introduÇÃo documento protegido pela lei de direito … · suíço jean piaget, e o teórico...

148
9 INTRODUÇÃO O Desenho sempre esteve associado à linguagem humana. O fato de que desenhos originaram a linguagem escrita foi comprovado pela existência de sistemas de escrita bem conhecidos, como o egípcio antigo e o chinês, ambos originados a partir de metáforas visuais e desenhos. Segundo Derdyk (1998), o desenho está presente em ilustrações de um livro, na representação de um mapa, na arquitetura, em logotipos, etc., atravessando tempos e fronteiras: Seja no significado mágico que o desenho assumiu para o homem das cavernas, seja no desenvolvimento do desenho para a construção de maquinários no início da era industrial, seja na sua aplicação mais elaborada para o desenho industrial e arquitetura, seja na função de comunicação que o desenho exerce na ilustração, na história em quadrinhos, o desenho reclama a sua autonomia e sua capacidade de abrangência como um meio de comunicação, expressão e conhecimento. (DERDYK, 1998, p.29). Apesar dos diferentes contextos históricos nos quais estiveram inseridos os primeiros sistemas de escrita, a presença do desenho como matriz comum a expressões lingüísticas de diferentes culturas remete-nos a questionamentos sobre a importância do lúdico na formação da inteligência humana. O desenho e a atividade lúdica, importantes ferramentas de auxílio à comunicação entre os povos, sempre estiveram presentes em todas as sociedades humanas, desde os primórdios da civilização. Investigações a respeito das relações entre a gênese do pensamento e a expressão da linguagem humana por meio de desenhos e palavras foram realizadas, no Ocidente, desde filósofos gregos como Platão e Aristóteles até as importantes contribuições de pensadores do século XX, como o pesquisador suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

Upload: others

Post on 16-Jul-2020

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

9

INTRODUÇÃO

O Desenho sempre esteve associado à linguagem humana. O fato de

que desenhos originaram a linguagem escrita foi comprovado pela existência

de sistemas de escrita bem conhecidos, como o egípcio antigo e o chinês,

ambos originados a partir de metáforas visuais e desenhos.

Segundo Derdyk (1998), o desenho está presente em ilustrações de

um livro, na representação de um mapa, na arquitetura, em logotipos, etc.,

atravessando tempos e fronteiras:

Seja no significado mágico que o desenho assumiu para o homem das cavernas, seja no desenvolvimento do desenho para a construção de maquinários no início da era industrial, seja na sua aplicação mais elaborada para o desenho industrial e arquitetura, seja na função de comunicação que o desenho exerce na ilustração, na história em quadrinhos, o desenho reclama a sua autonomia e sua capacidade de abrangência como um meio de comunicação, expressão e conhecimento. (DERDYK, 1998, p.29).

Apesar dos diferentes contextos históricos nos quais estiveram inseridos

os primeiros sistemas de escrita, a presença do desenho como matriz comum a

expressões lingüísticas de diferentes culturas remete-nos a questionamentos

sobre a importância do lúdico na formação da inteligência humana.

O desenho e a atividade lúdica, importantes ferramentas de auxílio à

comunicação entre os povos, sempre estiveram presentes em todas as

sociedades humanas, desde os primórdios da civilização.

Investigações a respeito das relações entre a gênese do pensamento e

a expressão da linguagem humana por meio de desenhos e palavras foram

realizadas, no Ocidente, desde filósofos gregos como Platão e Aristóteles até

as importantes contribuições de pensadores do século XX, como o pesquisador

suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o

desenvolvimento da inteligência humana.

DOCU

MENTO

PRO

TEGID

O PEL

A LE

I DE D

IREIT

O AUTO

RAL

Page 2: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

10

Os pressupostos teóricos de Piaget difundiram a idéia de que a

aquisição de conhecimentos pelo homem é uma construção que resulta tanto

da interação entre o sujeito e o objeto de sua atenção, quanto de processos

internos de organização do organismo do indivíduo, ao se relacionar com o

mundo que o cerca.

Este aspecto de construção do conhecimento pelo indivíduo caracteriza

o ordenamento teórico de Piaget, e é conhecido como teoria construtivista, ou

construtivismo.

As contribuições de Vygotsky fundamentaram as bases da teoria sócio-

interacionista, ao divulgarem a noção de que é o próprio processo de

aprendizagem que impulsiona o desenvolvimento das estruturas superiores da

mente humana. Durante este processo, a linguagem atua como o principal

elemento da interação entre seres humanos submetidos a determinadas

condições históricas.

Tanto Piaget quanto Vygotsky consideraram a hipótese de que o

desenho infantil e a atividade lúdica possam exercer papel significativo na

construção da inteligência, aprendizagem e desenvolvimento humanos.

A Psicopedagogia, considerada por esta pesquisa como uma área de

investigação científica cujo objeto de estudo é o indivíduo inserido em

situações de ensino-aprendizagem, compartilha os questionamentos dos

estudiosos acima citados, na tentativa de investigar os modos pelos quais o ser

humano aprende, e como o conhecimento se constrói no indivíduo.

Para Vygostky (1987), o desenho é uma das ferramentas lúdicas através

das quais o pensamento estrutura a linguagem, por meio da decodificação de

símbolos. Para ele, a linguagem, concebida como fenômeno social, enquadra-

se na análise da natureza simbólica de signos lingüísticos.

Ferreiro e Teberosky (1991), pesquisadoras das teorias construtivistas,

concordam com Vygostky (1987) e também consideram o desenho como um

estágio preparatório do desenvolvimento da escrita.

Nesse sentido, o reconhecimento da importância do desenho para o

desenvolvimento da inteligência, bem como das suas possibilidades de

atuação como elemento mediador no contexto de ensino/aprendizagem,

Page 3: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

11

relaciona-se diretamente ao processo de ensino-aprendizagem da língua

chinesa, visto que os caracteres chineses originaram-se de desenhos.

A necessidade de memorização dos elementos gráficos típicos da

escrita chinesa permite a investigação de hipóteses sobre a utilização de

recursos didáticos alternativos, como por exemplo, o desenho.

Diante do exposto, o presente estudo tem por objetivo investigar a

aplicabilidade do desenho como ferramenta lúdica no Ensino da Língua

Chinesa para alunos do Ensino Fundamental.

De início, fez-se um breve histórico das Teorias de Aprendizagem,

enfatizando a importância das concepções de Jean Piaget e Liev Vygostky

para o desenvolvimento de métodos de ensino-aprendizagem no Ocidente e no

Oriente.

O segundo capítulo abordou a visão psicopedagógica sobre a

participação do desenho e da atividade lúdica no processo de construção de

conhecimentos, interpretado a partir das teorias de Piaget (1972) e Vygotsky

(1987). Também foram estudadas as teorias de Ferreiro e Teberosky (1991)

sobre o processo de construção de conhecimentos relacionados à leitura e

escrita, compreendidas como desenvolvimento posterior das concepções de

Piaget.

O terceiro capítulo discorreu sobre o modo pelo qual as diferenças

morfológicas entre o sistema de escrita das línguas portuguesa e chinesa

podem influenciar os respectivos processos de ensino-aprendizagem das

mesmas. Um breve histórico da formação dos caracteres chineses, a partir de

desenhos, será apresentado.

Por fim, no quarto capítulo, foi investigada a hipótese de utilizar do

desenho como facilitador do processo ensino-aprendizagem da língua chinesa,

a partir das teorias abordadas. Também foram mencionadas propostas de

ensino da língua chinesa adotadas por educadores contemporâneos, no Brasil.

Page 4: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

12

CAPÍTULO I

TEORIAS DE APRENDIZAGEM

1.1. Jean Piaget e a construção de conhecimentos

O conhecimento não procede nem da experiência única dos objetos nem de uma programação inata pré-formada no sujeito, mas de construções sucessivas com elaborações constantes de estruturas novas. (PIAGET, 1972.p. 27).

Diversos estudos e discussões acerca da aquisição do conhecimento e

da linguagem têm sido desenvolvidos, desde a Grécia antiga até os dias atuais.

O pensamento humano constitui, até os dias de hoje, uma grande incógnita,

provocando novos experimentos e tentativas de compreender efetivamente seu

funcionamento e evolução.

Uma das mais importantes revoluções no campo da psicologia foi

empreendida pelo doutor em biologia Jean Piaget (1896 - 1980) que, ao tentar

compreender como o pensamento humano se origina, elaborou uma teoria a

que deu o nome de Epistemologia Genética.

Este pesquisador, ao buscar uma teoria que dissociasse a filosofia

clássica da ciência do conhecimento humano, descobriu as particularidades da

inteligência da criança, comprovando cientificamente que o desenvolvimento do

pensamento lógico é anterior à linguagem e à razão.

A ciência psicopedagógica compartilha essas indagações, dedicando-se

a investigar contribuições acadêmicas que possam contribuir para a formação

satisfatória de um sujeito ensinante-aprendente autônomo e capaz de colaborar

para o progresso científico e social. Nesse sentido, o campo de estudo da

psicopedagogia está sempre em busca de respostas às mesmas perguntas:

Como se dá o processo de aquisição de novos conhecimentos pelo homem?

Como o ser humano aprende? Qual é a melhor maneira de ensinar e aprender

uma língua estrangeira?

Page 5: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

13

De acordo com Madeira (2007), a preocupação central de Piaget

também era entender a gênese das estruturas lógicas do pensamento da

criança e como se organizam suas ações inteligentes.

Para Piaget (1972), o desenvolvimento psíquico é semelhante ao

desenvolvimento orgânico, e ocorre em função da procura por um estado de

equilíbrio progressivo. O autor ressaltou que a inteligência vai se aprimorando à

medida que a criança estabelece contato com o mundo, e adquire experiências

ao agir sobre os objetos de sua atenção.

Deste modo, a inteligência é um processo de adaptação em

busca do equilíbrio entre o organismo e o meio no qual está inserido,

construída através da atividade que permeia as relações entre as experiências

vivenciadas pelo indivíduo e o ambiente. Por exemplo: ao pegar um objeto, o

bebê tem oportunidade de explorar e observar de forma atenta, percebendo

suas propriedades (tamanho, cor, textura, cheiro, etc.) e, aos poucos vai

estabelecendo relações com outros objetos.

Segundo este autor, tal experiência é fundamental para o processo ativo

de construção de conhecimento realizado pela criança, que se constrói

enquanto constrói o objeto, ao mesmo tempo em que se relaciona com o meio

ambiente à sua volta. Conforme Piaget (1972):

O conhecimento não procede, em suas origens, nem de um sujeito consciente, nem de objetos já constituídos (do ponto de vista do sujeito) que a ele se imporiam. O conhecimento resultaria de interações que se produzem a meio caminho entre os dois, dependendo, portanto, dos dois ao mesmo tempo, mas em conseqüência de uma indiferenciação completa e não de intercâmbio entre formas distintas. (PIAGET, 1972, p. 14).

Para Piaget (1972), a unidade básica de estrutura do pensamento e

ações humanas é classificada como esquema, e pode ser equiparada ao

processo de mutação e adaptabilidade orgânica que atua na estrutura biológica

do indivíduo durante toda a sua vida. Deste modo, o esquema é a matriz das

Page 6: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

14

atividades de elaboração de conceitos novos, parâmetros de comportamento e

de organização mental.

De acordo com Piaget (1972), o ser humano desenvolve esquemas para

solucionar problemas relativos às ações que empreende, relacionando

estímulos ambientais às novas necessidades e desafios com os quais entra em

contato. Desta forma, o desenvolvimento cognitivo ocorre através da

transmissão social e da integração entre as experiências cotidianas e a

maturação biológica.

Logo, a experiência cotidiana capacita o indivíduo a adquirir novos

conhecimentos, por meio da conjugação entre sua estrutura psíquica e a

orgânica. O pensamento humano se desenvolve durante este processo de

realização de trocas com o meio ambiente.

Segundo Conceição (2007), a teoria piagetiana concebe o

desenvolvimento da inteligência humana como um processo orientado por dois

princípios básicos: organização e adaptação, que estão presentes em todas as

fases da evolução do homem. O princípio de organização integra todos os

processos biológicos e psicológicos em um sistema global. Já o princípio de

adaptação é o processo pelo qual as novas estruturas mentais são criadas.

Desta forma, este ordenamento teórico compreende o processo de

aquisição de conhecimentos como um conjunto de mecanismos psíquicos e

biológicos integrados, através do qual o conhecimento é construído pela

própria criança em contato com o mundo que a cerca.

Segundo Piaget (1972), o organismo humano está em busca constante

de equilíbrio, a qual é executada por mecanismos que possibilitam o processo

de adaptação às novas situações nas quais o indivíduo se insere no decorrer

de toda sua vida:

De um modo geral, as raízes biológicas das estruturas cognitivas e a explicação do fato de que elas se tornam necessárias não deveriam ser procuradas nem no sentido de uma ação exclusiva do meio, nem de uma pré-formação à base de puro inatismo, mas das auto-regulações com seu funcionamento em circuitos e sua tendência intrínseca ao equilíbrio. (PIAGET, 1972, p. 65).

Page 7: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

15

Na concepção do autor, a adaptação é a forma adequada para lidar com

situações novas e ocorre através dos processos de assimilação e acomodação.

A partir disso, no que concerne ao comportamento infantil, a manutenção do

equilíbrio entre acomodação e assimilação regula tanto as potenciais

tendências infantis à compulsão por novas experiências, quanto eventuais

propensões da criança ao comodismo e à inércia perante situações novas.

Já a assimilação corresponde à incorporação de um objeto, experiência

ou conceito ao conjunto de esquemas previamente adquiridos pela criança em

sua vivência cotidiana. Tal mecanismo oferece condições para que o

organismo procure solucionar um problema utilizando estruturas mentais

previamente existentes.

Deste modo, o amadurecimento e o crescimento do indivíduo ocorrem a

partir da conjugação entre estes dois processos, que orientam a maneira como

novos conhecimentos são incorporados a sua estrutura psíquica e orgânica, à

medida que ele vivencia novas experiências.

Além disso, estes processos são estruturados de modo que tanto a

indisposição para adquirir novos conhecimentos quanto a ansiedade por

vivenciar novas experiências sejam naturalmente reguladas por estes dois

princípios, que orientam a aquisição de novas informações e comportamentos.

De acordo com as concepções de Piaget (1972) outra forma de

adaptação a novas situações é o processo de acomodação. Neste, o indivíduo

analisa atributos específicos do objeto e procura novas formas de atuação,

selecionando e criando esquemas de ação que se adaptem às circunstâncias

mutáveis nas quais este objeto de sua atenção está inserido.

O processo de equilibração inicia-se com o nascimento da criança e se

desenvolve em quatro estágios distintos e cuja ordem é fixa, nos quais a

abordagem aos diferentes problemas é determinada por uma estrutura mental

característica que imprime diferentes formas de raciocínio.

Durante o primeiro estágio, classificado como Período da Inteligência

Sensório-Motora (de 0 a 2 anos), a criança não percebe nenhuma diferença

entre si mesma e o mundo exterior. Como propõe Piaget, “o lactente não

manifesta qualquer índice de uma consciência de seu eu, nem de uma fronteira

Page 8: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

16

estável entre dados do mundo interior e do universo externo.” (PIAGET, 1972,

p. 15).

Para o autor, nesta fase, o sujeito ainda não está formado e não iniciou a

construção de sua individualidade, o que só poderá ocorrer quando puder

perceber fatores que estabeleçam distinção entre os elementos do mundo

exterior e sua própria unicidade. Na visão de Piaget, “este adualismo dura até o

momento em que a construção desse eu se torna possível em correspondência

e em oposição com o dos outros.” (PIAGET, 1972, p.15).

Piaget (1972) ressalta que este período ocorre antes da linguagem, e se

caracteriza por atividades físicas dirigidas a objetos e situações externas que

constituem a única maneira pela qual o desenvolvimento cognitivo e orgânico é

possível, visto que o corpo é o centro do mundo do lactente, apesar de que ele

não possui nem mesmo consciência de sua própria individualidade. Diz o autor:

Em uma estrutura de realidade que não comporte nem sujeitos nem objetos, evidentemente o único liame possível entre o que se tornará mais tarde um sujeito e objetos é constituído por ações, mas ações de um tipo peculiar, cuja significação epistemológica parece esclarecedora. Com efeito, tanto no terreno do espaço como dos diversos feixes perceptivos em construção, o lactente tudo relaciona a seu corpo como se ele fosse o centro do mundo, mas um centro que a si mesmo ignora. Em outras palavras, a ação primitiva exibe simultaneamente uma indiferenciação completa entre o subjetivo e o objetivo e uma centração fundamental, embora radicalmente inconsciente em razão de estar ligada a esta indiferenciação. (PIAGET, 1972, p.15).

Às ações descoordenadas iniciais seguem-se movimentos cada vez

mais conscientes, que orientam o desenvolvimento em direção à constituição

do sujeito, e também do objeto, visto que este passa a ter maior grau de

permanência no tempo e no espaço. Este período apresenta três fases

distintas.

A primeira fase classificada como Fase dos Reflexos, na qual estão

presentes impulsos alimentares primitivos, bem como uma predisposição para

maior capacitação motora através de exercícios de repetição de movimentos.

Durante a segunda fase, classificada como Fase de Organização das

Page 9: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

17

Percepções e Hábitos, ocorre um processo de progressiva autonomia de

movimentos conscientes. A terceira fase, classificada como Fase da

Inteligência Sensório-Motora, refere-se à organização de esquemas de ação,

por meio de processos de seleção e classificação de objetos que possuem

características similares.

Segundo o ordenamento piagetiano, a partir dos dois anos de idade,

ainda na Fase da Inteligência Sensório-Motora, a criança começa a

compreender noções mais complexas de espaço e movimentos, ao entender

que existem conexões espaciais entre objetos e pessoas. Além disso, começa

também a entender relações de causa e efeito, que se originam de ações

realizadas anteriormente, como o fato de que o brinquedo se move ao puxar a

corda. Durante esta fase, a criança começa também a manifestar sentimentos

elementares, ligados à satisfação ou desprazer, como dor e interesse pelo

próprio corpo.

O segundo estágio, classificado como Período Pré-Operacional (2 a 7

anos), caracteriza-se pelo aparecimento da linguagem, bem como pela

capacidade de elaborar narrativas, reconstituindo ações passadas, além da

habilidade de antecipar ações, ou seja, a aptidão para representar

mentalmente eventos, objetos e ações. Durante este período, dinamizam-se

aspectos de organização do pensamento, resultando na interiorização de

palavras e ações à medida que a criança reconstrói os diferentes elementos

com os quais entra em contato, como a passagem do tempo, objetos, além das

diversas representações mentais que começa a realizar. Este período se

subdivide em duas fases.

A primeira fase do Período Pré-Operacional é classificada como Estágio

Pré-Conceitual (2 a 4 anos), no qual a criança inicia processos de

representação simbólica através de atividades de imitação. Nesta fase, a

criança não é capaz de se desprender de seu ponto de vista pessoal e

manifesta tendência a um egocentrismo expresso pela incapacidade de

diferenciação entre seu ponto de vista e os de outras pessoas, bem como entre

suas próprias atividades e as propriedades de transformação que o objeto

possui. Este egocentrismo está presente tanto em sua linguagem, que exprime

sem nenhuma preocupação com o ouvinte, quanto em seu raciocínio, o qual

Page 10: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

18

não possui capacidade de generalização, operando somente em níveis das

particularidades dos objetos e situações, nunca em aspectos genéricos dos

mesmos.

Além disso, pelo fato de articular suas idéias em pré-conceitos, e não em

conceitos, como um adulto, vincula seu raciocínio a uma realidade simbólica

própria, desvinculada da realidade do mundo à sua volta. Piaget (1972)

observa que:

O ensino que o primeiro sub-estágio do pensamento pré-operatório nos oferece é que, de uma parte, os únicos mediadores entre o sujeito e os objetos são apenas pré-conceitos e pré-relações (sem norma para o “todos” e o “alguns” para os primeiros, nem a relatividade das noções para os segundos.) (PIAGET, 1972, p. 26).

Ainda conforme o autor, durante esta etapa, a criança manifesta

tendência para utilização de símbolos que substituem objetos, lugares e

pessoas, além de desconsiderar o aspecto linear da sucessão de eventos e

passagem do tempo. Devido a esta propensão, movimenta seu pensamento,

indiscriminadamente, em direção ao passado e ao futuro.

Piaget (1971) sustenta que, nesta fase, inicia-se o aperfeiçoamento da

capacidade de pensar em um ente que não esteja circunscrito ao campo

imediato da visão da criança, ou seja, a mente infantil já consegue representar

mentalmente pessoas e objetos ausentes.

O surgimento desta nova habilidade possibilitou o estudo das

representações mentais e dos elementos que as compõem.

Tais representações mentais são classificadas como significadores, e os

objetos que as representam são classificados como significados. Diz Piaget:

Page 11: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

19

Representações mentais que utilizam significadores como imagens auditivas ou visuais, bem como outras associações de cunho pessoal, resultam no uso de Símbolos, enquanto que as realizadas por meio de associações que envolvem números ou palavras correspondem à utilização de Signos. (PIAGET, 1971, p. 188).

Durante a segunda fase do Período Pré-Conceitual classificada como

Estágio Pré-Lógico ou Intuitivo (4 a 7 anos), a criança torna-se

progressivamente capaz de visualizar e organizar imagens mentais de maneira

concreta. No início deste período, entretanto, a criança apresenta uma

tendência à centração, ou seja, costuma registrar apenas um estado de uma

situação, como ao desconsiderar a altura e a largura de um copo, registrando

apenas o contorno do mesmo. Além disso, também não consegue reverter

mentalmente uma atividade, como por exemplo, ao não conseguir

compreender os estágios de crescimento de pessoas, plantas e animais.

O autor ressalta que esta fase caracteriza-se pela referida incapacidade

inicial de compreender o significado da transformação, ou seja, pela fixação da

percepção no estado atual de uma situação, evento ou objeto, conservando

aquelas características indefinidamente e não admitindo ou compreendendo

possíveis mutações. Para ele, somente no final deste período, a criança

começa a apresentar maior compreensão relativa a estados intermediários de

conservação e não-conservação dos processos que originam fenômenos do

mundo exterior. Desta forma, a capacidade de compreender ligações entre

diferentes estados e transformações, bem como de admitir processos em que

ocorre reversibilidade de estados, relações e situações, manifesta-se somente

nos momentos finais deste período.

Piaget (1972) observa que “este segundo sub-estágio é assinalado por

um início de descentração que permite o descobrimento de certas ligações

objetivas, graças ao que chamamos de funções constituintes” (1972, p. 28).

No estágio seguinte, classificado como Período Operacional Concreto

(dos 7 aos 11/12 anos), a criança começa a realizar operações lógico-

matemáticas, expressas sob a forma de ações mentais sobre o objeto de sua

Page 12: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

20

atenção, que passa a ser considerado como uma unidade a ser quantificada e

classificada. Nos momentos iniciais deste estágio, as ações mentais capacitam

a criança a realizar operações de multiplicação e adição. Além destas

operações lógico-matemáticas a criança também realiza operações infra-

lógicas, isto é, passa a considerar o objeto como um elemento circunscrito ao

espaço e ao tempo, que pode ser subdividido em partes que se relacionam ao

todo, bem como suas relações físicas com outros objetos. Como expõe Piaget:

A novidade deste sub-estágio se assinala em particular no domínio das operações infra-lógicas ou espaciais. É assim que a partir dos 7 a 8 anos se vêem constituir certas operações relativas às perspectivas e às mudança de ponto de vista no que respeita a um mesmo objeto do qual se modifica a posição em relação ao sujeito. (PIAGET, 1972, p. 43).

No estágio subseqüente, classificado como Período Operacional Formal

(11/12 anos em diante), a criança adquire a capacidade de pensar de maneira

abstrata, criando teorias e concepções a respeito do mundo que a cerca. É

nesse período que o organismo se torna estruturalmente capacitado para o

exercício de atividades psicológicas mais complexas, como o uso da linguagem

articulada. Diz o autor:

A primeira característica das operações formais é a de poder recair sobre hipóteses e não mais apenas sobre objetos: é esta a novidade fundamental da qual todos os estudiosos do assunto notaram o aparecimento perto dos onze anos. (PIAGET, 1972, p.48).

Conforme Piaget (1972), a capacidade de pensar de forma abstrata é

dinamizada pelo fato de que, neste período, o pensamento não se limita a

raciocinar sobre objetos, transferindo suas inquirições para o âmbito de

hipóteses, o que resulta em concepções intelectuais que dispensam a

intermediação obrigatória de elementos concretos:

Page 13: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

21

Como as hipóteses não são objetos, são proposições, e seu conteúdo consiste em operações intra-proposicionais de classes, relações, etc., do que se poderia oferecer a verificação direta; o mesmo se pode dizer das conseqüências tiradas delas pela via inferencial. (PIAGET, 1972, p.48).

Deste modo, a criança não está circunscrita apenas a objetos físicos e

começa a elaborar seu pensamento de forma menos dependente do mundo

material.

Para Piaget (1972), a característica mais importante deste novo tipo de

raciocínio é a possibilidade que a mente infantil apresenta de realizar deduções

resultantes da combinação entre operações mentais:

A operação dedutiva que leva das hipóteses às suas conclusões não é mais do mesmo tipo, mas é inter-proposicional e consiste, pois, em uma operação elevada à segunda potência. Ora, esta é uma característica muito geral das operações que devem atingir este último nível para se constituir, quer se trate de utilizar as implicações, a lógica das proposições ou de elaborar relações entre relações (proporções, distributividade, etc.), de coordenar dois sistemas de referência, etc. (PIAGET, 1972, p.48).

Para o autor, este é o caminho para a atividade dedutiva mais

sofisticada, cujo desenvolvimento permitirá que a mente evolua na direção de

infinitas possibilidades de realização, pelo fato de que este tipo de raciocínio

resulta em atividades mentais mais complexas e potentes. Para ele:

É este poder de formar operações sobre operações que permite ao conhecimento ultrapassar o real e que lhe abre a via indefinida dos possíveis por meio da combinatória, libertando-se então das elaborações por aproximação as quais permanecem submetidas às operações concretas. (PIAGET, 1972, p. 49).

Page 14: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

22

As teorias de Piaget demonstraram que o intelecto do homem,

inicialmente incapaz de elaborar representações mentais, evolui em direção ao

pensamento cada vez mais sofisticado e complexo, e esta evolução possibilita

realizações intelectuais verdadeiramente criativas.

Page 15: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

23

1.2- Vygostky e o Desenvolvimento da Linguagem

A aquisição da linguagem pode ser um paradigma para o problema da relação entre aprendizado e desenvolvimento. A linguagem surge inicialmente como um meio de comunicação entre a criança e as pessoas em seu ambiente. Somente depois, quando da conversão da fala interior, ela vem a organizar o pensamento da criança. (VIGOSTKY, 1991, p.101).

Vimos anteriormente, que os pressupostos de Piaget enfatizaram a

relação entre o sujeito e o objeto de seu conhecimento para o desenvolvimento

do ser humano.

Segundo Baptista (2009), esta ênfase difundiu a idéia de que a evolução

do indivíduo depende apenas de mecanismos inerentes à sua organização

biológica. Para a autora, em virtude da difusão dos postulados piagetianos,

generalizou-se a concepção de que a infância seria um ambiente totalmente

desvinculado das realidades culturais e sociais dos agrupamentos humanos às

quais as crianças pertencem. Acerca destas reflexões, Baptista (2009),

entende que:

Ainda que pesem as indiscutíveis contribuições de Piaget, a centralidade atribuída à análise da interação da criança com o mundo físico impôs, em certa medida, a idéia de que o desenvolvimento humano era um desafio a ser alcançado individualmente, a partir de progressos naturais. De outra parte, implicou uma compreensão da infância como um universo isolado, como se adultos e crianças não compartilhassem práticas culturais comuns. (BAPTISTA, 2009, p. 16).

Deste modo, Piaget (1972) privilegiou suportes biológicos para

fundamentar sua teoria do desenvolvimento através de estágios comuns a

todos os indivíduos.

Page 16: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

24

Vygotsky (1987) também compreende a relação do sujeito com o objeto

de sua atenção como um fator importante para a aprendizagem. Para ele, no

entanto, as condições sociais e a interação entre indivíduos são os elementos

preponderantes para a evolução do intelecto do homem. Como observa

Baptista (2009):

Vygotsky também deu importância ao papel do sujeito na aprendizagem. Entretanto, se para o primeiro os suportes biológicos que fundamentam sua teoria dos estágios universais receberam maior destaque, para o segundo, a interação entre as condições sociais e a base do comportamento humano foram os elementos fundamentais para sua teoria sobre o desenvolvimento. (BAPTISTA, 2009, p.16).

Desta forma, este enfoque assinala uma diferença significativa entre

estas duas abordagens. As teorias construtivistas consideraram o processo de

conhecimento como uma realização que depende da relação entre o sujeito e o

objeto de sua atenção. Já os pressupostos sócio-interacionistas destacaram a

influência da realidade social e da cultura para o desenvolvimento da

inteligência humana.

Os estudos de Vygostky (1987) identificaram funções psicológicas

superiores, presentes apenas no homem, como responsáveis por sua aptidão

para realizar, de forma ordenada, atividades mentais nas quais estão inseridos

pensamentos que englobem representação mental, antevisão de eventos e

comportamentos futuros, além do comando de ações que, no reino animal, são

reguladas somente pelos instintos.

Segundo o referido autor, há uma distinção entre o desenvolvimento

psicológico e biológico dos animais evoluídos e do homem, pois os primeiros

possuem apenas as funções psicológicas naturais, enquanto que as funções

psicológicas superiores somente aparecem com o ser humano. Diz:

Page 17: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

25

Para desenvolver o primeiro destes pontos devemos indagar: o que realmente distingue as ações de uma criança que fala das ações de um macaco antropóide, na solução de problemas práticos? As crianças, com ajuda da fala, criam maiores possibilidades que os macacos podem realizar com a ação (...) através da fala, ela planeja como solucionar o problema e então executa a solução elaborada através de uma atividade visível. A maior mudança na capacidade das crianças para usar a linguagem como instrumento para solução de problemas acontece um pouco mais tarde no seu desenvolvimento, no momento em que a fala socializada (que foi previamente utilizada para dirigir-se a um adulto) é internalizada. Ao invés de apelar para um adulto, as crianças passam a apelar a si mesmas (VYGOTSKY, 1991, p.30).

