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ANDRESSA BATISTA FARIAS LINGUAGEM E VARIAÇÃO EM DIFERENTES ESTRATOS SOCIAIS: análise de usos da concordância verbal em dois bairros de Sinop/MT SINOP 2015

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ANDRESSA BATISTA FARIAS

LINGUAGEM E VARIAÇÃO EM DIFERENTES ESTRATOS SOCIAIS: análise de

usos da concordância verbal em dois bairros de Sinop/MT

SINOP

2015

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ANDRESSA BATISTA FARIAS

LINGUAGEM E VARIAÇÃO EM DIFERENTES ESTRATOS SOCIAIS: análise de

usos da concordância verbal em dois bairros de Sinop/MT

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

Banca Examinadora do curso de Letras, da

Universidade do Estado de Mato Grosso –

UNEMAT, Campus de Sinop, como requisito

parcial para a obtenção do título de

Licenciatura Plena em Letras.

Orientador (a): Profa. Dra. Neusa Inês

Philippsen

SINOP

2015

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Dedico este trabalho à minha orientadora, Neusa Inês Philippsen. Com ela aprendi a enfrentar

os desafios que muitas vezes pareciam impossíveis para mim.

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AGRADECIMENTOS

Mesmo sendo um trabalho acadêmico, sua tessitura exige esforços e o apoio de outras pessoas.

Nesse sentido, meus sinceros agradecimentos a todos aqueles que contribuíram, de forma direta

ou indiretamente, para a realização dessa pesquisa.

À professora, pesquisadora e orientadora, Dra. Neusa Inês Philippsen, de modo especial, por

ter sido tão dedicada, atenciosa, paciente e, acima de tudo, competente. O seu envolvimento

com os estudos linguísticos, com paixão e seriedade, desperta, em todos que a conhecem,

sentimentos de admiração e respeito. Obrigada por tudo. A você, devo esta conquista

acadêmica.

À Universidade do Estado de Mato Grosso, pela oportunidade do ensino gratuito e qualificado,

que é oferecido, apesar das dificuldades enfrentadas pela instituição, mas que, no entanto, tem

aberto muitas portas aos que por ela passam.

Aos professores da Banca Examinadora, Antônio Tadeu e Graci Leite, pela disponibilidade em

ler e avaliar esta pesquisa.

Aos pesquisadores do Projeto Diversidade e Variação Linguística em Mato Grosso -

DIVALIMT, pelas experiências que muito contribuíram para o enriquecimento de meus

conhecimentos e desta pesquisa.

À todos os Professores do curso de Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus

de Sinop.

Aos meus informantes, que me receberam e oportunizaram a concretização desta pesquisa.

Agradeço a disponibilidade em concederem-me as entrevistas. Sem vocês, esta pesquisa não

existiria.

À minha grande família, pelo apoio e incentivo constante. Meu agradecimento não tem fim para

vocês, amo muito todos vocês.

Às minhas amigas queridas conquistadas na faculdade, Josilene dos Santos e Janaína Viana,

que partilharam comigo as minhas angústias e sempre me apoiaram e ajudaram nos momentos

mais difíceis da faculdade, е que vão continuar presentes em minha vida com certeza.

Àqueles que lutam contra todos os tipos de desigualdades sociais, que são os causadores da

discriminação, da estigmatização, da violência e dos preconceitos social e linguístico.

E, finalmente, ao maior mentor deste trabalho, Deus, amigo fiel em todos os momentos.

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Não sou contra a gramática normativa (nenhum linguista tem esta postura): sou contra, sim, sua

veneração cega, que gera necessariamente seu uso equivocado, humilhando o ser humano por

meio do que ele tem de mais característico: o dom de dominar a própria língua (SCHERRE).

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FARIAS, Andressa Batista. Linguagem e Variação em Diferentes Estratos Sociais: análise

de usos da concordância verbal em dois bairros de Sinop/MT. 2015. 91 f. Trabalho de

Conclusão de Curso. – UNEMAT – Universidade do Estado de Mato Grosso. Campus

Universitário de Sinop.

RESUMO: O presente estudo, que se fundamenta nos pressupostos teórico-metodológicos da

Sociolinguística Variacionista, investiga o fenômeno da variável concordância verbal a fim de

verificar os fatores linguísticos e extralinguísticos que promovem a presença ou ausência da

marca de plural. Tomamos, como corpus de análise para a pesquisa, a realidade linguística de

moradores de duas comunidades/bairros da cidade de Sinop/MT, o bairro Boa Esperança e o

Centro Urbano. As duas comunidades/bairros estudados, embora estejam localizados no mesmo

município, pertencem a estratos sociais distintos, com diferenças socioeconômicas, sendo o

primeiro caracterizado como periférico, de menor prestígio social, e o segundo como região

Central, portanto, de maior status social. Por meio de um estudo qualitativo e quantitativo,

analisamos a variação da concordância verbal de 1ª e 3ª pessoas do plural nas formas padrão

(presença formal da marca verbal) e não-padrão (ausência formal da marca verbal), na fala de

8 (oito) sujeitos dessas duas comunidades/bairros. Os sujeitos entrevistados são jovens e adultos

entre 16 a 76 anos, de ambos os sexos, de procedência geográfica diversificada, diferenciados,

também, com relação ao grau de escolarização: menor grau (de 4 a 8 anos de escolaridade) e

maior grau (acima de 10 anos de escolaridade). A presente pesquisa teve o intuito ainda de

discorrer sobre o preconceito linguístico, aliado ao preconceito social, atribuídos ao bairro Boa

Esperança por moradores da região Centro Urbana de Sinop/MT. Com o resultado de nossa

pesquisa, pudemos constatar que os usos da concordância verbal não-padrão, predominam os

dados gerais, contudo, a comunidade de maior prestígio social, o Centro Urbano, apresenta mais

os usos da forma padrão do que o bairro de menor prestígio, o Boa Esperança. Concluiu-se,

portanto, que, embora as duas comunidades/bairros sejam geograficamente próximos, há muitas

diferenças socioeconômicas e culturais, as quais, acabam refletindo nas diferenças linguísticas,

causadoras dos preconceitos.

PALAVRAS-CHAVE: Variação; concordância verbal; preconceito; Boa Esperança; Centro.

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FARIAS, Andressa Batista. Language and Change in Different Social Strata: uses analysis

of the verbal agreement in two districts of Sinop/MT. 2015. 91 f. Term paper. - UNEMAT

- University of the State of Mato Grosso. Campus of Sinop.

ABSTRACT: This study, which is based on the theoretical and methodological assumptions of

Variationist Sociolinguistics, investigates the phenomenon of variable verb agreement in order

to verify the linguistic and extralinguistic factors that promote the presence or absence of plural

mark. The analytical corpus for research is the linguistic reality of living in two

communities/neighborhoods in Sinop/MT, the Boa Esperança neighborhood and the urban

center. The two communities/neighborhoods studied, although they are located in the same

municipality, belong to different social stratum, with socioeconomic differences, in which the

first is characterized as a peripheral, lower social status, and the second as a Central region,

therefore, higher social status. Through a qualitative and quantitative study, we analyzed the

variation of the verbal agreement of 1st and 3rd person plural in standard forms (formal

presence of the word mark) and non-standard (formal absence of the word mark) in the speech

of 8 (eight) subjects of these two communities / neighborhoods. The interviewees are young

and adults between 16-76 years, of both genders, from diverse geographic origin, different, too,

with the degree of education: lower level (4-8 years of schooling) and higher level (above 10

years of schooling). This research was also intended to discuss the linguistic discrimination,

coupled with social prejudice, attributed to Boa Esperança neighborhood by residents of the

Urban Center of Sinop/MT. Analyzing the results, we found that the uses of the verb agreement

nonstandard dominate the overall data, however, the community of greater social prestige, the

Urban Center, features more standard form of uses than the smallest neighborhood prestige,

Boa Esperança. It was concluded therefore that although the two communities / neighborhoods

are geographically close, there are many socioeconomic and cultural differences, which in turn

reflecting the linguistic differences, causing prejudices.

KEYWORDS: Variation; verbal agreement; discrimination Boa Esperança community; Urban

Center.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Fotografia 01: Parque Industrial Madeireiro em Sinop (1980) 38

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LISTA DE TABELAS

TABELA 01: IBGE - Censo Demográfico ano 2010

TABELA 02: IBGE - Censo Demográfico ano 2010

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LISTA DE QUADROS

Quadro 01: Informações dos sujeitos entrevistados

Quadro 02: Questionário aplicado à todos os sujeitos entrevistados

Quadro 03: Questionário aplicado aos falantes que moram na cidade

desde o início da colonização

Quadro 04: Questionário aplicado ao representante de bairro

Quadro 05: Modelo das transcrições das entrevistas

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 13

1 SOCIOLINGUÍSTICA: BREVE PERCURSO HISTÓRICO,

OBJETO DE ESTUDO E SEUS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

16

1.2 A Sociolinguística Variacionista

1.3 Língua, Linguagem, Cultura e Sociedade: uma relação

indissociável

1.4 Variação Linguística: a heterogeneidade da língua

1.5 A Heterogeneidade da Língua e a Concordância Verbal

1.6 Preconceito Linguístico e Preconceito Social

18

19

22

25

28

2 AS MIGRAÇÕES PARA O NORTE MATO-GROSSENSE E A

COLONIZAÇÃO DE SINOP

33

2.1 A Migração e o Trabalho na Formação da Cidade: o setor

agrícola e madeireiro nas décadas de 70 e 80

2.2 Sinop nos Dias Atuais

2.2.1 Região Centro-Urbana de Sinop

2.2.2 Bairro Jardim Boa Esperança

37

41

42

46

3 APRESENTAÇÃO METODOLÓGICA E TESSITURAS

ANALÍTICAS SOBRE O CORPUS

52

3.1 Procedimentos da pesquisa e seleção dos informantes

3.2 Pesquisa a Campo: entrevista semiestruturada

3.3 Roteiro: instrumento de coleta de dados

3.4 Considerações Sobre as Comunidades Estudadas: bairro

Boa Esperança e região Centro Urbana de Sinop

3.4.1 Algumas Ponderações do Processo de Análise da Pesquisa

na Aplicação da Concordância Verbal

3.4.1.1 Concordância Padrão e DNP Padrão – mos

3.4.1.2 Concordância Não-Padrão: DNP Não-Padrão – mo com

Apagamento do – s

3.4.1.3 Concordância Não-Padrão e DNP (desinência zero)

3.4.1.4 Sexo

3.4.1.5 Faixa Etária

3.4.1.6 Escolaridade

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53

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62

65

68

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78

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CONSIDERAÇÕES FINAIS 81

REFERÊNCIAS 85

REFERÊNCIAS WEBGRÁFICAS 90

ANEXO A 91

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INTRODUÇÃO

O uso da variável concordância verbal é um campo já estudado por pesquisadores tanto

em Mato Grosso quanto no Brasil. A motivação inicial para a realização deste estudo não foi

somente trazer mais resultados sobre o uso da concordância verbal a partir de uma nova

amostra. Pode-se dizer que a principal motivação para a escolha desse tema fundamenta-se,

também, em discutir sobre o preconceito linguístico e social aos sujeitos de menor status social

e econômico, levando-os, consequentemente à estigmatização e à exclusão. Além disso, o

estudo leva em consideração o processo de formação histórica de dois bairros de Sinop/MT, o

Boa Esperança e o Centro Urbano, para se compreender melhor sobre a constituição desses

bairros investigados.

Assim, o escopo de nossa pesquisa é de identificar e descrever marcas da concordância

padrão x não-padrão empregadas na fala de dois grupos de distintos estratos sociais, isto é, de

duas comunidades linguísticas, que se diferenciam no poder aquisitivo e se inserem, em sua

maioria, nas classes econômicas baixa e média. Nosso olhar pautou-se, fundamentalmente, nos

fatores que condicionam estas variáveis da língua, e que estão ligados a questões sociais e

culturais, tais como sexo, idade e escolaridade.

Para alcançarmos os objetivos propostos pela pesquisa, a mesma foi permeada por

leituras teóricas, em especial as relacionadas à Sociolinguística Variacionista e da Gramática

Normativa, durante todo o processo, bem como por coletas de dados, descrições e análises de

entrevistas realizadas com sujeitos dos diferentes estratos sociais citados, ou seja, moradores

do bairro Boa Esperança e do Centro Urbano da cidade de Sinop/ MT.

A importância de realização da presente proposta de pesquisa justifica-se,

fundamentalmente, pela necessidade de se enfatizar os preconceitos linguístico e social, que

são muito presentes na sociedade e que possuem um efeito muito negativo na vida das pessoas,

pois são parâmetros para estigmas, que, necessariamente, levam à exclusão social.

Tais preconceitos podem ser gerados por intolerância diante de uma palavra empregada

que destoa da norma eleita como padrão da Língua Portuguesa, ou, igualmente, pela falta de

empregos gramaticais desta norma, que envolvem as exigências de uso relacionadas à

concordância verbal.

Assim, as pessoas julgam o falar “correto” e o falar “errado”, sentindo-se no direito de

eleger uma variante/variedade melhor do que a outra. Aliado ao preconceito linguístico se

encontra o preconceito social, que, juntos, revelam, conforme nos mostra Bagno (2008, p. 90-

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91), profundas desigualdades sociais, sendo que “a violência urbana está intimamente ligada a

uma situação de profunda injustiça, que coloca o Brasil [...] entre os países com a maior

economia do planeta e, ao mesmo tempo, entre os primeiros com grande concentração de renda

e aguda exclusão social”.

Dessa forma, acentua-se a estigmatização de bairros afastados, periféricos, que se

apresentam, muitas vezes, por exemplo, sem estrutura de saneamento de água e esgoto

adequados, e distinções mais exacerbadas entre nível econômico e escolaridade, as quais

também podem estar relacionadas com as escolhas linguísticas feitas nessas comunidades de

fala.

Vale ressaltar, ainda, que, de acordo com Labov,

[...] um cenário em que os falantes das classes mais altas e de maior nível de

escolaridade exibem proporcionalmente uma maior frequência de uso das

formas de prestígio do que os falantes da classe média (e estes, por sua vez,

uma maior frequência do que os da classe baixa) apontaria para uma situação

de variação estável; enquanto que os processos de mudança tendem a ser

liderados pelos indivíduos mais integrados da classe média baixa e/ou das

seções mais elevadas da classe operária (LABOV, 2008, p. 77-78).

Reitera-se, assim, mais uma vez, a importância dessa pesquisa, porque se compreendeu

sobre a necessidade de realização de um estudo que registrasse o uso da variável concordância

verbal nesses dois lócus, visto que, neste espaço geográfico do norte de Mato Grosso não há

pesquisas dessa natureza, e, fundamentalmente, pela necessidade de se enfatizar os preconceitos

linguístico e social, que são muito presentes na sociedade, em especial, aos preconceitos

sofridos pelos moradores do bairro Boa Esperança por moradores da região Centro Urbana de

Sinop/MT.

O trabalho está organizado em três capítulos. No primeiro, expomos a fundamentação

teórica, na qual, contextualizamos os principais conceitos teóricos da Sociolinguística

Variacionista, assim como, brevemente, apresentamos a conceituação de nossas principais

noções operatórias: o uso da concordância verbal e os preconceitos linguísticos e sociais. No

segundo capítulo, apresentamos o universo de nossa pesquisa: o contexto social e geográfico

em que foi estudado o fenômeno da variável concordância verbal.

No terceiro capítulo, discorremos sobre os procedimentos metodológicos adotados para

que a pesquisa fosse desenvolvida. Esclarecemos como se deu o processo da coleta e a seleção

dos dados e discorremos, um pouco mais, sobre nossas noções operatórias: a concordância

verbal em 1° e 3° pessoas do plural e sobre os preconceitos linguísticos e sociais apreendidos

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na pesquisa. Em seguida, são apresentadas a amostra, coleta de dados, análise e discussão dos

resultados. Por fim, nas considerações finais, discutimos sobre os resultados gerais obtidos

nessa pesquisa.

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1 SOCIOLINGUÍSTICA: BREVE PERCURSO HISTÓRICO, OBJETO DE ESTUDO E

SEUS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

Este capítulo contextualiza os conceitos teórico-metodológicos da Sociolinguística

Variacionista. A escritura desse capítulo é fundamentada em pesquisas bibliográficas de obras

na área da Sociolinguística Variacionista, suporte teórico central dessa pesquisa.

A propagação de estudos na área da Sociolinguística nos últimos anos muito tem

contribuído para a sistematização da heterogeneidade da língua encontrada nas várias

comunidades de fala1 em todo o Brasil. O seu surgimento ganha destaque a partir da década de

1960, nos Estados Unidos, contrapondo-se às abordagens Estruturalista de Saussure e a

Gerativista de Chomsky, que concebiam a língua como homogênea, separada de fatores

externos e como um sistema de princípios universais. Um dos principais expoentes da

Sociolinguística é o linguista William Labov, que propõe um novo olhar sobre a estrutura das

línguas, desapontando as correntes Estruturalista e Gerativista que desvinculavam a língua dos

aspectos históricos e sociais.

De acordo com Labov (2008), não há sentido em querer estudar o desenvolvimento de

uma mudança linguística sem levar em conta a vida social da comunidade em que ela ocorre.

A Sociolinguística tem, como função, descrever como o sistema linguístico é usado

distintamente em várias comunidades de fala, relacionando a linguagem sob o aspecto da

heterogeneidade, expondo os princípios internos (linguísticos) e os externos (sociais).

Ainda que seja de cunho acadêmico, este estudo visa discorrer sobre distintos fatores

relacionados à língua e tem o propósito de contribuir para pesquisas nessa área. O estudo é

norteado, também, por análises de dados de usos reais da linguagem, isto é, a partir do

paradigma Laboviano2. Para tanto, não poderíamos deixar de fazer referência à Sociolinguística

Variacionista, que é o alicerce desta pesquisa.

A Sociolinguística3 é a parte da Linguística que estuda a Língua, a Cultura e a

Sociedade. Nesse contexto, língua e sociedade são inseparáveis, uma constitui a outra. Um dos

1 Comunidade de fala é um grupo de falantes que compartilha dos mesmos conjuntos de fenômenos relacionados

aos usos da língua. 2 Veremos mais adiante, ainda neste capítulo. 3 O termo Sociolinguística, ramo da Linguística, fixou-se em 1964, em uma conferência sobre sociolinguística

realizada por William Bright, na Universidade da Califórnia em Los Angeles, que contou com a presença de vários

pesquisadores, os quais, posteriormente, se tornaram referências clássicas para estudos relacionados à linguagem

e sociedade. Para William Bright, a Sociolinguística “não é fácil de definir com precisão [...] uma das maiores

tarefas da sociolinguística é mostrar que é correlata às diferenças sociais sistemáticas”. Para Calvet, “o encontro

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campos de estudo da Sociolinguística é a variação linguística, que coexiste dentro das

comunidades de fala, buscando explicar sobre esse fenômeno da língua e suas circunstâncias

de uso, que estão profundamente correlacionadas com a sociedade.

Conforme Mollica:

A Sociolinguística considera em especial como objeto de estudo exatamente

a variação, entendendo-a como um princípio geral e universal, passível de ser

descrita e analisada cientificamente. Ela parte do pressuposto de que as

alternâncias de uso são influenciadas por fatores estruturais e sociais

(MOLLICA, 2004, p. 9-10).

Assim, podemos dizer que o objeto de estudo da Sociolinguística é mostrar a realidade

linguística da sociedade, que envolve fatores de variação e mudança linguísticas em diferentes

comunidades de fala, considerando, imprescindivelmente, características socioculturais destas

comunidades, tais como diferenças de espaço geográfico, profissão, grau de instrução, posição

social, religião, dentre outras.

Nessa perspectiva, a Sociolinguística tem como objetivo todo um estudo e preocupação

com o uso da língua na sociedade, observando como a língua funciona e quais os fatores que

influenciam a variação e as mudanças linguísticas. Segundo Labov (2008), a língua acompanha

de perto a evolução da sociedade, refletindo os comportamentos que variam em função do

tempo e do espaço.

Ainda em relação ao modelo teórico-metodológico da pesquisa Sociolinguística,

Fernando Tarallo discorre que,

O modelo teórico-metodológico da sociolinguística parte do objeto bruto, não-

polido, não-aromatizado artificialmente [...] – o fato linguístico – é o ponto de

partida [...]. O fato sociolinguístico, o dado da análise, é ao mesmo tempo a

base para estudo linguístico: o acervo de informações para fins de confirmação

ou rejeição de hipóteses antigas sobre a língua e também para o levantamento

e o lançamento de novas hipóteses (TARALLO, 2002, p. 18).

O pesquisador William Bright, responsável pela Conferência Sociolinguística realizada

em maio de 1964 na Universidade da Califórnia em Los Angeles (momento em que a área de

estudos ganha o seu reconhecimento), demarca, então, como o objeto de estudo da

Sociolinguística, a diversidade linguística, cujos fatores estão relacionados à identidade social

do falante, à identidade social do receptor e à situação ou contexto da fala. Para o pesquisador,

de maio de 1964 marca, com efeito, o nascimento da sociolinguística que se afirma contra outro modo de fazer

linguística, o modo de Chomsky e da gramática gerativa” (CALVET, 2002, p. 29-30).

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a Sociolinguística complementa a Linguística, a Sociologia e a Antropologia (MONTEIRO,

2000).

1.2 A Sociolinguística Variacionista

A fundação da Sociolinguística Variacionista ou Teoria da Variação, como também é

conhecida, é atribuída ao pesquisador William Labov, que criou um modelo de análise que

possibilitasse a sistematização da variação existente na língua falada. Este modelo teórico-

metodológico toma por pressuposto a sistematização da variação da língua, mais

especificamente a partir da relação entre a língua e a sociedade, isto é, do “Estudo da língua em

seu contexto social” (CALVET, 2002, p. 32).

A pesquisa na Sociolinguística Variacionista é caracterizada por sua metodologia

empírica, ou seja, através de dados reais, produzidos por falantes reais, e que são apreendidos

pelos procedimentos das entrevistas sociolinguísticas4. Segundo Labov (2008, p. 244), “o

objetivo da pesquisa linguística na comunidade deve ser descobrir como as pessoas falam

quando não estão sendo sistematicamente observadas”.

Tais definições encontram-se em consonância ao exposto por Bagno (2014, p. 38),

quando afirma que o objetivo da Sociolinguística é relacionar a heterogeneidade linguística com

a heterogeneidade social. Portanto, para a Sociolinguística, segundo este autor, “é impossível

estudar a língua sem estudar, ao mesmo tempo, a sociedade em que essa língua é falada [...] não

dá para estudar a sociedade sem levar em conta as relações que os indivíduos e os grupos

estabelecem entre si por meio da linguagem”.

