logÍstica humanitÁria: o desafio da gestÃo diante de … · 2017-10-24 · logÍstica...
TRANSCRIPT
LOGÍSTICA HUMANITÁRIA: O DESAFIO DA
GESTÃO DIANTE DE DESASTRES
Elisangela Fatima de Oliveira (UFOP)
Eva Bessa Soares (UFOP)
Os desastres e as catástrofes têm sido cada vez mais frequentes no mundo,
causados por motivos diversos, atingindo populações em áreas urbanas e
rurais, provocando danos de ordem material e imaterial. A gestão de
operações em desastres e, em especial, a logística humanitária são
fundamentais para minimizar o sofrimento das vítimas afetadas em todas as
fases dos desastres. Esse estudo constitui uma breve revisão da literatura a
respeito do tema e visa explanar sobre o conceito de logística humanitária,
sua contextualização, além dos principais desafios enfrentados para uma
gestão eficiente dos desastres de início súbito. Para tal, procurou-se reunir
conceitos, terminologias e exemplos que possibilitam um entendimento do
potencial da logística humanitária, bem como que sirva para subsidiar os
agentes envolvidos na análise, gerenciamento e intervenções de áreas de
risco ou afetadas pelos desastres através de uma pesquisa descritiva
qualitativa. Como uma forma de exemplificar esses conceitos e fazer um elo
entre a teoria e a prática, o estudo apresentou o caso envolvendo o
rompimento da Barragem de Fundão no município de Mariana/MG.
Palavras-chave: Logística humanitária, gestão de desastres, eficiência da
cadeia humanitária
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
2
1. Introdução
Esse ensaio teórico visa discorrer a logística humanitária, definida por Silva (2011) como “o
processo de planejar, implementar e controlar de forma eficiente o fluxo e o armazenamento
de bens, materiais e informações relacionadas do ponto de origem até o ponto de consumo,
com o intuito de aliviar o sofrimento de pessoas em situações vulneráveis” (p.5). No sentido
em que se define logística humanitária, portanto, pode-se inferir que o tema factualmente
preocupa-se em tornar os processos de logística menos penosos para a vida humana mesmo
que em situação de grandes percalços como em desastres como aqueles ocorridos em
Mariana, Minas Gerais, no ano de 2015. Pesquisas nesta nova área garantem que, em
ocorrências desta natureza, o uso de conceitos logísticos pode contribuir de maneira
significativa para o sucesso de uma operação (VAN WASSENHOVE, 2006). Neste sentido,
grandes desafios são apontados na direção da implementação de processos logísticos
sistematizados, merecendo destaque: aspectos ligados à infraestrutura, localização de centrais
de assistência, coordenação de processos (pessoas, suprimentos, informações, materiais)
(NOGUEIRA e GONÇALVES, 2009).
2. O conceito de logística humanitária
As situações de natureza emergencial como desastres naturais (furacões, enchentes,
terremotos, maremotos), atentados terroristas, guerras e outros eventos deste tipo são
exemplos de desastres e requerem um tratamento logístico especial, que vem sendo
denominado como logística humanitária. Esse é um conceito ainda muito novo no Brasil,
entretanto vem sendo crescentemente estudado em países da Europa e nos Estados Unidos
(NOGUEIRA e GONÇALVES, 2009). Para os autores, o conceito de logística humanitária foi
desenvolvido a partir dos objetivos da logística de vencer o tempo e a distância na
movimentação de materiais e serviços de forma eficiente e eficaz. Destaca-se que para Pettit e
Beresford (2009) e Tathan e Pettit (2010) a logística humanitária assemelha-se com a
logística militar visto a preocupação de ambas com aspectos relacionados à sobrevivência das
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
3
pessoas em uma ambiente incerto e degradante infraestrutura. Meirim (2007) aponta que a
Federação Internacional da Cruz Vermelha define a Logística Humanitária como: “processos
e sistemas envolvidos na mobilização de pessoas, recursos e conhecimento para ajudar
comunidades vulneráveis, afetadas por desastres naturais ou emergências complexas. Ela
busca à pronta resposta, visando atender o maior número de pessoas, evitar falta e
desperdício, organizar as diversas doações que são recebidas nestes casos e, principalmente,
atuar dentro de um orçamento limitado”.
Nesse contexto, segundo Ertem et al. (2010) faz-se necessário diferenciar a logística
humanitária da logística empresarial, uma vez que são contextos e demandas muito diferentes,
mas inter-relacionados considerando-se que a logística humanitária propõe o uso efetivo dos
conceitos logísticos adaptados às especificidades da cadeia de assistência humanitária.