A partir desta reflexão, o desenvolvimento da inteligência humana

estrutura-se em função da passagem dos processos naturais aos processos

superiores, numa progressão cujo âmbito inicial está relacionado a estruturas

mentais elementares como os reflexos condicionados e incondicionados,

reações espontâneas e processos de associações simples.

Vygostky (1987) defende a idéia de que as estruturas mentais simples

são condicionadas por determinantes biológicos, e evoluem para instâncias

superiores à medida que o homem utiliza signos e outros instrumentos

psicológicos. Esses últimos, segundo o autor, são os objetos materiais que

auxiliam o ordenamento e reposicionamento das informações oriundas do

mundo exterior, tornando possível que o indivíduo seja capaz de vivenciar um

estímulo através da representação mental do mesmo. Para o autor:

Os instrumentos psicológicos são todos aqueles objetos cujo uso serve para ordenar e reposicionar externamente a informação, de modo que o sujeito possa escapar da ditadura do aqui e agora e utilizar sua inteligência, memória ou atenção no que poderíamos chamar de uma situação de situações, uma representação cultural dos estímulos que podemos operar quando queremos ter estes em nossa mente e não só e quando a vida real nos oferece. (VYGOTSKY, 1990 apud MACIEL 2009, p. 17).

Page 18: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

26

Como ressalta Vygotsky (1987), o desenvolvimento das funções

psicológicas superiores resulta da evolução cultural e não do desenvolvimento

biológico, visto que a atribuição de sentido a um objeto, bem como a

capacidade de transmitir tais significados às gerações vindouras, são

condições propiciadas pelas circunstâncias culturais intrínsecas a determinado

grupamento humano. Para ele, a capacidade de utilizar signos sofreu

mudanças significativas durante a evolução cultural da humanidade, resultando

em maior complexidade no processamento de informações de natureza

simbólica. Além disso, é possível traçar paralelos entre as transformações

ocorridas nos processo de utilização de signos, ocorridas ao longo da história

da humanidade, e o desenvolvimento intelectual do homem ao longo de sua

vida pessoal.

Deste modo, a teoria sócio-interacionista enfatiza a importância dos

instrumentos psicológicos, objetos materiais e ferramentas que concorrem para

o aperfeiçoamento das habilidades intelectuais do ser humano.

Vygotsky (1987) define instrumentos psicológicos como ferramentas

utilizadas como reguladores das ações dos homens sobre os objetos, e signos

como elementos que substituem outros elementos, colaborando para a

transmissão de conceitos e dinamizando processos de memorização e

atenção.

Conforme Oliveira (1997), um exemplo clássico desta proposição é a

utilização de um barbante amarrado no dedo com o fito de auxílio à

memorização. Na observação do referido autor, este instrumento psicológico

permite dinamizar uma função mental, a memória, ampliando sua condição

natural. Neste caso, o barbante exerce a função de um signo, ou seja, de uma

marca externa que fornece suporte concreto para a ação do homem no mundo.

Assim, podemos entender que os instrumentos psicológicos são

artifícios que ajudam o homem a dinamizar certas funções mentais como, por

exemplo, o ato de memorizar fatos, datas ou nomes de pessoas.

A utilização destas ferramentas, que também auxiliam na transmissão e

atribuição de significados e sentidos aos objetos, resulta em constantes

mudanças na capacidade humana de compreender e utilizar signos, bem como

Page 19: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

27

na melhoria das condições de comunicação entre os diferentes grupos

humanos.

Durante o aperfeiçoamento progressivo desta habilidade de utilizar

signos, ocorrem duas mudanças fundamentais no modo como o homem se

relaciona com os elementos que pertencem à realidade percebida pelos seus

sentidos.

De acordo com Oliveira (1997), a primeira transformação sofrida pelos

mecanismos de utilização de signos foi classificada por Vygotsky (1987) como

processo de internalização, e definido como a maneira pela qual marcas

existentes no mundo exterior transformam-se em processos internos de

mediação psicológica, propiciando a representação mental de eventos, seres

ou circunstâncias. A partir disso, ao longo de seu desenvolvimento, o indivíduo

substitui as marcas externas e começa a utilizar signos internos, ou seja,

representações mentais que substituem os objetos do mundo real.

Por exemplo, a noção adquirida sobre uma cadeira permite que uma

pessoa seja capaz de lidar mentalmente com este objeto, mesmo que este não

esteja presente. Para a autora:

Essa capacidade de lidar com representações que substituem o real é que possibilita ao homem libertar-se do espaço e do tempo presentes, fazer relações mentais na ausência das próprias coisas, imaginar, fazer planos e ter intenções (...). Essas possibilidades de operação mental não constituem uma relação direta com o mundo real fisicamente presente; a relação é mediada pelos signos internalizados que representam os elementos do mundo, libertando o homem da necessidade de interação concreta com os objetos de seu pensamento. (OLIVEIRA, 1997, p.35).

A teoria sócio-interacionista postula que o referido processo de

internalização de manifestações culturais, isto é, de aquisição das formas,

conteúdos e princípios que ordenam a realidade cultural de determinado grupo

humano, resulta na reconstrução da atividade psicológica dos indivíduos,

realizada através de operações com signos.

Page 20: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

28

Além disso, a crescente capacidade humana de realizar operações

mentais nas quais estes signos estejam envolvidos relaciona-se diretamente à

linguagem, cujo domínio também resulta em progressiva interiorização do

pensamento.

Desta forma, os objetos e entidades existentes no plano da realidade

exterior são incorporados ao pensamento humano por meio de alterações na

percepção individual, que passa a concebê-los sob a forma de elementos

puramente intelectuais, graças à progressiva habilidade de representá-los

mentalmente.

Assim, este processo de incorporação dos entes do mundo exterior sofre

contínuas modificações, o que resulta no aperfeiçoamento das formas de

utilização de signos pelo homem.

Segundo Baptista (2009), estas modificações resultaram na melhoria da

comunicação entre indivíduos, bem como em aquisições culturais

progressivamente mais sofisticadas. Para ela, outro fator que colaborou para

esta evolução foi o desenvolvimento de sistemas de comunicação organizados

sob a forma de símbolos. Desta forma, a progressiva sistematização do contato

humano, por meio de símbolos, relaciona-se diretamente ao aprofundamento e

aperfeiçoamento do fenômeno que Vygotsky (1987) classificou como processo

de internalização.

De acordo com a teoria sócio-interacionista, após o desenvolvimento da

capacidade de representar mentalmente os objetos e situações do mundo real,

a segunda transformação sofrida pelo processo humano de utilização de signos

correspondeu à organização de símbolos em sistemas de comunicação e

expressão de idéias. Tais sistemas de comunicação passaram a ser utilizados

pelos diferentes grupos humanos, que os adotaram como mecanismos úteis

para a transmissão de informações e conceitos.

Conforme Baptista (2009), a segunda transformação sofrida pelo

processo de internalização, foi “a organização de símbolos em estruturas

complexas e articuladas, denominadas sistemas simbólicos” (BAPTISTA, 2009,

p.17).

Page 21: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

29

Já Cole e Scribner (1998) ressaltam que a escrita e os números são

exemplos de sistemas simbólicos, e podem ser definidos como criações das

sociedades ao longo da história humana. Para os autores, em concordância

com Baptista (2009) e Vygotsky (1991), tais elementos são responsáveis por

modificações substanciais no desenvolvimento cultural dos diferentes grupos

humanos.

Deste modo, o aperfeiçoamento da habilidade de utilizar elementos que

facilitam processos de comunicação, isto é, de sistemas simbólicos como a

escrita, os números e as línguas, resultou em mudanças profundas na

evolução intelectual do homem e no progresso da civilização, facilitando o

relacionamento entre pessoas e nações, e colaborando para a evolução do

homem.

De acordo com Vygotsky (1987), esta propensão do homem para utilizar

e se apropriar de signos e outros instrumentos psicológicos é o elemento que

possibilita o controle sobre suas funções mentais. Para ele, o processo de

estruturação da mente infantil baseia-se tanto no acesso a estes instrumentos

e ferramentas psicológicas quanto à forma através da qual os mesmos são

manipulados e utilizados pelas crianças.

A partir disso, a teoria sócio-interacionista considerou o domínio de

sistemas simbólicos como um dos fatores mais importantes para o pleno

desenvolvimento da inteligência humana.

Ao contrário de Piaget (1972), que compreendeu a construção do

conhecimento como uma atividade que se realiza através da maturação

orgânica e da relação do indivíduo com o meio, Vygotsky (1991) concebeu o

desenvolvimento da inteligência como um fenômeno que ocorre mediante o

progressivo aperfeiçoamento do uso de signos e instrumentos psicológicos

pelo homem. As funções mentais superiores, exclusivas do ser humano, são

estimuladas e promovidas através do crescente domínio que os indivíduos

adquirem sobre ferramentas psicológicas e sistemas simbólicos.

Na concepção de Vygotsky (1991), o desenvolvimento psicológico não

pode ser visto como um processo abstrato e descontextualizado, e a aquisição

de ferramentas simbólicas, como os sistemas de escrita, não pode ser obtida

Page 22: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

30

por meios repetitivos e mecânicos. A aquisição destes sistemas organizados,

constituídos por símbolos que representam o resultado de um longo processo

de elaboração e maturação cultural, deve acompanhar, na criança, a evolução

de suas funções intelectuais, até que ela esteja em condições de compreender

e utilizar sistemas cada vez mais sofisticados. Diz:

É necessário que as letras se tornem elementos da vida das crianças, da mesma maneira que a fala. Da mesma forma que as crianças aprenderam a falar, elas podem muito bem aprender a ler e a escrever. Métodos naturais de ensino da leitura e da escrita implicam operações apropriadas sobre o meio ambiente das crianças. (VYGOTSKY, 1991, p. 134).

A partir de suas pesquisas, Vygotsky (1991) concluiu que o ensino de

leitura e escrita para crianças deve ser organizado de modo que estas

atividades tornem-se necessárias a elas. Conforme ressalta o autor:

A escrita deve ser relevante à vida da criança (...) deve ter significado, para as crianças, de que uma necessidade intrínseca deve ser despertada nelas e a escrita deve ser incorporada a uma tarefa necessária e relevante para a vida (VYGOTSKY, 1991, p. 133).

Outro ponto fundamental das teorias de Vygotsky é a importância dada à

linguagem como elemento estruturador das funções mentais superiores do

homem.

Na visão deste autor, a linguagem é o mais importante elemento de

mediação entre o indivíduo e os sistemas simbólicos, e é através dela que o

pensamento humano ascende a instâncias superiores, visto que a mesma

possibilita a execução de importantes funções, como representação,

generalização e abstração.

Os pressupostos sócio-interacionistas postulam que a linguagem é o

elemento que organiza os sistemas simbólicos, estruturando-os a partir da

Page 23: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

31

conjugação de signos formados por estruturas e formulações mentais cada vez

mais complexas.

Em concordância com o pensamento de Vygostky (1991), Oliveira

(1997) ressalta que a linguagem organiza a compreensão do significado dos

eventos que ocorrem na realidade cultural em que o indivíduo está inserido.

Para a autora, esta organização ocorre por meio de operações mentais que

proporcionam a classificação, sistematização e análise de fatos e situações

com as quais o indivíduo entra em contato. Segundo a autora:

A linguagem simplifica e generaliza a experiência, ordenando as instâncias do mundo real, agrupando todas as ocorrências de uma mesma classe de objetos, eventos, situações, sob uma mesma categoria conceitual cujo significado é compartilhado pelos usuários dessa linguagem. (OLIVEIRA, 1997, p. 27).

Assim como Piaget (1972), Vygotsky (1987) também admite a existência

de estágios progressivos no desenvolvimento infantil e concebeu a evolução do

pensamento da criança como um processo que se divide em três fases.

A primeira fase corresponde ao Estágio de Formação de Objetos, em

que a mente infantil estabelece relações simplistas entre os objetos do mundo

real. A fim de estabelecer tais relações, a criança seleciona características

subjetivas e imprecisas dos objetos, baseando-se em sua percepção imediata

da realidade material que a cerca. Este procedimento resulta no

estabelecimento de nexos de conformação vaga, isto é, de conexões e

analogias que não apresentam conformidade relevante e efetiva com atributos

reais.

A segunda fase corresponde ao Estágio do Pensamento por Complexos,

no qual, ao contrário do estágio anterior, a criança estabelece relações

baseadas em características concretas dos objetos.

A terceira fase corresponde ao Estágio da Formação de Conceitos, no

qual a mente infantil já consegue reunir objetos que possuem atributos comuns

Page 24: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

32

e isolar determinadas peculiaridades, agrupando-os a partir da complexa

multiplicidade de configurações e características que a experiência sensorial

apresenta a seus sentidos.

Esta evolução em sua maneira de pensar permite à criança abstrair seu

pensamento da percepção imediata e material, e realizar um processo de

seleção de características e qualidades que resulta em pensamento conceitual.

Em relação ao aprendizado infantil, Vygostky (1987) verificou a

existência de dois níveis de desenvolvimento. O primeiro, classificado por ele

como Nível de Desenvolvimento Real, que refere-se às aquisições previamente

alcançadas pela criança, isto é, a conhecimentos que ela já possui e a ações

que ela já consegue realizar sozinha, sem a ajuda de outras pessoas. O

segundo estágio, classificado como Nível de Desenvolvimento Potencial,

relaciona-se às capacidades que ainda estão em processo de construção e diz

respeito à capacidade de desempenhar tarefas e solucionar problemas com a

ajuda de outros.

De acordo com Urrutigaray (2007), a distância entre o que a criança é

capaz de realizar de forma autônoma e aquilo que ela realiza em colaboração

com outras pessoas, que pertencem ao seu meio social, caracteriza o que

Vygostky (1987) chamou de “Zona de Desenvolvimento Proximal”. Segundo a

autora:

A Zona de Desenvolvimento Proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentes em estado embrionário. (URRUTIGARAY, 2007, p. 31).

Desta forma, a convivência com outras pessoas, bem como a figura do

adulto que atua como mediador do processo e apresenta novos desafios que

reconstroem a atividade psicológica dos alunos, são fatores muito importantes

Page 25: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

33

para a construção ativa do conhecimento pelas crianças. Como nos fala

Conceição (2007):

A interação social favorece a troca verdadeira e ativa das idéias e do pensamento, portanto, é um meio para se praticar as experiências da conduta moral pela vivência e participação, através da mediação do educador e da colaboração/interação entre os educandos. Os métodos novos da educação reservam um lugar essencial à vida social da criança como fator fundamental para seu desenvolvimento intelectual e moral. (CONCEIÇÃO, 2007, p.22).

Diante de tais reflexões, podemos perceber que a perspectiva sócio-

interacionista valoriza a presença do adulto no desenvolvimento infantil, visto

que este, por ser mais experiente, pode promover experiências significativas e

enriquecedoras para as crianças, bem como fortalecendo sua auto-estima e

estimulando suas capacidades.

Podemos inferir também que, segundo esta perspectiva, cabe à escola

adotar medidas que favoreçam a crescente interação entre os alunos, pois,

como vimos ao longo deste capítulo, na idade escolar ocorrem transformações

psicológicas e biológicas fundamentais na construção de conhecimentos pelo

indivíduo.

Nesse sentido, Urrutigaray (2007), enfatiza a importância da interação

entre professores e alunos, bem como a estimulação destes últimos, para

tarefas que ainda não são capazes de realizar sozinhos. Desta forma, o

aprendizado será conseqüência do contato entre indivíduos de diferentes

capacidades e graus de conhecimento que, por meio da linguagem, construirão

suas próprias funções psicológicas superiores. Diz a autora:

O aprendizado é o responsável por criar a zona de desenvolvimento proximal, na medida em que, na interação com outras pessoas, a criança é capaz de colocar em movimento vários processos que, sem ajuda externa, seriam impossíveis de ocorrer. Esses processos se internalizam e passam a fazer parte das aquisições do seu desenvolvimento individual. (URRUTIGARAY, 2007, p. 15).

Page 26: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

34

Os pressupostos de Piaget (1972) e Vygotsky (1987) representam

contribuições fundamentais para os estudos sobre o processo de ensino-

aprendizagem.

De acordo com Lenninger (2006), a imensa influência das teorias destes

autores se estende por diversas vertentes de investigação acadêmica. Diz a

autora:

Seus estudos exercem grande influência sobre disciplinas relevantes para o estudo da Semiótica, tais como sociologia, psicologia cognitiva e pedagogia. Os estudos sobre o desenvolvimento cognitivo da criança, realizados por Piaget e Vygotsky no último século, ainda possuem a capacidade de influenciar aportes teóricos e a criação de estudos concretos. (LENNINGER, 2006, p.01) ‘tradução nossa’.

Além da importância das contribuições de Piaget (1972) e Vygotsky

(1987) para os sistemas educacionais do Ocidente, suas teorias também

influenciaram estudiosos orientais, e originaram muitos estudos realizados por

pesquisadores chineses, bem como exerceram papel fundamental em

iniciativas educacionais levadas a efeito pelo governo da República Popular da

China, que realizou uma reforma estrutural em todo seu sistema escolar, a

partir das duas últimas décadas do século XX.

Segundo Jia³ (2010), a investigação acadêmica realizada na China,

sobre as teorias destes dois autores, contou com o aval do Ministério da

Educação, bem como de todos os órgãos governamentais que coordenam

iniciativas relativas ao ensino de língua chinesa, dentro e fora da China. De

acordo com este autor, os pesquisadores chineses pesquisaram e divulgaram

os pressupostos construtivistas e sócio-interacionistas, seguindo orientações

do governo daquele país, que os considera importantes ferramentas para o

progresso de seu sistema de educação.

Ainda em Jia³ (2010), os pressupostos de Piaget (1972) e Vygotsky

(1987) exerceram efeitos profundos na Reforma do Ensino Básico e

Fundamental empreendida pelo governo da República Popular da China, bem

Page 27: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

35

como no estabelecimento das novas diretrizes curriculares adotadas pelo

sistema educacional daquele país. A adoção de propostas pedagógicas de

orientação construtivista e sócio-interacionista resultou na modificação das

metodologias de ensino adotadas em todos os estabelecimentos educacionais

tutelados pelo governo da China. Além disso, os resultados destas pesquisas

influenciaram as concepções pedagógicas de estudiosos chineses sobre o

processo de ensino-aprendizagem, a relação professor-aluno, bem como a

relação de ambos com o conhecimento.

Ao analisarem-se os métodos de ensino adotados pelo governo da

China para a reforma educacional de seu sistema de ensino, é possível

perceber a influência dos pressupostos teóricos construtivistas e sócio-

interacionistas nas propostas pedagógicas que a orientaram.

Segundo a UNESCO (2003), a China realizou, em 2001, a reforma das

diretrizes curriculares do sistema educacional, após extensa pesquisa sobre

diferentes teorias e aprendizagem, realizada por estudiosos chineses. Um novo

modelo pedagógico foi adotado, no qual a criatividade e o pragmatismo dos

alunos são incentivados, bem como a descoberta de soluções inovadoras e a

investigação, análise e coleta de dados. Além da mudança de orientação

pedagógica que afetou todo o modelo educacional, os órgãos governamentais

chineses orientaram seus pesquisadores a pesquisar e implantar práticas

pedagógicas que orientadas pelos ensinamentos de Piaget (1972) e Vygotsky

(1987).

De acordo com Ye e Wu (2003), acadêmicos designados pelo governo

chinês para estabelecer as diretrizes pedagógicas da reforma do sistema

educacional, o aluno passou a ser considerado como o elemento mais

importante do processo de ensino-aprendizagem, e suas experiências pessoais

e conhecimentos prévios passaram a ser reputados como material integrante

dos processos mentais que conduzem à construção de conhecimentos. Para

os autores:

Se fosse possível sintetizar toda a psicologia educacional em apenas um princípio, diríamos que o único fator que realmente afeta o estudo é o conhecimento prévio dos alunos. O ato de

Page 28: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

36

ensinar somente será eficaz se este ponto for privilegiado. (YE; WU, 2003, p. 44) ‘tradução nossa’.

De acordo com Jia³ (2010), “as teorias construtivistas exerceram papel

fundamental no ordenamento da reforma do ensino básico na China” (JIA³,

2010, p. 197) ‘tradução nossa’.

A partir deste momento, de acordo com as novas diretrizes educacionais

adotadas pelos órgãos responsáveis pelo ordenamento do sistema escolar

daquele país, a aprendizagem passou a ser identificada como um processo de

construção de conhecimentos do qual o sujeito exerce papel ativo.

Na análise de Piaget (1972), este processo se desenvolve,

principalmente, pela re-estruturação do sujeito, ocorrida a partir de sua ação

sobre o objeto de sua atenção. Já para Vygotsky (1987), o desenvolvimento

deste processo se realiza a partir da interação deste sujeito com os outros

indivíduos que habitam seu meio social.

Page 29: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

37

CAPÍTULO II

CONSTRUÇÃO PSICOPEDAGÓGICA ATRAVÉS DO

DESENHO

2.1. O papel do lúdico em processos de ensino-aprendizagem

A educação lúdica contribui e influencia na formação da criança, possibilitando um crescimento sadio, um enriquecimento permanente, integrando-se ao mais alto espírito democrático enquanto investe em uma produção séria do conhecimento. A sua prática exige a participação franca, criativa, livre, crítica, promovendo a interação social e tendo em vista o forte compromisso de transformação e modificação do meio. (ALMEIDA, 1994, p.41).

Muitos são os questionamentos referentes à educação infantil e ao papel

do educador no cotidiano escolar. Após o surgimento da internet e de outras

inovações tecnológicas, pais, mães e educadores observam que as crianças

hoje em dia não sabem mais brincar. Elas preferem brincar em seus

computadores a divertirem-se com brinquedos ou até mesmo desenhar o que

aprenderam na sala de aula.

Atualmente, a realidade educacional requer total comprometimento de

todos os envolvidos em processos de ensino-aprendizagem, frente aos novos

desafios do mundo contemporâneo. Diante disso, existem muitas propostas de

utilização de ferramentas lúdicas no processo de ensino-aprendizagem, para

que seja possível enfatizar a construção do conhecimento pelo aluno, e não

somente a absorção sistemática de informações.

O psicopedagogo pode colaborar com esta construção do conhecimento

ao contribuir, através da brincadeira, para que todos os sujeitos envolvidos em

situações de ensino-aprendizagem estejam em contato com os objetos de sua

atenção por meio da estimulação lúdica.

Desta forma, a ação psicopedagógica cumprirá sua função de propiciar

uma conjuntura na qual a ação destes sujeitos em estado de interação, frente

aos objetos de seu interesse, poderá resultar na construção de conhecimentos.

Page 30: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

38

Segundo Huizinga (2004), a palavra ludus expressa tudo que se refere

ao jogo, reportando-se aos jogos infantis, à recreação e às representações

religiosas e teatrais, bem como aos jogos de azar. De acordo como este autor,

a principal idéia contida no vocábulo latino ludus refere-se à noção de ausência

de seriedade, bem como ao conceito de “ilusão” e “simulação”.

De acordo com Craidy e Kaercher (2001), estudos feitos sobre a história

da infância mostraram que a criança vê o mundo através do brinquedo. Para as

autoras, o ato de brincar corresponde à utilização de uma forma de linguagem

através da qual as crianças se relacionam com o mundo e aprendem a se

organizar, construindo normas de conduta. Deste modo, é através da atividade

lúdica que a criança entra em contato cada vez mais profundo com o outro, ao

mesmo tempo em que se constrói como sujeito.

Para Huizinga (2004), o jogo pré-existe à própria cultura humana. De

acordo com este autor, atividades lúdicas já eram praticadas pelos

grupamentos humanos em épocas muito remotas:

Encontramos o jogo na cultura como um elemento existente antes da própria cultura, acompanhando-a e marcando-a desde as mais distantes origens até a fase da civilização em que agora nos encontramos. (HUIZINGA, 2004, p. 6).

Todos nós ainda guardamos na memória as lembranças de nossas

atividades infantis, jogos, brincadeiras de faz-de-conta e histórias contadas por

alguém querido. Os personagens dos contos-de-fadas estimulavam nossa

imaginação e muitas vezes encenávamos o que ouvíamos ou líamos nos livros

infantis.

As brincadeiras, imitações e jogos infantis ocuparam papel de destaque

nos estudos de orientação construtivista e sócio-interacionista, sobre os

processos de aprendizagem e o desenvolvimento da inteligência humana.

Piaget (1989) define o ato de brincar como um fator que exerce influência

expressiva na formação intelectual da criança, apesar de não se constituir em

elemento gerador do pensamento infantil. Segundo ele:

Page 31: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

39

A brincadeira deve fazer parte do cotidiano da educação infantil, pois, as atividades lúdicas adquirem um significado especial, quando são marcadas pelo interesse e pela espontaneidade da criança. Dessa forma, o brinquedo deve ser visto como algo sério, como objeto capaz de educar as crianças e também torná-las cidadãs. (PIAGET, 1989, p.143).

De acordo com Huizinga (2004), a atividade lúdica é capaz de atrair a

atenção do indivíduo de forma integral, mesmo que não exista nenhuma

recompensa de ordem material envolvida. Para este autor, a atividade lúdica

oferece atrativos que ultrapassam as necessidades cotidianas e agrega novos

valores às ações humanas. Diz o autor:

No jogo existe alguma coisa “em jogo” que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação. Todo jogo significa alguma coisa... seja qual for a maneira como o considerem, o simples fato de o jogo encerrar um sentido implica a presença de um elemento não material em sua própria essência. (HUIZINGA, 2004, p.4.)

Vygotsky (1984) enfatizou, em seu estudo sobre o papel da atividade

lúdica e do brinquedo no desenvolvimento da criança, os jogos infantis e o faz

de conta, nos quais a imaginação e a representação de papéis são elementos

preponderantes. Para o autor, “... é enorme a influência do brinquedo no

desenvolvimento de uma criança...” (VYGOTSKY, 1991, p. 109).

Nesse sentido, a brincadeira equivale a um estágio de transição entre o

mundo infantil e o mundo adulto, e sua característica principal é o fato de

permitir que a criança abstraia seu pensamento da realidade material à sua

volta. Além disso, brincar torna a criança capaz de representar mentalmente

uma realidade ausente, bem como separar objetos de significados, desligando-

se do imediatismo de situações objetivas. Como nos fala o autor:

Page 32: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

40

No brinquedo, a criança opera com significados desligados dos objetos e ações aos quais estão habitualmente vinculados; entretanto, uma contradição surge, uma vez que, no brinquedo, ela inclui, também, ações reais e objetos reais. Isto caracteriza a natureza de transição da atividade do brinquedo: é um estágio entre as restrições puramente situacionais da primeira infância e o pensamento adulto, que pode ser totalmente desvinculado de situações reais. (VYGOTSKY, 1991, p.112).

Para Vygotsky (1991), a idade pré-escolar é a fase na qual o pensamento

infantil deixa de ser regido pelos objetos externos e passa a ser regido pela

imaginação. Esta é a fase na qual a criança começa a utilizar objetos para

representar a realidade ausente, e substitui objetos reais por aquilo que

concebe em sua mente. Assim, o objeto observado e manipulado pela criança

é o elemento responsável pela separação entre seu pensamento e a realidade.

Diz:

Na idade pré-escolar ocorre, pela primeira vez, uma divergência entre os campos do significado e da visão. No brinquedo, o pensamento está separado dos objetos e a ação surge das idéias e não das coisas (...) a ação regida por regras começa a ser determinada pelas idéias e não pelos objetos. Isto representa uma tamanha inversão da relação da criança com a situação concreta, real e imediata, que é difícil subestimar seu pleno significado (VYGOTSKY, 1991, p.110).

À medida que a criança amadurece, seu pensamento torna-se mais

complexo e menos dependente da realidade material e dos objetos que a

cercam. O pensamento infantil torna-se cada vez mais autônomo e

independente de relações físicas com o mundo concreto, adquirindo

progressiva habilidade mental de elaborar pensamentos que não se restringem

a objetos materiais circunscritos ao alcance de sua visão.

Em relação a brincadeiras de faz-de-conta, Vygotsky (1991) defende a

idéia de que existe uma relação intrínseca entre as situações imaginárias

elaboradas pela mente da criança e as regras relacionadas à representação

das ações que ela realiza. Segundo o autor, ao interpretar diferentes papéis,

ela irá se submeter ao conjunto específico das regras inerentes à realidade do

Page 33: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

41

objeto observado e a outras, oriundas de sua imaginação pessoal. Assim, este

tipo de atividade permite que a criança amplie seu âmbito de percepção

habitual, pois o brinquedo a liberta das restrições estabelecidas pela realidade

material à sua volta.

Assim, ao entrar em contato com o mundo e as pessoas, a criança

reconstrói, através da imitação, as ações que observou, e esta atividade não

deve ser considerada como uma simples reprodução mecânica de movimentos

e gestos, mas como um processo que resulta na elaboração de pensamentos

abstratos e em desenvolvimento intelectual.

Deste modo, Vygotsky (1991) considera a imitação como um fator de

extrema importância para a construção do conhecimento infantil, pelo fato de

estimular, em longo prazo, a elaboração de ações de cunho pessoal, após as

fases iniciais em que a criança apenas repete ações de outras pessoas, sem

ter certeza do significado das mesmas. Esta atividade mecânica se

transformará em ação consciente à medida que as ações resultarem de

elaborações realizadas pela criança, resultando em um repertório próprio e

consciente de gestos e movimentos corporais.

Ainda em Vygotsky (1991), ao projetar-se nas atividades adultas de sua

cultura, a criança realiza um esforço para ser coerente com os papéis

assumidos e seguir regras de comportamento adequadas à situação que

procura representar. Por exemplo, ao representar o papel de mãe de suas

bonecas, a menina recria o gestual e a entonação de voz que caracterizam o

comportamento maternal, ensaiando papéis, atividades e valores futuros. Desta

forma:

A situação imaginária de qualquer forma de brinquedo já contém regras de comportamento (...) a criança imagina-se como mãe e a boneca como criança e, dessa forma, deve obedecer às regras do comportamento maternal. (VYGOTSKY, 1991, p.108).

