manoel de barros_geografias menores

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manoel de barros

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  • 7/18/2019 Manoel de Barros_geografias Menores

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    Revista Geografares, Edio Especial, p.118-132, Janeiro-Agosto, 2014ISSN 2175 -3709

    Artigo recebido em: 17/05/2014 Artigo publicado em: 07/08/2014

    MANOEL DE BARROS: POESIA INTERCESSORA DE GEOGRAFIAS MENORES EM VDEO

    Manoel de Barros: Poesa intercesora de las geografas menores en vdeo

    Manoel de Barros: Intercessory poetry of smaller geographies in video

    Eduardo de Oliveira Belleza1 (BR)Laboratrio de Estudos Audiovisuais (OLHO)

    da Faculdade de Educao da Universidade Estadual de Campinase-mail: [email protected]

    Resumo

    A noo de criao, por entendimento da losoa de Deleuze e Guattari - como algo que age com/sobre o mundo, demodo a promover alguma diferena - nos empurra a movimentar um conceito especco que tem se debruado acerca dopensamento espacial na contemporaneidade. Nosso exerccio aqui pensar junto com o conceito de geograas menores2e algumas imagens produzidas por jovens moradores de um bairro, localizado na periferia da cidade de Campinas SP,em uma ocina de produo de vdeos, onde se utilizou a potica de Manoel de Barros para inventar outras maneiras degrafar o espao de moradia dos participantes. Entendemos que este conceito nos ajuda a enfrentar alguns problemas epropor outros sentidos/pensamentos para a linguagem do vdeo, sobretudo, deslocando a imagem como representaoe do espacial como passvel de ser representado.

    Palavras-chave: Manoel de Barros; geograas menores; vdeo.

    1Mestre do Programa de Ps-graduao da Faculdade de Educao da Unicamp, apoiado pela FAPESP processo 2012/18976-1.2O conceito de Geografia Menor cunhado por Oliveira Jr. (2009) uma experimentao com a filosofia da diferena de Deleuze e Guattari em torno do

    problema de uma geografia abreviadora das potencialidades de se pensar o espao, e das imagens como prova do real.

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    Artigo recebido em: 17/05/2014 Artigo publicado em: 07/08/2014

    Resumen

    La idea de crear, mediante la comprensin de la losofa de Deleuze y Guattari - como algo que acta con / sobre elmundo con el n de promover una diferencia - nos empuja a mover un concepto especco que se ha ocupado sobre elpensamiento espacial en la actualidad. Nuestro ejercicio aqu es pensar, junto con el concepto de las geografas menoresy algunas imgenes producidas por jvenes residentes de un barrio situado en las afueras de la periferia de Campinas -

    SP, en un taller de produccin de vdeos, en los que se utiliz la potica de Manoel de Barros inventar otras maneras dedeletrear el espacio de vida de los participantes. Creemos que este concepto nos ayuda a enfrentar algunos problemasy proponer otros sentidos / pensamientos en el lenguaje del vdeo, especialmente al cambiar la imagen como una repre-sentacin del espacio y de posibilidades de estar representados.

    Palavras clave: Manoel de Barros; geografas menores; vdeo.

    Abstract

    The notion of creating, by understanding the philosophy of Deleuze and Guattari - as something that acts with / about

    the world of mode promote someone difference - pushes us to move a specic concept that has been addressing aboutcontemporary spatial thinking. Our exercise here is to think along with the concept ofsmaller geographies and someimages produced by young residents of a neighborhood, located on the outskirts of the city of Campinas - SP, in aworkshop of production of videos, in which we used the poetics of Manoel de Barros for to invent other ways to spell theliving space of the participants. We believe that this concept helps us to face some problems and propose other ways /thoughts into the language of video, especially by shifting the image as a representation of the space and as likely to berepresented.

    Keywords: Manoel de Barros; smaller geograhies; video.

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    Manoel De Barros: Poesia Intercessora De Geografas-Menores Em VdeoBelleza, E. O.

    INTRODUO

    No descomeo era o verbo.S depois que veio o delrio do verbo.

    O delrio do verbo estava no comeo, l onde acriana diz: Eu escuto a cor dos passarinhos.A criana no sabe que o verbo escutar no funcionapara cor, mas para som.Ento se a criana muda a funo de um verbo, ele delira. Epois. Em poesia que voz de poeta, que a voz de fazer nas-

    cimentos o verbo tem que pegar delrio.

