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Lições de Literatura de Língua Portuguesa BARROCO Bruno Fernandes de Lima

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Lições deLiteratura de Língua Portuguesa

BARROCO

Bruno Fernandes de Lima

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Lições de

Literatura de Língua Portuguesa

BARROCOBruno Fernandes de Lima

1ª Edição

Olinda, 2010

Page 4: Literatura de Língua Portuguesa BARROCO · Lições de Literatura de Língua Portuguesa BARROCO Bruno Fernandes de Lima 1ª Edição Olinda, 2010

Direção:

Bruno Fernandes de Lima.

Revisão do Texto:

Bruno Fernandes de Lima.

1ª Edição

1ª Impressão

2010

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A toda a minha família,

aos meus amigos

e alunos

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APRESENTAÇÃO

O presente trabalho é uma tentativa de simplificar

aquilo que é complexo por natureza. Definir literatura não é

algo simples. Isto porque a literatura é algo que está

intrinsecamente ligado à cultura dos seres humanos, e os seres

humanos estão em constante transformação. Logo o conceito

de literatura nunca é o mesmo à medida que o tempo passa e a

humanidade vai sofrendo suas transformações. Compreender

literatura não é algo simples. E o principal objetivo deste

estudo é facilitar a compreensão da literatura por parte dos

estudantes, para que possam assim aprender a apreciá-la

verdadeiramente.

Este estudo trata das Literaturas de Língua Portuguesa,

mais precisamente o período barroco. Veremos aqui as

principais características deste movimento através do estudo

dos textos mais representativos desta estética literária. Ou seja,

este estudo está focalizado em obras e autores.

Não pretendo com este trabalho me aprofundar na

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estética barroca, apenas intento fazer aqui uma introdução, para

que no estudante possa despertar o desejo de buscar outras

fontes para ampliar seus conhecimentos acerca do assunto.

O Autor.

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SUMÁRIO

Introdução 11Prosa Barroca em Portugal 20Poesia Barroca em Portugal 28Poesia Barroca no Brasil 36Historiografia em Portugal no Período Barroco 40Epistolografia em Portugal no Período Barroco 41Teatro Barroco em Portugal 43Conclusões acerca do Barroco em Portugal e no Brasil 45Referências Bibliográficas 46

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INTRODUÇÃO

No final do século XVI, a Europa vivia um momento de

progresso científico e tecnológico, com as descobertas

importantes feitas por Francis Bacon, Galileu Galilei, Johannes

Kepler e Isaac Newton, além do desenvolvimento cultural e

filosófico, com a consolidação dos estados protestantes

europeus nos quais eram propagados os ideais de liberdade de

expressão e pensamento. Reinava o racionalismo, cujas raízes

se encontram ainda no Renascimento. Os ideais do

Absolutismo monárquico também influenciavam fortemente a

ideologia da época.

Entretanto, Portugal não acompanha a tendência

seguida pelos demais estados europeus. Torna-se, na realidade,

um reduto da cultura medieval, ainda preso às antigas tradições

e à sua religiosidade, que acaba regredindo ao antigo

teocentrismo devido à Contrarreforma.

Para compreendermos o movimento barroco em

Portugal e no Brasil é preciso entendermos o contexto histórico

e artístico em que se inseriu. O Barroco português foi precedido

pelo Classicismo, estética literária característica do

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Renascimento. O Classicismo caracterizou-se pela imitação dos

modelos da Antiguidade Clássica greco-latina. Caracterizou-se

também pela substituição do pensamento teocêntrico medieval

pelo antropocentrismo que floresceu no período humanístico,

no século XV. Após o Classicismo, instaurou-se na Europa uma

nova forma de pensar, novos conceitos filosóficos e artísticos.

É preciso compreendermos que a literatura se

manifestou de modo diferenciado em Portugal, devido à

situação histórica em que o país se encontrava. O surgimento

do Barroco em Portugal se deu de modo crítico. Portugal nas

últimas décadas do século XVI já vivia a decadência do

“Império”, que foi construído com a empresa das navegações.

O país vivenciava uma crise financeira, que acabou se

agravando com uma outra crise, esta de ordem política. D.

Sebastião, rei de Portugal, embora presenciasse a iminência do

declínio do império, que se havia fundamentado em alicerces

vulneráveis, alimentava a esperança de ver a nação se reerguer

e voltar às épocas de glória (poder-se-ia dizer inspirado pelos

incentivos recebidos de Camões em Os Lusíadas?). Embalado

por esse sonho, o rei faz guerra contra Alcácer-Quibir, no norte

da África. O empreendimento fracassa e D. Sebastião

desaparece, O que leva Portugal a uma crise de sucessão na

Coroa. O Cardeal D. Henrique, tio de D. Sebastião, se torna

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regente e governa por dois anos, durante os quais se desenrola

o debate sobre a questão sucessória, até que em 1580, o rei da

Espanha, Felipe II, reivindica o direito ao trono por ser o

herdeiro mais próximo da Coroa e com isso acaba por unificar

a Península Ibérica, talvez o maior golpe contra a autoestima

portuguesa desde o surgimento da nação. Portugal esteve sob o

domínio espanhol de 1580 até 1640, quando o país recupera sua

autonomia.