A proposta teórico-metodológica de Labov busca, portanto, constatar as variações que

existem na língua, tendo como principal objetivo analisar e descrever variantes usadas em uma

determinada comunidade de fala. Segundo Labov (2008), a língua é um sistema dinâmico

porque está condicionada a fatores internos (a estrutura da língua) e externos (o social). Ainda

segundo o pesquisador, a própria língua acompanha a evolução da sociedade e reflete, de certo

modo, os padrões de comportamento, que variam em função do tempo e do espaço.

Labov conduziu os primeiros estudos na área da Sociolinguística Variacionista com a

pesquisa sobre o inglês falado na Ilha de Martha’s Vineyard, no Estado de Massachusetts, com

4 As entrevistas sociolinguísticas são caracterizadas pela especificidade de método, que visa a diminuir o que

Labov (2008) denomina de paradoxo do observador. O pesquisador sociolinguista, que for estudar uma

comunidade de fala, deve coletar um grande número de dados através de gravações da fala, de um considerável

número de informantes, dependendo o cunho de sua pesquisa. Em conformidade com o que Labov (2008) propõe,

deve-se buscar um envolvimento emocional com o assunto para que o entrevistado produza uma fala informal e

espontânea.

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o estudo sobre a variação dos ditongos /ay/ e /aw/, que foi sua dissertação de mestrado.

Posteriormente, o pesquisador prosseguiu com os estudos nessa área, com a pesquisa sobre a

estratificação do inglês falado na cidade de Nova York sobre a variável /r/, na Universidade de

Colúmbia, entre outros trabalhos que impulsionaram outros estudiosos a desenvolverem

pesquisas na área da Sociolinguística Variacionista, ou seja, a estudarem a língua e a sociedade

em conjunto.

Assim, o principal objetivo da pesquisa Sociolinguística Laboviana é analisar a

diversidade linguística, considerando os fatores sociais que influenciam nessa diversidade. A

Sociolinguística propõe, dessa forma, um entendimento das diferentes maneiras de falar, que

são condicionadas por fatores geográficos, sociais, econômicos, culturais, grau de escolaridade,

idade, entre outros fatores. Em síntese, estes são os principais aspectos teórico-metodológicos

que devem ser levados em consideração em uma pesquisa Sociolinguística a partir do

paradigma Laboviano, o qual também constitui a fundamentação teórico-metodológica desta

pesquisa.

1.3 Língua, Linguagem, Cultura e Sociedade: uma relação indissociável

A pesquisa Sociolinguística, como vimos, é constituída em estudo da língua e da

sociedade. Dessa forma, não há como querer estudar a língua sem levar em conta as condições

históricas, sociais e culturais, isto é, da comunidade em que ela ocorre. Para tanto, este aporte

teórico ampara-se em pesquisas bibliográficas e de campo, sendo assim, é de grande relevância,

para o percurso deste trabalho, tecermos algumas ponderações analíticas em relação à língua,

linguagem, sociedade e cultura, que são indissociáveis, tanto no que se refere para este estudo,

como também à própria Sociolinguística. O intento, ao decorrer deste subitem, não é buscar

uma definição precisa do que sejam esses quatro elementos, mas, de procurar elucidar a

correlação existente entre eles. Apresentaremos, assim, algumas explanações de autores que

discorrem sobre língua e linguagem e sua inerência à sociedade e cultura. “A linguagem se faz

na sociedade sob as marcas da história e da cultura.” (ANTUNES, 2009, p. 36).

Ainda sobre a relação entre língua, linguagem e cultura, Lyons assevera que,

Segundo a definição mais ampla de sociolinguística (que muitos especialistas

rejeitaram justamente por ser ampla demais), trata-se do estudo da linguagem

em relação à sociedade (v. Hudson, 1980: 1). Podemos adotar o mesmo ponto

de vista e definir etnolinguística como o estudo da linguagem em relação à

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cultura – considerando ‘cultura’ no sentido em que é usada em antropologia e

de um modo mais geral nas ciências sociais (v. 10.1). Mas, a cultura, nessas

definições mais amplas da sociolinguística e etnolinguística, os dois ramos da

macrolinguística a que os termos se referem vão se sobrepor

consideravelmente (LYONS, 1981, p. 200, grifos do autor).

Segundo Alkmim (2003), o preceito em relacionar língua, cultura e sociedade se

encontra nas reflexões de vários autores do século XX. A questão do social passa a ter uma

maior importância nos fenômenos da língua já a partir dos anos de 1930, com trabalhos de

linguistas como Antoine Meillet, Mikhail Bakhtin, Marcel Cohen, Émile Benveniste e Roman

Jakobson, os quais apresentam estudos sobre a língua enfocando a sociedade e a cultura e não

somente a língua em sua estrutura interna.

Desse modo, podemos caracterizar a língua como uma forma de linguagem e concebê-

la como um fenômeno natural, que se encontra em constante evolução e mudanças. Podemos,

também, afirmar que a língua tem como função primordial permitir a comunicação entre os

indivíduos. É por meio da linguagem que se constituem as características que representam a

identidade de cada comunidade linguística e do indivíduo que nela está inserido, como cita

Yonne Leite (2002, p. 07), “é na linguagem que se reflete a identificação de cada comunidade

e também a inserção do indivíduo em diferentes agrupamentos, status social, faixas etárias,

gêneros, graus e escolaridade”.

Neto (2003) também discorre sobre a relação existente entre língua, linguagem e

sociedade, afirmando que,

A linguagem seria a capacidade de comunicação humana oral, e as línguas

seriam as formas particulares por meio das quais cada comunidade, cada

sociedade ou grupo social realiza a linguagem. A questão do social, portanto,

está diretamente ligada à noção de língua, porque é a noção de sociedade que

vai permitir a delimitação desse particular que é a língua, à vista do universal

que é a linguagem (NETO, 2003, p. 41).

Por sua vez, Matos (2003) afirma que a relação existente entre linguagem, língua e

sociedade permite ao indivíduo apresentar a sua identidade, sendo a sociedade a grande

favorecida com os usos da língua. O autor ainda assevera que a língua é “um sistema de

comunicação intra/interpessoal e intra/intercultural, compartilhado e usado por membros de

uma ou mais comunidades, através de variedades individuais, geográficas e sociais” (MATOS,

2003, p. 92).

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Já Saussure (1999) afirma que língua não se confunde com a linguagem, ao enunciar

que:

Ela [...] é somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente.

É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um

conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir

o exercício dessa faculdade nos indivíduos (SAUSSURE, 1999, p. 17).

O autor referido apresenta a língua como um fato social, coletivo, que estabelece os

valores desse sistema através da convenção social. Para o linguista, a língua é um objeto bem

definido no conjunto dos fatos da linguagem, de natureza concreta, é parte social da linguagem,

exterior ao indivíduo. Já a linguagem é multiforme, heteróclita e pertence aos domínios

individual e social, sendo que não se concebe um sem o outro.

Ainda conforme Saussure (1999), a língua é um sistema de signos que tem o domínio

das articulações, pois, nela, se expressam ideias que fixam os sons, formando articulus, ou seja,

os membros da língua. Segundo Saussure (1999, p. 24), é por este motivo que a língua é

comparável “à escrita, ao alfabeto dos surdos-mudos, aos ritos simbólicos, às formas de polidez,

aos sinais militares etc., etc.”

John Searle (1969) discorre sobre linguagem assegurando que,

O objetivo da linguagem é a comunicação, quase da mesma forma como o

propósito do coração é bombear sangue. Em ambos os casos, é possível

estudar a estrutura independentemente da função, mas é inútil e também um

equívoco fazer tal coisa, já que estrutura e função interagem de maneira tão

óbvia. Nós nos comunicamos em primeiro lugar com outras pessoas, mas

também conosco mesmo, como durante um solilóquio, ou quando pensamos

em palavras (SEARLE, 1969, apud CHOMSKY, 1980, p. 47).

Para Chomsky (1980, p. 47), “a linguagem é o sistema comunicativo por excelência, e

é “estranho e excêntrico” insistir no estudo da estrutura da linguagem separando-a de sua função

comunicativa”.

Segundo Gnerre (1998, p. 6), a linguagem, além de ter como função veicular

informação, tem a função de “comunicar ao ouvinte a posição que o falante ocupa de fato ou

acha que ocupa na sociedade em que vive”.

De acordo com Leite (2008), a linguagem é um significativo fator de identidade e de

segregação, pois denuncia as diferenças que existem na sociedade desde que o homem aprendeu

a falar.

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Consonante ao que Leite afirma, sobre a linguagem como um importante fator de

identidade, é interessante expor o que Santos (1986) discorre sobre cultura, conceituando-a

como parte da realidade da sociedade em que a mudança é um aspecto fundamental. Referente

a esse fato, Câmara Jr. (1989, p. 21-22) afirma que a língua “é parte e também reflexo da cultura,

tendo como função expressar a cultura para permitir a comunicação social”.

Alusivo ao exposto acima pelos autores citados, é importante reportar-se a um trecho de

Scherre (2005), que descreve a língua como um instrumento de comunicação, reflexo da

cultura, e como um fator de identidade,

As línguas humanas são, em verdade, mais do que excelentes instrumentos de

comunicação. São, também, reflexo da cultura de um povo. São, além disso,

parte da cultura de um povo. São ainda mais do que isto: são mecanismos de

identidade. Um povo se individualiza, se afirma e é identificado em função de

sua língua. (SCHERRE, 2005, p. 10).

No que concerne a Mey (1998), língua e sociedade são inter-relacionadas, uma vez que

os homens se comunicam e se agregam socialmente. A linguagem é a maneira que a sociedade

usa para demonstrar seus pensamentos, para a comunicação social.

Língua, para Weedwood (2002, p. 152-153), é um trabalho desenvolvido de forma

conjunta pelos falantes, é uma atividade social, é enunciação. “A enunciação, compreendida

como uma réplica do diálogo social, é a unidade de base da língua, que se trate do discurso

interior (diálogo consigo mesmo) ou exterior”.

De tal modo, podemos considerar que língua, linguagem, sociedade e cultura estão

relacionadas entre si, sendo impraticável querer falar sobre língua sem falar em linguagem,

cultura e sociedade, pois estas influenciam, concomitantemente, nos atos da comunicação; a

língua reflete a sociedade que, consequentemente, expõe as atitudes, os pensamentos, os

costumes, isto é, a cultura da sociedade e/ou das comunidades linguísticas.

1.4 Variação Linguística: a heterogeneidade da língua

Sendo o principal campo de estudos da Sociolinguística, como também o campo de

investigação de nossa pesquisa, são imprescindíveis algumas considerações sobre a variação

linguística.

Como vimos, a língua é heterogênea e se encontra em constantes mudanças, assim, é

preciso ponderar sobre os fatores estruturais e, principalmente, sobre os fatores sociais, que são

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responsáveis pelas constantes mudanças e variações. Para as reflexões, buscamos, inicialmente,

bases teóricas a fim de elucidar, ao decorrer desse subitem, sobre a concepção de variação

linguística e sua preponderância na sociedade.

Ao estudar a língua em comunidades linguísticas, é inevitável depararmo-nos com a

enorme diversidade que compõe a língua falada. Sendo constituída por falantes de diferentes

gêneros, idade, grau de escolaridade e que pertencem a distintos estratos sociais. Diante dessas

circunstâncias, é inegável as diferenças existentes no uso da língua nas comunidades de fala.

De acordo com Alkmim (2003), a constatação mais imediata, ao se estudar qualquer

comunidade linguística, é a existência da diversidade ou da variação.

Uma mesma língua pode apresentar variações de região para região, de um grupo social

para outro, entre distintas faixas etárias, e, também, quando usada pelo mesmo falante, pode

variar em determinadas situações ou lugares.

De acordo com Calvet (2002, p. 170), variedade é um “sistema de expressão linguística

que pode ser identificado pelo cruzamento de variáveis linguísticas (fonéticas, morfológicas,

sintáticas etc.) e de variáveis sociais (idade, sexo, região de origem, grau de escolarização etc.)”.

Para Tarallo (2002), as variantes linguísticas são diversas formas de dizer a mesma coisa

em uma mesma condição e com o mesmo significado. A essas diversas maneiras de falar o

autor chama de “conjunto de variantes”.

Desse modo, podemos classificar, de forma mais geral, as variações linguísticas em

variação geográfica (ou diatópica) e em variação social (ou diastrática). A variação geográfica

ou diatópica, como também é conhecida, está relacionada às diferenças regionais. Para Alkmim

(2003), são as diferenças linguísticas distribuídas no espaço físico, observáveis entre falantes

de diferentes espaços geográficos.

Essas variações geralmente são apreendidas em traços linguísticos que são marcados

pelas diferenças de pronúncia e de vocabulário, as quais evidenciam o regionalismo, ou seja,

falantes de lugares geográficos diferentes, ou oriundos da zona urbana e da zona rural, quase

sempre apresentam traços distintos.

As variações sociais, também chamadas de diastráticas, são as variedades que aparecem

de acordo com o sexo, faixa etária, escolaridade e de estratos sociais diferentes, ou seja, temos

diferenças na fala do homem e da mulher, de uma criança e de um adulto, de um sujeito com

nível de ensino superior completo e um com baixa escolaridade, de um pobre e um rico e etc.

Para Alkmim (2003), essas variações estão relacionadas a um conjunto de fatores relativos à

identidade dos falantes e de acordo com a composição sociocultural da comunidade de fala.

Essas variações, assim, condicionam-se a fatores linguísticos e extralinguísticos.

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Nesse contexto, as variáveis linguísticas ou internas estão relacionadas aos níveis

estruturais sintático, morfológico, semântico, discursivo e etc. Enquanto as variáveis

extralinguísticas ou externas estão relacionadas ao grau de escolaridade, idade, sexo, classe

social, entre outros fatores.

De acordo com Mollica (2004), as variáveis internas estão correlacionadas aos fatores

de natureza fono-morfo-sintáticos, semânticos, discursivos e lexicais, que dizem respeito a

várias dimensões de características da língua. Já no conjunto das variáveis externas estão os

fatores inerentes ao indivíduo, tais como etnia e sexo; os fatores sociais, como escolarização,

profissão, nível de renda e classe social; e os contextuais, como grau de formalidade e tensão

discursiva. Assim, a língua varia conforme fatores internos ou externos, sendo que as posições

geográfica e social dos falantes são fatores que condicionam para uma variação linguística mais

expressiva.

Preti (2000) define, dentre as variações linguísticas, a variação situacional da

linguagem, que está associada ao uso da língua por um mesmo falante. Para o autor, a variação

da situação está relacionada às circunstâncias, lugar e tempo em que os atos da fala se realizam.

Dessa forma, o autor classifica as variações de situação em dois modos: nível de fala ou registro

formal - usado em situações mais formais, com emprego da língua culta, comportamento tenso,

refletido e, geralmente, com o uso de vocabulário técnico; e nível de fala ou registro coloquial

– empregado em situações familiares, diálogos informais, com predominância de estruturas e

vocabulários do uso popular e gírias.

Preti (2000) classifica, ainda, essas variações, quanto ao uso da língua pelo mesmo

falante, em variedades estilísticas, nas quais o falante escolhe, de acordo com a situação, um

estilo em determinadas circunstâncias. Para Alkmim (2003, p. 38), os usuários da língua

diversificam sua fala, ou seja, usam de estilos e registros que são distintos “em função da

circunstância em que ocorrem suas interações verbais”.

1.5 A Heterogeneidade da Língua e a Concordância Verbal

Nesse subitem discorreremos, de forma breve, sobre a concordância verbal, noção

operatória nos procedimentos de análise de corpus no capítulo III desta pesquisa. A análise se

estruturará na concordância verbal de 1ª e 3ª pessoas do plural. Trabalharemos com duas regras

variáveis, que são as concordâncias padrão x concordância não-padrão. A primeira, constitui-

se pela presença da marcação de pessoa e número no sintagma verbal, mais valorizada

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socialmente e imposta pelas gramáticas normativas, e a segunda, é essa ausência da marcação

de pessoa e número, e, por isso, socialmente estigmatizada.

Segundo Mollica (2004), a concordância entre verbo e sujeito é uma variável linguística,

pois pode ser realizada por meio de duas variantes, dois modos possíveis e com o mesmo

sentido: com a marca de concordância no verbo ou a ausência da marca de concordância.

A concordância não-padrão, apesar de estar presente na fala de muitas pessoas, mesmo

entre as mais escolarizadas, é seriamente estigmatizada e estereotipada. Bortoni-Ricardo

(2005), cita, como exemplo, usos como “nós vai”, os quais são imediatamente associados, pela

maioria dos mais letrados, a falantes com baixa ou nula escolaridade, ou, ainda, a moradores de

zona rural ou de periferias de grandes centros urbanos.

As Gramáticas Normativas prescrevem que a Concordância Verbal é a flexão do verbo

com o seu sujeito, em número e pessoa, e admitem, em alguns casos, a exceção de o verbo

concordar ou não com o sujeito. A aplicação das regras de concordância verbal será melhor

discorrida posteriormente no capítulo III.

Segundo Bechara (2000, p. 543), “a concordância geral consiste em adaptar a palavra

determinante ao gênero, número e pessoa da palavra determinada”. Em algumas reflexões este

autor atenta que, para a língua falada, existe uma variação maior do que na língua escrita, pois

a língua escrita, por ser formalmente mais elaborada, tem mais chances de ‘acertos’ da

concordância verbal padrão, já na língua falada, principalmente por causa do fluxo de

pensamento ser mais rápido do que a formulação da estruturação escrita, é comum a falta da

realização da concordância.

Dentre as possibilidades de variações, deparamo-nos constantemente, na fala de

qualquer indivíduo, mesmo entre os altamente escolarizados, com a falta de concordância

verbal e/ou nominal, que pode ser verificada tanto na fala quanto na escrita, seja por falantes de

comunidades linguísticas de classe média e alta ou de classe baixa, sendo já, por exemplo, regra

categórica da língua manter o verbo no singular quando antecede o sujeito.

Ainda com relação às regras de concordância, é interessante observar o exemplo citado

por Coan e Freitag,

As gramáticas normativas prescrevem que, no plural, todos os elementos de

um sintagma devem levar marca de concordância. A regra geral diz que aos

nomes deve-se acrescentar –s. Uma frase que atende aos padrões normativos

seria As meninas bonitas comem pães de queijo. Que juízos de valor faríamos

de alguém que, em dado momento, falasse uma frase como As meninaØ

bonitaØ comeØ pãoØ de queijo? Tenderíamos a fazer um julgamento negativo

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deste indivíduo com base neste falar: não frequentou a escola, porque não sabe

as regras de concordância da língua (COAN; FREITAG, 2010, p. 186).

Para Bagno (2003), mesmo os brasileiros moradores da zona urbana, com nível de

escolaridade superior completa, classificados como “cultos”, dizem frequentemente: “chegou

os livros que encomendei, foi feito já todas as alterações que você pediu”. Esse emprego, com

a falta da concordância verbal padrão, já se tornou tão comum na fala dos mais letrados que

passa despercebido como “erro” e geralmente já não causa mais estranheza no falar.

Contudo, pode-se afirmar que, se a frase acima for empregada por alguém de traços

característicos de origem rural ou periférica, ela pode ganhar espaços para julgamentos e

repreensões pejorativas, com a indicação dos ‘puristas’ da língua de que essas pessoas falam

tudo “errado” e que não sabem o “português”.

Em uma sociedade como a nossa, em que o uso predominante da língua “culta” e o

poder econômico são essenciais para o alcance do prestígio social, os diferentes usos da língua

com menor prestígio, que geralmente são mais característicos de falantes com menor nível de

instrução, estão suscetíveis a julgamentos em que se estabelecem preconceitos e estereótipos

desses usos.

Conforme cita Camacho (2003, p. 59), “as formas em variação adquirem valores em

função do poder e da autoridade que os falantes detêm nas relações econômicas e culturais”.

Ainda segundo este autor, a presença da marca de plural nos sintagmas nominal e verbal é

detentora de prestígio social e é conhecida como ‘variante’ padrão ou de prestígio, já a ausência

da marca de plural é denominada como variante não-padrão ou estigmatizada.

Como podemos verificar nas assertivas de Alkmim,

A variedade padrão é a variedade linguística socialmente mais valorizada, de

reconhecido prestígio dentro de uma comunidade, cujo uso é, normalmente,

requerido em situações de interação determinadas, definidas pela comunidade

como próprias, em função da formalidade da situação, do assunto tratado, da

relação entre os interlocutores etc. A questão da língua padrão tem uma

enorme importância em sociedades como a nossa. Algumas considerações a

seu respeito se impõem (ALKMIM, 2003, p. 40).

A norma-padrão é um código, um “modelo de língua” criado para ser seguido pelos

falantes. Comparando-se com as demais variedades, esta possui “mais palavras eruditas, tem

mais termos técnicos, tem um vocabulário maior e mais diversificado” e também apresenta

“construções sintáticas consideradas de bom-gosto, tem expressões de origem erudita que

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servem de modelos para serem imitados, metáforas clássicas que dão um ar “nobre” à

linguagem” (BAGNO, 2006, p. 23). É uma norma idealizada, que não é falada por ninguém na

sociedade, segundo Bagno,

A norma-padrão é aquele modelo ideal de língua que deve ser usado pelas

autoridades, pelos órgãos oficiais, pelas pessoas cultas, pelos escritores e

jornalistas, aquele que deve ser ensinado e aprendido na escola. Vejam bem

que eu disse aquele que deve ser, não aquele que necessariamente é

empregado pelas pessoas cultas (BAGNO, 2006. p. 22).

Bagno (2003) apresenta uma divisão entre as normas utilizadas no Brasil, separando a

norma-padrão de outras variedades bem-conceituadas: “... de um lado, temos a norma-padrão

lusitanizante, ideal de língua abstrato, usado como verdadeiro instrumento de repressão e

policiamento dos usos linguísticos”, criada como referência para “organizar” a língua e

“manter” a língua “viva”, e já “do outro, temos as diversas variedades prestigiadas, usos reais

da língua por parte das classes sociais urbanas” (BAGNO, 2003, p. 87).

