lisboa - grémio do património · unidade de projecto do bairro alto e bica (nuno morais)...

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Ano V – N.º 23 Julho /Agosto / Setembro 2004 – Publicação trimestral – Preço 4,48 (IVAincluído) Entrevista Dr.ª Mafalda Magalhães de Barros Empreiteiros Qualificação para a reabilitação Revista da Conservação do Património Arquitectónico e da Reabilitação do Edificado Entrevista Dr.ª Mafalda Magalhães de Barros Empreiteiros Qualificação para a reabilitação Cinco casos de estudo de reabilitação de Lisboa Lisboa: Conservar e reabilitar os bairros históricos Lisboa: Conservar e reabilitar os bairros históricos

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Page 1: Lisboa - Grémio do Património · Unidade de Projecto do Bairro Alto e Bica (Nuno Morais) PATRIMÓNIO RELIGIOSO 24 ... Câmara Municipal de Lisboa na reabi-litação urbana, colocada

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EntrevistaDr.ª Mafalda

Magalhães de Barros

EmpreiteirosQualificação

para a reabilitação

Revista da Conservação do Património Arquitectónico e da Reabilitação do Edificado

EntrevistaDr.ª Mafalda

Magalhães de Barros

EmpreiteirosQualificação

para a reabilitação

Cinco casos de estudo de reabilitação de Lisboa

Lisboa:Conservar e reabilitar os bairros históricos

Lisboa:Conservar e reabilitar os bairros históricos

Capa n.º 23 2/4/07 3:42 PM Page 1

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

Tema de Capa:

Reconhecida pelo Ministério da Cultura como “publicação de manifesto interesse cultural”,ao abrigo da Lei do Mecenato.

N.º 23 - Julho/Agosto/Setembro 2004Propriedade e edição: GECoRPA – Grémio das Empresas deConservação e Restauro do PatrimónioArquitectónicoRua Pedro Nunes, n.º 27, 1.º Esq.º1050 - 170 LisboaTel.: 213 542 336, Fax: 213 157 996http://www.gecorpa.ptE-mail: [email protected]: 503 980 820Director: Vítor Cóias e SilvaCoordenação: Cátia MarquesConselho redactorial: João Appleton, João Mascarenhas Mateus, José Aguiar,Miguel Brito Correia, Teresa de Campos Coelho Secretariado: Elsa FonsecaColaboram neste número: A. Jaime Martins, Carla Nicolau Ferreira,Carlos Mesquita, Cátia Marques, HelderCarita, João Varandas, José Maria Amador,José Maria Lobo de Carvalho, MafaldaMagalhães de Barros, Miguel Brito Correia,Miguel Figueiredo, Nuno Morais, NunoTeotónio Pereira, Paula Girão, Pedro Silva,Ricardo Lucas Branco, Rui Matos, SorayaGenin, Teresa Poole da Costa, Vanda Pereirade Matos, V. Cóias e Silva.Design gráfico e produção:Loja da ImagemRua Poeta Bocage, n.º 13 – B 1600-581 LisboaTel.: 210 109 100, Fax: 210 109 199E-mail: [email protected]:Loja da ImagemRua Poeta Bocage, n.º 13 – B 1600-581 LisboaTel.: 210 109 100, Fax: 210 109 199E-mail: [email protected] Impressão: Onda Grafe – Artes Gráficas, Ld.ªRua da Serra, n.º 1 – A-das-Lebres 2670-791 S.to. Antão do TojalDistribuição: Distribuidora Bertrand

Depósito legal: 128444/98Registo na DGCS: 122548ISSN: 1645-4863Tiragem: 2000 exemplaresPeriodicidade: Trimestral

Os textos assinados são da exclusiva responsabili-dade dos seus autores, pelo que as opiniões expres-sas podem não coincidir com as do GECoRPA.

1

Ficha Técnica 2EDITORIAL

46DIVULGAÇÃO

45COMEMORAÇÃO

48VIDAASSOCIATIVA/ NOTÍCIAS

51AGENDA

52LIVRARIA

56CONSULTÓRIO GECoRPA

57ASSOCIADOS GECoRPA

54PERFIL DE EMPRESA

4REFLEXÕES

Ano

V –

N.º

23 Ju

lho

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2004

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trim

estr

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do)

EntrevistaDr.ª Mafalda

Magalhães de Barros

EmpreiteirosQualificação

para a reabilitação

Revista da Conservação do Património Arquitectónico e da Reabilitação do Edificado

EntrevistaDr.ª Mafalda

Magalhães de Barros

EmpreiteirosQualificação

para a reabilitação

Cinco casos de estudo de reabilitação de Lisboa

Lisboa:Conservar e reabilitar os bairros históricos

Lisboa:Conservar e reabilitar os bairros históricos

Capa

AlfamaD.M.C.R.U.-C.M.L.

Lisboa: Conservar e reabilitar os bairros históricos

A Reabilitação Urbana em LisboaUma nova cultura de cidade

(Mafalda Magalhães de Barros)

32TECNOLOGIAS

Métodos de inspecção e observaçãocomo suporte da reabilitação do

património construído(Carlos Mesquita)

36URBANISMO EM ANÁLISE

As reformas urbanas manuelinas(Helder Carita)

40ISTO TAMBÉM É PATRIMÓNIO

Os gradeamentos de ferro nas fachadas(Cátia Marques)

34METODOLOGIAS

Metodologia e fases do projecto deconservação (Soraya Genin)

44AS LEIS DO PATRIMÓNIO

AAutoridade da Concorrênciapronuncia-se sobre a prestação de

serviços pelas universidades(A. Jaime Martins)

42OPINIÃO

Sistema de classificação das empresas (V. Cóias e Silva)

Cinquentenário da convenção da Haia(Miguel Brito Correia)

Inventários do património construído(Miguel Brito Correia)

Reabilitação urbana na Internet (José Maria Lobo de Carvalho)

55e-pedra e cal

8ENTREVISTA

Dr.ª Mafalda Magalhães de BarrosD.M.C.R.U. – C.M.L.

(Carla Nicolau Ferreira)

11CASO DE ESTUDO

Unidade de Projecto do Bairro Alto e Bica(Nuno Morais)

24PATRIMÓNIO RELIGIOSO

Reabilitar monumentos nas zonashistóricas da cidade

(José Maria Amador)

60PERSPECTIVAS

Reabilitação urbana: para além dosbairros históricos

(Nuno Teotónio Pereira)

27PROJECTOS & ESTALEIROS

Mercado da Mina de São Domingos(João Varandas)

14Areformulação dos interiores como espaçosde vivência, de memória e de modernidade

(Paula Girão, Rui Matos)

38O Postigo do Melo e Casas do

Embaixador(Vanda Pereira de Matos)

16Uma intervenção na Rua da Madalena

(Teresa Poole da Costa)

18O Palácio Pombal da Rua do Século

(Miguel Figueiredo)

20Ligações estruturais nos edifícios

da Baixa Pombalina(V. Cóias e Silva)

26O valor dos monumentos nos bairros

históricos da cidade actual(Ricardo Lucas Branco)

30Intervir nos bairros históricos

(Pedro Silva)

A Pedra & Cal agradece à Direcção Municipal de Conservação e Reabilitação Urbana da Câmara de Lisboa todoo apoio prestado na preparação deste número.

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 20042

EDITORIAL

Ao que parece, o nosso país sai, finalmente, de um ciclo de construção nova para encetar uma fase em quese pretende que a reabilitação das construções existentes tenha a primazia. Durante mais de uma década, o ritmo de construção nova foi alucinante: uma habitação de 5 em 5 minu-tos, dia e noite, sábados, domingos e feriados. Hectares e hectares dos nossos melhores solos foram beto-nizados e neles nasceram à pressa, por obra e graça de uma legião de construtores-promotores, milharesde novos blocos de apartamentos.Seduzidos pelas campanhas milionárias dos bancos, onde é tudo facilidades, e pelos “vídeo-porteiros”,“sons-ambientes” e “halls de mármore” dos construtores-promotores, a juventude deste país empenhou--se para o resto da vida para comprar, a preços muitas vezes exorbitantes, habitações de qualidade e du-rabilidade duvidosas.Foi um festim de vários anos em que uns quantos ganharam à custa de muitos outros perderem. Mas foium festim, sobretudo, para os que, ignorando as regras da arte e os requisitos da qualidade, construírama eito os tais apartamentos de “encher o olho”, onde, ao fim de pouco tempo, os defeitos e as insuficiênciascomeçam a vir ao de cima. É que construir parece fácil, mas não é, se se quiser construir com qualidade.E se construir bem já não é fácil, reabilitar a sério ainda o é menos. Reabilitar construções existentes é mui-to mais complicado do que construir a partir do zero. Exige materiais e tecnologias muito diferentes daconstrução nova. Acresce que grande parte do nosso edificado é bastante antigo e foi construído por téc-nicas, entretanto, abandonadas em favor do betão armado. A anatomia e a patologia desses edifícios é des-conhecida dos construtores de hoje. É por isso que o GECoRPA acha que as “simplificações” recentemente introduzidas na “Lei dos alvarás”foram no sentido contrário ao que deviam, abrindo as portas da reabilitação a todo e qualquer “pato-bra-vo”. Para que a maior relevância da reabilitação no sector da construção seja tida em conta, algumas dascategorias dos alvarás deverão, desde logo, ser separadas entre construção nova e reabilitação de cons-truções existentes. Há um mundo de diferenças entre construir, hoje, um edifício novo e reabilitar devida-mente um edifício com 100 ou 200 anos. Se não se estimular a especialização das empresas na reabilitação,estar-se-á a permitir um novo festim, gastando rios de dinheiro em obras que não duram nada, e descu-rando a própria segurança dos edifícios. Finalmente, há a questão da fiscalização do cumprimento da lei. E aqui a porta, que já estava aberta, ficaescancarada: o IMOPPI não tem meios para auditar as empresas, limitando-se a aceitar pelo valor facial ospapéis que os empreiteiros lhe entregam. Como dizia, há uns anos, a este propósito, Rui Alarcão, “Nós te-mos leis boas que são mal aplicadas e temos leis más que são bem aplicadas”. Aqui, e no que se refere à re-abilitação do edificado, receio que tenhamos uma lei má e mal aplicada.

V. Cóias e Silva

Reabilitação a sério ou mais um festim para os “patos-bravos”?

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

GECoRPA

3

Quadro de Honra

Do número apreciável de empresas que têm manifestado interesse na conservação do patrimónioarquitectónico português e nas actividades do GECoRPA, foi seleccionado um grupo restrito depatrocinadores da revista Pedra & Cal.Para distinguir essas empresas, particularmente empenhadas no sucesso da revista, foi criado opresente Quadro de Honra.

A Direcção do GECoRPA

Gabinete Técnico de Engenharia, Ld.aConservação e Restauro do

Património Arquitectónico, Ld.a

Diagnóstico, Levantamento e Controlo deQualidade de Estruturas e Fundações, Ld.a

03-03 Quadro de Honra 2/4/07 3:47 PM Page 3

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

TRADIÇÃO E MODERNIDADELisboa, como boa parte das cidadeseuropeias, mantém ainda um equilí-brio aceitável entre o fazer e o desfazer,entre as novas e as velhas estruturas, oque é um sinal de cultura.O trabalho da Reabilitação Urbana épois, por excelência, o de tutelar pelaconservação dos legados e ambientesurbanos, integrando-os na dinâmica demodernização da cidade. Pelo que umdos principais desafios assenta na ela-boração de projectos que permitamestabelecer um equilíbrio entre a pre-servação das memórias e dos vestígiosmateriais das vivências passadas e asua adequação a novos usos. Tradição emodernidade convivem numa cidadeque preza a sua longa história.

DEGRADAÇÃO DOS CENTROSHISTÓRICOSDurante décadas, Lisboa abandonouos seus centros históricos a um proces-so de lenta mas eficaz degradação. Ummodelo desequilibrado de desenvolvi-

mento traduziu-se no crescimento deuma malha periférica com cada vezmaior densidade de construção, en-quanto um número crescente de habi-tações ficavam devolutas nos seus cen-tros históricos(2). A grande aposta daCâmara Municipal de Lisboa na reabi-litação urbana, colocada em 2001/2002pela actual gestão autárquica, e defini-da como prioridade pelo seu presi-dente, Dr. Pedro Santana Lopes, tradu-ziu-se numa intervenção prática eimediata nestes territórios, de modo ainverter esta tendência de crescimentodesintegrado. Uma nova cultura urba-

na, implicando uma visão global dacidade, opôs ao crescimento indiscri-minado uma nova atenção sobre a cida-de existente.

INTERVENÇÃO EM DIVERSAS ÁREASAlgumas áreas foram consideradas deintervenção prioritária: a Baixa Pomba-lina, com o início da intervenção no edi-ficado da Rua da Madalena, maiorita-riamente particular, e no da Rua de S.Bento, em grande númeromunicipal; oinício da resolução de problemas quese arrastavam há quase uma década

4

REFLEXÕES

A Reabilitação Urbana em Lisboa

Uma nova cultura de cidade

Tema de Capa

Acidade é um corpo vivo, nela perdurando velhas estruturas his-tóricas e antigas formas de vida que convivem com novas criaçõesdo engenho humano. Uma cidade que cresce e que se constrói éao mesmo tempo uma cidade que se destrói. E é precisamente “namaneira de articular esta dupla operação de construção/des-truição que reside a possibilidade de as cidades se desenvolve-rem harmoniosamente”(1).

Reabilitação da Rua da Madalena (vários edifícios)

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nas freguesias do Castelo e de Alfama;a dinâmica criada no Bairro Alto com aintervenção no edificado e no espaçopúblico, possibilitada pelo condiciona-mento do trânsito naquele bairro; o iní-cio do programa de requalificação daMouraria após o encerramento ao trân-sito do Largo do Intendente. Dentro das diversas áreas de actuação,face aos problemas encontrados, novassoluções foram preconizadas paracumprir objectivos claros: aumento dadisponibilidade de habitação no cen-tro; aumento da segurança dos bairros;qualificação da oferta dos serviços;defesa e preservação dos valores patri-moniais.

Destacamos, ainda, a criação de umprograma específico para a conser-vação e restauro dos monumentosintegrados nas zonas históricas e quese tem traduzido numa campanha,sem paralelo, de restauro dos maissignificativos monumentos da cida-de. Estas acções integram-se no mes-mo objectivo da revitalização doscentros históricos, aumentando nelesa oferta cultural.

UM TRABALHO MULTIDISCIPLINARA complexa problemática da reabili-tação dos centros históricos é um tra-balho que exige a articulação de di-

versas disciplinas. À conservação dopatrimónio edificado alia-se a exigên-cia da conservação do patrimónioimaterial e, para que esse subsista, háque tutelar pela permanência daspopulações, pois só elas conferemalma aos espaços. Não defendemosuma cidade-museu parada no tempo,mas sim uma cidade culta e cosmo-polita, onde a construção se faça como mínimo de destruição possível e,sobretudo, que essa destruição decor-ra apenas da necessidade de adap-tação dos espaços às novas exigên-cias. Onde a tradição conviva (bem)com a modernidade, numa estratégiade integração e não de exclusão.

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REFLEXÕESTema de Capa

Palácio Pombal, Oratório

Escola n.º 12 - Rua da Rosa, n.º 160: obras na cobertura Rua da Rosa, n.º 145: habitação

Palácio Pombal: estrutura em madeira de tecto (séc. XVII / XVIII)

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REFLEXÕES

Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

Tema de Capa

UMA ESTRATÉGIA DE INCLUSÃO Neste domínio particular de acção eporque a intervenção no edificado exi-ge muitas vezes o realojamento dosresidentes, tem-se optado pelo arren-damento habitacional para respondera esta necessidade. Face a uma políticade atribuição massiva de subsídios àsfamílias que era necessário desalojar –política essa que assumia anteriormenteum peso desmesurado no orçamentoda instituição –, optou-se por procedera arrendamentos de fogos particularesnas imediações das áreas de residência,destinados exclusivamente a este ob-jectivo. Contribuímos, deste modo,

para estimular o mercado de arrenda-mento e para a sustentabilidade da eco-nomia dos bairros.De igual modo, uma política sistemáti-ca de vistorias ao edificado da cidade, ea consequente intimação dos proprie-tários à realização de obras de conser-vação, tem-se traduzido numa cam-panha de obras sem paralelo, muitas deiniciativa particular.Só a título de exemplo refiro os casos daRua de S. Bento onde existem 117 edifí-cios particulares(3). Destes, 27 encon-tram-se em bom estado de conservaçãoe 76 em fases distintas de procedimen-to com vista à intimação, estando já 32processos de intimação com prazos a

decorrer. Relativamente a estes últi-mos, cerca de 50% dos proprietáriosdeu já início a obras, apresentou candi-daturas ao Recria ou projectos de alte-ração em sede de licenciamento.No que respeita à Rua da Madalena,dos 61 edifícios existentes naquela arté-ria, 42 foram objecto de processos deintimação, encontrando-se concluídasobras em 12 edifícios, estando a decor-rer intervenções em 22. Destas 34 inter-venções, 20 foram levadas a efeito pelosparticulares, o que significa uma taxade 58% de iniciativa privada. Para 9 edifícios particulares decorrem proces-sos de licenciamento, e a câmara, alémda recuperação dos 2 edifícios munici-pais, executou e prepara intervençõescoercivas sempre que os proprietáriosnão intervenham atempadamente.

NOVA DINÂMICAO que importa sublinhar é a dinâmicacriada pela autarquia em prol da recu-peração do edificado da cidade que fará,estamos certos, criar condições para quemais fogos fiquem disponíveis e, conse-quentemente, novas camadas da popu-lação procurem estas zonas da cidadecomo locais de residência e fruição.Para a implementação deste ambiciosoprojecto, prevêem-se investimentos naordem dos 45 milhões de euros, dividi-dos por diversas empreitadas em cursoum pouco por toda a cidade, com espe-cial incidência nas áreas onde se encon-tram sediadas Unidades de Projecto eem eixos considerados prioritários.A aposta da Câmara Municipal deLisboa na reabilitação urbana cremosser já uma aposta ganha.

Notas:(1) Goitia, Fernando Chueca, Breve História do Urbanis-mo, Editorial Presença, 1996, pág. 205.(2) Entre 1991 e 2001, Lisboa perdeu 14,9 % dos seus ha-bitantes (98.737), enquanto que o número de residen-tes nos concelhos limítrofes cresceu, de acordo com osdados do Census 2001.(3) Na Rua de S. Bento existem 117 edifícios particula-res e 32 municipais, tendo destes transitado para aEPUL 4 edifícios e 5 integraram uma permuta comuma empresa de empreendimentos imobiliários.

6

MAFALDA MAGALHÃES DE BARROS,Directora Municipal de Conservação e Reabilitação Urbana, CML

Travessa do Convento de Jesus, n.º 35: habitação

Reabilitação na Freguesia do Castelo de S. Jorge: Rua de Santa Cruz do Castelo

Ermida de Nossa Senhora dos Remédios, Rua da Regueira, Alfama

04-06 Reflexões 2/4/07 3:59 PM Page 6

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ENTREVISTA

Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

Tema de Capa

8

Lisboa é hoje uma cidade que respiracom mais orgulho o passado no seupatrimónio construído?Penso que a actual autarquia desenca-deou uma dinâmica fundamental paraeste processo de reabilitação dos bair-ros históricos. Era necessário não só

estancar a desertificação do centro his-tórico, mas também promover a me-lhoria e a qualificação da habitação nes-sas áreas. No centro da cidade, toda aconstrução antiga e as áreas históricasencontravam-se abandonadas. Pensoque foi a aposta certa na hora certa.Sabemos que o facto de as rendas te-rem sofrido muito pouca evoluçãonestes últimos anos levou a que osproprietários não investissem nahabitação. As populações residentesnestas áreas são maioritariamenteenvelhecidas e carenciadas de recur-sos financeiros. Isto, aliado ao factode os terrenos nestas áreas seremaltamente apetecíveis para o desen-volvimento de projectos imobiliá-rios, levou a um ponto quase de rup-tura. Ao intensificar este processo devistorias, intimações e posses admi-nistrativas, a câmara criou uma dinâ-mica que fez com que muitos pro-

prietários realizassem eles própriosas obras. Assim se disponibilizarámais habitação no centro da cidade.Há poucos meses, o número de edifíciosem obras de reabilitação (particulares emunicipais) era de cerca de 600, só nestazona dos bairros históricos.

Quais os bairros lisboetas que se enqua-dram na classificação “históricos”?Neste momento, as áreas históricashabitacionais podem ser identificadaspela existência de gabinetes técnicoslocais – unidades de projecto: Madra-goa, Bairro Alto e Bica, Baixa/Chiado,a Mouraria, Castelo e Alfama. Emsimultâneo, há o Departamento deConservação de Edifícios Particulares(que está afecto também à Direcção deConservação e Reabilitação Urbana),que abarca toda a área da cidade e quetem como objectivo efectuar as visto-rias, notificar os proprietários e intimar

Durante décadas, Lisboa esque-ceu os seus bairros históricos vo-tando-os ao abandono. A actualgestão autárquica iniciou umanova dinâmica na reabilitação dasáreas históricas habitacionais, quejá está a dar os seus frutos. Tradi-ção e modernidade estão a apren-der a conviver numa cidade orgu-lhosa da sua longa história. Para a Dr.ª Mafalda Magalhães deBarros, a actual responsável pelaDirecção Municipal de Conser-vação e Reabilitação Urbana, tra-ta-se do “início de um processoirreversível, que nos vai obrigar aolhar para estas áreas históricasde um modo diferente e constatarque aqui está uma riqueza patri-monial muito grande e umamais-valia que temos andado adesperdiçar”.