Assim, a dominação espanhola e a força do catolicismo

e sua reação contra o movimento protestante determinaram o

rumo que Portugal e sua produção artística seguiriam no século

XVII e no início do século XVIII.

A data de 1580 é adotada para fins didáticos como o

início do Barroco em Portugal. Coincide também com a data da

morte de Luís Vaz de Camões, maior nome da literatura

portuguesa, autor da maior epopeia da língua portuguesa e

monumento à pátria e à língua, Os Lusíadas. A data que marca

o fim do período barroco no país foi o ano de1756, ano

marcado pela fundação da Arcádia Lusitana, inaugurando a

escola do Arcadismo.

A situação histórica em que se encontrava Portugal

naquela época determina e influencia as características da

estética literária que vigorará no país. Enquanto o restante da

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Europa viveu uma evolução científica e filosófica, Portugal

acaba seguindo uma mentalidade mais estreitada, devido à

influência espanhola, sendo a Espanha um forte reduto

católico, onde predominaram os ideais da Contrarreforma,

movimento reacionário à Reforma Protestante. A Literatura

Portuguesa, que parecia que seria fortemente impulsionada pela

produção renascentista (especialmente de Camões) e que

experimentaria voos altos e grandeza de estilo, acaba recuando,

baixando o tom, muito provavelmente devido ao golpe da

perda da condição de nação independente, tornando-se tímida,

permeada de sentimentos de revolta ou de misticismo (com o

surgimento do mito do sebastianismo, lenda que consistia na

crença do iminente retorno de D. Sebastião, que libertaria

Portugal e faria dele o Quinto Império).

Em Portugal, diferente dos outros países da Europa, o

Barroco foi mais expressivo na literatura que na arquitetura e

nas artes plásticas, por exemplo. A Literatura Portuguesa no

período barroco não alcançou o brilho do Classicismo, mas

ainda assim rendeu bons frutos, embora tenham sido mais na

prosa que na poesia. Faltou ao Barroco português uma

conexão, uma unidade de sentimento, uma vez que as

consciências estavam muito dispersas, sem um elo de ligação

forte que unisse os homens da época. A nação estava

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mergulhada em uma depressão que só chegaria ao fim com o

Romantismo, séculos depois, segundo Massaud Moisés (1977,

93). Isto porque nem no Barroco e nem no Arcadismo a

Literatura Portuguesa conseguiu alcançar brilho e expressão

que pudessem mesmo de longe rivalizar com a produção do

Classicismo.

No Brasil, então colônia de Portugal, a produção

literária era ainda escassa. Não existia um sistema literário

consolidado, logo a literatura feita no Brasil era ainda uma

extensão da Literatura Portuguesa.

A literatura barroca refletiu o sentimento predominante

na época. Era um período de confusão. Portugal havia perdido

a condição de país independente com a dominação espanhola; a

Contrarreforma procurou resgatar o teocentrismo cristão

predominante na Idade Média, no entanto o Humanismo e o

Renascimento haviam deixado marcas indeléveis na

mentalidade europeia. Logo, o barroco consistiu em uma

tentativa de conciliar as duas linhas de força: o teocentrismo

cristão e o antropocentrismo clássico, uma vez que este já não

poderia mais ser ignorado. A escola se caracterizou

principalmente pelo exagero, a dualidade e a religiosidade.

Consistiu também em uma reação contra a rigidez do

Classicismo. No Brasil, com Gregório de Matos, o Barroco se

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caracterizou pela expressão das mais profundas angústias da

alma humana, a dialética dos opostos, o jogo dos paradoxos, o

conflito entre o bem e o mal, a carne e o espírito. A poesia de

Gregório de Matos definitivamente não foi uma poesia vazia e

lúdica como a poesia barroca feita em Portugal.

Segundo Massaud Moisés, “no entender de alguns, o

Barroco tornou-se a arte da Contrarreforma, visto as

características básicas do movimento estético servirem aos

desígnios doutrinários e pedagógicos da Igreja na luta anti-

reformista” (1977, 91). A Contrarreforma utilizou a estética

como estratégia para a ação evangelizadora. Exatamente por

tentar unir essas duas linhas de força, o Barroco acaba sendo

paradoxal por excelência. É a escola dos antagonismos, das

antíteses, dos jogos de opostos (claro / escuro, corpo / alma, luz

/ sombra etc.). “A fusão de propósitos e tendências nem sempre

coerentes explica o caráter polimórfico assumido, às vezes,

pelo Barroco.” (1977, 91).

Duas tendências foram características do Barroco

português e brasileiro. A primeira se faria pela descrição de

imagens, com o uso de metáforas e de sinestesia, recurso

através do qual se relacionam planos sensoriais diferentes.

Privilegia-se o como dizer. Recebeu o nome de Gongorismo,

que deriva do nome do poeta espanhol Luis de Góngora y

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Argote. Isto porque o poeta utilizava em sua poesia uma

linguagem extremamente rebuscada e cheia de preciosismo,

privilegiando a forma em vez do conteúdo. Do termo

“gongorismo” criou-se o adjetivo “gongórico”, termo

pejorativo atribuído a escritores que utilizam linguagem prolixa

e convoluta, o que caracteriza uma injustiça ao autor espanhol,

que foi na realidade um grande poeta, que soube utilizar desses

recursos estruturais com talento e maestria. Os adeptos do

gongorismo buscavam uma linguagem rica, utilizando

neologismos, hipérbatos, trocadilhos e muitas outras figuras

que, segundo Moisés, “tornam o estilo pesado, alambicado e

tortuoso” (Moisés, 1977, 92).

