jornalismo no brasil: a institucionalização de uma identidade profissional
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O trabalho faz uma reflexão sobre o processo de profissionalização do jornalismo brasileiro.Por meio da revisão bibliográfica revisitamos a história do jornalismo e percebemos a singularidade doprocesso de institucionalização e constituição de uma identidade profissional no país. O caminhopercorrido demonstra que este ofício desenvolveu-se, primeiramente, como uma ocupação, um lugar depassagem para os que almejavam cargos políticos e literários.TRANSCRIPT
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Jornalismo no Brasil: a institucionalizao de uma identidade
profissional1
SILVA, Rafael Pereira (mestrando)2 Universidade Federal de Juiz de Fora, MG
Resumo: O trabalho faz uma reflexo sobre o processo de profissionalizao do jornalismo brasileiro. Por meio da reviso bibliogrfica revisitamos a histria do jornalismo e percebemos a singularidade do processo de institucionalizao e constituio de uma identidade profissional no pas. O caminho percorrido demonstra que este ofcio desenvolveu-se, primeiramente, como uma ocupao, um lugar de passagem para os que almejavam cargos polticos e literrios. A consolidao da profisso ocorre posteriormente, na dcada de 1950, com a adoo de novos critrios e padres de produo e, principalmente, com a emergncia de uma cultura profissional e ideolgica. No entanto, aps dois sculos de existncia no cenrio brasileiro, ainda hoje a profisso e seus profissionais, os jornalistas, sofrem com sua frgil regulamentao. Palavras-chave: Jornalismo; Identidade; Profissionalizao; Regulamentao.
Introduo
Durante muito tempo, o exerccio do jornalismo no Brasil esteve vinculado
a uma posio intermediria entre as posies da poltica, como postos e cargos
pblicos, e da literatura, como a publicao de livros e a insero em entidades e
atividades artstico-literrias. O jornalismo, ou melhor, a imprensa era constituda por
diletantes, representando uma ocupao provisria, um lugar transitrio, seja para
aumentar e complementar a renda, constituindo-se como um bico, um trabalho extra,
ou como um trampolim para alcanar posies destacadas em outras esferas sociais.
Assim, o embrio do jornalismo profissional brasileiro constitua-se como um lugar de
passagem, um espao que possibilitava estabelecer uma srie de relaes que poderiam
resultar em uma posio na poltica ou na literatura.
No incio do sculo XIX, a atuao da imprensa era vista como um
instrumento estratgico de mobilizao poltica e como uma prtica de atualizao,
crtica e julgamento dos fatos cotidianos. Atuava ora contra, ora a favor do Estado,
movimentando-se entre os diversos grupos, faces, partidos, movimentos e
1Trabalho apresentado no GT de Histria do Jornalismo, integrante do 10 Encontro Nacional de Histria da Mdia, 2015. 2 Jornalista, Ps-graduando em Comunicao Empresarial, Mestrando em Comunicao e Sociedade, na linha Comunicao e Identidades do PPGCOM da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) email: [email protected]
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manifestaes como destaca Petrarca (2005). Neste nterim, a imprensa constitua-se
como espao privilegiado para projeo de partidos e personagens polticos, pois era
atravs do jornal que se fortalecia a carreira na poltica no perodo imperial e meados da
repblica.
Da imprensa panfletria ao jornalismo de literatos
Desde seu surgimento at 1880, a imprensa brasileira foi caracterizada pelo
discurso panfletrio, refletindo e atuando diretamente nas lutas polticas e questes
sociais da poca, como a abolio da escravatura, o processo de independncia e a
transio da Monarquia para a Repblica. Nesse perodo, os jornais eram fundados
principalmente por escritores, padres, ex-militares, personagens polticos e
revolucionrios vinculados aos movimentos sociais e polticos do momento. Aqueles
que escreviam nos jornais, fazendo a matria e o comentrio, tambm faziam parte
desses grupos e movimentos (RIBEIRO, 2003; SODR, 1966).