Telm

oM

iller

Dr.ª Mafalda Magalhães de Barros

Direcção Municipal de Conservação e Reabilitação Urbana - Câmara Municipal de Lisboa

Conservar o encanto de Lisboa

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

ENTREVISTATema de Capa

9

à realização de obras. A lei estabeleceque os proprietários devem realizarobras de 8 em 8 anos, mas ninguém ofaz. O facto de nós, em muitos casos,quando o proprietário não faz as inter-venções, avançarmos para as possesadministrativas fez com que muitosdeles viessem ter connosco, no sentidode obterem informação sobre os pro-gramas de comparticipação Recria, etc.E tudo isto ajudou-nos a conhecer umbocadinho melhor o terreno onde nosmovemos.

Actualmente, o programa de reabili-tação é mais extensivo a toda a cidade?Há dois anos havia, de facto, um pro-grama para a reabilitação mais circuns-crito, não era extensível à cidade toda(a Baixa Pombalina e a área de S. Bento,por exemplo, estavam excluídas destadinâmica). Com a nova orgânica pre-tendeu-se que a reabilitação fosseestendida a toda a cidade.

Neste momento, quais são os grandesfocos de atenção?Há um grande volume de intervençõesnas áreas de Alfama, Castelo, Madra-goa, Bairro Alto e Bica. Está em cursouma grande empreitada na zona daMouraria e Intendente. Temos inter-venções em curso na Baixa Pombalina,especificamente na zona da Rua daMadalena. Está a ser preparada umaintervenção para o eixo da Rua daMisericórdia-Alecrim. Entrámos tam-bém agora numa nova fase de inter-venção na Rua de S. Bento. No total,foram lançadas e consignadas peloPelouro da Reabilitação Urbana, sobcoordenação da vereadora EduardaNapoleão, seis grandes empreitadas,que envolvem um investimento de cer-ca de 6 milhões de contos.

Quais as áreas envolvidas num pro-grama de reabilitação num bairro his-tórico?Uma das questões que mais me surpre-endeu, quando aqui cheguei, foi o factode toda a parte monumental estarexcluída da reabilitação. Para nós, acidade é constituída pelas habitações,pelos seus parques públicos, seus

monumentos... e por isso detectámos,de imediato, a necessidade de criar umprograma específico para a conser-vação do património monumental,nomeadamente o religioso. Neste mo-mento, são 15 as igrejas que estão asofrer intervenções de restauro. Orga-nizámos um programa muito interes-sante onde contamos com o apoio daDGEMN (que tem sido uma parceriafantástica) e das paróquias, claro está.A nível do património monumental,temos desenvolvido outras interven-ções muito interessantes como, porexemplo, a do Palácio Marquês dePombal (um projecto de recuperaçãoestrutural e do património artístico).No fundo, um programa de reabili-tação numa área histórica habitacionalimplica olhar também para o espaçopúblico, dando atenção ao pavimento,à vegetação, à iluminação, à definiçãodo mobiliário urbano. Já há projectos aeste nível em curso, mas em certaszonas temos de esperar que terminemas obras nos edifícios para podermosiniciar essa frente de acção. Em algunscasos, como no Bairro Alto, o condi-cionamento do trânsito permitiu a ins-talação de esplanadas e um melhorusufruto do espaço anteriormente ocu-

pado, muitas vezes anarquicamente,por carros.

Como é assegurada a salvaguarda dasconstruções com valor enquanto pa-trimónio arquitectónico?O nosso objectivo é a conservação doedificado, aplicando metodologias nãointrusivas. O que fazemos em sede deobra de conservação e, muitas vezes,em sede de obra coerciva é rectificar,tanto quanto possível, intervençõesque vieram descaracterizar os edifíciose pôr em causa a sua segurança (por-que lhes eliminaram elementos estru-turais fundamentais). Somos muitosensíveis às questões do equilíbrio, daharmonia do corpo edificado e consi-deramos que a intervenção tem de terem conta um conhecimento profundodo edifício onde estamos a intervir.Tentamos introduzir metodologias deintervenção e de conservação que nãoviolentem o edificado. Mas, muitasvezes, também testamos novas tecno-logias.Estou a pensar, por exemplo, no Paláciodo Marquês de Pombal, à Rua doSéculo, em que a fachada tardoz estavaa deslocar-se do corpo do edifício e foiintroduzida uma tecnologia inovado-ra, projecto do Eng.º João Appleton,que permitiu segurar o edifício.

Como é que vê a extinção, pelo IMOP-PI, da categoria “património construí-do protegido”, que distinguia, precisa-mente, as empresas especializadas emintervenções em construções antigas?Se esta categoria desapareceu, esperoque seja substituída por uma outraidêntica. Pois enquanto estive noIPPAR e agora aqui para a câmara, umdos critérios de selecção das empresaspassava exactamente por serem em-presas creditadas no IMOPPI, paraintervenção neste tipo de edificado.Relativamente ao outro tipo de inter-venção em património classificado,como é o caso das igrejas (Igreja deSanta Catarina, Igreja de S. João daPraça, de Santo Estêvão, de S. Miguel, aErmida dos Remédios, etc.), estamos atrabalhar com a DGEMN que tambémnos ajuda na definição das metodolo-

Telm

oM

iller

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gias e na elaboração dos cadernos deencargos. Depois, quando se trata deintervenção em património artístico, sãoescolhidas empresas acreditadas nosinstitutos de conservação e restauro.

A CML abandonou definitivamenteas operações meramente cosméticasde reabilitação?Todas as intervenções, se têm um ladoestético, visam sempre travar o proces-so de degradação dos imóveis. Pensoque estamos numa 2.ª fase, a que o Eng.º Cóias e Silva descreve como“uma reabilitação mais complicadaque é a de criar melhores condições dehabitabilidade e salubridade” e, paraisso, é necessário dotarmos o edifíciode instalação de esgotos, verificar oestado das caixilharias, das coberturas,etc. Em muitos casos, diria mesmo quejá entrámos na 3.ª fase: a do projecto dereabilitação estrutural.Por exemplo, na Rua da Madalenacomeçámos a perceber que tínhamosque evitar que os edifícios ruíssem. Nãointeressava se tinham casas de banhoou não. A intervenção começou porassegurar a salvaguarda do edificado(visou a conservação das coberturas,das fachadas, dos caixilhos e das redes:esgotos, água, electricidade e gás). Essafoi a 1.ª etapa. Agora vamos, caso acaso, verificar os interiores, em quesituação é que as pessoas vivem; masos edifícios, esses, deixaram de estarem risco de colapso.

É sabido que os edifícios da BaixaPombalina (e de outras zonas antigasda cidade) se encontram em situaçãode grande vulnerabilidade face à pos-sível ocorrência de um sismo intenso,como o de 1755. Como é que a CMLpensa assegurar que a reabilitação dosedifícios inclua a sua reabilitaçãoestrutural e não seja apenas o “lavar acara” desses edifícios?Ao longo de dezenas de anos, ou sécu-los, foram sendo feitas alterações aosedifícios que afectaram a sua estabili-dade. Para trás estão 200 anos de inter-venções que não são, certamente, asmais consentâneas com aquilo queactualmente achamos que seria desejá-

vel em termos da segurança e daresistência sísmica.No entanto, só podemos intervir nosedifícios quando os proprietáriosquerem fazer obras – e aí, sim, emsede de licenciamento, analisar todoo projecto e verificar se respeita alegislação em vigor no que respeita àsegurança – ou em sede de obra coer-civa, fazendo as intervenções que nósachamos mais adequadas. No entan-to, muitas destas alterações que ago-ra questionamos foram legalizadasao longo dos tempos.Acho que é um processo complexo queexige regulamentação, acompanha-mento técnico e também sensibilizaçãodos intervenientes no processo.

As intervenções levadas a cabo pelacâmara promovem a demolição totaldos interiores por questões de segu-rança?Infelizmente a degradação de algu-mas estruturas edificadas obrigou aque alguns projectos contemplassema demolição de interiores e a sua pos-terior reconstrução. Tratam-se desituações extremas em que a conser-vação desse edificado é já impossíveldo ponto de vista técnico. Defen-demos sempre a conservação, com oobjectivo de preservar a autenticidadedos objectos arquitectónicos. De facto,há uma relação indissociável do invó-lucro com o interior. Penso que os inte-riores são algo de muito interessantedo ponto de vista patrimonial, certospormenores decorativos, os azulejos,

os estuques... Lisboa não é uma cidademonumental como Roma… tem umaoutra escala. Mas é nessa relação dogrande com o pequeno, do exterior comointerior, a surpresa de um interior quenem se vislumbra do muro que o sepa-ra da rua, um pátio, é aí que reside oencanto desta cidade, com tantas épo-cas e memórias sobrepostas. NestaDirecção Municipal trabalhamos todospara que esse legado se conserve.

Para terminar, como gostaria de verLisboa no final da 1.ª década desteséculo?Gostaria de ver Lisboa com o seu patri-mónio conservado e os seus centros his-tóricos habitados e vividos. Gostavamuito que as pessoas percebessem queestes edifícios antigos, depois de recu-perados, têm uma grande qualidadeem termos de arquitectura e de espa-cialidade. Estas áreas têm um encantoespecial e permitem uma vida de quali-dade, pela sua centralidade. Li alguresque se abandonou o centro da cidadepara se ir construir nas margens, masisso não significou que se fizesse cida-de nessas periferias… fizeram-se su-búrbios, dormitórios. A cidade conti-nua aqui e temos de tratar dela.Gostaria muito que esse ciclo de deser-tificação do centro estivesse definitiva-mente resolvido e que houvesse umarelação de equilíbrio e harmonia, e nãode conflito, entre a cidade e o territórioque a circunda. É preciso restabeleceresse equilíbrio. Acho que esse é o gran-de desafio.

Tema de Capa

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ENTREVISTA

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Telm

oM

iller

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CASO DE ESTUDOTema de Capa

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No âmbito do processo de reabili-tação do Bairro Alto, apresentam-seaqui alguns exemplos da intervençãoda Unidade de Projecto do Bairro Altoe Bica. São três casos representativosde formas de adaptação de edifíciosantigos a novos usos e que contri-buirão para reforçar a identidade dobairro enquanto espaço aberto àsdinâmicas culturais: o Atelier MuseuJúlio Pomar, o Palácio dos Condes daAtalaia e a Escola n.º 12.Estas intervenções inserem-se numprograma mais vasto de acções emcurso, que visam a melhoria das con-dições de habitabilidade, a requalifi-cação do espaço público nas suasmúltiplas vertentes, a promoção deprojectos de animação urbana e a con-servação e restauro de patrimóniointegrado. De igual modo, considera--se que a vitalidade e diversidadefuncional, nomeadamente no que serefere aos equipamentos, em articu-lação com a manutenção da funçãohabitacional, é fundamental para asustentabilidade dos bairros enquan-to unidades territoriais.

ATELIER MUSEU JÚLIO POMARO edifício da Rua do Vale n.º 7, na fre-guesia das Mercês, adquirido pelaCâmara Municipal de Lisboa parainstalação do Atelier Museu Júlio

Pomar, é um imóvel de finais de oito-centos, cuja composição da fachadaremete para uma linguagem própriada arquitectura industrial, assimcomo a espacialidade dos seus inte-riores de nave única e piso em meza-nino.

O projecto de adaptação, da respon-sabilidade do arquitecto Álvaro SizaVieira, foi elaborado de modo a res-ponder ao duplo objectivo de dotar oedifício de condições que permitamao pintor desenvolver o seu trabalhoe, em simultâneo, adequá-lo a espaço

No contexto dos bairros históricos de Lisboa, o Bairro Alto assume uma dupla centralidade, não só emtermos territoriais, mas também enquanto pólo dinamizador de actividade cultural. Esta área dacidade, pela sua proximidade e ligação às academias, centros de produção e criação literária e artísti-ca, adquiriu uma identidade muito própria, associada a movimentos e manifestações de vanguarda.

Unidade de Projecto do Bairro Alto e Bica

A (re)qualificação de equipamentos

culturais e escolares

Atelier Museu Júlio Pomar

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CASO DE ESTUDO

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Tema de Capa

de Atelier Museu, criando, destemodo, um equipamento cultural quecontribua para a divulgação e conser-vação da obra do artista.Trata-se de um projecto de reabili-tação de património histórico, requa-lificador do território onde se insere,cuja relevância cultural é conferidanão só pela função a que se destina,mas também pela intervenção arqui-tectónica em causa.A importância do trabalho de JúlioPomar, no contexto da pintura portu-guesa, aliada ao facto de estarmosperante a concretização de uma obrade autor, Siza Vieira, contribuirá paraa criação de um equipamento dereferência na cidade. A concretizaçãodeste projecto, cujo início da obra seprevê para o segundo semestre de2004, permite associar dois dos expo-entes máximos da cultura contem-porânea nacional, cujo trabalho, hámuito, adquiriu uma dimensão e umreconhecimento internacionais.

HEMEROTECA MUNICIPAL DE LISBOA A intervenção no Palácio dos Condesda Atalaia, antiga sede do jornalRecord, vai permitir reinstalar aHemeroteca Municipal de Lisboa quereúne e conserva, seguramente, umdos mais significativos acervos bi-bliográficos e historiográficos do Por-tugal contemporâneo.Neste contexto, a sua permanência noBairro Alto justifica-se não só pelacapacidade de gerar dinâmicas cultu-

rais próprias, susceptíveis de atrairpúblicos diversificados e qualifica-dos, mas também pelo facto de o bair-ro estar, simbólica e historicamente,associado à actividade jornalísticaque aqui se desenvolveu desde oséculo XIX.Na elaboração do programa funcio-nal e projecto de alterações, de auto-ria do arquitecto Vasco Rovisco, hou-ve a preocupação de conciliar asnecessidades específicas decorrentesdo funcionamento de um equipa-mento desta natureza, com assoluções técnicas, organizacionais eestéticas adequadas, tendo em consi-deração os vários constrangimentosque resultam da adaptação de umespaço preexistente.Esta intervenção compreende, não só,alterações arquitectónicas relativas àcriação de novas espacialidades, aces-sos e circulação, mas também o neces-sário reforço estrutural do imóvel, porforma a comportar as cargas previstase a introdução de redes de distribuiçãode energia, sistemas de climatização einstalações mecânicas, rede estrutura-da e de comunicações, sistemas dedetecção de intrusão e de segurançacontra risco de incêndio, indispensá-veis ao funcionamento do equipamen-to e à preservação do acervo.Em termos genéricos, pretende-seoferecer aos seus utilizadores umequipamento dotado de condiçõesde trabalho e consulta adequadas,garantindo uma ampla acessibilida-de. O equipamento deverá, ainda,promover de forma apelativa a parti-cipação de todos os que o procuram,seja por razões culturais, historiográ-ficas, artísticas ou cívicas.

ESCOLA N.º 12A Escola n.º 12, localizada na Rua daRosa, n.º 168, ocupa um edifício dasegunda metade do século XVIII, detipologia palaciana, e está a ser objec-to de uma intervenção profunda. Estavisa, não só, travar o processo dedegradação em que o edifício seencontrava, mas também dotá-lo decondições que garantam o cumpri-mento do actual quadro legislativo,

relativamente a questões de segu-rança, acessibilidade e mobilidade,adequando-o às linhas programáti-cas e pedagógicas da política educati-va para o funcionamento de estabele-cimentos de ensino.O projecto de arquitectura é da res-ponsabilidade da Unidade de Pro-jecto do Bairro Alto e Bica (DirecçãoMunicipal de Conservação e Rea-bilitação Urbana) e as especialidades,do Departamento de Construção eConservação de Equipamentos (Di-recção Municipal de Projectos eObras).No âmbito desta intervenção, preten-de-se, ainda, restabelecer algumas liga-ções que se tinham perdido, em conse-quência de diversas campanhas deobras levadas a cabo, e que o trabalhode investigação e as sondagens arqueo-lógicas vieram pôr a descoberto.

DIFICULDADES DA ADAPTAÇÃODE EDIFÍCIOS ANTIGOSAs dificuldades de adaptação de edi-fícios relevantes do ponto de vista his-tórico e arquitectónico a programasfuncionais, por vezes muito comple-xos, resultam da necessidade de arti-cular o cumprimento das disposiçõesde um quadro legislativo – exigentedo ponto de vista técnico – com a pre-servação das características formais edecorativas que decorrem dos valorespatrimoniais em presença. Tal impli-ca, necessariamente, um acompanha-mento muito rigoroso destas obras efrequentes alterações de projecto.Os diversos imprevistos que surgemem obra – caso de algumas situaçõesestruturais críticas – obrigam aindaao desenvolvimento de soluções pro-jectuais compatíveis com as técnicasconstrutivas tradicionais. A necessi-dade de coordenação de uma equipapluridisciplinar, tendo em conside-ração as várias valências envolvidasnestas obras – designadamente, ar-quitectos, engenheiros das diversasespecialidades, arqueólogos, histo-riadores e técnicos de restauro – éigualmente determinante para a con-cretização destes processos.É precisamente nesta complexidade

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Hemeroteca

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que reside, em grande medida, o inte-resse deste tipo de intervenções. Poroutro lado, conhecer as transformaçõesoperadas nos imóveis ao longo do tem-po, a sua evolução e a dos seus proprie-tários e utilizadores pode contribuirpara um melhor conhecimento da história do bairro e da própria cidade.Com estas obras, pretende-se, assim,criar um conjunto de equipamentos dereferência, susceptíveis de contribuí-rem para a dinamização do tecido socio-cultural do bairro,capaz de potenciar assuas capacidades endógenas.Um agradecimento é devido à Dr.ªMafalda Magalhães Barros, à Dr.ªSofia Novais, ao Dr. António Mirandae Arq.º Diogo Mina pela colaboraçãoprestada.

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NUNO MORAIS,Arquitecto, Unidade de Projecto do Bairro AltoeBica, DMCRU, CML

Escola n.º 12

Escola n.º 12 - Alçado raso, corte e planta (piso 0)

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CASO DE ESTUDO

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Tema de Capa

Embora incomparáveis com o patri-mónio considerado monumental, asestruturas habitacionais acumulamuma série de heranças urbanas. Noseu conjunto poderão definir-secomo imóveis construídos numa épo-ca pós-pombalina, certamente sobreuma base ou sobre vestígios maisantigos e pontualmente adulteradospor obras posteriores. Tratam-se deedifícios de construção tradicional,com paredes mestras, empenas efachadas em alvenaria de pedra,estrutura dos pisos em madeira edivisórias interiores em tabique oualvenaria de tijolo.Não esquecendo preocupações deintegração, houve o cuidado para que

as intervenções não entrassem emconflito com o meio particular ondese inserem, optando-se por alteraçõesque se identificassem como recentes ecom desenho actual, embora de acor-do com elementos de pormenor, esca-la e proporção do meio construídoenvolvente.Para ilustrar os diferentes tipos deintervenção, apresentamos, sucinta-mente, três dos muitos casos quepodemos considerar exemplares,como resposta à identificação de pro-blemas em contextos histórico-patri-moniais e arquitectónicos distintos.O primeiro encontra-se já habitado, osegundo concluído e o terceiro emprojecto.

O primeiro exemplo que destacamosé o edifício da Rua da Adiça, n.º 36(Unidade de Projecto de Alfama/projecto do Arq.o Luís Patrício Costa)(Figs. 1 a 4). Depois do diagnósticofeito ao imóvel e corroborando o autode vistoria, confirmou-se o total esta-do de pré-ruína do seu interior, bemcomo a exiguidade das áreas existen-tes, propondo-se assim a sua demo-lição integral. Por outro lado, no quediz respeito à volumetria exterior, etendo em consideração a sua inser-ção na continuidade do plano mar-ginal da rua, optou-se pela preser-vação.Definiu-se como estratégia a adoptarna obra dos interiores a procura de

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A intervenção municipal efectuada em edifícios habitacionais camarários, recuperados na sua totali-dade, tem procurado que estes se tornem espaços modernos em termos de habitabilidade, criandoassim condições para uma melhoria significativa da fruição do espaço residencial dos seus morado-res. Os três exemplos aqui apresentados procuram retratar esta preocupação.

