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JESUTAS BRASIL
4 5Em Em
sumrio edio esPeCiAL | ANO 2 | juLHO 2015
EditorialCelebrando Santo Incio de Loyola
CalEndrio litrgiCo
Companhia dE jEsus pErEgrinos Em missoDe Loyola a Manresa: Peregrinando como Incio
EspECialQuem foi Incio de Loyola?
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Por meio daauto-observao, ele passou a notar que as ambies mundanas lhe causavam alegrias efmeras, meros prazeres, ao passo que a entrega a Jesus Cristo lhe enchia o corao de uma alegria duradouraPe. Joo Quirino Weber, assistente espi-ritual da direo do Colgio Catarinense, orientador de exerccios espirituais, assessor da CVX e escritor
4 5Em Em
EmJESUTAS BRASIL
ExpEdiENtE EM COMPANHIA uma publicao mensal
dos Jesutas do Brasil, produzida pelo Ncleo
de Comunicao Integrada (NCI)
ContAto [email protected]
www.jesuitasbrasil.com
diretor editoriALIr. Eudson Ramos
editorA e JornAListA resPonsVeLSilvia Lenzi (MTB: 16.021)
redAoJuliana Dias
diAgrAmAo e edio de imAgensDimas Oliveira
FotosBanco de imagens / Divulgao
Dimas Oliveira
Loyola University de Chicago (EUA) - pg. 22
Center for International Forestry Research (CI-
FOR) - pg. 20
A equipe do NCI agradece os jesutas que cola-
boraram nessa edio especial.
o ministrio dE unidadE na igrEja santa sIncio de Loyola e a fundao da Companhia de Jesus
goVErnoCompanhia de Jesus: uma Ordem ativa e inovadora
promoo da justia E ECologiaInspirados pela mstica inaciana
EduCaoSanto Incio e a educao
sErVio da FIncio de Loyola: santo dos tempos novos
16
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22
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InformatIvo dosJesutas do BrasIl
6 7Em Em
Mais uma vez, estamos celebrando Santo Incio de Loyola. O
dia 31 de julho data significativa para ns, jesutas, para vrias
congregaes religiosas de inspirao inaciana e para muitos lei-
gos que realizam sua misso atravs da Companhia de Jesus.
Desde o dia 16 de novembro de 2014, somos uma nica Pro-
vncia Jesuta no Brasil. A criao da nica provncia fruto de
muita escuta dos apelos de Deus, de reflexo, de discernimento,
de partilha e de tomada de decises. Por ocasio da Festa de Santo
Incio, somos convidados a agradecer por todo bem que a Com-
panhia de Jesus realizou no Brasil at hoje e a pedir para que ,
como um nico corpo apostlico, com renovado ardor apostli-
co e com fidelidade criativa, luz da espiritualidade inaciana e
atentos aos apelos de Deus, continuemos a bonita misso que o
Senhor nos confia como Companheiros e Amigos no Senhor.
Celebrar a festa de Santo Incio nos leva, como servos humildes
de Cristo, a agradecer a Deus pelo dom que o carisma inaciano na
vida da Igreja e na vida de tantas pessoas em particular. Tudo dom
e graa. Assim como Incio e os primeiros companheiros busca-
vam unicamente fazer a vontade de Deus, assim tambm ns, hoje,
jesutas e colaboradores, somos chamados a sermos fiis a Cristo,
colocando-nos inteiramente a servio da Igreja e da humanidade.
Como nico corpo apostlico, queremos ir ao encontro das
pessoas que vivem nas fronteiras da humanidade, s margens da
sociedade e que perderam a esperana crist. Queremos partilhar
nossos recursos materiais e humanos, colaborando com outras
entidades afins, colocando-os a servio da vida e da misso. Aci-
ma de tudo, queremos ser presena de esperana, de reconcilia-
o e de testemunho da Alegria do Evangelho. Para isso, implora-
mos ao Senhor o seu amor e a graa de sermos prontos e diligentes
em cumprir sua Santssima Vontade (EE 234).
Que Deus nosso Senhor, pela intercesso de Santo Incio,
nos abenoe e envie sobre ns a fora do Esprito, mantendo-
-nos unidos a Cristo e misso que Ele nos confia, levando a Boa
Nova a todos os povos.
editoriAL
CeLebrAndo sAnto inCio de LoyoLA
Pe. Joo renato eidt, SJProvincial dos Jesutas do Brasil
Celebrar a festa de santo InCIo nos leva, Como servos humIldes de CrIsto, a agradeCer a deus pelo dom que o CarIsma InaCIano na vIda da Igreja e na vIda de tantas pessoas em partICular. tudo dom e graa.
6 7Em Em
CALendrio LitrgiCo
So Bernardino Realino, presbtero
So Joo Francisco Rgis, presbtero
So Francisco de Jernimo, presbtero
Bem-aventurado Juliano Maunoir, presbtero
Bem-aventurado Antnio Baldinucci, presbtero
Bem-aventurado Incio de Azevedo
e companheiros mrtires
Santo Incio de Loyola, presbtero e Fundador da
Companhia de Jesus
em tudo amar e servir.
calendrio litrgicoPrprio da Companhia de Jesus JuLHo
DIA 2
So Leo Incio Mangin, presbtero e mrtir
Santa Maria Zhu Wu e companheiros mrtires
DIA 9
DIA 17
DIA 31
8 9Em Em
ComPAnHiA de Jesus pErEgriNOs Em missO
de LoyoLA A mAnresA: pErEgriNANdO cOmO iNciO
LoyoLA
esPAnHA
esPAnHA
FrAnA
reino unido
itLiA
PortugAL
mAnresA
ViVer A eXPerinCiA de inCio
Em 1521, enquanto defendia da invaso francesa a cidade de Pamplona, Navarra (Espanha), Incio de Loyola foi ferido na perna por uma bala de canho. Esse fato obrigaria o jovem, que at ento era agitado e vai-
doso, a recolher-se para que pudesse recuperar-se. Assim,
nesse perodo, Incio passa por uma transformao espi-
ritual que o leva a sua converso.
