[josé william craveiro torres e maria ednilza moreira] josé de alencar, Ícones literários de...
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José de Alencar; Iracema; Romance; Romantismo; Fortaleza; Ícone Literário; Turismo Cultural; Poder Público; Universidade Federal do Ceará; Monumentos; Estátuas; Programa Iracema; Projetos.TRANSCRIPT
IRACEMA E ALENCAR, ÍCONES LITERÁRIOS DE
FORTALEZA
José William Craveiro Torres1, Maria Ednilza Oliveira Moreira2
1Universidade de Coimbra, CAPES; [email protected] Federal do Ceará; [email protected]
Resumo
Fortaleza (Ceará) é um dos destinos turísticos mais procurados do Brasil, por
conta dos seus 34 km de litoral. A sua praia mais conhecida é a de Iracema, que leva o
nome da personagem mais famosa de José de Alencar. Pela cidade existem monumentos
alusivos à Iracema, bem como muitas outras homenagens ao seu criador. Estando tão
ligados à história e à cultura de Fortaleza, seria impossível que o autor e sua
personagem não tivessem se tornado tão emblemáticos para a cidade. O presente ensaio
tem, portanto, o objetivo de apresentar os esforços realizados pelo Poder Público
(executivo e legislativo) e pela Universidade Federal do Ceará para tornar,
definitivamente, Iracema e José de Alencar ícones literários de Fortaleza, por meio da
valorização da Literatura Brasileira/Cearense e do fomento ao turismo em torno de
locais e de monumentos relacionados à personagem e ao escritor.
Palavras-chave: Iracema; José de Alencar; Fortaleza; Literatura Brasileira;
turismo cultural.
Abstract
Fortaleza (Ceará) is one of the most visited cities in Brazil. Its most famous
beach is “Praia de Iracema” (Iracema Beach): the beach’s name is a tribute to Iracema, a
female character created by José de Alencar. In the city there are statues of Iracema and
many tributes to Alencar. Connected to the history and culture of Fortaleza, the author
and his character are very important to city. This essay aims to present the initiatives of
the Government and the initiatives of the Federal University of Ceará to transform
Iracema and José de Alencar in literary icons of Fortaleza through cultural tourism.
Keywords: Iracema; José de Alencar; Fortaleza; Brazilian Literature; cultural
tourism.
1. INTRODUÇÃO
Fortaleza, capital do Ceará, é um dos destinos turísticos mais procurados do
Brasil, por conta dos seus 34 km de litoral e de seu sol, que brilha forte praticamente o
ano inteiro. A sua praia mais conhecida é a de Iracema: nela podemos encontrar bares,
restaurantes, barracas com apresentações musicais e com shows de humor, bem como
hotéis de luxo. Exatamente pela sua importância, a Secretaria de Cultura do município
denominou-a “Bem de Relevante Interesse Cultural” e, para fazer jus ao espaço, tem
adotado iniciativas capazes de expandir o turismo cultural na região.
Uma das iniciativas constitui-se, obviamente, no resgate da história da cidade,
motivo pelo qual foram instalados, recentemente, em um dos espigões da praia,
dezessete totens com trechos da obra Iracema, de José de Alencar, para mostrar aos
turistas e aos próprios fortalezenses como se deu a origem do povo cearense.
Pela cidade existem ainda outros monumentos referentes à Iracema, bem como
muitas outras homenagens a Alencar: teatro, praça, bairro... O presente ensaio tem,
portanto, o objetivo de apresentar os esforços realizados pelo Poder Público (executivo
e legislativo) e pela Universidade Federal do Ceará para tornar, definitivamente,
Iracema e José de Alencar ícones literários de Fortaleza, por meio da valorização da
Literatura Brasileira/Cearense e do fomento ao turismo em torno de locais e de
monumentos relacionados à personagem e ao escritor.
