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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Fernanda Fujita De Castro Mello Marca notória: um estudo sobre a aquisição e perda de distintividade de marcas decorrentes de sua notoriedade MESTRADO EM DIREITO COMERCIAL SÃO PAULO 2010

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Fernanda Fujita De Castro Mello

Marca notória: um estudo sobre a aquisição e perda de

distintividade de marcas decorrentes de sua notoriedade

MESTRADO EM DIREITO COMERCIAL

SÃO PAULO – 2010

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Fernanda Fujita De Castro Mello

Marca notória: um estudo sobre a aquisição e perda de

distintividade de marcas decorrentes de sua notoriedade

Dissertação apresentada à Banca Examinadora

como exigência parcial para obtenção do título

de Mestre em Direito Comercial pela

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

sob a orientação do Professor Dr. Fábio Ulhoa

Coelho.

MESTRADO EM DIREITO COMERCIAL

SÃO PAULO – 2010

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Banca Examinadora

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IV

À Deus, por sua infinita sabedoria,

pelos meus pais.

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V

AGRADECIMENTOS

A idealização, elaboração e conclusão deste trabalho só foram possíveis com a

ajuda de meus professores, colegas de trabalho, amigos e familiares, aos quais

venho expressar minha profunda e sincera gratidão.

Em especial, gostaria de agradecer as seguintes pessoas:

- Professor Dr. Fábio Ulhoa Coelho, meu professor, meu orientador, e meu maior

incentivador, agradeço de todo o coração pela oportunidade, dedicação,

confiança e apoio fundamentais para a idealização e conclusão deste trabalho;

- Dra. Tatiana Zerbini, minha chefe e amiga, e demais colegas da Pinheiro,

Nunes, Arnaud e Scatamburlo Advogados, agradeço pelo apoio nas pesquisas,

pelas valiosas discussões sobre o tema e, principalmente, pelo apoio nos

momentos em que estive ausente;

- Dr. Ubirajara Gomes de Mello e Dra. Circe Lima Fujita, meus avôs, a quem

dedico todos os frutos de minha formação jurídica, agradeço pelo exemplo que se

tornaram na minha carreira;

- Minha família, em seu sentido mais amplo, agradeço profundamente pelo amor,

segurança e apoio, e pela confiança incondicional;

- Meus pais, Angela e Alcy, a quem agradeço diariamente pelos valiosos

ensinamentos, e por terem acreditado na minha formação;

- Meus amigos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, agradeço hoje e

sempre pela alegria dos momentos vividos nesta Universidade, os quais serão

inesquecíveis.

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VI

RESUMO

O presente trabalho visa analisar dois fenômenos empíricos decorrentes da

notoriedade de marca: a aquisição e a perda de distintividade marcária.

Primeiramente, busca-se introduzir o instituto da marca como signo distintivo,

demonstrando ser a distintividade condição de validade para sua concessão.

Após definir o instituto, a aquisição de notoriedade pela marca é analisada, sendo

objeto do presente estudo a marca notória como gênero, e suas espécies marca

notoriamente conhecida e marca de alto renome. A previsão legal e o âmbito de

proteção das marcas notórias são abordados, assim como as principais

conseqüências da notoriedade marcária. Feita esta introdução, o presente

trabalho aborda os fenômenos de aquisição e perda de distintividade marcária

decorrentes de sua notoriedade. O primeiro deles é estudado pela teoria do

secondary meaning, ou teoria do significado secundário, e sua ocorrência é

analisada em todos os sistemas de aquisição de marca. É dado destaque às

expressões originalmente não distintivas e que são passíveis de aquisição de

significado secundário, sendo, portanto, passíveis de registro como marca. A

seguir, é analisado o fenômeno da perda de distintividade marcária decorrente de

sua distintividade, fenômeno conhecido como degeneração ou degenerescência

marcária. Por se tratar de processo lento, e quase sempre irreversível, são

estudados alguns sinais indicadores da degeneração marcária, e formas

costumeiramente utilizadas para evitá-la. Por fim, algumas decisões judiciais e

administrativas envolvendo referidos fenômenos são analisadas, buscando-se

exemplificar algumas das formas encontradas para se provar e identificar a

aquisição de secondary meaning e a degeneração marcária empiricamente,

destacando-se a posição dos Tribunais e do INPI quanto ao tema.

PALAVRAS-CHAVES: PROPRIEDADE INDUSTRIAL; MARCA; DISTINTIVIDADE

MARCÁRIA; MARCA NOTÓRIA; MARCA DE ALTO RENOME; MARCA NOTORIAMENTE

CONHECIDA; SECONDARY MEANING; DEGENERAÇÃO.

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VII

ABSTRACT

The present study aims at analyzing two empiric phenomena resulting from

the notoriety of a mark: the attainment and the loss of trademark distinctiveness.

Firstly, it aims to introduce the institute of the mark as a distinctive sign,

demonstrating that the distinctiveness is a condition of validity for the grant

thereof. After defining the institute, the attainment of notoriety by the mark is

analyzed, being the object of the present study the notorious mark as the

category, and the well-known mark and high-reputation mark as the types. The

legal provision and the scope of protection of notorious marks are broached, as

well as the main consequences of trademark notoriety. Having made this

introduction, the present study discusses the phenomena of attainment and loss of

trademark distinctiveness resulting from the notoriety thereof. The first of them is

studied by the theory of secondary meaning, and its occurrence is analyzed in all

systems of trademark attainment. Emphasis is given to the expressions originally

non distinctive and which are susceptible of attainment of secondary meaning,

being therefore susceptible to registration as a mark. Next, the phenomenon of

loss of trademark distinctiveness resulting from its distinguishability is analyzed,

the phenomenon known as trademark degeneration or trademark degeneracy.

Since it deals with a slow process, and almost always irreversible, some indicator

signs of trademark degeneration are studied, as well as customary forms used to

avoid it. Finally, a few judicial and administrative decisions involving the referred to

phenomena are analyzed, seeking to exemplify some forms found for proving and

identifying the attainment of secondary meaning and trademark degeneration

empirically, emphasizing the position of the Courts and the INPI (the Brazilian

Patents and Trademarks Office) in relation to the matter.

KEY-WORDS: INDUSTRIAL PROPERTY; MARK; TRADEMARK DISTINCTIVENESS;

NOTORIOUS MARK; HIGH- REPUTATION MARK; WELL-KNOWN MARK; SECONDARY

MEANING; DEGENERATION.

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VIII

ABREVIATURAS

ABPI – Associação Brasileira da Propriedade Industrial AC – Apelação Cível CUP – Convenção da União de Paris para proteção da propriedade industrial Des. Fed. – Desembargado (a) Federal DJU – Diário de Justiça da União EI – Embargos Infringentes INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial j. - julgado LPI – Lei da Propriedade Industrial (Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996) Min. - Ministro OMC – Organização Mundial do Comércio Rel. – Relator REsp – Recurso Especial TRF – Tribunal Regional Federal TRIPs – Acordo sobre Aspectos dos Direitos da Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio (Trade Related Aspects on Intellectual Property Rights) STJ – Superior Tribunal de Justiça STF – Supremo Tribunal Federal

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IX

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 1 I. A MARCA COMO SINAL DISTINTIVO 4 1.1 – Conceitos 5 1.2 - Natureza jurídica das marcas 8 1.2.1 – Natureza jurídica da marca em função do seu objeto 8 1.2.2 – Natureza jurídica da marca em razão de sua função 12 1.2.3 – Natureza jurídica da marca a partir de seu conteúdo 14 1.3 – Funções 15 1.3.1 – Função distintiva 15 1.3.2 – Função de indicação de origem 18 1.3.3 – Função econômica 20 1.3.4 – Outras funções 21 1.4 – Princípios relativos às marcas 23 1.4.1 – Princípio da territorialidade 23 1.4.2 – Princípio da especialidade 25 1.4.3 – Princípio da novidade da marca 28 1.5 – Tipos de marcas 29 1.5.1 – Quanto à forma de apresentação 29 1.5.1.1 – Marcas nominativas 29 1.5.1.2 – Marcas figurativas 30 1.5.1.3 – Marcas mistas 30 1.5.1.4 – Marcas tridimensionais 31 1.5.2 – Quanto à origem 32 1.5.2.1 – Marcas nacionais 32 1.5.2.2 – Marcas estrangeiras 32 1.5.3 – Quanto à destinação 33 1.5.3.1 – Marcas de produtos ou serviços 33 1.5.3.2 – Marcas de certificação 33 1.5.3.3 – Marcas coletivas 34 1.5.4 – Quanto ao grau de distintividade 35 1.5.4.1 – Marcas de alto renome 35 1.5.4.2 – Marcas notoriamente conhecidas 35 1.6 – Sistemas de aquisição de direitos sobre as marcas 36 1.6.1 – Sistema declarativo 37 1.6.2 – Sistema atributivo 37 1.6.3 – Sistema misto 38 1.7 – Condições necessárias para registrabilidade da marca 40 1.7.1 – Distintividade 41 1.7.2 – Licitude 42 1.7.3 – Disponibilidade 44 1.8 – Proteção conferida pelo registro marcário 46 1.8.1 – Limitação à proteção 47

1.9 – Sinais não registráveis como marca devido à ausência de distintividade

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X

II. MARCA NOTÓRIA 57 2.1 – Conceito de notoriedade 57 2.1.1 – Questão fática 59 2.1.2 – A distintividade nas marcas notórias 62 2.2 – Tipos de marcas notórias 64 2.2.1 – Marca de alto renome 65 2.2.1.1- Exceção ao princípio da especialidade 67 2.2.1.2 - Previsão legal 68 2.2.1.3 – Requisitos 68 2.2.1.3.1 - Registro no Brasil 69 2.2.1.3.2 - Alto grau de conhecimento 69 2.2.2 – Marca notoriamente conhecida 70 2.2.2.1 – Exceção ao princípio da territorialidade 71 2.2.2.2 – Previsão legal 72 2.2.2.3 – Requisito 74 2.2.2.3.1 – Alto grau de conhecimento 74 2.2.2.3.1.1 – Limitação aos produtos e serviços afins. 75 2.3 – Critérios para se auferir notoriedade das marcas 75 2.3.1 – Os “critérios” da lei nº 5772/1971 76 2.3.2 – Ausência de critérios objetivos na lei atual 78 2.4 – Proteção legal das marcas notórias 80 2.4.1 – Motivos para a proteção especial 81 2.4.2 – Riscos decorrentes da notoriedade da marca 82 2.4.2.1 – Risco do aproveitamento parasitário da marca 83 2.4.2.2 – Risco de diluição da marca 84 2.4.2.3 – A diluição e a teoria da distância 88

2.4.2.4 – O INPI como coadjuvante no processo de diluição de marcas no Brasil

90

III. DA AQUISIÇÃO DE DISTINTIVIDADE DE MARCA DECORRENTE DE SUA NOTORIEDADE

93

3.1 – A teoria do secondary meaning ou teoria do significado secundário 95 3.1.1 – Origem 97 3.1.2 – Características 98 3.1.2.1 – Fenômeno lingüístico 98 3.1.2.2 – Expressões fracas x expressões carentes de distintividade 100 3.1.2.3 – As expressões em língua estrangeira 102 3.1.2.4 – Limites à proteção 103 3.1.3 – Aplicabilidade 105 3.1.3.1 – No sistema declarativo de registro de marca 105 3.1.3.2 – No sistema atributivo de registro de marca 106

3.1.4 – O aparente conflito existente entre a teoria do significado secundário e o artigo 124, VI, da LPI

107

3.1.5 – Fundamento legal para a teoria 108 3.1.5.1 – A Convenção da União de Paris 108 3.1.5.2 – O TRIPs 109 3.1.6 – Riscos da teoria do significado secundário 110 3.1.7 – Hipóteses de aquisição de significado secundário 112 3.1.7.1 – Uso prolongado no tempo 113

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XI

3.1.7.2 – Alto investimento publicitário 113 3.1.7.3 – Excepcionalidade do produto ou serviço assinalado 114 3.1.8 – A posição do INPI e dos Tribunais brasileiros quanto ao tema 115 IV. DA PERDA DE DISTINTIVIDADE DE MARCA DECORRENTE DE SUA NOTORIEDADE

117

4.1 – O fenômeno da degeneração da marca 117 4.1.1 – Degeneração x diluição marcária 118 4.1.2 – A excepcionalidade dos bens e serviços assinalados 119

4.1.3 – O conflito entre as estratégias de marketing e a construção de marcas distintivas

121

4.1.3.1 – A inércia do próprio titular da marca degeneranda 121 4.1.4 – Fundamento legal para o fenômeno da degeneração marcária 122 4.1.4.1 - A Convenção da União de Paris 123 4.1.5 – Sinais indicadores da degeneração marcária 123 4.1.5.1 – Dicionarização da expressão 124

4.1.5.2 – Uso da expressão como sinônimo do bem pelo público consumidor e pelos concorrentes

125

4.1.6 – Possibilidade de reversão 126 4.1.6.1 – A importância das campanhas publicitárias 127 4.1.6.2 – Atuação perante o INPI, mercado e meios de comunicação 129 4.2 – Efeitos da degeneração marcária para os registros de marca 130 4.2.1 – Impossibilidade de extinção do registro marcário 130 4.2.2 - Perda de eficácia do registro 131 4.2.3 – A posição do INPI e dos Tribunais brasileiros quanto ao tema 131 V. CASOS DE AQUISIÇÃO E PERDA DE DISTINTIVIDADE DECORRENTES DA NOTORIEDADE DA MARCA

133

5.1- Hipóteses de aquisição de distintividade marcária 133 5.2 - Hipóteses de perda de distintividade marcária 136 CONCLUSÃO 138 REFERÊNCIA 140

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INTRODUÇÃO

A marca, signo distintivo cujas origens remontam à Antiguidade,

atualmente representa um dos maiores ativos econômicos das empresas em todo

o mundo. A proximidade existente entre a marca e o produto ou serviço por ela

assinalado faz da marca a principal referência buscada pelo mercado na escolha

de seus produtos e serviços. Não é demais afirmar, portanto, que em muitos

casos, a marca possui maior reconhecimento e distintividade perante o mercado

que a própria empresa por ela representada.

Diante da importância de referido instituto, nos últimos séculos, acordos,

convenções e leis foram assinados buscando proteger, de um lado, o titular da

marca, que a desenvolve e investe em sua promoção, e de outro, o mercado em

geral, a quem a marca se destina. Tal proteção se justifica não apenas para

privilegiar o titular da marca, a quem é garantido o uso exclusivo de expressões,

figuras e formas estilizadas, mas principalmente o mercado como um todo, a fim

de se evitar que o consumidor seja confundido por marcas idênticas ou similares,

ou que expressões genéricas e comuns sejam apropriáveis a título exclusivo.

Sendo a marca signo distintivo, portanto, pode se afirmar que a

distintividade é condição de validade para sua concessão. A própria Lei da

Propriedade Industrial - LPI (Lei nº 9.279/96), em seu artigo 122, dispõe serem

“suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos...”, ao mesmo tempo que

proíbe o registro como marca de expressões genéricas, comuns e descritivas

(LPI, artigo 124, VI).

Nas últimas décadas, o processo de globalização e o desenvolvimento dos

meios de comunicação fizeram com que marcas antes limitadas a pequenas

regiões cruzassem continentes, e passassem a ser conhecidas e reconhecidas

por um número cada vez maior de pessoas. O desenvolvimento da internet e o

aumento significativo do acesso à informação digital trouxeram às empresas

maior facilidade na divulgação e comercialização de seus produtos e serviços,

trazendo às marcas, portanto, maior destaque na economia global.

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Dentro deste contexto, observa-se que determinadas marcas se destacam

das demais pelo maior grau de conhecimento pelo público, pela maior

notoriedade que adquirem perante o mercado. Referida notoriedade muitas vezes

está diretamente associada à qualidade do produto ou serviço que assinala,

principalmente quando se trata de produtos e serviços inovadores, nunca vistos

antes no mercado. Em outros casos, a notoriedade da marca é fruto de maciço

investimento em campanhas publicitárias e promoção do signo. A notoriedade da

marca, portanto, é fenômeno fático, verificado caso a caso, e garante à marca, ao

mesmo tempo, maior prestígio, e maior risco de aproveitamento indevido.

As marcas notórias – como são denominada pela doutrina -, no Brasil,

estão previstas na LPI em dois momentos distintos: como marcas notoriamente

conhecidas – as quais excepcionam o princípio da territorialidade das marcas -, e

como marcas de alto renome – as quais excepcionam o princípio da

especialidade das marcas. Considerando o maior poder atrativo de referidas

marcas, e conseqüentemente o maior risco de aproveitamento parasitário por

terceiros, às marcas notórias é garantida proteção especial, nos termos da lei

referida.

Apesar de a notoriedade de uma marca representar fenômeno fático, tal

fenômeno gera efeitos diretos no campo do direito. Dentre os efeitos da

notoriedade sobre os direitos marcários, estão a aquisição e perda de

distintividade de marcas decorrentes de referida notoriedade.

O presente trabalho, assim, visa analisar os efeitos da notoriedade da

marca com relação à sua distintividade. Dois fenômenos específicos serão

analisados no presente trabalho, quais sejam, o da aquisição de distintividade por

expressão originalmente não distintiva, decorrente de sua notoriedade (teoria do

significado secundário, ou secondary meaning), e o da perda de distintividade de

expressão originalmente distintiva, também em decorrência de sua notoriedade

(degeneração marcária).

No capítulo I do presente trabalho, será analisado o instituto da marca,

abordando-se seu conceito, natureza jurídica, funções, tipos, formas de aquisição

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e âmbito de proteção. Aqui serão analisadas as condições de validade da marca,

destacando-se os sinais não registráveis como marca, nos termos da legislação

nacional.

No capítulo II do presente trabalho será analisada em especial a marca

notória, analisando-se sua previsão legal, sua classificação, e algumas

conseqüências da notoriedade para o registro marcário, como possibilidade de

aproveitamento parasitário e risco de diluição.

Nos capítulos seguintes, assim, serão abordados especialmente os efeitos

da aquisição e perda de distintividade decorrentes da notoriedade da marca. No

capítulo III tratar-se-á da aquisição de distintividade decorrente da notoriedade da

marca, abordando a teoria do secondary meaning, ou teoria do significado

secundário. Aqui, serão analisadas as expressões que podem adquirir significado

secundário, adquirindo, pois, distintividade, bem como a aplicabilidade de referida

teoria dos sistemas de aquisição da marca.

No capítulo IV, por sua vez, será analisado o fenômeno de perda de

distintividade de marca decorrente de sua notoriedade, fenômeno conhecido

como degeneração ou degenerescência marcária. As principais causas da

degeneração serão abordadas, assim como as conseqüências para o titular do

registro marcário.

Por fim, no capítulo V serão analisadas algumas decisões judiciais e

administrativas que elucidam os fenômenos do secondary meaning e da

degeneração marcária, demonstrando empiricamente as formas de constatação e

comprovação de referidos fenômenos.

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I. A MARCA COMO SINAL DISTINTIVO

Dentre os bens da propriedade industrial1, a marca é o instituto que

atualmente tem maior destaque para o mercado em geral2. Para MATHÉLY

(1994: 12), “L‟importance de la marque et la protection dont elle beneficie

s‟expliquent et se justifient: - par son rôle économique, au bénéficie de l‟etreprise,

- et par son rôle social, dans l‟intéret du public.”. E, como bem sintetiza DI BLASI

(2005: 333), a marca atua essencialmente no plano comercial, “do ponto de vista

público, na defesa do consumidor, evitando confusão; e do ponto de vista privado,

auxiliando o titular no combate à concorrência desleal.”. Assim, nas últimas

décadas, as marcas têm adquirido maior importância econômica, representando,

muitas vezes, o maior ativo de uma empresa.

Não é por outro motivo que diariamente surgem diversas novas empresas

especializadas em avaliação econômica das marcas, cada qual com sua

metodologia e variáveis, o que resulta em diversas listagens acerca das marcas

mais valiosas do país e do mundo3. A marca assume, assim, o papel da mais

importante das propriedades intelectuais (BARBOSA, 2003: 801), sendo foco de

grandes investimentos por parte de seus titulares.

No presente capítulo, abordaremos exclusivamente o instituto da marca,

definindo seu conceito, natureza jurídica, funções, tipos, formas de aquisição e

1 Para CERQUEIRA (1946, v. I, Parte I: 72/73), “a propriedade industrial (...) pode ser definida como o

conjunto dos institutos jurídicos que visam garantir os direitos de autor sôbre as produções intelectuais do domínio da indústria e assegurar a lealdade da concorrência comercial e industrial. A propriedade industrial poderia também ser definida, de modo mais geral, como o ‘conjunto de normas legais e princípios jurídicos de proteção à atividade do trabalho, no campo das indústrias, e a seus resultados econômicos’, abrangendo, assim, a proteção das proteções intelectuais do domínio industrial (invenções, modelos de utilidade e desenhos e modelos industriais) e tôda a matéria relativa à repressão à concorrência desleal, inclusive as marcas, o nome comercial, as indicações de origem dos produtos, etc. Preferimos, porém, a primeira definição por ser mais restrita, particularizando melhor o objeto da propriedade industrial.”.

2 São bens da propriedade industrial a invenção, o modelo de utilidade, o desenho industrial e a marca

(COELHO, 2004, v. I: 136).

3 A revista Forbes, por exemplo, divulgou em 2010 a sua lista das dez marcas mais valiosas do mundo:

Apple, Microsoft, Coca-Cola, IBM, Google, McDonald’s, General Electric, Marlboro, Intel e Nokia. A empresa

Brandz, por sua vez, diverge em sua lista das dez marcas mais valiosas do mundo em 2010: Google, IBM,

Apple, Microsoft, Coca-Cola, McDonald’s, Marlboro, China Mobile, General Electric, Vodafone.

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âmbito de proteção, além das suas condições de validade, dentre outros aspectos

de relevância para o presente trabalho.

1.1 – Conceitos

O conceito de marca, como se verá, é bastante divergente na doutrina,

muitas vezes se confundindo com a própria função que as marcas exercem.

Para CERQUEIRA (1946: 364/365), “a marca de fábrica e de comércio

pode ser definida como – todo sinal distintivo apôsto facultativamente aos

produtos e artigos das indústrias em geral para identificá-los e diferenciá-los de

outros idênticos ou semelhantes de origem diversa.”.

FERREIRA (1962: 266), por sua vez, ao analisar as definições de marca

dispostas em legislação e doutrina estrangeiras, conclui que “as marcas de

indústria e de comércio são as palavras, sinais ou figuras, isoladas ou em

conjunto, de forma original, adotados e de uso exclusivo do fabricante ou do

comerciante, assegurado pelo registro, a fim de assinalarem-se seus produtos ou

mercadorias a exporem-se à venda.”.

A definição de marca de MENDONÇA (1955: 215), é uma das mais

precisas consagradas pela doutrina. Segundo o autor, as marcas “constituem

sinais gráficos ou figurativos, destinados a individualizar os produtos de uma

empresa industrial ou as mercadorias postas à venda em uma casa de negócio,

dando a conhecer sua origem ou procedência, e atestando a atividade e o

trabalho de que são resultado.”.

No Brasil, a própria LPI define ser suscetível de registro como marca “os

sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições

legais.”4. A definição legal, portanto, de marca no Brasil é todo símbolo distintivo,

4 LPI, artigo 122.

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visualmente perceptivo, não compreendido nas proibições legais, dentre elas

aquelas expressas no artigo 124 da própria LPI.

Dos conceitos referidos, assim, é possível concluir que marca, em seu

conceito mais amplo, é um signo distintivo destinado a assinalar determinados

produtos e serviços dos demais existentes no mercado. No caso brasileiro, tal

signo se limita aos visualmente perceptíveis, não sendo passível de registro como

marca, por exemplo, os sinais sonoros e olfativos5.

É importante destacar das definições referidas que todas elas se atentam

ao papel distintivo e individualizador da marca, característica essencial de referido

instituto. A marca serve para distinguir, individualizar, diferenciar o bem por ela

assinalado dos demais presentes no mercado. Portanto, um símbolo carente de

distintividade, em tese, não pode ser utilizado na identificação de um bem, pelo

simples motivo de ser incapaz de distingui-lo dos demais.

Neste sentido, a LPI, em seu artigo 124, inciso VI dispõe não ser registrável

como marca “sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou

simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a

distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do

produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e

época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de

suficiente forma distintiva;”.

A Convenção da União de Paris – CUP6, por sua vez, em seu artigo 6º,

quinquies, B, (2), prevê como hipótese de recusa ou invalidação de registro de

5 Um exemplo típico de sinal sonoro não passível de registro no Brasil como marca é o famoso “plim-plim”

utilizado nas vinhetas dos programas exibidos pela Rede Globo de Televisão. Dentre os sinais olfativos,

menos comuns no país, tem-se como exemplo a famosa essência de Alecrim presente em todas as lojas da

rede “Le Lis Blanc”, que já identifica a presença de uma das lojas da rede há metros de distância.

6 A CUP trata-se de Convenção datada de 1823 que visa estabelecer regras para o tratamento e a proteção

da propriedade industrial nos países signatários. Referida Convenção teve sua última revisão realizada em

Estocolmo em 1967, revisão esta devidamente ratificada no país pelo Decreto nº 75.572, de 08 de abril de

1975, e pelo Decreto nº 635, de 21 de agosto de 1992, que promulgou no país a adesão do país aos artigos

1º a 12 e artigo 28. Posteriormente, o Decreto 1.263, de 10 de outubro de 1994, ratificou e promulgou a

Declaração de Adesão aos artigos 1º a 12 e ao artigo 28, alínea “1” do Texto da Revisão de Estocolmo de 14

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marca “quando [as marcas] forem desprovidas de qualquer caráter distintivo ou

então exclusivamente composta por sinais ou indicações que possam servir no

comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, o

lugar de origem dos produtos ou a época da produção, ou que se tenham tornado

usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio do

país em que a proteção é requerida;”. O Acordo sobre Aspectos dos Direitos da

Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio - TRIPs7, por fim, em seu artigo

15, (1), ao dispor sobre o objeto de proteção de marca, estabelece que “Qualquer

sinal, ou combinação de sinais, capaz de distinguir bens e serviços de um

empreendimento daqueles de outro empreendimento, poderá constituir uma

marca. Estes sinais, em particular palavras, inclusive nomes próprios, letras,

numerais, elementos figurativos e combinação de cores, bem como qualquer

combinação desses sinais, serão registráveis como marcas.”.

Não há dúvida, portanto, de que a distintividade é característica

indispensável para que um signo seja reconhecido como marca, sendo não

apenas incoerente, mas também expressamente defeso em lei o registro como

marca de sinal não distintivo.

de julho de 1967 (BASSO, 2000: 77). Quanto à aplicabilidade da Convenção da União de Paris no país, por se

tratar de um tratado normativo, já devidamente ratificado no país, a CUP mostra-se perfeitamente aplicável

no Brasil. No caso, contudo, de eventual conflito entre o disposto na CUP e na legislação interna, em

respeito à jurisprudência brasileira, prevalecerá o disposto no diploma mais recente (MORO, 2003:

167/168).

7 O TRIPs (Trade Related Aspects on Intellectual Property Rights), ou Acordo sobre Aspectos dos Direitos da

Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio, trata-se de acordo contratual que prevê regras de

direitos marcários aplicáveis aos signatários do GATT (Acordo Geral de Tarifas do Comércio). O TRIPs foi

incorporado pelo ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto Legislativo nº 30/1994 e Decreto

Presidencial nº 1.355/1994, juntamente com o acordo que criou a OMC (MORO, 2003: 196). Contudo, como

ressalta BARBOSA (2005: 15), o TRIPs, não é uma lei uniforme; ele cria direitos e obrigações para os Estados

Membros signatários do acordo, não criando direitos e obrigações para os entes privados. O TRIPs,

portanto, exige lei interna, mas não se trata de lei interna.

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8

1.2 - Natureza jurídica das marcas

A definição da natureza jurídica das marcas, assim como seu conceito, é

bastante divergente entre os doutrinadores que se aventuram a tratar do tema.

Sendo a marca bem imaterial, contudo, sua natureza jurídica deve ser analisada a

partir da natureza jurídica dos bens imateriais.

MORO (2003: 46) adverte para a importância na definição da natureza

jurídica das marcas, esclarecendo que dependendo da natureza jurídica atribuída,

diferente será a aplicação da lei. “De forma mais específica, diverso será o regime

jurídico aplicado. Dependendo do regime jurídico aplicado, distintas serão as

conseqüências observadas.”.

GUSMÃO (1990: 09/47), em artigo sobre a natureza jurídica do direito da

propriedade intelectual, propõe classificar as diversas teorias que buscam

qualificar o direito sobre os bens intelectuais em três grupos, quais sejam (i)

teorias que determinam a natureza jurídica do direito a partir do seu objeto; (ii)

teorias que determinam a natureza jurídica do direito a partir de sua função, e (iii)

teorias que determinam a natureza jurídica do direito a partir do seu conteúdo.

Por considerar a divisão proposta por referido autor clara e bastante ampla,

o presente trabalho se limitará a tratar da natureza jurídica das marcas sob a ótica

de referido autor.

1.2.1 – Natureza jurídica da marca em função do seu objeto

Dentre as teorias que determinam a natureza jurídica do direito sobre bens

imateriais em função do seu objeto, GUSMÃO (1990: 09/47) vislumbra três

teorias: a teoria da personalidade do direito, a teoria dos direitos intelectuais, de

Edmond Picard e a teoria dos direitos dos bens imateriais, formulada por Kohler.

Segundo o autor, para a teoria da personalidade do direito, o direito sobre

as coisas imateriais, particularmente o direito autoral, é considerado um

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prolongamento do direito da personalidade. Assim, segundo referida teoria, a

proteção do direito de autor seria apenas o prolongamento da proteção do próprio

autor e de sua personalidade.

Contudo, a crítica que se faz a referida teoria é justamente a de confundir o

objeto da proteção com seu criador, além de confundir a natureza do objeto da

proteção jurídica com a natureza jurídica do direito sobre o objeto.

Quanto a este ponto, aliás, CERQUEIRA (1946: 116/117) já se manifestara

ao tratar da inadequação do uso da teoria dos direitos pessoais para explicar os

direitos sobre os bens imateriais. Como bem esclarece mencionado autor,

“O direito pessoal atribuído ao autor, segundo a maioria dos

escritores, consiste: 1º, na segurança da paternidade da obra; 2º

na defesa do inédito; 3º, no direito de arrependimento; 4º, na

faculdade de correção; 5º, na intangibilidade da obra; 6º, na sua

impenhorabilidade. Já vimos que pode ser objeto de cessão o

direito do autor de ligar o nome aos seus produtos intelectuais. Do

mesmo modo, o autor pode despojar-se dos outros direitos que

lhe assistem, cedendo o de alterar a obra e o de retificá-la da

circulação, renunciando à faculdade de correção, transferindo,

enfim, todos os seus direitos ao editor ou a qualquer cessionário.

Êsses direitos, portanto, não constituem direitos pessoais, uma

vez que podem ser cedidos, transformando-se em vantagem

pecuniária; pois os característicos diferenciais dessa classe de

direitos são justamente a falta de conteúdo econômico e a sua

intransmissibilidade.”.

GUSMÃO critica, ainda, referida teoria ao tentar transferi-la para o direito

sobre as marcas, as quais não necessariamente são resultado de um trabalho

intelectual. A aplicabilidade de referida teoria para a propriedade industrial,

portanto, na visão do autor, dificilmente se sustentaria.

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Quanto à teoria dos direitos intelectuais de Picard, ela cria uma nova

categoria para abrigar os direitos relativos aos bens imateriais por entender que

não se trataria de direitos reais, pessoais ou obrigacionais. Referida teoria,

portanto, ao estabelecer a qualificação do direito a partir de seu “objeto

intelectual”, conclui que o direito que o protege seria um “direito intelectual.”.

