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Livro de Geodesia

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CONCEITOS DE ASTRONOMIA DE POSIO, FUNDAMENTAL E GEODSICA

ASTRONOMIA GEODSICA

Posicionamento pelas EstrelasBaslio Santiago

Adriano Salviano

NDICE

NOTA DOS AUTORES

CAPTULO 1CONCEITOS FUNDAMENTAIS E SISTEMAS DE COORDENADAS

Introduo Astronomia Geodsica Sistema Horizontal de Coordenadas Sistema Equatorial de Coordenadas

ngulo horrio

Precesso

Relao entre os Sistemas Horizontal e Equatorial

Outros sistemas de coordenadasCoordenadas Eclticas

Coordenadas Galcticas Fundamentos de Geodsia

Histria da Geodsia

A figura da Terra

O Elipside de Revoluo

Geide

Sistema Geodsico de RefernciaDeterminao de Posio pela AstronomiaCAPTULO 2ESTUDO ANALTICO DO MOVIMENTO DIURNO Movimento diurno dos astros

Passagem meridiana

Estrelas circumpolares e estrelas invisveis

Movimento diurno: exemplos do efeito da latitude do observador

Trigonometria Esfrica

Tringulos Esfricos

Frmulas de Trigonometria Esfrica

Astronomia EsfricaSituaes especiais

CAPTULO 3MOVIMENTO ANUAL DO SOL E SISTEMAS DE TEMPO

Movimento Anual do Sol Estaes do ano e eclipses

As estaes do ano em nosso planetaEclipses Sistemas de Medida de Tempo

Instante, Hora, Intervalo e Estado de CronmetroAs diferentes definies de hora Converso entre Sistemas de Medida de Tempo

Converso de tempo solar em sideralTabela do Anurio Astronmico do Observatrio Nacional

Tabela do Astronomical AlmanacConverso de tempo sideral em solar

Equao do TempoTabela do Anurio Astronmico do ON contendo os valores da Equao do Tempo

Tabela do Astronomical Almanac contendo os valores da Equao do Tempo

Equao do Centro

Reduo ao Equador

CAPTULO 4CORREES S COORDENADAS EQUATORIAIS Variao de Coordenadas Equatoriais

Precesso Nutao

Tabela do Anurio Astronmico do Observatrio Nacional

Tabela do Apparent Places of Fundamental StarsDeslocamento do Plo Celeste

Movimento do Plo Astrometria

Aberrao

Refrao

Tabela do Anurio Astronmico do ON com valores deRefrao mdia para diferentes distncias zenitaisTabela do Anurio Astronmico do ON com os fatoresde correo de Rm para T e P Paralaxe e unidades de distncia em Astronomia Movimentos Prprios Catlogos de Estrelas e Atlas na Web

Reduo das coordenadas astronmicasTabela do Astronomical Almanac com os nmeros Besselianos

Tabela com valores dos nmeros Besselianos de 2a ordemTabela do Astronomical Almanac com os valores das coordenadas cartesianas X,Y,Z

CAPTULO 5 PRTICAS DE DETERMINAO ASTRONMICA

Roteiro para preparao de relatrio de prtica astronmica

Roteiro para montagem, nivelamento e calibrao de Teodolito 1 Prtica Determinao do meridiano astronmico e do azimute de uma mira usando aculminao de uma estrela

Procedimento Observacional

Exemplo 2 Prtica Determinao do meridiano astronmico e do azimute de uma mira usando uma estrela em elongaoProcedimento Observacional

Exemplo

3 Prtica Determinao de latitude usando o Mtodo de Sterneck

Procedimento Observacional

Exemplo 4 Prtica Determinao de longitude usando Mtodo das Alturas Iguais

Procedimento Observacional

5 Prtica Determinao de longitude usando Mtodo das Distncias Zenitais Absolutas

Procedimento Observacional

Exemplo 6a Prtica Determinao da hora pelo Mtodo de ZingerCAPTULO 6

EXERCCIOS COM SOLUES

Exerccios de Passagem Meridiana e Coordenadas Horizontais Exerccios de Trigonometria Esfrica e Movimento Diurno Exerccios de Sistemas de Tempo Exerccios sobre variaes de Coordenadas Equatoriais

CAPTULO 7APNDICES Glossrio de conceitos de Astronomia de Posio

Esfera Celeste

Sistema Horizontal

Sistema Equatorial Quadro Resumo de Coordenadas Celestes Deduo das Frmulas do Mtodo de ZingerBIBLIOGRAFIA

NOTAS DOS AUTORES

Este texto tem uma origem curiosa, pois seguiu um caminho possivelmente inverso da maioria. Inicialmente foi produzido em formato de hipertexto a ser acessado pela Internet e somente agora est sendo publicado na forma tradicional. Para os que tm acesso Internet sempre vale pena conhecer o material em sua verso eletrnica: http://www.if.ufrgs.br/~santiago/lectures/fis2005, at porque as atualizaes se do mais rapidamente para este ltimo.

O endereo do hipertexto dado acima parte do stio Internet do Instituto de Fsica da UFRGS. Este material foi inicialmente confeccionado com o objetivo de ajudar os alunos e professores de disciplinas de Astronomia Posicional, Fundamental e Geodsica. Trata-se, portanto, de material didtico concebido como apoio ao ensino universitrio. Por outro lado, o leigo interessado em Astronomia e dispondo de conhecimento de matemtica elementar como geometria e trigonometria certamente vai se beneficiar deste material.Na elaborao do hipertexto, originalmente foram usados trechos e figuras de alguns livros e stios disponveis na Web, incluindo-se stios do exterior. A traduo do ingls para o portugus, quando necessria, foi feita por estes autores. Os livros e sites da Web de onde foram retiradas partes dos contedos que originalmente compunham o hipertexto, so os seguintes: Boczko, I., Conceitos de Astronomia; Gemael, C., Astronomia Esfrica;

Hatschbach, F., Determinaes Astronmicas;

Astronomy 250 lecture notes. Endereo na Web:

;

Tutorials for Astronomy. Endereo na Web: ;

Roy Fisher's Earth Rotation and Equatorial Coordinates web page. Endereo na Web: ;

Terry Moore's web page on Coordinate Systems, Frames and Datums. Endereo na Web: ;

Tanto o hipertexto quanto o livro evoluram com o tempo, sendo que a elaborao da verso impressa, resultado de um projeto apoiado pelas Pr-Reitorias de Ensino e Pesquisa da UFRGS, foi um dos principais impulsionadores deste processo de aprimoramento. O material aos poucos foi sendo modificado e adaptado por estes autores, levando-se em conta os contedos da disciplina de Astronomia Geodsica I e II, do curso de Engenharia Cartogrfica da UFRGS, alm das demais disciplinas oferecidas pelo Departamento de Astronomia desta universidade. Figuras semelhantes s originais, por vezes melhoradas, bem como figuras novas, foram confeccionadas em sua maior parte por Adriano Salviano, formando de Engenharia Cartogrfica da UFRGS e co-autor desta verso impressa principalmente na parte de Sistema Geodsico de Referncia. Mudanas no texto e no ordenamento da exposio dos tpicos abordados se deveram em parte s novas figuras, mas tambm ao prprio processo de aprofundamento didtico dos autores. Todos os captulos do texto foram ampliados com relao verso original, em especial os captulos conceituais e o captulos de problemas com solues. O Captulo 5 em diante so, na verdade, um diferencial importante deste livro didtico, pois enfatizam a prtica astronmica, dando assim maior clareza aos conceitos tericos apresentados.Baslio Santiago

Adriano Salviano

CAPTULO 1CONCEITOS FUNDAMENTAIS E SISTEMAS DE COORDENADAS

Introduo Astronomia GeodsicaO simples ato de olhar para o cu noturno, em uma noite sem nuvens e longe das luzes da cidade, e nele identificar o grande nmero de estrelas de variados brilhos e cores, se constitui em uma forma primitiva de praticar a Astronomia de Posio. Quem no teve a experincia de ver uma "estrela cadente", ou presenciar subitamente algum fenmeno no cu (passagem de um satlite, balo meteorolgico ou mesmo um avio, aparente mudana de brilho de uma estrela, etc) e tentar descrever a outra pessoa em que posio do cu isso aconteceu? Em geral, para o leigo, este tipo de experincia leva ao uso das mos: a primeira reao apontarmos para a direo onde se deu o fenmeno. J outras pessoas podem tentar usar estrelas vizinhas ao ponto ou regio do cu em questo. O fato que a necessidade de localizar e identificar objetos no cu acompanha a civilizao humana desde o seu incio.

Na Antigidade, a identificao de estrelas especficas no cu logo ao anoitecer ou amanhecer, ou mesmo a posio do Sol no cu com relao a marcos de referncia em terra eram usados para marcar a sucesso das estaes de calor ou frio, de secas ou cheias. Para facilitar seu trabalho, muitos povos usavam as estrelas mais brilhantes do cu, juntamente com um pouco de imaginao, para formar figuras familiares, de animais conhecidos, figuras de sua mitologia, ou cenas cotidianas no cu noturno. Essas figuras, as constelaes, j representam um avano na prtica da Astronomia de Posio. Ao invs de apontar o dedo na direo de um certo fenmeno ou objeto celeste, o reconhecimento das constelaes no cu permitia localizar este fenmeno ou objeto simplesmente fazendo meno constelao cujas estrelas o circundavam.

Apesar do apelo que tm junto s pessoas (todos ns j ouvimos falar de constelaes como o Cruzeiro do Sul, Escorpio, Sagitrio, Touro, etc) atualmente a Astronomia de Posio faz pouco uso delas. O motivo para o pouco uso das constelaes pode ser conhecido se nos dispusermos a passar uma noite olhando para o cu e tentando identificar as constelaes nele presentes com o auxlio de um mapa celeste. No mapa, as estrelas que compem a figura de cada constelao esto ligadas por linhas, de forma que, com alguma boa vontade, podemos identificar as formas dessas figuras que lhes do o nome. Mas ao olharmos para o cu noturno a coisa se complica e muito. O que vemos simplesmente um monte de estrelas, algumas mais brilhantes, outras menos, algumas avermelhadas, outras azuladas ou bem brancas. Aquelas figuras marcadas na carta celeste simplesmente no se materializam facilmente aos nossos olhos no cu acima de ns. Uma explicao para este fato poderia ser a de que as constelaes que os mapas celestes descrevem at hoje so as mesmas que os gregos e romanos antigos identificaram. Figuras como o Sagitrio, Centauro, Pgaso, Andrmeda, Cassiopia, etc, fazem parte da cultura deles e no da nossa! Mas a verdade que somente com muito treino poderamos comear a separar a confuso de estrelas que vemos no cu em figuras distintas, mesmo que tentssemos identificar coisas bem familiares no cu, como por exemplo, o Cristo Redentor, o Po de Acar, o elevador Lacerda em Salvador, o prdio do Congresso Nacional em Braslia, o mapa do Brasil, o smbolo da CBF, uma cuia de chimarro, animais domsticos como cachorros, gatos, bois, o que for!

Atualmente, ns temos meios mais eficazes de localizar um astro no cu. Eficaz aqui significa objetivo e simples; na verdade to objetivo e simples quanto a Matemtica que aprendemos no ensino bsico. A posio de um astro no cu pode ser estabelecida por meio de um sistema de coordenadas. Nas pginas que se seguem, ns vamos descrever os sistemas de coordenadas mais usados em Astronomia de Posio, em especial o Sistema Horizontal de Coordenadas e o Sistema Equatorial de Coordenadas. Estes sistemas, assim como os demais que veremos adiante, so todos de um mesmo tipo: a posio de uma estrela no cu pode ser definida pela especificao do valor de dois ngulos, um deles contado ao longo de um plano de referncia, variando de 0 a 360, e o outro contado a partir deste mesmo plano, variando de 90 a 90. Estes sistemas so chamados de Sistemas de Coordenadas Esfricas.

