inventário dos autores de gravações de sons animais

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Versão 2.0 Inventário dos autores de gravações de sons animais Identificação de fontes primárias de informação para a história da bioacústica 2ª edição Paulo A. M. Marques (coordenador) Daniel M. Magalhães Susana F. Pereira ISPA – Instituto Universitário e Museu Nacional de História Natural e da Ciência Lisboa 2012

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2 ed No total, neste estudo, foram identificados 78 gravadores de sons de animais em Portugal que exerceram a sua atividade entre 1977, início da bioacústica em Portugal, e 2010. A lista, apesar de não ser exaustiva, deverá conter a maioria dos gravadores que tiveram atividade em Portugal. Estes resultados evidenciam que as primeiras gravações sistemáticas de animais em Portugal foram realizadas muito mais tarde que noutros países como os EUA (1945), a Alemanha (1952) ou a Austrália (1961) (Ranft, 2004). ...

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Page 1: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Versão 2.0

Inventário dos autores de gravações de sons animais Identificação de fontes primárias de informação para a história da bioacústica

2ª edição

Paulo A. M. Marques (coordenador) Daniel M. Magalhães Susana F. Pereira

ISPA – Instituto Universitário e Museu Nacional de História Natural e da Ciência Lisboa 2012

Page 2: Inventário dos autores de gravações de sons animais

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Estudo realizado no âmbito do projeto HC/000/2009 “Paisagens Acústicas Naturais num Mundo em

Mudança: Preservar o Passado e Construir as Memórias do Futuro” financiado por fundos nacionais

através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia e coordenado por Paulo A. M. Marques (PhD).

Citação

Marques, P.A.M., Magalhães, D.M. & Pereira, S.F. 2012. Inventário dos gravadores de sons animais:

Identificação de fontes primárias de informação para a história da bioacústica. Versão 2.0. ISPA-IU &

MNHNC. Março, Lisboa.

Page 3: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 3

O desenvolvimento científico tem desde sempre acompanhado a evolução da sociedade.

Desde os meados do século XIX que as tecnologias desenvolvidas com base no conhecimento científico

alteram o mundo à nossa volta sendo que, reciprocamente, o próprio desenvolvimento tecnológico

origina o progresso da ciência (Daston et al., 2005). Ao longo do século XX registou-se um grande

avanço na ciência, que se traduziu em novas descobertas científicas (Garfield, 2007). Este avanço foi

alicerçado no desenvolvimento de novos equipamentos de suporte à investigação, mais poderosos e

sofisticados, e na evolução do suporte teórico que fornecia o enquadramento para o novo

conhecimento. Estes aspetos que na sua essência são característicos do estudo e conhecimento

empírico e transcendem eras (Daston, 2004) mas que na segunda metade do século XX sofreram uma

aceleração. O processo do progresso científico origina sempre novos campos de conhecimento (Daston,

2004) facto este transversal às mais diversas áreas científicas (Bybee et al., 1991). A bioacústica não é

uma exceção (Obrist et al., 2010).

A bioacústica dedica-se ao estudo dos sons animais, envolvendo o estudo da sua emissão,

receção, o meio em que se propaga e os comportamentos associados (Fletcher, 2007). É uma área de

conhecimento transversal que abrange temas desde a evolução (e.g., Lynch and Baker, 1994, Luther and

Baptista, 2010) à conservação (e.g., Gilbert et al., 1994), passando pela sistemática (e.g., Quartau and

Boulard, 1995) e fisiologia (e.g., Penna et al., 2009). Os sinais acústicos são usados por uma diversidade

de grupos de animais, incluindo insetos, peixes, anfíbios, répteis, aves, mamíferos terrestres, morcegos e

mamíferos marinhos. As vocalizações podem ser usadas em diversas situações assumindo papéis

importantes em diferentes contextos da vida dos animais, como atração do parceiro sexual, defesa do

território, interações de grupo, comunicação, localização ou procura de alimento (Rossing and Fletcher,

2007).

