirn, a Revoiucao Francesa ad-

quire em sua obra urn contorno nItido. Foi urna revoiuçao da b urguesia, porque

nâo pôde ser feita pelo proletariado, que ainda não existia, na época, cornoclasse organizada e consciente. Os proletários se confundiarn corn os burgue-

ses no estado prirnitivo, no povo. Careciam de urn ideário e de uma direcao

classistas. Não obstante, durante os dias polérnicos da revolucao, faiou-se de

pobres e de ricos. Os jacobinos e os babouvistas reivindicararn os direitos

da plebe. Dc rnuitos pontos de vista, a revoluçao foi urn movirnento dos

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sans culottes: cia se apoiou nos camponeses, que constituIam uma categoria

social bern definida, enquanto o proletariado urbano estava representado pelo

artesão, no qual prevalecia urn espIrito peque no-burguê s. Não hav ia ainda gran-

des fábricas, grandes inddstrias. Faltava, em surna, o instrumento de urna re-

volucão socialista. 0 socialismo, ademais, nao havia encontrado ainda seu

método: era uma nebulosa de utopias confusas e abstratas. Sua germinacâo,

scu amadu recim ento não podiam ocorrer senão dentro de um a época de desen-

volvimento capitalista. Assirn como na entranha da ordem feudal se gestou a

ordern burguesa, na entranha da ordem burguesa deveria se gestar a ordern

proletária. Finalmente, da Revoluçao Francesa emanou a primeira doutrina

comunista: o babouvismo.

O tribuno do socialismo frances, que demarcou assim a participacao mate-

rial e espirituai do proletariado na Revoluçâo Francesa, era urn idealista, mas

não urn utópico. Os motivos de seu idealismo estavam em sua educaçao, em

sen temperamento e em sua psiologia. Não se combinava corn sua mentalida-

de urn socialismo esquemático e secamente materialista. Dal, em parte, seus

contrastes corn os marxistas e sua adesCo honrada e sincera a idéia da dem ocra-

cia. Trotsky dá u m a definicao rnuito exata dejaurès nas seguintes linhas: "Jaurès

entrou na arena politica na época m ais sombria da T erceira Repñblica, que nâo

contava então senão corn um a quinzena de anos de existéncia e que, desprovi-

da de tradicoes sólidas, tiriha que lutar contra inimigos poderosos. Lutar pela

Repdblica, por sua conservação, por sua clepuraçao, essa a idéia fundamental

de Jaurès, a que inspirava toda a sua acCo. Jaurès buscava para a Rep iIblica um abase social mais amp la; queria levá-la ao povo para fazer do E stado republica-

no o instrumento da economia socialista. 0 socialismo era para ele o tInico

m eio seguro de consolidar e cornpletar a Repdb lica. Em sua aspiracão infatigá-

ye1 da sIntese idealista, Jaurès foi, em sua prim eira fase, urn dem ocrata pronto

a adotar o socialismo; e, em sua ditirna fase, urn socialista que se sentia respon-

sável por toda a dem ocracia".O assassinato de Jaurès encerrou urn capItulo da história do socialismo

frances. 0 socialismo democrático e parlamentar perdeu nesse momento seu

grande iIder. A guerra e a crise pós-béiica vieram mais tarde a invalidar e a

desacreditar o método parlarnentar. Toda urna época, toda uma fase do socia-

lismo terminaram corn Jaurès.

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A guerra encontrou Jaurès em seu posto de com bate. Ate o i 'iltim o instante

ele trabalhou , corn todas as forças, pela causa da Paz. Seu verbo ec oou con tra o

grande crime em Paris e em Bruxelas. Somente a morte pôde afogar sua do-

qüente voz acusadora.Coube a Jaurès ser a primeira vitima da tragedia. A mao de urn obscuro

nacionalista, armada moralmente pela Action Fran ç aise e por toda a imprensa

reacionária, abateu o major homem da Terceira Repdb ica. Mais tarde, a Ter-

ceira Repdb lica iria renegá -lo, absolvendo o assassino.

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a, Minerva, 1925.

ANATOLE FRANCE'

o crepüsculo de Anatole France foi o ocaso de urna vida clássica. Anatole

France morreu lenta e integramente, sern pressa nern tormentos, corno ele ha-

via se proposto a terminar seus dias. 0 itinerário de sua carreira foi sempre

ilustre: nunca se atrasou nem se antecipou, e chegou pontualmente a todas as

estacOes da imortalidade. Suaapoteose foi perfeita, cabal, exata, como os pe-

rIodos de sua prosa. Nenhum rito, nenhuma cerirnônia deixou de set cumpri-

da. A sua gloria não faltou nada: nern a cadeira da Academia Francesa nern

Prérnio No bel.

Anatole France não era urn agnóstico na guerra de classes, tampouco urn

escritor sem opinides polIticas, religiosas e sociais. No conflito que esgarca a

sociedade e a civilizacao conternporâneas, não se intimidou em tomar partido.

Estava pela revolucao e corn a revolucao. "Do fund o de sua biblioteca", corno

disse urna vez urn jornal frances, "abencoava os atos da grande Virgem". Osjovens arnavam por isso.

M as o apo io a France, nestes tempos d e beligerancia acirrada, vai da extre-

ma direita a extrema esquerda. Tanto reacionários corno revolucionários ade-

rem ao m estre.

Não existiram, contudo, dois Anatole France, urn para uso externo da bur-

guesia e da ordem, outro para deleite da revolucao e de seus realizadores. 0

fato é que a personalidade de France tern diversas facetas e matizes. Assim,

cada segrnento do pO blico se dedica a adm irar seu traco predileto. O s veihos e

edauque e depois

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saboreararn, como urn licor aristocrático, Les opinions deJerôme Coignarci Os

jovens, entretanto, gostaram de ver France em companhia de Jaurès on entre

os admiradores de Lenin.

Anatole France nos surge urn pouco mais complexo do que geralrnente a

critica e seus lugares-cornuns no s fazern crer. V iveu sem pre nurn rnesrno clirna,

ainda que tenharn passado por sua o bra diversas influéncias. Escreveu durante

m ais de cinqüe nta anos, ern temp os rnuito versáteis, velozes e cam biantes. Sua

producao, conseqüenternente, corresponde a s distintas estacâes de sua época

heteróclita e cosmopolita. Prirneiro, ela indica urn gUsto parnasiano, ático e

preciosista; em seguida, ob edece a um a intencão dissolvente, niilista, negativa;

e, depois, adquire urna afeiçao a utopia e a crItica social. M as, sob a supe rficie

ondulante dessas rnanifestaç6es, rnantém uma linha persistente e duradoura.

Anatole France pertence a uma época indecisa, fatigada, em que arnadure-

cia a decadéncia burguesa. Sens livros rnostram urn temp eramento classicamente

educado, nutrido de antiguidade, recheado de romantismo, afetado, elegante

e gozador. Ele não chega ao ceticisrno e ao relativismo da atualidade: suas

düvidas e negacóes tern rnatizes benignos e estão m uito distantes da desespe-

ranca incurável e profunda de Andreiev, do pessimismo trágico de 0 inferno de

Barbusse, e da zornbaria amarga e dolorosa de Vestir o clespia'o e outras obras

de Pirandello. Anatole France fugia da dor. Sua alma era grega, enam orada da

serenidade e da graca e sua came, sensual, corno daqueles pretensos abades

liberais, urn pouc o voltairianos, que co nheciarn os g regos e latinos rnais do que

o evang eiho cristão e arnavarn a boa m esa sobre todas as coisas. Era sensIvel ador e a injustica, rnas, por não gostar da idéia que existissern, tratava de ignorá-

las. Punha sobre a tragédia hum ana a frágil espum a de sua ironia. Sua literatu-

ra é delicada, transparente e pura corno o champanhe. E o charnpanhe

rnelancólico, como o capitoso e perfumado vinho da decadência burguesa, e

não o arnargo licor da revolução proletária. T ern contornos elegantes e aromas

aristocráticos. Os tItulos de seus livros são de urn gosto refinado e ate deca-

dente: 0 estojo tie ndcar 0 jardim de Epicuro 0 anel de ametista etc. Que

importa que sob a capa de 0 anel tie ametista se oculte uma desrespeitosa

intencao anticlerical? 0 fino tItulo e o estilo rebuscado são suficientes para

ganhar a simpatia e o consenso da opiniao burguesa. A ernoção social, o pulsar

trágico da vida contemporânea ficarn fora dessa literatura. A pena de France

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nâo sabe apreendé-los. Nern sequer o tenta. A alma e as paixoes da multidâo

ihe escapam. "Seus finos olhos de elefante" nao sabem penetrar na entranha

escura do povo; suas mäos polidas jogam felinamente com as coisas e os ho-

m ens da superfIcie. France satiriza a burgue sia, a rói, a morde corn seus de ntes

agudos, brancos e maliciosos; mas a anestesia corn o ópio sutil de seu estilo

erudito e musical, para que não sinta dernasiadamente sua crftica.

Ex agera-se mu ito sobre o niilisrno e o ceticisrno de F rance, que, na verdade,

são assaz leves e suaves. Ele não era tao incrédulo como parecia. Impregnado

de idéias evolucionistas, acreditava no progresso quase ortodoxamente. 0 so-

cialismo para ele era urna etapa, urna estação do Progresso. 0 valor cientIfico

do socialismo o com ovia mais que seu prestIgio revolucionário. Pensav a que arevoluçao viria; m as que viria quase a prazo fixo. Não sentia nenhum desejo de

acelerá-la nem de precipitá-la. A revolucao lhe inspirava urn respeito mIstico,

um a adesão urn pouco religiosa. Essa adesão não foi, certam ente, um episódio

de sua velhice. France duvidou diirante muito tempo; mas no fundo de sua

diivida e de sua negação pulsava urna ânsia irnprecisa de fé. Nenhurn espiriro

que se sente vazio deixa de tender, finalrnente, a urn mito, a uma crença. A

düvida é estéril e nenhum homem se conforma estoicamente corn a esterilida-

de. Anatole France nasceu demasiadamente tarde para crer nos rnitos burgue-

ses; dernasiadamente cedo para renegá-los plenamente. Foi sujeitado a urna

época que não arnava, ao pesado juizo do passado e aos sedimentos de sua

educacao e de sua cu ltura, carregados de nostalgias estéticas. Sua adesão a revo-

lucao foi rnais urn ato intelectual do que espiritual.

As esquerdas sem pre tiverarn satisfacao em reconhecer A natole France cornouma de suas figuras. Somente por causa de seu jubileu, cornemorado quase

unanimemente por toda a Franca, é que os intelectuais da extrerna esquerda

sentiram a nece ssidade de d iferenciar-se clararnente dele. A revista Clarté n e -

gou "ao niilista sorridente, ao cético florido" o direito a homenagem da revolu-

cão. "Nascido sob o signo da dernocracia", dizia Clarté, "Anatole France fica

inseparavelmente unido àT erceira Repüb lica". Agregava que "as pequenas tern-

pestades e as rnedIocres convulsóes desta cornpunham urn dos principais ma-

teriais de sua literatura e q ue seu c eticism o era urn 'pequeno truqu e' ao alcance

de todas as bolsas e de todas as almas: em surna, era o efeito da mediocridade

circundante".

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M as, apesar dessas crIticas e discrepâncias, nada mais falso do qu e a irna-

gem d e urn Anatole France ex cessivamente burgués, patriota e acadérnico, que

nos prepararn e servem as cozinhas da crItica conservadora. Não, Anatole France

não era tao pouca coisa. Nad a ihe teria hurnilhado e afligido m ais ern vida do

que a idéia de merecer da posteridade esse julgamento. A justica dos pobres, a

utopia e a heresia dos rebeldes tiverarn sernpre em France urn defensor.

Dreyfusista corn Zola ha m uitos anos, clartista corn Barbusse ha pouco tempo,

o veiho e rnaravilhoso e scritor se insurgiu sempre contra a antiga ordern social.

Ern todas as cruzadas do bern ocupou seu posto de comb ate. Q uando o povo

frances pediu a anistia de Andrés M arty, o rnarinheiro do mar N egro que não

quis atacar a O dessa cornunista, Anatole France proclarnou o heroIsrno e o

dever da indisciplina e da desobediéncia perante um a ordern crirninosa. Vários

de seus livros, com o Opiniôes sociais, R umo a os novos tempos etc., assinalam a

hurnanidade as vias do socialisrno.

O utra obra sua, Sobre apedra branca que faz co nsideraçoes sobre o futuro

e a utopia, é urn dos rnelhores documentos de sua personalidade: todos os

elernentos de sua arte se con certam e cornbinam nessas páginas adrniráveis.Seu pen samento, alirnentado de recordaçoes da antiguidade clássica, explora o

futuro distante a partir de urn antigo cená rio. As dramatis personae da novela,

pessoas seletas, agradáveis e intelectualizadas, de uma alma ao mesrno tempo

antiga e rnoderna, m overn-se nurn am biente a altura da literatura do rnestre.

Urn dos personagens é autenticarnente real e conternporâneo: é G iacomo B oni,

o arqueologo do Foro Rom ano, a quem encontrei mais de uma vez em algurnaaula ou em algurn claustro de Rom a. 0 enredo do romance é urna discussão

erudita entre Giacomo Boni e seus colegas. 0 colóquio evoca Galión, go-

vernador da Grécia, fflósofo e literato rornano, que, encontrando-se corn

Sâo Pau lo, não soube entender sua estranha linguagem tarnpouco pressentir a

revolucão cristã que chegava. Toda a sua sabedoria e talento eram insignifican-

tes perante sua incapacidade - supe rior a suas forcas - de enxergar São Paulo

corno urna figura além de um judeu fanático, incoerente e sujo. Dois mu ndos

estiverarn nesse encontro frente a frente sem se conhecer nern se cornp reender.

G ali6n d esprezou São Pau lo como p rotagonista da H istdria; rnas a Histária

deu razão ao rnundo de São Paulo e condenou o rnundo de Galión. Não ha

nesse qu adro urna an tecipacão da nova filosofia da H istória? Assirn, os per-

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sonagens de Anatole France se entretém numa previsão da futura sociedade

roletária e calculam que a revolucao chegará ate o urn de nosso século.

A previsão foi excessivamente timida e modesta. Giacomo Boni e Anatole

France tiverarn a oportunidade de assistir, no ocaso dourado de sua vida, a

alvorada sangrenta da revolucao.

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0

André Gide, urn dos fundadores da Nouvelle Revue Franca/se.

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ridade e pluralidade de credo s e de géneros. N a Nouv elle Revue Fran ç aise s e

juntarn o clandisino dos decad entes e o m isticism o do s revolucionários; cia

aloja o nacionalismo de Montherlant o tradicionalismo de Ghéon o

cosmop olitismo de M ac Orlan e V alery Larbaud, o classicismo de Paul Valery,

o revolucionarismo de Jean-R ichard Bloch, o super-realism o de D elteil e de

Eluard etc. ANRFedita por outro lado, a Revuejuive, dernasiadamente inter-

nacional Para que se ihe dirija urna acusação especifica de gidismo. Sens pri-

m eiros rnimeros nos ap resentararn alguns escritos desconh ecidos de Proust

(revelar algurn inédito de Proust é algo obrigatório para toda nova revista

francesa) e textos inéditos de H enri Franc.

Mas, na consciéncia de seus crIticos e do püblico, nada disso consegue

separar a NRF de A ndré Gide. Ainda que as edicoes de Gallimard sejam urna

conseqü éncia da revista que ihes em presta seu nom e, os crIticos e o püb lico

distinguem as novas edicoes das antigas. A editora é uma coisa, a revista é

outra, por mais qu e a editora ibra suas portas de preferéncia aos escritores da

revista. E na Nouvelle Revue Fran çaise o gidismo, em diferentes doses, imp rime

a revista seu caráter. A NRFreüne em suas páginas muitos escritores diferentes.

M as os que dão sua linha são Gide e seus discipulos. Jacques Rivière - m orto

ha pouco -, sucessor de G ide na direcao da revista, era urn caso genum no de

gidismo. Pode-se dizer que, através de Rivière, Gide continuou dirigindo a

NRF. Na casa da Nouvelle Revue F ran çaise adora-se a Gide e a Proust como aos

deuses pagão s, nos quais se reconhece a crItica dos fenôm enos solidários e

consanglilneos da moderna literatura francesa.Ex iste - ao m enos segu ndo seu s crIticos - urn espIrito NR1 ou seja, urn

espirito An dré G ide. Qu ais são suas caracterIsticas? 0 gordo Hen ri Béraud,

autor de ma rtIrio do obeso, qualifica-o de esnobisrno huguenote. Outro

escritor o designa co rn o terrno mais ou rnen os equivalente de "calvinisrno

intelectual". Mas essas expressóes, se é verdade que sugerern algo, não definern

nada. Mais categóricos, mais precisos são o romancista Roland Dorgelès eo polem ista Henri M assis, ambos católicos. Do rgelès cond ena An dré Gide,

não sornente em nome do espirito católico, "senão em name de sua saüde

moral". "Nós sornos pelo menos tônicos", explica; "ele é a favor do veneno. Ele

cré ilum inar as alm as. Qu e erro. Ele as turva. N ão são as virtudes a que ihe

interessa; são as taras. 0 mal tern mais atração que o bern e por isso tantos

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jovens vão a Gide. Mas estou tranqüilo: eles o deixarão. Sua moda passará

come, tantas outras." Massis considera "a desordem da jovem literatura" come,

urna conseqüência do subjetivismo filosófico. O bserva M assis que para os es-

critores da NRFnão parecem existir senão realidades psicológicas. "0 eu: aqui

está o timnico objeto, a ünica realidade cognoscivel. Esses escrivãos sao, antes de

tudo, crIticos e não criadores. Em suas obras nao ha acontecimentos nem per-

sonagen s; nao acontece nada. Podem e ssas obras aspirar a enriquecer nossa

humanidade? Pois é isso o que faz urna obra verdadeiramente clássica. Mas faz

falta uma sociedade; pois bem, desde a revolucao romântica, não existe na

Franca urn espIrito p iblico q ue eq uilibre o individualisrno do artista; este se

afunda cada vez m ais na singularidade: a arte está cada vez men os em contato

corn o m eio social."

N esses terrnos expóem sua posicão perante a NRFos representantes da tra-

dicao. Na polém ica entre a NRF e seus impug nadores pode-se ver o conflito

entre o classicismo e o rom antismo. M aurras define a nova p oesia francesa

come, "a cauda da cauda do simbolismo". Para Os escritores daAction Française,

na polItica e na literatura todos os males vém da revolucão. Basta voltar aescola clássica e a tradiçao m onárquica para que as letras recobrem seu equill-

brio. Essa observacao os em purra ao repidio integral e absoluto de mais de u rn

século de história humana. Ou seja, ao mais radical e bizarro de todos os

rom anticismos. M as, em sua critica do espIrito da literatura de Gide, a s vezes

surgem principios que - ainda que isso pareca absurdo - pod em ser aceitos por

um a crItica revolucioná ria. A literatura mode rna sofre, realm ente, urna crisede individualismo e de subjetivismo. Gide é urn signo dessa crise. A esse res-

peito, cis revolucioná rios não tern dificuldade Para se declarar de acordo corn

cis tradicionalistas. 0 acordo acaba v iolentam ente quando o diagnóstico passa

ao tratamento. Os tradicionalistas crêem q ue Sao T omás e a Igreja podem im -

por sua disciplina a s almas inquietas e turvadas dos artistas. O s revolucionários

sorriem perante esse anti -roman ticismo romântico. Pensam e sentem que so-

m ente de um a nova fé pode nascer um a disciplina nova. Mu ito se escreveu,

nos iiltimo s tempos , em revistas e jornais franceses con tra Gide e a N R E Henri

Béraud contestou o d ireito de G ide se classificar entre cis continuadores da

lingua francesa. Expu rgando a obra de G ide, o terrivel Béraud encontrou algu-

mas deficiéncias gramaticais. M as esses e outros ataques do mesm o género não

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tern senão urn valor anedótico. A obra de Gide nâo pode set assassinada a

partir de urna encruzi hada da grarnática e da academia. O s juízos dignos de

set tornados em consideracao são os que pattern de pon tos de vista politicos e

filosóficos.

E absurdo e grosseiro ernpenhar-se em dem onstrar que Gide escreve mal.

O u, pelo menos, que nao escreve bern. A despeito de qualquer negligência

grarnatical de urna on outra de suas páginas, sua obra é técnica e esteticarnente

a de u rn rnestre da literatura francesa conternporânea. Os reparos que pode rn e

devem set feitos são de outra ordern. Urna crItica penetrante tern que classificá-

la, por exemplo, corno uma obra de influência dissolvente. Gide representa na

Franca, espiritual e intelectualmen te, uma forca de d issolucão e de anarquia.

Urn hornern de alm a apaixonada e d e inteligéncia construtiva não encontra em

seus livros nada qu e alirnente sua fé nem estimule sua d isposicao. Gide en erva

e afrouxa os nervos como urn banho rnorno. Não sai nunca de urn livro de

G ide senão urn pouco de laxidãb voluptuosa. 0 autor de L'enfantprodigue e La

pastoral contagia urna espécie de apatia elegante.