2. José de Alencar: vida e obra
José Martiniano de Alencar, ou simplesmente José de Alencar, nasceu na cidade
de Messejana, hoje bairro de Fortaleza, em 1829, e faleceu no Rio de Janeiro em 1877.
Filho do ex-padre José Martiniano de Alencar, um dos maiores nomes da política liberal
do Brasil Império, mudou-se com a família, ainda criança, para a Corte (Rio de Janeiro),
onde realizou seus estudos primário e secundário. Entre os anos de 1845 e 1850, cursou
Direito: parte em São Paulo, parte em Olinda (Pernambuco). Naquela época, escreveu o
seu primeiro romance, Os Contrabandistas, queimado acidentalmente por um colega de
quarto. Graduado, retornou ao Rio de Janeiro, para advogar, mas foi completamente
absorvido pela Literatura: atuou como cronista do Correio Mercantil e, depois, como
redator do Diário do Rio de Janeiro. Nesse periódico, sob o pseudônimo de Ig.,
escreveu, em 1856, artigos polêmicos sobre A Confederação dos Tamoios, que lhe
renderam muitos dissabores, ao longo de toda a vida, e pelos quais pagaria muito caro:
ficaram conhecidos, esses artigos, por Cartas sobre a Confederação dos Tamoios.
Ainda em seu espaço de crítico, destaque-se a posição de José de Alencar sobre o
poema de Gonçalves de Magalhães, que então inaugurava a vertente indianista no
Romantismo brasileiro, mas apresentava falhas quanto aos aspectos formais e
conteudísticos.
Pelo Diário do Rio de Janeiro foram publicados os seus primeiros “romancetes”
(ou novelas) em fins da década de 50: Cinco Minutos, em 1856, e A Viuvinha, em 1857.
O Guarani, seu primeiro romance indianista, também saiu por este periódico em 1857.
Naquele primeiro momento, a prosa de José de Alencar foi fortemente marcada pelo
viés historicista. Ainda na segunda metade da década de 50, o autor de Iracema
escreveria para o Teatro: as comédias O Crédito, Demônio Familiar, Verso e Reverso;
os dramas As Asas de um Anjo e Mãe; e o libreto da ópera bufa A Noite de São João.
Tudo foi encenado no Teatro Ginásio Dramático do Rio de Janeiro.
Na primeira metade da década de 60, escreveu: As Minas de Prata, entre 1862 e
1866; Lucíola. Perfil de Mulher, em 1862; Diva. Perfil de Mulher, em 1864; e Iracema.
Lenda do Ceará, em 1865. Na segunda metade, dedicou-se a opúsculos de natureza
política, por ter sido eleito deputado provincial pelo Ceará, após a morte do pai, em
1860, e por ter ocupado a pasta da Justiça no ministério conservador de 1868-1870. São
desta época, portanto: Ao Imperador – Cartas Políticas de Erasmo, Ao Imperador –
Novas Cartas Políticas de Erasmo, 1865; Ao povo – Cartas Políticas de Erasmo, 1866;
O Juízo de Deus. Visão de Jó, 1867; e O Sistema Representativo, 1868.
No primeiro lustro da década de 70, José de Alencar retomou a ficção. Saíram-
lhe da pena os seguintes romances: O Gaúcho e A Pata da Gazela, em 1870; Sonhos
d’Ouro e Til, em 1872; Alfarrábios (“O Ermitão da Glória” e “O Garatuja”) e A Guerra
dos Mascates, em 1873; Ubirajara, em 1874; Senhora e O Sertanejo, em 1875. Ainda
em 1875, um drama, o derradeiro, intitulado O Jesuíta.
Em 1877, o ilustre autor veio à Europa para se tratar da tuberculose, mas não
obteve êxito: faleceu no mesmo ano, no Rio de Janeiro. Postumamente, vieram a
público o seu romance Encarnação, ainda em 1877, e a sua autobiografia, Como e Por
Que Sou Romancista, em 1893.
