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1 JOAQUIM NABUCO E A NOÇÃO DE RAÇA NOS ANOS 1880: ENTRE O AGIR POLÍTICO E O AGIR INTELECTUAL * HILTON COSTA UFPR [email protected] Introdução A postura aqui adotada acredita na existência de um espaço intelectual e de um agir intelectual para o Brasil de fins do século XIX, bem com a presença de um espaço político com o seu respectivo agir. A ideia de agir aqui proposta se construiu a partir das considerações de Max Weber (1864-1920) acerca da ação e da ação social. (WEBER, 1999). Estes conceitos de Weber permitem a distinção entre o movimento puramente reativo daquele com sentido. Um sentido visado na relação com os demais agentes. (WEBER, 1999). Assim, a ação social weberiana contempla tanto a “vontade” individual quanto as “imposições” sociais, ela se constrói nesta relação. O agir intelectual e o agir político que se procura observar é pensado nestes moldes. A forma como as elites intelectuais e políticas propõem, discutem, discordam de teorias e doutrinas ocorre na relação entre as suas opiniões e posições individuais com as de seus pares. A relação entre esses pares para este agir articula-se segundo determinadas normas, regras compartilhadas, como por exemplo, a utilização de um mesmo vocabulário. Desta forma, o artigo que se segue propõe uma discussão sobre a atuação intelectual e política, política e intelectual de Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de Araújo (1849-1910) nos anos 1880. Nabuco é emblemático no que diz respeito ao amálgama existente entre as elites intelectuais e políticas do Brasil oitocentista. Simultaneamente, a atuação de Nabuco permite perceber a diferença entre o “agir político” e o “agir intelectual”. As elites intelectuais brasileiras, nos anos 1880, * Este artigo é uma versão do terceiro capítulo, O agir político e as teorias raciais, da minha tese de doutoramento intitulada: O navio, os oficiais e os marinheiros: as teorias raciais e a Reforma Eleitoral de 1881. Defendida em março de 2014 na UFPR sob a orientação do Prof. Dr. Carlos Alberto Medeiros Lima.

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JOAQUIM NABUCO E A NOÇÃO DE RAÇA NOS ANOS 1880: ENTRE O

AGIR POLÍTICO E O AGIR INTELECTUAL*

HILTON COSTA

UFPR

[email protected]

Introdução

A postura aqui adotada acredita na existência de um espaço intelectual e de um

agir intelectual para o Brasil de fins do século XIX, bem com a presença de um espaço

político com o seu respectivo agir. A ideia de agir aqui proposta se construiu a partir

das considerações de Max Weber (1864-1920) acerca da ação e da ação social.

(WEBER, 1999). Estes conceitos de Weber permitem a distinção entre o movimento

puramente reativo daquele com sentido. Um sentido visado na relação com os demais

agentes. (WEBER, 1999). Assim, a ação social weberiana contempla tanto a “vontade”

individual quanto as “imposições” sociais, ela se constrói nesta relação. O agir

intelectual e o agir político que se procura observar é pensado nestes moldes. A forma

como as elites intelectuais e políticas propõem, discutem, discordam de teorias e

doutrinas ocorre na relação entre as suas opiniões e posições individuais com as de seus

pares. A relação entre esses pares para este agir articula-se segundo determinadas

normas, regras compartilhadas, como por exemplo, a utilização de um mesmo

vocabulário.

Desta forma, o artigo que se segue propõe uma discussão sobre a atuação

intelectual e política, política e intelectual de Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de

Araújo (1849-1910) nos anos 1880. Nabuco é emblemático no que diz respeito ao

amálgama existente entre as elites intelectuais e políticas do Brasil oitocentista.

Simultaneamente, a atuação de Nabuco permite perceber a diferença entre o “agir

político” e o “agir intelectual”. As elites intelectuais brasileiras, nos anos 1880,

* Este artigo é uma versão do terceiro capítulo, O agir político e as teorias raciais, da minha tese de

doutoramento intitulada: O navio, os oficiais e os marinheiros: as teorias raciais e a Reforma Eleitoral

de 1881. Defendida em março de 2014 na UFPR sob a orientação do Prof. Dr. Carlos Alberto Medeiros

Lima.

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mobilizavam com frequência a noção de raça em suas reflexões, e em um uso bastante

explícito. A raça era entendida pelas elites brasileiras, tanto as intelectuais quanto as

políticas, em seu sentido mais usual: a continuação entre o físico e moral, com a

hierarquia biológica que colocava os europeus ocidentais no topo da pirâmide. Este era

o sentido mais comum atribuído à raça na segunda metade do século XIX. Por sua vez,

as elites políticas, em geral, quando mobilizavam a noção de raça o faziam

preferencialmente de maneira discreta, implícita e ou dissimulada . E esta situação se

fazia presente mesmo em se tratando da mesma pessoa. É o caso de Joaquim Nabuco

nos anos 1880. Assim, tomando a atuação parlamentar de Nabuco, notadamente na

Décima Sétima Legislatura, 1878-1881, e a sua produção intelectual almeja-se

demonstrar a dupla posição das elites brasileiras perante a noção de raça nos últimos

anos do Império do Brasil.