N ão é prematuro predizer o próxim o ocaso de sua influéncia. Dorgelès ternrazâo. A mo da de G ide passará corno tantas outras. Ern parte não é m ais que

urn reflexo do éx ito de Proust e do apogeu do rom ance psico ógico. A NRF, s e

quiser sobrev iver ao gidisrno, não terá outro rernédio a não set renov ar-se. A

m orte de Jacques Rivière facilita provavelmente sua evo lucao. Urna grande

editora está obrigada a set urn pouco o portunista. E já tem os visto com o, na

atualidade, a NRF rnais que uma revista é urna editora. A mais importanteeditora francesa.

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de dom inar e de conduzir a revolucao - e sern condiçoes, por consegu inte, de

reorganizar e reanimar a frente russa. A em baixada francesa, presidida por

No ulens, estava integralmente com posta de diplomatas de carreira, de hom ens

da alta sociedade. Essa gente, brilhante e decorativa num ambiente de festas e

intrigas elegantes, era absolutamente inadequada nurn am biente revolucioná-

rio. Fazia falta na embaixada urn homem de espirito novo, de inteligência

inquieta, de juIzo pen etrante, urn hom em h abituado a entend er e a pressentir

o estado de ânimo das m ultidóes, que nao tivesse repugnância ao demos nern a

praca, corn capacidade para tratar as idéias e os hornens d e um a revolucão.

o capitâo da reserva Jacques Sadoul, socialista moderado, possula essas condi-

cO es. M ilitava no P artido So cialista, que na época tornava parte no m inistério.

Intelectual e advogado, procedia adem ais da mesm a escola socialista que deu

tantos colaboradores a burguesia. Na guerra, havia cumprido corn seu dever de

soldado. 0 gov erno frances o julgou, por essas razóes, indicado para o c argo

de encarregado politico na ernbaixada.

M as veio a Revolucao de O utubro. Sadoul achou rnelhor agir próxirno de

urn governo de ousados e vigorosos revolucionários corno L enin e T rotsky -urn gov erno detestável para o gosto de urna ernbaixada que, naturalmente,

cultivava nos sa óes a amizade do antigo regime - do que de cornedidos e

harnietianos dernocratas como Kerensky. N oulens e seu séquito, em rigoroso

acordo corn a aristocracia russa, pensararn que o governo dos sovietes nao

poderia durar. Consideraram a Revolucao de Outubro urn episódio turnul-

tuoso que o born sen so russo - solicitamente estimulado pela diplornacia daEn tente - dana urn jeito de acabar em breve. Sadoul se esforcou em vão por

tentar esciarecer a embaixada, mas Noulens não queria nem podia ver nos

bolcheviques os criadores de urn n ovo regime russo. Enquanto Sadoul traba-

ihava para obter urn entendime nto corn os sovietes - que evitasse a paz sepa-

rada da Russia corn a Alemanha -, Noulens alentava as conspirac6es dos m ais

convictos e iludidos contra-revolucionários. A E ntente, a seu juIzo, não devia

negociar corn os boicheviques. Tendo em vista que a d ecornposicao e a derru-

bada de seu governo erarn im inentes, a Entente devia, pelo contrário, ajudar a

quem se propunha apressá-los. Ate a véspera da paz de Brest Litovsk, Sadoul

lutou para induzir seu ernbaixador a oferecer aos sovietes os rneios econôrnicos

e técnicos para continuar a guerra. Um a palavra oportuna ainda poderia deter

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a paz separada. Os ch efes bolcheviques capitulavam consternados perante as

brutais condicoes da Alemanha. T eriam preferido com bater por uma paz justa

entre todos os povos beligerantes. Trotsky, sobretudo, mostrava-se favorável ao

acordo defendido por Sadoul. Mas o fátuo embaixador nao com preendia nem

percebia nada disso. Não se dava conta, em absoluto, de que a revolução

boichevique, boa ou ma, era de todo modo urn fato histórico. Temeroso de

que os informes de Sadoul irnpressionassern o governo frances, Noulens evitou

transmiti-los telegraf'icamente.

Os informes de Sadoul chegaram, não obstante, a Franca. Ele escrevia, fre-

qüentemente, ao m inistro Albert Thom as e aos deputados socialistas L onguet,

L afont e Pressemane. Essas cartas, oportunamente, chegaram ao conh ecimento

de Clemenceau mas não conseguiram, ob viamente, atenuar sua feroz hostili-

dade contra os sovietes. Clemenceau era da mesm a opiniao de N oulens. Os

bolcheviques não podiam conservar o poder. Era fatal, imperioso e urgente que

O perdessem.

Clemenceau deu razão a seu embaixador. Sadoul atraiu todas as iras do

poder. A em baixada esteve a ponto de m andi-lo em com issâo para a Siberia,como urn m eio de livrar-se dele e de castigar a independéncia e a honradez de

seus juIzos. Isso teria ocorrido se um a grave circunstância nao o tivesse desa-

conselhado. 0 capitao Sado ul lhe servia de pára-raios em rneio a tempestade

bolchevique. sua sombra, a embaixada mano brava contra o novo regime. Os

servicos de Sadoul - convertido em urn m ediador perante os boicheviques -

mostravam-se necessários. Mas o jogo foi finalmente descoberto. A em baixadateve que sair da R ussia.

A revoluçao, no entanto, havia se apoderado cada vez m ais de Sadoul. Desde

o primeiro instante, ele havia com preendido seu alcance h istórico. Mas, im-

pregnado d e uma ideologia democrá tica, nao havia decidido ainda aceitar seu

rnétodo. A atitude das democracias aliadas perante os sovietes se encarregou de

desvanecer suas ditimas ilusóes democráticas. Sadoul viu a Franca republicanae a Inglaterra liberal, ex-aliadas do despotismo asiático do czar, encarniçarem-

se raivosamen te contra a ditadura revolucionária do proletariado. 0 contato

corn os ilderes da revoluçao ihe permitiu, ao mesmo tempo, dar a eles seu

valor. L enin e T rotsky se revelaram a seus othos e a sua consciéncia, em urn

momento em que a civilizaçao os rechacava, como dois homens de valor

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excepcional. Sadoul, possuldo pela emocão qu e estremecia a alma russa, entre-

gou-se gradualmente a revolucão. Em juiho de 19 18 escrevia a seus am igos, a

Longuet, a Thomas, a Barbusse, a Romain Rolland: "Como a major parte de

nossos camaradas franceses, antes da guerra eu era um socialista reformista,

amigo de uma sábia evo ucão, partidário decidido das reformas que, uma a

urna, vém a melhorar a situacão dos trabaihadores, a aumentar seus recursos

rnateriais e intelectuais, a apressar sua organizacão e a multiplicar sua forca.

Como tantos outros, eu vacilava perante a responsabilidade de desencadear,

em plena Paz social (na medida em que é possIvel falar de paz social dentro de

um regime capitalista), uma crise revolucionária, inevitavelmente caótica,

custosa, sangrenta e que, mal conduzida, podia estar destinada ao fracasso.

Inimigos da vio ência acima de tudo, havfarnos nos afastado pouco a pouco

das saudáv eis tradiçaes rnarxistas. N osso evolucionism o impen itente nos havia

levado a confund ir o m eio, isto é, a reforma, com o fim, ou seja, a socializacao

geral dos meios de producao e de troca. Assim havIamos nos separado, ate

perdê-la de vista, da ünica tática socialista admissIvel, a tática revolucionária. E

tempo de reparar os erros cometidos".

Na Franca, Noulens e seus secretários denunciararn Sadoul como urn fun-

cionário desleal. U rgia inuti izá-lo, invalidá-lo como acusado r da incompreensão

francesa. Clemenceau ordenou urn processo. 0 Partido Socialista indicou

Sadoul corno candidato a deputado. 0 povo era convidado, desse modo, a

anistiar o acusado. A e eicao rena sido entusiasta. Clemenceau decidiu entao

inabilitá-lo. Urn C onselho de G uerra se encarregou de julgá-lo in absentia e desentenciá-lo a pena c apital.

Sadoul teve que permanecer na Russia. A anistia de Herriot, regateada e

mutilada pelo Senado, não o beneficiou come, a Cail aux e como a Marty.

Sobre Sadoul continuou pesando uma sentenca capital. Mas ele compreendeu

que já era, apesar de tudo, o rnomento de vo tar a Franca. A opinião popular,

suficienrem ente inform ada sobre seu caso, saberia defendê- o. A policia tratoude prendé- o logo que chegou a Paris. A extrema esquerda protestou, rnas

governo respondeu que Sadoul não estava coberto pela anistia. Ele pediu que

seu processo fosse reaberto e em Janeiro ultimo compareceu perante o Conse-

iho de Guerra. Nessa audiéncia, Sadoul falou mais como urn acusador do que

corno urn acusado. Em vez de uma defesa, fez uma acusacão. Quern havia se

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equivocado? Certamente nao fora ele, que havia previsto a duracao e advertido

sobre a solidez do novo reg ime russo; certarnente não fora ele, que havia preco-

nizado urna coo peracão franco-russa, reciprocarnente respeitosa do igual di-

reito de am bos Os pov os de eleger seu próprio governo, adm itida agora, de

certa forma, corn o restabelecimen to das relaçoes dip om áticas. N ão; dcnao

havia se equivocado, rnas sim N oulens. 0 processo Sadoul se transformava,

assim, nu rn processo contra o próprio N oulens. 0 Conselho de G uerra con-

cordon corn a reabertura do processo e co rn a liberdade condicional de Sadoul.

E em seguida pronunciou sua absolvicao. A história já havia se antecipado a

essa sentença.

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Detaihe do mural de Diego Rivera, l hombre en una encrucijada

(1935, Palacio be Betas Artes, Mexico).

Ao lado de Trotsky aparecem James Cannon, Engels e Marx.

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LEON TROTSKY'

Trotsky nâo é sornente urn protagonista, mas tarnbérn urn filósofo urnhistoriador e urn crItico da revolucao. Nenhum lIder da revo ucão pode deixar

de ter, naturairnente, uma visao pano rârnica e precisa de suas raIzes e de sua

génese. L enin, por exem plo, distinguiu-se por urna capacidade singular para

perceber e entender a direcao 1a h istória contempo rânea e o sentido de seus

acontecirnentos. M as os penetrantes estudos de L enin abarcararn apenas as

questôes polIticas e econôm icas. T rotsky, porérn, interessou-se tamb ém pelasconseqüéncias da revolucao na filosofia e na arte.

Trotsky polemiza corn os escritores e cis artistas que anunciam a chegada de

uma nova arte, o surgimento de um a arte proletária. Possui já a revoluçao urna

arte prépria? T rotsky move n egativarnente a cabeça. "A cu ltura", escreve, "não

é a prirneira fase do bem-estar: é o seu resultado final."

0 proletariado g asta atualrnente suas energias na luta para derrubar a bur-

guesia e na tarefa de resolver seus problemas econôrnicos. A nova ordem

é dernasiadarnente ernbrionária e incipiente: ainda está ern perlodo de for-

maçâo. Uma arte do proletariado, portanto, ainda não pode surgir. Trotsky

efine o desenvolvimento da arte como o mais elevado testernunho da vi-

talidade e do va lor de urna época. Assim , a arte do proletariado não apresen -

tará os episódios da luta revolucionária: será aquela que descreverá a vida

ernanada da revolucao, de suas criacóes e de seus frutos. Não seria o mo-

m ento, entâo, de se falar de urna nova a rte, que, corno a n ova ordem social,

Publicado originalmente corn o tItulo "Trotsky" no livro La escena contempordnea,

Lima, M inerva, 1925.

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deve atravessar urn perlodo de ex periéncias e ensaios. "A revolucao encon -

trará na arte sua imagem quando deixar de set para o artista urn fenômeno

estranho a ele." A nova arte será produzida por hom ens de urn nov o tipo. 0

conflito entre a realidade m oribunda e a nascente durará long os anos de lutas

e mat-estar. Somen te depois que transcorrerem esses anos, quando a nova or-

ganizacão humana estiver cimentada e assegurada, é que existirão as condiçoes

necessárias para o desenvolvimen to de uma arte do proletariado. Q uais serão

os tracos essenciais dessa arte do futuro? Trotsky formula algumas previsóes. A

arte do futuro será, a seu juIzo , "inconciliável corn o pessimisrno, corn o ceti-

cismo e corn todas as outras formas de prostracao intelectual; e estará cheia de

fé criadora, de um a fé scm limites no futuro". Essa, certamente, não é um a tese

arbitrária. A desesperanca, o niilismo e a m orbidez, que a literatura contemp o-

rânea contém em grandes doses, são sinais caracterIsticos de um a sociedade

fatigada, esgotada, decad ente. A juventud e é otimista, afirmativa, alegre, en-

quanto a velhice é cética, negativa e rabugenta. A filosofia e a arte se apresenta-

rão, por conseguinte, em formas distintas em um a sociedade jovem e em uma

sociedade senil.0 pensam ento de Trotsky segue por esses caminhos e por outras conjectu-

ras e interpretacoes. O s esforços da cultura e da inteligéncia burgu esas estão

dirigidos principalm ente ao progresso da técnica e do me canismo d a produ-

ção. A ciéncia é aplicada, sobretudo, na criacão de u rn m aquinismo cada dia

m ais perfeito. O s interesses da classe dom inante são adversos a racionaliza-

cão da producao e são contrários, conseqüentemente, a racionalizaçao dos cos-tumes. As preocupaçoes da humanidade são sobretudo utilitárias. 0 ideal

de nossa época é o lucro e a poupan ca, enqu anto a acumu lacão de riquezas

acaba se tornando a m ajor finalidade da vida hum ana. A nov a ordem revolu-

cjonária jrá racionalizar e hum anizar os costume s, resolvendo o s problem as

que a ordem burguesa - por causa de sua estrutura e de sua funcão - não

consegue so lucionar: possibilitará que a m uiher se liberte da servidão dom es-tica; assegurará a educacao social das criancas; eliminará as preocupaçóes eco-

nôm icas do casamen to. 0 socialismo, tao zombad o e acusado de m aterjalista,

mostra-se, em suma, desse ponto de vista, como uma reivindicaçao, urn

renascimento de valores espirituais e morais, oprimidos pela organizacão

e pelos m étodos capitalistas. Se na época capitalista prevaleceram as am biçoes

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GRIGORI ZINOVIEV

Periodicamente, urn discurso on urna carta de Grigori Zinoviev tira do

sério a burguesia. Quando ele nâo escreve nenhum manifesto, os burgueses

nostálgicos de sua prosa se encarregarn de inventar urn ou dois. Os m anifestos

de Zinoviev percorrem o rnundo, deixando atrás de si urn rastro de terror e de

medo. 0 poder explosivo desses documentos é tao garantido que ate mesmo

foram usados na ditima campanha eleitoral britânica. Os adversários do tra-

baihismo descobriram, a s vésperas das eleicaes, urna horripilante mensagernde Zinoviev e a usaram, sensacionalmente, como urn estimulante da vontade

combativa da burguesia. Que honesto e aprazIvel burgués não iria se horrori-

zar corn a possibilidade de MacDonald continuar no poder? MacDonald pre-

tendia que a Grã-Bretanha emprestasse dinheiro a Zinoviev e aos dernais

comunistas russos. E, entrementes, o que fazia Zinoviev? Incitava o proleta-

riado britânico a fazer a revolucao. Para as pessoas bern inform adas, essa des-

coberta não tinha importância. Ha rnuitos anos, Zinoviev nao se ocupa

de ou tra coisa senão pregar a revolucao. A s vezes se ocupa de algo mais auda-

cioso ainda: trata de organizá-la. 0 seu trabaiho de consiste precisamente

nisso. Como se pode, entdo, querer honradarnente que urn homem não cum-

pra corn suas tarefas?

Urna parte do pdblico não conhece Zinoviev, a não set como urn formi-

davel fabricante de panfletos revolucionários. E provável ate que se compare

a produçao de seus panfletos corn a produçao de automóveis de Ford, por

Publicado originalmente corn o tItulo "Zinoviev y laTercera Internacional" no livro

La escena contempordnea, Lima, M inerva, 1925.

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exem plo. A T erceira Internacional deve set, para essa parte do püb ico, algo

assirn corno urna filial da Zinoviev Co. Ltda., fabricante de manifestos contra

a burguesia.

Efetivarnente, Zinovicv é urn grande p anfletário. Mas o panfleto não é Se-

nao apenas urn instrurnento politico. A polItica nestes tem pos é, necessaria-

rnente, panfletária. Mussolini, Poincaré e Lloyd George são tambérn panfletários

a seu m odo. Arneacarn e difarnarn os revolucionários, mais ou m enos corno

Zinoviev am eaça e difama os capitalistas. São prirneiros-ministros da b urgue-

sia como Z inoviev poderia s&-lo da revolução: ele cr& q ue urn agitador vale

quase sem pre mais que urn ministro.

Per pensar desse rnodo, preside a Terceira Internacional, em vez de exercer

urn cargo de com issário do povo. Foi levado a presidéncia da T erceira Interna-

cional por suas história e qualidade revolucionárias, bern como por sua condi-

cao de discIpulo e colaborador de Lenin.

Zinoviev é urn polem ista O rgânico. Seu pensam enro e seu esrilo são essen-

cialmente polérnicos. Sua cabeca dantoniana, de tribuno, tern um a perene an-

rude beligerante. Sua d ialética é ágil, agressiva, cá ida, nervosa: tern rnatizes deironia e de humour e trata o adversário de rnaneira desapiedada e acérrima.

M as Zinoviev é, sobretudo, urn depositário da doutrina de Lenin, urn con-

tinuador de sua obra . Sua teoria e sua prática são, invariavelmente, a teoria e a

prática de Lenin. Possui um a história absolutarnente bolchev ique: pertence a

vethaguarda do com unismo russo; trabalhou corn L enin, no estrangeiro, antes

da revolução; e foi urn dos professores da escola marx ism russa dirigida porLenin ern Paris.

Esteve sempre ao lado de L enin. N o corneço da revoluçao houve, não obs-

tante, urn instante em q ue sua opiniao discrepou da de seu rnestre. Q uando

L enin decidiu tom ar o poder de assalto, Zinoviev julgou prematura sua deci-

são. A história deu razão a L enin: os bolcheviques conquistaram e conservaram

O poder e Z inoviev recebeu o encargo de o rganizar a T erceira Internacional.

Explorernos rapidarnenre a hist6 ria dessa Terceira Internacional desde suas

origens.

A Primeira Internacional, fundada per M arx e Eng els em L ondres, não foi

senão apenas urn esb oco, urn gerrne, urn program a. A realidade internacional

ainda não estava definida e o socialismo era apenas um a forca em formaçao.

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M arx acabava de dar-ihe concrecão histórica. Cum prida sua função de traçar

as orientacôes de um a ação internacional dos trabaihadores, a Primeira Inter-

nacional submergiu na confusa nebulosa da qual havia emergido. Mas a von-

tade de articular internacionalm ente o m ovim ento socialista ficou formulada.

Alguns anos dep ois, a Internacional reapareceu vigorosamente. 0 crescimento

dos partidos e sindicatos socialistas requeria uma coordenacao e uma articula-

c á o internacionais. A funçao da S egunda Internacional fol quase unicarnente

organizadora. O s partidos socialistas dessa época efetuavam urn trabalho de

recrutamento: sentiam que a data da revolucao social se encontrava distante e

propuseram-se, por conseguinte, a conq uista de algum as reformas interinas. 0

m ovim ento operário adquiriu assim u rn espIrito e urna mentalidade reformis-tas. 0 pensamento da socialdernocracia lassalliana dirigiu a Segunda Interna-

cional, fazendo que o socialismo ficasse inserido na demo cracia. A S egund a

Internacional, por isso, nada pôde fazer con tra a guerra: seus ilderes e secóes

haviam se habituado a u m a atituIe reformista e dem ocrática. A resisténcia a

guerra reclam ava um a atitude revolucionária. 0 pacifismo da Segun da Inter-

nacional - que não se encontrava nem espiritual nem m aterialmente prepara-

da para a a cão revolucioná ria - era estático, platônico, abstrato. As m inorias

socialistas e sindicalistas trabaihararn em vão para radicalizar a organizacão. A

guerra acabou por dividi-la e dissolve-la e apenas algurnas m inorias continua-

ram representando sua tradicao e seu ideário, minorias estas que se reuniram

nos congressos de Khiental e Zimmerw ald para esbocar as bases de uma nov a

organizacão internacional. A revoluçao russa impulsionou esse rnovim ento e

em marco de 1919 foi fundada a T erceira Internacional. Sob suas bandeiras Seagruparam o s elementos revolucionários do socialismo e do sindicalismo .

A S egunda Internacional reapareceu corn a mesma m entalidade, os rnes-

m os homens e o m esmo pacifismo platônico dos tempos pré-bélicos. Em seu

estado-maior se concentram os lIderes clássicos do socialismo: V andervelde,

Kautsky Bernstein Turati etc. Apesar da guerra, esses homens nao perderam

sua antiga fé no m étodo reformista. N ascidos da demo cracia, não conseguem

renega-la e nao percebem os efeitos históricos da guerra. Trabalham como

se a guerra não tivesse interrompido nada. Não adm item nem compreendem

a existéncia de um a nova realidade. Os elem entos ligados a Segunda Inter-

nacional são em sua m aioria velhos socialistas, enquanto a T erceira Interna-

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cional, ao contrário, recruta o grosso de seu s adeptos en tre a juventud e. Esse

dado indica, meihor que nenhum outro, a diferenca histórica de ambas

as agrupacöes.