Aps o declnio dessa imprensa poltica e ideolgica, tem incio uma nova
fase na imprensa brasileira com o ingresso de escritores no espao dos jornais,
escrevendo e produzindo matrias. H, neste momento, uma fuso entre a informao e
a literatura. A decadncia do modelo panfletrio, mais voltada a questes de ordem
poltica, est relacionada estrutura articulada que o Imprio estabeleceu, instaurando a
conciliao entre conservadores e liberais.
A conciliao enfraqueceu a atividade dos jornais que se voltavam ou a idias liberais ou a conservadoras. Esse o perodo em que a literatura e os literrios ganharam espao na imprensa, momento de articulao entre a atividade do jornalista e o homem de letras. Os homens de letras, como eram comumente designados os literatos, procuravam encontrar nos jornais a notoriedade e a recompensa econmica que no encontravam nos livros (PETRARCA, 2005, p. 4).
Para Miceli (2001), a entrada dos escritores na atividade est relacionada ao
fato de que as camadas mais inferiores econmica e socialmente, ou como ele mesmo
chama os filhos de parentes pobres, que se encaminharam para as carreiras
intelectuais tiveram a possibilidade de ocuparem novas posies no atravs do ttulo e
diplomas, mas do capital simblico conquistado pelas relaes que conseguiram
mobilizar.
Segundo Petrarca (2005), o xito em suas estratgias coincidiu com o
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desenvolvimento das burocracias intelectuais, dentre elas a imprensa. Nesse perodo, os
escritores que no se enquadravam nos modelos de excelncia disponveis da poca,
como os grandes diplomatas e mandarins, dirigentes polticos ou porta-vozes das
oligarquias ou ainda bacharis com cargos estatais, constituram um novo tipo de
intelectual profissional que vivia dos rendimentos provindos das mais variadas
modalidades de sua produo, dentre elas as colaboraes na imprensa que se tornava
uma atividade central para tais escritores. Dessa forma, o exerccio do jornalismo
conformava-se em um novo ofcio condizente com o status proporcionado pela
atividade do escritor.
Estes literatos, alm de buscar a consagrao no mundo da literatura por
meio do novo espao que se constitua atravs dos jornais, tambm se investiam de uma
misso e ao poltica, convergente no s com a necessidade de exaltar o carter
nacional e a realidade brasileira, como tambm na insero de partidos polticos.
Este modelo de imprensa de carter nacional provocou o desenvolvimento da figura do
reprter, sendo este o agente histrico que vai aventurar-se em busca de um Brasil
autntico, que ir desvend-lo, mostrar suas peculiaridades, suas caractersticas
prprias, sua realidade. Para Petrarca,
A cobertura da Guerra de Canudos3, em 1897, constituiu-se como um marco para a definio da reportagem e caracterizao da figura do reprter, como aquele que vai mostrar a realidade brasileira e os problemas nacionais. Destacou-se na cobertura da Guerra de Canudos o escritor Euclides da Cunha que era colaborador do jornal O Estado de So Paulo e foi enviado para cobrir a Guerra (PETRARCA, 2005, p. 5).
A emergncia da figura do reprter4 no jornalismo brasileiro difere do modo
como aconteceu em outros pases, como os Estados Unidos, que tinham a imagem do
reprter desenvolvida de forma dissociada da literatura e da poltica, constituindo-se
como um profissional portador de um conhecimento especfico e de um saber fazer
prprio orientado para a busca do novo e para coleta de fatos. Estes princpios s
chegariam ao Brasil por volta da dcada de 1950, que ser quando realmente a profisso
comea a se profissionalizar e passa a adotar critrios como objetividade, neutralidade e
tem-se o enraizamento de prticas prprias como o lead e a pirmide invertida que se
3A cobertura da Guerra de Canudos transformou-se no livro Os Sertes de Euclides da Cunha. 4O nascimento da reportagem e da figura do reprter aparece nos Estados Unidos a partir da cobertura da Guerra de Secesso ocorrida de 1861 a 1865.
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tornam o modelo padro da atividade.
A verdade que, por determinantes histrico-culturais, o processo de
profissionalizao do jornalismo percorreu caminhes diferentes nos diversos pases.