No ano seguinte, j recuperado, Incio de Loyola deci-
de abdicar de seu estilo de vida e iniciar uma peregrinao
de Loyola a Manresa. Durante o percurso, de cerca de 700
grupo de australianos percorrendo o Caminho inaciano em setembro de 2013 (fonte: ignatiancamino.com)
8 9Em Em
Quando Incio decidiu fazer a peregrinao, sua famlia ficou preocupada. Por isso, antes de iniciar seu caminho, ele pede a proteo de Nossa Senhora de Aranzazu.
O Caminho Inaciano comea no Santurio de Loyola, casa onde Incio nasceu, em 1491. Com o desejo de conhecer mais de perto a vida do fundador da Companhia de Jesus, turistas e peregrinos procuram o local.
Os 700 quilmetros percorridos por Incio, em 1522, servem como inspirao para milhares de peregrinos nos dias de hoje
LoyoLA
ArAntzAzuzumrrAgA ArAiA ALdA geneViLLA LAguArdiA nAVArrete
quilmetros, ele tem um encontro profundo com Deus.
Aps dois meses de peregrinao, Incio conclui o itine-
rrio ao chegar, em 21 de maro de 1522, a Manresa, local
onde iniciaria um retiro espiritual de 10 meses, perodo
em que escreveria os Exerccios Espirituais.
Hoje, o Caminho Inaciano, como conhecido o per-
curso, rene centenas de peregrinos todos os anos. Com
27 etapas, a peregrinao inicia-se na casa natal de Santo
Incio, em Loyola, e atravessa o Pas Basco, La Rioja, Na-
varra, Arago e Catalunha. O trajeto, no sentido contr-
rio ao do famoso Caminho de Santiago, um convite a
todos que desejam viver a experincia de Incio.
10 11Em Em
Logroo
ALCAnAdre
CALAHorrA
ALFAro
tudeLA ALAgn
zArAgozA
Fuentes de ebro
Daqui a sete anos, mais precisamente em 2022, a Compa-
nhia de Jesus celebrar os 500 anos da peregrinao de Incio
de Loyola. Com o intuito de impulsionar e potencializar a espi-
ritualidade inaciana, foi criado o site caminoignaciano.org,
que traz informaes sobre o percurso. Alm disso, em 31 de
julho de 2015, dia de Santo Incio de Loyola, o Caminho Ina-
ciano celebrar seu primeiro Ano Jubilar, que ser
encerrado em 2016, na mesma data.
manresa, particularmente, foi especial para mim, pois um dos lugares em que baixar cova no significa morrer, seno encontrar o local em que incio obteve graas divinas, particulares e abun-dantes, e, quem sabe, tambm as contrair. naquele local, baixar cova significa entregar o esprito em orao, na esperana de que deus tambm a nos fale como falou ao santo de loyola no comeo de seu processo de converso.
Ir. Marcos Epifanio Barbosa Lima, SJJesuta realizou a peregrinao em janeiro de 2013
gALLur
Segundo relato em sua autobiografia, durante o percurso entre Gallur e Alagn, Incio encontra um muulmano e os dois discutem questes relacionadas religio. Nesse momento, Deus mostrou-se presente e ambos seguiram caminhos distintos aps a discusso.
Vista de montserrat durante o caminho na descida em direo a manresa.
10 11Em Em
ComPAnHiA de Jesus pErEgriNOs Em missO
buJArALoz
CAndAsnos FrAgA LLeidA Verd iguALAdA
montserrAtCerVerAPALAu dAngLesoLA
VentA desAntA LuCA
Montserrat, pelo conjunto de rochas forMa uMa Montanha intrigante, que parece uM castelo de areia feito por deus eM sua infncia. dimas oliveira
mAnresA
Em 21 de maro de 1522, Incio chega a Manresa, onde abrigou-se em uma cova, vivendo como eremita e mendigo. No local, ele escreveria os Exerccios Espirituais.
percorrer o Caminho inaciano sozinho e passar em lugares desconhecidos fez com que eu sentisse a presena real de deus em toda a jor-nada. o ponto alto foi o de conhecer montser-rat, que, pelo conjunto de rochas, forma uma montanha intrigante, que parece um castelo de areia feito por deus em sua infncia. Eu espero poder refazer essa experincia sem-pre que puder, pois a peregrinao esconde muitos tesouros nos lugares, nas pessoas que encontramos e em ns mesmos.
Dimas Oliveira, designer do Ncleo de Comu-nicao Integrada Jovem realizou a peregrinao entre os meses de janeiro e fevereiro de 2015
12 13Em Em
O fuNDADOr DA COMPANhIA DE JESuS NASCEu NO CAStELO DE
LOyOLA, EM AzPEItIA, rEGIO bASCA AO NOrtE DA ESPANhA, EM
1491. fILhO DE fAMLIA CrISt DA NObrEzA rurAL, O CAuLA DE
13 IrMOS E IrMS fOI bAtIzADO COMO IIGO. MAIS tArDE, ENtrE-
tANtO, MuDArIA SEu NOME, PASSANDO A ASSINAr INCIO.
esPeCiAL
12 13Em Em
Ambicioso das altas cortes de en-to, desde jovem, Incio parecia saber o que queria, conta Pe. Joo Quirino Weber, assistente espiritual da
Direo do Colgio Catarinense, orien-
tador de Exerccios Espirituais, asses-
sor da CVX e escritor. Assim, em 1506,
quando tinha aproximadamente 15
anos, colocou-se a servio de Juan Ve-
lzquez de Cullar, ministro do Tesouro
Real durante o reinado de Fernando de
Arago. Aos cuidados do seu protetor,
Incio recebeu esmerada formao,
aprimorou sua cultura e tornou-se ex-
mio cavaleiro, mostrando inclinao
pelas aventuras militares.
