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Vida de artista independente é difícil. Especialmente se o trabalho não se encaixa no muito mainstream, é bastante fácil dele se per-der no mar de produção cultural que existe hoje em dia. Grandes obras e incríveis autores não conseguem alçar voo – uma perda tanto para o artista quanto para o público em geral. Com isso em mente, criamos a Margem. Aqui vamos trazer várias dessas pérolas do cenário underground do Brasil para que se apresen-tem, falem um pouco sobre o que fazem e até para darem al-gumas dicas a quem interessar. Porque a Margem é para isso: é para quem curte, é para quem faz, é para quem está tentan-do fazer. Para todos nós, artistas e entusiastas da arte marginal.

Ah, e asseguramos que aqui não tem preconceito e categori-zação idiota: se você tem o que mostrar e o que dizer, é mais do que bem-vindo a se juntar à nossa mescla. Nessa edição sobre Música Independente, você encontrará vários artistas de vários contextos, estilos e portes diferentes. Entrevistamos o gênio do violão de doze cordas John Ainsworth contando experiências, di-ficuldades e tudo o mais; o Mestre Toni Vargas, que lançou um CD só de músicas de capoeira; o percursionista Luca Lisboa do Empolga às 9... Trazemos todas as dicas que Alexandre Cavalo, guitarrista da banda Velhas Virgens, tinha para dar para se virar como músico independente. Explicamos – alguém tinha que faz-er, não é? – o copyleft (O que é? Onde habita?) e muito mais.

Nas últimas páginas, oferecemos também coupons de des-conto para você que é músico independente ou que só curte muito mesmo. 30% de desconto na primeira hora do Estú-dio Smart, 10% de desconto em um curso da Escola Livre de Artes do Circo Voador, 30% de desconto ao agendar um show do Rio Rock & Blues e vales-CD exclusivos imperdíveis.

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E o que é que a gente quer?Velhas Virgens pode ser considerada uma das maiores bandas in-dependentes brasileiras – até mesmo hoje em dia, já tendo acabado o seu ápice. Por isso, muitas bandas novas a procuram para mostrar o som ou abrir shows. Isso inspirou o guitarrista Alexandre Cavalo a escrever um livro chamado “Independência ou morte” para dar umas dicas pra esse pessoal e para quem mais quiser. Para você que encontrou um tempinho entre ensaios para dar uma olhada, vale muito a pena. Para você que nem tem um ensaio marcado, vale mais a pena ainda. Mas a gente fez um apanhado do que lemos por lá para dar uma palinha para quem não teve a chance de fazer isso ainda.

Cavalo já começou quebrando alguns mitos que só atrapal-ham, falando para cortar um pouco a birra de artista indepen-dente. Ser independente não quer dizer que você não pode aceitar ajuda, nem que não pode ter parcerias, nem que não pode ouvir críticas. Desde que não seja necessário desvirtu-ar a sua obra, toda a ajuda é bem vinda (só não vá se me-ter com uma marca que não tenha identificação nenhuma com a banda). E mesmo com ajuda, você vai precisar ralar muito.

Na hora de montar banda, é bom saber que mesmo amigos an-tigos e mesmo que tenham o gosto musical parecido com o seu, vai ter treta. Para sobreviver a isso, têm que ter diálogo, respeito e coragem. Assim todo mundo fica à vontade para experimentar ideias novas – e ideias novas podem ser diferenciais. Encontrar o seu diferencial, identificar o seu nicho e saber onde atuar é impor-tante. Saiba transformar as suas limitações em vantagens, e en-contre a identidade da banda. Banda formada? Ensaie. Ensaie mui-to. Os ensaios são o seu trabalho como músico e deixam a banda afiada, o que é uma necessidade para mandar bem nos shows.

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Até porque hoje em dia, até as grandes gravadoras já estão perce-bendo (e tentando se adaptar a passos de preguiça dormindo) que a lógica do mercado pede por mais qualidade do que quantidade. Focar na carreira ao invés de focar em um produto. Nas palavras de Cavalo, “arte não é para ser vendida como sabão em pó”. Mas é pra ser vendida sim. Por mais diferente que você considere a sua música, se há alguém disposto a comprá-la ela é comercial. Por isso vêm aqui as dicas para ter uma cabeça de empresário.

