limites ao desenvolvimento: a questão da desigualdade · a europa e os eua crescem a 3 e ... da...
TRANSCRIPT
Desenvolvimento socioeconômico: teoria e aplicações
Valéria Pero
Limites ao desenvolvimento: a
questão da desigualdade
Capital in the 21st Century (Tomas Piketty); The top 1 percent in international and historial perspective (Alvaredo, Atkinson, Piketty e Saez); The spirit level (Wilkinson e Pickett); Os limintes do possível (Lara Resende)
Altas taxas de crescimento?
Até o início do século XVIII, praticamente não houve
crescimento.
Após: crescimento modesto tanto demográfico quanto da
renda. População mundial: cresce a taxas em torno de
0,4% ao ano e a renda um pouco mais, aumentando a
renda per capita.
Século XIX, a partir da Revolução Industrial: forte
crescimento. O crescimento demográfico sobe para 0,6%
ao ano e a economia para 1,5% ao ano, com a renda per
capita crescendo quase 1% ao ano.
Altas taxas de crescimento?
Sim, no século XX!
Taxas de crescimento demográfico de 1,4% ao ano e da
renda mundial de 3%. A renda per capita cresce a 1,6% ao
ano entre 1913 e 2012.
Apogeu nas três décadas que se seguiram ao fim da Segunda
Guerra Mundial.
A Europa e os EUA crescem a 3 e 4% ao ano. O crescimento
transformou o mundo.
A população mundial passou de menos de 500 milhões, para
mais de 7 bilhões de pessoas, num espaço de três séculos.
Altas taxas de crescimento?
Início de século XXI: taxas de crescimento econômico
inferiores a 2% ao ano são consideradas inaceitavelmente
baixas.
Parece questão de perspectiva: 1% por um ano pode parecer
pouco, mas se mantido por um longo tempo, é muito.
Efeito do processo de crescimento exponencial, das taxas
cumulativas compostas, durante um longo período de tempo.
O crescimento 1% ao ano, se mantido por 30 anos, o espaço
de uma geração, mais do que dobra a renda dos filhos em
relação a de seus pais.
Baixas taxas de crescimento populacional
Taxa de crescimento demográfico mundial de 0,8% ao
ano, dos últimos três séculos, é suficiente para mais do
que dobrar o número de pessoas no planeta a cada 100
anos.
O crescimento demográfico mundial dos últimos três
séculos já deu início a uma reversão.
A população mundial cresce hoje a taxas muito inferiores
Previsões de que a taxa deve voltar a se estabilizar, ou
até mesmo decrescer, a partir de algum momento da
segunda metade do século XXI.
Sem crescimento demográfico, renda vai
parar de crescer?
Parte do crescimento da renda é decorrente do crescimento
demográfico e seria esperado que, com a população estabilizada, o
aumento da renda ficasse limitado à renda per capita.
Esperado que a renda passe a patamares mais próximos de 2% do
que dos 4% ao ano observados no auge do século XX.
O crescimento da renda per capita dos países avançados já foi bem
menor nas duas últimas décadas. Os fatos apontam nesse caminho:
a Europa cresceu 1,6%, os Estados Unidos 1,4% e o Japão apenas
0,7%, ao ano, desde 1990 até hoje.
Na medida em que a população se estabiliza e é atingida a fronteira
tecnológica, o crescimento da renda e da produção vai precisar de
avanços da tecnologia.
Sem crescimento demográfico, renda vai
parar de crescer?
Modelo de Solow-Swan: até que se tenha atingido a fronteira
tecnológica, o crescimento depende da taxa de poupança e de
investimento. Mais poupa e investe, mais se cresce.
Porém, chegando a relação capital/produto de equilíbrio de longo
prazo, o crescimento passa a depender apenas do progresso
tecnológico.
Modelo original: crescimento atribuído ao progresso tecnológico é
estimado por resíduo, pela parcela do crescimento que não advém
nem do capital, nem do trabalho.
Estudos posteriores: fatores explicativos do progresso tecnológico,
como a educação - que aumenta o capital humano - e a pesquisa,
que permite a descoberta de novas tecnologias.
Como medir diante das mudanças no
desenvolvimento?
Medição do Produto Interno Bruto é recente: os conceitos e as
estatísticas das Contas Nacionais foram criados no final do anos 30
O conceito de PIB é uma abstração, que procura somar o valor de
tudo o que é produzido e todo serviço prestado comercialmente no
país.
