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Lino Geraldo Resende

Mídia, Ditadura e Contra-HegemoniaA ação do jornal Posição no Espírito Santo

Vila Velha, ES2014

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RevisãoSolange Antunes

Projeto GráficoLGResendeComum Editora

CapaLGResendeComum Editora

Edição:

Rua Luzia Grinalda, 550, Sala 204, Centro, Vila Velha, ES - Tel: (027) 3063-7025www.comum.net.br

MÍDIA, DITADURA E CONTRA HEGEMONIAA ação do jornal Posição no Espírito Santo

Copyright © 2014 Lino Geraldo Resende

TODOS OS DIREITOS RESERVADOSProibida a reprodução total ou parcial da obra sem que haja prévia autorização do dententor dos Direitos Autorais

COMUM EDITORA

ISBN 978-85-67775-05-0

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À minha família – Solange, Fernanda e Fábio – pelosuporte e pela compreensão, essenciais em todas ashoras.

Em memória de Jackson Lima, muito mais do queamigo, quase um pai, que me colocou na trilha dojornalismo e foi meu grande professor.

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AGRADECIMENTOS

À Profa. Dra. Márcia Barros Ferreira Rodrigues pela orienta-ção segura, que me facilitou a tomada de decisões e a escolhade caminhos. E pela amizade e suporte oferecido durante odesenvolvimento do Mestrado e desta pesquisa.

Ao Prof. Dr. Carlos Vinícius Costa de Mendonça que, comatenção e cuidado, me colocou no trilho e ajudou nos primei-ros passos deste Mestrado.

Ao Prof. Dr. Gilvan Ventura da Silva pelas pertinentes obser-vações sobre o conteúdo inicial deste trabalho, dando umaimportante contribuição ao seu aperfeiçoamento.

À Profa. Tânia Mara Ferreira, do Departamento de Comunica-ção da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) por terdisponibilizado sua preciosa – e quase única – coleção do jor-nal Posição, tornando possível este trabalho.

Aos professores do Mestrado em História Social das RelaçõesPolíticas pelo debate instigante proporcionado em conversaspessoais, encontros e seminários, o que ajudou, no final, naformatação desta pesquisa.

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SUMÁRIO

Apresentação

Uma combinação perfeita ............................................... 10

Introdução

Um pequeno reflexo do real ........................................... 17

Capítulo I

Hegemonia e intelectuais orgânicos ............................. 31

Estrutura da pesquisa ........................................ 48

Capítulo II

A realidade em um pedaço de espelho ......................... 53

Um clima difícil .................................................. 57

Um clima de esperança ...................................... 59

A questão da censura ......................................... 64

A situação no Espírito Santo............................ 70

O nascimento de Posição .................................. 72

Jornal e história ................................................... 73

Capítulo III

Posição e a contra-hegemonia ....................................... 83

Hegemonia, propaganda e distensão ............... 87

Uma questão recorrente .................................... 96

Contra-hegemonia e Posição ......................... 102

Capítulo IV

Intelectuais orgânicos e contra-hegemonia .............. 121

Considerações finais

Contra-hegemonia no Espírito Santo ........................ 139

Bibliografia ............................................................................ 147

Apêndice A

As capas do Posição ..................................................... 161

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“ C o m o é r e c orr e nt e e ntr e h istori a d or e s, c h e g u e i a o m e u

p ro b l e m a a tr a v é s d e u m a m e s c l a d e e xp e ri ê n c i a s p ro fissio-

n a is, int e l e c tu a is e p o líti c a s” .

C a rl E. Sc h orsk e

m 1964 quando os militares derrubaram um Governo civil legí-timo e instalaram no Brasil uma das mais obscuras ditaduras, euestava com 14 anos, morando em Alegre, um município do in-terior do Espírito Santo. A chamada revolução – como os mili-tares passaram, então, a denominar o golpe dado – não me afe-

tou em absolutamente nada. A minha rotina, de meus amigos e de minhafamília continuou a mesma. Eu e meus amigos, estudando. Minha família,trabalhando, cuidando da pequena propriedade que meu pai havia herdadoe que foi responsável pelo sustento da família e me permitiu seguir umcaminho diferente dos meus parentes, que foi sair do meio rural e ir para acidade estudar, o que contou com o apoio da minha mãe e a má vontadedo meu pai, que achava desnecessário ter uma grande instrução, comochamava o ensino formal.

O estudo fez diferença e me deu uma nova perspectiva. Minha cidade– e meu universo – ficou pequena. O universo rural e conservador torna-ra-se estreito e, contra a vontade de minha família, mais forte do lado deminha mãe, decidi fazer o caminho da capital. O objetivo era trabalhar,me sustentar e, com isso, ter possibilidade de continuar estudando, fazerum curso universitário e, usando o aprendizado, conseguir um bom empre-go, que deixasse minha família orgulhosa de mim.

Três meses depois de chegar a Vitória tinha um bom emprego e podiapensar em voltar a estudar. Por influência de amigos, que viam a possibili-dade de fazer carreira na empresa onde estava, escolhi fazer um curso téc-nico de administração, em nível de segundo grau. Nele, conheci gente

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nova, fiz amigos e arranjei uma namorada com quem me casei depois. Foidurante o curso, também, que minha vida começou a mudar. No segundoano, após perder o excelente emprego, decidi tentar um novo: ser repórterde jornal.

Em 1971, sete anos após o golpe e no auge da ditadura e da repressão,comandada pelo general Emílio Garrastazu Médici, o jornal A Gazeta, deVitória, no Espírito Santo, fez um concurso para escolher novos repórte-res. Eu fui um dos que se inscreveu, prestou as provas, passou e foi apro-veitado. Primeiro, como estagiário, para saberem se tinha ou não tendênciapara a coisa. Tinha. E tanto é assim que, 15 dias após ter iniciado o está-gio, estava contratado como repórter de Geral, área encarregada do notici-ário da cidade, abrangendo, no caso, não só Vitória, mas Vila Velha, Serrae Cariacica – depois, denominada Grande Vitória.

Foi um caso de amor à primeira vista. Entrando no mundo dos jornalis-tas, eu me identifiquei. Ali estavam pessoas que aprendi a admirar, criati-vos, com grande capacidade de argumentação e com trânsito no poder. Umdeles, Jackson Lima, acabou por se transformar em meu tutor e ensinou aorapaz interiorano o que era ser jornalista, os cuidados que precisava tomarna apuração da notícia e como escrever melhor, de forma a narrar os fatoscom precisão e transformá-los em boa informação.

Foi Jackson Lima quem, de forma indireta, me transformou em intelec-tual, mostrando a importância da leitura, de bons livros e do cuidado como texto, que além de correto, deveria ter estilo, ser de fácil leitura e semadjetivação. Foram as leituras e a convivência em um meio efervescenteque começaram a desconstruir uma personalidade formada através de umarígida formação católica, dando-me uma nova visão de mundo.

Foi Jackson, também, que me impôs o primeiro grande desafio, o de serrepórter de Política, o que na época era o crème de la crème dentro do jorna-lismo, no Espírito Santo e fora dele. Aceitei e venci o desafio. Algum tem-po depois, deixaria de ser repórter para me transformar no Editor de Políti-ca de A Gazeta. Estava com 24 anos, tinha dois como jornalista e acabarade me casar. Foi o início de um longo caminho e de um longo aprendizado.

Editando política vivi a fase mais negra do regime militar, convivi coma censura, noticiei prisões e, como uma boa parcela dos brasileiros, sentimedo, o medo criado pela ditadura, que tudo podia e não devia explica-ções a ninguém. Como editor vi, também, nascer o jornal Posição. Algunsdos seus fundadores trabalharam ao meu lado, e vi no novo jornal, em umaépoca onde a chamada imprensa alternativa florescia, uma oportunidadede dar divulgação ao que, em A Gazeta, pelo seu alinhamento com o regi-

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me e pela censura acatada pelo jornal, não podia divulgar.Com o início de uma abertura lenta e gradual, culminando na volta das

eleições diretas para Governador, o jornalismo feito no Brasil e no EspíritoSanto começou a mudar. Também foi assim comigo. Primeiro, deixei A Ga-zeta e fui para A Tribuna, onde fiquei pouco tempo. Voltei, então, à A Ga-zeta como repórter e, mais rápido que na primeira vez, retornei ao cargo deEditor, agora de Economia, onde fiquei pouco tempo, e voltei à Política.Alguns anos depois, dela, fui para Internacional, um trabalho ampliado,mais tarde, com uma página chamada Brasil. Esse, na verdade, foi um per-curso de anos.

Ao longo desse percurso achei tempo para fazer três cursos universitári-os. O primeiro, de Português, já que a Universidade Federal do EspíritoSanto (UFES) não tinha curso de Jornalismo. O segundo, de Jornalismo,que foi implantado quando estava concluindo o primeiro. Fui da primeiraturma, junto com vários outros colegas de redação. Alguns anos mais tar-de, em busca de reciclagem, voltei à Universidade para fazer Direito. Masao longo de todo o tempo minha atividade dominante foi o jornalismo.

Em 1998, meu casamento com o jornalismo diário acabou. Em umareformulação de A Gazeta, acabei saindo, demitido. Iniciava, então, umcaminho novo, paralelo ao jornalismo, mas fora de uma redação. Com amudança, houve a retomada de um projeto que foi abandonado em favorde carreira e profissão, a de estudar – ou de voltar a estudar. Dei o primei-ro passo, fazendo uma especialização, que serviu como esquentamento deturbinas para um projeto maior, de um Mestrado e, depois, de um Douto-rado.

Em 2004, 40 anos após o golpe militar de 1964, eu estava iniciando omestrado em História Social das Relações Políticas. No ano anterior, du-rante a preparação para a seleção, não tive dúvidas em relação ao que que-ria abordar na minha pesquisa. Ela envolveria, de um lado, o regime auto-ritário, já que a maior parte de minha vida, pessoal e profissional, se pas-sou sob ele. E, por fim, seria centrada no jornalismo e no papel que elerepresentou durante a ditadura, enfocando, neste caso, a ação desenvolvi-da no Espírito Santo, com cenário dominado por uma mídia que, desde oinício, esteve alinhada ao Governo e da qual posso falar por conhecê-lapor dentro, já que exerci cargos de chefia na Redação de A Gazeta porquase 30 anos.

O jornal Posição juntava os lados, o que o transformou, de modo natu-ral, no objeto de minha pesquisa. Ele me dará a oportunidade de refletirsobre um período importante da vida do país, do Estado e minha própria.

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Nele, se combinam jornalismo, que continua sendo a minha paixão, comhistória política, algo que sempre me fascinou. E não é só isso: a reflexãoestá me proporcionando a retomada de um projeto que ficou em segundoplano, o de voltar à academia.

Como muito bem lembra Carl Schorske na epígrafe, – embora não mepossa considerar um verdadeiro historiador - minha escolha pode ser vistasobre três ângulos diferentes. O profissional, devido ao meu envolvimentocom a imprensa, tendo nela militado longamente. O intelectual, configura-do pela retomada de um projeto que o lado profissional colocou, durantemuito tempo, de lado, e o político, já que, tanto no primeiro como no se-gundo caso, foi a política o fundamento de toda minha trajetória.

No final, não poderia haver combinação mais perfeita: juntar jornalis-mo, política e história e refletir sobre sua própria atividade, procurando-lheo sentido e vendo, em perspectiva, a trajetória do próprio país, que saiudas trevas – a ditadura, que em determinados momentos foi a mais repres-sora da história do país - para as luzes – a construção da democracia -,tudo isso sem deixar de lado alguns dos seus velhos problemas.

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“Se a p a ix ã o é im p u lsiv a , a c u ltur a é p ro d uto d e u m a c o m-p l ex a e l a b or a ç ã o ” .

A nto n io G r a msc i

história da imprensa alternativa no Espírito Santo não se resu-me ao jornal Posição. Antes dele, durante sua própria circula-ção e depois dela outros jornais alternativos circularam noEstado. Deles, no entanto, dois ganharam maior destaque:Folha Capixaba e Posição. O primeiro, como o segundo, pos-

suía um alinhamento político claro, já que era ligado ao Partido ComunistaBrasileiro. Um pouco desta história é contada no trabalho feito por alunosdo curso de Comunicação da Universidade Federal do Espírito Santo sob aorientação do professor José Antonio Martinuzzo1 , que está à frente de umprojeto de recuperação da história da imprensa capixaba. Existem, tam-bém, publicações não mapeadas como o micro-jornal Povão uma experiên-cia de jornal popular feita pelos jornalistas Jackson Lima e Dório Antunes,sem contar a iniciativa de jornais comunitários, em um dos quais partici-pou um dos fundadores de Posição, o jornalista Jô Amado.

No caso de Posição, o jornal ganhou visibilidade pelo momento em quecirculou, de grande movimentação política e social e de mobilização dediversos segmentos e forças contra a regime que comandava o Brasil. Ojornal, cujo primeiro número circulou no dia 29 de outubro de 1976, co-meçou a nascer bem antes, como frisa um dos seus fundadores, Jô Amado.“Por volta de 1975, um pequeno grupo de jornalistas – especialmente oLuzimar, o Bininho (Antonio Carlos Campos), o Ivanzinho, o Joaquim(Nunes), o Rogério Medeiros e eu – decidimos que seria oportuna a cria-ção de um jornal de resistência”2 , relata Jô. Esta informação é comple-mentada por Rogério Medeiros3 ao dizer que a idéia original do jornal foide Amado, tendo ele entrado por ser um nome conhecido, que tornariamais fácil o seu lançamento. Do grupo inicial, um único não jornalista par-

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ticipava, Walter Araújo4 , que se tornou, com a fundação do jornal, o res-ponsável pela sua administração e foi quem fez o registro da empresa noCartório de Registro Civil de Vitória (Cartório Sarlo). Posição passou afuncionar em uma sala do Edifício Glória, no centro de Vitória, de propri-edade de Araújo.

Rogério conta que, devido ao seu conhecimento e à sua experiência,ficou encarregado de viabilizar financeiramente o jornal, “uma coisa queninguém queria fazer”, já que jornalistas não gostam de ser confundidoscom publicitários, segundo relata. Foi neste sentido que fez contatos comprefeitos pertencentes ao MDB, notadamente os de Cachoeiro do Itapemi-rim, Gílson Carone, e de Vila Velha, Américo Bernardes da Silva, paraque, anunciando em Posição, lhe dessem o sustento financeiro inicial, queseria complementado pela venda dos exemplares. Definido o registro daempresa, Posição foi estruturado. Como diretores assumiram o próprio Ro-gério Medeiros e um outro conhecido jornalista capixaba, Pedro Maia.Como editor-chefe, ficou Jô Amado. A redação era formada, basicamente,por colaboradores, alguns dos quais permanentes. Na estrutura do jornalhavia, ainda, um Conselho Editorial, composto por jornalistas e outrosintelectuais. Entre a idéia inicial e a colocação do primeiro número nasruas, Amado calcula que tenha decorrido um ano.

“Será Posição um jornal diferente? Sim. Porque é um jornal de jornalis-tas. E também porque queremos que, deste jornal, o leitor faça o seu jor-nal. Participando como quiser e puder. Escrevendo crônicas, poesias oureportagens, desenhando ilustrações, criticando o nosso trabalho ou esti-mulando nossa posição”, dizia o primeiro editorial, sinalizando a linha quePosição iria tomar, de comprometimento com um caminho mais democrá-tico do que o adotado pela chamada grande imprensa. Esta democraciarefletia-se na escolha dos assuntos que o jornal abordaria, definidos emreuniões do Conselho Editorial, normalmente feita nos sábados e que, deacordo com Medeiros, “eram intermináveis”5 . Nestas reuniões, os inte-grantes do Conselho levavam sugestões e os jornalistas de Posição faziamo mesmo, inclusive com o aproveitamento de pautas dadas por quem per-tencia às redações de outros jornais. Medeiros lembra que era bastante co-mum Posição receber este tipo de sugestões, principalmente de assuntosque os outros jornais não podiam – ou não queriam – publicar.

Sobre o processo de escolha dos assuntos que o jornal abordaria, feitaem conjunto com o Conselho Editorial, Jô Amado lembra: “Fazíamos umareunião de pauta em que, fundamentalmente, eram discutidos temas rele-vantes não abordados, pouco abordados, ou mal abordados pela imprensa

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local. Além destes, sempre alguém tinha uma sugestão interessante. Haviapautas mais ou menos fixas, tais como a cobertura dos movimentos popu-lares”.

Com poucos recursos e contando com a participação financeira dosseus próprios sócios, Posição foi procurar um esquema de produção quelhe custasse o mínimo. Daí, lembra Walter Araújo, adotar um fluxo de pro-dução que passava por Belo Horizonte e Juiz de Fora. A cada quinzena,alguém saía de Vitória e fazia este percurso, retornando com o jornal pron-to. Um dos integrantes do Conselho Editorial do jornal, no início, e seueditor na fase semanal, Benedito Tadeu César6 , professor de Sociologia naUniversidade Federal do Espírito Santo (UFES), lembra que a produçãodo jornal era muito artesanal. As matérias eram escritas, levadas a BeloHorizonte para composição, voltavam a Vitória para montagem e seguiam,então, para Juiz de Fora, onde era feita a impressão.

Era com base neste esquema – produção do texto em Vitória, composi-ção em Belo Horizonte, montagem em Vitória e impressão em Juiz de Fora– que Posição começou a chegar aos seus leitores. Inicialmente, com trêsmil exemplares, que foram sendo aumentados na medida em que tudo eravendido. O esquema de distribuição, a exemplo do que ocorria na produ-ção, também era precário, feito pelos próprios jornalistas, com uma peque-na parte indo para assinantes, em 18 municípios do interior capixaba, alémda Grande Vitória, e uma outra parte para a venda em bancas, através daempresa Copollillo, responsável pela distribuição de publicações nos muni-cípios que integravam a região. A maior parte da venda, no entanto, comoafirmam Amado, Araújo, Medeiros e César, era feita pelos próprios inte-grantes do jornal que contavam, no caso da Universidade Federal do Espí-rito Santo, com a ajuda de estudantes do Diretório Central, dentre eles oestudante de economia Paulo César Hartung Gomes.

“O jornal”, afirma Rogério Medeiros, “sempre vendeu bem. A edição seesgotava poucas horas depois de chegar. Muita gente ficava esperando ojornal. Com o resultado da venda avulsa, do pequeno número de assinan-tes e da participação, pequena, da publicidade, a edição era paga e aindasobrava alguma coisa, para fazer frente às outras despesas”. Medeiros,Amado e Araújo destacam a penetração do jornal e sua boa aceitação pe-los leitores. Araújo fala em confluência, com o Posição servindo como re-ferencial para quem se colocava contra ao regime, fazendo-lhe oposição,mas não tinha no Espírito Santo uma publicação que refletisse esse pontode vista. Medeiros lembra que, embora com foco jornalístico, Posição aca-bou por dar voz à oposição, que tinha pouco acesso à imprensa local.

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Mudanças internasSe a linha editorial do jornal Posição se manteve praticamente a mesma,

desde seu lançamento até sua última edição, havendo apenas uma maiorradicalização do discurso, as mudanças internas, de cargos e comando, fo-ram variadas. A primeira ocorreu no número 10, quando Rogério Medeirose Pedro Maia deixaram a direção, assumindo o cargo de Diretor o jornalistaLuiz Rogério Fabrino. Em relação a esta mudança, Medeiros comenta quese deu devido a uma exigência de O Estado de São Paulo, de quem eracorrespondente. O jornal não aceitava que tivesse vínculo com qualqueroutra publicação. Com Medeiros, afastou-se, também, Pedro Maia. Rogé-rio, segundo seu próprio relato, continuou participando da equipe do jor-nal, se responsabilizando, sobretudo, pelas matérias políticas, principal-mente as de denúncia contra a elite local, um dos focos da publicação.

Sob a direção de Luiz Rogério foram publicadas as edições de 10 a 51.No número 48, Jô Amado deixou o cargo de Editor Chefe, assumido porLuzimar Nogueira Dias, um dos fundadores de Posição. Amado, de acordocom o relato de Tadeu César, saiu para dedicar-se, junto com outros inte-lectuais, ao lançamento de jornais envolvidos com os movimentos popula-res. Com ele saiu também, Rogério Medeiros, que foi para São Paulo assu-mir um cargo de chefia em O Estado de São Paulo. Pode-se dizer que comestas saídas encerrou-se uma primeira fase do Posição.

Além da consolidação de Posição como um jornal politicamente impor-tante, já que refletia no Espírito Santo o que poderíamos chamar de reali-dade em um pequeno pedaço de um grande espelho, serviu como suportepara a desconstrução do discurso oficial, federal e estadual, como pode servisto no fato que marcou sua primeira fase: a apreensão pela Polícia Fede-ral de todo o material destinado ao número 14. Segundo Walter Araújo, dequem o material foi confiscado por agentes da Polícia Federal, não se tra-tou de censura prévia, mas de uma ação policial voltada, inicialmente, paradeter estudantes que iam a um encontro em Minas Gerais. O material foiapreendido e depois devolvido ao Posição, que acabou por atrasar a suaedição. No lugar da edição normal, o jornal lançou uma de apenas duaspáginas, onde relata a apreensão do material e faz duras críticas ao siste-ma.

“A prática de atos agressivos, ilícitos ou de puro banditismo pelos“agentes da lei e da ordem” obedece, acreditamos, a noções clássicas dearbitrariedade policial. Basicamente, intimidar e confundir o agredido,mesmo que este se encontre em pleno uso de suas atribuições legais”, dizo editorial da edição, aproveitando-se para criticar a ação do regime e con-

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tribuindo, na opinião de seus editores, para que Posição ganhasse maiorcredibilidade junto aos seus leitores.

No que se refere à redação, a partir do número 51 o jornal experimentavárias mudanças. A primeira, com a troca do Editor Chefe, saindo LuzimarNogueira Dias e entrando em seu lugar Benedito Tadeu César. No número52, muda a direção, até então exercida por Fabrino, indo para o seu lugar ojornalista Joaquim Nery, que ficou apenas seis edições à frente do jornal.As constantes mudanças talvez se expliquem em função da situação dojornal. César, que já fazia parte de Posição, relata que o jornal acabou “lite-ralmente, em minhas mãos”. Veja o que diz: “Jô Amado e Robson (Chicó)Moreira, que eram as pessoas que, naquele momento, faziam o jornal exis-tir, convenceram-se, no final de 1978, que a opção política mais acertadanaquela conjuntura era a de se dedicar à edição de um jornal de bairro vol-tado para os moradores da periferia da Grande Vitória”.

Com base nesta posição, toda uma discussão foi feita dentro de Posição,envolvendo os jornalistas e o Conselho Editorial. César, de acordo com oseu relato, sempre foi contra a transformação do jornal em jornal de bairro,como pretendia Amado e Moreira. Assim, no início de 1979 “Jô e Robsonestiveram na minha casa em um final de semana e disseram-se que a partirde segunda-feira seguinte estariam iniciando um novo jornal de bairro eque se eu entendesse que Posição deveria continuar existindo que o assu-misse”. Foi o que ele fez, sem transferência de propriedade. Pode-se esta-belecer, a partir deste momento, a segunda fase na história de Posição,marcada por uma reorganização conduzida por César.

Edições semanaisCom novo diretor e com novo editor, Posição editou o seu número 52.

“Posição estava endividado, com tiragem em baixa (...). Em uma reuniãodos colaboradores do jornal propus realizar uma transformação radical desua estruturação: nova concepção gráfica, inovação do logotipo, nova lin-guagem, nova periodicidade”. A professora Tânia Mara Ferreira, do Cursode Comunicação da Universidade Federal do Espírito Santo, já colabora-dora do jornal, encarregou-se da mudança gráfica e César concentrou-se nagestão do jornal, incluindo a sua distribuição. Uma das medidas tomadas,dentro do espírito que sempre norteou o jornal, de discussão aberta, foiuma reunião de todos os colaboradores.

Nela, César propôs uma série de mudanças, a começar pela ampliaçãodo Conselho Editorial, que ganhou representantes de vários segmentos –MDB, OAB-ES, etc. – cuja tarefa, além de orientar a linha editorial de Po-

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sição, era conseguir recursos para a sua manutenção. Para que tudo fossefeito, a circulação do jornal foi suspensa por cerca de 60 dias, seu endereçomudado, segundo César, com o objetivo de reduzir custos e acertar suasfinanças. Com as enchentes que assolaram o Estado em 1979, o jornal vol-tou a circular, ainda quinzenal, denunciando a inércia do governo. Essaperiodicidade foi mudada logo depois, com a equipe do jornal, com oapoio do Conselho Editorial, transformando-o em semanal. A mudança foianunciada em cartazes espalhados pelos pontos onde o jornal era comerci-alizado, que diziam: Posição: a partir do dia 04 de maio toda sexta-feiranas bancas”.

O primeiro número semanal foi o 53. Nele, em um longo editorial, eraexplicada a mudança e seus objetivos:

“A conjuntura política, social e econômica mudou. O Brasil de hoje nãoé mais o Brasil de há dois anos. O “milagre” acabou. A crise do petróleo, acrise do capitalismo internacional, a crise econômica interna ao país, alia-dos às “fissuras” e “rachaduras” internas do sistema, somados às pressõespopulares, trabalham todos, rapidamente, para quebrar e arrebentar comtudo isso. Para quebrar e arrebentar com a ditadura.

(...) Assim, nós, de Posição, fiéis à nossa postura radical, lançamo-nostambém às transformações. (...) Posição mudou e continuará mudandosempre. (...) Somos radicais. Agimos, portanto, como radicais. Achamosque as mudanças, quando assumidas, devem ser assumidas em sua totali-dade e na sua devida intensidade (...)

Você tem um jornal novo. Somos agora semanal (...)Tadeu César só dirigiu a redação por dois números. Ainda no mês de maio,

quando o jornal voltou a circular como semanal, acabou deixando Posição pordiscordar da linha imprimida por Luzimar Nogueira Dias, que assumiu, nonúmero 53 o lugar de Editor Chefe, dividindo-o com Robson Silveira. Umanova mudança ocorreria no número 59, com a saída de Joaquim Nery, que dei-xou o cargo de diretor, assumindo, em seu lugar, o jornalista Robson Moreira,um dos fundadores do jornal. Neste período, ocorre uma intensa troca de lu-gares no comando do jornal, já que no número 61 Luzimar deixa seu posto eé substituído por Umberto Martins. Robson Silveira, que dividia a direçãocom Luzimar continua, e fica sozinho na última edição de Posição, a de nú-mero 65, já que a anterior fora a última em que Martins participou como edi-tor-chefe. Entre sua transformação em semanal e o fechamento Posição duroupouco mais de 10 edições. Encerrava-se, assim, a história do mais influentejornal alternativo do Espírito Santo.

Ao longo de sua trajetória, estiveram à frente do jornal Rogério Medei-ros, Pedro Maia, Luiz Rogério Fabrino, Joaquim Nery e Robson Moreira,

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como Diretores Responsáveis. Dentre os Editores Chefes, Jô Amado foi oque permaneceu mais tempo. Além dele, assumiram o cargo ao longo dacirculação do jornal, Luzimar Nogueira Dias, Benedito Tadeu César, Um-berto Martins e Robson Silveira. Deles, Luzimar e Fabrino morreram. To-dos os outros estavam em atividade no início de 2006, no jornalismo oufora dele. O professor Tadeu César, por exemplo, transferiu-se de Vitóriapara o Rio Grande do Sul. Jô Amado, estava em São Paulo à frente de umprojeto para a revitalização da cultura popular. Robson Moreira dirigia aTV Sesc. Joaquim Nery enveredou-se pela área de marketing político, comrápidas aparições no jornalismo. Umberto Martins, estava em São Paulo,fazendo assessoria para a Central Única dos Trabalhadores e vinculado aoPartido Comunista do Brasil (PCdoB). O único cuja atividade não foiidentificada é Robson Silveira, que teria se transformado em bancário. Doscolaboradores do jornal, vários deles ainda continuam atuando na área daimprensa, alguns ainda vinculados à imprensa alternativa.

Pressões e censuraResponsáveis pela criação do jornal, por sua direção inicial e pelo gera-

ção de receitas que o mantiveram na maior parte de sua vida, Rogério Me-deiros e Jô Amado acham que Posição teve um papel político importanteno Espírito Santo e citam, para comprovar este fato, o número de exem-plares vendidos a cada edição. Em alguns momentos, o jornal chegou aos10 mil exemplares, mas manteve, ao longo de sua história, uma tiragemmédia de três mil exemplares, caindo à metade na parte mais difícil de suavida, quando da saída de Amado e sua transformação em semanal, o quevoltou a elevar sua circulação. César e Medeiros acreditam que Posição eraviável e podia continuar. O primeiro, considera que havia um público inte-ressado na linha editorial que o jornal assumiu e uma prova disso é sua boavendagem. Medeiros lembra que, em vários momentos, Posição só nãovendeu mais por não ter capacidade para ampliar sua tiragem. Centradoem um discurso contra-hegemônico, de crítica à realidade local, o jornalconquistou leitores, transformando-se, como lembra Araújo, em ponto deconvergência para quem no Estado não apoiava o regime ou dele era críti-co.

Pelos relatos dos envolvidos com Posição pode-se notar que, como afir-ma Gramsci na epígrafe, havia paixão em quem se envolveu com o jornal,decorrendo, daí, a impulsividade da própria publicação. De outro lado, ain-da dentro do que Gramsci afirma, Posição como meta clara constituir umanova cultura – a democracia - e procurou desempenhar este papel, como

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assinalado no Capítulo III, através de um discurso contra-hegemônico, re-fletido em suas capas.

Se o clima era propício a uma publicação do tipo de Posição, o que le-vou ao seu fechamento? As respostas são discordantes. César, por exem-plo, acredita que foi o fator financeiro e a desorganização administrativaque tornou inviável o jornal. Enquanto à frente da empresa, quis tomar umrumo diferente, mas por divergências de postura, acabou saindo. Se o jor-nal se estruturasse, acredita que teria sobrevivido.

Este, no entanto, não é o único aspecto. César e Martins7 concordamque a abertura política representou um importante papel na inviabilizaçãode Posição. O primeiro destaca, no entanto, que se houvesse estrutura ad-ministrativa e financeira, o que não era difícil devido ao baixo custo dapublicação, ela teria sobrevivido. Esta é, também, a opinião de Medeiros,que vê na questão financeira o principal problema para o fim do jornal. Talcomo César, Medeiros acredita que havia – e ainda há – espaço para umapublicação alternativa, que explore assuntos não abordados pela mídia tra-dicional.

Combinados, a abertura política - que permitiu à mídia tradicional falarde assuntos que, antes, por imposição da censura oficial ou da autocensu-ra, não abordava – e a falta de estrutura administrativa e financeira acaba-ram por inviabilizar Posição. Ele, no entanto, não foi a única vitima da po-lítica de abertura. Outros jornais, inclusive Movimento, acabaram fenecen-do e fechando. Os vários grupos sociais e políticos que antes tinham suasvozes amplificadas pelos integrantes da imprensa alternativa acabaram porlançar seus próprios jornais, veiculando não mais um ideal único, de demo-cracia, mas a visão que dela tinham e que queriam passar à sociedade. Oque matou Posição, matou também os outros veículos da imprensa alterna-tiva, alguns com circulação nacional.

Ao se falar de Posição, ou de qualquer outro integrante da imprensa al-ternativa, uma pergunta recorrente é sobre a censura. Como foi a censuraem Posição? A pergunta é pertinente diante do quadro de censura vividopelo país e apontado no Capítulo II desta pesquisa. No caso da censuraoficial, Posição nunca foi a ela submetido é o que garante Jô Amado, noque é reforçado por Rogério Medeiros. O que houve, de acordo com Me-deiros e Amado, eram pressões, também reveladas pelos outros diretores eeditores do jornal. Medeiros e Amado foram várias vezes chamados à Polí-cia Federal para explicar determinadas matérias publicadas, principalmenteas mais contestatórias ao regime. Como não fazia autocensura, Posiçãosempre publicou o que quis. Nas idas à Policia Federal, eram sempre ques-

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tionados os objetivos por trás de uma ou de várias matérias do jornal, masnunca houve, de acordo com Medeiros e Amado, um pedido expresso paraque não se publicasse determinado assunto.

Sobre a censura, Jô Amado explica: “O jornal nunca foi censurado. Oque ocorria com certa assiduidade eram as “visitas” à Divisão de Censurada Polícia Federal, chefiada por um coronel, o “dr.” Minas Brasil. Em ge-ral, era eu que ia lá. Ele abria o jornal, apontava alguma matéria marcadapreviamente com um pilot e discutíamos a ação nefasta de elementos sub-versivos e comunistas no jornal Posição”. Amado, como Medeiros, achaque, com isso, a Polícia Federal achava que estava intimidando os inte-grantes de Posição para não fazer determinadas matérias ou abordar deter-minados assuntos. Os dois garantem que isso nunca aconteceu.

Ao lado da Polícia Federal, o jornal – e seus jornalistas – sofreram ou-tras pressões e ameaças. Um integrante da família Ceolin, de Linhares,ameaçou matar o editor Luzimar Nogueira Dias por uma matéria sobre osnegócios da família. Como lembra Umberto Martins, havia ameaças de po-líticos ligados ao partido do governo, a Arena, e de integrantes da elite ca-pixaba, dois dos principais alvos do jornal. O único caso de censura diretado jornal pode ser considerada a apreensão do número 14, antes de suacomposição. A apreensão, como lembram os integrantes do jornal, não foiuma ação específica, voltada para a censura ao jornal, mas fez parte deuma ação maior, da Polícia Federal. Depois, os originais foram liberados.

Outra ação, que Posição sempre relatou, é a de políticos alvo de críticasdo jornal, que mandavam comprar a edição, impedindo que circulasse emalguns municípios, chegando a haver a apreensão de alguns exemplares.Como a venda em bancas e no interior era pequena, este tipo de ação nãochegou, em nenhum momento, a afetar a circulação do jornal. Comparadacom a postura da grande mídia, que aceitava a censura oficial e se auto-censurava, Posição gozou de uma ampla liberdade, podendo veicular maté-rias com ácidas críticas ao governo. Esta liberdade acabou por ajudar ojornal no exercício de um papel contra-hegemônico, como relatado no Ca-pítulo III.

Os processos, alguns com o enquadramento na Lei de Segurança Naci-onal, uma outra ação muito presente em se tratando de jornais e jornalis-tas, também passaram ao largo de Posição. Nenhum dos seus jornalistas,apesar das cáusticas denúncias e críticas, chegou a ser processado. Nesteaspecto, a trajetória de Posição foi diferente de outros integrantes da im-prensa alternativa, como Opinião, o pioneiro, e Movimento. A censura, nocaso da imprensa de um modo geral, e da alternativa, em particular, era a

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regra. Posição foi uma exceção. Este fato, no entanto, não pode ser inter-pretado como despreocupação das autoridades em relação ao jornal.

A preocupação existia. Prova dela eram as “visitas” à Polícia Federal,feitas por Medeiros e Amado. Esta preocupação fica evidente diante deum fato que só se tornou público e conhecido dos que integravam o jornalapós o seu término: a presença de um agente da P2, a secção secreta daPolicia Militar do Espírito Santo, entre a equipe de Posição. O jornal sabiados vazamentos antecipados de suas matérias, desconfiava da existênciade alguém infiltrado, mas nunca conseguiu comprovar sua existência. De-pois de fechado, Luis Cláudio, que acompanhava a composição do jornalem Belo Horizonte, levando os originais e trazendo-os compostos para amontagem, admitiu que pertencia a um órgão de inteligência e que tinhasido o responsável por informar às autoridades o que o jornal iria publicarantes que circulasse. Luiz Cláudio, de acordo com César, esteve sob sus-peita, mas ela foi descartada, já que nada se conseguiu provar contra ele. Aconfissão só ocorreu depois de o jornal ter parado de circular.

Se olharmos o panorama da imprensa alternativa existente durante umaépoca no Brasil – notadamente nos anos 70 do século XX – vamos perce-ber que Posição não era diferente de outros jornais surgidos em vários Es-tados, que tinham por objetivo se contrapor ao governo e ao regime. Oque diferenciou Posição foi o seu foco em problemas estaduais, refletindosobre questões que, sem sua abordagem, passariam despercebidas. Olhan-do-se o Brasil e o que nele ocorria e fazendo uma analogia com um espe-lho, se podemos dizer que os fatos brasileiros, principalmente do ponto devista da construção hegemônica buscada pelo regime, eram refletidos nes-te espelho, em um pequeno pedaço dele – o Espírito Santo – Posição refle-tiu uma realidade diferente. E o fez exercendo um papel contra-hegemôni-co, através do engajamento de uma plêiade de intelectuais orgânicos que,agindo politicamente, se alinharam à construção de uma nova ideologia, ademocracia.

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Notas1 MARTINUZZO, José Antonio. Impressões capixabas – 165 anos de jornalismo

no Espírito Santo. Vitória, UFES-Departamento de Imprensa Oficial, 2005.2 Entrevista com Jô Amado, em 21-12-20053 Entrevista com Rogério Medeiros, em 27-12-20054 Entrevista com Walter Araújo, em 17-01-20065 Todas as citações atribuídas a Rogério Medeiros, daqui em diante, são resultantes da

entrevista que ele concedeu ao autor em 27 de dezembro de 2005. O mesmo acontece emrelação às citações atribuídas aos jornalistas Jô Amado – entrevistado em 21 de dezembro de2005 – e a Walter Araújo, cuja entrevista foi dada no dia 17 de janeiro de 2006.

6 Entrevista com Benedito Tadeu César, em 25 de janeiro de 2006. Todas as citações atri-buídas a Tadeu, a partir de agora, são desta entrevista.