    Manoel de Barros

    Quando Deleuze e Guattari (2010) liberam a lo-soa de seu sentido mais reexivo acerca do mundo, e

    apostam no ato de criao como mobilizao dos uxosde foras, eles nos convidam mais a um pensamentoloscocomconceitos, do que simplesmente dos con-ceitos. A proposio dos autores a de que eles - osconceitos - nos servem na medida em que possam ope-rar relaes inditas, estabelecer novas conexes, criaraberturas para passagens outras que ainda no erampossveis. A contemplao, a reexo, a comunicaono so disciplinas, mas mquinas de constituir Uni-versais em todas as disciplinas. (DELEUZE; GUATTARI,

    2010, p.13).Todo conceito exige um problema (DELEUZE;

    GUATTARI, 2010), criamos porque precisamos. A cria-o antes uma resposta a algo que nos afeta, Todoconceito remete a um problema, a problemas sem osquais no teria sentido, e que s podem ser isoladosou compreendidos na medida de sua soluo... (ibid.

    p.24). No criamos porque queremos, mas, sim porqueprecisamos. Criamos porque temos um problema queexige de ns uma ao, mas, nem sempre que temosum problema criamos.

    Apartado da intenso de reexo acerca de algo,Oliveira Jr. (2009) quando aproxima o conceito demino-ridade3 produto do pensamento de Deleuze e Guattari(1977) a um pensamento geogrco sedentarizadopela geograa tradicional, - e o faz na relao com asimagens - , alude possibilidade de arregimentar novoscontornos acerca das formas e contedos que concer-nem tanto a uma educao visual, sobretudo aquelaque em alguma medida toma as imagens como provade um real externo a prpria imagem e, a uma educa-

    o espacial dada, sobretudo, por uma geograa quetoma o espao no como algo acontece na justaposiode mltiplas trajetrias em constante atualizao (MAS-SEY, 2009), mas, como uma extensividade inerte e pas-svel de ser representada pelas imagens (cartogrcas,videogracase fotogrcas).

    Muitas dessas imagens-que-dizem-do-mundo querem ser vis-tas como o prprio real manifestando-se diante de ns. De-sejam ser tomadas como informaes-em-imagens passveisde serem localizadas no mundo alm-imagem. (OLIVEIRA JR.,

    2009, p. 21).

    3 A diferena entre maior e menor, na obra de Deleuze e Guatta-ri, pensada menos acerca de uma relao entre medidas, e maiscomo relao de foras, propondo intensidades distintas. O menorali perspectivado como um ndice de desterritorializao do maior,portanto, com maior potncia de produzir variao.

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    Aquilo que gera tenses criativas em seus escri-tos tem apontado para os usos mais habituais das ima-gens, como captura de algo externo a ela mesma, comoexclusivamente informativa, comunicativa, ilustrativa,

    e, quando utilizadas na relao com a geograa passama operar, com mais intensidade, a representao do es-pao capturado pelas lentes da cmera, pela graa dotraado, colocado diante de ns como paisagem. Este ,portanto, o indcio mais forte de uma geograa maior,que nos mobiliza a pensar de um determinado modoe que j se estabeleceu em ns, por uma educaoespacial como um modo de conceber o espacial ex-tensivo, inerte, separado do tempo, das medidas, ma-peado, codicado - e a sua associao com as imagens.

    Embalado pela relao entre as imagens e aquiloque delas escapa como possibilidade para um pensamen-to espacial outro, o autor compe conexes conceituaisque abrem frestas em direes pouco estabilizadas, deentendimentos que se processam no deslocamento depensamentos estabilizados sem que necessariamentetenha que se opor a eles, mas, de dentro deles mesmosagir, e, quem sabe fazer emergir aquilo que at entono era possvel de ser pensado minoridades.

    Geograas menores: estas so como ilhas no entorno do con-tinente da geograa maior, so potncias de expanso dessecontinente, so tambm as primeiras aproximaes desse con-

    tinente para quem vem do oceano livre utuante do pensa-mento... (OLIVEIRA JR., 2009, p. 19).

    Ao atualizar outras verses da relao com o es-pao sobretudo em experimentaes com vdeos, fo-

    tograas e mapas -, em suas minoridades, o autor per-fura a geograa maior e prope re-existncias. Ou seja,fora o pensamento espacial a deslocar-se de dentrodele mesmo uma aposta de que possamos inventar

    outros modos pensamento. Dar existncia a um pensa-mento espacial outro, como intui Doreen Massey, o es-pao como no como estase, mas, como uma simulta-neidade de estrias-at-agora (MASSEY, 2009, p. 29). Tomo estes primeiros apontamentos acerca dosespaos, da relao com o conceito de geograa me-nore da linguagem audiovisual, com o anseio de versaracerca de minha pesquisa de mestrado, de modo a su-gerir aos leitores alguns rastros dos mltiplos percursosagenciados em torno das imagens, das geograas e das

    educaes.

    UM CAMPO DE PESQUISA EM...

