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O ARTESÃO DO SERTÃO As curvas da madeira dão o tom da arte de Véio Alagamar As riquezas da comunidade que vive do Ouricuri no interior de Sergipe Diversão que não sai de moda Pião, Mané Gostoso e bonecas de pano continuam encantando gerações Entrevista Amorosa fala sobre seu trabalho na música e na gestão cultural REVISTA LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO - UFS ANO 2 Nº 01

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O ARTESÃO DO SERTÃOAs curvas da madeira dão o tom da arte de Véio

AlagamarAs riquezas da comunidade que vive do Ouricuri no interior de Sergipe

Diversão que não sai de modaPião, Mané Gostoso e bonecas de pano continuam encantando gerações

EntrevistaAmorosa fala sobre seu trabalho na música e na gestão cultural

REVISTA LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO - UFS

ANO 2 Nº 01

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Mais! Essa é a palavra-chave que orienta os traba-lhos do novo produto laboratorial do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Sergipe. A revista Mais Contexto surge com a proposta de complementar as ferramentas informativas desenvolvidas no Departamento de Comunicação Social (DCOS). Além do Contexto impresso e do Contexto Online, os estudantes passam a ter uma nova oportunidade para exercitar co-nhecimentos teóricos e técnicos com o jornalismo de re-vista. Nossa propósito é valorizar temas que fazem parte do dia dia, mas que não estão nas pautas das outras mí-dias. Um olhar diferenciado sobre fatos, comportamento e personagens que revelam a pluralidade cultural do ser-gipano. As obras do seu Cícero Alves dos Santos, mais co-nhecido como Véio do sertão, estampam nossa primeira capa. Um sujeito simples, que usa a madeira como maté-ria-prima das obras que compõem o próprio museu. E tem muito mais! Só que folheando a revista, você nunca vai sair da letra C: comunidade, comunicação, cultura, com-portamento, caçarola, convida, clique e cotidiano. Os ‘‘C” da revista Mais Contexto pretendem revelar novas pers-pectivas do ponto de vista da informação.

Espero que a leitura seja prazerosa!

E UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

UFS

Reitor: Angelo Roberto Antoniolli Vice-Reitor: André Maurício Conceição de SouzaPró-Reitor de Graduação: Jonatas Silva Meneses

DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

Chefe do Departamento: Maria Beatriz Colucci

EXPEDIENTE

Editor e Orientador: Vitor Belém

Equipe de Reportagem:Adson Santana, Alana Karolina, Camila Ra-mos, Cristiane Santos, Gabriela de la Vega, Igor Bacelar, Jéssica Feitosa, Keizer Santos, Leando Calado, Leila Almeida, Leonardo Vas-concelos, Letícia Santos, Luciana Nascimento, Maria Beatriz Campos, Marília Santos, Regiane Sá, Roseli Silva, Samara Pedral, Silas Brito e Taiene Santos

Equipe de Diagramação:Ana Medeiros, Érika Rodrigues, Francielle Couto, Luzia Nunes e Ruhan Victor Oliveira

Fotografias:Luciana Nascimento, Regiane Sá, Maria Bea-triz Campos e Leila Almeida

Capa:Érika Rodrigues

Revisão do projeto gráfico e da diagra-mação: Vitor BragaProdução: Alunos do 6º período do curso de Comunicação Social - Hab. Jornalismo da Uni-versidade Federal de Sergipe.

Equipe MAIS CONTEXTO

EDITORIAL

FALE CONOSCO

Envie sua sugestão de pauta ou comente sobre as matérias já publicadas através do nosso e-mail ([email protected]).

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Sergipe: rio de sirisA nomenclatura deixada pelos índios que aqui habitavam perdura até hoje. Mas é só de crustáceos que é feito o sergipano? A coluna CON-VIDA desta edição separou cinco indicações que driblam o senso comum.

Música

Lançado em 2013, o Un’Nu, terceiro álbum da Maria Scombona, se destaca em um ano fervilhante na música sergipana. É cru, direto, totalmente gravado ao vivo apenas com os instrumentos tocados pelo power trio Saulo Ferreira, Rafael Júnior e Robson Macaxeira e a voz marcante destilada em poesia por Henrique Teles. Impre-scindível na playlist de todo aquele que preza pela boa música brasileira e praticantes de voyeurismo.

Turismo

Ponto de partida para os mais agradáveis passeios de cata-marã, a Orla Pôr do Sol é uma opção de lazer para toda a família. Enquanto os adultos tomam uma cerveja gelada e degustam o famoso pastel de aratu no Bar do Kid, as crian-ças comem pipoca e algodão doce feitos por moradores dopovoado Mosqueiro e brin-cam no parque infantil. O píer com visão privilegiada para o rio Vaza Barris e da ponte Jor-nalista Joel Silveira é parada obrigatória para os amantes da fotografi a e apaixonados pela natureza.

Gastronomia

Desde a década de 80 o‘Tanga Vuou’ oferece o melhor da culinária nordestina com o seu Pirão de Galinha de Ca-poeira. Localizado também no Mosqueiro, o estabelecimen-to faz parte da cultura gas-tronômica de muitas famílias sergipanas. Quem nunca riu com os avisos na parede de que “só é permitido o namoro de tubarões”, ou da gravura semi-nua da mulher que está correndo atrás de sua tanga tragada pelo vento observada por um homem que murmura “assim que é bom”, defi nitiva-mente não sabe o que é pirão!

Audiovisual

Caminhando pela Rua Barão de Maruim em Aracaju, um rapaz escuta gritos femininos pedindo socorro vindo de uma casa bem sinistra e ao resolver ajudá-la percebe que não de-veria ter bancado o herói. Esta é a premissa do curta ‘Gritos da Rua Barão’, idealizado e di-rigido pelo aracajuano Marlon Delano. O fi lme tem aproxi-madamente seis minutos e foi considerado pelo Jornal do Dia um marco no cenário audio-visual de Sergipe.

Literatura

Publicado por Cleomar Brandi em 2009, um dos últimos cronistas do jornalismo local, “OS segredos da loba” é um conjunto de textos compilados dos seus 32 anos de jor-nalismo. Infelizmente, o lendário boêmio nascido na Bahia, mas Sergipano de coração, veio a falecer em 2011 devido a um tumor cancerígeno, mas deixou o seu legado para o jornalismo.