O agir intelectual

A pessoa que quisesse atuar como intelectual no Brasil em fins do século XIX

deveria se adequar a determinadas normas e regras, operar sob este regime configuraria

aquilo aqui denominado de agir intelectual. Tal situação pode ser tratada dentro das

considerações Pierre Bourdieu (1930-2002) referente à teoria dos campos e do conceito

de habitus. Pois “A cada classe de posições corresponde uma classe de habitus (ou de

gostos) produzidos pelos condicionamentos sociais associados à condição

correspondente e, pela intermediação desses habitus e de suas capacidades geradoras,

um conjunto sistemático de bens e propriedades vinculadas entre si por uma afinidade

de estilo.” (BOURDIEU, P., 2008a p 21). [grifos no original]. Pensar o espaço

intelectual brasileiro a partir de Bourdieu requer, evidentemente, alguns cuidados. Pois,

como observou Angela Alonso (2000; 2002) não existia um campo intelectual

autônomo no Brasil do período, assim o habitus intelectual não seria exclusivamente

pautado pelas regras internas do campo. Todavia, defende-se aqui, tomando por base as

argumentações de Nicolau Sevcenko e Roberto Ventura (1957-2002), a ideia da

existência de um espaço intelectual com características próprias, porém essas não

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emergiriam tão somente do campo intelectual. (SEVCENKO, N., 1983; 2003;

VENTURA, R., 1991).

A utilização de um vocabulário comum seria uma das “regras” fundamentais.

Outra seria o envolvimento em questões públicas, isto gerava debates e polêmicas que

se davam dentro de determinada linguagem. A formação ou a conformação de uma

linguagem comum pode ser atribuída à existência de algo semelhante a um campo no

sentido das formulações de Bourdieu. (BOURDIEU, P., 1996). A presença de “regras”

de inserção e de legitimação obrigava os postulantes à intelectual, para se validarem

neste meio, a estabelecer algum tipo de diálogo com as normas vigentes. Uma destas

normas seria a utilização de determinados referenciais teóricos – a linguagem comum.

Esta linguagem comum se configuraria em “regra” porque se tornaria normativa. Com

efeito, as considerações bourdieusianas permitem pensar os “condicionamentos sociais”

enquanto maneiras de regramento as quais determinam estilos (no sentido de formas de

comportamento) e que, portanto regulariam o agir. Em se tendo o foco na ação social

como definida por Max Weber, pensada em conjunto com a ideia de habitus de

Bordieu, permitiu-se tomar a utilização deste vocabulário comum como uma ação.

Desta feita, esta linguagem enquanto ação tem um dos sentidos expressos em princípios

de classificação. Assim, a utilização da noção de raça seria para as elites intelectuais e

políticas do Brasil de fins do século XIX não só tomada de posição como também

princípio de classificação. Portanto, a adoção ou não da noção de raça apresentava

implicações políticas das mais diferentes ordens.

O agir político

Acredita-se que nos anos 1880 existia, no Brasil, certo amálgama entre as elites

intelectuais e as políticas. Todavia, apesar de muito próximas cada uma possuía um agir

próprio, bem como um espaço próprio. A presença de um espaço político no Brasil

oitocentista parece ser algo menos controverso do que a existência de um espaço

intelectual. Alguns estudos importantes permitem localizar este espaço, daqueles

consultados para a presente argumentação atestam esta situação destaca-se José Murilo

de Carvalho, Sergio Buarque de Holanda, Raimundo Faoro, José Honório Rodrigues,

Sérgio Adorno. (CARVALHO, J. M., 2008, HOLANDA, S. B., 2008, FAORO, R.,

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2001; RODRIGUES, J. H. 1965; ADORNO, S. 1988). Toma-se aqui a posição de José

Honório Rodrigues por se entender que ela define bastante bem o agir político. O

espaço político seria, na visão de Honório Rodrigues, regrado pela capacidade de

transação, de conciliação com os seus pares e, por vezes, com o povo. (RODRIGUES,

J. H., 1965). As reformas, as concessões pontuais, normalmente dedicadas às

populações urbanas foram elencadas como demonstrações da conciliação das elites com

o povo. “As minorias dominantes no Brasil, para evitar as convulsões sangrentas,

sempre prometeram reformas, especialmente nas crises, e quando o povo se continha e

elas se tornavam senhoras da situação, descumpriam as promessas.” (RODRIGUES, J.

H., 1965 p 66). De todo, nem todas as “promessas de reformas” eram negaceadas, elas

podiam vir, mas não com toda a força que alguns setores esperavam e ou desejavam.