Tem algumas pessoas de quem você vai precisar desde o início. Eles são amigos que você vai recrutar, na verdade, mas vão ser companhias constantes e necessárias. Por exemplo, os roadies – a galera que vai te ajudar a carregar as coisas, montar o palco e tudo o mais. Não se esqueça de agradecer a eles. Tem também aqueles amigos que você vai chamar para todos os shows e eles vão aparecer em todos os shows. Eles curtem o seu som, conhe-cem as suas músicas e são os seus primeiros fãs. Mantenham-nos.

E além desses caras, é preciso ter um produtor. Na verdade, ele vai ser um produtor, empresário, divulgador e gerente de con-tas. Ele vai arrumar os shows, pegar o dinheiro, vender você para todas as pessoas que ele conhecer... enfim, tratar dos negócios. Você pode ser o seu próprio produtor, mas é melhor chamar alguém de confiança que esteja disposto a fazer o trabalho ao invés disso. Primeiro, porque te poupa de um estresse absur-do para manter o foco na arte. E também porque quando o negócio é feito diretamente com a banda, a coisa toda só parece muito menos séria e fácil de diminuir. Lembre-se: mesmo que você não seja profissional, pareça o mais profissional possível.

Para parecer profissional, você vai precisar de um site. Sério, um site é necessidade. Pode chamar um amigo que entenda dessas coisas pra ajudar com isso também (sim, quase tudo pode ser feito na base da camaradagem). O site tem que estar sempre atual-izado e com coisas interessantes. Talvez até uma loja online para vender merchandise da banda – isso é mais fácil do que parece. É bom botar um press release também, que é como um cartão de visitas da banda com as informações básicas e tudo o mais.

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Fato é que tem sempre que ter coisa nova para as pessoas te-rem um motivo pra checar. E quanto mais visualizações no seu site, mais patrocinadores em potencial serão atraídos por ele. Mas antes disso você tem que ter o que botar nele, então vamos lá.

Identidade visual. Isso é o nome, o logo, o mascote e tudo mais que vai identificar vocês visualmente. Isso tudo é muito importante. Solidifica como você é percebido. Aqui, você tem que chamar um designer. Pode ser até o seu amigo designer, mas não tenta fazer isso sozinho. Essa vai ser a sua marca. Deixa a sua marca em tudo o que você usar. Camisa, chapéu, case, boné, adesivo, tudo. Arruma também um fotógrafo. Nada de foto amadora tirada com o celu-lar, vocês precisam de fotos de verdade para apresentar a banda.

Agora, mais importante do que sites é tocar. É normal não ter muitos contatos no início e só meia dúzia de pessoas dispostas a te ouvir, mas com o Advento da Internet (amém) a coisa fica muito mais fácil. Não precisa ter medo da internet, porque quanto mais conhecem mais vão atrás do produto. E, de qualquer forma, o principal é que descubram que você existe. Toque na rua, toque em casas de show, toque no youtube, toque até na casa da sua tia-avó, mas toque. Sempre deixe o nome da banda em algum lugar visível, como num banner ou bumbo da bateria. Quem curtir o seu som precisa sa-ber o seu nome. Fazer clipes também é muito bom para mostrar a cara da banda – arrume um amigo de comunicação para fazê-lo.

Depois de um tempo tocando por aí, talvez você já tenha cria-do material para criar o seu CD e testado a receptividade com as músicas. Ótimo. Mas saiba que se foi o tempo em que inde-pendente era sinônimo de tosco. A gravação e a mixagem exi-gem muita paciência e bom humor, mas são o acabamento do seu trabalho, e se for bem feita já é um tremendo adianto. Bom comentar que primeiro CD em geral não dá lucro. Saiba dar preço ao seu produto e não o venda por menos do que ele vale, mas tenha em mente que se não perder muita grana, já pode con-siderá-lo sucesso. E para vendê-lo... Se conseguir montar a sua própria rede de distribuição vai ter mais lucro, mas muito mais trabalho também. Exige esforço, tempo, paciência e contatos.