3. Iracema
Iracema, a segunda obra indianista de José de Alencar, publicada em 1865, é
uma história romantizada com fortes traços de realidade – daí ser chamada de “lenda” –
da ocupação portuguesa no Ceará, no início do século XVII. Poderíamos dizer, também,
que é uma obra alegórica, porque representa, a partir de um caso específico, o que
aconteceu, ao longo dos séculos XVI e XVII, por toda a América: o encontro dos
europeus com os nativos, com os indígenas; o processo de ocupação do território para
posterior exploração; a colonização da América por parte do Velho Mundo; e,
principalmente, a formação de um novo povo, formado da mistura entre europeus e
nativos. Talvez por isso, “Iracema”, que, de acordo com o seu autor, significa, em
guarani, “lábios de mel”, seja o anagrama perfeito de “América”.
O livro conta a história de Iracema, índia com a qual o colonizador português
Martim Soares Moreno, que de fato existiu, teria vivido um romance. Desse enlace
amoroso teria nascido Moacir, o primeiro cearense, o fruto do amálgama de duas raças;
em suma, o típico brasileiro ou, já noutra escala, o verdadeiro americano.
O argumento da narrativa, como deixou claro o próprio autor, é histórico: trata-
se da ocupação e da colonização do Ceará pelos portugueses, sob o comando de Martim
Soares Moreno, com o apoio dos índios Potiguara, que habitavam o litoral e que eram
chefiados por Jacaúna e por seu irmão Poti, que realmente existiram. A narrativa faz
alusões, ainda, às lutas que os portugueses e a tribo dos Potiguara travavam contra os
demais povos europeus que ameaçavam a soberania portuguesa sobre o território;
sobretudo contra os franceses, que eram sempre apoiados por tribos indígenas do
interior, como os Tabajara, os Guaraciaba e os Tupinambá. No entanto, prevalece, na
narrativa, o ficcional: o encontro de Iracema e Martim; a fuga de ambos, em direção ao
litoral, retirando-se da tribo de Iracema, formada pelos índios Tabajara; a solidão e a
consequente tristeza da índia, quando Martim dela se afastou para batalhar contra os
“homens brancos”, os Guaraciaba e os Tupinambá, que ameaçavam a soberania
portuguesa pelas terras do litoral fortalezense; o nascimento de Moacir, “filho do
sofrimento”; a morte de Iracema; e a triste despedida de Martim da costa cearense,
levando consigo o seu filho e o fiel cão Japi.
De fato, o que José de Alencar parece ter feito, em Iracema, foi um romance
histórico nos moldes dos de Alexandre Herculano ou dos de Victor Hugo, em que
locais, personagens e fatos apresentados são reais, mas sem que isso interfira na
liberdade do escritor em (re)criar as personagens de seu livro, geralmente baseadas no
que a tradição oral, ou seja, a lenda – não a História –, diz sobre elas. As localidades
cearenses apresentadas pelo narrador, ao longo de toda a obra, realmente existem: Ipu,
Ibiapaba, Ibiapina, Acaraú, Camucim, Meruoca, Uruburetama, Iguape, Mocoribe,
Batuireté, Quixeramobim, Maranguab, Porangaba, Sapiranga, Aratanha, Guaiúba,
Pacatuba, entre outras.
