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INTRODUÇÃO 1 - CONTEXTO HISTÓRICO ATUAL SOBRE O TEMA Já se passaram doze anos da promulgação da Constituição Cidadã 1 e no que diz respeito ao seu capítulo de Políticas Urbanas, pouco se fez de lá para cá, para a sua regulamentação e viabilidade jurídica, técnica e principalmente política, especialmente em seus artigos correspondentes ao que se denominou de Uso Social da Propriedade Urbana 2 . Em muito boa hora estamos acompanhando, desde o ano de 1999, as discussões e debates promovidos pela Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados , liderados pelo deputado federal do Ceará Inácio Arruda, e por meio dos debates junto ao PC do B sobre esta necessária e muito tardia regulamentação. Assim é que a aprovação que se concretizou junto àquela comissão parlamentar no dia 01/12/99, em Brasília, que resultou no importantíssimo documento do Estatuto das Cidades 3 , acompanhado da 1.ª Conferência das Cidades e do documento A Carta das Cidades 4 , parece-nos hoje ser um marco histórico de instrumentação legal na tentativa de aprofundar uma verdadeira Reforma Urbana no Brasil, “revolucionária mesmo”, como colocou o Prof. Dr. Flávio Villaça, em sua palestra na conferência 5 . A mesma avaliação foi feita por muitos que lá estiveram presentes, dentre eles os Professores Doutores Flávio Villaça, Cândido Malta Campos, Raquel Rolnik, Ermínia Maricato, Aziz Abi 1

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Page 1: INTRODUÇÃO HISTÓRICA, TEÓRICA E METODOLÓGICA  · Web view- LEFEBVRE, Henri. A cidade do capital. Tradução de Maria Helena Rauta Ramos e Marilene . Jamur. Rio de Janeiro: DP&A,1999.180p

INTRODUÇÃO

1 - CONTEXTO HISTÓRICO ATUAL SOBRE O TEMA

Já se passaram doze anos da promulgação da Constituição Cidadã1 e no que diz respeito ao seu capítulo de Políticas Urbanas, pouco se fez de lá para cá, para a sua regulamentação e viabilidade jurídica, técnica e principalmente política, especialmente em seus artigos correspondentes ao que se denominou de Uso Social da Propriedade Urbana2. Em muito boa hora estamos acompanhando, desde o ano de 1999, as discussões e debates promovidos pela Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados , liderados pelo deputado federal do Ceará Inácio Arruda, e por meio dos debates junto ao PC do B sobre esta necessária e muito tardia regulamentação. Assim é que a aprovação que se concretizou junto àquela comissão parlamentar no dia 01/12/99, em Brasília, que resultou no importantíssimo documento do Estatuto das Cidades3, acompanhado da 1.ª Conferência das Cidades e do documento A Carta das Cidades4, parece-nos hoje ser um marco histórico de instrumentação legal na tentativa de aprofundar uma verdadeira Reforma Urbana no Brasil, “revolucionária mesmo”, como colocou o Prof. Dr. Flávio Villaça, em sua palestra na conferência5. A mesma avaliação foi feita por muitos que lá estiveram presentes, dentre eles os Professores Doutores Flávio Villaça, Cândido Malta Campos, Raquel Rolnik, Ermínia Maricato, Aziz Abi Saber, entre outras tantas autoridades políticas6, intelectuais7, de entidades de classe8, delegação de estudantes de Urbanismo e Arquitetura da UNESP – Bauru ( única delegação de estudantes lá presentes e que tivemos a responsabilidade de organizar e acompanhar), e principalmente uma representação muito expressiva de entidades e militantes ligadas às Associações de Moradores9 espalhadas por todos os Estados brasileiros ali representados.

Em 2001, participamos do 1.º Fórum Social Mundial de Porto Alegre com uma delegação de professores e estudantes que desenvolvem seis trabalhos de extensão na UNESP - Bauru, aprofundando uma visão crítica da relação entre a Sociedade e a Universidade Pública. Lá apresentamos da oficina coletiva

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Universidade Pública e Participação Popular10, cujo tema era Urbanismo: Planos Diretores Populares de Bairros. Também participamos de Conferências11 e oficinas12 em mais alguns esforços na divulgação, aprofundamento e luta política para a aprovação no Senado do Estatuto da Cidade, incluindo abaixo-assinados, envio de carta por correio eletrônico e outras formas de pressões populares sobre os deputados e senadores. Vivemos essa expectativa de sensibilização, pouco provável sem que haja alterações substanciais no texto para a aprovação final dessa importante lei para as cidades brasileiras. Vale aqui, a título de registro, dizer que mesmo historiadores e urbanistas internacionais que tiveram acesso a esse documento o vêem como muito avançado comparado a outros países. É o caso do prof. de Planejamento Urbano da Columbia University dos EUA, Peter Marcuse, que se colocou naquele Fórum Social Mundial dentro de uma visão crítica profunda do regime capitalista e das cidades geradas por ele, defendendo a posição do socialismo e a revisão da forma de concepção, produção e apropriação das cidades com qualidades para a maioria da sua população, hoje excluída e segregada das mesmas. Para ele, o “Estatuto da Cidade seria a melhor legislação urbana do mundo13 caso de fato aprovado na sua íntegra”.

A discussão do Estatuto da Cidade parece-nos ter despertado e integrado nesse momento uma corrente de intelectuais, membros de entidades civis, organizações e associações de moradores, professores e universitários, políticos ligados a partidos de esquerda, ONGs, que vêm de diversas lutas sociais pela habitação, pela melhoria da qualidade de vida urbana nos transportes, no meio ambiente, contra a especulação imobiliária, por saneamento, infra-estruturas, emprego, etc., que sentem que hoje a cidade é o protagonista da vida humana, pois concentra a maioria da população do Brasil, dos países capitalistas e do mundo 14 e que esta lei representa a possibilidade de uma verdadeira e profunda reforma urbana no Brasil; e que, se essa “questão fundiária urbana ainda não tem a expressão do campo é porque nas cidades a invasão de terras é permitida e não fiscalizada nas áreas de preservação permanente”15 , no dizer da Professora Doutora Ermínia Maricato, durante sua conferência no Fórum Social Mundial. A mesma professora expôs também seu sentimento de felicidade em relação a esta intensa discussão promovida na atualidade por essas forças sociais sobre as

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cidades naquela mesma ocasião, ou seja: “ finalmente a questão urbana entrou na agenda política da esquerda”16.

Diremos que, de uma forma objetiva, o Estatuto da Cidade, seja como documento-síntese mas principalmente como regulamentação de lei, norteará e possibilitará aos gestores públicos municipais, às secretarias de planejamento, aos prefeitos, aos responsáveis jurídicos e econômicos das prefeituras, às comunidades organizadas em torno da luta por moradia, por infra-estruturas, equipamentos públicos e questões ambientais diversas, uma alteração significativa no embate por conquistas desses equipamentos e qualificações urbanísticas, tendo em vista estar sendo legalizada e legitimada de forma clara e expressa a sobreposição dos interesses e direitos públicos e coletivos sobre os interesses e direitos privados individuais17. Isto caso seja de fato aprovado na sua íntegra como desejamos; certamente que haverá muita luta contrária formada por conchavos e união de grandes empresas de construção e grandes especuladores de terras urbanas, intermediários e agentes imobiliários especulativos,

Esse documento possibilitará também profundas reflexões em torno de futuras pesquisas acadêmicas, os seus significados mais profundos, suas amplas possibilidades de agora os interesses públicos nas gestões das cidades de fato serem a causa do poder municipal, na sua relação com a iniciativa privada e a população, podendo se dirigir para a maior parte desta, aquela mais carente, que tem sido alijada de qualquer benefício maior, sendo segregada e mesmo sitiada, exilada ou “isolada nas periferias” 18 urbanas dos grandes centros, tendo em vista que em decorrência da pobreza e desemprego estrutural19, não possui condições de sair de seus próprios bairros20.