A norma-culta é a norma que apresenta o maior prestígio em nossa sociedade, esta

norma é utilizada pelas pessoas ‘letradas’ em situações de monitoramento da fala e da escrita,

e, confrontada com outras normas, possui um ‘valor positivo’. Bagno (2014) ressalta que muitos

indivíduos acabam acreditando que norma-culta e norma-padrão são sinônimas, devido ao

prestígio que é socialmente atribuído à fala de cidadãos urbanos letrados. Segundo Bagno

(2006, p. 164), “classificamos como [+culta] aquela variedade na qual as formas consideradas

padrão ocorrem com maior intensidade”.

Para compreendermos melhor sobre nosso fenômeno estudado, a variação na

concordância verbal, é importante expormos uma definição sucinta sobre os conceitos de

variável e variante estabelecidos pela Sociolinguística. De acordo com Bagno (2014, p. 50),

uma variável na área da Sociolinguística “é algum elemento da língua, alguma regra, que se

realiza de maneiras diferentes conforme a variedade linguística analisada. Cada uma das

realizações possíveis de uma variável é chamada variante”. Podemos afirmar, assim, que

variante é “cada uma das formas diferentes de se falar a mesma coisa”.

Tarallo (2002) fala sobre a questão das variantes no que se refere à presença ou à

ausência de prestígio, quando assevera que,

As variantes de uma comunidade de fala encontram-se sempre em relação de

concorrência: padrão vs. não-padrão; conservadoras vs. inovadoras; de

prestígio vs. estigmatizadas. Em geral, a variante considerada padrão é, ao

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mesmo tempo, conservadora e aquela que goza do prestígio sociolinguístico

na comunidade. As variantes inovadoras, por outro lado, são quase sempre

não-padrão e estigmatizadas pelos membros da comunidade. Por exemplo, no

caso da marcação de plural no português do Brasil, a variante [s] é padrão,

conservadora e de prestígio; a variante [o], por outro lado, é inovadora,

estigmatizada e não padrão (TARALLO, 2002, p. 11-12).

Por sua vez, a sociedade acredita que o domínio da norma-padrão é considerado como

um meio de ascensão socioeconômica para o falante, mas, de acordo com Bagno (1999), esse

é um mito enraizado pela sociedade, visto que somente esse domínio não será suficiente para a

ascensão entre os falantes de classe mais desprestigiada:

[...] de nada vai adiantar a uma pessoa que não tenha todos os dentes, que não

tenha casa decente para morar, água encanada, luz elétrica e rede de esgoto. O

domínio da norma culta de nada vai servir a uma pessoa que não tenha acesso

às tecnologias modernas, aos avanços da medicina, aos empregos bem

remunerados, à participação ativa e consciente nas decisões políticas que

afetam sua vida e a de seus concidadãos. (BAGNO, 1999, p. 69).

Para Alkmim (2003), todas as comunidades linguísticas apresentam variedades que são

consideradas superiores e inferiores, refletidas pela hierarquia dos grupos sociais.

1.6 Preconceito Linguístico e Preconceito Social

Finalmente, tivemos, também, o ensejo de constatar o preconceito disseminado em

nossa sociedade, mais especificamente nos lócus que compõem o campo de investigação desta

pesquisa. Tanto o preconceito linguístico quanto o social foram relatados pelos sujeitos

entrevistados, que revelaram sofrer com esses preconceitos. À vista disso, consideramos

imprescindível para esse trabalho discorrer sobre as conceituações que definem e fazem refletir

sobre preconceitos linguísticos e sociais que se proliferam nas comunidades linguísticas.

Os preconceitos são, geralmente, os causadores da discriminação, da estigmatização5 e

da violência, que são decorrentes da ignorância e da intolerância. Vale ressaltar, contudo, que

as atitudes de preconceito surgiram muito antes da existência das sociedades modernas.

5 “Estigma é uma palavra grega que significa “sinal”, “marca”. Uma marca, uma característica, diferencia um

indivíduo ou grupos de indivíduos das demais pessoas ou grupos. Por se diferenciar, o portador do estigma – da

marca – chama a atenção e provoca variadas reações no meio em que vive e nas pessoas com as quais se relaciona.

Nas relações entre pessoas e grupos de pessoas, o estigma quase sempre exprime sentimentos de superioridade, de

um lado, e de inferioridade, de outro. O estigmatizado é visto por aquele que estigmatiza como um ser inferior

social, política e culturalmente” (FROSI, FAGGION & DAL CORNO, 2010, p. 7).

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Segundo Bisinoto (2009), o ato de discriminar percorre os séculos e envolve questões

econômicas, sociais e políticas. Para Leite (2008), o preconceito tem sua origem não na crítica

e sim na tradição, no costume ou na autoridade, pois o preconceito pode construir-se sobre o

que é assimilado culturalmente ou constituído em irracionalidades, emoções e sentimentos.

Segundo Leite (2008, p. 27), “o preconceito é um fenômeno que se verifica quando um

sujeito discrimina ou exclui outro, a partir de concepções equivocadas, oriundas de hábitos,

costumes, sentimentos ou impressões”.

O preconceito linguístico está intrinsecamente ligado ao preconceito social. E, em sua

maioria, ambos os preconceitos inter-relacionam-se e são identificáveis entre as pessoas que

sofrem maior carga de estigmatização por parte da sociedade, como os analfabetos, pobres e

aqueles que não possuem acesso à escolarização. Como cita Bagno (1999, p. 43, grifos do

autor), “o problema não está naquilo que se fala, mas em quem fala o quê. Neste caso, o

preconceito linguístico é decorrência de um preconceito social”.

De acordo com Bagno (2006, p. 27-28), no Brasil não é falada apenas uma língua

portuguesa. “Fala-se um certo número de variedades de português, das quais algumas chegaram

ao posto de norma-padrão por motivos que não são de ordem linguística, mas histórica,

econômica, social e cultural”. Considerando uma sociedade capitalista como a nossa, o poder

econômico e, consequentemente, linguístico está nas mãos de poucas pessoas que comandam e

que têm acesso aos bens culturais. Dessa forma, pode-se afirmar que o preconceito linguístico

está presente em todos os âmbitos da sociedade, tanto na família, na escola e no trabalho.

Assim, é interessante refletir sobre as assertivas de Chauí (2002), relacionadas à forma

como é constituída a ideologia do trabalho entre falantes dominantes da norma-padrão e não-

padrão, ou seja, em que a classe de menor prestígio sofre coerções da classe prestigiada.

Como cita Chauí,

[...] a ideologia burguesa, através de seus intelectuais, irá produzir ideias que

confirmem essa alienação, fazendo, por exemplo, com que os homens creiam

que são desiguais por natureza e por talentos, ou que são desiguais por desejo

próprio, isto é, os que honestamente trabalham enriquecem e os preguiçosos,

empobrecem. Ou, então, faz com que creiam que são desiguais por natureza,

mas que a vida social, permitindo a todos o direito de trabalhar, lhes dá iguais

chances de melhorar – ocultando, assim, que os que trabalham não são

senhores de seu trabalho e que, portanto, suas “chances de melhorar” não

dependem deles, mas de quem possui os meios e condições do trabalho.

(CHAUÍ, 2002, p. 30-31).

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Dessa forma, pode-se considerar que o preconceito linguístico tem suas raízes criadas

não na língua propriamente dita, e, sim, no poder ideológico que é criado pela própria

sociedade.

Os julgamentos de que existem variedades linguísticas “certas” e “erradas”, “bonitas” e

“feias” são muito comuns na sociedade brasileira. Ou mesmo, os julgamentos depreciativos

contra falantes de determinadas regiões geográficas, como é o caso da região Nordeste, pois a

fala de personagens de origem nordestina é geralmente retratada pela mídia de forma pejorativa,

“todo personagem de origem nordestina é, sem exceção, um tipo grotesco, rústico, atrasado,

criado para provocar o riso, o escárnio e o deboche dos demais personagens e do espectador”

(BAGNO, 1999, p. 44).

Da mesma maneira, há a concepção em tachar aqueles que não dominam a norma culta

como ‘ignorantes’ e ‘analfabetos’. Na maioria das vezes, essa discriminação acontece entre

falantes de comunidades linguísticas que se diferenciam socioeconomicamente. Como explica

Bagno; Gagné e Stubbs (2002, p. 73), “quanto mais baixo estiver um falante na escala social,

maior número de “erros” as camadas mais elevadas atribuirão à sua variedade linguística (e a

diversas outras características sociais dele)”.

Assim, podemos afirmar que uma variedade se torna mais prestigiada por uma

comunidade do que outra, não apenas pelas suas diferenças gramaticais normativas, mas,

fundamentalmente, por fatores econômicos, sociais e culturais.

De acordo com Bagno (2014), o português falado no Brasil apresenta uma grande

diversidade do uso da língua, sendo possível afirmar que o país fica dividido em dois segmentos

quanto ao uso da língua, sendo um o dos falantes da língua culta e outro o dos falantes da língua

não-padrão. Consoante a esse fato, existem diversas expressões da língua empregadas pelos

falantes da língua não-padrão que não são aceitas pelos falantes da língua culta ou vice-versa,

o que nada mais é do que a manifestação do preconceito linguístico.

É notória a influência que a língua tem na sociedade. No Brasil, as pessoas, com poder

aquisitivo e com um grau de instrução mais elevado, acham que falam uma língua mais

“correta” e “bonita”, discriminando socialmente e linguisticamente àquelas com menor grau de

escolaridade (analfabetos ou semianalfabetos) e pobres. Como podemos verificar no excerto de

Bagno (2003, p. 75), “os brasileiros urbanos letrados não só discriminam o modo de falar de

seus compatriotas semi-analfabetos, pobres e excluídos, como também discriminam seu próprio

modo de falar, as suas próprias variedades linguísticas.”

Mas o que é o preconceito linguístico?

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Segundo Bagno (1999, p. 12), “preconceito linguístico é o deboche, a sátira, ou a não-

tolerância em relação ao modo de falar das pessoas, é uma forma de preconceito a determinadas

variedades linguísticas”. Assim, o preconceito linguístico não é nada mais do que o fato de

discriminar uma pessoa pelo seu modo de falar. Deparamo-nos, a partir daí, também, com o

preconceito social, que separa as pessoas em classes sociais, estigmatizando ou prestigiando

falantes no uso da sua própria língua materna.

De acordo com Leite, o preconceito linguístico é:

a discriminação silenciosa e sorrateira que o indivíduo pode ter em relação à

linguagem do outro: é um não-gostar, um achar-feio ou achar-errado um uso

(ou uma língua), sem a discussão do contrário, daquilo que poderia configurar

o que viesse a ser o bonito ou correto (LEITE, 2008, p. 24-25, grifos da

autora).

Tais preconceitos podem ser gerados por intolerância diante de uma palavra empregada,

que destoa da norma eleita como padrão da Língua Portuguesa, ou, igualmente, pela falta de

empregos gramaticais que envolvem as exigências de uso relacionadas às concordâncias verbal

e nominal.

Assim, as pessoas julgam o falar “correto” e o falar “errado”, sentindo-se no direito de

eleger uma variante/variedade melhor do que a outra. Aliado ao preconceito linguístico, como

vimos, se encontra o preconceito social, que, juntos, revelam, conforme nos mostra Bagno

(1999, p. 70-71), profundas desigualdades sociais, sendo que “a violência urbana está

intimamente ligada a uma situação de profunda injustiça, que coloca o Brasil [...] entre os países

com a maior economia do planeta e, ao mesmo tempo, entre os primeiros com grande

concentração de renda e aguda exclusão social”.

Consonante a essa situação, Alkmim (2003, p. 42) descreve que “a intolerância

linguística é um dos comportamentos sociais mais facilmente observáveis, seja na mídia, nas

relações sociais cotidianas, nos espaços institucionais etc.” Ainda, segundo Bagno (1999), esse

preconceito é alimentado diariamente em programas de televisão e de rádio, em colunas de

jornais e revistas, os quais têm como principal objetivo querer ensinar e ditar o que é “certo” e

o que é “errado”.

As diferenças na fala geram, assim, profundo preconceito linguístico por meio da

discriminação e pelo julgamento depreciativo da fala do outro e até da própria fala. Dessa forma,

diante de todos os apontamentos teórico-metodológicos que expusemos até aqui, cabe ressaltar

que nosso estudo tem como propósito, ainda que modestamente, corroborar com a

desmistificação dos preconceitos e mostrar as variedades/variantes linguísticas efetivamente

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usadas pelos sujeitos entrevistados em uma comunidade de classe média alta, os quais possuem

maior prestígio social, e em uma comunidade de classe média baixa, que, consequentemente,

são socialmente desprestigiados.

A seguir, no próximo capítulo, apresentaremos um breve esboço da trajetória de

migrantes que vieram à região norte mato-grossense e sobre a formação dos bairros que

compreendem o lócus da pesquisa.

Neste segundo capítulo, apresentaremos os lócus em que se deu o desenvolvimento de

nossa pesquisa, para o estudo do fenômeno variável a que nos propomos: a concordância verbal.

Esta secção contextualiza geográfica, econômica, social e historicamente o universo do estudo

a campo: a região Centro Urbana e o bairro Boa Esperança.

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2 AS MIGRAÇÕES PARA O NORTE MATO-GROSSENSE E A COLONIZAÇÃO DE

SINOP

Para um conhecimento mais enriquecedor, é indispensável a contextualização do

universo de nossa pesquisa.

Localizada na região Centro-Oeste do Brasil, no norte de Mato Grosso, Sinop foi

constituída por uma política de ocupação da Amazônia Legal, desenvolvida pelo Governo

Federal na década de 1970.

Foi colonizada nessa década por famílias em sua maioria vindas da região sul do país.

Sinop fundou-se em 14 de setembro de 1974, e o nome da cidade deriva das letras iniciais da

empreendedora colonizadora da cidade, Sociedade Imobiliária Noroeste do Paraná -

Colonizadora Sinop S/A.

A ocupação da área onde hoje está localizada a cidade de Sinop teve início no ano de

1972, quando a então Colonizadora Sinop S/A adquiriu aproximadamente quinhentos mil

hectares de terra, a 500 km ao norte da BR 163 (Cuiabá-Santarém). A migração na região norte

deu-se inicialmente pelos sulistas, oriundos dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande

do Sul.

O processo de ocupação da região norte mato-grossense ocorrido a partir de 1970, como

consequência do programa Marcha para o Oeste6, representou, no entanto, um terceiro

movimento de povoamento humano. Inicialmente marcado pela presença de etnias indígenas e,

posteriormente, de grupos sociais menores, compostos de mestiços e brancos que foram

silenciados pelo terceiro movimento de ocupação da região pela política de colonização do

governo sob o regime militar (LORD, 2011).

O projeto de ocupação da região norte de Mato Grosso, em especial Sinop, sucedeu-se

com o empreendimento privado de uma imobiliária do estado do Paraná em parceria com o

governo militar. A Colonizadora Sinop S/A tinha a idealização da cidade que projetava, como

nos mostra Souza, quando a mesma, ao chegar no norte do estado, executou todo um processo

de organização e colonização:

A Colonizadora Sinop, ocupou uma área de 645 mil hectares, divididos em

lotes de diferentes tamanhos. Foram instalados quatro núcleos urbanos e de

6 Programa criado pelo Governo Federal na década de 1940, que incentivava o progresso e a ocupação da região

Centro-Oeste do Brasil, para que se pudesse ocupar o “espaço demográfico vazio”, pois havia muitas terras

“desocupadas”.

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apoio dentro da área de colonização: Vera, Santa Carmem, Cláudia e Sinop,

que hoje é sede do município do mesmo nome e a principal cidade do projeto,

após se desmembrar de Chapada dos Guimarães em 1979. [...] As empresas

de colonização que atuam em Mato Grosso, são empresas que adquiriram

experiência em colonização nos Estados de São Paulo, Paraná e Rio Grande

do Sul. (SOUZA, 2012, p. 11).

Dessa forma, os primeiros migrantes foram motivados por interesses político-

econômicos na colonização da Amazônia Legal, mediante a valorização da exploração e

ocupação da “última fronteira agrícola do país, induzidos por propagandas de terras ‘férteis’,

incentivos fiscais, financeiros e promessas de lucros fáceis e ascensão social” (PHILIPPSEN,

2013, p. 59). Inicia-se, então, sucessivamente o processo de migração na região norte mato-

grossense, de pessoas oriundas em sua maioria dos estados do Paraná, Rio Grande do Sul e

Santa Catarina.

Consideráveis parcelas desses migrantes vivenciavam precárias condições de vida em

suas regiões de origem, conforme Philippsen (2013, p. 60), “ao venderem ou perderem suas

pequenas propriedades naqueles Estados, instalavam-se nas áreas oferecidas pelas

colonizadoras particulares da Amazônia mato-grossense”. Influenciados, assim, por

propagandas da colonizadora com a “promessa de terras férteis e o enriquecimento fácil”, a

alternativa mais favorável, para escapar da situação de miséria que vivenciavam em seus

estados e na esperança do enriquecimento, era a migração para o Centro-Oeste. De acordo com

Lord (2011),

A propaganda da colonização do norte do estado do Mato Grosso, no que diz

respeito ao aliciamento de mão-de-obra, foi dirigida a uma população que

experienciou em anos anteriores a precarização das condições de vida de tal

forma que não havia outra alternativa além da migração – ou para as periferias

dos grandes centros, ou para “enriquecer” no centro-oeste. Assim, mais do que

uma promessa de riqueza, a propaganda da colonização significava àquelas

famílias a fuga da pobreza e da miséria em suas regiões de origem (LORD,

2011, p. 179).

Diversos fatores contribuíram para a ocupação da Amazônia, dentre os quais se destaca

a ocupação do “vazio demográfico” propagandeada por terras como meio de produção e

melhores condições de vida. Conforme Souza (2012, p. 11), “nesse processo de ocupação da

região norte de Mato Grosso, percebe-se uma política de valorização do empreendimento, em

um ciclo rápido. Exige-se, além das benesses fiscais, a superexploração do trabalho”. Como

visto, em parceria com o empreendimento Imobiliário particular, o governo federal concedeu

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terras para a colonização às Imobiliárias, que conseguiam muita terra e a dividiam em lotes, os

quais eram revendidos aos colonos que migravam do sul. Porém, ainda segundo Souza (2012,

p. 140), “muitos migrantes não conseguiram a “terra prometida” pela qual sonharam e foram

para Mato Grosso”.

Desta maneira, pode-se dizer que muitos desses migrantes foram trapaceados e iludidos

pelos empresários responsáveis pela colonização. Nesse contexto, o projeto de colonização,

para vários colonos migrantes, foi um “fracasso”, pois perderam suas pequenas propriedades

que venderam em suas regiões de origem para comprarem as terras “prometidas” de Mato

Grosso, no entanto, o que adquiriram, inicialmente, foi o acúmulo de dívidas, a ponto de não

terem condições financeiras para retornarem as suas terras de origem. Entretanto, a especulação

imobiliária rendeu o enriquecimento na região aos latifundiários, visto que, como nos mostra

Souza (2012, p. 141), “já para os capitalistas que “investiram” na Amazônia mato-grossense foi

um ótimo negócio”.

De acordo com Bertrand (1988, p. 75), os interesses de colonização desta região

consistiam em dois principais objetivos, o primeiro se destinava a futuras povoações e o

segundo, consecutivamente, à colonização agrária.

Martins (1997), faz a seguinte assertiva em relação ao projeto de colonização da

Amazônia e sobre o lema empregado pelo Governo Federal,

O lema da ditadura era ‘integrar’ (a Amazônia ao Brasil) ‘para não entregar (a

supostas e gananciosas potências estrangeiras). Os militares falavam em

‘ocupação dos espaços vazios’, embora a região estivesse ocupada por

dezenas de tribos indígenas, muitas delas jamais contatadas pelo homem

branco, e ocupada também, ainda que dispersamente, por uma população

camponesa já presente na área desde o século 18, pelo menos. (MARTINS,

1997, apud LACERDA, 2013, p. 57).

As terras adquiridas pela Colonizadora Sinop S/A integravam-se anteriormente ao

município de Chapada dos Guimarães. Por conseguinte, é a partir de 1971 que uma equipe de

exploradores veio para a região norte de Mato Grosso, para abrir as primeiras picadas, a qual

teve que atravessar rios, matas fechadas, fazer demarcações dos espaços e observar o ciclo das

águas (SOUZA, 2012). E em 1972 iniciam-se as explorações e ocupações do que mais tarde

seria a cidade de Sinop. Vale ressaltar que antes disso a expedição Roncador-Xingu7 deixou

7 Segundo Souza (2006, p. 42), “A Expedição Roncador-Xingu foi criada em 1943 pelo governo federal e fazia

parte da política de ocupação de Getúlio Vargas – a Marcha para o Oeste, tendo como objetivo principal conhecer

e desbravar as áreas que aparecem em branco nos mapas. Partindo do Rio das Mortes em 12 de junho de 1945, a

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suas marcas neste espaço geográfico, assim como ações governamentais foram decisivas para

que as ocupações acontecessem.

De acordo com Lacerda (2013), ao fim da década 1950, a ocupação da região Centro-

Oeste, em especial o norte de Mato Grosso, consolidou-se com a rodovia BR-163, apesar da

falta de programas de incentivos governamentais até o ano de 1960, que inibia, de certa forma,

o desenvolvimento da região. É então a partir do governo Médici (1969-1974), como meta de

desenvolvimento de Mato Grosso, que ocorre a transferência do 9º BEC (Batalhão de

Engenharia e Construções), Exército do Rio Grande Sul, a Cuiabá, para a construção da BR-

163. Em 1970 é lançado o Programa de Integração Nacional (PIN), que traz como prioridade a

construção das rodovias Transamazônica e a Cuiabá-Santarém, a partir das quais se

constituíram os vários núcleos de colonização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma

Agrária (INCRA).

Ainda Lacerda (2013), em síntese, define as políticas de ocupação, colonização e

desenvolvimento de Mato Grosso, de modo geral, como um processo composto de três âmbitos:

Geopolítico, pois se voltava à distribuição de terras para efetivar a

“ocupação” e o controle do território;

Âmbito econômico, para fortalecer a economia nacional por meio da

produção e consumo de bens;

Âmbito social, para transferir o “excedente” populacional do Sul, Sudeste

e Nordeste brasileiro para aquela região, por meio de planos tais como

Plano de Integração Nacional (LACERDA, 2013, p. 63).

