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III Mostra Nacional de Produção em Saúde da Família A ATENÇÃO PRIMÁRIA E A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EM UM MODELO DE ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE Brasília, 07 de agosto de 2008 Maria Rachel Jasmim de Aguiar Orientação: Carlos Eduardo Aguilera Campos IESC/UFRJ

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III Mostra Nacional de Produção em Saúde da Família

A ATENÇÃO PRIMÁRIA E A ORGANIZAÇÃO

DO TRABALHO EM UM MODELO DE

ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE

Brasília, 07 de agosto de 2008

Maria Rachel Jasmim de Aguiar

Orientação: Carlos Eduardo Aguilera CamposIESC/UFRJ

IntroduçãoNo Brasil, propostas de APS dos anos 1970 tornaram-se estratégias de

redemocratização.

Princípios (universalidade, integralidade e eqüidade) incorporados pelo

sistema de saúde.

A partir da década de 1990: municipalização das ações e serviços com

transferência gradativa da responsabilidade pela APS para os

municípios

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municípios

PSF:

ü Modelo assistencial para reorganizar o SUS a partir da APS

ü Adesão dos municípios X resistência por parte daqueles que já

organizavam a atenção à saúde e a rede de serviços com base na APS

ü Ao longo do tempo, em todo o país, incorporação e/ou adaptação de

modelos (Ex.: Programa BH Vida: Saúde Integral)

PSF (características):

ü concepção holística do processo saúde-doença

ü estabelece uma relação de vínculo-responsabilização com os usuários

ü perfil generalista dos profissionais que compõem as equipes mínimas,

porém não prevê a incorporação de inúmeros profissionais

ü expansão de forma mais ágil em municípios de pequeno e médio porte

Programa de Expansão e Consolidação da Saúde da Família

(PROESF)

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APS: lugar do processo de trabalho em saúde

ü questões do mundo do trabalho: nós críticos que se apresentam para a

melhoria da qualidade da APS

ü necessidade de ações como a multiplicação de práticas produtoras

de vínculo, acolhimento e autonomia do usuário, centradas no

usuário e na relação entre este e o trabalhador de saúde

Proposta do trabalho em equipe como forma de enfrentar o processo de

especialização na área da saúde

Portaria nº 1.065 em 2005 pelo Ministério da Saúde: criava Núcleos de

Atenção Integral na Saúde da Família para ampliar a integralidade e a

resolubilidade da Atenção à Saúde

ü constituídos por profissionais de diferentes áreas do conhecimento,

além daqueles já contemplados na equipe mínima proposta pelo

Ministério, visavam:

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q qualificação da AB com ênfase na estratégia de SF

q ampliação do acesso às ações de Atividade Física, Saúde Mental,

Reabilitação, Alimentação e Nutrição e Serviço Social

ü não foram implementados, mas teriam papel fundamental na

concretização de diversos princípios, como a integralidade

Equipe multiprofissional e redimensionamento da prática assistencial, centrada no indivíduo construção de modelo que atenda as necessidade de saúde

Com a reformulação do modelo de APS no país, há necessidade de

rediscutir o papel dos profissionais que atuam neste campo.

De um modelo anteriormente caracterizado pela distribuição dos

profissionais em programas integrais à saúde passa-se a um

sistema em que a equipe PSF responsabiliza-se por toda a

operação da APS no território.

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Partindo do pressuposto de que o processo de trabalho em saúde

e, em particular, na APS é especificidade da equipe, e não

da(s) profissão(ões), e de que deve ser tomado como política,

procuramos conhecer a forma de organização do trabalho na

APS em Belo Horizonte principalmente a partir do BH Vida:

Saúde Integral, a experiência de Saúde da Família do

município.

Debater a reorientação dos modelos assistenciais a partir

da reorganização da APS com expansão da Estratégia

de Saúde da Família, abordando aspectos do processo

de trabalho em saúde, a multi e interdisciplinaridade e

Objetivo

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enfocando a centralidade do trabalho em equipe para a

APS.