Índice da atividade econômica num determinado período, concebido
para medir a produção de bens agrícolas e industriais
Porém, agricultura e a indústria perderam espaço para os serviços.
O dinamismo maior da economia nos serviços, não está mais na
produção, mas sim na concepção.
Como medir diante das mudanças no
desenvolvimento?
Produzir bens é cada dia mais fácil e mais barato.
Contrapartida: aumentam os preços e a importância dos
serviços, especialmente daqueles onde a tecnologia
ainda não pode substituir o homem
Nesse caso ficam mais evidentes as deficiências
metodológicas do conceito de PIB
Mais difícil calcular valor dos serviços prestados...
Um reflexo de que caminhamos para
um problema de escassez relativa
A correlação entre PIB e bem-estar podia fazer sentido
no processo de industrialização.
Esta correlação deixa de ser válida a partir de um nível
de renda e outros fatores passam então a ser tão ou
mais relevantes do que o crescimento da renda.
A correlação perde força à medida que a renda cresce e
a escassez absoluta se reduz.
Aumenta importância da escassez relativa, da
desigualdade!
A questão da desigualdade
O debate sobre a desigualdade de renda e seus efeitos
sobre a oportunidade, a mobilidade social e renda
ganhou considerável impulso, em parte por causa da
grande recessão e em parte por causa da disponibilidade
de dados de longo prazo, os dados de renda para o 1%
mais rico registros administrativos/fiscais nas nações
mais ricas.
Obra do Piketty
Artigo de Alvaredo & Atinkinson & Piketty & Saez:
4 principais fatores para aumento do 1% mais ricos
1. Crescimento da desigualdade herdada
Quando a taxa de retorno do capital for
consistentemente maior que a taxa de crescimento
econômico, é inevitável que a herança (fortuna
acumulada no passado) predomine sobre a
poupança (riqueza acumulada no presente)
Lógica: r > g vai gerar um aumento da importância
da desigualdade gerada no passado, desigualdade
herdada
1. Crescimento da desigualdade herdada
Fator determinante para capacidade de transmitir
riqueza:
diferença entre a "taxa interna de acumulação" (taxa de
poupança * taxa de retorno líquido de impostos) e a taxa
de crescimento da economia.
Tributação das transferências de renda e de riqueza
pode influenciar na participação dos muito ricos,
contribuindo para a trajetória de queda da
participação do top income.
Paralelamente ocorreria o crescimento da "riqueza
popular" dos 99 por cento.
1. Crescimento da desigualdade herdada
No entanto, recentemente, a relação entre a taxa
interna de acumulação dos mais ricos e a taxa de
crescimento do capital foi revertida como resultado
dos cortes na tributação do capital e da queda da
taxa de crescimento econômico
Alguns países estão vivendo um retorno da herança
como um fator importante
2. Condução da política fiscal
Mudança na política fiscal: imposto sobre renda dos
mais ricos tem se movido na direção oposta a de
medidas sobre rendimentos antes dos impostos.
EUA reduziu 47 pontos percentuais imposto sobre o
rendimento alto e teve um aumento de 10 pontos
percentuais do 1% mais rico na distribuição de renda.
Alemanha, Espanha, Suíça, que não tiveram corte na
tributação, não mostraram aumento na participação dos
1% mais ricos na riqueza
Evolução dos impostos sobre alta renda está
correlacionada negativamente com as mudanças na
concentração de renda antes dos impostos.
3. Mudança no poder de barganha e na
determinação da remuneração
Visão mais completa do mercado de trabalho, em
que modelo de oferta de trabalho padrão é
contrastado com a possibilidade alternativa de que
pode ter havido mudanças no poder de barganha e
uma maior individualização na determinação da
remuneração.
Diminuição dos impostos sobre renda dos mais ricos
ter levado ao desvio das energias gerenciais para
aumentar a sua remuneração às custas do
crescimento das empresas e do emprego.
4. Relação entre rendimentos do
trabalho e do capital
Por fim, um fator ainda pouco estudado é a
correlação entre os rendimentos do trabalho e os
rendimentos do capital, que tornaram-se mais
intimamente associado nos Estados Unidos.
Distribuição conjunta capital e trabalho
Três conclusões:
distribuição conjunta é assimétrica. Em 2000, dos que
estão no topo de 1% dos rendimentos do capital, 61%
estavam no top 20% dos rendimentos do trabalho. No
entanto, dos que estão no topo de 1% dos rendimentos
do trabalho, uma maior proporção de 80% estavam no
top 20% dos rendimentos do capital.
grau de associação parece forte.
os números para 1980 são menores do que em 2000:
aumentou o grau de associação ao longo do tempo
Distribuição conjunta capital e trabalho
Por que mudou?