Antes de introduzirmos os sistemas horizontal e equatorial de coordenadas, contudo, faz-se necessrio estabelecer alguns conceitos elementares. Quando apontamos o dedo para alguma estrela, estamos escolhendo uma direo no espao. Todos os pontos situados ao longo da reta que, partindo de ns, passa pelo nosso brao a atinge a estrela, esto na mesma direo no espao. Mas onde ao longo desta reta est localizada a estrela? Esta pergunta inteiramente anloga a perguntarmos "a que distncia est essa estrela de ns?". Para uma estrela "prxima", o tamanho do segmento de reta que nos une a ela ser menor do que no caso de uma estrela "distante". Uma mesma direo no espao pode conter mais de uma estrela, situadas a diferentes distncias.

O fato que as estrelas esto to distantes de ns que, para o efeito de sua localizao no cu, podemos considerar que elas esto a uma distncia infinita! O que queremos dizer com isso que em Astronomia de Posio estamos apenas preocupados em caracterizar a direo na qual se encontram os astros. No nos interessa aqui a sua distncia, bastando para ns aceitar que esta distncia muito maior do que as distncias com que lidamos em nossas vidas cotidianas, ou mesmo do que o tamanho da Terra. Essa concluso nos permite definir ento a esfera celeste. Trata-se de um conceito abstrato, mas muito importante: a esfera celeste nada mais do que uma forma de atribuir uma forma material ao cu de um observador. A esfera celeste tem raio infinito e centro no observador. Mas como seu raio infinito, qualquer observador situado sobre a superfcie da Terra pode se considerar igualmente situado em seu centro. Qualquer objeto celeste (Sol, Lua, planetas, estrelas, o que for) em um dado instante est situado em um ponto da esfera celeste. Este ponto resulta do prolongamento ad infinitum da direo no espao na qual vemos o objeto.

Podemos desenhar crculos na esfera celeste. O exemplo mais fcil o crculo do horizonte. O horizonte um crculo sobre a esfera celeste que a divide ao meio: o hemisfrio que est acima do horizonte a parte visvel da esfera celeste. S conseguimos ver no cu os astros que esto no hemisfrio visvel, acima do horizonte. A metade abaixo do horizonte, obviamente, no conseguimos observar. O Sol, por exemplo, quando est acima do horizonte de um observador, ilumina tudo sua volta, caracterizando o dia; quando o Sol est abaixo do horizonte, temos obviamente menos claridade, o que significa uma situao de noite. Aos crculos que, como o horizonte, dividem a esfera celeste ao meio chamamos de grandes crculos ou crculos mximos. Ao longo do nosso estudo, deparar-nos-emos com outros exemplos de grandes crculos como o equador celeste, o meridiano astronmico e a eclptica. Estes sero discutidos em mais detalhe ao longo do livro, mas podemos adiantar que o primeiro divide a esfera celeste em dois hemisfrios: o norte e o sul celestes. J a eclptica um grande crculo no cu percorrido pelo Sol ao longo de um ano.

Na verdade, todos os pontos e crculos que definimos sobre a superfcie da Terra podem ser prolongados ad infinitum at encontrarem a esfera celeste. Assim podemos no apenas falar de Equador celeste e de hemisfrios norte e sul celestes, mas tambm de plos norte e sul celestes, paralelos celestes (assim como os paralelos ao Equador da Terra) e meridianos celestes. Quanto a estes ltimos, o meridiano astronmico de um observador, mencionado acima, nada mais do que a projeo na esfera celeste do meridiano geogrfico do mesmo.

Sistema Horizontal de CoordenadasA figura I.1.1 abaixo ilustra o sistema de coordenadas horizontais. Na figura vemos a metade da Abbada Celeste (= Esfera Celeste) visvel ao observador situado em O. A posio da estrela est marcada por E. O Znite do observador indicado por Z. O znite o ponto da esfera celeste acima da cabea do observador. De maneira mais tcnica podemos defini-lo como sendo o ponto da esfera celeste que resulta da extenso ad infinitum da vertical do observador. Assim sendo, a direo de Z perpendicular ao Plano Horizontal do observador, no qual se situam os pontos cardeais: Norte (N), Leste (E), Sul (S) e Oeste (W).

O plano que contm tanto os pontos cardeais N e S quanto o znite Z o Plano Meridiano, cuja interseco com a Esfera Celeste define o Meridiano Astronmico do observador. Este ltimo, por vezes chamado de Linha Meridiana, divide a esfera celeste ao meio, sendo portanto um grande crculo. Analogamente, a interseco do plano horizontal do observador com a esfera celeste o horizonte do observador, novamente um crculo mximo da esfera celeste. As duas metades da esfera celeste definidas pelo horizonte so o hemisfrio visvel (acima do horizonte e que contm o znite) e o hemisfrio invisvel (abaixo do horizonte). A figura I.1.1, como j dissemos, representa apenas a metade visvel da esfera celeste. Como o meridiano astronmico no todo disponvel observao, alguns autores preferem definir como meridiano astronmico apenas o semicrculo meridiano situado acima do horizonte. Outros fazem referncia a este ltimo como sendo o Meridiano Superior ou ainda, Semimeridiano Superior.

O plano que contm o observador O, o znite Z e a estrela E chamado de Vertical da Estrela. A interseco do vertical da estrela com a esfera celeste define o Crculo Vertical da mesma.

Figura I.1.1 Sistema de coordenadas horizontais.

Pois bem, podemos situar qualquer ponto na esfera celeste com duas coordenadas. No caso do sistema horizontal essas coordenadas so a altura h e o azimute A. Pela figura I.I.1 vemos que a altura o ngulo entre a direo estrela (segmento de reta OE) e o plano do horizonte. A altura arbitrada como sendo positiva para pontos da esfera celeste situados acima do horizonte e negativa para aqueles abaixo do horizonte. J o azimute o ngulo, contado ao longo do plano horizontal, entre o plano meridiano e o vertical da estrela. A origem da contagem de A (ou seja, A = 0) em geral arbitrada como sendo o ponto cardeal norte (N); mas alguns autores preferem usar o ponto cardeal Sul (S). comum tambm se substituir a altura h pela distncia zenital z; esta ltima o ngulo entre a direo vertical (ou seja, OZ) e a direo estrela. Fica claro, tanto pelas definies quanto pela figura, que a altura e a distncia zenital so ngulos complementares, ou seja:

h + z = 90

Azimute e altura geralmente so definidos de forma que seus valores possam variar dentro dos seguintes domnios:

Valores negativos de altura se aplicam a objetos abaixo do horizonte, sendo z > 90 neste caso.

Para fins de fixao, procuremos agora responder s seguintes perguntas:

1 Qual a altura de um objeto exatamente no horizonte do observador?

2 Qual a altura de uma estrela que esteja no nadir, ou seja, no ponto da esfera celeste diametralmente oposto ao znite?

3 Qual o azimute de um astro que se situa no meridiano astronmico do observador, entre o znite e o ponto cardeal norte?

4 Qual a altura de um astro cuja distncia zenital z = 40?

5 Qual o azimute de uma estrela cujo vertical contm o ponto cardeal leste (E)?

A figura I.1.2 mostra o sistema horizontal por uma outra perspectiva. No painel da esquerda vemos a definio da altura h do ponto de vista de algum que se situa no plano do horizonte. J o painel da direita mostra a definio do azimute A partir de uma perspectiva de quem olha para o plano horizontal de cima, ou seja, ao longo da vertical do observador.

Figura I.1.2 definio da altura h e do azimute A.Uma observao importante sobre o sistema horizontal que as coordenadas de um objeto mudam com o passar do tempo. fcil constatar isso, pois sabemos que, devido rotao da Terra, os astros se movem lentamente de leste para oeste. Ao nascer a leste do meridiano astronmico, qualquer estrela ter necessariamente um azimute no domnio 0 A 180. J ao se por a oeste do meridiano do observador, seu azimute ser 180 A 360. A altura (ou distncia zenital) obviamente tambm varia: tanto ao subir no horizonte a leste quanto ao baixar a oeste, a altura de uma estrela nula (h = 0). No intervalo entre estes dois instantes, o objeto obviamente est acima do horizonte e temos, portanto h > 0. Na verdade, veremos mais adiante que o movimento diurno de um astro tem a forma de um crculo na esfera celeste. Em geral, parte deste crculo est acima do horizonte e parte abaixo dele. A figura I.1.3 ajuda a visualizar um arco diurno tpico descrito por uma fonte celeste. Novamente, vemos apenas a parte do arco diurno que est acima do horizonte do observador.

Figura I.1.3 exemplo de arco diurno descrito por um astro.Note que na Figura I.1.3 os pontos em que o arco diurno cruza com o horizonte no coincidem com os pontos cardeais leste (L) e oeste (W). De fato, veremos mais adiante que poucos astros nascem (se pem) exatamente em L (W).

Alm de variar com o tempo, as coordenadas horizontais de uma fonte astronmica tambm dependem da posio do observador na superfcie da Terra. O fato de esta ltima ser de tamanho desprezvel comparada com as distncias s fontes astronmicas implica que a direo fonte no espao independe da posio do observador. Por outro lado, a direo da vertical do observador claramente depende de onde na superfcie da Terra ele est. A situao retratada na figura I.1.4, que mostra dois observadores situados em um mesmo meridiano geogrfico, mas em pontos distintos da superfcie da Terra. A direo estrela a mesma independentemente do ponto de observao sobre a Terra, sendo esta direo representada pelas retas paralelas da figura. Mas as verticais dos observadores, que pode ser aproximada como a reta originada no centro da Terra e que passa pelo observador, aponta em direes diferentes. Em outras palavras, os znites Z1 e Z2 dos observadores claramente correspondem a direes distintas no espao. O plano horizontal de cada observador perpendicular vertical e, portanto tambm varia de orientao no espao. Nota-se que a altura da estrela medida pelo observador O1 bem menor do que aquela medida por O2. Na figura, PNG e PSG correspondem aos plos norte e sul geogrficos, respectivamente.

Figura I.1.4 Variao da direo vertical e do plano horizontal com a posio do observador na TerraNa prxima seo veremos um sistema de coordenadas que no depende do tempo ou da localizao do observador na superfcie da Terra.Sistema Equatorial de CoordenadasJ havamos mencionado que os pontos e crculos que so definidos sobre a superfcie da Terra tm seus equivalentes na esfera celeste. Esta situao retratada na figura I.1.5, na qual vemos uma representao da Terra (esfera interna) e da esfera celeste (esfera externa). Note que esta ltima tem raio infinito, o que obviamente impossvel de reproduzir na figura. Mas o importante da figura o fato de permitir a visualizao dos equivalentes celestes ao equador e plos geogrficos. Eles so naturalmente chamados de Equador Celeste e Plos Celestes norte e sul.

Figura I.1.5 Equador e plos celestes.O fato de haver um nico plano equatorial, reconhecido como tal por todos os observadores em Terra, independente de onde estejam na sua superfcie, constitui-se na condio bsica para a definio de um sistema de coordenadas que seja universal, ou seja, utilizvel por todos os observadores e cujas coordenadas, para uma dada fonte, tenham o mesmo valor, independentemente de quem as mede. Este o Sistema Equatorial (ou Uranogrfico) de Coordenadas. Este sistema de coordenadas vem sendo usado desde que os primeiros catlogos de estrelas foram criados.