Por Leandro Calado e Igor BarcelarFotos Reprodução

ÍNDICE

08 Coti dianoA discriminação nas cadeiras

da universidade

04 ConversandoAntônia Amorosa

12 ComunidadeA arte que sustenta um lugar

16 ComunicaçãoGeração smartphone

20 Clique Véio: o artesão do sertão

24 CaçarolaO cuscuz nosso de cada dia

10 Conhecimento Rio Poxim: problemas causados

pela poluição

18 ComportamentoA magia do ontem

03 Convida

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Amorosa: símbolo da musicalidade sergipana

Por Adson Santana e Gabriela de la Vega Foto Aquivo Pessoal

A itabaianense Antônia Amorosa construiu sua carreira artística, como ela mesma diz, de baixo para cima, lutando para chegar onde está hoje. Atualmente, a cantora, autora, jornalista e gestora é Diretora de Arte e Cultura da Secretaria Especial de Cultura (Fun-caju) em Aracaju, escreve semanalmente pelo Correio de Sergipe, aos sábados, na coluna Poucas e Boas e possui mais de 400 artigos publicados nos principais jornais de Sergipe. Sua extensa carreira musical, com 10 coletâneas, 1 LP duplo e 5 Cd’s gravados, rendeu-lhe diversos prêmios, como o de melhor intérprete do Festival Canta Nordeste, 1993, pela Rede Globo/Nordeste e melhor intérprete do Brasil na Festa da Música Brasileira, em 2001, no Rio de Janeiro. Além disso, atuou musicalmente em quase todos os estados brasileiros, participou de eventos internacionais e fez turnê pela Alemanha, Áustria e Estados Unidios. Nessa entrevista, ela conta um pouco mais sobre a sua carreira e as dificuldades enfren-tadas como diretora da Funcaju.

Contexto: Quais foram os desafios que você enfrentou na sua carreira artística?

Amorosa: Segui o trajeto da minha carreira obe-decendo a um critério fun-damental de crescimento artístico - conquistando público. Há uma frase que diz que “o artista tem que ir aonde o povo está.” Na dé-cada de 80, período em que comecei, eles estavam nas casas noturnas de Aracaju. Durante anos ganhei dois salários mínimos por mês para cantar quatro vezes por semana, durante qua-tro horas seguidas e con-solidar meu nome com o talento que Deus me conce-deu. Nos dias de hoje, mui-

tos artistas querem ganhar dez mil reais de cachê, sem dar os primeiros passos de crescimento que é pagar o preço pela conquista do que cobra. Não se ganha espaço com grito, só com talento. À medida que meu nome se espalhou, alcancei diversos prêmios. Cheguei ao lugar em que estou hoje pelo meu talento.

Em 2013, você partici-pou do Brazilian Day, em Nova York, um evento que tem o objetivo de divulgar a cultura brasileira em outros países. Qual foi o significa-do de participar desse um evento como representante da cultura nordestina?Recebi o convite do meu

parceiro de composição e amigo pessoal, Del Feliz. Quando me deparei com a receptividade do meu tra-balho em Nova York pude me convencer que Deus me concedeu talento para ir a qualquer lugar do mundo. A única coisa que me entris-teceu foi o fato de ter sido levada pelos baianos, e não por minha terra.

Como você visualiza o cenário cultural em Araca-ju?

Temos muito para mostrar, recursos insuficientes para investir, muito trabalho para iniciar, muitos vícios para destruir, muita gente

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nova para mostrar, muita gente antiga, mas excelente para investir, muita cam-panha para injetar, muito bloqueio para intervir, mui-tos poetas para a-clamar, muitas vozes para se ouvir, muitos corpos para dançar, muitas mãos para pintar, patrimônios para preservar, danças populares para “re-existir”, preconceitos para quebrar, um novo tempo para fluir. Não perco a es-perança. Por isso, só por isso, permaneço aqui.

Você acredita que os artis-tas sergipanos têm as mes-mas oportunidades que ar-tistas dos outros locais?

Naturalmente, não. Mas, precisamos iniciar ou reini-ciar quantas vezes for pre-ciso até que consigamos despontar um nome, seja em que setor for. O grande problema desta frase “artis-ta sergipano” é que alguns se apresentam como tal, mas não têm talento, nem história, nem cacife para se intitular como artista. Nesta seleção ainda existe muita mistura, muitos equívocos. Enquanto o próprio artista não amadurecer sobre sua obra, ela não caminhará na dimensão devida. E con-struir uma carreira apenas em Sergipe não é suficiente para ser nome nacional. Sei do que falo e por quê.

Quais as dificuldades que os artistas sergipanos en-frentam para chegar ao sucesso?Produção e mídia. Talento e criatividade. Temos mui-tos produtos. Porém, nem

todos com real capacidade de se tornar nome nacio-nal. Isto é fato. Reproduz-ir algo que já existe não é novidade. Novidade é criar algo novo, ser diferente, ser algo que não tem pare-cido em lugar nenhum. Ou fazer parte de um movi-mento musical ou artístico onde um artista leva o ou-tro. É este o segredo. Sem esquecer do investimento financeiro, o mais cruel, e não menos importante. Quais estão sendo suas iniciativas como cantora e gestora em prol de uma difusão e solidificação da

cultura sergipana dentro e fora do estado?

Como cantora, já levei di-versos artistas sergipanos à Bahia, na terra de Dona Canô para cantar para um público diferenciado. Já lev-ei para o carnaval em Sal-vador para cantar comigo no circuito Barra Ondina; já indiquei nomes para cantar fora daqui. Como gestora, disponho de mais de 32 projetos de minha autoria que beneficia as áreas de música, teatro, dança, au-diovisual, artes plásticas, literatura, patrimônio, fol-clore e resgate da história indígena e negra em Ara-

caju, que espero em Deus e nos homens de boa vonta-de, realizá-los. Não cito os detalhes porque já fui “rou-bada” em diversas ideias de nossa autoria. Fiquei es-perta!

Quais os desafios enfren-tados na sua carreira como gestora?