Hoje, um diretor executivo pode ser tanto mais bem
pago e mais capaz de acumular riqueza.
Na outra direção, há o efeito da grande riqueza da
família no salário. No passado, a ligação pode ter
sido negativa, ao passo que hoje pode ser
socialmente inaceitável viver puramente de renda.
Conexões entre riqueza / familiares podem fornecer
acesso a emprego de alta renda.
Razões para o aumento do interesse na
questão distributiva
1. Muitos países atingiram níveis de desigualdade só
visto na pré-Segunda Guerra Mundial período,
aumentando as preocupações sobre crescimento
econômico inclusivo e equitativo, bem como sobre
a eficácia e o futuro das políticas sociais.
2. Concentração crescente da renda e da riqueza nas
mãos de poucos coloca sérios desafios para os
fundamentos que garantem o bom funcionamento
das democracias, na medida em que poder
econômico gera poder e influencia política
Razões para aumento do interesse na
questão distributiva
3. Apesar da magnitude da recente crise, problemas
distributivos estão longe de estar no centro do
debate político. Na verdade, as respostas com
políticas de austeridade para limitar intervenção do
governo e a redistribuição, pode exacerbar em vez
de reduzir a concentração de renda
Medida de desigualdade de renda
Duas questões principais: a dimensão do bem-estar
sob investigação e o indicador de desigualdade
(incluindo o fonte dos dados).
Concentrar na renda familiar derivada do mercado
(MI) e não sobre riqueza, consumo ou outras
dimensões
Focamos rendimento disponível das famílias (DHI –
mercado= lucro líquido de impostos diretos e de
contribuições para segurança social, incluindo
transferências de renda do setor público)
Indicador usado é o indice de Gini
Limites da desigualdade ao desenvolvimento
Meritocracia x Herança:
Mobilidade intergerancional de renda e a questão da
igualdade de oportunidades
Mobilidade intergeracional de renda é menor em
países com alta desigualdade - como Itália, EUA e
Inglaterra - e maior nos países nórdicos, onde a
distribuição da renda é mais uniforme
Questão: o aumento da desigualdade de renda pode
limitar a mobilidade econômica das futuras gerações
de jovens adultos?
Mobilidade intergeracional
Na linha introduzida por Becker e Tomes [1979],Becker e
Tomes [1986], diversos autores têm analisado mobilidade
intergeracional a partir da elasticidade entre as rendas de
pais e de filhos, onde valores mais elevados expressam
uma sociedade com menor mobilidade.
Formalmente, o modelo econométrico a ser estimado pode
ser descrito como
ysi = a+ byfi + ei , (1)
onde Cov(e, yf)=0, e yfi é o logaritmo da renda permanente
do pai da família i e ysi o análogo para o filho.
Mobilidade intergeracional
Quanto maior o valor de b, maior a chance de conhecendo
a posição do pai na distribuição da renda saber a posição
esperada do filho
Quanto menor elasticidade renda intergeracional, a renda
relativa dos pais será um fraco preditor da renda das
próximas gerações
Resultados – comparação internacional
De uma maneira geral, a evidência reunida na Tabela parece apontar para uma associação positiva entre os dois tipos de desigualdades: os países nórdicos são os que apresentam maior grau de
mobilidade,
seguidos de países da Europa central e dos EUA,
enquanto os países em desenvolvimento - em especial os da América Latina - são os que possuem os menores graus de mobilidade.
As exceções ficam por conta do Canadá e da Alemanha, que apresentam alto grau de mobilidade e de desigualdade.
País β Gini a
Equador b
1.13 0.437
Peru b
0.67 0.498
Brasil 0.66 0.589
Chile b
0.55 0.571
Malásia b
0.54 0.492
Inglaterra 0.5 0.36
Itália 0.47 -
EUA 0.47 0.408
Paquistão b
0.46 0.33
Africa do Sul b
0.44 0.578
Nepal b
0.43 0.367
França 0.39 0.327
Portugal 0.38 -
Bélgica 0.37 -
Espanha 0.34 -
Alemanha 0.32 0.283
Grécia 0.32 0.36
Singapura b
0.28 0.425
Suécia 0.26 0.25
Canadá 0.19 0.331
Noruega 0.18 0.258
Finlândia 0.18 0.269
Austrália 0.15 -
Dinamarca 0.14 0.247
Estimativas da Persistência de Status
Três problemas são encontrados ao se tentar estimar a
equação (1):
Um primeiro problema, originalmente notado por
Friedman [1957], vem do fato de que o pesquisador com
posse de dados em cross-section observa apenas
proxies de yf contaminadas tanto por flutuações
transitórias de renda como por erros aleatórios de
medida. Conseqüentemente, há um viés atenuador, o
que significa que para valores positivos de b espera-se
um viés negativo nas estimativas de MQO.