A imitação de ações, por meio da representação de papéis, equivale,

segundo a teoria sócio-interacionista, a uma espécie de ensaio dos

Page 34: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

42

comportamentos que, ao amadurecer, a criança realizará em seu convívio

social.

No que concerne à brincadeira, os pressupostos construtivistas também

enfatizaram a importância da atividade lúdica para o desenvolvimento da

inteligência do homem, bem como para processos de ensino-aprendizagem.

Tais pressupostos consideram a brincadeira como uma condição essencial

para o desenvolvimento infantil, visto que, ao brincar, as crianças assimilam a

realidade e se esforçam para transformá-la. Além disso, esta abordagem

teórica postula que cada etapa do desenvolvimento psicológico infantil

relaciona-se a tipos específicos de atividades lúdicas, numa progressão que

ocorre da mesma maneira para todos os indivíduos.

Segundo a classificação piagetiana, baseada na evolução progressiva

das estruturas mentais da criança, as diferentes modalidades de brincadeiras

podem ser divididas em jogos de regras, jogos simbólicos ou jogos de

exercícios.

De acordo com Piaget (1971), durante o Período da Inteligência

Sensório-Motora (0 a 2 anos), o conhecimento sobre os objetos é obtido pelos

bebês através de reflexos e de sua interação com os mesmos. Segundo ele, o

primeiro brinquedo utilizado pela criança é seu próprio corpo, que é explorado

desde os primeiros anos de vida. Ao descobrir o próprio corpo, a criança

adquire conhecimento sobre estímulos oriundos do ambiente e seu organismo

adapta-se, progressivamente, ao meio.

O jogo de exercícios, caracterizado por gestos repetitivos e movimentos

simples, constitui a atividade específica dos primeiros anos de vida, tais como

jogos de manipulação, motores, táteis e olfativos. Estes jogos estendem-se até

as fases iniciais do Período Pré-Operacional (2 a 7 anos), e somente se

modificam com o aparecimento da linguagem.

Os jogos simbólicos surgem com o aparecimento da função semiótica,

durante as fases iniciais do Período Pré-Operacional (2 a 7 anos), e

caracterizam-se pela transformação do objeto, pelo desempenho de papéis e

de atividades de faz-de-conta. Através deste tipo de jogo, a criança re-significa

objetos, ações, fatos, pessoas e funções, além de realizar imitações.

Já os jogos de regras surgem durante o Período Operacional Concreto

(7 aos 11/12 anos), no qual ocorre progressivo desinteresse pelos jogos

Page 35: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

43

simbólicos. Nesta fase a criança prefere os jogos em grupo, em contraste com

a atividade preponderantemente individual que caracterizava o período

anterior.

Assim como Vygotsky (1991), Piaget (1978) também atribuiu importância

à imitação, considerando-a como um elemento que exerce papel fundamental

no desenvolvimento da representação mental na criança, bem como da função

semiótica, definida como a capacidade de lidar com símbolos. Para ele,

imitação e brincadeira são processos complementares que contribuem para a

construção do conhecimento, a partir da relação entre os mecanismos de

adaptação e organização. Deste modo, a imitação relaciona-se à acomodação,

enquanto que na brincadeira predomina o mecanismo da assimilação.

Para Piaget (1978), o desenvolvimento da imitação como um processo

dividido em seis períodos progressivos, sendo que alguns deles se subdividem

em níveis internos.

Durante o primeiro período, classificado como Estágio da Preparação

Reflexa, a imitação verdadeira está ausente, visto que a reprodução de

modelos e padrões somente se configura a partir de atos reflexos, e este

comportamento não pode ser considerado como a verdadeira imitação.

No segundo período, classificado como Estágio da Imitação Esporádica,

os esquemas reflexos ampliam-se, devido à assimilação de elementos externos

e durante o terceiro, classificado como Estágio da Imitação Sistemática, a

criança amplia a coordenação entre o reflexo de preensão e o sentido da visão,

conseguindo realizar imitações simples por meio de movimentos espontâneos.

Já no quarto período ocorrem dois níveis diferenciados. Durante o

primeiro que se inicia por volta dos oito meses de idade, o bebê começa a

coordenar esquemas entre si, imitando movimentos que já executou e

repetindo movimentos de forma inconsciente. Durante o segundo, a criança

tenta reproduzir novos movimentos corporais e sons, enquanto que o quinto

período caracteriza-se pela tentativa de imitação sistemática de novos padrões

de movimentos.

Durante o Sexto Estágio da Imitação tem início a inteligência sensório-

motora, o que resulta em coordenação de esquemas independentemente da

experiência empírica imediata, o que permite o surgimento de combinações

puramente mentais.

Page 36: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

44

Este estágio compreende dois momentos distintos. No primeiro,

classificado como Estágio da Imitação Dilatada, a reprodução de um modelo

não se faz necessariamente em sua presença, mas também em sua ausência,

e depois de um período de tempo mais ou menos longo. O segundo,

classificado como Estágio da Evolução Posterior à Imitação, é o momento que

se caracteriza pelo aparecimento da linguagem, no qual a criança analisa a

imitação realizada.

Já Moura et al. (2002), defendem a idéia que a principal característica

do sexto estágio da imitação é o surgimento do símbolo lúdico, que se origina a

partir da formação de esquemas simbólicos, resultando em aumento

progressivo da capacidade infantil de representação. Os referidos autores

sustentam que:

Entende Piaget que quando existe imitação, elo menos aparente, de alguma coisa, e assimilação lúdica ao mesmo tempo, estamos diante da característica principal do jogo simbólico, isto é, aquela que se revela como a principal diferença do jogo puramente motor. (MOURA et al., 2002, p.3).

Portanto, compartilhando destas idéias, Maranhão (2007) reforça que a

atividade lúdica é um elemento primordial para a organização do pensamento e

a aquisição de códigos de linguagem, o que implica na importância que deve

ser atribuída à brincadeira.

Para ela, os educadores responsáveis por esta fase do desenvolvimento

infantil devem, obrigatoriamente, elaborar atividades que reforcem os

fundamentos da evolução da linguagem, e o aprendizado de conceitos, através

de brincadeiras.

Esta atitude é de importância fundamental para o desenvolvimento

intelectual da criança, visto que a educação infantil inicia-se durante a fase do

surgimento da linguagem, além do fato de que brincar é um direito das

crianças. Para a autora:

Page 37: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

45

Neste momento inicia-se a Educação Infantil. É preciso que se dê a devida importância a esta fase, pois não podemos aceitar que, em função de qualquer outro aspecto, se retire da criança o direito de brincar. (MARANHÃO, 2007, p. 11).

Natural, primordial e necessária, a brincadeira, é um direito da criança

reconhecido em declarações, convenções e leis nacionais e internacionais. No

que concerne à importância da brincadeira para as crianças, os dispositivos

legais brasileiros destacam as atividades lúdicas como essenciais. Conforme o

artigo 15 da Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990:

A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. (BRASIL, Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990).

Ainda na referida lei, o artigo 16 determina:

Art. 16- O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: I- ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais; II- opinião e expressão; III- crença e culto religioso; IV- brincar, praticar esportes e divertir-se; V- participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; VI- participar da vida política, na forma da lei; VII- buscar refúgio, auxílio e orientação. (BRASIL, Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990). (grifo nosso).

Acreditamos que apesar da existência de leis que garantam o direito das

crianças à brincadeira, a ludicidade não pode ser vista na esfera educacional,

apenas como diversão, pois é uma necessidade do ser humano.

É importante ressaltar que na Educação Infantil, encontramos espaços

para os jogos e brincadeiras. No que se refere ao Ensino Fundamental,

Page 38: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

46

entretanto, esses mesmos espaços, na maioria das escolas brasileiras, são

entendidos como inúteis e deixados de lado, em nome do saber cumulativo e

mecanicamente memorizado.

Por outro lado, em nosso entender, a utilização de tecnologia

informatizada torna-se questionável, pois não conseguimos reconhecer um alto

grau de ludicidade numa atividade repetitiva e mecânica como a manipulação e

utilização de um computador. Este pensamento nos leva a questionar se o

baixo desempenho dos alunos brasileiros, e a péssima posição do Brasil no

ranking mundial da educação, não se devem, entre outros motivos, à

desvalorização do lúdico em processos de ensino-aprendizagem.

Page 39: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

47

2.2- O Desenho como ferramenta Psicopedagógica.

Seja no significado mágico que o desenho assumiu para o homem das cavernas, seja no desenvolvimento do desenho para a construção de maquinários no início da era industrial, seja na sua aplicação mais elaborada para o desenho industrial e arquitetura, seja na função de comunicação que o desenho exerce na ilustração, na história em quadrinhos, o desenho reclama a sua autonomia e sua capacidade de abrangência como um meio de comunicação, expressão e conhecimento. (DERDYK, 1998, p.29).

Desde os primeiros anos de vida, o ato de desenhar acontece de forma

muito natural nas crianças, mesmo antes de ingressar na escola. Ao

observarmos o comportamento infantil, podemos perceber o quanto o desenho

é uma manifestação não somente espontânea, mas também comum a quase

todas elas.

O estudo das possibilidades educativas do desenho infantil sempre

esteve presente nas investigações relativas à construção do conhecimento

humano, realizadas por Piaget e Vygotsky, bem como por muitos outros

pesquisadores dedicados ao estudo das teorias de aprendizagem de

orientação construtivista e sócio-interacionista.

Alguns teóricos, em concordância com estas teorias, pautaram suas

investigações a partir da assertiva que postula que a evolução do grafismo

depende do desenvolvimento da percepção e da compreensão da atividade

simbólica, o que resulta em grande correspondência entre a linguagem,

expressa pelo desenho, e os modelos culturais nos quais a criança está

inserida.

Segundo Lenninger (2006), tanto Piaget (1972) quanto Vygotsky (1987)

reconheceram a importância do desenho para o desenvolvimento intelectual da

criança, apesar das divergências existentes entre suas abordagens. Tais

diferenças relacionam-se ao fato de que a pesquisa de Piaget (1972) enfatizou

aspectos relativos à origem e construção do conhecimento pelo indivíduo,

enquanto Vygotsky (1987) privilegiou a interação social. Diz:

Page 40: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

48

Embora a obra de Vygotsky seja uma crítica aos primeiros trabalhos de Piaget, ele foi muito influenciado por elas, existindo similaridades essenciais entre eles. Isto é particularmente óbvio em suas visões sobre o desenvolvimento das habilidades cognitivas como um processo que ocorre em estágios através dos quais o pensamento sofre mudanças não somente quantitativas, mas também qualitativas. (LENNINGER, 2006. p. 01) ‘tradução nossa’.

Em relação ao processo de ensino-aprendizagem, Vygotsky (1991)

afirma que o desenho infantil é o precursor da escrita e que, “... na verdade, o

segredo do ensino da linguagem escrita é preparar e organizar adequadamente

essa transição natural...” (VYGOTSKY, 1991, p. 131).

Já para Piaget e Inhelder (1979), é a função semiótica que capacita a

criança a representar um objeto que não esteja presente (um significado),

através de outro objeto, que está presente (um significante), ou seja, a mesma

possibilita o desenvolvimento da habilidade infantil de atribuir significado aos

objetos. Desta forma, o desenho seria apenas mais uma das manifestações

desta função, desenvolvendo-se paralelamente a outras, como o brinquedo e a

linguagem, e compartilhando o processo de desenvolvimento em etapas

característico da relação entre a criança e o mundo.

Na visão de Vygotsky (1991), a cultura define nosso modo de pensar e

aprender, consistindo num sistema de significação que se apresenta como um

processo dinâmico, modelado por diferentes grupos culturais. Segundo o autor,

sistemas de significação, ou sistemas simbólicos, são os meios pelos quais

idéias são compartilhadas pelos membros do mesmo grupo.

Assim, formas específicas de linguagem, como desenho, gesto e

palavra, são instrumentos de apropriação de cultura pelas crianças, que lhes

permite compreender o mundo e orientam suas ações sobre o meio em que

vivem.

Vygostky (1991) observa que existe um estreito vínculo de continuidade

entre as diferentes representações simbólicas realizadas pela criança ao

desenhar e brincar, visto que estas duas atividades contribuem, para o

processo de aquisição da linguagem escrita. Segundo o autor, o início do

desenvolvimento da escrita para a criança ocorre com o surgimento do gesto,

Page 41: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

49

enquanto “signo visual inicial que contém a futura escrita infantil como a

semente contém o futuro carvalho” (VYGOTSKY, 1991, p.121).

Deste modo, os desenhos, brincadeiras e gesticulações das crianças

estão relacionadas ao desenvolvimento das habilidades manuais necessárias

ao ato de escrever, bem como ao processo de desenvolvimento intelectual que

permitirá a compreensão e utilização dos sistemas de escrita.

O autor ressalta que as crianças somente começam a desenhar quando

já possuem determinado grau de desenvolvimento da linguagem falada, o que

demonstra que “o desenho é uma linguagem gráfica que tem por base a

linguagem verbal...” (VYGOTSKY, 1991, p. 127).

Esta relação entre expressão por meios gráficos e a habilidade de

organizar o pensamento através de palavras caracteriza o desenho como um

elemento importante para o desenvolvimento da comunicação lingüística pelas

crianças.

De acordo com Vygotsky (1991) durante a fase escolar, existe uma

tendência evolutiva que se inicia com a escrita pictográfica, baseada em

representações simplificadas de objetos reais, progredindo em direção à escrita

ideográfica, que expressa idéias através de sinais simbólicos abstratos.

Durante este trajeto evolutivo, os traços aleatórios são gradativamente

substituídos por rabiscos simbolizadores, que serão substituídos por desenhos

e pequenas figuras até que, finalmente, a criança irá utilizar somente os signos

socialmente adequados. Para ele, é possível “... interpretar o desenho das

crianças como um estágio preliminar no desenvolvimento da linguagem

escrita.” (VYGOTSKY, 1991, p. 128).

Desta forma, a escrita se desenvolve quando a criança substitui o

desenho de objetos pelo desenho de palavras, de modo que o

desenvolvimento da linguagem escrita ocorre através de um processo unificado

que engloba o brinquedo de faz-de-conta, o desenho e o ato de escrever.

Para o autor, o aprendizado da escrita é um processo que começa nos

primeiros rabiscos que a criança executa ao representar objetos, e que evolui

até a comunicação por meio de sinais simbólicos, ou seja, por meio do sistema

de escrita da sociedade na qual a criança está inserida.

Em análise, Vygotsky (1991) afirma que o ensino da linguagem escrita

deveria ser transferido para a pré-escola, visto que crianças em idade pré-

Page 42: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

50

escolar já são capazes de descobrir a função simbólica da mesma. Além disso,

o autor enfatiza o fato de que a escrita deva ter significado e importância para

as crianças, e sua importância deve ser demonstrada a elas. Para ele, “só

então poderemos estar certos de que ela se desenvolverá, não como hábito de

mãos e dedos, mas como uma forma nova e complexa de linguagem.”

(VYGOTSKY, 1991, p.133).

Vygotsky (1991) enfatiza, também, a necessidade de que as crianças

aprendam a escrever de forma natural, conjugando-se os aspectos motores à

atividade lúdica, de modo que o aprendizado seja absorvido de modo natural, e

não como uma atividade repetitiva e mecânica. Na concepção deste autor, para

que a transmissão de conhecimentos relativos ao ato de escrever seja eficaz,

as crianças “... devem sentir a necessidade do ler e do escrever no seu

brinquedo...” (VYGOTSKY, 1991, p.134).

O desenho infantil, tanto na abordagem construtivista quanto na sócio-

interacionista, foi analisado como uma atividade que ocorre em fases cujo

desenvolvimento é progressivo, e que ocorre em instâncias que podem ser

relacionadas aos diferentes períodos de desenvolvimento intelectual do ser

humano.

Para Vygotsky (1982), a primeira etapa do desenho infantil é a Etapa

Simbólica, na qual as crianças desenham a figura humana como bonecos

simplificados, representados de forma arbitrária e esquemática. Para ele,

durante esta etapa, a criança representa somente formas esquemáticas que

simbolizam os atributos dos objetos e: “o pequeno artista é muito mais

simbolista que naturalista” (VYGOTSKY, 1982, p.94). ‘tradução nossa’.

A segunda etapa é classificada como Etapa Simbólico-Formalista, na

qual os traços são mais elaborados e os recursos gráficos utilizados

apresentam maior grau de sofisticação. Durante esta etapa a criança percebe

que não precisa limitar-se à enumeração linear de aspectos concretos do

objeto representado, estabelecendo relações entre o todo e as partes menores.

O simbolismo ainda está presente, mas o desenho apresenta contornos mais

próximos da forma dos objetos representados.

Page 43: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

51

Durante a terceira etapa, classificada como Etapa Formalista

Verdadeira, o registro gráfico corresponde a uma tentativa de representar a

forma original dos objetos, ocorrendo um distanciamento do simbolismo

presente nas fases anteriores. A quarta etapa é classificada como Etapa

Formalista Plástica, na qual o desenvolvimento viso-motor da criança permite

que o objeto seja representado de maneira bastante realista. Para o autor, as

crianças que continuam produzindo desenhos durante esta fase consideram

esta atividade como uma fonte de grande prazer estético e sensorial.

A teoria construtivista também concebe a evolução do desenho infantil

como um fenômeno que ocorre em fases, dentre as quais a primeira,

classificada como Fase da Garatuja, se manifesta durante o Período da

Inteligência Sensório-Motora (0 a 2 anos), e se divide em dois momentos

distintos. No primeiro momento, classificado como Fase da Garatuja

Desordenada, a imitação da forma de um objeto ainda não é acompanhada de

representação, e mantém as características físicas mais evidentes do mesmo.

O segundo, classificado como Fase da Garatuja Ordenada, corresponde a um

estágio no qual já existe certo grau de coordenação entre a visão e a atividade

física necessária para produzir um desenho mais preciso. Neste estágio, já

estão presentes o símbolo e o jogo simbólico, além de narrativas.

Na segunda fase, classificada como Fase do Pré-Esquematismo, e que

ocorre durante o Período Pré-Operacional (2 a 7 anos), o desenho demonstra a

possibilidade de relacionar o mundo real e o pensamento infantil, apesar de

que a execução é ainda fragmentada e desprovida de relações espaciais

coerentes entre os objetos desenhados. Dentre estes objetos, a figura humana

aparece de forma preponderante e atua como referencial para todos os outros

objetos e relações, espaciais ou emocionais, bem como para a evolução da

habilidade infantil de lidar com símbolos.

Durante a terceira fase, classificada por Piaget como Fase do

Esquematismo e que pertence ao Período Operacional Concreto (dos 7 aos

11/12 anos), a criança apresenta uma percepção mais concreta do espaço

físico. Esta ampliação de sua capacidade de desenhar a realidade concreta do

mundo que a cerca manifesta-se na presença da linha que simboliza o chão,

bem como pelo uso de cores, que podem ter conteúdo emocional. Nesta fase,

Page 44: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

52

ao desenhar a figura humana, a criança registra detalhes anatômicos mais

realistas e contornos mais definidos.

A quarta fase, classificada como Fase do Realismo, manifesta-se

durante os momentos finais do Período Operacional Concreto. Nesta fase a

criança demonstra senso crítico, percepção das diferenças entre os sexos e

ênfase na expressão das emoções. As relações espaciais são mais

sofisticadas e não dependem tanto da linha, passando a adquirir proporções

geométricas mais acentuadas.

A quinta fase, classificada como Fase do Pseudo Naturalismo, pertence

ao Período Operacional Abstrato (11 anos em diante) e se caracteriza por

reduzida espontaneidade de execução, realismo visual e expressão subjetiva e

detalhes anatômicos bem pronunciados.

É possível notar que os estudos sobre a evolução do desenho e da

escrita infantis, registraram a existência de estágios de desenvolvimento na

qual as habilidades expressivas da criança evoluem no sentido de maior

capacidade de representação simbólica.

Esta evolução em direção à representação mental cada vez mais

elaborada, bem como o crescente domínio de sistemas simbólicos aproxima

desenho e escrita como importantes ferramentas de aquisição da linguagem.

De acordo com Maciel (2009), nas fases iniciais do aprendizado da

leitura e escrita, a primeira dificuldade consiste em diferenciar desenho e

escrita. Conforme ensina a autora, neste momento, como ainda não

conseguem compreender esta diferença, as crianças solucionam

precariamente o problema por meio da imitação do ato de escrever. Diz:

Durante os primeiros contatos da criança com marcas gráficas impressas em livros, cadernos, cartazes, inicia-se um longo processo de construção de esquemas conceituais cujo primeiro desafio consiste em distinguir o que é desenho do que é escrita. Neste primeiro momento, ainda sem fazer esta distinção, a criança se propõe a imitar o ato de escrever. Como num jogo, ela crê que poderia ou deveria escrever certo conjunto de palavras imitando a ação de escrever. (MACIEL, 2009, p. 47).

Page 45: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

53

Na busca pela compreensão dos processos infantis de aprendizagem, e

também das relações entre desenho e construção de conhecimentos de leitura

e escrita, os estudos de Ferreiro (2003) orientaram-se pelas teorias de Piaget

(1972).

Ao analisar os desenhos infantis da fase inicial, a autora notou que as

crianças não conseguem diferenciá-los, fundamentalmente, da escrita.

Segundo ela, a criança não se sente segura em relação à utilização de

palavras e apóia-se no desenho como um recurso adicional para garantir a

transmissão do significado que deseja expressar. Por exemplo: ao escrever a

palavra elefante, ela se utiliza de uma grafia cujo tamanho é muito grande, ao

passo que ao escrever a palavra formiguinha, utiliza letras bem pequenas. Diz:

Diferenciar a atividade de desenhar da atividade de escrever é importante porque a escrita, para as crianças pequenas, recupera o que se pode desenhar: o nome do objeto desenhado. (FERREIRO, 2003, p.150).

Podemos perceber que alguns pesquisadores concordam com as

assertivas que afirmam que o desenho precede à escrita e contribui para o

desenvolvimento infantil, bem como para um maior aproveitamento do

aprendizado do sistema de escrita.

Ao constatarem que, inicialmente, as crianças não diferenciam o

desenho da escrita, alguns autores, aconselham a aproximação entre

atividades lúdicas, desenho e processos de aquisição de sistemas de escrita,

como é o caso de Vygotsky (1991):

Desenhar e brincar deveriam ser estágios preparatórios ao desenvolvimento da linguagem escrita das crianças. Os educadores devem organizar todas essas ações e todo o complexo processo de transição de um tipo de linguagem escrita para outro. Devem acompanhar esse processo através de seus momentos críticos até o ponto da descoberta de que se pode desenhar não somente objetos, mas também a fala. Se quiséssemos resumir todas essas demandas práticas e expressá-las de uma forma unificada, poderíamos dizer o que

Page 46: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

54

se deve fazer é, ensinar às crianças a linguagem escrita e não apenas a escrita de letras. (Vygotsky, 1991, p.134).

A partir das reflexões deste capítulo, podemos depreender que a

atividade lúdica e os atos de escrever e desenhar são compreendidos como

elementos cuja conjugação pode colaborar para o processo de gradual

substituição do desenho de objetos pela escrita de palavras, bem como para a

aquisição da linguagem pelo homem.

Segundo nosso entendimento, a inserção do desenho em processos de

ensino-aprendizagem em geral, e especificamente, no que concerne ao nosso

estudo, torna-se uma intervenção psicopedagógica de cunho preventivo, visto

que o desenho possui a capacidade de facilitar a compreensão e a construção

de significação e conhecimentos.

Ora, se por um lado a criança desenha instintivamente o que procura

compreender e se, por outro, o desenho, como vimos, é uma ferramenta de re-

significação, a mesma poderá servir como elemento facilitador no processo de

ensino-aprendizagem durante o ensino fundamental, corpus de nossa

proposta. Nessa perspectiva, como nos fala Gonçalves (1999 apud Pereira,

2007), o psicopedagogo tem a possibilidade de “... intervir nesse processo, seja

para potencializá-lo ou para sanar possíveis dificuldades, utilizando

instrumentos próprios da psicopedagogia...” (GONÇALVES, 1999 apud Pereira,

2007, p.6).

Page 47: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

55

CAPÍTULO III

A ABORDAGEM PSICOPEDAGÓGICA DO

APRENDIZADO DE SEGUNDA LÍNGUA

3.1. O processo de ensino-aprendizagem da língua chinesa

As tradições, usos e costumes da cultura chinesa são praticamente

desconhecidos pela sociedade brasileira. A China é um país de história

milenar que apresenta grandes diferenças regionais, étnicas e principalmente

lingüísticas.

Para os falantes de língua portuguesa, o aprendizado da língua chinesa,

pode se constituir em um imenso desafio, devido às diferenças entre estas

duas línguas.

No que concerne ao embasamento teórico necessário à eficaz atuação

do psicopedagogo, o processo de ensino-aprendizagem de uma segunda

língua não apresenta os mesmos parâmetros de investigação psicopedagógica

que o aprendizado da língua materna.

Segundo Yip e Matthews (2007), o aprendizado de uma segunda língua

induz à noção de que a criança já é fluente em sua língua materna, enquanto

que aprendizado bilíngüe reporta-se à análise da relação entre os níveis de

conhecimento adquiridos sobre as duas línguas estudadas. Conforme afirmam

os autores:

Classificar uma das línguas faladas por uma criança bilíngüe como uma segunda língua implica no fato de que esta língua deve possuir a mesma natureza e status da segunda língua falada por uma criança ou adulto que já aprendeu pelo menos uma língua. (YIP; MATTHEWS, 2007, p. 23) ‘tradução nossa’.

Page 48: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

56

No que concerne ao aprendizado escolar, as imensas diferenças

estruturais entre a língua portuguesa e a chinesa resultaram em metodologias

de ensino totalmente diferentes.

De acordo com Störig (1990), a língua portuguesa pertence à família

indo-européia e é descendente do latim, língua falada pelos soldados romanos

que colonizaram as regiões que atualmente correspondem à Espanha e

Portugal, entre os anos de 218 a.C. e 201 a. C..

Deste modo, as metodologias de ensino desta língua, adotadas no

Brasil, orientam-se por parâmetros adotados para o ensino das línguas que

utilizam sistemas de escrita alfabética, e que evoluíram a partir do latim.

Em relação a orientações pedagógicas e metodológicas, o ensino da

língua portuguesa em escolas brasileiras é determinado pelas diretrizes

expostas nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), documento elaborado

pelo Governo Brasileiro. As diretrizes educativas contidas neste documento

serão analisadas no capítulo 4.1.

Ainda em Störig (1990), a Língua Chinesa pertence à família sino-

tibetana, ou seja, a um grupo de línguas falado na Ásia, cuja origem, sistema

de escrita, pronúncia, história e estrutura gramatical não têm absolutamente

nada em comum com as línguas indo-européias.

Em virtude destas circunstâncias, a investigação psicopedagógica dos

respectivos processos de ensino-aprendizagem requer significativas diferenças

de abordagem.

De acordo com Jia¹ e Jia² (2005), existe uma relação muito estreita entre

o sistema de escrita de uma sociedade e os padrões de pensamento das

pessoas que nela vivem.

Os sistemas de escrita são criados e refletem a cultura, as mentes e a realidade social que os originou. A mente e a cultura das pessoas que ali vivem, por sua vez, são fortemente influenciadas pelos sistemas de escrita dos quais se utilizam. (JIA¹ e JIA², 2005, p. 151) ‘tradução nossa’.

Page 49: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

57

Para Carvalho (1988), os processos de aprendizagem das línguas indo-

européias, como a língua portuguesa, baseiam-se em estruturas de raciocínio

baseadas na lógica linear característica dos métodos de ensino difundidos na

Europa a partir da influência da filosofia grega.

Este modo de raciocinar é completamente diferente dos sistemas de

pensamento adotados por indivíduos nascidos no Oriente.

Segundo Yutang (1955), o sistema filosófico chinês para conhecimento

da realidade que originou a tradição educacional daquele país, nada possui em

comum com os modelos de raciocínio lógico ensinados pelos educadores e

filósofos gregos.

De acordo com esta autora, a filosofia grega e a chinesa não utilizam

pressupostos epistemológicos, ou seja, diretrizes para investigação de

processos de construção de conhecimento, bem como terminologias de

exposição acadêmica, que possuam pontos em comum. Diz:

Que é, na realidade, a filosofia chinesa? E possui a China uma filosofia, digamos, como a de Descartes ou de Kant, uma filosofia de conhecimento da realidade ou do universo, filosofia logicamente construída e vigorosamente sustentada? A resposta é um altivo “Não”. Nisso está todo o problema. Quando se trata de filosofia sistemática, a China tem de importá-las da Índia. Nunca houve ali inclinação para a filosofia sistemática, e não haverá, enquanto os chineses continuarem chineses. (YUTANG, 1955, p.8).

Para ela, além dessas diferenças, as terminologias e técnicas de

exposição de conhecimentos utilizadas pelos intelectuais chineses são

completamente diferentes das utilizadas pelo mundo acadêmico ocidental:

A China nem sequer possui a gíria acadêmica de que tanto gostam os sociólogos e psicólogos norte-americanos e que se torna tão necessária para a construção de qualquer teoria acadêmica impermeável. (YUTANG, 1955, p.8).

Page 50: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

58

Desta forma, tanto as diretrizes utilizadas por pesquisadores e filósofos

chineses para investigar processos de construção de conhecimento quanto a

forma de exposição dos resultados obtidos, diferem totalmente dos métodos

ocidentais.

De acordo com alguns autores, como Jia¹ e Jia² (2005), Jia³ (2010) e

Tavassoli (1999), os diferentes métodos de escrita utilizados por estudiosos e

filósofos ocidentais e chineses para transmitir conhecimentos podem ter

colaborado para a formação de sistemas de pensamento e ensino muito

diferentes entre si.

Segundo Jia² (2005), o sistema de escrita chinesa, desenvolvido ao

longo de mais de seis mil anos, atuou como verdadeiro agente modelador dos

padrões de pensamento daquela civilização. De acordo com este autor,

existem estudos que afirmam, inclusive, que este sistema modelou a

organização das funções cerebrais relativas à leitura e, até mesmo, o

comportamento social do povo chinês.