Dessa forma , historiando, mas buscando entender a possível importância desse documento para o futuro das nossas cidades, não poderíamos deixar de colocar que talvez seja ele a síntese do que de mais importante se produziu até aqui no País para na prática dar condições jurídicas e políticas para uma gestão de terras urbanas ou uma autêntica reforma urbana.

De certa forma, não nos escapa, apesar de não ser o nosso foco central de análise nesta tese, que esse documento, emblematicamente, polariza e contrasta por diversas razões e significados com a Lei 601 de 1850, a 1.ª Lei de Terras do Brasil. Assim, ao contrário do aliançamento subalterno da lei de terras com os interesses capitalistas naquele momento histórico e hoje quando entendemos estar vivendo no contexto brasileiro e mundial dentro da

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corrente hegemônica econômica, social, política e cultural da era do globalismo21, o Estatuto da Cidade e sua discussão parece-nos ser verdadeiramente paradoxal22, e portanto, será capaz de produzir o germe e a força da resistência ou da contra corrente à força hegemônica, capaz de historicamente combater aquilo que para alguns parece ser inquestionável, ou já o fim da história23.

Ao contrário ainda da 1.ª Lei de Terras, só a título de exemplo, o Estatuto da Cidade procura privilegiar o interesse público sobre o privado, bem como procura contemplar os interesses de uma maioria da população segregada e espoliada, de fato, contra os interesses de uma minoria formada por uma elite econômica exploradora.

É importante constatar de forma objetiva que no Brasil entre os anos de 1995 e 1999, portanto dentro do período por nós escolhido para o aprofundamento da realidade de Bauru, foram produzidas cerca de “4,4 milhões de moradias, sendo que desse total 3,7 milhões foram produzidas fora do mercado, sem registros ou qualquer aprovações oficiais e apenas 0,7 milhões foram produzidas dentro do mercado tradicional24.

Outro quadro inquestionável apresentado pela doutora Ermínia Maricato é o percentual de população que vive em favelas atualmente nas maiores capitais do Brasil, ou seja: 20% no Rio de Janeiro; 28% em Fortaleza; 20% em Belo Horizonte; 33% em Salvador; 20% em Porto Alegre; 40% em Recife e 20% em São Paulo, perfazendo um total de mais de 22 milhões de pessoas morando em favelas nessas capitais25. Assim, essa realidade nua e crua das cidades convive com duas formas de apropriação do solo, uma oficial, legal, que possui até planos diretores, a cidade do mercado, a outra com radical flexibilidade nas periferias, um território sem leis, não citado e das não casas26. Estas últimas quase sempre ocupando de forma irregular áreas com problemas ambientais, nos morros, nas cabeceiras de córregos e rios, nas áreas de preservação permanente. Para esses 22 milhões, dada sua expressão, não podemos dizer que houve invasão de terras, mais que isso, temos que falar em direito à invasão ,27 pois a falta de espaço ou de habitação, no caso, representam um todo de uma sociedade em que uma série de problemas sociais não são resolvidos pelo mercado28.

Em Bauru, hoje uma cidade de cerca de 320 mil habitantes, perto de 11 mil habitantes vivem em favelas, segundo dados oficiais29, quase sempre nas beiras e cabeceiras de córregos, em áreas de preservação ambiental. Além disso, vários são os assentamentos

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promovidos pela prefeitura no passado ocupando áreas públicas sem que nenhuma regularização das terras tenha sido promovida. São os casos da Vila Santa Terezinha, do Jardim Nicéia, do bairro Ferradura Mirim e da área pública próxima à favela São Manoel.

Uma grande população vive com imensos problemas ambientais de diversos tipos por falta de infra-estruturas em loteamentos executados antes da lei 6766/79, num conjunto de áreas loteadas que ultrapassam cerca de 46% da cidade30 e que foram promovidas por especuladores urbanos, alguns deles ex-prefeitos ou vereadores e que se destinam para famílias humildes que querem fazer suas casas por autoconstrução; são os casos dos bairros Jaraguá, Santa Edwirges,

17 - SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro - 2.ª edição, São Paulo, Ed. Malheiros, 1995. 421 pg.

1 - BRASIL, Constituição. Constituição Federal Brasileira de 1988. O título de Constituição Cidadã foi popularizada a partir do discurso de sua aprovação feito pelo deputado federal Ulisses Guimarães, que presidiu os trabalhos do seu feitio.

2 - Ibid. Art. 21- Da Ordem Econômica e Financeira. Política Urbana; Art. 182 e Art. 183.

3 - BRASIL, Lei 5788/90. Estatuto da Cidade. Projeto de Lei do Senado 181/89 ( Senador Pompeu de Souza) denominado de Estatuto da Cidade, que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição federal e estabelece diretrizes gerais de Política Urbana. Aprovado no Senado Federal, o projeto vai para a Câmara dos Deputados em 1990, na Forma do Projeto de Lei 5788/90, tendo tramitação lenta a partir daí, sendo lá aprovado apenas em dezembro de 1999 na Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior ( com atuação destacada do Deputado federal pelo PC do B Inácio Arruda que presidiu os trabalhos), aprovado novamente no Senado em junho de 2001 e sancionado pelo Presidente da República em 10 de julho de 2001.

4 - HABITAR. Revista da CONAM ( Confederação Nacional das Associações de Moradores); N.º 2, São Paulo, Fev. 2000, pg. 17 a 20.

5 - VILLAÇA, Flávio. Sobre os Planos Diretores. In: CONFERÊNCIA DAS CIDADES, 1.ª, Dez. 1999, Brasília. Anais. Brasília : Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados, 1999.

6 - CONFERÊNCIA DAS CIDADES, 1.ª, Dez. 1999, Brasília . Anais. Brasília : Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados, 1999. Os debates da 1.ª Conferência das Cidades contaram com muitas autoridades políticas nacionais, destacando-se os políticos dos partidos de esquerda como do PC do B , PT e PSB liderados pelo deputado federal Inácio Arruda, do PC do B do Ceará.

7 - Ibid.

8 - Ibid.

9 - Ibid.

10 - FÓRUM SOCIAL MUNDIAL, 1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. A oficina coletiva da UNESP –

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Tangarás, Vila Aviação, Jardim Manchester, Vânia Maria, Parque Viaduto e tantos outros.

...........( Figura 1 – bairros pobres e com problemas de infra-estruturas)

Bauru, Universidade Pública e Participação Popular foi apresentada no dia 29/01/2001 no 1.º Fórum Social Mundial de Parto Alegre e contou com a integração dos seguintes trabalhos: Urbanismo: Plano Diretor Popular de Bairros; Educação: Utopia e Contra-Ideologia; Direitos Humanos e Cidadania; Comunicação Popular e Protagonismo Social; Classes populares e Universidade pública: Resistência e Construção da Contra-hegemonia Popular; Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo.

11 - FÓRUM SOCIAL MUNDIAL, 1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Conferências Participadas em:26/01 – Quais são os fundamentos da democracia e de um novo poder?; 27/01 – Como garantir o caráter público dos bens comuns à humanidade, sua desmercantilização, assim como o controle social sobre o meio ambiente?; 28/01 – Qual o futuro dos estados nações?; 29/01 –Como construir cidades sustentáveis?

12 - FÓRUM SOCIAL MUNDIAL,1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Oficinas participadas em: 26/01 – Experiências de Orçamento Participativo; 27/01 – Cidades Justas e Democráticas; 28/01 – Cidadania, Gestão Democrática das Cidades – Instrumentos da Reforma Urbana.