A reformulação dos interiores como espaços de vivência,

de memória e de modernidade

1 – Rua da Adiça, n.º 36, planta do 1.º andar (antes e depois da intervenção)

2 – Rua da Adiça, n.º 36, corte (antes e depois daintervenção)

3 e 4 – Rua da Adiça, n.º 36, fotos depois da intervenção

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um carácter sem dúvida actual, con-seguindo tipologicamente maximi-zar áreas úteis disponíveis. Estatransformação, caracterizada porfogos desdobrados em dois níveis ecom melhor iluminação natural, aca-bou por potenciar o espaço (volume)disponível, resolvendo simultanea-

mente os problemas de ventilação,circulação e acessibilidade.O grau de intervenção que teve lugarnos fogos inseridos na obra munici-pal da Rua de Santa Cruz do Castelo,n.º 21 (Unidade de Projecto do Cas-telo/projecto do Atelier Traços e Nú-meros – Arquitectos Eugénio CastroCaldas e Nuno Gomes da Silva) (Figs.5 e 6), pode considerar-se um casotipificado de recuperação com refor-

mulação. Na sua maioria, os fogosapresentam áreas consideravelmentereduzidas, em que não se encontra-vam asseguradas as condições míni-mas de habitabilidade e salubridade.Neste caso, a proposta consistiu fun-damentalmente em dotar o fogo deinstalação sanitária, encerrando-a

num espaço independente da cozi-nha (ao qual aparece, muitas vezesassociada) e na melhoria geral da dis-tribuição, com o objectivo de maximi-zar o aproveitamento da área disponí-vel. A correcção da inclinação dacobertura, para aumento do pé direito,bem como a criação da cozinha inte-grada na zona da sala de estar contri-buíram também para um aproveita-mento mais racional e eficaz do espaço.

O terceiro exemplo refere-se à ope-ração de reabilitação do imóvel daRua de S. Bento, n.º 306 (Unidade deprojecto de S. Bento / projecto dos ar-quitectos da Unidade) (Figs. 7 e 8),que se reveste de características mui-to particulares, uma vez que os seuselementos patrimoniais vão condi-cionar, definir e orientar a linha deactuação a seguir.Após o início da intervenção, foramdescobertas pinturas a fresco do sécu-lo XIX por baixo do estuque existente,através das quais foi fácil determinaras paredes que constituíam o núcleooriginal da casa, das posteriores (tabi-ques), que ao longo do tempo foramsendo sucessivamente construídas,adulterando a clareza tipológica doconjunto e camuflando um patrimó-nio valioso. Definiu-se assim comoestratégia a aproximação possível àtipologia original, na tentativa de res-tituir ao imóvel toda a sua veracidadeestética e, simultaneamente, dotá-lo decondições actuais de habitabilidade.É com este objectivo que se propõe ademolição das ocupações clandesti-nas do logradouro, que em diferentesépocas foram tendo lugar. A necessi-dade de construção de instalações

sanitárias e cozinha independentesobrigou a alguns desvios em relaçãoao modelo original, mas sem perdaspatrimoniais, conseguindo-se umresultado espacial e tipológico degrande qualidade.

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PAULA GIRÃO, ArquitectaRUI MATOS, Historiador da ArteDivisão de Gestão da Informação e ApoioTécnico, DMCRU, CML

7 – Rua de S. Bento, n.º 306, planta do 1.º andar (antes e depois da intervenção)

5 – Rua de St.ª Cruz do Castelo, n.º 21, planta do sótão (antes e depois da intervenção)

6 – Rua de St.ª Cruz do Castelo, n.º 21, fotos depois da intervenção

8 – Rua de S. Bento, n.º 306, fotos dos frescos duran-te a intervenção

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As características espaciais da arqui-tectura pombalina são de tal formagenerosas e versáteis que a adaptaçãodos fogos setecentistas às novasvivências se processa de um modorelativamente pacífico, quer a nível

da construção em si, quer a nível daadaptabilidade arquitectónica.No presente caso, um edifício total-mente devoluto e de propriedademunicipal, não surgiram quaisquerproblemas em termos estruturais,

não sendo portanto necessário proce-der a consolidações, apesar do mauestado geral de todo o edifício.Constata-se que este prédio sofreualterações, tanto materiais comoespaciais, em meados do século XIX

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O número 129/137 da Rua da Madalena tem sido alvo de uma intervenção de beneficiação de facha-das e coberturas e de um projecto de recuperação/reformulação dos interiores, de forma a consegui-rem-se 8 fogos completamente remodelados. Com esta iniciativa pretende-se combater a desertifi-cação do centro de Lisboa, pelo que o programa dos novos fogos foi delineado a pensar numapopulação de faixa etária mais jovem.

Uma intervenção na Rua da Madalena

Oito fogos habitacionaiscompletamente remodelados

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e, posteriormente, na década de 30 doséculo passado, que contemplaram,respectivamente, a construção demais dois pisos.Essas intervenções são facilmente iden-tificáveis na fachada, através das ban-deiras do primeiro andar (piso nobre) edas guardas déco, em ferro fundido, dassacadas.As alterações introduzidas com estanova intervenção, no que respeita aoexterior, são basicamente a nível dacobertura, a qual foi redesenhadacom vista à eliminação de váriosacrescentos sem qualquer racionali-dade. Em substituição das variadastrapeiras, optou-se por levantar trêsnovos vãos de sacada recuada nafachada da Rua da Madalena, en-quanto que na fachada posterior os

mesmos vãos introduzidos retomamde algum modo a tradição dos vãosdas mansardas, sem contudo oscopiar. Desta fachada foram aindaretiradas as diminutas instalaçõessanitárias ali existentes, e ainda umalaje de betão que escondia o lajedoantigo da sacada do quarto andar.Neste piso foram colocadas novasguardas em ferro, com desenho con-temporâneo, mas dentro do espíritodas restantes.A nível dos interiores houve a preo-cupação de manter e valorizar todosos elementos arquitectónicos impor-tantes, nomeadamente cantarias, cai-xilharias e estuques. Foi também pos-to todo o cuidado na introdução deum elevador e, ainda, dos elementosverticais das redes comuns (electri-

cidade, águas, gás e telefones), demaneira a que o seu impacte visual eestrutural fosse neutralizado tantoquanto possível. Da mesma forma,adaptou-se um espaço existente, lo-calizado junto à entrada do edifício,para a colocação de todos os respecti-vos contadores e caixas de esgoto.Desta intervenção resultaram oitofogos (a partir dos seis existentes inicialmente), sendo dois T0, dois T1,dois T2 e dois T3, além de dois es-paços comerciais no piso térreo. Asáreas dos fogos variam entre os 60 m2

e os 220 m2.

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TERESA POOLE DA COSTA,Arquitecta, DMCRU, CML

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O Palácio Pombal da Rua do Século

Sondagens, analítica, conservação e restauro dos tectos e paredes da capela e escadaria.

Tecto da escadaria - levantamento, registo e identificação de patologias

O Palácio Pombal, considerado umedifício de referência da arquitecturacivil, terá sido levantado em estilochão por Sebastião de Carvalho eMelo, avô do futuro marquês dePombal. Na segunda metade do sécu-lo XVIII, o palácio foi edificado emquatro núcleos articulados com umjardim. Actualmente, subsiste o quecorresponde à parte central e princi-pal do mesmo, encontrando-se desde1968 na posse do município de Lis-boa. O interior do palácio é caracteri-zado por um valioso conjunto artís-tico integrado, onde se destacam – com o arrojo cénico do barroco – ostectos atribuídos a João Grossi (1718--1781). Estes caracterizam-se porconjuntos figurativos (alegorias e

cenas mitológicas), envoltos em mol-duras e ornamentações fitomórficas,destacando-se, igualmente, o tectoda escadaria e as paredes da capelapela sua dimensão, programa formale decorativo.Este conjunto artístico sofreu um processo de deterioração das caracte-rísticas e das qualidades padrão dosmateriais estruturais, construtivos eornamentais. A intervenção levada a cabo promo-veu uma solução para a degradaçãoexistente e desenvolveu-se a partir deum empenho multidisciplinar.

Definiu-se e implementou-se um pro-cesso de gestão e de metodologia detrabalho, uma administração de re-cursos com um amplo conhecimentoacerca do património a gerir, o queassegurou uma sequência de ope-rações.Na concretização do tratamento, apli-caram-se métodos, técnicas e produ-tos compatíveis e de carácter reversí-vel. A prioridade foi dada, acima detudo, à conservação. Este projecto obrigou a:• Levantamentos, registos gráficos e

fotográficos, para identificação doobjecto a intervencionar, avaliaçãodo estado de conservação, mapea-mento de patologias e acompanha-mento de toda a intervenção de con-servação e restauro.

• Protecções e operações de S.O.S.,fundamentais para a salvaguardados elementos em situação crítica,com recurso a escoras e empalmesalmofadados sobre as superfíciesem destacamento, além de bandas

O antigo Palácio dos Carvalhosda Rua Formosa, actual PalácioPombal, é apenas parte de umextenso conjunto palacianoque acabou por ser desmem-brado no início do século XX. A empreitada de conservação e restauro destinou-se à pro-moção de um programa de sondagens e à preservação econservação do patrimónioartístico que preparará novoscaminhos para eventuais tra-balhos a desenvolver no futuro.

Tecto da escadaria - operações S.O. S. (protecções)

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de consolidação com uma argamas-sa pobre e ancoragens reversíveiscom matriz de fibra de celulose.

• Prospecções, sondagens e analítica.Nas peritagens sobre os estratoscromáticos a intervir, além daobservação macroscópica, usaram--se métodos laboratoriais para aná-lise de ligante, pigmentos e técnicasutilizadas. Em termos macroscópi-cos, as sondagens desenvolveram--se também ao nível físico, no senti-do de se obterem estratigrafias queajudam a decifrar os programasdecorativos assumidos ao longodo tempo. A análise conjuntados resultados evidenciou o que seconstatava a olho nu. Todos os tec-tos se apresentavam totalmenterepintados, em resultado de suces-sivas campanhas decorativas, o que

ocultava os esquemas cromáticosoriginais, assim como a definiçãoe o rigor escultórico e ornamental.No geral, os fundos cromáticosoriginais são uma mistura de têm-peras minerais e oleosas, pontual-mente enquadradas em técnicasdecorativas imitativas de mate-riais pétreos, além de aplicaçõesde folha metálica, enquanto asornamentações apresentam umacabamento mineral a branco.Com esta campanha de sonda-gens, prospecções e analítica colo-caram-se em exposição novosesquemas cromáticos e pinturasmurais que, em conjunto com osrevestimentos azulejares, eviden-ciam o aparato de um cromatismobarroco, inserido numa unidadeformal de gosto rocaille e com

apontamentos de um neoclassicis-mo emergente.

• Limpeza via mecânica e químicadas superfícies. Estabilização e con-solidação estrutural dos suportesminerais em tectos e paredes comrecurso a matriz de estabilização,injecção de caldas de hidróxido decálcio para colmatar fendas e fissu-ras interiores, além da estabilizaçãode superfícies com consolidantemineral (silicato de etilo).

• Duplicações volumétricas com re-curso à execução de moldes de correre moldes de silicone, para reposiçãoda integridade do programa formale decorativo das superfícies.

• Reintegração cromática sobre osrevestimentos parietais da capela etecto da escadaria, com têmperaacrílica e com a técnica de manchade cor.

Nesta colaboração, o Grupo de Ges-tão de Conservação e Restauro da A.Ludgero Castro e a Unidade de Pro-jecto do Bairro Alto e Bica desenvol-veram uma parceria de preservação evalorização do património portu-guês, procurando “recuperar para oséculo XXI a modernidade e visãoestratégica que celebrizaram o mar-quês de Pombal na sua acção gover-nativa".

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MIGUEL FIGUEIREDO,Engenheiro, Grupo de Gestão, Conservação e Restauro da A. LUDGERO CASTRO, LDA.

Sala de jantar - sondagens e remoção de camadas sobrepostas por processo químico, neutralização e exposiçãodas policromias neoclássicas da sala de jantar

Capela - pormenor das paredes da capela após tra-tamento de conservação e restauro

Sala Verde - estrati-grafias sobre camafeu efundo. O camafeu apre-senta dois estratos debranco. No fundo domesmo, por ordem cro-nológica, identifica-seum estrato decorativo(imitação de aventuri-na) e, posteriormente,um estrato final rosa.No fundo, cronologi-camente, identifica-seum estrato ocre, azul,rosa e verde. Na ilus-tração abaixo, observa-mos um aspecto doângulo da sala comestratigrafias que defi-nem os programas cro-máticos de origem

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Ligações estruturais nos edifícios da Baixa Pombalina ou

De como uma ideia recorrente sobre a construçãopombalina não resiste a uma observação um poucomais atenta

Na Baixa Pombalina, cada quarteirão(Fig. 1) está dotado de paredes princi-pais de alvenaria de pedra ao longo doseu contorno exterior e à volta dosaguão central. Estas paredes possuemuma espessura da ordem dos 0,9 a 1,1 mao nível do rés-do-chão, que vai redu-zindo gradualmente nos pisos superio-res. São interligadas transversalmente,ao nível do rés-do-chão, por outrasparedes de alvenaria de pedra, comespessuras de 0,5 a 0,7 m, que servem,por vezes, de separação entre os edifí-cios (Fig. 2).

Dentro de cada edifício existe um siste-ma de travamento tridimensional (Fig.3) formado, segundo a vertical, pelas

paredesem frontal

pombalino, dispos-tas segundo as duas direcções ortogo-nais dos edifícios e, segundo a horizon-tal, pelas estruturas de madeira dospisos e da cobertura.

Frequentemente, na constru-ção dos edifícios da BaixaPombalina, os carpinteirosentravam primeiro em obra,pondo de pé a parte da estrutu-ra de madeira, e só depoisavançavam os pedreiros, levan-tando as paredes de alvenaria.Talvez devido ao facto de,durante uma fase da construção,a estrutura de madeira – a intrincadagaiola – se elevar sozinha no ar, genera-lizou-se a ideia de que, em caso de sis-mo violento, as paredes exteriores dealvenaria, se deveriam desmoronar,caindo para fora e deixando novamen-te no ar a estrutura de madeira, que pro-tegeria pessoas e bens no seu interior.Embora seja recorrente na literaturasobre a construção pombalina, estaideia revela-se, desde logo, pouco con-sistente: de facto, dependendo da hora

a que ocorresse o sismo, o desmoro-namento das paredes exteriores pode-ria até apanhar mais pessoas na rua doqueno interior dos edifícios, tanto maisque o colapso seria por rotação dasparedes perpendicular-mente ao seu planoe que as ruas(mesmo

as principais) têm largura inferior àaltura das fachadas. Há, no entanto, umconjunto de pormenores construtivos,que se podem detectar facilmentenuma observação um pouco mais aten-ta da anatomia dos edifícios pombali-nos, que invalida claramente esta ideia,demonstrando, ao contrário, que osmestres construtores da altura, tinham

O edificado surgido no centrode Lisboa, após o terramoto e oincêndio de 1755 foi, a váriostítulos, inovador: os quartei-rões são uniformes e bem pro-porcionados, sem desconti-nuidades e sem assimetriasvolumétricas; aplicaram-se, emgrande escala, soluções deestandardização e prefabrica-ção; no plano estrutural, intro-duziram-se, de forma delibera-da e sistemática, disposiçõesanti-sísmicas inéditas.

1 – Volumetria e paredesprincipais, de alvenaria depedra, do quarteirão pom-balino

2 – Paredes de alvenaria de pedrainteriores e estrutura de suportedo 1º piso

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aintuição daqui-lo que é hoje um conceito básico do bomcomportamento sísmicodos edifícios: a boa ligaçãoentre os diferentes elementos estrutu-rais. De facto, além de servirem de divi-sórias principais e de suportarem asvigas dos pavimentos, é atribuída àsparedes em frontal pombalino (Fig. 3), emcaso de sismo, a função de contraventa-rem as paredes principais de alvenaria eajudarem a dissipar a energia. Pereira deSousa, na conferência que fez naAssociação dos Engenheiros Civis Por-tuguezes em Maio de 1909, salientaque “A gaiola de madeira, ligando os dif-ferentes elementos da construção, impedeque se separem e, ao mesmo tempo, tendouma certa elasticidade, amortece os effei-tos dos choques”. A preocupação comuma boa ligação entre elementosestruturais está bem patente nos edi-fícios pombalinos, através da intro-dução sistemática de um variado con-junto de dispositivos, de madeira oude ferro forjado.

A) Ligações entre as paredes em frontale os pisos de madeira

Dado que a estrutura das paredes emfrontal é, geralmente, contínua de umandar para o outro e que são, igualmen-te, contínuos os barrotes do pavimento,o travamento entre estes dois elemen-tos, quando o frontal é perpendicularaos barrotes, é inerente. Quando o fron-tal é paralelo aos barrotes, constata-seque, em geral, junto aos frontais a quesão paralelas, as vigas são interligadas

por peçasde madeira

colocadas dia-gonalmente, que

permitem, também,uma boa ligação piso/frontal (Fig. 4). A

preocupação de uma boa ligação entreparedes e superfícies horizontais nota-se, em alguns casos, em relação à própriaesteira, conforme documenta a Fig. 5.

B) Ligações entre os pisos de madeira eas paredes principais

As vigas de madeira dos pisos deve-riam ser dotadas de entregas de 0,25 a

0,3 m nas paredes mestras, sendo pre-gadas aos frechais com cavilhas de ferroforjado de 0,2 a 0,3 m. Além desta robus-ta ligação pregada, existem ligações adi-cionais constituídas por ferrolhos, querna direcção dos barrotes, quer na di-recção perpendicular a estes.

B1) Direcção dos barrotes

Os ferrolhos são do tipo representadona Fig. 6, sendo dotados de uma traves-sa ancorada do lado de fora da paredeou de uma unha que fica embebida naespessura da alvenaria. AFig. 7 mostraum desses ferrolhos, visto do lado inte-rior do edifício.

B2) Direcção perpendicular aos barrotes

Nesta direcção a ligação não é tão direc-ta e a mobilização do conjunto do pisonão é tão fácil. Existem, no entanto, dis-posições de vários tipos, que visamassegurar a eficácia dessa ligação, querpela face inferior do piso (Fig. 8), querpela superior (Fig. 9). É nesta direcçãoque o tarugamento desempenha opapel mais importante na mobilizaçãodo contributo do piso para o contra-ventamento do edifício.

C) Ligações entre paredes em frontal eparedes principais

Acima do primeiro andar, os nembosdas paredes exteriores, tanto das prin-

cipais como das de tardoz, são dotadosde uma grade de madeira, disposta dolado de dentro (Fig. 10), à qual estão liga-das as molduras de cantaria dos vãos,

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CASO DE ESTUDOTema de Capa

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3 – Sistema de travamento tridimensional existen-te em cada andar

4 – Peças de ligação piso/frontal quando este é para-lelo aos barrotes do pavimento

5 – Ferrolhos e tarugos de ligação parede inte-rior/esteira

6 – Peças metálicas de ligação dos pavimentos àsparedes de alvenaria.

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CASO DE ESTUDO

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Tema de Capa

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do lado de fora, através de peças metá-licas. As travessas destas grades dereforço são dotadas de peças de ligação,em madeira, designadas por “mãos”,que ficam embebidas na alvenaria (Fig.10), por vezes inclinadas em relação aoplano do nembo.

Além da pregagem dos elementos queconstituem as paredes em frontal aessas grades, a ligação entre paredes emfrontal e paredes principais é, ainda,reforçada através de ferrolhos do tipodo representado na Fig. 11.

D) Ligação entre paredes principaisopostas

Além das disposições acima referidas,constata-se a existência de outros aces-sórios destinados a permitir o funcio-namento tridimensional da estruturados edifícios, designadamente os tiran-tes (na época designados por “linhas deferro”), constituídos por vergalhão,amarrando exteriormente por traves-sas do mesmo material, como mostra aFig.12.

CONSIDERAÇÕES FINAISNos edifícios pombalinos existe umvariado conjunto de elementos metáli-cos e de madeira destinados a assegu-rar uma boa ligação entre os diversoselementos estruturais. Este facto con-traria uma ideia pré-concebida sobre oedificado pombalino, segundo a qualos edifícios estariam preparados parapermitirem o desmoramento das pare-des principais para o exterior. Pelo con-trário, tudo está previsto para que o edi-fício resista e se mantenha todo de pé,

como uma caixa tridimensional solida-mente interligada.

Os dispositivos de ligação que os mes-tres construtores da época pombalinaintroduziram, de raiz, nos seus edifí-cios, são idênticos aos que vêm, hoje,recomendados nos manuais de reabili-tação sísmica de edifícios antigos.

A intenção deliberada de dotar osnovos edifícios de um comportamentotridimensional e a concepção, por umavia inteiramente racional, de um con-junto de dispositivos destinados a con-seguir na prática um tal efeito, bemcomo a capacidade de inovação

demonstrada, definem uma das váriasvertentes em que a Baixa Pombalinarepresenta um valor universal excepcio-nal, nos termos da convenção do patri-mónio mundial da UNESCO. As inter-venções de reabilitação que nela foremlevadas a cabo devem, portanto, serconcebidas e executadas de modo apreservar a autenticidade do sistemaestrutural pombalino.