GUSMÃO, contudo, critica referida teoria em dois aspectos. Primeiramente,

para ele a natureza jurídica dos direitos não se qualifica em função de seu

objeto8. Em segundo lugar, para o autor referida teoria se equivoca ao acreditar

que o direito de propriedade concebido pelos Romanos destina-se apenas a bens

corpóreos. CERQUEIRA (1946: 124), aliás, é mais incisivo ao afirmar que Picard

limitou-se a criar uma nova categoria de direitos sob nova denominação sem,

contudo, definir qual seria sua natureza. Para este autor, “o único mérito da

doutrina de Picard, portanto, consiste em haver acentuado que o direito de autor

recai sôbre uma concepção de espírito, que tem por objeto a própria concepção

de autor e não a sua realização material” (CERQUEIRA, 1946: 127).

Por fim, a teoria sobre os bens imateriais de Kohler, assim como a teoria de

Picard, também propõe a criação de uma nova classe de direitos, a dos direitos

sobre os bens imateriais.

Como explica GUSMÃO, para Kohler, o direito sobre os bens imateriais

repousaria sobre a idéia de utilidade social, e teria sua origem na criação da obra.

Trata-se de um direito de exploração da obra perante o público e, segundo

Kohler, não seria um direito eterno na medida em que os bens imateriais tendem

a ser abandonados, após certo tempo, em favor da coletividade.

Mais uma vez, a crítica que se faz a referida teoria é de que ela não

resolveu a questão da natureza do direito envolvido, ao mesmo tempo em que ela

dificilmente seria aplicável para marcas, e para o direito da propriedade industrial

8 Caso contrário, exemplifica o autor, o direito sobre as coisas corpóreas deveria chamar-se direito corpóreo

e não direito de propriedade.

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como um todo. CERQUEIRA (1946: 130/131), por sua vez, também não poupou a

teoria de Kohler de referida crítica:

“A doutrina de Kohler, mais que a de Picard, representa, sem

dúvida nenhuma, notável progresso no estudo do direito de autor,

residindo seu maior mérito no haver dado a êsse direito um

conteúdo objetivo perfeitamente determinado, ao mesmo tempo

que definia a natureza de seu objeto e esclarecia várias questões

controvertidas e obscuras. Deve-se também ao seu autor, como

acentua Bonnet, a construção jurídica do direito de patentes sobre

o fundamento filosófico, econômico e social do direito do inventor.

Mas, se Kohler definiu o objeto do direito e lhe determinou a

natureza, estabelecendo a nova categoria dos bens imateriais, ao

lado dos bens corpóreos e incorpóreos; se explicou a gênese e o

fundamento do direito de autor; se esclareceu inúmeras e

importantes questões relativas a êste ramo do direito; não se

pode, entretanto, dizer que tenha tido o mesmo êxito ao tentar

definir a natureza específica do direito de autor. Nesse ponto

incorreu em êrro, como Picard, adotando o mesmo método

negativo para demonstrar que o direito de autor não pode incluir-

se entre os direitos pessoais ou entre os de obrigação, nem

considera-se como propriedade, justificando, assim, a criação de

nova categoria de direitos, cuja natureza seria determinada,

exatamente como no caso de Picard, pela origem e pela natureza

do objeto. Deve-se, porém, reconhecer em seu favor o fato de

haver definido com exatidão a natureza do objeto o direito, ao

passo que Picard assimilou a natureza do objeto à sua origem.

Mas, com indicar a natureza do objeto não se define a natureza

do direito que sôbre êle se exerce; de modo que, na teoria do

direito sôbre bens imateriais, a natureza do direito de autor

constitui questão aberta, não resolvida por seu criador.”.

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Conclui o autor, portanto, que nenhuma dessas teorias se prestaria à

explicação da natureza jurídica dos direitos sobre bens imateriais, dentre eles, a

natureza jurídica da marca.

1.2.2 – Natureza jurídica da marca em razão de sua função

Dentre as teorias que buscam determinar a natureza jurídica do direito a

partir de sua função, GUSMÃO trata das duas mais representativas: a teoria dos

direitos de clientela, concebida por Paul Roubier, e a teoria dos direitos de

monopólio, seguida por Remo Franceschelli.

Como esclarece o autor, a teoria dos direitos de clientela cria uma terceira

classe de direitos patrimoniais9. Roubier, em sua teoria, parte do princípio de que

para se definir a natureza jurídica do direito em questão deve-se, primeiramente,

buscar a utilidade econômica de referido direito e seu conteúdo econômico.

Assim, na análise de Roubier, segundo GUSMÃO, as noções de

concorrência e de monopólio devem ser levadas em conta para a análise dos

direitos referidos, os quais devem ser compreendidos na dinâmica jurídica, em

seu movimento, e não em sua estática jurídica como freqüentemente se faz. A

análise da clientela, e principalmente do seu volume, também seria um dado de

relevância na análise desses direitos, uma vez que seu volume mais ou menos

considerável modificaria o valor do bem, afetando o patrimônio do titular desse

bem. Por outro lado, há que se considerar que os direitos de propriedade

intelectual tendem a assegurar uma exploração exclusiva com relação à clientela,

a qual, entretanto, não é fixa, nem pode ser forçada a sê-lo.

MORO (2003: 49) sintetiza a teoria de Roubier ao afirmar que a utilidade

econômica dos direitos sobre bens imateriais estaria na tendência à conquista de

clientela, e seu conteúdo patrimonial, graças à dominação da clientela, estaria na

obtenção de benefícios na concorrência econômica.

9 Além dos direitos reais e dos direitos de crédito.

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GUSMÃO, contudo, critica referida teoria uma vez que Roubier não leva

em conta o conteúdo do direito, mas apenas sua função econômica. Assim,

referida teoria também não serviria para definir a natureza do direito sobre os

bens intelectuais, se limitando, apenas, a destacar uma conseqüência desses

direitos – a sua função econômica. Por outro lado, referida teoria dificilmente seria

aplicável aos direitos autorais.

A teoria dos direitos de monopólio de Franceschelli, assim como a teoria de

Roubier, defende que o caráter fundamental dos direitos de propriedade industrial

e intelectual, nesta teoria denominados “direitos de monopólio”, também estaria

no seu elemento funcional.

Referidos direitos seriam compostos pelo direito de exploração econômica

do objeto do direito – o que pertenceria ao autor independentemente de

regulamentação específica, sendo seu direito patrimonial - e o direito de se opor a

terceiros que tenham comprado esse objeto impedindo-os de reproduzir referido

objeto – prerrogativa que seria conferida ao autor por meio de lei especial (jus

prohibendi).

Após estabelecidos os elementos que compõem referidos direitos,

Franceschelli entende que os direitos de propriedade industrial ou intelectual não

podem ser considerados direitos reais, pessoais ou de obrigação, criando-se,

portanto, uma nova categoria, os “direitos de monopólio”.

Para GUSMÃO, Franceschelli tem mérito na evolução da natureza jurídica

dos direitos em questão, contudo, GUSMÃO entende não ser possível partir de

uma conseqüência econômica do fenômeno jurídico para qualificá-lo

juridicamente. GUSMÃO destaca, ainda o fato de referida teoria basear-se na

confusão entre o objeto do direito e o próprio direito.

Como se verificou, portanto, as teorias mencionadas também não se

prestam para definir a natureza jurídica dos direitos sobre bens imateriais, dentre

eles, a natureza jurídica da marca.

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1.2.3 – Natureza jurídica da marca a partir de seu conteúdo

Para GUSMÃO, as teorias que determinam a natureza jurídica do direito a

partir de seu conteúdo parecem ser as mais acertadas, sendo inclusive as mais

utilizadas pelos autores modernos. Segundo essas teorias, o direito de

propriedade seria o mais adequado para abrigar o direito sobre os bens

imateriais.

Para a teoria da propriedade “tout court”10, o direito de propriedade seria o

mais adequado para abrigar o direito sobre os bens imateriais na medida em que

referido direito seria idêntico ao direito de propriedade que se aplica às coisas

materiais11. Essa teoria, segundo GUSMÃO, seria a mais aceita pelos autores

brasileiros.

Aloïs Troller, divergindo em parte da teoria referida, propõe a teoria da

propriedade imaterial, onde aborda a divergência existente entre os direitos de

propriedade intelectual – que recaem sobre bens incorpóreos -, e os direitos de

propriedade, que recaem sobre bens corpóreos. GUSMÃO elogia referida

abordagem exatamente por notar que existe uma diferença entre referidos

direitos, mas critica Troller pelo fato de não ter aprofundado sua teoria e suas

conseqüências.

Ao final de seu estudo, GUSMÃO propõe uma teoria que denomina ser de

um direito de propriedade sui generis. Através dela, GUSMÃO propõe a aplicação

da teoria do direito de propriedade aos bens imateriais, aperfeiçoando-a, contudo,

ao dar destaque às peculiaridades relativas à natureza do objeto do direito. Para

GUSMÃO, as peculiaridades relativas aos bens imateriais justificam a adoção de

um regime jurídico próprio e sui generis, o qual se adaptaria melhor às restrições

legais impostas pelo legislador, ao mesmo tempo em que supera algumas

imperfeições da teoria da propriedade “tout court”.

10 “puro e simples”.

11 Referido direito de propriedade seria idêntico na medida em que confere ao seu titular o direito de usar,

gozar, dispor e reaver a coisa.

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1.3 – Funções

Como exposto no item 1.1, a definição das marcas muitas vezes se

confunde com suas próprias funções. Neste item, assim, daremos destaque às

principais funções exercidas pelas marcas, e tratadas pela doutrina.

1.3.1 – Função distintiva

Pode se afirmar que a função distintiva é a função primordial das marcas.

Como expusemos no item 1.1, a marca é freqüentemente definida como signo ou

sinal distintivo, exatamente pela função distintiva que exerce sobre o bem ou

serviço que assinala.

A concessão da marca, como se verá no item 1.8, garante ao seu titular um

direito exclusivo de usar, gozar e dispor da marca registrada. Tal direito de

exclusividade, garantido e tutelado pelo Estado, só se justifica na medida em que

a marca exerça uma função também de interesse do Estado. A função distintiva

da marca, assim, parece cumprir bem referida função de interesse estatal na

medida em que, de um lado, estimula o empresário a investir no produto ou

serviço ofertado, na busca da promoção de sua marca, e, de outro, protege o

consumidor do risco de confusão entre os produtos e serviços existentes no

mercado.

A LPI, em seu artigo 122, estabelece ser suscetível de registro como marca

“os sinais distintivos visualmente perceptíveis”. Logo, de acordo com o próprio

texto legal, a marca deve exercer a função distintiva, sob pena de não poder ser

levada a registro perante o INPI. Como também se expôs no item 1.1, tanto a

CUP, como o TRIPs prevêem a distintividade como característica necessária para

a concessão de registro de marca.

FERREIRA (1962: 270/271) define a distintividade das marcas como

qualidade essencial de seu caráter, e decorrente de sua própria definição. Em

suas palavras, “o objetivo da marca é o assinalamento de produtos ou de

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mercadorias, a fim de distinguirem-se de outros do mesmo gênero ou categoria.

Destina-se a evitar confronto entre artigos similares. Não tem outro escopo.”.

Neste mesmo sentido, MIRANDA (1983: 07) insiste que “A marca tem de

distinguir. Se não distingue, não é sinal distintivo, não „assinala‟ o produto

(Decreto-lei n. 7.903, art. 89, parágrafo único), não se lhe pode mencionar

„elementos característicos‟ (art. 126, IV). Confundir-se-ia com as outras marcas

registradas, ou apenas em uso, antes ou após ela. A distinção da marca há de ser

em relação às marcas registradas ou em uso, e em si-mesma; porque há marcas

a que falta qualquer elemento característico, marcas que são vulgaridades

notórias.”.

OLIVEIRA NETO (2003: 19/20) bem define a função distintiva como

essencial para as marcas. Esclarece referido autor que o regime jurídico das

marcas atribui um direito oponível erga omnes, de exclusividade sobre o bem

incorpóreo. Em contra partida, referido regime exige que as marcas cumpram

uma utilidade prática, que na visão do autor, seria a de identificar um produto ou

serviço e distingui-los dos demais. Assim, conclui referido autor tratar-se de um

vínculo típico, constante e necessário entre o objeto, a finalidade e o conteúdo do

direito.

Na doutrina, verifica-se uma divergência entre os autores sobre a função

distintiva exercida pelas marcas. Para alguns autores, como FRANCESCHELLI

(1964: 93), a função distintiva da marca serviria para distinguir o próprio produto

em si, enquanto para outros autores, como MATHÉLY (1984: 12), a função

distintiva da marca se prestaria para distinguir a proveniência do bem ou serviço

assinalado. Quanto a este posicionamento, esclarece GUSMÃO (1990: 119) que

a função distintiva da marca não seria a de indicar a procedência do bem, mas de

garantir sua origem.

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GONÇALVES (1999: 224), ao estudar a função distintiva da marca, trata de

suas diversas noções12, concluindo que

“[a] função distintiva da marca é, hoje, mais ampla e pode ser

assim redefinida: A marca, para além de indicar, em grande parte

dos casos, que os produtos ou serviços provêm sempre de uma

empresa ou de uma empresa sucessiva que tenha elementos

consideráveis de continuidade com a primeira (no caso da

transmissão desvinculada) ou ainda que mantenha com ela

relações actuais de natureza contratual e econômica (nas

hipóteses da licença de marca registrada usada ou de marca de

grupo, respectivamente) também indica, sempre, que os produtos

ou serviços se reportam a um sujeito que assume em relação aos

mesmos o ônus pelo seu uso não enganoso. Ou seja: a função

distintiva, no seu sentido amplo de proveniência, ainda pode

revelar-se válida quando a marca seja um sinal distintivo concreto

(efectivo) de produtos ou serviços, mas deixa de o ser quando a

marca seja mais um sinal distintivo abstracto (potencial) de

produtos ou serviços.”.

CERQUEIRA (1946: 348/349), ao tratar das funções das marcas, entende

que acima da função distintiva estaria sua função identificadora. Nas suas

palavras,

“As marcas, assumem, assim, tôda a sua fôrça de expressão:

marcam, efetivamente, o produto, que passa a ser um produto

diferente, na multidão dos produtos congêneres. A marca

individualiza o produto, identifica-o, distingue-o dos outros

similares, não pela sua origem, mas pelo próprio emblema ou pela

denominação que a constitui. É, pois, um sinal de identificação,

cuja função econômica é importantíssima. (...)

12 GONÇALVES (1999: 139) identifica três noções distintas na doutrina para a função distintiva da marca, as

quais ele divide em noção clássica, moderada ou reformista, e noção inovadora.

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Esta função identificadora das marcas, que já assinalávamos há

12 anos passados, assume hoje em dia importância cada vez

maior, em virtude dos modernos métodos de publicidade, que se

baseiam na denominação do produto e não mais no nome do

produtor. (...) Pode-se dizer, pois, que, antigamente, a marca

distinguia os produtos, indicando-lhes a origem. Hoje distingue-os,

identificando-os, dando-lhes individualidade própria.”.

Não há dúvida, contudo, que ao atribuir à marca a função identificadora,

necessariamente está se atribuindo à marca uma função distintiva. A função

distintiva da marca, portanto, é pacífica na doutrina como indispensável para sua

caracterização, independentemente da doutrina adotada.

1.3.2 – Função de indicação de origem

Além da função distintiva, exerce a marca função de indicação de origem,

isto é, indicação de sua procedência. Diferentemente da função distintiva, a

função de indicação de origem ou de procedência pode ser exercida pela marca,

não se tratando, portanto, de função essencial.

Na doutrina, referida função é identificada especialmente nos trabalhos

mais clássicos, visto que, atualmente, a função de indicação de origem não se faz

tão presente em uma economia altamente globalizada. Na primeira

regulamentação brasileira do uso de marcas, por exemplo, impunham-se

restrições à transferência do direito sobre a marca, uma vez que a função de sua

indicação de origem era tida como função essencial da marca13.

Entretanto, a exportação dos processos produtivos pelas empresas, e

principalmente a terceirização desses processos pelas grandes companhias faz

com que a função de indicação de origem das marcas perca um pouco do seu

13 Decreto nº 3.346, de 14 de outubro de 1887, artigo 13 e Decreto nº 9.828, de 31 de dezembro de 1887,

artigo 7º.

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significado. Não é de se esperar de um consumidor médio que ele saiba

identificar, através de uma marca, qual a empresa que produz determinado bem,

e em qual país ele é produzido.

Além disso, a possibilidade de transferência da marca entre as empresas –

o que ocorre freqüentemente no mercado -, faz com que a procedência dos bens

identificados pela marca seja constantemente alterada. Portanto, um produto que

hoje é produzido em determinado país e por determinada empresa pode ter sido

produzido por empresa e em país completamente distintos há poucos anos atrás,

e mesmo assim, ser identificado pela mesma marca.

O consumidor, por outro lado, raramente se interessa em obter dados

sobre o fabricante do produto, ou sobre o local onde ele é produzido. Assim,

OLIVEIRA (2004: 04) bem pondera que “a função de indicar a proveniência de um

produto não significa, necessariamente, a possibilidade de se identificar a

denominação do produtor, o que, aliás, muitas vezes é indiferente para o

consumidor.”.

MATHÉLY (1994: 11), quanto ao tema, também afasta a função

identificadora da origem das marcas. Como expõe,

“Il est bien évident que la marque n‟identifie pás l‟object q‟uelle

designe, em le définissant dans ce qu‟il est.

En raison de sa nature, et en raison du fait qu'elle est apposée sur

l'object désigné par la personne d'où proviet cet objet, la marque,

par la force des choses, identifie l'objet couvert pat l'indication de

sa provenance ou de son origine.

Certes, il est bien clair que la marque ne détermine pas cette

origine.

Elle ne révèle pas l'identité de la personne qui fabrique ou vend

l'objet désigné.

Elle ne révèle pas non plus le lieu d'établissement de cette

personne.

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Mais elle fournit l'assurance que les objets désignés ont la même

origine.

C'est à cela que le public reconnaît l'objet marqué.”.

Como bem coloca MORO (2003: 40), assim, atualmente a função de

indicação de origem pode ser traduzida como uma função de indicação do

responsável pela fabricação do produto. Tal entendimento mostra-se mais

coerente em uma economia altamente globalizada como a atual, e parece ser o

único que ainda se sustenta.

1.3.3 – Função econômica

Quanto à função econômica exercida pelas marcas, ao contrário do que

ocorre com a função de indicação de origem, parece-nos que na atualidade

referida função adquiriu maior relevância do que quando primeiramente

identificada pela doutrina.

FERREIRA (1962: 267/269) trata da função econômica da marca sob a

ótica do empresário e sob a ótica do consumidor. Ressalta, assim, que para o

titular da marca, esta seria uma garantia na medida em que identifica no mercado

quais os bens produzidos por ele. Essa identificação asseguraria o empresário

“da intensidade e da largueza de sua penetração no campo de consumo.”. Do

prisma do consumidor, a marca operaria como indicativa da origem do produto,

servindo, pois, de garantia no momento da compra. A função econômica da

marca, assim, estaria no estimulo econômico que ela representa tanto para o

empresário quanto para o consumidor.

CERQUEIRA (1946: 349) remete-se à Carvalho de Mendonça para tratar

da função econômica das marcas. MENDONÇA (1955: 217), por sua vez,

reconhece que as marcas “assumem valiosa função econômica garantindo o

trabalho e o esforço humano, representando fator de tráfego e tornando-se

elemento de êxito e de segurança às transações.”.

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Atualmente, contudo, observa-se que a função econômica da marca vai

além do vislumbrado pela doutrina no passado. Os altos investimentos na

promoção da marca constantemente fazem com que elas sejam o maior

identificador não só dos produtos e serviços por elas assinalados, mas das

empresas por detrás delas.

Assim, é comum que as marcas se tornem o maior ativo econômico das

empresas, representando um forte poder atrativo para investidores de todo o

mundo. A marca, portanto, assume papel essencial na captação de recursos e na

abertura de novos mercados.

1.3.4 – Outras funções

A doutrina reconhece, ainda, outras funções que podem ser exercidas pela

marca. Neste item, trataremos de duas funções comumente citada pela doutrina:

a função de indicação de qualidade das marcas, e a função publicitária.

A função de indicação de qualidade, muitas vezes tratada como função de

garantia ao consumidor, diz respeito à função exercida pela marca de transmitir

ao consumidor determinadas características relativas ao produto por ela

assinalado.

Tal função, contudo, parece-nos tratar-se de função meramente fática, não

possuindo, no direito pátrio, nenhum amparo legal.

É certo que ao investir em uma marca, o empresário busca cativar o

mercado consumidor, e conquistar a maior clientela possível. Para tanto, o

consumidor precisa associar determinada marca a características do produto ou

serviço por ela assinalado, como sua qualidade.

Assim, é de interesse do empresário que a qualidade de seu produto ou

serviço não se altere, de modo que sua clientela seja sempre atraída pelas

mesmas características do produto ou serviço que a agradaram no passado.

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Portanto, a marca passa a exercer, neste caso, a função de indicação de

qualidade do produto, neste sentido podendo ser interpretada por uma qualidade

boa ou ruim, dependendo do gosto do consumidor.

OLIVEIRA (2004: 05), contudo, entende ser impróprio, do ponto de vista

jurídico, atribuir à marca qualquer função de garantia, na medida em que nada

impede que o titular da marca altere as características do produto ou serviço por

ela assinalado.

MORO (2003: 43), por fim, destaca as marcas de certificação14 (tratadas no

item 1.5.3.2), as quais têm a função exclusiva de garantir a qualidade de um

produto ou serviço, nos termos em que são registradas. Referidas marcas,

portanto, devem exercer a função de indicação de qualidade, na medida em que

foram concebidas exatamente para este fim.

Quanto à função publicitária ou atrativa das marcas, FERREIRA (1962:

267/268) a descreve bem ao afirmar que “[o] proprietário efetua a propaganda de

seus artigos, assim por sua originalidade, quanto por efeito de sua publicidade.

Campanha publicitária bem orientada e melhor executada é de eficácia

incontestável. O que se anuncia é a marca; mas o que se vende é o produto.

Raridade não é, todavia, que os papéis se invertam. Ao cabo de propaganda

persistente e que os consumidores passem a comprar os produtos por causa de

suas marcas, tanto prestígio elas adquirem.”.

A publicidade, portanto, tem importância não só na promoção da marca,

mas principalmente na construção de sua identidade. A publicidade pode agregar

às marcas valores não necessariamente intrínsecos aos produtos ou serviços por

elas assinalados, podendo atribuir às marcas maior atratividade.

Não há dúvida, ainda, que a publicidade é um importante fator na conquista

de clientela, na medida em que apresenta aos consumidores novas marcas

lançadas no mercado, ao mesmo tempo em que relembra os consumidores das

14 LPI, artigo 123, inciso II.

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marcas já existentes. Como conclui MORO (2003: 45), “Ao final verifica-se uma

relação de interdependência entre publicidade e marca. Se, de um lado, a marca

se desenvolve pela publicidade, de outro, é ela instrumento indispensável à

mesma publicidade.”.

1.4 – Princípios relativos às marcas

Os princípios relativos às marcas, em geral, visam delimitar o âmbito de

proteção do direito conferido às marcas (MORO, 2003: 63). Como se verificou, a

função primária das marcas é distinguir os produtos e serviços por elas

assinalados dos demais existentes no mercado. Assim, a proteção legal conferida

ao titular de marca registrada não é absoluta, e visa apenas proteger o titular da

marca de seus concorrentes.

Os principais princípios relativos às marcas tratados pela doutrina são o

princípio da territorialidade, consagrado no artigo 129 da LPI, e o princípio da

especialidade.

A doutrina vislumbra ainda, um terceiro “princípio” que seria inerente à

marca: o princípio da novidade da marca. Embora referido princípio se confunda

com uma condição de validade da marca, ele será tratado no item 1.4.3 deste

Capítulo em respeito ao posicionamento doutrinário encontrado.

1.4.1 – Princípio da territorialidade

O princípio da territorialidade decorre da própria noção de soberania do

Estado, e prevê que a proteção conferida pelo Estado não transcende os limites

territoriais do país. Assim, nos termos do princípio da territorialidade, uma vez

registrada a marca, a ela é conferida proteção nos limites do território nacional.

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GUSMÃO (1996: 51) esclarece que o princípio da territorialidade deriva do

princípio maior da territorialidade das leis, “segundo o qual as leis de determinado

Estado são aplicáveis única e exclusivamente no território daquele Estado.”.

A LPI, assim, prevê o princípio da territorialidade em seu artigo 129 ao

assegurar ao titular da marca registrada seu uso exclusivo em todo o território

nacional.

MORO (2003: 65) bem coloca a questão do uso da marca no território

nacional. Como salienta, é indiferente nos termos da lei que uma marca registrada

no país seja utilizada apenas em uma cidade, estado, ou em todo o país. O

âmbito de proteção da marca é nacional, podendo seu titular, se assim quiser,

utilizá-la por todo o país ou em apenas uma região.

Assim, uma vez registrada a marca perante o INPI, não importa em que

região está localizado seu titular, nem qual a extensão do uso de sua marca

dentro do país. O registro validamente concedido garante proteção no âmbito

nacional.

No mesmo sentido, o titular de marca estrangeira deve efetuar seu registro

no país a fim de garantir sua proteção também no território nacional. Logo, não

importa que a empresa estrangeira não possua sede no país, nem mesmo que

sua marca seja registrada em dezenas de países: apenas o registro nacional lhe

garantirá proteção exclusiva no território nacional.

A LPI15, contudo, em conformidade com a própria CUP16, prevê uma

exceção ao princípio da territorialidade: a proteção conferida à marca

notoriamente conhecida. Como esclarece o texto das Diretrizes Provisórias de

Análise de Marcas17 (item 1.1.7.1), ao tratar da regra contida na CUP,

15 LPI, artigo 126. 16 CUP, artigo 6 bis (I). 17 Instituída pela Resolução nº 051/97, de maio de 1997. Com relação à referidas Diretrizes, é importante

esclarecer que foram elas instituídas para assegurar aos usuários do sistema marcário, e aos examinadores,

estabilidade quanto à interpretação das normas e dos princípios de Propriedade Industrial relativos às

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“Por essa regra unionista, o Brasil compromete-se, na qualidade

de signatário da Convenção, a recusar ou invalidar registro de

sinal que constitua usurpação de marca regularmente protegida,

via depósito ou registro, em outro país membro da Convenção,

quando esta for notoriamente conhecida no País,

independentemente de estar previamente depositada ou

registrada no Brasil (art. 126 da LPI).”.

Nos termos da LPI, portanto, o INPI poderá indeferir de ofício pedido de

registro de marca que reproduza ou imite marca notoriamente conhecida18. No

mesmo sentido, o titular de marca estrangeira notoriamente conhecida poderá se

opor ao registro de marca no país que reproduza ou imite sua marca,

independentemente de ter depositado, no país, pedido de registro para sua

marca.

Referida exceção, como se verifica, decorre da notoriedade da marca, e se

justifica pelo risco existente que um terceiro venha a registrar no país marca

estrangeira notoriamente conhecida, para assinalar os mesmos bens ou serviços

assinalados pela marca notoriamente conhecida em seu país de origem.

1.4.2 – Princípio da especialidade

O princípio da especialidade é aquele segundo o qual as marcas têm

proteção delimitada aos produtos ou serviços iguais ou semelhantes (GUSMÃO,

1996: 50). Segundo referido princípio, portanto, o direito de exclusividade ao uso

marcas. Contudo, quando instituída, determinou-se que elas fossem revistas no prazo de três meses, para

sua adequação integral à LPI. Referida revisão nunca ocorreu e as Diretrizes “provisórias” até hoje são

utilizadas, como se permanentes fossem. Discute-se, contudo, se referidas Diretrizes não estariam

revogadas, uma vez que já ultrapassado o prazo previsto para sua revisão. Sem adentrar ao mérito da

questão, referidas Diretrizes ainda se mostram relevantes não apenas para orientar os usuários do sistema

marcário e examinadores, mas por trazer conteúdo informativo de questões previstas pela LPI, mas por ela

não esclarecidas.

18 LPI, artigo 126, parágrafo 2º.

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de determinada marca garantido pelo seu registro limita-se aos bens ou serviços

idênticos, semelhantes ou afins àqueles que a marca assinala.

É importante esclarecer que o sistema de registro de marcas adota uma

divisão dos produtos e serviços em classes, facilitando, assim, não apenas o

registro das marcas, mas também a identificação de eventuais usurpadores de

marcas de terceiros19. Quando do depósito de pedido de registro de marca

perante o órgão competente, o titular do depósito deve indicar em qual classe

pretende registrar a sua marca, e a disponibilidade de referida marca, portanto,

será analisada, primeiramente, dentro da classe indicada em seu depósito.

Referida análise, contudo, não deve estar limitada a apenas uma classe, mas ao

ramo de atividade no qual se insere a marca.

A identificação da violação de uma marca por outra, com base no princípio

da especialidade, mostra-se cada vez mais complexa. A diversificação dos bens e

serviços oferecidos por uma mesma empresa faz com que uma mesma marca

seja passível de registro pelo mesmo titular em diversas classes distintas. Uma

famosa fabricante de roupas, por exemplo, pode também se dedicar à venda de

óculos de sol, perfumes e maquiagens, produtos incluídos em classes distintas e

que não necessariamente seriam consideradas “afins” a roupas. A proximidade,

portanto, entre as classes de marcas e serviços é cada vez maior, o que deve ser

levado em consideração pelo examinador dos órgãos de registro de marca

quando da análise de anterioridades impeditivas ao registro de uma marca. Daí

falar-se em proteção ao ramo de atividade, e não apenas a determinada classe

marcária.

Neste sentido, se manifestou CERQUEIRA (1946: 371):

19 A partir de janeiro de 2000, o Brasil passou a adotar a Classificação Internacional de Produtos e Serviços (Classificação de Nice), em substituição à antiga Classificação de Produtos e Serviços nacional, instituída pelo Ato Normativo 51, de 1981. A Classificação de Nice foi instituída por um Acordo concluído por ocasião da Conferência Diplomática de Nice, em 15 de junho de 1957, e revista em Estocolmo, em 1967, em Genebra, em 1977, e corrigida em 1979. Esta classificação, atualmente, é constituída por uma lista de 34 classes e por uma lista alfabética de produtos, e mais 11 classes e uma lista alfabética de serviços, totalizando, assim, 45 classes de produtos e serviços.

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“O princípio da especialidade da marca, entretanto, não é

absoluto, nem neste assunto podem firmar-se regras absolutas,

pois se trata sempre de questões de fato, cujas circunstâncias

não podem ser desatendidas quando se tem de decidir sobre a

novidade das marcas e a possibilidade de confusão. Quando se

trata de indústrias ou gêneros de comércio inteiramente diversos,

a questão de coexistência de marcas idênticas ou semelhantes

facilmente se resolve. Ninguém confundiria, por exemplo, uma

peça de fazenda com uma garrafa de vinho, ou um automóvel

com uma balança, não sendo induzido em êrro pelo fato de ser

usada a mesma marca nesses produtos. Tratando-se, porém, de

indústrias similares ou afins, surgem as primeiras dificuldades,

exigindo-se maior exame e ponderação. Nesses casos, a marca

empregada em uma indústria não deve ser admitida em outra, se

não existir sensível diferença entre os respectivos produtos,

levando-se ainda em conta a possibilidade de querer o titular da

marca estender a sua indústria a outros ramos similares, caso em

que ficaria impedido de empregar sua marca, se a outro

concorrente fôsse lícito usá-la.”

MORO (2003: 70), aliás, define bem a diferença existe entre “classe” e

“ramo de atividade”: “[n]em sempre o ramo de atividade está contido em uma só

classe, podendo ser mais abrangente que esta. E não necessariamente os

produtos ou serviços elencados em uma classe pertencem a um mesmo ramo de

atividade. Para o titular da marca, melhor é a proteção em seu ramo de atividade,

pois é neste que ele poderá sofrer mais prejuízos se um terceiro registrar marca

igual ou semelhante à sua, para assinalar produto igual ou afim.”.

A LPI, em seu artigo 125, prevê como exceção ao princípio da

especialidade a proteção conferida às marcas de alto renome, às quais “será

assegurada proteção especial, em todos os ramos de atividade.”.

Note-se que, assim como ocorre no princípio da territorialidade, a exceção

do princípio da especialidade também decorre da notoriedade da marca, e

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referida proteção se justifica pelo alto grau de notoriedade característico das

marcas de alto renome. A marca Coca-Cola, por exemplo, é imediatamente

identificada pelo consumidor como sendo a marca que identifica refrigerantes.