2. A cadeia de suprimentos humanitária
De acordo com Heaslip et. al (apud Silva 2011), quando aplicada às ações humanitárias, a
cadeia de suprimentos precisa ser flexível e capaz de responder rapidamente a eventos
imprevisíveis, de forma efetiva (que pode ser a diferença entre vida e morte) e eficiente
(atender a um maior número de necessitados) sob fortes restrições orçamentárias. Esse fato
reforça a necessidade do desenvolvimento de procedimentos para que, quando este tipo de
evento ocorra, tenham-se as diretrizes a seguir de modo a garantir que as vítimas sejam
atendidas em tempo hábil.
Já Balcik et al. (2010) defende que a cadeia de suprimento humanitária segue a estrutura
relacionada às seguintes fases: primeiramente, há a aquisição de suprimentos, que se dá
através de doações, locais ou globais, em espécie e de materiais, ou a partir de políticas
públicas. A seleção dessas doações, através do processo de triagem, merece atenção pelo fato
da aleatoriedade dos itens recebidos, que pode haver excesso de alguns e escassez de outros.
Assim, a triagem do material recebido é crucial, pois evita que itens desnecessários naquele
determinado momento sejam transportados para os centros de distribuição, ocupando espaços
de armazenamento e gerando retrabalho, que deve ser evitado ao máximo, considerando que
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
4
tempo é um fator delicado nessas operações.
Em seguida, tem-se o transporte dos suprimentos para os centros de distribuição, que irão
armazenar no primeiro instante os produtos adquiridos e doados, que foram selecionados na
etapa de triagem. Nesses locais, evita-se que os produtos sejam deteriorados e roubados, além
de ser possível organizá-los para posterior entrega nos estoques intermediários e pontos de
distribuição. Araújo (2012) elucida que emergência, desastre ou catástrofe são definidos por
inadequação entre os meios disponíveis e os necessários para atender uma situação de
urgência. Esses meios variam de acordo com cada área e estão relacionados à infraestrutura
urbana, ao tipo de moradia que a população dispõe, ao tipo de comunicação disponível, ao
nível de educação a população, ao nível de organização da população, aos recursos
disponibilizados pelos órgãos públicos.
3. Gestão de Desastres
Segundo Albala-Bertrand (apud Kraus 2014) “uma situação de desastres é um quadro
analítico em que os desastres são compostos de três processos interdependentes de um único e
mesmo fenômeno: um impacto de desastre, uma resposta a desastres e uma interferência
social moldada pelas duas anteriores.”
Benson e Clay (apud Kraus, 2014) acrescentam que do ponto de vista econômico, um desastre
implica uma combinação de perdas, em capital humano, físico e financeiro, e uma redução da
atividade econômica, tais como geração de rendimento, investimento, consumo, produção e
emprego.
Estas perdas podem exceder a capacidade da sociedade afetada em lidar com as mesmas.
usando apenas os recursos próprios e, portanto, pode ser necessária assistência de fora.
Quando se trata de vítimas de calamidade, Kraus (2014) classifica três categorias de vítimas,
de acordo com o grau e o tipo de perda sofrida como vítimas primárias: aquelas que foram
afetadas pela morte ou ferimento grave de um membro familiar ou perderem a sua habitação,
ou o seu emprego (ou subsistência), vítimas secundárias: as que têm ferimentos leves ou
danos menores de habitação, mas sofrem uma perda global de pelo menos serviços diretos e
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
5
vítimas de terceiros: aquelas que não sofrem perdas pessoais ou de habitação, nem sofrem
qualquer privação significativa de serviços de apoio direto, mas sofrem perda global de
serviços públicos/instalações e direitos. Desse modo, as vítimas primárias e secundárias são
principalmente aquelas pessoas que eram as mais vulneráveis antes de o desastre acontecer.
Em situações de desastre, geralmente surge uma vontade de cooperação entre os indivíduos,
seja diretamente ou por meio de instituições, como, por exemplo, captação de recursos por
instituições de caridade. Comumente, as transferências são distribuídas gratuitamente
(caridade); os serviços de alojamento são prestados livremente (por exemplo, nas escolas,
estádios, familiares, em residências ao redor da vizinhança, etc); e a mão de obra é fornecida
sem pagamento (por exemplo, partes de resgate, comitês de alívio). em outras palavras, a
racionalidade do mercado assume um papel secundário e o comportamento cooperativo ajuda
a aliviar flutuações de curto prazo na oferta e na procura.
