maria elisa esteves lopes galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não...

12
Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005 121 M ATEMÁTICA As secções cônicas e suas aplicações Fábio Silva Melo Pesquisador Maria Elisa Esteves Lopes Galvão Orientador Resumo Desde a antiguidade as secções cônicas despertam o interesse dos matemáticos. Entre os geômetras gregos, na busca pela resolução do clássico problema da duplicação do cubo, destacamos Menaecmo, que exibiu um método de obtenção dessas curvas seccionando um cone por um plano perpendicular a sua geratriz. Conforme o ângulo do cone fosse agudo, reto ou obtuso, obtinham-se as curvas que hoje conhecemos por elipse, parábola e hipérbole. No decorrer dos séculos as cônicas foram objeto de estudo dos matemáticos e cientistas. O astrônomo Kepler formulou as três leis do movimento planetário, onde, pela primeira vez, é dito que os planetas têm órbitas elípticas, um belo exemplo de identificação das curvas com as formas da natureza. O estudo das cônicas se justifica não apenas pelo lado histórico, mas também pela aplicação em diversas áreas da tecnologia, construção civil e Física. O trabalho se desenvolveu através de pesquisa bibliográfica em livros, revistas especializadas e Internet, bem como construção de modelos concretos para uso didático. O estudo abriu novos horizontes para uma abordagem de melhor qualidade, mais motivadora e objetiva do que se pode fazer numa sala de aula. Palavras- chave : Cônicas. Elipse. Geometria. Parábola. Hipérbole. Secções cônicas. Abstract Since Antiquity, conic sections have caught the interest of mathematicians. Among the Greek geometers, on the search of the solution of the classic problems of the duplication of the cube, it is important to note the importance of the works of Menaecmo, who developed a method to obtain these curves by sectioning a cone by a plan perpendicular to its geratrix. According to the angle of the cone (acute, straight, or obtuse), the curves known today as ellipsis, parabola, and hyperbole were obtained. Through the centuries, conics have been the object of study of mathematicians and scientists. The astronomer Kepler formulated the three laws of the planets´ movement, where, for the first time, it was said that the planets have elliptical orbits - a nice example of identification of the curves with Nature’s shapes. The study of conics does not justify itself only by its historic side, but also by its application in various areas of technology, civil construction, and Physics. The study was developed through bibliographic research on books, specialized magazines, and on the Internet, as well as through the construction of concrete models for didactical use. The study opened new horizons to an approach with better quality, more motivating and straightforward than it may be done inside the classroom. Key-words : Conics. Conics sections. Ellipse. Geometry. Parabola. Hyperbola.

Upload: vuphuc

Post on 09-Nov-2018

221 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

121

MATEMÁTICAAs secções cônicas e suas aplicações

Fábio Silva MeloPesquisador

Maria Elisa Esteves Lopes GalvãoOrientador

Resumo

Desde a antiguidade as secções cônicas despertam o interesse dos matemáticos. Entre os geômetras gregos, na busca pela

resolução do clássico problema da duplicação do cubo, destacamos Menaecmo, que exibiu um método de obtenção dessas

curvas seccionando um cone por um plano perpendicular a sua geratriz. Conforme o ângulo do cone fosse agudo, reto ou

obtuso, obtinham-se as curvas que hoje conhecemos por elipse, parábola e hipérbole. No decorrer dos séculos as cônicas

foram objeto de estudo dos matemáticos e cientistas. O astrônomo Kepler formulou as três leis do movimento planetário,

onde, pela primeira vez, é dito que os planetas têm órbitas elípticas, um belo exemplo de identificação das curvas com as

formas da natureza. O estudo das cônicas se justifica não apenas pelo lado histórico, mas também pela aplicação em

diversas áreas da tecnologia, construção civil e Física. O trabalho se desenvolveu através de pesquisa bibliográfica em

livros, revistas especializadas e Internet, bem como construção de modelos concretos para uso didático. O estudo abriu

novos horizontes para uma abordagem de melhor qualidade, mais motivadora e objetiva do que se pode fazer numa sala

de aula.

Palavras-chave: Cônicas. Elipse. Geometria. Parábola. Hipérbole. Secções cônicas.