Contudo, o alto grau de notoriedade da marca garante à The Coca-Cola

Company, titular da marca Coca-Cola20, proteção à sua marca nos demais ramos

de atividade.

Neste caso, mais do que coibir eventual confusão entre os produtos e

serviços assinalados pela marca de alto renome, busca-se, de um lado, evitar

associações indevidas à marca, o que doutrinariamente se denomina

aproveitamento parasitário, ao mesmo tempo em que se protege a marca de alto

renome do risco de diluição.

1.4.3 – Princípio da novidade da marca

LOUREIRO (1999: 230/231) propõe, ainda, o princípio da novidade da

marca. Segundo o autor, “Para que um sinal seja suscetível de ser utilizado como

marca ele deve estar disponível, ou seja, que um terceiro já não o tenha

registrado como marca. Para que seja considerado novo, é suficiente que o sinal

não tenha sido objeto de registro por parte de um concorrente do mesmo setor de

atividade (princípio da especialidade).”. Afirma, assim, o autor, que as marcas de

alto renome constituiriam uma exceção a referido princípio, na medida em que a

elas a lei nacional assegura proteção especial em todos os ramos de atividade.

CERQUEIRA (1946: 376), por sua vez, também disserta sobre o princípio

da novidade da marca, afirmando que “A novidade exige-se em relação às

marcas registradas no país, e, só excepcionalmente, em conseqüência e por fôrça

dos tratados e convenções internacionais, em relação às marcas estrangeiras,

satisfeitas certas condições.”.

20 Registro de marca nº 002.423.790.

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Parece-nos, contudo, que a novidade relativa trazida por referidos autores

como princípio marcário nada mais é do que condição de validade da marca.

Assim, uma vez cumprida referida condição, juntamente com as demais previstas

em lei, o registro de marca é concedido, não havendo que se falar em “princípio”

marcário.

1.5 – Tipos de marcas

As marcas registradas, tais como previstas no artigo 123 da LPI,

apresentam-se de diversas formas. Nesse item, trataremos dos principais tipos de

marcas registradas previstos pela doutrina e pela LPI. Trataremos, ainda, da

marca notoriamente conhecida, que embora constitua hipótese de marca não

registrada, merecerá destaque no Capítulo II do presente trabalho.

1.5.1 – Quanto à forma de apresentação

Quanto à forma de apresentação, dispõe as Diretrizes Provisórias de

Análise de Marcas que as marcas podem ser nominativas, figurativas, mistas e

tridimensionais, as quais serão tratadas a seguir.

1.5.1.1 – Marcas nominativas

As marcas nominativas são aquelas constituídas apenas por letras e

números, sem qualquer estilização. São exemplos de marcas nominativas as

marcas “COFAP”21, “752”22, “AASP”23, “BEIJINHO DOCE”24, dentre outras.

21 Registro de marca nº 003.431.169. 22

Registro de marca nº 007.156.790. 23

Registro de marca nº 006.030.858. 24

Registro de marca nº 820.773.140.

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Referidas marcas, quando concedidas, têm sua proteção limitada à

expressão ou conjunto numérico que a compõem, podendo ser representadas,

portanto, sob estilizações diversas.

1.5.1.2 – Marcas figurativas

As marcas figurativas, diferentemente, são aquelas constituídas

exclusivamente de elementos gráficos, como desenhos. São exemplos de marcas

figurativas:

25 26

Referidas marcas, quando concedidas, são protegidas apenas quanto ao

seu elemento figurativo, o qual deve ser utilizado exatamente como concedido,

sob pena de descaracterizar a marca registrada27.

1.5.1.3 – Marcas mistas

As marcas mistas, como a própria denominação informa, são aquelas

compostas tanto por elementos nominativos quanto elementos figurativos, ou

25

Registro de marca nº 006.192.424. 26 Registro de marca nº 811.058.948. 27 Alguns doutrinadores defendem, contudo, a proteção in genere da marca figurativa, isto é, que o registro de determinada figura como marca daria ao titular da marca o direito de uso exclusivo do gênero da imagem. OLIVEIRA (1998: 39), após ponderar referido entendimento, entende que a proteção in genere não se justifica por si só, devendo ser constatada semelhança intelectual capaz de criar risco de confusão entre as imagens.

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apenas de elementos nominativos representados de forma estilizada. São

exemplos de marcas mistas:

28 29

Quando concedidas, referidas marcas devem ser utilizadas tal como

concedidas – mesma estilização e todos os elementos no conjunto -, sob pena de

serem descaracterizadas como marcas.

1.5.1.4 – Marcas tridimensionais

Por fim, as marcas tridimensionais são aquelas compostas por desenhos

elaborados em três dimensões, como se verifica nos exemplos a seguir:

30 31

Referidas marcas podem ser constituídas de outros elementos, tanto

figurativos quanto nominativos, devendo também ser utilizadas tal como

concedidas sob pena de descaracterizar a marca.

28

Registro de marca nº 816.443.718. 29

Registro de marca nº 824.349.610. 30

Registro de marca nº 825.661.340. 31

Registro de marca nº 200.037.056.

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1.5.2 – Quanto à origem

Quanto à origem, as marcas podem ser nacionais ou estrangeiras.

1.5.2.1 – Marcas nacionais

As Diretrizes Provisórias de Análise de Marcas dispõem que as marcas

nacionais – ou marcas brasileiras -, são aquelas depositadas no Brasil por

pessoas domiciliadas no país. Em outras palavras, marcas nacionais são aquelas

registradas por entes brasileiros no próprio país de origem.

1.5.2.2 – Marcas estrangeiras

As marcas estrangeiras, por sua vez, são aquelas depositadas no país por

pessoa não domiciliada no Brasil, ou, ainda, são aquelas que, depositadas em

país vinculado a acordo ou tratado do qual o Brasil faça parte, ou em organização

internacional, são também depositadas no território nacional no prazo estipulado

no respectivo acordo ou tratado, e cujo deposito no país contenha reivindicação

de prioridade em relação à data do primeiro pedido.

Referida definição, como se verifica, engloba especialmente as marcas

previstas no artigo 12732 da LPI, às quais é permitido reivindicar prioridade no

registro, nos termos da lei referida.

32 “Art. 127. Ao pedido de registro de marca depositado em país que mantenha acordo com o Brasil ou em organização internacional, que produza efeito de depósito nacional, será assegurado direito de prioridade, nos prazos estabelecidos no acordo, não sendo o depósito invalidado nem prejudicado por fatos ocorridos nesses prazos.

§ 1º A reivindicação da prioridade será feita no ato de depósito, podendo ser suplementada dentro de 60 (sessenta) dias, por outras prioridades anteriores à data do depósito no Brasil.

§ 2º A reivindicação da prioridade será comprovada por documento hábil da origem, contendo o número, a data e a reprodução do pedido ou do registro, acompanhado de tradução simples, cujo teor será de inteira responsabilidade do depositante.

§ 3º Se não efetuada por ocasião do depósito, a comprovação deverá ocorrer em até 4 (quatro) meses, contados do depósito, sob pena de perda da prioridade.

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1.5.3 – Quanto à destinação

A LPI, em seu artigo 123, distingue as marcas quanto à destinação ou

finalidade do uso, dispondo que as marcas podem ser de produto ou serviço, de

certificação, ou coletivas, as quais serão tratadas a seguir.

1.5.3.1 – Marcas de produtos ou serviços

As marcas de produto ou serviço, como dispõe o inciso I do artigo 123 da

LPI, são aquelas utilizadas para distinguir um produto ou serviço de outro idêntico,

semelhante ou afim, de origem diversa. As marcas de produtos ou serviços são

as comumente encontradas nos mercado.

1.5.3.2 – Marcas de certificação

As marcas de certificação, previstas no inciso II do artigo 123 da LPI, são

aquelas que se destinam a atestar a conformidade de um produto ou serviço com

determinadas normas ou especificações técnicas, notadamente quanto à

qualidade, natureza, matéria utilizada e metodologia empregada. São exemplos

de marca de certificação:

§ 4º Tratando-se de prioridade obtida por cessão, o documento correspondente deverá ser apresentado junto com o próprio documento de prioridade.”.

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33

34

Como pondera CERQUEIRA (1946: 386), contudo, “não se pode

reconhecer nessas marcas o caráter de verdadeiras marcas de fábrica ou de

comércio, tendo-se em vista o conceito destas e a sua função primordial de

assinalar e distinguir os produtos em relação ao seu fabricante ou vendedor.”

O uso das marcas de certificação independe de licença, conforme prevê o

artigo 150 da LPI, “bastando sua autorização no regulamento de utilização.”.

1.5.3.3 – Marcas coletivas

As marcas coletivas, por sua vez, estão previstas no inciso III do artigo 123

da LPI, e são aquelas utilizadas para identificar produtos ou serviços provindos de

membros de uma determinada entidade associativa, como as cooperativas ou

organizações não governamentais, por exemplo. Um bom exemplo de marca

coletiva é a marca “UNIMED”35·, que visa assinalar serviços médicos prestados

por médicos de uma determinada cooperativa.

Ressalte-se que, assim como ocorre com as marcas de certificação, o uso

das marcas coletivas independe de licença, bastando sua autorização no

regulamento de utilização36.

33 Registro de marca no 821.105.124. Ressalte-se que esta marca consta na base de dados do INPI como

sendo marca de serviço porque seu registro foi requerido anteriormente à vigência da LPI, que institui a

classificação de marca de certificação, mas serve perfeitamente para o exemplo.

34 Registro de marca no 820.425.923. 35 Registro de marca nº 760.283.494. 36

LPI, artigo 150.

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1.5.4 – Quanto ao grau de distintividade

Por fim, quanto ao grau de distintividade, as marcas são divididas pela

doutrina entre marcas de alto renome e marcas notoriamente conhecidas. Neste

item, contudo, apenas introduziremos referidos tipos de marca, uma vez que o

Capítulo II do presente trabalho será exclusivamente dedicado a esses tipos de

marca.

1.5.4.1 – Marcas de alto renome

Marcas de alto renome são marcas registradas amplamente conhecidas e

identificadas pelo público consumidor, nele incluído não apenas o público

consumidor específico da marca, mas o mercado consumidor como um todo.

Referidas marcas assinalam produtos de qualidade e, por serem imediatamente

reconhecidas pelo consumidor, merecem proteção especial, nos termos da lei.

A LPI37, neste sentido, prevê proteção especial às marcas consideradas de

alto renome, garantindo-lhes proteção em todos os ramos de atividade. Referida

proteção especial, portanto, como se verá, constitui verdade exceção ao princípio

da especialidade das marcas, este já definido no item 1.4.2.

1.5.4.2 – Marcas notoriamente conhecidas

De todos os tipos de marca definidos até aqui, as marcas notoriamente

conhecidas são as únicas não registradas. Trata-se de marcas muito conhecidas

no ramo em que estão inseridas e, por este motivo, são freqüentemente utilizadas

indevidamente por terceiros na identificação de produtos idênticos ou afins aos

assinalados pela marca notoriamente conhecida.

37 LPI, artigo 125. “À marca registrada no Brasil considerada de alto renome será assegurada proteção especial, em todos os ramos de atividade”.

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Como se verá no Capítulo II, A LPI38, assim como a CUP39, garantem

proteção especial às marcas notoriamente conhecidas dentro de seu ramo de

atividade, independentemente de registro no país. Trata-se, como se verá, de

exceção ao princípio da territorialidade, tal como definido no item 1.4.1 supra.

1.6 – Sistemas de aquisição de direitos sobre as marcas

A doutrina tradicional reconhece dois sistemas de aquisição de direitos

sobre a marca. A principal diferença entre esses dois sistemas, como se verá está

na forma em que o direito sobre a marca é adquirido e, conseqüentemente, nos

efeitos do registro da marca para a aquisição desta.

MENDONÇA (1955: 323) propõe, ainda, um sistema intermediário, também

tratado por FERREIRA (1962: 355/357) e, posteriormente, por MORO (2003: 54),

quando da análise do sistema brasileiro de aquisição de direitos sobre a marca.

Referido sistema será devidamente abordado no item 1.6.3.

38 “Art. 126. A marca notoriamente conhecida em seu ramo de atividade nos termos do art. 6º bis (I), da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial, goza de proteção especial, independentemente de estar previamente depositada ou registrada no Brasil.

§ 1º A proteção de que trata este artigo aplica-se também às marcas de serviço.

§ 2º O INPI poderá indeferir de ofício pedido de registro de marca que reproduza ou imite, no todo ou em parte, marca notoriamente conhecida.”.

39 “Art. 6o bis (1): Os países da União comprometem-se a recusar ou invalidar o registro, quer administrativamente, se a lei do país o permitir, quer a pedido do interessado e a proibir o uso de marca de fábrica ou de comércio que constitua reprodução, imitação ou tradução, suscetíveis de estabelecer confusão, de uma marca que a autoridade competente do país do registro ou do uso considere que nele é notoriamente conhecida como sendo já marca de uma pessoa amparada pela presente Convenção, e utilizada para produtos idênticos ou similares. O mesmo sucederá quando a parte essencial da marca notoriamente conhecida ou imitação suscetível de estabelecer confusão com esta.”.

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1.6.1 – Sistema declarativo

No sistema declarativo de direitos sobre a marca40, é o primeiro uso da

marca que garantirá a seu titular a propriedade sobre a marca. Logo, neste

sistema, o registro da marca é meramente declarativo, uma vez que apenas

declara a propriedade da marca ao seu titular.

Esclarece CERQUEIRA (2010: 63), contudo, que o direito de propriedade

adquirido pelo uso, nesse sistema, não é absoluto. Como coloca, “[a] lei

reconhece, em certos limites, o direito fundado no uso da marca, exigindo o

registro para que o seu titular possa gozar das suas garantias especiais.”.

Para MENDONÇA (1955: 324), referido sistema seria o mais justo, pois

evitaria “espoliações injustas, por especuladores desalmados, ávidos em se

locupletarem com o alheio. Respeita o direito do criador da marca.”.

Muitas críticas são traçadas pela doutrina a respeito de referido sistema de

marca. A principal delas seria a insegurança que referido sistema representa para

os titulares das marcas, os quais dificilmente terão conhecimento de todas as

marcas adotadas em um determinado ramo de atividade, dificultando, pois, a

escolha da marca que se pretende adotar.

1.6.2 – Sistema atributivo

No sistema atributivo de direitos41, ao contrário do sistema declarativo, a

propriedade da marca adquire-se pelo registro de marca validamente concedido.

Logo, para adquirir direitos sobre a marca, deve o titular submeter seu pedido de

registro de marca a uma análise de mérito perante os órgãos competentes e,

somente o registro atribuirá os direitos de propriedade.

40 Referido sistema é adotado, geralmente, pelos países de common-law, como é o caso dos Estados Unidos

da América.

41 Referido sistema é adotado, geralmente, pelos países de civil-law, como é o caso da França.

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A vantagem oferecida por referido sistema seria a “da exatidão do regime

das marcas, evitando as questões sôbre posse ou uso, facilitando a prova da data

certa da propriedade e igualando a proteção internacional à nacional.”

(MENDONÇA, 1655: 324).

CERQUEIRA (2010: 66), contudo, assevera que “[o] sistema do registro

atributivo pode, algumas vezes, prejudicar o comerciante negligente, que descura

de seus interesses.”.

Entretanto, entendemos que o sistema atributivo é o único capaz de dar

garantias ao empresário de que sua marca é única em seu ramo de atividade.

Apesar da evolução dos meios de comunicação, a existência de um órgão central,

responsável pelas concessões de registro de marca, é de extrema importância na

busca prévia das marcas já existentes no mercado.

Além disso, como referido sistema exige o registro da marca, ele também

prevê a necessidade de uma análise de mérito, por órgãos especializados, acerca

da registrabilidade ou não das expressões e sinais levados a registro. Há,

portanto, uma garantia de que apenas sinais distintivos, lícitos e disponíveis, nos

termos da lei, serão efetivamente registrados como marca.

1.6.3 – Sistema misto

Como já introduzido, a existência de um sistema misto de aquisição de

direitos sobre a marca é proposto por MENDONÇA (1955: 323), e tratado por

FERREIRA (1962: 355/357) e MORO (2003: 54), sendo na opinião desta autora, o

sistema adotado pela legislação brasileira.

MENDONÇA (1955: 323), ao analisar referido sistema, esclarece que ele

“reconhece no registro efeito declarativo somente durante certo período de tempo;

decorrido, porém, êste prazo, não havendo oposição de terceiro, considera-se a

marca definitivamente de uso exclusivo daquele que a registrou e depositou, sem

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39

que se lhe possa excepcionar com o uso anterior de outrem.”. Assim, em sua

opinião, referido sistema “combina com felicidade os extremos dos outros,

estabelecendo brevíssimo prazo a contar do registro, para o preutente usar o seu

direito de reivindicação. Findo o prazo, sem reclamação, o registro a princípio

declarativo, torna-se atributivo da propriedade.” (MENDONÇA, 1955: 324).

O sistema misto, como informa o próprio nome, possui características tanto

do sistema declarativo como do sistema atributivo de direitos. Mas como ressalta

MORO (2003: 54), “Na prática, verifica-se a predominância de um ou outro

sistema puro, o que não prejudica a divisão teórica mencionada.”.

De fato, ante o disposto no artigo 129 caput da LPI42, no Brasil o sistema

de aquisição seria, a priori, atributivo, uma vez que apenas o registro validamente

expedido confere propriedade sobre a marca. A LPI, contudo, no parágrafo

primeiro do artigo referido, prevê o denominado direito de precedência, o qual

garante ao usuário de boa-fé de marca não registrada precedência no seu

registro. Assim, bastaria o uso anterior no país, por seis meses, de expressão

levada a registro por terceiro, para que o usuário tivesse direito sobre a marca.

Parece-nos, contudo, que a exceção contida no parágrafo primeiro do

artigo 129 apenas confere ao usuário da marca direito de precedência no registro

daquela. Logo, o mero uso da marca, neste caso, não confere ao seu titular direito

de propriedade, o qual só lhe será atribuído se sua marca for efetivamente

concedida após o tramite administrativo no órgão competente.

Assim, o sistema misto proposto pelos autores, no nosso entender, não se

aplica ao sistema brasileiro, no qual apenas o registro validamente concedido

atribuirá a propriedade da marca ao seu titular.

42

LPI, artigo 129: “A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148. § 1º Toda pessoa que, de boa fé, na data da prioridade ou depósito, usava no País, há pelo menos 6 (seis) meses, marca idêntica ou semelhante, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, terá direito de precedência ao registro. § 2º O direito de precedência somente poderá ser cedido juntamente com o negócio da empresa, ou parte deste, que tenha direta relação com o uso da marca, por alienação ou arrendamento.”.

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40

1.7 – Condições necessárias para registrabilidade da marca

Como já se verificou (item 1.6.3), no Brasil, a propriedade da marca só se

adquire pelo registro validamente expedido. Assim, tratar das condições de

validade da marca é também tratar das condições necessárias para a

registrabilidade da marca.

Para COELHO (2004: 158) o registro da marca está sujeito a três

condições: a novidade relativa, a não-colidência com marca notória, e o

desimpedimento. O autor inova na doutrina ao trazer a “não colidência com marca

notória” como condição necessária para o registro da marca. Segundo o autor,

“Seu fundamento legal se encontra no art. 126 da LPI, que atribui

ao INPI poderes para indeferir de ofício pedido de registro de

marca, que reproduza ou imite, ainda que de forma parcial, uma

outra marca, que notoriamente não pertence ao solicitante. (...)

O principal objetivo do segundo requisito da registrabilidade é a

repressão à contrafação de marcas (a chamada pirataria). Essa

prática ilícita consiste em requerer o registro de marcas ainda não

exploradas pelos seus criadores no Brasil, mas já utilizadas

noutros países. Quando o empresário, responsável pela criação e

consolidação da marca no exterior, resolve expandir seus

negócios para o mercado brasileiro, encontra-a registrada em

nome de outra pessoa, em princípio o titular do direito de

exclusividade. Demonstrada a notoriedade da marca, o

empresário poderá requerer ao INPI a nulidade do registro

anterior, bem como a concessão do direito industrial em seu

nome.” (COELHO, 2004: 161/162).

Quanto ao tema, CERQUEIRA (1946: 369) apresenta quatro requisitos que

seriam necessários para que as marcas preencham os fins a que se destinam: (i)

cunho distintivo; (ii) novidade; (iii) veracidade e (iv) caráter lícito.

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41

Neste trabalho, optamos por classificar as condições necessárias para

registro da marca de acordo com as características que o signo deve apresentar

para constituir marca válida. Para ser registrado como marca, o signo deve ser

distintivo43, lícito44 e encontrar-se disponível.

1.7.1 – Distintividade

A distintividade como condição de registrabilidade da marca decorre do

próprio artigo 122 da LPI, que dispõe ser suscetível de registro como marca “os

sinais distintivos...”.

CERQUEIRA (1946: 369) define bem a distintividade como condição de

validade da marca, abordando seu duplo aspecto:

“Destinando-se a distinguir produtos idênticos ou semelhantes, a

marca não pode deixar de ser distinta, sob duplo aspecto: ser

característica em si mesma, possuir cunho próprio, na expressão

de Ouro Preto, e distinguir-se das outras marcas já empregadas.

Os autores belgas costumam exprimir a mesma idéia, dizendo

que a marca deve ser subjetiva e objetivamente distintiva.”.

Neste mesmo sentido se manifestou RICCI (2006: 192), afirmando ser

necessário levar em consideração tanto a distintividade intrínseca quanto a

extrínseca do sinal a fim de se estabelecer seu grau de proteção em relação ao

seu caráter distintivo. Como esclareceu,

“(i) a distintividade intrínseca do sinal, i. e., quando analisado em

si mesmo, no seu sentido semântico primário e usual, aferindo se

o mesmo guarda relação direta ou indireta com os produtos ou

serviços. Para tanto deverão ser levadas em consideração as

43

LPI, artigo 122. 44

Previsão no mesmo artigo anterior.

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42

peculiaridades lingüísticas, filosóficas e culturais do país no qual a

norma terá aplicação.

(ii) distintividade extrínseca (externa) do sinal em relação ao

mercado e ao próprio e peculiar público consumidor do produto ou

do serviço, levando em consideração, inclusive, a realidade e as

peculiaridades de fato do mercado ou do país onde a norma será

aplicável, aferindo se o sinal tem reflexos e interferência no

campo econômico, na concorrência entre competidores, na

percepção e na proteção do público consumidor.”.

Para GUERRA (1996: 87), a noção de sinal distintivo teria relação direta

com os produtos ou serviços que o sinal visa assinalar. Esclarece o autor que um

sinal não distintivo em certa indústria pode ser em outra, logo, a distintividade

deve ser analisada à luz do princípio da especialidade.

Como amplamente tratado nos itens 1.1 e 1.3.1, a distintividade é função

primária das marcas, sendo completamente incoerente que se registre como

marca sinal incapaz de distinguir um produto ou serviço dos demais existentes do

mercado. Um sinal carente de distintividade utilizado como marca seria ineficaz,

inútil, e, portanto, completamente inconcebível.

1.7.2 - Licitude

Para ser passível de registro, o sinal deve ser lícito, isto é, não deve ele se

encontrar dentre as proibições legais. Na LPI, as vedações legais encontram-se

expressamente previstas nos artigos 124 e 181.

A ilicitude, neste caso, pode se dar em função de três aspectos: (i) ilicitude

em função da ordem pública45; (ii) ilicitude em função da contrariedade do sinal à

moral e aos bons costumes46, e (iii) ilicitude em função do caráter enganoso do

45 LPI, artigo 124, incisos I, XI e XIV.

46 LPI, artigo 124, inciso III.

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43

signo, que neste caso, pode se dar pela falsa indicação de proveniência47, ou pela

falsa indicação de qualidade ou de recompensa48. (MORO, 2003: 61).

LOUREIRO (1999: 239/250) distingue os sinais que não podem ser

adotados como marca em (i) marcas ilícitas49; (ii) sinais que podem atentar contra

a moral e os bons costumes ou contra a ordem pública50; (iii) sinais que podem

induzir a erro os consumidores no que se refere à origem, natureza ou qualidade

dos produtos ou serviços, os quais denomina marcas fraudulentas51; (iv) sinais

desprovidos de capacidade distintiva52, e (v) sinais que violem direitos da

personalidade ou outros direitos de propriedade intelectual.

COELHO (2004: 161) trata da necessidade da licitude do sinal para sua

registrabilidade como “requisito de desimpedimento” do signo. Aprofunda, assim,

sua análise, referindo-se expressamente às vedações legais dispostas no artigo

124 da LPI.

Quanto à ilicitude das marcas, pondera, ainda, CERQUEIRA (1946: 378):

“Deve se distinguir, entretanto, a marca ilícita do uso ilícito de

marcas válidas em si. Como observa Allart, a marca pode ser

ilícita em si, como, por exemplo, quando se trata de sinais cujo

uso, como marca, é vedado pelas leis. Mas pode dar-se no caso

de ser lícita a marca, destinando-se, entretanto, a assinalar

produtos cuja venda é interdita de modo absoluto ou reservada a

certas pessoas.”.

47 LPI, artigo 181.

48 LPI, artigo 124, inciso VI.

49 LPI, artigo 124; Convenção Internacional de Genebra, artigo 23; CUP, artigo 6º ter; Tratado de Nairobi de

1981, quanto aos símbolos olímpicos.

50 LPI, artigo 124, inciso III.

51 LPI, artigo 124, incisos IV, V, VII, IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XIX, XXIII.

52 LPI, artigo 124, incisos VI, VIII, XVIII, XX, XXI.

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44

Conclui-se, portanto, que para que um sinal seja passível de registro não

basta que ele seja distintivo. É ainda necessário que ele não esteja entre os sinais

expressamente vetados para registro como marca, isto é, que não seja ilícito.

1.7.3 - Disponibilidade

A disponibilidade, como condição necessária para registrabilidade da

marca, consiste “em não haver registro anterior daquele signo para produtos e

serviços iguais ou afins, bem como não pode encontrar óbice, proibição em outro

sinal distintivo protegido pela lei.” (MORO, 2003: 60). Assim, para ser disponível,

o signo não deve ter sido levado a registro em determinada classe de produtos ou

serviços por terceiros, nem ser objeto de proteção por outro instituto.

Como bem define GUERRA (1996: 88), trata-se de requisito de direitos

anteriores, que podem ser, por exemplo, direitos personalíssimos, direitos

autorais, direitos aos nomes de empresas, direitos às indicações geográficas, e

direitos de propriedade de marca anteriores.

MORO (2009: 105/106), em obra mais recente, aprofunda-se quanto ao

tema:

“O preenchimento da condição de disponibilidade ou novidade

relativa nada mais significa do que a constatação da não-

apropriação do sinal pretendido anteriormente por terceiro.

Entenda-se não-apropriação do sinal previamente não só como

marca, para assinalar produtos ou serviços idênticos,

semelhantes ou afins, mas também a não apropriação anterior por

terceiros de outros direitos protegidos por lei, tais como direitos de

personalidade e de imagem, nomes empresariais, indicações

geográficas, desenhos industriais e direitos autorais. Se, no

momento do depósito do pedido de registro de marca, já existir

alguma marca ou algum desses direitos mencionados de

titularidade de terceiro, que possa dar ensejo a confusão,

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45

entende-se que há anterioridade e que, portanto, o sinal não está

disponível.”

Como já se verificou, a proteção marcária, via de regra, é limitada a um

determinado ramo de atividade, como conseqüência do princípio da especialidade

das marcas (item 1.4.2). Assim, quando se fala em disponibilidade de um signo

em relação às marcas anteriormente registradas, esta deve ser analisada

principalmente dentro do ramo de atividade no qual se busca registrar a marca.

Parece-nos, assim, que a disponibilidade, em parte, muito se assemelha à

condição de novidade relativa tratada pela doutrina. Em ambos os casos, o que

também se sustenta é que para que um signo seja registrado como marca, não

pode ele já ter sido levado a registro por terceiros para assinalar produtos e

serviços do mesmo ramo.

Sobre a nomenclatura adotada, MORO (2009: 106) esclarece:

“Apesar de novidade relativa e disponibilidade terem igual

significação, acredita-se que o termo „disponibilidade‟ é mais claro

do que a expressão „novidade relativa‟, uma vez que no contexto

marcário aquela exige menos esforço interpretativo do que esta.

Em outras palavras, a explicação da composição „novidade

relativa‟ é muito mais complexa que a do termo „disponibilidade‟.”

Quanto à novidade relativa, sintetiza MENDONÇA (1955: 264/265):

“A marca de indústria ou de comércio, para corresponder ao seu

fundamental escopo, deve ser distintiva, evitando a confusão dos

produtos ou mercadorias similares (...). Os escritores exprimem

essa idéia dizendo que a marca deve ter o caráter da novidade.

(...)

Entenda-se aqui a novidade no sentido relativo, excluída a idéia

de invenção ou criação original dos sinais que entram para a

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46

composição das marcas. Êsses sinais podem ser vulgaríssimos,

achando-se no domínio comum ou público.”.

Sobre este requisito, também se manifesta CERQUEIRA (1946: 369/370):

“Êste requisito, entretanto, não deve ser entendido de modo

absoluto: a novidade da marca é relativa, bastando para

considerar-se nova, que a marca não seja ainda usada para

assinalar produtos idênticos ou semelhantes. (...)

Nada impede também que a marca seja idêntica ou semelhante a

outra já usada para distinguir produtos diferentes ou empregada

em outro gênero de comércio ou indústria. É neste caso que o

princípio da especialidade da marca tem sua maior aplicação,

abrandando a regra relativa a novidade. A marca deve ser nova,

diferente das já existentes, mas tratando-se de produtos ou

indústrias diversas, não importa que ela seja idêntica ou

semelhante a outra em uso.”.

COELHO (2004: 158), por fim, ao dispor sobre a novidade relativa,

esclarece que “não é exigida a novidade absoluta para a concessão do registro.

Não é necessário que o requerente tenha criado o sinal, em sua expressão

lingüística, mas que lhe dê, ou ao signo não lingüístico escolhido, uma nova

utilização.”.

1.8 – Proteção conferida pelo registro marcário

Como já se verificou (itens 1.6.2 e 1.6.3), no Brasil é o registro que confere

ao depositário ou usuário da marca a propriedade sobre ela. Assim, o registro

confere ao titular da marca direito de usar, gozar e dispor da marca adquirida.

Conforme dispõe o artigo 129 da LPI, ao titular da marca é assegurado o

direito de uso exclusivo da marca em todo território nacional. Assim, pode se

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47

afirmar que a principal finalidade do registro de marca é garantir ao seu titular o

direito de uso exclusivo da marca.

Quanto ao direito de dispor da marca, a LPI assegura ao seu titular o direito

de ceder e licenciar a marca registrada53. Note-se, quanto a este ponto, que a LPI

confere o direito de dispor da marca até mesmo para os titulares de pedido de

registro de marca, isto é, titulares de mera expectativa de direito.

O artigo 130, inciso III da LPI, por sua vez, confere ao titular da marca – e

ao titular de pedido de registro de marca – o direito de zelar pela sua integridade

material ou reputação. Tal direito permite que o titular ou depositário da marca se

oponha, por exemplo, contra terceiros que usem suas marcas na promoção de

eventos, ou ainda em propagandas comparativas.

Ao tratar dos direitos conferidos pelo registro da marca, CERQUEIRA

(2010: 120) aponta quatro direitos: (i) o direito de usar a marca para assinalar os

produtos e serviços indicados em seu registro; (ii) o direito de usar dos meios

legais para se opor a terceiros que empreguem marca idêntica ou semelhante

para os mesmos fins, ou usem a marca legítima em bem ou serviço de outra

procedência; (iii) o direito de anular registro para marca idêntica ou semelhante

registrada por terceiro para assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins, e

(iv) o direito de dispor da marca registrada, através da transferência ou cessão.

1.8.1 – Limitação à proteção

Como já se teve oportunidade de afirmar (item 1.4), a proteção conferida

ao titular da marca não é absoluta, encontrando limites nos princípios da

especialidade e territorialidade.