O sistema equatorial de coordenadas, assim como o horizontal, tambm baseado em dois ngulos: a Ascenso Reta e a Declinao . Outra semelhana entre os dois sistemas o fato de ambos serem definidos a partir de um plano de referncia. No sistema horizontal este plano o Plano Horizontal do observador. No sistema equatorial, como novamente implcito pelo prprio nome, o plano de referncia o plano que contm o equador da Terra e o equador celeste, ou Plano Equatorial. Na verdade, um observador atento vai notar que h uma enorme semelhana formal entre os sistemas horizontal e equatorial.

Na figura I.1.6 abaixo vemos uma representao grfica do sistema equatorial, onde T o observador e E uma estrela. Tambm indicamos a posio do Plo Norte Celeste (PNC). O plano perpendicular direo que conecta o observador a este ltimo o plano equatorial. A interseco entre o plano equatorial e a esfera celeste o grande crculo chamado de Equador Celeste.

A declinao definida como o ngulo entre o plano equatorial e a direo estrela (segmento TE da figura). Analogamente ao caso horizontal, o sinal de caracteriza os pontos dos diferentes hemisfrios separados pelo plano de referncia: (corresponde a pontos a norte (sul) do equador celeste. Uma estrela sobre o equador celeste tem declinao = 0. J o conjunto de todos os pontos cuja declinao constante chamado de Paralelo Celeste ou Paralelo de Declinao . O complemento da declinao, representado pelo ngulo p na figura, se chama Distncia Polar, sendo, como implica o prprio termo, o ngulo entre a direo estrela e a direo ao plo norte celeste (segmento de reta TPNC). A distncia polar desempenha, no sistema equatorial, o mesmo papel que a distncia zenital no caso das coordenadas horizontais. Podemos ento escrever:

p = 90

Figura I.1.6 Sistema de coordenadas equatoriais.J a ascenso reta, analogamente ao azimute no sistema horizontal, contada ao longo do plano de referncia. Logo a origem da contagem da ascenso reta () necessariamente um ponto sobre o equador celeste. Este ponto representado por na figura I.1.6. O ponto (ou Ponto Vernal ou ainda Ponto de ries) um dos dois pontos da esfera celeste que pertence tanto ao equador celeste quanto eclptica (ver seo sobre movimento anual do Sol). A ascenso reta definida como o ngulo entre o plano que contm PNC, T e e o plano que contm PNC, T e a estrela E (ver figura I.1.6). A interseco deste ltimo (primeiro) plano com a esfera celeste define um grande crculo chamado de crculo horrio da estrela (do ponto vernal). Os pontos sobre o crculo horrio da estrela tm o mesmo valor de Vemos pela figura que a ascenso reta contada para leste e pode assumir valores entre 0 360. comum, no entanto, exprimirmos a ascenso reta em unidades de tempo. Se atribuirmos um domnio de 24h ao domnio de valores de acima, teremos 1h = 15. Por exemplo, os pontos sobre o crculo horrio do ponto tm h. Esta relao entre ascenso reta e tempo ficar mais ntida adiante, quando discutirmos o conceito de ngulo horrio e as diferentes definies de sistemas de tempo.

ngulo horriongulo horrio H de um astro o ngulo entre o crculo horrio deste astro e o meridiano astronmico do observador. Este ngulo, assim como a ascenso reta, tambm contado sobre o equador celeste, variando de 0 H 360. A figura I.1.7 muito semelhante figura I.1.6. A diferena a incluso do meridiano astronmico do observador na figura. Conforme explicado anteriormente, o meridiano o grande crculo no cu que contm o znite e os pontos cardeais norte e sul. O meridiano necessariamente contm tambm os plos celestes norte e sul. Na figura vemos que o ngulo horrio cresce, a partir do meridiano, em direo oposta ascenso reta. H cresce para oeste, acompanhando o movimento diurno dos astros (de leste para oeste). J cresce para leste, seguindo o movimento anual do Sol. Note que enquanto a ascenso reta e a declinao formam o sistema de coordenadas equatoriais ou uranogrficas, o ngulo horrio H, juntamente com a declinao forma o sistema horrio de coordenadas.

Figura I.1.7 Sistema horrio de coordenadas. precisamente o fato de acompanhar o movimento diurno dos astros que torna H um indicador til para contagem de tempo. Por exemplo, se num dado instante uma estrela est no meridiano astronmico de um observador, seu ngulo horrio H = 0. Um dia depois, aps a Terra dar um giro completo em torno de seu eixo, a estrela estar novamente passando pelo meridiano do observador. Durante estas duas passagens meridianas, o ngulo horrio da estrela ter variado de 0 a 360. Podemos, portanto, definir a hora do dia com base no ngulo horrio do astro. Da o nome!

A verdade que o cu um imenso relgio, do qual os astros so os ponteiros. A partir da posio destes ponteiros podemos ento obter uma medida da hora. Por exemplo, define-se Hora Sideral (S) como sendo simplesmente o ngulo horrio do ponto vernal (ponto Pela figura I.1.7, vemos ento que:

S = H= H* + onde H* e se referem a uma estrela qualquer.

Podemos ento definir como Dia Sideral o intervalo de tempo necessrio para que o ponto vernal passe duas vezes pelo meridiano de um observador qualquer. Em outras palavras, o intervalo decorrido entre duas passagens meridianas do Ponto Podemos tambm usar o ngulo horrio do Sol como indicador da hora. Uma vantagem bvia de faz-lo reside no fato de que o Sol facilmente localizvel no cu, o mesmo no se aplicando ao ponto vernal. A Hora Solar (M) ento dada pela expresso:

M = Hsol + 12h

onde Hsol o ngulo horrio do Sol em um dado instante. O acrscimo de 12h serve simplesmente para fazer com que a passagem meridiana do Sol (Hsol = 0h) corresponda ao meio-dia (M = 12h) e no meia-noite. Novamente podemos falar de dia solar como sendo o intervalo de tempo decorrido entre duas passagens consecutivas do Sol pelo meridiano de um observador.

Por estar a Terra orbitando em torno do Sol ao mesmo tempo em que gira em torno de seu eixo de rotao, os dias solar e sideral no tm a mesma durao. Como o sentido de ambos os movimentos o mesmo (anti-horrio se visto do norte e horrio se olhamos do sul) fcil provar que o dia solar um pouco mais longo do que sideral:

Dia solar = 24h solares.

Dia sideral = 24h siderais = 23h 56min 04s solares.

Mais adiante, no Captulo 3, voltaremos a discutir, em mais detalhe, os sistemas de marcao de tempo usados em Astronomia.

Para fins de fixao, veja se consegue responder as perguntas abaixo.

1) Qual o valor de declinao do Plo Sul Celeste? E qual o valor de para o Plo Norte Celeste?

2) Qual o valor de de um ponto cujo crculo horrio faz um ngulo de 180 com o crculo horrio do ponto vernal?

3) Qual o valor de de uma estrela situada 45 a sul do equador celeste?

4) Seja um observador situado no plo norte geogrfico da Terra. Que ponto de referncia do sistema equatorial se situa no znite deste observador? Qual a declinao de um ponto cuja distncia zenital medida por este observador 30?

5) Qual o valor de distncia polar de uma estrela de declinao = 20? E de uma estrela com = 50?

Precesso

Finalmente, cumpre mencionar que o eixo de rotao da Terra muda de direo no espao. Por conseguinte, mudam no cu as posies dos plos celestes, do equador celeste e do ponto vernal. A este movimento chamamos de precesso do eixo (ou precesso dos equincios). Como as coordenadas equatoriais so definidas a partir destes pontos e crculos da esfera celeste, elas tambm variam com o tempo. Frmulas para calcular as coordenadas equatoriais de um astro em diferentes pocas so dadas pelo Astronomical Almanac. Essas frmulas so muito teis, pois os catlogos astronmicos geralmente listam as coordenadas das estrelas para uma poca arredondada, como 1950 ou 2000. Se quisermos localizar com preciso um objeto no cu em uma poca arbitrria, teremos necessariamente que corrigir as coordenadas catalogadas para a precesso.

A precesso do eixo muito lenta. De maneira aproximada, a variao de da ordem de 3s por ano e a de de uns 20/ano. A figura I.1.8 mostra a variao da posio dos plos celestes devida precesso. A figura da esquerda mostra a situao no presente, em que o plo norte celeste (PNC) coincide aproximadamente com a estrela Polaris. Daqui a milhares de anos, o plo celeste norte coincidir aproximadamente com a estrela Vega (figura da direita). No Captulo 4 discutiremos com mais profundidade a precesso do eixo, bem como outros movimentos que levam a variaes nas coordenadas equatoriais das estrelas.

Figura I.1.8 Precesso do eixo de rotao terrestre.

Relao entre os Sistemas Horizontal e Equatorial de CoordenadasVimos que o sistema de coordenadas horizontais ou altazimutais baseado no plano do horizonte e na vertical do observador. Por serem a horizontal e a vertical fceis de localizar, este sistema de coordenadas o mais fcil de se visualizar e suas coordenadas so mais diretamente mensurveis. tambm mais fcil montar um teodolito ou telescpio de forma que ele se mova horizontal e verticalmente. Portanto, quase todos os instrumentos de medida astronmica tm montagem altazimutal.

Por outro lado, vimos que, contrariamente s coordenadas equatoriais, as coordenadas horizontais de um astro mudam com a posio do observador e com a hora do dia. Isso porque o sistema equatorial baseado em pontos e crculos que so universalmente reconhecidos por qualquer observador na superfcie da Terra. J conceitos como o plano horizontal e direo vertical so relativos. Computadores podem ser programados para transformar coordenadas de um sistema para outro. Essas transformaes podem ser deduzidas usando-se frmulas de trigonometria esfrica. Como as coordenadas horizontais variam rapidamente com o tempo, e tambm dependem de onde se encontra o observador, essas transformaes tambm envolvem coordenadas temporais, como o ngulo horrio, e a latitude do observador, A Trigonometria Esfrica ser discutida no Captulo 2. Uma compilao mais extensa de frmulas de Trigonometria Esfrica pode ser obtida no livro Conceitos de Astronomia, de R. Boczko. Outra boa compilao pode ser obtida em Astrophysical Formulae, de K. Lang, p. 504.

Uma dificuldade comum consiste em sermos capazes de visualizar, ao mesmo tempo, os pontos e crculos pertinentes tanto ao sistema horizontal quanto ao sistema equatorial de referncia. Tentamos fazer isso na figura I.1.9. A figura mostra o plano que contm o meridiano geogrfico de observadores situados nos pontos O1 e O2 sobre a superfcie da Terra. So indicados o eixo de rotao da Terra, ligando os plos geogrficos norte (PNG) e sul (PSG), bem como o Equador geogrfico. Sabemos pela figura I.1.5 que o prolongamento do eixo de rotao leva aos plos celestes e que a projeo do Equador define o seu correspondente celeste.