Estimativas da Persistência de Status
A solução clássica para o problema de erros-nas-variáveis é o uso
de variáveis instrumentais (VI), e aqui encontra-se o segundo
problema com (1).
A dificuldade em se encontrar um instrumento não-correlacionado
com ys introduz vieses no estimador de VI. Solon [1992] e
Zimmerman [1992] mostram que para um instrumento I, correlações
positivas entre ys e I e entre yf e I garantem que o viés em seja
positivo.
Por isso, Solon utiliza a educação do pai como instrumento,
propondo assim o uso dos estimadores de MQO e de VI para que se
obtenham, respectivamente, limites inferiores e superiores de b.
Alternativamente, Solon (1992) e Zimmerman (1992) sugeriram o
uso da média de várias observações de yfi ao longo do tempo, caso
o pesquisador disponha de tais dados. Apesar de não eliminar
totalmente o viés decorrente de erros-nas-variáveis, este
procedimento possui a vantagem de não basear-se nas hipóteses
necessárias para a validade de variáveis instrumentais.
Estimativas da Persistência de Status
No entanto - e aqui se encontra o terceiro problema -, os
estimadores de MQO e de VI requerem dados longitudinais com
uma janela longa o suficiente para que se observem pais e filhos em
estágios comparáveis dos seus ciclos de vida. Dados deste tipo são
obtidos apenas a custos muito altos, o que torna a sua
disponibilidade rara. De fato, para a maioria dos países, inclusive o
Brasil, tais dados são inexistentes.
Mobilidade intergeracional e
desigualdade de oportunidades
A elasticidade renda intergeracional pode ser considerada uma
medida que sintetiza o grau em que a desigualdade é transmitida
entre gerações
Mas não significa necessariamente uma medida de desigualdade de
oportunidade
Roemer (2004, 2012): distinguir entre diferenças nas circunstâncias
– em que os indivíduos devem ser de alguma maneira compensados
– e escolhas pessoais, que será responsável pelas consequencias.
Circunstancias: escolaridade da mãe e do pai, raça, região de nascimento,
ocupação do pai, entre outros
Estudos empíricos mostram que indices de desigualdade de oportunidades
estão altamente correlacionados com indicadores de mobilidade
intergeracional, tanto de renda quanto educacional
Mobilidade intergeracional e
desigualdade de oportunidades
Desenvolvimento da criança para desempenho social e
no mercado de trabalho dos adultos através de um
processo recursivo
Status socioeconomico influencia a saúde e aptidões das
crianças nos primeiros anos, que por sua vez influencia a
desenvolvimento cognitivo e social, e prepração para leitura
Esses resultados e o sucesso da influencia da familia na
educação básica, que nutre o sucesso no ensino medio e
universitario.
Recursos e conexões familiares afetam acesso aos bens
escolares e empregos, e o grau de desigualdade no mercado
de trabalho determinam tanto os recursos dos pais quanto o
retorno a escolaridade dos filhos
Esse processo inteiro forma os salarios na fase adulta
Mobilidade intergeracional e
desigualdade de oportunidades
Razões para diferenças nas elasticidades de renda
intergeracionais entre os países tem a ver com o balanço
da influencia da
Da familia
Do mercado de trabalho
Da política pública
Na determinação das oportunidades de vida das
crianças
Mobilidade intergeracional e
desigualdade de oportunidades
Papel do retorno à escolaridade
Quanto maior retorno maior desigualdade no mercado de
trabalho e menos mobilidade geracional
Crescimento do retorno salarial com ensino superior foi
acompanhado de um aumento da elasticidade renda
intergeracional
Renda dos trabalhadores no topo da distribuição salarial tem
se tornado mais desigual depois dos anos 70 nos EUA (BR?)
Políticas progressivas para os menos favorecidos, mais
recursos para ensino fundamental e médio e menos para
ensino superior