Pois as reformas realizadas no período imperial, mais do que mudar ordenamento

social, procuravam manter as coisas como estavam. A ideia de Rodrigues de um agir

conciliador presente nas elites dominantes brasileiras desde muito cedo serviu como

mote para pensar essa característica não como um elemento inato desses grupos, mas

sim como um ethos, um habitus. Em se valendo, como exposto anteriormente, das

considerações de Pierre Bourdieu (BOURDIEU, P., 2008a p 21). A tendência pela

Conciliação, em termos políticos, seria, então, uma característica e, por vezes uma regra

do espaço político. E uma regra fundamental capaz de organizar as demais e ou fazer as

outras normas se organizarem a partir dela.

Acerca de Joaquim Nabuco

Se existe uma figura emblemática no que diz respeito ao amálgama entre

atividade intelectual e a política no Brasil de fins do século XIX certamente ela

responde pelo nome de Joaquim Nabuco. Ele foi deputado, diplomata, historiador,

ensaísta, biógrafo, pensador, político. A fortuna crítica acerca da vida e da obra do autor

é vasta. Trabalhos e estudos sobre Nabuco vêm sendo realizados desde pelo menos o

início do século XX. Como não é objetivo aqui fazer um levantamento do que se

produziu sobre Nabuco, optou-se por observar estudos que fizeram este trabalho. Desta

forma chegou-se a tese de Henrique Antonio Ré em Progresso e utopia no pensamento

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antiescravista de Joaquim Nabuco: influências da economia política francesa e das

teorias racialistas. (2009). Ré procurou estabelecer os caminhos mais usuais para

interpretação da obra nabucoana e neste processo fez um levantamento analítico dos

estudos sobre Joaquim Nabuco. (RÉ, H. A., 2009 p 31-88). Deste modo, o autor

localizou três correntes, predominantes, para a interpretação da produção nabucoana: 1

Interpretações Nabuco: o libertador da raça negra; 2 Interpretação de Nabuco: o

radical; 3 Interpretações de Nabuco: o liberal conservador. (RÉ, H. A., 2009, p 31-88).

Deste panorama enfatiza-se a terceira. Esta corrente foi definida por Ré como a

mais recente e faria parte de um conjunto de estudos cujo objetivo central seria

reconstituir melhor o papel histórico das classes subalternas na defesa de seus

interesses. Esta perspectiva historiografia proporcionou uma releitura do “processo que

culminou na abolição e procede a uma avaliação do papel desempenhado por alguns dos

nomes mais ilustres que participaram deste certame.” (RÉ, H. A, 2009 p 74). Sob esta

perspectiva “Nabuco não é mais visto tão somente como o grande intérprete da

escravidão no Brasil ou como quem soube analisar os avanços do liberalismo e

percebeu os desafios que eram lançados ao país no que dizia respeito à necessidade de

modernização das formas de produção e das relações sociais.” (RÉ, H. A, 2009 p 74).

Nabuco é entendido como “um abolicionista que, embora buscasse efetivamente a

libertação dos escravos, procurava, em primeiro lugar, preservar o status quo

dominante, não colocando verdadeiramente em questão a destruição da estrutura social

hierarquizada e espoliadora, montada pelo regime escravista.” (RÉ, H. A., 2009 p 74).

Com efeito, sob tais circunstâncias tornou-se inviável não abordar a relação de

Nabuco com as teorias raciais, coisa que as outras duas tradições não fizeram. Os

principais autores e autoras desta vertente seriam para Ré: Célia Maria Marinho

Machado, Maria Alice Rezende de Carvalho, Maria Helena Machado, Izabel Andrade

Marson e Antonio Penalves Rocha. (RÉ, H. A., 2009, p 75). A perspectiva interpretativa

lançada por estas autoras e autores foi assim sintetizada por Henrique Antonio Ré:

“[este] grupo de estudiosos de Nabuco, embora reconhecendo seu comprometimento

com a causa da libertação dos escravos, vê em sua militância uma preocupação muito

maior com o futuro dos senhores que com o dos próprios escravos.” (RÉ, H. A., 2009 p

88). E esta posição de Nabuco “não decorreria simplesmente de uma afeição por sua

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classe social, mas envolveria uma concepção prévia a respeito da ideia de país que se

queria ver implantada e de uma noção racial, formada a partir das teorias cientificistas

em voga na época.” (RÉ, H. A., 2009 p 88). A perspectiva aqui esposada encontrou

ressonância nesta tradição interpretativa da obra nabucoana. Isto porque nesta tradição

Nabuco é colocado mais “dentro” do seu tempo, no sentido de alguém que concluiu o

curso de Direito na Faculdade de Direito do Recife, que produziu seus textos com

algum diálogo com o “bando de ideias novas” que haviam ingressado no Brasil a partir

dos anos 1870. Ou seja, um intelectual e um político que fazia uso da linguagem, dos

conceitos, das teorias de seu momento. Ao se seguir por este caminho, o de admitir um

Joaquim Nabuco intelectual e político, político e intelectual entendeu-se que ele operava

no seio de duas formas de agir distintas. Pois mesmo com o relativo amálgama entre as

elites intelectuais e políticas, da proximidade dos comportamentos, a atividade política e

a intelectual possuíam formas de agir distintas.