O poder é um polvo com vários tentáculos. Assum-ir um cargo não garante que todos os seus projetos serão realizados. Mas acei-tar o desafio em tentar faz-er é o grande motivador. A primeira dificuldade é con-vencer sobre a importân-cia da inovação, seguida das limitações financeiras, ausência de apoios exter-nos consistentes em torno do que você acredita. Sou uma defensora do produ-to local em todas as suas vertentes, por não acredi-tar em crescimento cultural que não comece a partir da sua aldeia. Somente no ano de 2013, a Funcaju pres-tigiou mais de 300 artistas sergipanos. Houve uma di-minuição na contratação exagerada de artistas na-cionais e um fortalecimento do produto local, mesmo desagradando os que estão midiaticamente viciados em produtos culturais exter-nos. A demanda é maior do que o órgão suporta porque a-tualmente ele tem sido o único organismo cultural que tem absorvido a ausên-cia de outros.

Os artistas sergipanos rec-lamam que falta espaço para eles nas festas munici-

pais, a exemplo do Manifes-to Aracaju no a-niversário da capital, em que vários artistas sergipanos se man-ifestaram contra a con-tratação de artistas de fora do Estado para cantar na festa. Depois de eventos como o Forró Caju e o Rev-eillon, que tiveram majori-tariamente sergipanos, os artistas estão mais satisfei-tos?

Se estão felizes, não sei. Se eu estivesse no lugar deles me manteria sempre na ex-pectativa de mais, porque precisamos de mais. Mas, acredito que estejam mais esperançosos. No ano pas-sado, a vitória em termos aumentado a programação do Forró Caju de 55% para 86% de artistas sergipanos foi um desafio. Fazer o mesmo em eventos igual-mente significativos como o carnaval e réveillon tam-bém. Quanto aos artistas que assinaram o manifesto, tivemos acesso aos arquiv-os dos trabalhos desen-

volvidos pelo órgão durante outras gestões, onde veri-ficamos que um círculo re-petitivo de atrações estava ocorrendo. Naturalmente, todos, na medida do pos-sível terão oportunidade. Porém, estaremos sem-pre buscando inovar e dar oportunidade a artistas que nunca tiveram e, se tiveram foi muito pouco, a chance de mostrar seu tra-balho. Temos projetos vol-tados para diversos estilos musicais. E, a cada tempo e espaço devido estaremos propondo os nomes que acreditamos serem refer-ências. No entanto, uma parte dos artistas que se manifestou jamais procu-rou oficialmente esta rep-

“O poder é um polvo

com vários

tentáculos. ”

resentante no órgão, o que dificulta a possibilidade de apresentarmos propostas que nunca foram mostra-das a uma colega em co-mum. Estou no cargo como ponte. Mas alguns poucos ainda não entenderam isso. Apresentar-se é o primeiro passo de um verdadeiro profissional. Convidei al-guns no ano passado, no primeiro semestre para que fossem até o órgão. Esta-mos em Janeiro de 2014 e até hoje não apareceram, especialmente os que lide-raram o movimento. Per-maneço à disposição para servir e ser ponte entre o poder e a classe cultural. Ouvirei todos que quiserem levar suas propostas e id-eias. Mas não tenho como forçar a irem. Isto não de-pende de mim. Orgulho não leva ninguém aos espaços. O que leva é a humildade que dignifica, o talento, as ideias e a oportunidade. E isso nada tem a ver com política. Tem a ver com visão.

Amorosa no Brazilian Day ao lado dos também músicos Adelmario Coelho e Del Feliz ( Foto arquivo pessoal)

“Não se ganha

espaço com grito,

só com talento. ”

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A realidade da discriminação na universidade

Apesar das diversas atitudes de respeito e aceitação das diferenças, a discriminação e o preconceito ainda vêm atraves-sando marcas do tempo e aden-trando onde menos podíamos es-perar: na academia. Essa atitude pode ser presenciada na Univer-sidade Federal de Sergipe (UFS), onde na inevitável heterogeneida-de dos povos, o estranho, o dife-rente e o novo, não conseguem passar despercebido pelos corre-dores, didáticas e salas de aula. Mesmo com projetos de inclusão social, desenvolvidos em alguns centros acadêmicos e trabalhados em algumas disciplinas, a realida-de da discriminação ainda pode ser encontrada na universidade, trazi-da muitas vezes de âmbitos mui-to maiores, como na sociedade.

Diante dessas concep-ções, ainda pode-se definir dife-renças, entre preconceito e dis-

criminação. O primeiro é um juízo preconcebido que se manifesta de maneira discriminatória e diz respeito a uma valoração este-reotipada e negativa atribuída a pessoas, lugares ou tradições. Já a discriminação tem um conceito muito mais amplo e dinâmico, já que os dois têm agentes diversos: a discriminação pode ser provoca-da por vários indivíduos e institui-ções, enquanto o prejulgamento é praticado apenas por uma pessoa.

No Brasil, segundo o art. 20 da lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou proce-dência nacional, pode levar a uma pena de reclusão de um a três anos, acrescido de multa. Discer-nir, ainda, por sexo, idade, estado civil, doença, orientação sexual ou aparência, também pode afe-rir como um ato discriminatório.

A realidade nas salas de aula

Mesmo na comunidade acadêmica, a discriminação ain-da continua sendo uma realida-de entre alunos. Este é o caso da estudante de letras/português/inglês, Sharliane Braz Santos. Ela comenta que já foi vítima de uma atitude discriminatória no cam-pus, mas que conseguiu superá--la com a ajuda dos amigos. “Eu mesma já senti na pele o que é a discriminação. Sou mãe e en-gravidei muito jovem. Muitos dos meus amigos que estudavam aqui na UFS se afastaram de mim. Os únicos que sobraram são real-mente aqueles que gostam de mim e não se importavam pelo fato de ter sido mãe tão jovem”.

A estudante ainda com-pleta dizendo que já presenciou outro aluno sendo alvo de hosti-

lidades dentro da sala de aula e afirma que a atitude do discrimi-nador era evidente. “Já presen-ciei atos explícitos de racismo e discriminação. Na minha turma, um rapaz negro e homossexual sofria preconceito de pelo menos 25% da turma, principalmente de mulheres brancas, católicas e de classe média alta. Muitas, sempre se incomodavam quan-do ele falava em sala de aula ou chegava mais próximo delas”.

No entanto, a estudante de engenharia agrícola, Vanderly Santos, diz não se sentir confortá-vel na presença de casais do mes-mo sexo. “Eu mesma tenho que admitir que não gosto das atitu-des dos homossexuais. Hoje em dia é uma barbaridade tão grande. Antes eles eram mais discretos, cada um em seu canto e hoje em dia eles estão expostos demais, sempre se exibindo, querendo

chamar atenção e eu não gos-to disso”, comenta a estudante.