Nos EUA, por exemplo, em fins do sculo XIX, os jornalistas j eram definidos como
um corpo profissional autnomo. J na Frana, como demonstra Neveu (2006) e
Fidalgo (2008), a figura do reprter apareceu associada imagem do escritor,
caracterizando-se por possuir uma competncia e uma retrica literria.
A constituio de um corpo identitrio
No Brasil, as mudanas na sociedade, constituram um ambiente propcio
para a consolidao das instituies jornalsticas e a adoo de novos padres tcnicos,
ticos, estilsticos. Contudo, a profissionalizao favoreceu, principalmente, um sentido
de corpo e estabeleceu os liames de uma identidade profissional para os jornalistas
(Franciscato, 2005). Nesse contexto, a redao jornalstica passa a ser um ambiente
particular, local de cobertura noticiosa, da redao e edio de textos, com seus
conflitos de concepo, disputas e relaes de trabalho. Esse corpo identitrio em
formao origina um ethos5 prprio, que d um propsito singular ao trabalho e o
estabelecimento de princpios da atividade (sua misso social) e valores atrelados
liberdade de expresso e o interesse pblico. Alm disso, essas transformaes
motivadas pelo ritmo industrial de produo de fatos notcias, e estimularam a diviso e
a especializao da atividade, dando origem s subdivises e s hierarquias internas
profisso.
O jornalista deixava de experimentar e participar de todo o processo de produo e se limitava a atuar dentro das competncias de sua rea ou departamento. Ao mesmo tempo, novos conflitos surgiram com o incio da formao universitria dos jornalistas nos primeiros anos do sculo XX em pases como os Estados Unidos, tanto em relao ao ingresso de jornalistas diplomados em locais que antes prescindiam desta exigncia quanto s disputas entre os defensores e incentivadores dos dois diferentes projetos de formao, o profissional pelas redaes e a universitria (SALCETTI, 1995, p. 61-63).
5 o ethos e uma espcie de conscincia atuante e objetiva de um grupo social, tal como o grupo dos jornalistas e assessores. Essa conscincia revela a compreenso histrica do sentido da existncia, e onde tem lugar as interpretaes simblicas do mundo. Ela e, portanto, a instancia de regulao das identidades individuais e coletivas. Assim, costumes, hbitos, regras e valores so os materiais que explicitam a sua vigncia e regulam, a maneira de uma segunda natureza (Sodr, 2002).
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A conjuntura tambm favoreceu a incorporao de novos temas e a
explorao de novos gneros textuais. Nessa poca, surgiram as editorias especializadas
em temas e abordagens especficas como esportes, lazer, vida social e cultural,
crtica literria, notcias policiais, regionais, nacionais, e internacionais
(MARTINS; LUCA, 2008). Para Erik Neveu (2005), a existncia de editorias constitui
um ltimo elemento essencial da diviso do trabalho entre jornalistas.
Mesmo com todas essas transformaes, a formao em nvel universitrio
s teria incio no meio do sculo XX no Brasil. Todavia, o mais importante a destacar
que a profissionalizao da imprensa criou um conjunto de agentes que se dedicava
integralmente atividade, dando origem a um grupo de profissionais intitulados de fato
como jornalistas. Esse novo modelo funcionou como um modo de proteo da categoria
frente aos empresrios das mdias e demais atores sociais. Tal conjuntura tambm
fortaleceu e afirmou os valores prprios da atividade jornalstica, entre estes o dever de
servir ao pblico (HALLIN, 1996, p. 245 apud FRANCISCATO, 2005, p. 170).