Entre o agir político e o agir intelectual

A questão do elemento servil, como era denominada o tema da escravidão nos

idos de 1880, vinha sendo levada, nos termos do ditado popular, em “banho Maria”

desde a Lei de 1871, a Lei do Ventre Livre. A situação adquire novos contornos com

ascensão ao Parlamento da Décima Sétima Legislatura em 1878. O tema da escravidão

ganhou outro fôlego no Parlamento em muito graças à atuação de Joaquim Aurélio

Barreto Nabuco de Araújo. A pauta da emancipação dos cativos associava-se à situação

da lavoura com o trabalho livre, quem seriam os “braços da lavoura” sem os escravos, e

isto se vinculava com o tema da imigração para o Brasil. A imigração era uma pauta

recorrente no Parlamento e na política imperial e sempre carregou consigo a discussão

em torno de quem seriam os imigrantes bem vindos. O desejo desde os princípios do

Império foi o de atrair imigrantes europeus com características campesinas. No entanto,

em meados do século XIX circulavam ideias para trazer pessoas doutras partes do

mundo, bem como ideias sobre a viabilidade da atração de trabalhadores estrangeiros,

não necessariamente europeus, sob contrato – os coolies. Este cenário se acirrou nos

anos 1880 quando a ideia de buscar imigrantes chineses ganhou relativa força entre as

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elites, estas pessoas viriam para suprir a “falta de braços para a lavoura” e para

substituir o “braço escravo”.

A imigração chinesa para o Brasil foi o que levou o deputado Joaquim Nabuco

à tribuna do Parlamento por duas vezes no início do mês de setembro de 1879, mais

precisamente nos dias primeiro e três de setembro. A intervenção inicial do deputado,

em primeiro mandato, foi dada em resposta à interpelação realizada pelo colega de

Parlamento representante da Província da Paraíba, Manoel Pedro. A interpelação em

questão versava sobre a posição do deputado Nabuco com relação à concessão ou não

de autorização para a imigração de mão-de-obra chinesa para a agricultura brasileira. O

debate parlamentar em torno da imigração chinesa é um dos poucos momentos onde se

pode verificar uma utilização política das teorias raciais e justamente nos discursos de

Joaquim Nabuco. Anos mais tarde a forma como Nabuco se colocou diante das teorias

raciais será bastante distinta, menos direta, mais ambígua e até dissimulada.

No discurso do dia primeiro de setembro asseverou o deputado por

Pernambuco: “O SR. JOAQUIM NABUCO – Mas, senhores, não se trata simplesmente

de travar relações com a China, de aproximar dois dos maiores impérios do mundo;

trata-se de uma verdadeira emigração asiática para o Brasil, e essas relações

diplomáticas que se quer abrir não têm outro fim, não têm outro intuito senão

mongolizar o nosso país.” (NABUCO, J., 2010 p 215). O que foi prontamente

respondido nos seguintes termos pelo deputado mineiro: “O Sr. Galdino das Neves –

Ele já não está pouco mongolizado.” (NABUCO, 2010 p 215). Nabuco, logo depois

dessa interrupção continua o seu discurso descrevendo a forma como ele percebia a

China.

O SR. JOAQUIM NABUCO – A China, eu suponho, é um país muito

diverso daquilo que nos representam os seus emigrantes. Não se pode

compreender que uma máquina política dessa ordem tenha sobrevivido por

tantos anos aos grandes impérios ocidentais sem que haja nas suas bases, nos

seus alicerces, qualidades dignas de manter, de sustentar uma grande nação.

Não se pode supor que a China, cuja civilização perdesse na noite dos tempos, cuja agricultura, no dizer de Cobden, chegou à perfeição de tornar-se

horticultura; que era governada por uma legislação territorial admirável antes

que os Gracos pensassem em promover a Lei Agrária no fórum romano; que

construiu a sua grande muralha antes que Adriano pensasse em defender com

a dele o Império; que destruiu o feudalismo antes de este aparecer, na Idade

Média, a tomar posse do ocidente da Europa com os seus feudos, os seus

barões e os seus castelos; não se pode supor que um grande império, dessa

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força, dessa organização, dessa vida, cujas origens são imemoriais, não tenha realmente muita vitalidade própria e não seja alguma coisa muito diversa

dessa nação decrépita e dessa raça que todos os dias se nos descreve como

condenada a desaparecer. (NABUCO, J., 2010 p 215).