Figura I.1.9 Pontos e crculos de referncia aos Sistemas Horizontal e Equatorial de coordenadas.O plano horizontal do observador em O1, assumindo-se a Terra como esfrica e de densidade uniforme, simplesmente o plano tangente superfcie da Terra em O1, tal como indicado. J a vertical do observador ser o prolongamento da reta que liga o centro do planeta (C) ao observador, apontando na direo do znite (Z1). O ngulo entre esta reta e o plano equatorial , por definio, a latitude () de O1. Como a vertical perpendicular horizontal, o mesmo acontecendo com a direo dos plos celestes com relao ao equador celeste, fica evidente pela figura que a altura do plo celeste visvel do observador (no caso de O1 na figura o plo celeste norte, PNC) igual latitude do observador. Note que para O1 o plo elevado (acima do horizonte) o celeste norte, enquanto que para O2, por situar-se a sul do equador da Terra, o plo celeste elevado o sul. Para O2, portanto, a igualdade entre a altura do plo elevado e a latitude uma igualdade em mdulo, com sinais algbricos opostos.

Outros sistemas de coordenadasCoordenadas EclpticasEste um sistema cujo plano de referncia o da eclptica, ou seja, o plano que contm o caminho descrito pelo Sol no cu ao longo de um ano. Este sistema usado com freqncia em Astronutica, por exemplo, para expressar e manter a posio e orientao de uma nave com relao ao Sol. Latitude e Longitude Eclpticas so usualmente expressas em graus e so mais comumente usadas em Astronomia do Sistema Solar. A primeira ( a altura do astro com relao ao plano da eclptica (ver figura I.1.10 abaixo). J a longitude eclptica (L) contada ao longo deste plano, com origem no ponto Transformaes entre este sistema e os demais podem ser encontradas em Conceitos de Astronomia, de R. Boczko ou em Astrophysical Formulae, de K. Lang, p. 504.

Figura I.1.10 Sistema de Coordenadas EclpticasCoordenadas GalcticasMais um sistema de coordenadas esfricas, anlogo aos demais. Ele representado na figura I.1.11. Desta vez o plano de referncia o plano do disco da Via-Lctea, a galxia a que pertence o nosso Sistema Solar. Este plano faz um ngulo de 6232' com o plano equatorial. A Longitude Galctica (l), contada ao longo do plano do disco, tem origem na direo ao centro da Galxia. Note que difcil definir o centro da Via-Lctea, o que torna este sistema sujeito a revises mais freqentes do que os anteriores. A Latitude Galctica usualmente denotada pela letra b, podendo, assim como a declinao, a altura e a latitude eclptica, assumir valores entre 90 < b < 90. A direo ao centro da Galxia (ou seja, l = 0 e b = 0) situa-se na constelao de Sagitrio, ao passo que o plo norte galctico (ou seja, b = +90) fica na constelao da Cabeleira de Berenice. Este sistema de coordenadas mais aplicado em estudos que envolvem a distribuio de objetos dentro da Via-Lctea. Consulte o livro do Lang para ver transformaes entre este sistema e o equatorial.

Figura I.1.11 Sistema de Coordenadas Galcticas.Fundamentos de GeodsiaHistria da GeodsiaNs temos, por sculos, nos preocupado com a Terra sobre a qual vivemos. Em passado remoto, esta preocupao se limitava a mapear a vizinhana imediata de nossas casas; com o tempo, foi se tornando til, e mesmo necessrio, localizar e mapear outras regies, para fins de rotas comerciais e de explorao. Finalmente, com o aumento da capacidade de se transportar a grandes distncias, surgiu o interesse em se estabelecer a forma, o tamanho e composio de todo o planeta.

Os gregos dos perodos arcaico e clssico tiveram idias variadas quanto forma e tamanho da Terra. Homero sugeriu uma forma de um disco plano; Pitgoras e Aristteles advogavam uma forma esfrica. Pitgoras era um matemtico que considerava a esfera a figura geomtrica mais perfeita, sendo para ele, portanto, natural que os deuses dessem esta forma ao mundo. J Anaxmenes acreditava que a Terra tinha uma forma retangular.

A idia de uma Terra esfrica foi predominante entre os gregos. A tarefa seguinte e que ocupou muitas mentes foi a de determinar seu tamanho. Plato estimou a circunferncia da Terra como sendo de umas 40.000 milhas. Arquimedes estimou em 30.000 milhas. Estes valores, contudo, no passavam muito do campo da mera especulao. Coube a Eraststenes, no sculo II a.C., determinar o tamanho da Terra usando medidas objetivas.

Ele notou que no dia do solstcio de vero os raios solares atingiam o fundo de um poo em Siena (atual Assuan, no Egito) ao meio dia. No mesmo instante, contudo, o Sol no estava exatamente no znite na cidade de Alexandria, a norte de Siena; pelo tamanho da sombra que o Sol projetava, Eraststenes determinou o ngulo de incidncia dos raios solares: 7 12, correspondendo a 1/50 de um crculo. Conhecido o arco de circunferncia entre as duas cidades, ou seja, a distncia entre elas, Eraststenes pode ento estimar a circunferncia do globo. A distncia era de umas 500 milhas (na direo nortesul). Se essa distncia corresponde a 1/50 da circunferncia da Terra, esta deveria ter ento 50 x 500 = 25.000 milhas de circunferncia. Este um valor bastante prximo do valor mais atual (24.901 milhas, valor adotado no World Geodetic System). A figura I.1.12 ilustra o mtodo usado por Eraststenes. Nela vemos raios solares paralelos incidindo sobre as duas cidades, sendo que em Alexandria o ngulo com relao vertical no nulo, mas de 712.

Figura I.1.12 mtodo de Eraststenes para medir a circunferncia da Terra.A preciso de medida de Eraststenes incrvel considerando-se todas as aproximaes embutidas no seu clculo. Siena na verdade no est exatamente no trpico de Cncer (ou seja, os raios solares no so estritamente perpendiculares superfcie no solstcio de vero), sua distncia a Alexandria de 453 milhas (ao invs de 500 milhas) e as duas cidades no esto alinhadas na direo nortesul; todos estes fatores contribuem para diminuir a preciso da medida.

Outro Grego antigo a estimar o tamanho do globo foi Posidnio. Ele utilizou uma estrela que era circumpolar, ou seja, que estava sempre acima do horizonte, quando vista da cidade de Rodes, tangenciando o horizonte no instante da culminao inferior (ver Captulo 2). Esta mesma estrela teve ento sua altura medida em Alexandria e, conhecida, a distncia entre as duas cidades, foi possvel a Posidnio determinar um valor de 24.000 milhas para a circunferncia da Terra. Outro filsofo grego revisou o mtodo de Posidnio e encontrou um valor substancialmente menor: 18.000 milhas. Este valor foi o adotado por Ptolomeu, cujo trabalho e modelo de cosmos foi adotado na Europa ao longo da Idade Mdia. Foi possivelmente graas a esta subestimava da circunferncia do globo que Cristvo Colombo foi levado a crer que o Extremo Oriente estaria a apenas umas 3 ou 4 mil milhas a oeste da Europa. Somente no sculo 15 que o valor aceito por Ptolomeu foi revisado pelo cartgrafo finlands Mercator.

O advento do telescpio, de tabelas logartmicas e do mtodo da triangulao foram contribuies do sculo 17 cincia da Geodsia. Nesta poca, o Francs Picard fez medidas de arcos que podem ser consideradas modernas. Ele mediu uma linha de base usando traves de madeira e um telescpio para medir ngulos. Cassini posteriormente extendeu o mtodo de Picard, fazendo medidas de linhas de base maiores e tanto a sul quanto a norte de Paris. Quando computou o comprimento das linhas de base equivalentes a um ngulo de 1, Cassini notou que estas eram maiores na direo sul do que no norte. Tal resultado foi o primeiro indcio de um desvio da forma da Terra com relao a uma esfera.

A figura da TerraA expresso figura da Terra tem significados diversos em Geodsia de acordo com o contexto e com o grau de preciso com que se deseja definir a tamanho e a forma do planeta. A verdadeira superfcie topogrfica bem diversificada, com sua variedade de formaes de solo e reas lquidas. nessa superfcie, na verdade, que as medidas so feitas. Ela no , contudo, adequada para clculos matemticos exatos, pois as frmulas necessrias para acomodar as irregularidades exigiriam uma quantidade proibitiva de parmetros e clculos. A superfcie topogrfica , em geral, preocupao de topgrafos e de hidrgrafos.

O conceito esfrico de Pitgoras oferece uma superfcie simples e fcil de se lidar matematicamente. Muitos clculos astronmicos e de navegao fazem uso desta representao da superfcie da Terra. Ainda que uma esfera seja uma aproximao fiel e satisfatria em muitos casos, para geodesistas interessados em medidas de grandes distncias, envolvendo continentes e oceanos, uma figura mais exata se faz necessria. A idia de uma superfcie plana, por outro lado, ainda aceitvel em pesquisas sobre pequenas reas. Modelos planos so usados em pesquisas em rea relativamente pequenas, sem nenhuma correo para a curvatura da Terra. Um levantamento de uma cidade, por exemplo, provavelmente seria levado a cabo desprezando-se tal curvatura. Para reas pequenas assim, posies relativas entre pontos podem ser determinadas com exatido sem considerar-se o tamanho e a forma do planeta.

O Elipside de RevoluoDado que a Terra ligeiramente achatada nos plos e se alarga mais no equador, a figura geomtrica regular usada em Geodsia e que mais se aproxima de sua verdadeira forma o elipside de revoluo. O elipside de revoluo a figura que se obtm ao se rodar uma elipse em torno de seu eixo menor. A figura I.1.13 mostra uma elipse e seus principais elementos.

Figura I.1.13 Semi-eixos maior a e menor b, grande normal (N) e pequena Normal N.

Caracterizados pelo semi-eixo maior a (raio equatorial), semi-eixo menor b (raio polar), achatamento (f) e excentricidade (e). Onde:

Achatamento (f): f = ; Semi-eixo maior ou raio equatorial do Elipside (a); Semi-eixo menor ou raio polar do Elipside (b); Excentricidade (e):

E as referencias ao ponto em estudo: = Grande normal, contado perpendicularmente da superfcie do elipside at o eixo menor; = Pequena normal, contado perpendicularmente da superfcie do elipside at o eixo maior.

Note que e so diferentes da Normal (N) que a altura geoidal ou ondulao geoidal, contado da superfcie do elipside at a superfcie do nvel mdio dos mares, como se no houvesse os continentes, superfcie esta conhecida como Geide, tal como explicado a seguir. e no se originam do centro do elipside, mas pela perpendicularidade superfcie do elipside, no entanto, e passam pelo centro de gravidade da Terra quando o ponto em estudo est sobre o plano equatorial ou no eixo menor.

Um elipside de revoluo univocamente determinado pela especificao de dois parmetros. Geodesistas, por conveno, usam o semi-eixo maior e o achatamento. No caso da Terra, o tamanho da figura determinada pelo raio do equador, o semi-eixo maior, representado pela letra a. A forma do elipside definida pelo achatamento, f, que indica o quanto o elipside se aproxima de uma esfera. A diferena entre um elipside de revoluo que represente a Terra e uma esfera bem pequena. Isso demonstrado pela figura I.1.14, onde vemos vrias elipses, com diferentes valores de achatamento, sendo o maior deles igual a f = 0,5 e o menor f = 1/50 = 0,02. O valor no caso da Terra ainda bem menor: f = 1/300 = 0,00333.