Esses âmbitos, conforme o autor supracitado (2013, p. 60-61), amparado nas reflexões

sobre o processo migratório caracterizado por Zart (2005), foram preenchidos essencialmente

pela migração sulista para o Centro-Oeste, que se caracteriza em três tipos principais de famílias

migratórias, “os que possuíam terras, os descapitalizados e os desapropriados”. Sendo o

primeiro grupo de famílias, aquelas que se caracterizaram por possuírem terra na região de

origem, mas que influenciadas pelas propagandas de migração, promovidas fortemente pelo

Governo Militar, veem uma “oportunidade de melhor espaço e uma extensão de terra maior”.

O segundo conjunto de migrantes se define pela “descapitalização na região de origem”,

homens sem-terra, que, de “forma isolada”, buscavam melhores condições de vida e trabalho,

assim vinham trabalhar nas grandes fazendas na esperança de serem donos de um pedaço de

Expedição, conduzida pelos Irmãos Villas Bôas e sob o comando militar do Coronel Vanique Mendes, tinha como

objetivo mais remoto atingir o Rio Tapajós”.

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terra. Já o terceiro grupo consiste nos “excluídos e desapropriados no sul”, fundamentalmente

por causa da concentração de terras naqueles espaços nas mãos de grandes empreendedores.

2.1 A Migração e o Trabalho na Formação da Cidade: o setor agrícola e

madeireiro nas décadas de 70 e 80

Inicialmente foi criada a Gleba Celeste8, projeto elaborado para realizar uma idealização

de organização de moradia e trabalho do povoado, no qual se estabeleceu uma divisão em zonas

urbanas e rurais. A zona urbana sendo composta de bairros residenciais e industriais, e as rurais

tendo, dentre as finalidades, o desenvolvimento da produção de hortifrutigranjeiros para a

cidade.

Nas palavras de Silva (2014, p. 3), “o núcleo de povoamento foi planejado e dividido

em lotes rurais e urbanos, subdivididos em: residenciais, comerciais e industriais, circundados

por um cinturão de chácaras de 5 a 10 hectares, para a produção de hortifrutigranjeiros”. De

certa forma, estabeleceu-se uma separação entre os migrantes com maior influência e mão de

obra mais qualificada, como os proprietários de Imobiliárias e seus familiares, empresários e

comerciantes, inseridos na zona urbana; enquanto famílias de pequenos agricultores e migrantes

desfavorecidos eram ‘acomodados’ na zona rural.

Com o incentivo e a promessa de terras férteis e o progresso na região, “os migrantes

foram impulsionados pelo Governo Militar a virem ao norte mato-grossense para preencherem

“o espaço vazio”” (PHILIPPSEN, 2013, p. 50). Assim, desde o início da colonização, o

propósito da colonizadora era implantar a produção do café, principal produto de exportação

do estado do Paraná, mas que se encontrava naquele momento em fase de declínio na região

sul decorrente às geadas que assolavam com uma vasta produção. Desinente a essas

circunstâncias, impulsionou-se a migração dos de pequenos produtores à região norte mato-

grossense. Desse modo, inicialmente esses migrantes eram incentivados à produção agrícola de

café e mandioca, posteriormente se principia uma decadência do incentivo à produção e

comercialização dessas culturas e aos poucos passam a ser abandonadas pelos pequenos

agricultores (PHILIPPSEN, 2013).

8 Projeto idealizado pela Colonizadora Sinop S.A, para o processo de ocupação da Amazônia mato-grossense.

Inicialmente a Gleba Celeste foi dividida em lotes de diferentes tamanhos em formatos de lotes rurais e urbanos.

O espaço territorial era constituído oficialmente pelas cidades de Sinop, Vera, Santa Carmem e Cláudia. Essa

extensão, inicialmente, pertencia ao município de Chapada dos Guimarães (na época, maior município do Estado

de Mato Grosso em extensão territorial).

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Como expõe a mesma autora (2013), os experimentos, relacionados aos plantios do café

e da mandioca, tiveram um fracasso, que pode ser justificado pelo desconhecimento e a

inexperiência dos pioneiros sobre o espaço geográfico, relacionados ao solo e ao clima da

região, já que anteriormente esses migrantes atuavam em outras atividades ou com outras

variedades de produção no sul do país.

Ainda segundo Philippsen (2013, p. 75), “na chegada dos migrantes, que vinham

principalmente na expectativa de satisfazer o desejo de possuírem terras e melhorarem suas

condições de vida, no entanto, desenhou-se um cenário distinto, de reais dificuldades que foram

encontradas pelos “desbravadores” da floresta.” A inadequação ao plantio do café na região

conduziu a grandes prejuízos aos ‘colonos’, condição totalmente inversa aos dos anúncios e das

fotos que eram propagandeadas pela colonizadora, que exaltavam os fatores climáticos, como

a ausência de geadas e de chuvas constantes. Podemos constatar essas assertivas, também, no

seguinte excerto de entrevista realizada com um pioneiro de 57 anos, morador da região central

da cidade que chegou ao município de Sinop em 1977,

Olha (+), o meu pai, o sonho dele era o café (+), a plantação de café. Como

mostravam fotos falsa na época, pra trazê o pessoal pra cá, fazendas de

cafeza::is aqui na cidade que nunca existiu, meu pai foi um dos que se iludiu

com o café que nunca teve no Mato Grosso, aqui na no::ssa região também

não. Mostrado pela própria Colonizadora Sinop. Foi uma decepção to:tal. Luz

(+) só tinha na escola, que era da Colonizadora e ligava na escola. Tudo era

decepcionante, não tinha nada, foi decepcionante quando chegamos aqui.

(Entrevistado C3 M9)10.

Além da frustração com as ‘falsas’ propagandas divulgadas pela colonizadora por meio

de folders e fotografias que enalteciam a Gleba Celeste como terra ‘fértil’, sobre cafezais que

não ‘existiam’ e com o insucesso na produção do café e outras culturas por causa do solo e à

falta de financiamento aos colonos, os primeiros migrantes enfrentaram também dificuldades

em relação à moradia, à malária e à febre amarela, bem como dificuldades no período de

chuva11. Conforme é enfatizado na entrevista com o pioneiro C3 M, “as condições de moradia

eram difíceis, as casas eram levantadas com lonas, sem piso e divisórias, eram tudo provisórias

[...] a febre amarela era epidemia na região”. O entrevistado relata ainda sobre as dificuldades

9 C – sujeito entrevistado do Centro. F e M correspondem ao sexo Feminino e Masculino. No terceiro capítulo

será apresentado uma tabela com os dados e siglas dos sujeitos entrevistados, para a preservação de suas

identidades. 10 Procurou-se preservar a variação fônica ou da pronúncia características de todos os entrevistados. 11 O período de chuvas compreende-se entre os meses de novembro a abril. Entre os meses de maio a outubro é o

período relativo à seca.

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de comunicação, o acesso às estradas e à aquisição de alimentos no período de chuvas, sendo

que dependiam da COBAL (Companhia Brasileira de Alimentos)12:

O fato que mais me marcô, quando eu cheguei aqui (2.5), foi eu ficá totalmente

isolado, sem comunicação nenhuma, sem podê saí daqui, sem/porque as

estradas, simplesmente elas ficaram numa situação que não tinha como ir e

nem vir (+), ficamos isolados do resto do mundo. Se não fosse o Búfalo, os

aviões do exército que trazia comida pra nós, nós teríamos passado fome.

Chegô a um ponto de tê dinheiro e não tê comida pra comê. Daíí, foram onde

que começaram/(+) quando tinha a COBAL aqui em Sinop, que era um

mercado abastecido pelo governo(0.5), então não é nada de graça pro po::vo,

mas, aí mandavam alimento po povo, o básico pro povo podê se mantê durante

à época de chuva (Entrevistado C3 M).

Com o declínio da produção da agricultura, a falta de recursos e financiamentos do

governo federal, inicia-se, então, uma expansão na extração e instalação de madeireiras,

desenhando-se o cenário do setor madeireiro na região. Conforme Philippsen (2013, p. 67), “a

madeireira tornou-se, consequentemente, o principal produto de industrialização e de

comercialização da região”.

Segundo Teixeira (2006), a madeira foi a principal fonte de renda no início da ocupação

da região, já que a madeira era encontrada em abundância e precisava ser retirada para o

processo de ocupação, o que garantiria de certa forma a posse da terra.

Dessa forma, o trabalho na extração de madeira nas décadas de 1970 e 1980 passa ser a

principal atividade econômica na região mediante as instalações do setor madeireiro no norte

mato-grossense, que ganham forças com a expansão de empresas das regiões sul e sudeste do

país, visto que muitos dos trabalhadores das madeireiras foram funcionários deslocados para a

região e junto trouxeram a família que passa a depender exclusivamente das condições de

moradia e educação que eram ofertadas pelas empresas. Assim, este trabalho foi o pilar na

formação da sociedade local (LORD, 2011).

A fotografia, abaixo, apresenta um Parque Industrial Madeireiro da década de 1980. Ao

lado dos grandes barracões, no canto esquerdo, vemos a colônia de casas dos trabalhadores na

Indústria Madeireira (1983) que eram ofertadas aos funcionários e família dos funcionários, os

quais dependiam das instalações de moradia oferecidas pela empresa do setor madeireiro.

12 “Por ocasião da visita do Ministro da Agricultura, foi entregue à população o armazém da COBAL (Companhia

Brasileira de Alimentos), destinado a fornecer alimentos, utensílios e produtos de primeira necessidade a preços

mais acessíveis” (PHILIPPSEN, 2013, p. 76-77).

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Fotografia 01: Parque Industrial Madeireiro em Sinop (1980).

Fonte: Acervo Museu Histórico de Sinop.

Entretanto, conforme Philippsen (2007), a atividade no setor madeireiro, que teve

apogeu na década de 80, passa a entrar em declínio já no início da década de 90. Como podemos

verificar no fragmento abaixo,

a atividade madeireira, tão explorada e difundida nos anos 80, não conseguiu

se estabilizar e nem garantir ganhos substanciais aos empresários madeireiros.

Sem infra-estrutura, sem investimentos e recursos para se capitalizar e sem

incentivos políticos governamentais para o fortalecimento do setor, o

madeireiro, em geral com um perfil de pouca instrução (escolaridade) e de

gerenciamento muito abaixo dos padrões exigidos para uma inserção

competitiva nos mercados nacionais e internacionais, não encontra apoio para

prosseguir na atividade (PHILIPPSEN, 2007, p. 24).

A partir da década de 1990 inicia-se, então, um avanço no setor agrícola com a produção

de milho, arroz e a soja como carro chefe. De acordo com Lacerda (2013, p. 25), passam a se

instalar na região as grandes companhias internacionais voltadas ao desenvolvimento do setor

agrícola. Dentre as companhias o autor destaca a Bunge13, Cargill14 e a ADM15. Assim, o

13 “BUNGE: Bunge Corporation, baseada em Saint Louis. Tem unidades industriais, silos e armazéns nas

Américas do Norte e do Sul, Europa, Ásia, Austrália e Índia, além de escritórios da BGA (Bunge Global

Agribusiness) atuando em vários países europeus, americanos, asiáticos e do Oriente Médio. No Brasil, controla a

Bunge Alimentos, a Bunge Fertilizantes e a Fertimport. 14 CARGILL: é uma multinacional norte-americana fundada em 1865 por W.W. Cargill em Iowa. Atualmente

comercializa, processa e distribui produtos agrícolas, alimentícios, financeiros e industriais em 59 países. Sua sede

está em Minneapolis (Minnesota – EUA). 15 ADM: Archer Daniels Midland, com sede em Decatur, Illinois (USA), processa ingredientes especiais para

rações e produtos alimentícios” (LACERDA, 2013, p. 25).

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objetivo da ocupação dessas áreas passa da colonização e fundação de cidades para um novo

processo, a “expansão cada vez maior da produção de grãos, destinada à exportação”.

2.2 Sinop nos Dias Atuais

Atualmente, Sinop conta com uma população de 126.817 habitantes (estimativa IBGE16,

2014), e está situada em uma área de expansão da atividade agrícola moderna e de produção

agroindustrial, influenciam, “na atual sustentação econômica, a múltipla prestação de serviços

e um comércio varejista e atacadista estruturado”, além da caracterização do alto uso

tecnológico na utilização de insumos agrícolas e maquinários (empresas especializadas nessa

área) e centralização de prestação de serviços públicos e privados (MOURA, 2014, p. 06).

A cidade destaca-se também na área educacional, sendo considerada ‘cidade

universitária’. De acordo com Philippsen (2013, p. 80), “são nove faculdades que oferecem

mais de 60 cursos de nível superior, com destaque para a Universidade Federal de Mato Grosso

(UFMT) e à Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT)”.

Composta atualmente por migrantes de todas as regiões do país, fato que se deve ao

processo histórico de colonização, contudo a existência de traços que remetem à identidade

cultural sulista é notavelmente presente na cidade de Sinop, fato que se justifica pelas políticas

de colonização incentivadas pelo governo militar em parceria com empresas privadas

provenientes da região sul do país, conforme já supracitado, e enaltecido no seguinte excerto

de Moura:

Sabe-se que os fluxos migratórios, impulsionados pela política de

colonização privada em Mato Grosso, culminaram no enriquecimento cultural

mato-grossense, criando novas identidades culturais, mesmo que advindas de

outras regiões, contribuindo para ampliar a diversidade já existente.

(MOURA, 2014, p. 6).

O município é a quarta economia do estado de Mato Grosso e é renomada como a

“Capital do Nortão”. A soja é o principal produto cultivado e move a economia local. Conforme

dados de pesquisa de Junior (2014, p. 109), o cultivo da soja foi se expandindo na região e se

tornou a principal atividade econômica, obtendo mais de 8 milhões de hectares plantados na

safra 2013/14 e respondendo por 60% do valor das exportações.

16 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Lacerda (2013) fala sobre esse processo de expansão da produção agrícola que culminou

no que ele descreve de “vulnerabilidade social e segregação social”, provocando o processo de

urbanização acelerado e, ao lado desse crescimento econômico, há o aumento das desigualdades

econômicas, sociais e culturais. Como consequência, conduz-se a concentração dos novos

migrantes às periferias urbanas da cidade.

Ainda segundo este autor, esses fatores são os facilitadores da segregação socioespacial

que pode levar à exclusão social. E que é muito comum nas modernas cidades de nosso país.

A este respeito Villaça (2001) explana que o padrão de segregação mais conhecido das

cidades brasileiras é o do centro para a periferia. No qual o centro urbano da cidade é equiparado

pela maioria dos serviços urbanos públicos e privados e é, geralmente, ocupado pelas classes

com rendas mais altas; enquanto os bairros, com menor atribuição desses serviços e afastados

do centro, são resididos principalmente pelos excluídos.

A seguir será permeado um breve relato da trajetória histórica dos bairros que foram

lócus da presente pesquisa realizada, que se compõem de dois diferentes pontos de localizações

na cidade de Sinop. Embora esses dois bairros que integram a pesquisa sejam geograficamente

próximos (aproximadamente 5 km entre um e outro), eles se diferenciam pela questão de um

espaço geográfico ser caracterizado como centro urbano e outro como periférico. Nas palavras

de Souza (2006, p. 209) “torna-se visível em Sinop a desigualdade entre os preços dos terrenos

do centro da cidade – bem mais altos – e os da periferia”.

2.2.1 Região Centro-Urbana de Sinop

Inspirado no traçado da cidade de Maringá – PR, o plano de projeto urbanístico da

cidade de Sinop rege-se por uma planta com o traçado da mesma. Conforme cita Arruda (1997,

p. 134), “o projeto urbanístico, concebido para a cidade, segue os parâmetros similares ao

desenho urbano da cidade de Maringá (local de origem da empresa colonizadora)”. Entretanto

não se seguiu à risca o projeto urbanístico, visto que é perceptível a separação de sujeitos de

classes média alta e média baixa, esses sujeitos estão divididos em diversos grupos sociais. Por

sua vez, como planejado inicialmente pela Colonizadora Sinop S/A, estabeleceu-se a divisão

entre centros residenciais e industriais, estes sendo excluídos do comércio imobiliário, afastados

do centro e inseridos em lotes não planejados em regiões de aspectos periféricos, carentes de

infraestruturas e serviços públicos.

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Segundo estudos de Romancini et. al. (2003), a produção do espaço urbano público e

privado da cidade de Sinop revela uma complexa estrutura social separada em classes e revelada

pela segregação, que são resultados do processo histórico de ocupação.

Atualmente, toda a área central conta com atendimento de serviços públicos, como

hospitais, iluminação, limpeza pública, água tratada e esgoto, além de atendimentos

particulares. Constitui-se, também, de um compreensivo setor relacionado a serviços bancários,

comércios, saúde e educação. Esta área conta com avenidas largas e arborizadas. A esse respeito

Souza (2006), afirma que,

Sinop possui ruas e avenidas planejadas, como uma forma de controlar a

circulação das pessoas pelo espaço urbano e o acesso mais fácil para as forças

de segurança, se alguma área apresentar risco para a “ordem pública”,

controlando o espaço urbano e a movimentação das camadas populares neste

mesmo espaço (SOUZA, 2006, p. 213).

Segundo este autor (2006, p. 207), no começo da ocupação de Sinop, a avenida central

da cidade, a Júlio Campos (antigamente denominada Avenida dos Mognos), era local de

moradia e concentração comercial, com instalações provisórias, posteriormente inicia-se o

processo de urbanização da cidade, “com o surgimento dos primeiros estabelecimentos

comerciais, como farmácia, armazém, hotel, oficina mecânica, loja de confecções, serviços

públicos, escolas, igrejas, hospital e outros”.

Souza (2006, p. 208) relata ainda que o processo de expansão urbana difundiu-se a partir

de 1984 e 1985, da “Avenida Júlio Campos (antiga Avenida dos Mognos) em direção à

periferia. Novos bairros são incorporados, ruas e avenidas são abertas, auferindo à especulação

imobiliária grandes lucros através da comercialização elevada dos lotes urbanos”. Ocorrendo,

assim, um grande aumento da população urbana e declínio da população rural no período de

1988 a 1990.

O centro urbano, principalmente as ruas e avenidas mais antigas, construídas desde o

início da colonização, é composto em sua maioria por sulistas que estão ali presentes desde a

migração ao norte de Mato Grosso, bem como a segunda geração da família desses migrantes

que permanece em grande parte nesse espaço geográfico.

Vale ainda ressaltar que, conforme os migrantes entrevistados, as dificuldades eram

grandes em relação às condições de moradia, que eram extremamente precárias à época da

colonização. Na área da saúde, contava-se com apenas um pequeno posto de saúde e um único

médico. A primeira moradia desses migrantes era embaixo de lonas, até levantar a casa de

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madeira. Estes fatos foram também relatados pela entrevistada C1 F, de 73 anos, moradora na

região central desde que veio para a cidade em 1976,

A minha primeira casa, eu cheguei aqui (0.5) não tinha te::to, não tin:ha na::da

((risos)). Morei debaixo de lona, até terminar a casa. Era casa de madeira, que

você olhava de fora pra dentro você via tudo lá dentro. E piso não tinha, era

chão batido [...]. A parte de saúde, nós tinha um posto de saúde com um único

médico. A farmácia não tinha, o mercado tava abrindo o Machado Primaveras

(+) que era um corredor de madeira, desse tamanhinho ((gesticula com a

mão)). E tinha a COBAL que abastecia, mas não existia praticamente na::da,

não existia farmácia, não tinha médico, se você dependesse de uma

necessidade, um (1.5) caso de emergência de saúde, acho que morria aqui

mesmo, porque não tinha com o quê (+), era tudo muito difícil. (Entrevistada

C1 F).

No setor educacional, as dificuldades também eram grandes, durante o primeiro ano de

colonização existia uma única sala de aula de madeira, que havia sido construída em mutirão

com a ajuda de pais de alunos. Em 1974 foi construída, pela colonizadora, uma pequena escola,

composta de quatro salas de aula. A falta de estrutura, materiais didáticos, transporte e

qualificação profissional dificultavam na alfabetização desses alunos.

De acordo com a entrevistada C1 F, os alunos para se matricularem na escola tinham

que apresentar uma carteira de vacinação, isso servia como um controle para que todas as

crianças fossem vacinadas contra a malária, que era a causa de muitas mortes na época.

Em todos os relatos coletados com moradores da região central, que estão no município

desde o início da colonização, apresentaram-se, enfaticamente, grandes dificuldades

vivenciadas, desde a falta de infraestruturas, doenças e até a falta de perspectivas de vida.

Porém, com o passar dos anos, a cidade se desenvolve e as dificuldades iniciais são

minimizadas.

Portanto, a segunda geração dessas famílias pioneiras, ou aqueles que ainda chegam à

região diariamente de todos os cantos do país, pois Sinop ainda desperta sonhos e esperanças,

já não se deparam com dificuldades rudimentares. Essa constatação é feita pela entrevistada C2

F, de 23 anos, moradora da região central há 8 anos e oriunda da região sul do país:

Aqui acho que não teve e não tenho, porque:: aqui assim (+) é perto de tu:do,

tem mercado perto, a escola sempre foi perto, a igreja é aqui perto, então (+)

assim não teve tanta dificuldade. Por ser no centro, né, é tudo aqui ao redor

[...]. Aqui, como mora muito, o pessoal mais antigo do centro, é uma rua mais

antiga, todo mundo conhece to::do mundo, e a relação é boa (Entrevistada C2

F).

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Atualmente, a área central urbana de Sinop é de 17, 0108 km² (estimativa Embrapa17).

Possui uma população de 4. 313 habitantes (IBGE, censo 2010 - Setor Comercial).

A tabela 1, abaixo, apresenta o rendimento per capita dos moradores do bairro, segundo

a condição no domicílio e o compartilhamento da responsabilidade pelo domicílio (IBGE, censo

2010):

TABELA 01

Bairro Classes de rendimento nominal

mensal

Setor Comercial

Total 3.827

Até 1/2 salário mínimo 29

Mais de 1/2 a 1 salário mínimo 321

Mais de 1 a 2 salários mínimos 613

Mais de 2 a 5 salários mínimos 881

Mais de 5 a 10 salários mínimos 517

Mais de 10 a 20 salários mínimos 169

Mais de 20 salários mínimos 79

Sem rendimento 1.218

Sem declaração -

Fonte: IBGE - Censo Demográfico ano 2010.

2.2.2 Bairro Jardim Boa Esperança

O histórico do bairro será permeado através de dados e entrevistas coletadas no

arrabalde, com moradores, o representante da Associação de Moradores de Bairro e no Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além de leis sancionadas que constituíram o bairro

Jardim Boa Esperança, como é denominado atualmente, coletadas na Prefeitura Municipal de

Sinop e no Portal Transparência18.