13 - MARCUSE, Peter. Palestra da oficina Cidadania, Gestão Democrática das Cidades – Instrumentos da Reforma Urbana, Trabalho apresentado ao FÓRUM SOCIAL MUNDIAL,1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Porto Alegre 2001.

14 - MIRANDA, Rosana Helena. A “ era das cidades” no contexto neoliberal. São Paulo: Ativo Nacional do Movimento Comunitário do PC do B realizado em 17/05/97.

15 - MARICAT0, Ermínia. Citação sobre o “ Direito à Ocupação ” , Trabalho Apresentado na Conferência sobre Como Construir Cidades Sustentáveis, proferido no dia 29/01/2001 no FÓRUM SOCIAL MUNDIAL,1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Porto Alegre 2001.

Metrópole na Periferia do Capitalismo; São Paulo, HUCITEC, 1996, pg. 58 a 70.

16 - Ibid.

18 - SANTOS, Milton. Metrópole Corporativa fragmentada. São Paulo, Nobel, 1990.

MARICATO, Ermínia . Metrópole na Periferia do Capitalismo; São Paulo, HUCITEC, 1996, pg 73 a 95.

19 - IANNI, Octávio. A era do globalismo. 3.ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997. 304p.

20 - SANTOS, Milton. Metrópole Corporativa fragmentada. São Paulo, Nobel, 1990.

21 - IANNI, Octávio. A era do globalismo. 3.ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997. 304p.

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Desse conjunto de pessoas, grande parte integra os cerca de 5% dos habitantes que vivem na indigência e 25% situam–se abaixo da 22 - NAISBITT, John. Paradoxo Global. São Paulo: Abril Cultural, 1992.

23 - SCHMIED - KOWARZIK, Wolfdietrich. Sobre o sentido e o fim da história. Tradução de Wolfgang Leo Maar. Apresentado no XX Congresso Internacional Hegel, 24 a 28 de agosto de 1994, Budapeste e Debrecen. Hungria 1994. 13p.

24 - MARICAT0, Ermínia. Citação sobre a produção habitacional no Brasil. Trabalho Apresentado na Conferência sobre Como Construir Cidades Sustentáveis, proferido no dia 29/01/2001 no FÓRUM SOCIAL MUNDIAL,1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Porto Alegre 2001.

Metrópole na Periferia do Capitalismo; São Paulo, HUCITEC , 1996, 141 p.

25 - Ibid.

26 - Ibid.

27 - Ibid.

28 - Ibid.

29 - JORNAL DA CIDADE. Favelas crescem e assumem “cara” de bairro. JC nos Bairros: Bauru, 01 de julho de 2001, p.1.

30 - JORNAL DA CIDADE. Mais de 46% da cidade não têm asfalto. JC nos Bairros: Bauru, 29 de

abril de 2001, p 2.

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linha de pobreza31, perfazendo um total de 96 mil pessoas. Esses bairros formam uma franja urbana periférica, muitos são segregados da área central mais adensada por vários vazios urbanos especulativos, valorizados por infra-estruturas básicas públicas e transporte coletivo inserido ao seu redor . Vazios urbanos que na sua totalidade perfazem cerca de 50% da área urbana. Nesse sentido e só por esses exemplos o Estatuto da Cidade toma significados importantes em nível de Brasil no geral e em Bauru, em particular.

Brota assim, ou melhor, é possível estar brotando no Brasil, depois de curtido a lutas sociais, pobreza, falta de habitação, segregação e violências mil, pelo país afora, especialmente nas metrópoles32, um cogumelo de esperança, capaz de fazer renascer, mais uma vez, um sentido de direitos sociais, coletividade e solidariedade, num país injusto para com a maioria de seu povo e privilegiador das suas elites embasbacadas, que continuam a olhar apenas para o outro lado do oceano33.

O Estatuto da Cidade , mais que a formulação de leis novas, formará um corpo jurídico, dentro do direito urbanístico ainda pouco compreendido e explorado, que dará coesão dinâmica a um sistema de normas e leis34, que deverão ser compreendidas, aprofundadas, trabalhadas e principalmente reivindicadas nas lutas sociais por aqueles que buscarão os seus direitos sociais. Hoje temos planos e leis abundantes, o que não temos é uma correlação de forças numa sociedade marcada pelo patrimonialismo, onde o poder político está nas mãos dos grandes proprietários e os direitos sociais acontecem apenas para alguns. Temos no Brasil portanto uma privatização do poder 35.

Abre-se, assim, uma perspectiva nova, para uma retomada da formação de consciência coletiva crítica junto às populações urbanas populares e mais carentes, sobre seus direitos sociais e sobre o direcionamento das suas lutas organizadas pela qualificação do seus espaços de viver coletivo e individual. Legitima e legaliza as lutas pela terra urbana e dá condições de diálogo, de direito ou mesmo de confronto para uma interlocução em vantagem com o poder público e principalmente com os proprietários de terras especulativas. Assim retoma, ao nosso ver, um sentido de inclusão social e de cidadania para essa gente, meio que colocada à margem pelo pensamento hegemônico da época36, ou seja: permitirá a organização dessa gente no sentido de pertencer a uma classe social, ou como queiram alguns, a uma tribo37, com necessidades claras, objetivos claros, metas claras

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e direitos claros a serem atingidos, sabendo claramente quem são seus aliados e opressores, podendo ter estratégias e operações bem definidas para a luta por qualificação da sua vida no espaço das cidades. Isso porque os instrumentos como o Uso Capeão Coletivo, o Direito de Preempção, a separação entre o direito de propriedade do solo do direito de construção, a necessidade do Estudo de Impacto de Vizinhança, o Parcelamento Compulsório da Terra e o IPTU Progressivo entre outros, uma vez aprovados, certamente servirão de estímulo, pelo país afora para legalizar e facilitar uma maior socialização da terra urbana, bem como minimizar sobremaneira os efeitos da especulação imobiliária.

Retoma-se também nesse documento, com perspectivas a essa maior qualificação objetiva, a idéia de Planos Diretores, “que até aqui no Brasil, sempre serviu à classe dominante para escamotear os seus interesses, demarcar seus territórios e colocar uma cortina de fumaça sobre as reivindicações verdadeiramente populares e de interesse da população mais humilde, nunca serviu para nada”38. Agora se coloca a idéia de Planos Diretores Participativos e Democráticos39 como coisa obrigatória e mesmo se levanta a idéia mais participativa e próxima das comunidades de execução de Planos Diretores Participativos de Bairros40, experiência que temos executado pioneiramente em Bauru, desde 1997, especialmente com bairros populares como o Santa Edwirges, Jaraguá, Vânia Maria e Imediações; a Pousada da Esperança I e II, Vila São Paulo, Gasparini, Índia Vanuíre, Jardim T.V., Parque City e Colina Verde. Também com os bairros Camélias, Flamboyants, Geisel, Jardim Marambá, Vila Engler e toda a área relacionada com o futuro Parque da Água Comprida ( o que será aprofundado no anexo desta tese). Essa experiência tem possibilitado um melhor diálogo de igual para igual entre essas comunidades e os poderes municipais, invertendo a ordem consagrada historicamente da visão tecnocrática, paternalista ou assistencialista41, bem como tem possibilitado organizar e pautar a luta popular por reivindicações de curto, médio e longo prazos, estabelecendo de forma participativa o estabelecimento de prioridades das necessidades da comunidade, e ainda, um antever e organização para lutas sobre seus direitos sociais, buscando integrar instituições de defesa dos seus direitos nessas lutas42. Assim, esse trabalho vem se intensificando e aprofundando em Bauru, tornando a lógica dessas conquistas de melhoria da qualidade........................................................( Figura 2 – Plano Diretor de Bairro)

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de vida mais estruturais que episódicas ou localizadas.Reforça-se e modifica-se, assim, o conceito de Plano Diretor,

que terá o amparo legal e político de atuação das comunidades, obrigação mesmo43, dando liberdade às comunidades locais das cidades para definir social, política, econômica e fisicamente os seus interesses e limitações, interesses estes que somente por meio da efetiva organização política e na conscientização popular ficarão demarcados e possibilitarão de fato uma gestão transparente, participativa e legítima. Nem a lei maior, nem os planos por si só, nem qualquer governo ou forma de gestão centralizada ou tecnocrática44

serão capazes de solucionar os impasses e as necessidades sociais, econômicas e físicas genuínas da população , especialmente da sua maior parte que é a mais carente.