53

LPI, artigo. 130. “Ao titular da marca ou ao depositante é ainda assegurado o direito de: I - ceder seu registro ou pedido de registro; II - licenciar seu uso;”.

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48

Além de referidos limites, encontra-se na LPI uma lista expressa de

limitações à proteção conferida pelo registro de marca. São elas:

“Art. 132. O titular da marca não poderá:

I - impedir que comerciantes ou distribuidores utilizem sinais

distintivos que lhes são próprios, juntamente com a marca do

produto, na sua promoção e comercialização;

II - impedir que fabricantes de acessórios utilizem a marca para

indicar a destinação do produto, desde que obedecidas as práticas

leais de concorrência;

III - impedir a livre circulação de produto colocado no mercado

interno, por si ou por outrem com seu consentimento, ressalvado o

disposto nos §§ 3º e 4º do art. 68; e

IV - impedir a citação da marca em discurso, obra científica ou

literária ou qualquer outra publicação, desde que sem conotação

comercial e sem prejuízo para seu caráter distintivo.”.

Assim, apesar de o titular da marca possuir direito de uso exclusivo de sua

marca, não pode ele, por exemplo, impedir que comerciantes identifiquem em

seus estabelecimentos as marcas dos produtos ali comercializados. Outra

limitação importante é aquela relativa aos fabricantes de acessórios, que até por

uma questão de esclarecimento ao consumidor, costumam especificar as marcas

dos produtos compatíveis com os acessórios por eles produzidos.

Não podem os titulares das marcas, ainda, se opor à circulação de

produtos identificados por suas marcas, salvo nas hipóteses expressas na lei,

pois uma vez colocados no mercado, exaure o direto do titular da marca sobre

eles. Por fim, quanto às obras cientificas ou literárias, também não pode o titular

da marca se opor a trabalhos que façam menção às suas marcas, respeitado seu

caráter distintivo.

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49

Outra limitação que se coloca quanto ao registro de marca é seu caráter

temporário. Como prevê a LPI54, o registro de marca vigora pelo prazo de dez

anos, findo qual, caso não seja prorrogado, extingue-se55. A LPI56, aliás, prevê

outras três hipóteses de extinção da marca: (i) pela renúncia; (ii) pela

caducidade57, que ocorre quando o titular da marca não inicia seu uso no Brasil

no prazo de cinco anos; quando interrompe referido uso pelo prazo de cinco anos,

ou ainda quando faz uso da marca de forma distinta da qual foi concedida, e (iii)

pela ausência de constituição ou de manutenção de procurador no país, por

empresa estrangeira, com poderes para representá-la administrativa e

judicialmente.

1.9 – Sinais não registráveis como marca devido à ausência de

distintividade

No item 1.1, ao definir o conceito de marca, concluímos ser sua principal

característica a distintividade. Verificou-se também, no item 1.3.1, ser a função

distintiva a principal função exercida pela marca. Por fim, no item 1.7.1, a

distintividade foi tratada como condição de validade da marca.

Há de se concluir, portanto, que um sinal carente de distintividade não

pode ser registrado como marca. Não seria sequer coerente, aliás, adquirir

exclusividade no uso de expressão que não distingue os produtos ou serviços por

ela assinalados dos demais existentes no mercado.

54

LPI, artigo 133. “O registro da marca vigorará pelo prazo de 10 (dez) anos, contados da data da concessão do registro, prorrogável por períodos iguais e sucessivos.”.

55 LPI, artigo 142. “O registro da marca extingue-se: I - pela expiração do prazo de vigência;”.

56 LPI, artigo 142. “O registro da marca extingue-se: (...) II - pela renúncia, que poderá ser total ou parcial em relação aos produtos ou serviços assinalados pela marca; III - pela caducidade; ou IV - pela inobservância do disposto no art. 217.”.

57 LPI, artigo 143. “Caducará o registro, a requerimento de qualquer pessoa com legítimo interesse se, decorridos 5 (cinco) anos da sua concessão, na data do requerimento: I - o uso da marca não tiver sido iniciado no Brasil; ou II - o uso da marca tiver sido interrompido por mais de 5 (cinco) anos consecutivos, ou se, no mesmo prazo, a marca tiver sido usada com modificação que implique alteração de seu caráter distintivo original, tal como constante do certificado de registro.”.

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50

A legislação nacional, assim, em artigo que indica expressamente os sinais

que não são passíveis de registro como marca58, dispõe, especialmente, não

serem registráveis os sinais carentes de distintividade. Nos termos da LPI:

“Art. 124. Não são registráveis como marca: (...) VI - sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para

58 LPI, artigo 124. “Não são registráveis como marca: I - brasão, armas, medalha, bandeira, emblema,

distintivo e monumento oficiais, públicos, nacionais, estrangeiros ou internacionais, bem como a respectiva designação, figura ou imitação; II - letra, algarismo e data, isoladamente, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva; III - expressão, figura, desenho ou qualquer outro sinal contrário à moral e aos bons costumes ou que ofenda a honra ou imagem de pessoas ou atente contra liberdade de consciência, crença, culto religioso ou idéia e sentimento dignos de respeito e veneração; IV - designação ou sigla de entidade ou órgão público, quando não requerido o registro pela própria entidade ou órgão público; V - reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos; VI - sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva; VII - sinal ou expressão empregada apenas como meio de propaganda; VIII - cores e suas denominações, salvo se dispostas ou combinadas de modo peculiar e distintivo; IX - indicação geográfica, sua imitação suscetível de causar confusão ou sinal que possa falsamente induzir indicação geográfica; X - sinal que induza a falsa indicação quanto à origem, procedência, natureza, qualidade ou utilidade do produto ou serviço a que a marca se destina; XI - reprodução ou imitação de cunho oficial, regularmente adotada para garantia de padrão de qualquer gênero ou natureza; XII - reprodução ou imitação de sinal que tenha sido registrado como marca coletiva ou de certificação por terceiro, observado o disposto no art. 154; XIII - nome, prêmio ou símbolo de evento esportivo, artístico, cultural, social, político, econômico ou técnico, oficial ou oficialmente reconhecido, bem como a imitação suscetível de criar confusão, salvo quando autorizados pela autoridade competente ou entidade promotora do evento; XIV - reprodução ou imitação de título, apólice, moeda e cédula da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios, dos Municípios, ou de país; XV - nome civil ou sua assinatura, nome de família ou patronímico e imagem de terceiros, salvo com consentimento do titular, herdeiros ou sucessores; XVI - pseudônimo ou apelido notoriamente conhecidos, nome artístico singular ou coletivo, salvo com consentimento do titular, herdeiros ou sucessores; XVII - obra literária, artística ou científica, assim como os títulos que estejam protegidos pelo direito autoral e sejam suscetíveis de causar confusão ou associação, salvo com consentimento do autor ou titular; XVIII - termo técnico usado na indústria, na ciência e na arte, que tenha relação com o produto ou serviço a distinguir; XIX - reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia; XX - dualidade de marcas de um só titular para o mesmo produto ou serviço, salvo quando, no caso de marcas de mesma natureza, se revestirem de suficiente forma distintiva; XXI - a forma necessária, comum ou vulgar do produto ou de acondicionamento, ou, ainda, aquela que não possa ser dissociada de efeito técnico; XXII - objeto que estiver protegido por registro de desenho industrial de terceiro; e XXIII - sinal que imite ou reproduza, no todo ou em parte, marca que o requerente evidentemente não poderia desconhecer em razão de sua atividade, cujo titular seja sediado ou domiciliado em território nacional ou em país com o qual o Brasil mantenha acordo ou que assegure reciprocidade de tratamento, se a marca se destinar a distinguir produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com aquela marca alheia.”.

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51

designar uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva;”.

O sinal de caráter genérico59 pode ser entendido como aquele comumente

empregado para designar gênero, espécie, natureza, origem, nacionalidade,

procedência, destino, peso, medida, valor e qualidade (SOARES, 2010: 196).

FERREIRA (1962: 287), ao tratar dos sinais não registráveis como marca,

define como genérica

“[a] denominação designativa de certos e determinados produtos,

por sua composição, qualidade ou interêsse. É a que se refere a

certos gêneros de produtos ou mercadorias e por si só as indica.

Também se tem como necessária, por empregada correntiamente

pelo público ou pelo comércio, se não por um e outro. Dêsse

modo, os produtos por ela se conhecem, e por ela se clamam no

consenso e na voz de tôda gente.”.

Note-se que, para referido autor, as marcas genéricas são também

necessárias. Neste sentido, também se manifestou CERQUEIRA (1956: 34/35):

“Denominações genéricas são as próprias denominações

necessárias, usuais ou vulgares a que o Código se refere no

parág. único do art. 93, permitindo o seu registro, desde que se

revistam de forma distintiva. (...) São denominações relativas ao

gênero do produto ou artigo e, por isso, não podem constituir

objeto de direito exclusivo. Compreendem também as chamadas

menções genéricas, que seguem a mesma regra. As „expressões

empregadas comumente para designar gênero, espécie,

natureza, origem, nacionalidade (sic), procedência, destino, peso,

medida, valor, qualidade‟, outra coisa não são também que as 59 São exemplos de sinal de caráter genérico: genuíno, Brasil, americano, maravilhoso, ótimo, excelente,

carioca etc. (SOARES, 2010: 196).

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52

mesmas denominações genéricas, a que se refere o inciso, não

se compreendendo, assim, o emprêgo da conjunção bem assim,

como se tratasse de elementos diferentes. Aliás, usando

expressões diversas para designar a mesma coisa, o Código

incorre em grave êrro de técnica e dá lugar a dúvidas que não

deveriam existir nesta matéria.”.

MIRANDA (1983: 34), contudo, assevera:

“E preciso não se confundam denominações genéricas e

denominações necessárias. A denominação necessária pode não

ser genérica: „Morro do Corcovado‟ é denominação necessária

sem ser genérica. A denominação genérica não é proibida se

verídica: pode-se introduzir a expressão „sapato‟ na marca de

indústria ou de comércio, se é de sapato que se trata. No

parágrafo único do art. 93 do Decreto-lei n. 7.903, falou-se de

denominações necessárias, usuais ou vulgares, para se permitir o

uso, se revestirem forma distintiva suficiente. No art. 95, inciso 5º,

de denominações genéricas: a essas exige-se o mesmo, mais

veracidade. Seria absurdo exigir-se veracidade a denominação

necessária não-genérica.”.

As Diretrizes Provisórias de Análise de Marcas60, buscando orientar os

examinadores e usuários do sistema marcário, definem o sinal de caráter

genérico como “o termo ou expressão nominativa ou a sua representação gráfica

que, sem ser de caráter necessário em relação ao produto ou serviço, ou

indicativo de natureza, nacionalidade, peso, valor qualidade e época de produção

ou de prestação de serviço, não pode individualizá-lo, sob pena de atentar contra

o direito dos concorrentes;”.

60 Item 3.5.1.a.

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53

O sinal necessário61, por sua vez, é aquele “que representa o verdadeiro

nome do produto, está intrinsecamente ligada ao mesmo e é indispensável para

identificá-lo.” (SOARES, 2010: 196). Para FERREIRA (1962: 287), “a

denominação necessária é, em última análise, a única por via da qual a

mercadoria se designa, agregando-se-lhe de modo a não se poder separar uma

da outra.”.

As Diretrizes Provisórias de Análise de Marcas62, em caráter esclarecedor,

definem sinal necessário como o “termo ou expressão nominativa ou o elemento

figurativo indispensável para designar ou representar o produto, a mercadoria ou

o serviço; ou, ainda, seus insumos;”.

A proibição ao registro de sinal necessário se fundamenta no direito do

empresário de se referir ao seu próprio produto pelo seu nome. O registro a título

exclusivo, por exemplo, da palavra “refrigerante” para designar bebidas impediria

que empresas como a The Coca-Cola Company fizesse qualquer referência ao

seu produto Coca-Cola por meio de sua denominação. Neste sentido, também se

manifesta LOUREIRO (1999: 243): “o monopólio do nome ou sinal genérico em

benefício de um comerciante poderia gerar uma exclusividade inadmissível e

injusta, além de prejudicial aos concorrentes, que não teriam como apresentar

seus produtos.”.

O sinal de caráter comum ou vulgar63, por sua vez, é aquele “que se

incorporou à linguagem comum do povo, sem indicar, necessariamente, o

produto, mas dando perfeita caracterização do mesmo. Mais se nos avizinha

como sendo da gíria ou dito popular.” (SOARES, 2010: 197). Nas Diretrizes

Provisórias de Análise de Análise de Marcas, o sinal de caráter comum ou vulgar

é definido como “o termo ou expressão nominativa ou o elemento figurativo que,

embora não corresponda ao nome ou à representação pelo qual o produto, a

61

São exemplos de sinais necessários: automóvel para assinalar veículos, bala para assinalar doces etc.

62 Item 3.5.1.b.

63 São exemplos de sinais de caráter vulgar: pinga para assinalar aguardente, expresso para assinalar café etc.

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mercadoria ou o serviço foram originariamente identificados, tenha sido

consagrado, pelo uso corrente, para essa finalidade, integrando, assim, a

linguagem comercial;” (item 3.5.1.c).

Por fim, o sinal de caráter descritivo “é a designação, nome, palavra ou

conjunto de palavras próprias para descrever o produto, mercadoria ou serviço,

expondo e realçando a sua natureza, qualidade, valor, ingredientes, composição,

indicação, peso, medida, função ou qualquer outra propriedade ou característica

do produto.” (SOARES, 2010: 197). Exemplo de sinal descritivo seria o uso da

expressão “MARCATEMPO” para assinalar cronômetros64.

Quanto aos sinais mencionados, ressalva o próprio inciso VI, do artigo 124

da LPI que referidos sinais não são registráveis como marca “quando tiver relação

com o produto ou serviço a distinguir”. Assim, CERQUEIRA (2010: 05) adverte

que referida proibição não é absoluta, sustentando que

“[n]ão basta que o sinal adotado tenha uma relação qualquer com

o produto ou artigo que distingue; é preciso que essa relação seja

necessária ou, pelo menos, direta e imediata. Se o sinal se

relacionar apenas de modo fantasista ou indireto com o produto, a

regra deixa de ter aplicação.”.

Não se tratando, pois, de relação direta, mas indireta com o bem ou serviço

designado pelo sinal, este será passível de registro, ainda que constitua marca

pouco distintiva. Neste caso, como assevera CERQUEIRA (1946: 413),

“Tratando-se, porém, não do nome ou denominação própria do

produto, mas de palavra que com êle se relacione, ou de outros

elementos comuns, o seu uso, quando necessário, continua livre;

mas como marca, é exclusivo de quem primeiro a registrou. Êsse é

o caso, por exemplo, das marcas descritivas, das formadas por

letras ou algarismos, e outras. A lei protege o direito que assiste a

64

Diretrizes Provisórias de Análise de marcas, item 3.5.1.d.

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todos os comerciantes industriais de usarem a denominação

descritivas com que designam os produtos e artigos do comércio,

as letras do alfabeto, os algarismos, as menções genéricas, e

outros elementos que a êsses se equiparam. Não visa, entretanto,

assegurar-lhes o direito de empregarem marcas idênticas às

criadas pelos seus concorrentes. O fato de se tratar de

denominação relacionada com o objeto, a que a marca se destina,

não implica, necessariamente, no direito de terceiros usarem a

mesma denominação sob forma distintiva diferente.”.

SIERVI (2005: 47/48) ressalta, ainda, a questão dos termos estrangeiros.

Como bem coloca, se o sinal em língua estrangeira for genérico, descritivo,

vulgar, necessário ou de uso comum em relação ao produto ou serviço que irá

assinalar, este também será irregistrável, nos termos da LPI.65

A jurisprudência, por sua vez, está repleta de casos em que se impediu o

registro como marca de expressões que tenham relação com o produto ou serviço

que visavam assinalar, como “FEIRA LIVRE DE AUTOMÓVEIS”66, “BANCO 24

HORAS”67, “CHEESE”68 para produtos alimentícios, “CENTRO DE ESTÉTICA”69,

“KARAOKÊ”70, “NOSSO PÃO71” etc. (SCHIMIDT, 1999: 12).

65 Neste sentido, o INPI concedeu à empresa espanhola Telefonica S. A. a marca “TELEFONICA” para assinalar serviços de comunicação apenas em sua forma mista, e sem direito de uso exclusivo do elemento nominativo (Registro nº 821.343.513). A palavra “telefonica”, no idioma nacional, significa “telefone”.

66 TRF, 4ª Turma – AC 107.310 – Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro – j. 24.11.86 – DJU 11.12.86.

67 TRF, 2ª Região, 1ª Turma – AC 92.02.02639-4 – Rel. Des. Fed. Tânia Heine – j. 01.06.92 – DJU II 07.07.92,

p. 20.451, mantido em EI – j. 08.09.94 – DJU II 09.05.95, p. 27.311.

68 TRF, 2ª Região, 2ª Turma - AC 90.0220656-9 – rel. Des. Fed. D’Andréa Ferreira – j. 08.02.94 – DJU II 16.05.95, p. 29.115 e JSTJ e TRF 80/417.

69 STJ, Embargos de Divergência em REsp 7.259-0 – j.14.10.92 – DJU 16.11.92.

70 TRF, 2ª Região, 4ª Turma – AC 94.02.04546-5 – Rel. Juíza Convocada Valéria Medeiros e Albuquerque – j. 20.11.95 – DJU II 13.02.96, p. 6.756.

71 TRF, 2ª Região, 1ª Turma – AC 89.02.01526-2 – Rel. Des. Fed. Chalu Barbosa – j. 28.11.94 – DJU 18.04.95, p. 21.882.

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Há de se destacar, ainda, a ressalva trazida no inciso VI do artigo 124

supra reproduzido, que permite o registro dos sinais referidos quando revestidos

de suficiente forma distintiva.

Um sinal genérico, vulgar, ou comum, por exemplo, pode adquirir caráter

distintivo em conjunto com outros sinais, como os sinais figurativos. Nesses

casos, o INPI pode perfeitamente conceder a marca em sua forma mista, que

deverá ser utilizada em seu conjunto. Um exemplo de sinal necessário registrado

como marca é a marca “CASA DO PÃO DE QUEIJO”, concedida, em sua forma

mista, em 05 de junho de 1990, sob o nº 814.225.284, para assinalar “pães de

queijos, biscoitos, biscoitos amanteigados, bolos, bombons, brioches, doces,

empadas, pãezinhos, pão, pão integral, pão de sanduíche, pastéis, pastelaria,

pizzas, pudins, sanduíches, tortas, salgados, fermento, fermentas para massas

farinhas alimentares, massas.”. Referida marca, concedida sem exclusividade de

seu elemento nominativo, está assim configurada:

Outra hipótese que se vislumbra é a de um sinal necessário, por exemplo,

ser utilizado para assinalar produto ou serviço que não possui qualquer relação

com ele. Neste caso, o caráter distintivo também é mantido, como por exemplo, a

marca “TERRA”72, concedida para assinalar serviços de comunicação,

publicidade e propaganda.

O termo estrangeiro, no mesmo sentido, se empregado de forma distintiva

também é passível de registro como marca. Como exemplo, tem-se o registro da

marca “WHITE HORSE”73, concedida para assinalar uísque.

72

Registro de marca nº 821.230.239, concedido em 19.08.2008. 73

Registro de marca nº 002.784.769, concedido em 13.01.1943.

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II. MARCA NOTÓRIA

O estudo da marca notória mostra-se extremamente complexo dentro do

campo do direito. Sendo a notoriedade marcária fenômeno fático, sua percepção

envolve critérios muito subjetivos, fazendo, pois, com que a análise e identificação

da marca notória nem sempre seja precisa.

Por outro lado, a notoriedade da marca implica em efeitos jurídicos

relevantes, os quais devem ser definidos com cautela. Se por um lado a

notoriedade garante à marca maior atratividade, esta também passa a ser mais

visada pelos concorrentes, sendo freqüentemente objeto de violação por

terceiros. Neste cenário, empresários e consumidores são os entes mais

afetados, fazendo a marca notória jus, portanto, a proteção especial.

Assim, não é por outro motivo que acordos internacionais e legislação

pátria vêm garantindo às marcas notórias referida proteção especial, a qual vai

além da proteção ordinariamente concedida às marcas comuns. A legislação

nacional, contudo, não define as marcas notórias. Tal lacuna se dá, na verdade,

pelo fato de o conceito de notoriedade, como já exposto, envolver critérios

subjetivos, de difícil definição.

O presente Capítulo é dedicado ao estudo da marca notória, em especial

da marca notoriamente conhecida, e da marca de alto renome. Na primeira parte

do capítulo, buscar-se-á definir referidos institutos. Em um segundo momento,

tratar-se-á acerca da proteção garantida às marcas notórias, e principalmente

sobre os fundamentos para referida proteção.

2.1 – Conceito de notoriedade

O termo notoriedade provém de notório, no latim, notorius, de nascere

(conhecer), e pode ser definido como a qualidade ou a condição do que é sabido

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ou conhecido. Notório, por sua vez, é o que é do conhecimento de todos ou de

conhecimento generalizado (SILVA, 2000: 560).

Aplicando-se o conceito de notoriedade para o direito marcário, pode se

afirmar que a notoriedade é verificada quando um sinal distintivo é

excepcionalmente conhecido pelo público especializado ou pelo público em geral.

Referida notoriedade normalmente agrega ao sinal distintivo maior poder atrativo

e, conseqüentemente, maior valor econômico, ao mesmo tempo em que aumenta

o risco de aproveitamento parasitário do sinal por terceiros.

Note-se que a notoriedade de um sinal não decorre necessariamente da

qualidade dos bens e serviços por ele assinalados, ou da qualidade do sinal em

si. Não se pode negar que um produto de qualidade superior freqüentemente tem

sua marca mais destacada perante o mercado. Por outro lado, uma marca objeto

de forte campanha publicitária pode ser igualmente notória, independentemente

da qualidade do bem que assinala. Logo, sinais de maior ou menor distintividade

podem igualmente se tornar notórios perante o público consumidor, seja pelo alto

investimento em publicidade, seja pela qualidade do bem que assinala.

HERNÁNDEZ (2006: 40/41), ao tratar das marcas notórias no México,

discorre sobre os conceitos “notório” e “famoso” dentro do direito marcário. Em

seu entendimento, famosa seria aquela marca “que goza de fama y renombre. /

Superior, excelente./ Soñado, extravagante”, enquanto notória seria aquela marca

“sobradamente conocido, sabido de todos/ fácil de observar, evidente.” Conclui,

pois, que “[s]i uma marca es FAMOSA, luego entonces es NOTORIA, pero si uma

marca es NOTORIA no necessariamente es FAMOSA.”.

O conceito de notoriedade no âmbito marcário se trata de construção

doutrinária, diante da ausência de definição legal para o termo. E a doutrina, por

sua vez, tentando classificar as marcas notórias em marcas de alto renome e

marcas notoriamente conhecidas, freqüentemente se equivoca quanto ao

conceito alcançado.

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2.1.1 – Questão fática

A notoriedade da marca trata-se de fenômeno fático, que se mostra de

extrema relevância na medida em que produz efeitos diretos no campo do direito

(CORREA, 1997: 33).

Primeiramente, ressalta-se que as causas que levam a marca à

notoriedade são diversas74, como já exposto anteriormente. Para efeitos da

proteção especial conferida às marcas notórias, contudo, é indiferente identificar

quais os motivos que levaram determinado sinal a ser profundamente

reconhecido pelo público. Uma vez reconhecida a notoriedade do sinal, merece

ele proteção especial, dentro dos limites da lei.

RODRIGUES (2004: 11), expressa bem a questão fática da notoriedade da

marca, distinguindo-a, contudo, do fato notório:

“[o] alto renome da marca é um fato que decorre de uma realidade

que se lança no mercado e não um fato jurídico, strictu sensu,

porém, como tal, projeta efeitos no plano jurídico, repelindo,

contudo, qualquer tentativa de fixação no tempo e no espaço.

Sob esse espectro, a hipótese de alto renome parece não

encontrar similitude, de fato e de direito, na prática ou

ideologicamente, com a do fato notório, que, por sua própria

essência, independe de prova.

O fato notório constitui conhecimento próprio da cultura de

determinada sociedade, ou, minimamente, de certa localidade,

restando indene de dúvida que se trata de fato sabido por todos,

sem exceção.

Já o alto renome não reclama conhecimento tão difundido que

permita afirmar que ninguém, ninguém dentro de certa coletividade

possa ignorá-lo, donde não se deve orientar pelos mesmos

74 São fatores que influenciam a notoriedade da marca: a qualidade do produto ou serviço, o maciço

investimento em publicidade, a associação da marca a eventos ou celebridades, dentre outras.

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paradigmas e, de efeito, pelo mesmo princípio de direito que rege o

fato notório.”.

Em se tratando de questão fática, a dificuldade que se enfrenta quanto às

marcas notórias é a de estabelecer critérios de reconhecimento da notoriedade de

um sinal, a fim de se delimitar quais seriam as marcas merecedoras da proteção

especial prevista na lei.

O INPI, em uma tentativa de normalizar os procedimentos para a aplicação

do artigo 125 da LPI75, que trata da proteção especial conferida às marcas de alto

renome, baixou a Resolução nº 121/05, de 06 de setembro de 2005. Referida

Resolução apresenta em seu artigo 4º uma lista de informações que podem ser

apresentadas pelo titular de marca de alto renome para ajudar na comprovação

da notoriedade de sua marca, quais sejam:

“1) data do início do uso da marca no Brasil;

2) público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica;

3) fração do público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica, essencialmente pela sua tradição e qualificação no mercado, mediante pesquisa de opinião ou de mercado ou por qualquer outro meio hábil;

4) fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identifica a marca com os produtos ou serviços a que ela se aplica, mediante pesquisa de opinião ou de mercado ou por qualquer outro meio hábil;

5) fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identifica a marca essencialmente pela sua tradição e qualificação no mercado, mediante pesquisa de opinião ou de mercado ou por qualquer outro meio hábil;

6) meios de comercialização da marca no Brasil;

75 Apesar de referido artigo tratar especificamente das marcas de alto renome, algumas das informações

sugeridas pela Resolução nº 121/2005, em seu artigo 4º, servem também de parâmetro na identificação das

marcas notoriamente conhecidas.

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7) amplitude geográfica da comercialização efetiva da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior;

8) extensão temporal do uso efetivo da marca no mercado nacional e, eventualmente, no mercado internacional;

9) meios de divulgação da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior;

10) extensão temporal da divulgação efetiva da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior;

11) valor investido pelo titular em publicidade/propaganda da marca na mídia brasileira nos últimos 3 (três) anos;

12) volume de vendas do produto ou a receita do serviço nos últimos 3 (três) anos;

13) valor econômico da marca no ativo patrimonial da empresa.”.

Da análise do artigo transcrito verifica-se que as informações que serviriam

para comprovar a notoriedade da marca referem-se a questões fáticas relativas à

sua marca, isto é, referem-se a dados relativos ao efetivo uso da marca no

mercado, acerca da extensão de referido uso, bem como dos efeitos do uso da

marca.

Destaca-se, aliás, a menção expressa que se faz à comprovação dos

dados informados “mediante pesquisa de opinião ou de mercado”. Parece-nos

que a pesquisa de mercado acerca do conhecimento da marca pelo público é

aquela que melhor comprova a notoriedade da marca para os termos da proteção

especial. A pesquisa de opinião, realizada por instituição idônea, traz dados

objetivos quanto ao alcance da marca perante o público entrevistado. Tais dados,

assim, por não possuírem caráter unilateral, são ideais para comprovar referido

fenômeno fático.

Uma característica importante que se vislumbra quanto à notoriedade da

marca é o fato dela ser temporária. Em se tratando de fenômeno fático, há que se

considerar que os hábitos e gostos dos consumidores mudam ao longo dos anos,

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logo, nem sempre uma marca que era visivelmente notória há algumas décadas

resiste às mudanças do público consumidor.

Como coloca CORREA (1997: 33), a notoriedade,

“Como fato, escapa a toda e qualquer tentativa de fixação no

tempo e no espaço. Um sinal distintivo pode ter notoriedade nos

moldes da lei anterior, mas efêmera. Há marcas que perduram,

atravessando as décadas, como Coca-Cola, Mercedes e muitos

outros sinais. Outras há que se apagam em poucos anos ou

meses ou vão definhando no decorrer das décadas até atingir a

decrepitude e não exalar qualquer vestígio da antiga magia.”76.

Conseqüência importante dessa transitoriedade das marcas notórias está

no limite da proteção especial assegurado ao sinal notório. Referida proteção

deve ser limitada a um determinado período de tempo, findo o qual a notoriedade

da marca deve ser reavaliada.77 Caso contrário, sinais notórios no passado, mas

pouco conhecidos na atualidade, seriam perpetuamente protegidos nos termos da

lei especial, descaracterizando o instituto da marca notória.

2.1.2 – A distintividade nas marcas notórias

A notoriedade da marca traz diversas conseqüências para referido sinal. A

marca notória, normalmente, adquire maior poder atrativo, maior poder

econômico, maior facilidade de infiltração perante o mercado. A marca torna-se

objeto de desejo e, conseqüentemente, torna-se alvo constante de imitação e

reprodução indevidas.

76 No mesmo sentido também se manifesta RODRIGUES (2004: 11).

77 Assim, a Resolução º 121/05 do INPI, acerca das marcas de alto renome, dispõe em seu artigo 10º: “O

INPI promoverá a anotação do alto renome da marca no Sistema de Marcas, que será mantida pelo prazo

de 5 (cinco) anos.”.

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Nesta hipótese, a principal conseqüência ou efeito que se vislumbra da

notoriedade sobre a marca é o alto grau de distintividade que ela adquire perante

o público em geral, ou perante um público específico. A marca passa a ser

automaticamente associada ao produto ou serviço por ela assinalado,

distanciando-os cada vez mais dos demais produtos e serviços concorrentes.

É essa maior distintividade adquirida pela marca, pois, que lhe garantirá

maior atratividade, maior valor de mercado, e maior risco de aproveitamento

indevido. Entende-se, portanto, que o efeito direito da notoriedade sobre a marca,

nesta hipótese, é o aumento de seu poder distintivo, sendo os demais efeitos

decorrentes daquele.

Por outro lado, o alto poder distintivo adquirido por um signo notório pode,

mais do que aumentar sua distintividade, fazer com que referido signo adquira

distintividade. Nesta hipótese, um sinal originalmente não distintivo adquirirá

distintividade em função de sua notoriedade.

Tal fenômeno tem sido observado principalmente em países em que é

adotado o sistema declarativo de aquisição de marca. Nesta hipótese, o uso78

prolongado de sinal originalmente não distintivo como marca, associado à

notoriedade que referido sinal adquire perante o público consumidor, faz com que

o sinal originalmente não distintivo adquira distintividade e passe a ser

imediatamente relacionado com os bens e serviços por ele assinalados.

Referido fenômeno é estudado pela teoria do secondary meaning ou teoria

do significado secundário, e será oportunamente tratado no Capítulo 03.

Por fim, outros dois efeitos que se vislumbra com relação à notoriedade da

marca é o de enfraquecimento e o de perda de distintividade de um sinal

decorrentes de sua notoriedade. Na primeira hipótese, a notoriedade da marca

78

SAMPAIO (1995: 17) introduz a concepção dinâmica de eficácia distintiva, em que o uso da marca desempenha papel ativo quanto a questão da eficácia distintiva. Tal concepção, embora originada nos países do common law, parece-nos essencial na compreensão dos efeitos da notoriedade sobre a distintividade marcária, mesmo nos países do civil law.

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pode estimular terceiros a adotar como marca sinais muito próximos à marca

notória, sinais estes freqüentemente associados a ela. A marca notória, assim,

tem seu poder distintivo enfraquecido, diluído, não sendo mais a marca

automaticamente associada aos produtos por ela assinalados.

Na última hipótese, a notoriedade de uma marca pode fazer com que o

público, equivocadamente, associe a marca à própria qualidade do produto por

ela assinalado. Como conseqüência, a marca perde seu poder distintivo e passa a

ser utilizada pelo público em geral para designar o próprio bem. Referido

fenômeno, conhecido na doutrina como degeneração marcária, será

oportunamente analisado no Capítulo 04.