Mas, para melhor descrev-lo nessa
poca, vale recorrer sua autobiografia,
na qual ele relata que, at os 26 anos de
idade, tinha sido um homem entregue
s vaidades do mundo. Isso nos reme-
te a 1517, quando Juan Velzquez cai em
desgraa e Incio passa a servir ao du-
que de Njera e vice-rei de Navarra, An-
tnio Manrique, participando de vrios
combates militares.
Em 20 de maio de 1521, ao tentar,
sem sucesso, proteger Pamplona (capi-
tal de Navarra) dos invasores franceses,
Incio ferido por uma bala de canho
que, alm de partir sua perna direita,
deixa a esquerda com leses. O feri-
mento foi, certamente, um momento e
uma condio para que Incio desse um
salto qualitativo em sua vida, ressalta
Pe. Quirino. O fato foi causado pelos
homens, mas a fora interior foi a graa
que o iluminou e o fortaleceu para mu-
dar radicalmente o rumo de sua vida.
Devemos lembrar que Incio era uma
pessoa de f, que foi recebida no seio de
sua famlia e de sua poca.
Desse modo, o ponto fundamental
para a converso de Incio foi a leitura
da Vida de Jesus Cristo, escrita por Lu-
dolfo da Saxnia, e de uma coletnea
da Vida dos Santos. Como no castelo
de Loyola no havia livros de Cavala-
rias, para ocupar-se, Incio lia o que
lhe ofereciam. Foi aps o contato com
esses livros religiosos que ele comeou
a perceber, com ateno e pacincia,
as diferentes ressonncias em seu co-
rao, comenta Pe. Quirino. Por meio
da auto-observao, ele passou a notar
que as ambies mundanas lhe causa-
vam alegrias efmeras, meros prazeres,
ao passo que a entrega a Jesus Cristo lhe
enchia o corao de uma alegria dura-
doura. Essa consolao foi, para Incio,
um sinal de Deus, diz o jesuta.
J recuperado e com o forte desejo de
mudanas em sua vida, Incio decidiu
partir rumo a Jerusalm. Saindo de Loyo-
la, ele seguiu em peregrinao para Mont-
serrat. No caminho, doou suas roupas de
fidalgo a um pobre, passando a usar trajes
mais rsticos. A espada tambm foi dei-
xada no altar da Igreja de Nossa Senhora
Quem foiINCIO DELOyOLA?
14 15Em Em
de Montserrat, aps uma noite de orao.
Em Manresa, Incio abrigou-se em
uma cova. Vivendo como eremita e
mendigo, passou as mais duras neces-
sidades. Mas seu objetivo era maior:
queria ter tranquilidade para fazer ano-
taes em um caderno que, mais tarde,
transformar-se-ia no livro dos Exer-
ccios Espirituais, o mais importante
de seu legado. Incio foi aprendendo,
como um menino de escola, as novas
lies de vida. Constatava e registrava
com muita lealdade o que estava viven-
ciando. Foi um processo de honesto
discernimento espiritual. Com genero-
sidade, assumiu todas as consequn-
cias da nova vida, diz Pe. Quirino.
ForA mobiLizAdorA
Aps deixar sua vida de eremita em
Manresa, Incio seguiu em sua longa
peregrinao at Jerusalm, onde perma-
neceu por um tempo. De volta Europa,
sofreu perseguies e incompreenses.
Essas experincias fazem-no perceber
que era necessrio estudar para melhor
ajudar os outros. A cidade escolhida para
dedicar-se aos estudos de Filosofia e Te-
ologia foi Paris (Frana), onde conseguiu
agrupar colegas a quem passou a chamar
de companheiros ou amigos no Senhor.
Esse foi o primeiro esboo do que seria
a Companhia de Jesus, conta Pe. Paulo
Lisba, orientador espiritual e vigrio da
Parquia So Lus Gonzaga, em So Pau-
lo. Creio poder afirmar que, mais do que
fora interna, o que mobilizou Incio
convertido a procurar e a ir s pessoas de
seu entorno foi a graa prpria daquela
sua mudana: sair de um egosmo arrai-
gado, cheio de vaidades, para um desejo
que crescia de dentro para fora de ser
para os outros, ou seja, ajudar as almas,
em sua linguagem mais familiar.
Em 15 de agosto de 1534, na capela
de Montmartre, em Paris, Incio e seis
companheiros Francisco Xavier, Pedro
Fabro, Afonso Bobadilha, Diogo Lanez,
Afonso Salmeiro e Simo Rodrigues
fazem votos de dedicarem-se ao bem
dos homens, imitando Cristo, peregrinar
a Jerusalm e, caso no fosse possvel, ir
apresentar-se ao Papa, com o objetivo de
colocarem-se disposio do Pontfice.
Um ano depois, os votos so renovados
por eles e mais trs outros companhei-
ros Cludio Jaio, Joo Codure, Pascsio
CrEIO PODEr AfIrMAr QuE, MAIS DO QuE fOrA INtErNA, O QuE
MObILIzOu INCIO CONvErtIDO A PrOCurAr E A Ir S PESSOAS DE
SEu ENtOrNO fOI A GrAA PrPrIA DAQuELA SuA MuDANA: SAIr
DE uM EGOSMO ArrAIGADO, ChEIO DE vAIDADES, PArA uM DESEJO
QuE CrESCIA DE DENtrO PArA fOrA DE SEr PArA OS OutrOS, Ou
SEJA, AJuDAr AS ALMAS, EM SuA LINGuAGEM MAIS fAMILIAr.