Regulamentao e ideologia profissional
O processo de regulamentao da profisso de jornalista e o estabelecimento
dos primeiros critrios jurdicos institucionais do jornalismo esto ligados, como
demonstra Petrarca (2005), s convices polticas dos intelectuais, as quais alguns
jornalistas se inseriam. Para a pesquisadora, a atuao dos intelectuais nas lutas polticas
no s exalta o carter brasileiro e a nao brasileira, mas tambm atua e se filia aos
partidos polticos locais6. Esta ao foi um fator importante na regulamentao da
profisso no pas, as estratgias corporativas emanadas por este grupo, mesmo antes dos
anos 1930 esto na origem das medidas adotadas nas dcadas seguintes, como a
regulamentao das profisses e da criao das leis trabalhistas. Um dos motivos que
levou os intelectuais a se inserirem na poltica nesse momento foi o sentimento de
6Nas dcadas de 1920 e 1930 o projeto dos intelectuais era inseparvel da vontade de contribuir para fundamentar a cultura e o poltico. O nacionalismo de que eram porta-vozes aparece como uma maneira de obter reconhecimento do Estado. Nacionalismo, carter nacional, realidade brasileira e organizao aparecem como noes inseparveis, uma vez que para os intelectuais era o Estado Nacional que deveria criar as condies para o sentimento nacional. Nesse sentido, o jornalismo, assim como a literatura e algumas instituies como o ensino superior, foi colocado a servio da recuperao da nacionalidade e tambm como instrumento de transformao social e poltica (PCAUT, 1990).
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pertencer a uma categoria profissional.
O projeto corporativista instaurado pelo Estado Novo tinha como objetivo organizar tanto a sociedade, de modo geral quanto grupos especficos, como os intelectuais, os quais tinham uma intensa atuao na imprensa. Esse projeto inclua a regulamentao das profisses, as leis trabalhistas, legislao sindical e outros. E os intelectuais, como membros de profisses especficas, estariam sujeitos as disposies corporativas. As profisses foram reconhecidas e receberam um estatuto oficial, o que possibilitou aos intelectuais identidades e direitos especficos. Nesse perodo, alm da primeira regulamentao da profisso de jornalista, foram fundadas algumas organizaes como a Ordem dos Advogados do Brasil, criada em 1930, a Academia de Medicina, fundada em 1931, o Conselho de Engenharia e Arquitetura, em 1933, e o Sindicato dos Escritores. O objetivo da regulamentao profissional no consistia em questionar a posio dos intelectuais, mas conferir s elites de determinadas profisses a possibilidade de criar as condies de acesso ao exerccio profissional e intervir em nome de uma tica profissional (PETRARCA, 2005, p. 12).
A primeira lei sobre a profisso surge em 30 de novembro de 1938, pelo
Governo Getlio Vargas, junto com a assessoria dos sindicatos de jornalistas de So
Paulo e Rio de Janeiro. O decreto tinha como objetivo regulamentar a durao e as
condies de trabalho nas empresas jornalsticas. O jornalista era definido nesse
momento como um trabalhador intelectual cuja funo era desde a busca por
informao at a redao de notcias e artigos. O decreto tambm definia as principais
funes ocupadas pelos jornalistas: redator-chefe, secretrio, subsecretrio, chefe e
subchefe de reviso, chefe de oficina, de ilustrao e chefe de portaria.
Relatos sobre a histria da imprensa e do Brasil mostram que, nesta
conjuntura em que foram estabelecidas as primeiras definies jurdicas sobre a
profisso o pas passava por intensas crises do governo e da prpria imprensa. O Estado
Novo institudo por Vargas estabeleceu a censura no pas e criou rgos, como o
departamento de imprensa e propaganda, cujo objetivo era controlar a imprensa e o
rdio. Esse perodo impossibilitou a existncia de jornais sem grandes recursos e, em
contra partida, favoreceu aqueles que contavam com apoio financeiro (PETRARCA,
2005, p.11).
Concomitante, ampliava-se o nmero de sindicatos e entidades voltadas aos
jornalistas no pas. Com o objetivo de enquadrar a classe emergente dos jornalistas, em
1946, por exemplo, foi fundada a Federao Nacional dos Jornalistas (Fenaj) que surgiu
com o intuito de representar os sindicatos. Surgiam tambm as primeiras faculdades de
jornalismo, muitas delas criadas por empresas de comunicao e entidades que
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agregavam os profissionais do jornalismo. Em seguida, outras regulamentaes foram
aparecendo numa tentativa de solidificao do estatuto do jornalista no Brasil.