4. A noção de eficiência na logística humanitária
Segundo Rouse e Putterill (2003), existem inúmeras abordagens ou metodologias de medidas
de desempenho, cada uma com um propósito próprio. Essas diferentes abordagens têm sua
contribuição efetiva, mas na essência são incompletas. Bowersox e Closs (1996) salientam
que os objetivos principais das medidas de desempenho no que se refere à logística são: o
monitoramento em relação aos planos operacionais e a identificação de oportunidades para
aumentar a eficiência e eficácia organizacional. Segundo os mesmos autores, coexistem
medidas de desempenho de caráter funcional (atividades isoladas), com medidas de
desempenho focadas em processos, sendo essas mais apropriadas ao ambiente empresarial de
competitividade.
Beamon (apud Nogueira et al., 2007) destaca que existe uma grande dificuldade em se criar
uma abordagem geral, pois os tipos diferentes de sistemas requerem características e medidas
de desempenho específicas. O mesmo autor sugere que existe um interesse crescente no
desenvolvimento de medidas de desempenho de organizações sem fins lucrativos, mas poucos
esforços têm sido feitos neste sentido.
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
6
De acordo com Beamon e Balcik (2008) uma das perguntas realizadas constantemente pelos
steakholders de um desastre está relacionada a quanto os projetos e/ou programas das
organizações humanitárias podem ser efetivos e eficientes na ajuda aos beneficiários. Para que
esta eficiência possa ser medida, faz-se necessária a definição de indicadores de desempenho.
Dadas as diferentes características das organizações empresariais e das organizações de
assistência humanitária, as medidas de desempenho para essas organizações também são
diferenciadas.
Nessa perspectiva, Nogueira et al (2007) elenca que devem ser consideradas as seguintes
variáveis para o estabelecimento de indicadores: os objetivos e as características da demanda.
Entende-se em elação aos objetivos que diferentemente da visão da logística empresarial,
cujos mesmos se baseiam nos lucros e na prestação de serviços, o objetivo na logística
humanitária é salvar vidas e aliviar o sofrimento de pessoas vulneráveis, dada uma limitação
financeira. Já no viés das características da demanda, enquanto o foco da logística empresarial
está relacionado aos produtos e serviços, na logística humanitária são suprimentos e pessoas.
A demanda na cadeia de assistência humanitária é gerada por eventos aleatórios que são
imprevisíveis em termos de tempo, local, tipo e tamanho. Neste sentido, a mesma é estimada
após a necessidade da mesma, baseada na avaliação das características do desastre. Na
logística empresarial, a estimativa da demanda é feita previamente e é relativamente estável,
com solicitações em intervalos regulares.
Bertazzo et al. (2013) ressalta ainda que os estudos relacionados com a produtividade e
eficiência são questões desafiadoras que estão ganhando importância nas operações
humanitárias devido à cobrança por parte dos doadores às organizações humanitárias que
prestam ajuda aos beneficiários.
5. Metodologia
O estudo caracteriza-se por uma pesquisa descritiva. De acordo com Vergara (2005), uma
pesquisa descritiva expõe as características de determinada população ou fenômeno ou o
estabelecimento de relações entre variáveis. Ainda conforme Vergara (2005), o estudo de caso
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
7
tem caráter de profundidade e detalhamento e pode ou não ser realizado em campo.
Nesse contexto, o estudo foi respaldado por uma ampla pesquisa bibliográfica, que de
acordo com a concepção de Fonseca (2002) “[...] é feita a partir do levantamento de
referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como
livros, artigos científicos, páginas de web sites.” Além disso, para a coleta de dados
também foram observações sistemáticas no município de Mariana/MG. A base
metodológica mostrou-se essencial para a realização do presente trabalho.
6. Estudo de caso: Um exemplo real dos desafios enfrentados pela logística humanitária
Os dados apresentados abaixo referem-se ao desastre que ocorreu no município de Mariana,
no estado de Minas Gerais/Brasil, considerado um desastre de grande relevância no contexto
nacional.