    Inserido em um bairro perifrico da cidade deCampinas-SP, com a pretenso de fazer encontrar meusdesejos de produo audiovisual/espacial junto aos u-xos/foras da juventude local, lancei-me em uma ocinade produo de vdeos com jovens moradores daquelelugar na tentativa de produzir outros sentidos imag-

    tico-espaciais. A vontade de trabalhar com ocinas dizrespeito a uma educao que se processa na/por expe-rimentao, como processo inacabado, que ganha forapelas variaes que fazem encontrar outros modos, quese servem do acaso como alimento para produzir dife-renas, (CORRA; PREVE, 2011).

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    No mais um sistema identicvel, apreensvel, avalivel, mascujos efeitos se fazem sentir na capacidade de desmontar ten-tativas de docilizao para a produo de homens teis. (COR-RA; PREVE, 2011, p. 18).

    Em nossas experimentaes brincvamos com acmera em caminhadas pelo bairro a procura de sensa-es. Filmvamos aleatoriamente a relao entre luz esombra, inventvamos lugares para a cmera estar natentativa de produzir imagens inusitadas, tentvamosobservar o que de novo o bairro deles poderia oferecer.

    Aos poucos abramos nossos desejos de ima-gem para nos conectar com novas experimentaes.Uma delas veio de encontro com a poesia de Manoel deBarros, ali enxergamos a possibilidade de criar estra-nhamentos que animavam, apostamos em descontinui-dades, em trazer os delrios que o poeta realiza nas pa-lavras para as imagens, entendamos existir ali potentescontatos com geograas menores.

    Sei que fazer o inconexo aclara as loucuras.Sou formado em desencontros.A sensatez me absurda.Os delrios verbais me terapeutam.

    (BARROS, 2010, Livro sobre o nada).

    POESIA INTERCESSORA: ECOS MANUE-LESCOS

    O essencial so os intercessores. A criao so os interces-sores. Sem eles no h obra. Podem ser pessoas para umlsofo, artistas ou cientistas mas tambm coisas, palavras,at animais, como em Castaeda. Fictcios ou reais, animados

    ou inanimados, preciso fabricar seus prprios intercessores. uma srie. Se no formamos uma srie, mesmo que com -pletamente imaginria, estamos perdidos. Eu preciso de meusintercessores para me exprimir, e eles jamais se exprimiriamsem mim: sempre se trabalha em vrios, mesmo quando isso

    no se v. E mais ainda quando visvel: Flix Guatarri e eusomos intercessores um do outro. (DELEUZE, 2008, p. 156).

    Experimentvamos incorporar foras do lugar,

    tentando livrar nossas imagens da condio da explica-o, informao, comunicao. Tentativas de lmar tre-chos da poesia manoelesca em caminhadas pelo bairrose mostraram potentes, tanto para pensarmos um bair-ro, como a linguagem que o produzia. Poesia no pracompreender, poesia pra incorporar (BARROS, 2008),

    absorvemos a poesia com a sensao de que ela desor-ganiza os corpos: o corpo da imagem, o corpo de quemlma, o corpo do bairro, e nos deixa com a possibilidadede propor outras organizaes, se sugerir via vdeo outras existncias para o espao e para a imagem. Nossa intenso no era criar poesia, mas, infec-tar-se dela, para, com/atravs das imagens, produzirintervenes no real, fabular (BOGUE, 2011). Naquelereal passvel de ser capturado pelas lentes da cme-ra, de um olho que governado pelas tcnicas da Pers-

    pectiva, que enxerga um mundo atravs da percepoprimeira da imagem gurativa, de um modo pronto depensar, que se sobressai como verdade e reserva para ainveno/fabulao o territrio da iluso, do delrio, daesquizofrenia, do devaneio, ou mesmo do sonho, da po-esia. Algo que j se instalou em nossa educao visuale que se perpetua a cada instante, obstruindo mas ao

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    mesmo tempo possibilitando o desvio do institudo emdirees ainda por fazer-se. Usamos a poesia de Manoelde Barros para nos contaminar de incompletude, mirarum espao como quem no compreende ao certo o que

    se passa.

    Conversamos sobre as foras que atravessam os corpos e doexistncia aos seres. Entendemos que as regras regulam nos-sos corpos, regulam os atravessamentos. Em uma de nossasconversas explorvamos o territrio do certo e do errado. Da-quilo que podamos ou no efetivar naquele espao que secriava a partir de nosso encontro (ocina), algumas conversasexpunham o ambiente educacional escolar. Ex: (Pesquisador)se estamos sentados na escola podemos dormir?(Eles) Talvez.(Educadora social)No concordo! Ns temos que cumprir al-

    gumas regras, todo jogo, por exemplo, tem regras. Todo jogotem um objetivo. No futebol chutamos a bola no gol. (Pesqui-sador)Todo jogo tem regras? Todo jogo tem objetivo?(Eles)Sim. (Pesquisador)Ento o que seria um jogo sem regras esem objetivo? (jovem)Poesia. (25/11/2012, dirio do pesqui-sador).