O desenvolvimento da Bioacústica deu-se, efetivamente, a partir de 1950, quando se tornaram

disponíveis para a comunidade científica métodos práticos de gravação e análise de som. Os gravadores

portáteis reel-to-reel da Uher e Nagra surgem por volta de 1950: inicialmente desenvolvidos para os

repórteres de notícias, a sua utilização rapidamente se alargou à comunidade científica, tendo-se o seu

uso mantido até ao início dos anos noventa do século passado (Vielliard, 2003). A popularização do uso

de cassetes como suporte físico para as gravações e o surgimento de aparelhos mais portáteis como os

Introdução

Page 4: Inventário dos autores de gravações de sons animais

4

walkmans da Sony (Gay, 1997), facilitaram ainda mais a generalização do uso científico destes

equipamentos. O crescimento que é ainda mais acelerado desde o final do século XX, com o advento do

computador pessoal e a entrada na era digital.

Em Portugal a bioacústica desenvolveu-se ao longo da segunda metade do século XX, estando

por fazer uma abordagem histórica detalhada.

O desenvolvimento da bioacústica decorreu no período de crescimento da atividade científica

em Portugal. Este facto, associado quer ao seu caráter transversal nas disciplinas dentro da biologia, quer

à sua alargada aplicação a diferentes grupos animais, permite caracterizá-lo como um bom exemplo do

desenvolvimento científico em Portugal, constituindo um interessante estudo de caso da história

recente da ciência no nosso país. O estudo da história da bioacústica reveste-se de especial interesse,

especialmente a dois níveis: como estudo de caso da história da ciência e como meio para identificar o

património gravado em Portugal, quer como documentação da memória histórica quer como memória

acústica ecológica.

Assim, o estudo da história da bioacústica permite identificar o património científico,

contribuindo para a constituição da memória científica que deve ser abordada do ponto de vista

pluridisciplinar (Roediger and Wertsch, 2008). A identificação e documentação das gravações existentes

revelam a biodiversidade registada nas mesmas, contribuindo para a preservação de uma memória

histórico-acústica ecológica.

O presente trabalho pretende assim realizar o inventário dos gravadores de sons naturais em

Portugal e iniciar o estudo da história da bioacústica em Portugal. A realização de uma síntese histórica

necessita de uma fase preliminar, que envolve a identificação e localização de fontes primárias de

informação sobre as quais se poderá apoiar o trabalho de síntese. Neste contexto, destaca-se a

necessidade de identificar os intervenientes e o seu contributo para a bioacústica. Este trabalho

pretende identificar os gravadores de sons naturais que realizaram gravações em Portugal, bem como os

objetivos das suas gravações. O estudo analisa as áreas de conhecimento a que se dedicaram,

caracteriza os grupos taxonómicos gravados, estuda a distribuição geográfica das atividades de

gravações e ainda a variação do esforço de gravação ao longo do tempo.

O presente trabalho enquadra-se no conjunto de trabalhos do projeto “Paisagens Acústicas

Naturais num Mundo em Mudança” com o objetivo de preservação das gravações como parte do nosso

património científico e uma importante fonte de documentação da biodiversidade, no passado e no

presente.

Page 5: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 5

O foco geográfico deste estudo incide sobre gravadores que tenham realizado gravações em

território nacional, incluindo as regiões autónomas. Neste trabalho investigam-se as gravações

realizadas durante a segunda metade do século XX e início do século XXI. As gravações podem incluir

registos realizados em laboratório, em cativeiro e na natureza, e em meio aquático, marinho ou terrestre.

Identificação dos gravadores

Para a identificação dos gravadores iniciaram-se os trabalhos contactando especialistas na área

que, por sua vez, indicaram os nomes de outros gravadores. Os novos gravadores identificados foram

depois contactados e entrevistados ou inquiridos. Neste estudo designam-se por gravadores as pessoas

que tenham realizado gravações de animais ou estudado sons animais usando gravações de outros.