Antes de ser denominado como Jardim Boa Esperança em 1997, a região era constituída

de loteamentos, sendo inicialmente chamados de Loteamento Campo Verde, Decreto Nº 023/96

de 02 de julho de 1996, e Loteamento Jardim do Sol, Decreto Nº. 024/96 de 02 de julho de

1996, respectivamente.

17 Urbanização das cidades brasileiras, Embrapa monitoramento por Satélite. Visitado em: 23 de mar. de 2015.

Disponível em <http://www.urbanizacao.cnpm.embrapa.br>. 18 Disponível em <http://sic.tce.mt.gov.br/41>. Acessado em 5 de mar. de 2015.

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Estes Decretos foram sancionados pelo terceiro prefeito municipal de Sinop, Antonio

Contini, que administrou o município no período de 1993 a 1996. Aprovando, posteriormente,

um novo loteamento, denominado Residencial Porto Seguro, pelo Decreto Nº 030/96 datado

em 02 de agosto de 1996.

A partir da constituição desses três loteamentos é que surge o bairro Boa Esperança em

1997. Aprovado por um novo Decreto de Nº 481/97 que dá aos loteamentos Campo Verde,

Jardim do Sol e Residencial Porto Seguro a denominação de bairro Jardim Boa Esperança. A

lei datada em 27 de junho de 1997 foi sancionada pelo prefeito Adenir Alves Barbosa em seu

segundo mandato de 1997 a 2000. O seguinte Decreto aprova,

Art. 1º - Fica denominado de Bairro Jardim Boa Esperança, a área urbana do

Município de Sinop que abrange os loteamentos Jardim Campo Verde, Jardim

Morada do Sol e Residencial Porto Seguro.

É o que podemos verificar, também, no excerto de entrevista realizada com o Presidente

da Associação de Moradores de Bairro do Boa Esperança,

O Boa Esperança é (1.5), como foi falado, era o Jardim do Sol. Com o tempo

ele foi Campo Verde, Jardim do Sol e depois o Porto Seguro. Com o tempo

fizemos uma reunião com os moradores com uma votação, aí escolhemos o

nome Boa Esperança, pra ser o denominador desses três (+) a junção dos três,

como se diz, loteamento, não era bairro (+) Loteamento Campo Verde,

Loteamento Jardim do Sol e Loteamento Porto Seguro. (Entrevistado

Presidente B5 M).

O bairro Jardim Boa Esperança encontra-se situado na Avenida André Antônio Maggi,

aproximadamente a 5 km do centro da cidade. O arrabalde compreende uma população de 5.

493 habitantes (IBGE, censo 2010).

A tabela 2, abaixo, apresenta o rendimento per capita dos moradores do bairro Boa

Esperança, na condição de domicílio e o compartilhamento da responsabilidade pelo domicílio

(IBGE, censo 2010),

TABELA 02

Bairro Classes de rendimento nominal

mensal

Jardim Boa Esperança

Total 4.422

Até 1/2 salário mínimo 236

Mais de 1/2 a 1 salário mínimo 966

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Mais de 1 a 2 salários mínimos 1.199

Mais de 2 a 5 salários mínimos 418

Mais de 5 a 10 salários mínimos 38

Mais de 10 a 20 salários

mínimos 2

Mais de 20 salários mínimos -

Sem rendimento 1.563

Sem declaração -

Fonte: IBGE - Censo Demográfico ano 2010.

A formação do bairro foi e é constituída por um segmento social que se diferencia de

outros bairros e principalmente do centro urbano da cidade, como se pode conferir no quadro

acima, segmento este marcado pelas diferenças socioeconômicas, bem como pela educação,

trabalho, cultura e origem. Essas diferenças se compõem desde o início de sua criação e

carregam até nos dias atuais uma forte carga de estigmatização.

O espaço é caracterizado como região de periferia, que se deve ao fato do bairro ser

localizado a uma distância do centro urbano da cidade. “O fato de que à medida que nos

afastamos do centro rumo à periferia da cidade, nota-se que a cidade tem padrão urbanístico

extremamente segregador” (SILVA, 2014, p. 3). Essa diferenciação implica-se na localização

dos bairros e, consequentemente, ao fator socioeconômico, como é possível verificar nas

assertivas produzidas por Castells,

A distribuição dos locais residenciais segue as leis gerais da distribuição dos

produtos e, por conseguinte, opera reagrupamentos em função da capacidade

social dos indivíduos, isto é, no sistema capitalista, em função de suas rendas,

de seus status profissionais, de nível de instrução, de filiação étnica, da fase

do ciclo de vida, etc. (CASTELLS, 1983, p. 210).

Deste modo, a formação do bairro ocorreu, inicialmente, por moradores oriundos em

sua grande parte de regiões de garimpo, como Peixoto de Azevedo e Guarantã do Norte, em

consequência à estagnação da atividade garimpeira, refugiando-se em outras cidades, como

Sinop, em busca de melhores condições de vida, instalando-se em lotes distantes do centro, em

razão à facilidade de adquirir terrenos por baixo custo à época. É o que podemos constatar na

seguinte afirmação de Marta,

Com a queda do preço do ouro, a partir de 1991, alguns municípios que

nasceram do ouro ainda resistem, mas são verdadeiras cidades fantasmas,

onde as pessoas recebem para continuar morando. As populações foram para

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cidades maiores em busca de emprego. Sinop tem bairros retendo a evasão

garimpeira de Peixoto de Azevedo, Paranaíta e Apiacás. (MARTA, 1999b,

apud, SOUZA, 2006, p. 211).

De acordo com os relatos coletados na entrevista com o presidente do bairro, que morou

em região de garimpo na cidade de Peixoto de Azevedo, este veio para Sinop domiciliando-se

no Jardim do Sol, que atualmente é Boa Esperança, relata que os preços dos terrenos eram

acessíveis, este fato era o que motivava os migrantes em sua maioria do garimpo a se instalarem

no bairro.

Portanto, estas pessoas passam a se domiciliar em locais mais afastados do centro, com

pouca infraestrutura e baratos, pois são locais de moradia que se enquadram em suas situações

econômicas e profissionais.

A esta situação Negri (2008) assevera que,

As maneiras como as classes se distribuem no espaço urbano dependem do

acúmulo de capital individual que cada um consegue ter. Morar em um bairro

popular não depende somente de suas características culturais, étnicas ou

raciais, mas da reprodução da força de trabalho que o capital precisa para

reproduzir-se. (NEGRI, 2008, p. 15).

A região que atualmente constitui o Boa Esperança era conhecida e afamada como

“peixotinho”, em razão da maioria dos que residiam na localidade serem procedentes da região

de garimpo e vinham principalmente da cidade de Peixoto de Azevedo. Como afirma Souza

(2006, p. 210), “o bairro Jardim Boa Esperança (fusão de outros três bairros) é um verdadeiro

“peixotinho”, formado por pessoas que fugiram da crise do ouro no extremo norte de Mato

Grosso e vieram em busca de melhores condições de vida para as suas famílias”.

Sobre este assunto podemos, ainda, verificar no excerto de entrevista, quando o

presidente do bairro fala das dificuldades que esses moradores enfrentaram ao chegar à cidade.

Relacionadas principalmente às dificuldades de arranjarem emprego, por serem provenientes

de atividades garimpeiras da região de Peixoto e por residirem no Jardim do Sol, um motivo a

mais para a estigmatização desses moradores,

A dificuldade de você arrumá emprego, porque quem vinha de Peixoto pra

Sinop, era um pobrema sério. E quem vinha de Peixoto para o Boa/o “Jardim

do Sol”, era mais pobrema sério pra arrumá emprego porque (+) na realidade

o povo de Sinop, o centro, a sociedade que tava aqui a mais tempo, eles

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falavam/eles chamavam o Jardim do Sol de “peixotinho”. Era o peixotinho,

porque todo mundo de Peixoto é da região do garimpo (1.5) e vinha para o

Jardim do Sol. Então, se você era de Peixoto, chegava para fazer uma ficha de

emprego, falava que era de Peixoto “hum (+) amanhã eu ligo pra você”. “Cê

mora mesmo aonde?” “No Jardim do Sol”. “Então, não tem como”.

(Entrevistado Presidente B5 M).

No início da formação do bairro, as condições de infraestruturas e moradia eram

extremamente precárias e até mesmo insalubres. De acordo com entrevistas coletadas com o

presidente e moradores, o bairro era extremamente carente em condições de saúde, educação,

água tratada, esgoto e iluminação. As poucas possibilidades de trabalho a essas pessoas eram

de alinhador de serraria, dedetizador e vendedor autônomo.

Com o passar dos anos, o bairro consegue um bom desenvolvimento nas condições de

moradia e infraestruturas e, consequentemente, os moradores têm mais oportunidades de

mercado de trabalho, apesar do bairro ter sido há muito tempo designado de “peixotinho”

devido ao fluxo de migração de Peixoto de Azedo e outras regiões de garimpo. Nos dias de

hoje, o bairro é composto ainda de muitos moradores que vieram à época de garimpos da região

de Peixoto de Azevedo e Guarantã do Norte e que ainda estão vindo à cidade e se instalando no

bairro, motivados principalmente por emprego. Há, também, um grande número de

maranhenses.

Atualmente, o bairro conta com uma creche, escola, farmácia, posto de saúde, mercados

e dispõe ainda de um Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), de uma praça

esportiva, ginásio e campo de futebol. Compreende 70% de iluminação pública e asfalto em

todo o bairro. Possui uma base do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Sinop (SAAES) que

abastece uma parcela da cidade.

O bairro também tem uma Base Comunitária de Segurança Pública, inaugurada em 04

de junho de 2011. A base é a quarta já inaugurada no interior de Mato Grosso por meio da

Secretaria de Estado de Segurança Pública (SESP/MT) em parceria com a Prefeitura Municipal

de Sinop.

A instalação da Base Comunitária de Segurança tem como idealização a diminuição do

índice da criminalidade, e os serviços da Base se estendem para toda a população da cidade. De

acordo com relatos do presidente do bairro, a instalação dessa Base é resultado de muitos anos

de luta dos moradores, da Pastoral e de outras entidades do bairro juntamente ao Governo do

Estado.

Neste contexto, a população carecia e exigia de imediato a presença de uma Base de

Segurança, decorrente dos elevados índices de criminalidade, homicídios, apreensões de drogas

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e receptação de produtos de furtos que o bairro enfrentava e enfrenta, fatores estes que fazem o

bairro ainda sofrer uma forte carga de estigmatização por moradores do centro da cidade e

também por outros bairros, apesar do empenho desenvolvido nas condições de infraestruturas

e moradia.

Ainda conforme relatos de moradores entrevistados e o representante do bairro, o maior

e mais grave problema enfrentado pelo bairro é a droga. O uso e venda de entorpecentes e,

consequentemente, a receptação de produtos de furtos, fundamentalmente, para o consumo de

entorpecentes. Segundo moradores, o cenário que se desenha é a “rivalidade com moradores de

outros bairros [...] e cria um atrito, e acaba querendo fazê acerto de contas” (Entrevistado B3

M), devido ao tráfico, ao consumo de entorpecentes e à queima de arquivo.

Para esses jovens, o tráfico representa a possibilidade de atingir um status

social e obter respeito da sociedade. O traficante é visto como um indivíduo

respeitado, que possui poder e dinheiro, algo quase inatingível em uma

comunidade de baixa renda. No imaginário de vários jovens, é o traficante

quem zela pelo bem-estar da comunidade, na medida em que faz benfeitorias

(muitas vezes substituindo o papel do Estado). Acima de tudo, é quem os

respeita como cidadãos (CASTRO, 2002, p. 171).

Dessa forma, segundo esta autora, em um meio de exclusão social o envolvimento com

o tráfico de drogas pode estar relacionado ao desejo de satisfação de consumo, do qual eles são

excluídos ou, ainda, porque a sociedade não oferece meios legítimos para a inclusão social.

Assim, podemos compreender a percepção pejorativa que muitas pessoas apresentam

sobre o bairro, como violento, perigoso, marginal e pobre. O que, consequentemente, cria uma

grande estigmatização sobre o local. A partir desse contexto é que podemos buscar uma

compreensão do porquê o bairro mesmo depois de ter crescido tanto em condições de

infraestruturas, saúde, educação etc. ainda ser muito estigmatizado se comparado com inúmeros

bairros que não possuem condições básicas de serviços públicos como saúde, educação,

iluminação, água tratada e esgoto.

A esse contexto cabe expor que o bairro possui um projeto social voltado à área

esportiva para crianças e adolescentes. O projeto foi criado com o objetivo de promover a

integração dessas crianças e adolescentes com a comunidade e bairros vizinhos, no intuito de

ampliar o universo cultural e educacional.

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Conforme sanciona a lei do artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente19, é dever,

também, da sociedade, além do Estado, assegurar a efetivação dos direitos da criança e do

adolescente, como à educação, ao esporte, ao lazer, à cultura, à convivência familiar e

comunitária.

Assim, o projeto na área esportiva, criado e dirigido pelo presidente do bairro em

parceria com um professor, instituições e moradores do bairro, atende de domingo a domingo

no período vespertino. As atividades são realizadas no campo da associação de moradores aos

fundos da Escola Municipal de Educação Básica Armando Dias. O projeto estende-se para

moradores de outros bairros e atende em média 200 crianças e adolescentes. De acordo com o

presidente, o trabalho social tem dado a esses jovens oportunidade de um futuro melhor e tem

resgatado muitos adolescentes do caminho das drogas e criminalidade.

Após as considerações sócio-históricas tecidas, as quais demonstram que a população

da cidade de Sinop é formada por um conjunto de diversas etnias, costumes e de distintos grupos

socioeconômicos, é impossível ignorar que a diversidade étnica e cultural se faz estritamente

presente. De acordo com Signorini (2002, p. 76-77), “a língua se relaciona com a sociedade

porque é a expressão das necessidades humanas de se congregar socialmente, de construir e

desenvolver o mundo”.

Assim, a língua é, de certa forma, pioneira na constituição de uma sociedade, sendo

indispensável e apresentando variações em sua formação e significação, originárias de

diferentes culturas, etnias e regiões. Conforme expõe Frosi (2010, p. 172), “é indiscutível a

importância que tem a língua materna na manifestação da cultura e da etnicidade de um grupo

étnico”.

Podemos notar, também, que diferenças são perceptíveis no uso da língua por

grupos/comunidades linguísticas que se diferenciam nas condições socioeconômicas, até

mesmo dentro de um mesmo segmento social as particularidades do uso da língua são

percebíveis ou apresentam diferenças que podem acarretar julgamentos preconceituosos e que

levam à exclusão social. Fenômeno este linguístico e social, que será analisado, pelo viés da

Sociolinguística e também da Gramatica Normativa, ao decorrer do próximo capítulo a partir

dos resultados apreendidos no corpus da pesquisa.

19 Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/1990). 3. ed. Brasília: Conselho Nacional dos Direitos da

Criança e do Adolescente, 2004.

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3 APRESENTAÇÃO METODOLÓGICA E TESSITURAS ANALÍTICAS SOBRE O

CORPUS

Neste terceiro capítulo, constam os procedimentos metodológicos que orientaram os

passos da nossa pesquisa. Iniciamos, explicando como tivemos acesso ao corpus e quais as suas

características. Na sequência, tratamos sobre os métodos e materiais utilizados para a coleta de

dados. E, de forma breve, apresentamos novamente algumas ponderações acerca das

comunidades estudadas voltadas para a questão socioeconômica e trazemos algumas

considerações sobre a concordância verbal normativa. Em outra subseção, discorremos sobre o

modelo de análise adotado para a composição do trabalho e mostramos a organização das

variáveis de acordo com os fatores propostos neste trabalho: o uso da concordância padrão x

não-padrão, com um comparativo dos dois lócus em que se desenvolve a pesquisa.

3.1 Procedimentos da pesquisa e seleção dos informantes

O trabalho, como já apontado, segue o viés teórico-metodológico da Sociolinguística

Variacionista, utilizando-se de pesquisas bibliográficas e de campo. Com relação ao primeiro

enfoque, os construtos teóricos da Sociolinguística Variacionista foram imprescindíveis para

proceder às análises; quanto ao segundo, permitiu-nos a coleta do corpus, realizado no bairro

Jardim Boa Esperança e na região Centro urbana de Sinop, ambos lócus da presente pesquisa.

Como instrumento de coleta de dados, utilizamos a entrevista semiestruturada, que

consistiu em perguntas abertas e fechadas gravadas em áudio. Portanto seguiu-se um conjunto

de questões definidas do roteiro, no entanto, foram lançadas questões adicionais para esclarecer

os subentendidos, ou para recompor o contexto da entrevista, nos momentos em que alguns

informantes tiveram dificuldades em responder sobre o assunto da pergunta.

Para darmos início à coleta de entrevistas na pesquisa de campo, optamos,

primeiramente, em estabelecer um contato inicial por meio de uma conversa mais informal com

os informantes, marcando um horário em que os nossos entrevistados dispusessem e tivessem

tempo razoável para a entrevista, essa técnica também foi pensada para a preparação da ideia

em conceder a entrevista, visto que, muitas vezes, o informante pode ficar atônito no momento

do convite. No entanto, houve entrevistados que se dispuseram sem problema algum em

conceder a entrevista no momento do contato inicial para a escolha dos entrevistados.

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Assim, é importante mencionar que no primeiro contato com os informantes foi

esclarecido em que consistia a entrevista, e também sobre a permissão da realização da

gravação, quando asseguramos a privacidade dos dados do entrevistado, bem como a ocultação

de sua identidade. Dessa forma, deixamos claro que o objetivo de nossa pesquisa era de que se

tinha interesse pela história do bairro, bem como pelo seu modo de viver, dados sobre a

localidade, informações acerca da origem dos moradores do bairro, motivos por que vieram

para a cidade de Sinop e instalaram-se nessa localidade, sobre a cidade de Sinop e,

respectivamente, sobre outros assuntos relacionados à cidade e ao bairro; nesse contato inicial,

portanto, não evidenciamos em nenhum momento que o nosso objetivo era o estudo da língua

em uso, deixamos essa informação em segundo plano e a lançamos na sequência da entrevista.

Como propõe Labov (2008), em hipótese alguma se deve evidenciar, no primeiro

contato, que o objeto de estudo é a língua. Preocupamo-nos, também, em apresentar-nos como

estudante, procuramos, desse modo, não empregar a palavra pesquisador, para tentar não

intimidar nosso informante.

Quanto ao método adotado para as entrevistas, vale informar que se procurou atentar,

também, às características dos informantes, tais como, fatores socioeconômicos, escolaridade e

faixa etária. Para isto, elaboramos uma pré-ficha social para a entrevista, na qual, no primeiro

contato, elencávamos se o candidato para a entrevista se encaixava nos requisitos que

procurávamos, e, dessa forma, mantínhamos uma organização dos informantes que

precisávamos, de acordo com o sexo, faixa etária, escolaridade, se eram moradores da cidade

de Sinop desde o início da colonização e o tempo de moradia no lócus em que se realizava a

pesquisa. Essa organização fez-se importante, ainda, para a coleta de dados históricos da cidade

e do bairro, dados estes que foram indispensáveis para a escritura do capítulo II.

O início à ida a campo deu-se no dia 14 de fevereiro de 2015 e estendeu-se até o dia 11

de março de 2015.

3.2 Pesquisa a Campo: entrevista semiestruturada

A ida a campo possibilitou-nos constatar que realizar uma pesquisa de campo não é

tarefa simples e exige muito ‘jogo de cintura’ do pesquisador que se propõe a realizar uma

pesquisa nesse formato.

Contatar informantes para a entrevista foi um tanto difícil no início, necessitou-se de

uma conversa mais informal para explicar quais as nossas intenções e objetivos em estarmos

pesquisando sobre a comunidade/bairro. Diante desse impasse, buscamos, então, tentar resolver

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essa situação, e a saída foi contatar pessoas da localidade com maior relacionamento nesse

espaço geográfico, como, por exemplo, o representante de bairro e moradores mais antigos, os

quais foram facilitadores para contatar informantes que se enquadrassem no perfil que

precisávamos, no entanto, vale mencionar que, mesmo com a ajuda de pessoas que

intermediaram contato com informantes, esta etapa não foi tarefa fácil, pois alguns

entrevistados ficavam muito receosos quando informávamos que a entrevista se constituiria por

gravação de áudio.

Conforme reportado anteriormente, o método utilizado para a realização da pesquisa foi

o da entrevista semiestruturada, composta por perguntas definidas e abertas, que foram

fundamentais e serviram para que obtivéssemos mais informações. De acordo com Manzini

(1990/1991), esse modelo de entrevistas é estruturado em um assunto sobre o qual

confeccionamos um roteiro com perguntas principais e que foram complementadas por outras

questões relacionadas ao assunto da pergunta ou da pesquisa. Para o autor, na entrevista

semiestruturada, o pesquisador pode obter uma maior gama de informações e de forma mais

livre.

Ainda segundo Manzini,

A entrevista semiestruturada tem como característica um roteiro com

perguntas abertas e é indicada para estudar um fenômeno com uma população

específica: grupo de professores; grupo de alunos; grupo de enfermeiras, etc.

Deve existir flexibilidade na sequência da apresentação das perguntas ao

entrevistado e o entrevistador pode realizar perguntas complementares para

entender melhor o fenômeno em pauta (MANZINI, 2012, p. 156).

Destarte, primou-se pela metodologia sugerida por Labov (2008), para a realização das

entrevistas, a qual preconiza a necessidade de se construir situações de entrevista em que a fala

casual ou espontânea encontre um lugar e possa emergir durante a conversação. Esse estilo de

entrevista é um meio para tentar minimizar o “Paradoxo do observador”, que decorre,

principalmente, pela presença do gravador. Dessa forma, esse modelo induziria à

informalidade’ da fala, pois o entrevistado monitoraria menos a sua fala. Para se alcançar esse

objetivo, adotamos, portanto, o procedimento que é apresentado por Labov (2008), que consiste

no estímulo à produção de narrativas, modo que permite ‘desviar’ o monitoramento do falante-

entrevistado quando fala, pois o mantém envolvido emocionalmente no relato de uma

experiência.

Segundo este autor, essa forma metodológica tem mostrado muito resultado, pois, na

maioria das vezes, os entrevistados podem apresentar alternância no modo da fala.

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Uma das perguntas desse tipo que tem dado mais resultado é a que lida com o

“risco de vida”: “Você já viveu uma situação em que correu sério risco de

morrer?”. As narrativas produzidas em respostas a essa pergunta quase sempre

exibem uma mudança de estilo que se distancia da fala monitorada e se

aproxima do vernáculo (LABOV, 2008, p. 245).