    Concebamos a entrada em algumas de suas po-esias, sobretudo aquelas que aparecem no lme bio-graa do poeta S dez por cento mentira, e, tam-bm, aquelas escritas nos livros Ensaios fotogrcos

    e Gramtica expositiva do cho(BARROS, 2010)4

    . Ex-perimentvamos outras graas do espao, outras geo--graas, na aproximao entre a linguagem do vdeoe a linguagem da poesia escrita. Uma questo nos es-timulava: Em qual universo de criao embarcvamosquando nos dispnhamos relao entre a linguagensdistintas?

    Buscamos em As extremidades do Vdeo, deChristine Mello (2008), alguns entendimentos acercado vdeo como obra de arte numa cultura da multipli-cidade. A autora nos aponta alguns procedimentos que

    marcam a arte contempornea reetida na relao coma obra audiovisual, como um campo criativo que se dna convergncia de diversas linguagens (videodana,videoclipe, videoteatro, videopoesia, videoperforman-ce, videoinstalao, etc.). Emergem desse campo al-guns adjetivos que qualicam a obra em vdeo como:hbrido, interligao miditica, interface, rede deconexes, dialgico, transitivo. O vdeo, portanto, apartir da relao com outras formas de arte, se dobrasobre a prpria linguagem audiovisual, gerando outras

    conexes expressivas, atualizando outros agenciamen-tos em torno da imagem, dando possibilidade a relaesque at ento no eram possveis mas que ganham for-a no universo de novidade miditica.

    A noo de extremidades utilizada como atitude de olharpara as bordas, observar as zonas-limites, as pontas extre-

    mas, descentralizadas do cerne da linguagem videogrca e

    interconectadas em variadas prticas. (MELLO, 2008, p. 31).

    E o que se cria nestas extremidades? Fragilida-des. Pequenas frestas por onde escorrem possibilida-des. Nossas rasuras na linguagem so pequenas, comoque arranhes. A potncia da aproximao entre a po-esia das inutilidades e a gramtica do vdeo se colocapara ns como uma interface (fronteira compartilhada).

    4Ambos os livros encontram-se publicados em um mesmo volume.

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    Afetaes da poesia escrita na linguagem do vdeo evice-versa. Avizinhaes criadoras de zonas indiscern-veis que podem funcionar como mquinas de guerras5

    , efetuando cortes em um modo j habitual de ver/fa-

    zer, que forcem novos funcionamentos. Linhas de fugaagem sobre linhas duras, inventam um modo de dizerestrangeiro prpria lngua-linguagem, forando o queela j diz a ser dito de outra maneira, portanto, dizeroutra coisa, sem que o j dito seja desdito. O vdeo nodeixa de ser vdeo, a palavra no deixa de ser palavra,mas ambos se pervertem em um devir vdeo-palavra.A contaminao extravasa as possibilidades da obra, aexpande na medida mesma que faz as linguagens alar-garem-se a si mesmas. Filmar, aqui, aproxima-se do

    ato de escrever apontado por Gilles Deleuze: Escrever um caso de devir, sempre inacabado, sempre em viade fazer-se, e que extravasa qualquer matria vivvel ouvivida. um processo, ou seja, uma passagem da vidaque atravessa o vivvel e o vivido. (DELEUZE, 1997, p.11).

    A introduo da poesia de Manoel de Barros abre o corpodos participantes lentamente para as foras do lugar. As ex-

    perincias com os vdeos produzidos abrem, tambm, o corpo

    do pesquisador, sugerindo outros percursos no programados.O pesquisador no deve lutar para manter o cronograma dasatividades, ao contrrio, tem que estar disposio do acasomais do que todos os envolvidos, ele deve se permitir ao im -

    previsto (30/11/2012, dirio do pesquisador).

    A aposta em contaminaes criativas da relaoentre a gramtica do vdeo e a linguagem da poesia

    reverberou para ns em algumas imagens. Elas suge-remgeograas menores na medida em que fabulam umlugar outro, sem que a imagem necessariamente te-nha que explica-lo ou representa-lo. Lugar existente na/

    pela/atravs da imagem e, tambm, da escrita de umpesquisador acerca delas, sobretudo, acerca das rever-beraes de um espao intensivo que agenciam olharessingularizados na relao com a obra. Rastro de um es-pao que existe na conexo do olho com tudo aquilo quese atualiza em imagem. Um espao/vdeo conversandocom aquilo que nos mobiliza as geograas e as ima -gens e que, portanto, surgem para ns como o pr-prio bairro, sem necessariamente que a palavra bairroesgote todas as possibilidades de pensar com o lugar,

    mas que funcione para ns como mais uma camada doespao agenciada pelas imagens, pelos gestos de umacmera que busca a todo o momento tocar o real semquerer aprisiona-lo.