Figura I.1.14 elipses com diferentes achatamentos.GeideSabemos que as medidas em Geodsia so feitas sobre a superfcie aparente ou topogrfica da Terra e que os clculos tericos assumem um modelo, geralmente elipsoidal. H uma outra superfcie tambm envolvida nos clculos: O Geide. Em levantamentos geodsicos, a computao das coordenadas geodsicas de pontos feita em um elipside que aproxima com preciso o tamanho e a forma da Terra na regio considerada. As medidas, por seu turno, feitas na superfcie da Terra com determinados instrumentos se referem ao geide, tal como explicado abaixo. O elipside uma superfcie regular definida matematicamente e com dimenses especificadas. O geide, por seu turno, coincide com a superfcie mdia que os oceanos descreveriam se fossem livres para se ajustar ao efeito combinado da atrao gravitacional causada pela distribuio de massa da Terra e pela fora centrfuga resultante de sua rotao. Devido distribuio irregular da massa da Terra, a superfcie do geide irregular e, como o elipside regular, essas superfcies no so coincidentes. As diferenas so usualmente chamadas de ondulaes geoidais, alturas geoidais ou separaes geoidais.

O geide uma superfcie ao longo da qual o potencial gravitacional em todo lugar igual (ou seja, uma superfcie de isopotencial). Assim, a acelerao gravitacional sempre perpendicular superfcie geoidal. Esta ltima caracterstica particularmente importante, pois instrumentos ticos que contm mecanismos de nivelamento so comumente usados em medies geodsicas. Quando ajustadas de maneira apropriada, o eixo vertical do instrumento coincide com a direo da gravidade e , por conseguinte, perpendicular ao geide. O ngulo entre a linha de prumo que perpendicular ao geide (por vezes chamada simplesmente de vertical) e a perpendicular ao elipside (por vezes chamada de normal) definida como o desvio da vertical.

Na figura I.1.15 vemos representada a superfcie da Terra, com seu relevo irregular, um elipside que lhe serve de modelo e o geide. Vemos tambm as perpendiculares ao elipside a ao geide, e a medida do desvio, ou deflexo, da vertical mais exatamente pela sua componente meridiana .

Figura I.1.15 Representaes da superfcie da Terra: o elipside de revoluo e o geide, com suas respectivas perpendiculares em um dado ponto.

Sistema Geodsico de Referncia

Sistema Geodsico de Referncia (SGR) o elipside de revoluo, acompanhando nosso planeta em seu movimento de rotao adequando-se representao dos pontos terrestre. Podem ser geocntricos conforme a origem do terno cartesiano coincida com o centro de gravidade da Terra ou topocntrico quando o elipside de revoluo geocntrico translada at um ponto da superfcie do elipside tangenciar um ponto do Geide.

definido pelo:

Eixo Z coincidente com o eixo de rotao terrestre mdio, sentido positivo para o CTP (Conventional International Pole Plo Terrestre Convencional);

Eixo X no plano do equador terrestre mdio, e paralelo ao plano do Meridiano de Greenwich;

Eixo Y a 90 de X, de modo a tornar o sistema dextrgiro.

Caracterizado por cinco parmetros: Dois parmetros definidores do elipside de referncia: Semi-eixo maior a; Achatamento f. Trs parmetros definidores da orientao desse elipside em relao ao corpo terrestre: Latitude Geodsica o ngulo que a normal do elipside, passante pelo ponto, forma com a sua projeo equatorial Longitude geodsica o ngulo que mede o diedro formado pelos meridianos geodsicos do ponto considerado e de Greenwich, contada a partir deste, positivamente por leste Altura Geomtrica h o segmento da normal compreendido entre o ponto considerado e o elipside. Em primeira aproximao por no serem h e a altitude ortomtrica H (altura em relao ao geide) colineares.

ou

Trs Coordenadas Cartesianas terrestres mdias do Centro do Elipside (X0, Y0, Z0).

Na figura 1.1.16, podemos observar as coordenadas geodsicas, cartesianas e as alturas elipsoidal, ortomtrica e Normal, assim definido:h = altura elipsoidal;

H = altitude ortomtrica;

N = Normal.

Figura I.1.16 Coordenadas Geodsicas e Cartesiana no elipside de revoluo e as superfcies do Geide e da Terra.As coordenadas astronmicas de um ponto na superfcie da Terra diferem-se das coordenadas geodsicas com relao a altura, a primeira se refere a altitude ortomtrica e a segunda a altura elipsoidal, devido a direo da vertical (levantadas para as coordenadas astronmicas atravs de transporte da diferena de nvel em relao ao datum vertical) diferir da direo da altura geomtrica (levantadas para coordenadas geodsicas, atualmente, pela utilizao da tcnica de posicionamento atravs do sistema de satlites GPS Global Position System, Sistema de Posicionamento Global). Mas as coordenadas planimtricas tem o mesmo valor com determinado grau de acurcia, pois sabido que os levantamentos para coordenadas geodsicas so mais consistentes que os levantamentos para coordenadas astronmicas devido a tcnica de posicionamento por GPS.

Um estudo interessante, no se referindo ao caso acima, se faz na vinculao das coordenadas geodsicas e astronmicas do Sistema Geodsico de Referncia Topocntrico no ponto de tangncia do elipside transladado e o Geide, definido por Datum Horizontal visto na figura I.1.17. Neste ponto se confundem a Normal e a Vertical, com as conseqentes igualdades das coordenadas geodsicas e astronmicas. No entanto, as direes da Normal e a Vertical no so paralelas, gerando trs parmetros:

componente meridiana do desvio da vertical;

componente 1 vertical do desvio da vertical e;

N ondulao do geide no Datum horizontal, distncia entre a superfcie do elipside e o Geide.

Pode-se, ento, relacionar as coordenadas geodsicas com as astronmicas:

a

hH

Onde a e a so respectivamente as coordenadas de latitude e longitude astronmica no Datum e H a altitude ortomtrica.

Figura I.1.17 Deflexo da vertical no datum horizontal.

O Sistema Geodsico de Referncia Topocntrico, pertence ao sistema clssico de referenciamento utilizado em vrios pases, inclusive no Brasil onde conhecido por SAD69, por apresentar os data horizontal (vrtice Chu) e vertical (Imbituba) e a rede de referncia constituda pelas estaes monumentadas, as quais representam a realizao fsica do sistema. No entanto, no Brasil est em curso a migrao do Sistema Topocntrico SAD69 para o Sistema Geocntrico SIRGAS (Sistema de Referncia Geocntrico para a Amrica do Sul). Os dois Sistemas podem ser visto na figura 1.1.18.

Figura I.1.18 Elipsides de SGR local e geocntrico neste caso o SAD69 e SIRGAS.

Determinao de Posio pela AstronomiaA posio de um ponto sobre a Terra pode ser obtida diretamente pela observao de estrelas. Este mtodo de posicionamento astronmico o mais antigo de todos. Tem sido usado ao longo dos anos por navegadores e, mais recentemente, por aviadores. Exploradores freqentemente usavam o mtodo de posicionamento pelos astros para se situarem em regies no cartografadas. Geodesistas precisam de determinaes astronmicas, conjuntamente com outros tipos de dados, provenientes, por exemplo, de triangulaes e trilateraes, para estabelecer posies precisas. Posies obtidas astronomicamente e no vinculadas a levantamentos geodsicos no podem ser relacionadas umas s outras com preciso suficiente para o clculo de distncias e direes.

Como o prprio termo sugere, posies astronmicas so obtidas pelas medidas de ngulos entre uma linha de prumo (vertical) em um dado ponto e a direo a uma estrela (ou vrias), anotando-se o instante exato em que tais medidas so feitas. Ao se combinar essas observaes com dados de catlogos estelares ou anurios astronmicos, podemos ento inferir os valores de latitude e longitude do ponto de observao, aos quais chamamos de latitude e longitude astronmicas. Esta terminologia serve para diferenciar estas coordenadas daquelas baseadas em um modelo de elipside, que so ditas coordenadas geodsicas.

Podemos ento definir latitude astronmica como sendo o ngulo entre a perpendicular ao geide no ponto considerado e o plano do Equador terrestre. J longitude astronmica definida como o ngulo entre o plano do meridiano de Greenwich e o plano do meridiano que contm o ponto considerado. A figura I.1.19 ilustra estas definies.

Figura I.1.19 latitude e longitude astronmicas.A latitude astronmica pode ser determinada pela medida da altura de uma estrela na sua culminao superior, ou seja, sua altura mxima. H mtodos mais sofisticados que fazem uso de mais de uma estrela. Alguns destes mtodos sero apresentados neste livro, usando conceitos que sero apresentados no Captulo 2. Quanto longitude astronmica, sua determinao est intimamente associada medidas de tempo. Como veremos em mais detalhe no Captulo 3, a longitude astronmica de um ponto medida pela determinao da diferena de tempo (em horas, minutos e segundos) entre o instante em que uma estrela especfica faz sua passagem pelo meridiano de Greenwich e o instante em que ela passa pelo meridiano do ponto considerado. H tcnicas variadas para determinao da longitude, algumas das quais sero discutidas posteriormente. Estas tcnicas combinam medidas de tempo, em diversos sistemas de tempo (Captulo 3), com as informaes de anurios e efemrides, do local.

Outra determinao astronmica importante a do azimute de uma mira. Medidas azimutais de alta preciso so usadas no mtodo de triangulao. Novamente usando-se a figura I.1.19, o azimute astronmico de um ponto Q com relao ao ponto P definido como o ngulo entre o plano meridiano que contm P e o plano que contm tanto Q quanto a perpendicular ao geide passando por P. Este ngulo, em geral, tem origem no ponto cardeal norte e contado de 0 a 360 no sentido leste.

Observaes astronmicas so feitas com instrumentos ticos, como o teodolito, a cmara zenital ou o astrolbio, todos contendo mecanismos de nivelamento da base do instrumento. Quando nivelados de forma adequada, o eixo vertical desses instrumentos (que perpendicular sua base) coincide com a direo da acelerao gravitacional, sendo, portanto, perpendicular ao geide naquele ponto. Dessa forma, determinaes astronmicas sempre se referem ao geide. Como o geide uma superfcie irregular, as posies assim determinadas para diferentes pontos so independentes umas das outras.

CAPTULO 2ESTUDO ANALTICO DO MOVIMENTO DIURNO

Movimento diurno dos astrosAs estrelas visveis no cu noturno variam com a poca do ano, a hora do dia e com a latitude do observador.

A dependncia com a poca do ano causada pelo fato de o Sol se mover com relao s estrelas, ao longo do ano. Este movimento anual do Sol , como veremos no prximo captulo, o resultado do movimento orbital da Terra em torno do Sol. O caminho do Sol no cu em seu movimento anual se chama eclptica. Dessa forma, as estrelas que aparecem no cu noturno, ou seja, que esto longe da posio do Sol na esfera celeste, mudam lentamente ao longo do ano.