A conversoCinco fatores determinantes no processo de converso de Incio:
As leituras religiosas e piedosas que ele mesmo comeou a trazer sua vida.
A introspeco prolongada durante a convalescena, que o fez descobrir
as moes ou movimentos espiritu-
ais no mais ntimo de si mesmo.
Pe. Paulo Lisba, orientador espiritual e vigrio da Parquia so Lus gonzaga, em so Paulo
esPeCiAL
14 15Em Em
Broet. Nascia ali o que viria ser a Compa-
nhia de Jesus, conhecida tambm como
a Ordem dos Jesutas.
Por meio da bula Regimini militan-
tis Ecclesiae, a Companhia de Jesus foi
aprovada oficialmente pelo Papa Paulo
III, em 27 de setembro de 1540. O maior
e mais eficaz dos legados de Incio fo-
ram os Exerccios Espirituais, que ele
soube passar to bem ao grupo dos pri-
meiros jesutas. Ele chegou a coloc-los
como experincia necessria para todo
candidato que quisesse entrar na Or-
dem, ressalta Pe. Paulo. At hoje, os EE
fazem parte do longo processo de for-
mao dos jovens antes de serem acei-
tos definitivamente na Ordem. A meu
ver, essa experincia foi e continua sen-
do o que marca a vida de todo jesuta e
que lhe d a identidade como religioso
na Igreja de todos os tempos.
Em 1541, Incio foi eleito o primeiro
Superior Geral da Ordem, passando a vi-
ver em Roma (Itlia). Dedicou-se fun-
o preparando e enviando os jesutas
ao mundo todo, servindo Igreja e escre-
vendo as Constituies da Companhia
de Jesus. Em 31 de julho de 1556, muito
debilitado, Incio morre em Roma.
Segundo Pe. Paulo, o livro das Cons-
tituies, elaborado com muito amor
e ardor, outro grande legado deixa-
do por Incio. As linhas orientadoras
do documento, muito bem pensadas e
escritas sob a inspirao da Sabedoria
do Esprito, no foram corrigidas, mas
apenas retocadas em alguns pontos ao
longo dos quase cinco sculos da Com-
panhia de Jesus. Isso reflete muito bem
o carisma inaciano, diz o jesuta.
Consequncia dos dois legados cita-
dos anteriormente, Pe. Paulo acrescenta
que a maneira de amar e sentir a Igreja,
como esposa de Cristo Nosso Senhor e nos-
sa me, a Igreja Hierrquica (EE 353), ou-
tra herana deixada por Incio. Acredito
que so esses trs principais legados que
conservam o carisma de Incio intacto.
At mesmo durante a supresso da Com-
panhia de Jesus pela Igreja Catlica, entre
1773 e 1814, no se conseguiu apag-los
dos coraes que se propuseram a lutar
para que o Nome de Jesus fosse glorifica-
do, acima de tudo, conclui.
Fontes | Livros: Autobiografia Escritos de San-
to Incio O Relato do Peregrino e O Caminho
do Peregrino, ambos das Edies Loyola.
A vontade nova e to estranha de seguir mais de perto a Jesus, que foi
aparecendo ao ler a vida de santos,
como a de So Francisco.
A firme resoluo de ir e ficar em Jerusalm, para seguir os passos de
Jesus, aps recuperar-se dos feri-
mentos da bala de canho.
Os Exerccios Espirituais realizados em Manresa,
em muita orao
e penitncia, e
que, praticamente,
fecharam esse j
longo processo de
converso.
16 17Em Em
I N C I O D E L O y O L a
E a f u N D a O D a
C o m p a n h i a d e J e s u s
Pe. Jos Andrs FAyos FLorent, SJ
O ministriO de unidade na igreja santa s
Ilustrao deCarlos Saenz de Tejada
(1897 - 1958)
16 17Em Em
Em junho de 1539, em Roma (It-lia), Incio de Loyola e nove com-panheiros sacerdotes decidiram fundar uma Ordem religiosa: a Compa-
nhia de Jesus. A 27 de setembro do ano
seguinte, o Papa Paulo III aprovaria a
Frmula, ou Regra, da Companhia, que
comearia a existir oficialmente. Por
que ele fez isso? Qual foi sua motivao?
No comeo de sua converso, nem
de longe Incio imaginou que iria fundar
uma Ordem religiosa. Pensava apenas na
sua prpria santidade: fazer penitncia de
seus pecados, imitar os Santos, ser santo.
Mas, logo que inicia sua peregrina-
o, vai aparecendo no seu corao um
desejo: ajudar as almas. esse objetivo
que o leva a estudar. Depois, tambm
buscaria ganhar outros jovens que qui-
sessem seguir seu caminho e seu obje-
tivo. Ajudar os outros, transmitir-lhes a
alegria de conhecer e seguir Jesus, dei-
xando as riquezas e honras deste mun-
do. isso que Incio fez.
Em Paris (Frana), encontrou com-
panheiros que aderiram totalmente a
seu projeto: Pedro Fabro e Francisco
Xavier foram seus colegas de quarto na
universidade. Eles seriam seus mais fiis
discpulos e seguidores. Outros seis for-
mariam com eles o grupo de dez sacer-
dotes, de vasta cultura e profunda pieda-
de, que queriam dedicar sua vida a Deus.
Eles fizeram voto de viver em pobreza e
castidade e de ir a Jerusalm para gastar
sua vida em proveito das almas.