Objetivos específicosConhecer a percepção de membros da gestão e da atenção à saúde

no nível da APS de Belo Horizonte sobre:

ü organização da APS antes da implementação do BH Vida: Saúde

Integral;

ü composição das equipes de APS, inserção e papéis dos diferentes

profissionais neste nível de atenção a partir da implementação de

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programas como o PSF;

ü processo de trabalho dos profissionais da equipe e sua relação com

o modelo assistencial antes e após a implementação do programa;

ü reorientação do modelo assistencial em saúde, participação dos

sujeitos e instrumental utilizado para a mudança;

ü extinção, manutenção e/ou incorporação de estruturas de

organização do trabalho na APS anteriores ao BH Vida: Saúde

Integral.

Metodologia

Estudo de caso em 3 Unidades Básicas de Saúde localizadas em Belo Horizonte, MG e na respectiva Secretaria Municipal de Saúde.

Estratégia metodológica: análise documental referente ao

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Estratégia metodológica: análise documental referente ao modelo de assistência à saúde no município e pesquisa qualitativa através de entrevistas semi-estruturadas a sujeitos institucionais envolvidos com a gestão e a atenção do Programa BH Vida: Saúde Integral.

Critérios de escolha

ü Desenvolvimento de proposta de modelo assistencial orientado à

produção de vínculo entre o usuário e a equipe, de escuta e

atendimento às demandas da população, de autonomização e

acolhimento e de gestão como forma de governar processos de

trabalho;

ü Implementação de ações e unidades básicas de saúde antes do

surgimento do PSF

ü Formulação do Programa BH Vida: Saúde Integral como modelo de

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ü Formulação do Programa BH Vida: Saúde Integral como modelo de

APS, onde o trabalho em saúde se organiza em equipes

multiprofissionais;

ü Área metropolitana, onde é observada grande variedade de situações

de saúde na população;

ü Mudança de modelo relativamente recente, havendo pequeno volume

de trabalhos acadêmicos escritos divulgados e disponíveis, com

repercussão nacional.

Abordagem qualitativa

ü entrevistas semi-estruturadas a 11 informantes-chave:q 3 membros da Gerência de Assistência da SMSA, sendo 2

coordenadores de áreas técnicas

q 3 gerentes de unidades básicas – Centros de Saúde

3 Distritos Sanitários distintos;

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3 Distritos Sanitários distintos;

100% cobertura PSF;

vulnerabilidade à saúde (riscos) distintos

q 5 profissionais: 1 ACS, 1 auxiliar de enfermagem, 1 médico e 2 enfermeiros

Método: análise de conteúdo

Técnica: análise temática

descobrir os núcleos de sentido que compõem uma comunicação cuja presença ou freqüência signifiquem alguma coisa para o objeto analítico visado (MINAYO, 2004)

ü organização da APS

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ü trabalho e saúde

ü organização do trabalho

ü composição profissional da equipe

ü multiprofissionalidade e interdisciplinaridade

ü relação entre processo de trabalho em saúde e modelo assistencial

ü relação entre os distintos níveis de assistência

Resultados e discussão

1 - Percepções sobre a implementação do BH Vida: Saúde Integral

Impactos da Estratégia de Saúde da Família em Belo Horizonte

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“Heranças” do modelo assistencial anterior:

ü cuidado integral, VDs, concepção de território para a ação em saúde, Acolhimento – mudança no processo de trabalho

ü resultados positivos para o Programa BH Vida: Saúde Integral

Obstáculos ao PSF:

ü Modelo consolidadoü Resistência da própria gestão municipalü Maneira “autoritária” para implementação do modeloü O saber e o fazer dos profissionais: reordenar o saber acadêmico,

dividi-lo com a população, com a equipe...

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Integração do PSF à rede de serviços de saúde

Limites: falta de trabalhadores, de estrutura e de compreensão dos trabalhadores e usuários sobre o significado da APS e da mudança na forma de ofertar e produzir saúde

Integralidade do cuidado como eixo da atenção

§ Linhas do cuidado

Modelos matriciais de organização da atenção à saúde que visam a integralidade do cuidado, integram as ações de promoção, prevenção, vigilância e assistência e permitem a condução oportuna dos pacientes pelos diversos níveis de atenção (BRASIL, 2006)

Linha de produção do cuidado

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USUÁRIO Linha de Produção do Cuidado

(estruturada por projetos terapêuticos)

UBS, PSF e todo

cardápio de serviços

Apoio Diagnóstico e Terapêutico

Medicamentos Serviço de Especialidades

Outros serviços

Fonte: FRANCO; MAGALHÃES Jr., 2003, p. 130

Surgimento em BH - “Primeira experiência de radical integralidade na atenção à saúde” (FRANCO; MAGALHÃES Jr., 2003)