Esta recolha inicial foi complementada com informação obtida recorrendo a bases de dados de

publicações nas quais se identificaram artigos científicos de bioacústica e seus autores. Foram

consultados a plataforma ISI Web of Knowledge e o Google Scholar utilizando combinações de palavras-

chave como “bioacoustics”, “Portugal”, “song” ou “call”. Nas entrevistas e inquéritos foi feito o esforço de

identificar gravadores que poderiam não ter sido detetados anteriormente (através dos métodos já

referidos). Paralelamente, e com o objetivo de identificar gravadores não ligados à investigação

recolheu-se informação por indicação dos especialistas, por pesquisa na internet (incluíndo, entre

outros, a plataforma xeno-canto (http://www.xeno-canto.org/) e fóruns em linha (e.g. nature recordists

http://tech.groups.yahoo.com/ group/naturerecordists/) e procura de gravações comerciais. Desta forma

identificaram-se também os gravadores sem ligação à atividade científica, os quais foram

posteriormente inquiridos.

A entrevista (e o inquérito) foi composta por um conjunto de 32 questões nas quais se recolheu

informação sobre o investigador (ou gravador), o equipamento e a atividade de gravação. A informação

recolhida nas entrevistas e inquéritos, complementada com outras fontes, como artigos e consulta dos

investigadores, permitiu caracterizar cada investigador, nomeadamente no que diz respeito à área de

conhecimento, o grupo taxonómico gravado e a área geográfica em que trabalhou. Os gravadores foram

divididos em duas classes consoante as suas gravações foram realizadas com fins de investigação ou

não. Os investigadores foram agrupados consoante a sua área de atividade, numa de sete áreas de

Métodos

Page 6: Inventário dos autores de gravações de sons animais

6

conhecimento: comportamento, sistemática, evolução, genética, ecologia, conservação e fisiologia. A

cada investigador foi atribuída uma ou mais áreas de conhecimento, de acordo com as suas linhas de

investigação que utilizaram metodologias acústicas. Os gravadores não investigadores, por seu turno,

foram agrupados numa das seguintes classes, de acordo com a sua área de atividade: lazer, gravações

com fim comercial e gravações com fim artístico.

Cobertura taxonómica

Para estudar a cobertura taxonómica as espécies alvo de gravações foram agrupadas ao nível

da Classe com a exceção dos mamíferos, que devido às especificidades das vocalizações e diferença no

meio em que vivem foram divididos em três grupos. Os grupos considerados foram aves, insetos, peixes,

anfíbios, mamíferos terrestres, mamíferos marinhos e morcegos. Os répteis não integraram o estudo,

pois não se detetaram estudos em bioacústica em Portugal com este grupo de animais. Para saber o

esforço de gravação para cada um destes grupos, atribuiu-se o valor de 1 por cada gravador que realizou

gravações com determinada espécie do grupo. Assim, determinou-se o número de gravadores com

atividade em cada grupo. Cada gravador pode ter interesse em mais do que um grupo ao mesmo

tempo, ou alterar o seu interesse ao longo do tempo.

Área geográfica

Para cada gravador foi ainda determinada a área geográfica em que realizou as gravações,

identificando-se uma ou mais áreas geográficas para cada gravador. Para padronizar a cobertura

geográfica optou-se por agrupar a localização das diferentes gravações de acordo com a classificação

territorial de NUTS II (unidades territoriais de 2ª ordem segundo a nomenclatura estatística de unidades

territoriais) correspondendo às regiões: Algarve, Alentejo, Lisboa, Centro, Norte, Açores e Madeira. A

presença de cada investigador em cada NUTS II foi contabilizada como uma unidade e não corresponde

diretamente ao esforço de amostragem, como número de gravações realizadas ou horas de trabalho no

local. Assim, apresenta-se quantos gravadores realizaram trabalhos em bioacústica em cada área,

indicando quais as áreas que atraíam maior interesse da parte da comunidade de gravadores.

Período de atividade

O período de atividade define os anos em que um gravador realizou gravações ou estudos de

bioacústica. No estudo da variação do número de investigadores com atividade em bioacústica ao longo

tempo (número de investigadores por ano) cada gravador foi considerado apenas nos anos em que

tenha estado ativo na realização de gravações, ou ligado a projetos com uso da bioacústica. Ao

considerar o gravador como unidade pretendemos ter uma medida aproximada da variação temporal

do esforço de gravação. Considerou-se que os gravadores detinham gravações quando estavam em

posse de gravações originais realizadas pelos próprios.