Assim é que, atualizado e reforçado ideológica e teoricamente pelas discussões sobre o Estatuto das Cidades, a 1.ª Conferência das Cidades, a Carta da Cidade e o seus aprofundamentos no 1.º Fórum Social Mundial, já tendo esses documentos como propostas referenciais práticas a serem implementadas, antes de prosseguirmos nossa tese queremos fazer, de forma crítica, algumas breves considerações teóricas mais gerais sobre o que entendemos ser o

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significado e os papéis desses documentos para um processo de crítica e de transformação das bases capitalistas de produção, distribuição e consumo dos espaços das cidades .

É preciso considerar que toda essa movimentação e articulações de forças sociais e políticas em torno das questões da terra e da qualificação urbana, que já representa um grande esforço de integração e articulação de diversas lutas distintas históricas, estão acontecendo dentro dos espaços possíveis e contraditórios de uma sociedade capitalista.

Portanto, devem ser considerados como “implantes socialistas”45, assim como inúmeras outras lutas e ações isoladas dentro do Brasil de caráter urbano ou rural. Neste último caso podemos colocar de forma significativa o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

Acreditamos no entanto, e concordamos com João Machado, que esses “ implantes socialistas” são formas de organização e instituições que se orientam para satisfação de necessidades sociais e se contrapõem à lógica do mercado capitalista46. Devemos definir seu desenvolvimento como um dos eixos de nossa estratégia, porém acreditamos que esses “implantes” têm uma fragilidade básica: seu caráter estará sempre em risco enquanto estiverem no interior do capitalismo. Estão permanentemente sujeitos à descaracterização como aconteceu no complexo de Cooperativas de Mondragón, formado a partir do País Basco, após a entrada do Estado espanhol na Comunidade Européia e a pressão para “aumentar a competitividade”47. Também os Kibutzim de Israel são outra experiência cooperativa que passa por problemas desse tipo48.

Esta lógica, com todos os riscos às descaracterizações tratadas pelo autor no trabalho citado, de ir reforçando através dos “implantes” as condições de lutas para atingir o socialismo, seja qual for nossa concepção de socialismo, serão tanto melhores quanto mais criarmos formas sociais que signifiquem progresso na organização dos trabalhadores. Essa forma de começar a construir o socialismo de baixo para cima vai no sentido proposto por vários autores, entre eles Paul Singer 49.

Nesse sentido, pode-se falar em três tipos de lutas que podem ser desenvolvidas hoje, ou seja, ainda dentro do capitalismo, e que podem reforçar “implantes socialistas” e colocar a luta pelo socialismo em um patamar superior50. O primeiro é a luta pelo desenvolvimento de formas de economia solidária, o segundo é a luta por mudanças na relação capital-trabalho nas próprias empresas capitalistas, no sentido

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de ampliar os direitos dos trabalhadores e de questionar o exagero de “direitos” que a propriedade capitalista confere aos capitalistas. Hoje em dia, aliás, os capitalistas estão lutando para aumentar ainda mais esses “direitos” abusivos; é o que ocorre, por exemplo, quando tentam reduzir a legislação trabalhista, facilitar as demissões, em suma, cortar todos os entraves para o capital poder fazer o que bem entende. Temos de defender medidas que vão exatamente na direção oposta. O terceiro tipo são as lutas para mudar o caráter do Estado, para democratizá-lo e criar cada vez mais formas de participação popular e de controle social sobre o seu funcionamento. O Orçamento Participativo51 é até agora o melhor exemplo de um “implante socialista” desse tipo52.

É dentro desse terceiro tipo de “implante socialista”, de uma forma geral, que colocamos também algumas ações de gestão e projetos urbanos por nós desenvolvidos em Bauru entre o início do ano de 1993 e final de 1995, quando ocupamos o cargo de secretário de Planejamento da Prefeitura de Bauru, sejam as ações barradas politicamente pelo prefeito, portanto mal sucedidas, de formulações de legislações de limitações da propriedade privada do solo urbano, que incluíram um projeto de implantação de IPTU progressivo para vazios urbanos. Foi o caso, também, de um projeto de Permuta de Benefícios entre público e privado visando a busca de uma contrapartida social para empreendimentos que ultrapassassem o valor básico fixado para coeficiente de aproveitamento e taxas de ocupação para a cidade; ou da busca que empreendemos da implantação de um Plano Diretor verdadeiramente participativo e popular para a cidade, que afinal nos foi impossibilitado pelo prefeito e que foi um dos motivos da nossa decisão unilateral de entrega do cargo de secretário. Houve também ações bem sucedidas de gestões de terras urbanas na relação entre o Poder Municipal e a iniciativa privada, especialmente com os donos de terras quando da construção de sistema viário e outros equipamentos urbanos, como no caso da operação urbanística que empreendemos para a construção da Avenida Jânio Quadros ( Av. D`Oeste), Avenida Nações Unidas Norte, Avenida Lúcio Luciano e prolongamento da Avenida Duque de Caxias, quando foram conquistados cerca de 400 mil metros quadrados de terras sem qualquer ônus para o Poder Público, que em valores de hoje, no caso de uma desapropriação tradicional, valeriam cerca de 12 milhões de reais ou o correspondente à possibilidade de execução de 70 equipamentos públicos como escolas, creches, postos de saúde ou praças, e certamente o dobro

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disso quando terminadas as obras. Mencionamos ainda as ações de formulações de projetos urbanísticos de loteamentos populares que fizemos, como o de desfavelamento (Núcleo Fortunato Rocha Lima) para cerca de 1250 moradias ou o da Vila Tecnológica, quando privilegiamos o coletivo da população e a clareza da defesa dos espaços públicos em relação aos espaços privados daqueles projetos, bem como todo um critério técnico correto de preservação ambiental, evitando erosões e voçorocas pela melhor organização espacial dos conjuntos em relação à topografia do terreno. Esses projetos que teremos a oportunidade de citar em maior profundidade nos próximos capítulos como contraposição ao que estamos demonstrando da lógica urbanística e de gestão tradicional do período estudado, constituem–se como “Projetos Exceções”, onde o sentido e o interesse público se sobrepuseram ao interesse privado.

Podemos dizer que também as nossas experiências de realização atual de Planos Diretores Populares de Bairro na cidade de Bauru se enquadram nessa forma de implante socialista de terceiro tipo tratado anteriormente, bem como é desse caráter e com amplitude, potencial e coesão maiores para uma luta de implantação de medidas pensadas como já tendo um caráter socialista o documento do Estatuto da Cidade.

Finalizando, queremos ressaltar que temos certeza das limitações e possibilidades de descaracterização desses “implantes socialistas” na sua prática e jogo dentro das correlações de forças do capitalismo, mas não concordamos com aqueles, mesmo de esquerda, que caem na armadilha de dizer que a correlação de forças atual não permite defender um programa socialista.

