lições das coisas - agnaldo farias

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1 LIÇÕES DAS COISAS Revista da pós-graduação na FAUUSP. Prof. Dr. Agnaldo Farias Que coisas? Pois são os objetos, essa gama infinitamente variada de coisas cotidianas, artesanais e industriais, minúsculos e monumentais, íntimos e públicos, materiais e imateriais produzidas pelo homem para o seu conforto e que especialmente depois da era industrial, ainda mais impulsionada após a invenção do design, passaram a proliferar numa velocidade espantosa, a ponto de Baudrillard no seu estudo referencial sobre o assunto, começar perguntando se seria possível classificar “a imensa vegetação dos objetos como uma flora ou uma fauna, com suas espécies tropicais, glaciais, suas mutações bruscas, suas espécies em vias de desaparição?” (1) As metáforas escolhidas por Baudrillard são procedentes. Basta que nos detenhamos numa simples cadeira, colher ou lustre, não é preciso e nem convém ir muito longe, para que verifiquemos o número virtualmente infinito de versões conhecidas desses objetos. E o fato de que o componente funcional de na maioria eles mantenha-se teimosamente o mesmo, só serve para aumentar o mistério da perpétua variação de suas aparências. “Flora ou fauna” são designações coerentes pois há algo de orgânico no modo como um faqueiro assemelha-se a ramificação arbórea de facas, colheres e garfos ou em como a televisão assemelha-se ao tronco de uma família que se espraia em aparelhos de dvd, projetores e monitores, de microtelas dos aparelhos celulares aos símiles domésticos de telas cinemascope com os quais os consumidores mais ávidos de ilusões, e devidamente abonados, pretendem romper as torpes limitações de uma das paredes da casa em que mora. E como não lembrar a primeira e essencial lição trazida dentro do mais banal dos objetos, qual seja o fato de que todos eles possuem algo de nosso, como uma criatura que leva adiante os traços de seu criador? Tal pai tal filho. Tal homem tal objeto. Os objetos, deles disse Barthes, são a nossa assinatura no mundo, alertando ainda que “não devemos nos esquecer que um objeto é o melhor mensageiro de um mundo que está por cima da natureza.” (2) E quanto a isso nem será preciso avançar pela demonstração de cada objeto é a simultânea negação da natureza mais trabalho humano objetivado. Basta lembrar que todos eles possuem a nossa medida, mais não fosse são ergonômicos. E é por isso que freqüentemente são antropomórficos, quando não nos passam a vívida sensação de serem animados. Quem, durante as indefectíveis madrugadas insones da infância, ao menos uma vez não se quedou paralisado na cama com a certeza de que o paletó encabidado numa cadeira era o vulto de um homem? E que tal o relógio de pulso, que Julio Cortázar define como um “pedaço frágil e precário de você mesmo, algo que lhe pertence mas não é seu corpo, que deve ser atado a seu corpo com sua correia como um bracinho desesperado pendurado a seu pulso?(3) Há também as referências zoomórficas exploradas pelos designers de hoje em dia, cujo um dos melhores exemplos é o espremedor de limão “aracnídeo” que Philippe Starck projetou para a Alessi no princípio da década de 90, e que foram brilhantemente antecipadas por Hanna e Barbera, autores do memorável

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LIÇÕES DAS COISAS

Revista da pós-graduação na FAUUSP.

Prof. Dr. Agnaldo Farias

Que coisas? Pois são os objetos, essa gama infinitamente variada de coisas

cotidianas, artesanais e industriais, minúsculos e monumentais, íntimos e públicos,

materiais e imateriais produzidas pelo homem para o seu conforto e que

especialmente depois da era industrial, ainda mais impulsionada após a invenção

do design, passaram a proliferar numa velocidade espantosa, a ponto de

Baudrillard no seu estudo referencial sobre o assunto, começar perguntando se seria

possível classificar “a imensa vegetação dos objetos como uma flora ou uma fauna,

com suas espécies tropicais, glaciais, suas mutações bruscas, suas espécies em vias

de desaparição?” (1) As metáforas escolhidas por Baudrillard são procedentes.

Basta que nos detenhamos numa simples cadeira, colher ou lustre, não é preciso e

nem convém ir muito longe, para que verifiquemos o número virtualmente infinito de

versões conhecidas desses objetos. E o fato de que o componente funcional de na

maioria eles mantenha-se teimosamente o mesmo, só serve para aumentar o

mistério da perpétua variação de suas aparências. “Flora ou fauna” são

designações coerentes pois há algo de orgânico no modo como um faqueiro

assemelha-se a ramificação arbórea de facas, colheres e garfos ou em como a

televisão assemelha-se ao tronco de uma família que se espraia em aparelhos de

dvd, projetores e monitores, de microtelas dos aparelhos celulares aos símiles

domésticos de telas cinemascope com os quais os consumidores mais ávidos de

ilusões, e devidamente abonados, pretendem romper as torpes limitações de uma

das paredes da casa em que mora.