Abstract

Since Antiquity, conic sections have caught the interest of mathematicians. Among the Greek geometers, on the search of

the solution of the classic problems of the duplication of the cube, it is important to note the importance of the works of

Menaecmo, who developed a method to obtain these curves by sectioning a cone by a plan perpendicular to its geratrix.

According to the angle of the cone (acute, straight, or obtuse), the curves known today as ellipsis, parabola, and hyperbole

were obtained. Through the centuries, conics have been the object of study of mathematicians and scientists. The astronomer

Kepler formulated the three laws of the planets movement, where, for the first time, it was said that the planets have

elliptical orbits - a nice example of identification of the curves with Nature’s shapes. The study of conics does not justify

itself only by its historic side, but also by its application in various areas of technology, civil construction, and Physics. The

study was developed through bibliographic research on books, specialized magazines, and on the Internet, as well as

through the construction of concrete models for didactical use. The study opened new horizons to an approach with better

quality, more motivating and straightforward than it may be done inside the classroom.

Key-words: Conics. Conics sections. Ellipse. Geometry. Parabola. Hyperbola.

Page 2: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

122

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

Fábio Silva Melo

Primeiramente podemos nos perguntar: “O que é uma

secção cônica?” Secção cônica é uma curva que pode

ser obtida seccionando um cone de revolução por um

plano, a exemplo da figura abaixo. Se o plano secante

não passa pelo vértice do cone, então temos uma família

de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas,

que são a elipse, a parábola e a hipérbole.

O povo da ilha de Delos, sudeste da Grécia, por volta

do século V a.C. foi assolado por uma epidemia que

dizimava sua população. Então, pelos costumes religiosos

da época, consultaram um oráculo e foram informados

por Zeus que deveriam duplicar o altar de Apolo em

Delfos, na costa do Golfo de Corinto. O formato cúbico

do altar levou muitos geômetras a uma busca pelo então

formado problema da duplicação do cubo, que junto

com o problema da trissecção do ângulo e quadratura

do círculo, foram os mais conhecidos problemas da

antigüidade clássica.

O primeiro passo foi dado por Hipócrates de Chios

(século V a.C.) que reduziu o problema na solução da

proporção 2a x yx y a . Tal proporção nos leva a

encontrar 3 3 32 2x a x a , tarefa difícil para

os matemáticos gregos que dispunham apenas de régua

não graduada e compasso, e mostrando-se possível

apenas no século XIX.

A Menaecmo (por volta do século IV a.C.) coube o

mérito de obter uma descrição para a solução quando

fez a intersecção de duas parábolas da forma (na grafia

atual) 2x ay e 2 2y ax , onde a intersecção ocorre

no ponto 3 32, 4a a . Também a ele cabe a menção

de ter alcançado uma maneira de obter essas curvas na

secção de um cone. Para isso, considerava a secção de

um cone por um plano perpendicular a uma geratriz.

Conforme o ângulo do cone fosse agudo, reto ou obtuso,

obtinha-se a el i pse, parábola e hipérbole,

respectivamente. Entretanto, até então se trabalhava com

o cone de uma folha.

Ainda da Grécia antiga não podemos deixar de

mencionar Apolônio de Pérgamo (século III a.C.). Seu

trabalho foi de tal profundidade que marcou uma

revolução no conhecimento das cônicas. Os nomes pelos

quais as conhecemos hoje são de sua atribuição. Pelo

foco da curva e perpendicular ao eixo focal há o latus

rectum, segmento particular de cada curva. Em cada

ponto, se considerarmos um retângulo com essa altura,

na medida onde retângulo intercepta a curva, faz-se um

quadrado; conforme a área do retângulo é menor, igual

ou superior à área do quadrado, temos a elleipsis, a

parabole e a hyperbole, que significam “falta”,

“igualdade” e “excesso”.

Page 3: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

123

As secções cônicas e suas aplicações

Apolônio introduziu o cone de duas folhas gerado

pelo conjunto de retas que passam por uma

circunferência e um ponto fora do ponto desta; assim,

obteve a hipérbole com dois ramos da maneira que

conhecemos hoje. O trabalho de Apolônio foi editado

numa obra inti tulada “As Cônicas”, composta

originalmente em oito volumes, dos quais o último se

perdeu. No século XVIII Edmund Halley fez uma

tradução dos sete exemplares existentes.