Page 7: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 7

Neste estudo identificámos 78 gravadores que realizaram gravações de sons animais em

Portugal no período entre 1977 e 2010 (Tabela 1) tendo entrevistado ou inquerido 62,8% destes (num

total de 14 entrevistas e 35 inquéritos). Os gravadores identificados podem ser agrupados em dois

grupos distintos, gravadores de sons com fins de investigação (investigadores) que representam 83% do

total e gravadores com outros fins e que se dedicam a diferentes atividades, que vão desde a música a

fins lúdicos.

Os investigadores com atividade em bioacústica estiveram institucionalmente associados a 19

instituições, tanto nacionais como estrangeiras (Figura 1) destacando-se a Universidade de Lisboa (valor

acumulado de 16 investigadores), o ISPA-IU e a Universidade dos Açores (respetivamente com o valor

acumulado de 11 e 9 investigadores). As instituições estrangeiras representam 18 % dos investigadores

com gravações em Portugal salientando-se a Universidade de Oxford e a Universidade de Mainz (ambas

com o valor acumulado de 3 investigadores) e a Fonoteca Zoológica, MNCN/CSIC; o MNHN-Paris; o

Instituto de Ornitologia Max Plank e a Universidade de Copenhaga (todas com um valor acumulado de 2

investigadores).

A Universidade de Lisboa lidera também no número médio de investigadores em atividade

(cerca de 5 investigadores/ano) à qual se seguem o ISPA-IU (com um pouco mais de 3

investigadores/ano) e as Universidades de Coimbra e dos Açores (com quase 2 investigadores/ano).

Os investigadores dedicaram-se a diversas áreas do conhecimento e, em Portugal, a bioacústica

foi usada para estudar a biodiversidade desde o ponto de vista dos mecanismos, passando pelo estudo

da função e da sua evolução até à ecologia e à conservação. Os resultados mostram que foi na área do

comportamento, ecologia e sistemática que se concentrou o maior número de investigadores neste

período (1977-2010, Figura 2).

Resultados

Page 8: Inventário dos autores de gravações de sons animais

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Figura 1- Principais instituições para o estudo da bioacústica. Variação do número de investigadores

dedicados ao estudo da bioacústica em diferentes instituições no período de 1977 a 2010.

Figura 2 - Áreas científicas em que a bioacústica é mais usada. Variação do número de investigadores

dedicados ao estudo da bioacústica nas diferentes áreas de conhecimento no período de 1977 a 2010.

Em Portugal, e no período abrangido por este estudo, algumas espécies em cada um dos

principais grupos de animais foram alvo de gravações (Figura 3). Em valor absoluto a maior parte dos

gravadores estiveram dedicados à gravação de aves, estando os outros grupos animais menos

representados em termos de número de gravadores (Figura 3A). Contudo, quando se toma em

Page 9: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 9

consideração a duração do período de atividade dos gravadores esta tendência inverte-se, com a média

do período de atividade dos gravadores em grupos como os insetos, morcegos ou peixes a ser muito

maior que nas aves (Figura 3B). O período de atividade médio dos gravadores é de aproximadamente 7

anos, com uma dedicação média de cerca de metade do seu tempo de investigação aos sons animais.

Figura 3 - Cobertura taxonómica da investigação em bioacústica. Variação do número de gravadores

dedicados a cada grupo taxonómico (A) e a média de anos de atividade por investigador (B) em Portugal

no período de 1977 a 2010.

(A)

(B)

Méd

ia d

e an

os d

e at

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ade

por i

nves

tigad

or

Núm

ero

de in

vest

igad

ores

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10

Neste estudo verificámos que o número de investigadores dedicados à bioacústica mostrou um

aumento desde os primeiros anos desta área de conhecimento, passando de apenas um gravador em

1977 para 26 gravadores ativos em 2010 (Figura 4). Uma análise mais detalhada destaca três períodos:

um período inicial, de 1977 a 1994, com poucos gravadores em atividade e em que praticamente não

houve crescimento; um segundo período de crescimento acentuado que atinge o número de 28

gravadores em 2002, e um terceiro período com alguma oscilação, com o valor de gravadores a

estabilizar num valor na ordem das duas dezenas.