7 Entrevista com Umberto Martins, em 24-01-2006

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“ C ri a r u m a n o v a c u ltur a n ã o sig n ifi c a a p e n a s f a z e r in d iv i-

d u a lm e nt e d e s c o b e rt a s “ orig in a is”; sig n ifi c a t a m b é m , e so-

b r e tu d o , d ifun d ir c riti c a m e nt e v e rd a d e s j á d e s c o b e rt a s, “so-

c i a liz á -l a s” p or a ssim d iz e r; tr a nsf orm á-l a s, p ort a nto , e m b a s e

d e a ç õ e s v it a is, e m e l e m e nto d e c o ord e n a ç ã o e ord e m int e-

l e c tu a l e m or a l”

A ntô n io G r a ms c i

e como diz Antonio Gramsci a criação de uma nova cultura de-manda descobertas, que podem ser individuais, mas que devemser trabalhadas e socializadas, o trabalho acadêmico, que pode tercunho individual, deve levar em consideração alguns aspectos,começando pela escolha de um tema, um olhar, uma abordagem,

que podem partir de uma experiência de vida. Mas exatamente por se tra-tar de um trabalho científico, esta base não é suficiente. Feita a escolha,definidos objetivos e construída uma ou mais hipóteses, é precisodemonstrá-los, comprovando as assertivas feitas e embasando as conclu-sões cientificamente, o que vai lhes dar a validade final.

Ao procurar a união de mídia e história, este trabalho tinha, em primei-ro lugar, de tornar claro seu objetivo principal, que é o de demonstrar aação contra-hegemônica exercida no Espírito Santo pelo jornal Posição.Para fazê-lo, foi levantada uma hipótese, a de que o jornal, com sua oposi-ção ao regime vigente, participou da construção de uma nova hegemonia,ajudando na desconstrução da hegemonia pretendida e difundida pelo regi-me cívico-militar e pela mídia tradicional – homogênea e sem problemas –e fez isso refletindo sobre a democracia, conflito capital versus trabalho econtexto social. Como Gramsci afirma que todo momento dedesconstrução pressupõe o início de uma nova construção, o jornal Posi-

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ção, ao adotar uma postura crítica, abriu espaços para a oposição, deu voza quem não a tinha e cavou uma brecha no muro construído pela ditadura,ampliando os debates sobre temas ausentes na grande imprensa. O jornalPosição, nesta ação contra-hegemônica aproveitou a própria brecha abertapela ditadura - de mostrar um regime “democrático”, que permitia a oposi-ção e buscava legitimidade, para realizar o seu trabalho.

Para chegar a uma conclusão que referende a hipótese acima é precisotrabalhar com objetivos claros. No caso deste trabalho, o que se busca éanalisar como se deu a construção da representação política do jornal Posi-ção, desconstruindo a realidade apresentada pelo regime, e a abertura deespaços para a discussão de idéias mestras presentes na sociedade brasilei-ra como democracia, relacionamento capital versus trabalho, contexto so-cial, meio ambiente e problemas do campo em oposição à ideologia de se-gurança nacional e ao desenvolvimentismo, decorrência desta própria ideo-logia, reproduzida pela mídia tradicional.

A análise, que deve contemplar a comprovação da hipótese levantada,tem objetivos específicos, que são:

a) Avaliar como Posição desafiou o controle do regime, apresentandoaos leitores uma realidade diferente da oficial, com os problemas trazidospelas políticas governamentais e reproduzidos pela mídia tradicional.

b) Identificar e analisar os mecanismos utilizados pelo Posição para aconstrução de uma hegemonia política diferente, abrindo espaço para odebate e para a contestação à versão da realidade oficial.

c) Compreender e avaliar a situação do jornal Posição enquanto meiode comunicação engajado e de oposição e a sua necessidade de conseguirrecursos para a própria sobrevivência, uma vez afastado do mercado tradi-cional de mídia.

Dimensionados os objetivos do trabalho e sua hipótese, antes do seudesenvolvimento é preciso eleger um referencial teórico que forneça con-ceitos que dêem suporte ao tema ou temas estudados. No caso deste traba-lho, a Matriz Teórica do Pensamento de Antonio Gramsci é sua base. Édesta matriz que surgem conceitos que aqui serão utilizados, comohegemonia – e, por conseguinte, a sua parte contrária, a contra-hegemonia-, intelectuais orgânicos, ideologia e partido ampliado.

As idéias de Gramsci, como ressalta Rodrigues, podem ser tomadascomo guia e usadas para “refletirmos sobre a sociedade atual”1 , daí reafir-mar a atualidade do pensador italiano e ressaltar a sua profunda ligaçãocom a política e com o político. Lembrando a crise de paradigmas por quepassaram as ciências sociais, Rodrigues insere o pensamento de Gramsci

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como capaz de nos “oferecer ricas contribuições a partir de sua matriz teó-rica, que permite ao historiador instrumentalizar conceitos chaves eabrangentes para a análise política dos fatos históricos das sociedades con-temporâneas, tais como ideologia, intelectual orgânico, partido ehegemonia”2 .

De todos os conceitos chaves desenvolvidos por Gramsci, sem dúvidao que se ressalta e é dado, pelos seus exegetas, como o conceito central detoda sua formulação é o de hegemonia3 . Gramsci, como nos lembra Mar-ques, não é o autor do termo, que surgiu, pela primeira vez, na literaturapolítica “em escritos de Plekhanov (1883/4), tendo sido retomado porAxerold (1889/901), Martov e Lênin (1901)”4 . Se não é o autor do termo,Gramsci deu a ele o seu sentido contemporâneo e o transformou em umacategoria, o que permite sua utilização em análises de conjuntura,notadamente sob o ângulo político, determinando a existência de um mo-mento hegemônico, mas, também, propiciando apontar-se o momento dacontra-hegemonia, pois “não pode haver destruição, negação, sem umaimplícita construção, afirmação, e não em sentido “metafísico”, mas prati-camente”5 .

Pensando sempre sob o ângulo da política, Gramsci explica como se dáa hegemonia, que ocorre quando “(...) se adquire a consciência de que ospróprios interesses corporativos, no seu desenvolvimento atual e futuro,superam o círculo corporativo, de grupo meramente econômico, e podem edevem tornar-se os interesses de outros grupos subordinados”6 , é nestemomento que se adquire a “unicidade dos fins econômicos e políticos,também a unicidade intelectual e moral”7 . É a junção destas vertentes –econômico, político, intelectual e moral – que cria “a hegemonia de umgrupo social fundamental sobre uma série de grupos subordinados”8 .

O que Gramsci destaca é que a hegemonia se baseia no consentimento,na adoção de uma ideologia transformada em senso comum e vista comovisão de mundo, espalhada de tal forma – daí a necessidade do trabalhointelectual – que se entranha na sociedade fazendo com que as várias ca-madas sociais a pensem como sendo delas, não de um grupo de poder.Pode-se, neste caso, fazer uma aproximação do pensamento de Gramscicom o conceito de imaginário social desenvolvido por Baczko9 , algo queperpassa os vários segmentos sociais transformando-se em uma crença econsolidando uma visão de mundo. Para reforçar sua posição, defendendoo entranhamento de uma ideologia transformada em senso comum e a ne-cessidade de que seja difundida, mediante um trabalho orgânico feito porintelectuais, Gramsci, na análise feita de O Príncipe, de Maquiavel, obser-

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va “ crenças populares ou as crenças do tipo das crenças populares têm avalidade das forças materiais”10 .

Hegemonia, como nos explica Portelli, une, ao mesmo tempo, direção edominação da sociedade. Ele afirma que “o aspecto essencial dahegemonia da classe dirigente reside em seu monopólio intelectual, isto é,na atração que seus próprios representantes suscitam nas demais camadasde intelectuais”11 , que é feita através da instituição de uma ideologia capazde funcionar como agregadora dos segmentos sociais que nela se reconhe-cem.

Maria-Antonietta Macciocchi, por sua vez, aduz que o “conceito dehegemonia implica não somente na direção intelectual e moral, mas tam-bém na direção política do bloco de forças aliadas”12 . Ela frisa, ainda, queo poder não se exerce somente através da hegemonia, havendo necessida-de de um aparelho estatal de coerção. A hegemonia junta, assim, a socie-dade civil com a sociedade política, combinando-se a coerção do Estado ea dominação ideológica, que é, verdadeiramente, o que dará permanênciaà hegemonia já que, para Gramsci, ela serve como cimento que junta asvárias camadas sociais.

Por envolver tantas variantes, a hegemonia, segundo Gramsci, é umaconstrução permanente. Após conquistada, ela precisa ser mantida e énesse sentido que atuam os intelectuais orgânicos. O que o teórico italianonão diz, mas pode-se inferir a partir de sua conceituação, é que se existeuma hegemonia, certamente há, em contra-partida, um trabalho contra-hegemônico, já que na própria concretização da hegemonia não há, nunca,um fechamento total, com a concordância de todos. É nesse sentido aapreciação de Christinne Buci-Glucksman ao afirmar que “quanto maisuma classe é autenticamente hegemônica, mais ela deixa às classesadversárias a possibilidade de se organizarem e de se constituírem em umaforça política autônoma”13 , em síntese, é a própria hegemonia que abre asportas para a realização de um trabalho contra-hegemônico.

Voltando a Gramsci, pode-se afirmar que “a possibilidade de se tornarclasse hegemônica encarna-se precisamente na capacidade de elaborar demodo homogêneo e sistemático uma vontade coletiva”14 . Essa vontadecoletiva é expressa pela sociedade civil, um dos componentes essenciais desua formulação, já que é ela quem leva à “hegemonia cultural e política deum grupo social sobre o conjunto da sociedade”15 . A sociedade civil, nestecontexto e como afirma Portelli, é um conceito original e, ao mesmo tem-po, um conjunto complexo, podendo ser considerada sob três aspectos:ideológico, como concepção de mundo e como direção ideológica da soci-

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edade. À sociedade civil, Gramsci contrapõe a sociedade política, que nãopode ser reduzida, na sua conceituação, ao Estado, mas que está a ele inte-grada.

“A hegemonia gramsciana é a primazia da sociedade civil sobre a socie-dade política”, afirma Portelli em Gramsci e o bloco histórico16 , desta-cando que o aspecto essencial desta hegemonia é que ela reside em seumonopólio intelectual, isto é “na atração que seus próprios representantessuscitam nas demais camadas de intelectuais”17 . Portelli ressalta:

“Em tal sistema, a classe fundamental ao nível estrutural diri-ge a sociedade pelo consenso, que ela obtém graças ao controleda sociedade civil; esse controle caracteriza-se, particularmente,pela difusão de sua concepção de mundo junto aos grupos soci-ais, tornando-se assim “senso comum”, e pela constituição de umbloco histórico homogêneo, ao qual cabe a gestão da sociedadecivil”18 .

A conquista da hegemonia, no sentido que lhe atribui Gramsci e que éreconhecida por teóricos e exegetas, demanda uma ação intelectual e é emrazão disso que o pensador italiano atribui grande significação ao trabalhointelectual e a ação do que chamou de intelectual orgânico. Este trabalho étão mais importante no momento em que se reconhece que a hegemoniajamais é total porque “a classe dirigente, mesmo em um sistemahegemônico, não dirige toda a sociedade, mas somente classes auxiliares ealiadas que lhe servem de base social e usa a força para com as classesopositoras”19 , um papel desempenhado pelo regime cívico militar que por20 anos constituiu-se no bloco histórico que governou o Brasil.

A necessidade do trabalho intelectual e sua relevância para a constru-ção da hegemonia fez com que Gramsci instituísse, nas suas reflexões,uma outra categoria, exatamente a de intelectual orgânico. A questão dosintelectuais e de serem eles importantes ou não, atuantes ou não, não éuma discussão restrita a Gramsci. Como lembra Norberto Bobbio, “ao me-nos desde A República de Platão os filósofos sempre se ocuparam e se pre-ocuparam, ainda que sob denominações diversas, com o que fazem ou de-vem fazer os filósofos, isto é, eles próprios, na sociedade, com a influênciaque têm ou deveriam ter nas relações sociais (…)”20 .

O que ocorreu com Platão se repete, depois, em Kant, da mesma formaque havia ocorrido com quem precedera Kant, como é o caso deAristóteles, perpassando séculos e desembocando na modernidade, com aacentuação da discussão sobre os intelectuais e seu papel sendomaximizado a partir do início do século XX. “O tema é antigo e perene

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porque, bem vistas as coisas, ele nada mais é do que um aspecto de umdos problemas centrais da filosofia, o da relação entre teoria e práxis”, afir-ma Bobbio.

Este assunto preocupa também Peter Burke. Ao desenvolver a históriasocial do conhecimento, ele aborda a questão, mostrando que o termo in-telectual não é novo e este tipo de trabalho existia no Ocidente e no Ori-ente. Daí entender, ao contrário de Jacques Le Goff, que o intelectual nãoteve sua existência afirmada a partir da Idade Média e da divisão do traba-lho. Burke admite que a ascensão do intelectual enquanto grupo se deu,efetivamente, a partir do final do século XIX, proporcionado por todo umdebate na França sobre a condenação do capitão Dreyfuss, mas o conceitoé anterior..

Diferentemente de Bobbio e Burke, Jacques Le Goff, um dos mais acla-mados historiadores franceses, situa a gênese dos intelectuais na Idade Mé-dia. Ao explicar o próprio termo intelectual, Le Goff afirma:

“Entre tantas palavras: eruditos, doutos, clérigos, pensadores (aterminologia do mundo do pensamento sobre foi vaga), essa desig-na um meio de contornos bem definidos: o dos mestres de escola.(…) Designa aquele cujo ofício é pensar e ensinar seu pensamento.Essa aliança da reflexão pessoal e da sua difusão num ensino ca-racterizava o intelectual”21 .

É esta caracterização de Le Goff que temos presente, marcando o tra-balho intelectual como o de alguém que pensa e que transmite, ou ensina,o que pensa. O autor reconhece, na linha de Burke e de Bobbio, que havia,antes do que estabeleceu como intelectual, o que chama de trabalho deespírito, mas insiste em que, marcadamente, o intelectual pode ser reco-nhecido pelo seu ofício, que é pensar. A caracterização do intelectual queLe Goff foi buscar na Idade Média, constituindo-o como categoria é o quevimos ainda no início do século XX quando Antonio Gramsci, após amplamilitância política, seria preso e confinado pelo regime fascista deMussolini, com o objetivo precípuo de o impedir de pensar, o que, eviden-temente, não aconteceu. Sua prisão, na verdade, acabou funcionandocomo estímulo a todo o seu pensamento e elaboração crítica, com a cria-ção de modelos de análise que são mais atuais do que nunca.

Gramsci, principalmente a partir dos escritos do cárcere, avança naquestão dos intelectuais e os pensa de uma forma diferente colocando umasérie de questões que, postas, necessitam ser respondidas. Quem são osintelectuais? Qual é o papel dos intelectuais? Existem categorias de inte-lectuais? Qual é a sua origem e formação? Ao buscar respostas para as in-

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dagações, Gramsci começou com um conceito revolucionário ao dizer,conforme lembra Carlos Nelson Coutinho, que “todos os homens são inte-lectuais”22 . O que acontece é que nem todos exercem a função de intelec-tual. É nesse sentido que o empresário pode ser chamado de intelectual, jáque se especializou em uma área e ao atuar no dia-a-dia nesta sua área deespecialização pode acabar por exercer um papel intelectual, ensinando ouprocurando até transformar a atividade que exerce.

Saímos, então, do conceito de intelectual como homem de letras e ga-nhamos, na formulação de Gramsci, o conceito de intelectual como quemage. É na ação, efetivamente, que se dá o trabalho intelectual. E é estaação que transforma o intelectual em orgânico. Ademais, os intelectuais,ao contrário do que dizem os que antecedem Gramsci, não são autônomose, tampouco, independentes dos grupos dominantes. Eles são, na verdade,“instrumentos para o exercício da hegemonia social e governo político”23 ,daí o trabalho que fazem de traduzir o consenso das massas em orientaçãosocial.

O que Gramsci fez foi ampliar a ação do intelectual, pensando-o deforma diferente e lhe dando um caráter de formulador que, antes, ninguémhavia pensado. O intelectual surgido da formulação de Gramsci é absolu-tamente original, pois não guarda nenhum traço do que, antes, se pensavadele: um homem reflexivo, que procurava, de longe, explicar o mundo, nãotransformá-lo. Estava criado o intelectual orgânico, o que age, atua, parti-cipa, ensina, organiza e conduz, enfim, se imiscui e ajuda na construção deuma nova cultura, de uma nova visão de mundo, uma nova hegemonia. Eeste intelectual nascia em contraposição àquele que está afeito apenas àformulação teórica, mas não tem qualquer aproximação com o empírico. Oque Gramsci nos ensinou é que a teoria só tem sentido quanto é testada naprática, daí, por exemplo, a sua profunda reflexão sobre o porquê do fra-casso da revolução socialista no Ocidente.

Há, ainda, por destacar nesta nova formulação o seu valor revolucioná-rio, já que Gramsci, ao afirmar que todos somos intelectuais, acaba comuma pretensa divisão do trabalho, mostrando que o intelectual é tambémum trabalhador e, como ele, está sujeito à venda da única mercadoria quepossui, que é o seu próprio trabalho de pensar e de ensinar. Ao mesmotempo em que amplia a ação do intelectual, Gramsci o recoloca junto deuma classe, ligando-o a ela e diferenciando-o apenas em função das tarefasque irá exercer. Neste sentido, o trabalho intelectual não existe por si só,mas é uma função que se exerce no dia-a-dia, na organização, na difusãode idéias e na ação.

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Olhando o intelectual dentro do conceito ampliado, Gramsci pode dizerque “cada grupo social (…) cria para si, ao mesmo tempo e de modo orgâ-nico, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e aconsciência da própria função”24 e é neste momento que Gramsci explicaque os camponeses italianos, por não possuírem seus intelectuais orgâni-cos, acabam sem uma identificação de classe e, por isso, ligada às classeshegemônicas.

Reforçando a classificação de que não existem não intelectuais,Gramsci comenta:

“Na verdade, o operário ou o proletário, por exemplo, não secaracteriza especificamente pelo trabalho manual ou instrumental,mas por este trabalho em determinadas condições e em determina-das relações sociais (…) em qualquer trabalho físico, mesmo nomais mecânico e degradado, existe um mínimo de qualificação téc-nica, isto é, um mínimo de atividade intelectual criadora”25 .

Daí Gramsci afirmar, em seguida, que todo homem é um intelectual,mas nem todos desempenham esta função na sociedade. A distinção entreum e outro é, nada mais, nada menos, que uma referência à imediata fun-ção social da categoria profissional dos intelectuais. “Em suma, todo ho-mem, fora de sua profissão desenvolve uma atividade intelectual qual-quer”, afirma, reforçando sua assertiva. A partir desta constatação, o queGramsci busca é a criação de uma “nova camada intelectual”26 , o que elechama de elaborar criticamente a atividade intelectual que existe em cadaum de nós.

Identificado que todos somos intelectuais, embora, às vezes, não exer-çamos este papel, Gramsci começa a traçar o perfil do intelectual orgânicofazendo, em primeiro lugar, a sua contraposição ao intelectual tradicional,que chama de vulgarizado, e que tem o seu protótipo no literato, no filóso-fo e no artista. Um exemplo deste tipo de intelectual é, na acepção deGramsci, o jornalista, que se julga literato, filósofo e intelectual. Mas o jor-nalista pode, também, exercer um papel orgânico ao contribuir para a mu-dança da sociedade ou, mesmo, para a manutenção da hegemonia vigente.

Diante dessas formulações podemos responder à primeira questão, di-zendo que intelectuais todos são, mas que há uma hierarquia entre eles,começando por quem é orgânico e está intimamente ligado ao trabalho deconstrução de uma nova visão de mundo, que se contrapõe ao intelectualtradicional, que é desligado de sua classe e se julga autônomo em relação àsociedade civil. Ao intelectual que se encastela, que olha o mundo decima, Gramsci propõe o intelectual que pensa e age. Mas nada melhor do

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que suas próprias palavras:“O modo de ser do novo intelectual não pode mais consistir na

eloqüência, motor exterior e momentâneo dos afetos e das paixões,mas num imiscuir-se ativamente na vida prática, como construtor,organizador, “persuasor permanente”, já que não apenas oradorpuro – e superior, todavia, ao espírito matemático abstrato; da téc-nica-trabalho, eleva-se à técnica-ciência e à concepção humanistada história, sem a qual se permanece “especialista” e não se chegaa “dirigente” (especialista mais político)”27

Como se vê, Gramsci começa a apontar para a segunda pergunta destetópico, dando início ao traçado do que deve ser o papel do intelectual. E éa partir deste ponto, e com base no estudo da situação da Itália, que avan-ça, estabelecendo uma nova tipologia para o intelectual e o papel que eledeve desempenhar na sociedade. Um dos papéis é ligar os elos da superes-trutura mediante a interpretação do senso comum e visando a transformara ideologia que perpasse a sociedade civil em ideologia hegemônica, unin-do, assim, a sociedade em torno de um objetivo político. Como toda inter-pretação de Gramsci se prende ao político, é para a política que o intelec-tual deve se voltar. E no caso do intelectual orgânico, seu principal papel éde organizador, ao que deve seguir o dirigente e o educador. As funções,aliás, se realizam juntas, dando ao intelectual um papel político qualificadoe tornando-o em vanguarda, não no sentido de ir à frente, mas de preparara sociedade, através de criação de uma nova visão de mundo, para as mu-danças necessárias no Estado e na política.

Gramsci explica:“Poder-se-ia medir a “organicidade” dos diversos estratos inte-

lectuais, sua mais ou menos estreita conexão com um grupo socialfundamental, fixando uma gradação das funções e das superestru-turas de baixo para cima (da base estrutural para cima). Por en-quanto pode-se fixar dois grandes “planos” superestruturais: o quepode ser chamado de “sociedade civil” (isto é, o conjunto de orga-nismos chamados comumente de “privados”) e da “sociedade polí-tica ou Estado”, que correspondem à função de “hegemonia” queo grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de “domí-nio direto” ou de comando, que se expressa no Estado e no gover-no “justo”28 .

Nessa nova ótica, o intelectual é o “comissário” do grupo dominante,ficando responsável, em primeiro lugar, pela criação do consenso que vaiunir a sociedade e, em segundo, pela construção do aparato de coerção

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estatal, justificando-a. O novo papel do intelectual, porisso mesmo, insere-se na ampliação do conceito proposto por Gramsci, não deixando, ainda,de considerar que há uma divisão do trabalho intelectual e, como conseqü-ência, uma gradação de qualificação, partindo, dessa divisão ehierarquização, sua analogia com a organização militar, que é piramidal,com linha de comando e divisão de tarefas.

A tarefa final do intelectual seria, mesmo, a de criação e organização deuma cultura, contribuindo para o surgimento e consolidação de uma ideo-logia, que vai, conforme afirma o próprio Gramsci, perpassar toda a socie-dade, dando-lhe solidez e fazendo com que haja, por parte do grupo decomando, hegemonia. Em relação à organização da cultura, Carlos NélsonCoutinho29 lembra que, expressamente, Gramsci não falou sobre o temaquando desenvolveu o seu conceito de intelectual e traçou para eles o pa-pel que deveria desempenhar. Considera, no entanto, que isto é evidente,uma vez que o principal objetivo de Gramsci era político e a política,como tal, faz parte da cultura, o que leva ao seu desenvolvimento para quepossa se tornar hegemônica.

Baseando-se no que disse Coutinho, pode-se avançar e ver nesta funçãodos intelectuais o papel que Gramsci para eles reserva dentro do partido,dizendo que nada é mais exato do que considerar que todos os membrosde um partido devam ser intelectuais, o que o leva a pensar no partidocomo intelectual coletivo.

Constatado, como já o fizemos, quem são os intelectuais e qual o papelque exercem na sociedade, é preciso responder se existem categorias deintelectuais. Gramsci afirma que sim e começa por dividi-las em duas. Deum lado, coloca os intelectuais tradicionais, que agem como literatos,olham a realidade de longe e não se envolvem com a mudança, embora,com suas formulações, ajudem a consolidar a ideologia dominante, crian-do, com o seu uso e a agregação do senso comum, uma visão de mundoque gera o consenso e solidifica a sociedade.

Ao intelectual tradicional, Gramsci contrapõe o orgânico, que se envol-ve, que participa, que está ligado à sua classe, a um segmento da socieda-de, que age politicamente e que, assim, ajuda na mudança, criando umanova cultura de onde vai derivar uma nova ideologia, uma nova visão demundo e, por conseguinte, um novo grupo hegemônico. A construção deGramsci, não é preciso lembrar, dizia que este novo grupo era o proletaria-do, que deveria travar uma guerra de posições com a burguesia, conseguin-do aliados e, com eles, conquistando o poder para, então, fazer-sehegemônico.

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Voltando à questão, Gramsci alinha, tomando como base o desenvolvi-mento histórico, algumas categorias de intelectuais: aristocracia togada,administradores, cientistas, teóricos, filósofos não eclesiásticos, todos elescolocados, de certa forma, como coadjuvantes da grande categoria de inte-lectuais que são os eclesiásticos, responsáveis pela visão de mundo pro-porcionada pelo cristianismo, que se espalhou para o mundo todo e deuunidade à civilização ocidental, o que Gramsci considera uma ação orgâni-ca. A estas “velhas” categorias, ele acrescenta uma nova, a do intelectualorgânico, aqui já tipificado, inclusive por suas ações.

A análise de situação feita por Gramsci é concluída quando mostracomo são formados os intelectuais e de onde eles vêm. Como parte da so-ciedade, eles podem tanto ser urbanos como rurais. Gramsci aliás observaque boa parte dos intelectuais agregados aos grupos hegemônicos são domeio rural, mas não se sentem ligados à sua classe, usando sua ação para areprodução da dominação, não para mudá-la. Os intelectuais urbanos sãomais standartizados, mais afeitos a determinados padrões, enquanto osrurais são mais tradicionais. Nisso, Gramsci vê o reflexo da própria dinâmi-ca da sociedade, com o meio rural mais conservador do que a cidade. Atipologia, no entanto, acaba por retomar, como lembra Cerqueira Filho30 , aclassificação dual que Gramsci fornece dos intelectuais, que como vimos,podem ser tradicionais ou orgânicos, distinguindo-se, um do outro, pelaação. Aliás, pode-se lembrar que Gramsci, por ser marxista, trabalha sem-pre com um processo dialético, que é dual, o que o leva a pensar em oposi-ções e em circularidades, já que, conforme frisará em outro momento, aconstrução começa, mesmo, no início da destruição.

Tanto os intelectuais tradicionais, quanto os orgânicos podem vir dosmesmos segmentos, isto é, das áreas urbana ou rural. Sua formação inicialé a escola, que Gramsci considera o instrumento para elaborar o intelectu-al de diversos níveis. A escola fornece o ferramental básico, que terá de serdesenvolvido, coisa que o próprio Gramsci fez, valendo-se de leituras eaprendendo na sua própria ação. A partir daí, o intelectual orgânico, pode-se dizer, se constrói na sua atividade, ensinando, mas aprendendo, agindo,mas observando, enfim, vivenciando uma realidade e ajudando na suatransformação, com o objetivo de se conseguir uma nova realidade.

É por isso que Gramsci, valendo-se da hierarquização entre intelectu-ais, coloca os professores e jornalistas – que havia criticado antes, dizendoserem pretensos intelectuais – em um primeiro nível de organicidade. Eisto se dá por serem, os dois, instrumentos de ensino, em primeiro lugar, ede mudança, com o ensino marcando, mais ainda, a função do professor,

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que se transforma em um formador de novos intelectuais e, com isso, podecontribuir para que os formados sejam orgânicos, não tradicionais.

Olhando-se a questão sob a ótica da interpretação dada por Coutinho,podemos pegar as perguntas iniciais e respondê-las, definindo o intelectualsob uma forma geral e uma particular. Na primeira, ele é resultado de rela-ções entre classes. Na segunda, de relações sociais de produção31 , podendoser ligados às suas classes de origem ou aderirem a uma outra classe,autônomo na sua ação, mas vinculado às suas funções e às contradiçõesconcretas da sociedade. Não se pode comparar a autonomia antevista porGramsci à autonomia dos intelectuais tradicionais, que não estavam liga-dos por origem ou por adesão a uma classe. Eles se consideravam acimade classes e não tinham um sentido de pertencimento, a não ser em relaçãoao grupo hegemônico, para quem exerciam o seu papel, consolidando,como já dito, a sua ideologia. Gramsci cita Benedeto Croce como umexemplo perfeito deste tipo de intelectual.

A posição de Gramsci fica cristalina se olhada a análise feita por JoséLuís Bendicho Beired:

“Pode-se concluir então que: a) a atividade intelectual deve seranalisada no conjunto das classes sociais em que ela é desenvolvi-da; b) o intelectual é um agente socialmente determinado; e c) osintelectuais distinguem-se por desempenharem certas funções quernos processos de reprodução quer nos de transformação da ordemsocial”32 .

E é o próprio Beired quem afirma que a análise de Gramsci se centra nademonstração do papel – conservador ou transformador – do intelectualcomo figura “que organiza a cultura e os homens; que articula o centro doaparelho estatal do poder com o restante do corpo social; e que ao produ-zir ideologias fornece consciência e homogeneidade às classes que repre-senta”33 .

O que Gramsci propõe, no final, é uma mudança no intelectual, quedeixa de ser tradicional para se transformar em orgânico. Nele, como nopróprio Gramsci, não há lugar para o pessimismo, para o desânimo. Estenovo intelectual se distingue pela especialização técnica, pelo trabalhocoletivo, por uma disciplina no trabalho. São eles os responsáveis pelonexo teoria-prática, pelo encontro entre elites e povo ou, dizendo em ou-tras palavras, pela criação da vontade nacional-popular34 . São eles, no fi-nal, os construtores de uma nova hegemonia, pela consolidação de umaideologia, pela sua transformação em senso comum e pela disseminação deuma nova visão de mundo que abranja toda a sociedade.

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Nada melhor do que deixar o próprio Gramsci falar: “Poder-se-ia medir a “organicidade” dos diversos estratos inte-

lectuais, sua mais ou menos estreita conexão com um grupo socialfundamental, fixando uma gradação das funções e das superestru-turas de baixo para cima (da base estrutural para cima). Por en-quanto pode-se fixar dois grandes “planos” superestruturais: o quepode ser chamado de “sociedade civil” (isto é, o conjunto de orga-nismos chamados comumente de “privados”) e da “sociedade polí-tica ou Estado”, que correspondem à função de “hegemonia” queo grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de “domí-nio direto” ou de comando, que se expressa no Estado e no gover-no “justo”35 .

Se hegemonia e intelectual orgânico são, nesta pesquisa, conceitos cen-trais, ela trabalha, ainda com outro conceito gramsciano, que é o de parti-do ampliado, o que nos leva a um outro conceito básico para este trabalhoque é a Teoria Ampliada dos Partidos, também de Gramsci.

O partido político é considerado por Gramsci como o novo Príncipe,em uma referência a Maquiavel, de quem foi leitor e a quem admirava pelorealismo político. O conceito de partido que usa, no entanto, tal como fezcom o conceito de Estado, é mais ampliada. Gramsci, ao discorrer sobre aquestão e sobre a necessidade de estudá-la recomenda uma atenção maiorao tema “se se parte do ponto de vista de que um jornal (ou um grupo dejornais), uma revista (ou um grupo de revistas) são também “partidos” ou“frações de partidos”36 . O jornal, neste caso, atuaria como partido aoengajar-se, seja para manter a hegemonia conquistada, seja para construiruma nova hegemonia.

Ao ampliar o partido, incluindo o jornal, Gramsci dá o exemplo do Ti-mes, da Inglaterra, e do Corriere della Sera, na Itália, que têm uma funçãosupostamente apolítica, mas que, na verdade, têm ação política e de pro-paganda. “É certo que em tais partidos as funções culturais predominam,dando lugar a uma linguagem política de jargões: isto é, as questões políti-cas revestem-se de formas culturais”37 , afirma Gramsci ao comentar aação dos partidos e dos jornais e revistas, como partidos ampliados. Nestecontexto, forma-se um partido constituído de uma elite de homens da cul-tura que têm a função de dirigir “do ponto de vista da cultura, a ideologiageral, um grande movimento de partidos afins (na realidade, frações de ummesmo partido orgânico”)38 . Volta-se, assim, à questão do intelectual e desua importância para a construção da hegemonia, o que pode – e deve –ser feito mediante o uso da mídia, reconhecida por Gramsci como um par-

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tido ampliado, já que defende ou a hegemonia existente ou a construçãode uma nova hegemonia.

Hegemonia, intelectual orgânico e partido ampliado convivem, na Ma-triz Teórica de Antônio Gramsci, com outro conceito que lhe é essencial,que é o de ideologia, pois ela representa um papel central, começando pelasua afirmação de que perpassa todas as classes e funciona como um ci-mento entre elas, pelo fornecimento de uma filosofia comum. Gramsci,assinalam os que o estudam, como Perry Anderson39 , representa um mo-mento de inflexão na conceituação de ideologia, a que dá um sentido posi-tivo.

Outro estudioso, Terry Eagleton, ao apreciar as idéias de Gramsci, afirma:“É com Gramsci que se efetua a transição crucial de ideologia

como “sistemas de idéias” para ideologia como prática social vivi-da, habitual – que, então deve presumivelmente abranger as di-mensões inconscientes, inarticuladas da experiência social, além dofuncionamento de instituições formais”40 .

O papel da ideologia, no sentido levantado por Eagleton, conforme elemesmo reconhece, é fazer com que o poder “permaneça convenientemen-te invisível, disseminado por toda a textura da vida social e, assim, “natu-ralizado” como costume, hábito, prática espontânea”41 . Eagleton ressaltaque, deste ponto de vista, as ideologias devem ser vistas como “forçasativamente organizadoras que são psicologicamente “válidas”, modelandoo terreno no qual homens e mulheres atuam, lutam e adquirem consciênciade suas posições sociais”. A ideologia seria, então, a forma do bloco histó-rico, daí que uma “ideologia orgânica não é simplesmente falsa consciên-cia, mas uma consciência adequada a um estágio específico do desenvolvi-mento histórico e a um momento político particular”42 .

E é neste sentido, de ver a ideologia como algo constitutivo, que estapesquisa irá trabalhar. Deve-se ressaltar, ainda, que é ela quem fornece abase para o trabalho, tanto na construção da hegemonia quanto na suasubstituição, como dá ao intelectual sua organicidade, já que ele só se tor-na orgânico mediante o envolvimento político e, para fazê-lo, terá obriga-toriamente que adotar uma ideologia. No caso do jornal Posição, e da im-prensa alternativa que durante o regime cívico-militar que dominou o Bra-sil, pode-se dizer que estavam, mediante a atuação de intelectuais orgâni-cos ajudando na difusão de uma nova ideologia, agindo, sob a óticagramsciana, como partido ampliado, fechando o ciclo da construção deuma nova hegemonia ou, então, olhando-se do outro lado, dando início aum processo contra-hegemônico. É o que esta pesquisa pretende mostrar

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em relação ao jornal Posição.Há ainda a observar uma última questão que é da imprensa alternativa.

No caso desta pesquisa, o uso do termo guarda o significado que lhe deuBernardo Kucinski43 , que a preferiu à imprensa nanica, como os jornaisque faziam oposição ao regime eram também chamados. “O radical de al-ternativo contém quatro significados essenciais desta imprensa: o de algoque não está ligado a políticas dominantes; o de uma opção entre duas coi-sas reciprocamente excludentes; o de única saída para uma situação difícile, finalmente, o do desejo das gerações dos anos de 1960 e 1970, deprotagonizar as transformações sociais que pregavam”44 , explica Kucinskioferecendo, de antemão, uma pequena visão do engajamento dos jornalis-tas responsáveis pela feitura deste tipo de jornal.

Autor do que pode ser considerado o mais completo trabalho sobre aimprensa alternativa, objeto de sua tese de doutorado, Kucinski nos lem-bra que havia “basicamente duas grandes classes de jornais alternativos.Alguns, predominantemente políticos, tinham suas raízes nos ideais de va-lorização do nacional e do popular”45 . Os integrantes da imprensa alterna-tiva que eram políticos “em geral pedagógicos e dogmáticos (...) foram, noentanto, os únicos em toda a imprensa brasileira a perceberem o perigo docrescente endividamento externo (...) e o agravamento das iniqüidades so-ciais”46 . Os que não eram políticos e também faziam parte da imprensaalternativa tinham suas raízes no movimento de contracultura norte-ameri-cana, com abordagens que iam do orientalismo ao existencialismo, rejei-tando a primazia do discurso ideológico e mais voltados à crítica dos cos-tumes e à ruptura cultural.

O jornal Posição, que faz parte de uma das últimas levas de nascimentodos alternativos, integra-se à corrente das publicações políticas e, confor-me relatam seus editores, desde seu lançamento tinha como objetivo dis-cutir as questões relativas ao Estado e ajudar na sua transformação. A na-tureza da imprensa alternativa, como afirma Kucinski, era essencialmentejornalística o que, no caso de Posição, é reforçado pelo seu primeirodiretor, Rogério Medeiros, para quem a primeira preocupação do jornal eracom a produção de informações jornalísticas. É certo que ele mirava o Go-verno e as elites, mas queria discutir os problemas apresentando-os com autilização do discurso jornalístico.

Outra característica da imprensa alternativa e que coloca o Posição nes-ta categoria é a autogestão e a posse dos meios de produção. O jornal eragerido pelos próprios jornalistas, com a participação de um Conselho Edi-torial, e feito por eles. Como lembra o primeiro editorial, Posição era um

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jornal diferente, não só por se enquadrar dentro dos critérios alinhados porKucinski, mas porque se considerava um “jornal de jornalistas. E tambémporque queremos que, deste jornal, o leitor faça o seu jornal. Participandocomo quiser e puder. Escrevendo crônicas, poesias ou reportagens, dese-nhando ilustrações, criticando o nosso trabalho ou estimulando nossa posi-ção”. Neste trabalho, portanto, este será o sentido da imprensa alternativa,sempre que se referir a Posição e aos outros jornais que integraram o uni-verso deste tipo de imprensa.