A segunda tendência já não privilegiaria a forma, o

como dizer, mas o que são as coisas, procurava conceituar as

coisas. Em vez dos recursos estéticos e plásticos do

gongorismo, essa tendência se utiliza da lógica, da Razão, para

conceituar as coisas e dialeticamente categorizar a vida. É

chamada de Conceptismo. Devido às suas características, essa

corrente acabou se manifestando sobretudo em prosa. O

principal representante do conceptismo foi o escritor espanhol

Francisco de Quevedo, daí um outro nome dado à tendência ser

Quevedismo.

Mesmo aqui podemos ver a característica barroca de

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tentar fundir elementos antagônicos. Apesar de Gongorismo e

Conceptismo serem tendências opostas, elas são

contemporâneas e acabam por se misturar, muitas vezes até no

mesmo autor. Acaba sendo difícil às vezes distinguir os dois

estilos.

Os gêneros cultivados no período barroco em Portugal

foram, principalmente, a prosa doutrinária, a epistolografia, a

historiografia, a poesia e, um tanto timidamente, o teatro. A

poesia barroca seguiu um rumo um tanto diferente da prosa. Ao

contrário do caráter doutrinário, didático e moralizante da

prosa barroca, a poesia apresentou um caráter lúdico, de

entretenimento (essencialmente gongórico). Segundo Massaud

Moisés, “a poesia barroca corresponde mais ao culto da forma,

do verso, que da essência, do conteúdo, do sentimento, da

emoção lírica” (1977, 107). No Brasil, Gregório de Matos

Guerra foi, sem dúvida, o maior nome da literatura barroca.

Reuniu em sua obra tanto o estilo cultista quanto o conceptista.

Cultivou principalmente a poesia lírica religiosa e a poesia

satírica, tornando-se mestre no gênero, influenciando outros,

como provavelmente Manuel du Bocage, importante nome do

Neoclassicismo português.

Francisco Rodrigues Lobo representou a transição entre

o Classicismo e o Barroco em Portugal, trazendo características

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tanto daquela escola (com influência predominantemente

camoniana) quanto desta. No entanto, o personagem mais

importante do Barroco português foi, sem dúvida, o padre

Antônio Vieira, grande símbolo da literatura dessa época. Nele

se reuniram de modo complexo as principais características do

movimento.

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1. A PROSA BARROCA EM PORTUGAL

O maior nome da prosa barroca de língua portuguesa

foi sem qualquer dúvida o Padre Antônio Vieira. A prosa

doutrinária portuguesa da época do Barroco se divide, segundo

Massaud Moisés (2006, 176), em laica e religiosa. A prosa

laica, na passagem do Classicismo para o Barroco, sofre um

processo de mundanização, enquanto que a prosa religiosa se

torna pragmática, servindo a propósitos didáticos e

moralizantes.

Padre Antônio Vieira

Antônio Vieira (1608-1697) escreveu mais de

quinhentas cartas, obras de profecia e sermões. Estes são os de

maior interesse literário, pois neles podemos ver, além das

principais características seiscentistas, o melhor do

conhecimento e do talento do autor. Os sermões reúnem as

características fundamentais do Barroco, como o seu caráter

contraditório, cheio de antíteses e oposições. Neles, Vieira

procura eliminar a oposição que existe em cada homem, a

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oposição entre corpo e alma. A tendência seguida pelo autor é o

conceptismo. Procurou fazer uso da clareza na exposição de

suas ideias, usando um maravilhoso jogo de retórica,

conduzindo o ouvinte às conclusões de modo habilidoso.

Porém, vez por outra se utiliza de recursos gongóricos, como

vemos no trecho a seguir: “Ah pregadores! os de cá, achar-vos-

ei com mais paço; os de lá, com mais passos.” (Sermão da

Sexagésima. In: Moisés, 1977, 96)

O talento de Vieira é incontestável. O orador em seus

sermões se mostra um mestre no conceptismo. Costumava

utilizar analogias entre fatos reais e textos bíblicos,

estabelecendo uma aplicação prática destes na vida cotidiana

(como podemos verificar no Sermão da Sexagésima). Mostra

as consequências da colocação do problema de modo direto,

em seguida continua com um jogo incessante de argumentação,

cheio de paradoxos, ambiguidades, conduzindo os ouvintes por

caminhos tortuosos, enveredando-se em grandes dificuldades

de raciocínio que parecem não ter solução, mas o pregador as

sobrepuja com autoridade, alcançando seus objetivos didáticos

e moralizantes.

A estrutura dos sermões é fixa. Segue a estrutura

clássica, em três partes:

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• Introito (ou exórdio): introdução do sermão, em que o

orador expõe o tema e o seu plano de análise;

• Desenvolvimento (ou argumento): nesta parte o orador

apresenta seus argumentos, os prós e contras da proposta em

questão e os exemplos que reforçam a argumentação;

• Peroração: conclusão do sermão, em que o orador fecha o

sermão exortando os ouvintes a que vivam o que foi

ensinado.