No conseguindo viajar a Jerusalm, vo a Roma para coloca-
rem-se disposio do Papa Paulo III. Ele lhes dir o que devem
fazer e aonde ir. Incio, que tinha sido perseguido pelas autorida-
des da Igreja, mantm, contudo, atitude de profunda f com res-
peito pessoa do Papa. Ele o representante de Cristo e a palavra
dele a manifestao da vontade de Deus.
At a, no h nenhum projeto de formar uma Ordem religio-
sa. Apenas formam um grupo de amigos, que andam juntos para
ajudar os outros na vida espiritual. Mas...
O Papa aceita sua oferta e pede para trabalharem em Roma. Tor-
nam-se conhecidos pela cincia (telogos pela Universidade de Paris)
e por suas virtudes (vivem pobremente, no cobram nada pelos seus
ministrios e dedicam-se a pregar a palavra de Deus e ajudar os po-
bres). Chovem, ento, os pedidos de reis e bispos para irem a seus do-
mnios. No demora muito e so enviados a Siena e a outras partes da
Itlia. O grupo comea a se dispersar.
Estamos no incio de 1539. o momento da grande delibera-
o. O que fazer? Manter a unio do grupo ou dispersar-se, indo
cada um para onde for enviado? Acabaria, assim, a unio desse
grupo que durante dez anos viveu e trabalhou junto?
Seria longo descrever o discernimento. O certo que descobrem
ser a vontade de Deus permanecerem juntos. E, para selar essa unio,
ser tambm necessrio fazer um voto de obedincia a um deles.
Isso significa tornar-se uma Ordem religiosa com os trs votos de
castidade, pobreza e obedincia , alm disso, precisariam da apro-
vao do Papa, que aconteceria a 27 de setembro de 1540.
Por meio de dificuldades e contradies, Deus foi guiando Incio
para seu objetivo. No o dele, mas o de Deus. Fundar a Companhia de
Jesus, aceitar novos companheiros e espalhar-se por todo o mundo
conhecido daquele tempo ajudando as almas.
Pe. Jos Andrs Fayos Florent, SJ administrador paroquial da Parquia Santo Incio de Loyola, em Teresina (PI).
por meIo de dIfICuldades e ContradIes, deus foI guIando InCIo para seu objetIvo. no o dele, mas o de deus. fundar a CompanhIa de jesus...
santo incio de loyola entre so pedro Fa-bro e so Francisco Xavier, aps pronunciarem os votos religiosos na igreja de montmartre, em paris, a 15 de agosto de 1534.
18 19Em Em
Os primeiros jesutas pre-gando, ensinando as crian-as , ouvindo confisses e celebrando a Eucaristia.A igreja a antiga igreja de Santa Maria della Strada .Ilustrao de Peter Paul Rubens (1577 - 1640).
ComPAnHiA de Jesus gOvErNO
18 19Em Em
cOmpANHiAdE jEsus:uMa OrDEM atIvaE INOvaDOra
pE. danilo mondoni, SJ
Examinando sua experincia inte-rior, Incio progressivamente che-gou convico de que Deus lhe fa-lava por meio dela. Aprendeu que meditar
e contemplar orar com tudo o que se :
inteligncia, memria, imaginao, vonta-
de e afetividade. Seus Exerccios Espirituais
tm por objetivo ajudar as pessoas a entrar
nelas mesmas para descobrir a a ao di-
vina, a conduzi-las em um caminho espiri-
tual de acordo com seus dons e sua perso-
nalidade; so a base da espiritualidade e da
teologia da Companhia de Jesus e a matriz
de suas Constituies documento que re-
gula o funcionamento da Ordem religiosa.
Por sua intuio mstica e pela ex-
perincia prpria das necessidades
da Igreja, Incio insistiu na atividade
apostlica como marca essencial da
vocao jesutica. Nesse sentido, as
Constituies da Companhia de Jesus
no so uma coleo de decretos e re-
gras, mas apresentam um conjunto de
objetivos e ideais. Assim como os Exer-
ccios, repousam na hiptese de um
crescimento psicolgico e espiritual;
manifestam, ao mesmo tempo, firme-
za e suavidade, em dosagem jurdica
que permite Companhia adaptar-se s
circunstncias, conservando sua iden-
tidade. Teologicamente, a obra supe a
compatibilidade do Cristianismo com o
que a cultura oferece de melhor.
A Companhia de Jesus uma Ordem
inovadora e ativa. As inovaes provm da
finalidade apostlica e das exigncias fun-
damentais de uma Ordem ligada ao Papa:
A santificao dos outros situa-
-se no mesmo plano da santifi-
cao pessoal.
Empenho pelo progresso espiritu-
al dos fiis em todas as formas de
ministrio da Palavra.
Mobilidade de todos os membros.
Adaptao aos diversos ambientes.
Governo centralizado: Padre Geral
e Provinciais.
as constituies da coMpanhia de jesus no so uMa coleo de decretos e regras, Mas apresentaM uM conjunto de objetivos e ideais.
Dessas exigncias, derivam as no-
vidades da estrutura e da formao dos
membros:
Classes ou graus: professos (quar-
to voto solene em relao s mis-
ses), coadjutores espirituais (pa-
dres) e temporais (irmos).
Longa formao: residncias pr-
prias e estudos em universidades.
O ministrio teolgico, a tarefa edu-
cativa, a preocupao com a justia e o
dilogo inter-religioso so as priorida-
des e as perspectivas mais importantes
que se apresentam aos jesutas.
A educao o meio por excelncia de
esclarecer as conscincias e de armar as
vontades para o servio ao bem comum
na fidelidade ao Deus revelado por Jesus
Cristo. Trata-se de procurar educar a tota-
lidade da pessoa: psicolgica, moral, espi-
ritual, intelectual e profissionalmente.