2.2 – Tipos de marcas notórias

Como se verificou, a notoriedade de uma marca pode ser observada

perante um público especializado ou perante o público em geral. O conhecimento

de um sinal pelo público como marca, isto é, a notoriedade de uma marca perante

o público tem dimensões diversas, sendo diversas, também, as proteções

conferidas pela legislação nacional às marcas notórias.

Alguns autores, ao tratar dos tipos de marcas notórias, definem-nas através

de seu grau de notoriedade. MORO (2003: 90/91), contudo, adverte não se tratar

de “uma diferença de graus de notoriedade, mas de tipos de notoriedade, ou mais

precisamente, de tipos de marca notória. (...) Talvez fale-se em graus porque uma

protege somente dentro de um determinado setor do comércio e a outra

ultrapassa esse setor. Mas é essa uma compreensão limitada, pois vê o

fenômeno da notoriedade somente sob o ângulo do princípio da especialidade

das marcas.”.

Como já introduzido pela autora, no Brasil, são dois os tipos de marcas

notórias reconhecidas: uma que faz exceção ao princípio da territorialidade, a

marca notoriamente conhecida, e outra que faz exceção ao princípio da

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especialidade, a marca de alto renome. A proteção especial a referidas marcas

está prevista, respectivamente, nos artigos 126 e 125 da LPI.

GUSMÃO (1996: 52), ao analisar a notoriedade das marcas sob o prisma

das normas de proteção marcária (LPI, CUP e TRIPs), distingue três tipos de

notoriedade: (i) aquela prevista no artigo 125 da LPI, relativa às marcas de alto

renome, “que deve ser necessariamente de altíssimo grau, a ponto de justificar a

proteção especial em todos os ramos de atividade”; (ii) a notoriedade prevista no

artigo 6º bis (I) da CUP, “que não necessita ser de altíssimo grau, mas circunscrita

ao mesmo ramo de atividade, posto que a abrangência da proteção é restrita a

este ramo”79, e (iii) a notoriedade do artigo 6º bis (I) da CUP ampliada pelo artigo

16.3 do TRIPs, “que preconiza o alargamento da proteção da marca notoriamente

conhecida, desde que: a) possa indicar uma conexão entre aqueles bens e

serviços e o titular da marca notoriamente conhecida; e b) seja provável que esse

uso prejudique os interesses do titular da marca notoriamente conhecida.”80.

As faixas de notoriedade identificadas pelo autor são especialmente úteis

não apenas para se identificar os tipos de marcas notórias, mas especialmente

para justificar os diferentes graus de proteção conferidos a elas. Como se

analisará, enquanto as marcas notoriamente conhecidas têm sua proteção restrita

ao seu ramo de atividade, às marcas de alto renome é assegurada proteção

especial em todos os ramos de atividade.

2.2.1 – Marca de alto renome

A marca de alto renome caracteriza-se por uma marca registrada

amplamente conhecida pelo público consumidor em geral, e não apenas o público

específico de seu ramo de atividade. Tal reconhecimento perante o público como

um todo justifica a ampla proteção assegurada a referido instituto, que será

79 Refere-se o autor, quanto a este tipo de notoriedade, às marcas notoriamente conhecidas.

80 Para MORO (2003: 204), “*c+om esta disposição do TRIPs, amplia-se o âmbito de proteção da marca notoriamente conhecida, abarcando os casos de utilização e registro destas por terceiros, em produtos ou serviços distintos.”.

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66

protegido em todos os ramos de atividade independentemente se ser registrada

em todos eles.

Para RODRIGUES (2004: 20), tem-se por marca de alto renome,

“um sinal dotado de distintividade singular e de uma autoridade

incontestável no mercado, que resulta de sua tradição e

qualificação e da qualidade e confiança que inspira, seguramente

vinculadas à boa imagem dos produtos ou serviços a que se

aplica, exercendo um acentuado magnetismo, uma extraordinária

força atrativa sobre o público em geral, indistintivamente,

elevando-se sobre os diferentes mercados e transcendendo a

função a que se prestava primitivamente.”.

Como esclarece RODRIGUES (2004: 05/08), “na marca de alto renome

destaca-se o conceito de prestígio, fama, boa reputação e credibilidade.” Conclui,

ainda, referida autora, que “A marca de alto renome não se define, nem é preciso

provar sua existência: „sente-se sua presença.‟”.

A marca de alto nome não foi definida na LPI, tendo referida lei se limitado

a assegurar à marca de alto renome proteção especial em todos os ramos de

atividade81. A LPI, aliás, sequer determinou os critérios para se definir quais

seriam as marcas de alto renome e como se dará seu reconhecimento. O INPI,

contudo, em uma tentativa de preencher referida lacuna, baixou a Resolução nº

121/2005, de 06 de setembro de 2005, a qual normaliza os procedimentos para a

aplicação do artigo 125 da LPI. O artigo 2º de desta Resolução, assim, define que:

“Art. 2º Para os efeitos desta Resolução, considera-se de alto

renome a marca que goza de uma autoridade incontestável, de

um conhecimento e prestígio diferidos, resultantes da sua tradição

e qualificação no mercado e da qualidade e confiança que inspira,

vinculadas, essencialmente, à boa imagem dos produtos ou

81 LPI, artigo 125.

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serviços a que se aplica, exercendo um acentuado magnetismo,

uma extraordinária força atrativa sobre o público em geral,

indistintamente, elevando-se sobre os diferentes mercados e

transcendendo a função a que se prestava primitivamente,

projetando-se apta a atrair clientela pela sua simples presença.”.

Trata-se de definição ampla e repleta de conceitos subjetivos, que em

nosso entender, não define a marca de alto renome, mas apenas indica

qualidades a serem observadas para sua apreciação.

2.2.1.1- Exceção ao princípio da especialidade

A proteção conferida à marca de alto renome extrapola o ramo de atividade

em que ela se encontra registrada (LEVIGARD, 2007: 52). Trata-se, portanto, de

proteção especial que excepcionada o princípio da especialidade das marcas.

Tal entendimento se extrai do próprio texto legal, que assegura à marca

registrada no Brasil de alto renome proteção especial em todos os ramos de

atividade.82. Verifica-se, entretanto, que o princípio da territorialidade deve ser

respeitado, na medida em que a proteção especial mencionada só é assegurada

à marca registrada no Brasil.

Como esclarece RODRIGUES (2004: 20):

“A marca de alto renome registrada no Brasil observa o princípio

da proteção no território nacional, em cuja extensão impedirá ou

invalidará registro de marca posterior que a ela se oponham

independentemente dos produtos ou serviços a que a nova marca

se aplique. Em contrapartida, o alto renome da marca também se

deve projetar na mesma proporção, ou seja, na extensão do

território nacional, sem restringir-se a certa região, estado, cidade

82 LPI, artigo 125.

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68

ou localidade do país, embora a este não se limite, podendo

atingir outro país ou países, ou mesmo uma cobertura universal.”.

2.2.1.2 - Previsão legal

Na legislação brasileira, a noção de marca de alto renome aparece,

primeiramente, no Código da Propriedade Industrial de 196783, em seu artigo 83,

sendo posteriormente prevista no artigo 79 na Lei de 196984. Com o advento da

lei nº 5772/71, a proteção à marca de alto renome foi mantida em seu artigo 67,

sob a denominação, contudo, de “marca notória” (MORO, 2003: 110).

Atualmente, a marca de alto renome encontra-se prevista expressamente

no artigo 125 da LPI, que dispõe:

“Art. 125. À marca registrada no Brasil considerada de alto

renome será assegurada proteção especial, em todos os ramos

de atividade.”.

2.2.1.3 – Requisitos

Do artigo 125 da LPI, extrai-se que para que a marca seja reconhecida

como de alto renome no país, merecendo, pois, proteção especial, deve ela estar

registrada no Brasil. O registro no Brasil, assim, mostra-se essencial para que se

requeira o reconhecimento do alto renome de um sinal.

Um segundo requisito que se vislumbra, ainda, relativo ao próprio conceito

de marca notória, é a comprovação de sua notoriedade, isto é, de seu alto grau

de conhecimento perante o público em geral. Estes requisitos serão tratados a

seguir.

83 Decreto-Lei nº 254, de 28 de fevereiro de 1967. 84

Decreto-Lei nº 1.005, de 21 de outubro de 1969.

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69

2.2.1.3.1 - Registro no Brasil

A LPI, como se verificou, é taxativa ao dispor que “À marca registrada de

alto renome será assegurada proteção especial...”. O primeiro requisito, ou

requisito legal, que se vislumbra quanto às marcas de alto renome é a

necessidade de que elas estejam devidamente registradas no país.

Como se abordará adiante, as marcas notórias não registradas no país não

merecem proteção especial em todos os ramos de atividade, como é o caso das

marcas notoriamente conhecidas. Verifica-se, portanto, que o registro em território

nacional confere ao titular da marca de alto renome não apenas propriedade

sobre o sinal distintivo, mas o direito de requerer sua proteção especial em todos

os ramos de atividade e, conseqüentemente, de se opor a qualquer terceiro que

imite ou reproduza sua marca indevidamente, independentemente do ramo ao

qual se dedica.

2.2.1.3.2 - Alto grau de conhecimento

Para que seja considerada notória, a marca deve, ainda, ser prontamente

reconhecida pelo consumidor como indicativa dos produtos ou serviços que

assinala. Deve, portanto, possuir alto grau de conhecimento.

Como se verificou, a proteção especial conferida à marca de alto renome

diz respeito à proteção em todos os ramos de atividade. Logo, para que um sinal

seja merecedor de referida proteção, deve ele possuir alto grau de conhecimento

perante o público em geral, e não apenas no ramo de atividade em que está

inserido.

Por outro lado, não se exige que o sinal de alto renome seja também

notório fora do território nacional. A proteção conferida pelo artigo 125 da LPI diz

respeito a marcas registradas no país e o âmbito de proteção é apenas nacional.

Não há sentido, assim, em se exigir que uma marca de alto renome no país seja

também reconhecida no exterior, embora referida hipótese possa ocorrer.

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Note-se, ainda, que alguns autores tratam da reputação como

característica necessária à marca de alto renome. MORO (2003: 114/15), por

exemplo, afirma ser a reputação “característica fundamental da marca de alto

renome.” Como esclarece referida autora,

“A reputação de uma marca pressupõe um alto conhecimento do

público consumidor em geral, bem como lhe transmite valores.

Valores geralmente advindos da qualidade do produto, que

conferem à marca fama, celebridade, renome, prestígio.

A marca de alto renome pode ser vista como um símbolo de

qualidade. Qualidade esta que não representa necessariamente a

melhor, mas uma qualidade suficiente, que satisfaz o

consumidor.”.

Referida característica, contudo, embora seja própria das marcas de alto

renome, não pode ser considerada requisito para seu reconhecimento. A

reputação mostra-se demasiadamente subjetiva na medida em que envolve

valores também subjetivos. Ademais, não há qualquer previsão legal quanto à

necessidade de reputação para o reconhecimento do alto renome. Entendemos,

assim, que a reputação é característica comum às marcas de alto renome, mas

não elemento fundamental delas.

2.2.2 – Marca notoriamente conhecida

A marca notoriamente conhecida corresponde à marca que, apesar de não

ser registrada no país, possui alto grau de conhecimento em seu ramo de

atividade. Por não ser registrada, contudo, referida marca encontrar-se-ía

disponível para registro por terceiros, que estariam autorizados a se apropriar

desses sinais para identificar os mesmos produtos ou serviços por elas

assinalados no exterior.

A proteção que se assegura a referida marca funda-se, portanto,

especialmente no combate à pirataria, buscando-se evitar que terceiros se

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71

apropriem de marcas estrangeiras notórias no país, dificultando o comércio

internacional, e causando confusão perante o consumidor.

LEONARDOS (1995: 13) assevera, contudo, que “[a] marca que se protege

pelo art. 6 bis, da Convenção de Paris, há que ser notoriamente conhecida no

país onde se pede a proteção e não no país de origem do seu titular original”.

Esta observação mostra-se extremamente coerente na medida em que a proteção

à marca estrangeira se dará no território nacional.

A proteção às marcas notoriamente conhecidas, como se verá, é prevista

no artigo 6 bis (I) da CUP85, e foi incorporada na LPI nos exatos termos de

referida Convenção. Assim como ocorre com as marcas de alto renome, contudo,

a LPI também não define critérios para o seu reconhecimento, dificultando a

identificação da marca notoriamente conhecida merecedora de proteção especial.

2.2.2.1 – Exceção ao princípio da territorialidade

Como se depreende da LPI86, a marca notoriamente conhecida goza de

proteção especial no país “independentemente de estar previamente depositada

ou registrada no Brasil.”.

A legislação nacional, portanto, nos termos do artigo 126 da LPI, reconhece

os direitos de marcas estrangeiras notoriamente conhecidas no Brasil como se

85 CUP, artigo 6o bis: “(1) Os países da União comprometem-se a recusar ou invalidar o registro, quer administrativamente, se a lei do país o permitir, quer a pedido do interessado e a proibir o uso de marca de fábrica ou de comércio que constitua reprodução, imitação ou tradução, suscetíveis de estabelecer confusão, de uma marca que a autoridade competente do país do registro ou do uso considere que nele é notoriamente conhecida como sendo já marca de uma pessoa amparada pela presente Convenção, e utilizada para produtos idênticos ou similares. O mesmo sucederá quando a parte essencial da marca notoriamente conhecida ou imitação suscetível de estabelecer confusão com esta.”

86 LPI, artigo 126.

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aqui estivessem registradas. Referidos sinais, pois, tornam-se indisponíveis para

registro por terceiros87, respeitado o ramo de atividade no qual estão inseridos.

A marca notoriamente conhecida, assim, excepciona o princípio da

territorialidade das marcas na medida em que é protegida no país

independentemente de registro ou depósito prévio. Referida marca, pois,

“prescinde de estar registrada no país onde é invocada sua proteção”, uma vez

que “goza de proteção extraterritorial em todos os países que aderirem à CUP.”88

(LEONARDOS, 2000: 41).

Quanto ao princípio da especialidade das marcas, note-se que este não é

excepcionado no caso das marcas notoriamente conhecidas. A proteção

conferida aos sinais notoriamente conhecidos limita-se ao ramo de atividade em

que estão inseridos, como dispõe o próprio artigo 126 da LPI.

2.2.2.2 – Previsão legal

A marca notoriamente conhecida está prevista no artigo 6 bis (I) da CUP,

que assim dispõe:

“(1) Os países da União comprometem-se a recusar ou invalidar o

registro, quer administrativamente, se a lei do país o permitir, quer

a pedido do interessado e a proibir o uso de marca de fábrica ou

de comércio que constitua reprodução, imitação ou tradução,

suscetíveis de estabelecer confusão, de uma marca que a

autoridade competente do país do registro ou do uso considere

que nele é notoriamente conhecida como sendo já marca de uma

87 Entende-se, aqui, por terceiros aqueles que não são os titulares do registro da marca estrangeira em seu

país de origem.

88 A lista dos países que aderiram à CUP abrange, atualmente, 173 países, e se encontra disponível no sítio

eletrônico da WIPO – World Intellectual Property Organization (www.wipo.int).

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pessoa amparada pela presente Convenção, e utilizada para

produtos idênticos ou similares. O mesmo sucederá quando a

parte essencial da marca notoriamente conhecida ou imitação

suscetível de estabelecer confusão com esta.”.

Para que não restasse dúvida sobre a proteção conferida às marcas

notoriamente conhecidas, o legislador nacional introduziu referida proteção no

artigo 126 da LPI, remetendo-se, contudo, à definição disposta na CUP, nos

seguintes termos:

“Art. 126. A marca notoriamente conhecida em seu ramo de

atividade nos termos do art. 6º bis (I), da Convenção da União de

Paris para Proteção da Propriedade Industrial, goza de proteção

especial, independentemente de estar previamente depositada ou

registrada no Brasil.”.

A proteção à marca notoriamente conhecida é, ainda, prevista no TRIPs,

em seu artigo 16, que prevê a aplicação do artigo 6º bis da CUP, dando-lhe,

ainda, maior enfoque:

“2. O disposto no Artigo 6 bis da Convenção de Paris (1967)

aplicar-se-á, mutatis mutandis, a serviços. Ao determinar se uma

marca é notoriamente conhecida, os Membros levarão em

consideração o conhecimento da marca no setor pertinente do

público, inclusive o conhecimento que tenha sido obtido naquele

Membro, como resultado de promoção da marca.

3. O disposto no Artigo 6 bis da Convenção de Paris (1967)

aplicar-se-á, mutatis mutandis, aos bens e serviços que não

sejam similares àqueles para os quais uma marca esteja

registrada, desde que o uso dessa marca, em relação àqueles

bens e serviços, possa indicar uma conexão entre aqueles bens e

serviços e o titular da marca registrada e desde que seja provável

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74

que esse uso prejudique os interesses do titular da marca

registrada.”.

2.2.2.3 – Requisito

O artigo 126 da LPI não apresenta nenhum requisito para que a marca seja

reconhecida no país como notoriamente conhecida. Vislumbramos, pois, como

requisito para reconhecimento da marca notoriamente conhecida apenas o seu

alto grau de conhecimento, sobre o qual passamos a abordar.

2.2.2.3.1 – Alto grau de conhecimento

O alto grau de conhecimento que se exige das marcas notoriamente

conhecidas diz respeito ao grande conhecimento da marca estrangeira, em

território nacional, no ramo em que ela está inserida. Assim, ao contrário da

marca de alto renome, não se exige quanto à marca notoriamente conhecida alto

grau de conhecimento do público em geral, mas apenas de um público

especializado.

A limitação quanto ao alto grau de conhecimento das marcas notoriamente

conhecidas decorre do próprio limite à proteção estabelecido pela legislação

nacional. A proteção assegurada pela legislação nacional, como se verá, limita-se

ao “seu ramo de atividade”, isto é, ao ramo no qual a marca está inserida. Logo, é

coerente que se exija das marcas notoriamente conhecidas reconhecimento

apenas no ramo em que a marca está efetivamente inserida.

O alto grau de conhecimento que se exige das marcas notoriamente

conhecidas, portanto, é menor do que aquele exigido para as marcas de alto

renome, devendo, contudo, ser suficiente a justificar a proteção no país

independentemente de registro prévio.

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2.2.2.3.1.1 – Limitação aos produtos e serviços afins

A LPI, como se verificou, assegura às marcas notoriamente conhecidas

proteção especial independentemente de registro ou depósito prévio no país. Tal

proteção especial, contudo, limita-se ao ramo de atividade no qual a marca

notoriamente conhecida se encontra inserida.

Tal limitação se faz necessária em respeito às próprias marcas nacionais.

Como se sabe, as marcas comuns também têm sua proteção limitada a

determinado ramo de atividade, em respeito ao principio da especialidade das

marcas. Logo, caso a exceção relativa às marcas notoriamente conhecidas

também se estendesse ao princípio da especialidade das marcas, estar-se-ía

prestigiando a marca estrangeira em detrimento da marca nacional.

Assim, ao assegurar proteção especial em determinado ramo de atividade,

“a similaridade de produtos e serviços deve ser considerada caso a caso, até

porque o próprio mercado pode estabelecer critérios de afinidade e similaridade,”

(MORO, 2003: 106).

2.3 – Critérios para se auferir notoriedade das marcas

Como se abordou, as marcas notórias encontram sua previsão legal nos

artigos 125 e 126 da LPI. A legislação nacional, contudo, como se verá, nada

dispôs sobre os critérios de identificação das marcas notórias, transferindo a

problemática para o INPI, órgão competente para referida análise.

Antes de tratar dos critérios atualmente adotados na identificação das

marcas notórias, contudo, abordaremos os critérios adotados quando da vigência

da lei nº 5772/71, os quais representaram um avanço no assunto quando

estabelecidos.

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2.3.1 – Os “critérios” da lei nº 5772/1971

Quanto às marcas notórias, o antigo Código da Propriedade Industrial (lei

nº 5772, de 1971), em seu artigo 67, dispunha que:

“A marca considerada notória no Brasil, registrada nos têrmos e para

os efeitos dêste Código, terá assegurada proteção especial, em tôdas

as classes, mantido registro próprio para impedir o de outra que a

reproduza ou imite, no todo ou em parte, desde que haja possibilidade

de confusão quanto à origem dos produtos, mercadorias ou serviços,

ou ainda prejuízo para a reputação da marca.

Parágrafo único. O uso indevido de marca que reproduza ou imite

marca notória registrada no Brasil, constituirá agravante de crime

previsto na lei própria.”.

Primeiramente, insta observar que referido Código, ao tratar da proteção

especial conferida à “marca notória”, refere-se na verdade às marcas de alto

renome, as quais, como se verificou, excepcionam o princípio da especialidade

das marcas (CORREA, 1997: 33/34)89.

Pois bem, da leitura do Código da Propriedade Industrial, verifica-se que há

previsão expressa de proteção especial à “marca notória”, mas referido texto legal

“não fornece elementos para a análise dessa notoriedade, nem os critérios

objetivos pelos quais a administração deve se guiar para „declarar a notoriedade‟

de uma marca.” (GUSMÃO, 1988: 71). A única “regra” que pode ser extraída de

referido artigo é ter como “pressuposto de incidência, a constatação de que o

emprego não autorizado do sinal declarado notório seria suscetível de gerar

confusão ou denegrimento de sua imagem.” (CORREA, 1997: 34).

89 MORO (2007: 111) reconhece a existência de diferenças entre o instituto da “marca notória” previsto no

artigo 67 do antigo Código da Propriedade Industrial e a “marca de alto renome” da LPI. “Entretanto, ambos

possuem a mesma característica principal, que constitui o afastamento do princípio da especialidade. Qual

o motivo então para o legislador ter alterado a nomenclatura legal? A resposta não é de ordem técnica, mas

prática.”, que seria evitar as confusões corriqueiramente observadas, principalmente na jurisprudência.

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77

Assim, os “critérios” para se apreciar a notoriedade da marca foram

posteriormente estabelecidos pelo INPI, por meio de seu Ato Normativo 46. Como

ensina GUSMÃO (1988: 71),

“Em seu Ato Normativo 46, o INPI entendeu que certas

informações seriam necessárias para a análise do pedido de

declaração de notoriedade, e as enumera em seu art. 3º.: „a) valor

da marca no ativo da empresa; b) valor dos gastos em

propaganda diretamente relacionados com a marca;

abrangimento de mercados interno e externo, com número

estimado de consumidores e esclarecimentos de sua participação

relativa no setor; d) enumeração das empresas nacionais e

estrangeiras que utilizam a marca, e sua relação com as alíneas

„b‟ e „c‟; enumeração de países em que a marca se encontra

registrada; data inicial do uso da marca no Brasil, acompanhada

de documentação comprobatória possível.‟”.

Contudo, muito embora referidos “critérios” tenham sido estabelecidos pelo

INPI, em suprimento à lacuna legal, o artigo 5º do Ato Normativo referido

dispunha que “As autoridades, no uso de suas respectivas competências, próprias

ou delegadas, apreciarão o pedido segundo sua íntima convicção, sendo-lhes

facultado exigir outras informações ou formular diligências para verificação da

autenticidade das que tiveram sido apresentadas” (GUSMÃO, 1988: 71). Assim,

referido autor tece numerosas críticas ao Ato, principalmente pelo fato de que

“Segundo o Ato Normativo 46, a apreciação subjetiva derroga a objetiva.”

Além disso, referido Ato Normativo, amparado pela Lei nº 5772/71, criou

procedimento administrativo próprio para o reconhecimento da notoriedade, isto é,

o titular de marca notória seria titular de um segundo registro, o qual seria vigente

até a expiração do prazo de validade da marca, “ainda que esta já não gozasse

de mais notoriedade que lhe possibilitou a obtenção do mesmo.” (MORO, 2007:

114).

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Verifica-se, assim, que o antigo Código da Propriedade Industrial não

previa critérios para aferição da notoriedade da marca. O Ato Normativo 46 do

INPI, por sua vez, estabelecia critérios objetivos para se obter registro de marca

notória, os quais, contudo, possuíam mero caráter informativo ao examinador, não

servindo como prova absoluta da notoriedade do sinal.

2.3.2 – Ausência de critérios objetivos na lei atual

A LPI, assim como o antigo Código da Propriedade Industrial, também não

prevê critérios objetivos para se identificar as marcas notórias merecedoras de

proteção especial. Referido texto legal limita-se apenas a assegurar às marcas

de alto renome no Brasil proteção especial em todos os ramos de atividade90,

assim como assegura às marcas notoriamente conhecidas proteção especial

independentemente dela estar previamente depositada ou registrada no Brasil91.

Diante desta lacuna, mais uma vez coube ao INPI definir quais critérios adotar

para se declarar a notoriedade de uma marca.

Com relação às marcas de alto renome, o INPI, através da Resolução nº

121/05, de 06 de setembro de 2005, estabelece que “A proteção especial

conferida pelo art. 125 da LPI, deverá ser requerida ao INPI, pela via incidental,

como matéria de defesa, quando da oposição a pedido de registro de marca de

terceiro ou do processo administrativo de nulidade de registro de marca de

terceiro, em tramitação no INPI, nos termos e prazos previstos nos art. 158, caput,

e 168 da LPI, respectivamente.” (Artigo 3º da Resolução nº 121/05). Assim,

previamente ao exame da oposição ou ao processo administrativo de nulidade

referidos, o INPI decidirá quanto à condição de alto renome da marca (Parágrafo

1º do Artigo 3º da Resolução nº 121/05).

Como previamente tratado no item 2.1.1, na Resolução referida, assim

como ocorreu no Ato Normativo 46 no passado, o INPI enumera sugestões de

informações que ajudariam o titular de marca de alto renome a comprovar a

90 LPI, artigo 125. 91

LPI, artigo 126.

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79

notoriedade de sua marca92. Dentre as sugestões trazidas por referida Resolução,

parece-nos que aquela relativa à pesquisa de mercado, acerca do conhecimento

da marca pelo público em geral, é a que melhor comprova a notoriedade da

marca para os termos da proteção especial.

Neste caso, caso o examinador se convença que está diante de marca de

alto renome, “O INPI promoverá a anotação do alto renome da marca no Sistema

de Marcas, que será mantida pelo prazo de 5 (cinco) anos.” (artigo 10º da

Resolução nº 121/05). Logo, diferentemente do que ocorria quando da vigência

da Lei de 1971, não há mais que se falar em duplo registro, mas em proteção

especial, pelo prazo de cinco anos.

Com relação às marcas notoriamente conhecidas, o INPI, até o momento,

não estabeleceu regras de reconhecimento e proteção para mencionados sinais,

mas entende que eles podem ser reconhecidos de ofício “se o examinador

entender que aquela marca em exame colide com uma marca que é notoriamente

conhecida naquele ramo de atividade, a qual o depositante não poderia deixar de

92

“Art. 4º O requerente da proteção especial de que trata o art. 125 da LPI deverá apresentar ao INPI, incidentalmente, no ato da oposição ou do processo administrativo de nulidade, as provas cabíveis à comprovação do alto renome da marca no Brasil, podendo apresentar, em caráter suplementar às provas voluntariamente por ele coligidas, os seguintes elementos informativos: 1) data do início do uso da marca no Brasil; 2) público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica; 3) fração do público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica, essencialmente pela sua tradição e qualificação no mercado, mediante pesquisa de opinião ou de mercado ou por qualquer outro meio hábil; 4) fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identifica a marca com os produtos ou serviços a que ela se aplica, mediante pesquisa de opinião ou de mercado ou por qualquer outro meio hábil; 5) fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identifica a marca essencialmente pela sua tradição e qualificação no mercado, mediante pesquisa de opinião ou de mercado ou por qualquer outro meio hábil; 6) meios de comercialização da marca no Brasil; 7) amplitude geográfica da comercialização efetiva da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior; 8) extensão temporal do uso efetivo da marca no mercado nacional e, eventualmente, no mercado internacional; 9) meios de divulgação da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior; 10) extensão temporal da divulgação efetiva da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior; 11) valor investido pelo titular em publicidade/propaganda da marca na mídia brasileira nos últimos 3 (três) anos; 12) volume de vendas do produto ou a receita do serviço nos últimos 3 (três) anos; 13) valor econômico da marca no ativo patrimonial da empresa.

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80

conhecer.” (GUIMARÃES, 2008: 39). Logo, o reconhecimento também se daria

por via incidental, e não dependeria do requerimento do titular da marca93.

Apesar das críticas que se faz à ausência de critérios objetivos na análise

das marcas notórias, por outro lado, é difícil estabelecer quais critérios seriam

suficientes para identificar, objetivamente, uma marca notória. Como se expôs,

sendo a notoriedade fenômeno fático, quaisquer critérios que se estabeleça na

análise da notoriedade das marcas estes nunca serão absolutos. É por isso que a

pesquisa de mercado, através da pesquisa de opinião, se mostra mais confiável

na análise do conhecimento de uma marca perante o público e,

conseqüentemente, na identificação das marcas notórias.

2.4 – Proteção legal das marcas notórias

Nos termos da legislação nacional94, às marcas notórias é assegurada uma

proteção especial no país. A proteção especial prevista indica que os sinais

notórios terão proteção diversa daquela conferida às marcas comuns, no caso,

uma proteção superior.

Como já se verificou, as marcas de alto renome, primeiramente, são

protegidas em todos os ramos de atividade95. Tal proteção, pois, excepciona o

princípio da especialidade das marcas, na medida em que confere ao titular de

marca de alto renome proteção em ramos de atividade que sequer atua.

Às marcas notoriamente conhecidas, ao contrário, é assegurada proteção

especial “independentemente de estar previamente depositada ou registrada no

Brasil.”96 Referida proteção, pois, excepciona o princípio da territorialidade das

93

A possibilidade do INPI indeferir de ofício pedido de registro de marca que reproduza ou imite marca

notoriamente conhecida está prevista no parágrafo 2º do artigo 126 da LPI.

94 LPI, artigos 125 e 126. 95 LPI, artigo 125. 96

LPI, artigo 126, caput.

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81

marcas, garantindo direitos de propriedade no país a titulares de marca que foram

registradas em outros países.

Neste item, trataremos dos motivos que fundamentam a concessão de

proteção especial às marcas notórias, e trataremos, em especial, dos riscos

decorrentes da notoriedade da marca.

2.4.1 – Motivos para a proteção especial

As marcas notórias, como se expôs, caracterizam-se por sinais

extremamente distintivos, de alto poder atrativo, e de grande valor econômico. A

grande notoriedade adquirida por determinados sinais pode, contudo, fazer com

que seja necessário flexibilizar os princípios relativos às marcas pra garantir-lhes

eficaz proteção e uso exclusivo (ALMEIDA, 2008: 36).

RODIGUES (2004: 08/09), tratando especificamente da marca de alto

renome, fundamenta sua proteção especial no “excepcional caráter distintivo no

mercado, que lhe é exclusivo”, e no fato da marca gozar “de um goodwill

elevadíssimo e de conhecimento e prestígio diferidos, que derivam,

essencialmente, do reconhecimento de certa excelência e da confiabilidade dos

produtos ou serviços a que se aplica e que transcendem a coletividade usuária,

de fato ou em potencial, desses produtos ou serviços, atingindo, também, a

diferentes públicos, de mercados diversos.”.

CORREA (1997: 34), por sua vez, entende que “O princípio que informa a

proteção às marcas de alto renome é a repressão ao enriquecimento sem

causa.”.

Para GUSMÃO (1988: 67), “A notoriedade, em geral, aporta à marca um

valor dificilmente estimável, mas seguramente existente. É esse valor econômico

que se procura proteger, evitando-se a diluição de seu poder atrativo e de sua

reputação. O fundamento da proteção às marcas notoriamente conhecidas

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repousa sobre as regras de repressão à concorrência desleal, ainda que, no caso,

estejamos diante de uma relação de concorrência internacional.”.

Para BARBOSA (2003: 875), o fundamento jurídico da proteção legal às

marcas notórias estaria na própria proteção ao fundo de comércio, “sem deixar de

lado o princípio correlato da proteção ao consumidor.”.