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Se não conseguir, não há nada de errado em tentar en-contrar uma distribuidora que se encaixe na sua filosofia. É uma coisa a menos para se preocupar e pode render bas-tante. Mande o seu CD pra todas as rádios que possam tocá-lo – existem mais rádios do que a gente se dá conta.Fato que isso aqui é só um resumo do resumo de todas as coisas que tem pra se saber sobre como se virar na independência, e não dava pra colocar aqui tudo que o Cavalo falou em seu livro, mas já é um começo. A partir daí, só dá pra desejar muito boa sorte.

frontman das Velhas Virgens

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CopyleftVocê, alguma vez na vida, já deve ter visto este símbolo © em algum lugar. Trata-se do Copyright que basicamente assegura os direitos autorais. Nesse conceito de direitos autorais, focado no âmbito musical, há uma série de subdivisões como, por exemplo, os direitos reservados a cópia, às reproduções e ao uso de certos trechos para outras criações. No Brasil, ele não se encaixa muito nas leis nacionais e foi mais adotado em países Anglo-Saxões e nos EUA, a legislação nacional diz que o autor (e posteriormente seus herdeiros) deve(m) escolher como prosseguir com os direitos de sua obra, já o copyright assegura de antemão que os direitos sobre a obra são exclusivamente do autor, até que ele decida lib-erar para terceiros. Na era digital, esse conceito começa a ficar ul-trapassado e, em contrapartida ao copyright, foi criado o copyleft.

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Essa nova maneira de utilizar a legislação não determina que a obra seja de domínio público, mas permite que qualquer um pos-sa fazer a distribuição de forma não comercial dela. O copyleft também libera o uso do material para modificações e criações a partir dele. No cenário nacional de artistas independentes, um dos principais defensores do uso do copyleft é o músico B.Negão. Ele libera suas músicas online e pede apenas que não seja feito uso com fins comerciais, porém já disse, em entrevista à revista da MTV publicada em Março de 2006, ser mais a favor da pirataria do que da exploração das grandes gravadoras, tanto aos artis-tas com contratos nocivos quando ao público com preços exor-bitantes na venda dos materiais. O ex-vocalista do Funk Fuck-ers e do Planet Hemp, continua disponibilizando sua arte para domínio público, fazendo isso até mesmo com clipes de sua banda atual, os Seletores de Frequência. Essa tendência do futu-ro se prova vantajosa tanto para os artistas quanto para os fãs.

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CapoeiraA capoeira, por ser uma cultura popular muito antiga e miscigena-da, possui sua base histórica na tradição oral. Praticamente to-dos os fatos históricos e “regras” ou estudos sobre ela possuem diversas versões e diversas interpretações. Com base em en-trevistas e pesquisas fizemos um apanhado dos principais com-ponentes musicais de uma roda, é claro que podem haver dis-cordâncias por certas vertentes de estudo sobre esta cultura, porém o quadro geral que reunimos procura abranger o máxi-mo de teorias em maior concordância e coerência possíveis.

A roda tradicional de Capoeira Regional é composta por um atabaque, dois pandeiros (em certos grupos apenas um), even-tualmente um agogô e/ou um reco reco, palmas e couro, além do principal, três berimbaus. O primeiro é o Gunga, um berim-bau com a cabaça grande, seu som é o mais grave e ele, geral-mente, é tocado pelo principal mestre que compõe a orquestra e comanda a roda. O segundo é o Médio, este berimbau possui uma cabaça intermediária, o seu som é médio e ele acompanha a cadência do Gunga. O terceiro e último é o Viola, um berim-bau com a cabaça menor, seu som é mais agudo e este, normal-mente, é usado para viradas durante as músicas tocadas na roda.

Para o jogo acontecer, é preciso que haja música e a cadência da música dita as regras do jogo, o berimbau possui 7 toques clássi-cos na capoeira regional, cada um com um significado. São eles:

Iúna, normalmente é tocado em jogo de mestres e con-tra-mestres, talvez até outros instrutores já graduados. Este toque não vem acompanhado de cantos e é usado para jogo focado em floreios (acrobacias e movimentos de elasticidade e destreza corporal), pode ser utilizado tam-bém em apresentações solo. Ele também pode servir como homenagem a algum capoeirista importante que faleceu.

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Amazonas, utilizado na saudação de mestres com seus re-spectivos alunos visitantes, vindos de fora do grupo que estiver organizando a roda. Comum em batizados e con-fraternizações.

Cavalaria, era um toque muito utilizado quando a capoe-ira ainda era proibida, alertava sobre a chegada da polí-cia (principalmente) ou de um grupo inimigo, não se joga neste toque, ele apenas avisa que é preciso sair do local por causa do perigo.

Santa Maria, caiu um pouco em desuso pois hoje em dia um jogo de navalhas é muito raro, mas na época em que as maltas estavam espalhadas em larga escala pelas ci-dades, este toque avisava que havia alguém com posse de armas brancas no meio da roda.