A dependncia com a hora do dia se deve rotao da Terra. De maneira geral, os astros nascem e se pem no cu medida que a Terra gira em torno de seu eixo. Como esse movimento faz com que um observador fixo na superfcie da Terra descreva um crculo no espao, os astros, vistos por este observador, descrevem tambm um crculo na esfera celeste. A este movimento chamamos de movimento diurno. A rotao se d de oeste para leste; logo, o movimento diurno dos astros no cu se d no sentido inverso, de leste para oeste. O movimento de um ponto fixo na superfcie da Terra paralelo ao equador, mantendo-se constante, portanto, a latitude do ponto. Da mesma forma, o crculo descrito por uma estrela em seu movimento diurno paralelo ao equador celeste. Portanto, no se altera a declinao da mesma (ou a sua distncia polar p). Como o ponto fixo com relao s estrelas, tambm ele se move no cu ao longo do dia. A ascenso reta ento mantida constante. Essa a grande vantagem das coordenadas equatoriais sobre as horizontais: enquanto a altura h e o azimute A de um astro variam ao longo do dia, devido ao movimento diurno, a ascenso reta e a declinao so fixas. Essas ltimas variam apenas em escalas de tempo muito mais longas, devido aos efeitos de precesso, nutao, aberrao, paralaxe e movimento prprio, que veremos em maior detalhe no Captulo 4.Passagem meridiana

Em geral, parte do crculo descrito por um astro no cu ao longo de um dia estar acima do horizonte do observador e parte dele estar abaixo. No instante em que o astro est no plano que contm o meridiano astronmico do observador, sua altura no cu um extremo. Isso acontece duas vezes em um dia sideral; na culminao superior (ngulo horrio H = 0) a altura do astro mxima, na culminao inferior (H = 180) sua altura mnima. A culminao superior a melhor ocasio para se observar o astro, j que sua altura h mxima (distncia zenital, zmin, mnima). Neste instante de passagem meridiana, podemos tambm estabelecer relaes simples envolvendo a altura hmax e declinao da estrela e a latitude do observador. O primeiro passo para isso o de construir o diagrama do plano meridiano do observador. Este mostrado na figura I.2.1. Nele vemos o observador em O, sua vertical OZ que encontra a esfera celeste no znite (Z) e os pontos cardeais Norte (N) e Sul (S), tambm pertencem ao plano meridiano o plo celeste elevado (no caso da figura o plo celeste sul, PSC) e um ponto do equador celeste que cruza o plano meridiano em EC, cuja direo , obviamente, perpendicular direo ao plo celeste. O meridiano astronmico representado pelo semicrculo no diagrama. A posio de uma estrela que faz sua culminao superior tambm mostrada, juntamente com sua declinao e sua distncia zenital z. Como latitudes e declinaes a sul so arbitradas como de valor negativo, enquanto que altura acima do horizonte e distncia zenital so sempre positivas, faz-se necessrio incluir um sinal negativo na frente de alguns ngulos mostrados, como forma de compatibilizar estas definies.

Figura I.2.1 diagrama do plano meridiano de um observador de latitude a sul do equador terrestre.Note que a figura mostra um resultado muito importante e j discutido anteriormente: a altura do plo elevado numericamente igual latitude do observador. Para enfatizarmos este resultado fazemos uso da figura I.2.2, em que vemos o plano meridiano de um observador situado no ponto O da superfcie da Terra. Nesta figura, vemos no apenas o plano meridiano, mas tambm todos os pontos na superfcie da Terra que compartilham deste plano, incluindo-se ainda o centro da Terra e os seus plos norte e sul geogrficos (PNG e PSG, respectivamente). fcil provar, usando equivalncia de ngulos correspondentes e lembrando que o eixo de rotao perpendicular ao equador e que a vertical do observador perpendicular sua horizontal, que a altura do plo celeste elevado , de fato, numericamente igual latitude.

Figura I.2.2 representao do diagrama do plano meridiano do mesmo observador que na figura anterior.Voltemos agora questo fundamental da relao matemtica envolvendo a altura hmax e a declinao da estrela e a latitude do observador. So duas as relaes envolvendo estas variveis no instante da passagem meridiana. A relao a ser usada depende da culminao superior se dar a norte (A = 0) ou a sul de znite (A = 180):

zmin (se A = 0)

zmin (se A = 180)

Essas duas frmulas podem ser facilmente deduzidas pela figura I.2.3, que mostra novamente o diagrama do plano meridiano. Note que o plo celeste elevado agora o plo celeste norte, PNC. O ponto do equador celeste que cruza o plano meridiano EC e sua direo perpendicular a PNC.

A figura mostra a situao de culminao superior de duas estrelas, uma a norte do znite (K) e a outra a sul (V). Da figura segue imediatamente que:

kzk (Ak = 0)

vzv (Av = 180)

Figura I.2.3 diagrama do plano meridiano de um observador de latitude > 0, agora mostrando as culminaes de duas estrelas: EK e EV, culminando respectivamente a norte e a sul do znite (Z).Estrelas circumpolares e estrelas invisveisConsideremos agora o efeito da latitude do observador sobre a visibilidade das estrelas. Por exemplo, estrelas muito prximas do plo norte celeste esto sempre acima (abaixo) do horizonte de observadores situados em latitudes norte (sul). Estrelas sempre acima do horizonte so chamadas de circumpolares. Estrelas sempre abaixo do horizonte de um observador so simplesmente chamadas de invisveis. Para que uma estrela seja circumpolar, a altura mnima que ela atinge durante todo o dia tem que ser positiva, ou seja, hmin > 0. A altura mnima de qualquer astro ocorre na sua culminao inferior. Pela figura I.2.4 podemos ver que a condio de circumpolaridade de uma estrela para um observador no hemisfrio norte dada por:

p = 90 > 90 .

Figura I.2.4 Diagrama do plano meridiano mostrando a regio onde se situam as estrelas circumpolares (mais escura).Na figura I.2.4, o semicrculo que passa pelos pontos cardeais Norte (N) e Sul (S) e tambm pelo znite o meridiano astronmico do observador. O plo celeste elevado o plo celeste norte (PNC), cuja direo perpendicular ao equador celeste. Este ltimo cruza o meridiano do observador no ponto EC. A altura do plo celeste visvel igual latitude do observador, sendo que a direo de PNC bissetriz do arco mostrado em tonalidade escura na figura. Este arco representa a zona ocupada pelas estrelas circumpolares para o observador em questo.

Podemos determinar nossa latitude pela observao do movimento diurno de estrelas circumpolares. O mtodo ilustrado na figura I.2.5.

Figura I.2.5 Relao entre a latitude do observador e as alturas de uma estrela circumpolar nas culminaes inferior (hi) e superior (hs).Nela vemos novamente uma representao do plano meridiano de um observador. Vemos o plo elevado (PNC), de altura igual latitude do observador. Vemos tambm as posies de uma estrela circumpolar nos momentos da culminao superior (C.S.) e inferior (C.I.). Como a declinao da estrela no muda ao longo de um dia, sua distncia polar p tambm se mantm constante. Assim, podemos ver facilmente pela figura que as alturas mxima (hs) e mnima (hi) da estrela durante seu movimento diurno podem ser expressas em funo de e p:

hi = p

hs = + p

Logo, eliminando p do sistema de equaes acima, teremos:

Para um observador no Hemisfrio Sul da Terra, a frmula praticamente a mesma. A nica diferena que temos que lembrar que, neste caso, convenciona-se que a latitude negativa, enquanto que as alturas de uma estrela circumpolar sero sempre positivas. Assim temos apenas que mudar um sinal algbrico:

Note que o plo sul celeste est sempre abaixo do horizonte do observador em questo. Estrelas suficientemente prximas a este plo estaro sempre invisveis a este observador. A situao retratada na figura I.2.6, onde vemos o valor de declinao mnimo (em mdulo) necessrio para que uma estrela seja invisvel para um observador de latitude A condio para uma estrela nunca nasa (seja invisvel) (hmax < 0):

< (90 )

Figura I.2.6 Diagrama do plano meridiano mostrando a condio de invisibilidade para um observador no hemisfrio norte terrestre.Assim, no caso de um observador cuja latitude = 45, por exemplo, estrelas com socircumpolares e estrelas com so invisveis.

As condies de circumpolaridade e invisibilidade acima se aplicam para o caso em que o observador est no hemisfrio norte da Terra (ou seja, Para o hemisfrio sul (teremosCircumpolaridade:< (90 + nvisibilidade:

> (90 + Tente desenhar diagramas do plano meridiano de um observador, semelhantes aos diagramas das figuras I.2.4 e I.2.6 acima, mas para o caso de um observador no hemisfrio sul terrestre. Ao desenh-los, lembrando das definies de plo e equador celestes e lembrando que a altura do plo sul celeste ser sempre igual ao mdulo da latitude do observador, voc dever ser capaz de deduzir as expresses acima.

Movimento diurno: exemplos do efeito da latitude do observadorDiferentes pontos na superfcie da Terra vem diferentes partes da esfera celeste. As prximas 5 figuras representam, respectivamente, situaes de observadores no plo norte da Terra (figura I.2.7), a uma latitude norte intermediria (figura I.2.8), no equador da Terra (figura I.2.9), a uma latitude sul intermediria (figura I.2.10) e no plo sul (figura I.2.11). Em cada uma das cinco figuras, a linha cinza mais grossa denota o caminho diurno descrito por uma estrela de declinao > 0 e a linha cinza mais fina representa o mesmo caminho para uma estrela de declinao < 0. Como veremos mais adiante estes caminhos representam muito bem os arcos diurnos descritos pelo Sol em um dia de junho (linha grossa) e em um dia de dezembro (linha fina). J nos equincios (aproximadamente em 21/03 e 21/09) o Sol se encontra sobre o equador celeste (linha escura), sendo este ento o caminho por ele percorrido no cu ao longo destes dias.

No plo norte geogrfico (latitude = +90, figura I.2.7), o plo norte celeste (PNC) coincide com o znite e o equador celeste coincide com o horizonte. Assim, o cu visvel exatamente o hemisfrio norte celeste. medida que a Terra gira, todas as estrelas descrevem crculos em torno de PNC, ou seja, neste caso em torno do znite. Os crculos por elas descritos so ento paralelos ao horizonte, de altura constante (esses crculos de h constante so chamados de almucntar). Nenhuma estrela, portanto, nasce ou se pe no cu. Todas as estrelas do hemisfrio norte celeste (ou seja, com > 0) so circumpolares. As estrelas com < 0 so sempre invisveis. Se o Sol tem declinao positiva, ele tambm estar sempre acima do horizonte durante todo o dia. Por exemplo, no solstcio de junho (em torno de 21/06), a declinao do Sol = 23,5, o que significa que ele estar o dia inteiro acima do horizonte, no almucntar de h = 23,5. O inverso ocorre no ms de dezembro, quando a declinao do Sol negativa. Neste caso o Sol fica abaixo do horizonte (no se v a linha cinza mais fina no diagrama) e um observador no plo norte da Terra fica ento imerso em noite constante.

Figura I.2.7 Arcos diurnos para um observador no plo norte geogrfico da Terra.A uma latitude norte intermediria (= +45, figura I.2.8), o PNC est a uma altura de 45 (a altura do plo sempre igual ao mdulo da latitude, nunca se esquea disso!). Metade do equador celeste est acima do horizonte e a outra metade est abaixo. Note que isso sempre verdade, exceto para um observador nos plos. O equador celeste cruza o horizonte nos pontos cardeais leste (E) e oeste (W). Algumas estrelas so circumpolares (aquelas com > 45) e outras nunca nascem (< 45). As demais estrelas nascem e se pem a cada dia, passando parte do dia acima e parte do dia abaixo do horizonte. O Sol, por exemplo, no satisfaz nem a condio de circumpolaridade nem a de invisibilidade. Isso significa que em qualquer dia do ano o Sol nascer e se por a esta latitude. Claro que em junho, ele est mais prximo de satisfazer a condio de circumpolaridade, ficando, portanto mais tempo acima do horizonte, enquanto que em dezembro a situao se reverte e a noite mais longa do que o dia. Note ainda que o Sol nasce a norte do ponto cardeal leste e se pe tambm a norte do ponto cardeal oeste em junho, enquanto que em dezembro tanto o nascer quanto o por do Sol se do a sul desses pontos cardeais. Finalmente, vale notar que a altura do Sol ao passar pelo meridiano maior em junho do que em dezembro. Como a incidncia dos raios solares mais perpendicular no primeiro caso do que no segundo, as temperaturas tendem a ser maior em resposta a este aumento na insolao (e tambm ao fato de o Sol passar mais tempo acima do horizonte).