Se queremos que o desenvolvimento econômico , social, cultural e físico no sentido urbanístico e arquitetônico se dêem de fato segundo uma orientação anticapitalista, a luta contra a lógica do mercado tem de ser permanente53. Se para muitos problemas é difícil encontrar ainda solução, será que devemos a partir desses “implantes socialistas” crescentes, encontrar formas, alguma coisa que potencialize sua contribuição à luta socialista e reduza o risco de descaracterização54? A hipótese levantada por João Machado é de que para que estes implantes socialistas contribuam para a superação do capitalismo, há a necessidade da existência de um movimento político-cultural socialista amplo, que lhes sirva de referência, e no qual se integrem55. Não apenas um movimento político, mas um movimento com um caráter muito mais ideológico e cultural, que

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travasse uma disputa nestes termos na sociedade. Que fosse capaz de discutir e contrapor novos critérios de eficiência compatíveis com uma racionalidade mais ampla, voltada para os objetivos da sociedade como um todo. Para que se possa questionar, na prática, o uso de critérios de eficiência de mercado, é preciso construir um movimento que seja uma referência tão forte que torne o fato de ser bem - sucedido do ponto de vista desse movimento mais compensador, para muita gente, do que, por exemplo, ter uma renda mais alta. Será difícil avançar em direção ao socialismo se não construirmos um movimento que recupere alguns conteúdos ideológicos clássicos do movimento socialista. Sem a construção de um movimento político-cultural desse tipo, não vejo como os “implantes socialistas” existentes escapariam da tendência a se descaracterizar e a ser engolidos pelo mercado, isto é, pelo capitalismo, sob o peso da pressão dos critérios capitalistas de eficiência e das conseqüências da inevitável divisão social do trabalho56.

Por último, entendemos que, além da formação de uma base a partir desses “implantes socialistas”, é necessária a construção propositiva e estratégica de uma união de forças convergentes, hoje dissipadas e mesmo segregadas, até mesmo dentro dos próprios partidos políticos que desejam profundas transformações na sociedade e que esse conhecimento e sentimento atinjam as classes trabalhadoras, as grandes massas necessitadas e excluídas do País, as instituições, sindicatos e os intelectuais orgânicos comprometidos com essas transformações.

Não cremos, pois, que temos saída para essa situação no plano puramente teórico. O próprio Marx ensina que existem problemas que não tem solução nesse plano. Dependemos de um trabalho político, de arregimentação, mobilização e conscientização dos setores majoritários da sociedade57.

Lutamos para construir um novo bloco que, pela primeira vez no Brasil, possa representar diretamente a grande maioria da nossa população. Isso significa, antes de tudo, a união social do povo, em função da qual devem estar as alianças políticas, como expressões dos setores a serem unificados. Essa plataforma necessita modificar substancialmente as relações de poder que se articulam em torno dos eixos nevrálgicos da sociedade brasileira – a propriedade social da terra, a democracia nos meios de comunicação de massas, a superação da asfixia provocada pelas dívidas internas e externas, entre outros. Em torno dela se requer a mobilização e adesão

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profunda das amplas maiorias do País, para que possam ser enfrentadas as represálias que os setores privilegiados desatarão contra um governo democrático e popular 58.

Por último, nada substitui a disposição de lutar para ganhar, a vontade de derrotar as elites responsáveis pelas injustiças, pela exploração, pela apropriação privada dos bens públicos, pelo abandono de qualquer sentimento de solidariedade social, expressos no encaminhamento acelerado de uma sociedade de apartheid cada vez mais configurada entre nós. Ter o direito a triunfar supõe a vontade de triunfar, a disposição ao sacrifício para construir essa imensa força hegemônica dos explorados, oprimidos e humilhados, cuja superioridade social, política e moral é a única garantia de vitória da revolução democrática, sem a qual o poder continuará a ser sinônimo de espoliação, alienação e domínio das minorias59.

O caminho proposto nos dois últimos parágrafos por Emir Sader, em O poder, cadê o poder?60, parece-nos indicar a formação de uma base, forma de luta e superação do capitalismo pelas vias do que ele chama de revolução democrática. Será possível, acreditamos, ainda que duvidoso, mas é necessário mantermo-nos alertas e abertos durante esse processo de formação dessa base conscientizadora, mobilizadora e transformadora, para que se busque num horizonte futuro essa ruptura radical, quando num tempo correto e planejado se deva de fato e de vez cortar a cabeça do sistema capitalista.

Sistema esse que acabou com as nações, que transformou o mundo num grande cassino mundial, onde só um quinto da população é beneficiada por ele e os outros quatro quintos da população são esquecidos. Não existe democracia dentro desse sistema, existe um simulacro, a verdadeira democracia é a soberania dos povos, devemos resistir às represálias para mostrar outras possibilidades, temos que matar esse sistema se possível com paz, se não, temos que ter as portas abertas para as armas61.

É preciso lembrar sempre que “mesmo a intelectualidade mais heróica não é nada sem as massas62. Portanto, devemos buscar as condições sociais e políticas, objetivamente condicionadas no desenvolvimento da sociedade63 para essa transformação, mesmo que para tanto, para esse momento, seja necessário que esta reação adquira um caráter de massa, tenso, apaixonado e as barreiras do direito e do poder sejam derrubadas64. Na realidade, a intervenção ativa das massas nos acontecimentos constitui o elemento mais essencial da revolução65.

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Eis portanto, ao nosso ver, caminhos distintos ou complementares, apontados para os nossos novos e velhos objetivos postos para o futuro, e sobre os quais não nos aprofundaremos em nossa tese. Nos limitaremos a aprofundar alguns aspectos da compreensão crítica e interpretativa da história da acumulação capitalista sobre a organização dos espaços urbanos, dando condições de se avançar na contribuição propositiva para a formação dessa base de transformação da sociedade capitalista, mesmo que operando sobre uma parte do que aqui foi compreendido de “implante socialista”.

31 - JORNAL DA CIDADE. Combate à pobreza derrubaria preconceitos. JC nos Bairros: Bauru, 27 de maio de 2001, p.3.

32 - MARICATO, Ermínia . Metrópole na Periferia do Capitalismo; São Paulo, HUCITEC, 1996, 141 p.

33 - GUTIERREZ, Ramon. Arquitetura Latino Americana; São Paulo, Nobel ,1992.

34 - SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileira. 2.ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p.52 a 56.

35 - MARICAT0, Ermínia. Citação sobre a produção habitacional no Brasil , Trabalho apresentado na Conferência sobre Como Construir Cidades Sustentáveis, proferida no dia 29/01/2001 no FÓRUM SOCIAL MUNDIAL, 1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Porto Alegre 2001.

36 - IANNI, Octávio. A era do globalismo. 3.ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997. 304p.

37 - NAISBITT, Jonh e ABURDENE, Patrícia. Megatrends 2000; Dez Novas Tendências de Transformação da Sociedade nos anos 90. São Paulo, Amanda Key editora,1990.

38 - VILLAÇA, Flávio. Sobre os Planos Diretores. In: CONFERÊNCIA DAS CIDADES, 1.ª, Dez. 1999, Brasília. Anais. Brasília : Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados, 1999.

39 - BRASIL, Lei 5788/90. Estatuto da Cidade. Projeto de Lei 5788/90 sancionado pelo presidente da República em 10 de julho de 2001.

SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 2.ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p.95 a 98. 40 - Ibid

XAIDES, José. Anexo desta Tese: Planos Diretores Populares de Bairros. Bauru 2001.

41 - SERRA, Geraldo. Urbanização e Centralismo Autoritário. São Paulo, Nobel: Ed. da USP, 1991, 172 p.

42 - XAIDES, José. Anexo desta Tese: Planos Diretores Populares de Bairros. Bauru 2001. Dentre os exemplos de instituições em questão podemos citar Promotorias Públicas do direito da cidadania, do meio Ambiente, da Habitação e Urbanismo, os conselhos de defesa da

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2 – O DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA E SEU RECORTE CONCEITUAL

Uma vez contextualizado historicamente o tema no tópico anterior, bem como nossa ação como agente ativo na produção da cidade de Bauru por alguns anos, quando fizemos parte do Poder

infância, adolescência e juventude etc.