V. CÓIAS E SILVA,Eng. Civil, Presidente GECoRPA

7 – Aspecto de um ferrolho de ligação piso/parede,do lado interior

8 – Ferrolho de ligação na direcção operpendicularaos barrotes, pelo lado inferior

10 – Grade de madeira e ferrolhos de ligação

9 – Ferrolho de ligação na direcção operpendicularaos barrotes, pelo lado superior

11 – Ferrolhos de ligação parede em frontal/ paredeprincipal

12 – Tirante de contraventamento – pormenor datravessa de ancoragem.

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Delineado o referido programa e ten-do o mesmo sido aprovado pelos res-ponsáveis máximos da autarquia,deu-se início, em 2003, a uma série deintervenções em monumentos reli-giosos da cidade.Uma vez que os proprietários ou asentidades que os tutelam – na sua

maioria paróquias ou irmandades –não possuem os meios financeirospara suportarem os encargos com asua reabilitação, a CML entendeutomar a iniciativa de apoiar a valori-zação dos monumentos, partindo dosseguintes pressupostos:• Valorizar as zonas históricas da cida-

de implica não só reabilitar edifíciosde interesse arquitectónico para usohabitacional mas também os monu-mentos sediados nessas zonas;

• Ao apoiar estas acções de valori-zação do património monumental, aCML está a contribuir para que asentidades acima mencionadas pos-sam dispor dos seus limitados recur-sos financeiros para acções de carác-ter social de apoio à população maiscarenciada residente nos bairros his-tóricos.

As primeiras igrejas a serem objectode intervenções com o apoio da autar-quia foram, ainda em 2003, a Igreja de

Santa Catarina (Paulistas), sediadaentre o Bairro Alto e a Bica, e a Igrejado Menino de Deus, em Alfama, am-bas classificadas como MonumentosNacionais.Os dois monumentos tinham sofridoobras recentes por parte da Direcção--Geral dos Edifícios e MonumentosNacionais (DGEMN), pelo que seencontravam em condições para que oseu património artístico pudesse servalorizado.Em relação à primeira daquelas igre-jas, a CMLtem vindo a apoiar um vas-to programa de intervenções, patro-cinando a conservação e o restauro dovalioso acervo artístico da capela--mor, a que se seguirá o do transepto,o da nave, o do coro alto, o da sacris-tia e o restauro do órgão monumentaldo segundo quartel do século XVIII.Também com o apoio da CML, osoito retábulos da Igreja do Menino deDeus, em Alfama, incluindo pinturas

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A actual gestão camarária ele-geu como uma das suas priori-dades a reabilitação urbana,pelo que se procedeu, a partir de2002, à elaboração de um pro-grama específico com o objecti-vo de reabilitar monumentossediados nas zonas históricas dacidade, procurando inverter oprocesso de degradação que sehavia instalado há anos.

Menino-Deus: conservação e restauro da talha dourada e pintura de um dos oito retábulos da igreja (esq.); nave e capela-mor em fase de conclusão dos trabalhos (dir.)

Reabilitar monumentos naszonas históricas da cidade

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e esculturas, foram objecto de inter-venções de conservação e restauroencontrando-se os trabalhos em fasede conclusão.Estas acções têm sido possíveis gra-ças à excelente colaboração que temexistido entre as várias entidadesenvolvidas, quer com as paróquias e as irmandades, quer com os orga-nismos da administração central,como a DGEMN em relação à parteedificada, o IPPAR, na aprovação deprojectos e o IPCR relativamente àapreciação de propostas e ao acom-panhamento das intervenções nopatrimónio artístico.Também a Escola de Artes e Ofícios da CML tem colaborado na recupe-ração dos revestimentos azulejares dealguns monumentos.Do mesmo modo, as Irmandades eParóquias da Baixa Pombalina, na pes-soa do seu prior, têm desenvolvidouma importante acção de valorização

dos monumentos que lhes estão afec-tos com destaque para a Igreja de SãoNicolau onde estão a ser realizadasintervenções ao nível da limpeza dapedra, restauro de estuques, altares,esculturas e pinturas. Intervençõesque se estendem a outros monumen-tos, como as Igrejas de N.a Senhora daOliveira, Conceição Velha e Madalena.Ainda no corrente ano, com o apoiotécnico da DGEMN e o patrocínio daCML, estão previstas as seguintesintervenções:• Igreja de São Miguel, em Alfama:

arranjo das coberturas, fachadas edo tecto da nave;

• Igreja de São Cristóvão, na Mou-raria: coberturas e fachadas;

• Igreja da Graça (M.N.): arranjo dascoberturas e fachadas, e consoli-dação da portaria (notável edifi-cação dos finais do século XVII);

• Igreja de Nossa Senhora da Saúde,na Mouraria: continuação dos traba-

lhos iniciados em Abril do correnteano ao nível das fachadas e coberturas.

Concluídos os trabalhos na parte edi-ficada destes imóveis e garantida aestabilidade das condições ambien-tais no seu interior, dar-se-á início àfase de valorização do patrimónioartístico destes monumentos.Estima-se que as verbas com este pro-grama ultrapassem, em 2005, os doismilhões e meio de euros.Mantendo-se esta colaboração entreas diversas entidades e os organismosenvolvidos, este programa muito con-tribuirá para a fruição de um patrimó-nio que, sem estas intervenções, seperderia inevitavelmente, com ele,parte da nossa identidade.

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PATRIMÓNIO RELIGIOSOTema de Capa

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JOSÉ MARIA AMADOR,Mestre em Arte, Património e Restauropela FLULCoordenador do programa da CML para a reabilitação dos monumentos das zonashistóricas

Capela-mor da Igreja dos Paulistas ou de St.ª Catarina: conservação e restaurodas pinturas e talha dourada joanina

Igreja de S. Nicolau: aspecto da nave

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PROJECTOS & ESTALEIROS

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A localidade Mina de São Domingosnasce, como o nome indica, da estru-tura social desenvolvida em torno daexploração mineira de um jazigo depirite, conhecido desde o tempo dosromanos, e retomada a partir do ano1857 até 1967 pela Mason & Berry,concessionária para exploração daproprietária empresa de capitaisfranceses e espanhóis denominadaLa Sabina.Esta empresa, com autorização doEstado português, promoveu aextracção do minério, atingindoníveis de produtividade extrema-mente elevados que obrigaram àcriação de infra-estruturas pioneirasno País, como a primeira linha decaminho-de-ferro construída em terri-tório nacional entre a Mina e oPomarão – localidade junto ao rioChança, por onde eram escoados osprodutos por via marítima para aInglaterra.Outras estruturas fundamentais à exploração mineira consistiam nas residências dos trabalhadores, diferenciadas das residências dos res-ponsáveis ingleses, às quais se asso-ciavam edificações urbanas comple-mentares, como é o caso do mercadomunicipal, objecto de análise.

CARACTERIZAÇÃO E ESTADODE CONSERVAÇÃOO mercado é composto por três cor-pos independentes, dois dos quaisabertos e um fechado, com cober-turas constituídas por estrutura emasnas de madeira à vista com reves-timento em telha cerâmica.Em utilização pela comunidade, omercado apresentava anomalias

estruturais graves ao nível dascoberturas, com preocupantes fle-chas que obrigaram ao reforçopontual da estrutura de madeirapara garantia da utilização dolocal. Os pilares de suporte dacobertura, em betão armado, en-contravam-se igualmente fragili-zados, apresentando zonas de fen-dilhação causada pela corrosãodas armaduras de aço.

INTERVENÇÃOEm virtude do avançado estado dedegradação da cobertura, foi neces-sária a demolição total dos elemen-tos de madeira, reaproveitando-se orevestimento cerâmico e os elemen-tos metálicos de ligação entre aspeças das asnas.Antes da demolição foi executadoum levantamento arquitectónicoexaustivo para documentar a consti-tuição das asnas e respectiva cober-tura. Visou-se respeitar as pre-existências em todos os aspectosconstrutivos. A excepção foi a secçãodos elementos, insuficiente na estru-

tura inicial, causa maior das anoma-lias verificadas.A nova estrutura de cobertura foi executada em madeira (CasquinhaVermelha) com elementos de secção20 x 10 cm (com excepção das escoras,secção 16 x 10 cm). As peças novasforam devidamente tratadas por apli-cação de produto imunizador. Os ele-mentos metálicos foram decapados,tratados e reaproveitados. Apenas asbraçadeiras de ligação da linha àspernas da asna foram substituídaspor novos elementos, que abraçamtambém o novo frechal. Após colocação no local das asnascontraventadas pela nova fileira emadres, executou-se o varedo, ripa-do, cumeeiras, rincões e todos osacessórios necessários ao bom de-sempenho da cobertura. A inter-venção culminou com o assentamen-to da telha recuperada e pintura dospilares e elementos de alvenariaadjacentes.

Mercado da Mina de São Domingos

Uma nova coberturaO mercado da Mina de São Domingos, situado no concelho de Mértola, encontrava-se num avança-do estado de degradação com anomalias graves na estrutura de cobertura. Recentemente, foi alvo deuma cuidadosa intervenção, que esteve a cargo da Monumenta, Ld.ª.

JOÃO VARANDAS,Engenheiro, Monumenta, Ld.ª

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PROJECTOS & ESTALEIROS

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N.º 28 DA AV. VISCONDE VALMORO prédio sito na Av. Visconde Valmorn.º 28, construído no início do séculoXX, foi objecto de remodelação total.Esta intervenção, que recebeu o 3.ºPrémio Recria 2000, consistiu na exe-cução de nova cobertura com substi-tuição do madeiramento que seencontrava em mau estado com asmesmas características do existente,picagem dos rebocos nas fachadas eexecução de novos revestimentoscom argamassas hidráulicas apro-priadas e pintura com as cores origi-nais do edifício. Na fachada tardoz, aestrutura metálica de suporte às mar-quises encontrava-se totalmentecorroída, sem a possibilidade de ser

reparada. Optou-se pela execução deuma nova estrutura metálica devida-mente metalizada com o mesmo reti-culado da existente e, consequente-mente, pela demolição das marquisese respectiva reconstrução.No interior do edifício, as zonashúmidas (casas de banho e cozinhas)apresentavam o pavimento total-mente degradado e com o madeira-mento apodrecido nas entregas nasparedes. Também se verificou que asalvenarias das chaminés não estavamconsolidadas, pelo que foi necessárioesventrar toda esta zona, bem comoas paredes circundantes. Para a suareconstrução foram executadas pare-des em tabique com costaneiros, ripa-do e argamassas de cal e areia. Naestrutura dos pavimentos foram colo-cados vigamentos de madeira, devi-damente tratados e assoalhados, demodo a permitir a colocação de umabase de argamassa ligeiramentearmada para colagem de mosaicos.Em certas zonas, o vigamento demadeira junto às paredes exterioresencontrava-se apodrecido devido àsinfiltrações de águas pluviais, peloque foi substituído.Dado que as redes de águas e gás (ain-da em tubagem de chumbo), esgotos(em manilhas de grés) e instalaçãoeléctrica se encontravam em con-dições anti-regulamentares e em mauestado de conservação, foi necessáriaa execução de novas redes em mate-riais devidamente homologados.Acaixilharia de madeira foi reparada,com substituição dos elementos de-gradados, e pintada. Os tectos e pare-des foram reparados com estuque tra-

dicional e pintados. Os soalhos emmadeira foram afagados e encerados.A caixa de escada foi reparada, comsubstituição do madeiramento emmau estado, e envernizada.

ESCOLA 88, NO BAIRRO ALTONa Escola 88, no Bairro Alto, antigopalacete anterior ao terramoto de1755, dado o avançado estado dedegradação do madeiramento estru-tural do edifício, houve a necessida-de de demolir parcialmente o interiore proceder à consolidação das pare-des exteriores com recurso a varõesde aço inox em toda a periferia, con-sistindo assim numa cintagem emdiversos níveis e na projecção delâminas de microbetão com uma redede aço distendido.Devido à localização e características

Intervir nos bairros históricos

AMIU, Ld.ª tem desenvolvido diversos trabalhos no âmbito da conservação e reabilitação de bairroshistóricos de Lisboa, assim como no seu património arquitectónico.

Av. Visconde Valmor, n.º 28: fachada do edifício járeparada

Escola 88: pilares de madeira

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PROJECTOS & ESTALEIROS

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arquitectónicas, optou-se pela nãoutilização de betão armado na suaestrutura mas sim por uma estruturamista de madeira e perfis metálicos.Para o madeiramento, utilizou-sepinho da classe AA(casquinha), devi-damente imunizado, em pilares comcerca de 11 metros de altura e emtodas as estruturas dos pavimentos ecoberturas. Com a demolição parcialdo interior do edifício foi necessárioconstruir novas paredes mantendo omesmo tipo existente – estrutura em“Cruz de St.º André” com todas ascaracterísticas “da época”. Entretanto, foram encontradas, nasparedes do 2.º piso, duas camadas deestuque sob a mais recente, cada umacom pinturas das respectivas épocas.

BIBLIOTECA DO MEPATA Biblioteca do MEPAT, situada numpalacete qualificado na Av. da Liber-dade, apresentava uma decoraçãotípica dos anos 60/70 com paredesforradas a madeira e tectos falsos emplacas acústicas e alcatifas coladas.Após a remoção destes elementos,procedeu-se à recuperação da pintu-ra artística existente no tecto do salãonobre com detergentes neutros,fixação da camada cromática e nive-lamento das fissuras com integraçãoda camada cromática nas zonas repa-radas. O pavimento em mosaico demadeiras exóticas formando dese-nhos geométricos, que também seencontrava bastante danificado ecom zonas em falta, foi completa-mente restaurado com madeirasidênticas às existentes. Na aberturade um vão para ligação de dois salões,deparámos com duas colunas emferro fundido que estavam totalmen-te emparedadas. A MIU apresentouuma proposta para recuperação des-tas colunas que consistiu na limpezacom remoção de restos de argamas-sas e outras sujidades, fixação da fo-lha de ouro, preparação com subcapaem todas as superfícies, aplicação deverniz isolante e mordentes nas zonas

a dourar com a aplicação de ouro finode lei e patines finais.

IGREJA DO CONVENTO DE SANTA MARTANa Igreja do Convento de SantaMarta, um imóvel construído nosséculos XVII e XVIII, a recuperaçãoconsistiu na execução de um cadeiralem madeira de mogno, incluindo res-pectiva estrutura de suporte e acaba-mento a verniz mate, em substituiçãode um painel de azulejo branco semvalor histórico.Junto aos vãos que comunicam com anave da igreja existiam azulejos doséculo XVII. Estes foram cuidadosa-mente retirados para correcção dosperfis dos vãos e posteriormenterecolocados com argamassas apro-priadas.O pavimento existente, em tacos demadeira de pinho, foi devidamenterecuperado, escurecido e enverniza-do, tendo sido executados novosestrados revestidos com madeira depinho para o altar.Os revestimentos das paredes emestuque foram recuperados e pinta-dos. Os elementos pétreos foram lim-pos e, nas zonas que apresentavam

fracturas, foram colados com resinaepóxida.No Corpo da Antiga Sacristia, consti-tuído por 3 pisos, a escada de acessoem madeira encontrava-se totalmen-te degradada, tendo sido necessárioproceder à sua demolição e cons-trução de uma nova, em estruturametálica, com cobertores em madeirade pinho.As argamassas de colagem dos lam-bris de azulejos das paredes foramreforçadas, tendo alguns dos painéissido retirados cuidadosamente, lim-pos e catalogados para posteriorreposição.Durante a execução destes trabalhos,foi encontrada uma abertura no tectodo altar-mor da Igreja, através daqual se verificou a existência de outrotecto, com estuques e pinturas artísti-cas. Alertada a Fiscalização, o achadofoi objecto de estudo pela Direcção- -Geral de Edifícios e MonumentosNacionais dando origem à publi-cação de um artigo na revistaMonumentos.

PEDRO SILVA,Eng.º Civil, MIU, Ld.ª

Biblioteca MEPAT: salão nobre após recuperação Igreja do Convento de St.ª Marta: pormenor daescada da sacristia

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TECNOLOGIAS

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Para a elaboração de um tal projecto énecessário um suporte documental egráfico actualizado do imóvel que, namaioria dos casos, não existe, optan-do-se muitas vezes por soluções redu-toras de reabilitação, nomeadamentepela demolição do interior do imóvel,com preservação apenas das fachadas.Existem diversos métodos de ins-pecção e observação das construçõesque permitem obter o referido supor-te documental e gráfico actualizadodo imóvel. Apresentam-se, a seguir,alguns dos métodos disponíveis atra-vés de exemplos de casos reais deestudos de edifícios de Lisboa, queforam cometidos à Oz, Ld.ª.

MÉTODOS DE INSPECÇÃO E OBSERVAÇÃOLevantamento arquitectónicoConsiste no primeiro método de abor-dagem ao imóvel, sendo talvez o maisfácil de todos porque incide apenas nasua aparência. Visa a definição da geo-metria, quer do envelope, quer dointerior do imóvel, utilizando, nor-malmente, técnicas topográficas.

Dependendo do detalhe pretendido,o levantamento poderá incluir a iden-tificação das características arquitec-tónicas do imóvel.

Levantamento construtivo/estruturalResumidamente, consiste na caracte-rização dos elementos estruturais e,por consequência, não estruturais, emtermos da sua disposição no imóvel,da sua geometria (obtida em parte nolevantamento arquitectónico) e daspropriedades mecânicas dos mate-riais constituintes dos elementosestruturais.Caso a intervenção o justifique, olevantamento poderá incidir tambémna caracterização da fundação doimóvel, através, por exemplo, depoços de reconhecimento e de sonda-gens mecânicas para caracterizaçãogeológica/geotécnica dos solos inte-ressados.Na estrutura elevada, a informaçãopretendida pode ser obtida de técni-cas não destrutivas ou reduzidamen-te invasivas. Por exemplo, o tipo de

frontal pombalino (ver exemplos reaisdas Figs. 1 e 2) pode ser perfeitamentecaracterizado através de termografia(conforme ilustrado na Fig. 3) sendonecessário apenas aquecer uniforme-mente a parede e filmá-la com umacâmara de infravermelhos.Ainda no caso dos edifícios da BaixaPombalina, são bastante frequentesas alterações estruturais, tendo,muitas delas, tido lugar no início doséculo XX (pelo menos nos casos emque existe registo), altura em que erausual o recurso a elementos de aço(Fig. 4). A caracterização geométricada secção dos perfis metálicos, previa-mente localizados com um pacóme-tro (detector de armaduras, conformeevidenciado na Fig. 5) pode ser feitautilizando ensaios de ultra-sons paraa medição indirecta da espessura, porexemplo, da alma ou do banzo desecções “I” (ver Fig. 6).As propriedades mecânicas do açodos referidos elementos estruturais –importantes para a verificação dasegurança estrutural do edifício –podem ser determinadas através deensaios sobre amostras recolhidas delocais seleccionados de modo a nãofragilizar demasiado esses elementos.No caso das propriedades mecânicasda alvenaria das paredes resistentes,dado não ser praticável a recolha deamostras representativas do materialconstituinte para posterior ensaiolaboratorial, é possível, com poucaperturbação da parede, através da téc-

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É do conhecimento comum que qualquer intervenção de reabili-tação de um imóvel, antigo ou recente, deve ser fundamentadaatravés de um projecto de execução, descrevendo e justificandoas soluções adoptadas, apresentando graficamente o grau de por-menor necessário, especificando as técnicas e materiais a utilizare apresentando a estimativa orçamental da obra.

Métodos de inspecção e observação como suporte

da reabilitação do património construído

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

TECNOLOGIAS

nica dos macacos planos de pequenaárea (ver Pedra & Cal n.º 20), aferir,com grande rigor as referidas proprie-dades, ou seja, “levando” o laborató-rio para a obra.Ainda no âmbito do levantamentoconstrutivo, pode ter interesse a carac-terização das argamassas antigas ten-do em vista a definição dos materiaisde reparação, cujas características físi-cas e químicas deverão ser compatí-veis com as dos materiais existentes.Tal desiderato poderá ser levado acabo através de ensaios laboratoriais

sobre amostras de argamassas reco-lhidas do edifício (Fig. 7), nomeada-mente:

• Determinação da composição mine-ralógica das argamassas e seus com-ponentes, areia e ligante, através datécnica de difracção de Raios X;

• Estudo micromorfológico das amos-tras através de observação microscó-pica de luz reflectida (Fig. 8);

• Determinação da relação areia--ligante e determinação da granulo-metria de areia, por fracções.

Levantamento das anomaliasConsiste na identificação das anoma-lias visíveis, levantamento da sua dis-posição e extensão nos elementos daconstrução, e respectiva referenciaçãosobre desenhos. O conhecimento dasanomalias é muito importante para seavaliar como tem sido o desempenhoda construção ao longo da sua existên-cia e qual a eventual influência nodesempenho futuro pretendido.Das anomalias de índole estrutural,os sintomas mais correntes são as fis-suras com orientação bem definida,associadas, normalmente, a defor-mações dos elementos estruturais. Adisposição e a abertura das fissuras(medida, por exemplo, com um com-parador de fissuras) são fundamen-tais para o diagnóstico das respecti-vas causas (Fig. 9).Outros sintomas relacionados commovimentos importantes da estrutu-ra são as deformações, quer das pare-des, quer dos pisos. Podem ser detec-tadas e medidas com grande rigor,através de técnicas topográficas, o quepermite avaliar a sua importância. Arepresentação das deformações dospisos, através de curvas de nível, reve-la-se frequentemente muito útil parao diagnóstico (Fig. 10).