Pappus de Alexandria (século IV d.C.) foi o último

geômetra da antiguidade que contribuiu efetivamente

para o estudo das cônicas, demonstrando a propriedade

foco-diretriz, equivalente às secções feitas por Apolônio.

Sendo P um ponto da curva, r sua diretriz e a razão

podemos formular:

na elipse ocorre 0 < e < 1, na parábola e = 1 e na

hipérbole e > 1 . Definir as cônicas como lugares

geométricos no plano com essa propriedade, equivale a

obter a secção de um cone por um plano que intercepta

todas as suas geratrizes, ou que seja paralelo a uma

delas ou que intercepte as duas folhas do cone.

No século XVII, Johannes Kepler (1571 a 1630)

descobriu e enunciou as três leis do movimento

planetário:

1ª Lei ou lei das órbitas: Todos os planetas

descrevem órbitas elípticas em torno do Sol e este ocupa

um dos focos. Ao deduzir-se essa lei chegamos à equação

polar da elipse:

sendo que r é a r distância do planeta ao Sol em função

do ângulo, que chamamos de raio vetor; ´e é a

excentricidade, em particular, da Terra é e = 0,016637,

ou seja, a órbita da Terra é “quase” uma circunferência,

r0 é o raio inicial, ou seja, para

2ª Lei ou lei das áreas: O raio vetor que une o Sol a

qualquer planeta varre áreas iguais em intervalos de

tempos iguais; o planeta ao passar próximo do Sol

desenvolve uma velocidade maior que estando longe dele.

3ª Lei ou lei dos períodos: O quadrado do período

de revolução de um planeta é proporcional ao semi-

eixo maior de sua órbita, ou

onde T é o período (tempo para uma revolução completa

ao redor do Sol), a é a medida do semi-eixo maior da

elipse, G = 6,6726 . 10-11 N . m2 . kg-2 é a constante de

gravitação universal e M = 1,99 . 1030 kg a massa do

Sol. A princípio Kepler entristeceu-se ao descobrir que

a órbita da Terra era elíptica e não circular como se

acreditou por muito tempo, e também pelo lado religioso,

pois na época acreditava-se que as construções de Deus

eram perfeitas, tendo em vista que a elipse não era

considerada uma curva perfeita.

Podemos dizer que Kepler reviveu o assunto das

cônicas, e depois dele muitos outros geômetras

estudaram-nas, particularmente quando do surgimento

da Geometria Projetiva, com a qual é possível dar um

,,

d P Fe

d P r

011 cos

e rr

e

2 3 32 3

3

4 4T T aa GM GM

Page 4: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

124

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

Fábio Silva Melo

outro enfoque a essas curvas. Podemos destacar o francês

Charles J. Brianchon (1785 a 1864), autor do célebre teorema

que leva seu nome: as diagonais de um hexágono (pode ser

estendido ao triângulo, quadrado e pentágono) circunscrito

a uma cônica são concorrentes num ponto, chamado ponto

de Brianchon. Não só Brianchon, mas podemos citar muitos

outros e muitas obras escritas sobre o assunto do século

XVI em diante. Entre eles, Blaise Pascal, Girárd Desargues e

René Descartes.

As definições e os principais elementos dessas curvas

podem hoje ser dadas mais facilmente, recorrendo à

Geometria Analítica Plana, que foi criada por Descartes

e Fermat, motivados exatamente por problemas e técnicas

contidas no trabalho de Apolônio.

Dados dois pontos distintos, F1 e F2, que chamamos

de focos, a elipse pode ser entendida como o conjunto

dos pontos do plano cuja soma das distâncias a esses

focos é uma constante 2a, isto é, PF1 + PF2 = 2a.