Em relação ao que Labov propõe, podemos corroborar tais procedimentos nas nossas

entrevistas, visto que os falantes-entrevistados seguiam um estilo de fala de modo mais

monitorado e, ao serem lançadas perguntas de narrativas de experiências, notou-se uma forma

mais ‘solta’ na conversação. Recorremos, assim, também, às narrativas de experiências, como

se poderá verificar na tabela mais adiante, que mostra um panorama das perguntas aplicadas e

que envolvem as narrativas, com temáticas sobre o ‘risco de vida’, proposto por Labov (2008)

e Tarallo (2002), de relatos de infância, como brincadeiras, e sobre dificuldades enfrentadas.

Ao relatarem essas experiências, pôde-se notar em alguns entrevistados um maior

‘descuido’ na fala, no entanto, vale esclarecer que não foram todos os entrevistados que

reproduziram essa mudança, pois, como ressalva Labov (2008, p. 145), “não se pode esperar

que tais procedimentos sejam sempre bem sucedidos na obtenção de uma mudança radical de

estilo”.

Assim, sustentado pelos pressupostos teóricos da Sociolinguística, e seguindo, de forma

adaptada para esta pesquisa, o método sugerido por Labov (2008), em forma de entrevistas

dinâmicas, este estudo tem o intuito de observar, descrever e analisar a língua falada em

situações reais de uso nesses dois lócus da cidade de Sinop, MT, a partir das variações de

concordância padrão e não-padrão, observáveis entre falantes de diferentes origens geográficas

e de aspectos de natureza socioculturais, que motivam as variedades linguísticas.

3.3 Roteiro: instrumento de coleta de dados

Podemos ponderar que a coleta de dados constituiu uma das partes mais importantes

dessa pesquisa, por meio dela buscou-se informações substanciais para o desenvolvimento do

trabalho na parte prática.

Andrade (2010), por sua vez, discorre sobre a importância da coleta de dados na

pesquisa de campo e elucida alguns passos necessários para a sua execução e análise,

Para a coleta de dados deve-se elaborar um plano que especifique os pontos

de pesquisa e os critérios para a seleção dos possíveis entrevistados e dos

informantes que responderão aos questionários ou formulários. A coleta de

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dados constitui uma etapa importantíssima da pesquisa de campo, mas não

deve ser confundida com a pesquisa propriamente dita. Os dados coletados

serão posteriormente elaborados, analisados, interpretados e representados

graficamente. Depois, será feita a discussão dos resultados da pesquisa, com

base na análise e interpretação dos dados (ANDRADE, 2010, p. 37).

A metodologia adotada para as entrevistas pautou-se na observação dos sujeitos

entrevistados, como referido anteriormente, em fatores de natureza extralinguísticas, tais como

sexo, escolaridade e faixa etária. A variável social sexo refere-se aos papéis sociais entre

homem e mulher e foi observada para investigar se há distinção entre os usos da forma padrão.

O fator escolaridade (escolarizados e com pouca escolaridade) foi estabelecido para verificar

se as pessoas com maior nível de escolarização tendem a ter mais usos da concordância verbal

padrão. E o fator faixa etária foi determinado para verificar qual das duas faixas etárias (entre

15 e 25 anos e acima de 50 anos) apresentam menos as marcas de concordância padrão.

A confecção dos questionários de investigação, instrumento da coleta de dados da

pesquisa, foi fundamentada na revisão bibliográfica das obras de diversos autores da

Sociolinguística e da Metodologia Científica. Utilizamo-nos da entrevista semiestruturada,

como já supracitado, que combina perguntas fechadas e abertas, além do relato de experiência,

proposto por Tarallo (2002) e Labov (2008).

Segundo Tarallo (2002, p. 22), “os estudos de narrativa de experiência pessoal têm

demonstrado que, ao relatá-las, o informante está tão envolvido emocionalmente com o que

relata que presta o mínimo de atenção ao como”. Assim, o roteiro de perguntas para a entrevista

foi embasado em questões pertinentes ao tema e relacionadas ao bairro, como a vinda para a

cidade e/ou bairro e as dificuldades enfrentadas, após envolver os entrevistados nesta

comunicabilidade, partimos para questões mais expressivas da nossa pesquisa, relacionadas à

língua em uso, ou seja, tratamos de perguntas referentes aos preconceitos linguístico e social20.

Cabe ressaltar que esse corpus reunido serviu para o olhar reflexivo sobre os usos da

concordância padrão x não-padrão.

Ao todo, as entrevistas realizaram-se com 9 (nove) sujeitos, nessas duas comunidades

de fala, sendo um entrevistado, o representante21 de bairro, e mais 8 (oito) sujeitos, divididos

igualmente entre mulheres e homens, sendo 4 (quatro) moradores do bairro periférico e 4

20 Vale mencionar que, para introduzir as perguntas relacionadas aos preconceitos linguístico e social, realizou-se

uma breve apresentação, de forma elucidativa, sobre o tema, para situar os entrevistados e não assustá-los com as

terminologias. 21 As transcrições realizadas da entrevista com o representante de bairro não foram utilizadas para a análise

linguística, somente para dados sobre o bairro e para a análise sobre os preconceitos. É importante mencionar que

não conseguimos contatar o representante do lócus do centro, apenas do bairro Boa Esperança.

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(quatro) moradores do centro urbano. Com relação às faixas etárias, foram observadas duas

faixas distintas: 2 (dois) entrevistados entre 15 e 25 anos e 2 (dois) acima de 50 anos, de cada

grupo social, observando-se, ainda, a mesma divisão entre escolarizados e com pouca

escolaridade.

No quadro, abaixo, o leitor obterá um panorama das informações acerca da origem,

sexo, idade, escolaridade, profissão e etnia dos entrevistados nos dois bairros pesquisados.

SUJEITO22

IDADE LOCAL DE

NASCIMENTO

ESCOLARIDADE PROFISSÃO ETNIA

Boa Esperança – B

B1 F 76 anos Jaguaraçu–

MG23

4ª série Do lar NSR24

B2 F 20 anos Peixoto de

Azevedo – MT

Cursa o 2ª ano do

ensino médio

(EJA)25

Estudante Indígena e

Italiana

B3 M 62 anos Primeiro de

Maio – PR

8ª série Do lar NSR

B4 M 25 anos Guarantã do

Norte – MT

8ª série Alinhador de

Serraria

NSR

+ B5 M

*Representante

de bairro

43 anos Palmeiras do

Tocantins –

TO26

8ª série Vendedor Portuguesa

Região Central – C

C1 F 73 anos Campos Novos –

SC

4ª série Do lar Italiana

C2 F 23 anos Guaraciaba – SC Ensino superior Estudante Italiana e

Alemã

22 B – sujeito entrevistado do bairro Boa Esperança, C – sujeito entrevistado do Centro. F e M correspondem aos

sexos Feminino e Masculino, respectivamente. 23 Morou por 18 (dezoito) anos no Estado do Paraná antes de migrar para o Mato Grosso. 24 NSR= Não Soube Responder. 25 Educação de Jovens e Adultos (EJA). 26 Morou em Peixoto de Azevedo – MT antes de vir a Sinop.

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C3 M 57 anos Santa Isabel do

Ivaí – PR

3° ano do ensino

médio

Almoxarifado Alemã

C4 M 16 anos Eldorado – MS Cursa o 2° ano do

ensino médio

Garçom e

Estudante

NSR

Quadro 01: Informações dos sujeitos entrevistados.

O quadro, a seguir, elenca as questões elaboradas e aplicadas aos dois lócus da pesquisa.

As questões se dividem em 3 (três) sequências/partes.

1 Qual é o seu nome?

2 Qual a sua idade?

3 Há quanto tempo reside no bairro?

4 Qual é a cidade de origem?

5 Relate o motivo pelo qual você mudou de cidade?

Você tem vontade de voltar a morar na sua cidade natal?

6 Gosta da cidade e do bairro onde atualmente vive?

Como é a sua relação com os vizinhos?

7 Como é a segurança do bairro?

Há muita violência na rua?

8 A cidade de Sinop vem crescendo constantemente, e o que o/a Sr./Sra. acha desse

crescimento?

9 Junto com esse crescimento acelerado, os índices de violência também crescem. O que pensa

a respeito disso?

O que poderia ser feito?

10 Possui vínculo de relação com moradores de outros bairros?

Como é a relação?

O que você acha desses outros bairros?

11 Estuda ou já estudou?

Gosta ou gostava, como foi?

12 Você trabalha?

Qual é a profissão que exerce?

13 Você acha que o trabalho resulta e reflete as condições de existência social de uma

comunidade/cidade?

14 Qual é o seu estado civil? Tem filhos?

15 O/a Sr./Sra. pode relatar sobre a sua infância, como foi?

Como eram as brincadeiras?

Que brincadeiras mais gostava?

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16 Você já esteve alguma vez em uma situação em que estivesse correndo sério risco de vida,

uma situação em que tenha dito a você mesmo: “Chegou a minha hora”?

O que aconteceu?

Numa situação dessas algumas pessoas dizem: “Bom, seja o que Deus quiser!”. O que o/a

Sr./Sra. acha? (TARALLO, 2002, p. 22-23).

18 Quais foram as primeiras dificuldades que enfrentou logo que chegou à cidade e/ou ao bairro

em que reside?

19 Qual é a sua descendência?

20 O que você pensa em relação ao preconceito linguístico?

Você já sofreu alguma vez ou sofre com o preconceito linguístico?

21 Você acha que o seu modo de falar se diferencia do restante dos falantes da comunidade?

22 Você acha que existe um preconceito linguístico entre os falantes dessa mesma comunidade?

E com os falantes de outras comunidades?

23 Você acha que existe esse preconceito com falantes que são moradores de comunidades, que

se diferenciam no poder socioeconômico?

Já presenciou esse preconceito?

24 O preconceito linguístico de uma comunidade de falantes para outra, se dá, pelas formas em

que são empregadas as palavras?

25 O/A senhor(a) pode relatar um acontecimento ou fato marcante, logo que chegou à cidade

e/ou ao bairro?

Quadro 02: Questionário aplicado à todos os sujeitos entrevistados.

26 Quando vocês vieram para Sinop, era realizado algum incentivo ou promessas de

ascensão/progresso da região?

E como foi ao chegarem aqui? Quais eram as dificuldades?

Como eram as condições de moradia, saúde e de vida naquele tempo?

27 Qual era e como foi o trabalho?

28 Como foi a educação naquela época?

Quadro 03: Questionário aplicado aos falantes que moram na cidade desde o início da colonização.

30 Há quanto tempo é presidente de bairro?

Quais são as maiores dificuldades encontradas com a comunidade, enquanto presidente e/ou

representante legal dessa comunidade?

31 Como é o envolvimento da comunidade com as reuniões e propostas de projetos à

comunidade?

32 Como é a sua relação com a comunidade enquanto presidente?

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33 Neste bairro existem pessoas/migrantes de regiões diferentes do Brasil? O/A Sr.(a) acha que

eles falam o português de diferentes maneiras e/ou outras línguas?

Quadro 04: Questionário aplicado ao representante de bairro.

Os questionários ficaram divididos em três (3) partes pela necessidade da aplicação de

perguntas extras, em conformidade ao perfil dos entrevistados. Como, por exemplo, a

necessidade da realização de perguntas aos sujeitos entrevistados migrantes nas décadas de 70

a 80, e o questionário aplicado ao representante de bairro, para informações acerca do bairro,

que, como já supracitado, serviram de dados relevantes para a constituição do capítulo II, e,

também, para o corpus de análise. Assim, o questionário do quadro 2 (dois) foi aplicado aos

nove (9) sujeitos entrevistados, o do quadro 3 (três) aplicou-se aos sujeitos migrantes e o do

quadro 4 (quatro) aplicou-se ao representante de bairro do Boa Esperança. No outro bairro

investigado não foi possível saber se há algum representante do bairro, que responde pela região

central pesquisada, como é comum nos bairros da cidade. Vale mencionar que os sujeitos

contatados para a entrevista não souberam responder e/ou disseram que não havia ou que nunca

souberam de representante de bairro.

Depois de coletar os dados, passamos para a etapa das transcrições das entrevistas. As

transcrições dos dados coletados foi a atividade que mais demandou tempo, foi realizada de

forma integral e detalhada, em que se procurou transcrever da forma como as falas foram

pronunciadas, dessa forma, foram mantidas as características da pronúncia, pausas entre outras.

Um procedimento adotado para as transcrições das entrevistas foi iniciar a transcrição logo após

a coleta da entrevista, pois as impressões ou algo incompreensível no áudio gravado podiam,

assim, ser facilmente lembrados.

As entrevistas foram transcritas seguindo um modelo proposto por Marcuschi (1999).

No quadro, abaixo, serão resumidas algumas formas que foram adotadas para a transcrição,

propostas pelo autor.

Categorias Sinais Descrição Exemplos

1. Pausas e silêncios

(+)

ou

(2.5)

Para pausas pequenas

sugere-se um sinal + para

cada 0.5 segundo. Pausas

em mais de 1.5 segundo,

cronometradas, indica-se

o tempo .

...

A: /.../ por exemplo (+) a

gente tava falando em

desajuste, (+) EU

particularmente acho

tudo na vida relativo,

(1.8) TUDO TUDO

TUDO (++) tem um que

sã::o (+)/ tem pessoas

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problemáticas porque

tiveram muito amor (é o

caso) (incompreensível)

(+) outras porque /.../

2. Dúvidas ou

sobreposições

( )

Quando não se entender

parte da fala, marca-se o

local com parênteses e

usa-se a expressão

inaudível ou escreve-se o

que se supõe ter ouvido.

Ver exemplos no item 1.

3. Truncamentos

bruscos

/

Quando o falante corta a

unidade pode se marcar o

fato com uma barra.

...

L: vai tê que investi, né”

C: é/ (+) agora tem uma

possibilidade boa que é

quando ela sentiu que ia

morá lá (+) e:le o dono/

((rápido)) ela teve

conversan comi/ agora

ele já disse o seguinte

(+)

...

4. Alongamento de

vogal

:: Dependendo da duração

os dois pontos podem ser

repetidos.

...

A: co::mo” (+) e:::u

5. Repetições Própria letra Reduplicação de letra

ou sílaba.

e e e ele; ca ca cada um.

6. Indicação de

transição parcial ou

de eliminação

...

ou

/.../

O uso de reticências no

início e no final de uma

transcrição indica que se

está transcrevendo apenas

um trecho.

Reticências entre duas

barras indicam um corte

na produção de alguém.

Ver exemplos no item 1.

7. Comentários do

analista

(( ))

Para comentar algo que

ocorre, usam-se

parênteses duplos no local

da ocorrência ou

imediatamente antes do

segmento a que se refere.

((ri)), ((baixa o tom de

voz)), ((tossindo)),

((fala nervosamente)),

((apresenta-se para

falar)), ((gesticula

pedindo a palavra)).

Quadro 05: A obra da qual retiramos estas formas é intitulada “Análise da Conversação

(MARCHUSCHI, 1999, p. 10-12)”. Neste quadro, buscamos resumir somente algumas das normas de

transcrição propostas por Marchuschi, que utilizamos para a reprodução das entrevistas dos áudios

coletados.

Após elucidar os fundamentos metodológicos adotados na pesquisa, apresentamos, no

subitem concludente, as considerações analíticas sobre as comunidades estudadas.

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3.4 Considerações Sobre as Comunidades Estudadas: bairro Boa Esperança e

região Centro Urbana de Sinop

Para darmos início às considerações analíticas dos resultados obtidos dessa pesquisa,

vale-se reportar, novamente, a algumas ponderações tecidas no capítulo II, que se referem a um

apanhado histórico, social e econômico dos bairros que constituem os lócus da investigação.

Inicialmente, faz-se necessário elucidar sobre a escolha dos lócus de pesquisa, o bairro

Boa Esperança e o Centro da cidade. A escolha do bairro Boa Esperança se deve, ao fato da

localização, ou seja, por ser mais afastado e ser caracterizado como região periférica, e o outro,

por ser o Centro Urbano de Sinop. O primeiro arrabalde é caracterizado como periférico, por

ser longínquo, afastado do centro comercial e constituído por moradores de classes média baixa

e baixa. O que caracteriza o Boa Esperança é a grande carga de estigmatização que é atribuída,

que se deve ao histórico do bairro, às questões de infraestrutura vivenciadas ainda pelo bairro,

e, fundamentalmente, pela diferença socioeconômica de seus habitantes, discorrida no capítulo

II, fatores estes que influenciaram e influenciam para essa estigmatização.

Destaca-se que o objetivo mais geral dessa pesquisa foi buscar analisar, na fala dos

sujeitos entrevistados moradores do bairro Boa Esperança e do Centro Urbano, o uso de marcas

de concordância verbal padrão (presença explícita de plural no verbo) e o uso não-padrão

(ausência da marca de plural no verbo), empregados por esses distintos sujeitos sociais, bem

como procurar mostrar possíveis motivos que condicionam as variações e as razões que levam

aos preconceitos linguístico e social, que são muito fortes. Assim, mesmo não sendo de objetivo

primordial do presente estudo definir ou fazer um estudo analítico das condições e

desigualdades sociais do país e da cidade de Sinop, é de total importância e necessário discorrer

sobre o assunto, já que esta pesquisa não tem como único intento apresentar apenas uma nova

amostra do uso da concordância verbal em nossa sociedade, mas, também, discutir como os

preconceitos linguístico e social encontram-se presentes entre os usos das formas de

concordância verbal não-padrão utilizadas por sujeitos de menor status socioeconômico, de

profissão e local de moradia, configurando-se na estigmatização e exclusão.

Nessa perspectiva, citamos o que descreve Singer (1979), ao tratar da moradia em

cidades que têm expansão de crescimento, que podemos comparar com o quê vem acontecendo

em nossa cidade,

O acesso ao serviço urbano tende a privilegiar determinadas localizações em

medidas tanto maior quanto mais escassos forem os serviços em relação à

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demanda. Em muitas cidades, a rápida expansão do número de seus habitantes

leva esta escassez a nível crítico, o que exacerba a valorização das poucas

áreas bem servidas. O funcionamento do mercado imobiliário faz com que a

ocupação destas áreas seja privilégio das camadas de renda mais elevadas,

capaz de pagar um preço alto pelo direito de morar. A população mais pobre

fica relegada às zonas piores servidas e que, por isso, são mais baratas.

O elemento “prestígio” tende a segregar os mais ricos da classe média, que

pagam muitas vezes um preço extra pelo privilégio de morar em áreas

residenciais onde os “verdadeiros” ricos estão abandonando, exatamente

devido a penetração de arrivistas. Os promotores imobiliários, que conhecem

bem este mecanismo, tiram o máximo de proveito dele ao fazer “lançamentos”

em áreas cada vez mais afastadas para os que podem pagar o preço do

isolamento e ao mesmo tempo incorporar prédios de apartamentos em zonas

residenciais “prestigiosas” (SINGER, 1979, p. 27).

Esta situação é visível na cidade de Sinop, nos últimos 10 (dez) anos, com o surgimento

de condomínios fechados, localizados e afastados de serviços comerciais, totalmente cercados

de muros altos e áreas verdes e de lazer. Dessa forma, alguns terrenos e/ou imóveis que se

encontram longínquos do centro são destinados à constituição de habitações populares, como é

o caso de muitos conjuntos habitacionais construídos pelo governo e/ou prefeitura municipal,

que estão distantes do centro da cidade; como exemplificação, temos os conjuntos habitacionais

do Programa Habitacional “Minha Casa, Minha Vida”, promovidos pelo Governo Federal em

parceria com a Prefeitura de Sinop, que há poucos anos foram inaugurados, dentre eles,

podemos citar o Vila Mariana, o Vila Juliana, o Vila Lobos27, entre outros conjuntos

habitacionais. Ou então, os imóveis têm sido destinados para atender a classe mais alta, como

é o caso do Residencial Mondrian, o Aquarela Brasil Residencial, Carpe Diem Resort

Residencial28 etc., com padrões de moradia altamente elevados e planejados, com áreas verdes,

segurança, esportes e lazer. Tornando o local de alta valorização e, assim, atraindo a classe alta

da sociedade.

Desse modo, terrenos longínquos com uma melhor infraestrutura destinam-se à

construções a uma população com maior status econômico e os terrenos afastados infraestrutura

adequada são designados aos conjuntos habitacionais criados pelo governo em parceria com a

prefeitura e, geralmente, são destinados à população com menor poder econômico aquisitivo e

status social.

27 Foram entregues em 2012, 480 imóveis no Vila Mariana, 192 imóveis no Vila Juliana e 333 imóveis no Vila

Lobos. Informações disponíveis em:

http://www.amm.org.br/amm/constitucional/noticia.asp?iId=258662&iIdGrupo=6243. Acesso em 14 ago.2015. 28 Residencial Mondrian, primeiro Condomínio fechado, lançando em Sinop/Mt, em maio de 2002. Aquarela Brasil

Residencial, lançado em 2005, residencial aberto com filosofia de Condomínio fechado. Carpe Diem Resort

Residencial, lançado em 2014, maior Condomínio horizontal fechado da cidade. Informações disponíveis em:

http://www.jmdempreendimentos.com.br/Historico. Acesso em 14 ago.2015.

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Tais situações discorridas acima são favorecedoras de grande discriminação e exclusão

de pessoas aos acessos de bens sociais e culturais, visto que estimulam os preconceitos

linguístico. Sendo assim, pode-se afirmar que diferenças socioeconômicas, grau de

escolaridade, idade, etnia, entre outros fatores, influenciam nos diferentes modos de falar e na

variação da língua.