Em meio ao pluralismo e fragmen-
tao de valores, importa dar acesso in-
teligncia das coisas de Deus e tradio
crist mais vigorosa, questionar as razes
culturais e intelectuais da injustia e edu-
car para a cultura da responsabilidade e
do sentido da solidariedade, enfim con-
tribuir para que a humanidade encontre o
melhor caminho de preservar e promover
a vida em todas as suas dimenses bus-
car Deus em todas as coisas e participar
da luta por um mundo mais justo.
Pe. danilo mondoni, SJ professor associado da FAJE (Faculdade Jesuta de Filosofia e Teologia), professor de Histria do Cristianismo na Faculdade de So Ben-to e editor assistente de Edies Loyola
20 21Em Em
ComPAnHiA de Jesus prOmOO dA justiA E EcOLOgiA
20 21Em Em
O grande legado de Incio para a humanidade foi seu incansvel esforo em se colocar a servio das pesso-as. Nutria grande desejo de ajudar as almas. A partir de sua prpria experincia de converso, foi sistematizando
sua relao com Deus e deixando-se conduzir por Ele.
Mergulhando no mais profundo do seu interior, Incio foi
capaz de ir descobrindo qual a misso do ser humano neste
mundo: O homem criado para louvar, reverenciar e servir
a Deus Nosso Senhor e mediante isto salvar sua alma (EE,
Princpio Fundamento, n 23). Incio vivenciou a criao do
universo pelo Verbo: como tudo vem de Deus Vivo pela sua
ao criadora, e como tudo volta sua origem pelo Verbo en-
carnado. Em sua busca incansvel, vai tomando conscincia
de que o ser humano ser plenamente humano medida que
for capaz de estabelecer relaes justas com o Absoluto, com
seu semelhante e com a natureza.
Portanto, desqualificar este mundo para tentar viver em
outro uma grande alienao. Do ponto de vista cristo, o ser
humano e suas realizaes consistem, em primeiro lugar, em
situar-se com liberdade e responsabilidade no mundo com
Deus, co-criador e corresponsvel pela obra da criao, de-
fendendo e protegendo a vida em todas as suas dimenses.
O Reino de Deus no cai do cu, nunca produto de foras
celestiais capazes de prescindir de uma atuao humana.
Vivendo h mais de 15 anos na Amaznia, sinto-me cons-
tantemente interpelado a vivenciar a experincia de Deus na
criao a sabedoria dos povos originrios, as belezas das flo-
restas, dos rios, das aves so um convite a contemplar as mara-
vilhas do Criador. A preservao da Amaznia uma batalha que
a humanidade no pode perder e a Companhia de Jesus deve lutar
por essa causa. Devemos contribuir para a misso da Compa-
nhia universal para promover relaes justas com a criao
(Pe. Adolfo Nicols, Superior Geral da Companhia de Jesus).
Estamos em uma encruzilhada. Diante de uma crise civi-
lizacional: ambiental, econmica, poltica, de relaes e de
valores. Acredito que a inspirao da mstica Inaciana, vivida
em sua totalidade e abrangncia, pode nos ajudar a colocar
em prtica outro mundo possvel, pode nos religar com a ter-
ra, nos levar a refletir e a pensar em um projeto societrio, de
valores, de relaes e de cultura da vida. Relao com as ou-
tras formas de vida, com a terra, com a gua, com a Natureza.
Relao comigo e com os outros, com o Outro. O social e o
espiritual. Conceito cclico do tempo e dos ciclos da Nature-
za, o equilbrio. Questionar o conceito do desenvolvimento
enquanto crescimento econmico e linear.
Com o passar dos anos, todo esse legado de Incio foi sendo
incorporado pela Companhia de Jesus. Deu nossa Ordem reli-
giosa a arma da vontade disciplinada e a estratgia de abran-
gncia mundial, que h mais de quatrocentos anos a tem con-
duzido com bom xito. Com ele, as fileiras dos santos de todos
os homens e mulheres escolhidos por Deus, foram acrescidas
por um santo da vontade, por um pecador que achou seu ca-
minho para Deus, porque sua vontade era procurar Deus; por
algum que foi coroado com o halo da santidade porque lutou
por ela com todas as suas foras.
Mesmo depois de tantos anos, ele ainda representa com
perfeio o ideal, o tipo moderno do homem da fora da vonta-
de tipo que, desde ento, tornou-se caracterstico de organi-
zao do esforo humano. Sua inspirao tem sido ajuda para
inmeras pessoas que desejam alcanar a liberdade de esprito,
atravs da conscincia do significado de sua existncia, discer-
nindo o que mais a conduz para a vida em plenitude.
Concluindo, o segredo de sua permanncia est no fato
de que a vontade humana escolhe um objetivo fora do tempo
e do espao, no reino do esprito. A obra de Incio sobreviveu
na terra porque aspirava ao cu, sobreviveu no tempo porque
lutava pela eternidade.
Em tudo amar e servir!
Pe. Paulo tadeu barausse, SJ presbtero de Apoio da rea Missionria Santa Margarida de Cortona, em Manaus (AM)
o grande legado de incio para a huManidade foi seu incansvel esforo eM se colocar a servio das pessoas
pE. paulo tadEu BaraussE, SJ
inspirados pelamstica inaciana
22 23Em Em
Escultura de Santo Incio na Loyola university, em
Chicaco (EUA)
ComPAnHiA de Jesus EducAO
Foto
: Nat
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22 23Em Em
Santo Incio de Loyola no fundou uma Ordem religiosa para trabalhar com Educao. Inicialmente, a vocao jesuta foi concebida para discorrer por vrias terras. No entanto, o perodo de estudos do fundador, entre 1528 e
1535, na Frana, foi to positivo que tudo o que a Companhia
de Jesus faz tem uma estrutura pedaggica interna, uma in-
teno formativa e uma dimenso intelectual.