Benguela (ou Banguela), o toque mais lento e cadenciado da capoeira regional, indica que o jogo será amistoso, não pode haver quedas nem contato entre os capoeiristas, as possibilidades de quedas ou chutes são apenas sinaliza-das e o jogo é de, principalmente, interação coletiva entre os capoeiristas.

Idalina, um toque forte, porém lento, apresenta a liber-dade para um jogo com facas ou facões.

São Bento Grande (de Bimba ou da Regional), toque uti-lizado para jogo mais duro, com quedas e contato físico, o jogo é apertado e o ritmo é acelerado podendo haver também grandes manifestações de floreio no meio da luta.

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Ainda existem outros toques com outros significados ou uti-lizados em outras modalidades como os toques da capoei-ra de angola, ou, por exemplo, o hino da capoeira regional.Além dos toques específicos, muitos são acompanha-dos de cantos, estes possuem alguns estilos e significa-dos também, alguns dos principais tipos de cantos são:

Ladainha: Usado na abertura da roda, principalmente em rodas de capoeira de angola. É uma música lenta, mui-tas vezes conta uma história e no final termina com uma louvação. Esta louvação é composta, muitas vezes, de um improviso e a resposta do couro vem em cima da última fala após os versos principais da ladainha. A louvação em geral se segue em “Iê viva meu Deus” e o couro responde “Iê, viva meu Deus camará”, e em dali em diante ocorrem as repetições subsequentes e muitas vezes improvisadas inspiradas pela presença de mestres, convidados ou acon-tecimentos. “Iê viva meu mestre”, “Iê, viva meu mestre ca-mará”, “Iê, quem me ensinou”, “Iê, quem me ensinou ca-mará”, “Iê, viva a capoeira”, “Iê, viva a capoeira camará”...

Corrido: Cantos rápidos, o couro segue logo em seguida da estrofe que geralmente é curta, em pergunta e resposta.

Quadra: O couro vem de quatro em quatro tempos, asse-melha-se ao corrido e pode ser entendido como pergunta e resposta em certos casos.

Chula: Geralmente sua letra é uma história, as estrofes são grandes e o couro entra no final.

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MestreToni Vargas1- Qual foi a primeira coisa que te chamou atenção na capoeira?

A primeira vez que eu vi capoeira eu pirei, acho que é ex-atamente essa coisa da música ligada ao movimento, aq-uilo foi fascinante pra mim, eu pensava “que coisa incrível as pessoas cantam e ao mesmo tempo se movimentam”.

E como foi que a música te chamou atenção de forma que você chegasse a fazer um CD só de música? Como esse talen-to despertou em você?

Isso é uma coisa fantástica que a capoeira faz, hoje em dia todo mundo tem mais acesso, você chega numa comunidade como esta (Chapéu Mangueira), e tem vários projetos. Bem ou mal, as pessoas têm acesso a uma oficina de música ou de arte. Mesmo que não seja como gostaríamos, o acesso é maior. Eu não tive isso. Estou com 57 anos e na minha época não havia esse tipo de coisa, ainda mais nascendo numa família que não tinha músicos. Trabalhando em projetos, com crianças inclusive, percebi que todo mundo pode ser criativo e desenvolver sua criatividade. Mas eu era um menino pobre e do subúrbio, não tive acesso a esse tipo de coisa. Então acho que foi uma benção poder entrar em con-tato com a música a partir da capoeira. Tem um fator engraçado, as pessoas pedem pra eu dar aula só de música, cursos só com ritmo e eu não dou, porque tudo na capoeira hoje é muito siste-matizado, ensino de golpes, movimentação, a pedagogia hoje é muito avançada em relação ao meu tempo. Esse ponto da mu-sicalidade, por não ser tão sistemático, acaba não te prendendo, deixa você entrar em contato com a música a partir do que você é.

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Quando chega um aluno novo e diz que gosta da parte musical, eu dou a liberdade pra ele ir vendo como funciona e na troca com alunos mais velhos ele vai aprendendo aos poucos até que, em um dado momento, quando eu percebo que ele está mais confiante e preparado, o convido pra uma roda simples. A musicalidade vai se desenvolvendo de forma natural e comigo aconteceu isso, mas eu antes de entrar pra capoeira (começou aos 10 anos) já brinca-va de fazer umas quadras rimadas. Tive sorte dos meus mestres me darem liberdade e, sobretudo, o Mestre Peixinho, quando eu o conheci, era uma pessoa que tinha a sabedoria de te permitir desenvolver o melhor de você. Então eu brinco, “porque você faz música?”, “pra não ficar maluco”. Até se eu pegar um violão para tirar um som, quem tiver ouvindo vai comentar “tem capoeira aí”.