Em raros casos, Vieira deixou de utilizar algum dos

elementos que mencionamos, como o introito ou a peroração.

Ainda assim, os sermões não perdiam em qualidade, visto que

o autor estava sempre cônscio disto a que ele chamava violação

das “leis da retórica”.

Já no final da vida, Vieira se dedica a organizar seus

sermões por escrito. Obviamente os registros escritos não

correspondiam fielmente à realização oral dos sermões, em que

o orador se utilizava constantemente do improviso. Os textos

escritos acabavam por parecer um tanto artificiais, uma vez que

“a oratória pressupõe a presença física do orador” (Moisés,

1977, 98).

Apesar de ter havido outros talentosos autores no

movimento barroco português, Antônio Vieira estava muito

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acima de todos os outros em importância e qualidade literária.

É o grande nome do barroco português e brasileiro.

Principais obras:

• Sermões (15 volumes, 1679-1690, 1710-1718)

• História do Futuro (1718)

• Esperanças de Portugal (1856-1857)

• Clavis Prophetarum (inédita)

D. Francisco Manuel de Melo

D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666) se dedicou à

poesia, à historiografia, ao teatro, à

epistolografia, à prosa doutrinária e à

polêmica. Na poesia, mostrou influência

camoniana, inclusive nas características

barrocas que o próprio Camões prenunciou

(especialmente nos paradoxos). Prestou sua

contribuição ao teatro com a peça Auto do Fidalgo Aprendiz

(1665), em que se vê a predominante influência vicentina, além

de outras peças em espanhol que acabaram se perdendo. No

entanto, maior ênfase deve ser dada à epistolografia e à prosa

doutrinária, em que o autor mostrou seu maior talento. Em

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especial, merece nossa atenção a Carta de Guia de Casados

(1651), em que o autor trata do relacionamento conjugal de

modo gracioso e bem humorado, embora ironicamente o autor

jamais se tenha casado. Na carta, o autor trata de temas que,

apesar de estarem impregnados da ideologia da época, em

certos aspectos se mostra bastante atual, por tratar de

problemas verificados mesmo ainda hoje nos relacionamentos

familiares.

Padre Manuel Bernardes

Pe. Manuel Bernardes (1644-1710) escreveu apenas

literatura moralizante, sendo que sua vida e

obra se opõem absolutamente às do Pe.

Vieira. Utilizava uma linguagem limpa e

direta, essencialmente conceptista, com rico

vocabulário, mas sintaxe simples e direta,

com o objetivo de atingir de modo direto

seus ouvintes. Destacarei aqui, dentre suas obras, Nova

Floresta, em que se verificam “a simplicidade e a limpidez

antigongóricas” (Moisés, 2006, 180), com muitos exemplos

práticos e analogias, além da simplificação através da

interpretação das citações latinas da Bíblia, para facilitar a

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compreensão por parte dos ouvintes.

Cavaleiro de Oliveira

Cavaleiro de Oliveira, como se assinava em suas obras

Francisco Xavier de Oliveira (1702-1783), apesar de ter

nascido em Portugal, se inclui na Literatura Portuguesa apenas

incidentalmente, por ter escrito maior parte de suas obras em

francês e ter vivido grande parte de sua vida fora de seu país de

origem, tendo inclusive falecido na Inglaterra. Dentre suas

obras, quero chamar atenção para Amusement Périodique

(1751, traduzida para o português como Recreação Periódica),

série de crônicas jornalísticas, uma espécie de revista, em que

se verificam as principais características da sociedade de

Lisboa e da Europa do século XVIIII. Os temas são

atualíssimos, mesmo para os nossos dias, e embora não seja tão

rica em estilo, como afirma Massaud Moisés (1977, 105), o

conteúdo das crônicas é extremamente vivo e excitante. Alguns

autores o incluem no período neoclássico. Preferi colocá-lo no

Barroco de acordo com Massaud Moisés, visto serem os

estudos deste autor minha principal fonte para este trabalho.

Matias Aires

Matias Aires Ramos da Silva de Eça (1705-1763)

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escreveu obras de rico conteúdo literário, mas que foram

praticamente esquecidas no século XIV, sendo apenas

resgatadas no início do século XX, quando foram republicadas

por Solidônio Leite, editor de um jornal do Rio de Janeiro,

ressuscitando a figura de Matias Aires. Sua obra apresenta

grande influência do livro bíblico de Eclesiastes, na temática

predominante da vaidade. Tal como o texto bíblico, a obra de

Matias Aires é carregada de pessimismo ético e filosófico,

através do qual o autor enxerga o homem como decaído e

corrupto, “à mercê dum Deus onipotente e implacável”

(Moisés, 2006, 186), especialmente em sua obra Reflexões

sobre a Vaidade dos Homens (1752).

A Arte de Furtar

Dentro da prosa doutrinária barroca, é importante

mencionar a obra conhecida como Arte de Furtar (1652), cujo

autor é até hoje desconhecido, pois se identificou na obra

apenas como “Português mui zeloso da Pátria”. Sua autoria foi

atribuída a diversos escritores da época, sendo que a

investigação mais recente aponta para o nome de Antônio de

Sousa de Macedo. A obra é uma sátira contra a corrupção dos

baixos funcionários e ministros de Estado após a reconquista

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da independência portuguesa. Obviamente foi por isto que o

autor preferiu se manter anônimo, para que tivesse liberdade

para dirigir suas críticas a seus contemporâneos. Sua

importância literária é menor, em relação ao conteúdo satírico

da obra.