Em entrevista, alguns es-tudantes demonstraram indiferen-ça sobre o assunto e dizem nun-ca terem sido discriminados. No entanto, todos afirmam já terem presenciado atos de discrimina-ção dentro do campus. A estudan-te de ecologia, Yane Regina conta que nunca foi discernida, mas nos corredores da universidade, já ouviu relatos de muito que sofre-ram com essa prática em relação a opção sexual. Ela confirma ain-da que já presenciou condutas de distinção entre professores com alunos cotistas de escola pública.

No corpo docente

A situação também já foi presenciada pelos docentes da universidade. A professora e mes-tranda em Ciências Sociais, Julia-

na Correia Almeida e Silva, já veri-ficou uma situação de segregação de um professor de artes, que praticou racismo com uma aluna negra. O caso foi parar no Minis-tério Público, e o professor por pouco não foi punido; foi o único caso que presenciou desde 1998.

Outro fato curioso con-tado pela professora foi de um dos seus alunos que é transexu-al e lhe enviou um e-mail antes das aulas começarem, pedindo para que ela o chamasse pelo nome que ele realmente gos-taria de ser chamado. A pro-fessora conta que ficou assus-tada, mas como a universidade autorizou a realizar tal pedido, se sentiu mais tranquila para atendê-lo. “Por ordem do depar-tamento, tive que fazer a cha-mada em sala de aula e chamá--lo pelo nome que ele escolheu e não pelo nome de batismo”.

Por Rosely Silva e Silas Brito| Foto Silas Brito

Universidade, lugar da diversidade, mas onde nem sempre as difrenças são respeitadas

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Rio Poxim: problemas causados pela poluição

Morar na beira do rio é um privilégio para poucos. Imagina então para quem gos-ta de pescar. Seu Josafá Santa-na, 48 anos, bem que gostaria de viver em um paraíso nessas condições. Embora viva nas imediações do rio Poxim, em São Cristóvão, lugar que po-deria reunir muitos atrativos, o ex-pedreiro vive uma realidade bem diferente.

No local onde mora, res-tam poucas belezas naturais e já não se pesca mais. Seu Jo-safá fi ca sentado olhando o rio que um dia tirou seu alimento. Muito poluído, o rio não oferece condições para pesca, só resta o lixo que podem ser vistos nas margens e outros utensílios do-mésticos como latinhas de re-frigerantes e cervejas, garrafas pets, resto de sofás e tantos outros, encontrados nas mar-gens e dentro do rio, objetos

que são descartados por pes-soas de outras localidades, pe-los próprios moradores e tam-bém trazidos pelas enchentes.

Desde 1958, o rio Poxim tem sido uma das principais fontes de água para Aracaju. Segundo a Companhia de Sa-neamento de Sergipe (Deso), o rio abastece cerca de 790 mil habitantes da cidade de Ara-caju. Por outro lado é também o mais poluído do Estado, de acordo com a Semarh (Secre-taria de Meio Ambiente e Re-cursos Hídricos).

O descarte direto de lixo, a contaminação por pesti-cidas, principalmente advindas de agrotóxicos, fertilizantes, herbicidas e em menor quanti-dade por afl uentes industriais, estão entre as fontes de polui-ção. Além disso, o fato de estar localizado em uma área urbana

prejudica ainda mais, devido ao despejo do esgoto doméstico.

Segundo Ailton Rocha, Superintendente de Recursos Hídricos da SEMARH (Secre-taria de Meio Ambiente e Re-cursos Hídricos) Sergipe, atual-mente todo o esgoto de Aracaju é descartado in natura nos rios. As estações de tratamento do esgoto estão em construção e só devem concluídas no fi nal de 2014. “Cerca de 4 milhões de reais, foram investidos na preservação e recuperação das nascentes, através do progra-ma ‘Preservando Nascente e Municípios’. Isso porque o rio Poxim, é um rio estratégico para abastecimento humano e quando protegemos essas áreas de recarga, estamos pro-tegendo o rio como um todo”, ressalta o superintendente.

Embora tardia, a obra

pode trazer um refl exo posi-tivo na qualidade das águas. Quem sabe até seu Josafá pos-sa voltar a pescar. Coisa que há cerca de cinco anos ele deixou de fazer. Com essas obras que visam a recuperação das nas-centes e de saneamento, talvez os moradores ribeirinhos do rio Poxim e de outros rios Sergipa-nos, voltem a ter o prazer e a alegria de alimentar seus fami-

tato com a água, assim como os pescados ou animais que são criados nas proximidades. A nascente do rio é a área mais crítica em poluição e está sen-do recuperada. Um trabalho que conta com a participação do Comitê da Bacia Hidrográfi -ca do rio Sergipe, Universidade Federal de Sergipe, Comitê da Bacia Hidrográfi ca do rio Sergi-pe e das prefeituras municipais.

Enquanto projetos e promessas ainda não se con-cretizaram, seu Josafá Santa-na acompanha a destruição do rio, esperando por dias melho-res.

Por Maria Cristiane Santos Marília Santos Taiene Rodrigues| Foto Taiene Rodrigues

liares e amigos, com os peixes retirados dos rios.A vida na beira do rio é tam-bém prejudicial. Tanto para o rio, quanto para a população. As moradias irregulares cau-sam o desmatamento de ma-tas ciliares e o aterramento de margens, além do acréscimo de esgoto e lixo sendo descar-tado de maneira irregular.

O risco para quem vive nestas áreas é justamento pela poluição das águas. Várias doenças atingem com intensidade os mora-dores ribeirinhos e pesca-dores que entram em con-

Josafá Santana, 48 anos, ex-pedreiro | Foto Marília Santos

Uma pesquisa realizada pela Adema (Adminis-tração Estadual do Meio Ambiente) apontou que o quadro de doenças entre os moradores da área vai de micoses (40%); verminoses (33,33%); di-senteria (20%) à esquistossomose (6,67%).

Importante fonte de água para a capital, o rio Poxim sofre com a poluição e o descaso do poder público

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Localizada as margens do rio Brito a aproxi-

madamente 35 km da sede do município de Pirambu, o pov-oado Alagamar é o berço do artesanato oriundo da palha do ouricuri. A planta nativa da região nordeste é utilizada pe-los moradores desde gerações antigas para a fabricação de utensílios domésticos.