4. Os esforços do Poder Público para manter viva a memória de Alencar
A primeira grande homenagem a José de Alencar, em Fortaleza, foi feita em 17
de junho de 1910, com a inauguração, no centro da cidade, de um teatro que leva o seu
nome. Isso certamente se deu pelo fato de Alencar ter sido, além de romancista, um
grande dramaturgo; sem dúvida, o maior nome cearense das Letras àquela época. O
Theatro José de Alencar, que é o principal teatro do Ceará, é um equipamento cultural
administrado pelo Governo do Estado. Mais que um simples edifício, trata-se, na
verdade, de um verdadeiro complexo cultural, formado por dois prédios principais – o
primeiro, em estilo neoclássico, com um auditório para 120 pessoas; o segundo, em
estilo art noveau, a sala de espetáculos propriamente dita, com capacidade para 800
pessoas – e pelos jardins de Burle Marx, que abrigam uma área aberta, a Praça “Mestre
Pedro Boca Rica”, o Centro de Artes Cênicas do Ceará “Padaria Espiritual”, a Sala de
Teatro “Nadir Pápi Saboya” e o Teatro “Morro do Ouro”. Podemos encontrar, ainda,
nesse complexo, a Biblioteca Carlos Câmara, a Galeria Ramos Cotôco, quatro salas de
estudo e ensaio, e a Sala de Música “Jacques Klein”. O Theatro José de Alencar abriga,
também, a Orquestra de Câmara Eleazar de Carvalho, o Curso “Princípios Básicos de
Teatro e Circo” e oficinas de cenotécnica, iluminotécnica e figurino.
A segunda homenagem ao ilustre cearense veio da Câmara Municipal de
Fortaleza, que decidiu, dezenove anos após a construção do teatro, nomear a praça que
fica em frente a esse equipamento cultural de “Praça José de Alencar” (antes, “Praça
Marquês do Herval”). Àquela homenagem seguiu-se a construção de um monumento no
centro da praça, em granito branco, com seis metros e meio de altura e quatro de
largura, no qual podemos encontrar uma estátua em bronze do escritor. Ao redor do
monumento, podemos ver, em baixo relevo, cenas dos dois principais romances
indianistas de José de Alencar: O Guarani e Iracema. A autoria do monumento, que foi
inaugurado em 1º de março de 1929, para comemorar o primeiro centenário de
nascimento do romancista e dramaturgo, é do paulista Humberto Cozzo.
A terceira homenagem a José de Alencar também veio da Câmara Municipal de
Fortaleza, que decidiu, em 1930, após um concurso público, mudar o nome da “Praia do
Peixe” para “Praia de Iracema”, porque teria sido mais ou menos naquela praia em que a
índia teria ido morar com Martim Soares Moreno, ao chegar à costa cearense. O Bairro
no qual se encontra a Praia de Iracema, que leva o mesmo nome da praia, também traz
homenagens a José de Alencar: a maior parte das suas artérias (ruas e avenidas) alude a
tribos indígenas: Tabajara, Cariri, Potiguara etc.
A quarta homenagem foi feita também por meio de Iracema: trata-se da
escultura mais antiga, em Fortaleza, criada em torno da personagem. De autoria do
pernambucano Corbiniano Lins, e inaugurada em 24 de junho de 1965 pelo Presidente
da República Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, a “Estátua de Iracema”,
localizada na enseada do Mucuripe, traz a imagem da índia, em pé, em frente a uma
jangada na qual podemos ver, sentados, Martim, o filho Moacir, dentro de um cesto,
entre as pernas do pai, e o fiel cão deste, Japi, como se estivessem se afastando da costa
cearense: cena que pode ser percebida tanto no início quanto no fim da obra. Esta
estátua foi erigida para homenagear o centenário do livro. Em abril de 2006 foi
recuperada pelo poder público municipal para a comemoração dos 280 anos da cidade
de Fortaleza.
A quinta homenagem a José de Alencar também veio em forma de Iracema: a
estátua “Iracema Guardiã”, do artista plástico cearense Zenon Barreto. Esculpida em
ferro no ano de 1960, ela foi entregue à Prefeitura de Fortaleza cinco anos depois,
justamente no ano do centenário da obra. Deveria ter sido inaugurada exatamente em
1965, mas, não sabemos por qual motivo, somente veio a público em 1996. Esta estátua
fica no aterrinho da Praia de Iracema. Ela retrata a heroína de frente para o mar,
segurando um grande arco, em posição de batalha. Em 2012, a estátua foi restaurada,
depois de ter sido quase destruída por sucessivos atos de vandalismo.