A imprensa alternativa, neste caso, se contrapõe ao que se pode chamarde grande mídia – jornais, rádios e televisões – pertencentes a empresas ougrupo empresariais, muitas vezes com integração entre veículos e geridoscom o sentido capitalista do lucro. Outra diferenciação era que, na grandemídia, os jornalistas eram empregados, fazendo o que a linha editorial decada jornal, rádio, revista ou televisão determinava. Um terceiro item dediferenciação era o alinhamento ao Governo e às suas políticas. De ummodo geral, as empresas de mídia davam apoio ao regime e se havia críticaela não se endereçava à sua essência, discordando, apenas, de ações toma-das, principalmente na área econômica. Um desses casos é o do jornal OEstado de São Paulo, que sofreu uma pesada censura do Governo, masque foi, também, um dos primeiros defensores da derrubada de Goulart e ase alinhar ao regime.

Estrutura da pesquisaFeitas as escolhas de tema, objeto e referencial teórico e determinados

os objetivos, resta mostrar como esta pesquisa será desenvolvida e comoeste trabalho será estruturado. Além de uma apresentação, que explica ejustifica escolhas feitas, este trabalho está sendo estruturado a começarpor uma Introdução, que mostra a trajetória do jornal Posição. No CapítuloI são discutidos os pontos-chaves que dão sustentação ao trabalho,explicitando como se fará uso de conceitos como hegemonia, intelectualorgânico, partido ampliado e ideologia, além de antecipar a estrutura dotrabalho.

No Capítulo II, utilizando método recomendado pelo próprio Gramsci,faz-se uma contextualização do momento histórico do Brasil, situandonele a ação de Posição, além de mostrar a situação no Espírito Santo, espa-ço específico onde o jornal atuou, e se fazer uma pequena história do pró-prio jornal. Há ainda a busca de uma relação entre mídia e história, de-monstrando que a segunda pode ser usada como objeto da primeira. Acontextualização ajuda a entender o momento em que Posição circulava,

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as condições do político e do exercício da política e as variantes e verten-tes deste exercício, seja do lado hegemônico ou contra-hegemônico. É porrefletir o momento que o capítulo foi denominado A realidade em um pe-daço de espelho. O pedaço de espelho é o jornal Posição.

O Capítulo III irá tratar, especificamente, do papel desempenhado porPosição na construção de uma nova hegemonia. Este papel ele não o exer-ceu sozinho, mas integrando-se aos movimentos contra-hegemônicos quesurgiram, no Brasil e no Espírito Santo, com destaque para a atuação daIgreja Católica através das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs).

Para fazer esta demonstração iremos usar os conceitos da Matriz Teóri-ca do Pensamento de Antônio Gramsci, discutidas no Capítulo I, e algu-mas ferramentas disponibilizadas pela Análise do Discurso tomando comobase dois teóricos franceses, Maurice Mouillaud47 e DominiqueMaingueneau48 . Mouillaud dedica-se, especificamente, à análise da mídiaimpressa, sobretudo dos jornais, mostrando que podem ser visto como dis-positivos que enquadram a informação, dando-lhe um novo significado.Maingueneau, mais geral, aponta as ferramentas que podemos usar paraanalisar os discursos, inclusive o discurso jornalístico, deduzindo dele assignificações. Nos dois casos, o que buscamos é, através do ferramentalteórico disponibilizado pela Análise do Discurso, demonstrar que Posição,efetivamente, desenvolveu uma ação contra-hegemônica e que ela érefletida no seu discurso, sobretudo através das capas do periódico, ao lon-go de sua circulação.

Sobre a questão é bom observar o que Mouillaud diz: “(...) cada títuloconstitui um microssistema formado de dois enunciados articulados entresi: uma pressuposição que remete a unidades temáticas ou históricas, e umenunciado propriamente informacional”49 .

A constatação do trabalho contra-hegemônico de Posição será feita le-vando-se em consideração, exatamente, as unidades temáticas, relacionan-do o que o jornal afirmava com a base ideológica do regime, constituídapelos princípios inseridos na Doutrina de Segurança Nacional (DSN), divi-dida em quatro macros princípios: Militar, Econômica, Política ePsicossocial. Cada uma delas tinha objetivos claros, que o regime de 64procurava cumprir e esse esforço se dava, também, através do discurso.Daí, poder se contrapor às categorias da DSN o que Posição dizia e deter-minar se o discurso ia, verdadeiramente, de encontro ao que o regime pre-gava, configurando-se, com isso, uma ação contra-hegemônica. Destaque-se, mais uma vez, que o jornal não agiu sozinho, mas integrou ações e mo-vimentos que perpassaram uma boa parte da sociedade civil na época.

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A questão dos intelectuais que atuaram no Posição e do trabalho orgâ-nico que realizaram ao longo das 65 edições do jornal serão objetos do Ca-pítulo IV desta pesquisa. Nele, além da configuração do que são os inte-lectuais orgânicos, se demonstrará que a ação dos jornalistas de Posição seenquadra na conceituação desenvolvida por Gramsci, já que foram partici-pantes e lutaram para a construção de uma nova hegemonia.

Rogério Medeiros, que foi o primeiro diretor responsável pelo jornal edele participou até o número 49, escrevendo matérias que ajudavam adesconstruir a imagem rósea passada pelo regime, assume que Posição ti-nha um objetivo claro, que era o de mostrar o que estava acontecendo noEspírito Santo aproveitando-se da inércia da mídia local, comprometidacom o regime. “Centramos nossas críticas na elite que comandava o Esta-do, mostrando os problemas existentes, a corrupção no Governo e abrindoum espaço para a discussão com os vários segmentos sociais. Fizemos bomjornalismo”50 , afirmou em entrevista ao autor. Medeiros reconhece quePosição buscou a ocupação de um espaço, de crítica ao regime,regionalizando os assuntos e se contrapondo, no caso do Espírito Santo, aotriunfalismo existente. O principal objetivo, segundo seu relato, era mos-trar que, ao contrário do que diziam Governo e mídia – que era por elecontrolada – o país, em primeiro lugar, e o Estado, em particular, tinhamsérios problemas, mascarados por um discurso desenvolvimentista eotimista, calcado no princípio de que o crescimento econômico propiciariamelhoria para todos e que, como os dirigentes estavam trabalhando pelasociedade, não deviam ser objetos de crítica.

E foi para fazer frente às críticas, evitando-as, que o regime recorreu àcensura, um dos meios usados para se manter hegemônico, mesmo emmeio à crise provocada pelo endividamento externo e pela movimentaçãode base, de rejeição ao regime, como mostra o Capítulo a seguir.

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Notas1 RODRIGUES, Márcia Barros Ferreira (Org). A atualidade do pensamento de Anto-

nio Gramsci para a História Política. Coleção Rumos da História, Vol. 1, PPGHIS,UFES, Vitória, 2005, p. 5

2 RODRIGUES, Márcia Barros Ferreira (Org). A atualidade do pensamento de Anto-nio Gramsci para a História Política. Coleção Rumos da História, Vol. 1, PPGHIS,UFES, Vitória, 2005, p. 6

3 A questão da hegemonia é discutida, dentre outros, por Carlos Nelson Coutinho,Gramsci; Maria Antonieta Macciocchi, A favor de Gramsci; Hughes Portelli, Gramsci e obloco histórico; Christinne Buci-Glucksmann, Gramsci e o Estado e Nicola Badaloni,Gramsci e a filosofia da práxis como previsão, e Luciano Gruppi, A questão da hegemoniaem Gramsci, dentre outros autores. As indicações completas estão na bibliografia.

4 MARQUES, J. Luiz. O legado intelectual de Gramsci, in MARQUES, J. Luiz e VA-RES, Luiz Pilla (Org). Gramsci, Cem anos de pensamento vivo. Porto Alegre, LivrariaPalmarinca, 1991

5 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado moderno. Rio de Janeiro,Civilização Brasileira, 1991, p. 5

6 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado moderno. Rio de Janeiro,Civilização Brasileira, 1991, p. 50

7 GRAMSCI. Antonio. Maquiavel, a política e o Estado moderno. Rio de Janeiro,Civilização Brasileira, 1991, p. 50

8 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado moderno. Rio de Janeiro,Civilização Brasileira, 1991, p. 50

9 BACZKO, Bronislaw. Los imaginarios sociales – Memorias y esperanzas colecti-vas. Buenos Aires, Nueva Visión, 1999, 2ª edição.

10 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado moderno. Rio de Janeiro,Civilização Brasileira, 1991, p. 37

11 PORTELLI, Hugo. Gramsci e o bloco histórico. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983, p. 6712 MACCIOCCHI, Maria-Antonietta. A favor de Gramsci. Rio de Janeiro, Paz e Terra,

1980, 2 edição, p. 146-15513 BUCI-CLUCKSMANN, Christinne. Gramsci e o Estado moderno. Rio de Janeiro, Paz

e Terra, 1980, p. 8114 COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci, Porto Alegre, L&PM Editora, 1981, p. 120.15 PORTELLI, Hugues. Gramsci e o bloco histórico. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977, p. 2016 PORTELLI, Hugues. Gramsci e o bloco histórico. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977, p. 6517 PORTELLI. Hughes. Gramsci e o bloco histórico. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977, p. 6518 PORTELLI. Hughes. Gramsci e o bloco histórico. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977, p.

67-6819 PORTELLI, Hugues. Gramsci e o bloco histórico. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 1977, p. 6920 BOBBIO, Norberto. Os intelectuais e o poder. São Paulo, Unesp, 19996, p. 10921 LE GOFF, Jacques. Os intelectuais na Idade Média. Rio de Janeiro, José Olympio

Editora. 2003, p. 2322 COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Porto Alegre, L&PM, 1981, p. 21723 COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Porto Alegre, L&PM, 1981, p. 21824 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo

do Livro, s/d, p. 7

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25 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculodo Livro, s/d, p. 10

26 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculodo Livro, s/d, p. 11

27 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculodo Livro, s/d, p. 11-12

28 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculodo Livro, s/d, p. 12-13

29 COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Porto Alegre, L&PM, 1981.30 CERQUEIRA FILHO, Gisálio. A figura do intelectual e a formação discursiva

investigada in VELLOSO, João Paulo (Org). A questão social no Brasil, São Paulo, Nobel,sd, p. 46

31 COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Porto Alegre, L&PM, 1981. P. 4532 BEIRED, José Luís Bendicho. A função social dos intelectuais in AGGIO, Alberto

(Org). Gramsci, a vitalidade de um pensamento. São Paulo, Unesp, 1998, p. 12433 BEIRED, José Luís Bendicho. A função social dos intelectuais in AGGIO, Alberto

(Org). Gramsci, a vitalidade de um pensamento. São Paulo, Unesp, 1998, p. 12734 BEIRED, José Luís Bendicho. A função social dos intelectuais in AGGIO, Alberto

(Org). Gramsci, a vitalidade de um pensamento. São Paulo, Unesp, 1998, p. 12835 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo

do Livro, s/d, p. 12-1336 COUTINHO, Carlos Nélson. Gramsci. Porto Alegre, L&PM, 1981, p. 21337 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado. Rio de Janeiro, Civilização

Brasileira, 1991, p. 2338 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado. Rio de Janeiro, Civilização

Brasileira, 1991, p. 2339 ANDERSON, Perry. Considerações sobre o marxismo ocidental – Nas trilhas do

materialismo histórico. São Paulo, Boitempo, 200440 EAGLETON, Terry. Ideologia. São Paulo, Boitempo, 1997, p. 107-10841 EAGLETON, Terry. Ideologia. São Paulo, Boitempo, 1997, p. 10842 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado. Rio de Janeiro, Civilização

Brasileira, 1991, p. 10943 KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários nos tempos da imprensa alter-

nativa. São Paulo, Edusp, 200344 KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários nos tempos da imprensa alter-

nativa. São Paulo, Edusp, 2003, p. 1345 KUCINSKI. Bernardo. Jornalistas e revolucionários nos tempos da imprensa alter-

nativa. São Paulo, Edusp, 2003, p. 1446 KUCINSKI. Bernardo. Jornalistas e revolucionários nos tempos da imprensa alter-

nativa, São Paulo, Edusp, 2003, p. 1447 MOUILLAUD, Maurice e PORTO, Sérgio Darrel (Org). O jornal, da forma ao sentido.

Brasília, Editora UNB, 2002.48 MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. São Paulo, Cortez

Editora, 2002, 2 edição.49 MOUILLAUD, Maurice e PORTO, Sérgio Darrel (Org). O jornal, da forma ao sentido.

Brasília, Editora UNB, 2002, p. 2650 Entrevista com Rogério Medeiros, em 27-12-2005

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“ Nun c a e xistiu d e m o c r a c i a v e rd a d e ir a , n e m v a i e xistir”

Je a n J a c q u es Ro usse a u

e uma maneira ideal, a democracia, como muito bem assinalaRousseau, é irrealizável. Representa, porisso, uma utopia, nãono sentido de um sonho de futuro, sem sentido, mas de buscade uma transformação que parte, como assinala FredericJameson, do olhar e análise de uma situação concreta, de forma

a poder projetar uma ação à frente1 . Nesse sentido, há todo um caminho apercorrer em busca da utopia. Jameson, assim, não endossa o pessimismo deRousseau e aponta no sentido de voltarmos à utopia, construindo um futurodiferente do que temos hoje e nos lembra que, na ausência da política, doespaço para o político, é que se constroem e que surgem as utopias.

Ao lado de Jameson, e também na New Left Review, outro teórico mar-xista muito respeitado, Perry Anderson, vê espaço para o pensamento utópi-co. Concorda com Jameson na afirmação do surgimento do pensamento utó-pico quando a política ou o espaço político está ausente. Para explicitar suaposição, Anderson2 recorre a Immanuel Wallerstein e endossa sua posiçãopara aconselhar que o caminho da utopia se faça após uma avaliação sóbriae realista dos diferentes modos de organização da sociedade. O que ele acon-selha, no final, é a busca da utopia possível, não de um sonho irrealizável.

O pessimismo de Rousseau, a esperança de Jameson e o realismo deAnderson são bem condizentes com uma realidade vivida no Brasil a partirdos anos 60, quando um governo democrático foi derrubado e os militaresse instalaram no poder. O que vivenciamos, a partir de 1964, foi o

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estreitamento do espaço para a política e do político, com a implantação decontroles estritos sobre a sociedade civil e opinião pública de forma a que sóo governo e seus porta-vozes fossem ouvidos.

Ao longo de 20 anos o que se viu, para usar um termo prezado pelo maiorideólogo do regime, o general Golbery do Couto e Silva3 , foram sístoles ediástoles. Seguramente, as primeiras muito mais do que as segundas, já que otempo de fechamento do regime foi muito maior do que o de abertura. Nosmomentos de fechamento e de abertura, não importa em que governo mili-tar, o que vivenciamos foi o silenciamento da sociedade civil mediante acensura generalizada, a tortura, a intimidação e à instauração do medo. Nes-te contexto, só havia espaço para quem apoiava o governo, estava ao seulado e concordava com o que ele fazia ou pensava.

A ditadura, neste caso, acabou por confirmar as análises de Anderson eJameson e fez surgir, mesmo com todo o fechamento e medo, em segmentosda sociedade pessoas que, fazendo a análise de situação, entenderam que erapossível construir uma alternativa para o regime de então, buscando a demo-cracia, não a ideal, mas a possível, agindo no sentido da mudança, contra-pondo-se à hegemonia reinante e buscando construir uma nova hegemoniaem que esta democracia possível era o objetivo.

É sobre esta construção que esta pesquisa se debruça, buscando refletir aação de um jornal alternativo, o Posição, que circulou no Espírito Santo –notadamente na Grande Vitória – no período de 1976 a 1979 e que engros-sou a corrente de quem, fazendo frente ao regime, buscava uma alternativademocrática, abrindo-se novamente o espaço do político.

Sobre o regime de 64 e o seu tempo histórico há uma vasta literatura, comreflexões que englobam o seu antes, o durante e o seu depois, debruçando-sesobre os seus vários aspectos4 . Um deles, no entanto, resta pouco estudado,exatamente o papel desempenhado pela chamada imprensa alternativa. Oque há – e existem excelentes trabalhos – ocupam-se de dois expoentes des-ta imprensa, Opinião e Movimento, e quando falam de outros, como o casode Bernardo Kucinski5 , dão uma visão destes e neles centrada. Destaque-se,ainda, que a maioria dos trabalhos é da área de Comunicação, o que às vezesos deixam distantes da história e, sobretudo, da história política.

O que buscamos, então, é uma reflexão específica sobre um jornal alter-nativo e tendo como base a história política. Ao tomar o jornal Posição que-remos entender como se deu sua ação, como foi sua trajetória, que tipo deintelectuais o integravam e como foi a construção de uma nova realidade,em que se engajou, o que será visto tomando-se conceitos desenvolvidospor Antonio Gramsci6 como hegemonia, intelectuais orgânicos, partido am-

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pliado. Ao lado destes conceitos centrais, o trabalho irá refletir, também,sobre a ação da censura e o contexto político existente durante o período emque Posição circulou, mostrando a face do autoritarismo e a ideologiadesenvolvimentista, que perpassa todo o discurso do regime militar e noqual ele se embasou para buscar legitimidade para a democracia que, naótica de quem o dirigia, existia no Brasil. Mostra-se, enfim, o momento his-tórico brasileiro.

A reflexão será feita levando-se em conta a prevalência da Doutrina deSegurança Nacional, pedra basilar do regime militar, e as formas expressas esubliminares que a imprensa alternativa e de esquerda encontrou para contestá-la, promovendo o reflexo de uma realidade diferente do que queria o regime.

A abordagem teórica dessa questão recomenda, embora haja um recortehistórico claro e um objeto bem definido, que se debruce sobre a questão damídia, ressaltando a sua conexão com a história e mostrando, para o entendi-mento do trabalho contra-hegemônico desenvolvido por Posição e por seusintelectuais orgânicos. Antes, porém, é preciso uma contextualização.

Um clima difícilEm 1976 quando o jornal Posição começou a circular, o Brasil vivia um

momento difícil e ímpar. Difícil devido aos acontecimentos do ano, iniciadocom a morte do operário Manoel Fiel Filho na prisão do Exército, em SãoPaulo, devido ao recrudescimento da linha dura militar, contrária à anuncia-da política de abertura do presidente militar de então, o general ErnestoGeisel7 . A morte, também por enforcamento, repetia uma outra, do ano an-terior, em que morreu o jornalista Vladimir Herzog, depois de voluntaria-mente ter se apresentado ao Exército. Sobre a questão, o general Geisel deuo seguinte depoimento: “A resistência a fazer o inquérito foi muito grande, oque para mim era muito suspeito. Se as coisas fossem limpas, se não tivessehavido nada, se o enforcamento do Herzog tivesse sido espontâneo da partedele, qual o inconveniente do inquérito?”8 .

O depoimento do ex-presidente, dado ao CPDOC, da Fundação GetúlioVargas, é um reconhecimento tardio do que, na época, muito mais do queuma suspeita, era uma certeza: Vladimir Herzog, na verdade, foi assassinadopelos militares linha dura. E foi o mesmo que aconteceu, no início de 1976,com o operário paulista. Geisel, ao lembrar a ação da linha dura, neste mes-mo depoimento afirma que o país vivia “um regime de exceção, e esse era olado ruim da história”9 . Tardiamente, novamente, o ex-presidente reconhe-cia que o país, ao contrário do que pregavam os ideólogos e defensores doregime, não vivia em uma democracia, mas em um regime de exceção.

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Havia, como o próprio ex-presidente admite, um segmento dos militaresque era contrário ao abrandamento do regime, criticando os rumos tomadospelo governo e defendendo um endurecimento. Reconhece, ainda, que haviaum segundo problema, o do DOI-Codi, que misturava militares e civis queparticiparam da repressão nos anos de chumbo, sob o governo Médici. Ofato é que, se não tinham o apoio explícito do ministro do Exército, estesgrupos – e os grupos militares do Centro de Informação do Exército (CIE) –contavam com o beneplácito de seus superiores. É neste sentido que Geiselreconhece a existência de problemas e vê no inquérito do caso Herzog, pelomenos, uma busca de encobrimento do que a repressão vinha fazendo.

A tensão militar levou o governo a adotar a política de um passo avante edois atrás. De um lado, combatia a linha dura, mas, do outro, oferecia aosque não desejavam a abertura do regime ações no sentido de manter a “revo-lução” e o chamado “regime revolucionário”. Ouça-se o que o próprio gene-ral diz: “Às vezes, eu chegava à conclusão que era melhor cassar. A cassaçãotinha suas vantagens, no sentido de arrefecer o ímpeto da oposição (...) e dearrefecer a pressão da área militar”10 .

Pode-se afirmar, também, que são neste sentido as medidas tomadas emrelação à legislação eleitoral, com a edição da chamada Lei Falcão, cujo prin-cipal objetivo era manter a Arena, partido do governo, no poder, levando-a aganhar as eleições. Ao estudar os arquivos de Geisel na parte relativa aoMinistério da Justiça, Maria Celina D´Araújo relata que o ministro Falcãoconsiderava que “a legislação eleitoral precisa ser mudada pois (...) nenhumgoverno ganharia a eleição com a televisão “martelando” contra ele”11 . Erapreciso, então, calar a oposição, impedindo-a de mostrar a realidade do país.E é com esse objetivo que o Ministério atua, agindo em outra área sob suaresponsabilidade, que é a censura. Uma das iniciativas tomadas pelo minis-tro é a criação de um grupo de trabalho para “aprimorar a censura”. Noinício do governo Geisel, Falcão chegou a propor decreto aumentando asexigências para o registro de jornais, rádios e outros meios de comunicação.O intuito era combater a “má imprensa”12 .

Ao mesmo tempo em que propunha maior controle da imprensa e damídia, Falcão intensificava contatos com donos de jornais, rádios e TVs nosentido de buscar apoio para o governo. Um dos contatos de Falcão era oempresário Roberto Marinho, o poderoso dono da TV Globo, que seprontificou a promover uma reunião com empresários de comunicação para“elogiar a política econômica do governo”13 .

O elogio, no entanto, não era suficiente. Veja o que diz D´Araújo: “Oapoio da imprensa não foi procurado apenas por meios persuasivos. Falcão

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propõe a Geisel um levantamento junto ao Ministério da Fazenda e a bancosestaduais e privados, das dívidas das empresas jornalísticas”14 . E no arquivode Geisel, neste documento, aparece anotado à mão pelo próprio presidente“muito bom”. O intuito é claro, usar a pressão econômica para conseguir oapoio da mídia.

Havia, de outro lado, também uma preocupação com a imprensa alterna-tiva, que não poderia ser controlada por meios econômicos, já que vivia davenda dos exemplares, portanto, dos que adquiriam as publicações. É nosentido de controlar a imprensa alternativa que o ministro Falcão sugere“maiores rigores da censura e sua aplicação”15 . Era, mais uma vez, a de-monstração da política de sístoles e diástoles, sendo que, no caso, mais daprimeira que da segunda, já que o fechamento é muito mais comum do que aabertura.

No ano em que Posição nascia, o presidente Geisel afirmava, no mês demarço, que não aceitava contestação à revolução. Oposição, como ele admi-te no depoimento à CPDOC, tinha de ser responsável, não podendo contes-tar as bases do regime militar. O que o governo buscava era ter, de um lado,um partido do sim; e do outro, um do sim senhor. O clima de endurecimentose completa com a explosão de bombas na Associação Brasileira de Impren-sa (ABI), no Rio de Janeiro, e na sede da Ordem dos Advogados do Brasil.Era a linha dura agindo em aberto desafio ao governo, sendo encoberta peloaparato civil-militar da repressão e levando o governo Federal a agir no sen-tido de, ao mesmo tempo, frear a abertura e contentar a linha dura16 .

Nestes anos difíceis, em que o espaço da política e do político se estreita-va, é que um grupo de jornalistas decide fundar o jornal Posição. Seu objetivo:trabalhar no sentido da mudança, opondo-se ao regime militar e levando aseus leitores uma visão diferente da que oferecia a chamada “grande mídia”,controlada por pressões econômicas e pela censura, esta última que tambémafetou a imprensa alternativa.

Um clima de esperança Se de um lado havia o fechamento e, com ele, desesperança, de outro,

apesar dos controles impostos à sociedade civil, movimentos em seu seiocomeçaram a trabalhar no sentido da construção de uma nova realidade. Oprimeiro indício dessa mudança, que ia de encontro ao que os militares ecivis no poder pregavam, foi a vitória do MDB nas eleições legislativas de1974. Segundo Bolívar Lamounier, o resultado da votação, em relação aogoverno e ao seu partido, a Arena, dramatizou “a fragilidade eleitoral dopartido nas grandes cidades”17 , contribuindo, acredita, para a redução no

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ritmo da abertura.Se a afirmação de Lamounier é correta, também se pode dizer que a vitó-

ria do MDB acabou por mostrar que havia espaço para a oposição e que elatinha como atuar, procurando uma modificação do quadro existente. Mesmosubmetendo-se às regras do regime – o que efetivamente fazia – o MDBacabou abrindo espaço para a demonstração de insatisfação, já detectadapelo próprio regime, daí advir a idéia de Geisel e Golbery de fazerem uma“abertura”18 . É Golbery, por sinal, quem afirma:

“Não é de admirar-se, pois, que o esforço de descentralizador,conscientizado, do governo viesse a assumir o figurino de uma aber-tura política democratizante, desencadeada justamente através daliberação progressiva dos controles da censura, nem, tampouco, queesse estágio inaugural exigisse, para que não escapasse a qualquercontrole, prazo bastante longo e condução vigilante e ativa. (...) Tan-to mais se faria isso imperioso, quanto fortes pressões continuariamadvindo dos outros campos”19 .

Principal estrategista do governo militar, Golbery reconhece as tensõesexistentes e, em conferência feita na Escola Superior de Guerra, onde aju-dou a construir a Ideologia da Segurança Nacional, acaba afirmando que oregime adotou uma política que alternava “ações de contenção, senão decontra-ataque (...) garantindo, para si mesmo, espaço de manobra cada vezmaior e, pois, maior liberdade de ação para concretização de seus própriosobjetivos políticos”20 . Estes objetivos se resumiam, na verdade, na manu-tenção dos militares ou de seus prepostos no poder.

Insere-se neste contexto a preocupação do ministro Armando Falcão coma mudança da legislação eleitoral, que acabou sendo realizada em abril, eque tinha o claro objetivo de impedir, como o próprio ministro admitiu, umanova vitória do MDB. Uma das razões é que a oposição, mesmo a parlamen-tar, havia sido infiltrada e estava sendo controlada pelos comunistas, daí anecessidade de o governo se precaver21 . A preocupação se justificava, naótica do regime, porque, como lembra Skidmore, “Geisel e sua equipe nãotinham a intenção de permitir que a oposição chegasse ao poder. Eles imagi-navam uma democracia em que o partido do governo (ou partidos) continu-asse a mandar sem contestação”22 .

As eleições foram a parte mais visível da insatisfação da população, masnão a única, tampouco foi a primeira manifestação de oposição. Como lem-bra Thomas Skidmore, de há muito – desde o governo Médici, marcado pelaviolência da repressão – a Igreja Católica havia se tornado a principal voz deoposição ao regime, principalmente em relação à defesa dos direitos huma-

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nos, freqüentemente desrespeitados pelos militares23 .É de Skidmore a afirmação:

“A Igreja tornou-se o mais conspícuo opositor do estado autoritá-rio brasileiro. No caso não era apenas a CNBB procurando agressiva-mente defender sacerdotes e leigos contra a tortura (muitas vezessem êxito). Eram também os ativistas católicos que mobilizavamseus contatos no exterior – no Vaticano, no seio do clero e no laicatoda Europa e dos Estados Unidos, e de outros ativistas dos direitoshumanos, gerando assim protestos na imprensa estrangeira”24 .

A voz da Igreja era poderosa, já que ouvida pela maioria da populaçãobrasileira, um país, à época, marcadamente católico. Mas ela não era uníssona.Se havia prelados, padres e leigos dispostos a protestar e fazer oposição,havia, também, os que, ou se calavam ou se alinhavam ao regime. A chama-da ala progressista da Igreja era a mais engajada e foi através dela que surgiuno Brasil um dos mais importantes movimentos de base, as ComunidadesEclesiais de Base, cujo primeiro encontro nacional foi realizado em Vitória,no Espírito Santo25 .

Nascidas com o intuito de evangelização, as CEBs transformaram-se, comofrisa Della Cava, em poderoso instrumento de politização. “Independente-mente da intenção original dos arquitetos eclesiásticos, as CEBs ganharamvida própria”26 , acentua Ralph Della Cava, para quem houve o engajamentodo clero e de leigos mais progressistas na formação e na politização dasComunidades. Ao mesmo tempo, a Teologia da Libertação transformou asCEBs em seu laboratório e, por fim, intelectuais católicos orgânicos27

retrabalharam a religiosidade popular, dando-lhe nova dimensão e fazendocom que a religião e a igreja ficassem ao lado dos menos favorecidos, aomesmo tempo em que lhes davam uma educação política.

O crescimento das comunidades foi exponencial, chegando em poucotempo a mais de 80 mil em todo o Brasil. Com elas, a Igreja dava vazão à suaveia evangelizadora, suprindo deficiências de clérigos e, ao mesmo tempo,com a ação da ala mais progressista, como o teólogo Leonardo Boff, incutin-do uma ação política na ação das CEBs, o que, para eles, significava oposi-ção ao regime. O principal argumento era que a fé tinha de libertar e nocerne desta afirmação estava a Teologia da Libertação e frei Boff, que che-gou a ser considerado um dos mais importantes teólogos do mundo28 .

Se em número e em mobilização popular a Igreja Católica era imbatível,nem por isso outras entidades da sociedade civil deixaram de se movimentar.É o caso da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) “que se tornou ativaadversária do governo militar29 . A movimentação da Ordem começou ainda

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no governo Médici e foi uma reação, como no caso da Igreja Católica, àsconstantes violações dos direitos humanos. O nível de protesto foi se inten-sificando e, em 1974, no seu congresso, a OAB lançou um duro manifesto,comprometendo-se com a defesa ativa dos direitos dos presos políticos e seposicionando contra a tortura e prisões arbitrárias30 . Começou, então, umacampanha nacional para esclarecer a população sobre a importância dos di-reitos de cada cidadão. “Com sua firme posição, a OAB se organizava paraminar as bases do regime autoritário”31 , afirma Skidmore. O historiador afir-ma que as ações da OAB foram, em muitos casos, coordenadas com as daAssociação Brasileira de Imprensa (ABI).

Uma mostra da eficiência das ações da OAB pode ser dada pela posiçãodo ministro Armando Falcão, da Justiça, que deixou de comparecer à con-venção da entidade no Rio de Janeiro, o que está registrado em correspon-dência do arquivo Ernesto Geisel. O argumento usado era que não queria seexpor, nem ao governo. O ministro, no entanto, não considerava os advoga-dos e a Ordem como contrárias ao regime, mas ressaltava que ela era contraa tortura32 . A Ordem foi, também, a primeira entidade a se engajar na defesada anistia para os que haviam sido punidos pelo regime militar e na luta pelavolta ao estado de direito. E foi exatamente esta ação, que irritou o governomilitar, que o levou a propor o fim da autonomia da entidade.

Segundo Thomas Skidmore:“Em 1976 o governo apontou a sua própria metralhadora contra

a OAB propondo, como parte da reforma geral do Judiciário, a revo-gação do singular status daquela organização, a única não sujeita aocontrole direto do governo. Este privilégio, segundo o governo, de-via acabar, submetendo-se a OAB ao controle e supervisão do Mi-nistério do Trabalho”33 .

A ameaça serviu para tornar a organização ainda mais atuante, que pas-sou a denunciar a ordem jurídica ilegítima. O curioso desta postura, comolembra Skidmore, era que tanto a Ordem dos Advogados do Brasil quanto aprópria Igreja Católica eram conservadoras. No caso da entidade dos advo-gados, ressalta, ainda, que foram os juristas que deram o arcabouço legal àsleis arbitrárias baixadas pelo regime militar.

Merece observação, também, a atuação do movimento estudantil. Segun-do Maria Paula Nascimento Araújo este movimento foi “o grande responsá-vel pela retomada das mobilizações políticas, inclusive recuperando espaçonas ruas”34 . O movimento estudantil, segundo a historiadora, atuava emduas frentes. Na primeira, lutava para a reconstrução das entidades estudan-tis, como a União Nacional dos Estudantes (UNE) e “seguindo de perto a

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orientação das organizações de esquerda, levantava a bandeira da luta pelasliberdades democráticas”35 .

Ao lado da Igreja Católica – inclusive com as CEBs – e da OAB, haviaoutras manifestações da sociedade civil. Uma delas, conforme afirma ScottMainwaring36 , veio dos chamados movimentos populares. “(...) embora euconcorde com outras análises de que a abertura foi principalmente um pro-cesso de elite, também acredito que os movimentos populares tiveram certa-mente um impacto na situação política”37 , afirma Mainwaring, que foca oseu estudo sobre o Movimento dos Amigos do Bairro, do município de NovaIguaçu, no Rio de Janeiro.

À ação do MAB, que não era exclusivo de Nova Iguaçu, se juntou o Mo-vimento do Custo de Vida “uma forma popular de protesto iniciada em 1973e que atingiu o pico em 1977-78. Entre seus objetivos estava o de estimularo público a voltar às ruas em manifestações de protesto”38 . SegundoSkidmore, a tática adotada pelo MCV se assemelhava às manifestações con-tra o governo Goulart, antes do golpe, mas havia a diferenciação de origem,já que, no caso anterior à ditadura eram mulheres de classe média que parti-cipavam das manifestações, e na época do governo Geisel, eram mulheresligadas ao movimento dos trabalhadores.

Por fim, e não menos importante, temos toda a movimentação do que, naépoca, se convencionou chamar de “novo sindicalismo”. Antes, no entanto,uma explicação: A estrutura sindical brasileira foi construída no governoVargas e tinha, como assinalam todos os estudiosos do período, um fortecomponente corporativista, além de submeter os sindicatos ao governo, queprecisava autorizar seu funcionamento, e vinculá-los às receitas obtidas comcontribuições compulsórias. Como frisa Margaret E. Keck “o isolamentoeconômico e social da classe trabalhadora por meio da legislação trabalhistafazia parte de um modelo geral cujos valores subjacentes tiveram um notá-vel poder de permanência”39 .

Esse controle aumentou no período do regime militar. Dados levantadospor Margaret Keck mostram que no período de 1964 a 1970 o Ministério doTrabalho interveio mais de 500 vezes nas organizações sindicais “cassandoseus dirigentes e nomeando interventores”40 . E mais ainda: “Considerandoque os salários eram a causa principal da inflação e reconhecendo que ascampanhas salariais dos sindicatos eram períodos importantes de mobilizaçãoe politização, o regime militar instituiu uma nova política salarial destinada acontrolar esses dois elementos”41 .

As mudanças no movimento sindical e o surgimento do “novosindicalismo” começaram, segundo Margaret Keck, a partir dos anos 70,

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embora tenha havido greves nos anos 60, mas que terminaram em fracasso.O berço desse novo sindicalismo foi o ABC paulista, região mais industriali-zada do país. Seu objetivo principal era a negociação direta com os patrões,o que a legislação trabalhista não permitia, e a luta pela reposição de perdassalariais, decorrentes da manipulação dos índices de inflação pelo governo.

Três características, de acordo com Keck, marcaram esse novosindicalismo: ênfase na organização de base, reivindicação de mudanças nalegislação trabalhista, dando autonomia aos sindicatos, com reconhecimen-to do direito de greve e uma maior disposição para a militância, incluindo agreve, mesmo contando com a repressão do regime42 . O que as novas lide-ranças defendiam, embora não fossem homogêneas, iam de encontro às as-pirações do regime militar e, tal como no caso de outros movimentos dasociedade civil, acabaram contribuindo para abrir mais uma brecha no muroda ditadura.

O que fica patente da análise de situação, principalmente em relação aoperíodo em que o general Geisel esteve à frente do regime militar, é que, sede um lado havia o desejo de controle do governo, que usava todo o arsenalde medias arbitrárias e casuísticas, diminuindo o espaço do político, enten-dendo esta ação como forma de se manter no poder, como assinala Golberydo Couto e Silva na conferência feita na Escola Superior de Guerra, de outrohavia toda uma movimentação da sociedade civil, que buscava conquistarespaços que levassem a uma mudança do regime. É para integrar-se à ondada mudança que nasce o jornal Posição.

A questão da censuraUm contexto do Brasil, quando se fala do regime de 64, não estará com-

pleto se a censura à imprensa não for abordada. Pode-se, aqui, recorrer aoautor de um clássico que fala na manipulação das opiniões, de forma a tor-nar aceitável um regime que tudo controla, através de sua onipresença. GeorgeOrwell nos dá em 1984, ficção futurista para a época que foi escrita, umavisão de a quanto pode chegar um governo para controlar os seus cidadãos.O romance, que nos remete a um clima e a um regime opressivos, é pessi-mista e talvez decorra desse pessimismo a posição Orwell. O romance, nes-te caso, pode servir como uma analogia para a ação do governo brasileiro noperíodo da ditadura nos dando, exatamente, o clima vivido pelo país, sobre-tudo a partir de 1968, quando o poder não queria ouvir verdades – ou pelomenos não desejava que elas fossem ditas à população.

É com o objetivo de controlar a opinião pública, fazendo com que a po-

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pulação tivesse conhecimento só daquilo que interessava ao poder, que agea censura. Ela, no entanto, não atingiu só a imprensa, sendo bem mais amplae abrangendo artes, espetáculos, livros, cinema, teatro, música, etc. Legal einstitucionalizada, no que se refere à questão moral, a censura política, sejana mídia, seja fora dela, foi ilegal desde o início, agiu de forma coordenada econtou, no caso específico dos jornais, com a colaboração dos patrões e dejornalistas.