Ainda conforme Jia² (2005), a diferença primordial entre os processos

de pensamento dos povos ocidentais e orientais é o fato de que a maneira

ocidental de pensar baseia-se numa sucessão linear de idéias que são

relacionadas entre si até que uma solução, ou conclusão, seja encontrada. Já o

modo oriental privilegia estruturas não-lineares de encadeamento de idéias,

nas quais o indivíduo relaciona conceitos por meio de analogias, comparações,

justaposições e contraposições, aceitando um resultado final, ou conclusão, no

qual ainda existe a possibilidade de interpretação de sentido. Diz:

É verdade que discursos oriundos de diferentes sistemas lingüísticos podem compartilhar estruturas similares de organização formal. Estudos recentes comprovaram que diferentes culturas podem utilizar esquemas comuns de compreensão e memória. Devemos admitir, entretanto, a existência de diferenças substanciais em relação a aspectos comportamentais. Pesquisadores contemporâneos verificaram que apesar da possível existência de similaridades entre a organização mental de discursos, o discurso ocidental favorece a lógica linear de pensamento, enquanto que o discurso oriental enfatiza a organização não-linear do pensamento. (JIA², 2005, p. 90) ‘tradução nossa’.

Page 51: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

59

Além das diferenças de pronúncia, a língua portuguesa utiliza o sistema

alfabético de escrita, ou seja, é escrita por meio de letras. A língua chinesa, ao

contrário, é registrada por meio de marcas gráficas denominadas “caracteres

chineses”, que são traços cuja combinação original derivou de desenhos.

A pesquisa de Cagliari (1997) afirma que todo sistema de escrita possui

um aspecto funcional e um aspecto gráfico, cuja união é similar ao enlace entre

significado e significante no signo lingüístico. De acordo com o autor, o

significado se refere ao sentido das palavras, enquanto o significante reporta-

se aos sons. Deste modo, os aspectos funcionais da escrita correspondem ao

âmbito do significado e as características gráficas, cuja unidade é o caractere,

aludem ao significante.

Tavassoli (1999) defende a idéia de que as diferenças existentes entre

os processos de aquisição dos sistemas de escrita alfabética e o da escrita

chinesa, afetam diretamente os processos de memorização de conceitos,

palavras, imagens e, principalmente, a associação entre informações não-

verbais e palavras. Segundo este autor, tais diferenças resultam em maior

capacidade de realizar processos de memorização, por parte de usuários do

sistema chinês, além da maior tendência, apresentada pelos mesmos, de

potencializar tais processos ao conjugá-los com informações sonoras.

Em relação a estas diferenças, Jia² (2005) afirma que a leitura dos

caracteres chineses possibilita compreensão imediata do que cada caractere

significa, visto que os mesmos são compostos por unidades gráficas que

funcionam como veículo de seu significado. Para ele, ao contrário dos signos

lingüísticos dos sistemas alfabéticos, a relação entre significante e significado

no sistema de escrita chinesa não é arbitrária, pois é baseada na relação do

caractere com a forma do objeto que representa. Desta forma, uma das

diferenças mais importantes entre os dois sistemas é o fato de que a

compreensão do significado no sistema de escrita alfabética baseia-se

somente em regras fonológicas, enquanto que, no caso da escrita chinesa, a

mesma obedece a regras de reconhecimento visual.

A figura 1 exemplifica as relações citadas. Em língua chinesa, a palavra

“estábulo” corresponde ao caractere gào, cuja grafia obedece a regras de

correspondência visual. O caractere deriva do desenho de uma vaca

Page 52: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

60

alimentando-se num sorvedouro de curral, significando “o local onde as vacas

se alimentam”, ou seja, “estábulo”.

Entretanto, esta relação entre o significado de uma palavra e seu

reconhecimento visual, que é o fundamento do sistema de escrita chinesa, não

ocorre na língua portuguesa, na qual inexiste qualquer relação entre a grafia

das palavras e quaisquer elementos de natureza visual.

Ainda em Cagliari (1997), nos sistemas ideográficos, como o da escrita

chinesa, um caractere representa uma idéia, que pode ser expressa por

apenas um caractere, ou pela combinação entre dois ou mais destes

elementos gráficos. Segundo este autor, estas combinações resultam na

formação de palavras, enquanto que nos sistemas fonográficos, como na

língua portuguesa, um caractere, isto é, uma letra, representa uma consoante

ou uma vogal. Desta forma, no sistema alfabético existe uma preponderância

do âmbito sonoro sobre o do significado e as palavras são formadas através de

combinações entre consoantes e vogais. Como propõe o autor:

As letras são os caracteres do sistema alfabético de escrita. Caractere é a denominação da menor unidade gráfica de qualquer sistema de escrita, não só do alfabeto. Nos sistemas ideográficos, como a escrita chinesa, um caractere representa uma idéia, que pode ser expressa por uma palavra inteira ou por uma palavra composta. Nos sistemas fonográficos, como o nosso, um caractere representa um segmento fonético do tipo consoante ou vogal. (CAGLIARI, 1997. p. 13).

Já a perspectiva construtivista de Dirven (2004), concebe a linguagem

como um sistema de comunicação que se utiliza de signos, e a ciência

semiótica como aquela que se dedica ao estudo sistemático dos três tipos de

signos: índices, ícones e símbolos. Para ele, signo icônico, ou simplesmente

ícone, é um elemento gráfico cuja forma é similar à imagem do objeto

representado, como é o caso do pictograma. Já o índice é o signo que auxilia

na compreensão imediata da mensagem como, por exemplo, a placa rodoviária

Page 53: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

61

que indica o caminho para determinada cidade por meio de uma seta colocada

ao lado do nome da mesma.

Para este autor, no signo simbólico, ou seja, no símbolo, a relação entre

forma e significado é puramente convencional e a compreensão do significado

ocorre pelo fato de existir um consenso social a respeito de sua significação.

Logo, as palavras, escritas ou faladas, são os exemplos mais comuns de signo

simbólico.

O signo lingüístico, na concepção de Saussure (2006), caracteriza-se

pela arbitrariedade, visto que não existe nenhuma relação natural entre um

objeto ou conceito e a seqüência de sons que lhe serve de significante. Para o

autor, esta arbitrariedade é uma característica dos signos do sistema de escrita

alfabética, pois não existe nenhuma relação entre uma letra e o som que a

representa. Segundo ele, no caso dos sistemas de escrita alfabética, “o

significante é imotivado, isto é, arbitrário em relação ao significado, com o qual

não tem nenhum laço natural na realidade.” (SAUSSURE, 2006, p.83).

Além das peculiaridades estruturais da língua chinesa, nas quais a

relação entre expressão gráfica e significado é mais imediata, o

desenvolvimento histórico e cultural da China determinou o surgimento de

tradições pedagógicas e metodologias de ensino-aprendizagem típicas daquele

país.

Segundo Demao (1989), os modelos e métodos de ensino-

aprendizagem típicos da China foram fortemente influenciados pelas doutrinas

de Confúcio (551 a.C.- 479 a.C.), o sábio chinês que fundou a primeira escola

particular naquele país e cujos ensinamentos influenciaram, além do sistema

de ensino chinês tradicional, os legados culturais e os métodos de ensino-

aprendizagem do Japão e de outros países orientais.

De acordo com Mendoza (2003), a filosofia de Confúcio exerce

influência significativa sobre mais de um quinto da população mundial há mais

de dois mil e quinhentos anos e, na China, sua figura confunde-se com o

próprio conceito de Educação. O autor ressalta que os princípios educacionais

elaborados por Confúcio influenciaram os padrões educacionais chineses

desde o século II a.C., quando sua ideologia foi adotada como doutrina oficial

do Império Chinês. A partir desta época, suas teorias orientaram toda a

Page 54: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

62

metodologia pedagógica tradicional daquele país, mormente em relação ao

processo de memorização e aprendizagem do sistema de escrita chinesa.

Como ensina Mendoza (2003):

O projeto pedagógico de Confúcio é, em muitos aspectos, uma vigorosa tentativa de salvação de uma sociedade que se desagregava a olhos vistos, em que os desenvolvimentos tecnológicos e políticos questionavam os valores sociais básicos, condenando as pessoas a uma vida sem balizas ou referenciais (...). Para resgatar tais valores, Confúcio revisou, compilou e reescreveu a literatura existente e iniciou a transmissão e o cultivo das seis artes: rituais, música, arco e flecha, condução de carruagem, aritmética e caligrafia. (MENDOZA, 2003, p.2) (grifo nosso).

Ainda em Mendoza (2003), Confúcio não concordava com nenhum tipo

de desobediência aos ritos tradicionais que regulavam tanto o protocolo dos

governantes quanto os demais aspectos da vida social da época em que vivia.

Para aquele sábio chinês, o mundo era um sistema fechado de ritos de

obediência no qual todas as relações deveriam ser reguladas pelo respeito aos

valores do passado. Desta forma, as gerações do presente deveriam respeitar

as tradições das gerações anteriores; os filhos deveriam obedecer

incondicionalmente aos pais; o cidadão deveria se sujeitar ao governante e o

estudante da língua chinesa deveria se submeter às rígidas regras de escrita

dos caracteres.

Os preceitos confucionistas consideravam o aprendizado da língua

chinesa como uma relação na qual o aprendiz deveria reverenciar os

caracteres e o sistema de escrita como um todo. Deste modo, segundo o

confucionismo, em função das dificuldades de aprendizado do sistema de

escrita chinês, os estudantes deveriam se submeter a uma metodologia de

aprendizado muito rígida, da qual a repetição exaustiva e a memorização

mecânica cumpriam papel central.

Ainda em Mendoza (2003), durante a Revolução Cultural Chinesa,

liderada pelo líder político Mao Zedong e iniciada em 1976, os métodos

Page 55: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

63

tradicionais de ensino na China foram severamente questionados,

principalmente pelo fato de que os mesmos seguiam princípios confucionistas.

A partir desta época, os métodos educacionais tradicionais começaram a

ser questionados na China e, desde então, os diferentes sistemas de governo

que assumiram o poder buscaram formas de modernizar e melhorar a

educação popular.

De acordo com Jia³ (2010), a reforma do ensino promovida pelo governo

chinês, a partir das últimas décadas do século XX, permitiu a introdução das

teorias de Piaget e Vygostky nas escolas chinesas, e tal fato resultou em

conseqüências significativas para o processo de reforma educacional daquele

país. Para o autor estas teorias, que preconizam a construção do

conhecimento pelo indivíduo, bem como a influência da interação social no

aprendizado e desenvolvimento humano, exerceram influência decisiva na

elaboração das propostas pedagógicas adotadas contemporaneamente na

China.

Apesar das pesquisas empreendidas por estudiosos chineses, sobre os

ensinamentos construtivistas e sócio-interacionistas, existem grandes

diferenças entre os modelos tradicionais de ensino dos países ocidentais e

ocidentais.

Segundo Carvalho (1988), os sistemas educacionais dos países

ocidentais originaram-se a partir dos ensinamentos dos filósofos gregos

Sócrates (469 a.C.-399 a.C.), Platão (428 a.C.-347 a.C.) e Aristóteles (384

a.C.-322 a.C.). Para este autor, o ensinamento destes filósofos, baseado em

formas de raciocínio linear e analítico, modelou o sistema de pensamento e o

ordenamento pedagógico adotado nas escolas dos países ocidentais.

Já nos países orientais, a tradição filosófica que influenciou a formação

dos sistemas educacionais baseou-se em pressupostos totalmente diferentes.

No caso da China, como visto anteriormente, o sistema de ensino tradicional foi

concebido a partir dos ensinamentos de Confúcio, cujo sistema de pensamento

difere por completo do modelo ocidental.

As pesquisas de Li (2011) afirmam que os modelos pedagógicos

adotados naquele país, resultantes da influência milenar das lições de

Page 56: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

64

Confúcio, prescrevem, além de regras de conduta moral, procedimentos para

memorização dos caracteres, bem como para o aprendizado da língua chinesa,

baseados na repetição mecânica de conteúdos. Segundo o autor:

Nos estudos sobre o processo de ensino-aprendizagem de línguas, utilizado por estudantes chineses, a memorização por repetição mecânica sempre ocupou o papel principal, devido ao legado do Confucionismo, que tem sido a principal influência por 2.500 anos. (LI, 2011, p. 21) ‘tradução nossa’.

Em concordância com Li (2011), Chang (2001), aponta a influência do

confucionismo como o principal motivo da valorização de métodos de

memorização mecânica pelo sistema de ensino chinês tradicional, bem como

por alunos e professores chineses, residentes ou não na China. Entretanto, o

autor ressalta que, apesar da ênfase na repetição mecânica de conteúdos, o

método de Confúcio aconselhava, aos estudantes chineses, aprofundamento e

reflexão sobre todo e qualquer assunto estudado. Desta forma, apesar de exigir

respeito incondicional às regras de formação de caracteres, o sábio também

ensinava que adquirir conhecimento sem submeter os conteúdos à reflexão

não resultaria em aprendizado com qualidade.

Yutang (1955) concorda com Li (2011) e Chang (2001), e salienta que,

apesar da forte presença de métodos de memorização mecânica nos meios

educacionais chineses, existem obras de Confúcio nas quais a análise crítica

dos conteúdos estudados é estimulada, e a leitura executada sem pensamento

crítico é desencorajada. A autora ressalta que para Confúcio “ler sem pensar

nos dá um espírito desordenado e pensar sem ler faz ficarmos desequilibrados”

(YUTANG, 1955, p. 275).

No entanto, de acordo com Li (2011), o sistema educacional chinês

tradicional privilegiava e estimulava o aprendizado mecânico, e a persistência

de técnicas de aprendizado mecânico no sistema educacional da China foi um

dos principais motivos pelos quais o governo orientou os órgãos responsáveis

Page 57: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

65

pela reforma do ensino a empreender pesquisas sobre teorias de

aprendizagem cuja fundamentação teórica atendesse a requisitos científicos.

Segundo o autor, a figura 2 exemplifica as técnicas de aprendizagem

que o sistema de ensino tradicional orientava os alunos a utilizar.

De acordo com Yimin (2006), o Escritório de Assuntos Estrangeiros e o

Departamento de Elaboração de Exames, que pertencem ao Escritório

Nacional para o Ensino de Língua Chinesa como Língua Estrangeira - NOCFL,

National Office for Teaching Chinese as a Foreign Language, todos regidos

pelo Ministério da Educação da República Popular da China, são os órgãos

responsáveis pelo ordenamento metodológico que deve ser adotado em todas

as escolas que ensinam a língua chinesa como língua estrangeira, tanto na

China quanto em outros países.

Estes órgãos estabelecem rígidas diretrizes metodológicas para o ensino

desta língua como língua estrangeira, a partir de parâmetros curriculares

oficiais, expressos na “Lista Oficial dos Caracteres Mais Utilizados em Língua

Chinesa Moderna” (1988), publicada pelo Ministério da Educação da República

Popular da China em conjunto com a Comissão Governamental de Linguagem,

bem como no Escopo Geral de Glossários e Caracteres (2001), publicado pelo

Comitê Nacional para o Teste Nacional de Proficiência em Língua Chinesa

Hanyu Shuiping Kaoshi (HSK).

Segundo McNaughton (2005), o governo da República Popular da China

realizou, em 1950, a reforma do sistema de escrita chinesa, publicando

naquele ano, a “Lista dos 2000 Caracteres Chineses Mais Utilizados” e, em

1996, os “Parâmetros Vocabulares e Gramaticais da Língua Chinesa & Lista de

Caracteres Apresentados em Progressão de Complexidade” (Hanyu Shuiping

Cihui Yu Hanzi Dengji Dagang, ou HSCHDD). Segundo este autor, o governo

chinês também estabeleceu as diretrizes do conteúdo programático oficial para

o teste Hanyu Shuiping Kaoshi, ou HSK, cujo objetivo é avaliar os

conhecimentos de estrangeiros, bem como de chineses nascidos fora da

China, sobre a Língua Chinesa.

Conforme determina o plano de estudo sugerido pelos Parâmetros

Vocabulares e Gramaticais da Língua Chinesa (HSCHDD) publicado em 1996,

o aprendizado dos 2.205 caracteres necessários para escrever 5.253 palavras,

Page 58: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

66

deve ser realizado durante os dois primeiros anos de estudo. Este vocabulário

inicial é dividido em três listas de palavras:

1) A primeira lista, classificada como Lista A, contém os 800 caracteres

necessários para escrever as 1.033 palavras mais utilizadas em língua chinesa.

2) A segunda lista, classificada como Lista B, contém mais 804

caracteres necessários para escrever as 2.018 palavras usadas

freqüentemente.

3) A terceira lista, classificada como Lista C, contém mais 590

caracteres, além de 11 caracteres classificados como “suplementares”,

necessários para escrever 2.202 palavras cuja freqüência de uso está abaixo

da Lista B.

Durante o terceiro e o quarto ano de estudo, o aluno estudará a Lista D,

e conhecerá novas 3.569 palavras, classificadas como “de uso comum”, bem

como os 700 caracteres necessários para escrevê-las.

McNaughton (2005) afirma que os conhecimentos avaliados pelo teste

HSK baseiam-se nas diretrizes curriculares expressas pelos Parâmetros

Vocabulares e Gramaticais da Língua Chinesa (HSCHDD). Para ele,

atualmente é possível que qualquer estudante aprenda os 2000 caracteres

mais utilizados em um período de tempo que não seria possível antes da

publicação do HSCHDD e dos imensos esforços do governo chinês,

empreendidos para reformar o ensino naquele país desde 1950.

De acordo com este autor, a metodologia de memorização, significado e

grafia dos caracteres é apresentada, de forma completa, na terceira edição do

livro “Reading & Writing Chinese – A Comprehensive Guide to the Chinese

Writing System”, guia curricular adotado pelos estudantes chineses e

estrangeiros que se preparam para prestar o HSK.

A figura 3 exemplifica a metodologia utilizada nesta obra. Os caracteres

são apresentados em ordem numérica e a figura mostra os caracteres nº3 (nァ,

“mulher”) e nº4 (rén, “pessoa”), indicando o número de traços necessários para

escrevê-los, bem como a seqüência correta do traçado, ou seja, a grafia

correta. O texto explicativo indica a pronúncia e uma interpretação do

significado.

Os caracteres são apresentados em ordem de complexidade crescente,

isto é, de acordo com o número progressivo de traços, desde caracteres que

Page 59: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

67

apresentam apenas um traço, até aquele que apresenta o número máximo de

23 traços. A ordem de traços está de acordo com as diretrizes governamentais,

expressas na Regulamentação da Ordem dos Traços dos Caracteres Chineses

Usados Mais Freqüentemente, elaborada pela Comissão de Administração de

Imprensa e Publicações da República Popular da China em 1997.

A figura 4 exemplifica a apresentação da tabelas dos caracteres

compostos por 1, 2 e 3 traços, conforme apresentado na obra citada.

Na diagramação da figura 4, o número no início de cada coluna refere-se

ao número de traços necessários para escrever os caracteres apresentados

em cada grupo. Ao lado de cada caractere podemos ler a pronúncia adequada,

escrita no sistema alfabético ocidental. Esta é a representação fonética do

dialeto chinês conhecido como “Mandarim”, e oficialmente classificada como

alfabeto pinyin.

De acordo com Kantor (1981), existem mais de cinqüenta dialetos na

China, dentre os quais os mais importantes são o Cantonês, o Hakka e o

dialeto de Xangai. Segundo este autor, apesar da existência de muitos dialetos

em todo o território daquele país, o Mandarim é considerado como a língua

oficial, baseada no dialeto dos habitantes da cidade de Pequim. Desta forma, o

dialeto Mandarim é ensinado em todos os estabelecimentos escolares da

China, sendo utilizado pelos órgãos governamentais como língua das relações

internacionais, bem como por quase toda a população das regiões onde existe

um dialeto local.

Além das letras que indicam a pronúncia do dialeto Mandarim, o alfabeto

pinyin utiliza linhas desenhadas acima de cada sílaba para informar ao leitor os

detalhes da pronúncia.

Por exemplo, a pronúncia das palavras “agora”; “assim”; “não” e “sim”,

em Mandarim, de acordo com o alfabeto pinyin é, respectivamente, “xiànzài”;

“zhèiyàng”; “bú” e “shì”. De acordo com as normas deste alfabeto, cada sílaba

tônica é acentuada de acordo com a altura da voz humana ao pronunciá-la.

McNaughton (2005) observa que cada sílaba em Mandarim equivale à

emissão de determinada altura da voz humana, ou seja, cada sílaba

corresponde a um “tom” de voz diferente.

Page 60: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

68

Cada tom é representado por uma linha desenhada acima da vogal

tônica, como foi demonstrado, e existem apenas quatro tons, representados

pelos seguintes signos gráficos: .

De acordo com Kantor (1981), o primeiro tom, representado por uma

linha horizontal ( ), equivale a uma emissão sonora uniforme, na qual a altura

da voz permanece a mesma durante toda a vocalização da sílaba.

Por exemplo: mダo, “gato”; kダi chパ, “dirigir um carro”; ダn, “paz”.

A representação gráfica das variações da altura da voz durante a

pronúncia das sílabas tônicas em Mandarim está demonstrada nas figuras 5, 6,

7 e 8. A figura 5 exemplifica a representação do primeiro tom: ( ).

A seta representa o tempo durante o qual o som é pronunciado, ou seja,

a duração da emissão da voz. O primeiro tom é representado como “5-5”,

significando que a altura da voz permanece a mesma durante toda a pronúncia

da sílaba.

A figura 6 exemplifica a representação do segundo tom: ( ). O segundo

tom é representado por uma linha ascendente ( ), equivalendo, na figura 6, ao

traçado “3-5”, ou seja, a voz parte de uma altura mediana, até alcançar a altura

máxima.

Por exemplo: nán, “difícil”; lái, “vir”; xué, “estudar”.

A figura 7 exemplifica a representação do terceiro tom: ( ).

O terceiro tom é representado por uma pequena letra “v”, desenhada

acima da sílaba tônica. A emissão vocal parte de uma altura baixa, diminuindo

ainda mais sua altura, para depois ascender novamente a uma altura mediana.

Tal variação sonora equivale, na figura 7, ao traçado “2-1-4”.

Por exemplo: shゎi, “água”; yゎ, “chuva”; hよo, “bom”.

A figura 8 exemplifica a representação do quarto tom: ( ).

O quarto tom ( ), é o tom descendente, no qual a voz inicia a emissão

sonora a partir da altura mais alta, descendo até o mais baixo e caracterizando

o traçado “5-1”. Por exemplo: kàn, “olhar”, bào, “jornal”; hào, “número”.

Após o aprendizado das estruturas básicas de representação da

pronúncia, inicia-se o aprendizado efetivo dos grupos de caracteres, segundo a

metodologia oficial do Governo. O aprendizado será então dividido de acordo

com a subdivisão nas listas A, B C e D e nos períodos de tempo como vimos

anteriormente.

Page 61: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

69

3.2- Breve Histórico da formação dos caracteres chineses

Existem poucas informações sobre a origem dos caracteres chineses,

devido à inexistência de documentos confiáveis, o que resultou na

preponderância de fábulas e lendas em detrimento de documentação

acadêmica confiável.

De acordo com Wah (1980), uma das lendas mais conhecidas atribui a

autoria do sistema a Cダng Jí ( ) um dos ministros do Imperador Huáng Dì

( ).

Segundo esta lenda, Cダng Jí criou uma série de desenhos baseados

nas formas dos rastros deixados por animais, cujos traços foram reduzidos a

poucas linhas, em épocas subseqüentes, o que resultou em caracteres

expressivos. Deste modo, a origem e o traçado de todos os caracteres

chineses estão ligados ao ato de desenhar.

Estes caracteres primitivos, devido ao fato de terem se originado de

desenhos, foram classificados como Xiáng Xíng ( ) ou “formas de

imagens”, pelo erudito da Dinastia Han, Xゎ Shèn (30 d.C.-124 d.C.).

Tais caracteres designavam, principalmente, fenômenos da natureza, animais,

pessoas, plantas e ferramentas primitivas, como por exemplo, o caractere yuè,

>>>>>> que representa a lua, e rì que representa o sol.

A figura 9 e a figura 10 apresentam a evolução histórica do traçado

original destes caracteres, bem como os desenhos que originaram os

caracteres primitivos. A figura 9 apresenta o caractere rì, ( ), “sol” e a

figura 10 apresenta o caractere yuè ( ), “lua”:

Ainda segundo Wah (1980), quanto mais antigo o caractere, maior a

semelhança de seu traçado com a forma do objeto representado, como nos

casos dos caracteres shゎi ( ) “água”; chuダn, ( ) “rio”; shダn ( )

“montanha” e yゎ ( ) “chuva”. Para este autor, o sistema de escrita

chinesa reflete os valores culturais, fortemente relacionados a processos de

visualização, através da qual a civilização chinesa compreende e se relaciona

com o mundo.

Page 62: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

70

Já para Jia¹ e Jia² (2005), o sistema de escrita reflete os valores culturais

e a realidade social das civilizações, bem como as especificidades culturais de

determinada sociedade modelam seu sistema ortográfico. Como ensinam os

autores:

Os diferentes sistemas de escrita, tanto os caracteres ou ideogramas chineses, quanto o alfabeto fonético e o sistema numérico, são criados pela cultura e refletem a mentalidade de uma civilização e sua realidade cultural. Reciprocamente, os sistemas de escrita exercem grande influência sobre os processos cognitivos daqueles que os utilizam. (JIA¹ e JIA², 2005, p. 151) ‘tradução nossa’.

De acordo com Wah (1980), o caractere rèn, ( ) “homem”, representa

força e poder, atributos típicos da posição social do homem na sociedade

chinesa. Do mesmo modo, os caracteres nァ ( ) “mulher” e mゎ ( )

“mãe”, também representam concepções culturais desta civilização sobre as

qualidades ideais da mulher, tais como humildade, subserviência ao marido e

modéstia.

Esta relação entre o desenho dos caracteres e as características dos

personagens sociais pode também ser percebida ao analisarem-se estas

figuras utilizadas como exemplos, que apresentam ilustrações presentes em

livros didáticos publicados atualmente, com o fito de ensinar a língua chinesa.

A figura 11 apresenta a evolução do caractere rèn ( ) “homem” e a

figura 12 apresenta a evolução do caractere nァ ( ) “mulher”.

A coluna da direita demonstra as modificações sofridas pelos caracteres

primitivos até o surgimento dos traçados contemporâneo, e o desenho central

mostra o conceito ou idéia que os originou, bem como as formas primitivas. O

caractere nァ ( ), “mulher” se originou do desenho de uma mulher ajoelhada

e o caractere rèn ( ), “homem” deriva do desenho de um homem com os

braços estendidos à frente, demonstrando sua força física.

Page 63: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

71

Ainda em Jia¹ e Jia² (2005), em alguns caracteres, a relação entre a

representação gráfica e a forma do objeto representado é muito próxima dos

desenhos infantis, como nos casos dos caracteres mù ( ) “olho” (figura 13);

ér ( ) “orelha (figura 14) e koゎ ( ) “boca” (figura 15). O caractere mù

( ) “olho” se originou do desenho de um olho humano, o caractere ér

( ) “orelha”, do desenho de uma orelha humana e o caractere koゎ ( )

“boca”, do desenho de uma boca humana.

Além desses exemplos, tais características também estão presentes em

caracteres primitivos que representavam animais, como por exemplo: hゎ

( ) “tigre”; yang ( ) “ovelha”; xiàng ( )

“elefante”; mよ ( ) “cavalo” e niよo ( ) “pássaro”.

As figuras 16, 17 e 18 demonstram que os caracteres mよ ( )

“cavalo” (figura 16), niよo ( ) “pássaro” (figura 17) e xiダng ( )

“elefante” (figura 18) originaram-se a partir de desenhos.

Para Wah (1980), a importância da culinária na cultura chinesa pode ser

comprovada pela grande quantidade de caracteres primitivos que

representavam plantas e frutas, como um ( ) “árvore”; ca円 ( )

“grama” e mり ( ) “arroz”.

Muitos caracteres registram a evolução tecnológica e social, tais como

os que representam ferramentas agrícolas e utensílios domésticos, como dão

( ) “faca”; chパ ( ) “charrete”; zhoゎ ( ) “vassoura”; mりng

( ) “tijela”; ce ( ) “documento, livro”; yィ ( ) “pincel” e wよng

( ) “rede”.

Ainda de acordo com Wah (1980), os caracteres primitivos, evoluíram

para o estilo Zhり Shì ( ), que significa “ir direto ao assunto”, classificados

pelos filólogos ocidentais como “símbolos indiretos”. Tais caracteres

possibilitaram a transmissão de conceitos e idéias abstratas, o que resultou em

significativa ampliação das possibilidades de comunicação.

Page 64: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

72

Para o autor a metodologia utilizada para a criação do estilo Zhり Shì

baseou-se na adição de metáforas que representavam relações entre causas e

efeitos, atividades manuais e instrumentos, atributos e entes, partes de objetos

e objetos completos, bem como gestos manuais e ações completas.

Por exemplo, a adição de linhas para representar unidades numéricas,

como y┆ ( ) “um”; èr ( ) “dois”; sダn ( ) “três” e sì ( ) “quatro (não mais

utilizado), solucionou o problema da enumeração quantitativa.

A combinação de um ponto ou uma linha, acima ou abaixo do elemento

primitivo, possibilitou a expressão de conceitos como shàng ( ) “acima”

e xià ( ) “baixo”, “para baixo” ou “abaixo de”.

Da mesma forma, a adição de um traço à parte superior do caractere

( ) “árvore” significa mò,( ) “copa”.

O mesmo elemento, adicionado à parte inferior do caractere significa

bEn, ( ) “raiz” ou “tronco”.

O traço horizontal y┆ ( ) significava “um”, e o traço vertical (l)

representava “dez”. Posteriormente, “dez” passou a ser representado por ( ).

Uma linha vertical no centro de um círculo representava zh┗ng, ( )

“centro” ou “meio”.