A análise da cobertura territorial das atividades de gravação revela que é no Alentejo que um

grande número de gravadores desenvolve a sua atividade, seguindo-se a Região Autónoma da Madeira.

É também importante salientar que, a esta escala, todas as regiões foram visitadas por gravadores

(Figura 5). É interessante o facto de que as outras áreas geográficas apresentam um número de

gravadores da mesma ordem de grandeza.

Figura 4 - Variação temporal do número de investigadores a trabalhar na área da bioacústica em

Portugal no período de 1977 a 2010.

A maioria das gravações de animais realizadas em Portugal encontram-se na posse dos

gravadores (cerca de 76%) e não estão depositadas em nenhum arquivo.

Núm

ero

de in

vest

igad

ores

Page 11: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 11

4 - Cobertura geográfica das gravações de animais realizadas em Portugal no período de 1977 a 2010. Variação do número de investigadores por região NUTS II.

Page 12: Inventário dos autores de gravações de sons animais

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No total, neste estudo, foram identificados 78 gravadores de sons de animais em Portugal que

exerceram a sua atividade entre 1977, início da bioacústica em Portugal, e 2010. A lista, apesar de não

ser exaustiva, deverá conter a maioria dos gravadores que tiveram atividade em Portugal. Estes

resultados evidenciam que as primeiras gravações sistemáticas de animais em Portugal foram realizadas

muito mais tarde que noutros países como os EUA (1945), a Alemanha (1952) ou a Austrália (1961)

(Ranft, 2004). Na sua maioria estes gravadores dedicavam-se à investigação, sendo as suas gravações

realizadas com propósito científico. Outro tipo de gravadores, com outros fins, surge apenas num

período posterior, que deverá estar associado à introdução no mercado de equipamento de qualidade

profissional, mais portátil e a preços acessíveis como o walkman (Gay, 1997), o minidisc ou os

equipamentos de memória sólida. Neste contexto, a importância das gravações científicas é bastante

grande o que deverá corresponder, em grande medida, à realidade portuguesa. Os investigadores a

trabalhar em bioacústica neste período estavam em grande parte associados às universidades,

nomeadamente à de Lisboa, embora existissem pequenos grupos de investigação dispersos por diversas

instituições em Portugal. Neste trabalho identificámos também investigadores associados a instituições

estrangeiras, um sinal da internacionalização da ciência em Portugal.

A investigação em bioacústica neste período em Portugal foi sobretudo utilizada para

completar o conhecimento sobre determinadas espécies ou grupo de espécies e geralmente foi

combinada com outras perspetivas, como moleculares (Fonseca et al., 2008), taxonómicas (Quartau and

Boulard, 1995) ou ecológicas (Sueur et al., 2004), reforçando a ideia da sua transversalidade temática e

aplicabilidade a diferentes questões (Obrist et al., 2010, Márquez et al., 2011). Em Portugal a

investigação nesta área centrou-se sobretudo no estudo do comportamento animal (Marques et al.,

2011) e da ecologia das espécies (Amorim et al., 2010).

Todos os principais grupos de animais que utilizam o som já foram alvo de gravações em

Portugal. As aves apresentam-se como o grupo com mais gravadores dedicados, talvez devido à sua

abundância, facilidade de observação e importância do som para a maioria das espécies. Contudo, no

que diz respeito ao período de atividade dos investigadores este estudo detetou que é noutros grupos

Discussão

Page 13: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 13

que se observa uma maior longevidade de atividade, como os insetos, os morcegos e os peixes. As

gravações foram realizadas um pouco por todo o território nacional, verificando-se um contributo

semelhante de todas as regiões do território excluindo o Alentejo e a Região Autónoma da Madeira, com

uma maior atenção por parte da comunidade de gravadores.

Em síntese, o período em questão caracteriza-se por ser uma fase de crescimento do número de

gravadores de sons animais com a passagem de menos de 5 na década de 70 para um valor na ordem de

grandeza de 20 no início do século XXI. Este crescimento, que se verificou durante toda a década de 90,

corresponde a um aumento do investimento em ciência e tecnologia (FCT, 2002). A bioacústica segue

assim o padrão do panorama científico nacional de crescimento e está associado a uma

internacionalização nos últimos 40 anos, como de resto a generalidade do meio científico português.