A censura foi fundamental, também, para o aparecimento da chamadaimprensa alternativa, como muito bem lembra Thomas Skidmore43 . E é porisso, como forma de entender o contexto da construção da hegemonia e,depois, do trabalho contra-hegemônico feito, inclusive pelo jornal Posição,no Espírito Santo, que torna-se necessário dar um panorama da censura,mostrando como é que ela agia e os mecanismos que usou para conseguir aadesão de empresas jornalísticas e, até, de jornalistas que se alinharam aoregime, ajudando-o a disseminar sua ideologia.

A questão da censura está bem coberta pela literatura histórica e há, so-bre ela, uma gama de abordagem. O que os vários autores deixam presente éa combinação da censura com outras ações governamentais, todas no senti-do de passar à população uma realidade, senão risonha, pelo menos cor derosa, longe dos problemas efetivos que o país vivia. É inegável, como admi-te Daniel Aarão Reis44 , que houve crescimento econômico e, dele, muitos sebeneficiaram. Também é inegável que o regime contava com apoiadores nosmais variados segmentos da sociedade. Mas existe, ainda, outra questão ine-gável, a da atuação da censura como um política do Estado, como destacaCarlos Fico, mostrando que “a censura política à imprensa foi apenas maisum instrumento repressivo”45 . Junto com os outros dispositivos do governomilitar – repressão política, repressão policial e controle social – a censuraera “indispensável à “utopia autoritária” dos radicais vitoriosos em 1964”46 .

As afirmações de Fico vão ao encontro do estudo feito por Ane-MarieSmith47 , que constatou, dentre outras, duas coisas: a primeira, que haviauma política de Estado em relação à censura e, a segunda, que houve, nocaso da censura à imprensa, a colaboração dos patrões, que a aceitaram. Nocaso da política de Estado, Smith demonstrou que havia uma articulação dogoverno para impor o silêncio e que, com este mister, criaram-se mecanis-mos que funcionaram, e bem, por serem impessoais e a mídia não saber,exatamente, de onde vinha a censura, a não ser que era patrocinada pelogoverno militar.

O que Anne-Marie Smith considera é que“O regime acreditava que uma imprensa fidedigna seria um ins-

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trumento importante para garantir o êxito do seu empenho em legiti-mar-se. Alguém precisava proclamar as conquistas do regime (...) e aimprensa poderia ser um forte aliado para a disseminação dessa in-formação (embora, ao mesmo tempo, uma ameaça se ela se pusesse aquestionar ou criticar os custos sociais dessas realizações”48 .

Em busca de legitimação, o governo, para obtê-la, passou a controlar aimprensa, silenciando-a e às críticas ao regime, uma questão muito bem es-tudada por Beatriz Kushnir49 . Um primeiro ponto que Kushnir observa é ainstitucionalização da censura a partir do governo Médici, que tomou porbase um dos instrumentos excepcionais que tinha à mão, o AI 5. Ela vê abase da censura política aos jornais e à mídia no decreto lei 1077, de 1970,que teria autorizado o governo a exercer este tipo de atividade. O entendi-mento de Kushnir, no entanto, é contestado por Smith e Fico. Os dois dizemque o decreto regulava a censura aos espetáculos e diversões, não à impren-sa, daí tratarem a censura como ilegal. O trabalho de Smith é anterior ao deKushnir e o de Fico, posterior.

O que fica patente, no entanto, tome-se o ponto de vista de Kushnir, deSmith ou de Fico é que a censura foi, sim, uma política do Estado. Veja-se oque nos diz Kushnir:

“Ao apontar um árbitro, o ministro da Justiça no 1077-70 pareceiluminar uma instância superior reguladora de qualquer desmando,um locus apaziguador que impedisse o descalabro. Talvez essa nãoseja a melhor leitura. Creio que, no fundo, o que o decreto esclareceé que quem dita as regras da censura é o ministro da Justiça. Portantocensura é uma questão de Estado, com atuação política na execuçãodas medidas”50 .

Ao comentar toda a articulação estabelecida pela censura, com o coman-do central do ministro da Justiça, o que é reforçado com a leitura feita nosarquivos do presidente Geisel, relatada por Maria Celina D´Araújo51 , BeatrizKushnir acaba com o argumento de não ter havido uma orquestração dacensura, que atuava junto à imprensa, mas também, junto às artes eespetáculos. “Isso permite a reflexão de que a censura jamais foi caótica eque os censores tinham conhecimento e voz de comando acerca da direção atomar”52 , afirma.

É devido a esta articulação que Kushnir considera que “as transforma-ções por que passou a censura no pós-1968 compunham uma estratégia maiorque visava (...) calar notícias e informações e centralizar as atividadescensórias no intuito de forjar uma imagem do governo e de ganhar adesões”53 .Volta-se, portanto, a questão da busca de legitimidade, que levou o governo

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a buscar uma posição hegemônica, “vendendo” à sociedade os seus princípi-os e apresentando-os como se fosse dela, sociedade, uma questão bem dis-cutida por Maria José Rezende54 .

A questão do centro da censura pode ser visto, também, no estudo deMaria Aparecida de Aquino sobre os jornais O Estado de São Paulo e Movi-mento, que receberam censura prévia durante um bom tempo. No caso doEstadão, um censor ficava dentro do jornal, mas reportava-se a Brasília. Nocaso do Movimento, a censura era feita na Polícia Federal, na capital federal.É dela a afirmação:

“Encarava-se como necessário o controle da informação a serdivulgada, para preservar a imagem do regime, num exercício deocultação que passa, inclusive, pela negação de visibilidade, ao lei-tor, de suas próprias condições de vida. Afinal, nada pode ser mais“subversivo” do que enxergar a si próprio!”55 .

O levantamento de Aquino prova, com números, que a censura tinha umsentido e se preocupava mais com alguns assuntos que outros, embora tenhasido mais rigorosa com Movimento, um integrante da chamada imprensaalternativa, do que com O Estado de São Paulo, jornal tradicional e quehavia apoiado o movimento civil-militar que acabou depondo o presidenteJoão Goulart, mas que tinha se transformado em um crítico do governo. Ojornal foi, também, um dos poucos a não se impor a censura prévia.

O que a literatura histórica mostra, tomando-se os trabalhos de Fico,Kushnir, Smith e Aquino, é que havia uma articulação da censura e um cen-tro para ela, configurando-se, com isso, a existência de uma política do Esta-do no seu exercício. Podia até haver gradações, como no caso dos jornaistradicionais e nos alternativos, mas a censura à imprensa, que era política,não foi realizada ao acaso, mas teve o propósito claro de silenciar críticas e,com isso, insere-se na busca de legitimação do regime. Este, no entanto, nãoé o único lado do exercício da censura. Existe um outro e, nele, os empresá-rios donos de jornais representam o papel principal.

Quando Daniel Aarão Reis fala em apoio de segmentos da sociedade civilao regime militar, ele não está se referindo, diretamente, aos empresários dacomunicação. Mas, neste caso, a afirmativa se encaixa com perfeição. Basta,para comprová-lo, uma olhada no arquivo deixado pelo penúltimo dos presi-dentes militares que o Brasil teve, o general Ernesto Geisel. Ao estudar oarquivo do Ministério da Justiça, Maria Celina D´Araújo56 mostra as articu-lações feitas pelo ministro Armando Falcão junto aos empresários da mídiapara conseguir direcionar o noticiário no sentido que o governo desejava.Explicitamente, está citado o empresário Roberto Marinho, dono da Rede

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Globo, que é dado como um colaborador do regime.A questão, no entanto, já havia sido abordada antes por Anne-Marie Smith,

que chegou ao Brasil para estudar a questão da censura com a vantagem denão ter tido um envolvimento direto com ela, o que lhe deu uma visão dife-renciada do problema. É dela, por sinal, a afirmação categórica de que “agrande imprensa quase nunca foi censurada formalmente; em vez disso ha-via um acordo de cavalheiros – ou assim alegavam as “autoridades constitu-ídas”57 . É nesse sentido, de acordo de cavalheiros, que ela vê a questão daautocensura58 , personalizada pelos “bilhetinhos”59 que eram entregues àsredações com a recomendação dos assuntos que não deveriam ser publica-dos.

Demonstrando mais claramente a posição dos jornais, Beatriz Kushnirrelata a situação da Folha de São Paulo e o depoimento que lhe deu o editorde então, jornalista Boris Casoy. A direção da empresa optou por fazer o jogodo governo militar, recebendo as instruções do DPF acerca do que publi-car60 . Outro depoimento confirmatório do alinhamento dos patrões vem dojornalista Alberto Dines, então dirigindo o Jornal do Brasil. De acordo comKushnir, Dines afirmou, a propósito dos 10 anos do AI 5 em 1978:

(...) a direção me convocou para receber instruções. O Jornal doBrasil não pretendia opor-se a eles, causar qualquer problema. Entãopediu licença à direção – longe dos censores evidentemente – parame conceder o direito de que pelo menos nesta primeira edição doJornal do Brasil sob censura fosse registrada nossa resistência”61 .

No caso dos patrões, uma olhada nos arquivos do general Geisel é bemesclarecedor. Ao relatar a questão da censura decorrente da atuação do mi-nistro Armando Falcão, Maria Celina D´Araújo afirma:

“A censura ficaria toda centralizada no Ministério da Justiça, quefaria reuniões secretas com os ministros militares e o SNI. Essas de-cisões foram aprovadas por Geisel. Ruy Mesquita, de acordo com orelato do ministro, não aceitava a censura, autocensura ou censor.Falcão acabou trocando o censor de O Estado de São Paulo por um“melhor e mais bem pago”, como compensação pelas barganhas deMesquita. Enquanto isso, Roberto Marinho se prontificava a articu-lar reunião com empresários para elogiar a política econômica dogoverno”62 .

Evidenciava-se, assim, não só o apoio dos empresários de comunicaçãoao regime militar, mas a própria ação do governo no sentido de buscar esteapoio, inclusive por meio de pressões, o que foi feito, por exemplo, com oJornal do Brasil, pelo próprio Armando Falcão, que reclamou das críticas,

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que considerava injustas, feitas pelo jornal ao regime, em encontro com umdos proprietários do jornal, Nascimento Brito. O próprio Brito, antes, já ha-via se reunido com o ministro do Exército com a mesma finalidade63 .

Além da censura, o governo tinha outros meios de se impor às empresasde comunicação e, talvez aí é que esteja o verdadeiro sentido da colabora-ção. Um desses meios era o financeiro. Ao analisar a questão no seu trabalho,Smith observa que considerando as baixas tiragens dos jornais brasileiros, asreceitas vinham mais da publicidade que da venda dos exemplares. O padrãointernacional era de 50% das receitas vindas da venda dos exemplares e osoutros 50% de publicidade. No caso brasileiro, a publicidade era responsá-vel por dois terços da receita das empresas jornalísticas e, em alguns casos,chegava próximo a 80% de todo o faturamento64 . Assim a estrutura de recei-ta dos jornais os deixava dependentes dos grandes anunciantes e à pressãodo governo, conforme observa Smith. “O que mais interessa no caso doBrasil foi o extraordinário peso da publicidade oficial na geração da receitados jornais, a qual foi estimada em 15 a 30% da receita de muitos jornaisimportantes”65 , afirma Smith. Dessa forma, o governo podia exercer pressãosobre as empresas, ameaçando-as com a retirada de publicidade. Podia, in-clusive, agir no sentido de retirar a publicidade privada, já que as empresasprivadas também dependiam do governo.

Ainda sobre a pressão contra empresas, é esclarecedor ver o que afirmaSmith ao abordar a questão, relacionando-a com as empresas jornalísticas oude mídia. Segundo ela, “tendo em vista a extensa atuação do Estado brasilei-ro nas empresas de todo tipo, inclusive jornalísticas, havia amplas oportuni-dades para a interferência do Estado nas finanças da imprensa: suspender apublicidade, negar empréstimos pelos bancos oficiais, recusar licença deimportação de equipamentos ou papel de imprensa ou confisco de tiragens”66 .

Havia, ainda, um outro fator a considerar e que envolve, novamente, ogoverno militar, que é a expansão das comunicações no Brasil, com a ampli-ação das estações de rádio e televisão, ambas concessões do poder público.Como muitos dos grupos de mídia tinham interesse em concessões de rádioe televisão, o governo podia agir no sentido de obter a adesão dos empresá-rios para a sua política e, dentre elas, estava a autocensura. Uma visão decomo isso acontecia é dado pelos arquivos relativos ao Ministério da Comu-nicação no governo do general Geisel. O ministro Euclides Quandt de Oli-veira, de acordo com estudo feito por Alzira Alves de Abreu, tinha comopolítica “prestigiar os governadores dos estados”67 , o que significava, no fi-nal, a concessão de canais aos grupos que estivessem alinhados ao regime, oque não era diferente para as empresas de mídia que queriam expandir sua

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atuação para a área de rádio e televisão.Censura, de um lado, controle, do outro e o aceno com a possibilidade de

ampliação do negócio, o que para muitos aconteceu, fazia com que os em-presários de comunicação se alinhassem ao governo militar e, com isso, aju-dassem a reproduzir a ideologia dominante. Com o apoio – espontâneo ouforçado – da mídia o governo, ao mesmo tempo em que mascarava a realida-de do país, se apresentava como o “salvador da pátria” e fazendo o que, maisadiante, iria beneficiar toda sociedade. O bloco de poder agia, neste sentido,para se tornar dominante e implantar sua ideologia, consolidando umahegemonia sobre a sociedade brasileira.

A situação no Espírito SantoO Espírito Santo não é rico em publicações que discutam sua história

política, principalmente a mais recente, a partir da década de 70 do séculoXX. Até o início dos anos 60, a política estadual foi dominada pelo PartidoSocial Democrático (PSD) – com pequenas exceções – e, nele, com ahegemonia da família Lindenberg, que dominou a política local por quase 50anos68 . Outra característica era ser o Espírito Santo um Estado cuja econo-mia girava, praticamente toda ela, em torno da produção agrícola, sobretudono café69 .

A dependência do café persistiu até os anos 60, já no regime militar, quandouma política do governo federal determinou a erradicação dos cafezais.Haroldo Rocha70 considera que, com a erradicação das lavouras, houve umesvaziamento do campo e o Estado acabou entrando em uma grande crise.E esta foi a situação que o primeiro governador indicado pelos militaresencontrou no Espírito Santo.

O governador indicado, Christiano Dias Lopes Filho, “preocupou-se, en-tão, em planejar alternativas para o Estado”71 , criando uma infra-estrutura,que era muito incipiente, e mecanismos de incentivo e de crédito que permi-tissem a instalação de novas indústrias, já que o Espírito Santo tinha muitopouco delas. O governador contou, conforme ele mesmo admite, com o apoioe o suporte do governo militar para levar adiante o programa de industriali-zação capixaba.

Um membro da equipe de Christiano, o engenheiro Arthur Carlos GerhardtSantos, foi que o sucedeu no governo. A escolha, feita pelo general EmílioGarrastazu Médici, recaiu sobre um técnico, não um político como Christiano.Gerhardt Santos tinha uma visão diferente da de Dias Lopes Filho. Achavaque o Estado deveria se concentrar em grandes projetos, que funcionariamcomo pólos de atração para outros investimentos. No seu governo foram

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preparados “vários estudos mostrando a viabilidade de o Estado recebergrandes investimentos”72 .

Um dos investimentos que o governador buscava era o de uma nova side-rúrgica, anunciada pelo governo federal. A política dos grandes projetos, noentanto, já havia sido iniciada pela Cia. Vale do Rio Doce, com a instalação,nos anos 60, do Porto de Tubarão e com o início de implantação das usinasde pelotização, os dois programas desenvolvidos por iniciativa do engenhei-ro Eliezer Batista, que presidia a empresa. Foi nessa contingência de transi-ção de um Estado agrícola ao industrializado que chegamos aos anos 70 e aogoverno do general Ernesto Geisel.

Dentro do espírito de abrir espaço para a política e o político, conformedito pelo general Golbery do Couto e Silva, o governo do Espírito Santo foidado a um jovem político, o deputado federal Elcio Alvares, que desenvol-veu “um relacionamento especial com o general Golbery”73 , e admite tersido muito ajudado pelo poder central, inclusive com a garantia de implanta-ção no Estado da Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST). Além disso,Elcio reconhece a ajuda e a importância do governo militar para outros in-vestimentos feitos no Estado. A boa relação com Elcio é reconhecida pelopróprio general Geisel no depoimento dado ao CPDOC da Fundação Getú-lio Vargas74 .

Os grandes projetos acabaram por mudar a face da economia estadual,mas trouxeram com eles um outro lado, o das mazelas sociais – “inchaçãodas cidades, favelização, falta de infra-estrutura sanitária, etc.”75 – muitopouco visíveis em função do alinhamento da mídia tradicional com o gover-no. O ponto destoante era, exatamente, o jornal Posição, que havia nascidojá no contexto dos chamados grandes projetos. Enquanto a mídia tradicionalsilenciava para os problemas existentes, Posição chamava a atenção paraeles, exercendo, sobre seus leitores, um papel de esclarecimento.

Sobre Posição, Domingos de Freitas Filho, afirma que, apesar de sua cur-ta duração, ele “ocupou um significativo espaço (...) exponenciando-se quandodenunciou escândalos e corrupção”76 . Reconhecendo a passagem quase quemeteórica do jornal, que durou pouco mais de três anos e 65 números, FreitasFilho afirma:

“Depois do AI-5 (1968) a esquerda no Espírito Santo passou porum largo jejum até voltar a ocupar espaços na imprensa local. Ojornal Posição passou a ocupar quinzenalmente esse espaço. Seu lema“um jornal que depende do leitor”, era mais do que um slogan, poissua situação financeira foi sempre muito precária e não raras vezesamigos dos editores davam contribuições pessoais para que o núme-

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ro seguinte fosse editado”77 .O que se deduz das afirmações de Freitas Filho é que, exercendo um

papel de crítica, Posição desempenhou um papel contra-hegemônico, já que,refletindo uma realidade diferente da divulgada pelo poder, ajudava na refle-xão e na conscientização política, contribuindo, assim, para incrementar odesejo de mudança do regime.

O nascimento de PosiçãoO jornal Posição, na classificação feita por Bernardo Kucinski, integra a

sexta vaga de criação de jornais alternativos no Brasil. “Uma geração novade jornais, lançados por jornalistas de prestígio regional, nasceu da crise dopadrão complacente da grande imprensa”78 , afirma Kucinski, que fez umdos mais extensivos estudos sobre este tipo de publicação e produziu umlivro que é referência nesta área.

A apreciação de Kucinski é correta no que se refere ao Posição, cuja cri-ação foi liderada por um dos mais prestigiados jornalistas capixabas, RogérioMedeiros, embora baseado na idéia de um outro jornalista, Jô Amado, ambosligados à esquerda e ambos à procura de um veículo que permitisse a expres-são da crítica política e econômica no Espírito Santo79 .

Como relata Amado, que foi Editor Chefe do jornal de 48 de suas 65edições, uma das razões da criação foi a luta pela anistia e a busca da demo-cratização do país. A breve história do jornal pode ser dividida em pelo me-nos cinco momentos, que coincidem com as mudanças internas promovidasna sua direção. O primeiro abrange os nove primeiros números, cujo coman-do esteve com Rogério Medeiros e Jô Amado. O segundo, começa no déci-mo, quando Luiz Rogério Fabrino assume a direção, cargo que ocupou atépróximo do fechamento de Posição.

No terceiro momento há uma dança de cadeiras na Redação. A ela vol-tam Rogério Medeiros, que assume como Diretor Responsável, ficando LuizRogério Fabrino como Diretor de Redação e Jô Amado como Editor Chefe.Uma edição depois, na de número 49, nova mudança. Saem Rogério e Jô eLuiz Rogério volta ao cargo de Diretor Responsável com Luzimar NogueiraDias assumindo como Editor. O número 49 marca, também, o afastamentode Jô Amado, o idealizador do jornal, de Posição e, como conseqüência dela,a saída de Rogério Medeiros, em definitivo. No número 51 uma nova troca,saindo Luzimar e entrando Benedito Tadeu César como Editor.

O quarto momento começa no número 52 quando Joaquim Nery assumecomo Diretor Responsável. Enquanto Nery exercia a função, mudou o Edi-tor Chefe, saindo Tadeu César e voltando à função Luzimar Nogueira Dias

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junto com Robson Silveira. O quinto e último momento trouxe a mais signi-ficativa mudança para o jornal já que, nela, ele se transformou em semanal.Esta fase começa no número 59 com Robson Moreira, um dos primeiros emais assíduos jornalistas da redação de Posição, assumindo como DiretorResponsável. No número 61, Umberto Martins assume como Editor Chefejunto com Robson Silveira, fica até o 63 e deixa a responsabilidade comRobson. Os dois Robsons – Moreira e Silveira – comandaram o jornal até oseu fechamento, que ocorreu no número 65. Encerrava-se, então, a históriado Posição, um jornal que, ao nascer, já se disse alternativo, traçando rumosclaros de atuação, como destaca o seu primeiro editorial:

“Será Posição um jornal diferente? Sim. Porque é um jornal dejornalistas. E também porque queremos que, deste jornal, o leitorfaça o seu jornal. Participando como quiser e puder. Escrevendocrônicas, poesias ou reportagens, desenhando ilustrações, criticandoo nosso trabalho ou estimulando nossa posição”.

A ação do jornal e como durante sua história ele atuou, concretizando ounão a proposta inicial e refletindo a realidade do Espírito Santo em um peda-ço de espelho, ajudando na construção de uma nova hegemonia, serão objetos,mais à frente, de um capítulo específico. Cabe ressaltar, em relação às mu-danças acima, que elas não se deram em razão de conflito ou disputa internana redação ou busca de hegemonia de um grupo sobre o outro. Elas, confor-me frisam os que estiveram à frente de Posição, se deram em razão, na mai-oria das vezes, da atuação profissional dos próprios envolvidos. Um exem-plo é a saída de Rogério Medeiros, que deixou Vitória, indo trabalhar em OEstado de São Paulo, em São Paulo.

Jornal e históriaSe olharmos em perspectiva e recorrermos aos historiadores menos con-

temporâneos, vamos concluir que a mídia, no geral, e a imprensa, em parti-cular, não mereciam deles muita atenção. Estamos no curso da história delonga duração e em um momento em que o fazer histórico se debruçavasobre o passado distante, visto como condição essencial para a objetividadeda análise. E outro lado, a desconfiança na imprensa, de um modo geral, seprendia à certeza de ela agir como aparelho ideológico do Estado, reprodu-zindo, porisso mesmo, a ideologia dominante.

O que se estabeleceu entre história e jornalismo, portanto, como muitobem assinala Jean Laccouture80 , foi uma relação conflituosa, embora desta-que que há convergências entre as duas disciplinas. E é o próprio Laccoutureque, considerando a ação do jornalista, afirma:

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“O jornalista assim sacudido pelo capricho do acontecimentocontinua sendo um candidato à operação histórica, na medida emque, testemunha, ator, mediador, motor ou observador, ele introduzem sua pesquisa uma vontade racional de situar, de ordenar essasseqüências e relacioná-las a um sentido pelo menos problemático”81 .

Laccouture destaca o papel ativo do jornalista e, portanto, do jornal, apartir do momento em que a história voltou a considerar o acontecimento,com que historiadores e jornalistas trabalham. O que diferencia este traba-lho, para Jean Laccouture, é o nível de escuta. O jornalista faz uma escutamais localizada, o historiador, mais abrangente. O primeiro, capta o momen-to. O segundo, a duração. Os dois, no entanto, trabalham sobre uma cons-trução a partir de um objeto, seja ele o jornalismo – e a notícia – ou a históriae o objeto de estudo que será enfocado.

Ainda olhando-se a questão do lado da história, podemos tomar a posi-ção de Alzira Alves de Abreu, que trabalha com jornais como fontes dealgumas de suas pesquisas e para quem “os historiadores limitaram-se a re-conhecer a importância dos jornais para a pesquisa daqueles temas – comomovimentos operários, sindicatos, partidos políticos, correntes do pensa-mento, etc. – que nem sempre apresentam fontes documentais escritas”82 .Neste caso, observa, os jornais constituir-se-iam em único recurso disponí-vel.

Tal como Laccouture, Alzira Alves destaca a questão da reprodução, pelamídia, da ideologia dominante e ressalta, no caso do Brasil, a submissão daimprensa – e dos meios de comunicação – à censura, durante os períodosautoritários. Mesmo assim, entende que “o historiador não pode mais igno-rar que a mídia é parte integrante do jogo político da própria construção doacontecimento histórico”83 .

A crítica à superficialidade histórica, que se centrava mais nas pessoas,sobretudo em se tratando de história política, é uma dívida que temos paracom a Escola dos Annales. René Remond84 , por exemplo, nos lembra que ahistória política, por ser considerada superficial e centrada no acontecimen-to, acabou no ostracismo, a partir da insurgência contra ela provocada pelaEscola dos Annales, o que nos remete, novamente, à questão dos jornais edo jornalismo, também vistos como superficiais, que apenas arranhavam oreal.

Alinhava-se contra este tipo de história todos os argumentos contrários.Ela era elitista, aristocrática, além de basear-se em pessoas, não em fatos.Era, também, reprodutora dos interesses de grupos que dominavam o poder,subjetiva, idealista e, finalmente, no dizer de Barrès “uma pequena coisa na

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superfície do real”. A história política era, então, vista como a soma de todosos defeitos que uma história poderia ter. Uniam-se, então, as vozes contrári-as à história política, como um todo, e à crítica ao acontecimento como fatohistórico. Em função dessa crítica, a história política – e o acontecimento –passou por um período de grande ostracismo que, no entanto, foi sendo, aospoucos, superado e chegando novamente a um novo viço.

Mesmo com o reflorescimento do político e do acontecimento, Marietade Moraes Ferreira considera que “embora os jornais constituam uma formeprimária fundamental para as pesquisas dos historiadores e cientistas soci-ais, seu uso tem-se limitado a trabalhos que os enfocam apenas como ummeio para abordar um determinado tema”85 .

Autora de dois alentados trabalhos envolvendo o jornal O Estado de S.Paulo, Maria Helena Capelato, em outra publicação em que discute a relaçãoentre imprensa e história do Brasil, afirma que a grande imprensa “é e sem-pre foi porta-voz das elites”86 , assinalando que há outros tipos de imprensaque expressam projetos e reivindicações de trabalhadores e de gruposminoritários. Por isso, a historiadora considera os jornais como fontes valio-sas para a reconstrução da história dos movimentos sociais.

Ao considerar esta importância, situando a imprensa na história do Bra-sil, Capelato comenta:

“Manancial dos mais férteis para o conhecimento do passado, aimprensa possibilita ao historiador acompanhar o percurso dos ho-mens através dos tempos. O periódico, antes considerado fonte sus-peita e de pouca importância, já é reconhecido como material depesquisa valioso para o estudo de uma época. A imprensa registra,comenta e participa da história. Através dela se trava uma constantebatalha pela conquista dos corações e mentes (...) Compete ao histo-riador reconstituir os lances e peripécias dessa batalha cotidiana naqual se envolvem múltiplos personagens”87 .

O que a historiadora recomenda é que o pesquisador, de início, se façaalgumas perguntas, enquadrando, nelas, a ação do periódico que está servin-do como fonte de sua pesquisa. As perguntas são: Quem são seus proprietá-rios? A quem se dirige? Com que objetivos e quais os recursos utilizados nabatalha pela conquista dos corações e mentes? A partir desse conhecimento,no entender de Capelato, “é possível delinear um perfil provisório do perió-dico eleito como objeto-fonte de estudo. O primeiro levantamento fornecepistas para definir os caminhos a serem investigados”88 .

No caso do jornal Posição, que é objeto do nosso estudo, as perguntaspodem ser respondidas e, assim, dar um delineamento ao que esta pesquisa

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se propõe. No caso da primeira questão, os proprietários do jornal eram ospróprios jornalistas que o editavam, tendo à frente Jô Amado e RogérioMedeiros, e se dirigia a um público que não tinha nos jornais da chamadagrande mídia a informação que procurava – sobre os movimentos sociais,críticas ao regime político, críticas à economia, etc. No caso da terceira ques-tão, há, de início, apenas uma resposta parcial, uma vez que é, exatamente, ocerne da hipótese aqui posta, de construção de uma nova hegemonia. Esteera o objetivo. Os meios eram o próprio impresso, seu discurso e abordagemque fazia de um contexto que era visto sob outra ótica pela mídia dominante– e controlada.

Citando José Honório Rodrigues, que considera o jornal uma fonte sus-peita, Maria Helena Capelato afirma que este conceito merece uma revisão eexplica a evolução da própria história, hoje vista como uma construção: “Opassado é, sem dúvida, o objeto do historiador, mas hoje se admite que esseobjeto é construído e reconstruído tendo em vista as necessidades e pers-pectivas do presente. Nas leituras e releituras do passado há constantes per-das e ressurreições”89 .

E é ainda a historiadora quem, em 1988, quando seu livro foi publicado,assinala:

“Até a primeira metade deste século, os historiadores brasileirosassumiram duas posturas distintas com relação ao documento-jor-nal: o desprezo por considerá-lo fonte suspeita, ou o enaltecimentopor encará-lo como repositório da verdade. Neste último caso, a no-tícia era concebida como relato fidedigno do fato. As duas posturassão contestáveis. O jornal não é um transmissor imparcial e neutrodos acontecimentos e tampouco uma fonte desprezível porquepermeada pela subjetividade”90 .

A visão que os estudiosos e teóricos da comunicação e do jornalismo têmconverge com a da historiadora. Hoje, as notícias são vistas como uma cons-trução, questionando-se sua objetividade e sua imparcialidade, esta últimavista mais como um ritual estratégico adotado pelos jornalistas como formade se precaver contra os efeitos que uma determinada notícia pode provo-car91 . Jornalismo e história, neste caso, convergem, já que os dois apresen-tam uma construção do real, não o próprio real, o que tem suporte no pres-suposto que a cultura é uma construção e jornal e história estão nela integra-dos, portanto, são também uma construção.

Aliás, a questão da objetividade, na história e no jornalismo, é muito bemabordada por Maria Helena Capelato:

“O historiador de hoje dessacralizou os fatos e sequer admite que

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eles sejam a base da objetividade, pois reconhece que eles são fabri-cados e não dados. (...) O historiador mantém o compromisso debuscar a verdade, mas há muitas verdades. Por essa razão constataque é impossível ser completamente objetivo; a objetividade conti-nua sendo um critério fundamental da análise histórica, mas o seuculto mítico já é questionado. Algo semelhante ocorreu no campo daimprensa onde também se reverenciou a objetividade. A maioria dosjornalistas admite hoje que o fato jornalístico é construído sendo,pois, a objetividade relativa”92 .

A superação dos problemas decorrentes da subjetividade – que ocorre emambos os lados – se dá, no entender de Capelato, com o desenvolvimento deum trabalho com “método rigoroso, tratamento adequado da fonte e refle-xão teórica”, para que não se repita, para o leitor, o que o jornal já divulgou,muito atrasado e sem o mesmo charme. Este é o desafio que esta pesquisaimpõe: mostrar a atuação de um jornal de oposição, contextualizando e mos-trando como é que ele, no período de sua circulação, agiu de forma contra-hegemônica e, retornando ao início deste capítulo, perseguiu uma utopia, ademocracia.

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Notas1 JAMESON, Frederic. Politics of utopia. New Left Review, Londres, nº 25, janeiro-

fevereiro de 20042 ANDERSON, Perry. River of time. New Left Review, Londres, nº 26, março-abril de

2004, p. 67 a 773 SILVA, Golbery do Couto. Conjuntura política nacional. Rio de Janeiro, José Olympio,

19814 Para uma bibliografia abrangente sobre o regime militar ver FICO, Carlos. Além do

golpe. Rio de Janeiro, Record, 20045 KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários: a imprensa alternativa no

Brasil 1964-1980. São Paulo, Edusp, 2003.6 GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo

do Livro, s/d.7 SKIDMORE, Thomas. A lenta via brasileira para a democratização, in STEPAN,

Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 19858 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,

Editora FGV, 1997, 4ª edição, p. 3719 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,

Editora FGV, 1997, 4ª edição, p. 36710 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,

Editora FGV, 1997, p. 39111 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in

D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Dossiê Geisel, Rio de Janeiro, EditoraFGV, 2002, 3 edição, p. 35

12 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,Editora FGV, 1997, 4ª edição, p. 26

13 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,Editora FGV, 1997, p. 27

14 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,Editora FGV, 1997, p. 27

15 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,Editora FGV, 1997, p. 27

16 SKIDMORE, Thomas. A lenta via brasileira para a democratização, in STEPAN,Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p. 39

17 LAMOUNIER, Bolívar. O “Brasil autoritário” revisitado: o impacto das eleiçõessobre a abertura, in STEPAN, Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paze Terra, 1985, p. 102-103

18 COUTO E SILVA, Golbery. Conjuntura política nacional, o poder executivo egeopolítica do Brasil. Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1981

19 COUTO E SILVA, Golbery. Conjuntura política nacional, o poder executivo egeopolítica do Brasil. Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1981, p. 25

20 COUTO E SILVA, Golbery. Conjuntura política nacional, o poder executivo egeopolítica do Brasil. Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1981, p. 27

21 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, inD´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Dossiê Geisel, Rio de Janeiro, Editora

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FGV, 2002, 3 edição, p. 32-3322 SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8º

edição, p. 32123 SKIDMORE, Thomas Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8º

edição, p. 27324 SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8º

edição, p. 273 e 27425 DELLA CAVA. Ralph. A igreja e a abertura, 1974-1985, in STEPAN, Alfred (Org).

Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p.241-24326 DELLA CAVA, Ralph. A igreja e a abertura, 1974-1985, in STEPAN, Alfred (Org).

Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p.24227 GRAMSC, Antônio. Os intelectuais e a formação da cultura. São Paulo, Círculo do

Livro, sd, p. 7-1428 DELLA CAVA, Ralph. A igreja e a abertura, 1974-1985, in STEPAN, Alfred (Org).

Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p.24729 SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8º

edição, p. 36330 SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8º

edição, p. 36331 SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8º

edição, p. 36632 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in

D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Dossiê Geisel, Rio de Janeiro, EditoraFGV, 2002, 3 edição, p. 33

33 SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8ºedição, p. 366

34 ARAÚJO, Maria Paula Nascimento. A luta democrática contra o regime militar nadécada de 1970, in AARÃO REIS, Daniel, RIDENTI, Marcelo, e SÁ MOTTA, Rodrigo Pato.O golpe e a ditadura militar 40 anos depois (1964-2004). São Paulo, Edusc, 2004, p. 167

35 ARAÚJO, Maria Paula Nascimento. A luta democrática contra o regime militar nadécada de 1970, in AARÃO REIS, Daniel, RIDENTI, Marcelo, e SÁ MOTTA, Rodrigo Pato.O golpe e a ditadura militar 40 anos depois (1964-2004). São Paulo, Edusc, 2004, p. 167

36 MAINWARING, Scott. Os movimentos populares de base e a luta pela democra-cia: Nova Iguaçu, in STEPAN, Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paze Terra, 1985,

37 MAINWARING, Scott. Os movimentos populares de base e a luta pela democra-cia: Nova Iguaçu, in STEPAN, Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paze Terra, 1985, p. 275

38 SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Castelo a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8ºedição, p. 359

39 KECK, Margaret E. O “novo sindicalismo” na transição brasileira, in STEPAN,Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p. 383

40 KECK, Margaret E. O “novo sindicalismo” na transição brasileira, in STEPAN,Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p. 388

41 KECK, Margaret E. O “novo sindicalismo” na transição brasileira, in STEPAN,Alfred (Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p. 388

42 KECK, Margaret E. O “novo sindicalismo” na transição brasileira, in STEPAN,

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Alfred (Org). Democratizando o Brasil,. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, p. 39343 SKIDMORE, Thomas. De Castello a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8ª edição44 AARÃO Reis, Daniel. Ditadura militar, esquerdas e sociedade. Rio de Janeiro, Jorge

Zahar Editores, 2001.45 FICO, Carlos. Além do golpe. Rio de Janeiro, Record, 2004, p. 9046 FICO, Carlos. Além do golpe. Rio de Janeiro, Record, 2004.47 SMITH, Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura

no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997.48 SMITH, Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura

no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997, p. 4649 KUSHNIR. Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição

de 1988. São Paulo, Boitempo, 2004.50 KUSHNIR. Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição

de 1988. São Paulo, Boitempo, 2004, p. 11751 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CAS-

TRO, Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV,2002, 3ª edição

52 KUSHNIR. Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituiçãode 1988. São Paulo, Boitempo, 2004, p. 122

53 KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituiçãode 1988. São Paulo, Boitempo, 2004, p. 124

54 REZENDE, Maria José. A ditadura militar no Brasil: 1964-1984 – Repressão epretensão de legitimidade. Londrina, Editora UEL, 2001.

55 AQUINO, Maria Aparecida de. Censura, imprensa, Estado autoritário (1968-1978).São Paulo, Edusc, 1999, p. 15

56 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CAS-TRO, Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV,2002, 3ª edição

57 SMITH, Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censurano Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997, p. 45

58 Na verdade, não se tratava da autocensura como a iniciativa dos jornais de não publicaruma determinada notícia, mas da aceitação da censura do governo, que ditava o que podia serpublicado. Este procedimento acabou ficando conhecido no meio jornalístico como autocensurae é este o sentido usado por Anne Maria Smith.

59 Os “bilhetinhos” eram como ficaram conhecidas as proibições emitidas pela PolíciaFederal e entregue ao responsável pela redação dos jornais e das outras mídias. Ele, invariavel-mente, começava com um “De ordem superior, fica proibido...” e no jornal A Gazeta, deVitória, acabou por ocupar um grande quadro na redação.