Estudar deu a Santo Incio melhores condies de sis-
tematizar e partilhar a sua experincia espiritual de con-
verso. Ele gostou do modus parisienses porque proporcio-
nava aos alunos um itinerrio personalizado e progressivo.
Os estudos em Paris influenciaram o modo de conceber o
livro dos Exerccios Espirituais (EE), que o roteiro para o
retiro de trinta dias.
Apostolicamente, Santo Incio e seus primeiros companhei-
ros quiseram dedicar-se ao ministrio instrudo da Palavra de
Deus com inteno formativa, tendo nos EE seu melhor meio
de ajudar as pessoas. Bem cedo, porm, perceberam a impor-
tncia de abrir colgios e universidades para a formao integral
da pessoa humana. Por isso, a Companhia de Jesus passou a ser
identificada com Educao, formando, nas letras e no esprito,
homens e mulheres competentes, conscientes, compassivos e
comprometidos com os outros, principalmente os mais pobres.
Se as universidades nasceram na Idade Mdia, os ciclos de
estudos anteriores foram organizados a partir da fundao do
primeiro colgio jesuta (Messina, Itlia, 1548). Em outras pa-
lavras, a Educao Bsica nasceu com a Companhia de Jesus.
O Colgio Romano do sculo XVI, por exemplo, s mais tarde
deu origem Universidade Gregoriana. Georgetown Universi-
ty, em 1789, ilustra bem a evoluo da escolaridade influen-
ciada pelos colgios jesutas. Aos poucos, o curso completo
de sete anos deu origem a dois ciclos complementares: um,
para alunos de 14/15 a 17/18 anos; e outro, para os primeiros
estudos universitrios. Nos Estados Unidos, atualmente,
existe o High School de quatro anos (no Brasil, o Ensino M-
dio dura trs anos) e o College (bacharelado universitrio de
quatro anos). Na Amrica, o colgio mais antigo em funcio-
namento o San Bartolom, em Bogot, Colmbia, fundado
em 1604, e, no Brasil, o Colgio So Lus, em So Paulo, que
completa 150 anos em 2017.
No final do sculo XVI, surgiu a Ratio Studiorum. Trata-se
de um manual sistemtico de procedimento pedaggico e or-
ganizao do currculo e da aprendizagem. Foi amplamente
adaptada segundo as circunstncias de tempos, lugares e pes-
soas, inspirando o apostolado educativo dos jesutas at hoje.
Aplicando aos colgios e universidades a pedagogia inaciana
dos EE e o modus parisiensis, a Ratio proporcionou excelncia
em educao, realizando a misso da Companhia de Jesus nas
suas comunidades educativas.
Se Santo Incio visitasse os nossos colgios hoje, percebe-
ria como eles esto em sintonia com a viso do Papa Francis-
co, que quer a Igreja nas fronteiras e no em laboratrios,
onde tudo pode ser controlado de antemo. E esse o convite
do Rei Eterno (EE 95): segui-Lo nas lutas do dia a dia e partici-
par com Ele nas vitrias.
Pe. eduardo Henriques, SJ assistente espiritual no Colgio Antnio Vieira e reitor do Santurio Nossa Senhora de Ftima, em Salvador (BA)
sAnto inCio e A eduCAoPe. eduArdo HenriQues, SJ
tudo o que a coMpanhia de jesus faz teM uMa estrutura pedaggica interna, uMa inteno forMativa e uMa diMenso intelectual
24 25Em Em
pE. adroaldo palaoro, sj
inCio dEloYola:SaNtO DOS tEMPOSNOvOS
ComPAnHiA de Jesus sErviO dA F
24 25Em Em
Foi num contexto assim que o pe-regrino Incio de Loyola, sozinho e a p pelos caminhos da Europa, situa-se nas fronteiras da humanidade
em busca da comunho universal.
Depois de cinco sculos, Santo In-
cio continua sendo uma figura nica e
paradigmtica. O marcante nele est no
fato de ter sido capaz de situar-se, de
maneira original, no contexto das mu-
danas de seu mundo e de seu tempo.
Ele considerado o santo dos tempos
novos que despontavam perante seus
olhos deslumbrados.
O itinerrio da sua vida foi um pro-
cesso constante de leitura orante da re-
alidade. Por isso, Incio foi um homem
de sntese num mundo em mudana e
at contraditrio, pois ele assumiu com
abertura total, sem preconceitos, sem
nostalgias estreis, a mudana de tem-
po que lhe coube viver. Isso lhe abriu
horizontes culturais novos, nos quais
deixaria sua marca original.
A grande originalidade da histria
e da vida de Incio no a sua atitu-
de diante do que estava ocorrendo no
mundo, mas a que aconteceu dentro
dele. Sua principal contribuio his-
em todo momento histrico, quando a Igreja e a sociedade so sacudidas por grandes mudanas, surgem homens e mulheres que rompem com es-quemas e seguranas envelhecidos e deixam-se conduzir pelo esprito ao deserto, s margens, s fronteiras... Fugindo de um ambiente e de uma ordem asfixiante.
tria da humanidade no o que pesso-
almente ele realizou em suas atividades
de apostolado e de governo, ou sua obra
exterior mais conhecida a Companhia
de Jesus, mas a descoberta de seu mun-
do interior e, atravs dela, a descoberta
desse continente sempre inexplorado e
surpreendente que o corao de cada
ser humano, onde acontece o mais im-
portante e decisivo em cada pessoa.