Face ao exposto, os resultados confirmam a bioacústica como um bom estudo de caso do progresso da

ciência em Portugal.

Page 14: Inventário dos autores de gravações de sons animais

14

A equipa deste trabalho agradece a colaboração dos diversos gravadores que se

disponibilizaram a contribuir para este estudo respondendo às questões da entrevista e do questionário.

Especial agradecimento é devido a Ana Maria Costa, Joana Robalo e José Alberto Quartau pela ajuda na

revisão da versão 1 do documento.

Agradecimentos

Page 15: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 15

Amorim, M. C. P., Simões, J. M., Fonseca, P. J. & Almada, V. C. (2010) Patterns of shelter usage and social

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Bybee, R. W., Powell, J. C., Ellis, J. D., Giese, J. R., Parisi, L. & Singleton, L. (1991) Integrating the History and

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Daston, L., Renn, J. r. & Rheinberger, H.-J. r. (2005) International Max Planck Research Network "History of

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FCT (2002) FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia • 1997-2001, cinco anos de atividades, Ministério

da Ciência e da Tecnologia Lisboa.

Fletcher, N. (2007) Animal Bioacoustics. Springer Handbook of Acoustics (eds T. D. Rossing & N. Fletcher),

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Fonseca, P. J., Serrão, E. A., Pina-Martins, F., Silva, P., Mira, S., Quartau, J. A., Paulo, O. S. & Cancela, L. (2008)

The evolution of cicada songs contrasted with the relationships inferred from mitochondrial

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Garfield, E. (2007) Charting The Growth Of Science, Presented at the Chemical Heritage Foundation, May

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Gay, P. D. (1997) Doing cultural studies: the story of the Sony Walkman, Sage, London.

Gilbert, G., McGregor, P. K. & Tyler, G. (1994) Vocal individuality as a census tool: practical considerations

illustrated by a study of two rare species. Journal of Field Ornithology, 65, 335-348.

Luther, D. & Baptista, L. (2010) Urban noise and the cultural evolution of bird songs. Proceedings of the

Royal Society B: Biological Sciences, 277, 469-473.

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Referências

Page 16: Inventário dos autores de gravações de sons animais

16

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Márquez, R., de la Riva, I., Gil, D., Sueur, J., Marques, P. A. M., Llusia, D., Eekhout, X., Gonzalez, L., Perez, M.,

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indentidad. [The sounds of animals: an identity]. Quercus, 399, 34-44.

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Rossing, T. D. & Fletcher, N. (2007) Animal Bioacoustics. Springer Handbook of Acoustics, pp. 785-804-804.

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Sueur, J., Puissant, S., Simões, P. C., Seabra, S., Boulard, M. & Quartau, J. A. (2004) Cicadas from Portugal:

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Vielliard, J. M. E. (2003) A brief history of Bioacoustics. Consultado em 20/02/2011 em

http://www2.ib.unicamp.br/profs/jacques/ibac2003/history.html, 1.

Page 17: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Anexo Tabela 1- Lista de gravadores que realizaram gravações em Portugal durante o período de 1977 a 2010. Apresenta-se os Gravadores, Tipo de atividade, Instituição,

Período de atividade, Área de conhecimento e Grupo taxonómico.

Gravadores Atividade Instituição Período de atividade Área de conhecimento Grupo taxonómico

Alexandre C. Lees Não científica NA 2008 NA Aves

Ana Cláudia Morato Chumbinho Científica ISPA-IU 2001 Comportamento Aves

Ana Margarida Rainho Científica Universidade de Lisboa 1995-2010 Ecologia, Conservação, Comportamento Morcegos

Ana Teresa Mamede de Almeida Correia Científica Universidade de Coimbra 2003-2010 Comportamento, Ecologia Aves

António José Ribeiro Pires Ferreira Não científica NA 1989-1991 NA Mamíferos marinhos

António Paulo Fontoura Pinheiro de Magalhães Científica ISPA-IU, Universidade do Porto 1999-2004 Comportamento, Conservação Aves