Figura I.2.8 Arcos diurnos para um observador de latitude norte intermediria (= +45).Para um observador no equador de Terra (= 0. figura I.2.9), o PNC coincide com o ponto cardeal norte (N) e o plo celeste sul (PSC) coincide com o ponto cardeal sul. O equador celeste neste caso um crculo vertical, passando, portanto pelo znite. Durante um dia, medida que a Terra gira em torno do seu eixo de rotao (que liga PSC a PNC), toda a esfera celeste vai sendo revelada. No h, por conseguinte, estrelas circumpolares nem invisveis; todas as estrelas nascem e se pem para este observador de latitude nula. Em qualquer dia do ano, o movimento diurno do Sol sempre ao longo de crculos perpendiculares ao horizonte, metade dos quais est acima do horizonte. O Sol, portanto, fica sempre 12h acima e 12h abaixo do horizonte. Note que nos equincios, o Sol estando no equador celeste, ele passa pelo znite ao meio-dia. Como a insolao no muda muito ao longo do ano, as variaes sazonais de temperatura so minimizadas nas regies equatoriais.

Figura I.2.9 Arcos diurnos vistos por um observador situado sobre o equador geogrfico da Terra (= +0).Seja agora um ponto a uma latitude intermediria sul (= 45, figura I.2.10): a situao anloga ao caso da latitude intermediria norte. Mas desta vez o PSC que est a uma altura de 45. Novamente, algumas estrelas so circumpolares (aquelas com < 45) e outras nunca nascem (> +45). As demais estrelas nascem e se pem a cada dia, passando parte do dia acima e parte do dia abaixo do horizonte. O Sol novamente nasce e se pe todos os dias. Mas agora, ele fica mais da metade do dia acima do horizonte nos meses prximos a dezembro, resultando no vero no hemisfrio sul. Prximo a junho, seu caminho no cu ao longo do dia est majoritariamente abaixo do horizonte. Os pontos de nascer e ocaso do Sol novamente esto a norte ou sul dos pontos cardeais E e W, dependendo tambm da poca do ano.

Figura I.2.10 Arcos diurnos vistos por um observador situado em latitude sul intermediria (= 45) .No plo sul (latitude = 90, figura I.2.11), a situao tambm anloga ao caso correspondente a norte. O PSC agora coincide com o znite e o equador celeste coincide com o horizonte. Assim, o cu visvel exatamente o hemisfrio sul celeste. medida que a Terra gira, todas as estrelas descrevem crculos em torno de PSC, ou seja, neste caso em torno do znite. Os crculos por elas descritos so novamente almucntares e nenhuma estrela nasce ou se pe no cu: todas as estrelas do hemisfrio sul celeste so circumpolares. e todas as estrelas com > 0 so sempre invisveis. O Sol fica o dia inteiro acima do horizonte entre os dias 21/09 e 21/03, passando a ficar sempre abaixo do horizonte entre 21/03 e 21/09.

Figura I.2.11 Aarcos diurnos para um observador situado no plo sul geogrfico (= 90) .Trigonometria Esfrica

J estudamos qualitativamente o movimento diurno, concluindo que todos os astros completam diariamente um crculo paralelo ao equador celeste. Estudamos o caso particular em que um objeto atravessa o meridiano astronmico de um observador e vimos que nesta situao a sua altura no cu atinge um valor extremo (mximo na culminao superior e mnimo na culminao inferior). Alm disso, estabelecemos relaes matemticas entre a latitude do observador e a declinao e altura da estrela na passagem meridiana. Na verdade, as coordenadas de uma estrela no cu esto associadas posio do observador na superfcie da Terra em qualquer instante, mesmo fora da passagem meridiana. H relaes matemticas bem mais gerais envolvendo coordenadas horizontais, horrias e equatoriais de uma estrela e a latitude e longitude do observador. Para deduzirmos essas relaes, contudo, faz-se necessrio estudarmos um ramo da Trigonometria chamado de Trigonometria Esfrica, cuja aplicao Astronomia constitui-se no que chamamos de Astronomia Esfrica. Esta no a mais excitante das disciplinas, mas muito importante para a prtica da Astronomia, pois o cu tem geometria esfrica e no plana.

A Trigonometria Esfrica anloga trigonometria plana, mas com a diferena muito importante de ser aplicada a tringulos esfricos.

Tringulos Esfricos

Um tringulo esfrico uma figura sobre uma superfcie esfrica que resulta quando consideramos trs grandes crculos (ou crculos mximos) sobre essa superfcie. Um grande crculo qualquer crculo sobre a superfcie esfrica que a divida em dois hemisfrios. Um plano que contm um grande crculo necessariamente contm tambm o centro da esfera. A figura I.2.12 mostra um tringulo esfrico. Vemos uma esfera com centro em O e trs pontos em sua superfcie: A, B e C. Ao unirmos estes trs pontos, dois a dois, atravs de crculos mximos, formamos uma figura ABC que se assemelha a um tringulo, mas que se situa sobre a esfera: um tringulo esfrico, portanto.

Figura I.2.12 Representao de um tringulo esfrico (de vrtices A, B e C) sobre a superfcie de uma esfera.Note que um tringulo esfrico no qualquer figura de trs vrtices desenhada sobre uma esfera; para ser um tringulo esfrico esta figura tem que ter lados que sejam arcos de grande crculo. Outra observao importante sobre tringulos esfricos que tanto os seus ngulos quanto os seus lados so medidos em unidades angulares. Os lados de um tringulo esfrico so arcos de crculo mximo que, divididos pelo raio da esfera nos do o ngulo, com vrtice no centro da esfera, entre os pontos que eles ligam. J os ngulos em cada vrtice do tringulo esfrico representam a separao angular entre os planos dos grandes crculos que se interceptam naquele vrtice.

Os tringulos esfricos tm algumas caractersticas que os distinguem dos tringulos planos. Neste ltimo, por exemplo, a soma dos seus ngulos internos sempre igual a 180. No caso dos esfricos, a soma dos ngulos sempre compreendida entre 180 e 540. Existem vrios livros que abordam a Trigonometria Esfrica de uma perspectiva mais geral e aprofundada, discutindo e apresentando vrios teoremas e resultados de interesse geral sobre os tringulos esfricos. Exemplos so as apostilas sobre Trigonometria e Astronomia Esfrica de C. Gemael (UFPR) e o livro Conceitos de Astronomia, de R. Boczko. Aqui vamos adotar uma abordagem mais objetiva, voltando-nos diretamente para situaes de interesse Geodsico e Astronmico.

Na figura I.2.13 vemos um exemplo geogrfico de um tringulo esfrico. Trata-se do tringulo que tem como vrtices o plo sul geogrfico e as cidades de Rio de Janeiro e Cape Town (frica do Sul). Os lados do tringulo que ligam cada uma dessas duas cidades ao plo sul so simplesmente arcos ao longo dos seus respectivos meridianos geogrficos (arcos de grandes crculos, portanto). J o lado que liga as duas cidades tambm um arco de grande crculo.

Figura I.2.13 Exemplo geogrfico de um tringulo esfrico.Por que o estudo de tringulos esfricos importante para a Astronomia? O motivo que, em qualquer instante, exceto pela passagem meridiana, um astro forma um tringulo esfrico com o plo celeste de seu hemisfrio equatorial e com o znite do observador. Este tringulo chamado de tringulo de posio do astro. Na figura I.2.14 vemos representado o tringulo de posio de uma estrela (cuja posio na esfera celeste representada pela letra E). A figura inclui tambm a posio do observador (O), os planos equatorial e horizontal e o plano meridiano (contendo Z, N, S e M). Esto indicadas na figura vrias coordenadas associadas estrela, como sua altura h, sua distncia zenital z, sua declinao e sua distncia polar p. Esto indicados ainda o ngulo horrio H da estrela e, pela altura do plo celeste elevado (PN), a latitude do observador. Esta figura fundamental, pois envolve quase todos os conceitos e definies que vimos at agora. Recomendamos que o leitor reveja as definies de cada coordenada e de cada ponto e crculo da esfera celeste mostrados na figura I.2.14, at que esteja com ela bem familiarizado e entenda bem o que est vendo.

Figura I.2.14 Tringulo de posio de um astro (em branco), mostrado sobre a esfera celeste, juntamente com as coordenadas horizontais e equatoriais, alm dos pontos e crculos mais importantes.Frmulas de Trigonometria Esfrica

Podemos ento aplicar inmeras relaes entre os elementos de um tringulo esfrico ao tringulo de posio de um astro. Estas relaes so deduzidas a seguir para um tringulo esfrico genrico, de lados a, b e c e ngulos A, B e C. Considere o tringulo genrico da figura I.2.15. Na figura tambm mostramos o centro da esfera, O. Conforme j mencionado, o lado a do tringulo, por exemplo, um arco de grande crculo que mede o ngulo, com vrtice em O, entre os segmentos de reta OC e OB, e assim por diante. O ngulo A (ou seja, com vrtice em A), por seu turno, mede a separao entre os planos OB e OC.

Figura I.2.15 Tringulo esfrico genrico (com vrtices A, B e C).Vamos agora deduzir algumas frmulas importantes que associam lados e ngulos de um tringulo esfrico. Primeiramente, consideremos a perpendicular ao plano e que passa pelo vrtice em A do tringulo da figura I.2.15. Essa reta representada pelo segmento AP da figura. A partir do ponto P, tomemos agora duas retas, PN e PM, perpendiculares, respectivamente, aos segmentos OB e OC. Ao tomarmos estas retas, formamos na figura vrios tringulos (planos) retngulos: ANP, AMP, ONP, OMP e OAP. Alm desses, so tambm tringulos retngulos OAN e OAM. Usando todos estes tringulos poderemos ento deduzir vrias frmulas.

Considere o tringulo OAN, por exemplo. O ngulo com vrtice em O deste tringulo mede a separao entre o cateto ON e a hipotenusa OA. Mas este ngulo o lado b do tringulo esfrico. Logo podemos escrever:

cos(b) = ; sen(b) =

Analogamente, considerando o tringulo OAM, cuja hipotenusa OA (o raio da esfera), teremos:

cos(c) = ; sen(c) = Sejam agora os tringulos ONP e OMP, cuja hipotenusa OP. E sejam novamente os ngulos com vrtice em O, representados pelas letras gregas ePodemos escrever:

cos(; sen(

cos(; sen(

Podemos ento escrever que OM = OP cos Substituindo esta relao na expresso para cos c acima e lembrando que a, temos:

OM = OA cos(c) = OP cos(a OP [cos(a)cos(sen(a)sen( OA cos(c) = OP (cos(a) + sen(a) ) = ON cos(a) + NPsen(a) OA cos(c) = OA cos(b)cos(a) + NP sen(a)Esta ltima linha resulta da expresso para ON usando o tringulo OAN, dada anteriormente. Precisamos agora encontrar uma expresso para NP. Usando o tringulo ANP (retngulo em P e com hipotenusa AN), temos:

NP = AN cos()= AN cos(C)= OA sen(b)cos(C)onde o ngulo, com vrtice em N, entre os segmentos AN e NP. Mas este ngulo igual ao ngulo C do tringulo esfrico, ou seja, o ngulo entre os planos OAC e OBC.