A fabricação de produtos artesanais tem forte ligação com a cultura escrava. Segun-do os registros históricos, du-rante no séc. 18, Sergipe pas-sou a receber os braços fortes de escravos, vindo principal-mente de Salvador e do porto de Pernambuco e eram leva-dos à vila de Estância. Lá eram vendidos aos proprietários de terra de engenhos e de outros colonos da região. Explorados e maltratados, muitos fugiram de seus donos e se escond-erem próximos a rios e matas fechadas.

De acordo com moradores da região, o povoado Alaga-mar tem mais de 200 anos. A cor da pele e os traços físi-cos dos moradores revelam a naturalidade quilombola. A região, acidentada por morros e ladeiras, cortados por rios de águas doces que se escondem em meio à mata atlântica, foi o local ideal para a instalação de um quilombo. Os mais velhos da comunidade contam que os escravos se estabeleceram no local, para se esconderem dos seus senhores, quando fugiam das fazendas.

Atualmente toda a popu-lação é tem um forte grau de parentesco, não é por acaso que um sobrenome é predom-inante: Santos. Em Alagamar, quase todo mundo é parente. Até seu José dos Santos, um alagoano, popularmente con-

hecido por “Zé Pedreiro”, que casou com uma alagamaense, herdou o sobrenome e já mora na comunidade há mais de 20 anos. Ele atua na comunidade como pesquisador e contribuiu para o reconhecimento da co-munidade quilombola junto ao congresso em Brasília.

A matéria-prima que desenvolve um lugar

O ouricuri é uma planta nativa da região nordeste, seus frutos são comestíveis e de suas sementes pode-se extrair óleo vegetal. As fi bras das folhas são matéria-prima para a confecção de chapéus e outros objetos artesanais. A fabricação do artesanato da palha é uma atividade forte-mente marcada pelas raízes de origem negra, mas poucas pessoas da comunidade sabem de onde surgiu essa cultura artesanal. Mas a memória da artesã aposentada Cândida dos Santos ajuda a manter viva as raízes históricas. “Des-de os mais antigos é que se começou essa tradição. Isso eu prendi desde pequena com meus avós, então quando se iniciou o povoado já pode se registrar a cultura do arte-sanato. Começou pela tabúa, fazendo esteirões, chapéus e côfo”, explica Dona Cândida.

O artesanato dita as relações sociais que territorial-izam o povoado, reproduzindo o modelo de vida e refl etindo sobre o ofício do artesão. Por esta causa o ouricuri torna-se tão comum na comunidade, pois sua utilização é tão fre-quente que faz de sua utilidade a identifi cação das relações sociais que perpetuam as ger-ações.

A matéria-prima nem sempre foi acessível. A falta

Por Letícia Kichnner e Jéssica FeitozaImagens Luciana Nascimento

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A arte quesustenta um lugar

Alagamar, uma terra rica de gente simples

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O ouricuri e o fruto, matéria-prima para o artesanato

A arte sendo finalizada

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de estradas e de transportes, bem como as dificuldades para retirar a palha verde da palmeira (matas fechadas, animais peçonhentos, etc.) foram continuam sendo desa-fios para as artesãs.

O artesanato atualmente tem sua função de gerador do desen volvimento sus-tentável social do povo al-agamaense, além de ser o indicador do turismo local. Muitos produtos são ex-portados para outros Esta-dos. Não é surpresa passar pelas ruas e ver mulheres sentadas nas frentes das casas, juntamente com as filhas, a fiarem a palha seca. A arte de fiar a palha seca é tão séria para essas mulheres que sua atenção é totalmente voltada para

o vai e vem dos fios que são enrolados no desen-volver do produto. Mesmo com os dedos calejados pelo árduo ofício, as ar-tesãs produzem cada peça com delicadeza e esmero.

O perfeito aca-bamento é o que irá atrair os clientes. Enquanto fala de sua arte e da importân-cia de seu artesanato na comunidade alagamaense, dona Cândida costura rap-idamente uma bolsa, que em minutos fica pronta. “De uns anos pra cá a gen-te começou a fabricar bol-sas, passadeiras de mesa. Temos também peças que chamamos de enrolado, que é um artesanato difícil porque leva mais tempo para ficar pronto e nem

todos conseguem fazer”, enfatiza Cândida.

O espírito em-preendedor fez tanto suc-esso entre as mulheres que há até alguns homens que se ariscam a tecer os fios da palha do ouricuri pra desenvolver o ofício artístico. O senhor Claudio dos Santos, marido de Ira-nildes da Anunciação San-tos, mostra que tem certa paixão pela arte. “Esse ar-tesanato é uma coisa que ajuda para cobrir custos dentro de casa, porque a gente compra as coisas, então quando temos tem-po, nós homens ajudamos, seja na hora de buscar a palha no mato, seja quan-do tem que riscar a palha. No caso, separando o talo

do linho e quando a palha está seca a gente faz tran-ças e aí a gente ajuda.” diz satisfeito seu Claudio.

A confecção do ar-tesanato feito da palha do ouricuri é tradicional e exercida tanto por ido-sas, quanto por mulheres e crianças que podem ser vistas em grupos durante o dia a fazer tranças de palha. Mesmo durante a noite, o trabalho não para. Embora existam os-cilações nas vendas do ar-tesanato, além do trabalho cansativo, a prática dessa arte em Alagamar nutre a identidade do povo, forta-lecendo seu pertencimento a este lugar. Além de ser considerada a atividade econômica, considerada também uma ocupação que distrai e afasta a falta de dinamismo.

As artesãs que já são aposentados veem esse ofício como uma saída para combater o desânimo que os assola, pois estan-do eles juntos, tudo fica mais fácil. É o que conta a professora aposentada Doralice. “Quando esta-mos juntas na associação, nós conversamos, rimos,

falamos nossas besteiras engraçadas umas com as outras, e mantemos a mão na palha, tecendo o arte-sanato”. Embora o artesan-ato seja de caráter rústico e antigo, nos últimos anos os produtos fabricados tiveram de ser incremen-tados e moldados a fim de atender as tendências do mercado global. Por esta razão o artesanato tornou-se o elemento cultural na construção do desenvolvi-mento regional da comu-nidade Alagamaense.