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2. A POESIA BARROCA EM PORTUGAL

A poesia barroca se apresenta tanto em poetas isolados

quanto em antologias organizadas, semelhantes aos

cancioneiros medievais. Divide-se em poesia lírica, épica e

satírica. Destacarei aqui Francisco Rodrigues Lobo, D.

Francisco Manuel de Melo (de quem já tratei na “prosa

doutrinária”) e as mais importantes antologias, a Fênix

Renascida e o Postilhão de Apolo.

D. Francisco Manuel de Melo

Analisarei aqui três poemas de D. Francisco Manuel de

Melo, em que veremos as suas características barrocas e as

influências quinhentistas, principalmente camonianas:

IMundo Incerto

Eis aqui mil caminhos. PorventuraQual destes leva a gente ao povoado?Todos vão sós; só este vai trilhado;Mas, se por ser trilhado, em assegura?

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Não, que desde o princípio há que lhe duraDo erro este costume ao mundo dado:Ser aquele caminho mais erradoO que é de mais passage e fermosura.

Enfim, não passarei, temendo a sorte?Também, tanto temor é desconcerto;A quem passar avante, assi lhe importe.

Que farei logo, incerto em mundo incerto?Buscar nos Céus o verdadeiro norte,Pois na terra não há caminho certo.

Neste soneto vemos um reflexo da incerteza e confusão

barroca. O poeta parece se ver desorientado, desacreditado em

relação à vida terrena. Ou seja, parece lamentar as incertezas da

vida. Esta parece ser uma característica predominante no

século XVII em Portugal, a incerteza, a perturbação das

mentes. E essa preocupação com as incertezas da vida traz,

ainda que talvez de longe, ecos do “desconcerto do mundo”

que também perturbava Camões.

O poeta diz que há vários caminhos a se seguir na vida,

mas nenhum parece ser seguro, certo. E o que parece o

caminho mais bonito e seguro acaba sendo o mais errado. No

entanto, embora todos os caminhos pareçam incertos, é errado

ficar parado e não se aventurar em nenhum deles. A solução é

se orientar pelos Céus, que guiarão o viajante para o lugar

certo. Ou seja, vemos aqui também a importante presença da

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religiosidade no poema. Os homens não devem procurar

através da razão o melhor caminho na vida, mas confiar na

orientação dos Céus. Nisto podemos ver uma clara oposição ao

pensamento neoclássico.

Podemos notar que este poema é essencialmente

conceptista.

II

Antes da ConfissãoEu que faço? que sei? que vou buscando?Conto, lugar, ou tempo a esta fraqueza?Tenho eu mais que acusar, por mais firmeza,Toda a vida, sem mais como, nem quando?

Se cuidando, Senhor, falando, obrando,Te ofenda minha ingrata natureza,Nascer, viver, morrer, tudo é torpeza.Donde vou? donde venho? donde ando?

Tudo é culpa, ó bom Deus! Não uma e umaDescubro ante os teus olhos. Toda a vidaSe conte por delito e por ofensa.

Mas que fora de nós, se esta, se algumaFora mais que uma gota, a ser medidaCo largo mar de tua graça imensa?

Vemos também aqui a perturbação do poeta, sem saber

o sentido do que faz na vida. A dúvida também está em sua

própria identidade, ao perguntar-se “Donde vou? donde venho?

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donde ando?”. Ou seja, o poeta se questiona acerca de sua

origem e destino, enfim, quem é. Considera-se também

culpado e pecador, assim sendo ele próprio uma representação

de toda a raça humana, decaída e dependente da misericórdia

de Deus, como vemos no último terceto. Também predominam

aqui as características conceptistas.

IIIFermosura, e Morte, advertidas por um corpo belíssimo,

junto à sepulturaArmas do Amor, planetas da venturaOlhos, adonde sempre era alto dia,Perfeição, que não cabe em fantasia,Fermosura maior que a fermosura:

Cova profunda, triste, horrenda, escura,Funesta alcova de morada fria,Confusa solidão, só companhia,Cujo nome melhor é sepultura:

Quem tantas maravilhas diferentesPode fazer unir, senão a Morte?A Morte foi em sem-razões mais rara.

Tu, que vives triunfante sobre as gentes.Nota (pois te ameaça uma igual sorte)Donde para a beleza, e no que para.