Substituindo na expresso anterior temos ento:

OA cos(c) = AO cos(b)cos(a) + NP sen(a) = OA cos(b)cos(a) + OA sen(b)cos(C)sen(a)

Resulta finalmente em:

cos(c) = cos(a)cos(b) + sen(a)sen(b)cos(C)Esta a chamada frmula dos 4 elementos, em que os 3 lados do tringulo esfrico so associados a um de seus ngulos. Note que o lado cujo co-seno aparece no lado esquerdo aquele oposto ao ngulo que entra na frmula. Podemos escrever outras duas frmulas anlogas (cuja deduo tambm inteiramente anloga):

cos(a) = cos(b)cos(c) + sen(b)sen(c)cos(A)cos(b) = cos(a)cos(c) + sen(a)sen(c)cos(B)H tambm as frmulas dos 4 elementos aplicadas a ngulos:

cos(A) = cos(B)cos(C) + sen(B)sen(C)cos(a)cos(B) = cos(A)cos(C) + sen(A)sen(C)cos(b)cos(C) = cos(A)cos(B) + sen(A)sen(B)cos(c)Pelas frmulas aplicadas aos tringulos OAN, OAM, ANP e AMP acima, podemos tambm deduzir a analogia dos senos.

AM = OA sen(c) =

AN = OA sen(b) =

Logo:

= sen(b) sen(C) = sen(c) sen(B)

Astronomia Esfrica

Apliquemos agora as frmulas de Trigonometria Esfrica, deduzidas anteriormente, ao tringulo de posio de uma estrela, representado na figura I.2.16 pelo tringulo esfrico EZPNC. Os lados deste tringulo, conforme indicado, so o complemento da latitude do observador (90 , a distncia zenital z (90 h) e a distncia polar p (p = 90 . Alm do ngulo Q, com vrtice em E e mostrado na figura, ou outros ngulos do tringulo de posio so o ngulo horrio H, com vrtice em PNC (pois o ngulo entre o plano meridiano e o crculo horrio da estrela) e 360 A, com vrtice no znite. Este ltimo o ngulo entre o plano meridiano e o vertical da estrela, estando obviamente ligado ao azimute. O fato de seu valor ser 360 A se deve escolha particular da origem do azimute na direo norte e crescendo para lestesuloeste.

A analogia dos senos nos d ento:

Figura I.2.16 Tringulo de posio de um astro.J as frmulas dos 4 elementos nos do:

cos(z) = sen()sen()cos()cos()cos(H)

sen()sen()cos(z) cos()sen(z)cos(A)sen(sen()cos(z) cos()sen(z)cos(Q)

Situaes especiaisExistem algumas situaes especiais nas quais as frmulas se simplificam bastante. Essas situaes se caracterizam pelo fato de um ou mais dos lados ou ngulos do tringulo de posio se tornarem nulos ou retos.

A situao mais simples a da passagem meridiana. Neste caso o ngulo horrio H = 0. Pela analogia dos senos v-se imediatamente que os senos dos demais ngulos do tringulo de posio tambm tm que se anular, ou seja, o azimute, por exemplo, assume os valores A = 0 ou A = 180. Estes dois casos se aplicam a culminaes a norte e a sul do znite, respectivamente. fcil ver tambm, pela primeira frmula dos 4 elementos acima, que:

cos(z) = sen()sen()cos()cos()cos(

z = (quando A = 0) ou z = quando A = 180)Essas expresses j haviam sido deduzidas na seo sobre o movimento diurno, usando os diagramas do plano meridiano. O leitor cuidadoso e metdico vai notar que as mesmas relaes deveriam ser tambm obtidas no caso da culminao inferior, quando H = 180. Mas, de fato, se fizermos esta substituio nas equaes deduzidas acima, teremos:

cos(z) = sen()sen()cos()cos()= cos() z = 180 Note que a incluso do valor absoluto da soma + na expresso acima visa a compatibilizar os domnios em que so definidas as diferentes variveis envolvidas. A distncia zenital z, por exemplo, definida no domnio 0 < z < 180. Dependendo dos valores de latitude e declinao, que so definidas no domnio entre 90 e +90, a no incluso do valor absoluto poderia violar o domnio em z. Assim, ainda que haja mais solues matemticas para o caso de H = 180, a soluo astronmica para a situao da culminao inferior exige que se considere o mdulo de + . Situaes deste tipo no so raras e, portanto, temos que sempre ter em mente as definies e domnios de valores para as grandezas envolvidas e adaptar as solues matemticas gerais dadas pelas equaes da trigonometria esfrica ao caso astronmico com que estamos lidando.

tambm a situao do nascer e ocaso de uma estrela, z = 90. Neste caso, pelas frmulas dos 4 elementos, temos:

cos(H) = tg()tg()cos(A) =

A primeira expresso acima mostra que um astro s nasce e se pe se:|tg()tg()|tg()cotg()|tg()| < |tg(90 )| < |(90 )|

A segunda expresso resulta na mesma restrio acima, pois |cos(A)| tambm tem que ser menor do que a unidade

A restrio acima tambm requer cuidado. Se a latitude , ento (90 )90, o que novamente viola o domnio de valores permitidos para a declinao Assim, no caso de um observador no hemisfrio Sul, podemos substituir (90) por (90+, j que o mdulo da tangente ser o mesmo, independente do sinal aritmtico do argumento. Assim, usando o sinal positivo no argumento, respeitamos os limites possveis para a declinao.

Ou seja, uma estrela nasce e se pe somente se:|| < 90 , para > 0

|| < 90 + , para < 0

Essas condies tambm j haviam sido deduzidas anteriormente, quando estudamos estrelas circumpolares e invisveis.

H ainda outras situaes teis, em que as frmulas da Trigonometria Esfrica se simplificam. Por exemplo, quando A = 90 ou A = 270 dizemos que a estrela passa pelo 1 e 2 verticais, respectivamente. Analogamente, quando H = 90 ou H= 270, temos os crculos das 6h e 18h. Quando Q = +/ 90, dizemos que a estrela est em elongao. Em todas estas situaes o tringulo de posio da estrela retngulo. H outras situaes em que o tringulo de posio se torna retiltero, ou seja, com um lado igual a 90. Vimos o caso do nascer e ocaso (z = 90). H tambm os casos que envolvem astros ou observadores especiais, como o de uma estrela que pertena ao Equador Celeste (= 0), ou o de um observador situado no Equador da Terra (= 0). Procure voc mesmo deduzir as frmulas dos senos e dos 4 elementos nestes casos especiais.

Um outro conceito importante o de velocidade zenital. Esta a taxa de variao no tempo da distncia zenital, z/H. Podemos deduzir uma expresso para a velocidade zenital usando a frmula dos quatro elementos envolvendo o ngulo horrio:

cos(z) = sen()sen()cos()cos()cos(H)

Para isto basta derivarmos ambos os lados desta frmula com relao ao ngulo horrio (= tempo). Teremos ento:

O valor da velocidade zenital do Sol no incio ou final do dia, por exemplo, determina a durao daquela fase do dia em que nem dia claro nem escurido total, o que comumente denominamos de crepsculo. Quanto menor o valor de z/H, mais longo o crepsculo. Pela dependncia da expresso acima com a latitude e com o ngulo horrio, vemos que este ser mais longo em lugares de latitude alta e/ou quando o valor de H do Sol ao nascer e se por mais distante dos valores 90 ou 270 (ou seja, em torno dos solstcios).

CAPTULO 3MOVIMENTO ANUAL DO SOL E SISTEMAS DE TEMPO

Movimento Anual do SolAs estrelas que vemos noite tm posies fixas no cu umas com relao s outras (exceto pelos efeitos secundrios de aberrao, paralaxe e movimento prprio, que discutiremos mais adiante). O Sol, contudo se move por entre as estrelas a uma taxa de 1 por dia aproximadamente. Assim, ao final de um ano, ter descrito um grande crculo no cu, a que chamamos de eclptica. O movimento anual do Sol no cu causado pelo movimento orbital da Terra em torno deste. A figura I.3.1 mostra a variao da posio do Sol no cu com relao s estrelas mais distantes medida que a Terra se move em sua rbita anual. A rbita corresponde elipse mais interna da figura. A esfera maior, mostrada em quatro diferentes posies da rbita, representa a Terra, enquanto que a esfera central representa o Sol. A elipse mais externa da figura a eclptica.

Figura I.3.1 Movimento orbital da Terra, resultando no movimento anual do Sol na esfera celeste, sobre a eclptica.As estrelas formam figuras imaginrias no cu, a que chamamos de constelaes. As constelaes atravessadas pela eclptica so chamadas de constelaes zodiacais. A faixa do cu coberta por estas constelaes chamada de zodaco. Por entre as estrelas do zodaco move-se no apenas o Sol, mas tambm os demais astros do sistema solar, como a Lua e os planetas.

Em torno do dia 21 de maro o Sol, em seu caminho sobre a eclptica, atravessa o equador celeste. Este ponto de interseco entre os dois grandes crculos o ponto vernal (ou ponto ). Neste dia, chamado de Equincio de maro, o Sol cruza o equador celeste de sul para norte, marcando ento o fim do vero no hemisfrio sul da Terra e o fim do inverno no hemisfrio norte. Pela definio de ascenso reta, neste dia seu valor para o Sol 0h. Como est sobre o equador celeste, a declinao do Sol no equincio de maro tambm nula. Pela figura acima, vemos que o Sol, visto da Terra, projetado na eclptica na direo da constelao de Peixes nesta poca.

Uns 3 meses depois, em torno de 21 de junho, o Sol alcana seu maior valor de declinao: = 23. Nesta poca ele visto sobre a constelao de Gmeos. A partir deste instante, o Sol comea a se mover em direo ao sul, de volta ao equador celeste. Este dia chamado de Solstcio de junho, marcando o incio do vero (inverno) no hemisfrio norte (sul). Neste dia, 6h para o Sol. Em torno do dia 21 de setembro, o Sol volta a cruzar o equador celeste, mas desta vez do hemisfrio norte para o hemisfrio sul. o Equincio de setembro, fim do inverno (vero) no hemisfrio sul (norte) terrestre. O Sol est agora em Virgem. Coordenadas equatoriais do Sol: 12h ; 0.

Finalmente, uns 3 meses depois, o Sol atinge seu ponto mais a sul na esfera celeste: = 23, 18h . Este o Solstcio de dezembro, sempre em torno do dia 21/12. o incio do vero (inverno) no hemisfrio sul (norte). A partir deste dia, o Sol comea a se mover para norte at reatingir o ponto vernal no dia 21/3 do ano seguinte.

Figura I.3.2 Representao da eclptica (curva mais fina) sobre a esfera celeste, com a posio do Sol nos equincios e solstcios.Em resumo, em sua jornada anual ao longo da eclptica, o Sol percorre 24h de ascenso reta, a uma taxa mdia de 2h por ms. Note que este movimento anual independente do movimento diurno, compartilhado por todos os astros e causado pela rotao da Terra. O movimento diurno mais facilmente notvel, pois se d a velocidade bem maior, de 24h por dia.

A figura I.3.2 mostra uma espcie de mapa mundi da esfera celeste, no qual vemos toda a regio com | 47 projetada em um plano. O equador celeste a linha horizontal que corta a figura em duas metades. As demais linhas horizontais so paralelos de declinao, ou seja, crculos (pequenos) contendo todos os pontos de declinao constante, no caso, com = +/23,5. Estes paralelos de declinao sobre a abbada celeste so as projees no cu dos Trpicos de Cncer (latitude = 23,5) e de Capricrnio (latitude = 23,5), tal como indicado. As retas verticais representam os crculos horrios, de ascenso reta constante. A eclptica a linha curva e mais fina, sendo que os dois pontos em que ela cruza o equador celeste, no meio e no extremo direito figura, so, respectivamente, os pontos eJ a tabela abaixo m