As relações sociais ul-trapassam as fronteiras do povoado e alcançam ex-periências e conhecimen-tos. Foi com essa meta que a comunidade esta-beleceu contatos com in-stituições que auxiliam no setor de negócios em Ser-gipe, conheceu novas téc-nicas e formas de trabalho e criou o grupo “Raízes da Terra”. “Há oito anos nós trabalhávamos só com o chapéu. Depois de nos re-unirmos com a prefeitu-ra, SEBRAE, Emdagro e a Universidade, passamos então por reuniões, par-ticipamos de cursos para o aperfeiçoamento e en-

tão começamos a desen-volver melhor nosso tra-balho no grupo Raízes da Terra, durante o ano de 2005. Há três anos regis-tramos a associação, tra-balhamos, fazemos nossas peças e levamos pra orla de Atalaia, participamos de vários eventos.”, sali-enta a presidente da as-sociação, dona Iranildes.Com essas capacitações, essas associadas visaram o progresso local, pois ter aprendido novas técnicas proporcionou melhorias nas vendas dos produtos. O maior fluxo de produção destina-se à capital do Es-tado, que conta com dois mercados de referências turísticas, nos quais os comerciantes revendem obras artísticas.

O artesanato é a renda complementar da maioria das famílias no povoado Alagamar. Com a simpli-cidade de gente humilde, sorriso no rosto e as mãos cheias de calos, essas pes-soas seguem construindo seu presente, na esperan-ça de um futuro aonde o artesanato irá lhes propor-cionar melhores condições de vida.

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Geração smartphone

Por Leonardo Vasconcelos e Luciana Nascimento | Foto Luciana Nascimento

No começo ele era uti-lizado apenas para fazer e rece-ber ligações. Depois aparece-ram os serviços de mensagem como o SMS, hoje já supera-dos. Agora, com os smartpho-nes é possível fazer muito mais, como ler e-mails, acessar redes sociais, tirar fotos, fazer vídeos, ouvir música, acessar a inter-net, baixar aplicativos. Enfim, os novos dispositivos móveis estão cada vez mais presentes no dia-a-dia das pessoas, prin-cipalmente dos jovens. E não é difícil encontrar exemplos por aí. O estudante de audio-visual Victor Ramos, 21, é do tipo que usa o smartphone para ‘‘quase tudo’’. Ele diz que usa o aparelho para diversas funções como acessar o e-mail, conver-sar com outras pessoas, ouvir música e tirar fotos. Como to-dos esses dispositivos e tantos outros estão literalmente ao al-cance da mão, Victor revela que às vezes nem liga o computa-dor. Mas ele não está sozi-

nho. Uma pesquisa feita pelo Instituto IDC Brasil, empresa que presta serviços de consul-toria na área de tecnologia da informação e telecomunica-ções, registrou um crescimento de 19% na venda de smartpho-nes no Brasil entre os meses de julho e setembro de 2013 em relação ao trimestre ante-rior quando foram vendidos 8,7 milhões de aparelhos. Se com-parado ao mesmo período de 2012, o crescimento anual foi de 147%. Os números apenas tra-duzem o que pode ser verifica-do no dia-a-dia. Basta lançar um rápido olhar em volta para verificar como os smartphones estão cada vez mais presentes na vida das pessoas. A secre-tária do Núcleo de Relações Internacionais da UFS, Louise Freitas, acredita que passa a metade do dia usando o celular, tempo que divide entre as liga-ções e o acesso às redes sociais, como facebook e aplicativos de comunicação, como o whatsa-pp. Ela confessa que esse tipo de comportamento faz com que

se sinta dependente do apare-lho. “Se eu sair sem ele não fico bem. É como se tivesse faltan-do alguma coisa”, afirma. Outro tipo de proble-ma é apontado pelo estudante Thiago Santos de Jesus, 19. Ao relatar sua experiência pessoal conta que por causa do smar-tphone deixava a vida acadêmi-ca em segundo plano. “Eu es-tudava de última hora. Preferia ficar no smartphone assistindo vídeo”, confessa. A psicóloga Camila Lima Tavares, 27, con-sidera esse tipo de comporta-mento prejudicial. Segundo ela, “falta participação, a atenção está voltada para o celular e a pessoa fica dispersa. Há proble-mas de aprendizagem e fixação de conteúdo”, esclarece. Camila diz que não se assusta com a quantidade de aparelhos, já que, segundo ela,

a procura por informação ágil explica o crescimento na venda e uso de smartphones. Porém, ela se mostra preocupada com os efeitos desse crescimento, que tem provocado em alguns casos uma relação de depen-dência. “Eu percebo que esse uso exagerado tem gerado uma vida mais virtual do que real.

Isso tem gerado um esvazia-mento das relações sociais e essas relações têm se tornado cada vez mais escassas”, afirma Camila. Para os dependentes de plantão, ela recomenda que seja feita diminuição gradual do uso, como em ambientes de trabalho e em locais de estudo.

“A pessoa precisa se policiar. Por exemplo, eu sou psicóloga e não cabe a mim ficar no what-sapp no meio de uma consul-ta. Pessoas que trabalham com programação ou mídias sociais são casos diferentes. Mas é preciso que a pessoa perceba qual a real necessidade do uso”, aconselha.

Smartphones e redes sociais

Não é apenas a venda de sartphones que está em alta. O acesso às redes sociais através deles também. De acordo com uma pesquisa realizada em 2013 pela E. Life, empresa responsá-vel pela gestão de relacionamento e mídias sociais na América latina e em Portugal, os aplicati-vos mais usados em tablets e smartphones são aqueles ligados a redes sociais e comunicação. Segundo a pesquisa, 96,2% dos entrevistados que possuem entre 15 e 24 anos e 98,6% situa-dos na faixa etária entre 25 e 65 anos dizem que utilizam o smartphone para acessar as redes sociais.

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Smartphones proporcionam praticidade e permitem acesso o dia todo, em todos os lugares.

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A magia do ontemBrinquedos que ultrapassam gerações

e continuam conquistando crianças

Quem não se lembra dos brinquedos da infância?

Os prazeres de se divertir com o pião, o Mané Gostoso, camin-hões de carrinho e bonecas de panos, ficam marcados na memória de quem conviveu numa época onde computa-dor, televisão e video games, não existiam.