Nabuco buscou destacar a força da civilização chinesa, suas qualidades, para

em alguma medida, invalidar os argumentos de que a China seria uma civilização, uma

raça em decadência. A argumentação de Nabuco neste momento estava em consonância

com a linguagem e postura intelectual do momento. Raça e civilização foram tratadas

dentro de premissas semelhantes àquelas utilizadas por Gobineau e Taine. A civilização

e o estado de civilização eram admitidos como produtos da raça. No pensamento

oitocentista, notadamente, na segunda metade do século, essa correlação entre raça e

civilização, civilização e raça era usual. A forma como o deputado pernambucano

percebia a China o conduziu a projetar que nas possíveis relações entre Brasil e China, o

primeiro estaria em desvantagem. A civilização e a raça chinesa tenderiam a “engolir” a

brasileira, nesta direção disse ele:

Senhores, eu não quisera neste momento fazer um paralelo entre a China e o

Brasil; ambos esses países possuem imensos territórios; são dois dos maiores Impérios do mundo; ambos têm à sua frente um governo patriarcal; em

ambos o imperador é, como se diz na linguagem oficial da China, o pai e a

mãe do povo; ambos têm os seus mandarins, a sua organização especial e,

todavia, eles se distinguem por duas qualidades opostas. A China leva ao

extremo o respeito das suas tradições, dos seus antepassados, da sua história;

nós procuramos tomar a tangente do passado; tudo aqui está em evolução, ao

passo que lá tudo está, por assim dizer, petrificado. (NABUCO, J., 2010 p

215-216).

A tradição chinesa concomitantemente conferiria força a esta civilização e a

petrificava. A força da tradição impedia, na visão de Nabuco, o diálogo com o

progresso, com a evolução. Este movimento causava imenso temor no deputado por

Pernambuco: ele temia que imigração chinesa viesse a “petrificar” o Brasil. A questão

colocada por Nabuco passa, então, pelo temor de em uma concorrência entre o passado

chinês, consolidado, forte, conhecido poderia vir a suplantar um futuro brasileiro a se

fazer, desconhecido, em aberto. A imigração chinesa, na concepção de Nabuco, teria a

capacidade de bloquear o futuro ao Brasil. A argumentação nabucoana estaria em

consonância com o pensamento corrente no século XIX e que fora sintetizado, em

alguma medida, pelo Conde Gobineau. Este havia organizado no Essai sur I’inégalité

des races humaines, entre outras ideias, que no contato entre uma raça, uma civilização

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mais “avançada” e uma mais “atrasada” a tendência “normal” seria a primeira eliminar

a segunda. Contudo, nestes processos sempre é possível ocorrer tanto a miscigenação

quanto a mestiçagem e em isto acontecendo ter-se-ia a raça, a civilização mais

“atrasada” absorvendo a mais “adiantada”.

Não parece ser exagero notar, seja na visão apresentada por Nabuco sobre o

possível contato entre Brasil e China, seja em sua indagação sobre a necessidade da

imigração chinesa certa utilização do conceito da sobrevivência do mais apto, numa

acepção mais geral. Pois, o “o chim não [poderia] vir para o Brasil sem que a população

de origem europeia e a que essa tem assimilado a si desapareça” isso para as áreas

povoadas, pois “aquelas porções do país despovoadas pela imigração chinesa” tornar-

se-iam “verdadeiras povoações mongólicas.” Localizar este tipo de reflexão em Nabuco

não significa necessariamente afirmar que ele era um evolucionista ou um

gobineauriano, mas sim informar que o deputado pernambucano comungava das ideias

de sua época e que ele utilizava a linguagem comum e normativa do momento.

Joaquim Nabuco, no intuito de convencer o Parlamento do perigo da imigração

chinesa flertou com argumentos bastante próximos àqueles defendidos pelas teorias

raciais. A ideia de mongolização como mobilizada pelo deputado pernambucano é

passível de ser entendida dentro de, pelo menos, duas dimensões: a mongolização pela

miscigenação e ou pela sobrevivência do mais apto. E ambas podem ser relacionadas

com os postulados racialistas. Ao combater a proposta de imigração chinesa para o

Brasil o deputado Joaquim Nabuco flertou com as teorias raciais, aliás, como fazia a

maioria de seus contemporâneos. Fato este que mais do que revelar uma

excepcionalidade de Nabuco denota sua consonância com as formas de pensar de sua

época. Essa consonância do pensamento de nabucoano com o de seus contemporâneos

ocorre, evidentemente, em outros momentos. Ainda no discurso de primeiro de

setembro de 1879 é localizável um Nabuco bastante próximo de outro ex-aluno da

Faculdade de Direito do Recife, Sílvio Romero (1851-1914). Disse Nabuco:

É por isso que, por exemplo, quero ainda aproveitar-me de uma parte da

demonstração do Sr. Dee, aplicando-a ao Brasil. O negro e o branco, vivendo

misturados socialmente durante séculos, o sangue preto naturalmente tenderá

a ser eliminado no sangue branco, ou a desaparecer, cedendo essa raça o

campo a outra mais preparada para a luta da vida, porque, como muito bem

diz o escritor a quem me refiro em toda esta parte do meu discurso, o negro

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tem a alimentação abundante do selvagem, tem a mesma despreocupação do dia seguinte, e não aprendeu a preparar-se para ele senão no regime de

descuido pessoal, de abandono, de confiança nos outros, que se chama

escravidão. (NABUCO, J., 2010 p 234-235).