Parece-nos, assim, que a proteção especial conferida às marcas notórias

fundamenta-se, de um lado, na proteção ao próprio sinal, devido ao seu elevado

valor econômico e inquestionável poder atrativo, protegendo-se, portanto, o

empresário, titular da marca. Por outro lado, a proteção especial conferida às

marcas também se fundamente na repressão à concorrência desleal, princípio

basilar da ordem econômica, e na proteção ao consumidor, que quase sempre é o

destinatário final dos bens.

2.4.2 – Riscos decorrentes da notoriedade da marca

GUSMÃO (1988: 66), ao tratar da marca notoriamente conhecida, prevê

que ela “tende a ser usurpada exatamente em função do seu poder atrativo”.

Segundo o autor,

“A usurpação, em geral, se reveste de duas formas:

a) ela se manifesta em um território onde a marca notoriamente

conhecida não é protegida, para assinalar produtos idênticos ou

similares aos que ela assinala no seu território de origem;

b) se manifesta também para assinalar produtos diferentes

daqueles protegidos pela marca notoriamente conhecida, seja no

território de origem, seja em outros territórios.”.

Quanto à primeira hipótese referida, parece-nos que a legislação nacional,

ao proteger as marcas notoriamente conhecidas independentemente de registro

prévio no país, buscou exatamente coibir esse tipo de usurpação. Assim, o artigo

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126 da LPI visa coibir a apropriação indevida, no país, de sinais estrangeiros

notoriamente conhecidos em determinado ramo de atividade.

Quanto à segunda hipótese tratada pelo autor, em se tratando de marca de

alto renome, parece-nos que a legislação nacional também se presta para coibir

este tipo de usurpação, na medida em que assegurará proteção especial ao sinal

de alto renome em todos os ramos de atividade.

Em se tratando de marca notoriamente conhecida, contudo, a legislação

nacional nada dispõe a respeito da proteção de sinal notório para produtos e

serviços diversos de seu ramo de atividade. Embora a proteção às marcas

notoriamente conhecidas excepcione o princípio da territorialidade, o princípio da

especialidade deve ser respeitado.

Assim, existe o risco de que terceiros se utilizem de sinal notoriamente

conhecido na identificação de produtos e serviços diversos daqueles protegidos

pela marca notoriamente conhecida, buscando associar seu produto ou serviço ao

renome da marca original. Trata-se de hipótese de aproveitamento parasitário da

marca, que será tratado a seguir.

2.4.2.1 – Risco do aproveitamento parasitário da marca

O aproveitamento parasitário da marca caracteriza-se pelo aproveitamento

indevido, por terceiros, do renome de marca alheia para promover bens e serviços

diversos daqueles assinalados pelo sinal notório. Referido aproveitamento ocorre

por meio do uso de marcas notoriamente conhecidas para assinalar bens de ramo

de atividade distinto, ocorrendo, portanto, fora do campo da concorrência.

No aproveitamento parasitário, assim, busca o usurpador ter seus produtos

e serviços associados ao renome de marca de terceiro, aproveitando-se

indevidamente de sua fama.

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GUSMÃO (1993: 03) atenta para o fato de o aproveitamento parasitário

pressupor uma relação de não concorrência, divergindo, portanto, da

concorrência parasitária, que seria espécie de concorrência desleal. Em seu

entendimento,

“[o] aproveitamento parasitário constitui-se de claro e indiscutível

desvio de função das regras de proteção à propriedade industrial,

caracterizando-se como fraude à lei, portanto nulo,

independentemente do elemento intencional.”.

O principal problema que se vislumbra quanto ao aproveitamento

parasitário é o dano que ele causa ao valor atrativo da marca (GUSMÃO, 1993:

04). Um sinal que antes era imediatamente associado a determinado produto ou

serviço, passa a designar produtos e serviços diversos. Assim, ainda que

respeitado o princípio da especialidade das marcas, é necessário sempre

observar se o sinal que se busca registrar como marca encontra-se disponível

não apenas nos termos já expostos, mas também não representa risco de

aproveitamento parasitário de marca notória.

2.4.2.2 – Risco de diluição da marca

As marcas notórias, pelo alto poder atrativo que representam, estão

freqüentemente sujeitas ao aproveitamento indevido de terceiros. O próprio

aproveitamento parasitário das marcas, como se verificou, causa danos

irreversíveis ao valor atrativo das marcas notórias na medida em que elas deixam

de ser imediatamente associadas ao produto ou serviço que assinalam.

Entende-se, pois, por diluição da marca processo pelo qual a marca notória

perde gradativamente sua capacidade distintiva, passando a indicar bens e

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serviços diversos. Referida diluição pode se dar de três formas: por ofuscação da

marca, por maculação da marca, ou ainda por adulteração da marca97.

Como coloca CORREA (1997: 36)98,

“Verificando-se o fenômeno da notoriedade (=alto renome) e

presente, portanto, o pressuposto de outorga do amparo especial

de que cogita a lei, no artigo em exame, impõe-se atenção à

vulnerabilidade maior das marcas de alto renome ao processo de

desgaste decorrente da aparição de marcas que nela se inspirem.

É o fenômeno da diluição, que é um processo de erosão das

marcas, cujo magnetismo é, aos poucos, aluído. O que sucede é

que o surgimento, no mercado, de marca semelhante

identificando produtos de outros fabricantes ou prestadores de

serviço leva o público, inconscientemente, a lembrar a marca

original. Muito embora a marca parecida até mesmo nem gere

confusão quanto à origem, o público, paulatinamente, se habitua

com o fato de essa marca ser usada por outros empresários. Isso,

naturalmente, tem como conseqüência a queda do poder de

atração da marca original e o desaparecimento gradual de sua

posição de exclusividade.”.

97 Referida diferenciação é feita principalmente na doutrina norte-americana. A diluição por ofuscação afeta

a unicidade da marca, que perde sua força distintiva em si mesma, na medida em que, a coexistência com

marcas semelhantes, faz com que o público consumidor não mais identifique a marca imediatamente ao

produto ou serviço assinalado pela marca original. A diluição por maculação ofende a reputação da marca,

uma vez que esta passa a ser associada com produtos de baixa qualidade, ou com conceito moral

reprovável. Por fim, a diluição por adulteração afeta a consistência da marca, na medida em que admite uso

diverso daquele desejado por seu titular e conhecido pelo consumidor, reduzindo seu poder de venda.

(ALMEIDA, 2006: 184/185).

98 CORREA (1997: 37) compara a diluição das marcas à inflação econômica, ilustrando bem o prejuízo que

referido fenômeno causa às marcas. Em suas palavras, “A diluição corresponde, no direito das marcas, à

inflação no campo do direito econômico. Quanto mais moeda se emite, mais desgastada se torna a unidade

monetária. Aqui, quanto mais se incorpora a marca de terceiro a outras, de vários titulares, mais

desgastado, mais desvalorizado se torna o sinal distintivo. A diluição representa, no plano marcário, uma

verdadeira morte da marca por afogamento.”.

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Embora todo sinal distintivo, em tese, possa perder seu caráter distintivo99,

são as marcas notórias que sofrem maior risco de diluição. O alto poder atrativo

atribuído às marcas notórias, assim como sua reputação e alto valor econômico,

faz de referidos sinais os mais visados por aproveitadores.

Dentre as marcas notórias que sofrem risco de diluição, parece-nos que as

marcas notoriamente conhecidas, em especial, estão mais sujeitas a esse tipo de

enfraquecimento da marca, visto que a elas não é garantida proteção especial em

todos os ramos de atividade. Por outro lado, sendo o processo de reconhecimento

de marca de alto renome específico, possível de se requerer apenas por meio de

defesa, não há dúvida que as marcas de alto renome também podem ser

usurpadas por terceiros, diluindo seu poder distintivo.

A diluição marcária, contudo, não se confunde com o processo de

degeneração da marca, que será tratado no Capítulo 04. Assim como na diluição,

o sinal notório que sofre degeneração também perde seu poder distintivo.

Entretanto, enquanto na diluição o sinal passa a assinalar produtos e serviços

diversos, na degeneração a marca passa a significar o próprio nome do bem.

A diluição, assim, é fruto do aproveitamento indevido de terceiros, e

independe da intenção do titular da marca notória. Este freqüentemente age

99 Os sinais não notórios, ou aqueles notórios não reconhecidos como tais nos termos da lei, também sofrem risco de diluição, principalmente por não gozarem de proteção especial. O INPI freqüentemente concede registros de marca compostos por sinais semelhantes ou idênticos para assinalar produtos ou serviços de classes distintas, mas que possuem certa afinidade. O titular da primeira marca registrada, por não gozar da proteção especial relativa às marcas notórias, dificilmente consegue alterar referida decisão perante o Judiciário, exatamente pelo fato de sua marca não gozar de proteção especial nos termos da lei. Neste sentido, em recente julgado, ainda não publicado, e disponibilizado pelo próprio procurador da recorrente: “DIREITO. MARCA. EXCLUSIVIDADE. CLASSES DIVERSAS. Trata-se, na origem, de ação em que a ora recorrida buscava a anulação de registro de marca do ora recorrente no INPI. Foi concedido à recorrente registro para laticínios, classe 31, subitem 10, em 18/7/1986, enquanto, para a recorrida em datas anteriores, foram concedidos registros para massas alimentícias em geral, farinha e fermentos em geral, classes 32.10 e 32.20. No caso, os elementos distintivos da marca, bem como o fato de tratar-se de produtos de classes diferentes, são suficientes para que o consumidor exerça adequadamente seu direito de compra, sem se confundir. O simples fato de se tratar de gêneros alimentícios não é suficiente para presumir a confusão. Assim, a Turma deu provimento ao recurso ao entender que o direito à exclusividade do uso da marca, em razão de seu registro no INPI, limita-se à classe para a qual foi concedido, não alcançando outros produtos, não similares, enquadrados em classes diversas, excetuados os casos de marcas ‘notórias’.” STJ, REsp nº 863.975-RJ, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 19.08.2010.

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contra terceiros em busca de manter o poder atrativo de sua marca, mas nem

sempre os órgãos competentes constatam o risco de diluição de um sinal. Na

degeneração marcária, contudo, como se verá, é o titular da marca normalmente

o maior responsável pela perda da distintividade de seu sinal.

A proteção ao risco de diluição mostra-se complexa, contudo, na medida

em que o princípio da especialidade das marcas deve ser flexibilizado para

garantir proteção a sinais notórios em ramos de atividade em que eles não se

inserem. Na ausência de uma legislação especifica quanto à proteção ao risco de

diluição no país, a análise deve ser feita caso a caso, devendo-se sempre

prestigiar as marcas cujo cunho notório e distintivo seja mais latente.

Cabe, assim, ao titular da marca, acompanhar as decisões proferidas pelo

INPI, e atuar ativamente quando se deparar com registros de marca capazes de

afetar sua marca e de diminuir seu poder distintivo.

Destaca-se, por fim, que a teoria da diluição encontrou grande aceitação no

ordenamento jurídico norte-americano, sendo objeto de lei federal denominada

Trademark Dilution Revision Act, que encontra-se em vigor desde outubro de

2006, e veio para “revisar” o Federal Trademark Dilution Act, promulgado em

1996. Segundo referida Revisão, para se afastar o uso de sinal notório por

terceiros deve-se considerar a possibilidade de confusão entre o sinal famoso ou

notório e o sinal utilizado por terceiro, independentemente da prova real de

prejuízo (MILROT, 2009: 16)100.

100 Como coloca a autora em seu artigo, o Federal Trademark Dilution Act, antes da sua revisão, exigia prova

concreta do risco de diluição da marca para impedir seu uso por terceiros. No famoso caso norte-americano

envolvendo as marcas Victoria’s Secret e Victor’s Little Secret, que foi julgado pela Suprema Corte norte-

americana antes da revisão de 2006, o titular da segunda marca não foi condenado a se abster do seu uso,

por entender a Suprema Corte norte-americana que referida expressão não diminuía a capacidade

distintiva da afamada marca Victoria’s Secret (MILROT, 2009: 16).

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2.4.2.3 – A diluição e a teoria da distância

O processo de registro de marca no Brasil exige do examinador uma

análise prévia acerca da disponibilidade ou não do sinal que se pretende registrar.

Dentre os critérios adotados pelo examinador, encontra-se a possibilidade ou não

de coexistência entre as marcas já existentes e a marcas que se pretende

registrar, análise esta feita a partir dos elementos que distinguem a nova marca

depositada e da preexistência de outros registros de marca semelhantes. Referida

avaliação é denominada pela doutrina de teoria da distância.

Como define CORREA (2009: 15),

“A teoria da distância é a tradução, no campo das marcas, do

princípio da isonomia e visa a determinar se, diante de um quadro

composto por certo número de marcas precedentes, a marca

neófita pode ou não coexistir com outras pré-registradas. A

mensuração da distância ocorre diante de um quadro pré-

existente, do status quo. Não se mede necessariamente a

distinguibilidade intrínseca, genética dos sinais pré existentes,

mas o fato de eles conviverem apesar de semelhanças. Não se

questiona se as marcas anteriores deveriam ou não conviver: faz-

se um juízo de realidade, não um juízo de valor.”.

A teoria da distância, contudo, não considera o risco de diluição das

marcas ao analisar a mera possibilidade de coexistência entre elas. Na prática, o

que ocorre é a concessão, pelo INPI, de diversas marcas constituídas por sinais

notórios as quais, na opinião dos examinadores, seriam inconfundíveis e

passíveis de coexistência.

CORREA (2009: 16), pois, assevera que “[a] distância entre as marcas,

ditada pela maior ou menor relação entre os componentes semiológicos dos

sinais, é alterada por dois outros fatores”, dentre eles “b) o grau de prestígio

auferido por um sinal.”. Como ensina,

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“[o] grau de proteção das marcas é diretamente proporcional ao

seu grau de projeção e, em se tratando de marcas que tenham

atingido notoriedade, a lei contempla amparo especial. As marcas

notórias desfrutam de resguardo contra o fenômeno da diluição,

pela sua imensa capacidade de atração de clientela, imantando

qualquer produto ou serviço que designem. Em se tratando de

marca notória (= de alto renome), a questão que se projeta não é

simplesmente a de saber se existe ou não possibilidade de

confusão ou associação. O problema é outro: a diluição. Pela

posição preeminente adquirida pela marca notória, em razão de

sua penetração no mercado, desfruta ela de amparo especial

contra todo e qualquer ato que possa implicar diluição de sua

força atrativa. A diluição é a verdadeira erosão das marcas,

aluindo-lhes, aos poucos, o magnetismo. A diluição não tem como

fulcro a possibilidade de confusão. O que sucede é a aparição no

mercado de marca semelhante identificando produtos de outros

fabricantes levará o público, inconscientemente, a lembrar a

marca original. Muito embora a marca parecida até mesmo nem

gere confusão quanto à origem, o público, paulatinamente, se

habituará com o fato de essa marca ser usada por outros

fabricantes. Isso, naturalmente, tem como conseqüência a queda

do poder de atração da marca original e o desaparecimento de

sua posição de exclusividade.”.

Na prática, contudo, diante da concessão de marcas que representam risco

de diluição de um sinal notório, ao titular da marca notória não resta outra opção

além de recorrer ao Poder Judiciário, visando reverter a decisão administrativa do

INPI.101

101

Exemplo de decisão judicial quanto ao tema: “PROPRIEDADE INDUSTRIAL. COLIDÊNCIA DE MARCAS. TEORIA DA DISTÂNCIA. TEORIA DA DILUIÇÃO. DOUBLEMINT. DOUBLE SOFT. 1. No exame de eventual colidência, doutrina e jurisprudência têm tradicionalmente se utilizado da teoria da distância, que, fundamentando-se nos princípios da eqüidade e da igualdade, sustenta a coexistência de marcas quando a situação fática atual possibilite o convívio harmônico de signos semelhantes ou afins. 2. Embora muito eficaz na maioria dos casos, tal critério não é capaz de abarcar hipóteses especialíssimas, onde a infringência de direitos pode ganhar matizes diversos, que exigem uma análise mais profunda e sob outro enfoque, o da teoria da diluição. 3. A idéia principal da teoria da diluição é a de proteger o titular contra o

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ALMEIDA (2006: 185), Desembargadora Federal do Tribunal Regional

Federal da 2ª Região, ao ministrar palestra acerca da distintividade como uma

função dinâmica da marca, manifestou-se favorável à proteção das marcas do

risco de diluição, afastando, em algumas hipóteses, a teoria da distância. Como

salientou,

“A ratio da teoria da diluição é que a diminuição gradual da

distintividade e do valor de uma marca, como resultado do uso

indiscriminado por terceiros, constitui uma invasão indevida do

direito de propriedade da marca, ainda que inexista possibilidade

de confusão.

Assim, ao se deparar com um caso em que seja aplicável a teoria

da diluição, a preocupação do julgador não deve ser a distância

entre os signos ou a possibilidade de induzir o consumidor a erro,

mas sim a necessidade de resguardar a distintividade de uma

marca que mereça manter seu alto grau de integridade, material e

moral, e sua reputação.”.

2.4.2.4 – O INPI como coadjuvante no processo de

diluição de marcas no Brasil

Como se sabe, no Brasil o órgão responsável pela análise e concessão dos

registros de marca é o INPI. É nele que são proferidas decisões de mérito quanto

à registrabilidade ou não dos sinais depositados como marcas.

enfraquecimento progressivo do poder distintivo de sua marca, mormente em casos de marcas que ostentam alto grau de reconhecimento ou que sejam muito criativas, sendo o paradigma para a decisão entre aplicar a teoria da distância ou a teoria da diluição a fama e a criatividade do sinal. 4. Conquanto os efeitos de uma violação direta de marca registrada sejam mais facilmente identificados e tragam prejuízos imediatos, o resultado da diluição de uma marca traz efeitos nefastos, vez que enquanto o primeiro ludibria os consumidores já existentes, o segundo enfraquece o poder de venda de um sinal distintivo, podendo ser até irreversível. 5. Apelações improvidas.” TRF da 2ª Região, 2ª Turma, AC nº 2002.51.01.514660-7, Rel. Des. Federal LILIANE RORIZ, j. 22.08.2006, DJU 04.09.2006.

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Diante do risco de diluição que sofrem as marcas notórias, CORREA

(1997: 36) atenta que

“O acentuado poder distintivo e conseqüente valor econômico das

marcas de alto renome impõem maior rigor no exame de pedidos

de registro de sinais que com elas apresentem semelhança, pois

é intuitivo que a possibilidade de confusão, associação ou, no

mínimo, diluição, toma proporções maiores. O nível de rigidez na

apuração de conflito, em nosso sentir, deve ser crescente na

medida em que se conjuguem o dado

identidade/similaridade/afinidade/relatividade entre os segmentos,

e decrescente na medida em que a marca nova, que se pretende

similar, vise a ramo de negócio sem qualquer ligação (...).

Na avaliação de conflito, há que tomar em consideração, além

disso, a singularidade do sinal distintivo e a posição de

exclusividade de que gozava antes de tornar notória, pois marcas

há que, apesar do alto renome que adquiriram, há conviviam com

outras que lhe fossem semelhantes ou até mesmo idênticas.”.

O que se verifica, contudo, das decisões proferidas pelo INPI é que

raramente referido órgão faz uso do poder a ele conferido de indeferir de ofício

pedido de registro de marca que reproduza ou imite marca notoriamente

conhecida.102 Dado o assoberbamento enfrentado por referido órgão, as decisões

de indeferimento de registros de marca fundadas no risco de diluição de marca

notória quase sempre dependem da oposição de terceiros no trâmite

administrativo.

Outra problemática que se coloca com relação às decisões emanadas pelo

INPI é o fato de referido órgão não considerar, quando da análise da

registrabilidade das marcas, sua distintividade extrínseca103. LOBO (2006: 189),

Procurador do INPI, em palestra ministrada acerca da distintividade como função

102 LPI, artigo 126, parágrafo 2º.

103 Sobre distintividade intrínseca e extrínseca, discorreu-se no item 1.7.1.

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dinâmica da marca, defendeu o posicionamento do INPI no sentido que, quando

da análise da distintividade dos sinais, considera-se apenas a distintividade do

sinal em si mesmo e a distintividade do sinal por comparação aos outros, não se

analisando, portanto, as circunstâncias fáticas.

Por outro lado, sendo a diluição marcária processo fático, que deve ser

analisado caso a caso, sua identificação depende de análise subjetiva por parte

do examinador, que nem sempre tem conhecimento do cenário global em que a

diluição ocorre. É comum que examinadores concedam marcas diversas

compostas pelo mesmo sinal notório sem ter conhecimento acerca das decisões

proferidas entre os demais examinadores. E, caso o titular da marca notória não

se oponha contra cada um dos registros concedidos, a concessão e manutenção

de um único registro de marca poderá servir no futuro como fundamento para que

outras marcas compostas pelo mesmo sinal notório sejam concedidas, em

respeito à teoria da distância.

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III. DA AQUISIÇÃO DE DISTINTIVIDADE DE MARCA

DECORRENTE DE SUA NOTORIEDADE

Como se verificou nos capítulos anteriores para que uma marca seja

reconhecida como tal é indispensável que ela seja dotada de distintividade, isto é,

seja capaz de distinguir o produto ou serviço por ela assinalado dos demais

existentes no mercado. Não é por outro motivo que a própria LPI, em seu artigo

124, inciso VI, dispõe não ser registrável como marca sinal de caráter genérico,

necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com

o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar

uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso,

valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo se, como

o próprio inciso excepciona, o sinal seja revestido de suficiente forma distintiva.

Como também se verificou, a marca notória destaca-se das demais marcas

existentes do mercado por ter maior reconhecimento do público, que

automaticamente associa a marca notória aos produtos e serviços por ela

assinalados. Dentre os efeitos da notoriedade sobre a marca, como se observou,

estão aqueles relativos à distintividade do sinal.

É possível classificar quatro hipóteses distintas relativas à aquisição e

perda de distintividade marcária decorrente de sua notoriedade. A primeira delas,

já tratada no Capítulo 02 do presente trabalho, diz respeito ao alto poder distintivo

adquirido pelas marcas em decorrência de sua notoriedade, o que lhes garante

proteção especial nos termos da lei. Nesta hipótese, as marcas adquirem maior

distintividade, tornando-se excepcionalmente atrativas. Um bom exemplo para

ilustrar esse aumento de distintividade de uma marca pela notoriedade é a marca

“COCA-COLA”, cujo poder distintivo é inquestionável.

Na segunda hipótese, como também se verificou no Capítulo 02, a alta

notoriedade de um sinal faz com que terceiros passem a fazer uso dele para

assinalar produtos e serviços de ramos de atividade distintos, aproveitando-se,

indevidamente, do renome da marca original para promover sua atividade. Este

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aproveitamento parasitário do sinal notório faz com que referido sinal tenha sua

distintividade enfraquecida, diluindo-se no mercado. É possível vislumbrar alguns

exemplos de marcas em processo de diluição, como é o caso da marca

“CONTINENTAL”104, originalmente utilizada para identificar cigarros, e que

atualmente identifica produtos dos mais diferenciados ramos, como aros maciços

e pneumáticos de borracha105; gorduras, óleos comestíveis, condimentos e

especiarias106; bebidas, xaropes e sucos concentrados107; carroceria para

veículos108; relógios109, aparelhos eletrodomésticos110, dentre outros.

A terceira hipótese que se vislumbra – a qual será analisada no presente

Capítulo, é a de sinais não distintivos, isto é, carentes de distintividade, que

adquirirem distintividade diante de seu alto grau de notoriedade. Referidos sinais,

como se verá, adquirem um significado secundário ao longo do tempo, diverso

daquele original, prestando, pois, para distinguir o produto ou serviço que

assinalam.

A última hipótese que se vislumbra, e que será analisada no Capítulo 04, é

a de perda total de distintividade marcária decorrente do excesso de notoriedade

do sinal. Neste caso, diferentemente do que ocorre com a diluição, a perda de

distintividade não se dá em função do uso do sinal notório por terceiros. O que

ocorre, na verdade, é a confusão entre marca e objeto por ela assinalado, que

passam a ser considerados sinônimos para o público consumidor.

104 Registro de marca nº 002.523.272

105 Registro de marca nº 003.352.064.

106 Registro de marca nº 002.152.070.

107 Registro de marca nº 003.164.810.

108 Registro de marca nº 003.220.133.

109 Registro de marca nº 006.666.051.

110 Registro de marca nº 730.079.082.

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3.1 – A teoria do secondary meaning ou teoria do significado secundário

Como se verificou, a função primária da marca é a de distinguir os bens e

serviços por ela assinalados dos demais existentes no mercado. Isto porque, ao

assinalar seu produto com sinal distintivo, não tem o empresário outro objetivo

senão o de diferenciar seu produto dos demais, distingui-lo, torná-lo único na

percepção do consumidor.

A escolha do sinal que irá distinguir o bem ou serviço, contudo, não é uma

tarefa fácil. Como bem expôs PINHO (1996: 49), vários motivos influem para a

complexidade na escolha da marca:

“a pulverização do mercado com diversas empresas em posição

de concorrência; a abertura do mercado em função da

globalização da economia; a internacionalização dos mercados

antes nacionais ou regionais; a formação de blocos econômicos; a

busca da harmonização das diferentes legislações nacionais que

regulam a matéria com o conseqüente reconhecimento dos

direitos de empresas estrangeiras sobre a marca e nomes

comerciais.”.

Estes fatores, contudo, raramente são relevados pelo empresário comum.

Na verdade, a busca por uma marca altamente distintiva, com alto poder atrativo

antes mesmo do lançamento do produto ou serviço no mercado exige grandes

investimentos em pesquisa e principalmente em marketing, o que nem sempre

pode ser suportado pelo empresário.

É muito comum, portanto, que ao se escolher uma marca na identificação

de um produto ou serviço, o empresário opte por uma expressão não distintiva,

mas que se associe ao serviço ou produto oferecido. Tal associação entre o sinal

adotado e o bem assinalado mostra-se, a princípio, interessante na medida em

que, para o consumidor, a identificação entre o bem e o sinal que o identifica será

quase imediata, dispensando ao empresário gastos iniciais com publicidade. A

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marca “AMARULA”111, por exemplo, foi registrada para assinalar “bebidas,

xaropes e sucos concentrados”, e na prática identifica licor produzido a partir da

fermentação de uma fruta denominada “marula”. A associação entre o nome da

fruta e o principal ingrediente da bebida é imediata, o que, a princípio, pode ser

interessante para o empresário na divulgação de sua marca. Da mesma forma, a

marca “CIMENTCOLA”112, concedida para identificar, dentre outros produtos,

argamassas, praticamente descreve o produto por ela assinalado, introduzindo o

produto ao consumidor sem necessidade de maior publicidade do bem.

Verificou-se, contudo, que o uso continuado de sinais não distintivos na

identificação de determinados bens, associado à notoriedade adquirida por

referidos sinais perante o público consumidor, fez surgir no mercado marcas

perfeitamente capazes de distinguir os bens por ela assinalados, na medida em

que estes sinais, originalmente não distintivos, passaram a ter, para o

consumidor, significado diverso do seu significado original. Referido fenômeno

passou a ser estudado pela teoria do secondary meaning ou teoria do significado

secundário.

Como explica CARRAU113 sobre o motivo da denominação teoria

“secundária”,

“La explicación surge de que estamos frente a un signo (no

distintivo) que tiene uma significación „primaria‟: El concepto que

transmite el signo por si mismo, en su significado natural o literal.

Pero – a la vez – adquirió mediante el uso en el comercio un

segundo significado o una „significación secundaria‟: como marca.

Por ello, ese mismo signo termina simbolizando o significando

algo más, „distingue‟ los bienes de un comerciante, adquire un

valor, representa un origen, una calidad, un prestigio, una

clientela. De tal forma que llega un punto en que el significado 111

Registro de marca nº 811.923.924.

112 Registro de marca nº 790.315.041.

113 “La significación secundaria a la hora de elegir marcas”, pp. 02/03.

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„secundario‟ como „marca‟, por su uso y publicidad, por la

distintividad adquirida, se transforma en el „significado primario‟

(su significado o función como marca destaca por sobre el

significado natural o literal del signo).”.

O uso progressivo de sinal não distintivo no mercado para identificar

determinados bens, portanto, associado a um elevado grau de conhecimento que

esse sinal adquire perante o público consumidor, pode levar referido sinal a

adquirir um segundo significado para o mercado. Este sinal, assim, passa a ser

dotado de distintividade, sendo passível de registro como marca.

3.1.1 – Origem

O conceito de secondary meaning surgiu nos chamados países do

common law (SAMPAIO, 1995: 13), tendo sido verificado primeiramente na Grã

Bretanha, em 1896, e desenvolvido nos Estados Unidos da América, onde o uso

do sinal é fundamental para a aquisição do direito sobre a marca (MORO, 2003:

83/84).

O surgimento da teoria do secondary meaning nos países do common law

explica-se principalmente pelo fato de referidos países adotarem o sistema

declarativo de direitos. Nesses países, o registro da marca, como já se observou,

visa apenas declarar um direito pré-existente, adquirido pelo uso do sinal como

marca, e referido registro garantirá, ainda, ao titular da marca o direito de agir

contra terceiros.

Portanto, é também nos países do common law que são verificados com

mais freqüência casos de aquisição de significado secundário por sinais carentes

de distintividade, como se verificará no Capítulo 05.

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3.1.2 – Características

O fenômeno do secondary meaning pressupõe (i) a aquisição de

significado secundário, (ii) por sinal não distintivo, (iii) decorrente do seu uso

anterior e da notoriedade adquirida pelo sinal perante o mercado. Estes três

fatores, portanto, caracterizam o fenômeno do secondary meaning, e devem ser

observados quando da avaliação da ocorrência ou não do fenômeno estudado.

O secondary meaning trata-se, pois, de fenômeno lingüístico, que exige

uma mutação da linguagem, na medida em que um determinado signo passa a

possuir novo significado perante o público consumidor.

Como se observou, quando a ocorrência do fenômeno do secondary

meaning é reconhecida, seja pelo órgão responsável pelos registros de marca,

seja pelos Tribunais, o que se garante é o registro, como marca, de expressão

originalmente não distintiva, o que pode ser considerado uma excepcionalidade.

Logo, a identificação das principais características do secondary meaning,

mostra-se especialmente importante para que não se conceda, equivocadamente,

uma proteção especial a sinais carentes de distintividade.

3.1.2.1 – Fenômeno lingüístico

A primeira característica do fenômeno do secondary meaning, portanto, é o

fato de tratar-se de fenômeno lingüístico, relativo à própria semântica do sinal não

distintivo.

Como esclarece CORREA (1994: 32),

“O desenvolvimento de um significado secundário deriva de um

processo de depósito semântico dentro do significante. O

significante é apenas uma forma, ou, antes, uma fôrma, servindo

de receptáculo a conteúdos diferentes, simultânea ou

sucessivamente, por processo diacrônico. O significante que,

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inicialmente, possuía um significado ou mais, passa a ter mais

um, no plano puramente privado.”.

Na verdade, o que se observa no fenômeno do secondary meaning é que o

sinal não distintivo adquire significado diverso do seu significado original.

Entende-se por significado diverso aquele diverso do seu sentido semântico

original, primário, significado este que possui relação direta com o bem ou serviço

assinalado.

Como bem sintetiza RICCI (2006: 193): “[a]quela expressão ou sinal que,

originalmente e a priori, não teria suficiente distintividade intrínseca, adquire a

distintividade na mente do consumidor e passa a ter um segundo significado para

ele, qual seja: o sentido secundário de verdadeira marca.”.

JACOBY (2001: 1029) defende, ainda, tratar-se o secondary meaning de

fenômeno psicológico, na medida em que o novo significado do sinal é criada

mentalmente pelo público consumidor:

“When a „substantial‟, appreciable‟, or „significant‟ proportion of the

relevant consuming public develops cognitive networks for a

product or service, and these networks posses one or more nodes

capable of serving to uniquely identify that product or service and

only that product or service as coming from a particular (albeit

anonymous) source, then, forms a psychological perspective, that

node (or nodes) may be said to have „acquired distinctiveness‟ or

achieved „secondary meaning‟.”.

Em se tratando de sinais não distintivos que adquirem distintividade, não

há dúvida de que o novo significado adquirido pelo signo deve afastar-se do

significado original, permitindo que o signo desassocie-se do bem ou serviço que

visa assinalar, sendo capaz de distingui-lo dos demais.