60 KUSHNIR. Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituiçãode 1988. São Paulo, Boitempo, 2004, p. 194

61 KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituiçãode 1988. São Paulo, Boitempo, 2004, p. 194

62 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CAS-TRO, Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV,2002, 3ª edição, p. 27

63 D´Araújo, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CASTRO,Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002,

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3ª edição, p. 2864 SMITH, Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura

no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997, p. 45, p. 5765 SMITH. Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura

no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997, p. 5866 SMITH, Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura

no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997, p. 7867 ABREU, Alzira Alves de. As telecomunicações no Brasil sob a ótica do governo

Geisel, in CASTRO, Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina. Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, EditoraFGV, 2002, 3ª edição, p. 154

68 GURGEL, Antônio de Pádua. Dr. Carlos, um homem do campo e sua relação como poder. Vitória, Contexto, 2000.

69 PEREIRA, Guilherme Henrique. Política industrial e localização de investimentose o caso do Espírito Santo. Vitória, Edufes, 1998

70 ROCHA, Haroldo Correa. Formação Econômica do Espírito Santo, in GUALBERTO,João e DAVE, Eduardo (Orgs). Inovações organizacionais e relações de trabalho – ensai-os sobre o Espírito Santo. Vitória, Edufes, 1998.

71 SILVA, Álvaro José e RESENDE, Lino Geraldo. A ferro e a fogo, a trajetória de umsetor. Vitória, Sindifer, 2004, p. 33

72 SILVA, Álvaro José e RESENDE, Lino Geraldo. A ferro e a fogo, a trajetória de umsetor. Vitória, Sindifer, 2004, p. 37

73 SILVA, Álvaro José e RESENDE, Lino Geraldo. A ferro e a fogo, a trajetória de umsetor. Vitória, Sindifer, 2004, p. 39.

74 D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO, Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro,Editora FGV, 1997, 4ª edição

75 SILVA, Álvaro José e RESENDE, Lino Geraldo. A ferro e a fogo, a trajetória de umsetor. Vitória, Sindifer, 2004. p. 39

76 FREITAS FILHO, Domingos. Comunicação e participação: Os meios de comuni-cação de massa como sujeitos políticos. Tese de doutorado apresentada à Universidade deSão Paulo, São Paulo, 1988, p. 40

77 FREITAS FILHO, Domingos. Comunicação e participação: Os meios de comuni-cação de massa como sujeitos políticos. Tese de doutorado apresentada à Universidade deSão Paulo, São Paulo, 1988, p. 41

78 KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários nos tempos da imprensa alter-nativa. São Paulo, Edusp, 2003, p. 35

79 Entrevista com Jô Amado, em 21-12-200580 LACCOUTURE, Jean. A história imediata, in LE GOFF, Jacques. A história nova.

São Paulo, Martins Fontes, 200181 LACCOUTURE, Jean. A história imediata, in LE GOFF, Jacques. A história nova.

São Paulo, Martins Fontes, 2001, p. 23182 ABREU, Alzira Alves et alli. A imprensa em transição. Rio de Janeiro, Editora FGV,

1996, p. 883 ABREU, Alzira Alves et alli. A imprensa em transição. Rio de Janeiro, Editora FGV,

1996, p. 984 REMOND, René. Uma história presente. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2003, 2ª edição85 FERREIRA, Marieta de Moraes. A reforma do Jornal do Brasil, in ABREU, Alzira

Alves de et alli. A imprensa em transição, Rio de Janeiro, Editora FGV, 1996, 1ª edição, p. 141

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86 CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e história do Brasil. São Paulo, Contexto, 1988, p. 1087 CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e história do Brasil. São Paulo, Contexto, 1988, p. 1388 CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e história do Brasil. São Paulo, Contexto, 1988, p. 1489 CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e história do Brasil. São Paulo, Contexto, 1988, p. 2090 CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e história do Brasil. São Paulo, Contexto, 1988, p. 2191 Para uma ampla discussão sobre este assunto ver Nélson Traquina (Org). Jornalismo:

Questões, teorias e “estórias”. Lisboa, Vega Editora, 1999, 2ª edição, e O poder do jornalis-mo. Análise de textos da Teoria do Agendamento. Coimbra, Minerva, 2000 e O que éjornalismo. Lisboa, Quimera, 2002.

92 CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e história do Brasil. São Paulo, Contexto, 1988, p. 22

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“ O uso d a forç a é u m a c o n d i ç ã o n e c ess á ri a , m a sn ã o su fi c i e nt e p a r a a exist ê n c i a d o p o d e r p o líti c o ” .

N orb e rto Bo b b io

estudioso que virar-se e olhar o passado mais recente, sobretu-do o período em que o Brasil foi governado por sucessivos ge-nerais, pode achar que a afirmação de Norberto Bobbio, emepígrafe, não tem muita razão de ser. Afinal o regime militarsempre foi apresentado como tendo se mantido pelo uso da

força. É inegável que ela foi usada – e muito usada – espalhando o medo e,com isso, contribuindo para que a sociedade se acomodasse. Mas esta, comoressaltam autores como Carlos Fico, Caio Navarro de Toledo e Daniel AarãoReis1 , é apenas parte da explicação para a permanência do regime militar.

O que muitos historiadores têm discutido, lançando um novo olhar sobreo regime militar, é que, se de um lado ele usou a repressão para se manter,buscou, também, a legitimação por outros meios, inclusive recorrendo à pro-paganda política. Há, ainda, um outro aspecto que vem sendo levado emconsideração por uma vertente mais contemporânea, que é discutir – oulevantar – a questão do apoio que a ditadura recebeu de parte da população.Em alguns momentos, como nos lembra Aarão Reis, o regime contou comamplo apoio e uma das explicações para ele está no fato de amplos segmen-tos sociais terem se beneficiado do crescimento econômico experimentadopelo Brasil, principalmente durante o Governo Médici2 .

Ao se discutir o regime – e a repressão por ele encetada – um outro as-pecto a ser levada em consideração é o conjunto de forças que levaram aogolpe. Como ressalta René Armand Dreifuss3 , militares e civis se uniram,muito antes, para construir uma nova hegemonia, no sentido dado ao termopor Antonio Gramsci4 . Não faltaram, nesta construção, o trabalho e a açãode intelectuais orgânicos que não só difundiram uma idéia, mas ajudaram aformulá-la, dando unidade a um grupo heterogêneo. Deste grupo destaca-seo nome do general Golbery do Couto e Silva, que é recorrente durante o

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regime militar, seja agindo a favor ou contra grupos no poder. O grupo depoder buscou, em todos os momentos, se legitimar e ampliar sua hegemonia,cobrindo todos os aspectos do espectro político e social do Brasil, comomostram os trabalhos de Suzely Mathias, Maria José Rezende e Carlos Fico5 .

Os militares, em primeiro lugar, não deram o golpe sozinhos. Eles ti-nham, como mostra Dreifuss e uma vasta literatura sobre o assunto, apoiocivil, nas elites e fora dela. Um dos apoios era da Igreja Católica que, maistarde, acabou ficando contra o regime, ou pelo menos parte dela ficou. Opróprio contexto do golpe passa por uma atualização histórica, com publica-ções sobre o Governo Goulart e reflexões sobre o momento em que umconjunto de forças civis-militares romperam a normalidade constitucional einstalaram um novo regime do país.

Em uma gênese do golpe, recorrendo à literatura mais recente e ao quefoi publicado há mais tempo, podemos ver que, se de um lado havia apoio deexpressivos segmentos da sociedade ao Governo Goulart e às reformas porele defendidas, também havia um amplo movimento contrário a estas mes-mas reformas, vindas de segmentos mais conservadores da sociedade. Naraiz do golpe, nos mostra Daniel Aarão Reis, estava, de um lado, uma junçãode militares e civis que viam nas reformas de Jango a comunização do país.De outro, movimentos sociais que desejavam a mudança e que foramradicalizando a linguagem, passando a defender a imposição dessas mudan-ças “na marra”6 e acabaram criando, nos mesmos moldes que ocorreria maistarde, durante o regime militar, a utopia do impasse.

Assim, sob uma ótica, o golpe civil-militar foi um movimento para “sal-var” a democracia, ameaçada por Goulart e pelos que os apoiavam. Soboutro olhar – e é este o que tem prevalecido na historiografia brasileira – ogolpe foi isso mesmo, um golpe que acabou com a democracia e instalou nopaís uma ditadura que durou 20 anos. Hoje, o que se pode dizer, de acordocom Carlos Fico é que “a partir de 1964, gastou-se um projeto repressivoglobal, fundamentado na perspectiva da “utopia autoritária”, segundo a qualseria possível eliminar o comunismo, a “subversão”, a corrupção, etc. queimpediriam a caminhada do Brasil rumo ao seu destino de “país do futuro”7 .

O regime brasileiro, como ressalta muito bem o general Golbery do Coutoe Silva trabalhava com vertentes claras, com base na Doutrina de SegurançaNacional, que o próprio Golbery ajudou a desenvolver, e dividia sua ação, apartir do conceito de poder nacional, em áreas distintas, que iam da militar àpsicossocial. O objetivo era o de tornar o regime hegemônico e, com isso,construir uma base que lhe desse longa duração. A ação do Governo – e doregime – insere-se dentro do que Gramsci afirma: “(...) não pode existir des-

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truição, negação, sem uma implícita construção, afirmação, e não em senti-do “metafísico”, mas praticamente, isto é, politicamente”8 .

Nesse sentido, o regime realizou todo um trabalho de construção, bus-cando transformar-se não apenas em dominante, mas hegemônico, o que feztomando como base os princípios consagrados na Doutrina de SegurançaNacional. É com base na constatação de que havia uma hegemonia, decor-rente de uma construção continuada, e que, como muito bem assinalaGramsci, esta hegemonia nunca é total, abrindo-se, sempre, para a existên-cia de grupos que a ela não se submetem, que se pode falar, principalmenteno período de 1976-1979, quando o jornal Posição circulava, de um exercí-cio contra-hegemônico, do qual participou e ao qual, no caso específico doEspírito Santo, deu divulgação e repercussão, graças ao envolvimento deintelectuais orgânicos que investiram na busca de uma transformação políti-ca do país, perseguindo uma utopia, a democracia, e se contraponto à “uto-pia autoritária” do regime.

Podemos falar, em relação ao pretendido pelo regime, no que BronislawBaczko chama de imaginário social. Baczko diz:

“Todo poder busca monopolizar certos emblemas e controlar,quando não dirigir, os costumes dos outros. Deste modo, o exercíciodo poder, em especial do poder político, passa pelo imagináriocoletivo. Exercer um poder simbólico não significa agregar o ilusórioa um poderio “real”, senão multiplicar e reforçar uma dominaçãoefetiva pela apropriação de símbolos, pela conjugação das relações edo poderio”9 .

Baczko vai ao encontro do que afirma Noberto Bobbio sobre a força nãoser a única condição de exercício do poder. Mas como frisa o próprio Bobbio,em última análise o Estado se impõe mesmo é pela força, mesmo que elaseja legítima, assim reconhecida pelos integrantes da sociedade, e simbólica,ajudando a constituir o imaginário social de que nos fala Baczko e que, emúltima análise, é o entranhamento da ideologia nas várias camadas sociais,cimentando uma crença que se torna senso comum e dá a estes estratos umavisão de mundo que os une neste imaginário, como muito bem lembra Gramsci.

Hegemonia, propaganda e distensãoA ditadura, como mostra a ampla bibliografia sobre o assunto, uniu ao

longo dos 20 anos em que esteve no poder, a repressão, no seu sentido maislato, à pura propaganda política, com um discurso de manutenção da de-mocracia, de regime transitório com forte conteúdo ético, que promoveriauma rápida limpeza no Brasil, devolvendo o poder aos civis. Como entender

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estas duas vertentes da ação do regime? Não há uma resposta simples e fácilpara a pergunta. Há, no entanto, explicações, começando pela ideologia queperpassava o movimento militar que assumiu – no início junto com os civis– o poder. Esta era a ideologia de segurança nacional, gestada na EscolaSuperior de Guerra (ESG) ao longo de anos e decorria de uma das mais ricasvertentes do pensamento brasileiro, que é o pensamento autoritário desen-volvido sobretudo por Oliveira Viana e Alberto Torres10 .

Correndo o risco de uma simplificação, este pensamento pode sercondensado na afirmação de Wanderley Guilherme dos Santos11 da seguintemaneira: Redefine-se a função do poder público – que existe para criar aordem burguesa, e por isso precisa ser forte, e não apenas mantê-la, quandoentão poderia ser fraco. Esta postura foi reforçada a partir de 1964, o que sefaz “pela coação aleatória e generalizada e pelos impedimentos ao desenvol-vimento do conflito político”12 . Este argumento é reforçado por Boris Faustoque vê como principais princípios do autoritarismo brasileiro “o unitarismono plano político, o desenvolvimento econômico promovido pela instalaçãode indústrias estatais de base, o reaparelhamento do Exército, a ampliaçãoem larga escala do sistema educativo, etc.”13 .

A Doutrina de Segurança Nacional, que orientou os militares não só natomada do poder, mas, sobretudo, na busca de fórmulas para sua manuten-ção, forneceu a ideologia em que o regime se baseou para a busca dahegemonia, seja através do combate à “subversão”, que ia ao encontro daíndole pacífica do brasileiro, seja na propaganda política, utilizada para con-vencer que tudo no país ia bem e que vivíamos em uma democracia, seja napressão econômica contra empresas e empresários da mídia ou, mesmo, nacensura – e suas múltiplas faces – que tinham o objetivo de calar as críticase divulgar o que o regime achava que era bom para o povo.

Na ação repressiva no âmbito político, além da cassação e suspensão dosdireitos políticos de líderes políticos expressivos – uma forma de controlar aoposição – o novo regime se esmerou em mudar a legislação, estabelecendocontrole sobre a política, de modo a ficar com uma maioria confortável noCongresso, uma forma de dizer que o regime era democrático. Ao lado daaparência da democracia, a repressão policial continuava. E aumentou coma eclosão da luta armada. Uma multiplicidade de órgãos de repressão, com-binando civis e militares, passou a atuar em todo o país e bastava haver umasuspeita para que alguém fosse preso. Se tal acontecesse, ninguém sabia oque poderia acontecer.

Celso Castro ao estudar os arquivos do SNI durante o Governo Geiselencontrou alusões às prisões e torturas praticadas por sequazes do regime.

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De um relatório do órgão, extraiu o seguinte trecho: “Não há como deixar dereconhecer os excessos (...) que têm sido praticados pelos órgãos de seguran-ça. (...) Seria faltar com a verdade deixar de reconhecer que prisões têm sidofeias sob a forma aparente de seqüestros”14 .

Em relação ao esquema repressivo, Carlos Fico nos chama a atenção parao fato de o SNI ter participação significativa no surgimento da polícia políti-ca da ditadura e de o regime ter construído todo o seu aparato repressivoantes do surgimento da guerrilha, que serviu, no caso, para justificar a ampli-ação da repressão15 . A repressão – tortura, prisões ilegais, morte, persegui-ção política, etc. – admitida com eufemismos por quem estava no poder ouo apoiava e de forma clara pelos que se opuseram ao regime militar levou auma perda de legitimidade, com vários segmentos da sociedade civil – Igre-ja, estudantes, sindicatos, OAB, etc. – a fazerem frente ao regime, critican-do-o. Como observou o general Golbery do Couto e Silva em uma conferên-cia feita na Escola Superior de Guerra16 os militares foram ficando isolados.Era preciso, então, que tomassem a iniciativa de promover a descompressãodo regime, buscando, novamente, o apoio de amplos segmentos sociais e,com isso, caminhando no sentido de sua institucionalização.

Foi neste contexto que surgiu o que Suzely Kalil Mathias chama de “pro-cesso de distensão”, que classifica como uma iniciativa militar. A propósitoda abertura é bom ver o que diz Thomas Skimore: “Geisel e sua equipe nãotinham a intenção de permitir que a oposição chegasse ao poder. Eles imagi-navam uma democracia em que o partido do governo (ou partidos) continu-asse a mandar sem contestação”17 . Geisel, Golbery e grande parte da equipeque compunha o núcleo do novo governo eram remanescentes do esquemaIPES-IBAD, formuladores da “ideologia” que deu origem ao regime militar.Neste sentido, pode-se dizer, com base em Dreifuss18 , que os intelectuaisorgânicos responsáveis pela formulação de uma nova política que se preten-dia hegemônica voltava ao poder com a árdua missão de mudar, mas man-tendo o núcleo do regime, em uma tentativa de manter a hegemonia.

Na consolidação desta hegemonia, o regime precisava de se apresentarcomo legítimo, como decorrente da vontade da própria população. A procu-ra de legitimação foi feita em dois sentidos. Em um deles, no discurso oslíderes do regime sempre se apresentavam como democratas e ao movimen-to que lideravam como tendo raízes democráticas. É este o aspecto aborda-do, por exemplo, pelo estudo de Maria José Rezende19 . Ela recorre aos dis-cursos feitos pelos diversos generais presidentes para mostrar que havia umalinha de coerência neles, mesmo sendo tão diferentes e responsáveis porpolíticas que, às vezes, se opunham.

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Há, em relação ao regime, um aspecto interessante para o qual SuzelyMathias chama a atenção:

“Para os militares o regime não era militar porque era um cidadãoque, no uso pleno de suas responsabilidades e direitos, ocupava omais alto posto de governo; daí seus ocupantes trajarem-se sempre àpaisana, contrastando com outros países que conheceram regimessemelhantes, onde o uniforme militar era parte da pessoa do chefede Estado. O revezamento cumpria também este objetivo: não sequeria caracterizar o regime como ditatorial”20 .

O que Maria José Rezende constata é que, desde o primeiro momento, oregime quis se legitimar. A pesquisadora frisa que o regime “tentou criar umconsenso de que os interesses e os valores defendidos por ele e seu grupo depoder expressavam a totalidade dos grupos sociais”21 , configurando-se, maisuma vez, o trabalho de construção hegemônica, no sentido que lhe dá Anto-nio Gramsci, quando um determinado bloco histórico ascende ao poder equer, a partir dele, construir sua hegemonia mediante a transformação desua ideologia em senso comum.

A busca de legitimidade com base nas regras do próprio regime é reco-nhecida pelo general Golbery do Couto e Silva. Em conferência na EscolaSuperior de Guerra (ESG), já concluído o mandato de Geisel, destacou queum dos objetivos essenciais da abertura política era o de ganhar “suficientegrau de credibilidade quanto às intenções próprias e, pois, ao futuro de todoo processo liberalizante”22 . Ao mesmo tempo, o regime buscava fugir dadualidade onde era visto como o mal, e a oposição, como o bem. A ação deGeisel e Golbery, conforme admitiu na conferência, era o de conferir tons àscores predominantes no cenário nacional, ampliando o leque, mas mantendoo controle do Governo firme.

Assim, a abertura era mostrada como uma forma de proteger a sociedade“no sentido de traçar os limites da liberdade e da abertura que a sociedadesupostamente desejava”23 , observa Maria José Rezende para aduzir, em se-guida, que a ditadura batalhava para construir um consenso. Novamente,aqui, temos um dos tópicos de construção da hegemonia, que é a busca deconsenso entre as classes dominantes e, a partir delas, da criação e difusãode uma ideologia que se torne em senso comum para as classes coadjuvantese subalternas. Gramsci lembra, ao falar sobre Maquiavel e o moderno prínci-pe, que ao governante cabe “identificar as linhas de menor resistência ouracionais para alcançar a obediência dos dirigidos e governados”24 .

Ao buscar aceitação, mediante a tentativa de construção de um consensoe, a partir dele, de manutenção e/ou ampliação de sua hegemonia, o regime

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se apoiava, também, em outro requisito, o de representar a racionalidade quese opunha a irracionalidade dos que lhe eram contrários ou desejavam umnovo caminho para o país. O regime retomava, com isso, uma questãodicotômica que perpassou o discurso de líderes durante toda a história dopaís e que, na verdade, é uma das invariantes do discurso político. Por ela,um lado representa o bem, a ordem, e a oposição, o mal, a desordem. Odiscurso não muda mesmo se tratando dos militares, com o general Geiseldestacando a racionalidade das ações do Governo, o que era demonstradopela eficiência de suas estratégias econômicas, políticas, militares epsicossociais.

A estratégia psicossocial – que abrange, marcadamente, a ação da mídia eda propaganda política - por sinal, era um dos campos que mais preocupavaos militares. Esta preocupação está no cerne da Ideologia de Segurança Na-cional, da qual o general Golbery do Couto e Silva, foi um dos formuladores.Assim, na busca de legitimidade e de aceitação o regime agia em três verten-tes distintas. A primeira delas, e mais visível, foi a repressão política e polici-al. Não deixou, também, de atuar nos controles dos movimentos sociais,procurando evitar manifestações contra o regime e o governo. É o que ocor-ria, por exemplo, com os controles exercidos sobre o movimento estudantil eos sindicatos. No primeiro caso, como observa Helena Bomery25 , o Ministé-rio da Educação e Cultura acompanhava o que ocorria e agia no sentido deamortecer o movimento estudantil, o que, na opinião do ministro da Educa-ção de Geisel, Ney Braga, o regime havia conseguido, já que a grande maio-ria dos estudantes não se engajava na luta política.

No segundo, o Governo se valia da legislação corporativista que o Esta-do Novo havia legado ao país e mantinha os sindicatos e os sindicalistas sobrédea curta, ampliada com o controle das relações entre capital e trabalho,conforme nos lembra Boris Fausto26 . Uma das políticas era, em caso de ma-nifestação contrária ao regime, intervir no sindicato e colocar na sua direçãoalguém mais afinado com o Governo e mais dócil ao poder. As duas açõeseram, às vezes, casadas com a repressão, com prisões de lideranças, umaforma de desestimular, pelo medo, a participação e a contestação ao regime.

Repressão e controle, no entanto, não eram as únicas vertentes usadaspelo poder para buscar legitimidade e conseguir a hegemonia. Um dos ins-trumentos mais usados foi a propaganda política e a televisão foi o canalprincipal utilizado pelo regime para conquistar o imaginário do brasileiro,criando, então, no dizer de Baczko, “representações, símbolos, emblemas,etc., que o legitimam, o engrandecem e que é necessário para assegurar suaproteção”27 . Foi neste sentido que a comunicação do Governo trabalhou,

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principalmente no período mais duro da ditadura, sob o comando da Asses-soria Especial de Relações Públicas (AERP), com mensagens subliminaresque buscavam, exatamente, criar este imaginário, como mostra muito bem apesquisa de Carlos Fico28 .

O trabalho feito pela ditadura pode se inserir dentro do que BronislawBaczko chama de imaginário social. O que ele diz é que “só com o poderestatal instalado, em especial com o poder centralizado, e com a relativaautonomia que se concede ao terreno político, as técnicas de manejo dosimaginários sociais também ganham autonomia e se diferenciam”29 . Os mili-tares, sobretudo os que comandavam a AERP sabiam disso e agiram nosentido de ajudar na criação deste imaginário.

O que ocorre, no dizer do estudioso, é que, nas situações conflitivas,principalmente envolvendo Governo e quem se lhe opõe, houve o desenvol-vimento de novas técnicas competitivas no âmbito do imaginário, que sãousadas para desvalorizar o adversário e valorizar quem está no poder, inclu-sive com a exaltação das instituições por meio de representações magnificadasdelas. O que ocorreu, então, no dizer de Baczko, foi que passamos do sim-ples manejo para a manipulação do imaginário social e esta manipulaçãoassumiu, a cada passo, maior sofisticação e especialização.

Retomando a questão do ponto de vista da teoria marxista, Baczko assi-nala que “uma vez que a burguesia alcança o poder, sua ideologia dissimulaas relações de dominação e de exploração capitalista presente no estado bur-guês como a expressão do interesse geral, a propriedade privada dos meiosde produção como fundamentos da justiça, da moral, etc”30 .

A centralização de que fala Baczko e o dirigismo, sobretudo em relação àidéia já exposta de que, na vertente do pensamento autoritário encarnadopelos que deram o golpe em 1964, uma de suas atribuições era desenvolvero capitalismo e, portanto, uma burguesia nacional, foram os pontos de parti-da para a montagem da propaganda política do regime. De um lado, comoobserva Maria José Rezende, havia um discurso dos ocupantes do poder queprocuravam mostrar o regime como defensor das idéias e ideais do brasileiromédio, e do outro havia, conforme assinala Carlos Fico, a ação específica dapropaganda política, buscando – ou tentando retomar – um clima de otimismo,de forma a envolver os brasileiros na ideologia do regime.

O trabalho feito pelo regime insere-se, então, dentro do que Terry Eagletondiscute quando estuda a ideologia e sua evolução:

“Um poder dominante pode legitimar-se promovendo crenças evalores compatíveis com ele; naturalizando e universalizando taiscrenças de modo a torná-las óbvias e aparentemente inevitáveis; de-

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negrindo idéias que possam desafiá-lo; excluindo formas rivais depensamento, mediante talvez alguma lógica não declarada mas siste-mática; e obscurecendo a realidade social de modo a favorecê-lo”31 .

Ao lado de buscar a criação de um imaginário social onde a ditadura era arepresentação dos anseios da população, estava contribuindo para o desen-volvimento do país e era democrática, o regime entendia que o povo eraignorante e precisava ser preparado para o futuro. “A estratégia psicossocialformulada pela Escola Superior de Guerra e incorporada pelos governosmilitares como um dos seus fundamentos”, afirma Maria José Rezende, “partiada perspectiva de que o povo não sabia e não entendia quais eram, sequer, otraços fundamentais de sua cultura”32 . Foi nesta perspectiva que o regimetrabalhou para preparar as novas gerações, que deveriam aceitar os valoresque os militares achavam os mais adequados para o Brasil.

O que o regime fez, então, seguindo a estratégia constante da Doutrinade Segurança Nacional foi, de acordo com Carlos Fico, uma ação programa-da para se institucionalizar. Ele afirma:

“O recurso à noção de crise moral como explicação para osproblemas brasileiros é uma forma tanto de isolá-los de seu contextopolítico, social e econômico, quanto de justificar a necessidade deuma “ampla reforma moral”, como se propunha a “missão civilizadora”dos militares. No âmbito da “política de comunicação social” da agên-cia de propaganda da ditadura constava explicitamente como diretrizo respeito à ordem moral e espiritual, enquanto campanhas eram ela-boradas visando ao “fortalecimento do caráter nacional”33 .

E quais eram estes valores? Segundo Carlos Fico, amor à pátria, coesãofamiliar, dedicação ao trabalho, dignificação do homem, além de destacar oaspecto pacato e não reativo do brasileiro, propenso à conciliação. E tudoisso era completado pelo papel acrítico da mídia, controlada pela censura,direta e indireta. O que o regime buscava com a sua propaganda era ocultaçãoe não visibilidade34 .

O imaginário “vendido” pela propaganda do regime militar, na formula-ção de Fico, é a do otimismo. Aliás, observa que a ditadura apenas retomouum traço que de há muito era dado como uma das características do brasilei-ro. Nesse sentido, a propaganda reforçou o que, julgavam os comunicólogosdo regime, já era característico do nosso povo. O problema com a propagadado regime – e com ele próprio – era, conforme admite o próprio Fico, que osimbólico, o imaginário vendidos eram falsos, pelo menos no que se relacio-na ao aspecto político.

Quem se opunha ao regime, na ótica do poder, era “sempre impatriótico,

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já que a grandiosidade brasileira não só é garantia de um futuro promissorpara quem a ignore (e que, portanto, cabe ser esclarecido)”35 . Aqui, entravao racionalismo de que nos fala Maria José Rezende. Quem estava contra oregime era irracional, já que o Governo agia com base científica, planejando,estabelecendo metas, organizando ações e, com isso, procurando passar àpopulação a idéia de modernização do país.

O que a máquina de propaganda do Governo militar fazia era ressaltar –aliás, como toda propaganda e publicidade – o que julgava ser o lado positi-vo do regime. Criou-se, então, uma retórica em que afirmavam exatamente ocontrário do que se tinha. Os valores positivos, moralizantes, verdadeiros,por serem eticamente superiores, tinham de esconder a tortura, prisões, per-seguições políticas, etc. “A estratégia retórica, portanto, consistia em negarpropósitos que, no fundo, eram perseguidos; mas que, admitidos, configura-riam uma situação difícil de enunciar: a ditadura estava fazendo propagandapolítica”36 , afirma Carlos Fico. O encobrimento da verdadeira face do regi-me tinha como objetivo fazer com que sua aceitabilidade aumentasse e, comisso, conseguisse a legitimação que buscou, desde o início, seja por medidasformais – leis, decretos, etc., - ou por ações discursivas, dentre estas desta-cando-se a propaganda política37 e a busca de criação de um novo imagináriosocial e, portanto, da manutenção de uma hegemonia.

A propaganda do regime – combinada com outras ações – foi efetiva e,por um tempo, pelo menos, boa parcela da população o apoiou. Um dosindicadores para este apoio é o número de votos conseguidos pelo partidopolítico do regime, a Arena. Mesmo diante dos argumentos de manipulaçãoeleitoral, da falta de liberdade para o livre debate de idéias, o volume devotos da Arena era expressivo. Em 1974, época do auge do chamado “mila-gre econômico” brasileiro, quando o MDB conseguiu um crescimento nasáreas mais populosas, mesmo assim a Arena manteve um maior número devotos38 .

Há, ainda, em relação à busca de legitimação do Governo, dois outrosaspectos que precisam ser abordados para que haja entendimento das açõesdos militares. Os dois, por sinal, estão diretamente relacionados ao objetodeste trabalho e ao estudo que nos propusemos fazer. Um deles, é a questãoda censura. O outro, é a questão da abertura política, iniciada no Governodo general Ernesto Geisel. Os dois não estão no foco desta pesquisa, mascompõem o seu pano de fundo e, por isso, é preciso que deles se dê, pelomenos de forma rápida, uma visão. Na busca de entender o todo, comorecomenda Gramsci, é preciso mostrar as partes e relacioná-las.

Sobre a chamada “abertura política” é preciso entender, de início, que ela

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não foi uma concessão do regime e que tinha o objetivo claro deinstitucionalizá-lo e, com isso, conseguir o reconhecimento completo do queera e do que fez pelo país. Há, em relação à questão, uma vasta literaturamostrando os vários movimentos da sociedade civil que atuavam no sentidode obter, senão a mudança, pelo menos uma liberalização do regime, que setornaria mais permissivo e deixaria para trás um dos aspectos que o marcou,a repressão.

A constatação da existência e de todo um trabalho feito por estes movi-mentos não invalida, no entanto, a iniciativa do próprio regime de se abrir,mesmo que de forma “lenta, gradual e segura”, conforme queriam os milita-res – ou pelo menos parte deles. Esta iniciativa pode ser depreendida dasações do general Golbery do Couto e Silva e estão explícitas em seu livroConjuntura Política Nacional e Geopolítica do Brasil. Nele, estão reunidosalguns trabalhos do general e, dentre eles, destaca-se a conferência que fezna Escola Superior de Guerra, onde explicitou a sua teoria das sístoles ediástoles que acompanharam o desenvolvimento histórico do Brasil.

Ao investir na abertura o Governo buscava, nas palavras do próprioGolbery “ganhar a despeito de inevitáveis recidivas do poder coercitivo, su-ficiente grau de credibilidade quanto às intenções próprias e, pois, ao futurode todo o processo liberalizante”39 . Reconhecendo que havia, no país, umasituação bipolar, com grupos dentro do próprio poder – e fora dele – sechocando, Golbery admite que uma das intenções da abertura era terminarcom essa bipolaridade, aumentando o espectro de ação do regime e, comisso, lhe permitindo maior flexibilidade de ação.

Ouçamos, nesse sentido, o próprio general Golbery:“A estratégia recomendaria – como requeria, aliás, também, a pró-

pria intenção democratizante – pronta desarticulação do sistemaoposicionista, propiciando-se o surgimento de múltiplas frentes dis-tintas, em relação às quais voltasse a ser possível levar a cabo novotipo, mais ampliado, da mesma manobra em posição central que forapenhor do êxito alcançado na fase anterior. A heterogeneidade inatada oposição facilitaria alcançar-se tal objetivo, nem por isso menosessencial também ao progresso da própria causa democratizante eliberalizadora, tão insistentemente patrocinada pelos setores maisarticulados das elites nacionais”40 .

Que toda a movimentação tinha por objetivo manter o sistema, é o pró-prio general quem o afirma, quase ao concluir sua conferência, depois deconsiderar que o regime teve ocasiões muito melhores para abrir-se e seinstitucionalizar. Ao mesmo tempo, admite que as mudanças decorreram de

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pressões “hoje fortes e quase insuportáveis”, que poderiam “acumular-seaceleradamente pondo em risco a resistência de todo o sistema, nessa enor-me panela de pressão em que, como já teria sido assinalado em tempos pas-sados, veio a transformar-se o organismo nacional, após década e meia decrescente compressão”41 .

A citação de Golbery às elites e ao papel por elas desempenhado é refor-çado no estudo feito por Suzely Mathias, para quem “não fazia parte dosobjetivos das elites identificadas com o regime autoritário transformá-lo, massim alcançar uma institucionalização capaz de tornar este regime – e é preci-so sublinhar regime porque o governo ou seus ocupantes, incluindo as For-ças Armadas, poderiam se retirar – infinito no tempo”42 . E prossegue: “Oprincipal objetivo da distensão era descomprometer os militares com a re-pressão, e sua meta final – aceita pela maioria da elite dirigente – era o esta-belecimento de uma “democracia tutelar” ou “dictablanda”43 .

A questão de determinar se o regime conseguiu ou não o seu intento, nãocabe aqui, pois seria necessário, para afirmar seu sucesso ou negá-lo umoutro e minucioso estudo. O que fica, no entanto, é a constatação da cons-tante busca de legitimidade do regime, que recorreu, em busca de sua conso-lidação, da formação de um imaginário social que o aceitasse, a todos osdispositivos ao seu dispor. Um deles, e muito eficiente, foi a censura. E édela que falamos a seguir.

Uma questão recorrenteAutor de um clássico que fala na manipulação das opiniões, de forma a

tornar aceitável um regime que tudo controla, através de sua onipresença,George Orwell nos dá em 1984, ficção futurista para a época que foi escrita,uma visão de a quanto pode chegar um governo para controlar os seus cida-dãos. O romance, que nos remete a um clima e a um regime opressivos, épessimista e talvez decorra desse pessimismo a afirmação de Orwell que sea liberdade significa alguma coisa, é dizer aos outros o que não querem ou-vir. Retirada de um contexto e trazida para o Brasil para a época do regimemilitar ela nos dá, exatamente, o clima vivido pelo país, sobretudo a partir de1968, quando o poder não queria ouvir verdades – ou pelo menos não dese-java que elas fossem ditas à população.

É com o objetivo de controlar a opinião pública, fazendo com que a po-pulação tivesse conhecimento só daquilo que interessava ao poder que age acensura. Ela, no entanto, não atingiu só a imprensa, sendo bem mais ampla eabrangendo artes, espetáculos, livros, cinema, teatro, música, etc. Legal einstitucionalizada, no que se refere à questão moral, a censura política, seja

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na mídia, seja fora dela, foi ilegal desde o início, agiu de forma coordenada econtou, no caso específico dos jornais, com a colaboração dos patrões e dejornalistas.

A censura foi fundamental, também, para o aparecimento da chamadaimprensa alternativa, como muito bem lembra Thomas Skidmore44 . E é porisso, como forma de entender o contexto da construção da hegemonia e,depois, do trabalho contra-hegemônico feito, inclusive pelo jornal Posição,no Espírito Santo, que torna-se necessário dar um panorama da censura,mostrando como é que ela agia e os mecanismos que usou para conseguir aadesão de empresas jornalísticas e de jornalistas que se alinharam ao regime,ajudando-o a disseminar sua ideologia e na construção da hegemonia.

A questão da censura durante os 20 anos do regime militar está bem co-berta pela literatura histórica e há, sobre ela, uma gama de abordagem. Oque os vários autores deixam presente é a combinação da censura com ou-tras ações governamentais, todas no sentido de passar à população uma rea-lidade, senão risonha, pelo menos cor de rosa, longe dos problemas efetivosque o país vivia. É inegável, como admite Daniel Aarão Reis45 , que houvecrescimento econômico e, dele, muitos se beneficiaram. Também é inegável– e a questão já foi abordada acima – que o regime contava com apoiadoresnos mais variados segmentos da sociedade. Mas existe, ainda, outra questãoinegável, a da atuação da censura como um política do Estado.

Um dos autores a abordar a questão multifacetada da censura e o fato deela ser uma política do Estado é Carlos Fico, destacando que “a censurapolítica à imprensa foi apenas mais um instrumento repressivo”46 . Junto comos outras ações do regime – repressão política, repressão policial e controlesocial – a censura era “indispensável à “utopia autoritária” dos radicais vito-riosos em 1964”47 . É Fico, ainda, quem chama a atenção para o fato de acensura moral ser institucionalizada – e aceita pela população. No caso dacensura política, é diferente. O DCDP, órgão encarregado da censura morale de costumes, também fazia censura política, mas de maneira envergonha-da, já que não considerava esta a sua função.

As afirmações de Carlos Fico vão ao encontro do estudo feito por Ane-Marie Smith48 , que constatou, dentre outras, duas coisas: a primeira, quehavia uma política de Estado em relação à censura e, a segunda, que houve,no caso da censura à imprensa, a colaboração dos patrões, que a aceitaram.No caso da política de Estado, Smith demonstrou haver uma articulação dogoverno para impor o silêncio e que, com este mister, criaram-se mecanis-mos que funcionaram, e bem, por serem impessoais e a mídia não saber,exatamente, de onde vinha a censura, a não ser que era patrocinada pelo

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governo militar.O que Anne-Marie Smith considera é que

“O regime acreditava que uma imprensa fidedigna seria um ins-trumento importante para garantir o êxito do seu empenho em legiti-mar-se. Alguém precisava proclamar as conquistas do regime (...) e aimprensa poderia ser um forte aliado para a disseminação dessa in-formação (embora, ao mesmo tempo, uma ameaça se ela se pusesse aquestionar ou criticar os custos sociais dessas realizações”49 .