A semelhança de raciocínio entre Nabuco e Romero acerca da preponderância

dos caracteres brancos no processo de miscigenação é indicativa de como as teorias

raciais eram correntes entre as elites políticas e intelectuais do Brasil em fins do século

XIX. Contudo, a mobilização e utilização destas teorias eram oscilantes,

movimentavam-se conforme o momento e lugar. Anos mais tarde, fora do Parlamento, e

buscando dar o tom do movimento abolicionista em O Abolicionismo (1883), Joaquim

Nabuco não falou em termos de desaparecimento desta ou daquela raça nem em

eliminação, mas em “união das raças na liberdade”. (NABUCO, J., 2001 p 38). Nesta

mesma obra dizia Joaquim Nabuco que: “a raça negra não é, tampouco, para nós uma

raça inferior”. E raça negra seria admitida ainda como “um elemento de considerável

importância nacional, estritamente ligada por infinitas relações orgânicas à nossa

constituição, parte integrante do povo brasileiro.” (NABUCO, J., 2001 p 39).

Os termos da “união das raças” e da “integração” da raça negra ao povo

brasileiro são pouco nítidos. A inclusão poderia ser muito bem pela diluição da

população negra pela miscigenação, por exemplo, no sentido mais biológico da

assertiva que “o sangue preto naturalmente tenderá a ser eliminado no sangue branco”

ou se trataria de uma inclusão hierárquica: todos inseridos, mas cada qual no seu lugar.

Ou ainda ambas as situações. No entanto, é interessante destacar que diferentemente dos

discursos sobre a imigração chinesa, O Abolicionismo possuiu um caráter conciliador

bastante forte. A obra buscou indicar que o encontro de raças que se deu no Brasil até

aquele momento estava relativamente estabilizado e não havia gerado uma “guerra entre

as raças”. Assim, de forma geral, não existiria uma animosidade racial, argumento este

provavelmente mobilizado para convencer as elites senhoriais da viabilidade do

abolicionismo, pois o fim do escravismo não levaria o país a conflito aberto entre as

raças. Por sua vez, a função dos discursos sobre imigração chinesa era outra,

praticamente o inverso do que se lê em O Abolicionismo. Os discursos procuravam criar

uma situação de animosidade racial para impedir a “mongolização” do Império.

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O Abolicionismo (1883) é um dos textos mais conhecidos e mais estudados de

Joaquim Nabuco, passível de ser notado como sua obra de maior ressonância. O

Abolicionismo é revelador das tensões e ambiguidades de um político-intelectual e de

um intelectual-político no Brasil dos anos 1880. Nesta obra ficou nítido que o combate à

escravidão promovido por Nabuco não se deu tão somente por simpatias pela raça negra

e ou pelas pessoas escravizadas em si como ele procurou evidenciar Em Minha

Formação (1901), mas principalmente porque a escravidão envergonhava o Brasil

perante as demais nações livres do mundo, imobilizava os capitais e colocara o país nas

mãos dos comerciantes de pessoas escravizadas. (NABUCO, J., 2001 p 94; 110). A

escravidão havia atrofiado no Brasil o “espírito de iniciativa, e a confiança nos contratos

de trabalho” (NABUCO, J., 2001 p 51). Nabuco percebeu ainda a escravidão como o

fator que africanizou o Brasil. Situação que ele, e boa parte de seus contemporâneos,

não notava como positiva para o país. “O principal efeito da escravidão sobre a nossa

população foi, assim, africanizá-la, saturá-la de sangue preto”. (NABUCO, J., 2001 p

128). Além deste efeito negativo da escravidão sobre o Brasil, Nabuco defendia que

“muitas das influências da escravidão podem ser atribuídas à raça negra, ao seu

desenvolvimento mental atrasado, aos seus instintos bárbaros ainda, às suas superstições

grosseiras.” (NABUCO, J., 2001 p 132). Tais argumentos, mais do que causar

estranheza, são evidências bastante nítidas da articulação do intelectual pernambucano

com as formas de pensar do seu momento, bem como da utilização que ele fazia de um

vocabulário comum à sua época, de uma linguagem pela qual seus pares se expressavam

e faziam valer suas ideias.