O ponto médio do segmento F1F2, o centro da elipse,

é tomado como a origem de um sistema coordenado

e ao longo do eixo dos x colocamos esse mesmo

segmento. A equação reduzida da el ipse f ica2 2

2 2 1x ya b

, onde a é a medida do semi-eixo maior

e b é a medida do semi-eixo menor. O valor da constante

c é dado por a2 = b2 + c2. A elipse tem duas retas diretrizes

de equação 2ax

c .

Dada uma reta r , chamada de diretriz, e um ponto F,

que chamamos de foco, de modo que F r, a parábola

pode ser entendida como o conjunto dos pontos do

plano que eqüidistam do ponto e da reta. Colocando o

ponto médio entre F e r, o vértice da parábola, sobre a

origem de um sistema de eixos e abaixo do eixo dos x

a diretriz, a equação reduzida da parábola fica

x2 = 4py , onde 2p é a distância do foco à diretriz.

Dados dois pontos distintos F1 e F2, que obviamente

serão chamados de focos, a hipérbole pode ser entendida

como o conjunto de pontos do plano cuja diferença em

módulo é uma constante 2a, ou seja, PF1 - PF2 = 2a.

Do mesmo modo que fizemos na elipse, colocando a

hipérbole sobre o plano ordenado, coincidindo seu

centro com o centro deste, sua equação reduzida fica

x2 _ y2= 1

a2 b2

A medida a é a do semi-eixo transverso, b é a medida

do semi-eixo imaginário e c pode ser obtida por

c2 = a2 + b2. Familiarizados com os principais termos

Page 5: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

125

As secções cônicas e suas aplicações

quando trocamos a circunferência pela esfera. Sendo

assim, temos PF1 PV1 pois são tangentes a E1 por P;

do mesmo modo PF2 PV2 pois são tangentes a E2 por

P. Assim, a propriedade métrica pode ser escrita como

PV1 + PV2 = PF1 + PF2 = V1V2, como o segmento V1V2 é

de comprimento constante, podemos determinar que

V1V2 = 2a, logo, PF1 + PF2 = 2a.

Tomamos um plano que contenha uma geratriz do

cone. Qualquer plano paralelo e não coincidente a este

tem na secção uma curva que é uma parábola. Inserimos

a esfera E que tangencia o cone segundo a circunferência

G e o plano secante no ponto F. Escolhemos um ponto

P sobre a curva e traçamos a geratriz . S e j a

M = PV G. A reta r, diretriz da curva, é dada pela

intersecção do plano que contém a diretriz G e o plano

de secção. Pela mesma propriedade citada acima, temos

PM PF IS. Provando que PF1 PL1, onde PL1 é a

PVsuur

dessas curvas, já podemos dar um tratamento mais

técnico e compreender suas múltiplas aplicações.

Outro personagem importante foi o belga Germinal

Pierre Dandelin (1794 a 1847) que, juntamente com

Lambert Adolphe Jacques Quételet (belga, 1796 a 1874),

demonstrou, de uma forma bastante interessante, a

propriedade métrica das cônicas como a secção de um

cone circular reto. O trabalho desse matemático ficou

conhecido por três denominações: “teorema de

Dandelin”, “teoremas belgas” e “esferas de Dandelin”

devido à inserção destas no cone. Demonstraremos esses

resultados em linhas bem gerais.

Fazendo a secção no cone de modo que o plano

secante intercepte todas as geratrizes do cone, a curva

de da intersecção obtida é uma elipse. Inserimos as

esferas E1 e E2 n semi-planos superior e inferior

determinado pelo plano secante. Essas esferas

tangenciam o plano secante nos pontos F1 e F2 (focos).

Sejam C1 e C2 as circunferências de tangência das esferas

E1 e E2, respectivamente, com o cone, conforme a figura

9. Tomamos um ponto P qualquer da curva e

por ele traçamos a geratriz PV (V é o vértice). Sejam

V1 = C1 PV e V2 = C2 PV. Da geometria plana

sabemos que dois segmentos tangentes a uma

circunferência por um ponto fora dela são congruentes,

sendo o mesmo válido para a Geometria Espacial,

Page 6: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

126

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

Fábio Silva Melo

distância de P a r, provamos a propriedade métrica da

parábola. Sejam N = s VB e S = s T .Como t // VB,

a figura BNSI é um paralelogramo, logo, BN // SI. Como

MP PF BN IS PL PF, portanto, a curva é uma

parábola.