    Ao invs de contarmos a histria do bairro, dei-xemos que as imagens criem para leitor dilogos sens-veis. Nossa aposta que estes surjam como fendas poronde outros espaos possam passar e chegar, abertos,cada vez mais distintos, por vezes movedios. nossaaposta tambm que possamos pensar com o conceito

    de minoridade em suas trs principais dimenses: a)

    5A mquina de guerra efetua um corte no aparelho de Estado, ela a potncia de desarticulao do estabelecido em vista do novo, oerrante que rompe com a estrutura. A mquina de guerra, em seufuncionamento, uma forma de exterioridade a forma Estado, ondeh a potncia de variao, de multiplicidade, formas menores de aoque escapam ao consolidado (maior), ao habitual, ao interno, ao or-denado, a regra.

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    coeciente de desterritorializao; b) totalidade polti-ca; c) enunciao coletiva ; para tanto se faz neces-srio mirarmos as imagens no dilogo com Delleuze eGuatarri (1977) e com Oliveira Jr. (2009). Convidamos

    ento os leitores s geograas menores em vdeo6.

    TRANSFAZENDO EM IMAGENS

    Uma literatura menor no pertence a uma lngua menor, mas,antes, lngua que uma minoria constri numa lngua maior.

    Gilles Delleuze e Flix Guattari

    O exerccio foi o de convocar os jovens para buscartransformar em imagem aquelas poesias presentes no

    lme sobre Manoel de Barros. Ao escolherem uma de-las, saam pelas ruas do bairro, com a cmera na mo,em busca de lidar com elementos do espao e a poticados desobjetos.

    A imagem que inicia a sequncia dos exerccios a de um carro velho e abandonado, que ganhou deseu produtor o ttulo de coisa de ser intil 1. Obser-vamos o enquadramento habitual (o carro centralizado)como uma forma de mostrar ao espectador o objeto.Nele, o ndice de representao dado pelas qualidades

    de degradao do carro, como algo que aproximaria ottulo imagem. O que se v, porm, comporta outras conexes,por exemplo, a placa de propaganda poltica que apa-rece no segundo plano, parcialmente enquadrada, su-ciente para conseguirmos identicar um nome e umnmero, que provavelmente seja o de algum candidato

    6Como sugesto para a sequncia de escritos, indicamos o vdeo que

    embala este texto e que parte de nossas experimentaes: http://

    www.youtube.com/watch?v=wo_NiKztDfw acessado em 08/09/2013.

    Figura 1: Coisa de ser intil 1

    poltico do bairro. Nesta conexo, o ttulo antes co-

    lado ao objeto carro - transborda o enquadramento,arremessando o olhar do espectador para pensar umespao poltico agenciado pela/na imagem. A coisa deser intil 1 conecta-se com outros elementos: candi-dato intil; poltica intil; descaso pblico; poltica ha-bitacional.

    A imagem fala de uma temtica cara ao bairro -a relao entre os representantes da populao e suasprticas polticas acerca das demandas daquele lugar-, de certa forma at habitual nas falas dos lderes lo-

    cais, divulgada pela mdia de massa, rearmada em umolhar clich do espao periferia identicado pela faltacomo signo/marca.

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    At que esta imagem processe algum sentido, osuxos de sentido esto soltos em um espao liso, e po-dem ou no atualizar um questionamento poltico acer-ca do bairro, ou se dar para outras conexes. Em nossa

    leitura, porm, atualizou-se dessa maneira. Poderiamser outras, se segussemos as pistas dada pelo interlo-cutor no incio do vdeo, ento pensaramos por entre osesconderijos, que fazem de um carro velho algo de toanimado que assume para si a condio de mundo, um castelo animado7 de arquitetura mutante, assim comoum bairro que transgura-se em meio ao uxo de pes-soas que ali chegam e dali se vo.

    Assumimos esta imagem como expresso de umpensamento espacial que se processou na multiconexo

    daquilo que j um clich a imagem como expressopoltica dos problemas da periferia e daquilo que o extra-pola, ao inaugurar um jeito de trazer uma questo cara aobairro, porm, escapando dos modos habituais de se faz--lo. Observar esta imagem como viajar nela por entreos trajetos visuais que dela emergem, no visvel e no invi-svel, conguraes espaciais que escapam do enquadra-mento para alcanar, em/no vdeo, outras composies.