Exige o trabalho integrado

A equipe da UBS ou ESF tem responsabilidade sob o cuidado ao longo de toda a cadeia produtiva e deve ser gestora do projeto terapêutico

concretização da intervenção de ponta a ponta

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ü concretização da intervenção de ponta a ponta

ü acompanhamento do usuário na rede de serviços, mapeando recursos disponíveis, fluxos e mecanismos de regulação

ü precisam ser mais difundidas para que não se reproduza a fragmentação do cuidado e alienação do trabalho em saúde.

Universalidade vs consumo em saúde

• “universalidade vs território adscrito”

O primeiro atendimento eu tenho que acolher, porque o acolhimento éum princípio do SUS. (...) eu vou atendê-lo, mas vou fazer umencaminhamento para o responsável desse paciente, para onde ele vaiser melhor cuidado. (Gerente C)

• universalidade e consumismo

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Acesso a equipamentos, insumos e serviços com a premissa da universalidade à procura por inovações tecnológicas por parte de profissionais e usuários

APS: não necessita comportar maquinários e procedimentos tecnologicamente mais densos.

Caso contrário: lógica procedimento-centrada, dura tecnologicamente, resistente à inversão do modelo hegemônico e à reorientação do processo de trabalho em saúde.

2 – A organização do trabalho na APS sob uma perspectiva “sistêmica”

Estabilização de ESF: desafio

ü ESF sem sua configuração mínima – fatores:Alta rotatividadeLocalização dos CS e classificação de riscoProcesso de trabalho no interior dos CS

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Processo de trabalho no interior dos CS

ü Estrutura (física) das unidades de saúde

Estratégias:

ü Colegiado gestor, diálogo com as equipesü Educação permanenteü Concursos públicos

3 – A organização dos processos de trabalho na APS

Ampliação do acesso

O BH Vida: Saúde Integral atingiu população desconhecida pelos CS no modelo baseado na demanda, esp. adulto e idoso

Acolhimento: dispositivo para garantia de entrada da demanda espontânea dos usuários nas unidades, ultrapassando a lógica “programática”

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“programática”

Porém, aumento da demanda:ü sobrecarga, insatisfação, cansaço e sofrimentoü evidência da falta numérica de determinados profissionais

Contudo, a garantia de acesso a toda a população é um dos pontos mais fortes do programa.

Organização do trabalho em equipe

Pouca clareza das atribuições dos profissionais agrava a já existente dificuldade de se trabalhar em equipe

Trabalho em equipe: predomínio de abordagem agrupada (e não integrada) ( PEDUZZI, 1998; 2001

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Necessidade de integração do trabalho internamente à ESF e com o CS como um todo (demais ESF, apoio, gerência etc)

Recomendação SMSA: Reuniões entre profissionais dos CS e das ESF para organização dos fluxos da unidade e das equipes e para divisão e delegação de tarefas.

Pressupostos para o trabalho na APS

Predomínio da Clínica como corpo de conhecimentos na prática de saúde

ü no entanto, ACS apresenta o conhecimento do território, a relação de vizinhança e laços solidários que constroem (“tecnologia leve” – MERHY, 2002)

Na minha atuação em saúde, eu como agente comunitário, a técnica

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Na minha atuação em saúde, eu como agente comunitário, a técnicaque vejo é a da saúde mesmo, é entre população e o centro, e oposto. (...) Eu sou uma base chave porque desde a hora que eu saiopara trabalhar eu ouço, eu vejo o que as pessoas, as opiniões (ACS)

Resgate do debate da clínica ampliada: o profissional de saúde, além de saber fazer, precisa construir uma relação com o usuário que resulte em responsabilidade, liberdade e compromisso

4 – Multiprofissionalidade e interdisciplinaridade

Possibilidades para a aproximação de conhecimentos na construção de projetos terapêuticos, para a troca de informações e para a busca de objetivos comuns dentro da equipe

Composição das equipes

Nível central: equipe mínima

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Nível central: equipe mínima

Profissionais das ESF e gerentes de CS: ampliação das equipes, porém:ü Incorporação na ESF vs supervisão/apoio

Incorporação de outros profissionais às equipes como “solução” para a contra-referência