No dia 05 de novembro de 2015 uma barragem de uma empresa mineradora se rompeu e 55
milhões de metros cúbicos de rejeitos (lama, areia e água) foram descartados no meio
ambiente. O vilarejo mais próximo com mais chamado Bento Rodrigues com
aproximadamente 600 moradores foi a região mais atingido pelos rejeitos. (G1, 2015a). O
rompimento da Barragem de Fundão liberou 55 bilhões de litros de rejeitos, os quais se
juntaram a 7 bilhões de litros de água presentes na de Santarém, totalizando uma enxurrada de
62 bilhões de litros lançada na natureza. A lama matou 19 pessoas; desalojou mais de 300
famílias; devastou as localidades de Bento Rodrigues, Camargos e Paracatu de Baixo, em
Mariana, e o município de Barra Longa (MG); percorreu cerca de 930 quilômetros entre os
estados de Minas Gerais e Espírito Santo, poluindo os rios Gualaxo do Norte, Carmo e Doce,
bem como a foz deste, junto ao Oceano Atlântico (ponto de desova de tartarugas marinhas,
que também foi prejudicada); dizimou mais de 11 toneladas de peixes e outros animais
aquáticos; destruiu cerca de 1,5 mil hectares de vegetação; soterrou 120 nascentes; gerou
prejuízos econômicos aos setores da pesca e do turismo; afetou o abastecimento de água em
cidades como Governador Valadares (MG) e Colatina (ES); acabou com os laços culturais e
de subsistência mantidos pelos índios Krenak com o rio Doce; entre outros danos, morais e
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
8
materiais. (MAIA,2016). Dentre os principais problemas detectados e dificuldades
relacionadas à logística humanitária apontados pelos stackholders tiveram destaque os
seguintes: as primeiras ações para atendimento imediato às vítimas foram adotadas por
voluntários de forma desordenada. Em um primeiro momento, os desabrigados foram
encaminhados para espaços públicos como escolas e quadras cobertas de Mariana que é a
cidade mais próxima à região atingida. Doações de todo o país, voluntários que abandonam
sua família e cidade para ajudar com os feridos e nas buscas, além de proprietários de hotéis e
espaços que deixam suas portas abertas para os desabrigados permanecerem. Nesse sentido,
evidenciou-se um espírito de compaixão e solidariedade que foi exibido com forte cobertura
pela imprensa nacional. Porém, a boa vontade dessas pessoas nesse primeiro momento acabou
se transformando em empecilho para a logística humanitária na medida em que a
desorganização das doações e a postura dos voluntários acabava gerando desordem e poucas
ações efetivas em prol das reais necessidades dos atingidos pela lama. O fato é que as pessoas
estavam doando objetos que julgavam ser úteis às famílias, e isto muitas vezes não era
verdade. Segundo a Prefeitura de Mariana (2015), itens em mau estado de conservação,
perecíveis, objetos pessoais e até sucatas foram se amontoando no ginásio da cidade de
Mariana (principal ponto de armazenamento dos donativos). Muitas roupas foram descartadas
devido às más condições (os doadores não avaliavam as condições de uso) e o prefeito fez um
apelo via mídia para que as doações cessassem diante do volume de material e falta de espaço
para armazenagem das mesmas. Grande quantidade roupas sujas, rasgadas e misturadas
àquelas em boas condições foram doadas. Soma-se à isto, o envio de objetos como mobílias
antigas e outros artefatos que, aparentemente, a população não sabia como descartar e acabou
enviando como doação aos desabrigados. Grandes quantidades de itens repetidos,
principalmente, alimentos também foram observados. Já outros primários, como o
suprimento de água e roupa de cama ficou extremamente escasso.
Diversas entidades políticas, organizações não governamentais (ONGS) e grupos de
voluntários de cidades próximas se deslocaram para a cidade de Mariana e, de certa forma,
acabaram contribuindo para aumentar o tumulto e a falta de organização junto aos
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
9
desabrigados. (G1, 2015b)
Ainda, destaca-se o conflito em termos de gestão da informação em relação ao acidente
ocorrido. A imprensa noticiou que a barragem pertencente à cidade de Mariana havia se
rompido em um exemplo claro de ineficiência do sistema de comunicação.
(MODESTO,2016). Isto causou um enorme transtorno sob o ponto de vista logístico,
considerando-se que inúmeros viajantes, caminhoneiros e frotistas que deveriam chegar à
cidade, se negaram a tal e desviaram a sua rota, alegando a impossibilidade de acesso à
Mariana. Como consequência, houve desabastecimento de itens primários como hortaliças e
combustível nos primeiros dias após a tragédia na cidade. Hoje, sabe-se que isto foi um
enorme equívoco, já que o subdistrito de Bento Rodrigues se localiza a cerca de trinta e cinco
quilômetros do centro histórico de Mariana e que o acesso a tal localidade foi restrito aos
grupos de apoio como bombeiros e defesa civil.