Posteriormente ao decreto de 1938, instaurou-se o decreto de 1943 e 1944. Com a consolidao das leis do trabalho em 1943 repetem-se os artigos do decreto anterior no alterando distino entre profissionais de imprensa. Esse decreto adicionava a criao dos cursos de jornalismo. O decreto de 1944 acrescentou a remunerao mnima daqueles que trabalhavam em atividades jornalsticas e enquadrava como jornalistas tambm os redatores existentes na radiodifuso e na redao publicitria. Acrescentou-se nesse decreto os fotgrafos como funo auxiliar de redao ao lado do revisor, ilustrador ou desenhista e arquivista. O decreto de 1938 apenas diferenciava o jornalista, do locutor e do fotgrafo, mas no classificava dentro da hierarquia. E o decreto de 1944 alm de enquadrar radialistas e publicitrios como jornalistas, classificava o fotgrafo como auxiliar dos jornalistas (PETRARCA, 2005, p.13).
Com o tempo, outros decretos somaram-se a esses, como os de 1961, 1962,
1963 e 1969, dando as bases e criando as definies para atividade e a insero na
profisso.
(...) Considera-se jornalista profissional aquele cuja funo, remunerada e habitual compreendida a busca ou documentao de informaes, inclusive fotogrficas, a redao de matria a ser publicada, contendo ou no comentrio, a reviso da matria quando j composta tipograficamente, a ilustrao, por desenho ou por outro meio, do que for publicado, a recepo radiotelegrfica e telefnica de noticirio nas redaes de empresas jornalsticas, a organizao e conservao cultural e tcnica do arquivo redatorial, bem como a organizao, orientao e direo de todos esses trabalhos e servios (FILHO, 1995, p.57).
Esses decretos so importantes, pois seus textos j pretendiam balizar
contornos para a profisso, assim como definies sobre o que o trabalho de jornalista.
No entanto, foi apenas com o decreto-lei 972/69 que se estabeleceu a obrigatoriedade de
diploma em jornalismo para exercer a profisso no pas.
Nesse decreto a definio de jornalista compreendia,
A profisso de jornalista compreende, privativamente, o exerccio habitual e remunerado de qualquer das seguintes atividades: a) redao, condensao, titulao, interpretao, correo ou coordenao de matria a ser divulgada, contenha ou no comentrio; b) comentrio ou crnica, pelo rdio ou pela televiso; c) entrevista, inqurito ou reportagem, escrita ou falada; d) planejamento, organizao, direo e eventual execuo de servios tcnicos de jornalismo, como os de arquivo, ilustrao ou distribuio grfica de matria a ser divulgada; e) planejamento, organizao e administrao tcnica dos servios de que trata a alnea a; f) ensino de tcnicas de jornalismo; g) coleta de notcias ou informaes e seu preparo para divulgao; h) reviso de originais de matria jornalstica, com vistas correo redacional e a adequao da linguagem; i) organizao e conservao de arquivo jornalstico, e pesquisa dos respectivos dados para a elaborao de notcias; j) execuo da distribuio grfica de texto, fotografia
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ou ilustrao de carter jornalstico, para fins de divulgao; l) execuo de desenhos artsticos ou tcnicos de carter jornalstico.
Alm da ampliao da conceituao do que compreende a atividade do
jornalismo, este decreto teve o importante papel na oficializao da profisso no Brasil e
na valorizao dos cursos de jornalismo e assim impediu que a profisso fosse exercida
por pessoas que no eram formadas em cursos de nvel superior. Essa iniciativa tornar-
se-ia peculiar, j que fez da formao universitria o principal meio de acesso
profisso. Alm disso, a universidade passaria a ser o polo integrador de prticas e o
ambiente que forma e conforma uma identidade profissional prpria; a graduao
tambm tinha o intuito de impor uma tica profissional, tendo a formao universitria
como imprescindvel para apreenso dos critrios tcnicos da profisso, dentro de um
contexto mais geral da sociedade brasileira.