Em nosso corpus, verificamos, em todas as entrevistas realizadas com os sujeitos

moradores do Centro, que estes se referiram ao bairro Boa Esperança, como bairro de classe

baixa, e atribuíram aos seus habitantes estigmas como favelados e violentos. Nos recortes de

entrevistas, a seguir, podemos verificar essas concepções:

Tem gente que tem muito preconceito do bairro Boa Esperança. Dizem que

tem muita morte, sempre falam que lá só mora isso, mora aquilo, é uma favela

(+), tem bastante também de droga, né. [C1 F]

Eu não conheço, mas pelo o que todo mundo fala é o Boa Esperança (+), que

é o que mais passa na tevê, né. Mas eu não conheço /... / Ah (+), por exemplo,

não sei como posso dizê (1.5) saaí alguém por exemplo, lá do Boa Esperança,

pra cá ficam falando, não tem como explicá /.../. Acho, que eles têm modo

diferente de falá, uma forma mais errada digamos assim (+) devem usar gírias

(+) até a gente mesmo tem, sem querer julgá a pessoa errada, sem, sabe (+),

acredito que é mais o menos por aí. [C2 F]

/.../ mais aqui mesmo tem preconceito com moradores de classe mais baixa,

como, por exemplo, do Boa Esperança. /.../ aqui onde a gente mora é mais

setor comercial, são poucos moradores, mais com os outros bairros tem

bastante. [C3 M]

Tem bairro que é mil vezes mais perigoso que aqui /.../ Ah, o bairro Boa

Esperança, o Vila Mariana, Juliana (+) é bastante perigoso lá. Eu acho que não

iria pra lá não ((risos)). [C4 M]

É importante deixar claro que, no primeiro momento, não foram realizadas perguntas

relacionadas ao bairro Boa Esperança. Apenas quando o sujeito falava sobre bairro(s) é que

lançávamos perguntas sobre o referido bairro, lócus de nossa pesquisa, para que o entrevistado

discorresse mais sobre o espaço em análise. As questões de nosso roteiro, que nortearam os

entrevistados a referirem-se ao Boa Esperança, foram as seguintes: Possui vínculo de relação

com moradores de outros bairros? Como é a relação? O que você acha desses outros bairros?.

Assim, a partir desse segundo momento, em que citavam o Boa Esperança é que lançávamos

as perguntas sobre o que achavam e o que sabiam do bairro.

Partindo desta perspectiva, temos em nossa análise um preconceito social, ligado à

questão da desigualdade social, com pré-julgamentos sobre os moradores do bairro Boa

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Esperança, fundamentalmente, por estarem inseridos na classe baixa. Como pode ser verificado,

nos recortes de fala dos moradores do Centro Urbano, há um discurso preconceituoso em

relação ao bairro Boa Esperança.

3.4.1 Algumas Ponderações do Processo de Análise da Pesquisa na Aplicação da

Concordância Verbal

Nesta subsecção discutiremos e apresentaremos alguns processos adotados no percurso

de nossa análise. Como é de se notar, a Concordância Verbal29 é um exemplo de variável muito

presente na fala dos brasileiros, desde os menos escolarizados até os altamente escolarizados.

As variantes apresentam um mesmo valor de verdade, entretanto, com valores sociais opostos,

pois frases como (1) “/.../ porque no sítio onde nóis foi criado” [B1 F] carregam uma grande

carga de estigma, ao passo que, se reformularmos essa frase para a forma valorizada

socialmente “porque no sítio onde nós fomos criados”, a mesma não será mais estigmatizada,

ou seja, há um mesmo valor de verdade, isto é, um mesmo significado, no entanto uma frase se

encontra na forma não-padrão e a outra na forma padrão. Nesse contexto, cabe ressaltar as

reflexões de Labov (2008), quando afirma que as variantes são diversas maneiras de se dizer a

mesma coisa e com o mesmo valor de verdade, idêntico significado referencial, mas com valor

social diferente.

Como nossa análise da pesquisa debruçar-se-á nas 1° e 3° pessoas do plural, destacamos

em nossas considerações o uso do pronome pessoal do caso reto nós e da expressão nominal a

gente. Os autores Naro, Görski e Fernandes (1999) discorrem sobre esses usos, que podem

apresentar a concordância padrão e a não-padrão,

Em português padrão o sujeito de primeira pessoa do plural é nós e sua forma

verbal correspondente é feita com a flexão gramatical –mos. Um exemplo

típico é nós falamos. Entretanto, há uma alternativa para o sujeito pronominal

de primeira pessoa do plural: a gente, que deriva de um sintagma nominal com

a mesma forma e significa as pessoas. Na linguagem padrão o verbo usado

com a gente recebe desinência de terceira pessoa do singular, com terminação

zero. Um típico exemplo é a gente fala. Conquanto, o uso do pronome sujeito,

com certa frequência, não é obrigatório, e, na linguagem informal, a

desinência –mos é omitida com nós e usada com a gente, a despeito do papel

categorial e ao contrário do padrão. As formas nós falamos e a gente fala são

padrão; nós fala e a gente falamos são não-padrão (NARO et al., 1999, p. 201,

apud RUBIO, 2012, p. 103).

29 Será apresentada em alguns momentos ao longo da análise apenas com a sigla CV.

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Muitos estudos têm sido desenvolvidos sobre o assunto, em observações às pesquisas já

realizadas (BAGNO, 2004) constata-se que o uso de nós e de a gente é bastante presente na fala

do português brasileiro, este último, contudo, vem se apresentando muito mais como uma

mudança do que uma variação estável. Em análise durante a pesquisa, e de outros estudos da

língua, percebemos que as pessoas quando dizem ‘nós vai’ ou a ‘gente vamos’ são, na maioria

das vezes, corrigidas ou bastante estigmatizadas e tachadas como um falante pertencente à

classe social baixa ou, ainda, que se trata de um falante não escolarizado. Essas variantes, no

entanto, foram encontradas nas entrevistas realizadas com os sujeitos moradores dos dois lócus

da pesquisa, tanto na fala dos entrevistados que possuem o ensino fundamental quanto na dos

do ensino médio.

De modo geral, como já citado anteriormente, a CV constitui-se em uma variável

linguística composta, para fins de análise neste estudo, de duas variantes, uma que é a aplicação

da regra, ou seja, a presença de marca formal de plural, e outra que é a não-aplicação da regra,

isto é, a ausência de marca formal de plural.

Apresentamos, a seguir, a análise empírica deste estudo, pautada sobre os usos da CV,

com ênfase às 1° e 3° pessoas do plural. As variáveis observadas constituem-se, como

supracitado, pela presença de marca de plural (variante padrão) e pela ausência de marca de

plural (variante não-padrão). Para exemplificação, apresentamos, abaixo, os seguintes trechos

extraídos do corpus:

(2) Nós fomos criados na roça, até pouco tempo /.../ [B1 F]. (Variante padrão).

(3) /.../ melhorá de vida, porque lá nós era empregado /.../ [C1 F] (Variante não-padrão).

Para as formas verbais de concordância não-padrão, foram consideradas o uso de duas

formas: a morfossintática, de variação na aplicação da regra de concordância, e a

morfofonêmica30, com o apagamento do -s. A primeira refere-se aos casos em que não se

apresenta nenhuma marca de plural nos verbos, como no recorte que segue abaixo:

(4) /.../ tudo que num presta eles apronta. O dia eles passa dormindo, à noite tira pra robâ, pra

fazê mal feito. [B3 M].

30 Mudanças morfofonêmicas ocorrem quando a palavra sofre perda de um ou mais de seus constituintes

fonológicos, que podem ocorrer tanto no início, no meio ou ao final do morfema. “O morfema é a unidade mínima

da estrutura gramatical [...] Um morfema também é definido como o segmento maior que o fonema e menor que

a palavra. Ele é realizado por meio de morfes, ou alomorfes” (CASTILHO, 2010, p. 51).

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A segunda são aqueles em que se observa a presença de marcas de plural, porém com

mudanças morfofonêmicas apresentadas pela ausência das DNP (desinências número-

pessoal)31. Abaixo, segue exemplo:

(5) Nós viemo pra cá, e fomo morá junto, até mesmo porque não tinha casa ((risos)). [C1 F].

Estes fenômenos serão observados, no decorrer de nossa análise, pelo grande número

de ocorrências apresentadas nas entrevistas, vale lembrar, por sua vez, que esta é uma

característica recorrente na oralidade.

Para a continuidade da apresentação de nossos resultados, pautados nos recortes de

transcrições das entrevistas realizadas nos dois lócus de pesquisa, apresentamos, na sequência,

como se deu a distribuição geral das formas padrão e não-padrão registradas em nosso corpus.

Gráfico 1: Registro geral de concordância verbal no corpus.

No gráfico 1, acima, apresentamos a distribuição geral de todas as formas verbais padrão

e não-padrão de concordância de 1° (considerando a expressão a gente)32 e 3° pessoas do plural

levantadas nas entrevistas realizadas nas duas comunidades/bairros pesquisados. O gráfico

ilustra os primeiros resultados obtidos a partir da rodada dos 8533 dados considerados, dos quais

31 “Desinências são os elementos terminais indicativos das flexões das palavras. As desinências verbais indicam

flexões de número e pessoa e de modo e tempo dos verbos” (CEGALLA, 2008, p. 92-93). 32 Consideramos em nossa análise de corpus o uso da expressão a gente + verbo no singular, como concordância

verbal padrão. 33 Total de dados registrados de concordância verbal padrão e não-padrão no corpus.

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28 ocorrências são de concordância verbal padrão e 57 ocorrências de concordância verbal não-

padrão.

A seguir, discorreremos sobre cada uma das variantes de CV encontradas no corpus de

análise: concordância padrão e DNP padrão – mos; concordância não-padrão e DNP não-padrão

– mo; e concordância não-padrão sem marcas de plural no verbo e DNP (desinência zero).

3.4.1.1 Concordância Padrão e DNP Padrão – mos

Os recortes que seguem, abaixo, com ênfase aos destaques em negrito, tratam do uso da

concordância padrão e apresentam marca explícita do plural em seus verbos, sendo, dessa

forma, considerados como o uso de prestígio na sociedade,

(6) /.../ Elas queriam me batê, daí voltei pra Guarantã, fiquei cinco mês lá, daí voltei. [B2 F].

(7) Hoje não existe mais, eles só brincam dentro de casa e anda de bicicleta. Por que eles

brincam só dentro de casa, não dá pra deixá na rua porque é perigoso, não tem brincadeira mais

pras criança. [C1 F].

(8) Eles só foram achar porque viram os sinais escorrendo (+), bateu na bicicleta o guri voô e

só acharam um, o outro não acharam, e quando eles olharam para cima, viram o sangue

pingando e o menino pendurado lá em cima. [C3 M].

(9) /.../ elas ficaram numa situação que não tinha como ir e nem vir, ficamos isolados do resto

do mundo [C3 M].

(10) Quando nós chegamos na antiga rodoviária era escuro e como fazia pra se achá? Era lama,

barro e chuva, era seis mês de sol, seis mês de chuva. [C1 F].

(11) Nós destacamos de Guaraniaçu à Marcelândia, de Marcelândia à Nova Santa Helena,

Santa Helena à Sinop /.../ [B3 M].

(12) Daí, nós achamos melhor que fosse mudado (+) o modo de relacionamento dele com o

nosso irmão. [C2 F].

Nos recortes transcritos, acima, foi descartada a forma “nóis”, por ser característica da

fala, associada à forma não-padrão de CV. Assim, foram descartadas, para sistematização da

concordância padrão, várias transcrições da 1° pessoa que apresentavam a marca explícita de

plural, no entanto acompanhadas da forma “nóis”. Registramos, dessa forma, em nosso corpus

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6 (seis) ocorrências padrão com uso da 1° pessoa do plural nós e 4 (quatro) com o uso da 3°

pessoa do plural eles (as).

Cabe ressaltar, uma vez mais, que consideramos, para efeito de análise, em nossos

dados o uso da expressão a gente como padrão, embora nem todas as gramáticas normativas a

levem em consideração. Utilizamos, para exemplificação, apenas os casos que apresentam a

concordância no singular, pois não se pode negar que o seu uso é recorrente por pessoas

altamente escolarizadas e, assim, esse uso já é considerado por alguns estudiosos da linguagem

como uma forma padrão.

Essa escolha metodológica encontra-se em consonância com pesquisas da

Sociolinguística (AGOSTINHO 2013; ALMEIDA, 2006) que já codificam o uso da expressão

a gente como forma padrão. De acordo com Omena (1998, p. 189), “esta introdução da forma

a gente no sistema dos pronomes é mais uma modificação, dentre outras, que vem provocando

uma reestruturação no sistema, o que é comprovado pela riqueza do uso variável dessas formas

no discurso”.

É possível verificar, também, esta mesma assertiva em Agostinho (2013), quando

discorre em seu trabalho sobre a concordância verbal. A autora codifica o uso de a gente

concordando na 3° pessoa do singular como forma padrão,

Em nosso trabalho temos três variáveis. A primeira é o pronome nós e suas

respectivas concordâncias, sendo as variantes a concordância padrão -mos e

as não padrão -mo/-mu e zero. A segunda é o pronome a gente e suas

respectivas concordâncias, sendo que as variantes são a forma padrão de

concordância (na terceira pessoa do singular) e as não padrão que são -mo/-

mu e -mos; e a terceira é o SN+eu (sintagma nominal + eu) e suas respectivas

concordâncias, sendo que as variantes são a forma padrão -mos e as não

padrão -mo/-mu e zero. (AGOSTINHO, 2013, p. 99, grifos da autora).

Verificamos, ainda, em pesquisa realizada por Almeida (2006) sobre concordância

verbal, o uso de a gente como forma padrão na concordância em 3° pessoa do singular. A autora

disserta sobre a propensão e a preferência do uso desta expressão,

A tendência de aumentar a incidência do uso de a gente é um recurso utilizado

pelos falantes com a finalidade de empregarem a concordância padrão, sem a

exigência de domínio da desinência DNP4. A preferência pelo emprego do

pronome e do verbo na 3° pessoa do singular, que não implica na declinação

de desinências verbais, faz parte do processo de simplificação pelo qual passa

o sistema verbal. O aumento do uso de a gente não indica que,

necessariamente, ocorrerá a extinção do pronome nós, mas é possível que

ambos coexistam (ALMEIDA, 2006, p. 88).

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Várias pesquisas, assim, vêm evidenciando um uso considerável dessa expressão em

substituição ao pronome ‘nós’. Na sequência, apresentamos esses usos apreendidos em nosso

corpus:

(13) A gente fica assim sabendo pela TV [C2 F].

(14) Ontem, a gente estava indo lá (+), sentido a BR, aí, o motoqueiro veio contramão, quase

bate, ele nem olhando assim (+), ele andando e olhando pro lado, e a gente indo e começô a

businá /.../ [C2 F].

(15) Tem a Cida, tem o pessoal que trabalha junto, tem o Romeu (+), a gente se encontra no

final de semana [C3 M].

(16) Ah, quando a gente veio pra cá, tinha muito isso assim, falá o “r” mais puxado [C2 F].

(17) Não, porque a gente morava, quando eu cheguei aqui da primeira vez era só mato, e agora

não tem comunicação porque o povo trabalha [C1 F].

(18) Na época que cheguei aqui só tinha a escola Nilza, que a gente chamava de galinheiro

((risos)). [C1 F].

(19) Aqui (+), onde a gente mora é mais setor comercial, são poucos moradores, e não conheço,

pode até tê discriminação com alguém, mais ainda não vi, mas em outros lugares já vi bastante

[C3 M].

(20) /.../ mas a gente sabia, que quando inaugurasse aquela delegacia dali embaixo (+), ia

melhorá um pôco [B4 M].

(21) Naquele tempo, num tinha celular, num tinha televisão, a gente tinha nem rádio pra escutá

(+) a gente era assim, né (+), brincava de rodinha, de boneca, de comidinha, era desse tipo [B1

F].

(22) /.../ a gente passou muita dificuldade, mas graças a Deus, deu certo [B1 F].

(23) Porque depende (1.5), muitos casos que a gente liga e eles não vêm, porque num têm

viatura [B4 M].

(24) As brincadeiras era rodinha, a gente brincava de roda, cavalo de pau ((risos)), era tão

diferente de hoje [B1 F].

(25) Minha infância foi mais na roça, né (+), a gente achava que era sofrida, mais era gostosa

[B3 M].

(26) Desde que a gente mora aqui (1.5), quarenta e dois anos, aqui no centro mesmo [C1 F].

(27) Ah (+), era bem diferente do que agora, a gente brincava na rua, subia árvore, fazia de

tudo [C2 F].

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(28) Por exemplo, às vezes, um carioca se vier pra cá, a gente vai vê (+), já dá pra percebê que

é de fora, né [C2 F].

Os recortes elencados, acima, apresentam o uso da expressão a gente com o verbo no

singular 17 (dezessete) vezes, ou seja, foram 17 (dezessete) ocorrências registradas. Vale

considerar que, para a análise, foi descartada a forma não-padrão de a gente + verbo no plural.

Embora a Gramática Normativa ainda esteja reticente quanto a abarcar, no quadro de

pronomes pessoais, a expressão a gente, estudos sociolinguísticos34 vêm mostrando que as

alterações dentro do quadro pronominal são relevantes e necessárias.

3.4.1.2 Concordância Não-Padrão: DNP Não-Padrão – mo com Apagamento do –

s

Elencamos, abaixo, usos da concordância não-padrão, que apresentam alterações da

DNP, especificamente o enfraquecimento do – s, ao final da palavra:

(29) Então, nós viemo embora pro Paraná, (+) então lá eu morei dezoito ano, no Paraná. /.../ Aí,

em setenta e nove a gente veio pro Mato Grosso, né, daí nós moramo no sítio, daí viemo aqui

pra Sinop. /.../ Aí, nóis saímo pra cá, só ficô um filho meu lá no sítio. /.../ foi bom, daí de lá nós

viemo pra Mato Grosso, e viemo aqui pra Sinop, graças a Deus. [B1 F].

(30) Há muito tempo eu tô aqui, há muito tempo moro em Mato Grosso (2.5), no Paraná não

sei contas cidade nós já moramo. [B3 M].

(31) Oh, que agora nóis tamo pedindo é isso aí, porque... nem culpa da polícia não é::/ tem que

vim de Cuiabá essa (inaudível). [B3 M].

(32) Nós saímo de lá (+), e viemo pra cá. [B4 M].

Nos trechos acima (29), (30) e (32) o pronome nós se aproxima da forma determinada

pela GN35, no entanto, a CV subsequente apresenta-se com enfraquecimento da desinência –

mos, ou seja, exemplifica a perda do – s. No fragmento (29) a concordância não-padrão

intercala-se com a padrão, pois ocorre o uso do pronome nós, concordando o verbo, de forma

não-padrão, em viemo, moramo e saímo, demonstrando a ausência do – s, e o uso da expressão

34 BAGNO, Marcos. Gramática Pedagógica do Português Brasileiro. São Paulo: Parábola Editorial, 2011, p. 743. 35 A sigla GN significa Gramática Normativa.

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a gente, formal, realizando a concordância no singular. Já a sentença (31), além de apresentar

o enfraquecimento do – s, traz mudança morfofonêmica no início do constituinte, com a

omissão do (es)tamo(s).

Foram tecidos em nossos recortes analíticos, também, os usos da concordância não-

padrão do pronome da 1° pessoa do plural (nós) em sua forma subentendida:

(33) Ahm::, gente, conheço muito pouco, só saio no final de semana, vamo fazê um lanche, um

num sei o quê (+), e voltamo embora [C3 M].

(34) Aqui nesse bairro, graças a Deus, não tive dificuldade (1.5), agora eu tive muita

dificuldade, quando viemo. [B1 F].

(35) Eu tava chegando de São Paulo, nem desmanchei a mala, e ele falô “vamo pra Sinop”,

então vamo embora. [C3 M].

De acordo com Cegalla (2008, p. 471), “o verbo concorda com o pronome subentendido

nós em frases do tipo: todos estávamos preocupados. [=Todos nós estávamos preocupados]”.

Portanto, os verbos vamo, voltamo e viemo concordam com o pronome nós, que se encontra

subentendido da fala, e que é muito recorrente na oralidade, contudo, os verbos apresentam a

perda do – s, sinalizando a concordância não-padrão.

É importante ponderar, ainda, que o apagamento do – s ao final dos verbos da 1° pessoa

do plural é uma característica típica da oralidade de muitos brasileiros, até mesmo por pessoas

com alto nível de escolaridade. Atualmente, muitos estudos vêm sendo desenvolvidos, que

comprovam o apagamento do – s nas formas verbais.

Em relação a essa perda, apresentamos um excerto de Silva (1998), que trata sobre essa

eliminação do – s nas estruturas verbais, que estão, também, ligadas ao processo de

gramaticalização da expressão a gente,

Já é fato notório que o português brasileiro está em um processo de franca

perda da parte da flexão verbal relativa à desinência número-pessoal, devido

à renovação no quadro pronominal promovida pela entrada de você(s) e, mais

recentemente, de a gente (SILVA, 1998, p. 190).

Desse modo, a aplicação de uso da concordância pode ocorrer de várias maneiras, além

do apagamento do – s nos verbos pode ocorrer, também, a alternância da vogal temática36 / a /

36 Vogal temática é o elemento que, acrescido ao radical, forma o tema de nomes e verbos (CEGALLA, 2008, p.

93).

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para / e /. Algumas pesquisas realizadas (AGOSTINHO, 2013) apontam que essa troca pode

estar associada à forma não-padrão da DNP – mo. Exemplificamos, a seguir, trechos no qual

ocorrem essa troca da vogal temática / a / por / e /,

(36) E quando viemo pra cá, quando cheguemo em Cuiabá já não tinha mais ônibus pra vim

pra cá. Juntemo uma turma lá e loquemo um avião lá em Cuiabá. [C1 F].

(37) Esses aviãozinho (+), esses teco-tecozinho ((risos)), nós aluguemo ele, né, pra vim. Era

de Cuiabá, Várzea Grande [C1 F].

(38) Motivo que nós mudemo (1.5), melhorá de vida, porque lá nós era empregado e

continuemo empregado aqui também [C1 F].

(39) Nóis não enfrentemo dificuldade porque emprego sempre teve, tinha onde trabalhá, não

teve muita assim (+) dificuldade, foi normal [C1 F].

(40) Um fato que ficô marcado quando cheguemo aqui em Sinop (1.5), aconteceu muita coisa,

mas não consigo lembrar assim (+). A malária, eu nunca peguei, mas ele sim. Tinha muita

malária, logo que cheguemo aqui, minhas sobrinha pegaram, ele, o meu cunhado, um mo::nte

de gente [C1 F].

(41) Nós brinquemo muito (+), esconde-esconde, pega-pega, pique-latinha (+), bola queimada,

bola de gude /.../ [C1 F).

(42) Nós conquistemo pouco a pouco e foi crescendo /.../ Nós ajudemo muito pro

desenvolvimento da cidade [C1 F].

(43) Nóis enfretemo muita dificuldade nossa (+), meus filhos tudo pequeno, só meu marido

pra trabalhá [B1 F].

(44) /..../ a gente encontremo posto de/de saúde, tinha médico, né, atendimento bom que tinha

aqui nos postos de saúde. [B1 F].