Neste poema vemos a presença do tema da morte, que é

frequente na poesia barroca, mostrando a efemeridade do

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tempo e da vida, e que tudo caminha para o fim, inclusive a

beleza (“fermosura”), sendo esta também efêmera. O primeiro

quarteto trata da beleza, da formosura, como instrumento do

Amor, gloriosa e venturosa. Aqui há um traço gongórico: o

paradoxo, em “Fermosura maior que a fermosura”. O segundo

quarteto trata da morte, opondo-se à beleza, criando o jogo de

claro / escuro tipicamente barroco (a claridade, a luz, presente

no verso “Olhos, adonde sempre era alto dia”, em oposição à

escuridão presente no verso “Cova profunda, triste, horrenda,

escura”). Ou seja, temos aqui a presença da antítese, outro

elemento gongórico. E por fim, nos dois tercetos vemos uma

contradição: no primeiro terceto, a morte, como vitoriosa,

embora lhe tenham sido atribuídos adjetivos tão negativos na

estrofe anterior; enquanto que, no segundo terceto, vemos a

beleza ameaçada, embora viva “triunfante sobre as gentes”,

pois na morte a beleza “para”, chega ao fim. Apesar de todos os

elementos gongóricos, vemos também um toque conceptista,

na dissertação feita no poema acerca da fugacidade das coisas.

Vimos três sonetos de D. Francisco Manuel de Melo,

nos quais estão visivelmente concentradas características

seiscentistas. Vemos que o poeta parece preso à estética

barroca, o que o impede de exprimir maior dramaticidade. É

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como se o conceptualismo consciente acabasse expulsando da

poesia toda a emoção, privilegiando a exposição do

pensamento.

Francisco Rodrigues Lobo

Francisco Rodrigues Lobo (1580-1622), como já

mencionei aqui, pode ser considerado

precursor do movimento barroco em

Portugal, o que pode ser verificado

especialmente em sua obra Corte na

Aldeia (1619) e na trilogia de novelas

pastoris: A Primavera (1601), O Pastor

Peregrino (1608) e O Desenganado

(1614). A poesia de Rodrigues Lobo serve

como elo de ligação entre a poesia do classicismo (influenciada

pelo magistério camoniano) e a poesia barroca. Na prosa,

apesar de não haver tantas características barrocas, podemos

verificar o que seria um prenúncio do movimento nos diálogos

V e XI da Corte na Aldeia, em que, segundo Massaud Moisés,

é feita uma espécie de súmula de uma teoria literária do

Barroco (1977, 108).

Vejamos um poema de Francisco Rodrigues Lobo:

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SonetoQue amor sigo? Que busco? Que desejo?Que enleio é este vão da fantasia?Que tive? Que perdi? Quem me queria?Quem me faz guerra? Contra quem pelejo?

Foi por encantamento o meu desejoE por sombra passou minha alegria;Mostrou-me Amor, dormindo, o que eu não via,E eu ceguei do que vi, pois já não vejo.

Fez à sua medida o pensamentoAquela estranha e nova fermosuraE aquele parecer quase divino;

Ou imaginação, sombra, ou figura,É certo e verdadeiro meu tormento:Eu morro do que vi, do que imagino.

(Poesias, Lisboa, Sá da Costa 1940, pp. 77, 78. In: Moisés, 2006, 189.)

Podemos ver no poema acima a presença da influência

de Luís de Camões, além da inquietação barroca que iria se

manifestar de modo mais pleno em autores posteriores. Assim,

Rodrigues Lobo se situa na fronteira entre o quinhentismo e a

poesia conceptista.

A Fênix Renascida e o Postilhão de Apolo

A Fênix Renascida e o Postilhão de Apolo são as

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principais antologias poéticas do Barroco português. A Fênix

Renascida (1716) foi publicada em cinco volumes por Matias

Pereira da Silva e é talvez a antologia mais importante da

poesia barroca portuguesa. Nela é possível perceber a forte

influência camoniana, na glosa a seus sonetos e em seu poema

épico. Contém temas líricos, épicos, mitológicos, satíricos e

religiosos. Podemos ver nos poemas dessa antologia o uso

excessivo de antíteses, hipérbatos e sinestesias, característicos

do movimento, embora os poemas mostrem pouca riqueza de

conteúdo. Dentre os seus autores se encontram Jerônimo Baía,

Sóror Violante do Céu, Antônio da Fonseca Soares, D. Tomás

de Noronha, Diogo Camacho e Antônio Barbosa Bacelar. O

Postilhão de Apolo (1761) foi publicado em dois volumes por

D. José Ângelo de Morais. A temática dos poemas é variada,

desde a sátira até o lirismo grave. Possuem fortes

características gongóricas. Alguns dos poetas que participaram

da Fênix Renascida também participam do Postilhão de Apolo.

Além deles, temos também Eusébio de Matos, Bernardo Vieira

Ravasco, Francisco Rodrigues Lobo, D. Francisco Xavier de

Meneses, entre outros.

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3. A POESIA BARROCA NO BRASIL

Gregório de Matos

Gregório de Matos e Guerra (1633-1696) é, sem dúvida,

o maior nome da poesia barroca de língua portuguesa, e um dos

maiores satíricos da língua. Apesar da grandeza de sua obra,

não fez parte da formação do sistema literário brasileiro, vindo

a ser conhecido no Brasil apenas em um período muito

posterior.

Sua obra se divide em três partes: poesia lírica, satírica

e religiosa. Gregório se destacou por ter conseguido produzir

uma obra cheia de vivacidade, em uma época em que a poesia

era “artificiosa e fria” (Ramos, 1967, 27). Logrou fama por sua

poesia satírica, cheia de irreverência e veneno, que lhe rendeu o

epíteto de “Boca do Inferno”. No entanto, também foi bastante

relevante a sua poesia religiosa e lírica, que nos proporcionou

alguns dos mais belos sonetos de nossa língua. Sem dúvida,

Gregório de Matos foi um dos poetas mais representativos do

Barroco em língua portuguesa.