Em busca de legitimação, o governo, para obtê-la, passou a controlar aimprensa, silenciando-a e às críticas ao regime, uma questão muito bem es-tudada por Beatriz Kushnir50 , que aponta a institucionalização da censura apartir do Governo Médici. Ela vê a base da censura política aos jornais e àmídia no decreto lei 1077, de 1970, que teria autorizado o Governo a exer-cer este tipo de atividade. O entendimento de Kushnir, no entanto, é contes-tado por Anne Smith e por Carlos Fico. Os dois dizem que o decreto regula-va a censura aos espetáculos e diversões, não à imprensa, daí a trataremcomo ilegal. A discussão sobre a base legal da censura, ou se era ilegal, nãocabe nesta pesquisa. O que fica patente, no entanto, tome-se o ponto devista de Kushnir, de Smith ou de Fico é que a censura foi, sim, uma políticado Estado. Veja-se o que nos diz Kushnir:

“Ao apontar um árbitro, o ministro da Justiça no 1077-70 pareceiluminar uma instância superior reguladora de qualquer desmando,um locus apaziguador que impedisse o descalabro. Talvez essa nãoseja a melhor leitura. Creio que, no fundo, o que o decreto esclareceé que quem dita as regras da censura é o ministro da Justiça. Portantocensura é uma questão de Estado, com atuação política na execuçãodas medidas”51 .

A existência de uma articulação da censura, com o comando central doministro da Justiça, é reforçada com a leitura feita nos arquivos do presiden-te Geisel, relatada por Maria Celina D´Araújo52 . Beatriz Kushnir, por suavez, acaba com o argumento de não ter havido uma orquestração da censu-ra, que atuava junto à imprensa, mas também, junto às artes e espetáculos.“Isso permite a reflexão de que a censura jamais foi caótica e que os censo-res tinham conhecimento e voz de comando acerca da direção a tomar”53 ,afirma.

A questão do centro da censura pode ser visto, também, no estudo deMaria Aparecida de Aquino sobre os jornais O Estado de São Paulo e Movi-mento, que receberam censura prévia durante um bom tempo. No caso doEstadão – como o jornal é conhecido no meio jornalístico -, um censor fica-

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va dentro do jornal, mas reportava-se a Brasília. No caso do Movimento, acensura era feita na Polícia Federal, na capital federal. É de Aquino a afirma-ção:

“Encarava-se como necessário o controle da informação a serdivulgada, para preservar a imagem do regime, num exercício deocultação que passa, inclusive, pela negação de visibilidade, ao lei-tor, de suas próprias condições de vida. Afinal, nada pode ser mais“subversivo” do que enxergar a si próprio!”54 .

O levantamento de Aquino prova com números que a censura tinha umsentido e se preocupava mais com alguns assuntos que outros, embora tenhasido mais rigorosa com Movimento, um integrante da chamada imprensaalternativa, do que com O Estado de São Paulo, jornal tradicional e quehavia apoiado o movimento civil-militar que acabou depondo o presidenteJoão Goulart, mas que tinha se transformado em um crítico do Governo. Ojornal foi, também, um dos poucos a não se impor a censura prévia.

Quando Daniel Aarão Reis fala em apoio de segmentos da sociedade civilao regime militar, ele não está se referindo, diretamente, aos empresários dacomunicação. Mas, neste caso, a afirmativa se encaixa com perfeição. Basta,para comprová-lo uma olhada no arquivo deixado pelo penúltimo dos presi-dentes militares que o Brasil teve, o general Ernesto Geisel. Ao estudar oarquivo do Ministério da Justiça, Maria Celina D´Araújo55 mostra as articu-lações feias pelo ministro Armando Falcão junto aos empresários da mídiapara conseguir direcionar o noticiário no sentido que o governo desejava.Explicitamente, está citado o empresário Roberto Marinho, dono da RedeGlobo, que é dado como um colaborador do regime.

A questão, no entanto, já havia sido abordada antes por Anne-Marie Smith,que chegou ao Brasil para estudar a questão da censura com a vantagem denão ter tido um envolvimento direto com ela, o que lhe deu uma visão dife-renciada do problema. É dela, por sinal, a afirmação categórica de que “agrande imprensa quase nunca foi censurada formalmente; em vez disso ha-via um acordo de cavalheiros – ou assim alegavam as “autoridades constitu-ídas”56 . É com este acordo de cavalheiros, que ela vê a questão daautocensura57 , personalizada pelos “bilhetinhos”58 que eram entregues àsredações com a recomendação dos assuntos que não deveriam ser publica-dos.

A crítica de Smith é no sentido de não ter havido, por parte dos empresá-rios de comunicação, uma reação à censura, consubstanciada, neste caso, nachamada autocensura, o que permitia, inclusive, ao governo militar negar asua existência. Se nos foros internacionais o assunto era debatido, no Brasil,

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havia sobre ele um grande silêncio, até porque dizer que havia censura nopaís era um dos assuntos censurados. Demonstrando mais claramente a po-sição dos jornais, Beatriz Kushnir relata a situação da Folha de São Paulo eo depoimento que lhe deu o editor de então, jornalista Boris Casoy. A direçãoda empresa optou por fazer o jogo do governo militar, recebendo as instruçõesdo DPF acerca do que publicar59 .

Outro depoimento confirmatório do alinhamento dos patrões vem dojornalista Alberto Dines, então dirigindo o Jornal do Brasil. De acordo comKushnir, Dines afirmou, a propósito dos 10 anos do AI 5 em 1978:

(...) a direção me convocou para receber instruções. O Jornal doBrasil não pretendia opor-se a eles, causar qualquer problema. Entãopediu licença à direção – longo dos censores evidentemente – parame conceder o direito de que pelo menos nesta primeira edição doJornal do Brasil sob censura fosse registrada nossa resistência”60 .

Ao relatar a questão da censura decorrente da atuação do ministro Ar-mando Falcão, Maria Celina D´Araújo afirma:

“A censura ficaria toda centralizada no Ministério da Justiça, quefaria reuniões secretas com os ministros militares e o SNI. Essas de-cisões foram aprovadas por Geisel. Ruy Mesquita, de acordo com orelato do ministro, não aceitava a censura, autocensura ou censor.Falcão acabou trocando o censor de O Estado de São Paulo por um“melhor e mais bem pago”, como compensação pelas barganhas deMesquita. Enquanto isso, Roberto Marinho se prontificava a articu-lar reunião com empresários para elogiar a política econômica dogoverno”61 .

Evidenciava-se, assim, não só o apoio dos empresários de comunicaçãoao regime militar, mas a própria ação do governo no sentido de buscar esteapoio, inclusive por meio de pressões, o que foi feito, por exemplo, com oJornal do Brasil, pelo próprio Armando Falcão ao reclamar das críticas injus-tas feitas pelo jornal ao regime, em encontro com um dos proprietários dojornal. Nascimento Brito antes já havia se reunido com o ministro do Exér-cito com a mesma finalidade62 .

Além da censura, o governo tinha outros meios de se impor às empresasde comunicação e, talvez aí é que esteja o verdadeiro sentido da colabora-ção. Um desses meios era o financeiro. Ao analisar a questão no seu trabalho,Anne-Marie Smith observa que considerando as baixas tiragens dos jornaisbrasileiros, as receitas vinham mais da publicidade que da venda dos exem-plares. O padrão internacional era de 50% das receitas eram gerada pelavenda dos exemplares e os outros 50% pela publicidade. No caso brasileiro,

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a publicidade era responsável por dois terços da receita das empresasjornalística e, em alguns casos, chegava próximo a 80% de todo ofaturamento63 .

A estrutura de receita dos jornais os deixava dependente dos grandesanunciantes e à pressão do governo. “O que mais interessa no caso do Brasilfoi o extraordinário peso da publicidade oficial na geração da receita dosjornais, a qual foi estimada em 15 a 30% da receita de muitos jornais impor-tantes”64 , afirma Smith. Dessa forma, o governo podia exercer pressão sobreas empresas, ameaçando-as com a retirada de publicidade. Podia, inclusive,agir no sentido de retirar a publicidade privada, já que as empresas privadastambém dependiam do governo.

Ainda sobre a pressão contra empresas, é esclarecedor ver o que afirmaSmith ao abordar a questão, relacionando-a com as empresas jornalísticas oude mídia. Segundo ela, “tendo em vista a extensa atuação do Estado brasilei-ro nas empresas de todo tipo, inclusive jornalísticas, havia amplas oportuni-dades para a interferência do Estado nas finanças da imprensa: suspender apublicidade, negar empréstimos pelos bancos oficiais, recusar licença deimportação de equipamentos ou papel de imprensa ou confisco de tiragens”65 .

Havia, ainda, um outro fator a considerar e que envolve, novamente, ogoverno militar, que é a expansão das comunicações no Brasil, com a ampli-ação das estações de rádio e televisão, ambas concessões do poder público.Como muitos dos grupos de mídia tinham interesse em concessões, o gover-no podia agir no sentido de obter a adesão dos empresários para a sua políti-ca, o que levava à autocensura. Uma visão de como isso acontecia é dadopelos arquivos relativos ao Ministério da Comunicação no governo do gene-ral Geisel. O ministro Euclides Quandt de Oliveira, de acordo com estudofeito por Alzira Alves de Abreu, tinha como política “prestigiar os governa-dores dos estados”66 , o que significava, no final, a concessão de canais aosgrupos que estivessem alinhados ao regime, o que não era diferente para asempresas de mídia que queriam expandir sua atuação para a área de rádio etelevisão.

Censura, de um lado, controle, do outro, e o aceno com a possibilidade deampliação do negócio, o que para muitos aconteceu, fazia com que os em-presários de comunicação se alinhassem ao governo militar e, com isso, aju-dassem a reproduzir a ideologia dominante. Com o apoio – espontâneo ouforçado – da mídia o governo, ao mesmo tempo em que mascarava a realida-de do país, se apresentava como o “salvador da pátria” e fazendo o que, maisadiante, iria beneficiar toda sociedade. O bloco de poder agia para se tornardominante e implantar sua ideologia, consolidando a hegemonia sobre a so-

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ciedade brasileira.Ainda em relação à censura há outras duas razões a considerar. Uma, o

apoio de jornais e jornalistas ao regime, o que está documentado no trabalhode Beatriz Kushnir quando fala da Folha da Tarde. Outra, da censura decor-rente do exercício do poder dentro das redações, como ressalta CremildaMedina67 , que nos mostra um exercício diferente da censura, muitas vezesfeitas em nome do patrão que, na verdade, sequer foi consultado.

O que se pode inferir, a partir do estudo de Beatriz Kushnir, é que osjornais, se não estavam entregues aos órgãos de repressão, como ela afirmaestar a Folha da Tarde, existiam, em suas redações, jornalistas que apoiavamo regime. Aqui, no Espírito Santo, na redação do jornal A Gazeta, por exem-plo, existiam dois policiais que eram dublê de jornalistas – José Barreto deMendonça e Walmor Miranda - e ambos exerciam as duas tarefas com amploconhecimento das próprias empresas e dos jornalistas. No que se refere aotrabalho eram tidos como bons profissionais e não há indicações seguras quefossem informantes do regime. No caso de A Gazeta há, ainda, o fato de oseu Diretor Responsável por vários anos ser um general da reserva, DarcyPacheco de Queiroz, colocado no cargo logo após o golpe de 64, já que ojornal apoiava o governo Goulart.

Toda a movimentação do regime, indo da repressão policial ao controleeconômico e chegando à censura dos jornais tinha o claro objetivo de man-ter-se, e ao grupo hegemônico, no poder. As ações tomadas com base nasdiretrizes da Doutrina de Segurança Nacional se ligavam não só no âmbitodo país, mas havia uma clara conexão geopolítica não só com a América doSul, inserindo-se em um contexto maior, de ocidente e de luta contra o co-munismo. Esta posição está bem explicitada no livro do general Golbery doCouto e Silva68 . É dele, também, o reconhecimento das ações do regime nosentido de manter-se hegemônico, inclusive mediante uma política de divi-dir para reinar, no estilo de Maquiavel.

Contra-hegemonia e PosiçãoSe havia, como demonstrado acima, uma ação hegemônica do regime,

que queria se manter e ampliar sua dominação sobre a sociedade, há, tam-bém, todo um trabalho contra-hegemônico, um papel reconhecido porGramsci que afirma ser a hegemonia uma construção, que nunca é total,havendo sempre espaços para a atuação da contra-hegemonia. É neste mo-mento que os intelectuais orgânicos entram, fazendo a diferença, já que aju-dam a disseminar uma nova ideologia e, com ela, a construção de uma novahegemonia. Gramsci afirma que, em se tratando de política, há sempre uma

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luta de interesses, com os vários grupos sociais predominantes disputando opoder até que um deles venham a se impor e a se “difundir por toda a áreasocial, determinando – alem da unicidade dos fins econômicos e políticos –também a unidade intelectual e moral”69 . Assim, de acordo com o pensadoritaliano, nasce a hegemonia. Por isso “a tarefa essencial é a de trabalharsistemática e pacientemente para formar, desenvolver, tornar cada vez maishomogênea, compacta e consciente de si mesmo”70 a força – e, portanto, osgrupos – que terão atuação contra-hegemônica. Gramsci mostra que se tratade um processo, que não é isolado e que ocorre somente em condições histó-ricas específicas, quando há um desequilíbrio na correlação de forças.

A literatura histórica nos mostra que havia, durante os anos em que ojornal Posição circulou, um consistente trabalho contra-hegemônico exerci-do por uma variedade de grupos sociais e entidades, que procuravam ampli-ar o espaço de discussão e mostrar que, ao contrário do que afirmava oregime, não vivíamos em um regime róseo71 . Pode-se alinhar, neste caso, asComunidades Eclesiais de Base, criadas e disseminadas pela Igreja Católica,parte do movimento sindical, as associações de bairros e de donas de casaem algumas cidades, políticos de oposição ao Governo e a imprensa alterna-tiva. Trata-se, neste caso, do que Gramsci chama de material ideológico,sobre o qual assinala: “A parte mais notável e dinâmica dessa organização éa imprensa em geral (...) A imprensa é a parte mais dinâmica desta estrutura,mas não a única: tudo que influi ou pode influir sobre a opinião pública,direta ou indiretamente, faz parte dela”72 .

E Gramsci pergunta:“O que uma classe inovadora pode contrapor a esse formidável

conjunto de trincheiras e fortificações da classe dominante? O espí-rito de cisão, isto é, a progressiva aquisição da consciência da própriapersonalidade histórica, espírito de cisão que deve tender a se ampli-ar (...) tudo isso demanda um complexo trabalho ideológico, cuja pri-meira condição é o exato conhecimento do campo a esvaziar de seuelemento de massa humana”73 .

Ao responder à sua própria pergunta Gramsci indica, mais uma vez, ocaminho do exercício da contra-hegemonia e aduz que o objetivo final dotrabalho ideológico exercido pela mídia, é o de conquistar a opinião pública“de modo que uma só força modele a opinião e, portanto, a vontade políticanacional”74 . Olhando-se a questão do lado da hegemonia, é exatamente issoque o regime fez, buscando a adesão da chamada grande mídia, fosse elafeita de forma espontânea ou mediante pressão – política, censura oueconômica. E foi este, também, um dos caminhos tomados pela contra-

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hegemonia com a utilização da imprensa alternativa, ajudando na divulga-ção de novas idéias e na busca de um objetivo comum, a democracia, que seconfigurava em uma nova ideologia.

Em síntese, o que Gramsci aponta é a possibilidade de se fazer um traba-lho de construção contra-hegemônica, mesmo com um regime forte eintervencionista, como era o brasileiro. Neste caso, destacam-se, de um lado,a atuação política, que pode ser exercida pelo partido tradicional ou pelopartido ampliado, no qual ele insere a mídia e, portanto, os jornais, mas so-bretudo pelo trabalho do intelectual orgânico mediante a formulação, a di-vulgação e a consolidação de uma nova ideologia. No caso brasileiro e emrelação a Posição podemos dizer que este trabalho ocorreu e que a novaideologia era a busca de democracia, de maior participação e de mudança nosistema político implantado a partir do golpe de 1964.

Estabelecidas as condições do exercício contra-hegemônico é precisocaminhar mais um passo e demonstrar como o jornal Posição integrou-se aeste trabalho e de que forma expressou a busca de uma nova ideologia eajudou a cimentá-la junto à opinião pública. Como o jornal pode expressar-se? Maurice Mouillaud afirma que o “discurso do jornal não está solto noespaço: está envolvido no que chamaria de “dispositivo” que, por sua vez,não é uma simples entidade técnica, estranha ao sentido”75 , chamando aatenção para o tratamento dicotômico dado ao jornal como meio físico e aoseu conteúdo. Mouillaud defende que os dois não podem ser separados, daífalar em dispositivo que une a materialidade – papel, diagramação, etc. – aoconteúdo. Assim, a análise de um jornal deve levar em conta que ele, aoproduzir uma informação, a transforma de um estado difuso em unidadeshomogêneas.

O que o jornal faz, para Mouillaud, é uma representação, já que não há“conversão possível que permita um face a face com a “coisa”. Não há outrolocal, a não ser sobre a tela, em que se possa formar a representação”76 . Esteé um trabalho que procura organizar o caos, estabelecendo uma coerência,uma unidade na diversidade, construindo-se, como assinala Mouillaud, umtodo cujas partes estejam coordenadas. Forma-se, então, o sentido do jornale é este sentido que será transmitido aos leitores. O jornal, em síntese, to-mando-se a conceituação de Mouillaud, produz sentido através do seu todo– nome, títulos, conteúdo, diagramação, etc. - e é este sentido que deve serapreendido nas análises, sobretudo históricas, conduzidas a partir do quepublicam, o que pode ser feito criando-se, a partir de títulos, por exemplo,categorias e, a partir delas, mostrando o enquadramento que a publicação dáà informação que veicula.

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Ao afirmar que a “seleção de vozes e a hierarquização da forma permi-tem ao jornal orientar a leitura”77 , Mouillaud chama a atenção para a possibi-lidade de, assim agindo, fazer-se esta orientação do ponto de vista hegemônicoe avança ao dizer que o jornal militante, como se pode dizer de Posição,“substitui à polifonia uma imbricação das vozes de tal maneira que em todosos níveis, em todos os gêneros e em todos os domínios, a mesma voz permi-te que seja escutada sua redundância”78 . Se na diversidade representada porum jornal há a possibilidade de se transmitir um ponto de vista da hegemonia,o que efetivamente aconteceu no Brasil durante os 20 anos de regime civilmilitar, há, de outro lado, também a possibilidade de um trabalho contra-hegemônico, o que pode ser feito, do ponto de vista de Mouillaud, tantoadotando-se a polifonia ou a redundância.

Para determinar o papel contra-hegemônico do jornal Posição, adotamosos conceitos de Mouillaud. Em primeiro lugar tomamos como dispositivodesta contra-hegemonia a capa do jornal. A escolha se deu por ser, no casode publicações periódicas, as capas que estampam os principais assuntos,entendidos assim pelo próprio jornal, isto é, pelos intelectuais responsáveispela produção do seu conteúdo e sua edição. A capa, através dos seus títu-los, fotos, ilustrações e da própria colocação do assunto na página, ofereceao leitor uma primeira visão do que o jornal considera mais importante den-tre os assuntos que está publicando, marcando o tratamento que dá à infor-mação e o ponto de vista que adota, se hegemônico ou contra-hegemônico.

Feita a escolha, era preciso relacionar todos os títulos publicados ao lon-go das 65 edições do jornal Posição. O resultado foi uma longa listagem deassuntos que, à primeira vista, nada tinham em comum por tratar-se, comoobserva Mouillaud, de uma polifonia – várias vozes, vários significados – oque nos levou a um novo passo, que foi categorizar o que Posição disse,mediante a contraposição ao princípios básicos da Doutrina da SegurançaNacional. Esta doutrina subdividia o poder nacional em quatro poderes:políticos, econômicos, militares e psicossociais. Assim, temos quatro cate-gorias básicas que demonstram o exercício da hegemonia e nos permite, tam-bém, demonstrar o trabalho contra-hegemônico mediante a comparação en-tre os propósitos da Doutrina de Segurança Nacional e de cada um dos po-deres em que se dividia79 .

No caso do poder militar, seus princípios básicos apontavam para o po-der nacional como guardião da ordem, dos valores morais, dos valores éticose buscando a integração geopolítica com a América do Sul, mais próxima,integrando-se ao eixo ocidental, liderado pelos Estados Unidos e, nesta açãogeopolítica, interpondo-se à propagação dos regimes comunistas, que deve-

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riam ser afastados do Ocidente mediante a colaboração entre as nações doeixo ocidental. Ao lado do poder militar age, também, o poder econômico,configurado, no caso da Doutrina de Segurança Nacional, pela açãodesenvolvimentista, cujo objetivo era elevar o pais à condição de potência,mediante o uso da racionalidade, configurada pelo planejamento, e a buscada estabilidade econômica, permitindo ao país alcançar seu propósito. Ain-da sob o guarda-chuva do poder econômico está a criação de empregos e aconvivência de patrões e empregados de forma harmoniosa, sem conflitosde classe.

O terceiro poder integrador do poder nacional é o político. Dele, a DSNdestaca a existência de uma democracia, falando em modelo brasileiro, amanutenção da ordem, mediante a não contestação do regime, a nãomobilização das massas – usada como subterfúgio para a derrubada deGoulart – e a não reivindicação. O pressuposto é que o regime estava fazen-do o melhor para o país e por isso não deveria sofrer oposição, daí não acei-tar críticas e usar, dentre outros métodos, a censura à imprensa para que nãoexpusesse as mazelas sociais e econômicas do regime80 . O quadro se fechacom o poder psicossocial. Nele, o que o regime buscava era ressaltar a dedi-cação ao trabalho, o que todo brasileiro precisava ter, a coesão familiar, aadoção de princípios éticos e morais em todas as áreas de comportamento, oconformismo e, por fim, destacando a harmonia social e racial do pais, ondenão havia disputa entre raças e separação entre estratos sociais81 .

O poder nacional e suas subdivisões fornecem, neste caso, a categorizaçãopara o levantamento das ações hegemônicas do bloco de poder e, por com-paração, as ações contra-hegemônicas desenvolvidas no Brasil em face destemesmo regime. Um exemplo pode ser dado pelo primeiro número do jornalPosição. Ao lado da foto de um casebre de estuque caindo aos pedaços, achamada diz: Espírito Santo – As invasões de terra, a luta pela casa própria,a política habitacional e o desfavelamento. O título e seus subtítulos de-monstram, claramente, o posicionamento do jornal, de critica à política doGoverno, tanto no que se refere à ocupação de terras, quanto no caso dapolítica habitacional. No caso das invasões, mostra, em contraste com o queprega dos princípios da DSN, que há, sim, conflitos sociais no país e que umdeles se prende à posse da terra. No segundo caso, também fica claro a exis-tência de problemas relacionados à habitação, o que é reforçado pela foto docasebre. Nos dois casos há uma clara desconstrução do que o regime preten-dia, apresentando o Brasil – e o Estado – como isento de problemas, deconflitos sociais e de embates entre as classes e segmentos sociais. Comoassinala Peter Burke82 , no caso da comparação, mostrando o que não está lá,

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podemos chamar a atenção para um determinado aspecto, realização ou ação.É exatamente o que fez Posição. Ao mostrar os problemas, ele ia de encon-tro ao que o regime dizia e, ao mesmo tempo, chamava a atenção para aspec-tos que o regime não queria ver divulgado.

A categorização, a partir dos princípios do poder nacional, permite a cri-ação de sentido de que fala Mouillaud e, ao mesmo tempo, mostra, mediantea comparação sugerida por Burke, a diferença dos discursos do regime e dojornal. Esta diferença pode ser vista no caso do Poder Militar, aquele quefala, dentre outras questões, em valores éticos e integração geopolítica, estacom o sentido de se alinhar a um eixo ocidental e anticomunista. De um e deoutro lado, esta diferença é mostrada pelo Quadro I, na página 108.

O que fica claro, tomando-se os dois discursos e fazendo a comparaçãodeles, é que o jornal Posição procurava mostrar aspectos da realidade queiam de encontro às diretrizes do Governo, desenvolvidas a partir da Doutri-na de Segurança Nacional. A observação da coluna da direita no Quadro I,em contraposição à coluna da esquerda, mostra claramente a ação contra-hegemônica de Posição. Se o regime defendia a integração e o alinhamento àpolítica ocidental, comandada pelos Estados Unidos, Posição relatava expe-riências de outros países que iam no sentido contrário do pretendido pelaDSN, como a luta no Peru e no Equador, a exaltação do regime cubano ou orelato da ofensiva sandinista na Nicarágua. Esta posição é reforçada pelosvários títulos – e matérias internas – do Posição enfocando o problema dacorrupção, tomando como base o Espírito Santo, o que desmistificava umdos princípios da DSN relacionada aos valores éticos e ao combate à corrup-ção. Os valores do regime e de Posição eram diferentes e isso fica bem claronos títulos da primeira página do jornal relacionados ao chamado poder mi-litar, um dos desdobramentos do poder nacional consagrado na Doutrina deSegurança Nacional.

No caso da área econômica a diferença entre o discurso do regime e dePosição é ainda mais marcante, como pode ser visto na Quadro II, na página109.

Desemprego, miséria, trabalhadores de bolsos vazios, aumentos abusivosdas prestações da casa própria, demissões, corrupção em estatais, arrochosalarial, concentração de riquezas e desnacionalização da indústria nacionalsão alguns dos aspectos que, através dos títulos da primeira página do jornalPosição vão de encontro aos princípios pregados e difundidos pelo regime, acomeçar pelo benefício que o desenvolvimento, nos modelos construídospelo regime, iria trazer a todos os brasileiros. O princípio da racionalidade,executado através do planejamento, que evitaria problemas, é contestado

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C orru p ç ã o n a s Pr e f e itur a sD esr esp e ito à l e i e l e itor a lInv estig a ç õ es d e c orru p ç ã o e m e m-p res a s d o Est a d oIn justi ç a tr a b a lh ist a c o ntr a p esc a d o-resSu m i ç o d e p ro c esso c o ntr a e m p res á -rios d e d est a q u e n o ES ( O t a c ílio C o-ser)C a b id e d e e m p re g o n os órg ã os es-t a d u a isC PI d a La m a . Inv estig a ç ã o n aC o d es aC a rn a v a l d a c orru p ç ã o ( C orru p ç ã on o G o v e rn o d o Est a d o)Pro f essores f e d e r a is: p ro fiss ã o “su b-v e rsiv os”O s p orõ es d o re g im e: C oro n e lLu d w ig: “Só é p reso c orru p to b urro ”C h il e h o j e : o n óPe ru: a re v o lu ç ã o p ossív e lEq u a d or: q u est ã o d e t e m p oC u b a , si – v int e a n os se m c o c a -c o l aFl á v i a Sc h illin g: “N in g u é m n a sc e lu-t a d or, m a s se f a z lut a d or” .O fim c h e g o u: Po v o d e rrot a a d it a -d ur a (n o Ir ã )Um b a l a n ç o d e g u e rrilh a n a N i c a r á -g u aSe q ü estro d o e m b a ix a d or n ort e-a m e ri c a n oA igr e j a e o m a rxism oC a p ix a b a c o nt a c o m o v iu a o f e nsi-v a s a n d in ist aD e c l a r a ç ã o Un iv e rs a l d os D ir e itos d oHo m e m

DOUTRINA DE SEGURANÇA NACIONAL

PODER NACIONAL

Poder Militar

Discurso do Regime

Guardiões da ordem•Sem protestos•Sem manifestações•Sem movimentos demassasGuardiões dos valo-res morais•Valores familiares ecristãos•Guardiões dos valo-res éticos•Combate à corrupção•Lisura dos atos políti-cosIntegraçãogeopolítica•Alinhamento contra ocomunismo•Integração ao ladoocidentalLuta contra o comu-nismo

Discurso de Posição

Fontes: G eopolítica do Brasil – Jornal Posição (capas)

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Po líti c a h a b it a c io n a l f a lh a

Pl a n e j a m e nto a p ress a d o d a C ST

F a lt a d e in fr a -estrutur a p a r a C ST

Po líti c a d e a rro c h o s a l a ri a l, in c lusiv e

p a r a o fun c io n a lism o p ú b li c o

C rise e c o n ô m i c a : O so nh o a c a b o u

A b e rtur a p a r a a s m u ltin a c io n a is, se m

ig u a l d a d e d e c o n d i ç õ es p a r a a s e m-

pres a s br a sil e ir a s

A u m e ntos s a l a ri a is c o ntro l a d os: A

g orj e t a d os jorn a list a s

D eslo c a m e nto d e b a irros p a r a a t e n-

d e r à s e m p res a s – V a l e x Sosse g o

C orru p ç ã o n a s a ç õ es d o BN DES

Pro b l e m a s c o m C ST – b a l a n ç a , m a s

a in d a n ã o c a i

O d r a m a d a t e rr a – O s p ro b l e m a s n o

Esp írito Sa nto

F a v e liz a ç ã o d o e ntorn o d a c id a d e

Po líti c a h a b it a c io n a l p a r a os o p e r á -

rios f a lh a e c o m a u m e ntos a b usiv os

Su m i ç o d o d inh e iro d o PIS – Tr a b a -

lh a d or es d e b o lsos v a zios

D ese m pre g o c a us a d o p e los gr a n d es

p ro j e tos – A r a c ruz d e m it e 10 m il

Lut a d os o p e r á rios d o ES

M isé ri a e m V itóri a

O c u p a ç ã o d o Est a d o p or int e resses

p riv a d os – G o lp e d o turism o

DOUTRINA DE SEGURANÇA NACIONAL

PODER NACIONAL

Poder Econômico

Discurso do Regime

Desenvolvimentocomo bem•Benefícios para todos•Planejamento racio-nal•Sem mazelas sociaisRacionalidade doGoverno nas suasações, sobretudoeconômicas•Sem possibilidade deerrosEstabilidade da eco-nomiaSem conflito de clas-ses•Sindicatos controla-dos

Discurso de Posição

Fontes: G eopolítica do Brasil – Jornal Posição (capas)

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pela favelização causada em Vitória e em municípios vizinhos pela implan-tação dos chamados grandes projetos, notadamente a Companhia Siderúrgi-ca de Tubarão (CST). O discurso de Posição, no campo econômico, procura-va, em primeiro lugar, tirar o sentido de que tudo ia bem, conforme pregavao regime. Através das manchetes de primeira página e de um número maiorde matérias em páginas internas o jornal mostrava que, pelo menos no Espí-rito Santo, as coisas não andavam como dizia o regime. Mais uma vez, odiscurso do jornal, no campo econômico, era no sentido de desconstruir odiscurso oficial, portanto, fazendo um trabalho contra-hegemônico.

A postura de Posição continua indo de encontro ao discurso oficial quan-do se trata de política. Basta lembra que, do seu lado, o regime afirmava quehavia democracia, que as eleições eram livres, reafirmava a cordialidade dopovo brasileiro e investia no controle das reivindicações e da mobilização. Odiscurso do regime, como mostra Carlos Fico83 , era no sentido de constituirum país feliz, sem problemas, otimista e que ofereceria total apoio ao Go-verno e ao regime, “vendido” como salvador, racional e que buscava o bemde todos.

Como observa Gramsci84 o jornal pode ser usado de forma educativa.Suas páginas podem ser usadas para instruir seus leitores, discutindo assun-tos e mostrando outros pontos de vista sobre uma mesma questão. Estetrabalho o próprio Gramsci realizou no Ordine Nuovo, jornal que ajudou afundar e que dirigiu antes de ir para a prisão. Desta atividade resultaramalguns conceitos relacionados ao trabalho dos intelectuais e ao uso dos jor-nais como uma forma de partido ampliado, usado como instrumento políti-co de transformação. É neste sentido a ação do jornal Posição no campopolítico, como mostra a Quadro III, na página 111.

A comparação entre os dois discursos mostra claramente, mais uma vez,a ação contra-hegemônica do Posição. Como no caso dos poderes militar eeconômico, o discurso do jornal era de desconstrução do discurso do regime,o que foi feito com a contraposição de fatos relacionados à realidade doEspírito Santo. Contra a democracia e liberdade, problemas nas eleições.Contra a institucionalização do regime, a defesa da constituinte. Contra oregime, a defesa da anistia política. Em todos os momentos – o que refleteem suas capas – o jornal Posição adotou um discurso que, buscando a reali-dade local, procurava mostrar um real muito diferente do discurso oficial. Ojornal, com sua postura, acaba se enquadrando na recomendação feita porGramsci para a construção de uma nova hegemonia – portanto, trabalhocontra-hegemônico – que é criar uma nova consciência e, a partir dela, umanova ideologia integradora.

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Inv a sõ es d e t e rr a sC orru p ç ã o d e g o v e rn a nt es – g o v e r-n a d or e p re f e itosC orru p ç ã o e l e itor a l p e l a A re n aAss a ssin a tos p o líti c os ( O sé a s)Prisõ es a rb itr á ri a sTortur a d e estu d a nt es p e l a Po lí c i aA p r e e ns ã o d o m a t e ri a l d e Posi ç ã oD e nún c i a s c o ntr a p o líti c osB a sti d or es d a su c ess ã o n o ESD e f e s a d a C o nstitu int eO p ortun ism o p o líti c o n o ESC orru p ç ã o e m Pre f e itur a sO p osi ç ã o à s p o líti c a s d o G o v e rn od o ES ( C ríti c a s d e A u g usto Rusc h i)M a r d e l a m a n o ESIn d i c a ç ã o d o G o v e rn a d or – F a lt a d ed e m o c r a c i aEl e i ç õ es d ir e t a s p a r a G o v e rn a d orG a stos a b usiv os c o m p u b li c i d a d ep e lo G o v e rn o d o Est a d oA lut a p e l a a n isti a A a ç ã o d o M DB n a o p osi ç ã oC orru p ç ã o e m órg ã os d o Est a d oV io l ê n c i a p o li c i a l n o Est a d oEl e i ç õ es presid e n c i a is – Eu l e r Be nt esFig u e ire d o n o ES. FEDEULut a c o ntr a o a rb ítrio e a d it a d ur aA n isti a a os p r esos p o líti c osV ig il â n c i a so b r e o c i d a d ã oD e f es a d a m o b iliz a ç ã o p o p u l a rD e nún c i a s e nv o lv e n d o filh os d e fig u-r a s p o líti c a s d o G o v e rn o e d e d iri-g e nt e s d e órg ã os est a d u a isA p o io à gr e v e e su a d ivu lg a ç ã oC ríti c a à p o líti c a d e a b e rtur aSo b r e v iv e nt e s d a tortur aIm p un i d a d e p o li c i a lG r e v e d e f o m e p e l a a n isti a

DOUTRINA DE SEGURANÇA NACIONAL

PODER NACIONAL

Poder Político

Discurso do Regime

Existência de demo-cracia

•Eleições livres•Representatividadeeleitoral•Rodízio de dirigentesExistência de ordem(inexistência de con-testação)•Oposição dentro deum limiteNão mobilização po-lítica•Controles de acesso àmídiaNão reivindicaçãopolítica•Submissão doLegislativo

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Esta mesma postura é adota em relação a pontos que o regime, baseando-se nos princípios da DSN, considerava fundamentais e que abrangem o quechama de área psicossocial. Estudando as ações do regime no sentido de seinstitucionalizar, Rezende afirma: (...) o regime lutava para construir umsistema de valores e idéias visando sedimentar na sociedade como um todoa crença de que o movimento de 1964 somente se legitimava porque eleexpressava sob todos os aspectos os interesses do povo brasileiro”1 .

É no sentido desta legitimação que se dá a ação psicossocial do regime oque, para Rezende, significa a luta do “em todos os recônditos da vida socialvisando fixar aqueles valores que possibilitariam atingir um amplo processode homogeneização e padronização de atitudes, condutas e comportamen-tos”2 . Esta ação, como demonstra Carlos Fico3 , foi desenvolvida mediante ouso da propaganda política, feita com o uso de eufemismos, mas que estevepresente enquanto o bloco de poder se manteve. Se a ação do regime eraforte neste setor, também era o discurso de Posição. Ao longo dos seus 65números sempre mostrou, a partir da situação do Espírito Santo, que o dis-curso hegemônico ocultava fatos e a própria realidade, que não era rósea enem despida de problemas. Esta ação pode ser vista no Quadro IV, na página113.

As manchetes e chamadas de primeira página do jornal Posição,categorizadas e comparadas com os princípios do poder nacional, como vis-tos pela Doutrina de Segurança Nacional, mostram claramente o exercíciocontinuado de uma posição contra-hegemônica. O que o jornal buscava,como relata um dos seus fundadores, o jornalista Rogério Medeiros1 , era ircontra a elite capixaba, abrindo um campo de discussão para os problemaslocais e mostrando que o discurso de otimismo do Governo era enganoso.Esta posição é reforçada por outros dos fundadores do jornal, Walter Araú-jo2 , para quem o foco principal da publicação era de construir um novocaminho, democrático e participativo, não o regime excludente instalado apartir de 1964. O jornal, segundo ele, serviu, neste caso, de ponto de con-vergência para os que, no Estado, alinhavam-se contra o Governo e, antesde Posição, não tinham como se manifestar.