E como não lembrar a primeira e essencial lição trazida dentro do mais banal dos

objetos, qual seja o fato de que todos eles possuem algo de nosso, como uma

criatura que leva adiante os traços de seu criador? Tal pai tal filho. Tal homem tal

objeto. Os objetos, deles disse Barthes, “são a nossa assinatura no mundo”,

alertando ainda que “não devemos nos esquecer que um objeto é o melhor

mensageiro de um mundo que está por cima da natureza.” (2) E quanto a isso nem

será preciso avançar pela demonstração de cada objeto é a simultânea negação

da natureza mais trabalho humano objetivado. Basta lembrar que todos eles

possuem a nossa medida, mais não fosse são ergonômicos. E é por isso que

freqüentemente são antropomórficos, quando não nos passam a vívida sensação

de serem animados. Quem, durante as indefectíveis madrugadas insones da

infância, ao menos uma vez não se quedou paralisado na cama com a certeza de

que o paletó encabidado numa cadeira era o vulto de um homem? E que tal o

relógio de pulso, que Julio Cortázar define como um “pedaço frágil e precário de

você mesmo, algo que lhe pertence mas não é seu corpo, que deve ser atado a

seu corpo com sua correia como um bracinho desesperado pendurado a seu

pulso?” (3) Há também as referências zoomórficas exploradas pelos designers de

hoje em dia, cujo um dos melhores exemplos é o espremedor de limão “aracnídeo”

que Philippe Starck projetou para a Alessi no princípio da década de 90, e que

foram brilhantemente antecipadas por Hanna e Barbera, autores do memorável

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seriado infantil “Flintstones”, que apresentava o aspirador de pó como um pequeno

animal doméstico que se leva pela tromba e uma vitrola ancestral que trazia como

braço e respectiva agulha um pássaro debruçado com o bico enfiado nas ranhuras

do disco.

Houve um tempo em que parecíamos controlar, e já com muito custo, as novidades

no campo da produção material. Em seu “As Cidades e as serras”, Eça de Queiroz

oferece um retrato carregado nas tintas do entusiasmo pela civilização de seu

protagonista, Jacinto, esforçando-se por corresponder ao seu entendimento do

homem civilizado como aquele apto “a recolher dentro de uma sociedade e nos

limites do progresso (tal como ele se comportava em 1875) todos os gozos e todos

os proveitos que resultam de saber e de poder.” (4) De um aparelho telefônico ao

pequeno ascensor que ligava a cozinha à sala de jantar, o palacete situado no 202

da Campos Elíseos tinha de tudo. E note-se que o problema do Jacinto não se

estendia ao conhecimento e controle dos fatos e objetos do passado e sim os do

presente, em seu inexorável fabrico do futuro. Caso seu arrebatamento fosse em

direção aos feitos civilizacionais realizados, o problema se exponenciaria, e as

vastas e já atulhadas salas de seu casarão rebentariam no esforço de comportar o

excedente.

O impulso de cercar-se de objetos e informações, e aqui insinua-se uma segunda

lição das coisas, é algo tão antigo quanto o homem. Pomian refere-se a esse

atavismo afirmando que “pode-se constatar sem risco de errar (grifo meu) que

qualquer objeto natural de que os homens conhecem a existência e qualquer

artefato, por mais fantasioso que seja, figura em alguma parte num museu ou numa

coleção particular”. (5) De uma forma ou de outra todos nós somos colecionadores.

Desde a infância até a velhice. Toda a sorte de objetos materiais, coisas concretas,

palpáveis, que tanto podem ser efêmeros quanto atravessarem nossa existência,

sobrevivendo-a. No início há o inevitável fascínio pela diversidade das coisas,

fortuitas como maços de cigarros, lápis, tampinhas de garrafa, além dos

indefectíveis álbuns de figurinhas que cedo conferem à esse atavismo um formato

mais profissional. Há um misto de processo de conhecimento com o gosto pelo

desdobramento tentacular da nossa presença no mundo. A garrafa de coca-cola

egípcia ao mesmo tempo em que noticia a existência de gente em um ponto

remoto além do horizonte, gente que, face as letras de que fazem uso, só podem se

comunicar através de uma estranha algaravia, afirma aquele que a possui como

alguém mais poderoso, mais importante por deter algo que escapa aos outros,

extraordinário por possuir ter a posse do extraordinário.