Joaquim Nabuco e André Rebouças (1838-1898) foram das poucas figuras da

elite a militar no movimento abolicionista que pensaram o depois da escravidão. Ambos

dedicaram reflexões acerca de um programa de ações a serem tomadas no pós-

escravismo. Nabuco externou parte deste programa em O Abolicionismo. Ao final do

primeiro capítulo do livro encontra-se a seguinte passagem: “Quando mesmo a

emancipação total fosse decretada amanhã, a liquidação desse regime daria lugar a uma

série infinita de questões que só poderiam ser resolvidas de acordo com os interesses

vitais do país e pelo mesmo espírito de justiça e humanidade que dá vida ao

abolicionismo.” (NABUCO, J., 2001 p 28). De onde ele conclui: “Depois que os

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últimos escravos houverem sido arrancados ao poder sinistro que representa para a raça

negra a maldição da cor, será ainda preciso desbastar, por meio de uma educação viril e

séria, a lenta estratificação de trezentos anos de cativeiro, isto, é de despotismo,

superstição e ignorância.” (NABUCO, J., 2001 p 28).

Esta passagem já foi citada e discutida em inúmeros estudos e as interpretações

dela são igualmente múltiplas. O porquê de tal trecho ser recorrentemente visitado

também suscita variadas respostas. Não fica nítido o sentido dado à raça aqui, como em

outros vários momentos, de modo a ser viável inferir que a utilização se deu no sentido

mais geral do termo no ambiente oitocentista, sentido já exposto anteriormente. Pouco

evidente também é o sentido da “maldição da cor”: a raça negra foi amaldiçoada porque

foi escravizada ou a raça negra foi escravizada porque é amaldiçoada? Pelo que se pode

depreender do texto nenhuma das interpretações parece completamente descabida.

No seio de uma obra intensamente estudada como O Abolicionismo existem

passagens supervisitadas como a citada anteriormente e alguns capítulos gozam da

mesma situação, esse provavelmente é o caso do capítulo III intitulado o Mandato da

Raça Negra. Neste momento do texto nabucoano, o que se percebe é o desenvolvimento

de um argumento visando afastar a raça negra da participação direta na campanha

abolicionista tendo como justificativa o seu atraso. Assim, “O mandato abolicionista é

uma dupla delegação, inconsciente da parte dos que fazem, mas, em ambos os casos,

interpretada pelos que aceitam com um mandato a que não se pode renunciar. Nesse

sentido, deve-se dizer que o abolicionista é o advogado gratuito de duas classes sociais

que, de outra forma, não teriam meios de reivindicar seus direitos, nem consciência

deles. Essas classes são: os escravos e os ingênuos.” (NABUCO, J., 2001 p 37).

Com efeito, além de uma possível descrença na capacidade de ação das pessoas

egressas do cativeiro, bem como da população negra em geral, esta postura é reveladora

do Nabuco político, um político imperial, que como boa parte de seus colegas de ofício,

entendiam que a participação popular na política não devia passar das eleições, do voto.

Uma vez eleitos os representantes do povo, as questões políticas e sociais das mais

ordinárias às mais polêmicas e complexas deveriam ser resolvidas na esfera

institucional, no Parlamento. De modo que Nabuco definiu da seguinte forma o

movimento abolicionista: “No Brasil, porém, o abolicionismo é antes de tudo um

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movimento político, para o qual, sem dúvida concorre o interesse pelos escravos e a

compaixão pela sua sorte, mas que nasce de um pensamento diverso: o de reconstruir o

Brasil sobre o trabalho livre e a união das raças na liberdade.” (NABUCO, J., 2001 p

38). Nesta passagem o Nabuco político fica ainda mais nítido, pois simultaneamente ele

quer manter o abolicionismo restrito à esfera dos políticos e busca apresentar a

conciliação entre as partes. Nabuco procurou separar a escravidão dos fazendeiros,

colocando-a na conta dos comerciantes de pessoas escravizadas. (NABUCO, J., 2001 p

94). Eis a tentativa de conciliar fazendeiros e abolicionistas. Mas a prática conciliatória

também vigorava no intuito de buscar minimizar qualquer tipo de animosidade,

generalizada, entre a população negra e branca: “A raça negra não é, tampouco, para

nós uma raça inferior, alheia à comunhão ou isolada desta, e cujo bem-estar nos afete

como o de qualquer tribo indígena maltratada pelos invasores europeus. Para nós a raça

negra é um elemento de considerável importância nacional, estritamente ligada por

infinitas relações orgânicas à nossa constituição, parte integrante do povo brasileiro.”

(NABUCO, J., 2001 p 39).

Em outra passagem de O Abolicionismo, recorrentemente visitada, Nabuco

conseguiu ser ainda mais nítido em sua proposta conciliatória. Para ele “A escravidão,

por felicidade nossa, não azedou nunca a alma do escravo contra o senhor – falando

coletivamente – nem criou entre as duas raças o ódio recíproco que existe naturalmente

entre opressores e oprimidos.” (NABUCO, J., 2001 p 40). Três anos após publicar O

Abolicionismo, Joaquim Nabuco levou ao público o opúsculo O erro do imperador,

onde discute o contexto político da aprovação da Lei dos Sexagenários do ponto de

vista de um representante do Partido Liberal que fora destituído do Poder, em sua

opinião, por um ato do Poder Moderador. Esta ação foi entendida como equivocada e

como uma vitória do Partido Conservador, e principalmente, uma vitória da escravidão.