Para obtermos a hipérbole, o plano deve seccionar

as duas folhas de um cone de vértice V. No cone

inserimos as esferas E1 e E2, que tangenciam o cone

segundo as circunferências C1 e C2, respectivamente; e

também, tangenciam o plano secante em F1 e F2 (focos).

Escolhemos um ponto P da curva e por ele

traçamos a geratriz PV. Sejam V1 = C1 PV e

V2 = C2 PV. Usando a mesma propriedade já

citada, temos PV1 PF1, pois são tangentes a E1 por P;

analogamente, PV2 PF2, tangentes a E2 por P. A

propriedade métrica da hipérbole pode ser escrita da

forma PF1 - PF2 = PV1 - PV2 = V1V2, como o segmento

V1V2 tem tamanho fixo para qualquer ponto tomado

sobre a curva (independe do ponto), então podemos

estabelecer V1V2 = 2a e conseqüentemente,

PF1 - PF2 = 2a. Está demonstrada a propriedade métrica

da hipérbole.

Aplicações muito importantes dessas curvas ocorrem

na tecnologia. Quando nos deparamos com antenas

paraból icas, telescópios e “salões ovais” temos

aplicações diretas da propriedade refletora das cônicas.

Numa elipse, os raios luminosos ou sonoros que saem

de um dos focos, ao incidirem na superfície elíptica

interna, são refletidos para o outro foco. Numa parábola

os raios que incidem sobre um espelho ou superfície no

formato parabólico, desde que paralelos ao eixo da

curva, são refletidos para o foco; do mesmo modo, os

Page 7: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

127

As secções cônicas e suas aplicações

raios enviados do foco, ao incidirem sobre a curva, são

refletidos paralelamente ao eixo. Numa hipérbole os

raios emi tidos de um dos focos, ao incidi rem

(“internamente”) sobre a superfície hiperbólica, são

refletidos como se tivessem partido do outro foco; ou,

Temos ainda vários outros métodos de construção

das cônicas. Em analogia com o papel quadriculado,

podemos elaborar um “papel circulado”; ou seja,

marcam-se dois pontos, F1 e F2, na folha e desenham-se

circunferências concêntricas de modo que a diferença

do raio de uma para outra seja uma constante h

Com 2c = 7h, coloquemos ci rcunferências

centralizadas ora em F1 ora em F2, cujos raios vão se

abrindo de h, ou seja, o raio da mais externa é maior

em h unidades. Nomeemos as circunferências de

centro em F1 de para i = 2, 3, ...; assim, a

circunferência tem centro em F1 e raio 2h. Da

os raios que incidem (“externamente”) sobre a superfície

na direção de um foco, são desviados e vão para o

outro foco. Para demonstração desses fatos, podemos

usar as equações paramétricas das cônicas ou mesmo a

Geometria Plana.

mesma maneira, àquelas centralizadas em F2 chamemos

d e para j= 2, 3, ... .

Escolheremos pontos de intersecção da maneira

para

pois 2a = 11h. Note-se que para cada intersecção teremos

dois pontos a serem marcados. Estes são pontos de uma

elipse.

Procedendo assim, teremos os pontos de uma elipse.

Tal afirmação é verdadeira pois a soma das distâncias

de P a F1 e de P a F2 é sempre constante igual a 11h, o

que confere com a definição métrica da elipse.1,ih£

1,2h£

2, jh£

1, 2,ih jhP £ £ , : 1 1i j i j h h

*h ¡

Page 8: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

128

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

Fábio Silva Melo

Façamos a distância entre F1 e F2 valer 2c. Traçamos

os pontos de intersecção de modo que

1, 2,ih jhP £ £ para , : 2i j i j h h ,

pois agora fazemos 2a = 2h. Da mesma maneira, para

cada intersecção teremos um par de pontos.

A curva obtida nesse processo é uma hipérbole pois

a diferença entre as distâncias de P a F1 e de P a F2 é

sempre constante igual a 2h, o que confere com a

definição métrica da hipérbole. Por exemplo, um ponto

dado por 1,3 2,5h h£ £ é de uma hipérbole pois

1 2 5 3 2PF PF h h h .