    Uma das caractersticas para pensarmos o con-ceito de minoridade seu coeciente de desterritoriali-

    zao.Entendemos que Kafka ... faz da literatura algode impossvel; Impossibilidade de no escrever; impos-sibilidade de escrever em Alemo, impossibilidade deescrever de outra maneira. (DELEUZE; GUATTARI, p.38). A fala do garoto no comeo do vdeo emblem-tica neste sentido: difcil lmar o intil, por que tudoque voc olhar a sua volta pode ter alguma utilidade. A 7Em meno ao filme de Hayao Miyazaki O Castelo Animado (2004).

    diculdade de lmar o intil a fora que gesta pen-samentos em torno da experimentao com cmera. Oextensivo do espao devm intensidades fabuladorasde outros possveis modos sensveis - de relao com

    o bairro. O vdeo como um dispositivo para outras cone-xes com o espao, nestas outras geograas menores que se criam.

    Se concluirmos que o lugar no um dado em si, mas produtodas tenses e das disputas entre as muitas prticas e narrati-vas que se dobram sobre ele, concluiremos tambm que, nosdias que correm, conhecer o espao tambm pensar sobrecomo ele inventado diariamente diante de ns pelas cme-ras fotogrcas e pelas narrativas da tev, e sobre como ele criado em nossas prprias prticas educativas, onde apare-

    cem muitos mapas, fotograas, lmes, pinturas e outras tan-tas imagens. (OLIVEIRA JR., 2009, p.23)

    Figura 2:Prego que farfalha

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    O que nos diz o verbo farfalhar? Primeiro movi-mento: buscar em um dicionrio online os signicadosda palavra para apresentar ao leitor; segundo movimen-to: desistir desta tarefa e contentar-se com a imagem.

    Nela o movimento dado pelo zoom da cmera associadoao verbo farfalhar funcionou como intercessor para aescrita a seguir.

    Dois pregos tortos, ao fundo um muro laranjade concreto, e uma espcie de cerca que divide os pla-nos. Interessante notar que esta ltima parece intil,enquanto cercamento, pois j est bem destruda. Oarame que um dia serviu para delimitar um territrio,agora, j retorcido e enferrujado, parece estar ali ser-vindo de linha de conexo entre troncos de rvores. A

    cerca velha como fronteira para os planos na imagem.Os pregos no cho sugerem terem vindos de l, da cer-ca, como se tivessem escapados da trama metlica queum dia os envolveu, e, agora livres, dispersos, esperampela possibilidade de farfalharem.

    A tentativa do cinegrasta em dar um zoom nospregos cria duas situaes: a primeira faz fugir do qua-dro cerca e pregos; a segunda desfoca completamentea imagem, e, dado que uma vem em virtude da outra,tem-se a uma proposta de fazer com que o verbo fun-

    cione como deslocador do visvel ao dar o zoom paraoutro visvel, no pouco visvel a imagem desfocada.Quando ele percebe o que fez, procura recuar o zoome tornar novamente visvel a imagem dos pregos, mas,seu ato j farfalhou a imagem.

    O que tem de curioso nesta imagem frente sdemais? O movimento do zoom experimentado pelo ci-

    negrasta, e a relao foco desfoco - nenhuma outraexperimenta este recurso. Mas neste caso, mais inte-ressante ainda, o fato desse movimento estar asso-ciado ao verbo advindo da poesia. Deslocamento do uso

    verbal dando a palavra outras qualidades -, e do re-curso da cmera permitindo que o zoom estabeleaoutra relao de sentidos, que no a usualmente utili-zada pelo cinema com a nalidade de mostrar detalhes,ou exprimir uma sensao -, tambm do espao criadopela/na imagem espao (extensivo) que se processouna representatividade dos objetos na cena (pregos, cer-ca, arames, arvores, muro, etc.), mas, tambm em algoque, ao escapar do visvel, lanado na frao de umsegundo a existir (aberto) no desfocamento. O que vem

    da? Assumimos que o desfocar da imagem uma ex-perimentao interessante para criar desvios num modohabitual de produzir imagens. Ali, onde os contornosno so claros nem as formas perceptveis, h imagens.Sua fora a de turvar o ntido, produzir a variao dossentidos.