A sexta homenagem veio de uma sociedade filantrópica: o Rotary Clube de
Fortaleza. O marco rotário traz a personagem Iracema sobre um globo terrestre,
segurando a insígnia da instituição. Denominada de “Índia Iracema”, a estátua, que fica
na Avenida Castelo Branco, é obra do artista plástico cearense Descartes Gadelha. Foi
inaugurada em 2002.
A sétima homenagem a José de Alencar foi feita pelo Governo do Estado do
Ceará, que, a partir de 2011, nomeou de “Iracema” um dos palácios destinados à
residência do Governo. Antes, porém – para sermos mais exatos, a partir de 15 de
fevereiro de 2005 –, já havia, nas dependências do referido Palácio, uma estátua da
personagem, esculpida em resina acrílica e revestida por 92 mil pedaços de cristal pelo
artista cearense Francisco Zananzanan.
A oitava homenagem a José de Alencar foi feita pela Prefeitura de Fortaleza, em
1º de maio de 2004, na gestão de Juraci Magalhães, para comemorar os 278 anos da
cidade e os 175 anos de nascimento do escritor. Trata-se de uma estátua de Iracema no
centro da Lagoa de Messejana, feita por Alexandre Rodrigues a partir dos traços da
modelo cearense Natália Nara, que possui feições indígenas. A modelo foi escolhida em
meio a 2.760 mulheres que se candidataram a um concurso promovido para esse fim
pelo Sistema Verdes Mares de Comunicação. A estátua “Iracema, musa do Ceará”,
como é chamada, retrata a índia sentada numa pedra, empunhando a lança com uma
mão e banhando-se, por meio de uma cuia, com a outra: seria mais uma das cenas do
romance.
A nona homenagem a José de Alencar veio de uma mobilização popular puxada
por um artista local, João Netto. O comediante conseguiu, junto a seus vizinhos, mudar
de “Alagadiço Novo” para “José de Alencar” o nome do bairro. O projeto foi
apresentado à Câmara Municipal de Fortaleza pela vereadora Fátima Leite e sancionado
em dezembro de 2007. Nesse bairro, que pertencia à antiga cidade de Messejana, fica a
propriedade onde nasceu José de Alencar, administrada, atualmente, pela Universidade
Federal do Ceará – UFC.
Estando de tal forma presente no imaginário do povo cearense, notadamente no
do povo fortalezense, a personagem Iracema foi, em dezembro de 2011, instituída como
“Ícone Cultural do Município”, por força da lei conduzida pelo vereador Guilherme
Sampaio, do Partido dos Trabalhadores – PT. A partir de então, o dia 1º de maio, data
de nascimento de José de Alencar, ficou instituído como o Dia de Iracema. Poderíamos
dizer que esta foi a décima homenagem da cidade ao escritor. O Projeto de Lei do
vereador petista também previa a implantação, num dos espigões da Praia de Iracema,
de dezessete totens contendo todos os capítulos do romance, o que foi feito
recentemente.
5. As iniciativas da Universidade Federal do Ceará para preservar a memória de Alencar e o seu legado literário
As iniciativas da Universidade Federal do Ceará para manter viva a memória de
José de Alencar não ficam atrás daquelas realizadas pelo Governo do Estado do Ceará e
pela Prefeitura Municipal de Fortaleza; ou seja, pelos poderes públicos estadual e
municipal. Em 1965, no centenário de Iracema, o então magnífico reitor da
universidade, Antônio Martins Filho, adquiriu o terreno que pertenceu à família do
autor, que ficava no bairro do Alagadiço Novo, atual “José de Alencar”, como vimos.