Da criança que coleciona figurinhas aos ancestrais dos museus modernos, os

gabinetes de maravilhas surgidos a partir da segunda metade do século XIV, o

denominador comum desse vasto universo é o desejo de controle, uma afirmação

de poder sobre o invisível, seja ele espacial – aquilo cuja proveniência é, senão

longínqua, ao menos fora do raio do nosso trânsito habitual; seja ele temporal –

aquilo que vem do passado. Empenhar-se na lida com esses dois vetores

rigorosamente inesgotáveis significa obtenção de poder e, por extensão, prestígio.

Dois substantivos impossíveis de serem saciados. Haverá algum colecionador que

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não sucumba a nostalgia de não poder ir além, ainda que se trate um colecionador

da palavra FIM, título de uma gravura de Waltércio Caldas (1946) que traz

estampada 12 versões dela?

Mais do que a simples mobilidade do objeto no tempo e no espaço, um atributo

que por si só confina com uma espécie de magia, como é o caso de certos objetos

herdados e que são cultuados como verdadeiros talismãs, o fascínio pelo objeto

deve-se as noticias que ele traz acerca de quem o produziu. Prosseguindo por mais

essa lição lembremo-nos de Leroi-Gourhan que, versando sobre a etnologia como

“ciência da diversidade humana”, cujo “campo de investigação não está limitado

nem no espaço nem no tempo”, argumenta que a tecnologia, entendida como o

ramal da etnologia dedicada ao estudo dos produtos das técnicas, é a única “que

permite apreender os primeiros atos propriamente humanos e acompanhá-los de

milênio em milênio até os dias atuais.” (6) Além da sua qualidade de testemunho

acerca de uma cultura dada, informações sobre aos instrumentos da técnica de

“aquisição dos produtos necessários à vida material – produtos animais (caça,

pesca, criação), vegetais (recolecção e agricultura) e minerais – e ao seu consumo

através da alimentação, do vestuário e da habitação” (7), os objetos surpreendem

pela desenvoltura com que circulam pelo mundo, ultrapassando em muito os

deslocamentos das comunidades nômades, cujas migrações, ainda segundo Leroi-

Gourhan, por intensas que sejam ou tenham sido, no geral nunca exorbita o interior

do próprio território e, mesmo quando isso acontece, têm um papel menos

importante do que costumamos pensar. (8)

Os exemplos são infinitos. No nosso caso, brasileiros e acostumados que estamos a

incensar o adágio oswaldiano “Tupi or not Tupi”, o que no geral fazemos

despojando a frase de sua ironia para, em contrapartida, enfatizar o nosso caráter

antropofágico, essa lição sobre a repercussão e transformações entre as culturas

através dos objetos é algo digno de ser considerado com mais vagar. Ainda Leroy-

Gourhan chama-nos a atenção para o fato de que a metade mais aparente da

vida material do Japão, como a escrita, a língua oficial e erudita, o budismo, as

indústrias têxteis etc, serem de inspiração chinesa, muito embora “os chineses nunca

conquistaram o Japão e nunca se encontrará o mínimo vestígio dos seus esqueletos

nas grandes ilhas do arquipélago”. (9) A antropofagia e, mais do que ela, a

“objetofagia”, com o perdão do neologismo, é uma característica dos homens em

geral. E a referência chinesa vem a calhar, em primeiro lugar pelo momento em

que vivemos, no qual, perplexos, assistimos ao reerguimento do poderio daquele

país, cujos efeitos se fazem sentir nos mais variados aspectos da nossa vida

cotidiana, a começar por alguns itens do nosso vestuário. Mas bastaria dar uma

passada pela cidade mineira de Sabará, um dos berços do nosso barroco, o

primeiro grande momento de nossa expressão artística, para uma visita à capela da

Nossa Senhora do Ó, e depararmo-nos com os motivos pictóricos chineses, vários

deles realizados com o pigmento vermelho típico do período, ambos, motivos e

tinta, provenientes da mesma Macau ocupada pelos portugueses.

Corroborando a tese de Lucien Febvre, um dos pioneiros de uma nova visão da

história, co-fundador da revista “Annales d‟histoire économique et sociale”, os

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objetos falam. A história “pode fazer-se, deve fazer-se [...] com tudo o que a

habilidade do historiador lhe permite utilizar para fabricar seu mel [...] Logo, com

palavras. Signos. Paisagens e telhas. Com as formas do campo e das ervas

daninhas. Com os eclipses da lua e a atrelagem dos cavalos de tiro [...] Numa

palavra, com tudo o que, pertencendo ao homem, depende do homem, serve o

homem, exprime o homem, demonstra a presença, a atividade, os gostos e as

maneiras de ser do homem”. (10)