Para a construção da parábola devemos proceder

de uma maneira diferente na construção do papel

circulado. Escolhemos no plano uma reta r e fora dela

um ponto F, que serão, respectivamente, a diretriz e o

foco da curva. Seja *h ¡ , com o qual faremos o

parâmetro da curva valer 2h = p. Centralizadas em F,

desenhamos uma família de circunferências ih£ , onde

i = 2, 3, ... indica quantas vezes h é o raio da

circunferência. Restringimos o índice i para os inteiros

maiores que 2 pois a primeira circunferência tangenciará

a curva no vértice que dista 2h do foco. Paralelas à

diretriz, traçaremos uma famíl ia de retas sjh para

j = 2, 3, ...; assim, a reta s3h é a reta paralela à diretriz e

que dista 3h. Restringimos os valores do índice j para

os inteiros maiores que 2 pois a reta mais próxima da

diretriz deve distar de si 2h , pois tangenciará a curva

no vértice.

Tracemos pontos de intersecção da manei ra

ih jhP s £ para , :i j i j e, mais uma vez,

percebamos que haverá sempre dois pontos a serem

marcados a cada intersecção, pois, com exceção de 2h£e s2h que são tangentes, os demais pares são secantes.

Pela definição métrica dessa curva, que é o conjunto

de pontos do plano que eqüidistam de uma reta e de um

ponto fora dela, verificamos que a curva assim produzida

é de fato uma parábola.

Podemos obter uma elipse também com a seguinte

construção: traçamos duas retas paralelas e marcamos

pontos simetricamente, em cada uma, nos valores

inteiros de -10 a 10. Em seguida, basta ligar essas retas

de modo que o valor em uma delas seja o inverso na

outra, isto é, ligar os valores x com 1 .

x

Page 9: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

129

As secções cônicas e suas aplicações

Ainda sobre a mesma cônica, a seguinte construção

também resulta na elipse: façamos um retângulo ABCD

de altura AD = a e largura DC = 2a (a largura é o dobro

da altura). Traçamos os segmentos que dividem o

retângulo original em quatro retângulos menores de

2aa , isto é, um segmento ST paralelo à base (de

medida 2a) na altura (ordenada) a e um segmento VW

paralelo a AD distante de a, conforme a figura 20.

Dividiremos AD e BC em oito segmentos congruentes.

O mesmo faremos a ST. Considerando ST como o “marco

zero”, adotamos a cada um dos quatro pontos de AS e

SD os valores 1’, 2’ e 3’, idem para o lado BC.

Centralizamos ST sobre o eixo dos x de um sistema

coordenado, de modo que ST VW = O seja a origem

desse sistema. Então, aos quatro segmentos de SO e OT

marquemos valores 1, 2 e 3. Teremos pontos da elipse

pela intersecção de segmentos determinados da seguinte

maneira: que partem de W e passam por 1 de SO e que

partem de V e passam por 1’ de AS, assim para os demais

valores; para o lado direito, segmentos que partem de

W e passam por 1 de OT e que partem de V e passam

por 1’ de BT. O ponto em que cada par de segmentos

nessas configurações se cruza pertence à elipse de

equação reduzida 2 2

22: 1

2

x ya a

ou

x2 + 4y2 = a2. Podemos generalizar os pontos de

intersecção da forma P = WJ VJ’ , com J = 1, 2, 3 e

J’ = 1’, 2’, 3’.

Para a parábola podemos construí-la traçando dois

segmentos de retas concorrentes e marcando sobre eles

pontos a uma mesma distância. Em cada um deles

numeramos os pontos de 1 a 10, sendo o primeiro o

mais próximo do ponto de concorrência. Ligando um

ponto de um segmento com um ponto do outro, da

forma 1 10, 2 10 , obtemos uma

parábola envolta por suas tangentes.

Muitos de nós já vimos nos livros de Gramática os

termos elipse, parábola e hipérbole. Segundo a Gramática

são figuras de linguagem. Porém, a Matemática as

considera como curvas. Será que há alguma ligação?