Notas:Os exemplos indicados de algumas das técnicas con-sideradas mais correntes mostram que não é precisorelegar para a fase de obra o esclarecimento quanto àscaracterísticas da construção. Comprova-se que, an-tecipadamente, é possível conhecer com grande rigora construção, quer em termos estruturais ou constru-tivos, quer em termos de anomalias.

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CARLOS MESQUITA,Eng.º Civil, OZ, Ld.ª

1. Tipo de frontal pombalino 2. Outro exemplo 3. Imagem termográfica

4. Exemplo de alteração estrutu-ral antiga num edifício Pomba-lino com a introdução de elemen-tos metálicos

5. Detecção de elementos estru-turais metálicos com o pacóme-tro

6. Medição indirecta da espessu-ra de elementos metálicos atravésde ultra-sons

10. Levantamento de deforma-ções de índole estrutural (assen-tamento diferencial das fun-dações, associada com flexãoexcessiva dos vigamentos)

7. Local de extracção de amostrade argamassa de revestimento

8. Amostra observada ao micros-cópio com luz incidente, eviden-ciando a granulometria da areia

9. Levantamento de fissuras deíndole estrutural (assentamentodiferencial das fundações)

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Na verdade não há condicionamen-tos legais sobre o assunto. Resulta queo projectista ou faz o trabalho préviode análise, ou arrisca-se a cometererros por vezes irrecuperáveis. Se nãofoi solicitado, quem se responsabili-za? Como contornar o problema? Face a esta realidade, os levantamen-tos deveriam fazer parte integrantedo projecto nas suas diversas fases,correspondendo a um acréscimo deespecialidades, prazos e honorários.Assim, os levantamentos seriam limi-

tados e dirigidos aos objectivos de ca-da projecto, resultando em diversasfases de diagnóstico e numa aproxi-mação gradual e cada vez mais preci-sa das soluções e do orçamento, si-tuação ideal, importante quer para oprojectista quer para o dono de obra.Para a elaboração de um projecto deconservação bem fundamentado, im-porta que seja faseado com a seguintemetodologia: • Programa preliminar: o dono de

obra deverá fornecer o máximo pos-sível de documentação histórica;

• Programa-base: o coordenador doprojecto (que deverá ser um arqui-tecto/conservador) deve incluir naproposta a programação e custospara efectuar os levantamentos eanálises necessários, assim como to-das as especialidades necessárias aoprojecto, não esquecendo nunca ohistoriador de arte e o conserva-dor/restaurador;

• Estudo prévio: pesquisa documen-tal, análise histórica/arqueológica,levantamento arquitectónico e es-trutural, análise e registo das ano-malias;

• Projecto-base: levantamentos com-plementares, sondagens directase/ou com recurso a equipamentosespecíficos; poderão ser incluídasanálises aos materiais e testes para adeterminação dos tratamentos;

• Projecto de execução: terminado odiagnóstico, serão elaboradas aspeças escritas e desenhadas neces-sárias à execução dos trabalhos.

Esta metodologia pode vir a ajudar aresolver questões do dono de obra edo projectista para a realização doprojecto, em complemento ao estabe-lecido na Portaria de 7 de Fevereiro de1972.

METODOLOGIAS

Metodologia e fases do projecto de conservação

SORAYA GENIN,Arquitecta

É sabido que o Projecto deConservação deve ser precedi-do de um estudo histórico, re-correr à multidisciplinaridade(veja-se a carta de Veneza) epartir de um diagnóstico combase em levantamentos e aná-lises histórica, arqueológica,construtiva e do estudo dasanomalias. No entanto, rara-mente é fornecida, ou mesmosolicitada ao projectista, estabase de conhecimentos neces-sária para a execução do Pro-jecto de Conservação.

34 Metodologias 2/4/07 4:58 PM Page 34

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Cyan Magenta Yellow Black 32295-Onduline/Anúncio “Maquete” 210x297

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

Durante o reinado de D. Manuel,Lisboa conhece um processo de trans-formação urbana que determinará,duradouramente, a sua estrutura e asua arquitectura. Incrementada a par-tir de dois grandes programas inicia-dos, respectivamente, em 1498 e 1513,a renovação manuelina de Lisboa inte-gra-se num quadro de novas estra-tégias de administração e de gestão geo-política. Através de dois grandesprogramas urbanísticos, Lisboa estru-tura-se como capital dum impériomarítimo, polarizada a partir dum

novo centro – a Ribeira. Como caracte-rística essencial e profundamentemoderna, este centro afirma-se comuma vocação eminentemente cívica. Em articulação com este novo centrourbano mandam-se executar obras dereordenamento urbano nas ruas prin-cipais, passando a irradiar cinco novoseixos a partir deste centro. Sobressaindo deste grupo, a Rua Novad’El-Rei nasce como nova entidadeurbana, após uma série de demoliçõesde edifícios que, ao estabelecer umagrande linha de penetração urbana

para o interior, vai possibilitar a con-solidação dum novo núcleo de centra-lidade urbana no Rossio. Em paralelocom o estabelecimento duma novacentralidade urbana determinam-sereparações, tanto nas principais por-tas da cidade como nos mais impor-tantes chafarizes, numa acção concer-tada que visualizava o espaço urbanoda cidade num todo homogéneo, fun-cional e significante. Acompanhando todo este processo degrandes obras, entre 1498 e 1502, aCasa Real assina um vasto conjunto de

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URBANISMO EM ANÁLISE

As reformas urbanas manuelinas

e a implementação de uma arquitectura “regimentada” para a época moderna

Tema de Capa

Testemunho do dia-a-dia, das relações sociais e das formas de fazer, a arquitectura corrente, que seespraia por ruas e praças, é responsável pela morfologia das cidades, sendo um elemento funda-mental da sua imagem urbana. O estudo desta arquitectura apresenta-se, porém, de investigaçãoparticularmente delicada, dada a escassez de dados documentais específicos que expliquem comrigor as origens e os parâmetros que a modelaram ao longo dos séculos.

Esquema de reconstituição da nova frente urbana da Ribeira, construída a partir do plano de reordenamento da cidade de Lisboa em 1498 (em cima)Alçado, planta e traçado regulador do projecto das boticas da Praça da Ribeira, definidas no regimento de 1498 (em baixo)

36-37 Urbanismo em Análise 8/31/04 6:16 PM Page 36

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alvarás, provisões e cartas régias paraa sua concretização. Deste discursoemergem lógicas formais de traçadourbano e de arquitectura de programaonde transparecem conteúdos estéti-cos e urbanísticos de vincada moder-nidade que irão perdurar nos séculosseguintes. Afastando-se duma atitudeveiculada pela tratadística italiana, detendência especulativa e neoplatóni-ca, este discurso produzido para areforma urbana de Lisboa é atravessa-do por uma vertente racionalista e programática afecta ao ambiente ex-perimentalista dos Descobrimentos.Centralizado à volta do todo-podero-so secretário António Carneiro, o ur-banismo é entendido por um grupo dealtos funcionários régios nos seusmúltiplos valores geopolíticos e eco-nómicos, de onde emerge uma clarapreocupação pela justa medida, racio-nalidade de meios e estratégia quemarcará toda a produção urbanísticaportuguesa dos séculos XVI e XVII.

UMA ARQUITECTURAYGUAL E BAIXEm íntima relação com uma novaideia de urbanismo, a documentaçãorégia deste período revela a insistên-cia em implementar na cidade deLisboa uma arquitectura regulamen-

tada com claras implicações na for-mulação de novas morfologias urba-nas para a cidade.Nas várias cartas ao Senado de Lisboa,com indicações para o reordenamen-to das ruas do centro, o secretárioAntónio Carneiro refere sistematica-mente: "para todas as casas ficaremyguais e por cordel". Neste quadro, éfornecida para a Rua dos Ferreiros aindicação mais precisa, quanto à uni-formidade do alçado da rua: "ponhãotodas [as casas] sobre arcos de pedraria eque fiquem todas as ditas balcoadas sobreos ditos arcos iguais sem hua sair mais quea outra nem ser mais alta que outra". Estareferência evidencia que a formulaçãoteórica desta arquitectura de progra-ma implicava uma medida uniformee rigorosa para as cérceas dos alçadosdas ruas.Pela análise das cérceas e métricaspropostas nos regimentos de obras,podemos concluir que estes conjun-tos edificados correspondiam a umedifício urbano de apenas dois pisos,com estrutura de paredes em arga-massa de pedra e cal, que se afasta dotipo de edifício medieval de estruturade madeira com vários andares.A este modelo de edifício manuelino,podemos acrescentar o uso de vãosnormalizados com molduras em

pedra com a largura de um palmo, asistematização de janelas de sacadaem duplo quadrado de 6 x 12 ou 5 x 10palmos, e janelas de peito de 6 x 4 pal-mos. De crucial importância para aimagem dos alçados dos edifícios, asvarandas eram regulamentadas comuma sacada de pedra com 1 palmo emeio de saliência, solução que vere-mos ser mantida ainda na recons-trução de Lisboa Pombalina.Estamos, no entanto, perante ummodelo que assentava sobretudonuma lógica de métricas proporcio-nais e elementos arquitectónicos e deconstrução que se definia com umainteligente flexibilidade formal.Divulgada por todo o País, esta arqui-tectura será propagada ao longo dosséculos XVI e XVII em todo o espaçodo Império, dotando o urbanismo eas cidades portuguesas de uma ima-gem muito própria.Na sua uniformidade, esta arquitec-tura regimentada estabelecia, ainda,um coerente enquadramento aosgrandes edifícios públicos, igrejas epalácios que se recortavam na paisa-gem como elementos de pontuaçãourbana. Numa íntima relação entreedifícios de valor simbólico e corpode morfologias urbanas, esta estéticadotava, por fim, a cidade, ao mesmotempo de vibração e de coerência for-mal, constituindo um dos seus valo-res estéticos mais notáveis.

Notas: Uma versão mais desenvolvida do presentetexto foi publicada na revista História, n.º 26, 2000,com o título “Reforma urbanística da Lisboa Manue-lina. Início da escola moderna de arquitectura”.

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URBANISMO EM ANÁLISETema de Capa

HELDER CARITA,Arquitecto

Conjunto urbano em Luanda-Angola Conjunto urbano em Ouro Preto-Brasil

Conjunto urbano em Pangim-Goa Edifício urbano em Silves-Algarve

36-37 Urbanismo em Análise 8/31/04 6:31 PM Page 37

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URBANISMO EM ANÁLISE

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Tema de Capa

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O Postigo do Melo e Casas do Embaixador

A cidade como um objecto vivo e osseus centros históricos podem serconsiderados monumentos, dado oseu interesse histórico, arqueológico,artístico, científico, técnico e social.Para assegurar a sua conservação ereabilitação é necessário definir tipos.A análise do edifício de rendimentoem Lisboa, do século XVI à 1.ª metadedo século XVIII, permitiu estabelecerum padrão referencial, levando à des-coberta de um núcleo urbano situadoentre a Madragoa e a encosta de SantaCatarina, o Postigo do Melo e Casasdo Embaixador.A necessidade de rentabilizar oespaço disponível da cidade levou àsua divisão em lotes e ao aparecimen-to de um modelo sistematizado deedifício plurifamiliar, organizadoverticalmente em loja, sobreloja, 1.º e2.º andar. Do século XVI à 1.ª metadedo século XVIII, números-medida, debase pitagoriana, proporcionam as

medidas de frente e profundidade dolote, o alçado do edifício e definemdistâncias de ruas entre quarteirões.O lote do edifício de rendimento (30 x60 palmos = 6,75 x 13,5 m) é usadocomo módulo-padrão, divisível ouagregável consoante o poder econó-mico do comprador, resultando edifí-cios com diferentes plantas distribu-tivas. Esta arquitectura erudita, frutode um corpo legislativo preciso e teo-rizado, dada a sua simplicidade formal é muitas vezes confundidacom a vernácula.A Regimentação da época definiapara todo o território portuguêsuma imagem-tipo para o alçado doedifício, a arquitectura de interior eos seus materiais de construção:madeira de castanho para pavimen-tar os pisos, o uso de sobrado nasáreas por cima das asnas, a presençade cantareiras nas janelas de peito echaminés em cada fogo. As métricas

proporcionais modulavam o inte-rior e o exterior do edifício e a ima-gem de alçado. A iconografia, o edi-ficado mais bem preservado daépoca e a literatura existente sobreos elementos de composição dealçado definem uma imagem preci-sa do edifício de rendimento doséculo XVI à 1.ª metade do séculoXVIII quanto a: remates de facha-das, telhados, cunhais, gelosias,muxarabis e rótulas, portas, águas--furtadas, frestas e óculos, brasão dacidade de Lisboa e placas foreiras.Esta informação reavaliada com aanálise de novos dados permitiu aconstrução de um padrão referen-cial, que evidenciou a existência dedois grupos de edifício (um para osséculos XVI e XVII e o outro para a 1.ª metade do século XVIII) e a evolução desde o módulo-padrãoinicial até ao modelo do grande edi-fício de rendimento joanino, ilus-

Os edifícios urbanos, comoindivíduos participando namalha urbana, obedecem anormas jurídicas, legislativas eeconómicas, reflexo da gestãoterritorial da cidade. Esta defi-nição relaciona-se com um tipoe uma imagem específica deum contexto civil e ambientalde um determinado períodohistórico.

Duas categorias de edifícios são visíveis, os de “frente” e os de “topo” de quarteirão, que se dividem em três tipos: um resultante do módulo-padrão inicial, outro da sua divisão e um terceiro da adição de outromódulo-padrão...

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URBANISMO EM ANÁLISETema de Capa

trado nos desenhos de alçado doedifício para a Rua dos Ourives. Oagregado familiar típico, as noções de conforto e de sociabilidade daépoca, e o contexto social e políticoredefiniram o tipo de planta distri-butiva existente e o número de di-visões por fogo – três a quatro.O núcleo Postigo do Melo e Casas doEmbaixador, pela sua coerência eunidade, pode ser considerado ummonumento. A sua descoberta, da-da a singularidade dos seus tipos,concentrados numa área pequena,permite uma aturada reavaliação doedifício de rendimento e da sua evo-lução. Este núcleo é delimitado peloLargo de Conde-Barão, pelas Ruasdas Gaivotas, do Poço dos Negros ea Avenida D. Carlos I. A contínuaocupação dos seus lotes desde o 1.ºquartel do século XV até 1700, provauma tradição arquitectónica ininter-rupta, legada para o séculos XVIII eXIX, visível na tripartição de facha-das e num número padrão de três di-visões por habitação.

Biliografia:MATOS, V. P., Subsídios para o estudo do edifício de ren-dimento em Lisboa, século XVI à 1.ª metade do séculoXVIII, Dissertação de Mestrado, Faculdade de Arqui-tectura da Universidade Técnica de Lisboa, 2003.

VANDA PEREIRA DE MATOS,Mestre em Reabilitação da Arquitectura eNúcleos Urbanos pela Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa

... resultam, assim, diferentes plantas distributivas, de acordo com: a relação dimensão do lote/escadas; a inter-relação lote/planta/materiais de construção; a profundidade do lote, a sua forma e a existência de corredor; o com-primento do lote e o número de divisões por habitação; a localização das escadas, as janelas e o desenho de fachada

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ISTO TAMBÉM É PATRIMÓNIO

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Tema de Capa

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Os gradeamentos de ferro nas fachadas

ou o ritmo forjado da arquitectura

Mantendo os seus núcleos urbanosmais antigos em alvéolos históricos,Lisboa cresceu a partir da IdadeModerna sob a direcção de sucessivosplanos urbanísticos que foram ras-gando o território, desde a segundametade do século XVIII, em largasavenidas e desafogadas ruas. A imagem que construímos de Lisboa,à parte dos núcleos medievais e renas-centistas, é maioritariamente a da cida-de moderna desenhada “a régua eesquadro”, onde a arquitectura se sub-mete ao plano urbanístico. Este concei-to de cidade teve no Bairro Alto o seumomento fundacional em Lisboa, tendo sido adoptado, de uma forma sis-temática, como modelo racional deestruturação urbana, a partir do pla-neamento e construção da Baixa Pom-balina. Assim, numa arquitectura quese quer urbana e funcional, alguns arti-fícios foram sendo usados para dotaras vias urbanas de um maior sentidoestético, onde a construção progressi-

vamente massificada de prédios derendimento corria o risco de se tornarmonótona.O gradeamento de ferro – em portões,janelas de sacada, bow-windows, varan-das, floreiras, … – foi o elemento deeleição para nobilitar e ritmar a arqui-tectura corrente e dotá-la activamentede uma interferência com a vivênciaurbana. Marcando os limites do priva-do e do público, os gradeamentos deferro tornam ao mesmo tempo, com asua transparência, fluidas as relaçõesentre interior e exterior. E, a um nívelmacroscópico, estes ornamentos iden-tificam módulos urbanos inteiros deprédios de rendimento, dotando-osdaquilo a que Kevin Lynch nomeia de“continuidade” / “unidade temática”(1)

e diferenciando-os, consequentemen-te, na teia complexa que estrutura aimagem total da cidade.Os gradeamentos de ferro, com as suascaracterísticas fundamentais – robus-tez, linearidade e restrição no desenho,

com recorrência aos valores da repe-tição sistemática de motivos e à sime-tria – foram sendo usados na arquitec-tura monumental e corrente, religiosa ecivil, com um carácter mais ou menosfuncional ou decorativo. Porém, ésobretudo na arquitectura civil que seobserva a evolução formal do ferro for-jado, pela razão óbvia dos exemplos semultiplicarem até à infinitude, caracte-rizando ruas e bairros inteiros. A partir do século XVI, os gradeamen-tos de ferro desenvolvem-se, com ins-piração nos balaústres de pedra. Sendoo ferro um material menos oneroso quea pedra e, certamente, mais leve, o seuuso nas varandas e balcões dos paláciosquinhentistas e seiscentistas facilitavaa nobilitação das fachadas, sendo que oefeito seria talvez menos distinto, masigualmente identificador de umaarquitectura ligada ao poder: o balcão/varanda teve sempre (até à sua vulgari-zação) uma conexão, mesmo que sub-reptícia, com a afirmação de uma per-

1 e 2 - Do séc. XVI ao séc. XX, a varanda de balaústres em ferro foi motivo recorrente nas fachadas. Palácio dos Condes de Alvor (séc. XVII), R. das Janelas Verdes (esquerda). Prédio“Português Suave”, na Av. Fontes Pereira de Melo, n.º 25 (direita)

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ISTO TAMBÉM É PATRIMÓNIOTema de Capa

sonalidade. Neste sentido, os varõescilíndricos ou facetados de ferro ali-nham-se vertical e paralelamente, emregra austera, a imitar o balaústre nobrede pedra, fazendo uso de pequenos nósou “bilros” (um ou vários sobrepostos)a meio das barras (Foto 1). Todavia, a sua vulgarização em janelasde sacada, como parte da definição nor-mativa da arquitectura, verificou-seapenas a partir do período pombalino.Perpetuando os modelos austerosquinhentistas e seiscentistas dos bala-ústres, os gradeamentos assumementão o papel de ritmar uma arquitec-tura rígida, submetida ao planeamento

urbano, e tornam-se uma componentereiterada na construção corrente. Apar deste modelo formal vão-se infil-trando, nas fachadas, as tipologias maislivres de combinação dos ornamentos,de influência francesa e italiana, queanimam a arquitectura com a gracilida-de rococó e neoclássica (Foto 3): osintervalos entre os varões são invadi-dos por motivos de enrolamentos e deespirais, que, em movimentos gracio-sos, se combinam com motivos vegeta-listas, zoomórficos, de inspiraçãoarquitectónica (arcos, cartelas), em infi-nitas composições, suportando no cen-tro, não raras vezes, o brasão identifica-dor do proprietário. O século XIX traz consigo a técnica doferro fundido, que os advogados do for-jado normalmente rejeitam pela mono-tonia que a facilidade do trabalho impri-miu às obras. De facto, predomina alinha recta, sobre a qual se vazam moti-vos planificados de inspiração arquitec-tónica (arcarias neogóticas, por ex.),numa repetição e simetria massivamen-te padronizada, mas de inegável senti-do rítmico quando aplicadas no jogo deníveis da arquitectura corrente (Foto 4).De carácter intrinsecamente mais deco-rativo é o ferro beaux-arts e o art noveau,que recorrem a elementos formais orgâ-nicos estilizados para dotar os edifíciosde uma imaginação exuberante (Foto 5).A arquitectura de ferro em Portugal,embora de manifestação tímida, é prefe-rencialmente explorada nas traseiras

dos edifícios: erguem-se, assim, estrutu-ras de ferro exógenas ao corpo do edifí-cio, que servem de varandas e de esca-das de serviço (Vila Berta), criandomicrocontextos de vivência urbana.A reinterpretação estética destes ele-mentos funcionais (portas e varandas)é feita no período modernista da arqui-tectura. O prédio de rendimento déco eo modernista (“estilo cassiano”) vulga-rizam-se, qual norma instituída, naconstrução em massa da habitação lis-boeta. Nestas fachadas, a varanda ga-nha a expressão déco com a padroni-zação de novos motivos em formas quecontinuam as linhas rectas da fachada(Foto 6) ou, já em pleno modernismo, avaranda de betão de topos boleados érematada por varões cilíndricos que aacompanham. Neste período, são tam-bém as portas que inovam: superfícieslisas e opacas, em ferro, elas recortammotivos geométricos de grande senti-do estético, nobilitando a fachada. Apartir dos anos 40, os varões de balaús-tre serão recuperados por um revivalis-mo “Suave”, que, voltando ab initio,fecham o ciclo artístico do uso dos gra-deamentos de ferro com carácter orna-mental nas fachadas (Foto 2).