Considerando-se o viés econômico, percebe-se um impacto negativo na principal atividade
econômica da cidade de mariana: o turismo. A cidade que se destaca no cenário nacional
como patrimônio histórico da humanidade, viu sua imagem ser deteriorada e sofreu uma
grande evasão, dada a repercussão errônea de que a cidade também havia sido atingida pela
lama e se encontrava em estado de emergência. Os hotéis e pousadas foram reservados apenas
pela imprensa e representantes de entidades. O comércio local, principalmente àqueles
baseados em atividades como o artesanato, típico na região, teve um declínio caracterizado
pela estagnação das vendas. Ressalta-se que os danos produzidos no desastre ambiental
iniciado no município de Mariana foram sendo carregados pelos rios e atingiram os mais
diversos interesses, não mais apenas dos ribeirinhos que viviam da pesca ou de ceramistas,
mas da economia de diversas cidades. (PORCELLO, 2016)
7. Considerações Finais
Há várias considerações que podem ser tomadas como motivadoras para o desenvolvimento
do presente estudo. Natarajarathinam et al. (apud Bertazzo et al., 2013) aponta que os
desastres são eventos súbitos e inesperados ou lentos que podem ser caracterizados por atingir
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
10
uma determinada região causando danos econômicos, sociais e ambientais, podendo ferir ou
matar pequenas ou grandes populações. Por tratar-se de eventos não facilmente administráveis
por procedimentos rotineiros, há a necessidade de atuação conjunta de entidades
governamentais, setores privados, agências humanitárias e comunidades, em ações
preventivas de regiões vulneráveis a desastres. Ballou (1993) afirma que a logística visa
disponibiliza o produto ou serviço certo, no lugar e instante corretos, na condição desejada ao
menor custo possível. Dessa forma, a perspectiva da logística humanitária visa prover auxílios
às vítimas, sejam eles recursos materiais ou humanos, de maneira correta e em tempo
oportuno, focando sempre o alívio do sofrimento e a preservação da vida (THOMAS E
KOPCKZAC apud BERTAZZO et al., 2013). Por tal motivo, a gestão de operações em geral
e a logística humanitária em particular assumem papel relevante na otimização da utilização
dos recursos que são disponibilizados, muitas vezes, de forma bastante improvisada e com
traços de ingerência. Para elucidar essa dinâmica, o presente estudo propõe realizar uma
análise a partir de casos reais de desastres súbitos representativos no cenário nacional.
A incidência de ocorrências de desastres no Brasil e no mundo está ressaltando a importância
do estudo do tema, ao mesmo tempo em que tem demonstrado a visão limitada das
organizações e do poder público na compreensão desses conceitos. Nesse sentido, a
abordagem desse trabalho procurou evidenciar os principais conceitos envolvidos e elucidar a
importância da contextualização e desdobramentos do referido tema nos dias atuais utilizando
o exemplo do desastre ocorrido no subdistrito de Bento Rodrigues pertencente ao município
de Mariana/MG para ilustrar alguns desafios da logística humanitária. O presente estudo
constitui, assim, uma contribuição no sentido de reunir, os diversos aspectos que balizam as
questões referentes aos desastres súbitos sob a ótica humanitária.
8. Referências bibliográficas
ARAÚJO, S. B. Administração de Desastres Conceitos & Tecnologias. SYGMA – SMS. Gestão de Risco. 3ª
Edição 2012. Disponível em //www.defesacivil.pr.gov.br/arquivos/File/AdministracaodeDesastres.pdf. Acesso
em 10 de janeiro de 2016.
BALLOU, R. H. Logística Empresarial. Transportes, administração de materiais e distribuição física. Tradução
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
11
de Hugo T. Y, Yoshizaki. São Paulo: Atlas. Bandeira, R. A. M., V. 1993.
BEAMON, B. M. e BALCIK, B. Performance measurement in humanitarian relief chains. International
Journal of Public Sector Management, v.21, n.1, p.4-25. 2008.
BERTAZZO, T. R.; BRITO JUNIOR, I.; . LEIRAS, A. e YOSHIZAKI, H. T. Y. Revisão da literatura
acadêmica brasileira sobre a gestão de operações em desastres naturais com ênfase em logística humanitária.
Transportes v. 21, n. 3, p. 31–39, 2013.
BOWERSOX, D.J. & CLOSS, D.J., Logistical management: the integrated supply chain process. McGraw
Hill. New York, 1996.