O desenho de um homem com as pernas cruzadas ( ) jiダo

significava “cruzar” ou “estabelecer conexão”. A imagem da mão segurando um

arco significava shè, ( ) “atirar uma flecha com um arco”. O desenho

de um homem de pé significava Li ( ) “permanecer em pé”.

As figuras 19, 20 e 21 apresentam exemplos do segundo tipo de

caracteres, pertencentes ao estilo Zhり Shì ( ). O processo de elaboração

dos caracteres jiダo, ( ) “cruzar”, ou “estabelecer conexão” (figura 19), shè,

( ) “atirar uma flecha com um arco” (figura 20) e Li ( )

“permanecer de pé” (figura 21), obedeceu aos princípios de utilização de

metáforas para relacionar conceitos, típicos deste estilo.

Page 65: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

73

Segundo Wah (1980), o desenvolvimento social tornou obsoletos alguns

caracteres primitivos, com os quais não era possível expressar grande

quantidade de idéias abstratas. Esta necessidade resultou na criação de um

modo de representação que permitisse a inclusão de referências visuais às

peculiaridades da pronúncia do caractere. Este sistema resultou na criação de

caracteres definidos como ideo-fonogramas, e foi classificado como Sistema

Xíng Shパng ( ).

Para este autor, com o surgimento do Sistema Xíng Shパng , a escrita

chinesa desenvolveu-se de forma rápida e dinâmica, pois a metodologia

utilizada para a criação de ideo-fonogramas permitiu a criação de um número

infinito de novos caracteres. Os caracteres surgidos a partir da utilização deste

sistema tornaram-se preponderantes numericamente, devido às maiores

possibilidades de comunicação oferecida pelos mesmos, em comparação com

as formas primitivas.

Ainda em Wah (1980), com o surgimento do Sistema Xíng Shパng, o ciclo

evolutivo da escrita chinesa pode ser considerado completo, visto que 95% de

todos os caracteres chineses existentes são deste tipo.

Segundo o autor, este novo método de criação de caracteres pode ser

considerado como um tipo de escrita fonética, não devendo, porém, ser

classificados como um sistema alfabético. O sistema Xíng Shパng permite a

combinação entre um elemento que sugere o sentido da palavra e um

elemento fonético, que indica a pronúncia. A figura 22 apresenta exemplos da

formação de caracteres através do Sistema Xíng Shパng.

Os exemplos apresentados na figura 22 pertencem a uma série de

palavras cuja grafia pode ser realizada sem nenhuma possibilidade de erro,

apesar das similaridades de pronúncia. O caractere (qí, jì ou j┆) equivale, em

todos estes casos, ao elemento que indica a maneira como o caractere deve

ser pronunciado. Este caractere não se relaciona ao significado das palavras

compostas que resultam de sua combinação com outros elementos gráficos,

apesar de significar, também, as palavras “dele”, “dela”, “deles” ou “delas”.

Page 66: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

74

De acordo com Wah (1980), o caractere X mù ( ) “madeira”, por

exemplo, presente em 1.585 palavras, relaciona-se com objetos, conceitos e

idéias relativas à “madeira” em todos esses casos. A figura 23 apresenta casos

da união do caractere (mù), “madeira”, com diferentes elementos fonéticos,

resultando em caracteres que possuem outros significados. Este procedimento

caracteriza a forma de composição típica do Sistema Xíng Shパng.

Entretanto, ainda segundo este autor, outros 1.550 exemplos nos quais

o caractere (mù) determina o significado da palavra podem ser incluídos no

quadro acima. Para ele, isto demonstra que, além de expressar do significado

de palavras compostas, mù ( ) também pode determinar a pronúncia, como

no caso de mù ( ) “lavar”, “enriquecer por meio da gentileza”, “receber

favores”.

Wah (1980) ressalta que qualquer componente gráfico pode ser

utilizado como elemento fonético, bem como muitas figuras e símbolos podem

ser usados como determinantes de significado. Tal circunstância, aliada ao

número limitado de determinantes, impulsionou a criação de um sistema de

radicais, ou seja, elementos gráficos que permitiram a classificação dos

caracteres em dicionários.

Segundo Leyi (1993), o primeiro grande dicionário de caracteres, Sh┣o

Wén Jりe Zì ( ), elaborado pelo erudito X堰 Shèn, e finalizado em 121

d. C., apresentava 440 radicais, ou bù sh円u ( ). Este número permaneceu

inalterado até o lançamento do Kダng X┆ Zì Diよn ( ) Dicionário

Imperial da Dinastia Ching (1644 d.C.-1911 d. C.), que reduziu o número de

caracteres para 214, quantidade que se mantém até os dias de hoje.

Durante os séculos seguintes, a língua chinesa continuou a sofrer

mutações, o que resultou em grande quantidade de novas combinações

sonoras. As formas primitivas, inicialmente adequadas, tornaram-se

quantitativamente insuficientes para expressar significados cada vez mais

complexos e variados.

Page 67: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

75

Ainda em Wah (1980), um exemplo típico desta variedade de

significados é o elemento fonético g┗ng ( ) que, originalmente, significava

“trabalho” nos seguintes caracteres: g┗ng ( ) “mérito”, cujo determinante é Lì,

( ) “força”; hòng, ( ) “disputa”, cujo determinante é yán ( ) “falar”; hóng

( ) ”vermelho”, cujo determinante é mì ( ) “seda”; gダng ( ) “levar”, ( ) cujo

determinante é shれu ( ) “mão”; jiダng ( ) “rio”, cujo determinante é shuり ( )

“água”; gòng ( ) “tributo”, cujo determinante é bèi ( ) “concha” ou “dinheiro”.

Conforme Wah (1980), no passado, todas estas palavras eram

pronunciadas da mesma maneira, apesar de que, atualmente, a pronúncia das

mesmas tenha se modificado. Como expõe o autor:

Um exemplo típico de homofonia é o elemento fonético g┗ng

(originalmente, o desenho do esquadro de um carpinteiro), em um grande número de combinações, tais como: g┗ng (mérito), cujo determinante é (li), que significa “força”;

hòng (disputa), cujo determinante é (yán), que significa “falar”; hóng (vermelho), cujo determinante é (mi), “seda”;

(gダng) “levar”, cujo determinante é (sh円u), “mão”; jiダng (rio), cujo determinante é (shu榎), “água” e (gòng) “tributo” e cujo determinante é (beì), “molusco” e “dinheiro”. Estas palavras dificilmente podem ser consideradas como homófonas na língua chinesa contemporânea. Apesar disso, originalmente, todas eram pronunciadas da mesma maneira. (WAH, 1980, p.58). ‘tradução nossa’.

Os sistemas de escrita chinesa explicitados acima englobam as três

categorias tradicionais de caracteres: pictogramas, ideogramas e ideo-

fonogramas. Esta classificação é denominada pelos teóricos chineses

contemporâneos como sダn-sh┣, ( ), e reconhece apenas a existência de três

categorias de caracteres. Entretanto, os estudiosos chineses da atualidade

aceitam outra forma de distinção entre grupos de caracteres, denominada de

classificação liú-sh┣, ( ). Esta classificação determina um total de seis

Page 68: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

76

categorias de caracteres e foi elaborada pelos eruditos Liú X┆n e X堰 Shèn

durante a Dinastia Han (25 d.C.-220 d.C.).

Segundo estes eruditos, além das categorias determinadas pelo sistema

sダn-sh┣, ( ), existem três outros tipos de caracteres: os caracteres huì yi

( ) “encontro de idéias” ou “associações”, os caracteres zhuよn zhù ( )

“significado transferível” ou “símbolos interpretados” e os caracteres jiよ jiè

( ) “empréstimo” ou “caracteres cuja pronúncia foi adquirida por

empréstimo”. A figura 24 apresenta as seis categorias básicas de caracteres

chineses, de acordo com as duas classificações oficiais, o Sistema Sダn-Sh┣ e

o Sistema Liú Sh┣:

Para Wah (1980), a classificação liú-sh┣ enfatizava o uso cotidiano, em

detrimento da estrutura ou natureza dos caracteres. Desta forma, no caso dos

caracteres huì yì ( ), por exemplo, a combinação entre dois ou mais

pictogramas ou ideogramas produz um novo caractere para representar um

novo conceito. Por exemplo: míng ( ) “brilho” consiste na combinação entre

os pictogramas ri ( ) “sol” e yuè ( ) “lua” ( + = ); xiダn ( ) “fresco” consiste

na combinação entre os pictogramas yú ( ) “peixe” e yang ( ) “ovelha”

; hよo ( ) “bom” consiste na combinação entre os

pictogramas nァ ( ) “mulher” e zり ( ) “criança” ; jiダn ( ) “ponta

afiada”, consiste na combinação entre os signos xiよo ( ) que significa

“pequeno”, e dà ( ), que significa “grande” ( , colocado acima de = ).

Já para algumas combinações entre caracteres do tipo huì yì: sダng ( )

“amoreira”, é a imagem de várias mãos ( ) colhendo folhas de uma árvore

( ); nán ( ) “homem” é a imagem de um homem empregando sua força física

no campo ; ダn ( ) “paz” é a imagem de uma mulher sob um

telhado .

Segundo o autor, tais associações diferem dos ideo-fonogramas pelo

fato de que a pronúncia resultante não possui nenhuma relação com o som de

nenhum dos caracteres associados. Por exemplo, no caso da palavra “brilho”

Page 69: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

77

( ), a pronúncia míng resultou da associação entre rì (sol) e yuè (lua),

caracterizando o caractere do tipo huì yì (encontro de idéias).

No caso da palavra “jogo de xadrez chinês” ( ), por exemplo, a

pronúncia qì resultou da combinação entre um elemento que indica o

significado, mù ( ), que representa “madeira”, e o elemento fonético qì ( ).

Esta combinação resulta no tipo xíng shパng, um caractere no qual um elemento

( ) indica a pronúncia do mesmo, e o outro ( ), o significado. Tais caracteres

são classificados como ideo-fonogramas.

Segundo a classificação Liú Sh┣, existem ainda dois outros tipos

caracteres: os caracteres zhよn zhù, ou “símbolos de mútua interpretação”, e os

caracteres jiよ jiè, ou “caracteres formados por empréstimo”.

Os caracteres do tipo zhよn zhù pertencem à categoria dos ideo-

fonogramas, e são sinônimos constituídos pela combinação entre um indicador

de significado e um elemento que indica a pronúncia.

Já os do tipo jiよ jiè constituem um modelo de caracteres fonéticos,

formados através da utilização de um caractere que pertença a uma palavra de

mesma pronúncia. Por exemplo, no passado não existia nenhum caractere

que representasse o verbo “vir” ( ), cuja pronúncia era lái. No entanto, esta era,

também, a pronúncia do pictograma ( ) utilizado para representar um cereal. A

solução encontrada pelos escribas chineses para representar o verbo “vir” foi

utilizar o mesmo caractere .

Da mesma forma, o pictograma wàn ( ) “escorpião” foi tomado por

empréstimo para representar a palavra wàn, que significa “dez mil”, e o

pictograma ( ) qí “peneira” foi tomado por empréstimo para representar a

palavra qí, cujo significado é “dele”, “dela”, “disto”, “deles”, “isto” e “aquilo”.

A palavra x┆, que significa “oeste”, representada pelo pictograma ( )

significava, originalmente, um pássaro no ninho. De acordo com Wah (1980) o

motivo apresentado por Xゎ Shèn (25 d.C.-220 d.C.) para tal empréstimo

baseou-se no fato de que os pássaros permanecem em seus ninhos enquanto

o sol se põe no oeste.

Page 70: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

78

Para Wah (1980), apesar do sistema de escrita chinesa ter completado

seu desenvolvimento estrutural muito antes do início da civilização ocidental, tal

fato não significou que tal sistema tenha interrompido sua evolução. Para este

autor, alguns caracteres tornaram-se obsoletos, novos caracteres, porém,

jamais deixaram de ser criados, acompanhando o progresso e as novas

necessidades de comunicação.

De acordo com Leyi (1993), a formação da escrita chinesa possui uma

história de mais de seis mil anos, e sua evolução pode ser dividida nos

seguintes períodos:

1- Período Primitivo ou Lendário: corresponde ao estágio inicial da

escrita chinesa, no qual os pictogramas originaram-se a partir de desenhos de

objetos. Apesar de não existir nenhuma evidência arqueológica oriunda deste

período, os estudiosos estimam que o mesmo tenha se estendido por mais de

dez mil anos.

2- Período Arcaico ou Pré-Histórico: durante este período ocorreu um

grande desenvolvimento de ideogramas que representavam símbolos.

Evidências arqueológicas permitem situar este período num escopo temporal

situado entre cinco ou seis mil anos atrás.

3- Período Neo-Arcaico: é o período do surgimento dos ideo-

fonogramas, que se estendeu por mais de mil e seiscentos anos, desde a fase

final da Dinastia Y┆n (1384 a.C.-1112 a.C.) até a Dinastia Han (206 a.C.-220

a.C.). A maioria dos registros arcaicos conservados até hoje pertencem a este

período. Durante este período, a escrita chinesa completou tanto seu

desenvolvimento estrutural quanto sua evolução formal.

4- Período Contemporâneo: durante este período a escrita chinesa

alcançou um grau elevado de estabilidade, no qual as modificações formais e

estruturais atingiram a perfeição. Ao contrário dos pictogramas e ideogramas,

os ideo-fonogramas continuam a evoluir em direção a maior aperfeiçoamento.

Leyi (1993) ressalta que em termos formais, no entanto, desde o

aparecimento do sistema kaり sh┣ , ou “escrita-padrão”, durante as Dinastias

Weì e Jìn (221 d.C- 580 d.C.), ocorreram poucas mudanças formais. Segundo

ele, este sistema é utilizado como modelo do sistema de escrita impressa

Page 71: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

79

utilizada pelos meios de comunicação contemporâneos. No início da década de

1950, o governo da República Popular da China adotou um modelo simplificado

para dois mil caracteres, com o fito de obter maior conveniência e simplicidade.

Conforme Leyi (1993), os caracteres são classificados de acordo com o

tipo de transmissão de significados que seus traçados permitem realizar. Esta

premissa resultou em dois sistemas de classificação: o Sistema Sダn Sh┣, e o

Sistema Liú Sh┣.

De acordo com a classificação Sダn-Sh┣, existem somente três tipos de

caracteres: pictogramas, ideogramas e ideo-fonogramas. Entretanto, segundo

a classificação Liú Sh┣ , além destes, existem outros três tipos de caracteres:

os caracteres que resultam de associações, os símbolos interpretados e os

caracteres de pronúncia por empréstimo.

A unidade básica da escrita chinesa é, pois, o caractere, elemento

gráfico cuja forma primitiva reproduzia, de maneira rústica, o formato de objetos

físicos.

Desta forma, os caracteres originaram-se a partir de desenhos e, devido

ao progresso social, evoluíram para formas gráficas mais sofisticadas, nas

quais ainda está presente, apesar da adição de elementos gráficos que indicam

relações fonéticas e conceituais.

Page 72: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

80

CAPÍTULO IV

O ENSINO DA LÍNGUA CHINESA

ATRAVÉS DO DESENHO

4.1- Propostas de ensino da língua chinesa apresentadas

por educadores brasileiros e chineses

O Construtivismo é uma nova filosofia de aprendizagem. Somente através das regras da cognição construída internamente é que o sujeito pode organizar suas experiências e desenvolver conhecimentos. (JIA³, 2010, p. 197). ‘tradução nossa’.

Sabemos que Brasil e China possuem realidades sócio-culturais e

políticas bastante diferentes, bem como a história e valores éticos. A

aproximação entre chineses e brasileiros torna-se difícil pela barreira quase

intransponível representada pela comunicação verbal, visto que a língua

portuguesa e a língua chinesa nada possuem em comum.

Apesar disso, muitas iniciativas educacionais voltadas para o ensino de

língua chinesa surgiram no Brasil, principalmente a partir das últimas décadas

do século XX, em função do aumento do volume de negócios realizados entre

a China e o Brasil, e da ascensão da China como potência econômica mundial.

Ao analisarem-se os conteúdos programáticos dos cursos de língua

chinesa surgidos no Brasil a partir deste período, notam-se abordagens

pedagógicas voltadas tanto para o ensino da língua quanto para a transmissão

de conhecimentos relativos à cultura daquele país.

Tal posicionamento pedagógico está de acordo com diretrizes

curriculares incentivadas por órgãos do governo brasileiro em relação ao

ensino de língua estrangeira, no sentido de proporcionar acesso à maior

quantidade possível de conhecimentos sobre diferentes culturas, preparando

alunos brasileiros para viver no mundo globalizado.

Page 73: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

81

Em 1995, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) iniciou a

elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), guia curricular cujas

orientações são as mais utilizadas pelas instituições de ensino brasileiras.

Conforme as diretrizes dos PCN para o ensino de Língua Estrangeira

(1988), o ensino de segunda língua visa capacitar o aluno a identificar idiomas

estrangeiros, e perceber que vive num mundo plurilíngüe, no qual alguns

idiomas desempenham papel hegemônico, podendo expressar-se e ampliar a

compreensão do próprio papel como cidadão de seu país e do mundo. Além

disso, o aluno deve reconhecer que a aquisição de uma ou mais línguas

permite acessar bens culturais da humanidade, bem como aprender a valorizar

a leitura como fonte de informação e prazer, utilizando diversas formas de

comunicação, de modo que possa atuar em situações diversas.

Assim, ao contrário de outras disciplinas do currículo escolar, o

processo de ensino-aprendizagem de um idioma estrangeiro pressupõe a

conjugação do conteúdo com a prática e a aplicação imediata do mesmo.

Conforme os PCN de Língua Estrangeira (1998):

Diferentemente do que ocorre em outras disciplinas do currículo, na aprendizagem de línguas o que se tem a aprender é também, imediatamente. O uso do conhecimento, ou seja, o que se aprende e o seu uso devem vir juntos no processo de ensinar e aprender línguas. Assim, caracterizar o objeto de ensino significa caracterizar os conhecimentos e usos que as pessoas fazem deles ao agirem na sociedade. Portanto, ao ensinar uma língua estrangeira, é essencial uma compreensão teórica do que é linguagem, tanto no ponto de vista dos conhecimentos necessários para usá-la quanto em relação ao uso que fazem desses conhecimentos para construir significados no mundo social. (BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira, 1998, p.27).

Em relação ao ensino de língua chinesa no Brasil, a maioria das

propostas pedagógicas dos cursos oferecidos atualmente no mercado

brasileiro apresenta vasto material didático, em que estão presentes, além de

ensinamentos lingüísticos, conteúdos sobre a cultura e a história da China.

Estes cursos possuem corpo docente e conteúdo programático, bem como

Page 74: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

82

propostas metodológicas, aprovados e fiscalizados por órgãos governamentais

chineses. Em linhas gerais, os conteúdos de tais cursos são voltados para a

consolidação de noções gramaticais básicas, e conhecimentos sobre a cultura

chinesa, mormente os relativos a relações pessoais e empresariais.

O Instituo Confúcio-UNESP oferece um curso de língua chinesa cuja

supervisão pedagógica é realizada pela Universidade de Hubei, localizada na

China. De acordo com o diretor Luís Antônio Paulino, todos os docentes que

ministram aulas nesta instituição são selecionados e aprovados pela matriz do

Instituto Confúcio na China, em consonância com as normas do Escritório

Internacional para Ensino de Língua Chinesa Como Língua Estrangeira do

Ministério da Educação da China. Segundo o sítio eletrônico do Instituto, a

metodologia enfatiza conversação e escrita em ideogramas, bem como o

desenvolvimento da leitura por meio da disponibilização de variado acervo de

livros e revistas, proporcionando oportunidades para a prática da conversação

através de um laboratório de multimídia voltado exclusivamente para

comunicação verbal.

Este Instituto também oferece cursos voltados para empresários,

ministrando, além de conhecimentos lingüísticos, aulas sobre o ambiente

cultural, legal, político, empresarial e tributário para a realização de negócios na

China.

A Escola Mandarim, localizada em São Paulo, também oferece cursos

para alunos iniciantes, intermediários e avançados. De acordo com o sítio

eletrônico desta instituição, a metodologia adotada visa desenvolver as quatro

habilidades comunicativas: conversação, leitura, escrita e compreensão

auditiva. A proposta pedagógica desta escola foi elaborada de forma a atender

as necessidades de alunos iniciantes e de executivos interessados na

realização de negócios com empresas chinesas.

Segundo Marcell Mazzo, diretor da Escola Mandarim, desde setembro

de 2010, a instituição está oferecendo às escolas e colégios de São Paulo o

projeto Mandarim na Escola, iniciativa que promove o ensino deste idioma

como opção de aprendizado para alunos a partir de três anos de idade. A

metodologia deste projeto foi elaborada com o objetivo de integrar

conhecimentos oriundos da pesquisa acadêmica ao cotidiano escolar,

Page 75: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

83

integrando linguagens múltiplas e promovendo a realização de trabalhos

escolares em diferentes mídias. O conteúdo programático, organizado por um

coordenador pedagógico especializado em educação infantil, é dividido em

unidades didáticas que envolvem obrigatoriamente algum tipo de produção

artística.

Já a Escola Laifu, localizada em Campos dos Goytacazes, no estado

do Rio de Janeiro, oferece um curso de Mandarim cujo conteúdo programático

divide-se em quatro módulos básicos. Segundo o professor Wu Chun De, a

proposta pedagógica adotada objetiva garantir conhecimentos sólidos sobre as

estruturas gramaticais do idioma, enfatizando exercícios de conversação e

evoluindo, progressivamente, para o domínio do idioma conjugado com

conhecimentos sobre as formas de relacionamento pessoal e empresarial

adotadas pela cultura chinesa. O curso oferece material didático impresso, sob

a forma de cadernos de exercícios que acompanham a progressão das aulas,

cuja ênfase em conversação é compensada por meio de práticas de redação e

leitura de textos e letras de canções populares chinesas.

Além destas duas iniciativas educacionais, o curso oferecido pelo

Centro Cultural China-Brasil (CCCB), no Rio de Janeiro foi eleito pelo governo

da República Popular da China uma das 55 melhores escolas de língua

chinesa do mundo, em 18 de Setembro de 2009. Segundo a diretora da

instituição, Yuan Aiping, a proposta pedagógica adotada organiza o

aprendizado em módulos nos quais as competências comunicativas do aluno

são exercitadas de forma progressiva. As lições correspondentes aos níveis

básico, intermediário e avançado, englobam cerca de 500 palavras para cada

nível, distribuídas em exercícios de conversação básica, sob a forma de

diálogos em que são abordados temas do cotidiano, exercícios de revisão

voltados para consolidação do vocabulário aprendido e notas referentes a

regras gramaticais, escritas em língua portuguesa.

Ainda segundo a diretora da instituição, em todos os níveis, enfatizam-

se as regras da caligrafia chinesa e as regras de traçado dos caracteres. Diz:

Page 76: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

84

Aparentemente, nota-se uma grande dificuldade do iniciante em escrever o ideograma chinês, no entanto, com o uso constante dos exercícios de caligrafia, serão sanadas todas as dúvidas da escrita e assim, se tornará o estudante auto-suficiente em muito pouco tempo, tanto na ordem dos traços quanto no sentido dos mesmos. (AIPING, 2009, p.6)

O nível básico apresenta um vocabulário composto por cerca de 500

palavras distribuídas em diálogos nos quais são apresentados temas de

conversação cotidiana, bem como exercícios nos quais o aluno deve completar

frases com as expressões aprendidas. O nível intermediário apresenta

expressões novas que devem ser acopladas ao vocabulário utilizado no nível

anterior, introduzindo expressões coloquiais de forma gradativa, bem como

noções de cultura e costumes populares chineses, para que o aluno seja capaz

de utilizar a língua de modo socialmente apropriado. O nível avançado é

voltado para alunos com necessidades diferentes das demandas dos iniciantes,

englobando a utilização da informática, módulos de imersão, filmes e atividades

ligadas à culinária chinesa, abordando aspectos sócio-culturais, com ênfase em

atividades diplomáticas e empresariais realizadas entre brasileiros e chineses.

Segundo a fundadora:

Nosso objetivo também será ultrapassar as barreiras do preconceito e mau-entendimento que têm sido freqüentes quando essas culturas estão em contato, devido à grande distância que as separa, na historia e na geografia física. (AIPING, 2009).

No que se refere à organização do sistema educacional brasileiro, o

estabelecimento das diretrizes do ensino escolar é de competência da União,

ou seja, do Governo Federal. Esta prescrição esta explicitada no art. 9, capítulo

IV, da Lei de Diretrizes e Bases nº 9394/96 (LDB). Conforme expressa o

referido texto legal, cabe à União:

Page 77: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

85

“IV- estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e os conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum. (BRASIL, Lei 9394/96, art.9, de 20 de dezembro de 2006). (grifo nosso).

Deste modo, os currículos escolares devem estar de acordo com esta

lei, cujos artigos explicitam que diretrizes gerais devem ser adotadas pelas

escolas de todo o território brasileiro. Conforme o art. 26 do referido texto

legal:

Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. (BRASIL, Lei 9394/96, art. 26, de 20 de Dezembro de 2006) (grifo nosso).

O governo brasileiro atribuiu ao Conselho Nacional de Educação (CNE)

a competência para definir a base comum e as diretrizes curriculares do ensino

fundamental e médio. Em 1998, o CNE definiu estas diretrizes através da

resolução 02, emitida em 07/04/98, e da resolução 03, emitida em 26/06/98.

Apesar das orientações prescritas pelo CNE, a maioria das redes de

ensino escolar brasileiras orienta-se pelos Parâmetros Curriculares Nacionais

(PCN), documento elaborado em 1995 pelo Ministério da Cultura.

Como exemplo, no ensino da Língua Portuguesa, os Parâmetros

Curriculares Nacionais seguem as diretrizes estabelecidas pela LDB, e

aconselham a elaboração de propostas pedagógicas que possibilitem a

construção de conhecimentos pelos alunos, bem como orientá-los a

estabelecer uma postura de análise crítica sobre o material produzido:

Considerar o conhecimento prévio do aluno é um princípio didático para todo professor que pretende ensinar procedimento de revisão quando o objetivo é – muito mais do

Page 78: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

86

que a qualidade da produção – a atitude crítica diante do próprio texto. (BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais, Disciplina Língua Portuguesa, 1998, p. 37).

Assim, é possível notar que as orientações contidas nos PCN definem

um critério de organização de conteúdos de Língua Portuguesa que não se

baseia somente na transmissão de regras gramaticais, mas, principalmente, na

concepção de que à utilização da língua deve conjugar-se a reflexão crítica.

Conforme orientam os PCN de Língua Portuguesa (1998):

O critério de organização dos conteúdos de Língua Portuguesa em termos de USO-REFLEXÃO-USO, de certa forma, define também o eixo didático, a linha geral de tratamento dos conteúdos. Caracteriza um movimento metodológico de AÇÃO-REFLEXÃO-AÇÃO, em que se pretende que, progressivamente, a reflexão se incorpore às atividades lingüísticas do aluno de tal forma que ele tenha capacidade de monitorá-las com eficácia. (BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais, Disciplina Língua Portuguesa, 1998, p. 38).

Além disso, as diretrizes pedagógicas do referido documento não

consideram o processo de conhecimento como uma atividade na qual o aluno

participa como mero receptor passivo, mas como agente ativo:

Quando se pretende que o aluno construa conhecimento, a questão não é apenas qual a informação que deve ser oferecida, mas, principalmente, que tipo de tratamento deve ser dado à informação que se oferece. (BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais, Disciplina Língua Portugesa, 1998, p. 38).

A partir da afirmação acima podemos perceber que as orientações dos

Parâmetros Curriculares Nacionais valorizam a participação crítica dos alunos,

e que não consideram o resultado final da aprendizagem como um produto que

Page 79: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

87

deva ser aceito incondicionalmente, mas como um processo de elaboração

ativa, passível de análise e avaliação pelo próprio aluno.

Como visto anteriormente, o governo chinês, com o fito de modernizar o

país e aumentar o nível cultural de sua população, empreendeu, a partir da

década de 1950, uma reforma em todo seu sistema educacional.

Pesquisadores e professores universitários chineses foram incumbidos de

pesquisar as teorias de aprendizagem mais valorizadas e utilizadas pelas

instituições de ensino dos países ocidentais.

Os resultados apontaram para as teorias de Piaget e Vygotsky, que

passaram a ser incorporadas aos parâmetros e objetivos educacionais do

governo daquele país. Além da aceitação dos pressupostos teóricos

construtivistas e sócio-interacionistas pelo meio acadêmico chinês, ocorreu um

movimento de estímulo a adoção destes princípios pelo sistema escolar

daquele país.

Em concordância com a teoria construtivista, Jia³ (2010) observa que o

modelo educacional tradicional, no qual o professor apresenta conteúdos de

maneira autoritária e a aprendizagem é concebida como um condicionamento

faz com que o aluno se recuse a pensar. Sem a participação ativa do aluno, o

processo de construção de significados torna-se totalmente sem sentido e

inútil, carente de pensamento criativo. O autor ressalta também que os

professores chineses devam adotar uma postura humanista em relação a seus

alunos, favorecendo, desta forma, a criação de um ambiente propício ao

crescimento intelectual e pessoal. Diz:

A ação de ensinar deve abandonar a condução autoritária e adotar associação e comunicação. No ensino tradicional, os professores ocupam uma posição soberana e autoritária, não respeitando os alunos, nem mesmo se importando com eles, o que resulta em grande distanciamento entre eles, e até estimula conflitos. Dizem os Antigos: “Aqueles que possuem conhecimento são professores; os que possuem moral são exemplos”. Os professores chineses devem respeitar dar oportunidades e confiar em seus alunos, construindo relações harmoniosas e gentis com eles, o que possibilita a criação de um ambiente agradável para o aprendizado. (JIA³, 2010, p. 199). ‘tradução nossa’.

Page 80: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

88

Ainda em Jia³ (2010), os princípios construtivistas consideram a

interação entre novos conteúdos, conhecimentos anteriores dos alunos, hábitos

adquiridos, bem como as experiências pessoais no processo de ensino-

aprendizagem, como elementos essenciais para que as condições necessárias

aos atos de ensinar e aprender estejam presentes de maneira plena:

Os conhecimentos prévios dos alunos, as experiências, modos de pensar, hábitos de aprendizado e métodos de ensino representam o ponto de partida indispensável para o ensino e a aprendizagem eficazes. (JIA³, 2010, p. 199). ‘tradução nossa’.