Você acha que os primeiros cantos de capoeira podem ter surgido do improviso?

Percebo que algumas músicas tradicionais, as vezes são junções de pequenas quadras. Encontro em algumas outras tradições como no samba de roda ou em outras até menos ligadas a capoeira. Por exemplo, nas ladainhas, as mais antigas, poucas falam de capoeira em si, estão presentes ensinamentos, histórias e fatos contados. Fiquei por muito tempo na minha vida me perguntando o porquê disso. Primeiro, capoeira era proibido, pro cara falar de algo proi-bido, tinha que disfarçar, falar de outra forma. Depois que falar de escravidão, por exemplo, era uma coisa que trazia os antigos mui-to para próximo, precisava de um certo distanciamento pra coisa entrar na sua cabeça, precisava falar de outra forma. Mais à frente que foi surgindo aquela denuncia mais clara. O improviso em si, vivi em algumas rodas aqui no Rio, talvez por conta do partido alto, porque o capoeirista também está ligado ao samba. Existem alguns grandes improvisadores, eu participei de algumas rodas de improviso com algumas bases, o “paranauê” é uma boa base usada para trocar na hora os versos. Aqui sempre brincamos disso, fim de roda, no subúrbio, sobretudo, era comum a brincadeira de um capoeirista mandar uma frase direta pro outro feita na hora.

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Muitas das minhas criações eu faço na hora, as vezes quando dá um branco na hora da roda eu acabo levando por cima, meus filhos e alunos muitas vezes correm pra gravar no celular e não perdemos a letra.

Você disse que não daria aula só de música, mas um show só de música, você fez?

De um tempo pra cá as pessoas têm começado a entender que não existe música só de capoeira. É música. O público da capoeira tam-bém é muito grande, acabei fazendo um show cada vez que lancei um cd. Teve um que eram só com musicas tradicionais de capoeira e outros com mais misturas, fiz um show por exemplo em Brasília com mistura de músicas e poesias. Meu filho também tem uma ban-da e temos estudado fazer algumas experiências. Ele já fez arranjo de algumas músicas minhas e tocou com a banda, ficou muito le-gal. Temos todos pensado em fazer algumas coisas nesse sentido.

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Existe roda só de canto?

Uma coisa que eu faço muito é começar a roda só com canto, an-tes do jogo soltar bem todas as possibilidades musicais de cada um. Não precisa ser um músico para cantar, procuro incentivar os alunos nessa parte. Porém, é bom lembrar, que a capoeira no início não tinha uma música própria e organizada para ela. Acredito que tudo que vinha do negro tinha ritmo, mas a capoeira era muito violenta, os capoeiristas se organizavam em grupos (maltas) e se juntavam para lutar, eles muitas vezes aproveitavam as músicas ambientes. Por exemplo, em Recife e na Bahia era comum que eles lutassem em cima do frevo, do coco ou do repente. Quando a polícia chegava eles aproveitavam para disfarçar.

Como surgiu a ideia de fazer o CD? Qual foi o último estalo que deu e você disse “vou fazer”?

As pessoas pediam muito, eu já tinha participado, antes de ter um trabalho meu, de trabalhos de outras pessoas. Trabalhei com o Mestre Peixinho, fiz também uma participação num disco chama-do Favela que foi lançado na Alemanha. Uma participação numa fita cassete com o Mestre Nestor, até que chegou a hora de fazer o meu. Percebi que fazer um disco não era só juntar músicas, sempre foi muito grande a minha produção, mas o principal agora era um conceito pro cd. Eu queria fazer um trabalho que falasse de mim, com a minha cara, eu não tinha a mínima ideia do que ia acontecer e foi muito legal. Foi abrindo portas, o meu último trabalho foi o quinto que lancei. Este foi um convite do grande Mestre Boca Rica que é um aluno de Mestre Pastinha.

Como é na parte da gravação, o estúdio em si, quem faz isso acontecer?