O sítio, adquirido por José Martiniano de Alencar, pai do romancista, em 1825,
abriga uma edificação histórica, uma casa do tempo em que o escritor, ainda menino,
por ali viveu com a família, até os nove anos; ruínas arqueológicas do primeiro engenho
a vapor do Ceará, construído em meados de 1830; a biblioteca “Braga Montenegro”, na
qual podemos encontrar várias obras de José de Alencar; o Museu Artur Ramos; a
pinacoteca Floriano Teixeira, que traz uma exposição permanente de 32 quadros (telas a
óleo e desenhos) do pintor maranhense que lhe dá nome, em torno de personagens
alencarinas (Iracema e Martim, Peri, Lúcia, Aurélia, Arnaldo, Emília etc); a Sala
Iracema, na qual se encontram 33 desenhos feitos a bico de pena e nankim pelo artista
plástico cearense Descartes Gadelha, em torno das principais cenas do romance
indianista em apreço, além de uma tela a óleo em torno do mesmo tema; e a Coleção
Luiza Ramos, em torno das rendas de bilro cearenses. Ao lado do prédio principal há,
ainda, um restaurante – Restaurante Iracema – com comidas típicas, que atende aos
visitantes do equipamento cultural.
A outra iniciativa da Universidade Federal do Ceará veio da Prof.ª Doutora
Maria Ednilza Oliveira Moreira, do Departamento de Letras Vernáculas, que, desde
2011, vem desenvolvendo, por meio da Pró-Reitoria de Extensão, o Programa “Iracema,
o Retrato de Fortaleza”, junto não só à comunidade acadêmica, mas a toda a
comunidade fortalezense.
Partindo do pressuposto de que os equipamentos culturais anteriormente
apresentados, por si só, nada dizem sobre a personagem, sobre o escritor e sobre a
cultura cearense aos cidadãos de Fortaleza e aos turistas que visitam a cidade, a
professora preocupou-se em capacitar, a partir de alunos da universidade, que seriam
agentes formadores, os vários segmentos da sociedade que, direta ou indiretamente,
lidam com a Literatura Cearense e trabalham com o turismo: professores, artesãos,
taxistas, seguranças patrimoniais, guias de turismo e outros.
O intuito da professora, primeiramente, foi o de suscitar ou o de reforçar, no
povo fortalezense, um imaginário em torno de Iracema, para que esse, naturalmente,
possa ver os monumentos em torno de Alencar e de sua personagem como pontos
obrigatórios de visitação turística; assim, a professora pensou em estratégias de ação, ou
de formação, em todos os níveis e em todas as modalidades de ensino (fundamental,
médio, superior, profissionalizante), de modo a envolver diferentes segmentos da
sociedade, e não apenas as escolas e as universidades. Tais estratégias começariam, em
todos os níveis, por explorar a personagem em apreço a partir de várias percepções (do
romance, das letras das músicas, dos textos jornalísticos, das pinturas, dos desenhos, das
esculturas), para criar ou para reforçar, no povo, um rico imaginário em torno de
Iracema e de sua história. A partir daí, cada um iria, dentro da sua ocupação, da sua
profissão, desenvolver produtos ou serviços com base no que aprenderam: os artesãos,
esculturas, pinturas, bordados; os taxistas, itinerários turísticos; os funcionários da rede
hoteleira, mapas ou folders dando conta das atrações turísticas em torno do autor, da sua
obra, da personagem e da história do Ceará. Exatamente por isso, o Programa engloba,
basicamente, três projetos: o Curso de Leitura “Conhecendo melhor Fortaleza, a Terra
que nos remete à Iracema”, que tem por objetivo levar à comunidade em geral
informações históricas e literárias acerca da cidade, de José de Alencar, de sua obra e da
personagem em questão; a Feira de Artesanato “Um momento com Iracema”, que
procura incentivar os artesãos a produzirem objetos de arte e souvenirs que tematizem
Iracema, com vista à livre comercialização; e “Iracema vai à Rádio”, que tem por intuito
divulgar, por meio da programação da Rádio Universitária e de outros meios, canções e
poemas que fazem alusão à personagem, bem como anúncios publicitários em torno das
atividades que estão, direta ou indiretamente, relacionadas ao Programa.