Apesar das diferenças culturais e lingüísticas entre a China e o Brasil,

podemos perceber que, atualmente, orientações pedagógicas valorizadas por

pesquisadores chineses e preconizadas pelos órgãos responsáveis pela

educação em nosso país, compartilham diretrizes similares.

Em relação às abordagens conceituais que delinearam a elaboração

destas diretrizes, podemos inferir, também, que as mesmas foram elaboradas a

partir dos postulados presentes em teorias de aprendizagem construtivistas e

sócio-interacionistas.

Page 81: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

89

4.2. O ensino da língua chinesa através do desenho

Algumas culturas dependem muito mais da percepção visual do que outras. É necessário distinguir entre o modo de compreensão da realidade das culturas ocidentais, que utilizam sistemas alfabéticos e é baseado na sucessão linear de pensamentos, e o pensamento não-linear e fortemente visual das civilizações orientais, que utilizam sistemas icônicos e ideográficos de escrita. (St. CLAIR; JIA¹, 2006, p. 157) ‘tradução nossa’.

Os estudos de Piaget (1972) e Vygotsky (1987) trouxeram muitas

contribuições para a compreensão dos processos infantis de pensamento e

aprendizagem, bem como para a investigação das relações entre desenho,

atividades lúdicas e a aprendizagem da leitura e da escrita.

De acordo com Maciel (2009), durante as etapas iniciais do aprendizado

da escrita, os esforços das crianças são orientados no sentido de compreender

o que os sinais gráficos significam, e quais são os princípios que os organizam.

Deste modo, a necessidade de entender a relação entre estes sinais e seus

respectivos sons, ou seja, entre dois níveis diferentes de linguagem, estimula

sua capacidade de lidar com símbolos. Diz a autora:

Quando as crianças iniciam o processo de alfabetização, buscam compreender o que a escrita representa, ou seja, o que aqueles sinais gráficos representam e como se organizam e como eles se organizam formando um sistema de representação. Dessa forma, elas começam a lidar com a diferenciação dos dois planos da linguagem: o plano do conteúdo (dos significados), que diz respeito aos significados e sentidos produzidos quando usamos a língua oral ou escrita, e o plano da expressão (dos sons) que diz respeito às formas lingüísticas. (MACIEL, 2009, p. 49).

Desta forma, durante as fases iniciais da aprendizagem de leitura e

escrita, as crianças empreendem esforços para tentar entender os princípios

Page 82: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

90

que organizam estes sistemas. Este intento de compreensão estimula seu

desenvolvimento intelectual e aumenta sua habilidade de lidar com os

significados das formas gráficas, ou seja, sua competência simbólica.

Para Maciel (2009), durante estas fases, a primeira dificuldade consiste

em diferenciar desenho e escrita. Conforme ensina a autora, neste momento,

como ainda não conseguem compreender esta diferença, as crianças

solucionam precariamente o problema por meio da imitação do ato de escrever.

Diz:

Durante os primeiros contatos da criança com marcas gráficas impressas em livros, cadernos e cartazes, inicia-se um longo processo de construção de esquemas conceituais, cujo primeiro desafio consiste em distinguir o que é desenho do que é escrita. Neste primeiro momento, ainda sem fazer esta distinção, a criança se propõe a imitar o ato de escrever. Como num jogo, ela crê que poderia ou deveria escrever certo conjunto de palavras imitando a ação de escrever. (MACIEL, 2009, p. 47).

Na busca pela compreensão dos processos infantis de aprendizagem,

bem como das relações entre desenho, atividades lúdicas e construção de

conhecimentos de leitura e escrita, os estudos de Ferreiro e Teberosky (1991)

e Ferreiro (2003) também foram orientados pelas teorias de Piaget (1972).

De acordo com Ferreiro (2003), no passado, a maioria dos educadores

costumava enfatizar os aspectos figurativos da escrita, ou seja, valorizavam a

qualidade do traçado e a distribuição espacial das formas, em detrimento dos

aspectos construtivos do processo de aprendizagem. Para ela, o fator que

determina se efetivamente houve produção da escrita é a presença dos

aspectos construtivos, pois somente estes demonstram as tentativas realizadas

pela criança para compreender este sistema de símbolos.

Segundo a autora, a investigação acadêmica tradicional sobre a

aprendizagem da escrita estava voltada para a análise da produção mecânica

do ato de escrever, e privilegiava o exame de características como as formas e

proporções da caligrafia, bem como o tamanho e o traçado das letras. Tais

elementos, porém, não se relacionam com a intenção de representar

Page 83: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

91

significados e não permitem a investigação da competência da criança para

lidar com símbolos, ou seja, não indicam se o ato de escrever resultou de sua

atividade mental.

Segundo Ferreiro e Teberosky (1991), o processo de construção de

conhecimentos relativos ao aprendizado da escrita deve ser considerado como

um processo de aprendizagem de conceitos. Para as autoras, estudos sobre

este tema devem investigar processos construtivos e, não somente, aspectos

mecânicos e aprendizagem técnica:

Se a escrita é concebida como um código de transcrição, seu aprendizado deve ser concebido como a aquisição de uma técnica; se a escrita é concebida como um sistema de representação, seu aprendizado se converte na apropriação de um novo objeto de conhecimento. (FERREIRO; TEBEROSKY,1991, p.52).

Uma das diretrizes que orientaram as pesquisas de Ferreiro e Teberosky

(1991) e de Ferreiro (2003) referia-se, pois, à premissa de que a aquisição de

conhecimentos é um processo ativo de construção, e não somente o

aprendizado de uma técnica.

Esta orientação está em concordância com os pressupostos de Piaget,

que definem o sujeito como um ente predisposto ao conhecimento e à

superação das dificuldades em compreender a realidade com a qual se

defronta ao entrar em contato com o mundo.

Como estudado no primeiro capítulo, as teorias construtivistas

compreendem a relação do aluno com a aprendizagem como uma atividade

que independe de técnicas mecânicas ou do método pedagógico adotado.

De acordo com Ferreiro (2003), o desenvolvimento das competências

infantis necessárias ao domínio do sistema de escrita alfabético ocorre em dois

planos distintos, porém conjugados. O primeiro plano refere-se à compreensão

da natureza alfabética do sistema de escrita e o segundo plano relaciona-se à

Page 84: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

92

aquisição da consciência fonológica, promovendo, de forma associada, o

desenvolvimento da competência simbólica das crianças.

A aquisição do sistema de escrita depende, pois, do domínio e

compreensão da relação existente entre a fala e a escrita, fato que colabora

para o desenvolvimento da habilidade de utilizar símbolos e de compreender

seus significados.

Segundo Maciel (2009), no que se refere a aspectos construtivos, a

aprendizagem da escrita segue uma linha regular de evolução que independe

de fatores culturais e sociais específicos, possuindo características comuns em

crianças situadas em diferentes contextos culturais.

Em relação à presença de seqüências de evolução cronológica em

vários estudos sobre desenvolvimento infantil, Ferreiro et al. (1999 apud

MACIEL, 2009, p. 48) esclarecem que a simples constatação de que existem

níveis progressivos de evolução não interessa à investigação construtivista.

Para os autores, o que realmente importa é descobrir como se realiza a

conexão entre um estágio de conhecimento e o subseqüente. Logo:

Um estudo psicogenético interessa em conhecer não uma seqüência cronológica ou evolutiva. Para um investigador em psicologia genética, a pergunta central e persistente é: como se passa de tal estado de conhecimento a tal estado de conhecimento? (...) O investigador em psicologia genética trata de identificar uma seqüência evolutiva, mas não fica aí, tenta incessantemente reconstituir os laços de filiação entre os níveis que identifica. (FERREIRO et al., 1999, apud MACIEL, 2009, p. 48).

A partir das considerações acima, os estudos destes autores

concentraram-se em investigar os processos intelectuais pelos quais a criança

evolui de um estágio no qual possui poucos conhecimentos sobre determinado

assunto, para um estágio seguinte, no qual adquiriu mais conhecimentos.

Page 85: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

93

De acordo com Ferreiro (1990), a evolução da escrita infantil

compreende três períodos distintos entre si, dentro dos quais cabem múltiplas

divisões.

O primeiro período caracteriza-se pelos esforços que a criança realiza

para diferenciar desenho de escrita, e também para compreender que a função

desta última é substituir alguma coisa por outra, e não reproduzir algo.

No segundo período, após ter compreendido a diferença entre escrita e

desenho, a criança começa a investigar quais são os critérios utilizados para

definir a escrita.

O terceiro período caracteriza-se pela fonetização da escrita, ou seja, a

criança começa a perceber a relação entre a escrita e os sons da fala.

Conforme Maciel (2009), durante o primeiro período, as crianças

empreendem esforços para distinguir traços que reproduzem,

aproximadamente, o objeto representado, daqueles que não possuem

nenhuma semelhança com a aparência física de coisas e pessoas. Diz:

Neste primeiro período, a criança alcançará duas distinções básicas que sustentarão as construções subseqüentes: de um lado, a diferenciação entre as marcas gráficas figurativas e as não figurativas; de outro, a constituição da escrita como objeto substituto. (MACIEL, 2009, p.48).

Nesta fase, a criança tenta estabelecer a distinção entre desenho e

escrita para descobrir o que esta última representa e quais são as regras que

organizam este modo de representação.

De acordo com Maciel (2009), “o primeiro período caracteriza-se pela

distinção entre o modo de representação icônico e não-icônico” (MACIEL 2009,

p.48).

Segundo Houaiss (2001), o termo “icônico” está ligado à palavra “ícone”

e designa um elemento visual cuja forma apresenta similaridades com a

aparência do objeto que substitui. Conforme o autor, a palavra “ícone” define o

Page 86: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

94

“signo que apresenta uma relação de semelhança ou análoga com o objeto que

representa (como uma fotografia, uma estátua ou um desenho figurativo)”

(HOUAISS, 2001, p.1562).

Para Ferreiro (2003 apud MACIEL, 2009), diferenciar o desenho da

escrita é um dos fatores mais importantes para a aquisição do sistema de

escrita pelas crianças, pois no entender da autora:

Diferenciar a atividade de desenhar da atividade de escrever é importante porque a escrita, para as crianças pequenas, recupera o que se pode desenhar: o nome do objeto desenhado (hipótese do nome). Essa idéia também lhes serve para interpretar os textos que aparecem acompanhados de imagens. A escrita por si mesma não é suficiente para garantir o significado e por isso as crianças costumam desenhar antes de escrever. A imagem, por outro lado, é o que permite interpretar a escrita (pelo menos como uma tentativa). (FERREIRO, 2003 apud MACIEL, 2009, p.49).

Maciel (2009) ressalta que a maioria das crianças, antes de completar

seis anos de idade, consegue compreender que a escrita substitui alguma

coisa, mesmo não depreendendo que se trata de uma representação da

linguagem e de aspectos formais da fala. Segundo a autora, com o fito de

responder a estes questionamentos, a criança formula a concepção de que

escrita e desenho constituem uma unidade cujo objetivo é comunicar uma

mensagem gráfica.

De acordo com Ferreiro (2003 apud MACIEL 2009), somente nos

períodos finais do processo de compreensão da escrita as crianças conseguem

perceber, nas estruturas internas das palavras escritas e nas estruturas da

oralidade, o sistema lógico que orienta as transformações operadas.

Este é o momento no qual a criança compreende a correspondência

termo a termo entre as unidades gráficas e as unidades sonoras. A

complementação deste processo ocorre de modo que a aquisição do sistema

de escrita alfabético inicia-se com a letra, evolui para a sílaba e efetiva-se com

a palavra. Diz a autora:

Page 87: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

95

Esta idéia também serve para interpretar os textos que aparecem acompanhados de imagens. A escrita por si mesma não é suficiente para garantir o significado e, por isso mesmo, as crianças costumam desenhar antes de escrever. A imagem, por outro lado, é a que permite interpretar a escrita (pelo menos como uma tentativa). (FERREIRO, 2003, apud MACIEL, 2009, p.49).

Ainda em Maciel (2009), a maior parte das crianças, antes de completar

seis anos de idade, conclui que a escrita é um elemento cuja função é substituir

outro elemento. Na visão da autora, este conhecimento não é suficiente para

que a criança entenda que a escrita corresponde a uma representação da

linguagem e de aspectos formais da fala. A criança formula a hipótese de que

escrita e desenho formam uma unidade capaz de expressar o sentido de uma

mensagem gráfica.

Em meio a estas indagações, a criança costuma apresentar a tendência

de equiparar a escrita com o tamanho do objeto que pretende comunicar. Por

exemplo, a palavra “elefante” será escrita com letras exageradamente maiores

do que a palavra “formiga”.

Segundo Ferreiro e Teberosky (1991), “durante o primeiro período

psicogenético da escrita, a criança espera que a grafia conserve algumas

características formais do objeto a que substitui”. (FERREIRO; TEBEROSKY,

1991, p.261).

Para Maciel (2009), isto demonstra que, neste momento, a criança ainda

não considera o signo visual como um elemento que expressa uma forma

sonora, fato característico dos sistemas de escrita alfabética, mas pretende que

tanto desenho quanto escrita expressem o mesmo conteúdo simbólico de uma

mensagem.

Após a diferenciação entre desenho e escrita, inicia-se o segundo

período de aquisição da escrita.

Segundo Ferreiro (1990), neste período, a criança integra o

conhecimento resultante da distinção entre escrita e desenho à constatação de

algumas características que a escrita possui e, desta forma, “a distinção

Page 88: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

96

adquirida no nível precedente entre o icônico e o não-icônico não se perde; ao

contrário, ela se integra a novas construções (FERREIRO, 1990, p. 27).

A autora observa que, depois de solucionar este problema, a criança

estabelece dois critérios para que a escrita seja compreendida. Ela percebe

que para realizar o ato de leitura é necessário que exista uma quantidade

suficiente de caracteres, e que os mesmos não devem estar distribuídos de

maneira repetitiva. Além disso, se a quantidade de letras for muito pequena, e

algumas se repetem com muita freqüência na mesma palavra, será impossível

realizar o ato de leitura.

Para Maciel (2009), é importante ressaltar que esta conclusão resulta

dos questionamentos que a criança realiza sozinha, e não da transmissão de

conhecimento realizada por usuários do sistema, visto que estes critérios não

estão presentes nas regras do mesmo. Tal fato demonstra que este raciocínio

pode ser considerado como “resultado de uma intensa atividade cognitiva, fruto

da tentativa da criança de se apropriar deste sistema de representação”

(MACIEL, 2009, p.51).

Durante o segundo período, é possível perceber a diferença entre

informações adquiridas no meio social e as conclusões resultantes de um

processo de elaboração de hipóteses que a criança realiza sozinha.

Alguns conhecimentos são transmitidos por indivíduos que já conhecem

o sistema, como sinais de pontuação e o nome dos números. Outros

progressos resultam de construções e re-construções cognitivas elaboradas

pela própria criança.

O terceiro período de aquisição do sistema de escrita caracteriza-se

pela atenção que a criança dispensa às relações entre a escrita e os sons

emitidos durante o ato da fala, e pode ser subdividido em três momentos ou

hipóteses.

Segundo Ferreiro e Teberosky (1991), no primeiro momento, a criança

tenta relacionar a emissão vocal com as sílabas das palavras, caracterizando a

elaboração da hipótese silábica:

Passa-se de uma correspondência global para uma correspondência termo a termo. Surge a hipótese silábica:

Page 89: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

97

cada letra vale por uma sílaba. Destacam-se duas características centrais deste nível: 1) Supere-se a etapa de uma correspondência global entre a forma escrita e a expressão oral e se passa a uma correspondência entre partes do texto (cada letra) e partes da expressão oral (recorte silábico do nome). 2) A criança trabalha pela primeira vez com a hipótese de que a escrita representa partes sonoras da fala. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991, p. 193).

No segundo momento do terceiro período, a criança procura

compreender o sistema por meio de uma análise que não se limite ao exame

da sílaba. Entretanto, para as autoras, ao encontrar dificuldades para descobrir

um novo ordenamento, a criança realiza uma composição que incorpora

elementos silábicos e alfabéticos na mesma escrita, caracterizando a hipótese

silábico-alfabética:

O aprendiz abandona a hipótese silábica e descobre a necessidade de fazer uma análise que vai além das sílabas. É movido pelo conflito que experimenta a partir da hipótese silábica, juntamente com a exigência de quantidade mínima de grafias (ambas hipóteses originais da criança) e as formas gráficas que o meio lhe propõe. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991, p.194).

No terceiro momento, a criança já compreendeu os fundamentos do

sistema de escrita e consegue produzir uma escrita alfabética, o que

caracteriza a hipótese alfabética:

O aprendiz compreendeu que cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores sonoros menores que a sílaba, e realiza sistematicamente uma análise sonora dos fonemas das palavras que vai escrever. A partir desse momento, a criança se confrontará com as dificuldades próprias da ortografia, mas não terá problemas na escrita, no sentido estrito. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991, p. 213).

Page 90: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

98

Após ultrapassar todos estes estágios de formulação de hipóteses em

relação à escrita, a criança compreendeu o funcionamento do sistema

alfabético e, a partir de agora, terá que aprender que a escrita é uma

representação da língua, e não da fala.

Deste momento em diante, os desafios que a criança encontrará estarão

relacionados à compreensão dos fundamentos desta representação.

Além dos estudos de Ferreiro e Teberosky (1991), as investigações

sobre o aprendizado da escrita e leitura, no Brasil, receberam impulsos

significativos a partir das pesquisas de Grossi (2010).

Segundo Pain (2008), a contribuição teórica de Grossi (2010) baseou-

se nas teorias de Ferreiro e Teberosky (1991) e Ferreiro (2003), concebidas

como uma continuidade das idéias de Piaget (1972) sobre a construção do

conhecimento pelo próprio indivíduo. A autora explica que a pesquisa de

Grossi (2010):

Se inspira na teoria da construção léxica elaborada por Emilia Ferreiro, a qual tentou ampliar o pensamento construtivista de Jean Piaget – centrado habitualmente nos comportamentos estruturados pela lógica – ao estudo das diversas “teorias” que as crianças constroem em contato com essa realidade chamada escrita, cuja norma de combinatória nos parece evidente. (PAIN, 2008, p. 19).

Assim, tanto Grossi (2010) quanto Ferreiro e Teberosky (1991), e

Ferreiro (2003) investigaram os processos de ensino-aprendizagem dos

sistemas alfabéticos de escrita, orientando-se por pressupostos construtivistas

e sócio-interacionistas. A pesquisa de Grossi (2010) objetivou:

A descoberta dos liames de um processo vivo de construção de hipóteses que os alunos seguem fazendo depois de alfabetizados, para atingir um domínio mais amplo da leitura e da escrita, assim como para campos conceituais em qualquer

Page 91: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

99

uma das demais disciplinas do currículo escolar. (GROSSI, 2010, p. 8).

Além de estudar os pressupostos construtivistas, Grossi (2010), buscou

ampliar as possibilidades investigativas das premissas relativas à construção

ativa de conhecimentos pelo indivíduo, e conjugar proposições teóricas sócio-

interacionistas à teoria construtivista da evolução intelectual através da

progressão em etapas.

Para esta autora, a noção de zona de desenvolvimento proximal,

definida por Vygotsky (1987), é mais abrangente do que o conceito piagetiano

de nível psicogenético, e constitui um dos aspectos mais importantes de seus

estudos. Como nos fala Grossi:

Apresentamos uma noção muito nova que emerge da continuação de nossos estudos. Trata-se da noção de zona proximal no processo de alfabetização, a qual amplia de muito a noção de nível psicogenético na escrita ou na leitura. (GROSSI, 2010, p. 16).

Em linhas gerais, a teoria de Grossi (2010) pode ser definida como uma

aproximação entre o conceito de nível psicogenético da leitura e escrita, com o

conceito de zona de desenvolvimento proximal de Vygotsky (1987).

Vimos ao longo de nossa pesquisa que o conceito de zona de

desenvolvimento proximal enfatiza a importância do aprendizado social e da

figura do professor como mediador do processo de conhecimento.

Desta forma, a abordagem de Grossi (2010) considera o aprendizado

social, bem como o estímulo à área de contato entre o conhecimento que o

aluno já possui e aquilo que ele ainda não sabe, como essenciais à

possibilidade de construção do conhecimento.

Page 92: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

100

Em relação à evolução intelectual ocorrida de forma linear, por meio de

uma sucessão de estágios evolutivos, Grossi (2010), em concordância com

Ferreiro et al. (1999), considera a diferenciação das habilidades infantis por

períodos, ou níveis, apenas como uma formulação teórica.

Para Grossi (2010), uma criança pode apresentar, simultaneamente,

condutas relativas a diferentes níveis, visto que “não existe simultaneidade

entre processos de aquisição de leitura e escrita, enquanto eles se dão”

(GROSSI, 2010, p. 16).

A partir das pesquisas de Grossi (2010), Freitag (2010) também ressalta

que a compreensão da evolução do aprendizado em níveis, serve apenas

como um recurso didático. Para a autora:

A separação por estágios ou níveis claramente definidos é mais um instrumento teórico que uma realidade empírica. Nas crianças examinadas verificou-se, confirmando os achados de Emília Ferreiro, que existem vários estágios intermediários e ainda a simultaneidade de dois ou três “estágios”, por vezes no pólo da leitura, por vezes no pólo da escrita. (FREITAG, 2010, p. 37).

Deste modo, a ênfase da investigação dirige-se ao processo de

construção e re-construção de conhecimentos, realizado pelas crianças, do que

a suposição de que a aprendizagem da escrita e da leitura ocorre de forma

linear.

Segundo Grossi (2010), estas teorias podem ser classificadas como

“proposta pós-construtivista”, fundamentada, simultaneamente, pelas teorias de

aprendizagem propostas por Ferreiro e Teberosky (1991), Ferreiro (2003),

Piaget (1972) e Vygotsky (1987).

Esta abordagem divide o processo de aquisição da linguagem escrita

pela criança em três estágios, enfatizando, como mencionado acima, a

concepção meramente didática desta divisão:

Page 93: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

101

Durante o primeiro estágio, classificado como Estágio Pré-Silábico, a

criança não relaciona a linguagem falada às diferentes formas de

representação gráfica da mesma, acreditando que se escreve por meio de

desenhos.

No segundo estágio, classificado como Estágio Silábico, a criança

elabora a hipótese de que para cada sílaba é necessário haver pelo menos

uma letra, enquanto que no terceiro estágio, classificado como Estágio

Alfabético, a hipótese anterior é reformulada e surge a noção de que existe

uma correspondência entre fonema e letra.

Logo, após adquirirem certo domínio da escrita e da língua materna, as

crianças dirigem sua atenção para detalhes relativos às peculiaridades da fala.

Segundo Maciel (2009), quando chegam ao Ensino Fundamental, as

crianças já conseguem se comunicar verbalmente, de maneira satisfatória.

Para a autora, uma das capacidades das crianças que a escola deve

desenvolver é a análise do sistema fonológico da língua materna, atividade que

muito colabora para o processo de aquisição da escrita e da leitura no sistema

alfabético:

Os estudos sobre a relação entre consciência fonológica e alfabetização vêm demonstrando o importante papel das habilidades meta-fonológicas no processo de aquisição da leitura e da escrita num sistema alfabético. No entanto, pode-se dizer que essas habilidades se desenvolvem concomitantemente a esse processo; e não, previamente. (MACIEL, 2009, p. 58).

As teorias estudadas até aqui se relacionam, primordialmente, à

aprendizagem de sistemas de escrita alfabética.

Todavia, para alguns autores é possível aplicar estas teorias a outros

ramos do conhecimento, e as ilações resultantes da análise destes

pressupostos teóricos podem sustentar autonomia construtiva de pensamento,

comunicação e desenvolvimento da inteligência em todas as disciplinas

escolares, bem como em todos os níveis da escolaridade obrigatória.

Page 94: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

102

Segundo Pain (2008), a aprendizagem de um sistema de escrita é

apenas uma forma de preparar o pensamento infantil para níveis mais elevados

de conhecimento e contato com as realidades do mundo:

É unicamente um instrumento que permite aceder a certas formas mais elaboradas do pensamento, da comunicação e do conhecimento. Garantir uma continuidade à promessa de autonomia constitutiva do método significa sustentar para todas as outras disciplinas a mesma atitude racional, participativa e construtiva, e isto em todos os níveis da escolaridade obrigatória. (PAIN, 2008, p. 21).

Isto é possível pelo fato de que algumas inquirições destes autores

basearam-se em premissas similares, o que resultou em princípios, parâmetros

investigativos e proposições comuns. Por exemplo, todos estes ordenamentos

teóricos postulam que, nas fases iniciais de seu aprendizado, a criança

confunde as palavras com os objetos, o que levou os estudiosos a investigarem

as relações entre desenho e escrita.

Desta forma, a construção de conhecimentos relativos a sistemas não

alfabéticos de leitura e escrita, como a Língua Chinesa, também foi investigada

por pesquisadores que se basearam nas teorias dos autores estudados. Suas

abordagens constituíram, pois, contribuições às elaborações teóricas pós-

construtivistas.

Segundo Mendoza (2003), o processo de ensino-aprendizagem da

língua e escrita chinesas difere totalmente aprendizado de língua portuguesa,

visto que em língua chinesa não existem as fases pré-silábica, silábica e nem

alfabética, pois não há alfabeto.

De acordo com St. Clair e Jia¹ (2006), a diferença primordial entre os

processos de ensino-aprendizagem da língua chinesa e línguas indo-

européias, como a língua portuguesa, refere-se à organização geométrico-

espacial dos símbolos lingüísticos. Segundo os autores, o sistema alfabético

formou-se a partir de abstrações desprovidas de significado, isto é, não existe

nenhuma relação entre as letras do alfabeto e as idéias comunicadas, bem

como nenhuma correspondência entre as mesmas e os sons de sua pronúncia.

Page 95: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

103

Já a escrita chinesa originou-se de desenhos eivados de significação

simbólica, havendo relação direta entre a forma dos caracteres chineses e os

objetos e conceitos comunicados por meio deste sistema.

Segundo Jia¹ e Jia² (2005), tanto o sistema de escrita chinesa quanto o

alfabético refletem as realidades sociais dos ambientes em que foram criados,

e modelaram os sistemas de pensamento de seus respectivos usuários. Para

eles: “a nossa mente modela nossos sistemas de escrita e estes, por sua vez,

modelam nossas mentes” (JIA¹; JIA², 2005, p.151) ‘tradução nossa’.

Para estes autores, a tendência do povo chinês para pensar por

imagens resultou em um sistema de escrita baseado em desenhos, no qual a

transmissão de idéias está diretamente ligada às formas e traçados dos

caracteres.

De acordo com Jia² (2005), esta tendência resultou num processo de

elaboração de pensamentos no qual a visualização da experiência é um pré-

requisito para que o ato de pensar possa ocorrer, ou seja, a imagem é o

elemento a partir do qual o pensamento se origina.

Ainda em Jia¹ e Jia² (2005), o ambiente cultural chinês concebe o

pensamento humano como um processo no qual a visualização de uma ou

mais imagens é a primeira etapa, sem a qual a compreensão de uma idéia, ou

fato, é impossível. Segundo os autores, a segunda etapa do processo, isto é, o

entendimento efetivo, somente ocorre a partir da visualização mental de

elementos relacionados ao assunto em questão.

Os autores ressaltam que a difusão desta prática deu origem a uma

série de ditos populares cujo objetivo era ensinar técnicas para melhorar a

memória e a compreensão de conteúdos escolares e filosóficos. Dentre estes,

um dos provérbios mais conhecidos na China ensina que, para compreender

algo de maneira integral é necessário: “em primeiro lugar, visualizar a coisa e

fazer analogia, para depois visualizar a analogia e compreender o sentido”

(JIA¹ e JIA², 2006, p.152) (tradução nossa).

Ainda em Jia¹ e Jia² (2006), esta maneira de raciocinar, na qual a

formação de uma imagem mental do objeto ou fato é pré-requisito, facilita a

compreensão e a transmissão de conceitos, visto que: “a visualização da

Page 96: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

104

experiência é o pré-requisito a partir do qual o conceito emana” (JIA¹ e JIA²,

2006, 153) (tradução nossa).

Para estes autores, a construção de significados no sistema de escrita

chinesa realiza-se de modo mais imediato e direto do que nos sistemas

alfabéticos, visto que os caracteres chineses resultam da combinação de

desenhos e imagens que representam conceitos.

Por exemplo, os caracteres “sol” rì e “lua” yuè, quando

combinados, expressam a idéia de “brilho”, “luz” Ming.

O conceito de “morte” wàng, combinado com “coração” xIn,

resulta na expressão da idéia de “esquecimento” wàng. Segundo Wah

(1980), este caractere expressa “aquilo que já morreu no coração e não está

mais vivo na memória” (Wah, 1980, p. xx).

Pelo exposto, os caracteres chineses permitem a transmissão e

compreensão de conceitos através de um processo de comunicação visual no

qual o entendimento das idéias comunicadas é imediato.

Como vimos anteriormente, durante o processo histórico de elaboração

dos mesmos, seu desenvolvimento ocorreu no sentido de transmitir conteúdos

cada vez mais sofisticados através de formas gráficas sintéticas.

Os estudos comparativos sobre o processo de ensino-aprendizagem de

sistemas alfabéticos e o da escrita chinesa postularam diferenças significativas

em relação à construção de conhecimentos nestes sistemas.

Para Jia¹ e Jia² (2006), é possível classificar a construção de significado

por meio dos caracteres chineses como um processo simultaneamente

intuitivo, concreto, analógico e imaginativo, enquanto que o processo de

ensino-aprendizagem do sistema alfabético pode ser classificado como

abstrato, analítico, dedutivo e linear. Estes autores concordaram com as teorias

estudadas, no que se refere à aprendizagem de sistemas alfabéticos,

entendendo, porém, que o aprendizado do sistema de escrita chinesa envolve

atividades mentais diferentes. Dentre estas, a criação de imagens mentais pelo

Page 97: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

105

aprendiz, bem como a imaginação, a intuição e a analogia podem exercer

funções mais importantes do que na aquisição do sistema alfabético.