As raIzes da decadéncia da S egunda Internacional, saturada de preocupacóes

dernocráticas, confundem-se corn as raIzes da decadéncia da dem ocracia. Ela

corresponde a um a época de apogeu do Parlam ento e do sufrágio universal: o

método revolucionário, portanto, lhe é absolutamente estranho. Os novos tem-

pos se véem obrigados, então, a tratá-la de forma desrespeitosa e rude. A juven-

tude revolucionária costuma esqu ecer ate m esm o as realizacóes da Segund a

Internacional como organizadora do m ovirnento socialista. Mas a juventude

nao se pode , razoavelm ente, exigir que se preocup e corn a justica. Ortega y

Gasser diz que a juventude "poucas vezes tern razão no que nega, mas sem pre

tern razão no que afirma". A isso se poderia agregar que a forca impulsionadora

da história são as afirm acdes e as n egacóes. A juventude revolucionária não

nega, ademais, a Segunda Intrnaciona1 seus direitos no presente. Se a Seg unda

Internacional não insistisse em sobreviver, a juventude revolucioná ria teria o

prazer em venerar sua mem ória. Con stataria, honradam ente, que a Segu ndaInternacional foi um a má quina de organ izacão e a T erceira Internacional é

urna máq uina de combate.

Esse con flito entre duas mentalidades, entre duas épocas e entre dois méto-

dos do socialismo tern em Zinoviev uma de suas dramatis personae M ais do

que co rn a burgu esia, Zinoviev po lemiza corn os soc ialistas reformistas. I o

crItico rnais arnargo e contund ente da Segunda Internacional. Sua crftica defi-ne nitidamente a diferenca histórica das internacionais. A guerra, segundo

Zinoviev, antecipou ou , melhor d izendo, precipitou a era socialista. Existern as

prem issas econôrnicas da revolucão proletária, m as ainda falta a orientacão

espiritual da classe trabaihadora, que não pode set dada pela Segunda Interna-

cional, cujos ilderes continuarn acreditando, corno ha vinte anos, na possibili-

dade de urna suave transicao do capitalismo ao socialisrno. Pot isso foi forrnada

a T erceira Internacional. Zinoviev faz notar que a T erceira Internacional não

age sornente sobre os pov os do O cidente. A revo lucão, diz ele, não deve set

européia, e sirn m undial. "A Segu nda Internacional estava lirnitada aos ho--1—ipm nranraaTprcprannennrl rr1p tar nnnnpnccpn oelacom

Ela se interessa pelo despertar das rnassas oprimidas da Asia. "Não é, todavia",

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lembra ele, "uma insurreição de massas pro etárias; mas deve s- o. A corrente

que nó s dirigim os Iibertará todo o rnundo."

Zinoviev polemiza tambm corn os com unistas que discordam eventual-

m ente da teoria e da prática leninistas. Seu debate corn T rotsky, no partido

comunista russo, teve ha pouco tempo ressonância mundial. Trotsky,

Preobrajensky e outros atacavam a y e/ha gu arda do partido e incitavam os

estudantes de M oscou contra ela. Zinoviev os acusou de usar procedirnentos

dem agógicos, por falta de argumen tos sérios. E tratou corn urn pouco de iro-

nia aqueles estudantes irnpacientes, que, "apesar de estudarem 0 capital de

M arx ha seis rneses, ainda náo governavarn o pals". 0 debate entre Zinoviev e

T rotsky se decidiu favoravelmente para Zinoviev. Ap oiado pela veiha e p ela

nova guarda leninista, ele ganhou o duelo. Ago ra dialoga corn seus adversários

dos outros carnpos. Toda a vida desse grande agitador é po êrnica.

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MAX I MO GORKI '

M áxirno Górki é o rornancista dos vagabundo s, dos párias, dos miseráveis.

E o rom ancista das sarjetas, da m a vida e da forne. A obra de G órki é peculiar,

espontânea, representativa deste século de rnultidôes, do Q uarto Estado e d a

revolucão social. M uitos artistas conternporâneos extraem seus temas e seus

personag ens das carnada s plebéias, inferiores. A alma e as paixôes burg uesas ja

foram dernasiadam ente exploradas e, portanto, são urn tanto antiquadas. Já no

caso d o p roletariado, ao co ntrário, existern n ovos m atizes e linhas insólitas.

A plebe dos rom ances e dram as de G órki não é ocidental: é autenticarnenterussa. M as ele não é som ente urn narrador da R iIssia: é tambérn urn de seus

protagonistas. Foi urn de seus criticos, urn de seu s cronistas e urn de seus ato-

res. Não fez a revolucão russa; mas a v iveu.

Górki nun ca foi boichevique . Em g eral falta aos intelectuais e aos artistas a

fé necessária para env olver-se de forma facciosa, disciplinada e sectária nos

quadros de urn partido. Tendem a urna atitude pessoal, distinta e arbitrária

perante a vida. Górki, ondulante, inquieto e heterodoxo , não seguiu rigida-

m ente nenhurn prograrna nem nenhurna opcão p oilt ica. Nos prirneiros tem-

pos da revo ucão dirigiu urn jornal socialista revolucionário: Novaya Zhizn.

Esse diário acolheu corn desco nfianca e inirnizade o regime sov iético, tachando

os boicheviques de teóricos e utópicos. Górki escreveu q ue os boicheviques

faziam urn experirnento ütil hurnanidade, mas mortal para a RtIssia.

A raiz de sua resisténcia, contudo, era mais recôndita, Intirna e espiritual:

Publicado originalmente corn o titulo "Máximo Górki y Rtissia" no Iivro La escena

contempordnea, Lima, Minerva, 1925.

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era urn estado de ânirno, de reaçáo con tra-revolucionária, com urn rnaioria

dos intelectuais. A revoluçao os tratava e vigiava com o inirnigos latentes. E eles

se incom odavam que a revoluçao, tao baruihenta, tao caudalosa, tao explosiva,

turvasse de forma indelicada seus sonhos, suas pesquisas e seus discursos.

Alguns persist iram nesse estado de ânimo, enqu anto outros se contagiaram

e se inflamaram de fé revo ucionária. Górki, por exemplo, não tardou em

aproxim ar-se da revoluçao. Os sovietes o encarregaram da organ izacão e dire-

ção da casa dos intelectuais, destinada a salvar a cultura russa da m are revolucio-

nária, hospedando, alirnentando e fornecendo elem entos de estudo e de trabaiho

aos hom ens de ciência e de letras da Riissia. Gó rki, entregue protecão dos

sábios e dos artistas daquele pals, se converteu, assim, em urn dos colaboradores

substantivos do Cornissário de Instrucáo P üblica Lun atcharsky .Vieram os dias de seca e escassez na regiao do V olga. Um a coiheita frus-

trada ernpob receu totairnente, de forma sübita, várias provIncias russas, já de-

bilitadas e extenuadas por m uitos anos de guerra e de bloqueio: milhOes de

homens ficaram sem pâo para o inverno. Górki sentiu que seu dever era com o-

ver a hum anidade corn essa tragedia imen sa e, para isso, solicitou a colabora-

cao de A natole France, Gerhart Hauptmann, Bernard Shaw e de outros grandes

artistas. Saiu da Rñssia, na época m ais distante e m ais estrangeira do que nun-

ca, para falar a Europa de perto. Mas ele não era m ais o vigoroso vagabundo,

o duro nôm ade de outros tem pos. Sua ant iga tuberculose o atacou no cam i-

nho, obrigando-o a ficar na Alemanha e a se internar num sanatório. Urn

grande europeu, o sábio e explorador Nansen, percorreu a Europa pedindo

auxilio para as provIncias farnélicas. Discursou em L ondres, Paris e Rom a,

sob a chan cela de sua palavra insuspeitável e apoiltica, afirmando que aquela

tragedia nâo havia sido culpa do cornunismo : era urn flagelo, urn cataclismo,

urn infortünio. A Rt'issia, bloqueada e isolada, náo podia salvar todos seus

farnintos. Não havia tem po a perder. 0 inverno se aproxirnava. N áo socorrer

irnediatarnente os farnintos seria o mesm o que abando ná-los a rnorte. Muitos

espIritos generosos respon derarn a esse charnado. As m assas operárias derarn

sua contribuicao. Mas o instante não era proplcio para a caridade e a filan-

tropia. 0 Ocidente estava demasiadam ente carregado de rancor e raiva contraa Rássia. A grande imprensa européia deu cam panha de Nansen urn apoio

sern entusiasmo, enquanto os Estados europeus, insensibilizados, envene-

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econom ia med ieval, prirnitiva. A intuicao e a visâo de Górki coincidem co rn

a constatacão do hom em de ciência.

Falei corn Górki desse e de outros assuntos em dezembro de 1 92 2 no Neue

Sanatorium d e Saarow Ost. Seu alojamento estava fechado a todas as visitas

estranhas e insólitas. Mas sua m uiher, M aria Feodorow na, me abriu suas por-

tas. Gó rki não fala senão o russo, rnas a esposa se cornunica em alem ão, fran-

cés, inglés e italiano.

Ne sse tempo, Gó rki escrevia o terceiro tom o de sua autobiografia. E corne-

çava urn livro sobre homen s russos.

- Hornens russos?

- Sim; homen s que vi na Russia; homen s que conheci; não necessariarnente

hornens célebres, m as, sirn, interessantes.P erguntei-lhe sobre suas relaçôes corn o b olchevisrno. Alguns periódicos

insinuavarn que ele andav a afastado de seus lIderes. Górki me d esrnentiu essa

notIcia: suas relaçOes c orn os sbviéticos eram boas, norrnais. Tinha a intencao

de voltar logo Russia.

Ha em Górki algo de veiho vagabundo, de veiho peregrino, corn seus olhos

agudo s, mãos rüsticas, estatura urn pouco en curvada e b igodes tártaros. Ele

nao é fisicamente u rn hornern rnetropolitano; é, rnais propriarnente, urn ho-

m ern rural, urn cam ponés. M as não tern urna alma patriarcal e asiática corno

Tolstói, que defendia urn com unisrno camp onés e cristão. Górki adm ira, am a

e respeita as rnáquinas, a técnica e a ciéncia ociden tais, todas as co isas que

repugna varn o m isticismo de T olstói. Esse eslavo, esse vagabun do e abstrusa

e subconscientemente, urn devoto e urn apaixonado pelo Ocidente e por

sua civilizacao.

E, sob os telhados de Saarow Ost, aonde nao chegavam os rurnores da

revolucão com unista nern tampouco os ruIdos da reacão fascista, seus olhos

doentes e visionários de hom em alucinad o viarn corn angüstia aproximar-se o

ocaso e a rnorte de urna civilizacâo maravilhosa.

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poiltica e econôm ica: as £inanças da nação se achavam subm etidas ao controle

das poténcias estrangeiras ao m esmo tempo em que a decrépita dinastia manchu

não po dia opor quase n enhurna resisténcia a colonização do pals nem suscitar

ou presidir urn renascirnento da energia nacional. Imp otente perante a abdica-

ção da soberania nac ional, já nâo era m ais capaz de retroceder: nao possula

nem o apoio nem a confiança da populacão. Exangue e aném ica, estranha ao

povo, vegetava languida e palidam ente, representando som ente urn feudalis-

rno rnoribundo, cujas raIzes tradicionais se m ostravam cada vez m ais enve-

ihecidas e minadas.

As idéias nacionalistas e revo1ucioná ris, difundidas pelos estudantes e in-

telectuais, encontraram, por conseguinte, urna atmosfera favorável. Sun Yat

Sen e o partido Kuo -Ming-Tang promo veram um a poderosa corrente republi-

cana. A C hina, assim, tratou de ad otar a forma e as instituicóes dem o-liberais

da burguesia européia e americana. Não cabia, absolutamente, na China, a

transforrnação da m onarquia aboluta em mo narquia constitucional. As bases

da dinastia rnanchu estavam totalmente m inadas e um a nova d inastia não po-

deria set improv isada. Sun Yat Sen não propu nha, portanto, um a utopia. Ti-

nha que tentar, de fato, a fundaçao de uma repüblica, que não nasceria,

obviam ente, solidame nte cimentada, m as que, através das peripécias de urnlento trabaiho de afirmacao , encontraria ao fim seu equ ilibrio. Os aconteci-

mentos deram razão a essas previs6es.

A dinastia manchu foi derrubada, definitivamente, no primeiro grande

em bate da revolucao. A insurreiçâo estourou em W u Chan g, capital da provIn-

cia de Hu-Pei, em 10 de outubro de 1911. A mo narquia nâo pôde se defender.

Foi proclamada a reptiiblica e S un Yat S en, o chefe da revolucao, assumiu o

poder. Mas ele se deu conta de que seu partido ainda não estava rnaduro parao governo. A dinastia havia sido facilm ente vencida; ma s os tuchuns, os latifun-

diários do norte, ainda con servavam suas posicóes. As idéias liberais haviam

prosperado no sul, onde a po pulacao, muito mais densa, era comp osta princi-

palmente de pequenos burgueses. N o forte , onde o partido Kuo -Ming-Tang

não havia conseguido desenv olver-se, dom inava a grande propriedade.

Sun Yat Sen entregou o governo a Y uan Shi Kay , o qual, deientor de urn

antigo prestlgio corno experirnentado estadista, contava corn o apoio da classe

conservadora e dos chefes militates. 0 governo d e Yuan Shi Kay representava

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urn compromisso: deveria desenvolver urna poiltica de conciliaçao dos interes-

ses capitalistas e feudais corn as idéias dem ocráticas e republicanas da revolu-

cáo. Mas Yuan S hi Kay era urn estadista do antigo regime, cético em relaçao

aos prováveis resultados do e xperimento republicano. Adem ais, se apoderou

logo dele a arnbicao de ser o futuro im perador. Em dezem bro de 1915 , acredi-

tou que hav ia chegado a h ora de realizar seu projeto. A restauração foi precária

e o novo império durou apenas oitenta e trés dias. Aban donado por seus pro-

prios correligionários, Yuan S hi Kay teve que abdicar, enquanto o sen tim ento

revolucioná rio, em co nstante vigilancia, voltou a se impor.

Urn ano e rneio depois, contudo, outra tentativa de restauracáo m onárquica

pOs em perigo a repOblica. Derrotada naquela ocasião, a reacao nao se desar-

rnou ate agora. 0 mandarinismo e o feudalismo, que a revolucão ainda nao

conseguira liquidar, conspirararn incessantemente contra o regime dem ocráti-

co. A revolução, porém, não desmobilizou suas legióes, tendo em S un Yat Sen,

ate sua m orte, urn de seus a nirndores.

Em 1 9 2 0 , o con flito entre as provIncias do sul, dorninadas p elo partido

Kuo-Ming-Tang, e as provIncias do norte, dorninadas pelo partido An-Fu

e pelo caudilhism o tuchum, produziu um a secessão. Consti tuiu-se em Can-

tao urn bo lsão de agitacao nacionalista e revolucionária. 0 pacto assinado emWashington em 1921 pelas grandes potências, corn o objetivo de fixar limites

de sua açâo na Ch ina, condenou e rechaçou tais atitudes, comb atendo todos

as esforcos da ditatura do forte para subm eter a China a urn regime ex cessiva-

rnente centralista - contrário a s aspiracóes de autonom ia adm inistrativa das

provIncias - e contestando a organização de urn m ovirnento fascista, financia-

do p ela alta burguesia de Cantão, corn a mo bilizaçao arm ada do proletariado.

Educado na escola da dem ocracia, Sun Yat Sen soube, não obstante, em suacarreira polItica, ultrapassar as limites da ideologia liberal. Os m itos d a dem o-

cracia (soberania popular, sufrágio universal etc.) não se apoderaram de sua

inteligéncia clara e d ecidida de idealista prático. A polItica irnperialista d as

grandes poténcias ocidentais ensinou-lhe plenamente as qualidades da justica

dernocrática, enquanto a revoluçao russa rnostrou-lhe o sentido e a alcance da

crise contemporânea. 0 agucado instinto revolucionário de Sun Yat Sen o

orientou ate a ROssia e seus hornens. Ele via a RO ssia como a libertadora dos

povo s do Oriente. Náo pretendeu n unca repetir, rnecanicarnente, na China,

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os experimentos europeus: adaptava sua acão revolucionária realidade de seu

pals. Queria que fosse cumprida na China um a revoluçao chinesa, assim com o

se leva a cabo na R Issia, ha sere anos, urna revoluçao russa. Seu conhecim ento

da cultura e do pensam ento ocidentais náo desnacionalizava nern desarraigava

sua alma, ao mesm o tempo profundam ente chinesa e hum ana. Apesar de set

doutor por um a universidade forte-americana, perante o imperialismo ianque

e o o rguiho ocidental preferia sentir-se som ente urn cooli. Serviu austera, abne-

gada e dignarnente ao ideal de seu povo, de sua geracão e de sua época. E a esse

ideal deu toda a sua capacidad e e toda a sua vida.

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MAHATMA GANDHI  

Esse homem doce e piedoso é urn dos maiores personagens da história

contempo rânea. Seu pensam ento náo influi somen te nos trezentos e vinte m i-

  hóes de indianos: com ove toda a Asia e repercute também na Europa. Romain

Rolland, que descontente corn o O cidente se volta para o Oriente, ihe consa-

grou urn livro. A im prensa européia explora corn cu riosidade a biografia e o

cenário do apóstolo.

o principal capi tulo da vida de Gandhi com eça em 19 19 . 0 pós-guerra o

colocou a cabeca do mo vimento de em ancipacao de seu povo. Ate então, Gandhi

servia fielmente a Grá-B retanha e, durante a guerra, chegou a colaborar corn os

ingleses. A India deu a causa aliada uma importante contribuiçao, já que a

Inglaterra havia se comp rometido a lhe conceder o s direitos dos dem ais "Do-

mInios". Terminada a contenda, a Inglaterra esqueceu sua palavra e o princIpio

wilsoniano da l ivre determinacao do s povos: reformou superficialm ente a ad-

m inistraçao da India - na qual o povo ind iano concord ou ter uma p articipa-

cáo secundária e inócua - e respondeu a s queixas da popu acão local corn uma

repressão militar cruel. P erante esse tratam ento pérfido, Gan dhi mu dou suaatitude e ab andonou suas i lusôes. A India se insurgia contra a Grã-Bretanha e

reclamava sua autonom ia. A m orte de Tilak havia posto a direcao do m ovi-

m ento nacionalista nas mâos de Gan dhi, que exercia sobre seu povo um a gran-

de influéncia religiosa. Ele aceitou a o brigacao d e liderar seus com patriotas e

os conduziu a náo-cooperação. A insurreiçáo armada o repugnav a: os meios

Publicado originalmente corn o tItulo "Gandhi" no livro La escena contempordnea,

Lima, Minerva, 1925.

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deviam set, em sua op iniáo, bons e m orais corno os fins. Hav ia que utilizar a

resisténcia do esp Irito e do am or para se opor a s armas britânicas.

A palavra evang élica de Gandhi inflam ou de m isticism o e de fervor a alma

hjndustana. 0 Mahatma acentuou, gradualmente, seu método: os indianos

foram convidados a abando nar as escolas e universidades, a administracao e os

tribunais; a tecer corn suas m ãos seu traje khaddar; a rechaçar as manufaturas

britânicas. A India g andhiana se voltou, poeticarnente, a "m iisica da roca". Os

tecidos ingleses foram queim ados em Bom baim corno um a coisa m aldita e

satânica. A tática da não-cooperacáo se encarninhava a s suas iiltimas conse-

qüéncias: a desobediéncia civil e a recusa do pag am ento de impo stos. A India

parecia próxirna da rebe lião definitiva. P roduzirarn-se algum as violéncias.

Gandhi, indignado corn isso, suspendeu a ordem de desobediéncia civil e,

m isticamente, se entregou a penitência. Seu pov o nao estava ainda educado

para o uso da satyagraha, a força-amor, a força-alma. Os indianos obedec eram

a seu che fe. Mas essa retirada, ordenada no instante de ma ior tensão e m ajor

calor, debilitou a onda revolucionária. 0 mo vimento se consum ia e se desgas-

tava sem combater. Houve algurnas deserç6es e dissensóes. A prisão e o proces-

so contra Gandhi vieram a tempo. 0 M ahatma d eixou a direcao do m ovimento

antes que este declinasse.

0 Congresso Nacional indiano de dezembro de 19 23 m arcou urn enfraque-

cimento do gandhismo. P revaleceu nessa assembléia a tendéncia revolucionária

da nâo-cooperacão; mas a ela se contrapôs outra tendéncia, direitista ou

revisionista, que, contrariamente a tátjca gandhista, propunha a participacao

nos con selhos de reforma, crjados pela Inglaterra para dom esticar a burguesia

indiana. Ao m esmo tem po apareccu na assernbléia, em ancipada do gandhismo ,

um a nova corrente revolucionária de inspiracâo socialista. 0 programa dessacorrente, dirigido pelos nilicleos de estudantes e emigrados indjano s na Europa,

propunha a separacão com pleta da India do Império B ritânico, a abolicao da

propriedade feudal da terra, a supressâo dos im postos indiretos, a nacionaliza-

cão de m inas, ferrovias, telegrafos e dem ais serviços püblicos, a intervencao do

Estado na gestâo da g rande indiistria, uma m oderna legislaçao do trabalho etc.