Produzi todos de forma independente, hoje em dia temos uma equipe, mas no início era a minha esposa com a energia para acontecer, meu cunhado também ajudou muito fazendo a parte gráfica.

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A primeira vez foi um susto, é muito diferente cantar no estúdio, dá um medo danado de perder a energia na hora. Nesse CD com o Boca Rica, por exemplo, era difícil gravar, não queria que o mestre ficasse desconfortável pra cantar, então tivemos que trabalhar forte na mixagem porque haveria vazamento de som, queríamos priorizar a energia da roda.

Suas principais influencias, você falou por alto, mas pode nomear alguns cantores es-pecíficos?Sou apaixonado por música popular brasileira. Gosto mui-to dos cantadores do nordeste de base de raiz, gosto muito de Geraldo Vandré, curto muito samba de raiz, pagode de raiz, Bezerra da Silva, Zeca Pagodin-ho, os clássicos como João Bo-sco, Chico Buarque, Caetano.Ouvia muitas coisas antigas por causa da minha mãe, mui-tas que ela mesma cantava.Dos capoeiristas, o dis-co que mais me comoveu, foi o de Mestre Pastinha.

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Gostava muito dele ser contador de história e acho que isso me influenciou muito, por isso também talvez eu seja um contador de história nas músicas muitas vezes.

Para fechar, a última pergunta que tem mais a ver com o con-texto da revista, você concorda com o CopyLeft?

A capoeira é uma coisa muito louca, tem uma mídia muito a par-te, temos hoje mais de 10 milhões de praticantes. Eu não tenho tido grandes problemas com pirataria ou algo do tipo, as vezes as pessoas pirateiam porque o disco não chega no local, não há distribuição suficiente, quando eu chego nos locais com o orig-inal as pessoas compram. E até hoje, com raríssimas exceções, as pessoas que quiseram usar minha música, me ligaram e pedi-ram permissão, eu sempre deixei, em geral eram casos que não envolviam fins lucrativos ou eram cds independentes. Só não pude liberar muitas modificações. Agora existe um site America-no, muito interessante, todos os meus discos estão lá, chama-se Dun Dak. Você pode baixar uma música ou o álbum inteiro, pa-ga-se com o cartão de crédito e uma parte da grana vai pro autor. Sai mais barato e dá uma força pro autor, eu acho super legal, é feito por capoeiristas para capoeiristas. Fora isso eu mesmo ven-do os meus cds e as vezes coloco em alguma loja de capoeira.

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John AinsworthJohn Ainsworth é um habilidoso músico originário de Manches-ter, que tem ganhado espaço no cenário independente inglês e tocando em alguns festivais pelo mundo. Com um som bas-tante puxado para o folk, John faz performances acústicas com muita potência vocal e qualidade musical. No dia 13 de Se-tembro tivemos a oportunidade de entrevistá-lo via Skype, e aqui serão abordados alguns pontos chave desse bate papo.

John diz que o estudo formal pode te abrir muitas possibilidades e expandir seus horizontes, entretanto, não é o mais importante para uma carreira no ramo da música, “a criatividade é o essencial”. Ele sempre tocou em bandas, e a última delas foi o pontapé inicial para pegar num violão de 12 cordas. Com isso conquistou uma enorme liberdade artística e habilidade técnica, tendo claras influências de Radiohead, Muse e Jeff Buckley, e trazendo seu principal difer-encial: o rápido e trabalhado dedilhado de suas linhas de violão.

O músico nos disse que seu trabalho de composição, de gravação e de performance é intenso e se complementa, mas a parte que mais o empolga é tocar ao vivo e poder interagir com cada vez mais pessoas através de sua música. “No início eu tocava para amigos, depois criei um canal no youtube e comecei a postar vídeos em que eu aparecia tocando as minhas músicas - live at my bedroom”. Depois disso conseguiu alguns contatos, como a Can-dyrat Records, que gravou o clipe de sua música Mind Explosion e muitas outras músicas que se encontram em seu soundcloud.

Quando foi tocar no festival Le Blues Antour Du Zine, na França, tam-bém se apresentou em outros estabelecimentos, e disse que a re-ceptividade do público francês é muito maior em relação ao público inglês, “Lá as pessoas realmente te escutam tocar, e te respeitam por ser um músico, eles se interessam mais”. John ainda contou sobre um sufoco que passou em um festival chamado Whisky Jar Open Mu-sic, no qual ele estava sozinho e sem dinheiro para voltar para casa.