Se fica patente, mediante a comparação com os objetivos do regime, quePosição exerceu, de fato, um papel contra-hegemônico, inserindo-se em ummovimento maior, do qual participava entidades, sindicados, organizaçõessociais e a própria imprensa alternativa, é preciso, ainda, completar este per-curso de ação mostrando o trabalho dos intelectuais que fundaram e fizeramo jornal. Orgânicos, no sentido dado por Gramsci, já que se engajaram emum movimento que visava à mudança e à construção de uma nova hegemonia,

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Lut a p e l a c a s a p ró p ri aD esf a v e l a m e ntoPro b l e m a s c o m tr a nsp ort e d e o p e r á -riosD esc o nt e nt a m e nto tr a b a lh ist aLa vr a d ores c o m p ro b l e m a sLut a d os f e rro v i á rios d a V a l eIn justi ç a c o m p esc a d oresPro f essor es m a l p a g osA c i d e nt e c o m tr a b a lh o n a in d ústri aD ese m pre g o n a á re a d e e d u c a ç ã oHosp it a l o c u p a d o p e l a p o lí c i aLut a d a s c o m un id a d es. A n c h i e t aQ u est ã o d e a lim e nt a ç ã o – a xe p ad a f e ir aElitism o n a e d u c a ç ã o un iv e rsit á ri aPro b l e m a s c o m a ssist ê n c i a a o m e-n orA lut a p e l a t e rr a – p osse irosBusc a d e m e lh ori a d e v id aPro b l e m a s c o m a e d u c a ç ã oO d esp rezo c o m a s a ú d e d o tr a b a -lh a d orExp lor a ç ã o d a c a s a p ró p ri a – o c a sod e La r a n j e ir a sPo líti c a sin d i c a l – m u d a n ç a n os sin d i-c a tos e n a s r e iv in d i c a ç õ e sC o nt est a ç ã o d e estu d a nt es – Re iv in-d i c a ç ã o e p o líti c aG r e v e d e o p e r á rios e m V itóri aLut a p or m e lh ori a s n o tr a nsp ort eLut a s d a c l a sse o p e r á ri a n o ESRe iv in d i c a ç ã o s a l a ri a l d e p ro f essor esO p e r á rios f a l a m d o c a p it a lism oG re v e d e estu d a nt esA rro c h o s a l a ri a l n a PMES

DOUTRINA DE SEGURANÇA NACIONAL

PODER NACIONAL

Poder Psicossocial

Discurso do Regime

Dedicação ao traba-lho•Sem greves•Sem reivindicaçãosalarialCoesão familiarPrincípios éticos emoraisManutenção da or-dem social•Conformismo com asituação•Inexistência de rei-vindicaçõesHarmonia social eracial

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o trabalho destes intelectuais será discutido no próximo capítulo. Nele, oque se busca é confirmar a ação contra-hegemônica de Posição, não maistomando como base o seu discurso, mas a ação dos intelectuais que o inte-gravam e que agiam no sentido da mudança.

Há, ainda em relação ao papel contra-hegemônico representado pelo jor-nal, um outro aspecto a ressaltar que é a sua circulação – numero de exem-plares impressos e vendidos em cada uma de suas edições. O que todos osenvolvidos com o jornal destacam é que ele começou com uma pequenatiragem, de três mil exemplares, e chegou, em alguns números, a tirar 10 miljornais. Jô Amado, que foi o Editor Chefe na maior parte da existência dojornal lembra que a “tiragem foi de três mil exemplares. Na grande maioriadas vezes o encalhe foi insignificante e, em algumas, a edição se esgotou”3 .Rogério Medeiros4 , um dos fundadores e o primeiro diretor do jornal, acres-centa à informação de Amado que, em alguns números, a tiragem do jornalfoi elevada para 7 mil exemplares e que, depois dos primeiros números, acirculação se estabilizou por volta dos 5 mil exemplares. A informação deAmado é reforçada por Robson Moreira5 , que dirigiu o jornal em sua fasefinal, mas dele participou desde o início, e lembra que a venda dos exempla-res era feita pelos próprios integrantes da redação, mantendo uma média detrês mil exemplares por edição. Dois outros editores do jornal reforçam oque dizem Medeiros, Amado e Moreira. Benedito Tadeu César6 , que dirigiuo jornal por pouco tempo, mas dele participou durante muitos números, selembra de um aumento da circulação quando o jornal passou de quinzenalpara semanal, com as edições se esgotando, mas mantendo uma media de 3mil exemplares. Umberto Martins7 , que também dirigiu Posição, afirma que,em alguns números, a edição chegou aos 10 mil exemplares.

Ainda sobre a tiragem, outros dos fundadores do jornal, Walter Araújo,informa que, além da Grande Vitória – Vitória, Vila Velha, Cariacica, Serrae Viana – Posição era distribuído em outros 18 municípios do Espírito San-to. “Para fazer a distribuição nos valíamos de sindicatos, entidades sociais eopositores do regime. O fato é que o jornal chegava a um bom número deleitores nestas cidades, aumentando a repercussão de suas matérias e dandomaior volume às criticas ao Governo”8 , afirma. Algumas bancas do interiore muitas da Grande Vitória também recebiam o jornal, segundo Araújo, am-pliando a distribuição. Um dos canais usados eram os estudantes universitá-rios, consumidores e distribuidores do jornal. Posição tinha, também, umnúmero fixo de assinantes, na Grande Vitória e no interior do Estado, lem-bram Amado, Araújo, César e Martins.

A circulação, através das assinaturas – de menor parte – e da venda avul-

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sa – a maior parte – é, segundo Rogério Medeiros, significativa para a épocaem que Posição circulou. De acordo com Medeiros, considerando-se que amédia de leitura de um jornal é de cinco pessoas por exemplar, Posição che-gou, em alguns momentos, a ter 50 mil leitores. O próprio Medeiros, noentanto, comenta que, no caso do jornal, o número de leitores por exemplarera maior e isso podia ser medido pela repercussão das matérias por elepublicadas. Estes números, no entanto, nunca foram aferidos por um institu-to de pesquisa, como ocorre hoje em relação à leitura dos jornais diários.Medeiros, Amado, Araújo, Martins, Moreira e César são unânimes ao desta-car a circulação do jornal e chamar a atenção para o fato, como diz RogérioMedeiros, “que ele era comprado, não vendido, já que muita gene ficavaesperando pelas edições”.

Por fim, há um último dado a considerar que é a forma como Posição sefinanciava. Dela, pode-se dizer que foi sua força e, também, o seu pontofraco. O jornal, como relatam seus integrantes – Medeiros, Amado, Moreira,Martins, César e Araújo – tinha sua principal fonte de receita na venda avul-sa, portanto, dependia do próprio leitor, já que o volume de publicidade querecebia era pequeno. A ligação com o leitor, que o financiava com a aquisi-ção de seus números, permitia ao jornal a independência que os integrantesda mídia tradicional não possuíam, já que não se ligava ao Governo e nãodependia de verbas publicitárias para sua sobrevivência. Os integrantes dojornal calculam que a publicidade, em sua maioria de profissionais liberais,representava algo em torno de 5% das receitas de Posição. O jornal recebia acolaboração de jornalistas que estavam nas redações da grande mídia e nãotinham como publicar determinadas matérias. Elas, de acordo com Medeiros,eram repassada ao Posição, que as publicava. Isso diminuía seu custo, já quenão tinha de pagar a estes profissionais, que colaboravam com o jornal.

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Notas1 Ver, sobre a questão, as obras Reinventando o otimismo, de Carlos Fico; O golpe e a

ditadura militar 40 anos depois, de Daniel Aarão Reis, Marcelo Ridenti e Rodrigo Patto de SáMotta, eA ditadura militar no Brasil, de Maria José de Rezende, cujas indicações completas estão nabibliografia deste trabalho.

2 AARÃO REIS, Daniel. Ditadura e sociedade: as reconstruções da memória, in AARÃOREIS, Daniel, RIDENTI, Marcelo e SÁ MOTTA, Rodrigo Patto. O golpe e a ditadura militar40 anos depois (1964-2004). São Paulo, Edusc, 2004

3 DREIFUSS, René Armand. 1964: A conquista do Estado. Petrópolis, RJ, Vozes, 19814 A questão da hegemonia, um dos conceitos chaves desta pesquisa, pode ser visto, dentre

outras obras, em O conceito de hegemonia em Gramsci, de Luciano Gruppi: A favor deGramsci, Maria Antonieta Macciocchi, e Gramsci e o Estado, de Christianne Buci-Glucksmann,cujas indicações estão na bibliografia desta pesquisa

5 A busca de legitimação é discutida, sobretudo, por Suzely Mathias em Distensão noBrasil, O projeto militar, e Maria José Rezende em A ditadura militar no Brasil. O uso dapropaganda para se institucionalizar, mantendo e ampliando a hegemonia é discutida porCarlos Fico em Reinventando o otimismo. Ver indicação completa na bibliografia.

6 Para um panorama geral sobre a ditadura ver Daniel Aarão Reis, Marcelo Ridenti e RodrigoPatto Sá Motta (Org). O golpe e a ditadura militar 40 anos depois (1964-2004). São Paulo,Edusc, 2004, e Carlos Fico. Além do golpe. Rio de Janeiro, Record, 2004.

7 FICO, Carlos. Versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar, in Revista Brasileirade História, São Paulo, vol. 24, n 47, jan-jun 2004 p. 36

8 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado.Rio de Janeiro, Civilização Brasilei-ra, 1991, p. 5

9 BACZKO, Bronislaw. Los imaginarios sociales – memorias y esperanzas colectivas. BuenosAires, Nueva Visión, 1999, 2 edição, p. 16-17

10 Sobre este assunto consultar Eliezer Rizzo de Oliveira, As forças Armadas: Política eIdeologia no Brasil (1964-1969). Petrópolis, RJ, Vozes, 1976.

11 SANTOS, Wanderley Guilherme. Roteiro bibliográfico do pensamento político-socialbrasileiro. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2002.

12 SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Paradigma e história, in SANTOS, WanderleyGuilherme. Roteiro bibliográfico do pensamento político-social brasileiro. Belo Horizonte,Editora UFMG, 2002, p. 64

13 FAUSTO, Boris. O pensamento nacionalista autoritário. Rio de Janeiro, Jorge ZaharEditor, 2001, p. 65

14 CASTRO, Celso. As apreciações do SNI, in CASTRO, Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina(Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002, 3 edição, p. 54-55

15 FICO, Carlos. Além do golpe. Rio de Janeiro, Record, 2004, p. 81-8316 COUTO E SILVA, Golbery. Conjuntura política nacional. Rio de Janeiro, José Olympio,

1981.17 SKIDMORE, Thomas. De Castello a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8 edição, p. 32118 DREIFUSS, René Armand. 1964: A conquista do Estado. Petrópolis, RJ, Vozes, 198119 REZENDE, Maria José. A ditadura militar no Brasil: 1964-1984 – Repressão e pretensão

de legitimidade. Londrina, Editora UEL, 2001.20 MATHIAS, Suzely Kalil. Distensão no Brasil. O projeto militar (1973-1979). São Paulo,

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Papirus, s-d21 REZENDE, Maria José. Op. Cit, p. 15722 COUTO E SILVA, Golbery do. Conjuntura política nacional. Rio de Janeiro, José Olympio

Editora, 1981, p. 22-2723 REZENDE, Maria José. A ditadura militar no Brasil: 1964-1984 – Repressão e pretensão

de legitimidade. Londrina, Editora UEL, 200, p. 18024 GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado. Rio de Janeiro, Civilização Brasi-

leira, 1991, p. 1925 BOMENY, Helena. Educação e cultura no Arquivo Geisel, in CASTRO, Celso e

D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002, 3ª edição26 FAUSTO, Boris. O pensamento nacionalista autoritário. Rio de Janeiro, Jorge Zahar

Editor, 2001, p. 6927 BACZKO, Bronislaw. Los imaginarios sociales. Memorias y esperanzas colectivas. Buenos

Aires, Nueva Visión, 1999, 2 edição, p. 828 FICO, Carlos. Reinventando o otimismo. Ditadura, propaganda política e imaginário

social no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997.29 BACZKO, Bronislaw. Op. Cit., p. 1830 BACZKO, Bronislaw. . Los imaginarios sociales. Memorias y esperanzas colectivas. Buenos

Aires, Nueva Visión, 1999, 2 edição, p. 2031 EAGLETON, Terry. Ideologia. São Paulo, Boitempo, 1997, p. 1932 REZENDE, Maria José. A ditadura militar no Brasil: 1964-1984 – Repressão e pretensão

de legitimidade. Londrina, Editora UEL, 2000, p. 19133 FICO, Carlos. Reinventando o otimismo. Ditadura, propaganda política e imaginário

social no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997, p. 4534 FICO, Carlos. Op. Cit. p. 5935 FICO, Carlos Fico. Reinventando o otimismo. Ditadura, propaganda política e imaginá-

rio social no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997., p. 8136 FICO, Carlos. Reinventando o otimismo. Ditadura, propaganda política e imaginário

social no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997, p, 9537A propósito da propaganda política um dos estudos mais esclarecedores é o de Jean Maria

Domenach, que estudou, logo após a II Guerra Mundial, a propaganda nazista e a feita pelosbolcheviques na Rússia e a partir delas estabeleceu uma série de “leis” que regulariam a atividade.O livro de Domenach, editado no Brasil em 1955, está há muito esgotado, mas pode serencontrado na Internet no site: http://www2.uol.com.br/cultvox/livros_gratis/apropagandapolitica.pdf. A referência completa ao livro está na bibliografia deste trabalho.

38 Uma visão concisa, mas bem esclarecedora, dessa questão pode ser vista no trabalho deLúcia Grinberg publicado no livro O golpe e a ditadura militar 40 anos depois (1964-1984),organizado por Daniel Aarão Reis, Marcelo Ridenti e Rodrigo Patto Sá Motta. A referênciacompleta encontra-se na bibliografia deste trabalho.

39 COUTO E SILVA, Golbery do. Conjuntura política nacional. Rio de Janeiro, José Olympio,1981, p. 27

40 COUTO E SILVA, Golbery do. Conjuntura política nacional. Rio de Janeiro, José Olympio,1981, p. 28

41 COUTO E SILVA, Golbery do. Op. Cit., p. 3142 MATHIAS, Suzely Kalil. Distensão no Brasil. O projeto militar (1973-1979). São Paulo,

Papirus, s-d, p. 3943 MATHIAS, Suzely Kalil. Distensão no Brasil. O projeto militar (1973-1979). São Paulo,

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Papirus, s-d44 SKIDMORE, Thomas. De Castello a Tancredo. São Paulo, Paz e Terra, 2004, 8ª edição45 AARÃO REIS, Daniel. Ditadura militar, esquerdas e sociedade. Rio de Janeiro, Jorge

Zahar Editores, 2001.46 FICO, Carlos. Além do golpe. Rio de Janeiro, Record, 2004, p. 9047 FICO, Carlos. Além do golpe. Rio de Janeiro, Record, 2004.48 SMITH, Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura no

Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997.49 SMITH, Anne-Marie. Op. Cit., p. 4650 KUSHNIR. Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de

1988. São Paulo, Boitempo, 2004.51 KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de

1988. São Paulo, Boitempo, 2004, p. 11752 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CASTRO,

Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002, 3ªedição

53 KUSHNIR, Beatriz. Op. Cit, p. 12254 AQUINO, Maria Aparecida de. Censura, imprensa, Estado autoritário (1968-1978). São

Paulo, Edusc, 1999, p. 1555 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CASTRO,

Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002, 3ªedição

56 KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de1988. São Paulo, Boitempo, 2004.

57 SMITH, Anne-Marie. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura noBrasil. Rio de Janeiro, Editora FGB, 1997, p. 45

58 Na verdade, não se tratava da autocensura como a iniciativa dos jornais de não publicaruma determinada notícia, mas da aceitação da censura do Governo, que ditava o que podia serpublicado. Este procedimento acabou ficando conhecido no meio jornalístico como autocensurae é este o sentido usado por Anne Maria Smith.

59 Os “bilhetinhos” eram como ficaram conhecidas as proibições emitidas pela PolíciaFederal e entregue ao responsável pela redação dos jornais e das outras mídias. Ele, invariavel-mente, começava com um “De ordem superior, fica proibido...” e no jornal A Gazeta, deVitória, acabou por ocupar um grande quadro na redação.

60 KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda. Jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de1988. São Paulo, Boitempo, 2004, p. 194

61 KUSHNIR, Beatriz. Op. Cit., p. 19462 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CASTRO,

Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002, 3ªedição., p. 27

63 D´ARAÚJO, Maria Celina. Ministério da Justiça, o lado duro da transição, in CASTRO,Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina (Orgs). Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002, 3ªedição, p. 28

64 SMITH. Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura noBrasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997., p. 57

65 SMITH. Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura noBrasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997., p. 58

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66 SMITH, Anne-Maria. Um acordo forçado. O consentimento da imprensa à censura noBrasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997, p. 78

67 ABREU, Alzira Alves de. As telecomunicações no Brasil sob a ótica do governo Geisel, inCASTRO, Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina. Dossiê Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV,2002, 3ª edição, p. 154

68 MEDINA, Cremilda. As múltiplas faces da censura, in CARNEIRO, Maria Luiza Tucci(Org). Minorias silenciadas. São Paulo, Edusp, 2002, p. 424

69 COUTO E SILVA, Golbery. Conjuntura política nacional. Rio de Janeiro, José Olympio,1981.

70 GRAMSCI, Antonio. Análise das situações. Correlação de forças in COUTINHO, CarlosNelson. Gramsci. Porto Alegre, L&PM, Editores, 1981, p. 186

71 GRAMSCI, Antonio. Idem, p. 18872 Sobre o a ação dos vários movimentos e sua luta contra-hegemônica ver Um clima de

esperança, no Capítulo I desta pesquisa. Sobre o mesmo tema, pode se destacar três trabalhos:Ditadura militar, esquerdas e sociedade e O golpe e a ditadura militar 40 anos depois, de DanielAarão Reis, e Democratizando o Brasil, de Alfred Stepan, que trazem um panorama da luta pelademocratização do Brasil, sobretudo na década de 70 do século passado.

73 GRAMSCI, Antonio. Material ideológico, in COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci.Porto Alegre, L&PM Editores, 1981, p. 198

74 GRAMSCI, Antonio. Op. Cit., p. 19975 GRAMSCI, Antonio. A opinião pública, in COUTINHO, Carlos Nelson. Op. Cit., p 19976 MOUILLAUD, Maurice e PORTO, Sérgio Dayrell (Orgs). O jornal, da forma ao sentido.

Brasília, Editora UNB, 2002, 2ª edição, p. 3777 MOUILLAUD, Maurice e PORTO, Sérgio Dayrell. Idem, p. 4578 MOUILLOUD, Maurice e PORTO, Sérgio Dayrell (Orgs). O jornal, da forma ao sentido.

Brasília, UNB, 2002, 2ª edição, p. 18579 MOUILLAUD, Maurice e PORTO, Sérgio Dayrell. Idem, p. 18580 Um panorama da Doutrina de Segurança Nacional e de seus objetivos podem ser vistos,

com maiores detalhes, em COUTO E SILVA, Golbery. Geopolítica do Brasil. Rio de Janeiro,José Olympio, 1981

81 A ação política do regime é bem retratada nos trabalhos de AARÃO REIS, Daniel,RIDENTI Marcelo e SÁ MOTTAS, Rodrigo Patto. O golpe e a ditadura militar 40 anos depois(1964-2004). São Paulo, Edusc, 2004 e AARÃO REIS, Daniel. Ditadura militar, esquerdas esociedade. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editores, 2001. Para ver esta ação durante o período queo jornal Posição circulou ver as obras de CASTRO, Celso e D´ARAÚJO, Maria Celina. DossiêGeisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2002, 3ª edição e D´ARAÚJO, Maria Celina e CASTRO,Celso (Orgs). Ernesto Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997, 4ª edição

82 A ação psicossocial do regime está bem retratada em REZENDE, Maria José. A ditaduraMilitar no Brasil. Londrina, Editora UEL, 2001. Dela, também fala FICO, Carlos. Reinventandoo otimismo – Ditadura, propaganda e imaginário social no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGV,1997.

83 BURKE, Peter. História e teoria social. São Paulo, Unesp, 2002.84 FICO, Carlos. Reinventando o otimismo. Ditadura, propaganda política e imaginário

social no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 199785 GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do

Livro, s/d86 REZENDE, Maria José. A ditadura militar no Brasil: repressão e pretensão de legitimi-

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dade – 1964-1984. Londrina, Editora UEL, 2001, p. 3387 REZENDE, Maria José. Op. Cit., p. 3888 FICO, Carlos. Reinventando o otimismo. Ditadura, propaganda política e imaginário

social no Brasil. Rio de Janeiro, Editora FGV, 199789 Entrevista com Rogério Medeiros, em 27-12-200590 Entrevista com Walter Araújo, em 17-01-200691 Entrevista com Jô Amado, em 21-12-200592 Entrevista com Rogério Medeiros, em 27-12-200593TRINDADE, Carlos Calenti et alli. Jornalismo Alternativo: da década de 40 aos dias

atuais, in MARTINUZZO, José Antonio (Org). Impressões capixabas – 165 anos de jornalis-mo no Espírito Santo. Vitória, UFES-Departamento de Imprensa Oficial do Espírito Santo,2005, p. 291

94 Entrevista com Benedito Tadeu César, em 25-01-200695 Entrevista com Umberto Martins, em 24-01-200696 Entrevista com Walter Araújo, em 17-01-2006

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“N oss a s v e rd a d es só n os p a re c e m p l a usív e is e mfun ç ã o d e o n d e est a m os situ a d os nu m d a d o m o-m e nto ” .

Te rry E a g l e ton

e pode haver, em relação à história alguma dúvida da prevalênciada ideologia o mesmo não ocorre em relação à mídia, que vemsendo tratada, há tempo, como meio ideológico por excelência. Asteorias da comunicação confirmam e reafirmam esta vertente,

começando pela Teoria Hipodérmica1 , quando atribui à mídia influência diretasobre o pensar das pessoas. A analogia com uma injeção é no sentido de,aplicada, ter efeito imediato. Assim também se daria com a mídia.

As teorias evoluíram, mas a discussão sobre a influência da mídia perma-nece. Wolf, um dos mais aclamados teóricos da comunicação, afirma que osmeios de comunicação são um dos mais poderosos instrumentos de constru-ção da realidade2 . Desde que tiveram seu papel amplificado, sobretudo apartir da contemporaneidade, os mídia têm servido de espelho para que nosvejamos refletidos. São eles, como frisa Noelle-Newmann, que ditam o quefalar, dizendo ao cidadão o que deve ser discutido e, até, como deve serdiscutido3 .

Impõe, no final, como frisa a pesquisadora, uma espiral de silêncio, fazen-do com que as minorias percam a voz. No contexto histórico ao qual esta-mos nos reportando e que o jornal Posição circulou, a imposição do silênciose dava, também, como frisa muito bem Maria Luiza Tucci Carneiro4 , pelospróprios instrumentos utilizados pelo poder, dentre os quais se destacava acensura, que se não aparecia para o grande público, era explícita e constante.

Mesmo com os controles ao máximo, o Governo militar procurou limitarao mínimo o espaço institucional da política, o que ocorreu mesmo na cha-mada distensão, patrocinada pelo Governo Geisel, época em que o jornalPosição começou a circular. Apesar de oferecer, fruto das pressões que vi-

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nha sofrendo, como observa Thomas Skidmore5 , uma brecha no forte muroda ditadura, o regime tinha a pretensão de se manter e, para tanto, usandoum contexto ideológico, buscava adesão para o que pregava. Parte dessabusca ficava por conta da mídia, controlada pela censura ou, então, por mei-os econômicos. A reprodução da ideologia dominante foi, neste caso, umtrabalho que contou com a ampla participação dos barões da mídia, como sevê no trabalho de Anne Marie Smith6 .

O que a mídia fazia, de acordo com o estudo de Anne Marie Smith, erafingir que não havia censura e, com raras exceções, alinhar-se ao regime,ajudando-o na construção de uma realidade onde o conflito era substituído,pelo menos na ótica oficial, pelo consenso. O que tínhamos, como assinalaCarlos Fico7 , era uma tentativa da conquista dos corações e mentes dosbrasileiros, de forma que os militares não só se legitimassem, mas conseguis-sem apoio para o seu projeto, que era a manutenção do poder por um longoprazo. A ação dos militares, como assinalam muito bem os pesquisadorescitados, era nitidamente ideológica, tal como a da mídia, ao dar suporte aoregime.

Temos, no final, não uma ligação feita através de um ou vários liames,mas verdadeiramente um “casamento” entre mídia e ideologia. Ao mesmotempo, temos todo um trabalho, feito por intelectuais orgânicos, de busca daconsolidação de uma visão de mundo, uma das bases da hegemonia, de acor-do com Gramsci. O que buscava o regime? É Gramsci quem responde:“(...)consenso “espontâneo” das grandes massas da população quanto à ori-entação impressa pelo grupo fundamental dominante, à vida social”8 .

Este, de acordo com Gramsci, é um trabalho típico do intelectual orgâni-co. Também é função do intelectual orgânico, na visão de Gramsci, a cons-trução de uma nova hegemonia e um dos meios que pode ser usado para essaconstrução é exatamente a mídia, aliás o que o pensador italiano fez quandodirigia o Ordine Nuovo. Configura-se, mais uma vez, a função ideológica damídia, que pode agir tanto no sentido de consubstanciar o poder, quantopode investir na sua modificação. Aqui, insere-se não só o trabalho do inte-lectual orgânico, mas do próprio jornal, que pode ser entendido na perspec-tiva gramsciana como um partido ampliado, o que releva o seu papel ideoló-gico.

Enquanto veículo de oposição – e de esquerda – o jornal Posição tinhainteresse em mostrar uma realidade que era diametralmente oposta à apre-sentada pelo que podemos chamar de “grande mídia”. A busca, assim, erapor uma nova hegemonia, o que significava, em primeiro lugar, a remoçãodos militares do poder, o que, aliás, não era um desejo só de Posição, mas da

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chamada imprensa alternativa como um todo, como mostra BernardoKucinski9 , e de uma parcela considerável da sociedade. Jornais alternativose movimentos sociais, como as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), paracitar apenas um deles, buscavam a construção de uma nova hegemonia e,portanto, inseriam-se em um movimento contra-hegemônico.

A ligação entre a mídia, ideologia e o trabalho de intelectuais é ressaltadopor Gramsci quando fala sobre a cultura, sobre os próprios intelectuais esobre jornalismo. De todos os assuntos que abordou em seus vários escritos,um dos quais Gramsci dedicou bom espaço foi o jornalismo. À atividadejornalística, Gramsci associa o intelectual orgânico e relaciona procedimen-tos que devem ser adotados para que um jornal atenda o seu público e sejaefetivo. Sobre jornalismo, diz:

“O tipo de jornalismo estudado nestas notas é o que poderia serchamado de “integral” (…), isto é, o jornalismo que não somentepretende satisfazer todas as necessidades (de uma certa categoria) deseu público, mas pretende também criar e desenvolver tais necessi-dades e, consequentemente, em certo sentido, criar o seu público eampliar progressivamente sua área”10 .

O jornal, assim é formado a partir da existência, “como ponto de partida,de um agrupamento cultural (em sentido lato) mais ou menos homogêneo,de um certo tipo, de um certo nível e, particularmente, com uma certa orien-tação geral”11 . É o que aconteceu no caso da criação de Posição. Um grupode jornalistas, que tinha uma orientação geral decidiu lançar um veículo decomunicação que explorasse um espaço não coberto pela mídia local, queera dar voz aos movimentos sociais, engajar-se em favor da anistia e da cons-tituinte, como frisa Jô Amado12 , um dos idealizadores do jornal. Posição,neste sentido, nasceu com o sentido da crítica, focalizando a elite e seusproblemas, chamando a atenção para a ação política e mostrando aspectosda realidade local que, sem a existência do jornal, não teriam sido mostradas,segundo acredita o seu primeiro diretor e um dos fundadores, RogérioMedeiros13 .

Ainda reportando-se ao jornalismo e à organização dos jornais e revistas,Gramsci, depois de comentar as possíveis razões de sucesso de um veículoimpresso, assinala que “a orientação redacional deveria ser fortemente orga-nizada, de modo a produzir um trabalho intelectualmente homogêneo, ape-sar da necessária variedade de estilo e das personalidades”14 . O que Gramscibusca é que a publicação defina público, linguagem e que apresente aos seusleitores assuntos variados, mas dentro de uma orientação, seguindo uma li-nha editorial coerente. Esta é uma tarefa dos jornalistas que, no caso, devem

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não apenas ser produtores das matérias, mas dirigentes – como Gramsci ofoi – de sua própria publicação. Mais uma vez pode-se enquadrar Posiçãoneste modelo. Sobre esta questão, Rogério Medeiros explica que odirecionamento dos assuntos que o jornal iria abordar eram dados pelo Con-selho Editorial, constituído por jornalistas e outros intelectuais. Os assuntoseram discutidos, incluindo-se, nesta discussão, a abordagem a ser feita, bus-cando-se ressaltar aspectos da realidade local para os quais a “grande mídia”não dava atenção.

A preocupação com o regional enquadra-se em outra diretriz apontadapor Gramsci, que considera fundamental a abordagem deste tipo de ques-tões. “Muitos gostariam de conhecer e estudar as situações locais, que sem-pre interessam muito, mas não sabem como fazê-lo, por onde começar (…)Este trabalho pode ser feito, de diversos pontos de vista, não só para regiões,mas para problemas gerais, de cultura, etc.”15 . Para comprovar que Posiçãoadotava esta postura basta uma folheada em seus exemplares. Alguns títulosde primeira página podem, neste caso, ser tomados como exemplo, como é ocaso da chamada do número 03: Tubarão: o projeto da siderúrgica foi apres-sado, sem planejamento, sem infra-estrutura. Mas é irreversível. Ou de umadas chamadas do número 09: Ensino. Eleições na universidade. Politicagemnas escolas. Apesar do foco local, o jornal não deixava de falar de assuntosnacionais e internacionais, como pode ser vistos nos quadros que tratam, noCapítulo II, da comparação dos discursos de Posição e do regime, baseadona Doutrina de Segurança Nacional.

Gramsci, ao mesmo tempo em que traça diretrizes para o lançamento edireção de um jornal, atribui grande importância ao papel da imprensa, deum modo geral. Dela, diz ser um partido ampliado, no sentido de, como umpartido, lutar por um determinado objetivo. Coloca, ainda, o jornal dentrodo que chamou de aparelhos privados de hegemonia, já que a mídia ajuda naconstrução e na manutenção da hegemonia. Pode, por outro lado, exercerum papel contra-hegemônico, contribuindo, neste caso, para a substituiçãode uma hegemonia por outra. Neste caso, através do trabalho dos intelectu-ais orgânicos, ajuda na difusão de uma nova ideologia, com o objetivo detorná-la senso comum e entranhá-la na sociedade civil de tal forma que setransforme em visão de mundo das várias classes sociais.

O que Gramsci teoriza, baseado na sua própria experiência de ação polí-tica, é que, em primeiro lugar, um jornal pode ser usado como um partidoampliado, buscando alargar a ação de conquista do poder mediante a cons-trução de uma nova hegemonia e, portanto, da instalação de uma nova ide-ologia. Em segundo lugar, liga a ação do jornal à dos intelectuais orgânicos,

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chaves no processo de estabelecimento de uma nova hegemonia ou na ma-nutenção da existente. Neste caso, cita Benedeto Croce, um dos mais conhe-cidos intelectuais da Itália no início do século XX, cuja ação foi, sempre, nosentido de manter a hegemonia existente. Em terceiro lugar, Gramsci afirmaque não há um único caminho para a construção desta nova ideologia e danova hegemonia. O trabalho deve ser multifacetado, pois

“Não basta a premissa da “difusão orgânica, por um centrohomogêneo, de um modo de pensar e de agir homogêneo. O mesmoraio luminoso, passando por prismas diversos, dá refrações de luzdiversas: se se pretende obter a mesma refração é necessária todauma série de retificações nos prismas singulares. (...) é necessária aadaptação de cada conceito às diversas peculiaridades e tradiçõesculturais”16 .

Ao intelectual, que “é um profissional especializado (skilled) que conhe-ce o funcionamento de “máquinas” próprias especializadas”17 cabem a “apre-sentação e representação em todos os seus aspectos positivos e em suasnegações tradicionais, relacionando sempre cada aspecto parcial à totalida-de”18 , o que vai levar à formação de uma consciência critica e, portanto,ajudar na construção da nova hegemonia. O papel do jornal integra-se, aqui,ao do jornalista. Os dois, no entender de Gramsci, podem – e devem – exer-cer um papel de formação de uma cultura, criando uma nova consciência,ajudando na difusão e implantação de uma nova ideologia e, como conseqü-ência deste trabalho, construindo uma nova hegemonia.

Quem é intelectual? O que são intelectuais orgânicos? Para se trabalharcom o conceito gramsciano de intelectual é essencial dar respostas às duasperguntas. No caso da primeira, o seu conceito é revolucionário, já que nãoreduziu o intelectual ao homem de letra, mas afirma que todos são intelectu-ais e o que os diferenciam é a função que exercem. Gramsci ampliou o con-ceito de intelectual, dando-lhe um caráter de formulador. O intelectual sur-gido desta formulação é absolutamente original, pois não guarda nenhumtraço do que, antes, se pensava dele: um homem reflexivo, que procurava delonge explicar o mundo, não transformá-lo. Assim, mudando o conceito deintelectual, é possível responder à segunda questão. Orgânico, em síntese, éo intelectual que participa, que age, que ajuda na formulação de uma novahegemonia ou se engaja na manutenção da hegemonia existente. De um ladoe do outro, a organicidade vem do comprometimento, da participação, naformulação de idéia que ajudem na ação política, seja ela hegemônica oucontra-hegemônica.

Há, ainda, por destacar nesta nova formulação o seu valor revolucioná-

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rio, já que Gramsci, ao afirmar que todos somos intelectuais, acaba com umapretensa divisão do trabalho, mostrando que o intelectual é também um tra-balhador e, como ele, está sujeito à venda da única mercadoria que possui,que é o seu próprio trabalho de pensar e de ensinar. Ao mesmo tempo emque amplia a ação do intelectual, Gramsci o recoloca junto de uma classe,ligando-a a ela e diferenciando-o apenas em função das tarefas que irá exer-cer. Neste sentido, o trabalho intelectual não existe por si só, mas é umafunção que se exerce no dia-a-dia, na organização, na difusão de idéias e naação.

Olhando o intelectual dentro do conceito ampliado, Gramsci pode dizerque “cada grupo social (…) cria para si, ao mesmo tempo e de modo orgâni-co, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e aconsciência da própria função”19 e é neste momento que Gramsci explicaque os camponeses, por não possuírem seus intelectuais orgânicos, acabamsem uma identificação de classe e, por isso, ligada às classes hegemônicas.

Reforçando a classificação de que não existem não intelectuais, Gramscicomenta:

“Na verdade, o operário ou o proletário, por exemplo, não se ca-racteriza especificamente pelo trabalho manual ou instrumental, maspor este trabalho em determinadas condições e em determinadas re-lações sociais (…) em qualquer trabalho físico, mesmo no mais me-cânico e degradado, existe um mínimo de qualificação técnica, isto é,um mínimo de atividade intelectual criadora”20 .

O intelectual orgânico está intimamente ligado ao trabalho de constru-ção de uma nova visão de mundo e se contrapõe ao intelectual tradicional,desligado de sua classe e que se julga autônomo em relação à sociedade civil.Gramsci traça os papéis que os intelectuais orgânicos devem representar eum deles é ligar os elos da superestrutura mediante a interpretação do sensocomum e visando a transformar a ideologia que perpasse a sociedade civilem hegemônica, unindo, assim, a sociedade em torno de um objetivo políti-co. Como toda interpretação de Gramsci se prende ao político, é para a polí-tica que o intelectual deve se voltar. E no caso do intelectual orgânico, seuprincipal papel é de organizador, ao que deve seguir o dirigente e o educador.As funções, aliás, se realizam juntas, dando ao intelectual um papel políticoqualificado e tornando-o em vanguarda, não no sentido de ir à frente, mas depreparar a sociedade, através de criação de uma nova visão de mundo, paraas mudanças necessárias no Estado e na política.

Gramsci explica:“Poder-se-ia medir a “organicidade” dos diversos estratos intelec-

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tuais, sua mais ou menos estreita conexão com um grupo social fun-damental, fixando uma gradação das funções e das superestruturasde baixo para cima (da base estrutural para cima). Por enquanto pode-se fixar dois grandes “planos” superestruturais: o que pode ser cha-mado de “sociedade civil” (isto é, o conjunto de organismos chama-dos comumente de “privados”) e da “sociedade política ou Estado”,que correspondem à função de “hegemonia” que o grupo dominanteexerce em toda a sociedade e àquela de “domínio direto” ou de co-mando, que se expressa no Estado e no governo “justo”21 .

A tarefa final do intelectual seria, mesmo, a de criação e organização deuma cultura, contribuindo para o surgimento e consolidação de uma ideolo-gia, que vai, conforme afirma o próprio Gramsci, perpassar toda a socieda-de, dando-lhe solidez e fazendo com que haja, por parte do grupo de coman-do, hegemonia. Toda a análise e conceituação de Gramsci partiu da situaçãoitaliana e da dominação do Norte sobre o Sul do país, incluindo-se sua pró-pria região. As formulações levam em conta, ainda, o momento histórico epolítico, com a esquerda tentando e não conseguindo chegar ao poder. Con-sideram, também, a dificuldade de alianças entre os vários grupos sociais, oque dificultava a ação política de quem não compunha o bloco de poder enão estava inserido no momento hegemônico.

Gramsci, valendo-se da hierarquização que fez dos intelectuais, colocaos professores e jornalistas – que havia criticado antes, dizendo serempretensos intelectuais – em um primeiro nível de organicidade. E isto se dápor serem os dois instrumentos de ensino e de mudança, com o ensino mar-cando, mais ainda, a função do professor, que se transforma em um forma-dor de novos intelectuais e, com isso, pode contribuir para que os formadossejam orgânicos, não tradicionais. O que é necessário ver, então, é se os jor-nalistas de Posição se enquadram na categoria de orgânicos e se fizeram,com a publicação do jornal, um trabalho contra-hegemônico, buscando aconstrução de uma nova ideologia, de uma nova hegemonia.