Notas:(1) Kevin Lynch, A imagem da cidade, p. 76.

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CÁTIAMARQUES,Historiadora da Arte, Assessora de Direcção do GECoRPA

3 - Palácio pertencente à Ordem de S. Francisco dePaula, R. das Janelas Verdes

5 - Prédio de rendimento beaux-artsda R. Pinheiro Chagas, n.º 28

6 - Prédio de rendimento art déco da R. TomásRibeiro, n.º 93

4 - Neste prédio de rendimento da Av. D. Carlos I é notável a alternância e a cor dos gradeamentos das sacadas, que “forjam” o ritmo da fachada principal, quebrando a sua monotonia e dotando-a de um notávelsentido estético e urbano

40-41 Isto tb é Património 8/31/04 7:14 PM Page 41

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 200442

OPINIÃO

PROPOSTAS do GECoRPA

1. AVALIAÇÃO DA COMPETÊN-CIA DOS EFECTIVOSSegundo os procedimentos adop-tados pelo IMOPPI, após a entradaem vigor do Dec.-lei- 12/04 de 9 deJaneiro, a avaliação dos efectivos é fei-ta apenas por grupos de remune-ração, sem consideração da profissão.

Proposta do GECoRPA:Esta modalidade não basta para ga-rantir que a empresa, que se propõededicar à reabilitação (em particular,a estrutural), ou à conservação do pa-trimónio arquitectónico, possui nosseus quadros os perfis profissionaisque assegurem as especialidades quese propõe exercer. Como tal, para es-tas áreas, devem ser apresentados oscertificados de aptidão profissional(para as figuras profissionais que jáos possuam), ou os currículos profis-sionais dos colaboradores envolvidos(para as figuras profissionais que ain-da não os possuam). Deverá ser pro-movida, junto do Sistema Nacionalde Certificação Profissional, a certifi-cação de aptidão profissional de to-das as figuras profissionais do sector.

2. VALIDAÇÃO DOS DADOSFORNECIDOS PELAS EMPRESASO processo de ingresso e permanên-

cia na actividade de construção é ape-nas documental e as verificações queo IMOPPI se propõe fazer não são su-ficientes para validar os dados forne-cidos pelas empresas.

Proposta do GECoRPA:Propõe-se que sejam feitas auditoriasna altura do ingresso e, pelo menos,de dois em dois anos. Numa fase ini-cial, estas auditorias podem ser alea-tórias, por amostragem.

3. “REGIME PROBATÓRIO”O “regime probatório” beneficia asempresas recém-chegadas, em prejuí-zo das que já estão legalizadas, e au-menta a probabilidade de insucessoem áreas mais complexas do que a daconstrução nova, ou seja, a reabilitaçãodos edifícios existentes e a conser-vação do património arquitectónico.

Proposta do GECoRPA: Propõe-se que este regime seja elimi-nado, baseando-se a classificação deuma empresa, que se regista pela pri-meira vez, no seu quadro de pessoal eno currículo de obras comprovada-mente dirigidas ou em que participa-ram os seus quadros.

4. MATRIZ CLASSIFICATIVAA matriz classificativa não tem emconta que:

A) Mesmo em presença de tecnolo-gias construtivas e materiais corren-tes, intervir numa construção exis-tente é, frequentemente, mais com-plexo do que fazer uma construçãode raiz. Isto verifica-se, sobretudo,em trabalhos de natureza estrutural,acrescendo que, nestes trabalhos, éfrequente o uso de tecnologias e ma-teriais não tradicionais (tecnologiasemergentes);

B) As intervenções em muitas cons-truções mais antigas existentes no Pa-ís exigem, além das competências daalínea anterior, conhecimento pro-fundo de tecnologias construtivas emateriais entretanto abandonados,em particular a alvenaria clássica;

C) Na conservação do patrimónioarquitectónico ou construído prote-gido, o objecto da intervenção é,além de uma construção, um bemcultural, pelo que, em paralelo comas competências mencionadas naalínea anterior, se exigem metodo-logias e tecnologias específicas euma postura de particular con-tenção, rigor e responsabilidade.Estes requisitos são aplicáveis queraos trabalhos de construção pro-priamente ditos, quer aos trabalhosenvolvendo as instalações e siste-mas dos edifícios.

Sistema de classificaçãodas empresas que se dedicam à reabilitação de construções antigas e à conservação do património arquitectónicoNo seguimento da audiência tida com o anterior ministro das Obras Públicas, Transportes eHabitação, Prof. Dr. António Pedro Carmona Rodrigues, no passado dia 21 de Junho, o GECoRPAdesenvolveu uma alternativa de classificação das empresas mais simplificada que a publicada naPedra & Cal n.º 22. Apresenta-se, em seguida, uma síntese dessas propostas.

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004 43

OPINIÃO

Proposta do GECoRPA:Para ter em conta a alínea A):Criação, na 1.ª categoria – cuja desig-nação mudaria para “Construção no-va e reabilitação de edifícios recen-tes” – e em todas as subcategorias quecubram trabalhos de natureza estru-tural, de subcategorias complemen-tares para distinguir as empresas comcompetência para trabalhos de reabi-litação; Isso aplica-se às subcatego-rias 1.ª, 2.ª e 3.ª, e pode ser feito man-tendo a mesma numeração de subca-tegorias e acrescentando-lhes a letra“R”, de “reabilitação”;Alteração da classificação de “Em-preiteiro geral de reabilitação e manu-tenção de edifícios recentes” para terem conta as subcategorias referentesa “estruturas”.

Para ter em conta a alínea B):Instituição de uma categoria “Reabi-litação de edifícios antigos” (verAnexo I) com subcategorias segundoo tipo de trabalho e o tipo de material.

Para a atribuição de algumas das sub-categorias desta categoria ou para aatribuição do estatuto de empreiteirogeral desta área, pode ser exigido àempresa que disponha no seu qua-dro, no mínimo, de um arquitectoe/ou de um engenheiro civil com for-mação relevante em edifícios antigos;Criação da classificação de “Emprei-teiro geral de reabilitação e manu-tenção de edifícios antigos”, sendodeterminantes as subcategorias “can-tarias”, “rebocos” e “estruturas”.

Para ter em conta a alínea C):1. Criação de subcategorias comple-

mentares na categoria proposta naalínea anterior, para distinguir asempresas com competência paraintervir em edifícios classificadoscomo património arquitectónico.Isto pode ser feito mantendo a mes-ma numeração de subcategorias eacrescentando-lhes a letra “C”, de“conservação”. Para a atribuiçãode algumas destas subcategorias

ou para a atribuição do estatuto deempreiteiro geral desta área, podeser exigido à empresa que dispo-nha no seu quadro, no mínimo, deum arquitecto e/ou de um enge-nheiro civil com formação relevan-te em património arquitectónico ede um conservador-restauradorcom formação relevante em conser-vação de bens culturais imóveis;Criação da classificação de “Em-preiteiro geral de conservação dopatrimónio arquitectónico”, sen-do determinantes as subcategorias“cantarias”, “rebocos” e “estrutu-ras”, na vertente “Conservação”.

2. Criação de subcategorias comple-mentares na 4.ª categoria – que pas-saria a abranger todas as insta-lações e sistemas dos edifícios – se-gundo o mesmo método de 1.

Com estas alterações, podem ser eli-minadas a 10.ª subcategoria da 1.ª ca-tegoria e a 5.ª e a 8.ª subcategorias da5.ª categoria; A 8.ª e a 9.ª subcatego-rias da 1.ª categoria passam para a 4.ªcategoria.

Só assim o sistema será adequado ànova realidade do sector e só assimexistirão condições para que a reabili-tação do edificado, em particular doantigo, seja feita com um mínimo dequalidade e que as intervenções nopatrimónio arquitectónico possamser feitas em respeito pelos requisitosda conservação.É importante simplificar, mas é maisimportante assegurar que os traba-lhos de reabilitação – de que o edifi-cado do País tanto necessita – sejameficazes e duráveis e, sobretudo, queas intervenções no património arqui-tectónico não contribuam para a suaadulteração.

Notas:Para ler uma versão completa deste artigo, consulteo site GECoRPA em www.gecorpa.pt

SISTEMA DE CLASSIFICAÇÃO DAS EMPRESAS QUE SE DEDICAM À REABILITAÇÃO DE EDIFÍCIOS

ANTIGOS E À CONSERVAÇÃO DO PATRIMÓNIOARQUITECTÓNICO

ANEXO I

CATEGORIA 1A – REABILITAÇÃO E MANUTENÇÃO DE EDIFÍCIOS ANTIGOS

SUBCATEGORIAS• 1. Azulejaria (C)• 2. Cantarias (assentamento, substituição) (C)• 3. Cantarias (limpeza, tratatmento) (C) • 4. Carpintaria de limpos (madeira em caixilharias e guarnecimento de vãos) (C)• 5. Carpintaria de toscos (estruturas de madeira) (C)• 6. Esculturas de metal • 7. Esculturas de pedra• 8. Estruturas de alvenaria (C)• 9. Estruturas de betão armado e pré-esforçado (C)• 10. Estruturas metálicas, incluindo protecção (C)• 11. Estruturas de terra (taipa e adobe) (C)• 12. Estuques correntes e ornamentais (C)• 13. Pavimentos (C)• 14. Pinturas correntes (C)• 15. Pintura mural• 16. Pinturas decorativas sobre suporte mineral • 17. Pinturas sobre madeira e douramentos• 18. Rebocos (C)• 19. Revestimentos de coberturas inclinadas (C)• 20. Serralharias (C)• 21. Talha e esculturas de madeira • 22. Vidros e vitrais (C)

Notas: 1. A classificação em “Empreiteiro geral de reabilitação e manutenção de edifícios antigos”

depende da posse cumulativa das subcategorias determinantes, assinaladas a itálico;2. Aletra “C” denota qualificação para intervenções de conservação em imóveis classificados.

V. CÓIAS E SILVA,Eng.º Civil, Presidente do GECoRPA

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AS LEIS DO PATRIMÓNIO

Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

Tal Recomendação da Autoridade daConcorrência, tem como objecto a con-corrência (desleal) movida por “uni-dades de investigação” pertencentes auniversidades públicas que se apre-sentam no mercado, como empresas,a prestar serviços de inspecção, levan-tamento e diagnóstico, para manu-tenção, conservação e reparação deedifícios, beneficiando da isenção dopagamento de impostos, maxime, deImposto sobreos Rendimentos de Pes-soas Colectivas (IRC), de programasde financiamento sob a égide do Mi-nistério da Ciência e do Ensino Supe-rior e da utilização dos equipamentos,outros meios públicos e recursos hu-manos pagos pelo Estado, logo, pelospróprios agentes económicos a quemé movida a concorrência. Ora, tais benefícios fiscais concedi-dos, a existência de financiamentos afundo perdido ou outros e a utili-zação na prestação desses serviços demeios, equipamentos e recursos hu-manos pagos pelo Estado, consubs-tanciam, uns, desde logo formal e ma-terialmente, outros materialmente,apoios ou auxílios de Estado.Tais apoios ou auxílios estatais, per-mitem às universidades ou a unida-des destas especializadas que pres-tam serviços em concorrência com os

agentes económicos, apresentar osmesmos serviços a preços que não re-flectem o verdadeiro custo dos mes-mos, muito menos, com o acréscimode lucro que naturalmente é buscadopelo agente económico.Verifica-se, deste modo, uma flagran-te violação da sã concorrência entreos agentes que operam no mercado,violando os princípios da trans-parência, da proporcionalidade e danão discriminação.Efectivamente, pode ler-se na Reco-mendação em causa: “Os Estabeleci-mentos de Ensino Superior que, paraalém da prossecução de serviços deinteresse cultural geral, nas áreas doensino, da ciência e da tecnologia,apoiados por medidas estatais, pres-tam também acessoriamente serviçosem mercados, em regime de con-corrência, com agentes económicos,devem observar os princípios datransparência, da proporcionalidadee da não discriminação, em que as-senta o funcionamento do mercadoconcorrencial.”.Na verdade, impõe o princípio datransparência que exista uma sepa-ração contabilistica das actividadesdesenvolvidas pelas universidadesem regime de concorrência com osagentes económicos, o princípio da

proporcionalidade que os preços doserviço reflictam verdadeiramente oscustos da actividade e os custos do ca-pital fixo nela envolvidos, e o princí-pio da não discriminação que o preçopraticado não reflita os beneficios fis-cais concedidos e os auxílios estatais.Os princípios afirmados na Reco-mendação n.º 01/2003 da Autoridadeda Concorrência, embora primempor uma indiscutível justiça e acerti-vidade, pecam, muito provavelmen-te, e, salvo melhor entendimento, pe-la dificuldade de implementação.No entanto, estamos em crer que, nãodeverão os agentes económicos per-der a oportunidade de invocar a refe-rida Recomendação n.º 01/2003, daAutoridade da Concorrência, sempreque, na abertura de propostas paraprestação de serviços em concursospúblicos, as referidas universidades,por si, ou através duma “unidade es-pecializada” se apresentem a prestaro mesmo serviço por preços que to-dos sabemos não serem os do merca-do, requerendo a sua exclusão.

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Pela sua importância e aguçada actualidade, não se pode aqui deixar de chamar a atenção do clien-te do tipo de serviço em causa para a Recomendação n.º 01/2003 da Autoridade da Concorrência, de01 de Setembro de 2003, a qual poderá ser consultada no sítio www.autoridadedaconcorrência.pt(link das recomendações), emitida a propósito da prestação de serviços por estabelecimentos deensino público superior, em concorrência com agentes económicos.

A Autoridade da Concorrência pronuncia-se sobre

a prestação de serviços pelas universidades

A. JAIME MARTINS, Docente UniversitárioAdvogado de ATMJ – Sociedade de Advogados

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

COMEMORAÇÃO

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A guerra tem efeitos devastadoresem pessoas e bens, atingindo tantoalvos militares como alvos inofensi-vos. É incalculável o número de mo-numentos e de obras de arte destruí-dos no decorrer dos conflitos arma-dos. Para poupar os bens culturais àdestruição da guerra, houve, desdefinais do século XIX, várias tentati-vas de aprovação de convenções en-tre nações em tempo de paz. Umaconvenção internacional é uma nor-ma jurídica aprovada por diversosEstados, que se obrigam a aplicar noseu território os princípios nela ex-pressos. Provavelmente, a mais antiga con-venção internacional que refere ex-plicitamente a salvaguarda de mo-numentos em caso de conflito arma-do é a Convenção de Bruxelas, de 27de Agosto de 1874, mas que não che-gou a entrar em vigor. As primeirasconvenções internacionais a regulara conduta dos Estados em tempo deguerra a efectivamente vigoraremforam as Convenções da Haia, assi-nadas em 29 de Julho de 1899 e revis-tas em 18 de Outubro de 1907, namesma cidade holandesa. No entan-to, a sua eficácia foi praticamente nu-la face à devastação da 1.ª GuerraMundial (1914-18). Retomando esta preocupação pelasalvaguarda dos monumentos, é as-sinado em Washington, D.C., em 15de Abril de 1935, o Pacto Roerich,

que ficou limitado aos estados ame-ricanos. Também a Sociedade dasNações preparou um Anteprojectode Convenção internacional para aprotecção dos monumentos e obrasde arte em tempo de guerra (1936),mas o eclodir da 2.ª Guerra Mundial(1939-45) não permitiu a sua apro-vação. Na sequência destas experiênciasnormativas (e bélicas) é assinada, háprecisamente meio século, em 14 deMaio de 1954, a Convenção da Haiapara a protecção dos bens culturaisem caso de conflito armado. Resul-tando da iniciativa da Organizaçãodas Nações Unidas para a Educação,Ciência e Cultura (UNESCO), a Con-venção da Haia de 1954 entrou em

vigor dois anos depois, mas Portu-gal só a ratificou em 2000 (Resoluçãoda A.R. n.º 26/00, de 30 de Março),embora o embaixador português nosPaíses Baixos fosse um dos 37 signa-tários do Acto Final da conferênciaintergovernamental que aprovou aConvenção. Actualmente, são 110 osEstados que fazem parte desta Con-venção, que é complementada porum Regulamento de Execução, o Pri-meiro Protocolo (ambos de 14 deMaio de 1954) e o Segundo Protocolo(de 26 de Março de 1999). Entre os aspectos mais significativosdeste texto normativo destacamos: aatribuição de valor universal aosbens culturais de todo e qualquer po-vo; a definição precisa de bens cultu-rais móveis e imóveis (pela primeiravez numa norma internacional) e decentros monumentais; o compromis-so assumido entre os Estados partede respeitarem esses bens e de não osexporem à destruição; a criação deum sinal distintivo a colocar em de-terminados bens para os identificarcomo não sendo alvos militares (jáprevisto nas Convenções de 1907); eas medidas a adoptar em tempo deguerra para proteger os bens. Esta Convenção tenta equilibrar asexigências de protecção dos bensculturais com as exigências de or-dem militar num conflito convencio-nal (não contempla a utilização dearmas de destruição maciça). Apli-ca-se tanto a conflitos internacionaiscomo aos que têm lugar no territóriode um só Estado e foi a primeira con-venção da UNESCO no domínio dopatrimónio arquitectónico.

Cinquentenário da Convenção da Haia

MIGUEL BRITO CORREIA,Arquitecto

Em Maio de 1954 foi assinada a Convenção da Haia para a pro-tecção dos bens culturais em caso de conflito armado. Esta entra-ria em vigor dois anos mais tarde em resultado da iniciativa daOrganização das Nações Unidas para a Educação, Ciência eCultura (UNESCO).

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Pedra & Cal Pedra & Cal n.º 26 Abril . Maio . Junho 200540

O museu, instalado num edifício oito-centista, o Solar dos Goulões, de ine-quívoco valor histórico e artístico –classificado como Imóvel de InteressePúblico em 2002 – apresenta a expo-sição de longa duração O labor doCanteiro, desenvolvida ao longo deum percurso, que acompanha as fasesde intervenção sobre a pedra com vis-ta à produção de cantarias. Mostram-se os utensílios mais antigos e tradi-cionais usados pelos canteiros no de-curso das sucessivas operações e tam-bém as inovações de que foram objec-to, conduzindo ao seu abandono esubstituição por maquinarias.As imagens apresentadas ao longo dopercurso documentam práticas e téc-nicas que conduzem à produção deformas ou à elaboração estética da pe-dra, dando conta dos traços funda-mentais da evolução da actividade pé-trea em Portugal.Integram ainda o circuito do Museu

do Canteiro, a cozinha, cuja lareira earmários de parede, construídos empedra aparelhada de grandes di-mensões, são de destacar, assim comoo varandim da capela que faz a ligaçãodo Solar à capela anexa, actualmentedenominada de São Brás, onde os ha-bitantes da casa assistiam às cerimó-nias religiosas. Outras divisões do edifício exprimema forte relação dos seus donos com agrande propriedade de tendência lati-fundiária, assente numa economia deprodução de cereais, de pragana eazeite. Atítulo de exemplo, as tulhas ea sala de armazenamento de azeite,que impressionam pela aplicação decantarias realizada nestes espaços me-ramente funcionais, também podemser visitadas. A escolha do Solar dos Goulões parareceber este museu não foi, aliás, feitaao acaso. A elaboração do trabalho dapedra que se verifica neste edifício, in-

vulgar na sua composição interior eexterior, tornam-no um belo exemplarda aplicação do trabalho de cantaria.Oespaço destinado às exposições tem-porárias constitui o campo dinâmicodo Museu do Canteiro, aberto a gran-de diversidade de propostas, mas cujatemática a abordar será invariavel-mente a do canteiro. Diversos ateliês, promovidos pelo ser-viço educativo desta instituição muse-ológica, ocupam o segundo piso destemagnífico solar.