Os frutos do Programa “Iracema, o Retrato de Fortaleza” já vêm sendo colhidos:
o patrimônio público em torno de Iracema tem sido mais respeitado pela comunidade; o
trabalho dos guias turísticos em torno dos equipamentos anteriormente assinalados tem
obtido maior aprovação do público; os artesãos passaram a retratar, mais e melhor, em
suas produções, a personagem Iracema; os alunos de todos os níveis, das escolas
públicas e particulares, e também os da universidade, já não são tão indiferentes à
personagem alencarina e ao seu criador como antes; e José de Alencar e Iracema
passaram a ser mais respeitados pelo Poder Público, tanto o estadual quanto o
municipal. Aliás, nesse sentido, devemos dizer que foi o Programa coordenado pela
Prof.ª Ednilza Moreira o grande responsável pela criação do Dia de Iracema (1º de
maio), em Fortaleza, e do Projeto de Lei do vereador Guilherme Sampaio que deu à
Iracema o título de “Ícone Cultural do Município”.
6. CONCLUSÃO
Ao cabo de tudo o que foi dito, acreditamos que tenha ficado claro para os
leitores deste ensaio o porquê de Iracema e de Alencar terem sido eleitos, desde muito
cedo, ícones literários de Fortaleza: o escritor, sem dúvida nenhuma, pelo fato de ter
sido o primeiro homem da cidade – do estado do Ceará, na verdade – a se projetar
nacionalmente, em se tratando de Literatura; a personagem, por ser, ainda hoje, uma das
mais presentes no imaginário de todo e qualquer brasileiro, quando pensa em
personagens de ficção, e uma das que melhor representa o povo indígena, por
simbolizar, como poucas, a figura do nativo, ou seja, daquele que já vivia por solo
brasileiro aquando da chegada dos portugueses. Tais fatos, portanto, já seriam
suficientes para justificar tantas homenagens feitas pelo poder público estadual e pelo
poder público municipal ao longo de toda a cidade: estátuas, bairros, praça, teatro etc.
Esperamos, ainda – e principalmente –, que este ensaio tenha conseguido
mostrar àqueles que sobre ele se debruçaram a importância da Universidade Federal do
Ceará para o fomento do turismo em torno dos equipamentos culturais que
homenageiam Iracema e Alencar, bem como para a preservação da memória do escritor,
da sua obra e da personagem junto ao povo fortalezense (ou ao povo cearense) e aos
turistas que visitam a cidade, por meio de diversas ações educativas e formativas.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Alencar, J. (s.d.). Iracema. Fundação Biblioteca Nacional/Departamento Nacional do Livro. Disponível em http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000014.pdf
Bosi, A. (2006). História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix.Câmara Municipal de Fortaleza (2011). Debate na Câmara destaca Iracema como
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Diário do Nordeste (2013). Caminhos de Iracema: História e Cultura nas Férias. Acesso em 01 dezembro 2014. Disponível em
http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/suplementos/tur/historia-e-cultura-nas-ferias-1.362476
Governo do Estado do Ceará/Secretaria da Cultura (2013). Theatro José de Alencar. Acesso em 01 dezembro 2014. Disponível em http://www.secult.ce.gov.br/index.php/equipamentos-culturais/theatro-jose-de-alencar
Portal Messejana (s.d.). Fortaleza é assim: Iracema, a virgem dos lábios de mel. Acesso em 01 dezembro 2014. Disponível em http://www.portalmessejana.com.br/noticias.php?exibir=turismo&id_noticia=6144
Universidade Federal do Ceará (s.d.). Casa de José de Alencar. Acesso em 01 dezembro 2014. Disponível em http://www.ufc.br/cultura-e-arte/equipamentos-culturais/2040-casa-de-jose-de-alencar