Po steriormente, a cisão continuou aprofundand o-se. As duas grandes faccoes

mo stravam urn con tei' ido e um a fisionom ia classistas. A tendência revolucio-

nária era seguida pelo proletariado, que, duramen te explorado e scm o am paro

KII

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de leis protetoras, sofria ainda mais a dom inacao inglesa. Os pobres e hum ildes

eram fiéis a Gandhi e revoluçao, enquanto o proletariado industrial se organi-

zava em sindicatos em Bom baim e ou tras cidades indianas. A tendéncia de direi-

ta, ao contrário, abrigava as castas ricas, os parsis, comerciantes, latifundiários.

0 m étodo da n ão-cooperacao - sabotado pela aristocracia e p ela burguesia

indianas e contrariado pela realidade econôm ica - foi perdendo, pouco a pou-

co, sua forca. 0 boycot dos tecidos ingleses e o retorno lIrica roca nao pud e-

ram prosperar: a indüstria manu al era incapaz de con correr corn a indiistria

m ecânica. 0 povo indiano, adernais, náo tinha interesse em resistir ao proleta-

riado inglés, aumentando as causas do desemp rego naquele pals, corn a perda

de um grande mercado. Não se esqueciarn de que a causa da India precisava do

apoio do partido trabalhista da Inglaterra. Em contrapartida, os func ionários

dem issionários voltaram , em grande parte, a seus postos. Relaxaram -se, em

sum a, todas as formas da não-cooperacão.

Quando o gov erno trabaihista de M acDonald o anistiou e l ibertou, Gand hi

encontrou o m ovimento nacionalista indiano reduzido e fragmen tado. Pouco

tempo antes, a maioria do Congresso N acional, reunido extraordinariamente

em D elhi, em setembro de 1 92 3, havia se declarado favorável ao partido Sw araj,

dirigido por C. R. Das, cujo programa se conformava em reclamar para aIndia os direitos dos "D om inios" britânicos e se preocupava em obter para o

capitalismo indiano sólidas e segu ras garantias.

Atualmente Gandhi já nâo lidera nem controla a orientacão politica da

m aior parte do nacionalismo indiano. N em a d ireita, que deseja a colaboraçao

corn os ingleses, nem a ex trema esqu erda, que aconselha a insurreicão, ihe

obedecem . 0 nüm ero de seus correligionarios decresceu. Ma s, Se sua autori-

dade d e ilder politico decaiu, seu p restigio de asceta e d e santo náo parou deaum entar. Urn certo jornalista contou com o afluiam peregrinos de diversas

raças e regiôes asiáticas ao retiro do M ahatma. Gan dhi recebe, sem cerimôn ias

e sem p rotocolo, todo aqu ele que bate sua porta . Ao redor de sua mo rada

vivem centenas de indiano s felizes em sentir-se perto dde.

Essa é a gravitacao natural da vida do M ahatma. Sua o bra é m ais religiosa e

m oral do que polit ica. Em seu diálogo corn Rabindranath Tagore, o M ahatma

declarou sua intencao de introduzir a religiao na politica. A teoria da não-

cooperacão está saturada de preocupacôes éticas. Gandhi não é , verdadeira-

if

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m ente, o caudilho da liberdade da India, mas sim o apóstoio de urn movim en-

to religioso. A auton om ia da India não ihe interessa, nâo ihe apaixona , senão

secundariamente. Nâo sente nenhum a pressa em chegar a cia. Quer, antes de

tudo, purificar e elevar a alma indiana. Ainda que sua m entalidade esteja nu-

trida, em p arte, de cultura européia, o M ahatm a repudia a civilizaçao do O ci-

dente. Repugna-the seu m aterialismo, sua imp ureza, sua sensualidade. Com o

Ruskin e como Toistói, os quais leu e os quais ama, detesta a máquina. A

m áquina é para ele o sImbo lo da "satânica" civiiizaçao ocidental. N áo quer,

conseqüen temente, que o maqu inismo e sua influéncia se aclima tem na India.

Acredita que a máquina é o agente e o motor das idéias ocidentais e que a

psicologia hindustana nao é adequada a uma educaçao européia; mas ousa

esperar que a India, fechada em si mesm a, elabore urna m oral boa para o usodos demais povos. Indiano ate a medula, pensa que a India pode ditar ao

mu ndo sua p rópria disciplina. Sens fins e sua atividade - que almejam a con-

fraternizaçao de hinduIstas e ma om etanos on a redençao dos intocdveis, dos

párias - tern um a vasta transcendéncia poiltica e social. Mas sua inspiracâo é

essencialmen te religiosa.

Gandhi se classifica como urn "idealista prático". Henri B arbusse o considera,

ademais, urn verdadeiro revolucionário. Diz, em seguida, que "esse termo desig-na em nosso espirito a quem , tendo concebido, em oposicâo a ordem poiltica e

social estabelecida, uma ordem diferente, se consagra a realizacao desse piano

ideal por meios práticos". E agrega que " o utópico não é um verdadeiro revo-

lucionário, por m ais subversivas que sejam suas sem -razöes". A definicao é

excelente. Mas Barbusse cré também que, "Se Lenin tivesse se encontrado no iugar

de G andhi, teria falado e agido corno ele". Essa hipótese é arbitrária. L enin era

um realizador e urn realista, assim co mo indiscutiveimen te urn idealista práti-

co. Não está provado que a não-cooperacão e a não-violéncia sejam a ünica via

da em ancipacâo indiana. Tilak, o antigo lIder do nacionalism o indiano, não

rena desprezado o método insurrecional. Romain Rolland opina que Tilak,

cujo génio ena ltece, teria podido se entende r corn os revolucionários russos.

Tilak, não obstante, náo era rnenos asiático nem me nos indiano que G andhi.

M ais fundada que a hipótese de Barbusse é a hipótese oposta, a de que L enin

teria tentado aproveitar a guerra e suas conseqüé ncias para libertar a India e em

nenhum a circunstância deteria os indianos no caminho da insurreicâo. Gandhi,

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dorninado por seu tem perarnento m oralista, não sentiu a s vezes a mesma ne-

cessidade d e l iberdade que sentia seu po vo. Sua forca, entretanto, dependeu -

m ais do que apen as de seu discurso religioso - principalmente das possibilida-

des que esta oferecia para a resoluçao da escravidão e da forne dos indianos.

A teoria da não-cooperacâo continha m uitas ilusôes. Um a delas era a ilusão

m edieval de reviver na India uma econ ornia superada. A roca é impotente para

resolver a questao social de qualquer povo. 0 argurnento de Gand hi de que "a

India já viveu assim antes" é dem asiadam ente ingénuo e anti-histórico. P or

m ais cética e desconflada que seja sua atitude perante o Progresso, urn hom em

m oderno rejeita instintivam ente a idéia de que se possa vo ltar atrás. Um a vez

adquirida a rnáquina, é difIcil que a hurnanidade renuncie a em pregá-la. Nada

pode c onter a inflltracao da civilizacao oc idental na India. Tagore tern plena

razão nesse caso, durante sua polém ica corn Gandh i. "0 problerna de hoje é

rnundial . Nenhum povo pode buscar sua saüde separando-se dos outros. Ou

salvar-se juntos ou desaparecer juhtos."

As crIticas contra o materialism o ocidental são exageradas. 0 h om em d o

Oc idente nao é tao prosaico e torpe com o alguns espIritos conternplativos e

estáticos supôem. 0 socialisrno e o sindicalisrno, apesar de sua concepcão

m aterialista da história, são rnenos rnaterialistas do que p arecem . Apóiarn-sesobre o interesse da rnaioria, rnas tendem a enobrecer e dignificar a vida. Os

ocidentais são rnfsticos e religiosos a seu rnodo. P or acaso a emo ção revolucio-

nária não é uma erno cao religiosa? 0 fato é que no Ocidente a religiosidade Se

transferiu do céu a terra. Seus mo tivos são hurnanos, sociais, e nao divinos.

Pertencem a vida terrena e não a celeste.

A co ndenacao da violência é rnais rom ântica do que a própria violência. A

India não consegu irá forçar a burguesia inglesa a devolver-lhe sua liberdadesomente corn armas rnorais. Os honestos juIzes britânicos reconhecerão, quantas

vezes for necessário, a honradez dos apó stolos da não-cooperacão e do satyagraha;

m as ainda assim seguirão condenando -os a seis anos de prisão. A revoluçao

não se faz, infelizrnente, corn jejuns. Os revolucionários de todos o s cantos

tern de escoiher entre softer a violência e usa-la. Se não se qu er que o espirito e

a inteligencia estejam a s ordens da forca, é necessário colocar a forca a s ordens

da inteligéncia e do espirito.

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RABINDRANATH TAGORE  

Urn dos aspectos essenciais da personalidade do grande poeta indiano

Rabindranath Tago re é seu generoso internacionalism o. Internacionalismo de

poeta, nao de politico. A poesia deT agore ignora e condena o ódio; não conhe-

ce e exalta senão o amor. 0 sentirnento nacional, na obra de Tagore, não é

nunca um a negacão; é sempre um a afirm acao. Tagore pensa que todo o huma-

no e seu. Trabaiha para consub stanciar sua alm a na alma u niversal. Explore-

m os essa regiâo do p ensamento do poeta. Definamos sua po sicão perante o

Oc idente e perante Gandh i e sua doutrina.

A ob ra de Tago re contém v ários exemplos de sua filosofia polItica e moral.

Urn do s ma is interessantes e nitidos é seu roman ce A casa e o m undo. Além de

set urn grande romance humano, A casa e o mundo é urn grande romance

indiano. Os personag ens - o rajá Nikhil, sua esposa B imala e o ag itador na-

cionalista Sandip - se movem no ambiente do movimento nacionalista, do

movirnento swadeshi, com o se chama em lingua indiana e como já é designado

em todo o rnundo. As paixóes, as idéias, os homens, as vozes da polItica

gandhiana da não-cooperacão e da desobediéncia passiva passarn pelas cenasdo adm irável rom ance. 0 po eta bengali, pela boca de urn de seus personagens,

o do ce rajá Nikhil, polemiza corn os instigadores e apoiadores do m ovirnento

swadeshi. Nikhil pergunta a Sandip: "Como vocé pretende adorar a Deus

diando a o utras pátrias que são, exatamen te corno a sua, man ifestaçoes de

Deus?". Sandip respond e que "o ódio é urn cornplemen to do culto". Bim ala, a

mulher de Nikhil, sente-se como Sandip: "Eu gostaria de tratar meu pals

Publicado originalmente no livro La escena contempordnea, Lima, Minerva, 192 5.

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corno uma pessoa, chamá- o de mae, deusa, Durga; e par essa pessoa eu

averm eiharia a terra corn o sangue dos sacrifIcios. Eu sou hu m ana; nao sou

divina". Sandip exulta: "V eja, N ikhil, coma a verdade se faz cam e e sangue

no coracão de uma muiher A m uiher sabe set cruel: sua violéncia é semeihante

a de urna tempestade cega, terrIvel e bela. A vio ncia do hornem é feia

porque alirnenta em seu seio as vermes roedores da razão e do pensam ento.São nossas m uiheres que salvarão a pátria. Devemo s ser brutais sem vacilacão,

sem raciocInio".

o tom de Sand ip não e certamente, o torn de um verdadeiro gandhiano,

sobretudo quando, invocando a violéncia, recorda esses versos exaltados: "Vem ,

P ecado espléndido. Que teus rubros beijos vertam em n osso sangue a pilirpura

queimante de sua chama Ha de soar a trombeta do ma imperioso. E tecer

sobre vossas faces a grinalda da injustica exultante ".

Não é essa a linguagem de Gandhi; mas pode set a de seus discIpu os.

Rom ain Rolland, depois de ter estudado a doutrina swacleshi nos discIpulos de

Ga ndhi, exciam a: "T em Iveis discIpulos Quan to m ais puros, m ais funestos

Que Deu s preserve a urn grande homem desses am igos que não apreendem

senão uma parte de seu pensarnento Cod ificando-o, destroem sua harmonia".

o i ivro de R em ain Rolland sobre Gan dhi resume o diálogo politico entre

Rabindranath Tagore e a M ahatma. Tagore explica assim seu internacionalismo:

"Todas as glórias da hurnanidade são rninhas. A Infinita Personalidade do

Hom ern (como dizem as Upanishads nao pode set realizada senão num a gran-

diosa harmon ia de todas as racas hum anas. Minha pregacão é p ara que a India

represente a cooperacão de todos as povos do m undo. A U nidade é a Verdade.

A U nidade é aquilo que com preende tudo e, portanto, não pode set alcançada

pela via da negacão. 0 esforco atual para separar nosso espIrito do espIrito doOciden te é uma tentativa de suicIdio espiritual. A época atual esteve poderosa-

m ente possuIda pelo Ocidente. Isso s o foi possivel porque ao Ocidente foi

designada alguma grande m issão para a homem . Nós, os hom ens do Oriente,

temos aqui alga para nos instruir. E urn mai sem dOvida que, ha muito tempo,

não tenharnos estado em co ntato corn nossa própria cultura e que, em conse-

qüência disso, a cultura ocidental não esteja colocada no piano co rreto. M as

dizer que é ruim segu ir se relacionando corn eia significa alentar a pior form ade provincianismo , que não produz senão indigência intelectual. 0 problem a

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de hoje é m undial. Nenhum povo pode encontrar sua saiide separando-se dos

outros. Ou salvar-se juntos ou desaparecer juntos".

Rab indranath Tagore defend e a colaboracao entre o Oriente e o Ocidente,

reprova o boycot a s m ercadorias ocidentais e não espera urn resultado taum a-

türgico no retorno a roca. "Se as grandes m áquinas são urn perigo para o espi-rito do Ocidente, não seriarn as pequenas máquinas urn perigo major para

nos?" N essas opinióes, Rabindranath Tag ore, não obstante seu p rofundo idea-

l ism o, mo stra-se na verdade m ais real ista que G andhi. A India, de fato, não

pode reconquistar sua liberdade isolando-se misticamente da ciéncia e das

m áquinas ocidentais. A experiéncia politica da não-cooperação foi adversa a s

previsóes de Gandhi. M as Rabindranath Tagore parece extraviar-se na abstra-ção quando critica Gan dhi por sua atividade de chefe po litico. Teria origem

essa critica na convicção de que Gan dhi possui urn temp erarnento de reforrnador

religioso e não de chefe p olitico, ou seria um simp les desdérn ético e estético

pela politica? N o prirneiro caso,Tagore terá razão. Em rneu estudo sobre G andhi

tive a ocasião de sustentar a tese de que a obra do Mahatma, rnais do que

politica, é moral e religiosa, enquanto sua forca não dependeu tanto de suapregacão religiosa quanto do fato de que esta ofereceu aos indianos um a solu-

c an para sua escravidão e para sua fome o u, rnelhor dizendo, apoiou-se em urn

interesse politico e econôm ico.

M as provavelmente Tagore Se inspira somente em consideraç6es de poeta e

de filósofo. Tagore sente meno s ainda que Gan dhi o problema p olitico e social

da India. 0 mesmo Swarajhom e rule) não Ihe preocupa d ernasiadam ente.

Um a revoluçao polItica e social não ihe apaixona. Tagore não é urn realizador:

é urn poe ta e urn ideólogo. Ga ndhi, nessa questão, acusa um a intuicao rnais

profunda da verdade. E a guerra", diz. "Que o poeta deponha sua lira Canta-

rei depois." N essa passagern de sua p olémica corn Tagore, a voz do M ahatma

tern um torn profético: "0 poeta vive para o am anhã e queria que nós fizésse-

m os o mesm o... E preciso tecer Que cada urn teca QueT agore teca com o asdernais Que queime suas roupas estrangeiras E o dever de hoje. Deus se ocu-

pará do arnanhã. Com o diz a Gita: Cum pra a ação justa ". Tagore na verdade

parece urn pouco ausente da alma de seu povo. Não sente seu drama. Não

com partilha sua paixão e sua violéncia. Esse hom ern tern um a grande sensibi-

l idade intelectual e m oral; m as, neto de urn principe, herdou um a nocão urn

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pouco palaciana e aristocrática da vida. Conserva dem asiadamente arraigado,

em sua cam e e em sua alma , o sentirnento de hierarquia. P ara sentir e corn-

preender plenarnente a revoluçao indiana e o m ovirnento swadeshi, falta-ihe

estar urn pouco m ais perto do p ovo, urn pouco mais perto da história.

Tagore não olha a civilizaçao ocidental corn a mesma ojeriza, corn a mesma

raiva que o Maha tma. Não a qualifica, corno o Maha tma, de "satânica". M aspressente seu firn e denun cia seus pecados. Pen sa que a Europa está rolda por

seu m aterialismo. Repud ia o home rn da cidade. A hipertrofia urbana ihe pare-

ce urn dos ag entes ou urn dos signos da decadéncia ocidental. As B abilônias

m odernas na o ihe atraern; entristecern-no. Ele as julga espiritualrnente estéreis.

Ama a vida do carnpo que mantém o homern ern contato corn "a natureza

fonte da vida". Nota-se aqui que, no fundo, Tagore é urn hornern de go stos

patriarcais rurais. Sua impressáo da crise capitalista, irnpregnada de sua ética e

de sua metafIsica, e não ob stante, penetrante e concreta. A riqueza oc idental,

segundo Tago re, é urna riquezavoraz. Os ricos do O cidente desviarn a riqueza

de seus fins sociais. Sua cobica e seu luxo violam os limites rnorais do uso dos

bens que adrninistrarn. 0 esp etáculo dos prazeres dos ricos engend ra o ódio de

classes. 0 am or ao dinheiro faz que o Ocidente se perca. Tagore tern, em sum a,

urn c onceito patriarcal e aristocrático da riqueza.

Em R abindranath Tagore, o poeta certam ente supera o pensador. Tagore é,

antes de tudo e sobretudo, urn grande poeta, urn artista genial. Em nenhu m

livro conternporâneo ha tanto perfume poético e tanta profundidade ifrica

como em Gitangali. A poesia de Gitangali é suave, simples, campo nesa. E,

com o diz André Gide, tern o m érito de nâo ter sido engravidada por nenhum a

rnitologia. Em A lua nova e em 0jardineiro se encontram a mesm a pureza, a

mesrna simplicidade, a mesrna graça divina. Poesia profundamente lIrica. Sern-pre voz do homem. Nunca voz da rnultidáo. E, não obstante, perenernente

grávida, eternam ente cheia de emoção cósm ica.

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ALVARO OBREGON

0 general Ob regón, assassinado dezessete dias dep ois de set elei to p resi-

dente do Mexico, liderou a Revolucao Mexicana num de seus perlodos de

m ajor atividade realizadora. Tjnha porte, tempera e dons de chefe, caracteris-

t icas que ihe permitirarn presidir urn governo que, corn urn am plo consenso

da op iniâo pC iblica, liquidou u rna etpa de turbuléncias e contradicoes, quan-

do o processo revo ucionário mexicano conc retizou seu sentido e coordenou

suas energias. 0 g overno de O bregón representou urn movirnento de concen-

tracão das rnelhores forcas revolucioná rias do Mex ico. Ele iniciou urn periodode realizacao £irrne e sagaz dos principios revolucionários, apoiado no partido

agrarista, nos sindicatos operários e nos intelectuais renovadores. Sob seu go -

verno, entrararn em vigor as novas no rrnas constitucionais contidas na Carta

de 19 17. A reform a agrária - identificada por Obregon co rno o principal ob-

jetivo do m ovirnento popular - com ecou a traduzir-se em atos. A c lasse traba-

ihadora consolidou suas posicoes e acrescentou revolucao seu poder politico

e social , enquanto a ação educacional, dirigida e anirnada por u rn dos m ais

erninentes homens da Am erica, José Vasconcelos deu urna aplicacao p rática,

fecunda e criativa aos esforcos do s intelectuais e artistas.

A p olitica governarnental de Ob regón consegu iu esses resultados por ace r-

tar em associar a seus objetivos a rnaior som a de elemen tos para a reconstru-

çâo. Seu éxito se deveu virtude taurnathrgica do cau dilho: ele fortaleceu o

Estado surgido da revo luçao, definindo e assegurand o sua solidariedade corn

Pu blicado originalmente corn o tItulo "Obregón y la Revolucion M exicana" em

Variedades, L ima, 21 de julho de 1928 .

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as ma is extensas e ativas carnadas sociais. 0 Estado se proclamou e se conside-

rou órgão do povo, de modo que seu destino e sua gestao deixavam de depen -

der do prestIgio pessoal de urn caudilho P ara vincular-se estreitamen te aos

interesses e sentim entos das m assas. A estabilidade de seu g overno se assentou

num a am pla base popular. Obregon não governava em norne de urn partido,m as sirn de urna con centracão revolucionária, cujas diversas reivindicaçoes

constitularn urn program a. Era essa aptidão para un ificar e disciplinar as for-

ças revolucionárias que indicava, precisamente, suas qualidades de lIder e

de condu tor.