DIVULGAÇÃO

Museu do Canteiro Percursos da tecnologia da pedra

SOLANGE ALMEIDA, MUSEU DO CANTEIRO

Identificação: Solar dos GoulõesLocalização: Alcains, Castelo Branco.Protecção: IIP, Dec. N.º 5/2002, DR 42 de 19de Fevereiro 2002Museu do CanteiroCentro Cultural de AlcainsSolar dos Goulões, Rua das Fontainhas, nº16005 Alcains, Tel. [email protected]

No passado dia 22 de Janeiro,foi inaugurado, em Alcains, oMuseu do Canteiro. Tendo asua génese correspondido auma iniciativa espontânea dacomunidade alcainense, for-mula-se agora como uma insti-tuição autárquica, vocaciona-da para estudar, preservar edivulgar as práticas e as vivên-cias do trabalho do canteiro.

46 Divulgação 2/4/07 5:13 PM Page 40

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GECoRPA debate Sociedades de

Reabilitação Urbana

Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

VIDAASSOCIATIVA

Teve lugar, no passado dia 11 de Maio,no Palácio da Bolsa do Porto, o VIJantar GECoRPA, que reuniu cerca de40 convidados, entre representantesdo IPPAR e da DGEMN, de diversasassociações e instituições de ensinosuperior do Norte, bem como deempresas que se dedicam à conser-vação, reabilitação e restauro dopatrimónio edificado.Como convidado de honra estevepresente o presidente da Sociedadede Reabilitação Urbana do Porto, Dr.Joaquim Branco, que fez uma inter-venção no final do jantar sobre o tema“As Sociedades de ReabilitaçãoUrbana: oportunidades e riscos”. O Dr. Joaquim Branco apresentou oprojecto de reabilitação urbana daBaixa Portuense, procurando trans-mitir aos participantes a necessidadede ter uma visão sistémica dos pro-blemas e das soluções. De uma formasucinta, caracterizou a situação actualda zona de intervenção nas vertentessocial, económica, ambiental e física,explicitou as suas principais causas,e, de seguida, descreveu os motivosque sustentam o interesse e a necessi-dade de efectuar um processo de rea-bilitação urbana.

A metodologia definida para a inter-venção foi também exposta, tendo oconvidado de honra descrito os pro-cessos de diagnóstico utilizados, adefinição estratégica e a forma da suaoperacionalização, dando uma visãosumária dos instrumentos à dispo-sição. Por fim, o Dr. Joaquim Brancofinalizou a sua comunicação comuma síntese dos princípios quedeverão nortear a intervenção naBaixa Portuense.Após o discurso, os participantestiveram oportunidade de colocar

algumas questões, o que deu lugar aum interessante e necessário debatesobre as “oportunidades e riscos” queo desafio das Sociedades de Rea-bilitação Urbana (neste caso específi-co a do Porto, que foi a pioneira doprojecto) lança às entidades públicase privadas, aos proprietários e, acimade tudo, às cidades e ao seu patrimó-nio edificado.

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BREVE NOTA BIOGRÁFICADO CONVIDADO DE HONRA

Joaquim José Fernandes Branco,licenciado pela Faculdade deEconomia do Porto. Até 1992, director da União deBancos Portugueses. De 1993 a2002, administrador da Com-panhia de Seguros de Crédito-Cosec. Desde 2003, membro daEstrutura de Projecto, para acriação da Sociedade de Rea-bilitação Urbana da Baixa Por-tuense. De 1993 a 1997, administrador daCompanhia de Seguros de Macau.Em 1995, vogal do Conselho Fiscaldo Banco Borges & Irmão.Presidente da Fundação RotáriaPortuguesa de 1999 a 2002. Vice-presidente da Associação deAntigos Alunos da Faculdade deEconomia do Porto, desde 1996.Vogal da Junta Directiva daCâmara de Comércio Luso-Es-panhola de 1995 a 2003.

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

VIDAASSOCIATIVA

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GECoRPA realiza primeiro e segundo Demo-nários 2004

Decorreram nos passados dias 5 de Maioe 2 de Junho, nas instalações do CENFIC,no Prior Velho, o primeiro e o segundoDemo-nários GECoRPA. O primeiro foidedicado à “Reabilitação e conservaçãode estruturas de madeira de edifíciosantigos” e o segundo às “Inspecções eensaios em edifícios antigos e recentescom vista à sua reabilitação”.O Demo-nário de 5 de Maio teve porobjectivo a exposição dos processos tra-dicionais e não tradicionais de repa-ração e reforço de estruturas de madeirade edifícios antigos, para cuja aborda-gem o GECoRPA recorreu a dois espe-cialistas: Eng.ª Helena Cruz, do LNEC,que falou sobre a “Conservação ereforço de estruturas de madeira”; eDave Smedley da empresa britânicaRotafix, Ld.ª, cuja intervenção teve porbase “O restauro de madeira combi-nando a carpintaria tradicional commateriais modernos”. Este último ora-dor foi responsável pela demonstraçãoprática, exemplificando reparações deestruturas de madeira, em provetes, eapresentando os diferentes materiaisfabricados por esta empresa. Foramapresentados três exemplos de repa-rações: Reconstituição de peça de estru-tura de madeira utilizando varões dematerial compósito e enchimento com“grout” de epóxido; Reparação deestrutura de madeira (viga) utilizandoelementos de material compósito e resi-nas de epóxido; Testes à viscosidade dasresinas de epóxido.

O segundo Demo-nário GECoRPAobjectivou a caracterização dos mate-riais dos edifícios antigos e recentes areabilitar e das suas patologias, bemcomo o controlo de qualidade das inter-venções. Para a parte teórica foram con-

vidados como oradores o Eng.º V. Cóiase Silva, presidente do GECoRPA, e aEng.ª Iolanda Soares, directora daQualidade da empresa OZ, Ld.ª. OEng.º V. Cóias e Silva introduziu osmétodos não destrutivos ou reduzida-mente intrusivos de inspecção, o ensaioe monitoragem de edifícios e o diagnós-tico das anomalias por eles apresenta-das. A apresentação da Eng.ª IolandaSoares centrou-se na “Gestão da quali-dade na inspecção e ensaio”.Ademonstração prática foi da respon-sabilidade da Eng.ª Iolanda Soares edo técnico Carlos Gonçalves, tambémda OZ, Ld.ª, que apresentaram a simu-lação de ensaios não destrutivos eferramentas informáticas de apoio aodiagnóstico. Os participantes tiveramoportunidade de contactar e manuse-ar com as ferramentas, experimentan-do o seu modo de utilização.Estão programados mais dois Demo--nários para este ano. Para saber maissobre este ciclo de acções de for-mação, consulte o nosso sítio web emwww.gecorpa.pt .

Exposição teórica feita pela Eng.ª Helena Cruz, LNEC

Demonstração prática apresentada pelo técnicoCarlos Gonçalves (à esq.ª) e pela Eng.ª Iolanda Soares

Eng.ª Iolanda Soares e Eng.º V. Cóias e Silva, OZ, Ld.ª

Demonstração prática de Dave Smedley, Rotafix, Ld.ª

Participação dos formandos na simulação dos ensaios e contacto com as ferramentas de apoio ao diagnóstico

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VIDAASSOCIATIVA / NOTÍCIAS

Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 200450

Guia prático para a conservação de imóveis O auditório do InstitutoNacional da Habitaçãoestava repleto para assis-tir ao lançamento destelivro do Eng.º VítorCóias e Silva, na tarde de8 de Julho. Após as apre-sentações do represen-tante do editor e da Se-cretária de Estado daHabitação, Maria doRosário Águas, que sa-lientou a aposta do Go-verno na reabilitação ur-bana, o autor reforçoua necessidade de au-

mentar a percentagem de obras de conservação deedifícios no conjunto do sector da construção, valor

esse que está ainda muito abaixo da média da União Europeia, e, sobretudo, de criar condições para que essa rectificação se-ja feita com qualidade.Este “manual para a utilização durável e económica da habitação, através de uma adequada manutenção” é uma publicaçãoeminentemente prática, repleta de ilustrações e de explicações muito acessíveis ao público e informativas para os profissio-nais da construção e da conservação de edifícios. Dividido em quatro capítulos (introdução, generalidades, manutenção etécnicas de intervenção) e complementado por quatro anexos, o livro foi escrito para ajudar os utentes das habitações amantê-las, prolongando a sua vida útil, e os compradores a saberem detectar anomalias que encareçam a manutenção da ha-bitação que pretendem adquirir. Areferência a boas e más opções (com pictogramas de rápida interpretação), às anomalias,a actividades de manutenção (com exemplos práticos), à legislação em vigor e a bibliografia sobre casos específicos tornama consulta rápida e completa.

M.B.C.Já à venda na Livraria GECoRPA(www.gecorpa.pt): Preço: € 27,50 Código: QUI.M.1

A nova direcção do GECoRPA, eleita em Março deste ano, tem vindo a apresentar os objectivos que se propõe a atingirdurante o triénio de 2004 a 2006 a algumas entidades públicas, destacando-se as audiências concedidas pelo ministro dasObras Públicas, Transportes e Habitação, Prof. Dr. António Pedro Carmona Rodrigues; pela presidente do ConselhoDirectivo Nacional da Ordem dos Arquitectos, Arq.ª Helena Roseta; e pela Presidência da Câmara Municipal do Porto,assessora Dr.ª Emília Galego. Manifestando o desejo da associação de colaborar com estas entidades, com vista a uma melhor gestão do edificado e sal-vaguarda dos edifícios históricos, a direcção do GECoRPAexpôs algumas questões fundamentais:- Necessidade de promoção da reabilitação estrutural do edificado;- Inconvenientes das recentes alterações introduzidas no sistema de classificação dos empreiteiros, que levaram à extinçãoda categoria Património Construído Protegido, e formas de os suprir;- Necessidade de acções de formação destinadas, sobretudo, às empresas e aos seus técnicos, tendo em vista a qualificaçãodos recursos humanos a utilizar na reabilitação.

Ministério das Obras Públicas, Ordem dos Arquitectos e Câmara Municipal do Portoouvem o GECoRPA

48-50 Notícias 8/31/04 1:23 PM Page 50

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

AGENDA

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The VIIIth International DOCOMOMO Conference: “Import Export: Postwar Modernism in an Expanding World, 1945-1975”

Data e local: 26 de Setembro a 2 de Outubro de 2004, Columbia UniversityCampus, Nova IorqueTemas: Internacionalização; Polarização; Reconstrução e reedificação; Re-sistência e independência; Zonas de tempo; Utopias

Informações: URL: http://www.docomomo2004.org/ E-mail: [email protected]

Seminário Internacional «ReabilitaçãoEstrutural de edifícios antigos em Alvenaria e Madeira» - 3 R ConstruaOrganização: EXPONOR e GECoRPAData e local: 29 de Outubro de 2004, das 10h00 às 12h00; EuroparqueOradores e temas: Eng.º V. Cóias e Silva – GECoRPA; Ramiro Sofronie (Roménia) – “Reforço anti-sísmico de construções antigas dealvenaria – Sistema Richtegard”; Dave Smedley (Inglaterra) – “Reabilitação e conservação de estruturas de ma-deira de edifícios antigos” (Dave Smedley, Rotafix, L.td).

Informações:Sofia Costa – Exponor, Tel.: 229 981 487 • Fax: 229 981 482, E-mail: [email protected] Cátia Marques – GECoRPA, Tel.: 213 542 336 • Fax: 213 157 996, E-mail: [email protected]

4th international Seminar "StructuralAnalysis of Historical Constructions" Data e local: 10 a 13 de Novembro de 2004, Universidade de Pádua, Itália

O principal objectivo deste seminário épromover a troca de conhecimentos, in-formação e pontos de vista entre os pes-

quisadores e peritos na área da preservação, protecção e restauração das cons-truções históricas (monumentos arquitectónicos e centros urbanos). As ediçõesanteriores deste seminário decorreram em Barcelona (1995 e 1998) e Guimarães(2001). Oradores convidados e algumas pequenas contribuições farão a cobertu-ra dos aspectos principais relacionados com o estudo e reparação da construçãohistórica, tais como inspecção, testagem não destrutiva e técnicas de monotori-zação, análise estrutural, técnicas de consolidação, caracterização dos materiaisde construção, uso de inovadores e tradicionais materiais e técnicas de inter-venção em monumentos.

Informações: Universidade de PáduaDepartamento de Engenharia Estrutural e dos TransportesVia Marzolo 935131 Pádua – ItáliaWebsite: www.historicalstructures.net

IX Encontro Nacional de Mu-nicípios com Centro Históri-co: “Tradição e Inovação” Organização: Câmara Municipal deMértola, Associação Portuguesa deMunicípios com Centro HistóricoData: 21 a 23 de OutubroTemas: Centros Históricos e Territó-rio; (Re)viver no Centro Histórico;Novas Técnicas – Novas LinguagensInscrições: até 30 de Julho, para parti-cipantes com comunicação (€100); até1 de Setembro para participantes semcomunicação (€ 150). Os estudantesuniversitários têm uma redução de50% e a sua inscrição está limitada a20 vagas.Informações: Dr.ª Lígia RafaelC. M. Mértola – Divisão de Cultura, Desporto e TurismoPraça Luís de Camões, 7750-329 MértolaTel.: 286 610 100/109E-mail: [email protected]

“Vision Techniques Applied to the Rehabilitation of CityCentres”Data e local:25 a 27 de Outubrode 2004,Oceanário, Parque das Nações, LisboaOs centros urbanos são realidades com-plexas, onde as estruturas construídasantigas e recentes coexistem e intera-gem para formar o enquadramento davida urbana.Areabilitação dos centros urbanos, va-lorizando o património construído ecriando novas oportunidades para asactividades económicas, sociais e cul-turais, é hoje um tema vital para a ad-ministração das cidades. Aanálise e o estudo de impacte da rea-bilitação dos centros urbanos têm de sercorrectamente planeados com ante-cedência, por forma a atingir os melho-res resultados para todos os interesses evalores que lhe dizem respeito. Areabi-litação dos centros urbanos está, por is-so, altamente dependente de infor-mação fiável e de informação relativaaos aspectos métricos e semânticos doambiente construído corrente.Informações: International Committee forArchitectural Photogrammetry (CIPA) E-mail: [email protected] Website: www.visiontec-workshop.org

51 Agenda 2/4/07 5:18 PM Page 51

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Pedra & Cal n.º 22 Abril . Maio . Junho 200452

LIVRARIA

Sistemas de Construção, IV – Coberturas planas,Juntas; Materiais Básicos (2.ª parte): Materiaisferrosos e alumínioCoordenação: Jorge MascarenhasEdição: Livros HorizonteEsta obra integra-se como o quarto volume de uma série,onde se faz uma descrição ilustrada e detalhada de processos construtivos utilizados correntemente em Portugal. Esta colecção pretende construir um auxiliar de consulta útil para profissionais e conhecer e classificaros diversos processos de construção existentes, com as suas vantagens e desvantagens.Preço: 22,95 euros – Código: HT.E.19

Património Arquitectónico e Arqueológico: Cartas,Recomendações e Convenções Internacionais Autores: Flávio Lopes, Miguel Brito CorreiaEdição: Livros HorizonteOs conceitos e as doutrinas sobre o património culturalevoluíram extraordinariamente ao longo do século XX e não permanecerão, obviamente, imutáveis no futuro.Esta publicação apresenta, além de uma breve introduçãosobre a evolução dos conceitos de salvaguarda do património arquitectónico e arqueológico, a traduçãopara português de 34 cartas, recomendações e convençõesinternacionais produzidas por organismos de grandeprojecção, como a UNESCO, o Conselho da Europa, o ICOMOS e outros. Uma listagem com uma centena de outras normas relevantes, uma bibliografia específica e um índice remissivo contribuem para que estapublicação seja de leitura obrigatória.Preço: 33,60 euros – Código: HT.E.21

O Livro de Lisboa

Coord. Irisalva Moita, Livros Horizonte, 527 pp., 44,89 euros Código: HT.E.20

CIMAD’04 – 1.º Congresso Ibérico: “A Madeira na Construção”Coordenação: Paulo J. Cruz, João A. Negrão, Jorge M. BrancoEdição: Universidade do MinhoO ressurgimento das estruturas de madeira na construçãocivil deve-se principalmente a três factores: razõesambientais, desenvolvimento das técnicas de classificação(conhecimento do comportamento mecânico do material)e desenvolvimento dos meios de execução das ligações(maior precisão dimensional e maior liberdade de formas).Este livro reúne cerca de uma centena de comunicaçõessobre os desenvolvimentos recentes sobre a Madeira na Construção, dividindo-se nos seguintes temas:Indústria da Madeira; AMadeira como material de construção; Património Arquitectónico e Reabilitação;Segurança de estruturas de madeira; e Realizações.Preço: 50,00 euros – Código: UM.A.2

NOVIDADESOs livros de Lisboa à venda na Livraria GECoRPA

Palácio Pancas Palha

CML, 127 pp., 20,95 eurosCódigo: CML.E.1

A Igreja da Memória

Joaquim Oliveira Caetano,DGEMN, 84 pp., 14,96 eurosCódigo: DG.E.1

Lisboa – Arquitectura & Património

José Manuel Fernandes,Livros Horizonte, 219 pp., 12,67 eurosCódigo: HT.E.1

Plano Verde de Lisboa – Componente do PDM de Lisboa

Gonçalo Ribeiro Telles, Colibri, 197 pp., 19,90 euros Código: COL.E.1

A Lisboa Turística: entre o imaginário e acidade. A construção de um lugar turísticourbano

Eduardo Brito Henriques,Colibri, 198 pp., 10,50 euros Código: COL.E.3

Mapa de Arquitectura de Lisboa

Ed. Trilingue, Argumentum, Preço: 6 euros – Código: AR.M.2

Lisboa em Obras

José Manuel Fernandes,Livros Horizonte, 223 pp., 18,33 eurosCódigo: HT.E.2

Política urbana de Lisboa, 1926-1974

Carlos Nunes da Silva,Livros Horizonte, 231 pp., 10,47 eurosCódigo: HT.E.4

Os engenheiros em Lisboa: urbanismo earquitectura (1850-1930

Maria Helena Lisboa, Livros Horizonte, 293 pp., 26,25 euros Código: HT.E.6

Lisboa Manuelina e a formação de modelosurbanísticos da época moderna (1495-1521

Hélder Carita,Livros Horizonte, 255pp., 18,33 eurosCódigo: HT.E.7

Lisboa: urbanismo e arquitectura

José-Augusto França,Livros Horizonte, 119 pp., 7,85 eurosCódigo: HT.E.8

Torre de Belém: intervenção de conservação exterior

IPPAR, 153 pp., 24,94 eurosCódigo: IP.E.6

Para saber mais sobre estes e outros livros, consulte a Livraria Virtual em www.gecorpa.pt

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LIVRARIA

N.º 3, Jul/Ago/Set 1999Preço: 3,74 eurosCódigo: P&C.3

N.º 4, Out/Nov/Dez 1999Preço: 4,48 euros

Código: P&C.4 – esgotado

N.º 5, Jan/Fev/Mar 2000Preço: 4,48 euros

Código: P&C.5 – esgotado

N.º 6, Abr/Mai/Jun 2000Preço: 4,48 euros

Código: P&C.6 – esgotado

N.º 7, Jul/Ago/Set 2000Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.7

N.º 8, Out/Nov/Dez 2000Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.8

N.º 2, Abr/Mai/Jun 1999Preço: 3,74 euros

Código: P&C.2 – esgotado

N.º 9, Jan/Fev/Mar 2001Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.9

N.º 10, Abr/Mai/Jun 2001Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.10

N.º 11, Jul/Ago/Set 2001Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.11

N.º 12, Out/Nov/Dez 2001Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.12

N.º 13, Jan/Fev/Mar 2002Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.13

N.º 14, Abril/Maio/Jun 2002Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.14

N.º 18, Abril/Maio/Jun 2003Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.18

N.º 15, Jul/Agosto/Set 2002Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.15

N.º 19, Jul/Agosto/Set 2003Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.19

N.º 20, Out/Nov/Dez 2003Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.20

N.º 21, Jan/Fev/Mar 2004Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.21

Revista da Conservação do Património Arquitectónico e da Reabilitação do Edificado

AnoV–N.º22Abril/Maio/junho2004–Publicaçãotrimestral–Preço

€4,48(IVA

incluído)

AnoV–N.º22Abril/Maio/junho2004–Publicaçãotrimestral–Preço

€4,48(IVA

incluído)

Patrimóniomarítimo

EntrevistaEng.º Damião Martins de Castro

Vestígios do património náutico em Portugal

EntrevistaEng.º Damião Martins de Castro

Vestígios do património náutico em Portugal

Sistema de classificação das empresas da reabilitação e da conservação

N.º 22, Abr/Mai/Jun 2004Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.22

N.º 16, Out/Nov/Dez 2002Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.16

N.º 17, Jan/Fev/Mar 2003Preço: 4,48 eurosCódigo: P&C.17

Nota de EncomendaNome Endereço

Código Postal Localidade Telefone Fax

Junto cheque n.º sobre o Banco no valor de ____________________ euros, à ordem do GECoRPA

Data Assinatura

N.º Contribuinte e-mail

Código Título Preço Unitário Desconto (*) Quantidade Valor (**)

(*) Os associados do GECoRPAou assinantes da Revista têm direito a 10% de desconto sobre o valor de cada obra encomendada. Os descontos não são acumuláveis, nem aplicáveis aos números da Pedra&Cal já publicados.(**) Ao valor de cada livro deverão ser acrescentados 3,64 euros para portes de correio. Por cada livro adicional deverá somar-se a quantia de 0,70 euros.Quanto aos números da Pedra&Cal já publicados, os portes de correio fixam-se em 1,10 euros. Para mais informações, consulte as Condições de Venda na Livraria Virtual.FORMADE PAGAMENTO: o pagamento deverá ser efectuado através de cheque à ordem de GECoRPA, enviado juntamente com a nota de encomenda para Rua Pedro Nunes , n.º 27, 1.º Esq.º 1050-170 Lisboa.