A objetivao das prticas e da tica profissional evocada por muitos
intelectuais nesse perodo devido ditadura. O intuito era constituir uma frente coletiva
de resistncia. Para isso o jornalismo teria que se vestir de uma nova roupagem, mais
fundamentada e alicerada nos procedimentos tcnicos e deontolgicos. Petrarca (2005)
argumenta que os intelectuais passaram a se atribuir uma legitimidade que na dcada
de1960 e 1970 assume um teor cientfico e o tema da profissionalizao passa a ser
privilegiado. Assim, a invocao de uma competncia especfica implicaria em
reivindicar uma legitimidade que o regime no poderia questionar.
De outra forma, a temtica da profissionalizao insurgente neste momento,
ressoou em vrios outros setores do jornalismo, principalmente entre os grandes jornais
de circulao, como a Folha de So Paulo e Estado de So Paulo, que passaram a adotar
os manuais de redao que serviam como uma orientao tcnica.
Os debates conduzidos pela Associao Brasileira de Imprensa (ABI), desde
sua fundao em 1908, j apontavam para a necessidade de investimento na formao
dos jornalistas e defendiam a criao de cursos superiores como forma de habilitao
profissional7. O I Congresso Brasileiro de Jornalistas, promovido pela ABI em 1918,
considerado o movimento mais emblemtico no alvorecer da ideia de se constituir uma
7 Para uma compreenso mais abrangente sobre os embricamentos entre ensino universitria do jornalismo e regulamentao da rea, ver a pesquisa realizada por: LOPES, Fernanda Lima. Jornalista por canudo: o diploma e o curso superior na construo da identidade jornalstica. Rio de Janeiro, 2012.
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escola de jornalismo no Brasil, pois sistematizou discusses iniciais de alguns homens
de imprensa do incio do sculo XX (LOPES, 2012).
O pioneirismo no ensino do jornalismo teve incio na Universidade do
Distrito Federal, criada em 1935 por iniciativa de Ansio Teixeira. A ao, como relata
Jos Marques de Melo (1974, p. 17), bebia da inspirao europeia, e pretendia valorizar
a formao humanstica. O curso foi extinto por decreto do Estado Novo em 1939.
Excluindo essa primeira tentativa sem xito, o primeiro curso de jornalismo do pas de
fato foi criado a partir do desejo do jornalista Csper Lbero, que fora expresso em seu
testamento. Diretor do jornal A Gazeta, ento um dos mais modernos do pas, Csper
Lbero defendia a necessidade de formao profissional do jornalista nos moldes do que
havia nos Estados Unidos e na Europa. Em seu testamento, ele determinou a criao de
uma escola de jornalismo e ensinamento de humanidades, particularmente portugus,
prosa, estilo, literatura, eloquncia (Sic), histria e filosofia, em cursos de grandes
propores, a comear pelo secundrio e finalizar pelo superior (HIME, 2004). Este
curso s passou a funcionar em 1947, vinculado Pontifcia Universidade Catlica de
So Paulo.
Destacamos que a instituio legal do curso de Jornalismo na estrutura
universitria brasileira deu-se apenas em 13 de maio de 1943 com a edio do Decreto
5.480 (MELO, 1974). A legislao exigia a integrao do curso s Faculdades de
Filosofia.
Para os jornalistas brasileiros, a obrigatoriedade do diploma tem uma
trajetria de idas e vindas, sendo um processo ainda no consolidado, principalmente
aps 2001, quando a aprovao de uma liminar suspendeu a exigncia do diploma para
exercer a profisso de jornalista no Brasil. Tal iniciativa desencadeou uma srie de
discusses e debates entre os profissionais da rea, o campo acadmico e as empresas de
comunicao. Diversas entidades e instituies que renem a categoria, bem como
proprietrios e diretores de jornais se posicionaram a respeito, abordando temas como
liberdade de imprensa, liberdade de expresso, democracia, normatizao da atividade,
profissionalizao, entre outros (PETRARCA, 2005). Essa ao culminou em 20098
8O STF julgou recurso interposto pelo Sindicato das Empresas de Rdio e Televiso no Estado de So Paulo (Sertesp) e Ministrio Pblico Federal contra acrdo do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3 Regio. Em 2001, deciso em primeira instncia da juza federal Carla Rister extinguiu a exigncia do
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com a queda definitiva do diploma para jornalista no Brasil, desencadeando uma srie
de trabalhos e debates sobre a identidade profissional dos jornalistas, j que no existia
mais o diploma a partir dali, o que por muito tempo foi principal base e
estabelecimento de fronteira entre o jornalismo e outras profisses, especialmente
dentro do prprio campo da comunicao.