A bala que o feriu na batalha de Pam-
plona no transpassou somente sua
perna; atravessou, tambm, de modo
igualmente profundo e traumtico, todo
o mundo de ambies e sonhos de con-
quistas que havia perseguido e fantasiado
at aquele momento. Todo um sistema de
ideais se v, desse modo, derrubado.
Um castelo interior desmorona-se ao
mesmo tempo em que comea a surgir
outro edifcio humano nunca imaginado,
seduzido pela pessoa de Jesus Cristo, que,
a partir de agora, ocupar a tela inteira de
sua vida. As velhas fronteiras geogrficas
e polticas pelas quais Incio lutou apai-
xonadamente sero substitudas por ou-
tras, aquelas do corao humano.
Enquanto seus contemporneos
aventuravam-se na descoberta de novas
26 27Em Em
terras, seu descobrimento no menos importante ou de me-
nor alcance humano que o daqueles. Sem rudo, galees, di-
nheiro, plvora, armas, sangue e violncia, Incio abrir cami-
nhos nesse continente interior, prprio e de cada ser humano,
deixando-se conduzir e observando como conduzido.
Caminhar de surpresa em surpresa, em sua nova hist-
ria, apoiando-se sempre na interrogao evanglica que no
lhe sair mais dos lbios e do corao, e com a qual ir abrin-
do, como uma chave mestra, os captulos desconhecidos de
sua vida: Quid agendum? (Que devo fazer?).
Inserido apaixonadamente em seu tempo e em seu mun-
do, Incio, de nenhuma maneira, estava preocupado em pro-
por uma nova doutrina teolgica, nem uma ideologia e/ou
nova moral. Ele encontrou experimentalmente sua maneira
pessoal de mergulhar na aventura do esprito, sistematizou o
mtodo e o props a outros (Exerccios Espirituais). O central
de sua proposta no consiste no contedo doutrinal, mas nas
indicaes prticas do mtodo de exerccio para tocar, ativar,
assumir e fortalecer as estruturas profundas da pessoa e, as-
sim, dar novo sentido prpria existncia.
Os Exerccios Espirituais constituem-se como um caminho
a percorrer, uma maneira vital de dispor-nos inteiramente ao
do Esprito (deixar-nos conduzir por Ele), que nos transforma e
liberta o nosso corao de todo desejo desordenado para buscar,
encontrar e realizar a vontade de Deus na nossa prpria vida.
Os EE so uma escola de orao, de escuta, na qual so-
mos convidados a descobrir Deus e seu projeto, ajudando a
nos conhecer mais a fundo, em nossas luzes e sombras. Os EE
tm sido uma riqueza na vida da Igreja, uma proposta que j
ajudou uma infinidade de pessoas a se libertar de tudo o que
lhes trava viver mais intensamente, ganhando profundidade,
sentido e compromisso em suas vidas.
A presena inspiradora e original de Incio em seu tempo
e em seu mundo pode nos ajudar, atravs dos Exerccios Es-
pirituais, a nos situar melhor e mais lucidamente no nosso.
Vivemos um contexto social e cultural no qual se constata um
modo de vida que no favorece o contato profundo consigo
mesmo, com os outros, com o Criador.
Vivemos a era do vazio, tempos de inrcia e passividade,
em que a superficialidade apresenta-se como ideal de vida e
as grandes aspiraes reduzem-se ao consumismo e ao narci-
sismo. Tudo convida ao descompromisso e mediocridade. A
vida ps-moderna apresenta-se cada vez mais como um cami-
nho sem meta, um vagar deriva, sem horizontes. Essa desar-
monia interna exteriorizada gerando uma desarmonia na
relao com os outros, com a natureza e com o Criador.
nesse contexto de profunda desarmonia que a pedagogia
dos Exerccios Espirituais revela sua atualidade e sua fora trans-
formadora. Como Pedagogia da Interioridade, ela reacende o mo-
vimento de busca da harmonia, fecunda o esprito criador, abre
espao para o novo, nos faz garimpeiros do ouro escondido nas
cavernas profundas. Portanto, uma pedagogia humanizadora.
A originalidade dos Exerccios Espirituais encontra-se na
aventura da re-descoberta do mundo interior, esse mundo des-
conhecido e surpreendente, onde acontece o mais importante
e decisivo de cada pessoa. Eles revelam que toda pessoa possui
dentro de si uma profundidade que seu mistrio ntimo e pes-
soal. Por isso, viver em profundidade significa entrar no mago
da prpria vida, descer at as razes da prpria existncia e che-
gar corrente subterrnea de gua viva, de desejos...
Essa interioridade um modo de ser, uma atitude de base
a ser vivida em cada momento e em todas as circunstncias.
Mesmo nas atividades cotidianas mais simples, a pessoa que
criou espao para a interioridade mostra-se centrada, serena
e cumulada de paz, caminhando junto com os outros na mes-
ma direo que aponta para a Fonte de vida e de eternidade.
A partir da interioridade, tudo se transfigura, tudo tem sen-
tido, tudo vem carregado de venerao e sacralidade. Viver a
interioridade desenvolver a prpria capacidade de contem-
plao, de compaixo, de assombro, de escuta das mensagens e
dos valores presentes no mundo nossa volta. Uma interiori-
dade desvelada que move a pessoa a ser presena inspiradora e
comprometida com a transformao do seu mundo.
Pe. Adroaldo Palaoro, SJ diretor do CEI-Jesutas (Centro de Espiritualidade Inaciana)
os exerccios espirituais so uMa escola de orao, de escuta, na qual soMos convidados a descobrir deus e seu projeto, ajudando a nos conhecer Mais a fundo, eM nossas luzes e soMbras.
ComPAnHiA de Jesus sErviO dA F
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p A r A m A i O r g L r i A d E d E u sA d M A J O R E M d E I G l O R I A M