Associado do GECoRPA (10% de desconto)Assinante da “Pedra&Cal” (10% de desconto)

Assinatura anual de 4 números da P&C pelo preço de 16,13 € (beneficiando do desconto de 10% sobre o preço de capa), acrescido de 4,40€ de portes de envio.

Nota: Os assinantes da P&C têm 10% de desconto nas publicações vendidas na Livraria GECoRPA.

Actividade / Profissão

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 200454

PERFIL DE EMPRESA

54 Perfil de Empresa 2/4/07 5:34 PM Page 1

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

e-pedra e calTema de Capa

55

Em 1996, conheci em Inglaterra oacadémico brasileiro Sílvio MendesZanchetti, da Universidade Federalde Pernambuco, que, com sentidaadmiração, me disse ter Lisboa nes-sa altura o maior volume de traba-lhos de conservação urbana na Eu-ropa. Passei assim a olhar com maisrespeito o trabalho meritório desen-volvido pela Câmara Municipal deLisboa (CML) nos seus bairros his-tóricos. Sílvio Zanchetti encontrava--se então em trânsito de Roma parao Brasil depois de um ano sabáticono ICCROM a organizar, juntamen-te com Jukka Jokilehto, um novocurso de pós-graduação chamadoIntegrated Territorial Urban Con-servation (ITUC), com o objectivo deintegrar a conservação urbana noprocesso de decisão e planeamentodas cidades (a consultar www.ic-crom.org ou a versão brasileira emwww.ceci-br.org). Em Portugal, a reabilitação urbana é exemplar a nível internacional, do projecto da Ribeira-Barredo(CRUARB) aos centros históricos deGuimarães e Évora, para citar ape-nas os mais conhecidos. Mas se arealidade urbana nos mostra a obrafeita, a realidade virtual nem por is-so, e pouca foi a informação que en-contrei para este artigo. Entre not í c ias d ispersas , emhttp://cruarb.ufp.pt podemos co-nhecer pormenores do projecto deum Centro de Documentação para oProjecto Municipal para a Reno-vação Urbana do Centro Históricodo Porto (CRUARB), cujo acervo do-cumental relativo aos projectos de-

senvolvidos desde 1974 constituiuma fonte valiosa de informação para investigadores e público em geral, através da sua disponibili-zação on-line em formato digital.Quanto a o t r a b a l h o d a C M L , os i t e http://ulisses.cm-lisboa.pt per-mite-nos conhecer sumariamente aszonas com operações de reabilitaçãourbana em curso (cf. PlaneamentoUrbano: Planos publicados) e umadescrição do Plano Integrado doCastelo (cf. Galeria: Castelo de S.Jorge/PIC). Em http://jornal.publi-co.pt, pode ler-se um texto de02/06/2004 sobre as recentes pro-postas de Pedro Santana Lopes paraa constituição de duas sociedades dereabilitação urbana (SRU) para aszonas da Baixa Pombalina e de Be-lém e Ajuda. Pela militância cívica em prol da re-abilitação urbana, destaco aindadois sites que me pareceram interes-santes. Em http://baixapombali-na.no.sapo.pt encontra-se um es-paço individual da proprietária deum pequeno apartamento na Baixa,cuja secção “Notícias” possui umavasta selecção de artigos de impren-sa sobre a Baixa Pombalina desde1999. Na secção “Estudos” encon-tra-se à consulta uma completa listade textos técnicos de referência (vul-nerabilidade sísmica, fluxos pedo-nais, águas pluviais, ordenamentodo território ou planeamento) de as-sinalar com satisfação. A secção“Links” aponta vários blogs (caso dowww.baixapombal ina .blogs-pot.com) e de sites relacionados como tema, alguns já aqui referidos em

artigos anteriores. Para terminar, asecção “UNESCO” disponibiliza in-formação sobre os critérios e o pro-cesso de candidatura a PatrimónioMundial. Ignoro quem é a misterio-sa AnabelaR que consta do e-mail decontacto na secção “Então diga lá”(a fazer lembrar uma recente cam-panha Europeia), mas está de para-béns pelo esforço e qualidade da in-formação reunida.No campo associativo, em http://oprurb.org encontra-se o site da Ofí-cios do Património e ReabilitaçãoUrbana (OPRURB), com corpossociais e estatutos devidamenteidentificados, apresenta-se comoum espaço de promoção e discussãoda cidade histórica. Destaque paraa promoção de visitas, seminários epublicações, em particular o semi-nário “Construções antigas: que fu-turo?”, agendada para o segundotrimestre de 2004, com a presença deJosé Maria Ballester, Françoise Choaye Filipe Mário Lopes, bem como umaassinalável recolha de sites de asso-ciações congéneres e instituições dereferência nacionais e estrangeiras.Para terminar, em particular paraaqueles que pensam enveredar poresta área profissional, aconselho avisita ao site http://mestrado-reabi-litacao.fa.utl.pt do Mestrado em Re-abilitação da Arquitectura e Núcle-os Urbanos, da Faculdade de Arqui-tectura de Lisboa.

JOSÉ MARIA LOBO DE CARVALHO,Arquitecto, Mestre em Conservação do Património (York). Actualmente, desenvolve o Doutoramento no IST,enquanto bolseiro da FCT

Reabilitação urbana na Internet

55 e-pedra 2/4/07 5:36 PM Page 55

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56

CONSULTÓRIO GECoRPA

As injecções de cimento têm sido utilizadas,com grande frequência, na consolidação deestruturas de alvenaria de pedra, em parti-cular, de paredes. Este tipo de solução tem,no entanto, vários inconvenientes, que têmvindo a torná-la menos popular. Desde logo,a selecção do material de injecção. O cimen-

to portland corrente não é, de todo, um material aconse-lhável. Quimicamente é muito diferente dos materiaistradicionais em presença e a cal livre que dele faz parte,bem como os sais que ele contém, pode ser arrastada pa-ra a superfície dando origem a incrustações ou eflores-cências que têm um péssimo efeito estético. Por isso,quando esta solução é adoptada, a preferência hoje vaipara misturas com baixa percentagem de cimento e, ain-da assim, usando cimentos de baixo teor salino.Mas os inconvenientes desta solução não ficam por aqui:há outros relacionados com o processo de execução e comos próprios resultados obtidos. Quanto ao primeiro, temsido recomendada, mesmo por tratadistas conceituados,a prévia saturação com água do interior da parede a con-solidar. Tal prática traduz-se na presença de elevadosteores de humidade difícil de eliminar, que pode dar ori-gem aos problemas a ela associados, como manchas, fun-gos, etc., além dos efeitos negativos sobre a salubridade,a habitabilidade e o conforto higrométrico dos espaçosinteriores. Quanto aos segundos é, desde logo, bastantedifícil controlar a eficácia das injecções, dado que não háensaios de controlo de qualidade que realmente garan-tam que os efeitos pretendidos são atingidos. Por outrolado, tem-se constatado que as heterogeneidades criadaspodem dar lugar a zonas muito rígidas na construção tra-tada, que levam a uma distribuição de esforços alterada,com concentrações inesperadas nos locais rigidificados.

Nestas condições, as zonas reforçadas podem ser maisafectadas, por exemplo, perante a eventualidade de umsismo.Finalmente, em termos da boa prática da conservação, háque atender ao carácter irreversível deste tipo de solu-ção. Depois de se injectar o que quer que seja numa es-trutura de alvenaria, é impossível retirá-lo. Do ponto devista da conservação de imóveiscom valor histórico, is-to não é desejável, sen-do preferível escolhersoluções que pos-sam ser removi-das, caso fun-cionem malou devamser substituídas, ama-nhã, por outras melho-res. Quais? Porexemplo, o con-finamento daalvenaria,através deelementos colocadostransversalmente, quepermitam uma boa liga-ção entre os dois para-mentos; Aredução das cargas actuantes sobre os elementosestruturais em causa, substituindo os materiais pesados empartes da construção por eles suportadas por outros maisleves (por exemplo, substituir betão armado por madeira);A redução dos impulsos actuantes sobre os elementos emcausa através da colocação de tirantes que os equilibrem.

V. Cóias e Silva

O GECoRPAconstituiu um grupo técnico de apoio para tentar responder a questões práticas que surjamdurante as diferentes fases do trabalho de conservação do património e da reabilitação do edificado.

Este grupo de apoio é constituído pelos Engenheiros Carlos Mesquita, da OZ, Ld.ª (área de diagnóstico), Vítor Cóias e Silva, doGECoRPA (área estrutural), Paulo Ludgero Castro, da A. Ludgero Castro, Ld.ª (área de gessos e estuques ornamentais) e MariaAmélia Dionísio, do Instituto Superior Técnico (IST), para questões relacionadas com a pedra. Estes especialistas responderão àsquestões que os nossos leitores encontrem nas diversas fases de um trabalho de conservação e reabilitação do património arqui-tectónico e das construções antigas, dando o seu parecer e concorrendo, assim, para a boa prática da actividade. Para outras ques-tões que não estejam directamente relacionadas com estas áreas, o GECoRPA encarregar-se-á, dentro do possível, de procurar oespecialista indicado para responder aos nossos leitores.

Envie as suas questões para: Consultório GECoRPARua Pedro Nunes, n.º 27, 1.º Esq.º • 1050-170 Lisboa • [email protected] • Fax: 213 157 996

Nota: As respostas serão enviadas directamente via e-mail, e também posteriormente publicadas na Pedra & Cal e no site.

Pedra & Cal n.º 22 Abril . Maio . Junho 2003

“As injecções de cimento para consolidaçãode alvenaria de pedra são uma boa solução?”

Corte transversal de uma parede de alvena-ria de pedra de uma construção antiga,mostrando a disposição habitual dos tubosde injecção

56 Consultório 8/31/04 7:34 PM Page 56

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

ASSOCIADOS GECoRPA

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A. da Costa Lima, Fernando Ho,Francisco Lobo e Pedro Araújo - Arquitectos Associados, Ld.ªProjectos de Conservação e Restaurodo Património Arquitectónico.Projectos de Reabilitação, Recuperaçãoe Renovação de Construções Antigas.Estudos Especiais

DESARCON – Execução de Projectos e Promoção Imobiliária, Ld.ªProjectos de Conservação e Restaurodo Património Arquitectónico.Projectos de Reabilitação,Recuperação e Renovação deConstruções Antigas. Fornecedoresde Levantamentos, Inspecções eEnsaios em P.A. e C.A.

ETECLDA - Escritório Técnico deEngenharia Civil, Ld.ªFiscalização de obras e projectos.Gestão e coordenação deempreendimentos.

MC Arquitectos, Ld.ªProjectos de arquitectura.Levantamentos, estudos ediagnóstico.

Consulmar Açores - Projectistas eConsultores, Ld.ªProjecto, consultoria e fiscalização.

LEB – Consultoria em Betões e Estruturas, Ld.ªProjecto, consultoria e fiscalização naárea da reabilitação do patrimónioconstruído.

PENGEST – Planeamento,Engenharia e Gestão, S. A.Projectos de conservação e restaurodo património arquitectónico.Projectos de reabilitação,recuperação e renovação deconstruções antigas. Gestão,Consultadoria e Fiscalização.

OZ - Diagnóstico, Levantamento e Controlo de Qualidade de Estruturas e Fundações, Ld.ªLevantamentos. Inspecções e ensaiosnão destrutivos. Estudo e diagnóstico.

ERA - Arqueologia - Conservação e Gestão do Património, S. A. Conservação e restauro de estruturasarqueológicas e do patrimónioarquitectónico. Inspecções e ensaios.Levantamentos.

Brera - Sociedade de Construções e Representações, Ld.ªConstrução, conservaçãoreabilitação de edifícios.

A. Ludgero Castro, Ld.ªConsolidação estrutural. Construçãoe reabilitação de edifícios.Conservação e restauro de bensartísticos e artes decorativas:estuques, talha, azulejaria,douramentos e policromias murais.

Alfredo & Carvalhido, Ld.ªConservação e restauro dopatrimónio arquitectónico.Conservação e reabilitação deconstruções antigas.

Alvenobra - Sociedade deConstruções, Ld.ªReabilitação, recuperação erenovação de construções antigas.

AMADOR, Ld.ªConservação , restauro e reabilitaçãodo património construído einstalações especiais.

Antero Santos & Santos, Ld.ªConservação e restauro do PA.Reabilitação, recuperação erenovação de CA. Instalaçõesespeciais em PAe CA.

Augusto de Oliveira Ferreira & Cª., Ld.ªConservação reabilitação deedifícios. Cantarias e alvenarias.Pinturas. Carpintarias.

GRUPO IProjecto,

fiscalização e consultoria

GRUPO IILevantamentos,

inspecções e ensaios

GRUPO IIIExecução

dos trabalhosEmpreiteiros

e Subempreiteiros

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ASSOCIADOS GECoRPA

Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 200458

Pintanova - Pinturas na Contrução Civil, Ld.ªConservação e restauro de rebocos,estuques e cantarias. Pinturas.

Somafre - Construções, Ld.ªConstrução, conservação ereabilitação de edifícios. Serralharias.Carpintarias. Pinturas.

Cruzeta – Escultura e Cantarias,Restauro, Ld.ªConservação e reabilitação deconstruções antigas. Limpeza erestauro de cantarias, alvenarias eestruturas.

COPC - Construção Civil, Ld.ªConstrução de edifícios.Conservação e reabilitação deconstruções antigas. Recuperação econsolidação estrutural.

Sociedade de Construções José Moreira, Ld.ªExecução de trabalhosespecializados na área do patrimónioconstruído e instalações especiais.

GALERIA N.E.T., Ld.ª Conservação e restauro de douradosem obras de arte, mobiliário antigo,molduras, etc.

MELIOBRA - Construção Civil e Obras Públicas, Ld.ª Construção, conservação ereabilitação de edifícios.

GECOLIX – Gabinete de Estudos e Construções, Ld.ªConservação e restauro dopatrimónio arquitectónico.reabilitação, recuperação erenovação de construções antigas.Instalações especiais em patrimónioarquitectónico e construções antigas.

Construções Borges & Cantante, Ld.ªConstrução de edifícios.Conservação e reabilitação deconstruções antigas.

Na Esteira, Sociedade deurbanização e Construções, Ld.ªConservação e restauro do PA.Reabilitação, recuperação erenovação de CA. Instalaçõesespeciais em PAe CA.

Sofranda – Empresa de Construção Civil, S. A.Conservação e restauro do PA.Reabilitação, recuperação erenovação de CA. Instalaçõesespeciais em PAe CA.

CVF - Construtora de Vila Franca, Ld.ªConservação de rebocos e estuques.Consolidação estrutural.Carpintarias. Reparação decoberturas.

Listorres - Sociedade de ConstruçãoCivil e Comércio, Ld.ªConstrução e reabilitação deedifícios.

L.N. Ribeiro Construções, Ld.ªConstrução e reabilitação deedifícios. Consolidação defundações.

Lourenço, Simões & Reis, Ld.ªConsolidação estrutural.

MIU - Gabinete Técnico de Engenharia, Ld.ªConstrução, conservação ereabilitação de edifícios.Conservação e reabilitação depatrimónio arquitectónico.Conservação de rebocos e estuques epinturas.

Monumenta - Conservação e Restauro do PatrimónioArquitectónico, Ld.ªConservação e reabilitação deedifícios. Consolidação estrutural.Conservação de cantarias ealvenarias.

Poliobra - Construções Civis, Ldª.Construção e reabilitação deedifícios. Serralharias e pinturas.

Quinagre - Estudos e Construções, S. A.Construção de edifícios.Reabilitação. Consolidaçãoestrutural.

STAP - Reparação, Consolidação e Modificação de Estruturas, S. A.Reabilitação de estruturas de betão.Consolidação de fundações.Consolidação estrutural.

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ASSOCIADOS GECoRPA

Tecnocrete – Materiais e Tecnologias de ReabilitaçãoEstrutural, Ld.ªProdução e comercialização demateriais para construção.

Tintas Robbialac, S. A.Produção e comercialização deprodutos de base inorgânica paraaplicações não estruturais.

Tecnasol FGE – Fundações e Geotecnia, S. A.Fundações e Geotecnia. Conservaçãoe restauro do patrimónioarquitectónico. Conservação ereabilitação de construções antigas.

BLEU LINE - Conservação eRestauro de Obras de Arte, Ld.ªMateriais para intervenções deconservação e restauro emconstruções antigas. Conservação de cantarias.

GRUPO IVFabrico e/oudistribuição de produtos e materiais

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Pedra & Cal n.º 23 Julho . Agosto . Setembro 2004

Depois de, ao longo das últimas déca-das, se ter expandido desenfreadamen-te o parque habitacional com novasconstruções, eis que se tomou cons-ciência dos gravíssimos prejuízos re-sultantes desta orientação e se opta,tanto a nível de Governo como dos res-ponsáveis dos principais centros urba-nos, por políticas públicas, procurandoinverter a situação.Ao nível das cidades e de extensas áre-as suburbanas e periurbanas, tal si-tuação, que se foi paulatinamente agra-vando, quase se diria de catástrofe. Noentanto, o tema da reabilitação urbanae do parque habitacional degradadoconta já algumas décadas entre nós.Basta lembrar os exemplos pioneirosda Ribeira e Barredo, no Porto, o caso,justamente apontado como de sucesso,em Guimarães e o arranque dos cha-mados bairros históricos, em Lisboa. Oproblema é que se confinaram estasacções demasiado tempo aos chama-dos “centros históricos”, abandonandoos cascos urbanos e os territórios envol-ventes à sorte de um mercado quase emroda livre – mau grado a abundâncialegislativa e regulamentar expressa eminstrumentos de planeamento avulsos,carentes duma estratégia integrada deorganização do território. Valeram ain-da de alguma coisa as restrições impos-tas pela REN e pela RAN, mas deixou--se que as cidades se fossem esvazian-do e degradando e não se cuidou de “fa-zer cidade” nas expansões que foramcrescendo na respectiva órbita, e queconstituem quase sempre imensos ter-ritórios urbanos desorganizados.Verifica-se assim um enorme desafio aque há que dar resposta, em duas di-recções: a regeneração das cidades tra-dicionais e a reurbanização dos tecidosdas periferias e da chamada cidade di-

fusa. Mas nesta tarefa, que levará déca-das a cumprir, uma prioridade seimpõe: a reabilitação e repovoamentodos centros urbanos, com a consequen-te contenção das expansões periféricas.Foi uma tomada de consciência colecti-va acerca desta questão que dominouas campanhas para as últimas eleiçõesautárquicas, sobretudo nas principaiscidades do País – Lisboa, Porto e Coim-bra. Tomada de consciência que exigepolíticas públicas rápidas, continuadase integradas.

É à importância e urgência desta tarefaque a recente legislação promulgadapelo G overno procura corresponder,nomeadamente com a criação das So-ciedades de Reabilitação Urbana. Es-tranha-se, no entanto, a ausência demedidas de carácter mais geral aplicá-veis ao conjunto dos tecidos urbanos,excedendo os perímetros limitados dasS.R.U. Está neste caso, por exemplo, ataxação progressiva das dezenas demilhares de fogos devolutos existentesem Lisboa e no Porto.A experiência da reabilitação dos cha-mados bairros históricos de Lisboa, ini-ciada há perto de duas décadas, deveser avaliada tendo em conta o caráctertransversal e integrado do objectivoque agora se propõe. Bem como as ou-

tras duas atrás apontadas: Porto e Gui-marães – todas elas com característicase contextos muito diferenciados. E per-cebe-se que a nova legislação as tomouem conta, ao agilizar e simplificar pro-cessos, ao criar novas figuras de inter-venção e ao alargar o leque dos finan-ciamentos.Neste propósito de alargar o processode reabilitação, a experiência dos casoscitados no que respeita aos aspectosconstrutivos deverá também ser tidaem conta, mas agora numa dupla pers-

pectiva: por um lado, respeitar a ideiade que não são apenas os chamadosbairros históricos que devem ter direitoà preservação da sua imagem; por ou-tro, admitir a utilização de tecnologiase expressões contemporâneas, desdeque integradas com acerto. Isto, porquedeve ser preservada a identidade de ca-da época, mesmo das mais recentes,utilizando ao mesmo tempo os mate-riais e técnicas mais adequados, pondode lado efeitos miméticos que atentemcontra a autenticidade que toda a boaarquitectura requer.

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PERSPECTIVAS

NUNO TEOTÓNIO PEREIRA,Arquitecto

Reabilitação urbana:

para além dos bairros históricos

60 Perspectivas 8/31/04 7:35 PM Page 52

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