    A qualidade potica do desobjeto prego que far-falha criado por Manoel de Barros entra em tenso coma busca representacional de quem lma. O farfalhar

    um verbo que no se conecta com prego em um primei -ro momento. nessa impossibilidade que se provocamexperimentaes na linguagem do vdeo, de modo abuscar algum modo de representa-lo, mas, este con-tinua a escapar, deixando uma marca de sua tentativa(o movimento de cmera, a produo do desfoque). Acada nova experimentao os pregos que farfalharam

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    vo multiplicando possibilidades, justamente porqueno so apreendidos numa forma representacional queos estriaria ali. A impossibilidade de colar um sentido spalavras do poeta foi identicada por ns como potncia

    de variao nos modos de ver/produzir imagens parapensar/sentir os espaos, algo que aos poucos foi con-gurando um estilo/aposta em nossas produes poracreditar que h nesta relao algumas conexes perti-nentes para esta pesquisa. Entre um espao que se estabiliza em uma ima-gem do pensamento e aquele que se multiplica em fusocontnua h linhas de fuga, que gestam variaes da-quilo que se atualiza, esgarando-o em outros possveissentidos. Algo que acontece quando pensamos: e se ex-

    perimentssemos de outra maneira, ao se imaginar quea cmera pudesse trabalhar em outro sentido, com ou-tros ltros, outra luz, outros pregos? H a, tambm, aproduo de algum sentido em relao imagem e suaproduo espacial? Entendemos as experimentaesque no se realizaram como a possibilidade de funcio-narem como uma linha de fuga tambm. Enquanto algoest em fuga ele capaz de produzir conexes outrasem sua deriva, a que h maior possibilidade de va-riao de sentido. A escrita que por ora (des)conforma

    alguns sentidos ao leitor tambm parte desta experi-mentao, e continuar a ser para alm destas linhas,tambm nos escritos que no se realizaram, mas, quede alguma forma invisveis permanecem diludos porentreo texto. Na minoridade tudo poltico. A questo indi-vidual, ampliada ao microscpio, torna-se muito mais

    necessria, indispensvel, porque uma outra histria seagita no seu interior. (DELEUZE; GUATTARI, 1977, p.39). Esta armao evidencia o fato de sermos mobili-zadas pelas conexes que nos afetam, mediante os pro-

    blemas que nos mobilizam. A minoridade surge comouma resposta, uma necessidade. A minoridade umafora de desarticulao, ela incide como rasura naquiloque j se vinculou e nosso pensamento, ela uma friacontra o comedido.

    As geograas menores so totalmente polticas:poltica de inveno, poltica de dar s imagens outrosusos, poltica de lidar com o espao em outras conexes(criao, fabulao, sensao, desarticulao), elas soapostas na criao de (re)existncias, de outros poss-

    veis modos de (geo)graas, ela mesma uma polticada experimentao.

    Aquilo em que tocam estas experimentaes cria fraturas noque era antes, sem contudo negar o anterior, mas forando-oa ser pensado e vivido de outra maneira, fazendo com que ostemas, assuntos, lugares mobilizados nestas experimentaessejam forados a serem outros desde dentro deles prprios,promovendo outras experincias deles/neles mesmos. (OLI-VEIRA JR., 2013, p. 307).

    O plonge produz o foco sobre o objeto duascaixas de papelo acavaladas posicionando o especta-dor acima da cena. A sensao que se cria a de segre-do, ao mirar o olhar do espectador a buscar de cimada cena espiar o que pode estar dentro das caixas. Avista de cima sugere que olhemos para dentro, comoum convite a descobrirmos o que elas guardam: que

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    tipo de sonhos so acumulados nesta imagem? O obje-to est enquadrado e a cmera est parada, nada maisbvio para uma imagem que quer mostrar algo. Mas odetalhe, perceba, a posio de mergulho, ali existeuma proposta, uma experimentao singular que gestasentidos misteriosos acerca dos sonhos que dali poderoemergir. Quais sentidos, portanto, despertam em ns ossonhos singularizados na/pela imagem que possam nosdizer um pouco mais acerca da juventude e do bairro?

    Dentro das caixas h uma embalagem plstica,seria ela a representao daquilo que embala o ttuloda imagem? O plstico lembra industrializao, consu-mo, mercadoria, poluente, utenslio, lixo, embalagem,propaganda. Seriam estes os adjetivos capazes de darconta de dizer dos sonhos? No se pode armar.

    Para esta imagem em que sonho se liga a se-gredo, dado a escolha do ngulo perguntas cabem

    mais do que respostas, e nelas, aquilo que, de manei -ra frgil, nos permite alguns percursos pelo espao dobairro, ganha fora na prpria inconsistncia. Talvezseja esta a fora mais contundente nesta imagem, ao

    colocar para ns quando miramos a juventude umajuventude em devir, smbolo de uma metamorfose uma boa questo: quais condies ns temos de enxer-gar do alto, por querer desvelar, os sonhos dos jovens?A imagem parece querer nos desaar quando no nosrevela -, a ns e a educao educao dos sabereshierrquicos em que o professor habitualmente aqueleque est acima de seus alunos. Anal quem somos nspara queremos ao pensarmos polticas pblicas e(m)aes educativas diversas lidar com os sonhos dos

    jovens? A enunciao sempre coletiva em uma minori-dade.