No Mercado Municipal de Ara-caju, a venda de brinquedos antigos é uma tradição. José Freire de Oliveira, mais conhe-cido como Zé Careca, é um dos vendedores de brinquedos arte-sanais mais antigos do Mercado e também um dos mais popu-lares e conhecidos. Os brin-quedos chegaram no seu box há 62 anos e são responsáveis por grande parte dos lucros do comerciante. “Eu vendo bem, até porque eu não vendo caro, vendo por um preço normal, então eu vendo muito. O pião, por exemplo, custa 5 reais; o Mané Gostoso varia de 2 a 3 reais e os carrinhos variam o preço, mas não deixam de ter preços populares”, explica o

comerciante.No box de Zé, há brinquedos

de todos os tipos, uns mais conhecidos e outros mais difer-entes, mas as crianças apren-dem com facilidade a manusear. “Eu vendo de caminhõezinhos a Mané Gostoso, são muitos brin-quedos. Quando as crianças chegam, a gente ensina como é que brinca com eles ou às vezes eles já pegam e passam logo a perna no cavalinho, ar-rastam o caminhão, elas real-mente gostam desse tipo de brinquedo. E eu aproveito para lembrar da minha infância”, en-fatiza Zé Careca.

Gilmara Santana vende brin-quedos infantis em seu box há 15 anos e se sente orgulhosa em poder levar as crianças a conhecer brinquedos que fi z-eram parte da sua infância. “A ideia, quando eu comecei a trabalhar com esses brinque-dos, foi dar continuidade, não deixar apagar esse costume. As crianças precisam conhecer os tipos de brinquedos que os pais, as mães e avós brincaram,

mas elas não têm acesso hoje em dia e se vierem ao Mercado, elas podem passar a ter esse conhecimento. Elas chegam aqui e se encantam, o que elas não conhecem, sempre dão um jeito de aprender”, conta a comerciante

Quanto ao brinquedo favorito das crianças, os vendedores têm opiniões parecidas: não existe brinquedo preferido, to-dos fazem sucesso com a ga-rotada. “É incrível, tudo o que elas veem, elas se encantam. É diferente, não é da época delas, mas não importa a ger-ação, esses brinquedos sempre conquistam as crianças. Mesmo quando não sabem brincar, elas perguntam e a gente ensina. Elas são muito espertas”, con-clui Gilmara Santos.

Ubiratan Silva, de 9 anos, veio de São Paulo para passar o fi nal de semana em Aracaju e ficou encantado assim que viu os brinquedos artesanais.“É bem diferente dos meus brinque-dos, mas eu gostei deles. Só não sei dizer se gosto mais de-

Você sabia?O pião é um objeto cônico, geralmente de madeira, com uma ponta de metal. É lança-do com ajuda de um fi o (con-

hecido por “fi eira”), que o faz girar. Os piões são conhecid-os desde a antiguidade, ten-do sido encontrados piões de argila, decorados, originários da Babilônia. Piões foram en-contrados nas escavações de

Pompéia. Cinco séculos antes de Cristo, um poeta grego de nome Calímaco fazia menção ao pião como jogo infantil popular. O brinquedo é citado por Virgílio, Horácio e Plínio; O Velho.

Por Camila Ramos e Maria Beatriz Cam-pos / Imagens Maria Beatriz Campos

1918

les ou dos meus.”, diz o garoto paulista.

A baianinha, Sofi a Castro, de 5 anos, também se rendeu aos brinquedos antigos e fi cou fascinada com a variedade que encontrou no Mercado. A mãe de Sofi a faz questão de incentivar e tentar inseri-los na rotina da criança. “Eu tento sempre colocar esses brinque-dos na rotina dela, são muitos brinquedos modernos, mas mesmo assim eu tento. Os brinquedos mais simples es-timulam a criatividade dela e eu acho isso muito importante. Ela é bem receptiva, gosta de muitos brinquedos artesanais, mas algumas vezes os brin-

quedos modernos conseguem deixar ela mais empolgada, do que os mais simples”, contou Isabella Castro, mãe de Sofi a.

Segundo a pedagoga Edileu-sa Santana, os brinquedos artesanais contribuem para o desenvolvimento das habi-lidades motoras. Já que eles exigem mais movimentos para funcionar do que os eletrônic-os. “Os brinquedos antigos contribuem para o desen-volvimento motor da criança. Os eletrônicos são interes-santes e muitas vezes são a preferência das crianças, por conta do colorido e pelo fato dela poder estar no comando, que as deixam fascinada. Ela

se encanta ao perceber que só de apertar um botão o brinquedo já realiza os movi-mentos. Um brinquedo que é excelente para ajudar no de-senvolvimento psicomotor das crianças é o pião, já que ele exige movimento e cria nelas a noção de espaço.”, indica a pedagoga.

Mesmo os eletrônicos sendo mais presentes nas brincadei-ras atuais, os brinquedos anti-gos não perderam seu fascínio e é possível ver o brilho nos olhos e a curiosidade de cada criança que tem seu primeiro contato com os mesmos brin-quedos com que seus pais se divertiram por muitos anos.

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Véio: o artesão do sertãoEsculpindo em madeira, ele constrói história na cultu-ra sergipana

Por Samara Pedral, Keizer Santos e Regiane Sá | Foto Regiane Sá

Dono de uma simplici-dade natural e de uma criativi-dade peculiar, o artesão Cícero Alves dos Santos, conhecido como Véio, surpreende a todos com o seu museu a céu aberto em pleno alto sertão. Quem passa pela BR 206, rodovia que liga os municípios de Feira Nova e Nossa Senhora da Glória, na altura do km 8, se depara logo na entrada do sítio com obras de arte da coleção do autêntico artesão, que mantém o Museu Só Arte.

Com apenas 5 anos de idade Véio já demonstrava seu talento ao transformar cera de abelha em arte. A escassez da matéria-prima de suas primei-ras obras o fez mudar e passar a esculpir em madeira, material que o consagrou como artista de renome internacional. No início da sua carreira foi con-siderado louco e preguiçoso por dedicar seu tempo à atividade artística.

A diversidade das obras de Véio, chama atenção pelo fato delas não terem um padrão definido. O artesão tanto dá ênfase às formas naturais da madeira, quanto esculpe ima-

gens de personagens da cultura popular. “Minha preocupação é aproveitar as curvas da madeira para torná-la uma obra única; não me preocupo com o comé-rcio e sim com a arte”, destaca o artista.

No Brasil, quase todos os Estados possuem obras de Véio. Além disso, suas criações ganharam destaque internac-ional, com obras espalhadas por vários países, como Esta-dos Unidos, Portugal, Nicará-gua, Noruega e França, onde em Paris, expôs a convite da Fundação Cartier. No Estado, o trabalho do artista pode ser encontrado no Memorial de Sergipe, no Museu da Gente Sergipana, e em grande quanti-dade no seu museu particular.