Já para Mendoza (2003), os princípios que orientam o aprendizado dos

caracteres chineses pertencem à esfera da poesia e da filosofia, e não a um

conjunto de regras para representação de sons, como no sistema alfabético.

Segundo esta autora, estes princípios possibilitam a utilização de

metodologias simples e objetivas para transmissão de conteúdos, visto que a

construção de significado ocorre mediante interpretações e analogias que

podem ser realizadas até mesmo por crianças em idades iniciais. Por isso, o

sistema educacional chinês utiliza, para a educação infantil, métodos que

estimulam a compreensão por analogia visual para explicar o significado dos

caracteres, ministrando conteúdos gramaticais somente em séries mais

avançadas.

Segundo Leyi (1994), desenhos podem ser utilizados sistematicamente

como ferramenta auxiliar em processos de ensino-aprendizagem da língua

chinesa, desde que seja obedecido um padrão de apresentação das

informações que respeite as normas elaboradas pelo Ministério da Educação

da China.

Para ele, a escrita chinesa pode ser ensinada através de desenhos

explicativos, de acordo com o seguinte método:

1- Cada caractere deve ser apresentado ao lado de um desenho

explicativo, acompanhado de uma explicação sucinta a respeito de seu

significado e evolução gráfica.

2- A evolução dos diferentes traçados de cada caractere deve ser

apresentada em ordem cronológica.

As figuras 25, 26, 27 e 28 exemplificam alguns procedimentos

metodológicos adotados no ensino de língua chinesa como segunda língua, em

livros adotados na China e em países estrangeiros.

Segundo McNaughton (1999), este modelo de apresentação bilíngüe é

utilizado mediante autorização e supervisão do Ministério da Educação da

República Popular da China em conjunto com a Comissão Governamental de

Page 98: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

106

Linguagem, bem como pelo Comitê Nacional para o Teste Nacional de

Proficiência em Língua Chinesa Hanyu Shuiping Kaoshi (HSK):

O padrão de apresentação é o mesmo em todas as ilustrações, nas

quais a forma contemporânea do caractere está inserida em um quadrado

situado na área superior. No retângulo demonstra-se a ordem correta do

traçado e, na área central, a evolução pictórica desde o caractere e desenho

primitivos até o desenho sobre o qual a forma contemporânea foi baseada. O

texto apresenta explicações detalhadas sobre a evolução do traçado e o

processo de construção de significado, bem como a pronúncia pinyn.

A diferenciação entre os caracteres apresentados está de acordo com a

proposta de classificação de Wah (1980).

A figura 25 apresenta a evolução do caractere N援: que pode significar

“mulher”; “garota” ou “filha”. O traçado do caractere procura transmitir idéias

utilizando uma estrutura que se aproxime da forma do objeto representado.

Conforme ensina Wah (1980), esta é a característica dos pictogramas, logo

este caractere pertence à categoria Xiáng Xíng, ou “formas de imagens”. Diz:

O pictograma original mostra uma mulher reverenciando o interlocutor. Aparentemente, para facilitar o traçado, o caractere original foi reduzido e modificado para a forma que

expressa mais humildade- uma mulher ajoelhada- mas esta modificação não foi utilizada por muito tempo. A versão

moderna retrata a difícil jornada que as mulheres devem trilhar para que possam estar ao lado dos homens. (WAH, 1980, p.1) ‘tradução nossa’.

A figura 26 apresenta a evolução do caractere Z榎: , que pode significar

“criança”; “bebê” e “filho”. Neste caractere estão presentes as mesmas

características do caso anterior, ou seja, o traçado resulta da estilização das

formas do objeto representado. Este caractere também pertence à categoria

Xiáng Xíng, pois procura reproduzir a forma de uma imagem ou objeto, ou seja,

é um pictograma.

Page 99: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

107

A figura 27 apresenta a evolução do caractere Mù: , que significa

“olho”. Este caractere primitivo, derivado do desenho de um olho, também é

classificado como pictograma. A modificação do desenho original foi realizada

devido à semelhança do traçado original com a forma de outro caractere, cujo

significado é diferente. Como ressalta Wah (1980):

Em sua forma original, o olho era retratado com cílios e pupila ( ). A forma estilizada ( ), muito similar ao caractere ( ) que expressa o número “quatro”, dificultava a leitura e foi

modificada para um traçado vertical ( ) e, mais tarde, para um

traçado retangular ( ). (WAH, 1980, p 47) ‘tradução nossa’.

A figura 28 apresenta a evolução do caractere K円u: , que significa

“boca”.

Segundo Wah (1980), este pictograma também foi utilizado para

transmitir a idéia de “espaço aberto”, “abertura”:

O caractere para boca era, originalmente, o pictograma de uma boca aberta ( ), e foi modificado para o de um sorriso ( ). Posteriormente, o traçado foi alterado para o de uma boca esticada ( ) e, por fim, uma boca contraída como um quadrado ( ). ( ) também pode significar “abertura” (WAH, 1980, p. 50) ‘tradução nossa’.

Como ressaltam Jia¹ e Jia² (2005), os princípios que orientaram a

formação de todos os caracteres chineses relacionam-se a processos de

elaboração gráfica cujos resultados são muito parecidos com os que orientam a

realização de desenhos. Para estes autores, existe uma similaridade muito

grande entre desenhos produzidos por crianças e caracteres que pertencem às

diversas categorias, e não somente a dos pictogramas.

Page 100: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

108

As figuras 29, 30, 31, 32 e 33 apresentam caracteres que também

pertencem à categoria dos pictogramas.

A figura 29 apresenta o caractere Mù: , que significa “árvore” ou

“madeira”.

Este caractere representa uma árvore através do desenho de seus

componentes, isto é, tronco, raízes e galhos. Conforme Wah (1980), “... é o

pictograma de uma árvore, com galhos ( ), tronco ( ) e raízes ( ). O

traçado também significa “madeira...” (WAH, 1980, p. 10) (tradução nossa).

A figura 30 apresenta o caractere Hu円: , que significa “fogo”.

A figura 31 mostra o caractere Chuダn: “rio”, “córrego”. O pictograma

representa um rio, por meio do desenho de duas linhas que equivalem às

margens, e de uma linha central que representa o fluxo de água.

A figura 32 apresenta o caractere Shu榎: , que significa “água”. Diz

Wah (1980):

Água ( ), fonte natural de energia, originalmente

representada por ( ), pictograma que mostra água surgindo simultaneamente de uma origem central e de quatro diferentes

nascentes. Uma variante que utiliza somente três gotas ( ) é utilizada como um radical relacionado a uma infinidade de caracteres cujo significado reporta-se à “água”. (WAH, 1980, p. 91) ‘tradução nossa’.

A figura 33 apresenta a evolução do caractere , que significa

“homem”. De acordo com Wah (1980), o caractere é uma síntese de

concepções filosóficas sobre a vida do homem na terra:

Page 101: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

109

O pictograma é uma interpretação da evolução humana. Criado

a partir da terra e munido de mãos e pés, o homem inferior ( ) explorava o solo com suas mãos, para que pudesse

permanecer ereto ( ). Após descartar os pés e as mãos,

passou a usar somente a cabeça ( ). Atualmente, viver na era da “raça da sobrevivência do mais forte” fez com que ele

perdesse definitivamente a cabeça ( ) e mal consiga manter-se em pé. (WAH, 1980, p. 13) ‘tradução nossa’.

Entretanto, como os pictogramas não eram suficientes para comunicar

idéias tão complexas, surgiu um novo estilo de caractere que resultou da

combinação entre traços de caracteres antigos. Como vimos anteriormente,

este estilo foi classificado como Zhり Shì, ou estilo dos ideogramas.

Inicialmente, as idéias transmitidas pelos ideogramas eram mais

simples, como no caso do caractere Xi┣: (figura 34), que significa

“descanso”. Neste caso, para transmitir a idéia abstrata de “descanso”,

combinaram-se o caractere “homem” e o caractere “árvore”, isto é, um homem

encostado em uma árvore. A simples justaposição de pictogramas originou um

ideograma.

No entanto, outros caracteres pretendiam comunicar informações ainda

mais complexas, como no caso do caractere Yuè: (figura 35), que significa

“lua” e, também, “mês”. Neste caso, houve a intenção de comunicar as

diferentes fases da lua, que resultam na mudança de sua posição e de seu

contorno, além da influência das diferentes fases lunares sobre os seres

humanos. As mudanças ocorridas no traçado do caractere demonstram a

intenção de transmitir conteúdos mais complexos do que a simples

representação estática do objeto “lua”.

Segundo Wah (1980), este fato demonstra algumas circunstâncias que

favoreceram o processo de evolução dos caracteres primitivos para as formas

de representação mais elaboradas, como os ideogramas e os ideo-

fonogramas. Diz o autor:

Page 102: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

110

Para formar o caractere referente à “lua”, ou “mês lunar”, foi

escolhido o desenho da lua crescente ( ). O pictograma original sugeria as duas fases da lua. Primeiro por meio do desenho que, por meio de dois traços internos, expressava o

aumento de tamanho da lua nova ( ) e, posteriormente, através da modificação do ângulo do desenho, “apontando a

lua para a terra” ( ). A forma final ( ) expressa a influência da radiação lunar sobre o homem. A ilustração mostra os efeitos dos raios lunares sobre as pessoas que vivem na Terra. (WAH, 1980, p. 26) ‘tradução nossa’.

Esta necessidade de elaborar caracteres capazes de transmitir

conteúdos cada vez mais sofisticados, também pode ser exemplificada pelo

caractere Zì: (figura 36), que significa “escrita”, “caractere”, ou seja, este

caractere é utilizado para designar os próprios caracteres chineses.

Neste caso, o caractere resultou da combinação entre dois pictogramas

que já existiam e foram unidos para que fosse possível transmitir uma idéia

abstrata, o que caracteriza os ideogramas. De acordo com Wah (1980), a

cultura chinesa considerava os caracteres como um tesouro tão precioso que

deveria ser preservado e protegido como uma criança:

Para preservar a escrita chinesa da deterioração, os caracteres foram registrados em livros. Estas preciosas palavras escritas eram consideradas tão preciosas que passaram a ser protegidas como uma criança ( ) dentro de casa, isto é, sob um teto ( ) seguro. Logo, ( ) significa “caractere escrito”. O

traçado original ( ) mostra claramente um caractere que representa um jovem, sendo protegido da destruição, sob um teto. (WAH, 1980, p.5) (tradução nossa).

O mesmo ocorreu no caso do caractere Tiダn: , que significa “céu”,

“paraíso” e “dia”, exemplificado na figura 37. No processo de composição deste

caractere, a intenção não era somente comunicar a noção de “céu” ou

Page 103: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

111

“firmamento”, mas também, o conceito filosófico da preponderância das

potestades celestiais sobre o destino do homem. Este caractere também

pertence à categoria dos ideogramas, na qual a combinação entre diferentes

caracteres resulta na transmissão de idéias abstratas.

Neste caso, o caractere não tem o objetivo de transmitir somente a

forma física dos objetos representados, como ocorre nos pictogramas. Ao

contrário, o processo de elaboração utilizou a combinação de diferentes

elementos gráficos com o intuito de comunicar conceitos abstratos e idéias de

natureza filosófica. Desta forma, a combinação resultante representa a imagem

simplificada de um homem de braços abertos, sob uma linha que equivale à

representação estilizada do firmamento.

Para Wah (1980):

Esta representação estilizada mostra a habilidade que o

homem possui de manter-se ereto sobre os pés ( ), abrindo

egoisticamente os braços ( ). Mas, acima do homem ( ),

por maior que ele seja ( ), está o firmamento celestial ( ), ocupando o espaço vazio sobre seus ombros e direcionando

seus passos. Logo; representa o céu autoritário e legislador, acima da cabeça do homem. Como a luz crescente do céu resulta no entardecer, passou a significar também o “dia”. (WAH, 1980, p. 150). ‘tradução nossa’.

Além de constituírem o fundamento do sistema de escrita, os caracteres

não são considerados pela cultura chinesa apenas como um meio de

comunicação.

Segundo Leyi (1993), a influência do confucionismo resultou na

concepção de que o sistema de escrita é um dos mais importantes tesouros

culturais daquele país, pelo fato de exercer a função de transmissor dos

esforços intelectuais realizados por filósofos e eruditos chineses durante

milênios. Para ele, os caracteres possuem a capacidade de não somente

Page 104: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

112

instruir e transmitir conteúdos escolares e científicos, mas também a de ensinar

e preservar valores morais e modelos de comportamento que devem ser

adotados por todos os habitantes da China.

Deste modo, a elaboração dos caracteres também objetivou conservar

as idéias da filosofia chinesa através da história e, em cada um, podem ser

encontradas alusões a conceitos filosóficos, bem como informações sobre

valores sociais importantes para a sociedade chinesa. Este é o caso do

caractere Sh榎: (figura 38), que significa “porco”.

Segundo Wah (1980), no passado o porco era um animal muito

valorizado, pois garantia a nutrição das famílias:

Neste pictograma que representa o porco, a cabeça do animal foi substituída pela linha ( ). À esquerda estão situadas a

barriga e as patas ( ) e, à direita, as costas e o rabo ( ). O porco doméstico pode ter sido considerado como sinônimo de prosperidade para o homem, a julgar pelo modo como eram mutuamente dependentes. Esta dependência mútua provavelmente originou o provérbio: “O professor jamais deve abandonar seus livros, e o homem pobre, seu porco. (WAH, 1980, p. 6) ‘tradução nossa’.

A importância deste animal para a economia doméstica pode ser

percebida no processo de elaboração do caractere Jiダ: (figura 39), que

significa “casa”, “lar”, “família” e representa a habitação da família chinesa

tradicional. O caractere foi formado a partir do desenho de um teto, símbolo da

segurança familiar, sob o qual está um porco, símbolo da riqueza e garantia da

alimentação da família.

Segundo Wah (1980), a estabilidade da família chinesa, no passado, era

associada à posse deste animal, assim “... um porco ( ) sob um telhado ( )

representava o conceito de “lar” ( ). Ao porco doméstico era dada liberdade

para permanecer dentro da casa de seu dono.” (WAH, 1980, p.7) ‘tradução

nossa’.

Page 105: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

113

Estas analogias e associações, presentes no processo de elaboração

dos caracteres, foram também utilizadas na criação de metodologias de ensino

que pudessem utilizar o desenho como uma ferramenta de transmissão de

conteúdos lingüísticos e valores sociais. O sistema de ensino organizado pelo

governo chinês após a reforma educacional adotou um ordenamento interno

baseado na transmissão progressiva de conteúdos, não somente em termos

dos ensinamentos ministrados, mas também associada aos atributos gráficos

dos caracteres.

Assim, organizou-se um método de ensino escolar baseado na

associação entre desenhos e a evolução histórica, bem como a progressiva

sofisticação conceitual e gráfica dos traçados. Este método de transmissão de

conteúdos pode ser compreendido através da análise dos caracteres

“grande”, “muito”, “pequeno” e “menor”.

A figura 40 apresenta o caractere Dà: , que significa “grande”. Neste

caso, apesar da semelhança com o desenho de um homem de braços abertos,

o caractere é um ideograma, e não um pictograma.

A idéia transmitida é a de tamanho comparativo, e não a representação

da figura humana, que é o caso do caractere rèn ( ). Wah (1980) observa

que “... a representação ideográfica de “grande” é a imagem de um homem de

braços abertos ( ). O que transmite a idéia de “grande” não é o tamanho do

homem, mas o seu gesto...” (WAH, 1980, p. 14) ‘tradução nossa’.

A figura 41 apresenta o caractere Tài: , que significa “muito”,

“demasiadamente”, “excessivo”. Neste caso, o caractere Dá: “grande” foi

utilizado para expressar outra idéia, mediante o acréscimo de um novo

elemento gráfico. A colocação de um pequeno ponto sob o caractere que

exprime a idéia de “grande”, resultou na noção de “muito”, “demasiado”. Diz

Wah (1980):

Page 106: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

114

Sublinhar “grande” ( ) com uma linha ( ) resultou num caractere superlativo ( ), que significava “em demasia” ou “acima do limite”. No êxtase da dupla felicidade e enlevo da bem-aventurança matrimonial, o homem conferiu a sua esposa o honroso título de , o que denotava ênfase dupla. Como a ilustração demonstra, ela o levou a sério e passou a viver de acordo com este padrão. Posteriormente, o homem substituiu a linha por um pequeno traço. (WAH, 1980, p. 17) ‘tradução nossa’.

Um artifício parecido foi utilizado para a transmissão dos conceitos de

“pequeno” e “grande”. A figura 42 apresenta o caractere Xi越o: , que

significa “pequeno” ou “jovem”.

A formação deste caractere seguiu o processo de criação de

ideogramas, ou seja, a combinação de elementos gráficos abstratos para

comunicar um conceito. Segundo Wah (1980), o conceito de “pequeno” é

representado por “... um traço vertical ( ), separando dois traços menores

( ). A idéia derivou, também, da divisão ( ) de um objeto ( ) cujo tamanho

é pequeno...” (WAH, 1980, p. 19) ‘tradução nossa’.

A figura 43 apresenta o caractere Sh越o: , que significa “menor do

que”, “menos” e “pouco”. Como no caso dos caracteres e , ao caractere

, que significa “pequeno”, foi adicionado um elemento que o transformou em

um novo caractere, cujo significado, “menor”, ou seja, “menos quantidade”,

relaciona-se à idéia original.

O resultado final é um caractere que mantém o traçado de Xi越o: e

comunica uma idéia derivada de seu conceito, pela adição de um novo traço.

Conforme Wah (1980), “... combinou-se ( ) com ( ) para formar ( ).

Significa “cortar de tamanho menor” ou “diminuir” ( ) aquilo que já é pequeno

( ), tornando-o menor ainda ( )...” (WAH, 1980, p. 20) ‘tradução nossa’.

Este procedimento ocorreu em todas as fases de criação e evolução de

caracteres, e continua ocorrendo até os dias de hoje.

Page 107: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

115

Como vimos anteriormente, o desenvolvimento tecnológico e social

tornou os caracteres primitivos obsoletos e insuficientes para expressar as

novas atividades humanas. Além disso, a necessidade de expressar conceitos

cada vez mais complexos contribuiu para a criação de caracteres resultantes

da combinação entre os já existentes.

Por exemplo, o caractere , utilizado para designar “chuva” foi

aproveitado na composição gráfica do caractere , que passou a transmitir

a idéia de “eletricidade”:

A figura 44 apresenta o caractere Y堰 , que significa “chuva”. A idéia

de chuva foi expressa pelo desenho das gotas que caem verticalmente das

nuvens que estão no céu. Diz Wah (1980) que “... , o caractere para chuva,

é o desenho das gotas de chuva ( ) caindo verticalmente (I) de uma nuvem

( ) que está no céu ( )...” (WAH, 1980, p. 95) (tradução nossa).

Já o caractere Diàn (figura 45), que significa “eletricidade”, e

também “relâmpago”, deriva do caractere “chuva”. Para transmitir o

conceito moderno de eletricidade combinou-se o caractere “chuva” com um

desenho que representava o relâmpago. Como ensina Wah (1980):

A linha formada pelo raio ( ) em meio à chuva que cai ( )

originou o caractere que representa “relâmpago” ( ). O relâmpago concebido como uma descarga visível de

eletricidade ( ) passou a significar “eletricidade” ( ) que, ao trilhar o caminho que oferece menos resistência, descarregou oito de seus traços, transformando-se na forma simplificada ( ). (WAH, 1980, p. 99) ‘tradução nossa’.

Deste modo, o caractere significa “eletricidade” e também pode ser

escrito sob uma forma simplificada . O mesmo processo foi utilizado para a

Page 108: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

116

elaboração do caractere que expressa o verbo “ser”, bem como outros

significados.

A figura 46 apresenta o caractere Shì: , que significa “correto”,

“certo”, “adequado” e também o verbo “ser”. Neste caso, o processo de

elaboração obedeceu a analogias mais complexas e sutis, bem como a

preceitos filosóficos presentes nos ensinamentos confucionistas. Esta

complexidade, porém, não está aparente na forma simples do traçado, o que

favorece a intelecção pelo estudante.

O pictograma primitivo rì ( ) “sol”, está colocado sobre o ideograma

zhèng ( ) que transmite o conceito de “atitude correta”. Este caractere

derivou seu traçado do desenho de um homem indicando, com a mão

esquerda, o “caminho correto” que deve ser seguido pelo outro homem, ao

mesmo tempo em que aponta para o sol com a mão direita. O traço vertical

acima dos dois homens representa as nuvens do céu.

De acordo com Leyi (1993), a presença do sol neste caractere reforça a

idéia de “atitude correta”, pela qual o homem de bem deve sempre optar, de

acordo com os ensinamentos de Confúcio. Segundo o autor, nas concepções

filosóficas confucionistas, o sol sempre foi reverenciado e considerado como

parâmetro da atitude social e moral a ser adotada por todo o povo chinês.

Desta forma, o caractere Shì: passou a ser utilizado para transmitir

várias acepções cujos sentidos estão associados à idéia de “justo”, “certo”,

“correto”, bem como a idéia de “positivo”, em contraposição a tudo que não

contribui para o bem da sociedade.

Segundo Wah (1980), estes ensinamentos estão sintetizados neste

caractere pelo fato de que, além de significar “correto”, “certo”, o mesmo é

utilizado para exprimir o verbo “ser”. Para o autor, isto demonstra a

correspondência entre o significado do caractere e a atitude moral preconizada

pelos ensinamentos de Confúcio. Desta forma, o elemento lingüístico funciona

como divulgador de preceitos filosóficos, ou seja, o caractere divulga o

Page 109: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

117

ensinamento confucionista que recomenda que a postura moral do homem de

bem deve ser clara e correta como o sol.

Vimos que após o surgimento dos ideogramas, o crescente

desenvolvimento da língua chinesa resultou na criação dos ideo-fonogramas.

Os ideo-fonogramas são caracteres cuja forma resulta da combinação entre

dois caracteres já existentes, na qual um destes funciona somente como um

elemento que indica a pronúncia.

Além dos estudos que enfatizaram os processos de construção de

significado por meio da análise dos aspectos gráficos e da crescente

complexidade dos ideo-fonogramas, muitos pesquisadores investigaram o

processo ensino-aprendizagem da língua chinesa sob o prisma das relações

entre a apreensão de significados pela leitura e as peculiaridades da fala.

Em língua chinesa as relações entre a forma dos caracteres e sua

pronúncia não é muito rígida, devido à grande quantidade de dialetos.

Segundo Perfetti e Zhang (1991), em Mandarim existem 1.300 sílabas, o

que resulta em grande número de homófonos.

De acordo com Cheng (1981), a escrita chinesa soluciona este problema

de homofonia por meio da elaboração e aperfeiçoamento contínuos do sistema

dos caracteres. Para ele, este estado de permanente renovação facilita o

aprendizado da escrita e da leitura, pois resulta em uma quantidade muito

maior de caracteres. No dialeto Mandarim, por exemplo, existem dez vezes

mais componentes gráficos do que elementos sonoros, ou seja, o número de

elementos gráficos, destinados a transmitir conteúdos, é muito superior às

unidades de pronúncia existentes.

Deste modo, no aprendizado da língua chinesa, a percepção visual e a

compreensão do sistema de transmissão de significação, por meio dos

caracteres, exercem um papel muito mais importante do que a memorização de

regras de pronúncia.

Apesar disso, o sistema de escrita através de caracteres possui regras

que, além de serem muito rígidas, são praticamente idênticas para todos os

dialetos. Desta forma, em toda a China, independentemente do dialeto falado

em determinada região, o sistema de escrita é o mesmo. Esta característica

Page 110: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

118

facilitou a comunicação entre habitantes de regiões diferentes, e contribuiu

para a unificação do método de ensino-aprendizagem de leitura e escrita.

Em relação ao processo de ensino-aprendizagem da língua chinesa,

estudos pós-construtivistas postularam a hipótese da preponderância da

aquisição visual sobre a de natureza sonora.

Para Tavassoli (2010), as diferenças estruturais entre as línguas afetam

os processos através dos quais as mesmas são aprendidas. Segundo este

autor, no caso dos sistemas de escrita alfabética, aspectos fonológicos

interferem no ato da leitura, e tal fato não ocorre na língua chinesa.

O processo de ensino-aprendizagem da língua chinesa relaciona-se, primordialmente, à percepção visual e interpretação de conceitos, enquanto o das línguas alfabéticas envolve, em grau muito maior, a consciência fonológica. (TAVASSOLI, 2010, p. 89) ‘tradução nossa’.

As pesquisas de autores pós-construtivistas investigaram a relação entre

o acompanhamento visual e a emissão vocal da fala durante a leitura. O

objetivo desta investigação foi estudar as relações entre leitura e escrita nos

diferentes sistemas de escrita. Os resultados destas pesquisas levantaram

hipóteses sobre a preponderância da emissão vocal sobre a leitura em

sistemas alfabéticos, e da maior importância da apreensão visual sobre a

pronúncia, no caso da língua chinesa.

Como ressalta McCusker (1981), no caso da leitura em línguas que

utilizam sistemas de escrita alfabética, há uma tendência para a sub-

vocalização, ou seja, a repetição vocal das palavras lidas. Segundo este autor,

isto não ocorre durante a leitura dos caracteres chineses.

Para Hung (1981), isto ocorre pelo fato de que a leitura dos caracteres

enfatiza a apreensão visual, em detrimento de aspectos fonológicos, visto que

a associação com a pronúncia dos mesmos é arbitrária.

Já Perfetti e Zhang (1991) observaram em seus estudos que, como os

caracteres são símbolos eivados de significado, a compreensão dos mesmos

Page 111: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

119

não depende de mediação por meio de aspectos fonológicos ou de sub-

vocalização. Para estes autores, em língua chinesa, os leitores não precisam

repetir vocalmente as frases lidas para que consigam compreender conteúdos

textuais.

Na visão destes autores, a construção de significado em língua chinesa,

difere das línguas que utilizam escritas alfabéticas, e não está vinculado à

capacidade de reconhecimento de fonemas, baseando-se, principalmente, em

habilidades de apreensão visual. Tal característica demonstra que, em língua

chinesa, a compreensão da significação de conteúdos transmitidos por meio da

leitura e escrita ocorre de forma mais rápida, objetiva e imediata do que nos

sistemas alfabéticos.

Já os pressupostos teóricos de Packard (2004) afirmam que a

interpretação de significado por meio dos caracteres chineses está relacionada

à compreensão do método de composição de palavras. Durante o processo de

ensino-aprendizagem da língua chinesa, os alunos devem aprender como os

mecanismos de formação dos caracteres, bem como as formas de composição

de palavras a partir dos mesmos.

Para o autor, em língua chinesa, a unidade lingüística denominada

“palavra” pode ser definida de três formas diferentes:

Em primeiro lugar podemos definir a palavra como o elemento que representa um conceito; em segundo lugar, como o resultado da aplicação de regras gramaticais de composição e, por último, como uma unidade independente que pode pertencer a diferentes categorias sintáticas. (PACKARD, 2004, p.48). ‘tradução nossa’.

Estas definições referem-se somente ao conceito de palavra em língua

chinesa e, segundo o autor, pode variar em função do tipo de sistema de

escrita estudado.

Entretanto, é possível apontar paralelos entre esta abordagem de

Packard (2004) e os estudos sócio-interacionistas sobre a linguagem, bem

Page 112: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

120

como sobre as relações entre imagens e a construção de significados em

diferentes sistemas de escrita.

Para Luria (1976), a palavra é o elemento primordial da linguagem, pois

permite que a inteligência humana evolua, através da individualização e

classificação de objetos de acordo com características específicas. Para ele, “a

imagem percebida decodifica a experiência humana” (LURIA, 1976, p.33)

(tradução nossa).

Vygotsky (1993) concordou com Luria (1976) e também considerou a

imagem como o elemento que torna o homem capaz de separar objetos e

noções que possuam características semelhantes. Para os autores, as

imagens que o homem percebe visual e mentalmente originam as palavras, e

estas atuam como alicerce do desenvolvimento das funções mentais

superiores e da inteligência humana.

No que concerne à importância da imagem para a construção de

conhecimentos pelo homem, a proposta de Grossi (2010) concorda com

Vygotsky (1987) em relação ao fato de que o processo de ensino

aprendizagem infantil de leitura e escrita pode ser comparado à origem

histórico- social dos sistemas de escrita adotados por diferentes civilizações, ao

longo da evolução histórica da humanidade.

Já Ferreiro e Teberosky (1991), em relação aos sistemas de escrita

alfabética e às relações entre imagem e construção de significados, definem a

palavra como resultado de um desenvolvimento histórico iniciado com o

pictograma e que, obedecendo às relações entre o ato da leitura e o da fala

resultou no sistema de escrita silábica.

Devido a estes fatores, para Packard (2004), a elaboração de

metodologias de ensino da língua chinesa deve reconhecer a preponderância

da aquisição derivada do aspecto visual sobre o sonoro, devido à relação

estreita entre os caracteres chineses e a construção de significado naquela

língua. Para ele, o acesso ao significado por meio dos caracteres pode ser

mais direto do que nos sistema alfabéticos, nos quais o elemento sonoro ocupa

posição de destaque.

Page 113: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

121

Assim, o estudo das relações entre a aprendizagem humana, desenho

infantil e imagem representativa de conceitos contribuiu para pesquisas sobre a

construção do conhecimento pelo homem e para análises dos processos de

ensino-aprendizagem de línguas que se utilizam de sistemas de escrita

alfabéticos e não-alfabéticos.

No caso do sistema de escrita chinesa, estas relações possuem vínculos

ainda mais estreitos, devido à estrutura gráfica oriunda de desenhos utilizados

para representar conceitos.

A existência destes vínculos possibilitou a criação de metodologias de

ensino da língua chinesa que utilizam a analogia entre as formas de diferentes

objetos. Além disso, estas metodologias admitem a possibilidade da

investigação de significados por meio do desenho, visto que este, na

concepção dos autores, é precursor da escrita.