Antes de entrarmos nesses detalhes, teremos que

compreender o conceito do Latus Rectum de uma cônica.

Tal segmento é perpendicular ao eixo de simetria da

curva e passa pelo foco. Desenvolvendo os cálculos

analiticamente, concluímos que na elipse e na hipérbole

mede 22b

a e na parábola 4p. Coloquemos esse

segmento sobre o vértice da cônica e construímos um

retângulo a uma largura qualquer. O ponto em que a

aresta interceptar a cônica dará o comprimento do lado

do quadrado que devemos fazer, conforme a figura 22.

Seja AQ a área do quadrado e AR a do retângulo.

Page 10: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

130

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

Fábio Silva Melo

e que é facilmente identificado” (PASCHOALIN, 1989,

p. 365). Analisando a parábola, conclui-se que em

AQ = AR, há igualdade das áreas; pela Gramática:

“Narração alegórica na qual o conjunto de elementos

evoca, por comparação (igualdade), outras realidades

de ordem superior” (FERREIRA, 1988, p. 481). Por último,

na hipérbole ocorre AQ > AR, ou seja, há excesso de

áreas comparando o quadrado e o retângulo; analisando

a Gramática: “Figura que através do exagero (excesso)

procura tornar mai s expressiva uma idéia”

(PASCHOALIN, 1989, p. 363).

Muitas são as atividades que podem ser desenvolvidas

com alunos do Ensino Médio no que se refere ao assunto

das secções cônicas. Certamente, maior será a satisfação

de uma classe quando os alunos perceberem que o

conteúdo dos l ivros e as “enfadonhas” aulas de

Matemática podem estar presentes em suas vidas, na

natureza ou na tecnologia. Novas formas de abordar

um conteúdo, diferente de “aulas régias”, resultam em

maior participação aos alunos. Certamente, uma

contribuição generosa ao futuro docente da Matemática.

No que se refere à atividade de pesquisa, de iniciação

científica precisamente, temos certeza de que foi uma

at ivi dade intel ectualmente grat i f i cante e

profissionalmente compensadora, pela experiência

proporcionada. Pois pesquisar, tentar compreender os

detalhes de cada teoria, escrever os resultados

encontrados trazem um novo conceito de aprendizagem:

a aprendizagem independente.

É possível calcular as diferenças entre as áreas AQ e

AR. Para a elipse chegaremos à conclusão de que

AQ < AR, ou seja, há falta de área no quadrado em

relação ao retângulo; segundo a Gramática, eis a

definição de elipse: “Ocorre quando há o ocultamento

(falta) de um termo, que fica subentendido pelo contexto

Page 11: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste

Revista PIBIC, v. 2, p. 121-131, 2005

131

As secções cônicas e suas aplicações

Referências

ÁVILA, Geraldo S. S. Kepler e a órbita elíptica. Revista do Professor de Matemática, Rio de Janeiro, n. 15, 1989.

____________. A hipérbole e os telescópios. Revista do Professor de Matemática, Rio de Janeiro, n. 34, 1997.

BOLT, Brian. Actividades matemáticas. Lisboa: Gradiva, 1991.

____________. Mais actividades matemáticas. Lisboa: Gradiva, 1992.

BOULOS, Paulo; CAMARGO, Ivan de. Geometria analítica, um tratamento vetorial. São Paulo: Makron Books, 1987.

BOYER, C. A história da matemática. São Paulo: Edgard Blücher, 1999.

CARVALHO, Thales Mello. Matemática, 2º ciclo. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1969.

LEITHOLD, Louis. O cálculo com geometria analítica. 3. ed. São Paulo: Harbra, 1994, v. 1.

MARIN, André Perez; PAULA, Carlos F. de. Elementos de geometria. Campinas: Tipografia a Vapor Livro Azul, 1912.

THOMAS Jr., George B. et al. Cálculo. São Paulo: Addison Wesley, 2002, v. 1-2.

Page 12: Maria Elisa Esteves Lopes Galvão - unifieo.br · de curvas que chamamos de cônicas não degeneradas, que são a elipse, a parábola e a hipérbole. O povo da ilha de Delos, sudeste