A Lei dos Sexagenários foi tomada por abolicionistas como Joaquim Nabuco como uma

vitória do escravismo por, supostamente, ter dado novo fôlego à escravidão. Em O erro

do imperador, Nabuco colocou a questão do fim da escravidão como uma demanda

liberal e os conservadores como defensores natos do escravismo, porém o mesmo

Nabuco três anos antes em O Abolicionismo dizia ser o tema suprapartidário. “Não há

dúvida de que já existe um núcleo de pessoas identificadas com o movimento

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abolicionista, que sentem dificuldade em continuar nos partidos existentes, por causa

das suas ideias. Sob a bandeira da abolição combatem hoje liberais, conservadores,

republicanos, sem outro compromisso – e este tácito e por assim dizer de honra política

– senão o de subordinarem à sujeição partidária a outra maior, à consciência humana.”

(NABUCO, J., 2001 p 31).

Em O erro do imperador novamente fica nítido que a questão da escravidão

deveria ser tratada politicamente, no espaço da política, ou seja, no Parlamento. Para

Nabuco com a ascensão do Partido Conservador esta discussão estaria travada neste

ambiente, e esta situação poderia abrir caminho para que a discussão da abolição

tomasse as ruas. Dois anos antes, em 1884, Joaquim Nabuco estava em campanha para a

deputação, para Décima Nona Legislatura, e deste processo emergiu a obra Campanha

abolicionista no Recife: eleições de 1884, reunindo seus discursos. Nesta compilação o

agir político de Nabuco fica ainda mais nítida a posição conciliatória: fazer a

emancipação das pessoas escravizadas sem maiores rusgas com os proprietários, a

definição do espaço político como o lugar apropriado para se discutir e mesmo encerrar

a escravidão no Brasil. As obras O Abolicionismo, Campanha abolicionista no Recife:

eleições de 1884 e O erro do imperador tratadas em conjunto desvendam o Joaquim

Nabuco fusão de político com intelectual, de intelectual com político e como tal

mobilizando o vocabulário e a linguagem dos dois espaços que, aliás, por vezes se

confundiam.

Considerações finais

A intenção do argumento aqui colocado não foi alocar Joaquim Nabuco como

um racialista, nos moldes que anos mais tarde fora um Raymundo Nina Rodrigues

(1862-1906) ou mesmo como Sílvio Romero era já nos anos 1880. O intuito foi o de

destacar o vínculo de Nabuco à linguagem comum e normativa de sua época e que ele a

mobilizava conforme os problemas empíricos se colocavam. A análise das obras

nabucoanas dos anos 1880, bem como de seus discursos parlamentares referentes à

Décima Sétima Legislatura, permitiu localizar um político intelectual e um intelectual

político que dialogou com as teorias disponíveis à sua época. E fazendo uso das mesmas

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da forma e maneira que lhe pareceu necessário. No caso específico das teorias raciais o

diálogo se deu de um modo mais próximo da “ortodoxia” racialista no combate à

proposta de imigração chinesa para o Brasil. Na campanha abolicionista, por sua vez, a

presença das teorias raciais seria mais heterodoxa. Pois, ao mesmo tempo em que é

perceptível certa presença do racialismo para justificar a tutela da raça negra,

procurando evitar sua participação direta na campanha abolicionista, também é visível o

abandono das premissas de cunho racialista no esforço de convencer o meio senhorial

de que não haveria o que temer com a emancipação. Em sua interpretação não haveria

no Brasil perigo de um conflito racial, pois a escravidão não teria criado ódio recíproco

entre as raças. (NABUCO, J. 2001 p 40).

Assim, se por um lado a ação de Nabuco, na questão da imigração chinesa

lembra os debates mais próprios do mundo intelectual, onde o dialogo com as teorias

raciais fluíam de maneira mais intensa, de outro seu posicionamento na questão da

emancipação estaria dentro das regras do agir político. Neste ponto ele atuou de modo

mais moderado, “exercendo um papel sedativo, corrigindo o radicalismo” e “poupando

o país das intolerâncias.” (RODRIGUES, J. H., 1965 p 102). A adoção do racialismo

num tema como o da emancipação poderia quebrar esta postura “moderada”, incitar os

“radicalismos” e por fim levar ao país às “intolerâncias”. A prática conciliatória criou

um ambiente mais de inclusão do que de exclusão formal das pessoas, uma inclusão

altamente hierarquizada, mas inclusão. (DEBRUN, M., 1983 p 52). A postura racialista

poderia gerar um ambiente abertamente excludente. E esta situação seria inconveniente

por ser fértil para o crescimento dos “radicalismos” e “intolerâncias”. Desta feita, a

utilização das teorias raciais no espaço político, quando ocorreu, primou pela discrição,

pelo caráter indireto, contudo, evidentemente, existiram exceções, uma delas o debate

sobre a imigração chinesa para o Brasil.

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