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3.1.2.2 – Expressões fracas x expressões carentes de

distintividade

Como se verificou, a LPI, em seu artigo 124, inciso VI, é taxativa ao não

permitir o registro, como marca, de sinais carentes de distintividade. Da lista dos

sinais dispostos no artigo referido, têm-se os sinais de caráter genérico,

necessários, comuns, vulgares ou simplesmente descritivos, “quando tiver relação

com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para

designar uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza,

nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do

serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva.”.

Por outro lado, como também se verificou, são os sinais carentes de

distintividade que podem sofrer o fenômeno do secondary meaning, uma vez que

referido fenômeno pressupõe a aquisição de distintividade de um sinal

originalmente não distintivo, de modo a garantir-lhe o direito de ser registrado

como marca.

Das disposições referidas, conclui-se que somente poderão sofrer o

fenômeno do secondary meaning os sinais genéricos, de uso comum, vulgares,

descritivos, assim considerados em relação ao produto ou serviço que visam

assinalar.

A doutrina norte-americana, contudo, apesar de admitir a aplicação da

teoria do secondary meaning para sinais genéricos, não admite que referidos

sinais sejam registrados como marca (SIERVI, 2005: 138). Na opinião da autora,

“[o] Direito americano nega-se a atribuir conseqüência jurídica, no

caso, proteção marcária, em tais circunstâncias, pois não admite

que possa ser dado direito de exclusividade ao uso de termos que

identifiquem, de forma genérica, um produto ou serviço.”.

Embora a jurisprudência norte-americana se mostre pacífica quanto ao

entendimento referido, na prática há uma grande dificuldade de se definir e

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diferenciar os termos genéricos dos sinais descritivos, vulgares, necessários ou

de uso comum, o que pode gerar decisões contraditórias quanto ao mesmo tema.

A legislação nacional, por sua vez, não proíbe o registro como marca de

sinais que, embora se relacionem indiretamente com o produto ou serviço que

visam assinalar, sejam dotadas de distintividade. De fato, são essas as marcas

preferidas pelos empresários, pois ao mesmo tempo em que evocam o produto ou

serviço que assinalam, ou sugerem sua natureza, sendo facilmente identificadas

pelo mercado, são elas passíveis de registro como marca.

Referidos sinais são comumente reconhecidos pela doutrina como marcas

evocativas ou sugestivas e caracterizam-se por possuírem um poder distintivo

mais atenuado. São consideradas, portanto, marcas fracas, em contraposição às

marcas fortes, de alto poder distintivo.

LEONARDOS (2000: 47) esclarece que a marca evocativa “É a marca

registrável que por contraposição à descritiva (irregistrável), que meramente

evoca o produto que pretende distinguir, mantém com ele uma relação remota ou

indireta.”. O autor apresenta como exemplos a marca “MOTORÁDIO” para rádio

de automóveis, “PAPER MATE” para canetas, e “BAGUETE” para sanduicheria.

Para GARCIA (2008: 21) as marcas sugestivas são as preferidas dos

publicitários pelo fato de sua associação com o produto não depender de

campanhas publicitárias. Dentre os exemplos trazidos, destacam-se as marcas

Coca-Cola, Palmolive e Eveready.

A questão que se coloca, contudo, é se as marcas evocativas e sugestivas

também seriam passiveis de sofrer o fenômeno do secondary meaning. Em se

tratando de fenômeno que estuda a aquisição de distintividade por signos não

distintivos, a princípio, parece-nos tecnicamente equivocado prever a aplicação de

referida teoria para sinais dotados de distintividade.

O que se admite, contudo, é que sinais evocativos ou sugestivos também

adquiram um novo significado ao longo do uso, isto é, que adquiram um

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secondary meaning, adquirindo, portanto, mais distintividade do que originalmente

possuíam, na medida em que seu novo significado é capaz de afastar o sinal do

bem ou serviço por ele assinalado. Referido significado secundário, assim, não

transformará um sinal não distintivo em signo passível de registro como marca,

mas será capaz de transformar uma marca originalmente fraca em marca forte.

3.1.2.3 – As expressões em língua estrangeira

Quanto às expressões em língua estrangeira, como se verificou, referidos

sinais são passíveis de registro como marca desde que apresentem caráter

distintivo. Isto significa afirmar que as palavras em língua estrangeira serão

passíveis de registro como marca quando não possuírem relação direta com o

produto ou serviço que assinalam.

Quando referidas expressões, contudo, possuírem relação com o produto

ou serviço que distinguem, parece-nos que devem ser observadas as mesmas

disposições relativas às marcas evocativas ou sugestivas e às marcas genéricas,

de uso comum, vulgares e descritivas.

Assim, expressões em língua estrangeira que possuem relação indireta

com o produto ou serviço que assinalam, sendo consideradas evocativas ou

sugestivas, não estão sujeitas ao fenômeno do secondary meaning - muito

embora possam adquirir significado secundário com o uso prolongado114 -,

enquanto os sinais em língua estrangeira diretamente relacionados com o bem ou

serviço que assinalam, poderão sofrer o fenômeno do secondary meaning.

114 A marca “POST-IT” (Processo nº 006.995.160), por exemplo, foi concedida para assinalar “material de

papel ou papelão em folha contendo um revestimento adesivo pelo menos em um dos lados, para fixação

em paredes ou outras superfícies verticais para manter no lugar exemplares de exposição e outras

mensagens.”. Considerando que o verbo “post”, na língua portuguesa pode ser traduzido como postar,

informar ou dispor, não há dúvida de que a marca “POST-IT” evoca a função das etiquetas autocolantes que

ela identifica. Entretanto, há que se reconhecer que a notoriedade adquirida por referida marca fez com

que ela adquirisse maior distintividade, afastando o termo “post-it” do objeto assinalado pela marca “POST-

IT”.

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103

3.1.2.4 – Limites à proteção

Ao adquirir um significado secundário, como se abordou, o sinal

originalmente não distintivo adquire capacidade distintiva, sendo passível,

portanto, de registro perante o INPI. Uma questão que se coloca, contudo, é a de

qual seria a extensão da proteção garantida a referidos sinais, na medida em que

são constituídos por expressões genéricas, comuns, descritivas de um produto ou

serviço.

Como coloca SIERVI (2005: 146),

“A necessidade de proteção a sinais, em princípio, não distintivos,

em decorrência da notoriedade adquirida e do uso diferenciado

feito pelo comerciante, com vistas à percepção pelos

consumidores de que tal termo constitui-se a marca

individualizadora de determinado bem gera, em contrapartida, a

possibilidade de monopólio da linguagem para o titular do signo

que adquiriu secondary meaning.”.

Parece-nos, contudo, que a questão pode ser resolvida em se limitando a

forma em que o sinal que adquiriu secondary meaning será utilizado, tanto pelo

titular da marca que adquiriu significado secundário, como pelo mercado em

geral. Tem-se, assim, que somente o titular da marca poderá fazer uso do sinal

como marca, enquanto aos demais somente será permitido fazer uso do sinal de

forma genérica, descritiva, isto é, em seu significado primário.

Tal conclusão, aliás, não poderia ser outra: o fato de um sinal inicialmente

não distintivo ser registrado como marca não impede que a palavra possa ser

usada em sua acepção semântica “[o]u seja, que não possa ser usada como

símbolo semiológico para referir-se ao significado que lhe é atribuído enquanto

tal.” (SHIMIDT, 1999: 15).

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Ao tratar da legislação uruguaia e da teoria do significado secundário no

Uruguai, CARRAU115 ressalva que

“Como contrapeso justo a la doctrina de la „significación

secundaria‟ ha surgido la doctrina o defensa del „uso leal‟ („fair

use‟ defense). Así, nadie podría ser impedido de usar términos de

uso general, aunque sean marcas registradas, si los usa

lealmente, de buena fé, en su significado literal (y no como marca)

para describir o calificar y sin provocar riesgo alguno de

confusión. Naturalmente, esto habrá de ser ponderado en cada

caso concreto, apreciando todos los elementos en cuestión.”.

Um exemplo apresentado por SAMPAIO (1995: 14) serve para ilustrar a

limitação à proteção referida:

“Um comerciante norte-americano lançou a marca Realemon para

sumo de limão. O produto obtém grande sucesso, mormente pela

sua qualidade. Os concorrentes accionam judicialmente esse

comerciante, alegando que ele não tem direito a tal expressão

como marca, visto que ela tão-só descreve o produto como sendo

„realmente limão‟.

Em sua defesa, o comerciante apresenta affidavits (declarações)

demonstrando o grande volume de vendas da sua marca, os

avultados gastos na sua publicidade e sobretudo o resultado de

surveys (inquéritos ou sondagens) demonstrando que o público

consumidor associa inequivocamente a expressão a uma

determinada origem do produto, função individualizadora

característica de marca. O Tribunal decidiu então que a expressão

„Realemon‟, apesar de poder significar que o produto é realmente

limão, tem efectivamente um „segundo significado‟ (secondary

meaning), pois que preenche cabalmente a função característica

da marca. Isso não quer dizer que os concorrentes possam apor

115 “La significación secundaria a la hora de elegir marcas”, p. 03.

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nas embalagens dos seus produtos a expressão „real lemon‟, mas

apenas como mera expressão indicativa de que o seu produto é

realmente limão, e não como marca.”.

Conclui-se, portanto, que mesmo registrado como marca, o titular de um

sinal que adquiriu secondary meaning não pode impedir o uso de referido sinal

em seu significado originário por terceiros. A doutrina do secondary meaning

busca apenas identificar sinais que adquirem distintividade para garantir ao seu

titular o registro como marca, respeitado sempre o fair use do sinal, em seu

significado primário.

3.1.3 – Aplicabilidade

A aplicação da teoria do significado secundário das marcas, como se verá,

pode se dar tanto no sistema declarativo de direitos, como no sistema atributivo.

3.1.3.1 – No sistema declarativo de registro de marca

No sistema declarativo de direitos, como se verificou, é o primeiro uso da

marca que garantirá a seu titular a propriedade sobre a marca. Logo, neste

sistema, o registro da marca é meramente declarativo, uma vez que apenas

declara a propriedade da marca ao seu titular.

Como também se expôs, a teoria do secondary meaning pressupõe a

aquisição de significado secundário, por sinal não distintivo, decorrente do seu

uso anterior e da notoriedade adquirida pelo sinal perante o mercado, decorrente

de referido uso anterior.

Logo, uma das principais características do fenômeno do secondary

meaning - a aquisição de distintividade pelo uso anterior do sinal – é

perfeitamente compatível com a principal característica do sistema de declarativo

– a aquisição de um direito pelo uso do sinal. Não é por outro motivo, portanto,

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que a teoria do secondary meaning surgiu exatamente nos países que adotam o

sistema declarativo de direitos.

Não há dúvida, portanto, acerca da aplicabilidade da teoria do secondary

meaning em países que adotam referido sistema, sendo nestes países, como se

verá, que são mais freqüentemente observados casos de aquisição de significado

secundário por sinais originalmente não distintivos.

3.1.3.2 – No sistema atributivo de registro de marca

A questão acerca da aplicabilidade da teoria do secondary meaning no

sistema atributivo de direitos, por sua vez, mostra-se polêmica, não encontrando

posicionamento pacífico na doutrina.

Como se verificou, no sistema atributivo, a propriedade da marca adquire-

se pelo seu registro. E, para que o sinal depositado seja registrado como marca,

como também se verificou, deve ele preencher os requisitos legais, dentre eles, o

de ser distintivo.

A análise acerca da distintividade do sinal no sistema atributivo, portanto,

ocorre no momento em que ele é depositado perante o órgão competente para

ser registrado como marca. E, se neste momento, o sinal mostrar poder distintivo,

o órgão competente não pode recusar-se a registrá-lo por ausência de

distintividade.

Desta análise, portanto, mostra-se incorreto o entendimento de que a teoria

do secondary meaning não encontraria aplicabilidade nos países que adotam o

sistema atributivo de direitos. Nada obsta que um sinal adquira secondary

meaning pelo uso antes de ser levado a registro perante o órgão competente.

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No Brasil, por exemplo, a marca “CREDICARD”116 foi devidamente

registrada perante o INPI para identificar “serviços auxiliares ou correlatos das

atividades financeiras.”. A marca “ALPARGATAS”117, por sua vez, também

se encontra registrada para identificar, dentre outros produtos, “calçados,

tênis, sapatos esportivos, sapatos para a prática de esportes, chuteira de

futebol, botas para a prática de esportes, botinas, sapatos de ginástica,

sandálias de banho, chinelos de banho, sandálias e sapato social.”. Logo, a

possibilidade de aplicação da teoria do secondary meaning em países que

adotam o sistema atributivo de registro de marca é fato inafastável.

Como se verificará, aliás, dos demais exemplos selecionados no capítulo

05, em muitos casos, uma marca que adquiriu significado secundário e foi

registrada em país que adota o sistema declarativo de direitos, posteriormente é

levada a registro em países que adotam o sistema atributivo. Nesses casos, a

marca já se mostra perfeitamente distintiva quando é depositada perante o órgão

competente, sendo, assim, passível de registro também perante esses países.

3.1.4 – O aparente conflito existente entre a teoria do significado

secundário e o artigo 124, VI, da LPI

Como se verificou, o artigo 124, VI, da LPI é taxativo ao impedir o registro

como marca de sinais carentes de distintividade. O artigo 165 da LPI, por sua vez,

dispõe ser nulo o registro de marca que for concedido em desacordo com as

disposições daquela lei.

Outra questão que se coloca, portanto, é a de que a teoria do significado

secundário seria inaplicável no país na medida em que conflitaria com disposição

expressa da LPI de não permitir o registro como marca de sinal de caráter

genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo.

116 Registro de marca nº 006.751.377, concedido em 10.09.1978.

117 Registro de marca nº 007.534.922, concedido em 13.10.1981.

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108

Tal posicionamento, contudo, também não merece prosperar. Como bem

se abordou, a teoria do significado secundário prevê a aquisição de distintividade

por sinais originalmente não distintivos, logo, a própria teoria do secondary

meaning somente assegura a proteção como marca aos sinais que adquiriram

distintividade.

Assim uma análise restritiva do artigo 124, VI, da LPI mostra-se

incompatível com o próprio sistema de registro de marca no país, uma vez que os

termos “genérico”, “necessário”, “comum”, “vulgar” e “descritivo” podem ser

perfeitamente afastados diante do significado secundário adquirido pelo sinal. Daí

estar-se diante de um conflito aparente entre a teoria do significado secundário e

o artigo 124, VI, da LPI, o qual, na prática, não se verifica.

3.1.5 – Fundamento legal para a teoria

A possibilidade de um sinal originalmente não distintivo adquirir

distintividade, tornando-se, portanto, passível de registro, não está

expressamente prevista na legislação nacional. Contudo, a teoria do secondary

meaning pode ser perfeitamente fundamentada na CUP e no TRIPs, como se

passa a demonstrar.

3.1.5.1 – A Convenção da União de Paris

A CUP118 dispõe, em seu artigo 6 quinquies C (1), que para se apreciar se

uma marca é suscetível de proteção, devem ser consideradas todas as

circunstâncias de fato, notadamente a duração de seu uso.

Ao comentar este dispositivo, em especial a importância das circunstâncias

de fato a serem analisadas quando da concessão do registro de marca,

BODENHAUSEN (1969:123), antigo Diretor Geral dos Bureaux Internacionaux

118 Sobre a aplicabilidade da CUP no Brasil, discorreu-se no item 1.1.

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109

Réunis pour la Protection de la Propriété Intellectuelle - BIRPI (hoje denominada

OMPI – Organização Mundial da Propriedade Intelectual), prevê expressamente a

possibilidade das circunstâncias de fato demonstrarem que uma marca

originalmente sem distintividade adquiriu, pelo seu uso prolongado, um significado

secundário, tornando-a distintiva.

Logo, a teoria do significado secundário da marca mostra-se perfeitamente

fundamentada no artigo 6 quinquies C (1) da CUP, uma vez que, dentre as

circunstâncias de fato a serem analisadas quando da apreciação da

registrabilidade ou não de um sinal, certamente está a aquisição de um

significado secundário pelo sinal originalmente não distintivo.

3.1.5.2 – O TRIPs

O Artigo 15. 1 do TRIPs, por sua vez, dispõe:

“1. Qualquer sinal, ou combinação de sinais, capaz de distinguir

bens e serviços de um empreendimento daqueles de outro

empreendimento, poderá constituir uma marca. Estes sinais, em

particular palavras, inclusive nomes próprios, letras, numerais,

elementos figurativos e combinação de cores, bem como qualquer

combinação desses sinais, serão registráveis como marcas.

Quando os sinais não forem intrinsecamente capazes de distinguir

os bens e serviços pertinentes, os Membros poderão condicionar

a possibilidade do registro ao caráter distintivo que tenham

adquirido pelo seu uso. Os Membros poderão exigir, como

condição para registro, que os sinais sejam visualmente

perceptíveis.”.

Referido instrumento legislativo, como se verifica, prevê expressamente a

possibilidade de um sinal adquirir distintividade pelo seu uso, contemplando, pois,

a teoria do secondary meaning.

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110

Uma ressalva que se coloca, contudo, quanto ao TRIPs é acerca da sua

aplicabilidade no país, uma vez tratar-se de tratado-contrato119. Como adverte

SIERVI (2005: 175),

“O TRIPS é um tratado-contrato e, por conseguinte as obrigações

geradas por este tipo de tratado são dirigidas aos Estados

signatários, que devem modificar suas legislações internas, a fim

de que essas sejam compatíveis com as disposições do tratado.”.

Assim, embora o Brasil esteja obrigado a reconhecer a possibilidade de

registro de uma marca originalmente não distintiva que adquiriu distintividade por

meio do uso, as regras estabelecidas pelo TRIPs não podem ser exigidas

diretamente dos cidadãos. Torna-se, pois, necessária uma modificação da

legislação nacional para que a teoria do significado secundário seja também

aplicada no país com fundamento no TRIPs, modificação esta que só poderá ser

feita pelo Congresso.

3.1.6 – Riscos da teoria do significado secundário

A teoria do significado secundário, como se colocou, prevê uma hipótese

excepcional, em que é garantido a um único empresário direito de propriedade

sobre sinal originalmente não distintivo. Desta excepcionalidade, contudo,

decorrem dois riscos inevitáveis: um para o titular da marca, e outro para seus

concorrentes.

Primeiramente, como se expôs no item 3.1.2.4, mesmo registrado como

marca, um sinal que adquiriu secondary meaning não pode afastar o uso de

referido sinal em seu significado originário por terceiros. Isto porque, como se

colocou, a proteção conferida ao titular de marca adquirida em decorrência do

secondary meaning é limitada.

119 Sobre o tema, discorreu-se no item 1.1.

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111

Portanto, o titular de marca composta por sinal originalmente não distintivo

terá que conviver com o uso legítimo, por seus concorrentes, do sinal referido em

seu sentido primário. O titular da marca “VOLKSWAGEN”120, por exemplo, que

traduzido do alemão significa “carro popular”, não poderá impedir que seus

concorrentes utilizem a expressão “carro popular” como indicativa do produto por

eles ofertado. Referida restrição se coloca, principalmente, nos países de língua

alemã. No mesmo sentido, o titular da marca “KITCHENS”121 não poderá impedir

que seus concorrentes utilizem referido sinal para designar “cozinhas”.

Quanto a este ponto, contudo, é importante ressaltar que o ônus que se

impõe ao titular da marca de convívio com o uso de sua marca por terceiros em

seu significado primário, não se traduz na permissão de uso desenfreado de

referidos sinais como marca por terceiros. A concessão de registros de marca

para terceiros compostas com a marca que adquiriu significado secundário, ainda

que sem direito de uso exclusivo, não deve ser permitida, sob o risco de causar a

diluição da marca.

Como ensina CORREA (1998: 12):

“[a] distintividade descomunal da marca notória deve ser o fio

condutor de qualquer análise de colidência. Não importa que a

marca notória tenha emergido de um campo lógico originalmente

banal. Importa é a sua evolução no campo cognitivo, a aptidão

que tenha adquirido, em função do uso, para dinamizar a venda

de um produto. Assim como alguém pode nascer em um meio

acanhado e tornar-se dono de um império, a marca notória pode

ser, na origem, palavra banal, quase genérica, e crescer a ponto

de libertar-se de sua limitação natal.”.

Quanto aos concorrentes do titular da marca, por outro lado, estes terão

que conviver no mercado com marca intrinsecamente ligada aos bens e serviços

120 Registro de marca nº 002.171.511, concedido em 21.01.1969.

121 Registro de marca nº 003.989.100, concedido em 24.10.1969.

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112

por eles ofertados, mas para designar bem da concorrência. Embora a eles seja

permitido o uso do sinal em seu significado primário, não há como evitar que o

sinal seja imediatamente associado ao produto da concorrência. Além disso,

deverão eles ter muita cautela no uso de sinal registrado como marca por terceiro

na identificação de seus bens ou serviços, para que o uso não ultrapasse os

limites do fair use, caracterizando violação de marca.

3.1.7 – Hipóteses de aquisição de significado secundário

A aquisição de significado secundário por sinal originalmente não distintivo

pode se dar por diversos motivos.122 Trataremos aqui dos três principais motivos

vislumbrados na prática para ocorrência do fenômeno do secondary meaning.

122 SIERVI (2005: 169/170) traz uma hipótese interessante prevista pela doutrina uruguaia e italiana

“denominada, respectivamente, de recaptura e riabilitazione”, que ocorreria “quando o secondary meaning

é adquirido posteriormente ao registro do sinal como marca.”. Como ensina,

“*n+esses casos, o termo em questão é, em princípio, distintivo, dada a sua natureza

fantasista, mas com o uso esse sinal perde o seu caráter distintivo, operando-se a sua

degeneração. A degeneração faz com que os consumidores não identifiquem mais o signo

como marca, mas como o próprio nome do produto. O sinal torna-se, portanto, carente de

distintividade e é considerado de uso comum.

No caso de recaptura ou reabilitação, entretanto, o sinal readquire a sua capacidade

distintiva, graças aos esforços do seu titular para restaurar a função marcária do signo. Essa

recuperação da distintividade ocorre com base nos mesmos fatores que dão ensejo ao

secondary meaning. Desse modo, a constatação da aquisição do significado secundário se dá

após o registro da marca e ao invés de fazer surgir o direito à proteção marcária, ela impede a

anulação do registro pré-existente.”.

Embora a hipótese mostre similaridades com a disciplina do secondary meaning, entendemos que a

recaptura de marca degenerada por seu titular não representa hipótese de secondary meaning, pois o sinal

degenerado não adquire novo significado, diverso do original, mas apenas retoma referido significado. Por

este motivo, a hipótese sugerida não será tratada neste trabalho.

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113

3.1.7.1 – Uso prolongado no tempo

O uso prolongado no tempo de sinal originalmente não distintivo para

identificar determinados bens ou serviços é a principal hipótese reconhecida pelos

tribunais brasileiros para se identificar a ocorrência do secondary meaning.

Como se verificou, em sendo um fenômeno lingüístico o secondary

meaning exige que um sinal não distintivo adquira um novo significado perante o

mercado. Logo, é o consumidor quem deve identificar um signo não distintivo

como designador de determinado bem, é ele quem deve reconhecer a

distintividade do sinal.

Não se pode negar, portanto, que o uso de um sinal não distintivo, por um

longo período de tempo, e de forma contínua, para designar determinado bem ou

serviço é capaz de fazer com que o consumidor passe a identificá-lo como marca.

Referido sinal, depois de anos, décadas, consolida-se no mercado, adquire

significado próprio, independentemente de originalmente não possuir caráter

distintivo.

3.1.7.2 – Alto investimento publicitário

O alto investimento publicitário, por sua vez, mostra-se extremamente

eficaz na aquisição de significado secundário por um sinal, embora não possa ser

considerado prova absoluta da aquisição de secondary meaning.

Como se sabe, a publicidade tem por objetivo promover um produto ou

serviço, apresentando-o para o mercado, destacando suas qualidades e

diferenciando-o dos demais. Assim, ainda, que se trate de um sinal originalmente

não distintivo, a publicidade é capaz de agregar-lhe características distintivas, e

mais do que isso, é capaz de transmiti-las ao consumidor.

Em se tratando de matéria de prova, contudo, o alto investimento

publicitário nem sempre é capaz de demonstrar que o consumidor, na prática,

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114

reconhece o significado secundário de um sinal originalmente não distintivo.

Como já exposto, é o consumidor quem deve reconhecer o novo significado

adquirido pelo sinal, o que só pode ser verificado caso a caso.

O alto investimento publicitário, entretanto, comprova a boa intenção do

titular da marca na busca da individualização de seu sinal, e deve ser relevado

quando da análise da incidência ou não do secondary meaning.

3.1.7.3 – Excepcionalidade do produto ou serviço

assinalado

Uma terceira hipótese que se vislumbra, por fim, é a de aquisição de um

significado secundário por um sinal decorrente da excepcionalidade do produto

que ele assinala. O que se vislumbra, nesta hipótese, são bens de qualidade tão

excepcional que, ainda que sejam identificados por sinal não distintivo, o

consumidor identifica o bem em decorrência de sua qualidade.

Neste caso, a excepcional qualidade do bem é capaz de agregar poder

distintivo ao sinal marcário que o identifica, fazendo que ele adquira um

significado secundário.

Um bom exemplo para ilustrar esta hipótese é a marca “IPHONE”123,

depositada no Brasil para assinalar serviços de telecomunicação. A qualidade

excepcional dos aparelhos de celular “IPHONE” fez com que referido produto

adquirisse fama internacional, e que a expressão “IPHONE” - que significa

telefone (“phone”) com internet (“i”) -, adquirisse novo significado, confundindo-se

com o próprio produto.

123 Pedido de registro de marca nº 829.213.910.

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115

3.1.8 – A posição do INPI e dos Tribunais brasileiros quanto ao

tema

A aplicabilidade da teoria do significado secundário no país mostra-se

divergente no âmbito administrativo e judicial

O entendimento oficial do INPI é a de que o secondary meaning só teria

aplicação nos países que adotam o sistema declaratório de direitos, não sendo,

portanto, aplicável no Brasil (LOBO, 2006: 189/190). Isto porque, o INPI não

analisa as circunstâncias de fato quando da concessão de registros de marca,

ainda que assim determine a CUP, artigo 6º quinquies C (1), por entender que

referida determinação é aplicável apenas em hipóteses de marcas já registradas

no exterior quando requeridas no Brasil, e somente quando aplicável o princípio

do “telle quelle” previsto no artigo 6º, quinquies A (I) da CUP124.

A argumentação referida, contudo, foi taxativamente afastada pelo poder

judiciário em sentença proferida no caso da marca “POLVILHO

ANTISSÉTICO”125, onde se decidiu que

“Não ficou demonstrado o argumento do réu no sentido de que tal

ressalva (o art. 6, quinquies, da Convenção de Paris) só prevalecia nos

países em que a propriedade da marca se adquire por mera ocupação,

uma vez que não foi citado e parece inexistir qualquer dispositivo

convencional ou legal que estabeleça tal restrição quanto à aplicação do

citado texto da Convenção de Paris.”.

124

Como dispõe o artigo 6o quinquies A (1), da CUP, “Qualquer marca de fábrica ou de comércio

regularmente registrada no país de origem será admitida para registro e protegida na sua forma original nos outros países da União, com as restrições indicadas no presente artigo. Estes países poderão antes de procederem ao registro definitivo, exigir a apresentação de um certificado de registro no país de origem, passado pela autoridade competente. Não será exigida qualquer legislação para este certificado.” Assim, o princípio “telle quelle” determina que a marca registrada no país de origem será protegida nos demais países da União “tal qual” foi concedida no país de origem, isto é, em sua forma original. No entendimento do INPI, portanto, a aplicação do artigo 6º quinquies, C (1) da CUP, isto é, a necessária verificação das circunstâncias de fato quando do registro da marca seria apenas observada no caso das marcas estrangeiras a serem registradas no país.

125 Referido caso será tratado oportunamente no Capítulo 05.

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116

Logo, embora o INPI, oficialmente, relute em aceitar a teoria do secondary

meaning, ele não pode afastar o registro de marcas que, no momento do

depósito, se mostrarem suficientemente distintivas, ainda que referida

distintividade decorra de uso anterior do sinal.

Os Tribunais, por sua vez, embora de maneira tímida, têm aceitado a

aplicabilidade da teoria do secondary meaning no país, como se abordará no

Capítulo 05.

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117

IV. DA PERDA DE DISTINTIVIDADE DE MARCA DECORRENTE DE

SUA NOTORIEDADE

Como se observou, é possível vislumbrar quatro hipóteses distintas

relativas à aquisição e perda de distintividade marcária decorrente de sua

notoriedade. Neste capítulo, abordaremos a última hipótese de perda de

distintividade marcária, decorrente do excesso de notoriedade adquirido pelo

sinal.

4.1 – O fenômeno da degeneração da marca

A notoriedade de uma marca, como se destacou, é freqüentemente vista

de forma positiva pelo direito. Isto porque, a notoriedade é capaz de agregar a um

sinal maior distintividade, maior valor econômico e maior poder atrativo. É por

este motivo que às marcas notórias, como se expôs, é conferida proteção

especial, que excepciona os princípios relativos às marcas, visando proteger seu

poder atrativo.

Diante deste contexto, o fenômeno de degeneração marcária constitui um

paradoxo para o direito. Neste fenômeno, o excesso de notoriedade de um sinal

tem como conseqüência a perda de sua distintividade, e conseqüentemente, a

perda do seu valor como marca.

A degeneração marcária, assim como o secondary meaning, trata-se de

fenômeno lingüístico, na medida em que a marca, originalmente distintiva, adquire

novo significado, diverso de seu significado original. De forma idêntica, portanto, é

o público consumidor que passará a identificar a marca como sinônimo do

produto, agregando-lhe novo significado.

Como ensina COELHO (2004: 172),

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118

“A degeneração de marca notória é um interessante fenômeno

mercadológico que se verifica quando os consumidores passam a

identificar o gênero do produto pela marca de um de seus

fabricantes (cf. Sampaio, 1995). Marcas como aspirina, gilete e

fórmica encontram-se degeneradas, na medida em que deixaram

de identificar certo produto, fornecido por determinado

empresário, e passaram a se referir ao gênero, incluindo produtos

concorrentes. A degeneração é altamente prejudicial ao

empresário, porque a marca deixa de cumprir com a sua função

essencial. Todos os investimentos em publicidade para tornar

notória a marca podem se perder, pelo exagero da notoriedade.

Os investimentos para reverter processo de degeneração em

curso, por sua vez, devem ser tão ou mais elevados, e sua

eficácia não é garantida, podendo até mesmo contribuir para

degenerar mais a marca.”.

Portanto, como bem destaca o autor, a degeneração marcária é

especialmente prejudicial ao empresário. Na degeneração, mais do que perder a

distintividade, a marca passa a significar o próprio bem que assinala, passando a

ser utilizada no mercado como sinônimo de referido bem.

4.1.1 – Degeneração x diluição marcária

A diluição marcária, como se verificou, trata-se de hipótese de

enfraquecimento da distintividade de um sinal decorrente de sua notoriedade.

Referido enfraquecimento, em muitos casos, é tão acentuado que o sinal deixa de

ter força distintiva, diluindo-se.

Portanto, tanto o processo de diluição como o processo de degeneração

marcária tratam-se de hipóteses de perda de distintividade do sinal, ambos

decorrentes da notoriedade da marca.

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119

Não se pode, contudo, confundir referidos fenômenos. Na diluição de

marca notória, um mesmo sinal distintivo passa a ser utilizado para distinguir

diversos produtos existentes no mercado, perdendo, portanto, sua força distintiva.

A diluição marcária normalmente é conseqüência do aproveitamento indevido de

marca por terceiros e, via de regra, independe da intenção do titular da marca

notória.

O titular da marca, aliás, como se expôs, freqüentemente age contra

terceiros em busca de manter o poder atrativo de sua marca, mas nem sempre os

órgãos competentes constatam o risco de diluição de um sinal quando da análise

do registro de marcas por terceiros.