O trabalho contra-hegemônico exercido por Posição está demonstradono Capítulo II, contrapondo-se o seu discurso, através do que foi expressoem suas capas, ao discurso do regime. O próprio discurso adotado pelo jor-nal pode servir para medir a organicidade dos intelectuais que nele atuaramao longo de suas 65 edições. A este respeito, reportemo-nos a DomiqueMaingueneau22 que, ao apontar princípios para a análise dos discursos, nosremete a duas leis que indicam ser o discurso orientado e uma forma de ação.Sobre o primeiro ponto, afirma: “O discurso se constrói, com efeito, emfunção de uma finalidade, devendo, supostamente, dirigir-se para algum lu-

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gar”23 . No segundo, porque “falar é uma forma de ação sobre o outro e nãoapenas representação do mundo”24 . O autor ressalta, a seguir, que “todaenunciação constitui um ato (prometer, sugerir, afirmar, interrogar, etc.) quevisa a modificar uma situação”25 . O discurso, neste caso, destina-se a produ-zir uma modificação nos destinatários. Tanto em um, como no outro casopode-se enquadrar o discurso jornalístico, de uma maneira geral, e o de Posi-ção, em particular. O jornal, a se basear na conceituação de Maingueneau,construiu o seu discurso com o sentido claro de produzir uma modificaçãona postura de seus leitores, oferecendo-lhes uma visão critica do momentohistórico vivido no Espírito Santo e, a partir dela, ajudando na reflexão so-bre a ação do regime, contribuindo para a sua desconstrução e, com isso,participando da disseminação de uma nova ideologia – a democracia, que seantepunha à ditadura.

Esta postura é reforçada no depoimento de Jô Amado, Editor Chefe dojornal. “Naquela época (em que o jornal Posição foi criado) a prioridadepolítica na luta contra a ditadura obedecia basicamente a dois temas: a) anis-tia aos presos políticos; e b) denúncia e luta contra a censura”26 . RobsonMoreira, um dos primeiros integrantes da redação e que no final da vida dePosição foi seu diretor, assinala que a idéia que perpassava o jornal “eradizer, em função de uma determinada realidade, tudo aquilo que há muitonão era dito”27 , acrescentando que havia um trabalho de integração com osmovimentos sociais. “Não fazíamos para eles, mas, por meio do jornal, falá-vamos dos problemas e que, se eles se organizassem, poderiam conquistar avida que estavam necessitando”28 .

Nos dois casos fica claro o engajamento dos jornalistas em um trabalhoque buscava expor os problemas do regime, mediante a divulgação do queocorria no Espírito Santo e, ao mesmo tempo, o comprometimento delescom a mudança, duas das condições essenciais, segundo Gramsci, para seclassificar um intelectual como orgânico. Outra mostra do engajamento é acomposição do próprio Conselho Editorial do jornal. Em uma de suas fases,conforme relata Tadeu César, em “uma reunião dos colaboradores do jornalpropusemos a criação de um grande conselho editorial com a participação dedeputados estaduais do MDB, de integrantes do movimento Justiça e Paz,da OAB, de intelectuais engajados, de lideranças do movimento estudantilque se encontrava em reorganização, de sindicalistas, etc.”29 . Com a inser-ção dos movimentos sociais no Conselho Editorial Posição ampliou sua liga-ção com estes movimentos, iniciado desde o primeiro número, conformeafirma Jô Amado: “Havia uma integração efetiva com os movimentos soci-ais (centros comunitários), com sindicatos, com setores das igrejas – no caso

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específico da igreja católica, éramos muito próximos da Comissão de Justiçae Paz”30 .

Umberto Martins, outro dos colaboradores do jornal e que também foiseu Editor, é mais claro quanto fala da ligação de Posição com os movimen-tos sociais. “O jornal”, afirma, “buscava representar anseios e opiniões dosmovimentos sociais, bem como do MDB e personalidades que faziam oposi-ção ao regime militar”31 . Martins reconhece que os partidos de esquerda, naépoca na ilegalidade, exerciam influência sobre o jornal, mas ressalta que eletambém tinha influências do MDB, o partido legal de oposição, fornecendo aindispensável ligação política que Gramsci atribui ao intelectual orgânico.

O caráter de oposição e, portanto, de luta contra-hegemônica, é ressalta-do por Rogério Medeiros32 ao lembrar que o jornal se focou nos problemasestaduais, incluindo os políticos, e mirou a elite, que estava no poder ou quedava suporte a ele. O próprio Medeiros era o encarregado de escrever asmatérias políticas devido, reconhece, ao maior trânsito que tinha e ao conhe-cimento do mundo político local. Este caráter é reforçado por César, aolembrar que, no caso do Espírito Santo, Posição era a única publicação regu-lar que fazia oposição ao regime, destacando que o jornal “cumpria um papelpolítico muito importante no ES, já que era o único jornal de resistência àditadura no estado e, consequentemente, o único canal de enfrentamento aostatus-quo dominante”33 , daí entender que Posição ajudou a “compor umaconsciência critica à ditadura e, mesmo com os tropeços sectários, inerentesao próprio momento em que vivíamos, contribuímos para a construção deuma consciência democrática no Espírito Santo”34 . Marca-se, assim, um dosoutros aspectos da atuação orgânica dos intelectuais que compunham posi-ção, engajados na construção de uma nova hegemonia mediante uma atuaçãopolítica clara.

O engajamento, seja mediante criticas ao Governo e ao regime, seja pelaligação com os movimentos sociais, é reconhecido pelos que participaramde Posição, tenham exercido cargos de chefia ou não. Martins, Amado,Medeiros, César, Moreira e, fora do rol de jornalistas, Araújo, deixam claro aligação do jornal com, em primeiro lugar, a oposição constituída no Estado,mediante abertura de canais para o MDB, que não tinha acesso à grandeimprensa. O jornal dava voz aos movimentos sociais, denunciando, dentreoutras coisas, a favelização da Grande Vitória. O discurso de Posição, nestecaso e como destaca Maingueneau, é marcado por uma ação de contraposiçãoao regime, o que nos leva a afirmar que era contra-hegemônico e marca aatuação dos intelectuais que nele atuavam como orgânicos.

Na linha do uso do discurso para mostrar o trabalho orgânico dos intelec-

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tuais de Posição, outro suporte são os editoriais do jornal. Como destacaJean-François Tétu “o editorial mostra mais que qualquer outra parte dojornal, dado que seu papel é o de informar, ao mesmo tempo, sobre o mundoe sobre a maneira através da qual se deve percebê-lo”35 , aduzindo que ojornal constrói o acontecimento e, por isso, “o editorial o indica claramen-te”. O editorial, assim, não apenas diz o conteúdo do jornal, mas remete oleitor à sua interpretação, como ele deve ser lido e os objetivos buscados novariado material que compõe, na diversidade, a unidade de sentido destedispositivo, como lembra Mouillaud36 .

Assim, os editoriais de Posição servem para mostrar a sua ação contra-hegemônica, uma vertente que não adotamos nesta pesquisa. Servem, tam-bém, para indicar uma ação orgânica dos intelectuais que o integraram, refle-tindo o seu engajamento político e a busca de transformação social, o que seconfigura, no final, como um trabalho contra-hegemônico do próprio jornale daqueles que o integram. Veja-se o que disse o Editorial do numero 05:

“(...) a crise camuflada que se vinha arrastando há meses tende aassumir, cada vez mais, claramente, os contornos concretos de umarecessão econômica. Ontem, as pessoas se queixavam da falta defeijão, do preço dos alimentos, da alta do aluguel, do nível dos salári-os. Hoje, o fantasma do desemprego passa a ocupar o lugar principalnas preocupações do povo”.

A orientação do discurso, na linha defendida por Maingueneu, é clara eobjetiva desconstituir a imagem de desenvolvimento econômico, da ausên-cia de problemas e de consenso entre a população brasileira em face do regi-me e da Doutrina de Segurança Nacional que adotava. O discurso reafirma,também, o engajamento do jornal e dos intelectuais que o compunham, des-tacando um aspecto do real que não era abordado pela chamada grande mí-dia, pela existência da censura oficial ou por seu alinhamento com o blocode poder, visando à manutenção de uma hegemonia.

Esta postura é reforçada por outros editoriais, como o do numero 16:“(...) passamos mais de seis meses abordando temas “tabus” para

o restante da imprensa capixaba: revelando a face escondida de gran-des grupos econômicos estrangeiros, denunciando desmandos –crônicos e reincidentes – de representantes do Poder Público; notici-ando conluios entre abastados particulares e empresas do governo(...) ou divulgando ilegalidades, iniqüidades, irregularidades cometi-das em nome da Justiça”.

O que o jornal buscava, desde o seu início, como ressalta Martins era a“democratização das relações políticas no Estado e um fortalecimento de

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um pensamento e de forças progressistas, a exemplo de outras publicaçõesparecidas (em geral alternativas) elaboradas noutros Estados e regiões dopaís e/ou de circulação nacional (caso dos jornais Movimento e Opinião)”37 .Por isso, segundo ainda Martins, o jornal era hostil às forças da direita “damesma forma que o jornal era hostil à ditadura e seus representantes noEstado”38 , o que resultava em o que ele chama ódio destes segmentos àpublicação.

Ao contrapor-se ao regime, mediante a escolha de informações que nãoeram veiculadas na chamada grande mídia, os jornalistas de Posição, além dotrabalho técnico, no sentido gramsciano, realizavam, também, um trabalhoque visava à mudança e, portanto, de construção de uma nova hegemonia.Como frisam os integrantes do jornal – Amado, Martins, César, Moreira eMedeiros – Posição investia na conscientização da necessidade de democra-tização do país. Defendia, assim, uma nova ideologia, a democracia, que seopunha à ideologia do regime, baseada na Doutrina de Segurança Nacional.

O que os jornalistas, já apontados por Gramsci, como intelectuais quepodem ter uma atuação orgânica, fizeram foi imiscuírem-se “ativamente navida prática, como construtor, organizador, “persuasor permanente”. Se osintelectuais são “funcionários” da superestrutura, a ligação deles com o con-texto social, que é diversificado, pode se dar, ainda de acordo com o concei-to gramsciano, do lado da sociedade civil ou da sociedade política. ComoGramsci relaciona a sociedade política ao Estado, ao poder, os intelectuaisalinhados a ela seriam, no caso, os reprodutores da hegemonia, lutando pelamanutenção do poder das classes que já o têm. De outro lado – e aqui estãoos jornalistas que integraram o jornal Posição – ao alinharem-se à sociedadecivil, os intelectuais orgânicos passam a exercer um papel contra-hegemônico,isto é, passam a trabalhar no sentido de construção de uma nova hegemoniae, portanto, da formação de uma nova sociedade política. Como frisa Beired39 ,na teoria gramsciana os intelectuais podem exercer papéis de conservaçãoou de transformação. Em ambos os casos, eles têm atuação orgânica. “Aanálise de Gramsci detém-se na demonstração do papel – conservador outransformador – do intelectual como figura que organiza a cultura e os ho-mens; que articula o centro do aparelho estatal de poder com o restante docorpo social; e que ao produzir ideologia fornece consciência e homogeneidadeàs classes que representa”40 , afirma Beired.

No caso do jornal Posição, pela postura adotada pela publicação, peloengajamento dos seus jornalistas e pela ação por eles exercidas, podemosafirmar, tomando o conceito desenvolvido por Gramsci, que estamos diantede um trabalho orgânico, inserido em um contexto social e histórico delimi-

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tado e que, por se engajarem e difundirem uma nova ideologia – a da demo-cratização – os jornalistas de Posição podem ser considerados intelectuaisorgânicos. A demonstração dessa organicidade é dada pelo discurso da pu-blicação, pelo engajamento de seus jornalistas e pela integração aos movi-mentos sociais que buscavam a mudança da hegemonia vigente. O trabalhoorgânico, de criação de uma nova hegemonia, pressupõe um engajamentoideológico – o que, conforme relatam os integrantes do jornal, aconteceucom Posição. A ideologia serve, assim, de pano de fundo para o trabalhopolítico e orgânico, em todos os seus níveis, realizado pelos intelectuais.

Se a ideologia representa um papel importante, como é que Gramsci a vê?A ideologia, responde Gramsci, nos Cadernos do Cárcere, “é a unidade entreuma concepção de mundo e uma norma de conduta adequada a ela”41 .Coutinho afirma que para Gramsci “a ideologia é algo que transcende o co-nhecimento e já se articula diretamente com a pratica, com a política”42 . JáBadaloni afirma que o conceito “busca dar às “crenças” (ou, como ele diz, às“ideologias”) um significado ativo, criador, precisamente porque aparecemcomo elemento organizador da coletividade”43 . A ideologia, então, ganhaimportância e significação no trabalho hegemônico e contra-hegemônico.Cabe aos intelectuais orgânicos a formulação de ações que, de um lado, con-firmem um determinado bloco histórico ou, então, que estabeleçam diretrizespara a sua substituição, instalando-se uma nova hegemonia, um trabalhofeito pelo jornal Posição e pelos intelectuais orgânicos que o integravam.Pizzorno ajuda no entendimento de como Gramsci vê a ideologia ao afirmarque “quando a ideologia adquire “a solidez das crenças populares” (segundouma expressão de Marx), então se unifica um bloco social, se constitui umbloco histórico (quer dizer, se realiza um sistema social integrado”44 .

O que a ideologia faz, na concepção gramsciana, que é positiva, é “darcoerência a um partido, a um grupo, a uma sociedade, vale dizer, de consti-tuir princípios de distinção e de coesão internas”45 . Somente com a ideologiaentranhada no meio social é que se torna possível tornar unitária e coerentea visão de mundo. Se tal não for realizado, afirma Pizzorno, a incoerênciapode levar a “múltiplas influências negativas no plano da conduta moral, davontade, até ao ponto de impedir totalmente a ação e decisão e produzir umestado de passividade moral e política”46 . Se há uma coisa que Gramsci nãoaceita é a passividade, ao ponto de chegar a dizer que odiava os indiferentespor entender que viver significava tomar partido.

A importância da ideologia para as formulações de Gramsci é destacadapor Eagleton47 ao dizer que o conceito de hegemonia inclui a ideologia, masnão pode ser reduzida a ela. “A hegemonia”, afirma Eagleton, “então, não é

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apenas um tipo bem sucedido de ideologia, mas pode ser decomposta emseus vários aspectos ideológicos, culturais, políticos e econômicos”48 . Éexatamente a existência de vários eixos dentro de uma ideologia – e quelevam à busca de hegemonia – que torna o trabalho do intelectual orgânicomais importante. Dentro de um jornal, como educador, como criador denovos significados e novos simbolismos, ele ajuda na construção destahegemonia. O que Gramsci fez, ressalta Eagleton, foi efetuar uma “transi-ção crucial de ideologia como “sistemas de idéias” para ideologia como prá-tica social vivida, habitual – que, então, deve abranger as dimensões inconsci-entes, inarticuladas da experiência social, além do funcionamento das insti-tuições formais”49 . O que a ideologia fornece à hegemonia é a possibilidadedela permanecer invisível, disseminada por toda textura da vida social, natu-ralizada como costume, hábito, prática espontânea. Evitando se mostrar,nos diz Eagleton, o poder evita contestação, dificultando, com isso, o traba-lho contra-hegemônico.

Como há, como demonstra Eagleton, uma ligação estreita da hegemoniacom a ideologia, o trabalho dos intelectuais orgânicos é, também, um traba-lho ideológico. Na construção de uma nova hegemonia – portanto, em umtrabalho contra-hegemônico – o que fazem é desconstituir a hegemonia do-minante para a implantação de uma nova. A ação orgânica torna-se, assim,ação política, já que visa à mudança do bloco de poder, e assume o seucaráter ideológico, de pregação de uma nova hegemonia e de uma nova visãode mundo, que tende a ser naturalizada em um corte transversal que perpas-sa todos os estratos sociais.

A ideologia, assim, além de servir de pano de fundo para toda ação dosintelectuais orgânicos e dos aparelhos privados de hegemonia, dentre os quaispodemos destacar a mídia, está no cerne da atuação orgânica dos intelectu-ais. Temos, aqui, como afirma Zizek, a ideologia “como matriz geradora doque regula a relação entre o visível e o invisível, o imaginável e o inimaginável,bem como as mudanças nessa relação”50 . É essa a construção a que o inte-lectual orgânico se dedica. A ideologia, por se muito mais do que um sistemade crenças, por fornecer a própria base de subjetivação, está no cerne dotrabalho contra-hegemônico e oferece o suporte e as ferramentas com que ointelectual orgânico trabalha.

No caso do jornal Posição, estas vertentes estão claras. Tomando-se comobase as entrevistas dos integrantes do jornal, eles adotaram uma posiçãopolítica clara, de oposição ao regime e integraram correntes sociais que bus-cavam uma nova hegemonia, atuando como críticos, expondo problemas doregime e, exercendo as leis do discurso, dando ao que o jornal publicava um

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sentido contra-hegemônico. A base de tudo o que foi feito está, em relaçãoao momento histórico específico, na democracia, uma forma de Governo,mas também um sistema ideológico que se contrapunha à política do regime,desenvolvida a partir das diretrizes da Doutrina de Segurança Nacional.

O grande feito da ideologia, como lembra Pêcheux51 , é tornar-se invisí-vel, já que opera ocultando sua própria existência. E é exatamente por issoque a questão ideológica precisa ser examinada, mostrando que ela existe,exerce influência e oferece a base para um trabalho de contra-hegemonia,buscando, no entender de Gramsci, tornar-se senso comum, entranhada notecido social e criar uma nova concepção de mundo. Quando isso ocorre,tem-se uma nova hegemonia. E foi o que aconteceu no Brasil com o fim doregime civil militar. Posição e seus jornalistas participaram, ao longo do tem-po de circulação do jornal, da construção desta nova hegemonia, que culmi-nou com a democratização do país.

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Notas1 WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. Lisboa, Editorial Presença, 20022 WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. Lisboa, Editorial Presença, 2002, p. 723 BARROS FILHO, Clóvis de. Ética na comunicação: da informação ao receptor, São Paulo,

Moderna, 1995, p. 207 a 2254 CARNEIR, Maria Luiza T. Minorias silenciadas, a história da censura no Brasil. São Paulo,

Edusp, 20025 SKIDMORE, Thomas E. A lenta via brasileira para a democratização, in STEPAN, Alfred

(Org). Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 19856 SMITH, Anne Marie. Um acordo forçado. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2000.7 FICO, Carlos. Reinventando o otimismo. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997.8 GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do

Livro, s/d, p. 149 KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários nos tempos da imprensa alternativa.

São Paulo, Edusp, 2003.10 GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do

Livro, s/d, p. 14711 GRAMSCI, Antonio. Op. Cit., p. 14712 Entrevista com Jô Amado, em 21-12-200513 Entrevista com Rogério Medeiros, em 27-12-200514 GRAMSCI, Antonio. Op. Cit., p. 15415 GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do

Livro, s/d, p. 15716 GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do

Livro, s/d, p. 158-15917 GRAMSCI, Antonio. Idem, p. 15918 GRAMSCI, Antonio. Idem, ibidem, p. 16019 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do Livro,

s/d, p. 720 GRAMSC, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do Livro, s/

d, p. 1021 GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo, Círculo do Livro,

s/d, p. 12-1322 MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. São Paulo, Cortez

Editora, 2002, 2 edição23 MAINGUENEAU, Dominique. Idem, p. 5224 MAINGUENEAU, Dominique. Análise dos textos de comunicação. São Paulo, Cortez

Editora, 2002, 2 edição, p. 5325 Idem, p. 5326 Entrevista com Jô Amado, em 21-12-200527 TRINDADE, Carlos Calenti et alli. Jornalismo alternativo: da década de 40 aos dias atuais,

in MARTINUZZO, José Antônio. Impressões capixabas – 165 anos de jornalismo no EspíritoSanto. Vitória, UFES-Departamento de Imprensa Oficial, 2005, p. 292

28 Idem, p. 29229 Entrevista com Benedito Tadeu César, em 25-01-2006

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30 Entrevista com Jô Amado, em 21-12-200531 Entrevista com Umberto Martins, em 24-01-200632 Entrevista com Rogério Medeiros, em 27-12-200533 Entrevista com Benedito Tadeu César, em 25-01-200634 Entrevista com Benedito Tadeu César, em 25-01-200635 TÉTU, Jean-François. Le Monde e Liberation em perspectiva, in MOUILLAUD, Maurice,

e PORTO, Sérgio Dayrell (Orgs). O jornal da forma ao sentido. Brasília, Editora UNB, 2002, 2edição, p. 192.

36 MOUILLAUD, Maurice, e PORTO, Sérgio Dayrell (Orgs). O jornal da forma ao sentido.Brasília, Editora UNB, 2002, 2 edição

37 Entrevista com Umberto Martins, em 24-01-200638 Idem39 BEIRED, José Luís Bendicho. A função social dos intelectuais, in AGGIO, Alberto.

Gramsci, a vitalidade de um pensamento. São Paulo, Unesp, 1998.40 BEIRED, José Luís Bendicho. A função social dos intelectuais, in AGGIO, Alberto.

Gramsci, a vitalidade de um pensamento. São Paulo, Unesp, 1998, p. 12741 GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere, apud COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci.

Porto Alegre, L&PM Editores, 1981, p. 8342 COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Porto Alegre, L&PM Editores, 1981, p. 8443 BADALONI, Nicola. Gramsci e a filosofia da práxis como previsão, in HOBSBAWN,

Eric. História do Marxismo, Rio de Janeiro, Paz e Terra, Vol. 10, 1997, p. 4844 PIZZORNO, Alexandre. Sobre el método de Gramsci, in GALLINO, Luciano. Gramsci

e as ciências sociais, Cordoba, 1979, p. 5145 Idem, p. 5246 GALLINO, Luciano. Gramsci e as ciências sociais. Córdoba,1979, p. 384747 EAGLETON, Terry. Ideologia. São Paulo, Boitempo-Unesp, 1997, p. 10548 Idem, p. 10649 EAGLETON, Terry. Ideologia. São Paulo, Boitempo-Unesp, 1997, p. 10750 ZIZEK, Slavoj. O espectro da ideologia, in ZIZEK, Slavoj. Um mapa da ideologia. Rio

de Janeiro, Contaponto, 1996, p. 751 PÊCHEUX, Michel. O mecanismo de (des)conhecimento ideológico, in ZIZEK, Slavoj

(Org). Um mapa da ideologia. Rio de Janeiro, Contraponto, 1996, p. 148

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“Im p re ns a é o p osi ç ã o . O resto é a rm a zé md e se c os e m o lh a d os”

M illôr F e rn a n d es

afirmação de Millôr, humorista reconhecido e autor consagradono teatro, certamente é um exagero. Os teóricos do jornalismonão concordam com esta posição, mas admitem que o jornal, osjornalistas e a construção do acontecimento que fazem não sãoneutros. No mínimo, eles passam por um enquadramento, que

pode ser do jornal ou do jornalista ou, então, dos dois. Nélson Traquina, umteórico português bastante utilizado nas academias brasileiras, coloca umaquestão para reflexão, chamando a atenção para uma pergunta que entendeser fundamental: o que é jornalismo na democracia? E ele responde:

“A democracia não pode ser imaginada como um sistema de go-verno sem liberdade, e o papel central do jornalismo, na teoria demo-crática, é informar o público sem censura. Os pais fundadores dateoria democrática sempre insistiram, desde o filósofo Milton, na li-berdade como fator essencial da troca de idéias e opiniões, reservan-do ao jornalismo não apenas o papel de informar os cidadãos, mastambém, num quadro de checks and balances (a divisão de poderentre poderes), a responsabilidade de vigilante (watchdog) do gover-no. Tal como a democracia sem uma imprensa livre é impensável, ojornalismo, sem liberdade, ou é farsa ou é tragédia”1 .

Sem democracia, o jornalismo vira propaganda. E foi isso o que aconte-ceu, durante o regime civil militar que, por 20 anos, dominou o país. O con-trole da informação exerceu um papel importante na busca de manutenção econsolidação do regime. Sobre a mídia, nestes anos, sempre pendeu a espadade censura. Mas não foi só. O Governo usou os outros instrumentos quetinha, indo da pressão econômica ao oferecimento de facilidades na obten-ção de concessões de rádio e televisão. Contou, ainda, com a adesão dos

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empresários que detinham o controle da mídia brasileira. No final, sobravapouco espaço para a discussão de idéias e opiniões, como sugere Traquina.O caminho para furar este bloqueio foi a chamada imprensa alternativa. Nestecaso, o jornalismo transformou-se, de fato, em oposição. Basta paracomprová-lo ver o que afirma Kucinski, que chama os integrantes destaimprensa de jornalistas e revolucionários. No primeiro caso, por estarem,efetivamente, integrados à profissão. No segundo, pelo seu desejo de mu-dança, o que foi exercido com a ação dos jornais alternativos, dentre elesPosição.

A discussão feita neste trabalho buscava, em primeiro lugar, comprovaruma hipótese que dizia ter o jornal Posição exercido um papel contra-hegemônico, ajudando na construção de uma nova hegemonia e fez issorefletindo sobre a democracia, conflito capital versus trabalho e contextosocial. O exercício contra-hegemônico de Posição está demonstrado no Ca-pítulo II e, através do uso de categorias em que a Doutrina de SegurançaNacional divide o poder nacional, foi possível mostrar que o discurso dojornal, através das chamadas de capa e da significação criada pela própriaprimeira página, com a colocação dos títulos, ilustrações ou fotografias,efetivamente se contrapôs ao do Governo, então detentor da hegemonia. Aoexercer papel contra-hegemônico, Posição discutiu questões relacionadas àdemocracia, ajudando a mostrar que o país não vivia em um regime demo-crático, principalmente através da integração com os movimentos sociais.Mostrou, também, os problemas relacionados ao conflito capital versus tra-balho falando de reivindicações salariais, movimentação sindical e greve,tudo feito em nome de melhores salários. Este discurso se contrapunha aodo Governo, que dizia não existir no Brasil conflito entre empregados e pa-trões, exercendo um férreo controle sobre os sindicatos.

O jornal explorou, e muito, o contexto social, partindo dos problemasexistentes no Espírito Santo, relacionados à economia, à política e às condi-ções de vidas dos que eram mais pobres. Em relação à economia, semprefez, como mostram as chamadas de capa de Posição, uma crítica consistenteaos grandes projetos, chamando a atenção para aspectos que não eram di-vulgados, como a ampliação das favelas, ocorrida com o êxodo das áreasrurais, devido à atração destes projetos, que apareciam, no imaginário capi-xaba, como forma fácil de emprego. Basta ver, para tanto, o quadro que faza comparação entre as diretrizes da DSN e o discurso de Posição. Mostrou,ainda, problemas na educação, na saúde e no campo, sempre em confrontocom o discurso oficial, desenvolvimentista e que procurava passar a idéia dainexistência de problemas, principalmente os da área social. A categorização

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e, a partir dela, a comparação entre as diretrizes da DSN e o discurso dePosição comprova que o jornal exerceu, de fato, um papel contra-hegemônico,ajudando na construção de uma nova hegemonia, consolidada a partir daadoção da democracia, com liberdade de imprensa, de opinião e com o fimda censura e da repressão política.

Se a hipótese resta comprovada, é preciso ater-se, ainda, aos objetivostraçados para esta pesquisa e ver se foram alcançados. No caso do desafio aocontrole do governo, Posição o fez, basicamente, através do engajamento deseus jornalistas, intelectuais orgânicos na acepção de Gramsci. Foram elesos responsáveis pelo levantamento dos problemas divulgados pelo jornal.Foram eles que, engajados politicamente, como reconhecem os que dirigi-ram Posição, furaram o bloqueio da mídia tradicional, mostrando que o Es-tado não era e não vivia em um mar de rosa. Havia problemas que iam doeconômico ao social, sem deixar de lado os políticos, com manipulação elei-toral e corrupção no poder público. O quadro que fala em poder político, noCapítulo II, mostra muito bem esta ação. O trabalho, no entanto, não foiisolado, já que o jornal ligava-se aos movimentos sociais, divulgando suasreivindicações e servindo de voz para os que não tinham acesso à mídiatradicional, o que dava maior amplitude às reivindicações.

O exercício do jornalismo, e do bom jornalismo, foi o principal instru-mento usado por Posição para fazer o trabalho contra-hegemônico. Os inte-lectuais orgânicos que o integravam, como demonstrado no Capítulo III,agiam no sentido de ter, a cada edição, um número variado de assuntos,refletido na primeira página do jornal, destacando matérias que ajudavam nadesconstrução do discurso oficial, de que tudo ia bem e não havia proble-mas. O jornal valeu-se, também, de sua circulação, pequena se consideradao contexto dos grandes jornais, mais que atingia um número considerável deleitores e formadores de opinião, criando o debate sobre as questões aborda-das e desconstruindo a hegemonia do regime. Aqui, como antes, o papelcontra-hegemônico está ligado aos assuntos que o jornal abordava e ao pró-prio discurso e como ele o construía, de forma a opor-se ao discurso oficial,cuja base era a DSN.

Resta, para se completar os objetivos levantados, a questão da situaçãodo jornal e os meios que buscava para sua sobrevivência. Esta questão sópode ser entendida a partir do depoimento das pessoas envolvidas com ojornal. E elas dizem que, basicamente, ele se pagava com a venda avulsa eum pequeno número de assinantes. O jornal recebia anúncios, mas eles nun-ca foram significantes para a sua receita. Rogério Medeiros2 lembra que asPrefeituras de Cachoeiro do Itapemirim e de Vila Velha, ocupadas por pre-

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feitos do MDB, ajudavam com anúncios. Outra ajuda vinha de anúncios deprofissionais liberais, alguns de oposição, cujo sentido era o de ajudar o jor-nal, como comenta Walter Araújo3 . Medeiros e Araújo informam que o jor-nal recebia ajuda de outras pessoas, o que era feito sem a veiculação deanúncios. Um dos nomes citados pelos dois é o do advogado Paulo Silveira.Outro, do também advogado Sizenando Pechincha Filho. Quando o jornal,em seu primeiro editorial e em outros, sempre que havia uma mudança, diziaque dependia do leitor, não estava se valendo apenas da retórica, mas reco-nhecendo uma situação que ocorria na prática. A receita com os leitores, noentanto, às vezes não era suficiente e integrantes do jornal, que tinhamatividades fora da redação, acabavam colaborando para que Posição nãodeixasse de circular, como lembra Benedito Tadeu César.

Dependente do leitor, mas sem uma estrutura que permitisse ter recursossuficientes para manter-se circulando, Posição acabou. Os problemas finan-ceiros, no entanto, explica apenas em parte o fim do jornal. Ele se deu, tam-bém, pela mudança do contexto político, com o fim da censura à imprensa, aabertura partidária e a liberdade de manifestação. Combinados, estes fatorescontribuíram para o fim do jornal. É como afirma Martins, ao comentar ofechamento de Posição: “O fato mais geral é que se tratou de um períodohistórico a que a imprensa dita alternativa respondeu e que, ao se aproximardo fim (num clima de maior abertura, avanço da oposição e liberdade deimprensa –maior do que nos tempos mais sombrios da ditadura) talvez tenhaesgotado a necessidade de tais publicações”4 . Talvez, como comenta César5 ,se fosse estruturado, tivesse se transformado em cooperativa e compradoequipamentos o jornal se mantivesse. César acredita que sim. Esta, no en-tanto, é uma outra questão e não perfaz os objetivos deste estudo. Paracomprová-lo seria necessário uma outra pesquisa.

Medeiros, que foi o primeiro diretor de Posição, acha que havia – e aindahá – espaço para um jornal como Posição e entende que foi realmente o ladofinanceiro o determinante para o seu fechamento. O fato é que Posição real-mente dependia dos seus leitores, já que não contava com verbas de publici-dade para se manter. E foi esta uma das principais características do jornal.

A comprovação da hipótese e o alcançar dos objetivos propostos, no casodo jornal Posição, não esgota a questão do trabalho contra-hegemônico noEspírito Santo. Se o jornal foi um ícone da resistência, não foi o único. Polí-ticos, dirigentes sindicais, dirigentes de entidades, lideranças de bairros eligadas às Comunidades Eclesiais de Base, advogados, a Ordem dos Advo-gados do Brasil, a Igreja Católica e a Luterana, pelo menos, também agiramno sentido contra-hegemônico. Em alguns momentos, Posição refletiu este

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trabalho. Em outros, não. E é por isso que a questão merece ser maisinvestigada. No caso desta pesquisa, seu objeto é claro e o seu locus, limita-do, já que se centrou na ação de um jornal, que circulou no Espírito Santo de1976 a 1979, inicialmente a cada quinzena e, depois, a cada semana, criado,dirigido e escrito por intelectuais orgânicos e que, pelo seu engajamento,pelas posições assumidas e pela articulação do seu discurso exerceu, de fato,um papel contra-hegemônico no Estado.

A questão da contra-hegemonia, se resta explicada, não esgota a possibi-lidade de novos estudos sobre o jornal Posição, principalmente devido à ri-queza do que fez e ao momento que viveu, um dos mais férteis do país, como despontar de movimentos sociais e a busca da democratização, que chega-ria alguns anos depois do seu fechamento. Seguramente, o jornal pode ofere-cer novos caminhos para a reflexão, ficando aberto aos pesquisadores quevenham a se interessar pela sua trajetória e ação.

A proposta desta pesquisa de, sob a ótica da história política, relacionarmídia, ditadura e contra-hegemonia no Espírito Santo, mostrando a ação dojornal Posição, foi alcançada, mostrando que houve, de fato, uma ação con-tra-hegemônica por parte do jornal. A pesquisa mostra, ainda, as possibilida-des de se trabalhar a mídia e o que ela faz para se levantar a história política.Sem dúvida, Posição dá uma boa mostra como foi o exercício da oposição noEspírito Santo. Mostrá-lo, no caso desta pesquisa, só integrado a um objetivomaior, que era a construção de uma nova hegemonia que, como nos afirmaGramsci, só é conquistada com a união da sociedade política e da sociedadecivil, formando um bloco histórico e fornecendo os integrantes do bloco dopoder.

Os conceitos gramscianos de hegemonia – e de contra-hegemonia -, inte-lectuais orgânicos, partido ampliado e ideologia deram o suporte à discussãodeste trabalho, conduzindo-o, no final, à comprovação da hipótese levanta-da e ajudando no alcance dos seus objetivos. Eles não foram os únicos, noentanto, já que há o aproveitamento de recursos da análise do discurso e,mesmo, de elementos do jornalismo. O que se fez, na verdade, foi seguir oconselho de Peter Burke, de se recorrer à teoria social e buscar ainterdisciplinaridade para se exercer melhor o ofício de historiador e paraexplicar melhor o objeto escolhido e pesquisado. A utilização de conceitosde outras áreas, se cria uma dificuldade operacional, como reconhece Burke,acaba por permitir um enriquecimento da pesquisa. No caso deste trabalho,a afirmação de Burke é verdadeira e começa pelo uso dos conceitos deGramsci, desenvolvidos a partir da reflexão política, não histórica, mas quese aplica perfeitamente à história e à análise de questões como hegemonia,

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intelectuais, partido ampliado, etc.O que se prova, com esta pesquisa, no final, é que história, mídia e polí-

tica possuem liames muito fortes que as liga, com a primeira podendo seutilizar da segunda e da terceira como seus objetos ou, então, como se trataneste trabalho, juntando mídia e política e, a partir delas, fazendo-se umadiscussão histórica, focada em um momento, com recorte claro, buscando aexplicação para a ação de um jornal que se diferenciou pela sua ação, peloseu discurso e pelo trabalho dos intelectuais que o integravam.

Notas

1 TRAQUINA, Nelson. O que é jornalismo. Lisboa, Quimera, 2002, p. 122 Entrevista com Rogério Medeiros, em 27-12-20053 Entrevista com Walter Araújo, em 17-01-20064 Entrevista com Umberto Martins, em 24-01-20065 Entrevista com Benedito Tadeu César, em 25-01-2006

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“ A re a lid a d e , t a l c o m o a v e rd a d e , nun c a é ,p or d e fin i ç ã o , “to d a ” ” .

Sl a v o j Zize k

e, como nos diz Slavoj Zizek1 , repetindo Lacan, a realidade só nosaparece por espectro e é este espectro que está no cerne da ideolo-gia, as capas do jornal Posição oferece uma pequena visão de umarealidade que, durante o tempo em que circulou, era bem diferenteda apresentada pelo governo e pelo regime. O que estas capas nos

mostram é uma crítica recorrente àquilo que o regime mais prezava, às ve-zes, feita de forma ácida, às vezes, recorrendo ao cômico, através de dese-nhos que retratavam situações nem sempre risíveis, mais que levavam àreflexão.

Se o jornal, por outro lado e como afirma Mouillaud2 , se caracteriza comoum dispositivo que usa títulos, ilustrações, chamadas e o próprio meio físi-co, o papel, para gerar sentido, as capas de uma publicação, por refletirem oque seus responsáveis consideram mais importante, é o melhor meio de apre-ender este sentido. Assim, para complementar o que esta pesquisa demons-trou, torna-se importante reproduzir as capas de Posição, permitindo que,através da associação de seus títulos, chamadas e ilustrações se forme osentido contra-hegemônico criado pela publicação, através da ação de seusintelectuais orgânicos.

Adiante, estão reproduzidas todas as capas de Posição, inclusive a donumero que, por ter sido apreendido pela Policia Federal, não foi publicado,gerando uma capa em que a apreensão era denunciada e uma segunda pági-na com um cáustico editorial contra o regime.

SS

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Notas1 ZIZEK, Slavoj. O espectro da ideologia, in ZIZEK, Slavoj (Org). Um mapa da ideologia.

Rio de Janeiro. Contraponto, 1996, 1ª reimpressão.2 MOUILLAUD, Maurice e PORTO, Sérgio Dayrell (Orgs). O jornal – Da forma ao sentido.

Brasília, Editora UNB, 2002, 2ª edição.

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