43 - BRASIL, Lei 5788/90. Estatuto da Cidade. Projeto de Lei 5788/90 sancionado pelo presidente da República em 10 de julho de 2001.

44 - VILLAÇA, Flávio. Sobre os Planos Diretores. In: CONFERÊNCIA DAS CIDADES, 1.ª, dez. 1999, Brasília. Anais. Brasília : Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara

dos Deputados, 1999.

45 - SINGER, Paul. Economia Socialista. Revista Socialismo em debate, São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo,2000, p. 11 a 50 e 77 a 80.

46 - MACHADO, João. Comentários. Revista Socialismo em debate, São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo,2000, p.51 a 64 e 80 a 81.

47 - Ibid.

48 - Ibid.

49 - Ibid.

50 - Ibid.

51 - Ibid.

52 - Ibid.

53 - Ibid.

54 - Ibid.

55 - Ibid.

56 - Ibid.

57 - KONDER, Leandro. O indivíduo no socialismo. Revista Socialismo em Debate. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2000, p. 48.

58 - SADER, Emir. O poder, cadê o poder?. O marxismo na América Latina: uma antologia de 1909 aos dias atuais; Org. Michael Löwy; São Paulo: Ed. Fund. Perseu Abramo; 2000, p.532 a 536.

59 - Ibid.

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Municipal queremos a partir de agora explicitar o objeto central de nossa tese sobre a história do urbanismo, no tempo e no espaço da produção social66 na cidade de Bauru, mostrando a coerência de nossa formação e as nossas experiências práticas, com o caráter público do que iremos aprofundar nessa tese, seja também colocando de forma objetiva um referencial teórico desejado a ser atingido e um referencial jurídico, considerado um “implante socialista” que estamos defendendo agora, que envolve toda a discussão sobre um possível papel, não garantido, do poder público bem delineado no documento do Estatuto da Cidade.

O desenvolvimento de nossa pesquisa, desde suas premissas iniciais formuladas para o ingresso no doutorado da FAU-USP, evoluiu em seu conteúdo e em seus recortes, dialeticamente, como seria o esperado, de acordo com a evolução dos nossos trabalhos. Para essa evolução queremos considerar, especialmente, a nossa inserção intensa, seja nos aspectos históricos e teóricos gerais, mas fundamentalmente, no conjunto de ações práticas como cidadão e professor na busca de uma reflexão e praxis orgânica67, que se propôs a estabelecer relações entre o ensino, a pesquisa e a extensão de serviços, inserindo estas ações diretamente junto a um conjunto de pessoas que representam a parcela de moradores e trabalhadores de bairros mais humildes e excluídos do maior direcionamento de investimentos públicos do Poder Municipal de Bauru, obviamente também dos investimentos privados, estes com normas urbanísticas e delimitação de espaços muito claros no contexto de Bauru68.

60 - Ibid.

61 - BELLA, Ben Ahmed. Conferência: Quais são os fundamentos da democracia e de um novo poder? Anais : Fórum Social Mundial, 1.º, 26 de janeiro de 2001, Porto Alegre.

62 - TROTSKY, Leon. A Revolução Russa: Conferência de 1932; A natureza de classe da URSS. Tradução de Silvana Foá, São Paulo: Informação, 1989. p.24.

63 - Ibid. 64 - TROTSKY, Leon. A Revolução Russa: Conferência de 1932; A natureza de classe da URSS.

Tradução de Silvana Foá, São Paulo: Informação, 1989. 90 p.

65 - Ibid.

66 - MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Moscou: Edições Progresso, 1987, 70 p.

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Nossa formulação inicial para o desenvolvimento da pesquisa, intitulada na época de “ cidades médias/ Bauru – questões urbanas! parcerias?, partia da nossa politicamente limitada e pontual mas bem realizada e intensa experiência como secretário de Planejamento de Bauru nos anos de 1993 a 199569, quando percebemos já os grandes desvios e falta de interesse político-histórico de vários governos centralizados e tecnocráticos em de fato solucionar os maiores e profundos problemas sociais, econômicos e espaciais da cidade70, que se situavam junto às camadas mais humildes da população espalhadas em bairros periféricos. Na verdade, as frases anteriores carregam consigo uma carga teórica e ideológica71 sobre o que entendemos ser hoje, mesmo dentro de um quadro da realidade econômica e política capitalista que repudiamos e queremos transformar, o papel fundamental do Poder Público Municipal, Popular e Participativo, ou seja, ser um agente coletivo a serviço da população que de fato produz a cidade e que hoje é espoliada, explorada, segregada e exilada72 em prol de uma acumulação de poucos beneficiados do sistema.

Na verdade, a formulação da pesquisa, na forma como foi feita na época, tinha em mente uma visão propositiva de ações concretas possíveis, polêmicas, contraditórias com as forças hegemônicas capitalistas urbanas, mas capazes de serem trabalhadas desde que houvesse uma gestão participativa, que fosse capaz de estabelecer uma correlação de forças sociais73 e comprometida com essas causas, 69 - BAURU. No período de jan. de 1993 a dez. 1995, ocupamos o cargo de secretário de

Planejamento da Prefeitura de Bauru a convite do prefeito eleito Antônio Tidei de Lima.

70 - XAIDES, José. Elementos para o Plano Diretor de Bauru. Trabalho trienal do Dep. de Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo da UNESP – Bauru. 1996.

71 - CHAUÍ, M. O que é ideologia. São Paulo, Brasiliense, 1987.

72 - KOWARICK, Lúcio. A espoliação urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979, 202 p.

ROLNIK, Raquel. Cada um em seu lugar. Dissertação de Mestrado, FAU USP, São Paulo 1981.

SANTOS, Milton. Metrópole Corporativa fragmentada. São Paulo, Nobel, 1990.

67 - VALE, José Misael Ferreira do. A escola pública como espaço de conhecimento, reflexão e compromisso. In: SANTOS, Milton. Cidadania e Globalização, São Paulo: Saraiva; Bauru, SP, Associação dos Geógrafos Brasileiros, 2000.p 337 a 341.

68 - BAURU. Lei de Zoneamento de 1979 e Lei Municipal 2339/82: Lei de Parcelamento do Solo Urbano.

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que contemplasse a partir do prefeito, dentro de um regime mesmo que de centralismo democrático, essa visão que, sabidamente incapaz de apenas a partir do município romper com o regime capitalista e promover a socialização dos meios de produção, seria capaz de promover avanços consideráveis na formulação de uma proposta de qualificação equilibrada dos espaços urbanos. Ela vislumbrava a aplicação da maioria dos recursos captados pelos municípios em programas e projetos, incluindo os urbanísticos, nas áreas destinadas às populações mais carentes. Assim, pretendíamos, além de levantar um conjunto estrutural de questões e problemas urbanísticos relacionados com a limitação da forma de aplicação dos instrumentos legais existentes, as formas de gestões de um poder municipal compromissado com a elite econômica74 e a falta de qualidade física dos espaços, especialmente os públicos e coletivos, causada pela limitação do planejamento onde o poder público é mero coadjuvante dos interesses especulativos privados75. Desejávamos propor formas de atuação mais eficazes e qualificadas, relativas ao trato de questões urbanísticas importantes, na área da política de parcelamento do solo urbano, do desenho urbano, na área da política de combate à especulação imobiliária, na área de prioridade dos investimentos públicos em infra-estruturas e equipamentos públicos, na área habitacional, de preservação ambiental, de legislação urbana e operações urbanísticas, de discussão e gestão democráticas e participativas da cidade e de preservação de bens culturais urbanísticos e arquitetônicos.