ERTEM, M., BUYURGAN, N., ROSSETTI, M. Multiple-buyer procurement auctions framework for
humanitarian chain management. International Journal of Physical Distribution and Logistics Management.
v. 40, n. 3, p. 202-227, 2010.
G1. (2015a). Barragem se rompe, e enxurrada de lama destrói distrito de Mariana. G1. (11/05/2015) Acessado
em: 13/05/2015. Disponível em: http://g1.globo.com/minas-gerais/noticia/2015/11/barragem-de-rejeitos-se-
rompe-em-distrito-de-mariana.html
G1. (2015b). Rompimento de barragem da Samarco, em Mariana, completa um mês. G1. (12/05/2015) Acessado
em: 14/07/2015. Disponível em: http://especiais.g1.globo.com/minas-gerais/2015/desastre-ambiental-em-
mariana/1-mes-em-numeros/
KRAUS, A. Desastres Naturais: Impacto econômico e period de reconstrução. Porto: Vida Econômica
Editorial, 2014.
MAIA, Gustavo. Lama da Samarco: 10 fatos que marcaram a maior tragédia ambiental do Brasil.
Disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2015/12/31/relembre-os-momentos-que-
marcaram-o-maior-desastre-ambiental-do-brasil.htm. Acesso em: 04 mai. 2016.
MEIRIM, H Logística humanitária e logística Empresarial. Disponível em: www.mmrbrasil.com.br. 2007.
Acesso em: 02 de janeiro 2015.
NATARAJARATHINAM, M., I. e NARAYANAN, A. Managing supply chains in times of crisis: a review of
literature and insights. International Journal of Physical Distribution and Logistics Management. p. 535–
573, 2009.
MIGUEL, P. S. Desastres naturais: os desafios para cadeias humanitárias e produtivas. Disponível em:
http://politica.estadao.com.br/blogs/gestao-politica-e-sociedade/desastres-naturais-os-desafios-para-cadeias-
humanitarias-e-produtivas/, 2015. Acesso em: 08/01/2016.
XXXVII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e as novas tecnologias produtivas: indústria 4.0, manufatura aditiva e outras abordagens
avançadas de produção”
Joinville, SC, Brasil, 10 a 13 de outubro de 2017.
12
MODESTO, C.. Três meses da tragédia de Mariana: os riscos de não ter um plano de comunicação
socioambiental. Disponível em: http://www.jornalcruzeiro.com.br/materia/674752/tres-meses-da-tragedia-de-
mariana. Acesso em 25/02/2016.
NOGUEIRA, C. W e GONÇALVES, M. B. A logística humanitária: apontamentos e a perspectiva da
cadeia de assistência humanitária. XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE
PRODUÇÃO. A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão.
Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009.
PETTIT, S. BERESFORD, A. Critical success factors in the context of humanitarian aid supply chains.
International Journal of Physical Distribution & Logistics Management. v. 39, n.6, p. 450-468, 2009.
PREFEITURA DE MARIANA. (2015). Operação Mariana. Boletim 5/12. Prefeitura de Mariana.
(12/05/2015) Acessado em: 12/05/2015. Disponível em:
http://prefeitura2014.pmmariana.com.br/noticia/3002/operacao-mariana-boletim-23-11
ROUSE, P.; PUTERILL, M. Na integral framework for measurement. International Journal os Operations &
Production Management. 22, n.11, p. 791-805, 2003.
SILVA, L. Ferreira. Gestão da logística humanitária: proposta de um referencial teórico. Dissertação de
mestrado (Mestrado em administração). Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto COPPEAD de
Administração, Rio de Janeiro, 2011.
PORCELLO, Flávio et al. O Telejornalismo e a Cobertura de Desastres Ambientais: uma Análise do Caso
Samarco. XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação , São Paulo, SP, 05 a 09/09/2016.
TATHAM, P. PETTIT, S. Transforming humanitarian logistics: the journey to supply network management.
International Journal of Physical Distribution & Logistics Management. v. 40, n.8/9, p. 609-622, 2010.
THOMAS S. A. e KOPCKZAC, L. R. From logistics to supply chain management: the path forward in the
humanitarian sector. Fritz Institute, 2005.
VAN WASSENHOVE, L. Humanitarian aid logistics: supply chain management in high gear. Journal of the
Operational Research Society. v. 57, n. 5, p. 475-489, 2006.
VERGARA,S.C. Métodos de pesquisa em administração. São Paulo: Atlas, 2005.