Artur R. Serrano

Brancolas

Carlos Pacheco

Científica

Não científica

Científica

Universidade de Lisboa

NA

Universidade de Copenhaga

2001

2002-2010

2000-2002

Comportamento

NA

Comportamento, Conservação

Insetos

Aves

Aves

Catarina Nascimento Moreira Científica Universidade de Lisboa 2001-2010 Sistemática, Evolução Anfíbios

Cláudia Inês Botelho de Oliveira Científica Universidade dos Açores 2008-2010 Ecologia Mamíferos marinhos

Colm C. Moore Científica SPEA Sem informação Ecologia Aves

Cornelia Voigt Científica Instituto de Ornitologia Max Plank 1995- 2002 Comportamento, Evolução Aves

Danilo Russo Científica Universidade de Napoli 1998-2010 Ecologia, Sistemática Morcegos

Eduardo Gonçalves Crespo Científica Universidade de Lisboa 1977-1981 Evolução, Sistemática Anfíbios

Eloisa Matheu

Gabriela Alexandra Pinto Juma

Não científica

Científica

NA

Universidade de Lisboa

Sem informação

1996-2010

NA

Evolução, Sistemática, Comportamento

Sem informação

Insetos

Gonçalo Canelas Cardoso Científica Universidade de Coimbra 1998-2007 Comportamento, Sistemática Aves

Herman van Oosten Não científica NA 2009 NA Aves

Hugh A. Robertson Científica Universidade de Oxford 1983 Comportamento Mamíferos marinhos

Page 18: Inventário dos autores de gravações de sons animais

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Gravadores Atividade Instituição Período de atividade Área de conhecimento Grupo taxonómico

Hugo Emanuel Vitorino Rebelo Científica Universidade do Porto 2001-2010 Sistemática Morcegos

Humberto Delgado Rosa Científica Universidade de Lisboa 1990-1995 Sistemática Anfíbios

Irma Cascão Científica Universidade dos Açores 2007-2010 Ecologia Mamíferos marinhos

Jeróme Sueur Científica MNHN-Paris 2001 Ecologia, Sistemática Insetos

Joana Cardoso Científica Universidade de Lisboa 1998 Comportamento Aves

Joana Maria de Melo Belém Jordão Científica ISPA-IU 2008-2010 Comportamento Peixes

João Miguel Gouveia Nunes Não científica NA 2008-2010 NA Aves

João Pargana Científica Universidade de Lisboa 1995-2004 Comportamento, Sistemática Anfíbios

João Tiago Marques Científica Universidade de Lisboa Sem informação Ecologia, Conservação Morcegos

Jonathan Gordon Científica Universidade dos Açores 1987-1991 Comportamento, Ecologia Mamíferos marinhos

José Alberto Quartau Científica Universidade de Lisboa 1988-2010 Evolução, Sistemática Insetos

José Manuel Abreu de Jesus

José Miguel Simões

Científica

Científica

Universidade da Madeira

ISPA

2008

2007-2010

Evolução, Comportamento

Comportamento

Morcegos

Peixes

José Freitas

José Pedro Sousa do Amaral

Não científica

Científica

NA

MNCN Madrid

Sem informação

2004-2008

NA

Sistemática, Evolução, Ecologia

Sem informação

Anfíbios

José Pedro Tavares Científica RSPB 1997-2000 Comportamento, Conservação Aves

Luís Antero Neves Gonçalves Não científica NA 2008-2010 NA Mamíferos terrestres, aves

Luís de Oliveira Rijo Gordinho Científica Universidade do Porto 2010 Evolução, Sistemática Aves

Luís Freitas Científica Museu da Baleia 1998-2010 Ecologia, Conservação Mamíferos marinhos

Luís Manuel Riberio da Rocha Monteiro Científica Universidade dos Açores 1998-1999 Conservação, Ecologia Aves

Luís Matos Vicente Científica Universidade de Lisboa 1978-1981 e 1999-2003 Comportamento, Evolução, Sistemática Anfíbios, Aves

Madeleine Paillette Científica CNRS-França Sistemática e evolução Anfíbios

Magnus Stewart Robb Não científica NA 2001-2010 NA Aves

Manuel Eduardo dos Santos Científica ISPA-IU 1995-2010 Ecologia, Comportamento Mamíferos marinhos, Peixes