A força pessoal de Obregón tinha origern em sua história de general da

revolucao, em g rande parte por sua atuação militar, admirada pela populacãoprincipalme nte pela contribuiçao que havia significado a sua causa. A foiha de

serviços do general O bregón tinha valor para o povo por ser a de urn g eneral

revolucionário que, ao se orgulhar de seus 80 0 quilôrnetros de camp anha, evo-

cava o penoso processo de um a epclpéia m ultitudinária.

Obregdn era, ate pouco temp o atrás, o hom em qu e mais m erecia a confian-

ça das m assas. Para os po vos corno os d a A m erica, que nao progredirarn poli-ticarnente o bastante Para que seu s interesses se traduzissem clararnente em

partidos e program as, esse fator pessoal ainda jOga urn papel decisivo. A R evo-

lucão M exicana, adem ais, atacada de fora por seus inim igos histdricos, sabo-

tada de den tro por suas próprias excrescências, acredita ainda n ecessitar a sua

cabeca d e urn chefe m ilitar, com autoridade suficiente P ara m anter nos lirnites

as tentativas arm adas dos reacionários. Ela presenciou m uitas deserçoes, causa-das pela intriga dos reacionários, que astutamen te influenciavam as arnbicóes

pessOais e egoIstas de hom ens inseguros, situados acidentalmente no cam po

revolucionário por urn capricho do acaso. Houve o caso de Adolfo de la

H uerta - dando a m ao aos reacionários, depois de haver participado do rnovi-

rnento contra Carranza e ter ocupa do prov isoriarnente o pod er -, seguido de

perto pelos generais Serrano e Górnez.Por isso, ao aproximar-se o término do m andato de Calles, a maioria dos ele-

m entos revolucionários designou o general Obregón para a sucessâo a Presidén-

cia. Isso podia dar a mu itos a imp ressão de que se estabelecia um a guinada

antipática no p oder. As cand idaturas Serrano e Górnez - tragicam ente liquidadas

ha alguns m eses - se aproveitaram P ara resistir a essa possibilidade. Mas a f6rm u-

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la Obregon - para quern exam inasse objetivam ente os fatores atuais da poiltica

m exicana - aparecia ditada por m otivos concretos, em defesa da revolucao.

Obregón nao era, certarnente, urn ideologo, mas seu forte braco de soldado

da R evoluçao po dia apoiar-se no trabaiho de definiçao e experirnentação de

um a nova ideologia. A reação o ternia e o odiava, adulando-o e m uitas vezesacreditando que fosse m ais m oderado que Calles. O bregón era sem düvida

m oderado e prudente, mas não p recisarnente no sentido qu e a reação suspeita-

va. Sua moderacao e prudéncia, ate o ponto em que foram usadas, haviam

servido a afirmaçao das reivindicaçóes revolucionárias e a estabilizacao do p0

der pop ular.

A m orte engrandece sua figura na história da R evolucao Mexicana. Quemsabe se seu segundo governo não tivesse conseguido set tao bem-sucedido com o

O primeiro... 0 poder a s vezes envaidece os hornens e emb ota seus instintos e

sensibilidade poilticas.

Esse efei to é com urn entre os hom ens de um a revoluçao que carecem de

um a forte disciplina ideológica. A figura de Obregón se salvou desse perigo.

Assassinado por urn fanático, de cujas cinco balas foi descarregado o ódio detodos os reacionários do M exico, Obregón con clui suavida, heróica e revolucio-

nariam ente, e fica definitivarnen te incorporado a epopéia de seu povo, corn os

m esmos timbres de M adero, Zapata e Carrillo. Sua acâo e vida pertencerarn a

um a época de violencia. Não ihe foi dada, por isso, a oportunidade de terrni-

nar seus dias serenam ente. M orreu corno m orreram m uitos de seus tenentes e

quase todos os seus soldados. Pertencia a veiha guarda de uma geracão educadano rigor da guerra civil, que havia aprendido m ais a morrer do que a viver e

havia feito instintivam ente sua um a idéia que se apodera corn facilidade dos

espIritos nesta época revolucionária: "viva perigosamen te".

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COLI:CCION CI..JLIDM

C::AI L

-

Cape da primeira edicao de La tragedia del Altiplano

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TRISTAN MAROF

Urn D om Quixote da poiltica e da literatura americanas, Tristan M arof, ouGustavo N avarro, como preferirem, depois de repousar de sua ültima aventura

em A requipa, esteve em L ima por algumas horas, de passagern Para Havana.

Aonde teria eu visto antes seu perfil sernita e sua ba rba escura? Em nenhu m

lugar, porque a barba escura de Tristan Ma rof é urn improviso recente. Tristan

M arofnáo usava barba antes. Essa barba varoni , que parece tao antiga em sua

cara mIstica e irônica, é completarnente nova: ajudou-o a escapar de seu

confinamento e a asilar-se no P eru; forrnou parte de seu disfarce; e, agora,parece pedir que a d eixem ficar onde está. urna barba espontânea, que náo

obedece a nenhurna razão sentimental nern estética, que tern sua origem nurna

necessidade e utilidade e que, por isso mesm o, ostenta uma trernenda vontade

de viver, resultando num aspecto tao arquitetônico e decorativo.

A literatura de Tristan Marof - El ingenuo continente americano, Suetonio

Pimienta, La justicia del inca etc. - é come, sua barba. Não é urna literatura

premeditada, do literato que b usca fama e dinheiro corn seus livros. possIvelque Tristan M arofocupe m ais tarde urn lugar eminente na história da literatu-

ra da Indo-A mérica, rnas isso ocorrerá sern que ele o b usque. Faz literatura

pelos mesm os rnotivos que faz p oiltica; e é o rnenos literate, possIvel. Tern ihe

sobrado talento para escrever volumes esmerados; mas tern dernasiada arnbi-

cáo P ara contentar-se corn urna gloria pequena e anacrOnica. Hom ern de uma

época vitalista, ativista, romântica e revolucionária - corn sensibilidade de cau-

Publicado originalmente corn o tItulo "La aventura de Tristan Marof" em Var i eda-d e s , Lima, 3 de marco de 1928 .

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dilho e de profeta -, Tristan nâo podia con siderar digno dele o destino de uma

literatura h istórica. Cada livro seu é urn doc urnento de sua vida, de seu tempo.

Doc umento vivo; e, rnais do que urn docum ento, urn ato. N ão é urna literatu-

ra bonita, nem cu idada, rnas sim vital, econôrnica, pragmática. Com o a barbade Tristan Marof, essa literatura se identifica corn sua vida e corn sua história.

Suetonio Pimienta é urna sátira contra o tipo de diplomata rastaquera e

improvisado que tao liberalmente produz a America do Sul e Central, diplo-

mata de origem eleitoral ou "revolucionário" na a cepcáo sul-americana do vo-

cábulo. La justicia del inca é urn livro de propaganda soc ialista P ara o povo

boliviano. Tristan Marof sentiu o dram a de seu povo e o fez seu. Pod ia t6-lo

ignorado, na sensual e burocrática comodidade de urn posto diplornático ouconsular. Mas T ristan M arofé da estirpe romântica e donquixotesca que, corn

alegria e paixão, se ye predestinada a c riar urn mundo nov o.

Como Waldo Frank - corno tantos outros americanos entre os quais me

incluo -, na Europa descobriu a America. E renunciou ao salário de diplornata

P ara trabalhar durarnente na obra ilurninada e profética de a nunciar e realizar

o destino do continente. A polIcia de sua pátria - capitaneada por urn intendente

fugido prematurarnente de urn possIvel romanc e de Tristan M arof— o conde-nou ao confinamento num rincão Perdido das montanhas bolivianas. Mas

assim co rno nâo se confina jarnais urna idéia, nâo se confina tarnpouco u rn

espIrito expansivo e incoercIvel corno o de Tristan Marof. A po lIcia pacenha

poderia ter encerrado a Tristan M arof nurn baü corn chav e dupla. Com o urn

faquir, Tristan M arof teria desaparecido do bad , sem violentá-lo nern quebrá-

lo, Para reaparecer na fronteira, corn uma barba rnuito negra na face pálida. Na

fuga, Tristan Marof teria sempre deixado crescer sua barba.P ode set que interesse a alguns o literato; a mirn interessa mais o ho mern.

Ele tern a figura de prócer, aquilina e séria, dos hornens que nascern rnais P ara

fazer a história do que P ara escrevé-la. Eu nunca o h avia visto antes; mas ja o

havia encontrado muitas vezes, em M ilão, P aris, Berlirn, Viena, Praga ou em

qualquer das cidades ond e, nurn café ou nurn cornIcio, tropecei corn hom ens

em cujos olhos se podia ver a mais ampla e arnbiciosa esperanca. Lenines,

Trotskys, Mussolinis de arnanhã. Com o todos eles, Ma rof a s vezes tern urn atjovial e grave. E urn Dorn Quixote de agudo perfil profético. E urn desses

homens perante os quais não cabe a ninguérn a di'tvida de que dará o q ue falar

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na posteridade. Olha a vida corn uma alegre confiança, corn urna robusta

seguranca de conquistador. A seu lado ihe acompanha sua forte e bela mu lher,

urna Dulcinéia, muito hurnana e moderna, corn olhos de boneca inglesa

e porte de valquIria.Falta a este artigo urna citacao de urn livro de M arof. Tirá-la-ei de Lajusticia

del inca. Escolherei estas linhas, que fazern justica surnária a Alcides Arguedas:

"Escritor pessimista, tao órfão de observacao econôm ica como obcecado ern

sua arnarga crItica ao povo boliviano, Arguedas tern todas as enfermidades que

cataloga ern seu livro: sern brilho, sern emocão exterior, tImido ate a prudên-

cia, rnudo no P arlamento, grande elogiador do genera M ontes... Seus livros

tern a tristeza do altiplano. Sua ma nia é a decéncia. A sornbra que não ihe deixadormir: a plebe. Quando escreve que o povo boliviano e s t á d oe n te , eu não vejo

a doenca. De que está enfermo? Viri , heróico, de grande passado, a iinica

doença que o carcome é a pob reza".

Esse é T ristan Ma rof. E essas são m inhas boas-vindas e rneu adeus a esse

cavaleiro andante da Arnérica do Su .

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JOSE INGENIEftOS 1

Nossa Am erica perdeu urn de seus rnaiores mestres. José Ingenieros era noContinente urn dos principais representantes da Inteligéncia e do Espirito.

Nele os jovens encontravarn, ao mesrno tempo, urn exemplo intelectual e mo-

ral. Ingenieros soube set, além de urn hom ern de ciéncia, urn homem de-.eu

tempo. N ão se contentou em set urn ilustre catedrático; quis set urn mestre.

Isso é o que torna sua L igura ainda rnais respeitável e admirável.

A ciéncia e as letras ainda estão, no mundo inteiro, dernasiadarnente domes-

ticadas pelo poder. 0 sábio e o p rofessor mostrarn, gerairnente, e sobretudo naveihice, urna alma burocrática. As ho nras, os tItulos e as m edaihas os conver-

tern ern hurnildes funcionários da ordern estabelecida. Ou tros secretamente

repudiarn e desdenharn suas instituicôes; mas, em p üblico, aceitam sern pro-

testar a servidão qu e se ihes imp öe. A ciência, corno semp re, tern urn valor

revolucionário; rnas os homens de cincia não. Como hornens, como mdi-

vIduos, se conforrnam em a dquirir urn valor acadérnico. Parece que em seu

trabaiho cientIfico esgotarn sua energia. Não Ihes sob ra ja aptidão para con-ceber ou sentir a necessidade de outras renovaçôes, estranhas a seu estudo

e a sua disciplina. 0 desejo de cornodidade, em todo caso, atua de urn m odo

demasiadarnente enérgico sobre sua consciéncia. E assirn se dá no caso de urn

sábio do nIvel de Ramón y C ajal, que fala ern norne dos cortesãos de urna

rnonarquia decrépita. Ou no de M iguel Turró, que se incorporou ao séquito

do general libertino, que ha dois anos desempenha na Espanha o papel

de d itador.

Publicado originalmente em Varied ad es , Lima, 7 de novembro de 1925 .

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José Ingenieros pertencia a mais pura categoria de intelectuais livres. Era urn

intelectual consciente da função revolucionária do pensamento e, sobretudo, urn

hornem sensIvel a ernoção de sua época . Pa ra Ingenieros, a ciéncia não era

tudo. A ciéncia, Para ele, tinha a rnissâo e o dever de servir ao progresso social.Ingenieros não se entregava a polItica. Continuava sendo urn hornern de es-

tudos, de cátedra. Mas não via a po lItica corno conflito de idéias e de interesses

sociais, nern tinha p or ela o desdérn absurdo que sentern ou simulam outros

intelectuais, demasiadarnente tImidos P ara assumir a responsabilidade de uma

fé e rnesrno de urna opinião. Ern sua Revista cle Filosoji'a - que ocupa o primeiro

lugar entre as revistas de sua classe na Ibero-Arnérica - reservou urn luga r espe-

cial ao estudo dos fatos e da s idéias da crise poiltica co nternporânea e, par-ticularrnente, explicacao do fenôm eno revolucionário.

A rnaior prova da sensibilidade e da penetracão históricas de Ingenieros me

parece set sua atitude perante o pós-guerra. Ingenieros percebeu que a guerra

abria uma c rise que não se podia resolver corn veihas receitas. Cornpreendeu

que a reconstrucão social não podia set obra da b urguesia, rnas sirn do p roleta-

riado. Nurn instante em que egrégios e robustos hom ens de ciéncia nao conse-

guiam senâo balbuciar seu medo e sua incerteza, José Ingenieros acertou ao vere falar claro. Seu livro Los nuevos tiempos é urn documen to que honra a inteli-

géncia ibero-americana.

N a Revoluça o Russa, o olhar sag az de Ingenieros viu, desde o prirneiro

mom ento, o princIpio de uma transforrnaçao mundial. Po ucas revistas de cul-

tura revelararn urn interesse tao inteligente pelo processo da Revolucao Russa

corno a revista de José Ingenieros e Anibal Ponce. 0 estudo de Ingenieros

sobre a obra de Lunatcharsky no Com issariado de Educaçao P üblica dos sovietesflea come, urn dos prirneiros e rnais elevados estudo s da ciéncia oc idental a

respeito do valor e do sentido dessa obra.

Essa a titude mental de Ingenieros correspondia ao estado de ânirno da nova

geracão. Ele se apresenta, portanto, corno urn rnestre corn capacidade e ardor

para sentir corn a juventude, que, corno diz Ortega y G asset, se raras vezes tern

razão no que neg a, semp re tern razão no que a flrrna. Ingenieros transformou

em raciocInio o que na juventude era urn sentirnento. Seu juIzo aclarou a cons-ciéncia dos jovens, oferecendo urna sólida base P ara sua v ontade e para seu

desejo de renovacão.

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A form acao intelectual e espiritual de Ingenieros correspondia a uma épo ca

que os novos tempos vinham, precisamente, a contradizer e retificar seus

conceitos mais fundamentais. Ingenieros, no fundo, permanecia demasiada-

men te Liel ao racionalismo e ao criticismo dessa ép oca de plenitude da orderndemo-liberal. Esse racionalismo e criticismo conduzem geralmente ao ceticis-

são adversos ao pathos da revo ucão.

M as Ingenieros com preendeu, scm düvida, seu ocaso. Deu-se conta, segu-

ramente, de que nele enveihecia uma cultura. Mesmo assim, não desalentou

nunca o impulso nem a fé dos jovens - chamados a criar uma nova cultura -

com reflexóes céticas. Pelo contrário, os estimulou e fortaleceu sempre corn

palavras enérgicas. Como verdadeiro mestre, como altIssimo guia, pode ser

apresentado e def'inido por estes conceitos: Entusiasta e ousada ha de set a

juventude: sem entusiasmo de nada servem ideais bonitos, scm ousadia nao se

realizam atos honrosos. Urn jovem sem entusiasmo é um cadaver que anda;

está morto em vida, para si mésm o e para a sociedade. P or isso urn entusiasta,

exposto a equivoc ar-se, é preferIvel a urn indeciso que nao se equivoca n unca.

o primeiro pode acertar; o segundo não pode faz6-lo jamais. A juventude

termina quando se apaga o entusiasmo... A inércia perante a vida é covardia.

Não basta na vida pensar num ideal; é necessário aplicar todo esforco em sua

realizacao... 0 pensamento vale pela acão social que permite desenvolver .

Em tomb de José Ingenieros e de seu ideário se constituiu na Repüblica

A rgentina o grupo Renov ación, que pub lica o "boletin de ideas, libros y revis-

tas com esse nome, dirigido por Gabriel S. Moreau, e que serve de órgão

atualmente a União Latino-americana. Dc forma geral, o pensamento de

Ingenieros teve uma poderosa e extensa irradiacao em toda a nova geração

hispano-americana. A União L atino-americana, presidida por A lfredo P alacios,

surgiu, em grande medida, como uma concepcão de Ingenieros.

Não recordemos melancolicamente a bibliografla do escritor que morreu,

para lhe tecer uma coroa com os tItulos de seus livros. Deixemos isso para as

notas necrológicas feitas por aqueles que acham que o valor de Ingenieros se

encontra apenas em seus volumes. M ais do que os livros, importa o significado

e o espIrito do mestre.

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OL1VERI() (;IJox1.x.)l9l)

S 9146 Vd. *1&G quo sic

teDgo: an bi0gr1B couSpacta y

precipitada. 3a quo no -Yca-

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deshijvauada 7 lOutS. Atrlb 1y Q

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.menos rorzanne a rscOuoce

quo *07 0.11 Zi*tnbt* ISIS hat*

Tf* *

=ubtsa: Velnte poCmu pars er ieldoe on ol ir*iil& (1924)

Cakecnenlu (12).

Caricatura apresentada na ExposiciOn de la Actual Poesla Argentina 1922-1927).

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sobre P roust: "A s frases e idéias de P roust se desenvolvem e se enroscam com o

enguias que nadam em aquariUs; a s vezes deformadas por urn efeito de refra-

cáo, outras unidas em acoplam entos viscosos, sempre envoltas nesta atmosfera

que tão-somente se encontra nos aquários e em suas obras".0 ofIcio das escolas de vanguarda - dessas escolas que nascem como cog u-

melos - é nega tivo e dissolvente. Elas tern a funcao de dissociar e destruir todas

as idéias e sentirnentos da arte burguesa. Em vez de busc ar a Deus, buscam o

átorno. Não nos conduzern a unidade; desviam -nos por m il rotas diferentes,

desesperada mente individualistas, nurn dédalo finito e zombeteiro. Seus áci-

dos corroem os m itos amigos. 0 frenesi corn que zombam de todas as solenes

alegorias retóricas é o que a s escolas ultram odernas tern de revolucionário:nada do mundo burguês ihes parece respeitável. Difarnam e desagregam a eter-

nidade burguesa corn ironias sutis, limpando a superfIcie do Novecentos de

todas as fezes, clássicas ou românticas, dos séculos mortos. Quando se livrarern

de Judas, corn todos us remendos , e de todas as rnetáforas da literatura burgue-

sa, a arte e o mund o recuperarao sua inocéncia.

Já comecaram a recuperá-la na Rdssia. 0 poeta da revolucao, Vladimir

Maiakovski, fliho do futurismo, fala aos hornens numa linguagem trágica.Guillermo de la Torre se dá c onta, em sua apologia das literaturas européias de

vanguarda, de que "vozes de urn sotaque puro, nobre e dramático se sobressaem

entre o coro dos demais poetas da Europa com o algo irônico e hum orIstico".

A v oz de O liverio Girondo pertence a esse coro? Náo sei por que insisto em

minha convicção de q ue Girondo é de outra estirpe. P enso que a sátira náo é

senão uma estacao de seu itinerário, urn episódio de seu romance. P or agora, o

melhor é nao levar a sério essas coisas.Seus V eintep oemas para se r le lcios en e l tran v ia e suas Calcomanias podem set

desprezado s pela crItica asm ática e pedante. A pesar disso, Girondo é urn dos

valores mais interessantes da poesia da Am erica hispânica. Entre urna aria sen-

timental do velho parnasiano e um a "gritaria" acérrima e estridente, O liverio

Girondo p elo menos nos oferece urna visao verdadeira da realidade. Vejamos

aqui uma cena da procissão de Sevilha: "Os cavalos - corn a boca ensaboada,

como se fossem se barbear - tém as ancas lustrosas, que as mu lheres aprovei-tam P ara ajeitar a mantilha e averiguar, sem virar-se, quem lanca urn olhar a

seus quadris".

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P ara alguns essa poesia tern o grave defeito de não set poesia. Mas essa é

apenas um a questão de gosto. A poesia, matéria preciosa, nâo está presente no

quartzo poético senão em mInimas proporcôes. 0 que m udou nao foi a poesia,

mas sirn sua cristalizacao. 0 elernento poético se mescia, na obra dos p oetascontemp orâneos, a ingredientes novos, entre os quais, por exemplo, o hum or.