A deciso, em 2009, do Supremo Tribunal Federal (STF), que retira a
obrigatoriedade do diploma para o exerccio profissional, abriu um vasto campo de
pesquisa para a identificao das diferenas de atuao entre os bacharis em jornalismo
e os graduados e ps-graduados em outras reas, ou ainda sem graduao, que podero
ser admitidos nas redaes.
Ao discorrer sobre a institucionalizao do jornalismo e emergncia do
jornalista profissional como um novo ator no cenrio da comunicao, percebemos que
fundamental perceber, assim como apresentado por diversas investigaes em
histria da imprensa (RIBEIRO, 2000, SODR 1966, MARTINS; LUCA, 2008), que
a dcada de 1950 um momento de ruptura no jornalismo brasileiro, erigindo novos
padres tcnicos e valores profissionais ao jornalismo, constituindo-se de fato no
momento de profissionalizao do jornalismo.
Fbio Pereira (2011) aponta, ao investigar as interaes entre jornalistas e
intelectuais no Brasil, que neste momento que os jornalistas conseguem se
emancipar dos demais grupos intelectuais artistas, escritores e militantes polticos. A
profissionalizao que atingem a atividade neste momento promove a substituio dos
valores polticos, literrios e humansticos que pautavam o jornalismo por uma nova
racionalidade calcada no domnio de uma competncia tcnica especfica.
A nova ambincia profissional substitui a aura romntica e combativa por
outros atributos encampados por uma lgica racional, distantes, portanto, do campo
literrio ou do poltico-panfletrio. A transio do jornalismo artesanal para o industrial
provoca transformaes no apenas na prtica como no prprio perfil identitrio dos
jornalistas:
diploma para o exerccio do jornalismo. Em outubro de 2005, por unanimidade, trs desembargadores do Tribunal Regional Federal-SP rejeitaram a sentena da juza, restabelecendo a obrigatoriedade da formao superior especfica. Depois deste trmite em primeira e segunda instncia, o assunto entrou na pauta de julgamento do STF.
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O jornalista romntico passa a ser visto como ineficaz despreparado para enfrentar as crescentes mudanas, como a racionalizao dos processos de produo. Isso no significa que h puramente uma substituio, sai de cena o romntico e entra o racional, o metdico, mas que novas discursividades se abrem, possibilitando, assim, que novos elementos entrem na configurao do imaginrio do/sobre o jornalista, na constituio de sua identidade (CAVALCANTI, 2006, p.70)
Os novos habitus do jornalismo brasileiro, que h pouco se autonomizava
das instncias artsticas e intelectuais vai gradativamente firmando um campo
propriamente dito do jornalismo no Brasil, tendo em uma nova ideologia, baseada em
prticas objetivas na busca pela verdade dos fatos e na adoo de princpios reguladores
das prticas cotidianos da profisso, o que d suporte para a emergncia de uma cultura
e de um ethos profissional que passa a exercer influncia sobre o procedimento de
construo das notcias.
A conformao desse polo ideolgico emanado por um estatuto profissional
que se consolida essencial, j que agrupa um conjunto de ideias que sustenta a
comunidade jornalstica e impe melhorias nas prticas assim como legitima
socialmente o jornalismo, fundamentando-se em dois vetores: a ideologia da
objetividade e a ideologia do profissionalismo. Ser esta nova realidade que conformar
as bases da identidade profissional contempornea. Para Neveu (2006), essa crena na
reconstituio objetiva dos fatos imaculados uma grande iluso. Contudo, esta prtica,
ou melhor, crena, se tornou um dos alicerces, uma norma profissional fundamental
para o jornalismo e que produz efeitos significativos para a imagem de si, construda
pelo discurso dos profissionais deste campo.