Partiríamos, assim, da análise histórica dos problemas selecionados, demonstrando a impossibilidade de apenas pelos elementos legais e técnicos disponíveis76 e das formas tradicionais de gestão do poder municipal utilizadas até aqui ( com raras exceções no tempo e no espaço77, que só reforçam os problemas gerais) produzir e ordenar de forma mais qualificada e justa os espaços urbanos e proporíamos soluções a algumas dessas questões.

74 - FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. Vol. 1 e 2. 5.ª ed. Porto Alegre, Globo, 1979. 750 p.

75 - XAIDES, José. Trabalho Programado 1 – Levantamento de dados sobre loteamentos privados e públicos da cidade de Bauru. Bauru, 2000.

73 - MARICAT0, Ermínia. Citação sobre a produção habitacional no Brasil , Trabalho apresentado na Conferência sobre Como Construir Cidades Sustentáveis, proferido no dia 29/01/2001 no FÓRUM SOCIAL MUNDIAL,1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Porto Alegre 2001.

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No entanto, a partir do nosso distanciamento da experiência concreta junto à Prefeitura, quanto mais nos aprofundávamos nas diversas pesquisas, nos trabalhos programados e ações concretas de ensino e interação junto com a população, fomos percebendo que a lógica normal da produção da cidade de Bauru ao longo da história reproduzia a lógica maior da produção da cidade capitalista78 como um todo. Esta lógica, portanto, foi sendo por nós desvendada de forma material e clara em várias questões e, seja pelas suas características de permanência e repetição, seja pelos aspectos quantitativos dessa produção no tempo e espaço, passaram a ser os elementos fundamentais e mais importantes a serem historiados em profundidade.

O aprofundamento sobre essa lógica da produção urbanística, interrelacionado com o que passamos a ter clareza no caminho, sobre o significado de “exceção” no tempo e no espaço da nossa colaboração na produção de obras públicas em Bauru entre 1993 e 1995, fazendo as devidas considerações sobre as limitações da mesma, permitiu-nos ir enxergando de forma cada vez mais nítida, na forma de um caleidoscópio, a relação entre as formas de gestão, a apropriação ou não dos instrumentos legais urbanísticos e a síntese qualitativa expressa pela forma urbana.

Assim, passamos a considerar a nossa realização apenas como um apoio concreto para mediar79 a nossa análise interpretativa sobre a produção da cidade de Bauru no espaço e no tempo que delimitamos e que trataremos posteriormente em capítulo específico, mas que aqui, em forma ainda de síntese, pode ser expressa como a falta de interesse do poder municipal em exercer uma gestão com as leis, prerrogativas jurídicas e conhecimento técnico e urbanístico existentes80 com o caráter verdadeiramente público81. Entenda-se este caráter como a possibilidade de por meio de processo coletivo e participativo se conquistar a satisfação da maioria mais humilde da população, aquela que não é dona dos seus próprios meios de produção nos países capitalistas82. A essa falta de interesse, omissão

78 - LEFEBVRE, Henri. A cidade do capital. Tradução de Maria Helena Rauta Ramos e Marilene Jamur. Rio de Janeiro: DP&A,1999.180p.

76 - XAIDES, José. Plano Inicial Para a Tese de Doutorado de 1996 apresentado à FAU-USP.

77 - XAIDES, José. Exceção no tempo e no espaço, dentro da qual colocamos nossa atuação no período de 1993 a 1995 quando ocupamos o cargo de Secretário de Planejamento da Prefeitura Municipal de Bauru.

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ou desvio da finalidade desse caráter público é que estaremos denominando de Voçorocas do Poder Público83.

Ao longo das nossas pesquisas, quanto mais aprofundávamos a relação entre a lei, a gestão e a forma urbanística da cidade produzida fomos percebendo que:

1 – A compreensão crítica e estrutural da história do crescimento urbano de Bauru, a Cidade Sem Limites84, e suas formas de planejamento a partir da aprovação da lei 6766 /79 até a discussão do Estatuto da Cidade, em 1999, já era ampla e suficiente à nossa tese.

2 – De forma estrutural, ou seja, na lei, na forma e na gestão urbana, duas idéias corriam sempre juntas e dialeticamente correspondentes e integradas, assim, de um ponto de vista físico, sempre estava relacionada uma questão de “disputa”85 sobre as terras urbanas com o privilégio, ênfase ou direcionamento principal para a organização dos espaços privados versus a organização dos espaços Públicos ou Semi Públicos. Do ponto de vista político e ideológico, nessa disputa, quase sempre estava relacionado o papel assumido

83 - XAIDES, José. Voçorocas do Poder Público .O sentido completo da definição Voçorocas do Poder Público, será tratado e de possível compreensão por meio de toda a conceituação trabalhada ao longo da tese, porém, num sentido simplificado imediato, usando metaforicamente a definição do termo Voçorocas como grandes erosões do solo, ou seja; a perda de material ou substância através de um processo erosivo como o promovido pelas chuvas ou ventos; aqui iremos tratar da perda de sentido, dos desvios, da omissão ou negligência no exercício do papel público do poder municipal.

84 - JORNAL DA CIDADE. Bauru ilustrado. Suplemento mensal do Jornal da Cidade, Editor Luciano Dias Pires.

79 - CAVALCANTI, Lana de Souza. A sala da aula, espaço da cidadania e do saber? O ensino de geografia e a formação do cidadão. In: SANTOS, Milton. Cidadania e Globalização, São Paulo: Saraiva; Bauru, SP, Associação dos Geógrafos Brasileiros, 2000, p 360 a 363.

SANTOS, Milton. Pensando o Espaço do Homem. São Paulo, Hucitec, 1986.

80 - SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 2.ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, 421p.

81 - Ibid.

MARX, Murillo. Cidade no Brasil terra de quem? São Paulo, Nobel – Edusp, 1991.

82 - MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Moscou: Edições Progresso, 1987, 70 p.

OLIVEIRA, Francisco; STEDILE, João Pedro e GENOINO, José. Classes sociais em mudança e a luta pelo socialismo. Revista Socialismo em Debate. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2000, 58 p.

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pelo Poder Municipal de privilegiar as elites econômicas nas formas de gestão e estruturação física do espaço da cidade.

Assim, tendo clareza do recorte central da nossa tese, queremos responder ao longo desta, a partir da relação entre os dois elementos tratados anteriormente, a seguinte pergunta: Qual foi o significado do papel do poder municipal na forma de crescimento e organização dos espaços urbanos desta cidade média, no período estudado, para qualificar ou não a vida da maior parte da sua população, especialmente aquela que não é dona dos seus próprios meios de produção e não participa de nenhuma parte da mais valia acumulada no processo de produção capitalista86?

Queremos, ao longo dos capítulos posteriores, a partir dos estudos das áreas e dos elementos conceituais selecionados para aprofundamento, comprovar a falta ou a “erosão”87 do sentido público na gestão do espaço da cidade e o comprometimento do poder municipal com os interesses privados e especulativos da sua elite econômica.

3 – DO TÍTULO, O RECORTE TEMPORAL, ESPACIAL E A SELEÇÃO DOS ELEMENTOS DE APROFUNDAMENTO DA TESE

Para atingirmos nosso objetivo nesta tese interpretativa sobre as formas de produção do espaço urbano de Bauru faz-se necessária a explicitação dos significados contidos no título e dos aspectos históricos e metodológicos que usamos para fazer os recortes temporal e espacial que adotamos para a comprovação de nossa tese88.

Voçorocas do

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Poder Público:Na lei, forma e gestão urbana na “Cidade Sem Limites”

O título selecionado, Voçorocas do Poder Público, sintetiza a idéia básica que percorrerá as análises, interpretações e conclusões dos elementos urbanísticos selecionados para estudo da cidade de Bauru, ou seja: Várias questões e problemas de planejamento urbano, na forma da aplicação das leis, na forma do desenho dos espaços e nas formas de gestão urbana da cidade de Bauru têm como hipótese o não exercício pleno do sentido público do papel do poder municipal no exercício de suas prerrogativas.