Os que estão habituados a degustar a poesia somente nos moihos teóricos

clássicos não podem digerir os poemas de G irondo. E ficam indignados qua n-

do a crItica moderna o classifica como urn poeta profundo e auténtico. Se nos

remetermos aos hesitantes "noturnos" de G irondo, encontraremos emoçó es

poéticas como as seguintes: "Hora em que os m óveis veihos aproveitam P ara

livrar-se das mentiras e em qu e os encana mentos dão g ritos estrangulados,como se asfixiassem dentro das P aredes".

A s vezes se p ensa, ao ligar a chave da eletricidade, no espanto que sentirão

as sombras e na v ontade que ternos de avisá- as, para que tenham tempo de

encoiher-se nos cantos. E a s vezes as cruzes dos postes te1efnicos, sobre os

terraços, tern algo d e sinistro e temo s vontade d e nos esgu eirar junto a s p a r e -

des, como urn gato ou com o urn Jadrão."

De m inha parte, troco de born grado esse resumo, esses comprimidos - que,em rneus mo men tos de excursáo pelos novos caminhos da literatura, conten-

to-me em corner como se fossem bom bons -, por todo o épico barroco tropi-

cal e pela m ediocre e liquefeita Utica que a inda prosperarn em nossa A merica.

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José Carlos MariátegUi em Lima, 1918.

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Nota autobiografica

A inda que eu seja urn escritor rnuito pouco autob iográfico, ihe darei algu-mas informacoes breves. Nasci em 9 5 1 Aos 1 4 anos cornecei come, ajudante

nurn jornal. Ate 1 9 1 9 trabalhei no jornalismo, primeiro no La Prensa, depois

no El Tiemp o e, L inalmente, no La R azón. Neste ijitimo jornal patrocinarnos a

reforma un iversitária. A p artir de 1 9 1 8 , nauseado corn a poiltica criolla, voltei-

me resolutamente ao socialismo, rornpendo corn rninhas primeiras experién-

cias de literato contaminado de decadentismo e bizantinisrno finisseculares,

em pleno apogeu. Do final de 1 9 1 9 a rneados de 1 9 2 3 , viajei pela Europa.

Residi mais de dois anos na Itália, onde me casei corn uma muiher e algumas

idéias. Andei por Franca, Alemanha, Austria e outros palses. Minha rnulher e

rneu fliho me impediram de chegar a Rdssia. Da Europa, pus-me de acordo

corn alguns peruanos para a ação socialista. Meus artigos dessa época mostrarn

essas etapas de minha orientacao socialista. Depois de meu retorno ao Peru,

em 1 9 2 3 , em reportagens, conferéncias na Federacao dos Estudantes, na Uni-

versidade P opular, em artigos e etc., expliquei a situacao européia e iniciei rneutrabalho de investigacao da realidade nacional, de acordo corn o método m ar-

xista. Em 1 9 2 4 estive, como já ihe contei, a ponto de perder a vida. Perdi um a

perna e fiquei m uito fragilizado. Já teria, segurame nte, me curado de tudo isso,

se levasse uma vida tranquila. Mas nem minha pobreza nem minha inquieta-

cáo espiritual o permitem. Náo publiquei mais livros além daquele que vocé

conhece. Tenho prontos dois e outros dois em projeto. Esta é a minha vida em

I Apesa r de Mariátegui acreditar ter nascido em 1 89 5, já está mais do que comprova-do que dc, em realidade, nasceu em 18 94 .

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poucas palavras. Não creio que vaiha a pena torná-la püblica; mas não p0550

the recusar os dados clue vocé m e pede. la me esquecendo: sou autodidata.

Matriculei-me uma vez em letras, em Lima, mas corn o ünico interesse de

seguir o curso de latim de urn erudito ag ostiniano 2 . E na Europa frequenteialguns cursos livremen te, sem nunca, contudo, perder meu c aráter extra-uni-

versitário e talvez ate mesm o antiuniversitário. Em 1 92 5 a Federaçao de Estu-

dantes propôs meu norne Universidade como catedrático na matéria de minha

competéncia; mas a ma vontade do reitor e, seguramente, meu estado de saüde

frustraram essa iniciativa. 3

2 Tratava-se do espanhol Pedro Martinez Vélez.

Carta corn data de 10 de janeiro de 1927, enviada por José Carlos Mariátegui aoescritor Enrique Espinoza (Samuel Glusberg), diretor da revista La Vida Li terd r ia,

editada em Buenos Aires. A carta foi publicada no nñmero de maio de 1930, em

homenagem a Mariategui, que havia morrido recentemente.

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Cronologia resumida de José Carlos Mariátegui

1 8 9 4 o dia 14 de junho, em M oquegua, nasce José C arlos Mariátegui, f liho deMaria Am alia L a C hita Ballejos ( 1 8 6 0 - 1 9 4 6 ) e Javier Francisco M ariátegui yRequejo (1849-1907). 0 pal, em seguida, Ira abandonar a farnIlia.

1 8 9 9 ariátegui, a mae e os irrnãos Guilhermina e Julio César vão viver em Huacho.

1 9 0 1 ariátegui ingressa na escola.

1 9 0 2 ecebe urn golpe nojoelho da perna esquerda. E levado para L ima e inter-nado na M aison de Same. Terá que se tratar por quatro meses e será obrigadoa largar os estudos. Flea coxo da perna esq uerda.

1 9 0 7 erde o pai.

1 9 0 9 omeça a trabaihar com o entregador, ajudante e linotipista do jorna La Prensa,

de Lima.

1 9 1 1 ublica o p rirneiro artigo no jornal La Prensa. Com eça a utilizar o pseudôni-mo de Juan C roniquer.

1 9 1 4 ublica artigos na revista Mundo Limeño.

1 9 1 5 ontinua publicando artigos nas revistas El Turf e Lulü. Escreve, juntarnentecorn Julio Baudoin, a peca teatral Las tapadas.

1 9 1 6 ublica artigos na revista Coldnida. Torna-se redator-chefe e cronista politicodo jornal El Tiempo. E nomea do co-diretor da revista El Turf. Escreve a pecaLa mariscala, urn "poerna drarnático en seis jornadas y un verso", corn A brahamValdelomar.

1 9 1 7 anha urn concurso literário promovido pela rnunicipalidade de Lim a corna crônica " L a procesión tradicional". Pa rticipou, junto corn outros jornalis-tas, do "escândalo" da bailarina N orka Rouskaya. P ublica o jornal La Noche.Começa a estudar latim na Universidade Católica, mesmo tendo sido sempre

autodidata e não ter nenhum a formaçao ac adémica. Eleito vice-presidente doCIrculo de Jornalistas.

1 9 1 8 enuncia ao pseudonimo de Juan C roniquer. Funda, corn César Falcon ( 1 89 1 -

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19 70) e Felix del Val le (18 93 -195 0), a revista N u e s t ra E p o c a , sobre temaspoliticos. Ajuda a criar o Comité de Propaganda e Organizacao Socialista, doqual ma is tarde se afasta. P rirneiro encontro corn Haya de la To rre.

1919 ublica a jamal La Ra zón. Em 8 de outubro, vai viver na Europa. Fica qua-

renta dias em P aris. Ch ega em dezem bro em G énova, Itália.

19 20 A partir de janeiro, começa a viver em Roma . Viaja naquele mesmo ano P araFlorenca, Génova e Veneza. Conhece Anna Chiappe, de 17 anos. Começa aenviar artigos novamente Para El Tiempo.

1921 asa-se corn Anna Ch iappe. Passa a lua-de-mel em Frascati. Nasce em 5 dedezemb ro a fllho Sandro. Assiste corno jornalista ao XV II Congresso N acio-nal do Partido Socialista Italiano em Livorno. Viaja a Milão, Turim e Pisa.

19 22 Retorna a Génova para participar corno jornalista da C onferéncia EconômicaInternacional. Juntarnente corn Césa r Falcon, Carlos Roe e P almiro Mach iavello,funda a prirneira célula "com unista" peruana. Vai corn a esposa e a filho a M uni-que, Alema nha. Entre junho e julho segue para P aris. Viaja de barco pelo rioDanObio e passa por Viena e Budapeste. Tambérn vai a Praga, Tchecoslovaquia.

1923 m fevereiro, retorna ao Peru no navio alemão Neg ada, corn a esposa Anna eo filho. Começa a dar palestras nas Universidades P opulates G onzalez P rada.Também começa a colaborar com as revistas V a r ie da de s e Clariclad (desta 61-

tirna será diretor).1924 m janeiro é preso durante uma reunião dos editores da revista Claridadcorn

alunos e professores univ ersitários. Sua satide piora. Tern a Perna direita arnpu-tada. Continua escrevendo para a imprensa peruana.

1 9 2 5 unda, com a irmão Julio César, a Editorial Librerla-Imprenta Minerva. Co-

meça a escrever Para a revista Munclial. P ublica a livro La escena contempordnea.

1926 omeça a publicar a revista Amauta.

1 92 7 N o começo daquele ano, envolve-se nurna polémica corn L uis Alberta Sanchez

sobre a indigenismo.

1928 omeça sua polbm ica com H aya de la Torre. P ublica a livro Sete en sa i os de

interp reta cáo cIa realidadeperuana.Funda a jamal Labor. Corneça a se relacio-nar com a Secretaria Sindical daTerceira Internacional e envia dois delegadospara o Congresso da Internacianal, em Moscou, e para a Congresso dos

P aises Orientais, em BakO . Funda a P artido Socialista do P eru. Mariáteguié escoihido secretario-geral da organização.

1929 Ajuda a fundar a CGTP (Confederacao Geral dos Trabalhadores do Peru).

1930 Sua sa6de piara novamente e em marco é internado as pressas na ClInica

Villarán. Mariategui rnorre no dia 16 de abril. No rnesrno ano seu partido

rnuda de name para P artido Com unista do P eru.

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Obras do autor

TItulos organizados por José Carlos Mariátegui:La esce na contem p oránea . L ima, Editorial M inerva, 1 92 5.Siete ensayos ale interpretacion de la realidadperuana. L ima, Editorial Minerva, 19 28 .

TItulos publicados postumam ente na coleçao Ob ras Comp letas Populates, da Empre-

sa Editora Amauta (Lima):

Tom o I.Tom o II.

Tom o III.Tomo IV.

Tomo V.

Tomo V I.

Tomo VII.

Tom o VIII.

Tomo IX.

TomoX.Tomo X I.

Tomo X II.

Tomo XIII.

Tomo XIV.

TomoXV.

Tomo XV I.

Tomo XVII.

Tomo X VIIITomo XIX.

Tom XX.

Tomo XX I.

La es c ena c o ntem po rd nea, 1959.

Sie te ensay os d e in ter pr e tacion ale la real idad pe r uana, 1943.

El alma m at inaly otras e s taciones d e l hombr e de hoy , 1950.L a n o v e l a d e l a v id a , 1955.

De fensa de l ma rxi smo, 1959.

El ar t is tay la época, 1959.

Signosy obras , 1959.

Histor ia d e la cr is i s mund ial, 1959.

P o e m a s a M a r id t e g u i (este livro nao foi escrito por M ariátegui,mas está incluldo na colecao), 19 59 .

José Car los Mar idtegui (escrito per Maria Wiesse), 1945.P e r u a n i ce m o s a l P e r ü , 1970.

Tema s d e nues t ra A mérica , 1960.

IdeologlaypolItica, 1969.

Temas d e e ducación , 1970.

Cartas d e I ta ' l ia , 1969.

F i g ur a s y a s p e c to s d e l a v id a m u n d i a l (volume 1), 19 70.F i g ur a s y a s p e c to s d e la v i d a m u n d i a l (volume 2) , 1970.

F i g ur a s y a s p e c to s a l e l a v i d a m u n d i a l (volume 3), 197 0.Amautay su influencia (escrito por Alberto Tauro), 19 60.M a r i d t e g u i y s u t ie m p o (escrito per Armando Bazán), 1969.Escri tos juveni les , 1987.

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Textos biograficos

Ana tole France (1 84 4-1 92 4) - escritor e critico frances, filho de urn vendedor delivros, estudou no College Stanislas, em P aris, e mais tarde na École des Ch artes. Na

década de 1 86 0, foi assistente do pai, catalogador e editor-assistente em B acheline-

Deflorenne e L emerre. Tam bém foi professor. Serviu o exército durante a guerra fran-

co-prussiana e assistiu aos eventos da Cornuna de P aris. Em 18 75 , fol convidado aescrever diversos artigos pa ra o Les Temps, importante jornal da época, que foram mais

tarde publicados entre 188 9 e 18 92 em quarto volumes intilulados La vie l i t téraire.

Entre 18 76 e 1 89 0, foi bibliotecário-assistente no Senado. Sua primeira coletânea de

poernas, Lespoè r nes d ar es , foi publicada em 1 87 9. Em 18 88 , foi nomeado crItico lite-rário do Les Temps. F oi eleito Para a A cadémie Française em 18 96 e ganhou o P rémio

Nobel de L iteratura em 1 92 1. France, conhecido por seu anticlericalismo, apoiou o

P artido C omunista de seu pals. Escreveu L e c r im e d e S y lv e s t r e B o nn a r d ( 1881) , La

r o ti s s e r i e t ie l a R e i n e P e d a u q u e (1893), L e s o p i n i on s d e M . J e r o m e C o i g n a rd (1893) e

La vie enfleur (1922), ernie outros.

Andreiev, Leonid Nikolaievitch (1871-1919) - ingressou na Universidade de

São P etersburgo aos 20 anos. Depois de algum as tentativas de suicldio, transferiu-se

para a Universidade de Moscou, tornando-se reporter de assuntos policiais. Nessa

época p ublicou suas primeiras histórias em revistas e jornais. Entre seus livros maisfamosos estão 0 governador (1905), e Os se te e n for cados (19 08). Também escreveu

pecas de teatro com o A v i d a d e u r n h o m e r n (1907 ) , e Etc, q ue leva b ofe tad as (1916) .Apoiou o governo na Prirneira Guerra Mundial e fugiu da R6ssia depois da revolucao.

Era antibolchevique. Foi extremarnente popular em sua época.

Arguedas, Alcides (1879-1946) - nascido em La Paz (Bolivia), foi urn famoso

rornancista, jornalista, sociologo, historiador e diplomata. Estudou sociologia em P aris

e serviu como diplomata na Inglaterra, na Franca, na Venezuela e na C olombia. Foi oprincipal dirigente do P artido L iberal Boliviano. Escreveu Pueblo enfermo (1909) , R a z a

d e b r on ce ( 1919) e Historia gener al d e Boliv ia (1 92 2), entre outras obras.

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Barbusse, Henri (18 73 -193 5) - começou sua carreira literária como neo-simbo-

lista, corn seu Pleureuses (1 89 5) , c seguiu urn estilo neonaturalista em L'enfer (1908).

L utou na infantaria na P rimeira Guerra M undial e ern 19 17 foi liberado do exército

por causa d e seus ferimen tos em cornb ates. Seu livro Lefeu, journal dune escouaa e

(1 91 6) ganho u o P rémio Gon court. Depois da guerra, tornou-se pacifista e militante

comunista.

Bernstein, Eduard (18 50-1 93 2) - ingressou no P artido Socialdemocrata Alemáo

em 1871 e editou Der Sozialdemokr at , o órgão do partido. Viveu em Zurique, em

L ondres e na Alemanha. Foi amigo de Engels e participou da Sociedade Fabiana. Seus

artigos no D i e N e u e Z e i t tinham o intuito de " revisar" os elementos do marxismo que

dc considerava datados, dogmáticos ou ambIguos. Die Voraussetzungen des sozial i smus,

é sua obra m ais importante. Durante a P rimeira Guerra M undial defendeu urn acordode P az e em 1 91 5 v otou contra os créditos de guerra. Em 1 91 7, uniu-se ac   USPD.

Mais tarde, retornou ao P artido Socialdemocrata e ajudou a escrever seu programa.

Bloch, Jean-Richard (1 88 4-1 94 7) - romancista, ensaista e drarnaturgo socialista

frances. Em 1 91 0, começou a editar a revista L'Effort Libre e colaborou corn a revista

Clarté. Defendia que a arte deveria associar a tradiçao dem ocrática corn a cultura do

proletariado. Durante a Segunda G uerra Mundial, passou a m aior parte do tempo na

União Soviética. Autor de L e d e r n ie r e m p e r e u r (1 92 6), entre outras obras.

Briand, Aristide (18 62-1 93 2) - estadista Frances e urn dos fundadores do jornal

L'Humanite ' , foi ministro da Instrução P üblica e C ultos e candidato a Presidéncia da

Franca em 1 93 1. Ganhou o Prérnio Nobel da Paz em 19 26.

Calles, Elias P lutarco (18 77 -19 02) - presidente do Mexico entre 192 4 e 19 28 .

Cam panella, Tomm aso (1 568 -1639 ) - filósofo italiano e m onge dorninicano, de-

fendia a divisâo das tetras feudais. Foi preso por set urn dos lIderes da revolta cam po-

nesa na Calábria. Em 162 3, escreveu A cidade do so , que descreve urna soc iedade ideal.

Claudel, Paul (1 868 -19 55 ) - poeta, dramaturgo e ensaIsta frances, foi autor de

P a r ta g e d e m i d i (19 06) e Le soul ier de sa t in (1 92 9) , eritre outras obras.

Clemenceau, Georges (1841-1929) - politico frances. Apelidado "0 Tigre", foi

deputado, senador e rninistro do Interior. Em 1906 torna-se prirneiro-ministro, cargo

que ocuparia ate 1 90 9 e ao q ual seria reconduzido, pelo então presidente RaymondP oincaré, em 19 17 , exercendo também a funçao de ministro da Guerra. Teve papel

relevante na Conferéncia de P az de P aris, ao exigir severas reparacoes da Alem anha.

D'Annunzio, Gabriele (186 3-1 93 8) - nascido em P escara (Itália), foi poeta, ro-

ma ncista, contista, jornalista e lider politico. Pub licou seu primeiro poema , "P rimo

vere", em 1 87 9. Entre seus livros, destacam-se L'innocente (1892) , Le vergine delle rocce

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(1896) e Ilpiacere (18 98 ). Escreveu tambérn pecas de teatro importantes, corno LaGiocond a ( 1899) , Ilfuoco (1900) e Lajiglia di brio (1 90 4). Cornbateu na PrimeiraGuerra M undial e em 1 91 9, juntarnente corn trezentos hom ens, ocupou o porto deFiume, o qual acreditava pertencer a Itália. Governou-o com o ditador ate dezemb ro de

1 92 0, quando foi forçado a renunciar a seu mandato. A partir dal, tornou-se defensordo fascismo, m as não exerceu nenhum a grande influéncia na politica de seu p als.

Debs, Eugene Victor (18 55 -192 6) - lIder socialista. Nascido em Indiana (EUA ),

trabalhou nas ferrovias desde jovem, tornando-se o p rimeiro presidente do Sindicato

dos Ferroviários Americanos, em 1893. Liderou a Greve de Pullman de 1894, foi

preso por seis meses, mas ganhou notoriedade em todo o pals. Ajudou a fundar o

P artido Socialista em 1 901 e a IW W (Industrial Workers of the World) em 1 905 . Foi

várias vezes candidato a presidente dos Estados U nidos. Foi condenado a dez anos de

prisao em 1 91 7, falsamente acusado de espionagem, mas foi libertado em 19 18 . Foitalvez o mais imp ortante dirigente socialista dos Estados U nidos em sua época.

DeL e6n, Daniel (185 2-19 14 ) - nascido em C uraçao, estudou na Alemanha e de-

pois na Holanda. Ficou na Europa entre 1866 e 1872, e em seguida foi para os Estados

Unidos, onde colab orou corn exilados cubano s e corneçou a se envolver na politica

forte-americana. Forrnou-se em direito corn distinçao na C olumbia L aw School em

18 76. Foi mem bro dos K nights of Labor. Casou-se corn Sara Lobo em 1 88 2, corn

quern teve quarto filhos. Urn ano mais tarde, foi convidado para set palestrante nauniversidade onde havia se formado. Corn a perda da esp osa e de trés £ilhos, começou

a se radicalizar e a se envolver mais no movimento operário. Ingressou no Partido

Socialista Operário em 1890 e em pouco tempo se tornou sua principal lideranca,

assim com o editor do jornal The People e criador da Socialist Trade and L abor Alliance.

Foi urn dos fundadores da IWW Traduziu para o inglés obras de Marx, Engels, Bebel,

K autsky, assim como dezenove volumes de romances históricos de Eugene Sue e F r a n zvon Sickingen, de Ferdinand L assalle. Em 1 89 2, casou-se novarnente, dessa vez corn

Bertha C anary, corn quem teve mais cinco filhos. Escreveu Tw o P a ges from R oma nHistory (1902) , The P rea m b le of t he IW'W(1905) eAs to Polit ics (1907), entre outrasobras. E considerado o p rimeiro marxista original do continente.

Delteil, Joseph (1 89 4-1 97 8) - escritor frances, é autor d e J o a n a d ' A r c, entre outrosromances.

Dorgeles, Roland (1885-1973) - romancista frances, membro da Academia

Goncourt. 0 livro Les croix d e bois é considerado sua obra m ais importante.