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Vejamos o seguinte poema de Gregório:

Pequei, SenhorPequei, Senhor; mas não porque hei pecado,Da vossa alta clemência me despido;Porque, quanto mais tenho delinquido,Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto pecado,A abrandar-vos sobeja um só gemido:Que a mesma culpa que vos há ofendidoVos tem para o perdão lisonjeado.

Se uma ovelha perdida é já cobradaGlória tal e prazer tão repentinoVos deu, como afirmais na sacra história,

Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,Cobrai-a; e não queirais, pastor divino,Perder em vossa ovelha a vossa glória.

(Ramos, Péricles Eugênio da Silva. Poesia Barroca: Antologia. São Paulo:

Melhoramentos, 1967, p. 30.)

Neste poema vemos o tom confessional da poesia

religiosa de Gregório. Embora muitos acreditem que a fase

religiosa de Gregório tenha ocorrido no fim de sua vida, como

uma expressão de arrependimento, ela se deu na realidade

concomitantemente com a poesia satírica, mostrando assim a

natureza contraditória de Gregório, tipicamente barroca.

No próximo soneto, podemos ver certas características

da poesia satírica de Gregório:

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A cada canto um grande Conselheiro,Que nos quer governar cabana e vinha:Não sabem governar sua cozinha,E querem governar o Mundo inteiro!

Em cada porta um bem frequente OlheiroDa vida do Vizinho e da Vizinha,Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinhaPara o levar à Praça e ao Terreiro.

Muitos Mulatos desavergonhados,Trazendo pelos pés aos Homens nobres;Posta nas palmas toda a picardia.

Estupendas usuras nos mercados:Todos os que não furtam, muito pobres:Eis aqui a Cidade da Bahia.

(Ramos, Péricles Eugênio da Silva. Poesia Barroca: Antologia. São Paulo:

Melhoramentos, 1967, p. 54.)

Certamente há muito que se falar a respeito deste

grande poeta da língua portuguesa, no entanto temos aqui

apenas um pequeno resumo do que foi a poesia de Gregório de

Matos. Não se pode negar sua importância para a Literatura

Brasileira, embora, como já foi dito anteriormente, ele não teve

influência direta nos momentos decisivos da formação do

sistema literário brasileiro, por não ter sido sequer conhecido

na época do Arcadismo e do Romantismo brasileiros.

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Manuel Botelho de Oliveira

Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711) foi o primeiro

autor brasileiro a ter sua obra publicada, o livro Música do

Parnasso, editado em 1705, em Lisboa. Maior representante do

cultismo gongórico no Brasil. Utilizou muito simbolismo em

sua poesia, muito rebuscamento de linguagem, mas os temas

que abordou eram demasiado fúteis.

Os demais autores do Barroco brasileiro foram pouco

significativos. Como não pretendemos nesta obra fazer um

estudo detalhado e aprofundado do movimento barroco,

especialmente no Brasil, não trataremos dos demais autores.

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4. HISTORIOGRAFIA EM PORTUGAL NO PERÍODO

BARROCO

A historiografia do período seiscentista em Portugal não

teve tanta expressão. Regrediu muito em relação aos períodos

anteriores. Acabou se tornando submissa aos interesses da

aristocracia, além de introvertida, subjetivista e retrógrada

(Moisés, 1977, 109).

Frei Luís de Sousa

O nome de maior importância nesse gênero foi Frei

Luís de Sousa (1555-1632). Foi um modelo da melhor prosa da

época, com um estilo sóbrio e sem os excessos do Barroco.

Disse Massaud Moisés acerca dele:

Seu mérito, para nós mais importante, reside no estilo de que era senhor: pela linguagem castiça, fluente, plástica, apropriada ao andamento psicológico, moral ou factual das cenas, tornou-se verdadeiro mestre, ao lado do Padre Vieira e do Padre Bernardes. (1977, 111)

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5. EPISTOLOGRAFIA EM PORTUGAL NO PERÍODO

BARROCO

Embora o gênero já fosse cultivado muito antes, a

epistolografia do barroco português assume características

muito peculiares, diferenciando-se da que já ocorreram no

Renascimento e alcançando brilho poucas vezes alcançado em

outras épocas, antes ou depois. Na época, as cartas

funcionavam de modo semelhante a jornais, muitas vezes sem

um destinatário específico, mas endereçadas a um leitor ideal,

fictício. Produziram no gênero importantes escritores da época

em Portugal, entre eles o Pe. Antônio Vieira, D. Francisco

Manuel de Melo, Frei Antônio das Chagas, Cavaleiro de

Oliveira e Sóror Mariana Alcoforado, a esta última darei

atenção especial.