Vivemos rodeados pelos objetos porque sua existência é extensão de nossa

existência mesma. E, ao menos presuntivamente, garantia e promessa de conforto,

mitigamento da solidão, o que se confirma quando, depois de uma viagem,

regressando-se a casa e ao convívio tranqüilizador com os nossos co-moradores, ou

simplesmente quando a noite vai alta e a atmosfera se aquieta, tornando

perceptível o peculiar palrar de seus tique-taques, estalidos, ronronares ou até o

silêncio que se amplifica bruscamente, em seqüência aos staccatos do motor da

geladeira. Mas é fato que a tranqüilidade dessa convivência está sempre a ponto

de dissolver. Essa proximidade de nós, patente em suas feições e na nossa

inclinação em efetuar projeções psicológicas, faz com que os objetos convertam-se

em “outros”, inabordáveis, misteriosos e ameaçadores. Não é assim que Clarice

Lispector os trata em seu conto “Amor”, quando Ana, a protagonista, com a casa

vazia e o sol alto, contemplava os móveis limpos com o coração apertado de

espanto, um sentimento redimido pelo amanhecer de um novo dia, quando

“encontrava os móveis de novo empoeirados e sujos, como se voltassem

arrependidos.” (11) E não é que esse quadro de estranhamento vem se agravando

mais e mais? Especialmente após a segunda metade do século passado, após a

integração de novas tecnologias ao processo produtivo, a entrada em cena das

técnicas de miniaturização, do transistor ao chip, da informática e da robótica, e a

estupenda ampliação dos bens produzidos, o processo ficou tão dinâmico que

diante de certos objetos temos a sensação que, atirados para fora do barco da

história, vemo-lo afastando-se de nós rapidamente. Mais do que nunca sentimo-nos

impotentes diante da “marcha do progresso” a ponto de sorrir das pretensões de

Jacinto, tão factíveis no vagaroso século XIX. Nossas casas são ocupadas,

bombardeadas por toda sorte de objetos. No meio dessa vertigem sentimo-nos

precocemente envelhecidos, seres cristalizados em meio a um ambiente marcado

pela fugacidade. Um pouco como a população da cidade no magistral

“Amarcord” de Fellini, que se lança ao mar numa miríade de barcos e canoas para

contemplar de perto a passagem do Rex, o transatlântico, paquiderme

tecnológico, orgulho da pátria. A expectativa pelo objeto vai se dissipando com a

noite a medida em que o mar embala o sono de todos. Quando então,

discretamente anunciado por uma sirene abafada, uma sombra imensa invade a

escuridão silenciosa indiferente aos aplausos e gritos emocionados de todos diante

da desmesura. Assim é a história, diz Fellini, assim é a produção de bens que nos

consagra e que, por outro lado, ignora-nos como um barco imenso que navega

resolutamente em direção ao futuro, como se não fossemos nós, com nossos

afazeres tão diminutos, nossas tristezas e alegrias, nossas feiúras, nossas idealizações

e fracassos, os responsáveis pela sua construção.

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O objeto, além de flores, pêras, maçãs, peixes, caveiras..., na arte. Outras lições

De um modo ou outro o objeto sempre esteve presente na produção artística.

Impossível pensar na representação do homem, tema imemorial e anterior a própria

invenção da arte, sem que ele não esteja ataviado com algum objeto, arma ou

vestimenta, por simples que sejam. Contudo, o objeto só passa a merecer alguma

evidência, ganhar espaço como protagonista, na passagem dos séculos XVI para o

XVII, na esteira da criação das academias e na consolidação das “pinturas de

costumes” e da “natureza-morta” como gêneros artísticos, ainda que considerados

secundários em relação aos outros gêneros, a pintura histórica, mítico-religiosa, a

paisagem desde que imbuída de algum desses atributos, e o retrato, todos esses

dotados de uma significação que transcendia aos limites domésticos e comezinhos

dos dois primeiros. Sem se estender na questão, convém prudência em sua análise

uma vez que a pintura de costume, tal como a praticada por Johannes Vermeer

(1632-1675), o mestre de Delft, estava longe do prosaísmo pejorativamente

associado ao gênero. E o florescimento desse gênero nos países baixos deve ser

creditado ao impedimento do protestantismo para a representação de cenas

religiosas. O caráter doméstico dessa pintura, pelo que era desprezada pelos

acadêmicos na conta de “arte feminina”, estendia-se à natureza-morta, como se

pode confirmar nos inúmeros exemplares constituídos por arranjos com cornucópias

de frutas, buquês de flores, além de animais caçados e pescados.

Também aqui deve-se cuidar para não reduzir o gênero a um problema de

composição e de relações cromáticas, o que também não quer dizer que esses

fossem problemas de pequena monta e não chegassem as raias de elaborações

formais das mais intrincados. Discorrendo sobre a natureza-morta, Shapiro, depois de

advertir que “os objetos escolhidos para a natureza-morta – a mesa com comida e

bebida, as louças, os instrumentos musicais, o cachimbo e o tabaco [...] pertencem

a campos de valor específicos: o privado, o doméstico, o gustatório, o convival, a

vocação e o hobby, o decorativo e o suntuoso e, menos freqüentemente, num

clima negativo, objetos oferecidos à meditação como símbolos da vaidade,

lembranças do efêmero e da morte”, lembra que eles transmitem ainda “o sentido

do poder humano sobre as coisas, ao produzi-las e utilizá-las; são instrumentos assim

como instrumentos de sua habilidade, seus pensamentos e apetites.” (12)

De fato, e nomeadamente na Espanha onde através de mestres como Francisco de

Zurbarán (1598-1664) e Juan Sánches Cotán (1560-1627) a natureza-morta atingiu

um patamar superior, o gênero abordou um universo preponderantemente

simbólico, patente na variante de “clima negativo”, segundo Shapiro, denominada

por vanitas, cuja origem remonta à passagem bíblica do livro do Eclesiastes (I, 2) em

que se lê: “Vaidade de vaidades e toda vaidade.” Fiéis ao espírito da Contra-

Reforma, as obras pertencentes a esse sub-gênero, nas quais elementos perecíveis

como flores e frutas não raro vinham acompanhadas de caveiras, pretendiam

induzir o espectador à meditação sobre a vida. (13)

A alteração do estatuto do objeto na arte, sua passagem do plano secundário

onde estava relegado para uma posição de destaque foi uma decorrência do

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programa realista introduzido por Gustave Courbet (1819-1877) na cena estética

francesa no final da primeira metade do século XIX. A ênfase dada ao objeto na

obra dos Impressionistas, com destaque à Vincent Van Gogh (1853-1890) e, mais

ainda, Paul Cézanne (1839-1906), cuja importância para o cubismo de Georges

Braque (1882-1963) e Pablo Picasso (1881-1973) merece ser qualificado como

seminal.

Colagem cubista e a era do objeto

“Penso que um quadro se parece com o mundo real quando está feito de mundo

real”

Robert Rauschenberg (14)

A simples formulação de um ponto de vista como esse de Robert Rauschenberg

(1925), artista cuja carreira despontou nos Estados Unidos no começo dos anos 50

para ser quase imediatamente identificada como Neo-dadaísta, graças ao uso de

elementos extraídos da vida cotidiana, mostra, simultaneamente, a atualidade da

colagem, procedimento cubista inventado em Paris por Braque e Picasso durante o

ano de 1912. Será legítimo compreender as peculiares “combine-painting” desse

artista, obras que apagavam as fronteiras entre escultura e pintura, materiais nobres

com toda sorte de detritos – “A pintura está relacionada com arte e vida [...] Um par

de meias não é menos adequado para uma pintura do que madeira, pregos,

terebentina, óleo e tecido” (15) – como colagens em versão radicalizada. E foi o

cubismo que, além de eleger a natureza-morta como o grande gênero artístico, o

que em parte era devido a postura anti-acadêmica que os impulsionava, juntou à

sua pintura, através da colagem e da assemblage, fragmentos de produtos típicos

da vida citadina e industrial. Pedaços de jornais, papéis de parede, rótulos de

garrafas, cartas de baralho etc. De acordo com Shapiro, a colagem cubista, isto é,

a agregação formalmente elaborada de “objetos reais à tela ao lado do pigmento

tradicional – [era o] ponto culminante de uma tendência a ver a pintura em si como

coisa material e a eliminar por diversos meios os limites entre realidade e

representação.” (16)

Por sua vez, Rosalind Krauss, sem negar as considerações acima, defende a

invenção da colagem pelos cubistas como um efeito da ação combinada de três

fatores, a saber: o impacto causado pela poesia “Zona” de Guillaume Apollinaire,

publicada em 1912 no interior do livro “Álcoois”, no qual o autor celebra “os

prazeres lingüísticos dos cartazes e sinais urbanos”; a adoção de materiais baratos e

efêmeros, e sua utilização dentro de parâmetros mais próximos às estratégias de

design como críticas ao protocolo das belas artes, assim como a busca da

experiência estética nas margens daquilo que era socialmente regulado como

indício da liberdade artística; os conflitos nos Balcãs reportados pela imprensa do

período e selecionados pelos artistas para protagonizarem seus recortes de jornais,

dão prova da dimensão realista de seu trabalho plástico, afastando-o da acusação

de simples operação formal. (17)

Marcel Duchamp e o ready-made – mais e inesperadas lições

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“Se o Sr. Mutt fez ou não com suas próprias mãos a fonte, isso não tem importância.

Ele escolheu-a. Ele pegou um objeto comum do dia-a-dia, situou-o de modo que se

significado utilitário desaparecesse sob um título e um ponto de vista novos – criou

um novo pensamento para o objeto.” Marcel Duchamp (18)

“A arte é possível sem intenção artística e pode ser melhor sem ela.” Hiroshi

Sugimoto (19)

Se a colagem é o gênero o ready-made é a espécie. Embora tenha surgido um ano

depois da colagem, em 1913, o ready-made, isto é, a apropriação e re-

contextualização no âmbito da arte de um objeto qualquer produzido em escala

industrial, de autoria anônima, cuja ordem funcional supera qualquer pretensão

estética, joga o problema para um território muito mais amplo, do qual a colagem é

apenas um caso particular, e denominado posteriormente por alguns teóricos,

como assemblage. O contato de Marcel Duchamp (1887-1968) com os cubistas é

um fato notório até porque naquela altura ele estava alinhado com o grupo

chegando a integrar suas exposições, uma adesão rompida no mesmo ano de

1912, o ano do surgimento da colagem e, portanto, ano zero do objeto “ao vivo” na

obra de arte. Inúmeros historiadores da arte responsabilizam à pressão efetuada por

seus irmãos, os artistas Raymond Duchamp-Villon (1876-1918) e Jacques Villon (1875-

1963), para que ele retirasse do Salão dos Independentes, reduto dos cubistas,

realizado no verão daquele ano, sua pintura “Nu descendo a escada”, provocativa

e fora dos preceitos do grupo. Uma situação desgastante e que o próprio Duchamp

declarou ser responsável por sua atitude de abandonar a pintura, cuja orientação

“retiniana”, ou seja, dirigida mais para os olhos do que para o pensamento,

desagradava-o profundamente. (20) Mas a reação do artista não se resumiu a isso,

o incidente levou-o a iniciar uma obra pautada em novos materiais e questões, cujo

primeiro grande produto levaria anos para ser feito “A noiva despida por seus

celibatários, mesmo” (1915-1923), também conhecido por “Grande vidro”, uma

pintura a óleo sobre vidro. Paralelamente, mais próximo do que nos interessa, ele

começou sua anti-obra, a apropriação de objetos, os já mencionados ready-

mades, abrindo fronteiras que seriam consideradas anti-artísticos. (21)

Rosalind Krauss argumenta que esse fato, de resto confirmado por Duchamp, não

logra explicar a amplitude do problema. Mais do que uma desavença, o ready-

made significou, em primeiro lugar, a alternativa encontrada por Duchamp contra a

insistência do cubismo em permanecer na esfera representacional mesmo com a

extraordinária abertura propiciada pela colagem e a conseqüente utilização de

materiais extra-artísticos. Essa compreensão do problema teria sido acompanhada

à distância, e provavelmente sem que um tenha tomado consciência do outro,

pelo artista russo, Vladimir Tatlin (1885-1953), cujos contra-relevos produzidos a partir

de 1914 foram impulsionados pela mesma crítica, feita por Tatlin depois de uma

breve estadia e Paris, onde se inteirou das colagens cubistas assim como suas

realizações no âmbito da escultura. O segundo ponto da linha de raciocínio de

Krauss concerne ao fato de que tanto Duchamp quanto Tatlin, na medida em que

recusavam o compromisso milenar que a arte mantinha com a representação - é

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bem verdade que já abalado pela irrupção, poucos anos antes, do abstracionismo

de Wassily Kandinsky (1866-1944) - e, mais ainda, pelo modo como encampavam

materiais e temas que nada tinham a ver com a “dignidade” dos meios e materiais

clássicos, sentiram na pele a “verdade sobre o caráter burguês” da arte, vale dizer,

revelou-se a eles que, diversamente de autônoma, a arte havia se transformado

numa instituição. (22)

O paralelo entre ambas invenções cessa tão logo se compara as duas produções,

pois enquanto Tatlin, em 1915, emprega os termos “construção” para designar suas

peças feitas de materiais industriais e processos eminentemente mecânicos, e

“tectônica” para enfatizar a conexão entre a investigação formal e os princípios

políticos do Comunismo, o ready-made de Duchamp, na medida em que se

pautava em objetos pré-existentes, retirados de circulação e incorporados em um

outro circuito semântico, leva ao extremo o questionamento da própria noção de

arte, lançando proposições muito distintas de seu colega russo. Resta salientar que a

divergência entre os dois pode ser resumida no fato de que enquanto Duchamp

operava com os limites do sistema de arte, fazendo com que parte de sua obra,

nomeadamente o ramal apoiado no ready-made, tivesse a ironia por tônica, Tatlin,

ao contrário, era um produtor dos mais ativos, profundamente interessado em

pensar a articulação entre arte e indústria.

Concentrando-se na fração irônica da obra de Duchamp, com a qual ele testava

os limites do território da arte, e que com muita justiça é denominada como anti-

obra, comecemos parafraseando Octávio Paz lembrando que “os ready-made são

objetos anônimos que o gesto gratuito do artista, pelo único fato de escolhê-los,

converte em obra de arte”, para então concluir que esse mesmo gesto “dissolve a

noção de obra.” (23) Deslocar um objeto qualquer para o campo da arte significa o

mesmo que questionar a relação e a arbitrariedade que separa um objeto utilitário

de um estético e, por extensão, indagar se uma obra de arte pode ser feita por um

anônimo. Como duchampianamente propõe Sugimoto na epígrafe deste

segmento do texto, “A arte é possível sem intenção artística e pode ser melhor sem

ela”. Valorizando o gesto casual e não o gesto movido pelo eventual interesse

estético de um objeto dado, Duchamp valoriza o conceito, a idéia que preside

toda ação. Indo adiante no raciocínio, Duchamp abriu mão da sua condição de

artista, compreendido como aquele que “cria” obras de arte, em troca do artista

como aquele que se apropria, uma estratégia capaz de provocar o colapso do

meio artístico fundamentado em valores como o caráter artesanal da obra de arte,

cujo primeiro e principal corolário era justamente a figura do autor. Tomando o

objeto feito anonimamente, Duchamp desferia um golpe mortal na noção clássica

de arte.

Quando em 1913 ele apresentou a “Roda de bicicleta”, tecnicamente um ready-

made modificado ou assemblage (24), Duchamp, como já foi dito, converteu-se na

principal voz a se levantar contra a arte retiniana e a noção do artista como um

trabalhador manual, noções que haviam se consolidado no século XIX no processo

de reação à progressiva perda do papel de quase total exclusividade da pintura na

produção de imagens e símbolos. A eficácia da transmissão dos conteúdos éticos,

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religiosos e políticos subjacentes era uma prerrogativa do artista e do sistema de

exibição posto a seu serviço. A proliferação de imagens proveniente da fotografia,

ao passo em que provocou o desalojamento da arte desse lugar fortaleceu, em

contrapartida, o espaço do museu e congêneres, entendidos como espaços onde

as obras de arte, paulatinamente liberadas dos seus compromissos anteriores,

poderiam ser apreciadas pelos seus atributos formais. Ao mesmo tempo em que

consagrou uma produção artística desvinculada do compromisso com grandes

temas, centrada em seus próprios elementos internos, o museu consolidou uma

forma de fruição compatível com ela, ajudando a formação de um novo público e

ensejando o florescimento da atividade crítica. A estabilização desse circuito criou

uma situação sem precedentes: para que um objeto fosse considerado obra de

arte, para que ele pudesse produzir significados legítimos, além de seus atributos

metalinguísticos, ele deveria ter a chancela de um museu ou de um crítico. Vista sob

esse ângulo, o que se entendia como obra de arte estava protegido de qualquer

outra compreensão externa. Estava? Não, aí entra Duchamp “trocando os antigos

critérios estéticos de feitura, material e gosto („essa pintura ou escultura é boa ou

má?‟), para novas questões com potencial ontológico („o que é arte?‟),

epistemológico („como saber se é?‟) e institucional („quem determina?‟).” (25)

A alternativa proposta por Duchamp significou implosão da lógica do sistema

artístico enviando-lhe um objeto outro, um objeto industrial, anônimo,

desfuncionalizado, nem feio nem bonito, um objeto apenas. Ao fazê-lo demonstrou

que a produção de sentido não é algo que se esgota no objeto instituído como

artístico e que, além disso, arte é uma prerrogativa de quem olha, não

necessariamente de quem faz. Deslocado de seu habitat, o objeto doméstico, à

maneira de um trocadilho - jogo que Duchamp tanto gostava, passa a demoníaco;

colocado em outro contexto, desmontada a sintaxe, o objeto converte-se em outro,

de afável e familiar transforma-se em obstáculo, corpo estranho.

Notas

1. Jean Baudrillard – O sistema de objetos. São Paulo: Perspectiva, p. 9.

2. Apud Mark Francis & Hal Foster – Pop: themes and movements. Londres:

Phaidon Press, p. 196.

3. Julio Cortázar – “Preâmbulo às instruções para dar corda ao relógio”; In:

Histórias de cronópios e de famas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1972,

p. 20.

4. Eça de Queiroz – As cidades e as serras. Belo Horizonte, Itatiaia, 1962, p. 13.

5. Krzysztof Pomian – “Coleção”, In: Ruggiero Romano (org.) – Enciclopédia

Einaudi – Vol. 1. Memória – História. Porto: Imprensa Nacional-Casa da Moeda,

1984, p. 51.

6. André Leroi-Gourhan – Evolução e as técnicas – 1. O homem e a natureza.

Lisboa: Edições 70, 1984, p. 11. Levando adiante seu raciocínio, Leroi-Gourhan

defende que “os Australantropos [o mais antigo entre os homo faber], que

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têm mais de um milhão de anos, possuíam já a nossa postura vertical e

fabricavam utensílios muito primitivos.”

7. idem, p. 18.

8. idem, p. 12.

9. idem, p. 13.

10. Jacques Le Goff – “Documento/Monumento”, In: Ruggiero Romano, op. cit.,

p. 98.

11. Clarice Lispector – Laços de família. Rio de Janeiro: José Olympio, 1976.

12. Meyer Shapiro, As maçãs de Cézanne, In: A arte moderna – Séculos XIX e XX.

Ensaios escolhidos. São Paulo: Edusp, 1996, pp. 59/61.

13. A dimensão metafísica era o pano de fundo de grande parte dessas obras, o

que já era indiciado pela denominação em holandês, stillleven e inglês, still

life, e a pressuposto contido de que mesmo até mesmo uma fruta qualquer

possui uma vida interior silenciosa e somente perceptível para a sensibilidade

capaz de atravessar sua casca. O assunto não tem limites e estende-se por

outras modalidades de arte. Na literatura, por exemplo, Leyla Perrone-Moisés,

em seu livro de ensaios “Flores da escrivaninha” (São Paulo: Cia das Letras,

1990), entre as páginas 44 e 66, debruça-se com sua habitual agudeza sobre

um romance menor de Balzac, “O lírio do vale”, “trezentas páginas que

podemos qualificar de chatas”, demonstrando que entre elas estão, “talvez,

as páginas mais eróticas da Comédia Humana [...] e são descrições de

buquês de flores.” Em seu livro “Objects on a table” (Washington, D.C.:

Counterpoint, 1998, Guy Davenport disserta com desenvoltura e interesse

sobre a presença e o significado dos objetos em literatura e artes visuais.

14. Citado por Calvin Tomkins em “The bride and the bachelors: five masters of the

avant-garde”. Londres: Penguin Books, 1976, pp. 193-194.

15. Robert Rauschenberg – Untitled statement, In: K. Stiles & P. Selz (org.) –

“Theories and documents of contemporary art”. Berkeley: University of

California Press, 1996, p. 321.

16. Shapiro, op. cit., p. 63.

17. Rosalind Krauss, In: H. Foster; R. Krauss; Y. Bois; B. Buchloh – “Art since 1900.”

New York: Thames & Hudson, 2004, pp. 112-117.

18. Citado por Calvin Tomkins em “Duchamp: uma biografia”. São Paulo:

Cosac&Naify, 2004, p. 193.

19. Citado por Cecília Fajardo-Hill em “Objetos afortunados.” Catálogo de

exposição. Miami: CIFO – Cisneros Fontanals Art Foundation, 2007, p. 21.

20. “Desde Courbet acredita-se que a pintura é endereçada à retina; este foi o

erro de todo mundo. O frisson retiniano! Antes a pintura tinha outras funções,

podia ser religiosa, filosófica, moral [...] É absolutamente ridículo. Isso tem que

mudar; não foi sempre assim”. In: Pierre Cabanne – “Marcel Duchamp – O

engenheiro do tempo perdido”. São Paulo: Perspectiva, 1987, p. 73.

21. De acordo com as palavras de Duchamp em sua famosa entrevista à Pierre

Cabanne: “o „Nu descendo a escada‟ foi recusado no Salão dos

Independentes, em 1912. Gleizes está por trás disso; a tela causou um tal

escândalo, que antes da abertura, eles encarregaram meus irmãos de me

pedirem que retirassem o quadro. Então veja... PC -- Este gesto pode ser

incluído entre as razões que o levaram a tomar, mais tarde, uma atitude anti-

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artística? - Isto ajudou a me libertar completamente do passado, no sentido

pessoal da palavra. Eu disse: “Se é assim, não é a questão de entrar num

grupo, não quero contar com ninguém a não ser comigo, sozinho.”, idem, p.

52.

22. Krauss, op. cit., pp. 125 e seguintes.

23. Octavio Paz – Marcel Duchamp ou o castelo da pureza. São Paulo:

Perspectiva, 1977, pp. 21/22.

24. assemblage é uma modalidade de construção plástica na qual se enquadra

a colagem, simples ou complexa, não importa, mas que se define por ser

composta de materiais distintos quanto as suas características físicas como

também quanto ao uso que dele se fazia – o pé de uma mesa de madeira, o

papel jornal, o selim e o guidom de ferro de uma bicicleta etc - e, como tais,

portadores de temporalidades, informações e conceitos diversos.

25. Krauss, op. cit., p. 128.