Núcleos de Apoio em Reabilitação e Núcleos de Atenção Integral à Saúde da Família

NAR: 16 profissionais- Implementados em 2 Distritos Sanitários- Prioridade: portadores de deficiência e incapacidades- Atuação conjunta com ESF

ü inserção de outros saberes e profissionais na APSapoio e suporte às ESF, complementando a atuação destas com

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ü apoio e suporte às ESF, complementando a atuação destas com apoio matricial

Porta de entradaü Característica da APS (e não um atributo profissional ou individual)ü Acolhimento: encaminhamento para consultas, grupos operativos e

toda sorte de atividades no âmbito do CS, bem como para ações de outros profissionais na APS (as quais devem ser ofertadas)

5 – Visita domiciliar

Cotidiano das ESF, pp. ACS, mas deve ser estruturada e realizada sob a perspectiva multiprofissional e interdisciplinar

ü Superação da divisão social e técnica do trabalho (modelo “simplificado”?)

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Melhoria da qualidade do trabalho em saúde quando utilizada também por outros profissionais

6 – Processo de trabalho e relações de rede

ü Desafio: garantir articulação da rede de serviços e acesso aos demais níveis

• Linhas do cuidado: linhas da vida, expressão

da longitudinalidade

- aporte regular de cuidados pela equipe e uso consistente ao longo do tempo

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longo do tempo

- relação pessoal duradoura entre um paciente e um profissional ou equipe

e da coordenação das ações e serviços

Pois buscam garantir o caminhar do usuário pelos diferentes níveis de atenção do sistema e o acesso seguro às tecnologias necessárias à assistência.

7 – Concepção de modelo assistencial

Ações de promoção, prevenção e vigilância, diversificando as ações estritamente terapêuticas

Atenção à demanda dos usuários dificultou uma melhor organização de ações programadas e de vigilância:ü equipes se ressentem de não estarem “fazendo PSF” por não

“fazerem promoção e prevenção”

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“fazerem promoção e prevenção”ü APS é mais que promoção e esta depende de ações

intersetoriais

Relação entre processo de trabalho e modelo assistencial:ü Para um modelo produtor de cuidado e de vínculo, é

necessária a persistência do Acolhimento e ampliação e consolidação do trabalho em equipe multiprofissional

A intervenção de saúde através do BH Vida: SaúdeIntegral revelou um período de transição do modeloassistencial, levando a alterações no funcionamento dosCS e no processo de trabalho dos diversosprofissionais, enfocando o trabalho em equipe e com

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profissionais, enfocando o trabalho em equipe e comreferência na família.

O BH Vida: Saúde Integral traz subsídios para o debate da APS, cada vez mais compreendida e valorizada como estruturante do modelo assistencial à saúdeü tempos de expansão e consolidação em grandes centros...

A mudança é sempre necessária, seja para a inversão de um dado modo de agir, de processar o trabalho ou de organizar o trabalho.

Recomendações

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modo de agir, de processar o trabalho ou de organizar o trabalho.

Debates acerca da incorporação de novos profissionais devem ser feitos, recusando-se a defesa corporativista mas lutando pela ü melhoria da qualidade da atenção eü garantia de prestação de cuidado em uma linha que permita ao

usuário caminhar na rede de serviços de saúde e andar na vida.

Projeto terapêutico deve ser interdisciplinar para garantia da integralidade

Superação das dificuldades para a conformação do trabalho em equipe – eixos:

ü Conhecer o trabalho do outroü Reconhecer a dinamicidade das equipes

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ü Reconhecer a dinamicidade das equipesü Pensar além das fronteiras disciplinares e profissionaisü Compreender a equipe como ferramenta para a integralidade

Multiprofissionalidade e interdisciplinaridade: desafios para que os modelos assistenciais sejam realmente pautados nas necessidades dos usuários

Faz-se necessário resistir e lutar pela transformação da sociedade, de modo a superar os entraves que caracterizam a atual ordem social, caminhando em direção a uma forma social em que os indivíduos e coletividades se organizem voluntária e conscientemente na busca pela superação da atual divisão e desumanização do homem e divisão do trabalho.

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desumanização do homem e divisão do trabalho.

Sem dúvida, isto produzirá a inversão do modo de produção da saúde.

Obrigada!

MARIA RACHEL JASMIM DE [email protected]