Apesar desse reconheci-mento expressivo o artesão critica a falta de valorização cultural e investimento fi-nanceiro por parte do poder público. E relata também que suas obras recebem pouco

reconhecimento da população local. Preocupado com este esquecimento, Véio mantém em seu museu, além das suas obras, um grande acervo que preserva parte da história e da cultura do Estado. Dentre as relíquias mantidas estão dis-cos LP’s, rádios, máquinas de escrever, câmeras fotográficas, objetos da época dos escravos, primeiros pregos produzidos por ferreiros de Nossa Senhora da Glória, objetos domésticos, peles de animais, entre outros.

Segundo o artista, até hoje foram produzidas mais de 17 mil obras, que variam de tamanhos, formas e cores. Véio afirma que esculpiu a menor escultura em madeira do mundo, reconhecida pelo Guiness Book. A obra retrata um homem montado em um cavalo e de acordo com o es-cultor não foi utilizado nenhum tipo de lente especial e levou apenas dois dias para confec-cioná-la.

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Apesar disso o artesão não uti-liza suas obras para competir. “Se eu souber que na exposição será escolhida a melhor arte como forma de competição, desisto de participar”, ressal-tou. Véio já foi personagem de várias reportagens e docu-mentários. Ele afirma, que já foram produzidos 10 cur-tas, 2 longas-metragens, mais de 100 jornais e cerca de 60 matérias em revistas sobre a sua obra. Entre os documen-tários produzidos destacam-se “Véio: Tradição e contempora-neidade”, “Cavalhada de Poço Redondo”, “Nação lascada de Véio”, “A glória do sertão”, “Véio: o filme” e “O universo simbólico de Véio”. O trabalho de Véio tam-bém ocupa os espaços virtuais através de uma página de di-vulgação no Facebook adminis-trada por sua filha. Na página é divulgada a agenda, partici-pação em eventos e a sua obra. A arte não é a principal fonte de renda de Véio, o ar-tesão divide seu tempo entre a

produção artística e a agricultu-ra. Suas obras não possuem valores fixos, depende do in-teresse da pessoa e da relação com a arte. Ele não manifesta interesse em sair do seu sítio, pois gosta da vida pacata que leva, e as pessoas que quiser-em conhecer sua obra vão ao seu encontro, e sempre serão bem-vindas, afirma o artista. Véio consagrou-se um importante personagem com papel fundamental para a con-strução e preservação da cultu-ra sergipana. Isso só foi possível através da sua dedicação à arte ao longo de várias décadas. Preconceito, desvalorização e desconfiança não foram obs-táculos fortes o suficiente para desanimá-lo ou para fazê-lo desistir da arte. Em meio a sua simplicidade, o artesão repre-senta a força que vem do seu interior demonstrada em diver-sas obras.

“Minha preocupação é aproveitar as

curvas da madeira para torná-la uma

obra única; não me preocupo com o

comércio e sim com a arte”

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AAAAmarelinho, simples e gostoso. marelinho, simples e gostoso. marelinho, simples e gostoso. marelinho, simples e gostoso. O cuscuz, apelidado carinho-O cuscuz, apelidado carinho-

samente como “teimosinho”, é um samente como “teimosinho”, é um prato que não pode faltar na maio-prato que não pode faltar na maio-ria das mesas brasileiras, principal-ria das mesas brasileiras, principal-mente nas da região nordeste. Sorte mente nas da região nordeste. Sorte dos africanos em serem os criadores dos africanos em serem os criadores dessa iguaria e nossa de recebê-la dessa iguaria e nossa de recebê-la pelos portugueses. pelos portugueses.

Como toda coisa boa sempre tem Como toda coisa boa sempre tem uma boa história, o kuz-kuz ou alcuz-uma boa história, o kuz-kuz ou alcuz-cus - dialeto africano - é originário da cus - dialeto africano - é originário da África Setentrional. Incialmente era África Setentrional. Incialmente era cus - dialeto africano - é originário da cus - dialeto africano - é originário da África Setentrional. Incialmente era cus - dialeto africano - é originário da cus - dialeto africano - é originário da

preparado com arroz, sorgo, farinha preparado com arroz, sorgo, farinha de trigo e milheto, porém só se es-de trigo e milheto, porém só se es-palhou pelo mundo quando começou palhou pelo mundo quando começou a ser feito com a massa de milho a ser feito com a massa de milho americano. americano.

Quando chegou às terras brasilei-Quando chegou às terras brasilei-ras, ainda no período colonial, a ras, ainda no período colonial, a massa de milho pilada, temperada massa de milho pilada, temperada com sal e cozida ao vapor ganhou com sal e cozida ao vapor ganhou espaço nas mesas das famílias mais espaço nas mesas das famílias mais humildes, tornando-se também a humildes, tornando-se também a base da alimentação dos negros. base da alimentação dos negros. Das mãos dos escravos, a iguaria Das mãos dos escravos, a iguaria conquistou espaço nos tabuleiros e o conquistou espaço nos tabuleiros e o paladar do povo.paladar do povo.

Incorporado à cultura brasileira, Incorporado à cultura brasileira, o prato até hoje tem lugar garan-o prato até hoje tem lugar garan-tido no cardápio dos nordestinos. E tido no cardápio dos nordestinos. E nós tratamos de aprimorá-lo, acres-nós tratamos de aprimorá-lo, acres-centando temperos da região e centando temperos da região e sofi sticando a simples tradição.sofi sticando a simples tradição.

O cuscuz nosso de cada diaPor Alana Karolina e Leila DolifFoto Leila Dolif

ANOTE AÍO empresário Suedson Cardoso

da Silva, proprietário da Casa do Cuscuz, fez da tradição o seu negócio, criando diversas receitas com a massa de milho. Ele com-partilha com a gente a receita de um delicioso cuscuz de charque e queijo coalho.

Ingredientes- 150g de massa de milho;- 1 pitada de sal;- 100g de charque;- 50g de queijo coalho cortado em cubos.

Modo de preparoMolhe a massa de milho e deixe descansar por 15 minutos. Escal-

de a carne, deixe secar e depois triture no liquidifi cador. Misture a massa de milho, a carne e o queijo coalho e coloque no cuscuzeiro e deixe cozinhar por 20 minutos.Em seguida é só servir com um café quentinho! Rende 1 porção. Bom apetite!

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