Page 19: Inventário dos autores de gravações de sons animais

Inventário dos gravadores de sons animais 19

Gravadores Atividade Instituição Período de atividade Área de conhecimento Grupo taxonómico

Margarida Maria de Ceia Hasse Ferreira Científica Universidade de Lisboa 2000-2010 Ecologia Anfíbios

Maria Amélia Oliveira Gonçalves Fonseca

Maria Clara Amorim

Científica

Científica

Universidade dos Açores

ISPA-IU

2009

1997-2010

Ecologia

Comportamento, Ecologia

Morcegos

Peixes

Maria da Luz Mathias Científica Universidade de Lisboa 2008-2010 Ecologia, Comportamento Mamíferos terrestres

Maria Inês V. de Albergaria Pinheiro Moreira

Maria João Veloso da Costa Ramos Pereira

Maria Manuela Guilherme Nunes

Científica

Científica

Científica

ISPA

Universidade dos Açores

Universidade dos Açores

1997-1998

1999-2001

2000

Ecologia, Comportamento

Conservação, Ecologia

Comportamento, Sistemática

Aves

Morcegos

Aves

Mark Bolton Científica Universidade dos Açores, RSPB Inglaterra 2007-2010 Sistemática Aves

Martin Packert

Michel Boulard

Científica

Científica

Universidade de Mainz

MNHN-Paris

1998

1973-2006

Comportamento, Evolução

Sistemática

Aves

Insetos

Mónica Almeida e Silva Científica Universidade dos Açores 2007-2010 Ecologia Mamíferos marinhos

Niels Bouton Científica Universidade dos Açores 2004-2005 Comportamento Peixes

Niklas Holmstrom Não científica NA 2005 Nenhuma Aves

Paula Cristina Simões Científica Universidade de Lisboa 1997-2010 Conservação, Evolução e Sistemática Insetos

Paul C. James

Paulo Alexandre Magalhães Marques

Científica

Científica

Universidade de Oxford

ISPA-IU, Universidade de Lisboa

1983

1998-2010

Comportamento

Comportamento, Ecologia

Mamíferos marinhos

Aves

Paulo Almeida Não científica NA 2009 Nenhuma Aves

Paulo J Fonseca Científica Universidade de Lisboa 1985-2010 Comportamento, Fisiologia Insetos, Peixes

Paulo Jorge Gama Mota Científica Universidade de Coimbra 1991-2008 Comportamento Aves

Peter K McGregor Científica Universidade de Copenhaga 1980-2007 Comportamento Aves

Rafael Marquez Científica MNCN-Madrid 1990-2010 Evolução, Sistemática, Comportamento Anfíbios

Raquel Freire Pereira de Ornelas e Vasconcelos Científica ISPA-IU 2003-2010 Fisiologia, Comportamento, Peixes

Ricardo Antunes Científica Universidade de St. Andrews Sem informação Comportamento Mamíferos marinhos

Ricardo Matos Científica ISPA-IU 1996-1997 Ecologia, Comportamento Peixes

Richard Ranft Não científica NA 1999 NA Insetos

Page 20: Inventário dos autores de gravações de sons animais

20

Gravadores Atividade Instituição Período de atividade Área de conhecimento Grupo taxonómico

Roef Mulder Não científica NA 2010 Nenhuma Aves

Rute Cabecinhas Científica Universidade dos Açores 1999-2001 Ecologia Mamíferos marinhos

Sarah Collins

Sofia Gonçalves Seabra

Científica

Científica

Universidade de Plymouth

Universidade de Lisboa

2002

1999-2003

Comportamento

Evolução

Aves

Insetos

Stefan Leitner Científica Instituto de Ornitologia Max Plank 1995-1999 e 2002 Comportamento, Evolução Aves

Stephen J. M. Gantlett Não científica NA 2005 Nenhuma Aves

Teresa Maria Pinto Coelho Saraiva

Tito Alves Silva

Científica

Não científica

Universidade do Porto

NA

1999-2004

1999-2010

Comportamento, Evolução

NA

Aves

Insetos e Aves

Vicente Palacios Sánchez Científica Universidade de Valência 2001-2003 Comportamento, Evolução Mamíferos terrestres