D'Ors, Eugenio (18 81 -19 54 ) - £ilósofo e crItico espanhol, autor de Glosario, Labienplantada, Elsecreto de lajIlosofia, entre outras obras.

Duhamel, Georges (1884-1966) - em 1906 uniu-se a outros escritores Para fundar

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a comunidade de A bbaye, em Créteil-sur-M arne, e tornou-se doutor em m edicina em1909. Serviu corno cirurgião na frente de batalha durante a Primeira Guerra Mundial.

Tornou-se membro da Academic Française em 1 93 5. A utor de Vi e d e s mar ty rs (1917)

e de um a autobiografia em cinco volumes, Lumières s ur ma v ie , entre outras obras.

Eluard, P aul (18 95 -19 52 ) - pseudonimo de Eugene G rindel. P aul Eluard foi urn

dos fundadores do m ovirnento surrealista. Em 1 91 9, conh eceu André B reton, P hilippeSoupault e Louis Aragon, com os quais se associou ate 193 8, escrevendo poesia. Depois

da Guerra C ivil espanhola, abandonou o surrealisrno e sua obra com eçou a refletir sua

militância polItica. Ingressou no P artido Cornunista Frances em 1 94 2. Escreveu Cap itale

d e la d o u le u r (1926) , Lesy euxf er t i le s (193 6) e Tout dire (1 95 1) , entre outras obras.

Erzeberger, M atthias (1 87 5-1 92 1) - politico católico alem ão, antimilitarista, fez

denüncias contra o alto cornando alernão por decisOes que considerava equivocadas,durante a P rimeira Guerra M undial.

Foch, Ferdinand (1851-1929) - marechal frances, lIder das forças francesas na

P r i m e i r a G u e r r a M u n d i a l , a u t o r d e O s p r i n ct Ao s d a g u e r r a , E lo g i a a N a p o le a o M e m o -

riaspara servira his t O ria da Gra nrle Gue rra ,entre outras obras.

Frank, Waldo D avid (1 88 9-1 967 ) - romancista e critico norte-americano, estu-

dou em Y ale. Defendia reformas sociais em seus romances. Seus temas jam desde o

racismo ate a Revolucao Cub ana. Escreveu muitos livros, corno City Block (1922),Holiday (1923) , C h a l k F a c e (1924) , In the Ame r ican Jungle (1937) , Birth o f a W orld

( 1951) e The P rophe t ic I s land: a P ortrai t of Cuba (1967).

Gallimard, Gaston (1881-1975) - editor frances, estudou direito e literatura na

Universidade de P aris e depois voltou-se para o jornalismo. Em 1 90 8, fundou, junta-

mente com André Gide e Jean Schlumberger, a revista literária L a N o u v e l le R e v u e

Française . Em 1911, criou a editora La Nouvelle Revue Francaise-Librairie Gallimard,

que manteve esse nome ate 1 91 9, quando m udou P ara L ibrairie Gallirnard. Publicou

os mais importantes escritores franceses de sua épOca.

Gandhi, Mohandas Karamchand (1 869 -19 48 ) - lider pacifista e independentista

da fndia, favorável a s técnicas da "n ão-violéncia", influenciou movimentos de direitos

civis em todo o mundo. Ma hatma G andhi, corno era charnado, nasceu em P orbandar,

atualmente no estado de Gujarat. Forrnado em direito pela University College, de

Londres. Na Inglaterra conheceu socialistas ingleses e fabianos, assirn corno personali-

dades como George B ernard Shaw . Recebeu influéncia das idéias de H enry David

Thoreau e do escritor russo Tolstói. Em 1 89 1, G andhi retortion a India, onde tentou,scm sucesso, trabaihar como adv ogado em Bornbaim. Dois anos rnais tarde, foi man-

dado por sua firma P ara a Africa do Sul, onde iria trabalhar no escritório de advocacia

em Durban. Residiu nesse pals por vinte anos, lutando pelos direitos civis e sendo

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Comoedia. Em 1 91 5 estréia no teatro Apolo, de Buenos Aires, sua peca L a m a d r a s t a ,

escrita em colaboraçao corn Zapata Quesada. Viaja por Africa e Europa em 1 91 8 e em

1 91 9 funda, corn o escritor Ricardo Guiraldes e Eva M éndez, o Editorial Proa. P ublica

seus V ei ntepo e m as para s er l e ld o s e n c i tray v i a em 1 92 2, na Franca, e seu segundo livro,

Calcomanlas, na Espanh a, urn ano rnais tarde. Tarnbérn é autor de E s p a n t a p a a r o s (1932) ,Interlunio ( 1937 ) e E n ía m a s m é d u la (1 95 3) , entre outras obras.

Gom pers, Samuel (1 85 0-19 24 ) - nascido na Inglaterra, foi para os Estados Unidos

em 1 86 3, tornando-se aprendiz de fabricante de charutos. Entrou para o sindicato dos

fabricantes de charutos em 1 864 e em 1 87 7 já havia se tornado seu presidente. Em18 86, tornou-se presidente daAFL , sendo reeleito diversas vezes, corn exceção de 18 95 ,

ate o final de sua vida. Gornpers aproxirnou a A FL do P artido Democrata e fundou

o Cornité de Guerra sobre o Trabalho, durante a Primeira Guerra Mundial. Ficouconhecido tam bérn por suas posicóes co ntra os socialistas.

G órki, Máximo (18 68-19 36) - pseudônirno de Alexey M aksimovich P eshkov,

contista e roma ncista russo. Nasc ido em N izhny N ovgorod, teve urna infância sofri-

da e pobre, sendo espancado constanternente por seus patroes e muitas vezes ch egando

a passar a fome. P or causa de sua vida dura, criou o pseudonimo Gorki, ou "amargo".

Tentou o suicIdio na juventude. Aos 21 anos de idade, tornou-se urn vagabundo,

viajou por várias cidades da Russia e realizou diversos trabaihos diferentes. Corneçou a

fazer sucesso após a publicacao de C h ei kash (1 89 5) . Seu prirneiro romance foi F o m a

gordeyev (18 99 ). Tarnbérn escreveu várias pecas de teatro. Entre 18 99 e 19 06, viveu em

São P etersburgo, onde se tornou rnarxista. Foi preso em 19 01 , por causa de seu poema

"P esnya o B urevestnike". Ao ser libertado, foi para a C rirnéia, onde contraiu tubercu-

lose. Deixou a Russia em 1 90 6 e passou sete anos no exllio, principalmen te na ilha

de Capri. Retornou a R6ssia em 1 91 3 e se opôs a participacão do p als na P rimeira

Guerra M undial. Tam bérn fez critica aos boichev iques, quando estes tornararn o poder

em 1 91 7, assim corno criticou Os métodos de Lenin no periódico Novay a Zhizn , sendo

obrigado a deixar suas c rlticas de lado p or ordens do próprio lIder da revolução russa.

A p artir de 19 1 9, com eçou a cooperar corn o governo revolucionário. Morou na Itália

entre 1921 e 1928 e depois novamente retornou a seu pals. Tornou-se o prirneiro

presidente do Sindicato dos Escritores Sov iéticos. Seus trabaihos m ais conhecidos

no perlodo soviético foram Lev Tolstoy (1919) e 0 P isate lyakh (1928) .

Haig, Douglas (1 86 1 -19 28 ) - general e estrategista militar inglés, urn dos respon-

sáveis pela vitéria de seu pals nos cam pos de batalha na P rirneira G uerra Mundial.

Harding, Warreb Garnaliel (1865 -192 3) - rnernbro do P artido Republicano e 29

presidente dos Estado s Unidos, foi editor do jornal Star, em Marion, Ohio, senador

estadual entre 189 9 e 19 03, governador de Ohio entre 19 03 e 19 05 e senador federal

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entre 1915 e 1921. Nas eleiçoes de 1920, Harding teve uma das maiores votaçoes

populates da história dos Estados Unidos ate entäo, conseguindo 1 6.152 .200 v otos.

James M. Cox (18 70-1 95 7), na ocasião, conseguiu 9.147 .353 votos, ou 35% do total.

Harding foi presidente entre 19 21 e 1 92 3. Seu g overno foi marcado por diversos casos

de corrupcão.

Hauptmann, Gerhart Johann Robert (1 862 -19 46) - talvez o mais proeminente

dramaturgo alemâo do início do século X X e ganhador no P rêmio Nobel de L iteratura

de 1912. Foi urn dos principais autores naturalistas de seu pals, mas abandonou o

estilo mais tarde, utilizando em suas pecas teatrais elementos mIsticos, religiosos, mito-

lógicos e simbolistas. Também escreveu contos e romances. Foi autor de A n te s d o a m a -

nhec er (1889) , A ch e g a d a d a p a z (189 0) e Vidas sol i tdrias (1891), entre outras obras.

Hilferding, Rudolf (18 77 -19 41 ) - econornista marxista austriaco, foi professor naescola de quadros do P artido Socialdemocrata Alem ão e editor do jornal Vorwarts,

entre 1907 e 19 15 . Em 1 92 3, e depois entre 192 8 e 19 29 , foi ministro das Finanças

da Repüblica de Weimar. Exilou-se em 1933 e foi assassinado em 1941. Foi urna

destacada Ligura do austromarxismo e importante personalidade da Segunda Interna-

cional. Era considerado urn reformista. Escreveu 0 capital Jmnanceiro, em 19 10, seu

livro mais conhecido.

Hoover, Herbert Clark (1874-1964) - foi o 31 2 presidente dos Estados U nidos,entre 1 92 9 e 19 33 . Forrnado pela Universidade de Stanford. Trabalhou numa mina de

ouro quando jovem e depois se tornou engenheiro de minas na A ustralia e na C hina.

Ficou rico nas m inas da B irmânia. Durante sua carreira poiltica, apoiou a criação da

L iga das Naçoes. Foi secretário de Comércio entre 19 21 e 19 28 . Criou a Reconstruction

Finance C orporation. Deixou o governo corn pouca p opularidade.

Ibsen, Henrik Johan (1828-1906) - dramaturgo noruegués, autor de peças tea-

trais corno Catilina (1850) , Brand (1866), P e e r G y n t (1867) , O s p i la r e s d a s o ci e d a d e

(1877) , U ma ca sa de b oneca s ( 1879) e Ur n inimigo dopov o (1 88 2), entre várias outras.

Ingenieros, José (18 77 -19 25 ) - nascido em P alermo, Itália, foi urn dos mais im-

portantes intelectuais da Argentina no inlcio do século XX . Estudou medicina, espe-

cializando-se em psiquiatria e crirninologia. Sua tese La simulación de la locura foi

premiada pela Academia de Medicina de P aris e ganhou a Medaiha de O uro da Acade-

mia N acional de Medicina de Buenos A ires. Em 1 904 , assumiu a suplbncia da C átedra

de P sicologia Experimental da Faculdade de Filosofia e L etras e, em 19 08 , fundou a

Sociedade de Psicologia. Seus Princuipios deps icologla representariam o primeiro siste-made ensino cornpleto dessa m atéria naA rgentina. P ublicou obras importantes, como

La sociologla argentina e La ev olución de las ide as argentinas. Editou a coleçao La cultura

argentina, assim como foi o fundador da Revista de Filosofla. Foi psiquiatra,

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crirninologista, sociólogo e filósofo, e suas idéias tiveram enorme repercussáo e

influência em todo o c ontinente.

Jaurès, Jean (1859-1914) - proveniente de urna familia francesa de classe media,

foi professor universitário, escritor e politico. Como historiador, escreveu urn longotrabaiho sobre a Revolucáo Francesa. Em bora tenha preparado urn estudo sobre refor-mas no exército, era fam oso por suas idéias pacifistas. Foi assassinado por urn fanático

nacionalista frances antes da guerra.

Jefferson, Thomas (17 43 -18 26) - nascido no estado da Virginia (EUA), corneçou

sua carreira de advogado na década de 1 86 0, sendo eleito para a Câm ara dos Cidadaos

da V irginia em 17 68. Foi o autor de Resumo dos d ir e i tos daAmér ica br i tâ nica (1774),

D e c l a ra ç ão s o b r e o s m o t iv o s e a n e c e s s i d a d e d e p e g a r e m a r m a s ( 1 7 7 5 ) , D e c l a ra ç a o d e

indep endéncia dos E s t a dos U nidos ( 1776) e R esoluçao de Ke ntucky (179 8) . Entre 1776 e1 77 9, foi deputado na Assernbléia da Virginia; ern 1 7 7 9 , foi nomeado governador da

Virginia; entre 17 85 e 1 78 9, foi embaixador na Franca; em 1 79 0, foi nomeado secre-

tdrio de Estado; em 1 79 6, foi eleito vice-presidente dos Estados Unidos. Em 1 80 1 ,tornou-se o presidente do pals e em 1 80 4 foi reeleito para o c argo. Deixou a politica de

vez em 1 80 9. Foi urn dos principais fundadores da U niversidade da V irginia, da qual

foi seu prirneiro e ma is importante reitor.

K autsky, Karl (18 54 -19 38 ) - estudou história, econornia e filosofia na Universi-

dade de Viena. Em 1875, entrou para o Partido Socialdernocrata Austriaco. Entre

18 85 e 18 90, viveu em L ondres. M ais tarde, foi para a Alema nha, onde se tornou o

principal teórico do P artido Socialdernocrata, ajudando a escrever o programa de Erfurt,

de 1891. Ficou no partido ate 1917, quando ingressou no Partido Socialdemocrata

Independente, retornando ao am igo partido em 19 22 , sem contudo ter a rnesma in-

fluência de antes. Foi para P raga em 1 93 4 e mais tarde paraAmsterda, onde morou ate

o firn da vida. Foi urn dos principais teóricos marxistas da Segunda Internacional.

Editou o jornal Die Neue Zeit e colaborou corn Engels. Ajudou a popularizar o

marxismo. Autor de A questao agrdria (1899 ) e 0 caminho do poder (19 09), entreoutras obras.

Keynes, John Maynard (1883-1946) - economista inglés e pioneiro da ma-

croeconom ia, estudou na Un iversidade de C amb ridge, onde mais tarde lecionou. Em

1911, foi redator do Economic Journal, tornando-se, alguns ano s depois, secretário

e redator da Sociedade Real de Econom ia. Em 1 91 9, foi o representante financeirodo Tesouro britânico na C onferéncia de P az em P aris. Em 1 94 4, foi o representante

inglés na Conferhncia de Bretton W oods, que deu origem ao Fundo Monetário Inter-nacional. Em 1 94 6, foi escolhido presidente daquela instituição. Autor de Treatise on

M o n e y (193 0) e T h e G e n e r a l T h e o r y o f Em p l o y m e n t , In te r e s t a n d M o n e y (1936), seu

livro mais importante.

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Kropotkin, PiotrMekseievitch 1842-1921) - aristocrata anarquista russo.

L arbaud, Valery (1881-1957) - rornancista e critico frances, autor de F e r m i n aMarquez (19 11 ) , Enfantines (191 8) e Amants, he ureux amants (19 23 ), entre outras obras.

Lassalle, Ferdinand 1825-1864) - importante figura do movirnento operário ale-mao na segunda m etade do século XIX , foi urn "jovem hegeliano" e autor de textos

populates entre os trabaihad ores de seu pals. Em 1 8 6 3 , ajudou a orga nizar o prirneiropartido socialista alemão e m anteve durante muito tempo contato corn Marx e Eng els,

que nao concordavam corn suas idéias e táticas. Os dois teóricos consideravam L assalle

urna figura vaidosa, corn urn estilo de vida desregrado e urn discurso dernag ogico.

L assalle retirou seu apoio aos liberais, negoc iou corn Bismarck , tentando conse guir

P ara a classe op erária o sufragio universal, urn Estado mais dem ocrático e transformar

o Estado em urna entidade que prornovesse de fato as rnudancas sociais, fornecendocrédito a s cooperativas de trabaihadores, que aos poucos construiriarn a base do socia-lisrno. Perdeu a vida nu rn duelo.

Lincoln, Abraham 1809-1865) - urn dos principais lIderes politicos dos estados

do Norte na G uerra Civil none-americana, foi presidente dos Estados U nidos de 1861a 1865.

L loyd George, David (1863-1945) - politico e advogad o britânico, rnernbro do

P artido L iberal. Eleito Para o P arlarnento em 1890, ficou conhecido por seu radicalis-rno e antiirnperialisrno. Em 1 9 0 5 , foi nomeado presidente da junta de Com ércio e, em1 9 0 8 , tornou-se rninistro das Finanças, durante o governo de Herbert A squith. Em1 9 1 5 , foi nomeado rninistro das M uniçoes e, em 1 9 1 6 , oc up ou o posto de rninistro daGuerra. Em dezembro desse ano, tornou-se prirneiro-rninistro, liderando a Inglaterra

ate o final da P rimeira Guerra Mu ndial. Depois do conflito, foi o principal delegado

britânico na Conferéncia de Pa ris que elaborou o Tratado de V ersalhes. Renuncioucorno primeiro-ministro em 1 9 2 2 . Publicou War Memoirs, entre 1 9 3 3 e 1 9 3 6 , e The

Truth about the Peace Treaties, em 1 9 3 8 , entre outras obras. Foi convidado por Churchillpara fazer pane do G abinete de G uerra em 1 9 4 0 , ma s recusou. Recebeu o titulo deconde L loyd George of Dwyfor no final da vida.

L udendorff, Erich (1865-1937) - irnportante general alemão durante a P rimeiraGuerra M undial.

Mac Orlan, Pierre ( 1 8 8 2 - 1 9 7 0 ) - escritor frances, eleito mernbro da A cadem iaGoncourt em 1 9 5 0 . Autor de romances de aventuras corno A b a n d e i r a , V e r d un e

Montmartre , entre outros.

Maiakovski, Vladimir Vladimirovitch ( 1 89 3 - 1 9 3 0 ) - nascido em B agdadi, Georgia,foi urn dos ma is importantes poetas do inicio da revolucao russa. Foi preso diversas

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mais tarde, editor do jornal La Lot ta d i Classe , influenciado pelas idéias rnarxistas,

assim como por pensadores corno Nietzsche, Auguste Blanqui e Georges Sore . Em

1 9 1 0 , ocupou o cargo de secretário local do Partido Socialista em Forli. Inicialmente

defensor de idéias pacifistas, foi preso por fazer p ropaganda q uando a Itália declarou

guerra a Turquia. Foi contra a participacáo da Itália na P rimeira G uerra Mundial. Emnovembro de 1 9 1 4 , fundou urn novo jornal, IlPopolo d'Jtalia, e o grupo Fasci d'Azione

Rivoluzionaria, e, em m arco de 1 9 1 9 , os Fasci de Combattimento. Subiu ao poder em

1 9 2 2 , reorganizou o pals através de propag anda, novas leis, centralizaçao do poder,

absorçao de sindicatos pelo governo, vigilancia e perseguicao aos opositores do regime,

controle da indüstria e de gastos em obras ptlblicas e agressóes m ilitates. Aliou-se a

Alem anha nazista durante a Segunda G uerra Mundial. Foi executado em ab ril de 1 9 4 5 .

Nansen, Fridtjof ( 1 8 6 1 - 1 9 3 0 ) - explorador, oceanografo e estadista noruegués.Seus relates de muitas expediçaes no A rtico e no Atlântico Norte são consideradosclássicos da literatura norueguesa. Em 1888, organizou uma expedicão de seis hornens

para cruzar a G roenlândia, onde estudou a cultura esquimó. Em 1 8 9 3 , realizou estu-

dos sobre a corrente polar perto da Siberia, através do oceano Artico, ate chegar

a mais longlnqua latitude já atingida ate então pelo hornem. Durante a P rimeira Guer-

ra Mundial, concentrou-se em atividades hum anitárias e diplomá ticas. Foi o ganh ador

do P rérnio Nobel da P az em 1 9 2 2 . Autor de V i d a d e e sq uim o ( 1 8 9 1 ) , M a i s a o for te

( 1 89 7 ) e B r um a s d o fo r te ( 1 9 1 1 ) , uma análise crItica das exp loracoes a s regióes donorte do planeta ao longo dos séculos.

N itti, Francesco (1868-1953) - politico liberal italiano, foi urn dos respon sáveis

por tirar a Itália de um a grave crise econôrnica depois da P rirneira Guerra M undial.

Obregón, Alvaro (1880-1928) - politico e lIder militar rnexicano. Na sceu perto

de Los Alamos, estado de Sonora. Quando jovern trabalhou corno barbeiro, pintor,

professor, vendedor e produtor de garbanzo. Entrou na politica em 1 9 1 0 , no inicio da

revoluçao. Em 1 9 1 1 , foi eleito prefeito de Huatabarnpo. A poiou o presidente Francis-co Madero e enfrentou urn levante armado dirigido por P ascual Orozco. A pds o assas-

sinato de Madero, f 'icou do lado de V enustiano Carranza na luta contra Adolfo de la

Huerta. Num combate contra Pancho Villa, em 1 9 1 5 , perdeu o braco direito. Foi

nomeado ministro da Guerra em 1 9 1 6 , cargo que ma nteve ate 1 9 1 7 . L utou contraCa rranza, que foi assassinado alguns anos mais tarde. Tornou-se presidente em 1 9 2 0 e

iniciou diversas reformas trabalhistas, agrárias e educa cionais. Incentivou investirnen-

tos estrangeiros e empresas privadas nacionais. Distribuiu quase dez vezes m ais tetras

aos carnponeses que C arranza. Nom eou o escritor e fildsofo José Vasconcelos com oministro da Educação e revolucionou o sistema de p ublicacoes, a pintura muralista e as

artes em geral no pals. Obregon teve de com bater uma revolta liderada por Adolfo de

la Huerta durante seu g overno e saiu vitorioso principalmente pelo ap oio que recebeu

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dos trabalhadores urbanos e camponeses. Durante o governo de P lutarco Elias Ca lles

não atuou ativame nte na polItica. Em 1 9 2 8 foi eleito novamente presidente, mas foi

assassinado p or urn fanático religioso antes de tomar pos se no cargo.