Consideraes finais
Mesmo conseguindo se consolidar ao longo do tempo como uma prtica
importante s sociedades democrticas, o jornalismo ainda gera perguntas e
questionamentos sobre o que a profisso de jornalista no duplo sentido de uma gama
de habilidades e de uma profisso organizada por regras. Pesquisadores de vrias reas,
entre elas a comunicao e a sociologia, se perguntam se o jornalismo de fato uma
profisso ou uma ocupao. Como j destacou Joaquim Fidalgo, a dificuldade de
delimitao do mbito de atividades dos jornalistas, enquanto profissionais, caminha,
como parece, a par da prpria dificuldade de definio clara e inequvoca da sua prpria
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atividade: o jornalismo. Com as rpidas mudanas, transformaes e
desregulamentaes que ocorrem nesta profisso torna-se ainda mais difcil fazer um
definio precisa sobre o que o esta profisso.
A sociologia funcionalista produziu uma vasta literatura sobre a noo de
profisso: onde uma profisso supe condies formais de acesso atividade (diploma,
certificado); b) ela detm um monoplio sobre a atividade que rege como ilustra a
organizao dos advogados ou a dos mdicos; c) ela dispe de uma cultura e de uma
tica que pode fazer valer pelos meios contratuais que o Estado lhe outorga ( o caso
das ordens profissionais); d) ela forma, enfim, uma comunidade real: seus membros
atribuem a ela o essencial de sua energia, so conscientes de ter interesses comuns.
No Brasil, devido ao seu processo singular de constituio, o jornalismo
brasileiro contempla muitas dessas caractersticas, mesmo que de forma precria em
algumas situaes. Como mencionado, na regulamentao sobre a profisso no pas,
desde a dcada de 1960, o acesso profisso se deu por meio de diplomas conferidos
por universidades, por isso a queda do diploma em 2009 considerada um retrocesso
para afirmao do estatuto profissional dos jornalistas. Em relao ao monoplio sobre
a atividade, esse uma questo que cerca o jornalismo brasileiro mesmo com o papel
dos sindicatos, a institucionalizao de um cdigo de tica profissional e a emergncia
de alguns rgos e federaes ao longo de sua histria. Ainda falta ao jornalismo no
Brasil, a criao de uma entidade de classe forte, como um Conselho Nacional de
Jornalismo que at hoje no conseguiu se institucionalizar.
Entre os critrios apresentados, os dois ltimos so os que, para o objetivo
de nossa investigao, so considerados os mais importantes: a disposio de uma
cultura profissional, com a obteno de valores ticos e ideolgicos e a constituio de
uma comunidade com sentimentos e interesses compartilhados. Esses dois fatores so,
de fato, hoje, balizadores da profisso no pas.
Como expe Traquina (2008), o processo de profissionalizao leva
formao de grupos organizados, dependentes de uma solidariedade cerrada e
dependente de seus membros para constiturem um grupo parte com um ethos
prprio. Esse processo de profissionalizao leva criao de uma cultura que requer
ajustamentos como pr-requisito para o sucesso na carreira. Tal propriedade , para
Greenwood (1957), o atributo mais importante de uma profisso, e consiste na formao
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de valores, normas e preceitos sociais para esses profissionais.
O cerne da questo que mesmo que os jornalistas ainda no tenham
conseguido alcanar todos os atributos que constituem uma profisso, de acordo com os
parmetros da sociologia funcionalista, a verdade que constata-se, assim com sublinha
Ruellan (1997), a existncia de um reconhecimento coletivo das responsabilidades
especficas que os jornalistas tm no espao pblico, responsabilidades consideradas
essenciais para o funcionamento do sistema democrtico, que constituem elementos
importantes para toda uma cultura profissional e que esto diretamente vinculadas a
uma mitologia, um ethos e uma ideologia construdo ao longo dos dois ltimos sculos.
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
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