(45) /.../ depois nós conquistemo a Rua Paulo Pan, o asfalto, depois nós conquistemo aqui um

prédio alocado para o postinho de saúde [B1 F].

A pesquisa realizada por Zilles & Silva (2000) revela que este fenômeno está fortemente

associado ao apagamento do /s/ final, além de estar associado ao baixo grau de escolaridade.

Em nossos dados registramos 17 (dezessete) ocorrências da vogal temática / e / em lugar de / a

/. Assim, podemos afirmar que em nosso corpus essa alternância se encontra bastante

acentuada.

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3.4.1.3 Concordância Não-Padrão e DNP (desinência zero)

Os casos que seguem, abaixo, trazem referências de pronomes no plural, porém, não

apresentam marca formal de plural nos verbos. Esses fenômenos serão definidos em nossa

análise como desinência zero, ou seja, a não aplicação da CV padrão:

(46) As casinha era de madeira, não tinha energia. Só quem era mais rico tinha de motor. Nós

só tinha luz no gás, a gente era no gás, né [C1 F].

(47) Olha (+), a parte de saúde, nós tinha um posto de saúde com um único médico. [C1 F].

(48) É porque eles acham que nós fala errado, mais se entende (+), entende. Mais eles memo

tira sarro da gente. [B3 M].

(49) Nóis brincava de bola, de/várias brincadeiras (2.5), gostava de jogá bola. [B4 M].

(50) /.../ e se eles abre o jogo, amanhã ou depois amanhece morto, quem mandô matá? [B3 M].

(51) /.../ tudo qui: era tipo de brincadeira, nóis inventava. [B3 M].

(52) Ah (+), acho que, na minha opinião, deve ter mais patrulha da polícia, porque é bem raro

eles passá por aqui, fazê uma ronda e tal [C4 M].

(53) Eles entrô, renderam a gente, com a arma na cabeça, é:: tava até com o meu irmão mais

novo comigo, foi bem tenso. [C4 M].

(54) Não era conhecido, né (+), eles desconfia, né, ficam com medo. [B4 M].

(55) /.../ eles gosta, por que, assim, mesmo não tendo um palmo pra construí algo. /.../ . [B4 M].

(56) /.../ eles tira sarro (+), acha engraçado. [B4 M].

(57) Eu entendo eles (+), eles entende eu. [B3 M].

(58) Naquele tempo era boa, né (1.5), não tinha violência, não tinha nada quando nós era

criança. [C1 F].

(59) Eu tenho uma amiga minha que dá aula no Nossa Senhora de Lourdes, às vezes ela vai

com medo dá aula e volta com medo dos alunos (1.5), eles ameaça, não pode repreendê. [C1

F].

(60) Mas foi o lugá que eles mais gostô foi daqui de Sinop. Aqui onde nóis mora é um bairro

da lente da gente mora /.../ [B1 F].

(61) /.../ mas eles pode fazê o que qué (+), você num pode matá uma paquinha no mato hoje,

vai preso, pensa que joga fora, pega aquela paquinha vão comê, fazê festa, fazê churrasco pra

eles [B3 M].

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(62) Nóis faiz esse trabalho no campo da associação, nos fundos da escola aqui (+), do bairro

Boa Esperança [B4 M].

(63) /.../ nós estudou em casa (+), e aquele tempo lá, num tinha, escola pública igual hoje em

dia tem, né, aí, meu pai pagou uma professora /.../ [B1 F].

(64) O meu irmão veio na frente, comprô sítio aqui (+), aí, a gente viemos atrás junto [C1 F].

Foram elencados todos os recortes que apresentam ausência (desinência zero) da

aplicação da regra padrão, nas 1ª e 3ª pessoas do plural. Os exemplos trazidos, acima, não

apresentam a marca explícita normativa, do plural, nos verbos e são considerados pela visão

gramaticista como “erros”, sendo, assim, usos que carregam um grande estigma, levando a

preconceitos tanto linguísticos quanto sociais.

No corpus, o uso da expressão a gente + verbo no plural, apresenta-se com 2 (duas)

ocorrências registradas nos fragmentos (64) e (44) (discorrida na subsecção anterior), com a

presença da troca da vogal temática / a / por / e /.

Na maioria dos casos, as pessoas que dizem nós fala ou a gente viemos, como nos

recortes apresentados acima, são corrigidas ou são tachadas como um falante pertencente à

classe social baixa e não escolarizada. Segundo Scherre (2005), a construção de nós + verbo no

singular e a gente + verbo no plural são usos altamente estigmatizados e inerentes às camadas

sociais desprivilegiadas.

Apresentamos, no gráfico abaixo, as distribuições das formas padrão e não-padrão de

concordância de 1° e 3° pessoas do plural, nos bairros Boa Esperança e Centro:

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Gráfico 2: Distribuição das formas padrão e não-padrão nos bairros.

Foram levantados, em nosso corpus, 10 (dez) formas padrão de uso de

concordância verbal no bairro Boa Esperança e 30 (trinta) formas não-padrão, já no Centro

foram registradas 18 (dezoito) ocorrências de concordância verbal padrão e 27 (vinte) não-

padrão.

Com este resultado, podemos verificar que não há muita diferença do uso da CV não-

padrão entre o Boa Esperança e o Centro, apresentando-se uma diferença de 3 (três) registros

de formas empregadas não-padrão. A diferença maior do uso da CV manifesta-se nos usos

padrão, com um diferencial de 8 (oito) registros entre o Boa Esperança e o Centro, assim com

maior número do uso padrão no Centro.

Discorremos, a seguir, os dados quantificados dos principais fatores sociais que

constituem nossa análise: sexo, faixa etária e escolaridade, fatores estes, como apontados pelos

pressupostos teóricos, indissociáveis e inerentes à variação linguística.

3.4.1.4 Sexo

No gráfico, abaixo, apresentamos a distribuição por sexo das formas padrão e não-

padrão nos dois bairros.

10

18

30

27

DE

RE

GIS

TR

OS

BOA ESPERANÇA CENTRO

DISTRIBUIÇÃO DAS FORMAS PADRÃO E NÃO -PADRÃO NOS BAIRROS

PADRÃO NÃO-PADRÃO

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Gráfico 3: Distribuição dos usos padrão e não-padrão por sexo nos dois bairros.

Verificamos, em nosso corpus, que o sexo feminino apresenta mais usos da forma

padrão do que o sexo masculino, com diferencial de 8 (oito) registros. No entanto,

paradoxalmente, o sexo feminino também apresenta mais usos da forma não-padrão, com 35

(trinta e cinco) ocorrências desta forma, enquanto o sexo masculino apresenta 22 (vinte e duas)

ocorrências da forma não-padrão, com a diferença de 13 (treze) registros do uso da forma não-

padrão entre os sexos.

Verificamos, também, o diferencial de registros das ocorrências padrão e não-padrão

entre os sexos nos dois bairros. Desse modo, apuramos que o sexo feminino do Centro apresenta

mais usos da forma padrão do que o sexo feminino do Boa Esperança, com 6 (seis) ocorrências

a mais da forma padrão, porém, os sujeitos do Centro também apresentam mais registros das

formas de uso não-padrão, com 7 (sete) registros a mais desta forma. Resultado que mostra a

alternância desses usos.

O sexo masculino do Boa Esperança apresenta mais usos das formas não-padrão do que

os sujeitos masculinos do Centro, apresentando a diferença de 10 (dez) ocorrências de uso a

mais daqueles da forma não-padrão.

3.4.1.5 Faixa Etária

PADRÃOBOA

ESPERANÇA

NÃO-PADRÃOBOA

ESPERANÇA

PADRÃOCENTRO

NÃO-PADRÃOCENTRO

FEMININO 6 14 12 21

MASCULINO 4 16 6 6

6

1412

21

4

16

6 6

DE

OC

OR

NC

IAS

DISTRIBUIÇÃO POR SEXO

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O gráfico, abaixo, apresenta a distribuição de registros de CV padrão e não-padrão nos

dois bairros. A faixa etária I é de 15 a 25 anos e a faixa etária II acima de 50 anos.

Gráfico 4: Distribuição das formas padrão e não-padrão nos bairros.

Como podemos verificar, nos dados acima, a faixa etária I, do bairro Boa Esperança

apresenta mais formas de uso não-padrão de CV do que formas padrão, com 3 (três) registros

de formas padrão contra 7 (sete) registros não-padrão. A faixa etária II também apresenta mais

formas de uso não-padrão, com 23 (vinte e três) registros contra 7 (sete). Dessa forma, as duas

faixas etárias do bairro Boa Esperança não apresentam acentuadas diferenças de usos das

formas padrão; ainda quanto ao uso não-padrão, a faixa II apresenta mais ocorrências desta

forma do que a faixa I, com a diferença de 16 (dezesseis) ocorrências.

No Centro, apresenta-se um número maior de uso de formas padrão na faixa I, com 6

(seis) registros contra 2 (dois) de formas não-padrão. Na faixa II, há mais registros da forma

não-padrão, com 25 (vinte e cinco) versus 12 (doze) formas padrão. Assim, a faixa II apresenta,

concomitantemente, mais registros de formas padrão e não-padrão do que a faixa I.

Com relação ao comparativo entre as faixas etárias dos dois bairros, a faixa I do Centro

apresenta mais formas padrão, com a diferença de 3 (três) ocorrências; na forma não-padrão a

diferença é de 5 (cinco) registros desta forma, com maior número de usos de formas não-padrão,

portanto, no bairro Boa Esperança. Já na faixa II, a diferença é de 5 (cinco) registros da forma

PADRÃOBOA

ESPERANÇA

NÃO-PADRÃOBOA

ESPERANÇA

PADRÃOCENTRO

NÃO-PADRÃOCENTRO

FAIXA I 3 7 6 2

FAIXA II 7 23 12 25

3

7 6

2

7

23

12

25

de

Oco

rrê

nci

asDISTRIBUIÇÃO POR FAIXA ETÁRIA

FAIXA I FAIXA II

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padrão, com maior número de usos desta forma no Centro. Nas formas não-padrão a diferença

é de apenas 2 (dois) registros, com maior número de usos desta forma, no Centro.

3.4.1.6 Escolaridade

A seguir, apresentamos a distribuição de usos das formas padrão e não-padrão por

escolaridade. Foram considerados 2 níveis de escolaridade, sendo eles, nível I, com até 8 (oito)

anos de escolaridade, e nível II, acima de 10 anos de escolaridade. Em cada nível de

escolarização, ficaram divididos 4 sujeitos.

Gráfico 5: Distribuição das formas padrão e não-padrão por escolaridade.

Como podemos verificar, nos dados do gráfico acima, o nível I (4 a 8 anos de

escolaridade), apesar de uma diferença mínima, apresenta mais formas de uso padrão de CV do

que o nível II (acima de 10 anos de escolaridade), com diferencial de 2 (dois) registros a mais

do uso da forma padrão. Porém, no uso das formas não-padrão o nível I apresenta um número

grande de diferença, com 45 (quarenta e cinco) registros a mais do uso da forma não-padrão do

que o nível II.

Nível I (4 a 8 anos) deescolaridade

Nível II (Acima de 10anos) de escolaridade

PADRÃO 15 13

NÃO-PADRÃO 51 6

15 13

51

6

DISTRIBUIÇÃO POR ESCOLARIDADE

PADRÃO NÃO-PADRÃO

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Nessa amostra, não foi possível separar os níveis de escolaridade por bairros, pois no

Boa Esperança, em nossa pesquisa, não conseguimos contatar nenhum sujeito com ensino

superior.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Concordância Verbal foi a noção operatória principal de nossa pesquisa e também de

muitas outras da área da Sociolinguística Variacionista, que mostram, conforme os resultados

apresentados, como as regras estabelecidas pela Gramática Normativa são pouco seguidas e/ou

aplicadas na língua falada no cotidiano da maioria dos brasileiros, incluindo os mais cultos e

altamente escolarizados (VIANNA, 2006). Vale ressaltar que os estudos Variacionistas se

preocupam com os usos da língua falada sem estigmatizá-los, visto que variáveis/variantes são

consideradas como “erros” apenas pelos gramaticistas. Dessa forma, a Sociolinguística tem o

propósito de ‘quebrar’ a visão apenas normativa do (in)uso da língua e mostrar o uso real,

cientificamente comprovado, de falantes no dia a dia, como é o caso desta pesquisa, que teve o

objetivo maior de mostrar como a concordância verbal se apresenta, de fato, na fala dos sujeitos

entrevistados, mesmo entre os mais escolarizados e moradores do bairro central.

Ao apresentarmos os usos da concordância verbal a partir de duas visões, da Gramática

e da Sociolinguística Variacionista, tivemos como pretensão mostrar que a abordagem

gramaticista da concordância verbal, que assume apenas uma forma da língua como a única

“certa” e, assim, descarta as demais variações como “erradas’”, está muito distante da realidade

linguística em uso no Brasil. Para a Gramática Normativa, o processo de concordância verbal

se dá quando todas as marcas do sujeito pronominal concordam com as do verbo. Com a

pesquisa, pudemos concluir que o uso da CV encontra-se em um constante estado de variação,

indo contra ao que geralmente é prescrito pelas regras normativas.

Podemos afirmar, assim, a partir dos resultados obtidos, que as regras de uso aqui

localizadas encontram-se em pleno processo de variação, ou seja, a aplicação da CV padrão ora

se aplica, ora deixa de se aplicar. A aplicação das concordâncias padrão e não-padrão ocorre

em ambos os grupos/bairros pesquisados, os com maior e menor graus de escolarização e

classes mais e menos favorecidas socioeconomicamente.

Sustentados pelo referencial teórico da Sociolinguística laboviana, estudos da gramática

e pesquisas relacionadas à CV e outras áreas afins, buscamos descrever e analisar nesta pesquisa

o fenômeno da variação da concordância verbal de 1° e 3° pessoas do plural, na fala de 8 (oito)

sujeitos de dois bairros/comunidades da cidade de Sinop, MT, que apresentam diferenças

socioeconômicas e culturais, o Boa Esperança e o Centro Urbano da cidade, bem como enfatizar

os preconceitos linguístico e social que estão entrelaçados.

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Apuramos em nosso corpus que o uso da concordância verbal não-padrão predomina

nos dados. Apesar da Gramática Normativa tradicional não considerar o uso da expressão a

gente, como parte do quadro pronominal, por ser muito recorrente na fala em nossos dados e

amparado por outras pesquisas da área, incluímos esta forma em nossos dados como padrão.

Como podemos verificar, já é grande o número de pesquisas (OMENA, 2003; VIANNA, 2006;

BAGNO, 2011) que mostram que o fenômeno da variação entre nós e a gente indica uma

mudança linguística em percurso, na qual, essa forma inovadora vem gradualmente ocupando

o lugar da forma nós.

Podemos ainda verificar, esse processo de percurso de a gente em concorrência com

nós, na assertiva de Callou & Lopes,

Aparentemente, a substituição de nós por a gente se está efetivando

progressivamente, seja entre os falantes cultos, seja entre os não-cultos. Na

amostra NURC relativa aos anos 70, o uso da forma mais antiga nós

suplantava a forma inovadora, mas a nova amostra referente a década de 90,

com informantes diferentes, sugere, ao contrário, um uso mais frequente da

forma inovadora, indicando uma aceleração rápida na implantação da

substituição de nós por a gente na comunidade (CALLOU & LOPES, 2003,

p. 73, apud VIANNA, 2006, p. 9, grifos da autora).

De tal modo, averiguamos em nosso corpus que, apesar da inserção do a gente na forma

padrão, há predomínio do índice de concordância não-padrão, sendo a maior parte da

concordância padrão registrada pelo uso de a gente.

Em síntese, os dados analisados nesta pesquisa indicaram que os sujeitos moradores do

bairro Centro Urbano apresentaram maior número de realização da concordância verbal padrão

do que os sujeitos do Boa Esperança, o que vem confirmar a nossa hipótese inicial. Podemos

justificar tal resultado, pela circunstância geográfica do bairro Boa Esperança, ou seja, por ser

localizado mais afastado do centro da cidade e se caracterizar como bairro periférico e com

baixo índice de escolarização, assim, esses falantes, possuem menor contato com as formas

padrão, geralmente disseminadas pela escola, trabalho entre outras circunstâncias. Já os falantes

do Centro Urbano, diferentemente do outro bairro, por morarem numa posição mais central da

cidade, estão mais expostos ao uso de formas padrão da língua, seja pela escola, trabalho e

grupo social em que estão inseridos.

Durante a pesquisa a campo, em observações realizadas e no intento da busca por

sujeitos com grau de escolaridade de ensino superior, constatamos que o nível de escolaridade

dos adultos da comunidade Boa Esperança é baixo, na qual existem muitos moradores que

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frequentaram pouco a escola. Dessa forma, não foi possível contatar nenhum sujeito para a

gravação da entrevista com nível superior de ensino, visto que no outro lócus da pesquisa, no

Centro, foi entrevistado 1 (um) sujeito com ensino superior.

Vale lembrar que, quanto ao nível de escolaridade, optou-se em escolher sujeitos

entrevistados com no mínimo 4 (quatro) anos de escolaridade. Essa opção justificou-se pela

dificuldade em encontrar sujeitos da faixa etária acima de 50 (cinquenta) anos com escolaridade

maior do que a 4° série no bairro Boa Esperança.

Verificamos que grande parte dos sujeitos entrevistados no Boa Esperança não possui

percepção da estigmatização sobre os usos das formas não-padrão. Podemos confirmar essa

constatação com a assertiva de Bortoni-Ricardo (1981), que discorre sobre o uso das formas

não-padrão, por pessoas com menor grau de instrução,

O indivíduo de pouca cultura formal possivelmente só chegará a ter

consciência do caráter estigmatizado da concordância não-padrão depois de

um período de escolarização e de convívio com o dialeto de classe média

urbana. A duração deste período não é possível de se precisar, sem que se

proceda a estudos experimentais. Podemos, porém, prever que esse indivíduo

adotará a certa altura de sua formação escolar supletiva as normas de avaliação

da classe mais alta, mas tenderá sempre a usar a regra de concordância padrão

com menos frequência, posto que ele a assimilou tardiamente. (BORTONI-

RICARDO, 1981, p. 94).

No entanto, os sujeitos do Boa Esperança sabem do profundo preconceito social que

sofrem pelos moradores do Centro, pois é uma situação que enfrentam em seu cotidiano, não

só por moradores do Centro, como também por moradores de outros bairros que gozam de

maior prestígio. Segundo os entrevistados, a maior dificuldade ainda enfrentada é para

conseguir emprego, por residirem em comunidade considerada periférica e palco de muitos

problemas sociais, como tráfico de drogas e homicídios.

Ao passo que os sujeitos entrevistados do Centro, têm a consciência dos usos não-padrão

e que esses usos são formas estigmatizadas. Bem como, são portadores de um julgamento

preconcebido de que moradores dos bairros de menores condições socioeconômicas tendem a

empregar usos menos formais, por não terem o conhecimento de usos de maior prestígio e

acesso ao ensino superior.

Constatamos, em nossa investigação, que o preconceito mais presente é o preconceito

social, dos sujeitos entrevistados do Centro aos moradores do Boa Esperança, visto que

pudemos apreender nos relatos de todos os sujeitos moradores entrevistados do Centro uma

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grande carga de preconceito pelo bairro Boa Esperança. Podemos corroborar tal situação com

a assertiva de Monteiro (2000, p. 78), “não resta nenhuma dúvida de que a linguagem reflete

não apenas o local de origem do indivíduo, mas também o local onde ele mora e trabalha”.

Em relação às variáveis sociais analisadas, constatamos que a variável sexo demonstrou

que as mulheres, ao mesmo tempo, empregam mais usos das formas padrão do que o sexo

masculino, como também apresentam maior número de formas não-padrão. E os sujeitos do

Centro, tanto o sexo masculino quanto o feminino, apresentam mais usos da forma padrão do

que os sujeitos do sexo masculino e feminino do Boa Esperança. Na variável faixa etária, os

resultados demonstraram que os falantes mais velhos dos dois bairros estudados, os da faixa II,

tendem a realizar mais concordâncias padrão e não-padrão, do que os mais novos, os da faixa

II. Em comparativo entre os dois bairros e as duas faixas etárias, os sujeitos do Centro

apresentam mais usos de concordância verbal padrão do que os sujeitos do Boa Esperança.

Quanto à variável escolaridade, como já reportado anteriormente, não foi possível fazer

uma divisão igual entre os dois bairros devido ao fator menor escolaridade dos moradores do

Boa Esperança. Conquanto, os resultados apontaram maior número de concordância padrão aos

sujeitos do nível I (de 4 a 8 anos) de escolaridade do que no nível II (acima de 10 anos) de

escolaridade. Quanto ao uso das formas não-padrão, os sujeitos do nível I, também, apresentam

mais usos destas formas do que os sujeitos do nível II. Vale destacar, ainda, que a análise desses

três fatores sociais, sexo, idade e escolaridade, foram indispensáveis para os resultados de nossa

investigação, resultados já evidenciados, também, por inúmeras pesquisas da língua.

De maneira geral, com estes resultados apreendidos em nossos dados, certificamo-nos

que, apesar da variação na CV estar presente nos dois estratos sociais investigados, no Boa

Esperança e no Centro Urbano, a frequência de uso das formas não-padrão é maior por

moradores de menor poder aquisitivo e de menor escolaridade, ou seja, os do bairro Boa

Esperança, esses sujeitos, por essas razões, são por vezes discriminados e estigmatizados,

fundamentalmente, pela proveniência do local de moradia, nível de escolaridade, profissão e

status social em que o falante se encontra inserido, configurando o que se conhece como

preconceito social.

Concluímos esta pesquisa na certeza de que há muito o que se investigar em relação à

concordância verbal, e que pode contribuir grandemente para a redução dos preconceitos

linguísticos e sociais muito arraigados em nossa sociedade.

Acreditamos, assim, que esta pesquisa sobre a variação na concordância verbal em duas

comunidades de fala pode contribuir para uma melhor compreensão acerca da realidade

linguística na cidade de Sinop/MT.

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ANEXO A: Pré-ficha social

FICHA SOCIAL

Seleção Pré-ficha para entrevista.

Individuo:

Sexo:

( ) M ( ) F

Faixa etária

( ) 15 a 25 anos ( ) acima de 50 anos

Grau de instrução

( ) ensino fundamental ( ) ensino médio ( ) ensino superior

Serve?

( ) sim ( ) não

Pergunta-se se ele tem vontade de responder ao questionário social.

( ) não tem ( ) sim

Dia e hora da entrevista:

Endereço: