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LEITURA DE TEXTOS LITERÁRIOS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: desafio na diversidade etária

Autor:Maria Cristina Ferreira da Silva1

Orientador: Ubirajara Inácio de Araújo2

RESUMO

O presente trabalho chama a atenção dos educadores que trabalham com EJA sobre o desafio de apresentar o texto literário como ferramenta de difusão de literatura qualitativa entre jovens e adultos que deixaram de ler textos dessa natureza. Os alunos da EJA trazem costumes e bagagens diferenciadas para os mesmos espaços escolares e, por constituírem uma clientela significativa, não podem ter suas preferências literárias descartadas neste ambiente. O referido estudo apresenta o perfil dos alunos da EJA, as suas escolhas literárias e as ações que contribuíram para dinamizar o acesso à leitura dos alunos do CEEBJA Fazenda Rio Grande. Os dados analisados foram coletados por meio de questionário investigativo sobre o perfil de 142 alunos do Ensino Fundamental e Médio, e suas preferências literárias analisadas a partir dos apontamentos realizados pelos alunos a partir da leitura de textos literários disponibilizados em sala de aula. Como metodologia foi utilizada a pesquisa-ação que usa a intervenção, no desenvolvimento e mudança de grupos, organizações e comunidade. A prática educativa apresenta os resultados que vão refletir nas mudanças do processo pedagógico que parte de ações concretas no ambiente escolar. Os resultados obtidos puderam ser vistos no volume de empréstimos de livros de literatura na biblioteca escolar, na participação e envolvimento dos diversos momentos de estímulo à leitura: feira externa e interna de livros, visitas às bibliotecas e corredor literário, que possibilitaram uma reflexão sobre o papel da escola como articulador no processo de formação do leitor.

Palavras chaves: Educação de jovens e adultos; leitura de textos literários; diversidade e práticas educativas.

1 Professora CEEBJA Fazenda Rio Grande2 Mestre e Doutor em Semiótica e Linguística Geral pela Universidade de São Paulo (USP).

Professor de Metodologia e Prática de Ensino de Língua Portuguesa do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

1

ABSTRACT:

This study draws the attention of educators who work with youth and adults education on the challenge of presenting the literary text as a tool for distribution of good literature among young people and adults who no longer read these texts. The students from youth and adults education bring different habits and luggage for the same school, none of them can have its literary preferences ignored in this environment. This work presents students profiles from adult education, their literary choices and actions that contributed to streamline the access of students of the “CEEBJA Fazenda Rio Grande” to reading. The data were collected through an investigative questionnaire about 142 students’ profile from elementary and high school. Their literary preferences were analyzed from notes made by these students from the reading of literary texts available in the classroom. The methodology used was the “action-research” which uses the involvement in the development and change of groups, organizations and communities. The educational practice presents the results that will reflect the changes in the pedagogic process which stems from concrete actions in the school environment. The results were observed in the amount of loans of books from the school’s library and in the participation and involvement of several moments of stimulus on reading which provided a reflection on the school's role as articulator in the formation process of the reader.

Palavras chaves: Youth and adults education; reading of literary texts; diversity and

educational practices.

1 INTRODUÇÃO

Partimos, neste artigo, do ponto de vista de que a leitura é algo essencial à vida e

de que a motivação no ambiente escolar é sempre um ponto de partida para

discussões sobre essa temática. Pretendemos, ao longo do trabalho, demonstrar

como as iniciativas de aproximar os alunos dos livros podem transformar cidadãos

comuns em leitores muito interessados pela leitura, uma vez que, para Geronasso

(2001), a literatura proporciona uma aventura única, inigualável e contínua, que

normalmente eleva o leitor a uma condição diferenciada, a de transportar-se para a

narrativa que o escritor desejou transmitir. O mesmo autor ainda acrescenta:

“A literatura é o encanto que se produz de forma escrita para proporcionar ao leitor

uma pequena, porém inesquecível, viagem.” O objetivo é retratar as preferências

2

literárias dos alunos do CEEBJA promovendo e incentivando a leitura de textos

literários no ambiente escolar visando à formação do leitor, possibilitando melhor

qualidade do ensino-aprendizagem, desenvolvimento social e cultural de jovens e

adultos e, a partir dos resultados, possibilitar o acesso dos alunos a um número bem

mais significativo de leituras e espaços culturais que possibilitem essa prática, pois o

fenômeno literário se efetiva na inter-relação autor/leitor/texto.

No artigo de Castorina (1998, p.166), o autor relata: “para que a aprendizagem seja

possível, deve haver um saber disponível, de forma que todo novo conceito deve ser

contido no anterior. Disso deriva a aceitação do inatismo do saber anterior”,

enfatizando que há uma necessidade de considerar as demandas e as

especificidades da diversidade cultural brasileira como paradigma do sistema

educacional. Alguns aspectos têm demonstrado que o público da EJA não tem

encontrado na escola um ambiente de favorecimento na ampliação de seus

conhecimentos. Para Carrano (2008), os espaços escolares têm se apresentado

pouco abertos. A instituição escolar deveria criar espaços e situações que

favorecessem as experiências de sociabilidade, demonstrando a capacidade do ser

humano em viver em grupo, de solidariedade, de debates públicos que garantissem

a participação crítica da sociedade, de atividades culturais e formativas de natureza

extra-escolar que oportunizassem de maneira qualitativa a ampliação dos

conhecimentos. No Manual da Rede de Educação para a Diversidade (2008, p.13)

há mais uma vez a reflexão de que é necessário repensar que tipo de jovens e

adultos temos nesse espaço escolar “a EJA é também espaço de tensionamento e

aprendizagem em diferentes ambientes de vivências que contribuem para a

formação de jovens e adultos como sujeitos da história”.

Os jovens e adultos populares não são acidentados ocasionais que, gratuitamente, abandonaram a escola. Esses jovens e adultos repetem histórias longas de negação de direitos. Histórias que são coletivas. As mesmas vivenciadas por seus pais e avós; por sua raça, gênero, etnia e classe social. (ARROYO,2005, p. 25)

Entender essa diversidade de jovens e adultos oriundos de diversas classes sociais,

trabalhadores, e com aspectos culturais diferenciados deve ser um aspecto

3

primordial para garantir o sucesso da qualidade escolar, pois a EJA se apresenta

como modalidade educacional específica na qual a diversidade socioeconômica,

política e cultural dos sujeitos estão sempre presentes nas turmas de Ensino

fundamental e Médio. A EJA é uma educação que tem que estar disponível a todos,

cumprindo um dever do estado, e na prática deve ser um trabalho que garanta o

acesso, reconstrução constante de saberes e inovações que contribuam para a

educação do ser humano.

Considerando esses aspectos, os dados da pesquisa apontam que a ausência ou

pequenas iniciativas de incentivo a leitura são entraves para a formação do leitor,

pois ações estanques, e sem continuidade não modificam a situação do leitor na

escola. Esse desafio de criar situações de aprendizado constante, de estar

incentivando a leitura independentemente do nível de leitura dos alunos que temos

na sala, traz também a ruptura de uma cultura de desconstrução de uma imagem de

sujeito para a EJA que não poderá ser inconsistente, primária ou medíocre, uma vez

que estamos lidando com pessoas que reconhecem com facilidade a importância da

leitura.

2 METODOLOGIA

Como metodologia, utilizou-se a pesquisa-ação. Nesse tipo de pesquisa, supõe-se

alguma forma de ação, que pode ser de caráter social, educativo, técnico ou outro.

Na fase exploratória da pesquisa-ação, objetiva-se determinar as expectativas dos

interessados, bem como que tipo de auxílio eles poderão oferecer ao longo do

processo de pesquisa. Supõe-se uma forma de ação de caráter educativo e

qualitativo que, no caso da implementação que será utilizada neste projeto, articula-

se com as expectativas de mudanças na prática educativa.

Na implementação realizada na escola, foi utilizado inicialmente o caderno temático

como produção didático-pedagógica que possibilitou a reflexão sobre a trajetória da

4

educação de jovens e adultos, os aspectos sociais, econômicos, políticos e

pedagógicos inseridos no trabalho de leitura.

Nesse intuito, a coleta de dados realizada por meio de um questionário traçando um

perfil do aluno do CEEBJA, do período noturno do Ensino Fundamental e Médio, fez-

se necessário para que o resultado dessa amostra pudesse ser utilizado

qualitativamente, levando em consideração as escolhas literárias e características

desse público.

Como uma das ações desse trabalho, propusemos uma atividade de sensibilização

com a visita a uma feira de livros Municipal que, apesar de ocorrer pelo segundo ano

no município, os alunos ainda não a conheciam. O evento não chegava a ser

grandioso, mas trouxe diversidades de títulos apresentados por várias editoras, o

que garantiu a especificidade do evento, que empolgou, motivou e fez pensar a

relação e reação enquanto leitor, que diante de tal perspectiva viu aflorar o gosto

pela leitura, até então adormecido pela falta de iniciativa ou de oportunidade.

Durante a visita, os alunos percorreram os estandes buscando informações

curiosas como: o menor livro, o maior, o mais caro, o mais barato, a diversidade de

material para o livro impresso, a existência de livros não impressos, as formas de

apresentação de um livro, editoras nacionais e internacionais presentes; também

preencheram um formulário que serviu de direcionamento da visita fazendo com que

os alunos tivessem uma noção do que havia nessa feira.

Para dar continuidade às iniciativas de valorização e aproximação com livros, foi

realizada uma feira de livros antigos, curiosos, para a qual os alunos e a

comunidade demonstraram bastante interesse em revista de quadrinhos antigas,

novelas, etc. Simultaneamente ocorreu uma feira de livros interna com a

participação de várias editoras, na qual os alunos receberam um vale livro e

puderam escolher vários livros para compor o acervo da biblioteca. Essa ação foi

importante, porque muitos nunca tinham entrado na biblioteca, e poder escolher o

livro que estaria nas estantes ajudou a aumentar o número de livros emprestados. O

5

evento foi um sucesso e até saiu no jornal da cidade com entrevistas dos alunos,

que aprovaram a iniciativa.

Durante a semana cultural foi realizada uma gincana e uma das provas era recolher

o maior número de livros para o acervo da biblioteca. O evento conseguiu arrecadar

200 livros de literatura. Sempre que pensamos em práticas significativas que se

devem gerar na escola, impõe-se estar atento à dinâmica das relações sociais com

o objetivo de “democratizar o saber, a cultura ou o conhecimento, bem como

conduzir o educando a aprender o significado social e cultural dos símbolos

construídos, tais como as palavras, as artes, os valores, dotados da capacidade de

propiciar-nos meios de orientação, de comunicação e de participação” (Arroyo, 2001,

p.144).

Dentre as ações previstas, com a utilização do catálogo com textos de diferentes

gêneros (crônicas, contos, fábulas, lendas, manchete, poemas, romances,

reportagens e texto argumentativo), foi feita a leitura de todos, mas a tabulação,

somente das preferências dos textos literários. Os outros textos foram incluídos,

uma vez que a clientela do CEEBJA são adultos que leem manchetes e reportagem

em jornais no ônibus ou no trabalho, já o texto dissertativo é normalmente

trabalhado na escola. Pensamos que apresentar uma coletânea de textos totalmente

fora da sua realidade poderia não motivar a leitura dos alunos. Havendo alguns

textos de seu conhecimento, ajudaria a começar pelo que conhecem e chegar aos

literários. Após a leitura e classificação do textos literários por preferência, com

relação à faixa etária, ao sexo, ao ensino, ao tempo fora da escola,etc. A seleção de

textos compôs um catálogo, que foi disponibilizado para uso dos outros professores

da escola em momentos de leitura, tendo em mãos mais um material de apoio. Há,

todos os meses, um corredor literário com textos escolhidos pelos alunos, de

diferentes autores e espalhados pelas paredes da escola, como incentivo à leitura

dos outros alunos que fazem outras disciplinas. Com isso, atende-se às Diretrizes

Curriculares quando apresentam que “Ler é familiarizar-se com diferentes textos

produzidos em diversas esferas sociais” (PARANÁ, 2008, p.71)

6

Com livros de literatura, foram disponibilizados momentos de leitura em biblioteca da

escola, biblioteca municipal, internet, montando um roteiro de sugestões de leitura

coletadas pelos alunos diante do perfil apresentado, que será disponibilizado na

página de internet do CEEBJA para acesso dos professores e alunos.

Como finalização dos trabalhos, foi realizado o GTR (Grupo de Trabalho em Rede),

no qual vários professores se inscreveram e participaram das discussões sobre o

projeto apresentado e as ações do período de implementação, o que oportunizou

compartilhar o material didático produzido, bem como as estratégias para

aproximação dos alunos da Educação de Jovens e Adultos ao mundo da leitura. Ao

propor uma discussão com os professores sobre os assuntos abordados no caderno

temático EJA: O retrato de sua história e a importância da leitura traçando caminhos

sob o olhar da literatura, muitos apontamentos vieram à tona. Para abrir as

discussões, utilizei o vídeo “de Pé no chão também se aprende a Ler”, que serviu

para intensas discussões sobre políticas públicas diante da nossa vivência com a

EJA, que até hoje trabalha com algumas situações de improviso na educação.

Tivemos a oportunidade de analisar como estão as políticas voltadas para a EJA

atualmente, sendo necessário repensar a nossa prática pedagógica para não

estarmos contribuindo para que essa educação seja tratada como uma casualidade.

3 DESENVOLVIMENTO

3.1 No valor das escolhas , o caminho aberto a novas leituras

A inserção de jovens e adultos no âmbito escolar está prevista em lei e em análise

ao documento preparatório para a VI CONFITEA – Conferência Internacional da

Educação de Jovens e Adultos (2008), que tem o compromisso de configurar a

possibilidade de consolidar e fortalecer a política nacional de Educação de Jovens e

Adultos firmado por meio do documento “Brasil – Educação e Aprendizagens de

7

Jovens e Adultos ao longo da vida”, tem-se a convicção de que o trabalho dentro

dessa modalidade de ensino tem que garantir o acesso à educação voltado à

elaboração e à reconstrução de saberes que contribuam para a humanização e a

emancipação dos seres humanos atendidos nessa modalidade de ensino. A clientela

da EJA atende a diversidade e devem-se a todo momento ajustar práticas

pedagógicas que deem significado à educação oferecida e que o conhecimento

adquirido em sala de aula, através das leituras, interpretações, participações nas

atividades, fruto da interação professor-aluno e os meios utilizados para ampliar este

conhecimento mude também a sua prática ao longo da vida e não só no ambiente

escolar.

Para Giroux e Mclaren (1994,p.138), a complexidade de cultura e valores exige,

portanto, uma formação docente comprometida com “questões de emancipação e

transformação. São questões que vão combinar de um lado “conhecimento e crítica”

e de outro “um apelo para a transformação da realidade em benefícios de

comunidade democráticas”. A leitura contribuirá com essa comunidade e

acreditemos nas palavras de Ziraldo: “Ser professor é a mais bela profissão do

mundo. É uma profissão que ajuda a construir o ser humano. O engenheiro constrói

edifícios. O médico salva vidas. O professor constrói o ser humano, e isso é uma

coisa impressionante.” Há necessidade de respeito e diálogo.

Para Arroyo (2005, p.42), “os jovens e adultos que voltam ao estudo sempre

carregam expectativas e incertezas à flor da pele”. Conhecer a história da EJA e

também a história de vida dos alunos traz uma aproximação e reconhecimento da

similaridade dos problemas e da diversidade de contextos, o que pode tornar o

homem por meio da leitura terrivelmente mais humano, como diz Guiomar de

Grammont, em seu texto” Ler devia ser Proibido”.

Para despertar uma reflexão para a importância da leitura, utilizou-se o vídeo “Ler

devia ser proibido”, veiculado no YOUTUBE, no qual estudantes de publicidade da

Universidade do Rio Grande do Norte usaram como base o texto de Guiomar de

Grammont para enfatizar a importância da leitura, tratando o tema como proibido,

8

em que as chamadas das cenas revelam que “ler deveria ser proibido porque acorda

os homens para realidades inesperadas... a leitura induz à loucura... com ela a

criança se torna um adulto perigoso, inconformado com o mundo... a leitura é um

poder... e o poder é para poucos...etc.” Durante a apresentação, muitos alunos

relataram: “Nossa professora, tô até com vergonha, de não ler muito.” O impacto

visual e apelativo da montagem do vídeo vai dando flashes de que é preciso mudar

essa prática de acomodação vivenciada por esses alunos na sua formação como

leitores. Na sequência, os alunos produziram vários cartazes que foram espalhados

pela escola, fazendo essa reflexão às avessas sobre a importância da leitura.

Por serem adultos em turmas em que a variação etária é bastante diversificada,

teve-se que repetir o vídeo várias vezes, pois a maioria não conseguia guardar as

informações logo na primeira exibição, havendo comentários como “repete aí,

professora, eu quero entender bem”. Essa dificuldade foi constatada na ocasião em

que os alunos tiveram de preencher o questionário, pois eles manifestaram

dificuldade de guardar o leram, o que é um empecilho para a leitura. Os adultos

conseguem participar das aulas de maneira satisfatória quando estimulados e

questionados e preferem opinar quando percebem a importância da proposta

apresentada, preferencialmente depois de escutar várias vezes até compreender

bem o que se pretende passar, pois não gostam de se expor sem ter entendido.

Dentre os entrevistados 37% afirmam ter dificuldade para ler por não guardarem

com facilidade as informações. Os dados da pesquisa retratam esse aspecto:

9

Gráfico 1: Por que tem dificuldade para ler?

9%

37%

26%0%

9%

8% 11%

Por que tem dificuldade para ler ?Não entende a linguagem

Não consegue guardar o que lê

Não tem tempo

Leitura é insignificante

Como se tratava de um vídeo, a repetição seria como se eles precisassem ter lido

várias vezes o mesmo trecho do texto. Na prática em leitura, se leu e não entendeu

é mais fácil deixar o texto de lado. Como na situação apresentada o recurso era

visual e auditivo, foi fácil insistir até chegar ao entendimento. Observando o gráfico,

percebe-se que três indicativos demonstram que a dificuldade para ler perpassa pela

falta de entendimento do texto, pelo cansaço, pelo tempo e também pelo

esquecimento em guardar as informações lidas anteriormente e juntá-las para

formar o todo do texto. Quando o entendimento acontece, os alunos valorizam a

informação, a reflexão que se pretende aparece. A importância que se dá quando as

coisas adquirem um significado é a diferença entre valorizarem ou não alguma

coisa.

Para Helga Loss (2008), apud Bertucci et al. (2007), após cerca de um século de

pesquisas na área de psicologia e de um longo caminho de tropeços e confrontos,

conclui-se que os atos de aprendizagem também são fruto de um intrincado de

habilidades e afetos, construídos a partir de um referencial social e histórico. Ainda

não se pode precisar a natureza da relação entre cognição e afeto, contudo já se

sabe bastante bem que ela tem influência crucial sobre os processos de construção

dos conhecimentos. Assim, hoje nos convencem as palavras do filósofo Feuerbach

(1804-1872) citado por Bertucci et.al.(p.25,2007) “Somente aquilo que é objeto de

paixão realmente é”.

Na sequência da pesquisa, foram apresentados textos de vários gêneros: crônicas,

contos, poesias, lendas, fábulas e novelas, dos alunos fizeram leitura para indicar

suas preferências. O trabalho realizado envolvia leitura em sala de aula, escolha de

textos usando livros na biblioteca, pesquisa de textos literários no laboratório de

informática. Portanto, vários ambientes para um mesmo fim, e a cada espaço

escolhido uma descoberta diferente ou uma certeza constatada, o incentivo à leitura

não pode desaparecer da escola. Os alunos frequentavam pouquíssimo a biblioteca

e o laboratório de informática e utilizar esses espaços para procurar textos literários

foi motivador. Os textos escolhidos fizeram parte da primeira amostra do corredor

literário, onde os materiais separados pelos alunos foram expostos para que outros

10

alunos pudessem ter um momento de leitura quando passam pelo corredor ou

quando estão em horário de intervalo. Todos os alunos, alguns mais entusiasmados,

outros menos, participaram das atividades, que em sua grande maioria contribuiu

para a volta desses alunos ao universo de leituras, adormecido em seus

inconscientes pela falta de tempo e pela falta de oportunidade.

O acesso à leitura não ocupa dentro da sociedade um papel de destaque, mas é

dever da escola estar a todo momento realimentando ações que possam reacender

novas possibilidades de aproximação entre leitores e o mundo de leituras. Há vários

gêneros textuais, e dar oportunidade aos alunos de conhecê-los é reconhecer na

possibilidade do começar a ler por gostar do que está sendo lido, um aliado para a

abertura de novas possibilidades de leituras.

Observe-se a tabela de dados que indica a preferência dos gêneros literários nas

diversas faixas etárias e ensino .

Em análise, percebe-se que as preferências literárias ficaram entre poesia e

crônicas tanto no Ensino Fundamental como no Médio. A poesia, como relata

11

Gráfico 2: Preferências literárias por faixa etária

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

Masc. Fem. Fund. Médio -18 18 à 25 26 à 30 31à40 41à 50 51à 60 61

Contos

Crônicas

Poesias

Lendas

Fábulas

Novelas

Micheletti (2006, p.22), “oferece ao leitor possibilidades para pensar a língua e sua

carga expressiva (…) traz para o leitor uma carga de informação e, ao mesmo

tempo, o conduz a uma reflexão mais ampla que envolve questões existenciais até o

posicionamento do sujeito-leitor no seu grupo social.”

Analisando os dados, é possível perceber que 68% dos alunos do Ensino

Fundamental preferiram ler os poemas, os títulos trabalhados contemplavam vários

autores: Pedro Bandeira, Cecília Meireles, Roseana Murray, Vinícius de Moraes,

Cora Coralina, Ferreira Gullar, Carlos Drummond de Andrade, José Paulo Paes,

Manuel Bandeira, Paulo Leminsky e Thiago de Mello. Da obra de Thiago de Mello

destacam-se os poemas Milagre que dói, O pão de cada dia e Diário de um

brasileiro, em que os alunos se interessaram muito pela temática abordada, uma vez

que os textos falam dos problemas como roubalheira na política e a falta de políticas

públicas que coíbam o uso de drogas entre os jovens, muitos já perdidos no vício. O

poema O pão de cada dia, o mais votado entre os alunos, é um retrato do cidadão,

pessoas que lutam como esses próprios alunos, que travam uma luta por dia para

ganhar o seu pão, e só estão na escola porque a vida lhes impõe necessidades para

garantir o emprego ou a sobrevivência, sendo assim o acesso aos bancos escolares

torna-se imprescindível, tem-se a impressão que os alunos se viram naqueles

versos.

Que o pão encontre na boca

o braço de uma canção

construída no trabalho

Não a fome fatigada

de um suor que corre em vão

Que o pão da vida não chegue

sabendo o resto da luta

e o troféu da humilhação...

Mais do que flor, seja fruto

que maduro se oferece,

sempre ao alcance da mão.

Da minha e da tua mão...

12

Para o Ensino Médio, a pesquisa aponta a preferência para o poema de Carlos

Drummond de Andrade, Igual e desigual, no qual o autor traça um paralelo de

situações em que quase todos os fatos são iguais, começando com uma certeza

envolta em desconfiança: ”Eu desconfiava./ Todas as histórias em quadrinhos são

iguais(...) Todos os políticos são iguais (...)Todas as fomes são iguais (…) A morte é

igualíssima (…) Contudo o homem não é igual a nenhum outro homem, bicho ou

coisa(...) Nada é igual a nada./ Todo ser humano é um estranho impar. A faixa etária

do público analisado é dos 26 a 30 anos, em sua maioria mulheres, cuja indicação

pode ter ocorrido devido à simplicidade dos versos, elas têm a certeza de que tudo

realmente é assim, igual, e do ser humano tudo se pode esperar de atrocidades,

loucura ou amor ao próximo. Durante todo o processo de leitura, há a troca de

informações, esclarecimentos, posicionamentos, que vão encaminhando as

possíveis leituras que os alunos fazem diante da diversidade de textos.

Para Fávero (2008) apud Stoltz (2008, p.336), quando se fala do sujeito adulto, a

indicação de que este é “capaz de enxergar uma “paisagem” maior, que envolve o

tempo e as pessoas existindo antes e depois dele, o que envolve ultrapassar a

própria realidade, trata-se de entrar na realidade do outro e desenvolver conceitos

completos de self,” (que neste sentido poderia ser encarado como a individualidade

ou a sua essência), de sucesso, de continuidade pessoal, e assim por diante.

Considerando os dados que aparecem na pesquisa, os alunos leram textos

literários, uns em maior quantidade que outros, e revelam que trazer literatura para

escola é peça essencial para a formação de leitores. Os contos ocupam o terceiro

lugar na lista de preferências. O mais lido foi “Assim caminha a humanidade de

Rachel de Queiroz que fala sobre o trânsito das cidades com seus carros,

engarrafamentos e o tempo gasto nas viagens. Um trecho bastante comentado entre

os alunos faz lembrar o dia a dia dos alunos que moram na região metropolitana e

todos os dias enfrentam um trânsito lento e caótico que os fazem sair de casa de

madrugada, mais uma vez eles optaram por temas que os aproximam de suas

realidades: ”Hoje em dia, leva-se mais tempo viajando de casa para o trabalho do

que no trabalho propriamente dito. E, como os patrões exigem as suas oito horas,

13

tem-se que sair de casa em plena madrugada, chegar em casa depois das dez da

noite. Quem mora em subúrbio conhece essa tragédia. Os ônibus mesmo, que

poderiam ser um grande recurso, têm os seus espaços disputados furiosamente

pelos carros e se embaralham, retardam e engarrafam na confusão geral.”

(fragmento do texto “Assim caminha a humanidade”)

Nossa cidade é considerada cidade dormitório, devido justamente ao cotidiano dos

trabalhadores, que saem cedo de casa, chegam atrasados na escola, isso quando

conseguem estudar, ou simplesmente em sua grande maioria só vem para casa

dormir.

Cabe ressaltar, que a literatura segundo Proença ( 2007, p.36) “é antes de tudo, um

objeto da linguagem. E não nos esqueçamos de que o texto literário envolve

dimensões históricas e ideológicas. É, portanto, sobretudo por força da sua

dimensão conotativa que a obra literária se abre as mais variadas interpretações”

Por isso a literatura é importante no currículo escolar: “o cidadão, para exercer

plenamente sua cidadania, precisa apossar-se da linguagem literária, alfabetizar-se

nela, tornar-se seu usuário competente, mesmo que nunca vá escrever um livro:

mas porque precisa ler muitos”. (LAJOLO, 2002, p. 106).

Entre 40 e 50 anos, os alunos também preferiram ler poesias, crônicas e lendas. As

lendas, nessa faixa etária, tiveram uma condição de simplificar uma realidade, deixar

mais tranquilo, pois usa uma linguagem simples, baseando-se na fantasia ou ficção

para explicar algumas situações ou descobertas, nas quais se misturam imaginação

e realidade dentro do fato apresentado. Dentre os títulos trabalhados, destacam-se:

A Lenda do Mate, A Origem do Dia, A História do Guaraná. As história contadas

nessas lendas retratam o folclore, ou a cultura popular, sendo este um modo de

expressão que reflete, de maneira simples, o sentimento, crenças e histórias de um

povo de determinadas regiões. Ao ser transmitido através das gerações, vai

compondo a memória da nação, combinando fatos reais, históricos com fatos irreais,

fruto da imaginação, deixando na lenda esse misto de realidade e imaginação que

14

dão corpo e alma às histórias brasileiras. Os alunos dessa faixa etária,

principalmente os de 50 anos, que escolheram esse tipo de texto, procuram textos

curtos, histórias engraçadas ou imaginárias, porque queriam ler algo tranquilo e de

fácil entendimento, sem preocupação. Leram várias lendas durante a aula e com

certeza teriam mais histórias para contar aos netos em casa. Essas escolhas nos

fazem refletir que o adulto procuram cumprir o trabalho proposto sem ter que se

estressar, leem o que querem, usando o critério que lhes convém, mas não deixam

nunca de se aventurar na tarefa de leitura, e afirmações do tipo “na próxima vez vou

ler esse grande aí também” sempre aparece. O hábito de leitura entre esses

estudantes é sempre muito escasso, a maioria passou décadas fora da escola e o

acesso à leitura fora do contexto escolar é ainda mais precário do que dentro dele.

Em nossa pesquisa, esse fato fica evidenciado neste gráfico, que determina o tempo

que este grupo ficou fora da escola e em que época mais leram:

15

Gráfico 3: Tempo fora da escola

14%

42%25%

10%

3%

6%

Tempo fora da escola

1 a 3 anos

4 a 8 anos

9 a 15 anos

16 a 20 anos

21 a 25 anos

26 a 30 anos

nda

A maioria de nossos alunos estão há pelo menos 10 anos fora da escola, e o

distanciamento do mundo da leitura de livros é bastante acentuado nesse período,

pois a entrada no mundo do trabalho e os afazeres familiares tomam todo o tempo,

e a leitura fica em último plano. Percebe-se, analisando-se os dois gráficos, que a

idade em que os alunos mais leram foi entre os onze e quinze anos. Idade em que

ainda estavam regularmente em bancos escolares. E se o outro percentual de maior

leitores é entre os 16 e 20 anos, isso determina que a maioria dos alunos tem na

média de trinta a quarenta anos e ficaram sem ler com mais regularidade há pelo

menos 20 anos, portanto, ter os alunos determinando suas escolhas é respeitar o

seu tempo diante desse desafio de voltar a ler, sejam livros, crônicas, poesias,

lendas ou contos. Quando damos a possibilidade de escolher entre os vários

gêneros apresentados, damos significado ao momento de leitura. Para Bakthin o

conteúdo tem um papel especial para quem está pensando, carregado de emoções

e sensações que fazem o indivíduo afirmá-lo de maneira emocional-volitiva. Nessa

colocação, Bakthin afirma que um conteúdo somente é significativo quando

estabelece com o ser um interação emotiva que afirme o que se percebe como

verdade, só tem sentido se o ser não é indiferente a ela.

Nenhum conteúdo seria realizado, nenhum pensamento seria realmente pensado se não estabelecesse uma interconexão essencial entre conteúdo

16

Gráfico 4: Idade em que mais leu

3%

14%

29%

27%

7%7%

10%

3%

Idade em que mais leu

5 aos 7 anos

8 aos 10 anos

11 aos 15 anos

16 aos 20 anos

21 aos 25 anos

26 aos 30 anos

31 aos 40 anos

depois dos 40 anos

e seu tom emocional-volitivo, isto é, seu valor realmente afirmado para aquele que pensa. O experimentar ativo de uma experiência, o pensar ativo de um pensamento, significa não estar de modo algum indiferente a ele, significa afirmá-lo de maneira emocional-volitiva.(BAKTHIN,1992 apud Tezza, 2003, pág.23).

Em alguns pontos, a pesquisa apresenta algumas contradições, pois há a afirmação

de que 65% dos alunos entrevistados gostam de ler, e somente 25% não gostam,

porém quando se referem aos empecilhos que impedem a leitura, 63% apontam a

falta de tempo como fator principal. Esses percentuais não se completam, pois

temos no balanço final somente dois por cento dessas pessoas que gostam de ler

efetivamente praticam a leitura e os motivos apontados são vários, como mostram

os dados da pesquisa:

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Gráfico 5: Gosta de ler?

65%

25%

10%

0%

Gosta de Ler ?

Sim

Não

às vezes

nda

Gráfico 6: Barreiras para a leitura?

63%

4%

8%

14%6% 5%

Barreiras para a leitura

Falta de tempo

Falta de interesse

Preguiça

Prefere outro entreterimento

Falta de dinheiro

Mais uma vez, esse público trabalhador demonstra reconhecer a importância da

leitura, mas não destina um tempo para essa prática, ser leitor implica determinação

e escolhas que acabam por ser minadas pela correria do dia a dia. Os dados

indicam que 14% do entrevistados preferem fazer outra coisa e não encaram a

leitura como entretenimento, e todas as alternativas que são subjetivas como: falta

de interesse e preguiça superam o valor econômico, pois a falta de dinheiro fica em

último lugar nessa análise. Logo se vê que só dizer que gosta de ler não basta, é

preciso reagir e mudar as atitudes, tanto dos alunos como dos professores, que têm

que incentivar o trabalho com leitura, é necessário abrir as portas dos espaços

escolares para práticas que envolvam leitura de livros e textos, só a movimentação

garantirá o amplo acesso e a firmação de novos leitores. Maria Antonieta Cunha,

doutora em Letras, afirma em uma reportagem à revista Aprende Brasil, de março de

2006, que o principal é ter em mente que a leitura do texto deve ser associada à

leitura da vida. “Se conseguirmos conversar com nossos alunos sobre a vida de

cada um e sobre a humanidade, certamente formaremos leitores.”

Ter em sala momentos de círculo de leitura é também uma alternativa que incentiva

a leitura, pois ver o amigo contar o que leu torna a aprendizagem mais próxima e

aguça o interesse pelo assunto, até porque isso serve para trocar ideias

posteriormente. Um dado da pesquisa realizada em sala revela que a indicação de

colegas é um dos critérios para a escolha de um livro para ler.

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Gráfico 7: Critérios de escolha de um livro?

63%7%4%

18%8%

Critérios de escolha de um livro

Indicação de colega

indicação de revistas

lista de bestsellers

Quando a história vira filme

nda

É comum no universo escolar realizarmos ações pautadas na experiência de outros.

No mundo adulto que cerca as escolas de EJA esse posicionamento também

aparece, apesar de serem adultos e tomarem decisões próprias, por muitas vezes

as ações tendem a ser menos ofensivas quando alguém já experimentou. Em sala

de aula, os alunos, quando trabalharam leitura de textos de vários autores, leram

mais porque o outro indicou do que por escolhas próprias, na maioria das vezes, não

sabia o que ia escolher, era como dar um tiro no escuro e, por isso, a indicação era

mais segura e menos traumática.

Os alunos que liam porque a história virou filme, 18% da amostra, eram os mais

novos, que tinham mais tempo livre, estavam a menos tempo fora da escola, e a

leitura de romances longos ainda fazia parte de alguma rotina que ainda mantinham.

Em uma reportagem sobre leitura da revista Veja, de 18 de maio de 2011, o enfoque

dado é justamente sobre a avalanche de novos leitores trazida pela era Harry Potter,

Crepúsculo, etc. Esse fenômeno aconteceu justamente quando o mundo começava

a pensar que a era do livro impresso estava prestes a acabar. O jornalista Bruno

Meier, em sua reportagem relata:“Na virada do século XX para o XXI, o vaticínio até

parecia razoável: o sistema de ensino em franco declínio e sua tradição de fracasso

na missão de formar leitores, o pouco apreço dado à instrução como valor social

fundamental e até dados muito práticos, como a falta e a pobreza de bibliotecas

públicas, o alto preços dos exemplares impressos aqui, conspiravam (conspiram

ainda) para que o contingente de brasileiros dados aos livros minguasse de maneira

irremediável”. Mas isso não vem acontecendo, a leitura não se tem tornado

obsoleta, toda essa invasão de bestsellers, apreciados pela juventude, tem aberto

caminho para outros títulos mais clássicos, movimentando o mercado livreiro, que

conseguiu dar a volta por cima, contrariando todas as expectativas. Vale salientar

que na compra que os alunos adultos fizeram de livros para a biblioteca todos esses

títulos importados: Harry Potter, Crepúsculos, A última música, Querido John, etc

também foram contemplados em suas escolhas, bem como os de literatura brasileira

de autores trabalhados em sala.

Analisando mais uma divergência dos dados levantados, quando a temática foi a

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motivação para ler, apesar das considerações anteriores demonstrarem que a

indicação do colega determina escolhas, o gráfico mostra que os alunos

isoladamente disseram que a “vontade própria é quem motiva a ler”. O resultado da

pesquisa demonstra isso e afirma que a necessidade de saber sobre algum assunto

é um veículo condutor de motivação para o prazer ou necessidade de ler.

Outro dado interessante a ser analisado é que os entrevistados declararam ter livro

de literatura em casa, em um percentual até bem elevado, o que caracterizou que

não há uma constância em comprar livros, mas todos têm pelo menos um em casa,

seja fruto de uma aquisição antiga ou presente, porém quando perguntados sobre

compra de livros, 49% afirmaram não comprar livros de literatura, conforme

apresentado no gráfico abaixo:

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Gráfico 8: Motivação para ler

56%

7%

7%

5%

25%

Motivação para ler

Vontade própria

Iniciativa do professor

Ir à biblioteca

Ir a uma livraria

A necessidade de conhecer algum assunto

Adquirir um livro de literatura não faz parte das ações dessa população, até porque ,

tendo em média de 2 a 3 filhos e ganhando em média de 1 a 3 salários mínimos, a

compra de livros é quase um luxo.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As experiências relatadas mostram a importância de se pensar em ações frequentes

que evidenciem a importância da leitura, pois o que não é visto não é lembrado. Nas

APEDs (Ações Pedagógicas Descentralizadas), por exemplo, turmas de EJA

Fundamental e Médio que funcionam em outras escolas, os livros de literatura são

levados pela Coordenação Itinerante e emprestados semanalmente pelos alunos.

Na SEDE, além da biblioteca que tem um acervo para empréstimo, temos o corredor

literário, onde os alunos podem ler textos de vários gêneros trocados mensalmente.

A biblioteca do CEEBJA passou a ser um local frequentado no período noturno, a

biblioteca municipal nos empresta caixas de livros para disponibilizarmos para os

alunos, porque o acervo da escola é pequeno. Acontecerá todos os anos a feira

interna de livros para os alunos comprarem mais alguns exemplares para a escola,

pois este projeto PDE passou a fazer parte da Projeto Político Pedagógico para que

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Gráfico 9: Compra livros de literatura?

28%

49%

14%9%

Compra livros de literatura ?

Sim

Não

às vezes

Raramente

as ações incentivem novas leitores o tempo todo, pois recebemos um aluno a cada

dia. Vygotsky (1984, p.76) já afirmava que a aprendizagem só é possível quando o

que se pretende ensinar materializa-se na interação social entre sujeitos. Tanto o

professor como os alunos precisam ver essa necessidade e não desistir, a todo

momento se motivarem e serem motivados por esse exercício que leva a vários

países, lugares, situações em um simples mudar de página. Na EJA, trabalha-se

com jovens, adultos e idosos em uma perspectiva de atender a diversidade que

desafia os professores constantemente. Dentro dessa consideração, Giroux (1995,

p.88) faz uma importante afirmação:

Os/as educadores não poderão ignorar, no próximo século, as difíceis questões do multiculturalismo, da raça, da identidade, do poder, do conhecimento, da ética e do trabalho que, na verdade, as escolas já estão tendo de enfrentar. Essas questões exercem um papel importante na definição do significado e do propósito da escolarização, no que significa ensinar e na forma como os/as estudantes devem ser ensinados/as para viver num mundo que será amplamente mais globalizados, high tech e racialmente diverso que em qualquer época da história.

Contudo a escola não deixará de estar permanentemente lembrando e pontuando

ações voltadas para a leitura, que é e sempre será uma necessidade do ser

humano. Quando trabalhamos com literatura, ela cria na verdade significantes e

funda significados. Toda mensagem traz uma intenção para quem lê e para quem

escreve e traz, segundo Proença ( 2007, p. 49), a marca de uma variabilidade

específica, seja em relação aos discursos individuais, seja em termos de

representatividade cultural. Ao trabalhar com gêneros, ganha-se um aliado na

Língua Portuguesa o que possibilitará ao aluno todas as condições necessárias para

desenvolver a sua competência de leitura. As palavras de Karwoski (2004, p,121)

revelam a viabilidade de se trabalhar com gêneros procurando lidar com o uso

autêntico da língua.

O domínio dos diferentes gêneros pode auxiliar, o aluno a ser legitimo “dono” de sua fala, ou seja, pode levar o aluno a ocupar, com maior consciência, os diferentes lugares a partir dos quais pode falar e escrever. Além disso, o aluno, a partir dos trabalhos com diferentes gêneros textuais, poderá tanto exercitar a reprodução dos gêneros, como também poderá reinventá-los por meio de exercícios de práticas de linguagem proporcionadas na/pela escola, durante as atividades de ensino/aprendizagem de Língua Portuguesa e outras disciplinas.

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Ao conduzir essa trajetória, tendo como prioridade apresentar e apontar as

preferências literárias, temos a possibilidade de trazer, por meio da beleza de

algumas obras, a oportunidade de navegarmos em inúmeras leituras que podem

firmar as novas marcas enquanto leitor, renascer o gosto pela leitura tendo a

literatura como possibilidade de assimilação e recriação.

Bom seria se conseguíssemos que a leitura fizesse parte da vida como algo que não

pudesse faltar e que isso desse a nossa vida a condição de sustentabilidade. Ziraldo

poetizou: É também dever da escola indicar diretrizes e incentivar a prática da

leitura. “... a tônica da escola deveria ser a leitura, num trabalho que fizesse do

hábito de ler uma coisa tão importante quanto respirar.”

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