Na degeneração marcária, diferentemente, a marca perde sua capacidade

distintiva na medida em que passa a significar o próprio nome do bem que

assinala. A marca, assim, torna-se sinônimo do bem. Nesta hipótese, como se

verá, o titular da marca é normalmente o maior responsável pela perda da

distintividade de seu sinal, seja pelo mau uso que faz do sinal marcário, seja pela

inércia na sua proteção.

Note-se que alguns autores tratam a degeneração marcária como hipótese

de diluição de marca (neste sentido, FABBRI JR., 1996: 97). Embora os

fenômenos sejam muito próximos, entendemos que algumas das causas de

referidos fenômenos, bem como uma das principais conseqüências da

degeneração – o fato de a marca tornar-se sinônimo do bem -, faz da diluição e

da degeneração marcária fenômenos distintos.

4.1.2 – A excepcionalidade dos bens e serviços assinalados

A excepcionalidade de um bem ou serviço lançado no mercado é

freqüentemente apontada como causa de degeneração de marca.

Nesta hipótese, o que se observa é o lançamento no mercado de um

produto ou serviço inovador, muitas vezes objeto de proteção patentária, que

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120

passa a ser designado pelo público em geral pela própria marca que o assinala.

Neste caso, o produto ou serviço, por ser único no mercado, adquire o nome da

marca que o identifica, com ela se confundindo.

Como ensina MIRANDA (1983: 34),

“Se a denominação do produto cuja invenção foi patenteada cai

em domínio comum, com a invenção mesma, dá-se a

generalização da expressão, porque o produto, que passa a poder

ser feito por outros, tem de ter nome e a denominação, que tivera,

quase sempre se impõe. Não importa se é o nome do próprio

patenteado. Se o inventor que evitá-lo, não tinha outro caminho

que deixar de emprestar o seu nome ao produto. A fortiori, se não

se trata de nome do inventor, mas de nome de fantasia.”.

Note-se que nesta hipótese é o consumidor que, primeiramente, passa a

reconhecer o gênero do produto como sinônimo da marca. Por não encontrar

produtos similares no mercado, o produto inovador vai, aos poucos, sendo

divulgado entre os consumidores apenas pela marca, como sendo o nome do

próprio produto, como ocorreu com a marca “ASPIRINA”126, ou ainda com a

marca “CHICLETS”127. Entretanto, é a inércia do titular da marca que, em um

segundo momento, contribuirá para que a marca seja confundida com o produto

inovador, tornando-se, na visão do consumidor, sinônimo daquele.

Assim, em casos como tais, cabe ao titular da marca, quando do

lançamento do produto no mercado, designá-lo pelo seu nome próprio, ainda que

de difícil assimilação pelo consumidor, visando evitar a degeneração de sua

marca.

126 Registro de marca nº 810.848.775.

127 Registro de marca nº 817.767.096.

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121

4.1.3 – O conflito entre as estratégias de marketing e a

construção de marcas distintivas

O problema que se encontra quanto às estratégias de marketing é o fato

de, em muitos casos, centrarem-se elas na transformação da marca em sinônimo

do produto (FABBRI JR., 1996: 98). Referida estratégia, para o profissional do

marketing, parece ser a mais eficaz na fixação de uma marca, na medida em que

a associação direta entre a marca e o produto reduz o âmbito de atuação da

concorrência.

Neste sentido, os profissionais de marketing, contratados para promover o

bem, focam suas campanhas na associação entre marca e produto, de modo que

o consumidor, ao se deparar com determinada marca, automaticamente

identifique o produto por ela assinalado, e vice-versa.

Contudo, a longo prazo, referida estratégia mostra-se extremamente

perigosa, e é capaz de causar a degenerescência da marca que se visava

promover. O sucesso do marketing, portanto, pode paradoxalmente levar a marca

a perder seu poder distintivo, degenerando-se.

4.1.3.1 – A inércia do próprio titular da marca

degeneranda

Como se verificou, a degeneração marcária, normalmente, ocorre por mau

uso da marca por seu titular. O titular da marca, ainda, diante dos indícios da

degeneração de sua marca, muitas vezes é negligente, e acomoda-se diante do

lento processo de perda de poder distintivo de sua marca.

Ao se vislumbrar a ocorrência de processo degenerativo, isto é,

identificados os sinais indicadores da degenerescência, deve o titular da marca

agir a fim de zelar pela sua integridade material e reputação, em respeito aos

poderes que lhe são conferidos pelo artigo 130, III, da LPI.

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122

Como adverte SAMPAIO (1995: 15/16),

“[v]árias vezes a degenerescência tem ocorrido por certa

negligência do titular da marca relativamente à possibilidade dessa

ocorrência. E é claro que há formas concretas de evitar a

degenerescência marcária. Não basta, porém, o titular da marca

preocupar-se com isso, ou até fazer enormes esforços nesse

sentido, se estes esforços não conseguirem evitar tal fenômeno.

Pelo menos, nos EUA (e também na Grã-Bretanha) o que interessa

é a efectiva perda factual da capacidade distintiva do sinal

marcário, independentemente dos esforços do seu titular em

sentido contrário.”.

Como pondera referido autor é a perda da capacidade distintiva da marca -

que passa a confundir-se com o próprio bem -, que importa para a caracterização

da degeneração. Os esforços empregados pelo titular da marca na tentativa de

reverter referido fenômeno não terão nenhum valor no caso da degeneração

definitiva do sinal.

4.1.4 – Fundamento legal para o fenômeno da degeneração

marcária

Assim como ocorre com o secondary meaning, a possibilidade de perda de

propriedade sobre um sinal em decorrência de sua degeneração não está

expressamente prevista na legislação nacional. A degeneração marcária, aliás,

sequer se encontra entre as hipóteses de extinção de registro de marca, como se

mostrará no item 4.2.1.

Entretanto, o fenômeno da degeneração marcária encontra fundamento na

CUP a qual, como já exposto é perfeitamente aplicável no país. Como passamos

a demonstrar, a CUP prevê, de um lado, a possibilidade de uma marca registrada

ser invalidada por ter degenerado e, de outro, impossibilita o registro de marca

que já sofreu degeneração.

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4.1.4.1 - A Convenção da União de Paris

A CUP, em seu artigo 6 quinquies B (2), dispõe que:

“B . Só poderá ser recusado ou invalidado o registro das marcas de

fábrica ou de comércio mencionadas no presente artigo, nos casos

seguintes:

(...)

(2) quando forem desprovidas de qualquer caráter distintivo ou

então exclusivamente composta por sinais ou indicações que

possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a

quantidade, o destino, o valor, o lugar de origem dos produtos ou a

época da produção, ou que se tenham tornado usuais na

linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio

do país em que a proteção é requerida;”.

Da leitura de referido artigo verifica-se que a CUP prevê expressamente a

possibilidade de recusa ou invalidação de registro de marca “que se tenha

tornado usual na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do

comércio do país em que a proteção é requerida;”, isto é, que tenha sofrido

degeneração perante o público em geral.

4.1.5 – Sinais indicadores da degeneração marcária

A degeneração marcária trata-se de processo lento e muitas vezes de

difícil percepção. Normalmente quando o titular da marca nota a perda do poder

distintivo do sinal, a marca já se degenerou, ou se encontra em estágio quase

irreversível de degeneração.

A doutrina, assim, aponta alguns sinais indicadores da degeneração

marcária, visando principalmente alertar o titular da marca para que ele tome as

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124

medidas necessárias para tentar reverter o processo de degeneração, isto é, para

tentar manter a sua marca, antes que ela perca seu poder distintivo por completo.

Como exemplifica SAMPAIO (1996: 16),

“Nos EUA, os meios de prova judiciais de degenerescência de uma

marca são usualmente: definições em dicionário em que a

expressão aparece como designação genérica, documentação que

prove ter o próprio titular ou seus associados usado a expressão

genericamente e, ainda, sondagem que demonstrem o uso as

marca como expressão simplesmente genérica.”.

Neste item, abordaremos os dois principais indicadores da degeneração

marcária verificados na prática: a dicionarização da marca, e o uso da expressão

como sinônimo do bem pelo público consumidor e demais concorrentes do

mercado.

4.1.5.1 – Dicionarização da expressão

Um dos sinais mais comuns da degeneração marcária é verificado quando

a marca é abordada nos dicionários como designativa do bem ou serviço que

assinala. Os dicionários muitas vezes indicam marcas registradas como

sinônimos dos bens por ela assinalados, contribuindo para o processo de

degeneração do sinal.

Para que uma marca seja dicionarizada, contudo, é necessário que ela seja

previamente reconhecida pelo público em geral como designativa do bem que ela

assinala. Os especialistas responsáveis pelo desenvolvimento dos dicionários não

criam novos verbetes, mas os buscam na linguagem corriqueira, popular.

O titular da marca, assim, quando se deparar com a dicionarização de sua

marca, deve agir contra as editoras, notificando-as acerca de seus direitos sobre

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125

o sinal e exigindo que se indique nos dicionários tratar-se referido sinal de marca

registrada.

GLAU-KUNTZ (1995: 30), em comentário à Lei de Marcas Alemã de 1995,

trata de curiosa disposição presente em referida lei, a qual prevê que na hipótese

de marca registrada ser citada em dicionário, enciclopédia, livro de referências

(também em forma de banco de dados eletrônicos) e levar à idéia que referida

marca é, na verdade, um nome genérico para produtos ou serviços para os quais

a marca registrada se destina, o titular de marca registrada poderá exigir do editor

da obra que em sua apresentação seja incluída uma indicação de que se trata de

uma marca registrada. Na hipótese, ainda, da obra já ter sido publicada, aquela

disposição deverá ser cumprida na edição seguinte.

A disposição alemã quanto ao tema representa um avanço na medida em

que prevê hipótese expressa de responsabilização da editora pela degeneração

do sinal. Embora no Brasil não exista nenhuma disposição legal neste sentido,

não há dúvida que o titular da marca poderá agir judicialmente contra a editora,

visando zelar pela integridade material de sua marca128.

4.1.5.2 – Uso da expressão como sinônimo do bem pelo

público consumidor e pelos concorrentes

Como se verificou, a ocorrência de degeneração marcária, por se tratar de

fenômeno empírico, deve ser verificada juntamente ao público consumidor. Como

assevera SIERVI (2005: 217):

“Não haverá degeneração se o consumidor não perceber o sinal

como sinônimo da designação comum do bem que esse costumava

distinguir. A vulgarização de uma marca notória é, como visto, um

fenômeno sociológico que se opera no seio da sociedade e

depende do comportamento do público para ser configurada. Por

128 LPI, artigo 130, III.

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pior que seja a atitude do titular frente ao sinal, ou seja, por mais

que o titular da marca realize um uso não distintivo do signo,

utilizando-o sempre como o nome comum do bem que designa, por

meio da publicidade ou de qualquer outra forma, a vulgarização do

sinal não existirá se o público consumidor não considerar o sinal

como o próprio nome do produto ou serviço.”.

Para JAY (2009: 1.118/1.119),

“Many types of evidence may be proffered in trademark disputes on

the issue of whether a mark is or has become generic. However,

surveys (opinion polls) that measure the „primary significance‟ of a

mark to consumers are „almost the rigueur‟ in such inquiries.”.

A pesquisa de opinião, portanto, é reconhecida pela doutrina como uma

medida eficaz para se identificar eventual processo de degeneração de um sinal,

servindo de parâmetro para que empresários preocupados na manutenção de sua

marca remodelem sua estratégia publicitária.

4.1.6 – Possibilidade de reversão

A possibilidade de reversão do processo degenerativo é bastante discutida

pela doutrina, porém, dificilmente se verifica, na prática, a “recaptura” da

distintividade pelo sinal.

Como se verificou no item 3.1.7, parte da doutrina classifica a “recaptura”

da distintividade pelo sinal degenerado como hipótese de aquisição secondary

meaning pelo sinal129, posicionamento com o qual discordamos naquele

momento.

129 Neste sentido, LEVY (2005: 1.197).

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CARRAU130, a título ilustrativo, traz um exemplo ocorrido nos Estados

Unidos da América relativo à marca “SINGER”, que considera ser uma “recaptura”

da marca131:

“En los Estados Unidos, la firma Singer Manufacturing Co. perdió

derechos sobre sua marca de máquinas de coser, porque el

público consumidor designaba genéricamente dichas máquinas

como „singers‟. Sin embargo, la campañía continuó utilizando el

signo para distinguir sus produtos y lugeo de cincuenta años,

logro obtener nuevamente derechos exclusivos sobre dicho

término: „recapturó‟ la marca.”.

O problema da “recaptura” da distintividade do sinal está na dificuldade de

se perceber, normalmente, que determinada marca está se degenerando, e que o

titular da marca deve agir imediatamente. A reversão da degeneração, portanto,

dependerá não apenas das medidas tomadas pelo titular da marca, mas também

do momento em que as medidas serão tomadas, e da resposta do público

consumidor a referidas medidas.

4.1.6.1 – A importância das campanhas publicitárias

O uso de campanhas publicitárias na tentativa de se reverter a

degeneração do sinal pode, de fato, gerar efeitos positivos, isto é, garantir que o

sinal não degenere, e retome à distintividade que possuía originalmente.

Nos Estados Unidos da América, por exemplo, a titular da marca

“TABASCO” investiu em forte campanha publicitária para dissociar sua marca ao

sinônimo de pimenta. Como coloca FABBRI JR. (1996: 98), “Evidente que tal

ação de emergência se deu após o referido fabricante constatar que os esforços

130 “La significación secundaria a la hora de elegir marcas”, p. 03.

131 Abordaremos sobre o exemplo referido no Capítulo 5.

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128

em marketing despendidos até então tinham como tônica a mensagem de que

„Tabasco era pimenta, e pimenta era Tabasco‟”.

SAMPAIO (1995: 16) apresenta dois exemplos interessantes:

“O sucesso inicial da KODAK foi tal, que o público, maravilhado

com o produto a tão baixo preço, começou a verbalizá-lo

genericamente dizendo: eu kodako-te, tu kodaka-me, ele foi

kodakado etc. O Sr. Eastman gastou então rios de dinheiro para

evitar tal generalização. Fê-lo através de enormes campanhas

publicitárias, e até por meios judiciais, de modo a levar os

consumidores, vendedores e imprensa a dizer que se „fotografa

com uma máquina fotográfica (da marca) Kodak.”.

(...)

“Há alguns anos, a empresa Xerox obrigou um Senador norte-

americano a desmentir-se publicamente, em pleno Senado, na

semana seguinte a ter dito „tenho aqui uma xeroxcopy‟... pois o

que ele afinal tinha não era uma Xeroxcopy (marca registrada),

mas sim uma mera fotocópia tirada por uma qualquer máquina

japonesa. A empresa Xerox tem despendido largas somas na

vigilância e detecção de dicionários, enciclopédias e outras

publicações que insiram a palavra „xeroxcopy‟ como expressão

comum ou vulgar sinônimo de fotocópia ou cópia fotostática,

obrigando os editores, inclusive judicialmente, a eliminar tais

inserções. E tem-no conseguido.”132.

Um exemplo bastante lembrado no Brasil foi a campanha publicitária

desenvolvida para evitar a degeneração da marca “LYCRA”133, que era usada

corriqueiramente para identificar qualquer tecido elástico para roupas. Com o

132 A título ilustrativo, em consulta ao mini dicionário Houaiss a palavra xerox aparece definida como “1.

máquina que copia a seco texto ou imagem; 2. Diz-se de ou essa cópia – marca registrada (Xerox) que

passou a designar seu gênero; cf. fotocópia.” (original não grifado).

133 Registro de marca nº 002.698.315.

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slogan “Se tem essa etiqueta é Lycra. Só Lycra é da Dupont”, a empresa Dupont

conseguiu, com sucesso, destacar a marca “LYCRA” no mercado, evitando de

forma eficaz sua degeneração.

4.1.6.2 – Atuação perante o INPI, mercado e meios de

comunicação

Quando determinada marca começa a ser identificada pelo público em

geral como sinônimo do bem que representa, é comum que terceiros depositem,

como marca, expressões compostas pela marca degeneranda. Tal conduta

muitas vezes ocorre por falta de informação do depositante, que desconhece

tratar-se o sinal de marca registrada.

A marca “JEEP”134, por exemplo, vem sendo utilizada corriqueiramente

para identificar quaisquer veículos de tração 4x4, e não apenas os veículos da

empresa DaimlerChrysler Company. Por este motivo, as associações de

proprietários desse tipo de veículo vêem se reunindo em “JEEP” clubes,

organizando passeios, eventos, e outras atividades que envolvam veículos de

tração 4x4.

Ocorre que alguns “JEEP” clubes vêm levando a registro marcas

compostas pela marca “JEEP”, de titularidade da empresa DaimlerChrysler

Company. A marca “JEEP CLUBE DO BRASIL”135, por exemplo, reproduz

claramente a marca “JEEP”, o que pode influenciar ainda mais na degeneração

deste sinal.

É muito comum, ainda, verificar no mercado placas indicando empresas de

“XEROX”136, que também representa marca registrada. O uso da marca “XEROX”

em matérias jornalísticas como sinônimo de fotocopiadoras, aliás, é prática 134

Registro de marca nº 002.811.316.

135 Registro de marca nº 813.268.214.

136 Registro de marca nº 006.531.881.

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130

constante.

Note-se, portanto, que o titular da marca deve estar atento às situações

referidas e agir sempre que constatar a possibilidade de degeneração de sua

marca. Agir previamente pode ser a única maneira de se evitar que a marca, de

fato, degenere.

4.2 – Efeitos da degeneração marcária para os registros de marca

Como passaremos a abordar, os efeitos da degeneração marcária para os

registros de marca, no Brasil, são essencialmente práticos.

4.2.1 – Impossibilidade de extinção do registro marcário

A LPI prevê, em seu artigo 142, as hipóteses de extinção do registro de

marca, quais sejam:

“Art. 142. O registro da marca extingue-se:

I - pela expiração do prazo de vigência;

II - pela renúncia, que poderá ser total ou parcial em relação aos produtos ou serviços assinalados pela marca;

III - pela caducidade; ou

IV - pela inobservância do disposto no art. 217.”.

Não há, portanto, qualquer previsão legal de extinção de registro de marca

já concedido com fundamento na degeneração sofrida pelo sinal ao longo do

tempo. Em outras palavras, uma vez registrado como marca, o INPI não pode se

recusar a prorrogar o registro de marca degenerada, salvo nas hipóteses

expressas do artigo 142.

Por outro lado, mesmo que se recorra ao Poder Judiciário, não há qualquer

fundamento legal capaz de fundamentar uma ação de extinção de registro de

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131

marca. Ainda que se alegue que o titular da marca deixou de zelar por sua

integridade137, referida omissão não é causa de extinção de registro de marca.

4.2.2 - Perda de eficácia do registro

Nos termos da lei, como exposto, ainda que uma marca degenere, ela

continuará registrada como se distintiva fosse. Entretanto, na prática a marca

perde sua força distintiva, e seu titular não poderá impedir que terceiros façam

uso do sinal por ele registrado para identificar seus produtos.

A perda de eficiência do registro de marca, portanto, é o principal efeito da

degeneração da marca sobre o sinal, e mostra-se importante na medida em que a

legislação nacional nada dispõe acerca da manutenção de marcas que perderam

seu caráter distintivo em processo de degeneração.

4.2.3 – A posição do INPI e dos Tribunais brasileiros quanto ao

tema

Como se verificou, a degeneração marcária não está prevista na legislação

nacional como hipótese de extinção do registro de marca. Por este motivo,

embora se esteja diante de um registro de marca que sofreu degeneração, o INPI

não pode se negar a prorrogar o registro de referida marca se seu titular assim

requerer.

Na prática, contudo, visando superar esta questão, o INPI concede

registros de marca compostos por outras marcas que considera ter degenerado.

Embora referida conduta, a princípio, se mostre contrária à LPI138, há que se

ressalvar que o registro de marca degenerada, ainda que vigente, é ineficaz,

portanto incapaz de ser oponível a terceiro.

137 LPI, artigo 130, III.

138 LPI, artigo 124, XIX.

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132

Quanto aos tribunais brasileiros, estes reconhecem a possibilidade de

degeneração de uma marca, principalmente em ações interpostas com

fundamento em marca degenerada, na qual se requer a abstenção do uso da

marca por terceiros.

A marca “FORMICA”, por exemplo, e o termo “JET SKI”, foram

reconhecidos judicialmente como degenerados, isto é, como não passíveis de uso

exclusivo por seus titulares. Outras hipóteses serão tratadas no capítulo 05.

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133

V. CASOS DE AQUISIÇÃO E PERDA DE DISTINTIVIDADE DECORRENTES

DA NOTORIEDADE DA MARCA

Neste capítulo, trataremos de alguns casos práticos nos quais é possível

identificar a incidência dos fenômenos do secondary meaning e da degeneração

marcária, bem como casos em que referidos fenômenos foram suscitados, porém

não reconhecidos pelos órgãos competentes.

5.1- Hipóteses de aquisição de distintividade marcária

A doutrina apresenta, freqüentemente, quatro casos clássicos de

reconhecimento, em âmbito judicial, de aquisição de distintividade marcária

decorrente do secondary meaning adquirido pelo sinal.

O primeiro deles refere-se à marca “VECAMBRÁS”139, cujo pedido de

registro de marca foi indeferido pelo INPI sob o argumento de que induziria falsa

procedência - uma vez que o sufixo “BRÁS” indicaria pessoa jurídica de direito

público. Neste caso, o antigo Tribunal Federal de Recursos anulou o ato

administrativo de indeferimento do registro, diante da prova feita pelo titular da

marca de que referida marca era usada há quase vinte anos no mercado, tendo

adquirido um novo significado perante o público em geral140.

O segundo caso clássico apresentado pela doutrina refere-se à marca

“POLVILHO ANTISSÉPTICO”141, designativa de um talco, cujo registro também

foi, a princípio, indeferido pelo INPI. O titular da marca propôs ação de nulidade

do ato administrativo do INPI de indeferimento e o antigo Tribunal Federal de

Recursos do Rio de Janeiro142 confirmou a sentença de primeira instância que

139 Registro de marca nº 002.117.193.

140 Publicado no Diário Oficial de 12.11.1975, p. 8.313.

141 Registro de marca nº 760.022.038.

142 Apelação Cível nº 102.635 – TFR/RJ – 5ª. Turma – Relator Min. Pedro Acioli, publicado no Diário Oficial

de 17.10.1985, p. 18.379.

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134

deu provimento à ação para anular o ato do INPI. Em referida ação, o Tribunal

destacou que o titular da marca comprovou fazer uso do sinal como marca desde

o ano de 1903, quando o produto foi licenciado pela Saúde Pública. Neste caso

houve aplicação expressa do artigo 6, quinquies, da CUP, restando reconhecida

que a marca em questão havia adquirido caráter distintivo em face de seu uso

prolongado.

O terceiro caso bastante discutido pela doutrina, e já citado no presente

trabalho, refere-se à marca “ALPARGATAS”143. Neste caso, o titular da marca

mencionada propôs ação visando coibir o uso do sinal mencionado por terceiros,

e o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim se manifestou quanto ao

assunto144:

“Ninguém questiona que o vocábulo „alpargata‟ é substantivo que, na

significação original, denota espécie de sapato, ou calçado com algumas

peculiaridades que não vem a propósito. Para demonstrá-lo, escusa

recorrer aos dicionários. Mas a questão fática, que esta a desafiar a

qualificação jurídica neste processo é outra, e está em indagar se,

difundindo seu uso como expressão nominativa de singular espécie de

calçado, por ela fabricado há muitos anos, não acabou a autora por

emprestar-lhe conteúdo semiótico translato e singular, que entrou no

universo da concorrência mercantil, a identificar não só o produto em si,

mas o comerciante mesmo, e todas as atividades industriais e

comerciais?

(...)

De modo que, se a r. sentença reconheceu ter a autora granjeado, em

mais de 70 anos de atividades industrias e comerciais, merecia fama, cuja

intensidade respondeu pelo fenômeno semântico de o fabricante e o

produto terem assumido e absorvido a notação ideológica da própria

espécie sob a marca „Alpargatas‟, o que compõe sua „denominação‟, não

143 Registro de marca nº 007.534.922, concedido em 13.10.1981.

144 Acórdão proferido na Apelação Cível nº 82.301-1, TJSP, 2ª Câmara, rel. Des. Cézar Peluso, j. 10.02.1987,

em ação proposta por São Paulo Alpargatas S/A, titular da marca “ALPARGATAS”.

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135

ver o claro perigo de confusão advindo do isso de igual „nome‟, por parte

da ré, dedicada a objeto social idêntico, é negar aquele fato vistoso e

transparente.”.

Com referida fundamentação, pois, foi confirmada a sentença que julgara

procedente a ação, a fim de impedir o uso da marca “ALPARGATAS” por

terceiros.

Por fim, o quarto caso constantemente apresentado pela doutrina refere-se

à marca “GASTHAUS”145. Neste caso, o poder judiciário anulou a decisão

administrativa que havia indeferido o registro da marca em questão para

identificar serviços de alimentação, levando em conta outros argumentos, como o

uso ininterrupto dessa marca por quase duas décadas por seu titular. O acórdão

de lavra Tribunal Regional Federal da 2ª Região, aliás, faz menção expressa ao

artigo 6, quinquies, da CUP, relativo à aquisição de distintividade pelo uso.

Em caso recente, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região reconheceu a

aquisição de secondary meaning pela marca “KITCHENS”146, registrada para

assinalar, dentre outros produtos, utilidades domésticas. De forma diversa,

contudo, o mesmo Tribunal não reconheceu a aquisição de significado secundário

pela marca “CULTURA INGLESA”147.

Com relação ao INPI, como já se expôs, referido órgão mostra-se relutante

em aceitar a aplicação no país da teoria do secondary meaning. Contudo, muito

embora este seja o posicionamento oficial de referido órgão, basta uma análise

das suas decisões para se verificar que muitas marcas constituídas por sinais

originalmente não distintivos são concedidas, sem qualquer ressalva, como as

marcas “VOLKSWAGEN”, “CREDI-CARD”, “MISTURA FINA”, “FIAT LUX”,

“COCA-COLA”, “GENERAL ELETRIC”, “SUPER LUX”, “MOTO SPORT”,

“ULTRAGAZ” e “GEMADO”. 145

Registro de marca nº 814.173.330.

146 Apelação cível nº 2007.51.01.803363-9.

147 Apelação cível nº 2001.51.01.536393-6.

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136

5.2 - Hipóteses de perda de distintividade marcária

SOARES (2010: 169/198), em obra recentemente lançada acerca das

marcas notórias e seu risco de diluição, trata minuciosamente sobre os mais

famosos e recentes casos de litígios judiciais em que se discutiu a degeneração

marcária. Dado a complexidade do trabalho do autor, optamos por selecionar

alguns dos casos por ele abordado.

O primeiro caso trazido pelo autor - Bayer CO. v. United Drug CO – refere-

se à degeneração sofrida pela marca “ASPIRINA”148 nos Estados Unidos da

América. Como destaca referido autor, a empresa Bayer CO. adquiriu em 1900,

nos Estados Unidos da América, a patente do produto e a marca “ASPIRIN” para

assinalar ácido acetilsalicílico. A marca “ASPIRIN” foi utilizada por seu titular por

quinze anos como sinônimo do produto que assinalava, sem que o titular da

marca - e da patente – se preocupasse com referida associação. Assim, quando a

patente para o ácido acetilsalicílico expirou-se, muitos fabricantes de produtos

químicos, incluindo os concorrentes, admitiram que o termo “ASPIRIN” era o

nome genérico da droga. Por fim, através de decisão tomada pelo examinador do

Departamento de Patentes e de Marcas nos Estados Unidos da América, foi

declarado que a marca “ASPIRIN” não era mais válida e foi determinado o seu

cancelamento.

Outro caso tratado por referido autor - DuPont Cellophane Co vs. Waxed

Products Co., Inc. – refere-se à antiga marca “CELLOPHANE”, que não se

encontra mais vigente no país. Neste caso, o produto, também objeto de patente,

representava uma inovação para o mercado, e diante da ausência de produtos

semelhantes no mercado, passou a ser identificado como sinônimo da própria

marca.

A marca “TEFLON”149 (E.I. DuPont de Nemours & Co., Inc. VS. Yoshida

Internacional, Inc) também sofreu processo de degeneração, como ensina o

148 No Brasil, a marca “ASPIRINA” está registrada sob o nº 003.010.716; como já tratado, no país a

degeneração marcária não é causa de extinção do registro de marca.

149 Registrada no Brasil sob o nº 003.320.464.

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137

mesmo autor. Entretanto, através da pesquisa de opinião, o titular da marca

conseguiu demonstrar em juízo que o público identificava a expressão “TEFLON”

como marca registrada, opinando o juízo pela manutenção da marca.

A marca “SINGER”150 de propriedade de The Singer Mfg Co., também teria

sofrido degeneração. Após a decorrência legal no prazo de validade das primeiras

patentes de referida empresa, e com a colocação de seu objeto no domínio

público, muitos concorrentes passaram a fabricar máquinas de costura

identificando-as como “Singer sewing machines”. Em 1896, a Suprema Corte dos

Estados Unidos da América conclui que a marca “SINGER”, tornou-se nome de

uma classe de máquinas de costura feitas pela Singer Company e pelos seus

concorrentes. Não satisfeita com essa decisão, a titular da marca “SINGER”

continuou a se utilizar de sua marca, porém com muito mais cautela,

“não só projetando a mencionada marca, como também ampliando

sobremaneira a sua produção nos Estados Unidos da América e

em quase todos os outros países. Durante o período de 1930 a

1950, colocou ao mercado quatro milhões e meio de máquinas de

costura, despendendo quinze milhões de dólares em publicidade.

Os concorrentes foram desaparecendo paulatinamente e a

„SINGER‟, através de nova decisão judicial, em 1952/3, readquiriu

os direitos à sua plenitude a qual, indiscutivelmente, continua a ser

umas das mais conhecidas em todo o mundo.” (SOARES, 2010:

173).

São, ainda, casos famosos de degeneração de marca, reconhecidos pela

doutrina: “VASELINA”, “CELLULOID”, “MACACÃO”, “WALKMAN”, “PILATES”,

“VITROLA”, “XEROX”, “GILLETE”, “DANONE”, “BAND-AID”, dentre outros.

150 Registrada no Brasil sob o nº 002.294.788.

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138

CONCLUSÃO

Como se verificou, a distintividade se trata da principal característica da

marca. A marca surge como sinal distintivo e visa distinguir os produtos e serviços

por ela assinalados dos demais existentes no mercado.

Assim, a distintividade é também condição de validade para o registro

marcário. Um sinal carente de distintividade é, nos termos da lei, irregistrável

como marca.

As marcas notórias merecem, por sua vez, proteção especial nos termos

da lei por serem especialmente distintivas, atrativas, e de maior valor econômico.

Quanto aos efeitos da notoriedade sobre a marca, observamos no presente

trabalho quatro hipóteses.

Na primeira delas, um sinal carente de distintividade pode adquirir

significado secundário. Assim, referido sinal, originalmente não distintivo, torna-se

distintivo pelo uso. Esta hipótese é tratada pela teoria do secondary meaning, e

mostra-se particularmente importante na medida em que garante a um sinal não

distintivo proteção marcária.

Na segunda hipótese, um sinal distintivo torna-se excepcionalmente

distintivo, merecendo proteção especial. Esta hipótese é analisada dentro do

instituto das marcas notórias.

A terceira hipótese vislumbrada é aquela na qual um sinal tem seu poder

distintivo enfraquecido pelo aproveitamento indevido de terceiros. Referido

fenômeno é estudado pela teoria da diluição marcária.

Por fim, o último fenômeno analisado refere-se à perda total da

distintividade marcária decorrente de seu uso impróprio na designação do gênero

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139

do produto assinalado. Este fenômeno é denominado degenerescência ou

degeneração do sinal marcário.

No presente trabalho, assim, abordamos as quatro hipóteses referidas,

dando maior ênfase à disciplina do secondary meaning, e ao fenômeno da

degeneração da marca. Alguns casos foram trazidos de forma ilustrativa, a fim de

demonstrar a aplicabilidade de ambas as teorias no país.

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140

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