Page 114: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

122

CONCLUSÃO

A idéia que temos da língua chinesa é a de ser complexa e de difícil

aprendizagem, já que a mesma é grafada por caracteres, e não por letras,

como em nossa forma de escrita.

Entre as inúmeras pesquisas existentes sobre a aquisição de uma

segunda língua, acreditamos que as teorias de Piaget e Vygostky, bem como

os estudos de todos os outros autores estudados, contribuíram para a

compreensão dos processos de aquisição da escrita e da linguagem, em

sistemas alfabéticos e não-alfabéticos, bem como do papel do desenho e da

atividade lúdica no processo de ensino-aprendizagem da língua chinesa.

Esclarecemos que nossa tentativa neste primeiro trabalho foi traçar um

paralelo entre a aplicação do desenho e o aprendizado da língua chinesa por

alunos do ensino fundamental, por acreditarmos que nesta fase o lúdico pode

tornar-se um facilitador significativo do processo de construção e aquisição da

linguagem. Entretanto, esta pesquisa não teve a pretensão de aprofundar-se

no assunto, mas a de sugerir que a aplicação do desenho poderá ser possível

no processo de ensino-aprendizagem da língua chinesa.

Observamos que Piaget e Vygostky apresentam concepções diferentes

no que se refere à aprendizagem. Piaget postula que o conhecimento é

construído a partir de uma atitude ativa da criança ao entrar em contato com o

objeto de sua atenção e que, ao aprender, ela constrói sua inteligência através

de um processo de desenvolvimento que ocorre em etapas.

Por outro lado, vimos que Vygostky privilegia o papel da cultura e da

interação social no processo ensino-aprendizagem e na construção de

conhecimentos pelos indivíduos. Neste processo, a cultura fornece os

elementos a partir dos quais serão criadas as condições para o

desenvolvimento das habilidades de representação mental que impulsionam o

aparecimento da linguagem.

Outro aspecto importante, e que atende aos objetivos de nossa

pesquisa neste primeiro momento, é o fato de que, para Vygostky, a criança se

desenvolve, e constrói conhecimentos, por meio de instrumentos psicológicos e

signos. A utilização de tais elementos proporciona a internalização das

Page 115: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

123

manifestações culturais, resultando na permanente reconstrução da inteligência

humana. Tal reconstrução ocorre por meio de progressiva organização de

sistemas simbólicos cada vez mais complexos.

Portanto, acreditamos que a escrita chinesa, enquanto sistema

simbólico sujeito a processos contínuos de evolução e re-elaboração pode

colaborar com processos de reconstrução da inteligência do homem, bem

como de suas habilidades de comunicação. Ou seja, quanto mais o aluno

entrar em contato com os caracteres chineses, mais sua inteligência estará

sendo estimulada, e maiores serão suas habilidades de promover re-

significação e re-construção de conhecimentos.

No que diz respeito ao desenvolvimento da inteligência e a construção

de conhecimentos, percebemos que, tanto o desenho quanto a atividade lúdica

auxiliam a criança a entender o caráter de representação, e adquirem

importância fundamental para o aprendizado de sistemas de escrita,

considerados como sistemas simbólicos. Ambos permitem que a criança

transforme as relações entre os objetos e seres do mundo exterior, inserindo-

os no campo de sua imaginação, no qual substitui as funções e atributos

originais dos objetos e seres por situações novas, atividade mental que permite

a libertação do plano imediato de significações.

Nessa perspectiva, constatamos que Ferreiro e Teberosky vêem o

desenho como um dos elementos a partir dos quais a criança formula

hipóteses para tentar compreender o que é a escrita alfabética. A escrita

chinesa não é um alfabeto, mas sim um sistema que tem sua origem a partir de

desenhos. Perguntamo-nos se isto ocorreria na aquisição de sistema de escrita

chinesa, visto que a tentativa de compreender este sistema pode ser

interpretada como um processo de reconstrução de significação.

Portanto, entendemos que, nas fases iniciais de seu aprendizado, ao

confundir as palavras com os objetos, a criança tenta, espontaneamente,

construir e compreender significados através do desenho. Remetemo-nos

também à Derdyck, que afirma que o desenho é a forma de comunicação mais

antiga que existe, e que ainda está presente no mundo atual, “... seja na sua

aplicação mais elaborada para o desenho industrial e arquitetura, seja na

função de comunicação que o desenho exerce na ilustração...”. Ou seja, como

nos fala Vygostky, “... o desenho é precursor da escrita...”.

Page 116: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

124

Quanto ao sistema de escrita chinesa, podemos constatar que, neste, a

relação entre o significante e o significado é mais imediata, pois os caracteres

originam-se de desenhos, o que não acontece no alfabeto.

Observamos, e podemos concordar com Wah, em relação ao fato de

que a estrutura gráfica deste sistema procura comunicar conteúdos da maneira

mais direta, rápida e objetiva possível. Isto se dá graças a processos de

analogia, comparação e justaposição entre a forma dos objetos e conceitos

representados e o traçado dos caracteres chineses.

Assim, acreditamos que a apresentação de um novo caractere a um

grupo de alunos do ensino fundamental, seguida da execução de um desenho

explicativo que demonstre a forma do objeto ou conceito que originou seu

traçado, pode resultar na compreensão imediata de seu significado.

Após esta explicação, de certa forma, desenhar acaba se tornando um

ato espontâneo que equivale a uma tentativa de investigação do processo de

construção da significação, bem como de memorização dos conteúdos

transmitidos, além de estimular e ampliar o interesse pela aquisição de novos

conhecimentos. Deste modo, a reprodução manual destes caracteres pelos

alunos do ensino fundamental, não será simples cópia mecânica, mas poderá

ser considerada como um processo de imitação simbólica que favorece a

atividades de representação mental, tanto na visão construtivista quanto na

abordagem sócio-interacionista.

Neste caso, remetendo-nos a Vygostky, esta apresentação do caractere

desconhecido aos alunos, pode criar uma Zona de Desenvolvimento Proximal,

pois é através da mediação do professor que informa o desenho, e o conceito a

partir dos quais o caractere foi concebido, que o aluno é estimulado a construir

um novo conhecimento.

É importante ressaltarmos que o desenho já é utilizado pelo sistema de

ensino oficial da China como ferramenta auxiliar no processo de ensino-

aprendizagem da língua chinesa como segunda língua.

Ao analisarmos o sistema educacional chinês contemporâneo,

surpreendemo-nos com a constatação de que as teorias construtivistas e sócio-

interacionistas foram adotadas como diretrizes metodológicas da reforma do

ensino básico iniciada no final do século XX, pelos órgãos responsáveis pela

educação naquele país. Nossa pesquisa verificou também que, anteriormente,

Page 117: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

125

as metodologias adotadas priorizavam a memorização mecânica e a cópia

sistemática dos caracteres, bem como a figura autoritária do professor, que

transmitia uma série de informações sem nenhum estímulo ao pensamento

crítico ou análise.

Nesse sentido, concordamos com Jia³ quando afirma que o professor

deve adotar uma postura mais humanista e criar um ambiente mais agradável

para o aprendizado, já que o educador é um mediador da construção ativa de

conhecimentos pelos alunos.

Outro aspecto importante, defendido pelo autor, e com o qual também

concordamos, está na natureza do material didático, a qual deveria ser

elaborada conforme o conhecimento prévio e a realidade sócio-cultural dos

alunos.

Já em nosso sistema de ensino, vimos que os Parâmetros Curriculares

Nacionais para o ensino de língua estrangeira também preconizam a

participação crítica do aluno, e servem como referência para a (re) elaboração

do projeto pedagógico e do currículo escolar em escolas brasileiras.

No que se refere ao ensino de língua chinesa, no Brasil, percebemos

que não é comum a utilização do desenho, embora os cursos nacionais

oferecidos possuam convênios com o Ministério de Educação da China e este

órgão governamental aprove este método.

Entretanto, somente a Escola Mandarim, apresentou uma metodologia

que envolve algum tipo de produção artística, mas não menciona se o desenho

faz parte do currículo do curso.

Em geral, as metodologias dos cursos pesquisados não utilizam o

desenho como ferramenta auxiliar de ensino, priorizando outras atividades e

exercícios para a memorização dos traçados e significados dos caracteres.

Enfatizamos que a ação psicopedagógica preventiva tem por objetivo

facilitar o aprendizado e eliminar potenciais dificuldades de aprendizagem.

Desta forma, a utilização do desenho no processo de ensino-

aprendizagem da língua chinesa para alunos do ensino fundamental de escolas

brasileiras, pode proporcionar ao psicopedagogo a possibilidade de uma

atuação eficaz. Isto se deve ao fato de que o desenho é um elemento

verdadeiramente universal, capaz de construir significados, transmitir

conteúdos, re-significar os próprios envolvidos no processo de ensino-

Page 118: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

126

aprendizagem, independentemente do contexto lingüístico e sócio-cultural no

qual estejam inseridos. Em última instância, a eficácia o desenho como veículo

de comunicação e expressão não se restringe às normas dos sistemas de

escrita, sejam estes alfabéticos ou não. Como exemplo, podemos citar o

desenho “a pomba da paz”, de Picasso, no qual a mensagem que se deseja

transmitir pode ser compreendida em todos os contextos culturais e lingüísticos

do mundo.

Também nos parece que a construção de significados no sistema de

escrita chinesa pode até mesmo ser considerada como uma ação

psicopedagógica de teor preventivo, visto que, na estrutura interna deste

sistema, a relação entre significante e significado, além de não ser arbitrária,

como nos sistemas alfabéticos, é intencionalmente mais direta.

Esta peculiaridade evidencia a intenção de facilitar a aprendizagem e,

também, de eliminar potenciais dificuldades de compreensão e transmissão de

conteúdos e mensagens, características que definem os objetivos da

psicopedagogia de teor preventivo.

Acreditamos que esta pesquisa não se esgota aqui, devido às

possibilidades de construção de conhecimento oferecidas pelo desenho e pelo

aspecto psicopedagógico.

Entretanto, sugerimos que futuros educadores e psicopedagogos,

aprofundem seus conhecimentos referentes ao assunto abordado, ampliando

desta forma as possibilidades de pesquisa relativa à utilização de ferramentas

lúdicas, como o desenho, não apenas voltado ao aprendizado de segunda

língua, mas aplicado a outras disciplinas.

A utilização do desenho como ferramenta lúdica no processo de ensino-

aprendizagem da língua chinesa pode, também, abrir imensas oportunidades

profissionais para alunos e professores brasileiros. Além disso, pode auxiliá-los

a aprender a aprender, construindo sua própria autoria de pensamento e

ampliando seus horizontes.

Por fim, a utilização do desenho no processo de ensino-aprendizagem

da língua chinesa como segunda língua pode proporcionar ao psicopedagogo

condições adequadas para intervir neste processo, de modo que sua atuação

preventiva possibilite o estabelecimento de um processo de conhecimento no

qual esteja manifesta a presença de um verdadeiro construtivismo social.

Page 119: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

127

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, Paulo Nunes de. Educação Lúdica, Técnicas e jogos pedag ógicos. São Paulo: Loyola, 1998.

Apostila IAVM: CONCEIÇÃO, Régia de Jesus. Módulo III – O Jogo no Processo Ensino-aprendizagem. Disciplina: Recreação e Artes. Curso de Pós Graduação em Psicopedagogia a Distância. Rio de Janeiro: UCAM/IAVM, 2007. 32 p.

Apostila IAVM: MADEIRA, Eunice do Vale. Módulo II – A Contribuição de Jean Piaget. Disciplina: Psicologia do Desenvolvimento e Dificuldades de Aprendizagem. Curso de Pós Graduação em Psicopedagogia a Distância. Rio de Janeiro: UCAM/IAVM, 2007. 24 p.

Apostila IAVM: MARANHÃO, Diva Nereida M. Machado. MAIA, Antônio Carlos de Carvalho. Módulo I – Processos Criativos. Disciplina: Recreação e Artes. Curso de Pós Graduação em Psicopedagogia a Distância. Rio de Janeiro: UCAM/IAVM, 2007. 24 p.

Apostila IAVM: PEREIRA, Mary Sue Carvalho. Módulo I – Psicopedagogia: Funções e espaço de atuação. Disciplina: Teorias e Intervenções Psicopedagógicas. Curso de Pós Graduação em Psicopedagogia a Distância. Rio de Janeiro: UCAM/IAVM, 2007. 27 p.

Apostila IAVM: URRUTIGARAY, Maria Cristina Fontes. Módulo IV - O Modelo Cognitivista como suporte para uma prática e intervenção psicopedagógicas. Disciplina: Teorias e Intervenções Psicopedagógicas. Curso de Pós Graduação em Psicopedagogia a Distância. Rio de Janeiro: UCAM/IAVM, 2007. 33p.

Apostila IAVM: URRUTIGARAY, Maria Cristina Fontes. Módulo VI - O Modelo histórico-cultural de Vygostky. Disciplina: Teorias e Intervenções Psicopedagógicas. Curso de Pós Graduação em Psicopedagogia a Distância. Rio de Janeiro: UCAM/IAVM, 2007. 22p.

BAPTISTA, Mônica Correia. Crianças menores de sete anos, aprendizagem da linguagem escrita e o Ensino Fundamental de Nove anos. In: A criança de seis anos, a linguagem escrita e o Ensino fundamental de nove anos. 1ª. Edição. Brasília: MEC, 2009

CAGLIARI, L. C. Las letras y sus estilos. Revista de Divulgación

científica y Tecnológia de La Asociación Ciencia Hoy. Vol 07, nº 40. Campinas, SP: 1997.

CARVALHO, Olavo de. Introdução à Teoria dos Quatro Discursos. In: Aristóteles em Nova Perspectiva. Rio de Janeiro: Topbooks, 1988.

CHANG, J. Chinese speakers. In: Learner English. 2nd. Edition.Cambridge, UK: Cambridge University Press, 2001.

Page 120: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

128

COLE, M.; SCRIBNER, S. Introdução. In: Vygotsky, L.S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998. CRAYD, Carmem. KAERCHER, Gládis E. Educação Infantil: Prá que te quero? Porto Alegre: Artmed, 2001. DEMAO, Kong. On the 2540th anniversary of Confucius’ Birth. Pequim, China: The Beijing Museum Academy, 1989. DERDYK, Edith. Formas de pensar o desenho: desenvolvimento do grafismo infantil. São Paulo: Scipione, 1998.

DIRVEN, René. Cognitive Explorations of Language. Philadelpfia, MA: John Benjamins Publishing Company,2004.

FERREIRO, Emília. A escrita... antes das letras. In: SINCLAIR, Hermine et al. A Produção de Notações na Criança: linguagem, número, ritmos e melodias. São Paulo: Cortez, 1990.

FERREIRO, Emilia.TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. 4ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.

FERREIRO, E. et al. Piaget, Vygostky. Novas Contribuições para o debate. 2ª. Ed. São Paulo: Artes Médicas, 1999.

FERREIRO, Emília. Los ninõs piensan sobre la escritura. Buenos Aires: Siglo XXI Editores, 2003.

FREITAG, Bárbara. Prefácio. In: GROSSI, Esther Pillar: Didática dos níveis pré-silábicos. 10ª. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2010.

GROSSI, Esther Pillar. Didática dos níveis pré-silábicos. 10ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2010.

HOUAISS, A. VILLAR, M. de S. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva. 2001.

HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. 5ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2004.

KANTOR, Philipe. Le Chinois Sans Peine. Vol.1. França: Assimil, 1981.

LEYI, Li. Tracing the roots of Chinese Characters: 500 cases. Pequim: Beijing Language and Culture University Press, 1994.

LI, Xiuping. CUTTING, Joan. Rote Learning in Chinese Culture: Reflecting Active Confucian-Based Memory. Strategies. In: Researching Chinese Learners Skills, Perceptions and Intercultural Adaptation, Ed. Jin, L. & Cortazzi, M., Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan, 2011.

LURIA, Alexander Romanovich. Cognitive Development: It’s Cultural and Social Foundations. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1976. MACIEL, Francisca Izabel Pereira. A Criança de seis anos, a linguagem

escrita e o Ensino Fundamental de nove anos. 1ª. Edição. Brasília: MEC, 2009.

Page 121: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

129

MCNAUGHTON, William. Reading and Writing Chinese: A Comprehensive Guide to the chinese writing system. 3rd.Edition. Singapore, HK: Tuttle Publishing, 2005.

MOURA, M. L. S. de e RIBAS, A. F. P. Imitação e Desenvolvimento Inicial: evidências empíricas, explicações e implicações teóricas. In: Estudos de Psicologia. vol.7. n.2. Natal: 2002.

OLIVEIRA, Martha Kohl. Vygostky: aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1997.

PACKARD, Jerome P. The Morphology of Chinese- A linguistic and cognitive approach. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.

PAIN, Sara. Prefácio. In GROSSI, Esther Pillar: Didática do nível alfabético. 9ªEd. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008 PIAGET, Jean. A Formação do Símbolo na Criança. Imitação, jogo e sonho, imagem e representação. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar, 1971.

____________. Epistemologia Genética. Petrópolis: Vozes, 1972.

____________. A formação do símbolo: imitação, jogo e sonho,

imagem e representação. 3ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

PIAGET, J. INHELDER, B. A função semiótica ou simbólica. In: A Psicologia da criança. Lisboa: Moraes, 1979.

___________. A linguagem e o Pensamento da criança. 5ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

SAUSSURE, Ferdinand. Curso de Lingüística Geral. São Paulo: Cultrix, 2006.

STÖRIG, Hans Joachim. A Aventura das Línguas – Uma História dos Idiomas do Mundo. Tradução de Clória Paschoal de Camargo. São Paulo: Melhoramentos, 1990.

VYGOTSKY, L. S. La imaginación y el arte en la infancia: ensayo psicologico. Madrid: Akal, 1982.

______________. The collected works of L.S. Vygotsky. Nova York: Plenum Press, 1987.

______________. A Formação Social da Mente. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

______________. El Desarollo de los processos psicológicos superiores. Barcelona: Crítica, 2000.

WAH, Ong Tee. Fun with Chinese Characters. Hong Kong, China: Federal Publications, 1980. YIMIN, Jia. Zhongwen- Mandarin Chinese Language. 5ª ed. Jinan University Press. China; 2006.

Page 122: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

130

YIP, Virginia. MATTHEWS, Stephen. The Bilingual Child – Early Development and Language Contact. Cambridge: Cambridge University Press, 2007.

YUTANG, Lin. A Sabedoria da Índia e da China. Vol.1. Rio de Janeiro: Irmãos Pongetti Editores, 1955.

Page 123: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

131

WEBGRAFIA

Aiping, Yuan (2009). Centro Cultural China-Brasil. Página consultada em 10 de Outubro de 2010, <http://www.chinabrasil.com

Cheng, Chao Ming (1981) “Perception of Chinese characters”. Página consultada em 03 de Setembro de 2010. <

>.

http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/0093934X8990093X

Escola Mandarim de Língua chinesa (2011). Página consultada em 28 de Outubro de 2010. <

>.

http://www.mandarim.net

Hung, D.L, e Tzeng, O.J.L (1981). Orthographic variations and visual information processing. Página consultada em 16 de setembro de 2010. <

>.

URL:http://www.haskins.yale.edu/sr/SR066_07.pdf>.

Instituto Confúcio na Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita de Filho- UNESP (2011). Página consultada em 28 de Outubro de 2010. <

.

http://www.institutoconfucio.unesp.br

Jia¹,Yuxin e JIA², Xuerui. (2005). “Chinese Characters, Chinese Culture and Chinese Mind”. Página consultada em 05 de Março de 2010. <

>.

http://www.uri.edu/iaics/content/2005v14n1/YuxinJia/XueruiJia.pdf

>.

Jia², Xuerui (2005). A Contrastive Analysis of Chinese and American Rhetoric. Página consultada em 05 de Março de 2010. <:http://www.uri.edu/iaics/content/2005v14n2/XueruiJia.pdf

>.

Jia³, Qiong (2010), “A Brief study on the implication of Constructivism Teaching Theory on Classroom Teaching Reform in Basic Education”. Página consultada em 10 de Agosto de 2010. <http://www.ccsenet.org/journal/index.php/ies/article/download/58884661 /QJia2010.pdf

Laifu- Centro de Língua Chinesa. Página consultada em 30 de Agosto de 2010. <

>

http://laifu.com.br

Lenninger, Sarah (2006). “Piaget and Vygostky on the child becoming sign-minded.” Página visitada em 13/03/2010, <

>.

http://lup.lub.lu.se/luur/download

McCusker, L.X., Hillinger, M. L. e Bias, R.G. (1981) “Phonological recording and reading”. Página consultada em 18 de Agosto de 2010. <

>

URL:http://www.sciencedirect.com/science/article/pii

Mendoza, Inty Scoss (2003) Confúcio, a Linguagem e a Educação. Centro de Línguas, USP. Página consultada em 10 de Setembro de 2010.<

>

http://www.multiculturas.com/delfim/filos_educ/textosIMendoza_Confucio_linguagem_educação_sd.pdf

>.

Page 124: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

132

Ministério da Educação e Cultura (1996). “Lei de Diretrizes e Bases da Educação-LDB n. 9394/96, artigo 9”. Página consultada em 15 de Setembro de 2011, <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei9394_ldbn2.pdf

Ministério da Educação e Cultura (1997). “Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira em 1ª. A 4ª. séries da Educação Básica”. Página consultada em 16 de Setembro de 2011, <

>.

http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/pcn_estrangeira/pdf

Ministério da Educação e Cultura (1998). “Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa”. Página consultada em 16 de Setembro de 2011, <

>.

http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf

Perfetti, C. A. e Zhang, S. (1991), “Phonological processes in reading Chinesecharacters”. Página consultada em 30 de agosto de 2010. <

>.

http://www.pitt.edu/~perfetti/PDF/ReadChinesecharortho/and/pho

no/(chapt)-Liu.pdf>.

St.Clair, Robert N. e Jia¹, Yuxin (2006). “Visual Metaphors, Visual Communication and the Organization of Cognitive Space”. Página consultada em 15 de agosto de 2010.<http://www.uri.edu/iaics/content/2006v15n1/RobertN.St.ClairYuXin Jia.pdf

>.

Tavassoli, Nader T. (1999), “Temporal and Associative Memory in Chinese and English”. Journal of Consumer Research, vol.26, n.2, Página consultada em 25 de Agosto de 2011, <http://www.jstor.org/stable/2489804

>.

Tavassoli, Nader T. “Visual Processing of Language in Chinese and English” (2010) Página consultada em 25 de Agosto de 2010.<http://wwwyaffecenter.org/downloads/Visual_Persuasion/nader.pd

UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (2003). “O Ensino Médio no Século XXI: Desafios, tendências e prioridades”. Página consultada em 12 de abril de 2010. <

f>.

URL:http://unescodoc.unesco.org/images/0013/001335/133539por.pdf

>

YE, Lan e WU, Yaping (2006) “A Reforma do ensino e da Avaliação em Sala de Aula. Página consultada em 10 de abril de 2010. <http://www.fed.cuhk.edu.hk/en/er/200300240008/0042.htm

>.

Page 125: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

133

LISTA DE SIGLAS

CCCB - Centro Cultural Brasil-China. HSR - Hanyu Shuiping Kaoshi. HSCHDD - Hanyu Shuiping Cihui Yu Hanzi Dengji Dagang. NOCFL - National Office for Teaching Chinese as a Foreign Language (China). MEC - Ministério da Educação e Cultura. PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais. f.s.- Forma Simplificada.

Page 126: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

134

LISTA DE FIGURAS

Capítulo 3.1.

Figura 1, p. 59.

Fonte: Leyi, 1994, p.101.

Page 127: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

135

Figura 2, p. 65.

ESTRATÉGIA DESCRIÇÃO Práticas obrigatórias

1 - Repetição 1 - Repetir a leitura, escrita ou fala. 2 - Memorização 2 - Memorizar vocabulário importante. 3 - Compreensão 3 - Priorizar a compreensão ao ler. 4 - Prática 4 - Repetir os exercícios várias vezes. 5 – Revisão 5 - Retornar ao material para fixação.

Práticas alternativas Conceito 1 - Ler em silêncio ou sub-vocalizando. 1 - Ler mentalmente ou sub-vocalizando,

repetidas vezes. 2 - Memorização de palavras escritas. 2 - Re-escrever a mesma palavra várias

vezes. 3 - Memorização de palavras escritas em cartões.

3 - Repetir listas de palavras escritas em cartões.

4 - Exemplos típicos. 4 - Repetir expressões várias vezes. 5 - Encontrar traduções equivalentes. 5 - Traduzir listas de palavras de trás

para frente e em ordem normal. 6 - Encontrar definições. 6 - Escrever palavras várias vezes. 7 - Agrupar itens aos pares. 7 - Repetir pares de palavras. 8 - Memorização de verbos irregulares. 8 - Recitar listas de verbos irregulares. 9 – Agrupar. 9 - Classificar palavras em grupos. 10 – Associações. 10 - Relacionar novas informações a

conceitos já conhecidos. 11 - Inserir palavras conhecidas em contextos novos.

11 - Inserir palavras conhecidas em contextos novos.

12 - Utilizar imagens. 12 - Relacionar palavras e desenhos. 13 - Utilizar mapas semânticos.

13 - Organizar palavras em diagramas nos quais o sentido principal esteja escrito no centro, e palavras e conceitos relacionados sejam ligados por setas.

14 - Palavras-chave. 14 - Memorizar palavras-chave por meio de recursos visuais e auditivos.

15 - Representar sons. 15 - Memorizar informações de acordo com similaridades sonoras.

16 – Revisão. 16 - Realizar revisões permanentemente Fonte: Li, 2011, p. 23-24. ‘tradução nossa’.

Page 128: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

136

Figura 3, p. 66.

Fonte: McNaughton, 2005, p.1. ‘tradução nossa’.

Page 129: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

137

Figura 4, p. 67.

Fonte: McNaughton, 2005, p. 293.

Figura 5, p. 68.

Fonte: Kantor, 1981, p. xxx.

Figura 6, p. 68.

Fonte: Kantor, 1981, p. xxx.

Page 130: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

138

Figura 7, p. 68.

Fonte: Kantor, 1981, p. xxx.

Figura 8, p. 68.

Fonte: Kantor, 1981, p. xxxi.

Capítulo 3.2.

Figura 9, p. 69.

Fonte: LEYI, 1993, p.278.

Page 131: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

139

Figura 10, p. 69.

Fonte: LEYI, 1993, p.451.

Figura 11, p. 70.

Fonte: LEYI, 1993, p. 242.

Figura 12, p. 70.

Fonte: LEYI, 1993, p. 277.

Page 132: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

140

Figura 13, p. 71.

Fonte: LEYI, 1993, p.227.

Figura 14, p. 71.

Fonte: LEYI, 1993, p. 76.

Figura 15, p. 71.

Fonte: LEYI, 1993, p.184.

Page 133: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

141

Figura 16, p. 71.

Fonte: LEYI, 1993, p. 209.

Figura 17, p. 71.

Fonte: LEYI, 1993, p.237.

Figura 18, p. 71,

Fonte: LEYI, 1993, p. 376.

Page 134: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

142

Figura 19, p. 72.

Fonte: LEYI, 1993, p.160.

Figura 20, p. 72.

Fonte: LEYI, 1993, p. 293.

Figura 21, p. 72.

Fonte: Wah, 1980, p. 195.

Page 135: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

143

Figura 22, p. 73.

Fonte: Wah, 1980, p. v. ‘tradução nossa’.

Page 136: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

144

Figura 23, p. 74.

Fonte: Wah, 1980, p. vii. ‘tradução nossa’.

Page 137: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

145

Figura 24, p. 76.

Classificação Sダn Sh┣, 1- Pictogramas (caracteres primitivos) Xiáng Xíng (formas de

imagens/desenhos) 2- Ideogramas (símbolos indiretos ) Zhり Shì (conceitos e idéias abstratas) 3- Ideo-fonogramas Xíng Shパng (ideogramas+sons)

Classificação Liú Shu 4- Associações Huì Syi 5- Símbolos interpretados Zhuan Zhi 6- Pronúncia por empréstimo Jia Jiè Capítulo 4.2.

Figura 25, p. 106.

Fonte: Wah, 1980, p. 1.

Page 138: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

146

Figura 26, p. 106.

Fonte: Wah, 1980, p.2.

Figura 27, p. 107.

Fonte: Wah, 1980, p. 47.

Page 139: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

147

Figura 28, p. 107.

Fonte: Wah, 1980, p. 50.

Figura 29, p. 108.

Fonte: Wah, 1980, p. 10.

Page 140: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

148

Figura 30, p. 108.

Fonte: Wah, 1980, p. 121.

Figura 31, p. 108.

Fonte: Wah, 1980, p.91.

Page 141: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

149

Figura 32, p. 108.

Fonte: Wah, 1980, p. 13.

Figura 33, p. 108.

Fonte: Wah, 1980, p. 33.

Page 142: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

150

Figura 34, p. 109.

Fonte: Wah, 1980, p. 26. Figura 35, p. 109.

Fonte: Wah, 1980, p. 2.

Page 143: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

151

Figura 36, p. 110.

Fonte: Wah, 1980, p. 15.

Figura 37, p. 110.

Fonte: Wah, 1980, p. 6.

Page 144: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

152

Figura 38, p. 112.

Fonte: Wah, 1980, p. 7.

Figura 39, p. 112.

Fonte: Wah, 1980, p. 14.

Page 145: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

153

Figura 40, p. 113.

Fonte: Wah, 1980, p. 19.

Figura 41, p. 113.

Fonte: Wah, 1980, p. 20.

Page 146: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

154

Figura 42, p. 114.

Fonte: Wah, 1980, p. 95.

Figura 43, p. 114.

Fonte: Wah, 1980, p. 99.

Page 147: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

155

Figura 44, p. 114.

Fonte Wah, 1980, p. 95. Figura 45, p. 115.

Fonte: Wah, 1980, p. 99.

Page 148: INTRODUÇÃO DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO … · suíço Jean Piaget, e o teórico bielo-russo Liev Vygotsky, sobre o desenvolvimento da inteligência humana. DOCUMENTO

156

Figura 46, p. 116.

Fonte: Wah, 1980, p. 79.