    (...) o que o escritor diz sozinho j constitui uma ao comum,e o que ele diz ou faz, mesmo se os outros no esto, de acor-do, necessariamente poltico. O campo poltico contaminou oenunciado. (DELEUZE; GUATARRI, 1977, p. 40).

    Somos parte de um rizoma sem medidas. Nos-sas aes reverberam conexes, e estas, por sua vez,j vem desdobradas de outros agenciamentos. A cadanova conexo todo o conjunto atual de relaes al-terado, outras pontas se abrem ao porvir, devires atodo momento proliferam a Vida,mquinas de guerragestando cortes no estabelecido, desterritorializandopensamentos sedentarizados e acrescentando diferen-

    Figura 3: O acumulador de sonhos

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    ciaes produtoras de nomadismos. Somos uma redeatravessada a todo instante, recongurada a cada atua-lizao. Em todo caso, (...) os trajetos fazem uma rede,e essa rede no tem outro objetivo do que apreender

    as ocasies que o acaso oferece (...) (PELBART, 2013,0.262). No h sujeito, s h agenciamentos coletivosde enunciao (DELEUZE; GUATTARI, 1977), e, o vdeoexprime esses agenciamentos na medida em que nopode ser considerado externo ao conjunto de foras quedele/nele pulsam fora potica, fora nmade, foramenor -, ao contrrio, so eles, os vdeos, tambm rizo-mas, conexes desmedidas com povos porvir, potnciasde desterritorializao da/na linguagem em que a dife-rena se repete por violentos desajustes, que fazem o

    pensamento navegar a deriva sobre um espao liso queo desarticula sempre que se estabelece em um espaoestriado.

    Todas essas derivas buscam apontar devires possveis ao pen-samento geogrco a partir da potncia que a mirada sobre asimagens traz at ele, atravessando-o com novas possibilidadesde criao; com um punhado de geograas menores que bro-

    tam das colises, dos embates e das aproximaes entre osestudos que apontam a forte presena de uma educao pelasimagens nos dias atuais e os pensamentos acerca do espao

    geogrco que surgem dela. (OLIVEIRA JR, 2009, p.27).

    (DES)CONCLUSO

    Havia no lugar um escorrer azul de guasobre as pedras do crrego.(Um escorrimento lrico).

    Andava por l um homem que fora desdecriana comprometido pra lata.

    Manoel de Barros

    Em que medida as imagens apresentadas suge-rem um pensamento espacial que possa ser entendi-do como ilhas no entorno do continente da geograamaior (OLIVEIRA JR., 2009, p.19)? Certamente na pro-poro em que no sustente, por vontade, os sentidos.Que estejam frgeis o suciente para rachar, trincar, deonde possa saltar a potncia de produo do espao,muito mais do que somente sua representao. Sentidoscom disposio de justaposio com outros, de grudarem outros entendimentos podendo adquirir qualidade

    de multiplicidade. Potncia de fabulao, de inveno,de criao de outros possveis modos de se pensar, acessando outras camadas do espao, ao toma-lo comoaberto, contnuo, em devir. Tambm de outra relaocom a imagem, assumindo-a como linguagem, de ges-to no mundo, que diz do real como mais um possvelmodo de dizer/cria-lo, de expresso mais do que s in-formao, comunicao, explicao. Como fora de in-terconexo com outras linguagens em um processo decontaminao mtua, que toca em outras verses es-

    paciais nas/com/pelas imagens. Imagem infectada pelapoesia dos desobjetos, entre conexes comum espaomenor, que se efetiva nos encontros da cmera com omundo, e, tambm, dos traos singulares de jovens quese encontram com o olhar do pesquisador.

    Assim que entendemos as geograas-meno-res em vdeo, (geo)graas que gestam outros possveis

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    modos de existir, arrastando linguagens e pensamentosa serem outros, que criam extremidades, que se abremem rizomas,onde a produo do realmente novo acon-tece na diferenciao do j posto de dentro da geogra-

    a maior,e da imagem como prova do real -, repetindo--se em potncia de diferenciar-se ainda mais, semprecontnuo, uma metamorfose em fuso. Nossa poltica da experimentao. Tomamosos vdeos aqui apresentados como obras que adensammuitos dos percursos gestados em nossa pesquisa. Es-peramos que eles no sejam encarados como uma es-pcie de sntese daquilo que viemos fazendo em nossasocinas, ou menos ainda, como representaes de umbairro da periferia da cidade de Campinas SP. Mas

    que possam convidar o leitor a fabulao, a criar traosdelirantes, que possam dizer de um lugar e de umapes-quisa sem esgot-la, bem como gerar silncios, (des)entendimentos, antes, sensaes.

    l f d

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