Ortega y G asset, José (1883-1955) - nascido em Madri, estudou na Universidadede M adri e na Alema nha, onde foi influenciado pela escola filosófIca neokantista.

A cabou s e afastando dessa influncia posteriormente. Eritre 1 9 3 6 e 1 9 4 5 , viveu em

outros paises da Europa e na A rgentina, voltando a Espanha depois da Segunda Guer-

ra Mundial. Em 1 9 4 8 , fundou o Instituto de Humanidades em Madri. Sens livros

mais conhecidos são Addn en elparaIso (1910), Meditaciones de Quijote (1914), El

te m a d e n u e s tr o ti e m p o ( 1 9 2 3 ) , Es p a i i a in v e r te b r a d a ( 1 9 2 2 ) e L a r e b e li ón d e 1 a 5 m a s a s

1929), entre outros.

Palacios, Alfredo (1880-1965) - politico e escritor argentino, autor de Lafatigay

sus proyecciones s ociales , El nuevo d erecho e Estadistas y poetas, entre outras obras.

P ershing, John Joseph (1860-1948) - general norte-americano que lutou contra

os indios apaches, participando também da guerra hispano-americana. Foi a responsá-

ye1 pelas tropas que perseguirarn Pancho Villa no Mexico, scm sucesso. Foi o lider das

tropas dos Estados Unidos na P rimeira Guerra Mundial.

P hilippe, C harles-L ouis (1874-1909) - romancista frances que se preocupava em

retratar Os sofrimentos dos pobres. Autor de B u b u d e M o n tp a r n a s s e ( 1 9 0 1 ) e Le P è r e

Perdrix 1902), entre outros.

P irandello, Luigi ( 1 8 6 7 - 1 9 3 6 ) - dramaturgo, contista, poeta e roman cista italiano,

e s c r e v e u M a l g io c on d o ( 1 8 8 9 ) , Am o r i s e n z a a m o r e ( 1 8 9 4 ) , L ' e s c lu s a ( 1 9 0 1 ) e II turno

1902). Com ecou a fazer sucesso corn seu livro Ilfu Mattia Pascal (1904), seguido de

outras obras, com a U no, nes suno e cent omila e L'umorismo. Em 1 8 9 8 havia estreado

como dram aturgo corn L'epilogo, e voltou a escrever pecas a partir de 1 9 1 0 , corn La

morsa. Sua peca rnais farnosa é Seipersonaggi in cerca d 'autore (1921) . Escreveu tambérnT h t to p e r b e n e ( 1 9 2 0 ), V e s t ir e g li i gn u d i ( 1 9 2 3 ) e Que sta sera s i recita a soggetto (19 30).

P latão - nasceu em A renas, cerca de 4 2 8 a. C., e viveu ate cerca de 347 a. C. Filho

de urna proerninente familia ateniense, após a execução d e Socrates refugiou-se em

Meg ara. Passou alguns anos viajando por G récia, Egito e peninsula itálica. Em torno

de 387 a. C., fundou a Aca demia de Arenas, corn o intuito de construir urn instituto

que pudes se desenvolver urn trabaiho sisternático de estudos fllosóficos e cientIflcos.

M ais tarde, foi tutor de DionIsio II, voltando em seguida para a A cadem ia. Escreveu

textas clássicos, como Euthy nphr o, Apologia , Cr i to , Phae d o, Cr aty lus , T he ae the tus , So-

f ista, Simp ósio, A rep iiblica, entre outras obras.

P once, Anibal (1890-1938) - escritor rnarxista argentina, foi urn dos editores da

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R e v i s t a d e F i lo s o fl a e fundador da revista Dialéctica. Publicou Eclucación y lucha de

clases , Ambi ción y angustia de los adolescentes , De Erasmo a Romain Rollande Sarmiento,

entre outras obras.

P reobrajensky, Evgeny Alexeyevich (18 86-1 93 7) - entrou P ara o Partido SocialDem ocrata Russo aos dezessete anos, sendo eleito em 1 92 0 com o mem bro perma-

nente do Cornité Central. De 1 92 3 a 1 92 7, foi urn dos principais teóricos econômicos

do particle, defendendo maior énfase na industrializacao e associando vs proble-

mas econôrnicos do pals a burocratizaçao do partido na época de Stalin. Mais tarde,

tentou uma reconc iliacao corn o ditador. Foi expulso e readm itido no p artido, expulso

novamente em 1931, readmitido em 1932 e depois preso em 1935 e executado

em 1937 .

P révost, Marcel (1 862 -19 41 ) - romancista frances, foi engenheiro civil, cargo aque renunciou após faz er sucesso corn seus dois primeiros livros, Le s corpion ( 1887) e

C honchet t e (1 88 8) . Foi eleito para aAcadémie Française em 19 09 e teve muitas de suas

histórias adaptadas para o teatro. Foi autor de mais de cinqüenta livros.

P roust, Marcel (187 1-1 92 2) - romancista frances, estudou no Lycée C ondorcet e

na École de Sciences Poliriques. Escreveu Lesplais irs et les fours e A la r ech er ch e d u t emps

p e r d u , sua obra m ais importante.

Ram ónyC ajal, Santiago (18 52 -19 34 )— escritor e medico espanhol, ganhador doPrérnio Nobel de Medicina e Fisiologia em 1906. Autor de E lem ent os d e hi s t ologia

normaly de técnica micrografica, entre outras obras.

Reed, John (188 7-19 20) - nascido em P ortland, Oregon, formou-se em jornalis-

mo na U niversidade de Harvard e em 19 11 foi viver em Nova Y ork, onde escreveu

Para diversas publicacoes. Esteve como jornalista no Mexico, na Europa ocidental, na

Europa oriental e na Rdssia durante a Primeira Guerra Mundial. Presenciou os even-

tos da revolucao russa e se tornou amigo de revolucionários corno Lenin e Trotsky. Foiurn dos fundadores do P artido Com unista Operário e mem bro do Com ité Executivo

da Terceira Internacional. Autor de vários livros importantes, com o Mex ico reb elde

( 1914) e Os de z clias q ue abalar am o inundo (1919), entre outros.

Rivière, Jacques (1886-1925) - escritor, crItico e editor frances. Urn dos fundado-

res da N o u v e lle R e v u e F r a n ç a is e e seu editor de 19 19 a 19 25 . Autor de Etudes (1912) e

Aimée (1 92 2) , entre outras obras.

Ruskin, John (1 81 9-1 90 0) - escritor e crItico inglés, defensor do renascimento domov imento gótico na arquitetura e nas artes decorativas na Inglaterra. Estudou em

Christ Church, Oxford, onde se formou em 18 42 . Ganhador do Prémio New digatede poesia em 18 39 . 0 primeiro volume do livro The s tones of Venice foi publicado em

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1 8 5 1 . Den aulas na U niversidade de Oxford, a partir de 1 8 6 9 , ate se dernitir em 1 8 7 9 .

E autor da autobiografia Praeteri ta, entre outras obras.

Shaw, George Bernard ( 1 8 5 6 - 1 9 5 0 ) - dramaturgo, critico literário e propagan-

dista socialista irlandks. Ganhou o P rkrnio Nobel de L iteratura em 1 9 2 5 . Durante adécada de 1880, Shaw tentou, sem sucesso, seguir uma carreira literária em L ondres,

mas suas obras nao tinham kxito. Nesse perIodo, tornou-se urn orador püblico polemista

e aderiu ao socialismo. Foi tamb ém influente dentro da Sociedade Fabiana. Corneçou

a fazer sucesso principalmente a partir do final dos anos 1 8 9 0 , quando colaborou no

The Saturday Re view come, crItico teatral. Escreveu m uitas pecas, corno A rms a n d th e

M an (189 8) , Candid a (1898) , The M an ofDe st iny(1898) , You N ev er Can Tell (189 8) ,

Three Plays for Puritans (19 01), The De vil 's Disciple (19 01), Caesar and Cleopatra (19 01),

Captain Brassbound's Conve rs ion (19 01) , Man and Superman (19 03) , John Bull 's O therIs land (19 07) , Major Barbara (1907 ) , The Doctor 's Di lemma (19 11 ) , Pygmalion (19 14 ) ,

Androcles and the Lion (19 16) , Heartbreak House (19 19 ) , Back to M ethuse lah (192 1) e

Saint Joan (19 24 ) , entre outras.

Sorel, Georges ( 1 8 4 7 - 1 9 2 2 ) - nascido em Cherbou rg (Franca), estudou na École

Polytechnique em Paris e ate os 4 5 anos de idade trabalhou com o engenheiro. Come-

çou a escrever em 1 8 8 6 e sk começ ou a se dedicar ao marxismo a partir de 1 89 3 . F o i o

responsável por um a reformulaçao e reinterpretacáo original do marxismo, colocandoknfase em a spectos morais da doutrina. Pa ra ele, os temas funda mentais do rnarxisrno

deveriam set vistos com o "m itos", imagens que inspirassem a classe trabalhadora a

agir. 0 mito mais imp ortante seria a greve g eral. Seria pela ação e pela v iolkncia que os

trabaihadores simultaneamente desenvolveriam um a ética de grandeza, destruiriam a

burguesia e construiriam as fundaçOes morais do socialismo. Era a favor do sindicalismo.

Autor de R eflexoes s obre a viollncia (19 06), entre outras obras.

Spengler, Oswald (1880-1936) - filósofo alemâo, autor de A de cadéncia do Oci-

dente , seu livro mais conhecido.

Sun Yat Sen (1866-1925) - lider revolucionário chinks, de origem camponesa,

nasceu na vila de C uiheng, atualmente localizada na cidade de N anlang, na provIncia

de Guangdong, no sul do pals. Quando criança, estudou em sua cidade natal e no

inlcio da adolesckncia foi viver corn o irmão m ais veiho em H onolulu, no Haval, onde

estudou na lolani Sch ool, entre 1 8 7 9 e 1882, e no Diocesan Boys' School, em 1883.

De 1 8 8 4 a 1886 cursou o Queen's College em Hong K ong. Obteve urna licença P ara

trabalhar como m edico pela H ong K ong C ollege of M edicine em 1 8 9 2 . F o i influen-ciado pelos missionários cristãos norte-americanos no H aval, assim com o pelas idéias

de Alexander Hamilton, Abraham L incoln, Karl M arx e Henry G eorge. Em outubro

de 1 8 9 4 , fundou a Sociedade Xing Zhong e, urn ano mais tarde, após urna fracassada

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tentativa de golpe em seu p als, exilou-se na Europa, Estados Unidos, Ca nada e Japao

pelos dezesseis anos seguintes, levantando dinheiro para a luta revolucionária. Retortion

a China em 1 9 1 1 e, em 1 9 1 2 , foi ecolhido como o primeiro presidente provisório do

pals. Foi urn dos fundadores do Ku omintang. Foi para o Japao em 1 9 1 3 e voltou a

China em 1 9 1 7 . Em 1 9 2 1 foi eleito presidente do autoproclamado governo nacionalem Guangzhou, sul do pals. Criou a Academia Militar de Whampoa. A partir de

1 9 2 4 , trabalhou em estreita colaboracao corn os cornunistas chineses e aceitou o apoio

da Uniáo Soviética para reorganizar o Kuomintang, seu partido politico. Foi autor de

o problem a vital cia China, 0 clese nvolvirnento internacional cia China, M ernó rias c/c urn

revoluciondrio chin/s e F undam entos d a reconstruçáo nacional , entre outros textos.

Tagore, Rabindranath (1861-1941) - poeta e mlstico indiano, ganhad or do P ré-

mio N obel de L iteratura de 1 9 1 3 , era fliho de urn maharishi (lider espiritual) e autorde diversos livros imp ortantes, corno Manasi (1890), Sonar tan (0 barco dourado)(1893), Citra (1896), Kalpana (Sonhos) (1900) e K s an ika (19 0 0 ) , entre outros. A

partir de 1 9 0 1 , foi administrar as propriedades de seu pai em Shilaidah e Saiyadpur,

onde viveu em contato corn o pov o hurnilde do campo. Era considerado urn grande

poeta. Tamb ém era comp ositor e sua canção, "Our G olden Benghal" , se tornou poste-

riormente o Hino N acional de Bangladesh. Muitos achavam que ele era urn dos maio-

res pintores indianos de seu tempo.

Tardieu, André 1876-1945) - escritor, jornalista e politico frances, presidente doConselho de M inistros da Franca, foi um grande partidário de Clemenceau. A utor de

A paz e A hora cia decisáo, entre outras obras.

Tchitcherin, Georgi Vassilievitch ( 1 8 7 2 - 1 9 3 6 ) - diplornata sov iético, foi cornis-

sário do povo dos Negoc ios Estrangeiros entre 1 9 1 8 e 1 9 3 0 e chefe da delegacao so-

viética nas conferéncias internacionais de Gén ova e de L ausanne. Urna das p rincipaisfiguras do gov erno soviético.

Tilgher, Adriano (1887-1941) - filósofo e critico italiano, defensor de P irandelloe autor de Relativismo conternporáneo, entre outras obras.

Tolstói, Leo ( 1 8 2 8 - 1 9 1 0 ) - estudou na Universidade de K azan, abandonando ainstituiçao para it viver em sua casa em Y asnaya P olyana. Entrou no exército em 1 8 5 2e em 1 8 5 7 viajou para Franca, Sulça e Alemanha. Q uando voltou de suas viagens,fundou uma escola para crianças em Yasnaya. C asou-se em 1862. Ap esar de ter umaorigem nob re e set dono de tetras, tinha urna vida sim ples e ascética. Era pacifista.Ficou ma is conhecido com o escritor e publicou contos e romance s importantes. Foi

autor de clássicos da literatura universal, como O s cossacos (1863) , Guerra e paz (1865-186 9 ) , A n n a K aren in a (1875 - 1877) e conftssao (1884), entre outras obras.

Torre, Guillermo de la (1900-1971) - critico Iiterário e ensaista esp anho l, autor

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de M anifes to u ltrais ta ve r t ical , Li teraturas e urope as d e v anguard ia , Valoración l it erar ia

de l existencial ismo e Pr oblemd t ica d e Ia l it er atura , entre outras obras.

Trotsky, Leon (18 79 -19 40) - pseudlrnimo de Lyov Davidovich Bronstein, nascido

na Ucrânia, membro do Partido Operário Socialdemocrata Russo, inicialmente urnmenchevique e mais tarde boichevique, importante lider da Revoluçao de O utubro,

Cornissário do Povo p ara RelacOes Internacionais em 19 18 , Comissário do P ovo para

Assuntos Militates e Navais entre 1918 e 1925, fundador do Exército Verrnelho e

teórico marxista. Enquanto Stalin defendia a idéia do "socialismo em urn so pals",

Trotsky era favorável a teoria da " revoluçao perma nente". Fez duras criticas a burocra-

cia soviética e a forma com o aTerceira Internacional estava se desenv olvendo. Durante

a disputa pelo poder, foi expulso da RO ssia cm 1 92 9 por Stalin. Fundador da QuartaInternacional. Foi assassinado no exllio, no M exico, por urn agente stalinista. E autor

de vários trabaihos, como, a História do revoluçao russa , A rev oluçáo tra Ida e rev oluçdo

p e r m a n e n t e , entre outros.

Turati, Filippo (1857-1932) - socialista reformista, fundador e colaborador da

Critica Sociale e urn dos fundadq res do P artido Socialista Italiano. Durante o regime

fascista, foi para a Franca, onde se exilou.

Valery; P aul (18 71 -19 45 ) - poeta, ensaIsta e crItico frances, estudou direito emMo ntpellier. Foi eleito para aAc adémie Française em 1 92 5; foi diretor adrninistrativo

do Centre Universitaire Méditerranéen em Nice, em 1933; foi professor de poesia,cadeira criada especialrnente para ele no College de France, em 1 93 7. Escreveu La

jeuneparque (1 91 7), entre outras obras.

Vandervelde, Emile (1 866 -) 19 38 ) - socialista belga, membro do Comitê Executi-

vo da Internaciona l Socialista, foi rninistro de Estado e representante da B élgica na

Conferéncia de P az de 19 25 . Foi autor de A q ues tao agr d r ia na Belgica , entre outras

obras.

Vasconcelos, José (1882-1959) —politico, ensaIsta e fllósofo rnexicano, formou-se em direito em 1907. Norneado rninistro da Educaçao, exerceu a funçao entre

19 20 e 1 92 4, quando realizou enorrnes reformas no sisterna de ensino do pals. Em

19 29 , foi candidato a P residéncia do M exico, sem sucesso. Foi autor de La ra za cósmi-

ca (1925), IndologIa (1929) , Bolivarism oy monroIsmo (193 4) e ThdologIa (19 52 ), entre

outras obras.

W ashington, George (173 2-17 99 ) - nascido na Virginia (EUA), foi o comandan-

te-em-chefe das forças c ontinentais e um dos principais llderes da Guerra de Indepen-

dência, obrigando o general Cornawallis a se render em Yorktown, em 1 78 1. Foi tarnbém

urn rico dono de tetras e empreendedor. Em 1 78 9, tornou-se o prirneiro presidente

dos Estados Unidos.

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W ells, Herbert George ou 'Wells, H. G. (1866-1946) - romancista, jornalista,sociólogo e historiador inglés. Formado pela N ormal Sch ool of Science, de L ondres,suas principais obras são: The Time M a c h in e ( 1 8 9 5 ) , T h e I n v i s ib le M a n ( 1 8 9 7 ) e The

War of the Worlds (1898). Era membro da Sociedade Fabiana. Escreveu também

Anticipations (19 01) , The N ew M achiave l li (19 11 ) , Mr. Brit ling See s i t Through (19 16)e M ind at the End of i ts Tether (19 45 ) , entre outras obras.

Wilson, Thomas W oodrow 1856-1924) - foi o 2 8 presidente dos Estados U ni-dos, entre 1 9 1 3 e 1 9 2 1 . Criado no estado da G eorgia, estudou no Da vidson College,

no Tennessee, completando seus estudos em P rinceton. Trabalhou como advog ado e

conseguiu seu PhD em Ciência PolItica pela Johns Hopkins. Lecionou nas universida-des Bryn Maw r, Johns Hopkins e P rinceton. Em 1 9 0 2 , tornou-se reitor de Princeton.

Em 1 9 1 0 ganhou as eleiçoes para governador de N ova Jersey. Foi eleito presidente em1 9 1 2 e ficou no poder de 1 9 1 3 a 1 9 2 1 . Criou a C omissão de R elacoes Industriais, o

Federal Reserve System e a Comissáo Federal de Comércio. Também apoiou a inter-

venção de tropas de seu pals no M exico, durante o perlodo revolucionário. Ficou fa-

moso inicialmente por sua posicão isolacionista na P rimeira Guerra M undial e, depois,

por seus Quatorze Pontos, elaborados para criar as condicoes de uma "P az justa" de-

pois da guerra. Teve de desistir de vários "pontos" ap ós a C onferéncia de P aris, da qualparticipou.

Zinoviev, Gr igori Ieseievitch 1883-1936) - entrou Para o movimento da

socialdemocracia russa em 1 9 0 1 e depois do II Congresso do POSDR Se tornou

boichevique. Importante lIder da Revoluçao de O utubro. Em 1 9 2 5 , ajudou a organi-zar a "nova oposicão". Em 1 9 3 4 foi expulso do partido e, em 1 9 3 6 , foi assassinado porordens de Stalin, assim com o muitos outros lIderes da revolução.

Zola, Emile-Edouard Charles-Antoine (1840-1902) - romancista e crItico fran-cs, um dos fundadores do m ovime nto naturalista na literatura. C om o não consegu iupassar em seu exame no

baccalauréat, passou dois anos procurando em prego, ate co-meçar a trabalhar num cargo burocrático numa em presa de transporte marltimo. Em1 8 6 2 , conseguiu emprego no departamento de vendas da editora de L ouis Ch ristopheFrançois Hach ette. Seu primeiro livro foi Contes a Ninon, de 1 8 6 4 , que foi seguido porLa confession de Claude , de 1865. Foi autor de livros famosos, com o Thérèse R aquin

(1867) , La fortune des Rougon (1871) , L'assommoir (1877), Nana (1880), Germinal

(1885) , L 'ouvre (1886) e La bête humaine (1890) . Teve um a participacão ativa no casoDreyfus, escrevendoJ'accuse, uma carta denunciando o aparato militar frances. Nunca

foi eleito P ara a A cademic Française, mesmo tendo sido indicado diversas vezes pa ra setornar um de seus mem bros.

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