Sóror Mariana Alcoforado

Sóror Mariana Alcoforado (1640-1723) não escreveu

com objetivo literário. Suas cartas não foram escritas para

serem publicadas. Deu-se que em 1663 se apaixonou por um

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oficial francês chamado Chamilly, e este, tendo recebido

chamado superior, retorna à França, abandonando Mariana,

com quem troca cartas, das quais só ficaram as que foram

escritas pela religiosa. As cartas foram traduzidas para o

francês e publicadas em Paris em 1669 sem indicação de

destinatário ou do tradutor, e posteriormente no mesmo ano é

publicada nova edição, agora com os nomes do destinatário e

do tradutor, respectivamente Chamilly e Guilleragues, além da

remetente: Mariana. Só em 1810 foram traduzidas para o

português por Filinto Elísio. Foram publicadas apenas cinco

cartas, mas não se sabe ao certo se foram escritas apenas cinco,

qual a ordem correta na qual foram escritas, em que língua de

fato foram escritas e se não houve interpolações feitas pelo

tradutor.

As Cartas de Amor, como ficaram conhecidas, são de

uma beleza e lirismo fantásticos. Por terem sido escritas

motivadas por sentimento puro e verdadeiro, sem fins de

publicação e sem a preocupação com a estética, distanciam-se

um tanto do estilo barroco, pela leveza e espontaneidade, mas

mantém certa ligação com o período, especialmente pelo

paradoxo de ideias. A autora expressa de modo muito sincero e

apaixonado os seus mais íntimos sentimentos, em especial na

terceira carta, considerada o ponto alto de sua confissão.

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6. TEATRO BARROCO EM PORTUGAL

Desde Gil Vicente, não apareciam em Portugal

dramaturgos de expressão. Todos os que surgiram copiaram o

estilo do grande teatrólogo português ou se restringiram a

apresentações fechadas de peças de caráter religioso ou

moralizante. No Barroco, D. Francisco Manuel de Melo

chegou a dar uma contribuição importante ao teatro português

com sua peça Fidalgo Aprendiz, mas além dele, nada de

relevante seria produzido no gênero no país até o surgimento

de Antônio José da Silva.

Antônio José da Silva

Antônio José da Silva (1705-1739), conhecido como “o

Judeu”, produziu pouco por sua vida ter sido interrompida pela

Inquisição, mas ainda assim sua obra foi bastante significativa.

Suas peças tinham o objetivo de provocar o riso, satirizar a

sociedade da época por meio da comicidade. As peças eram

acompanhadas por música e canto e eram representadas por

“marionettes”. Tinha influência de Gil Vicente, mas também

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reúne traços da comédia clássica e do teatro contemporâneo

espanhol, italiano e francês. Destaco dentre suas peças as

Guerras do Alecrim e da Manjerona (1737). É a sua peça mais

acabada, segundo Moisés (1977, 116). Nela, Antônio José da

Silva satiriza tanto a novela de cavalaria (nos nomes de

linhagem celta do personagem D. Tibúrcio e no nome do

personagem D. Lancerote) como também o próprio estilo

barroco, quando utiliza os recursos gongóricos para provocar

riso. Nisto pode-se perceber que a obra do dramaturgo já traz

os primeiros sinais da decadência do movimento.

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7. CONCLUSÕES ACERCA DO BARROCO EM

PORTUGAL E NO BRASIL

O Barroco em sua completude se mostra, como

pudemos ver através deste trabalho, como um movimento um

tanto difícil de definir. Não há uma unidade estética,

características que possamos considerar gerais, no entanto

podemos concluir que é esse caráter confuso e paradoxal a sua

principal característica. O teor pesado da estética barroca, a

linguagem carregada, a inquietude de ideias, são características

que podemos tomar para, mais adiante, contrapor com a escola

literária que virá a seguir: o Arcadismo.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa. São Paulo:

Cultrix, 1977.

________________. A Literatura Portuguesa Através dos

Textos. 30ª ed. São Paulo: Cultrix, 2006.

RAMOS, Péricles Eugênio da Silva. Poesia Barroca:

Antologia. São Paulo: Melhoramentos, 1967.

<http://auladeliteraturaportuguesa.blogspot.com> acessado em

20 de novembro de 2009, às 20h40min.

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SOBRE O AUTOR

Bruno Fernandes de Lima nasceu em 03

de junho de 1984, na cidade de Paulista, na

região metropolitana do Recife, estado de

Pernambuco. Cresceu e estudou durante

toda a infância e a maior parte da

adolescência em Olinda. Cursou o último

ano do Ensino Médio no Colégio e Curso

Brasil, em Recife, em 2001. Iniciou em 2003 o curso de Letras

na Universidade Federal de Pernambuco. Em 2005, viajou para

São Paulo para servir como missionário da Igreja de Jesus

Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Serviu nas cidades de São

Paulo, Guarulhos e São José dos Campos. Voltou para Olinda

em 2007 após concluir seu serviço como missionário religioso.

Em 2008, casou-se com Carla Renata de Oliveira Sandes.

Nesse mesmo ano, começou a trabalhar como professor de

inglês e português. Em 2009, nasceu sua filha Marina Sandes

de Lima. Ainda em 2009, retomou o curso de Letras, o qual

ainda está em andamento. Foi então que desenvolveu o gosto

pela poesia e pela literatura. Começou a escrever poesias e

publicou várias delas na internet durante o ano de 2009. Em

2010, publicou o livro Felicitas e Outras Poesias. Atualmente

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está conhecendo outros gêneros e estilos literários, como a

poesia estruturalista e concretista, além da poesia marginal.

Também se interessa por literaturas de língua inglesa, área em

que pretende se especializar.