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Segundo ele essa pressão o impulsionou a tocar melhor do que o de costume, a acabou conseguindo vender todos os cds que tinha levado.

Sobre a grande mídia, Ainsworth diz, sem rodeios, que é real-mente difícil se lançar de forma independente no merca-do musical. Por mais que a internet esteja mudando isso aos poucos, dando oportunidade a mais pessoas de mostrar sua arte, continua sendo bastante difícil, principalmente pra quem não tem grana para bancar equipamento ou desembol-sar com terceirização do trabalho de gravação, mixagem, etc...

A dica que ele dá pros novos artistas independentes não tem nada de mágica – é ir de cara, fazer música por amor e de todas as formas possíveis. As amizades nesse meio também se ajudam bastante, mas o principal é acreditar na proposta da sua música, seja qual for, até mesmo se a proposta é não ter uma proposta. “Cheers!”

John Ainsworth

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Luca Lisboa,empolga às 9Como você descobriu sua aptidão pra música, o que te mo-tivou a entrar nesse universo?

Através do futebol. Eu costumava frequentar os jogos do Flu-minense quando era mais novo e, um dia, alguns membros da bateria não foram. Resolvi pegar um surdo pra experimentar e tudo começou. Minha mãe também me incentivou bastan-te, sendo a responsável por me matricular nas aulas de música.

Quando você se tornou profissional, como foi a entrada e a percepção desse mundo?

Acabei entrando no meio da música através da Oficina de Percussão do Empolga, fiz aula durante um ano e fui convidado a integrar a banda como músico substituto. Depois de um ano meu professor se mudou para os Estados Unidos e eu fiquei no seu lugar. O que me chamou mais atenção no início desse caminho foi a falta de opor-tunidades para o surgimento de novas bandas, visto que o famoso “network” é um dos pontos principais para se conseguir algo no meio.

Você é um musico independente certo? Se considera indepen-dente financeiramente?

Certo. E não, não me considero financeiramente independen-te, moro com os meus pais, e a sazonalidade da profissão não permite contrair compromissos financeiros. É possível que em um mês eu possa ganhar uma coisa e no outro um décimo disso.

Luca

Lis

boa

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Quais são as principais dificuldades que você enxerga na música independente, no cenário em que você atua?

As condições de trabalho, principalmente. A qualidade dos equipamentos de grande parte das casas de show do RJ é a pior possível. Muitas bandas também não possuem chanc-es reais de expor seu trabalho. Isso tudo sem falar nos

Conte-nos sobre alguma ex-periência incrível que trabalhar com musica tenha lhe propor-cionado.Ver, do alto do trio elétrico, quase 100.000 pessoas no desfile do Empolga na Praia de Copaca-bana, com certeza uma imagem que eu nunca vou esquecer.

preços proibitivos que os músi-cos enfrentam quando pre-cisam comprar instrumentos ou equipamento essenciais.

Você já fez apresentações com outros artistas? Ou em outras baterias? Quais?

Já fiz participações em shows do Alceu Valença, Ney Mato-grosso e Boombay Byci-cle Club. Além de já ter tocado nas baterias da Mangue-ira, São Clemente e Monobloco.Quais são suas principais in-fluências?Black Alien, Criolo, Gabriel o Pensador, Produto Interno, Cás-sia Eller, Novos Baianos, Nação Zumbi, dentre muitos outros...

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Como você enxerga o copyleft?Acho que pode ser uma alternativa interessante ao já ultrapas-sado “Copyright”. É inegável que em alguns ramos (como o da informática) a cooperação e modificação posterior à criação é um fator importantíssimo. Porém, creio que conflitos podem ocorrer no mundo da música, uma vez que o “Copyleft” pode abrir brechas jurídicas para o plágio. A verdade é que só o tem-po nos dirá como os artistas e os mercados reagirão a isso.Qual a sua visão sobre a pirataria? E o que acha da disponibili-zação de download informal na internet?Acredito que a pirataria é um empecilho na vida do músi-co. Além de não ser feito nenhum repasse financeiro prove-niente do lucro da obra, a qualidade do produto não pode ser garantida, o que, de certa forma, influencia a apresentação de seu trabalho. No entanto, temos visto mais e mais músicos dis-ponibilizando suas músicas e álbuns para download gratuito na internet, o que é uma ótima forma de expor seu trabalho e dri-blar a dependência criada em relação às grandes gravadoras.

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