Para a compreensão devida do sentido público ao qual nos referimos e que iremos aprofundar, queremos ressaltar inicialmente que o mesmo é antagônico à compreensão histórico-crítica daqueles poderes ligados, representantes e legitimadores dos interesses das classes sociais dominantes na evolução da sociedade capitalista89. Nesse caso este poder pode ser considerado sinônimo de espoliação, alienação e domínio das minorias90.

Nossa análise crítica parte do princípio, em tese, da possibilidade histórica do exercício do poder de forma democrática e participativa por representantes da maioria mais humilde da sociedade e voltado a atender as necessidades também dessa maioria mais humilde91. Seja a parcela mais ativa da classe de trabalhadores, no caso das cidades, que não possuem os seus próprios meios de produção, seja aqueles hoje excluídos de qualquer possibilidade de acesso ao mercado de empregos capitalistas92, os excluídos de toda ordem ou os sem-sem93 . Somatório que perfaz a imensa maioria da população urbana das cidades, em Bauru principalmente94. Assim, ...São minoria os privilegiados? São maioria os humildes? é democrática uma revolução em que os humildes têm as armas? 95

A citação do texto do parágrafo anterior nos parece importante na medida em que aqui, em nossa tese, o nosso olhar interpretativo buscará compreender a realidade da produção dos espaços urbanos selecionados e os compromissos e papéis do poder municipal em sua estruturação sob o ponto de vista dessa imensa maioria da população

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mais humilde, que mais carece, que mais sofre, que pior vive, que menos possui condições de disputa sobre as oportunidades oferecidas no sistema de produção capitalista, que não possui acesso à terra, não participa das decisões sobre os meios de comunicações e que fica condicionada aos interesses oficiais e econômicos daqueles capitalistas que a dominam hoje, que mais necessita se organizar, se revoltar e agir na busca de mudanças verdadeiras e profundas, pois não tem de fato muito o que perder.

Sob o ponto de vista do que defendemos como democracia aqui, queremos superar a idéia, hegemônica hoje, de uma pseudo-liberdade de participação, trânsito e possibilidade relativa de expressão e luta pelo acesso ao poder político e crescimento na escala social dentro da divisão social do trabalho do mercado capitalista. Esta na verdade é uma pseudo democracia ou um simulacro96 de democracia, oferecida pelo sistema onde os bens materiais e os meios de produção foram privatizados nas mãos de poucos, e um certo sonho manipulador e falso de que todos tem possibilidades iguais vem se tornando público ou socializado97. Não dá para falar em democracia hoje, a não ser como arremedo falso, quando nesse sistema quatro quintos da humanidade carecem dos elementos básicos à sobrevivência, quando a maioria da população do Brasil não possui acesso à terra seja no campo ou na cidade ou quando para a maioria da população de Bauru existem problemas de emprego, qualidade em seus bairros, falta lazer e cerca de 25% da população total da cidade vive abaixo da linha de pobreza98. Isto só para citar alguns exemplos.

Também não dá para falar em democracia hoje, do ponto de vista político, contemplando o sistema de democracia representativa existente, subjugada aos interesses econômicos da minoria privilegiada, aliás, representação que na história brasileira quase sempre esteve condicionada a esses interesses99.

Esses desvios falsificadores de uma real democracia no sistema representativo é próprio do sistema capitalista e se expressa em todos os níveis, seja no nível das disputas para a representação federal, estadual, municipal, como também no nível das formas encontradas dentro do próprio município na busca do seu aprimoramento, como no caso das instituições de conselhos municipais por decreto dos prefeitos. Nesses casos, muitas vezes o que se busca na realidade, além da permanência dos privilégios de certos grupos organizados na sociedade e a aparência democrática, é a construção de mais uma instância protetora ou intermediária entre a população e o poder

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político, além do fato de significar muitas vezes o ganho de tempo na perpetuação dos privilégios. Aqui, o que vale a pena considerar e questionar é a própria estrutura representativa desses conselhos100, pois eles na maioria dos casos são formados por representações técnicas e muitas vezes aleatórias e não a partir de uma representação proporcional à estrutura de classe econômica e social da cidade, incorrendo-se portanto nos mesmos desvios da estrutura geral da representação geral da democracia de voto dentro do capitalismo.

Por outro lado, é preciso reconhecer, uma vez feitas as críticas anteriores, que quanto maior for a capacidade de organização social e política das camadas mais humildes e necessitadas da sociedade, mais se poderá avançar nesse processo de participação popular e democratização das formas de gestão e distribuição dos recursos a partir do poder público. Em várias cidades e Estados no mundo hoje, mas mesmo no Brasil, e mesmo dentro de uma realidade atual de economia capitalista em fase neoliberal, onde a privatização crescente de vários espaços públicos é evidente101, podemos considerar exemplos de grandes avanços na busca de uma maior democratização e transparência das formas de gestões do poder público, com implantações de formas de democracia direta e busca de soluções para que as decisões públicas respaldem de verdade o desejo da maioria mais necessitada da população e para que esta possa por si mesma, além de aprofundar e conhecer as suas necessidades, ainda aprender a hierarquizá-las dentro de um quadro econômico da realidade de recursos disponíveis nos períodos correspondentes, bem como acompanhar e fiscalizar de forma mais próxima e transparente a aplicação de tais recursos e ações do poder público. Os exemplos mais contundentes desses avanços hoje no Brasil situam-se nas cidades que estão implantando os processos de orçamento participativo. O caso atual mais notório é o da cidade de Porto Alegre102, que há quatro gestões seguidas tem podido aprimorar esse processo, hoje inclusive já sofrendo algumas críticas secundárias, devido a uma certa aquisição de vícios burocráticos do processo. É preciso recriar e avançar sempre. Outras cidades puderam e tem podido implantar esse modelo: Santos, Santo André, Belém e Ribeirão Preto, nos momentos de administrações mais compromissadas com a maioria da população. Nós mesmos colaboramos para uma implantação do orçamento participativo na cidade de Liberdade (M.G.)103 - em 1999 e a partir do interesse popular

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e da presidência da Câmara Municipal104 na época, mesmo o prefeito na ocasião sendo contra o processo e sendo centralizador e autoritário.

..................( Figura 3 - 1.º orçamento participativo de Liberdade, M. G.)

Vale aqui mencionar, apenas como registro, que é possível hoje em dia, a partir dos avanços tecnológicos na área de telecomunicações e informatização, aprimorar os processos de

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referendos populares e de decisões diretas sobre vários assuntos mais emergenciais e pragmáticos que envolvam partes expressivas da população105. No entanto, do ponto de vista da formação de consciência crítica das massas106, mesmo não se tendo mais condições objetivas do exercício do debate como na Pólis Grega107, nada substitui o debate aberto, livre e franco, especialmente se este puder ser exercido pela população. Este debate, exercido na forma crítica e desvendadora da realidade opressora, espoliadora e segregadora da maioria, quanto mais atingir as massas populares, contém intrínseco nele o que consideramos um germe revolucionário urbano que tem que ser defendido, ampliado e incentivado por quem queira organicamente se comprometer de verdade com o aniquilamento do sistema capitalista que aí está108. A definição do nosso recorte temporal e espacial de estudo sobre a realidade da produção dos espaços urbanos de Bauru foi condicionada metodologicamente pela seleção, por um lado, do ponto de vista temporal, da existência objetiva e inequívoca de instrumentos legais e prerrogativas do poder municipal, além do conhecimento científico e tecnológico na área de urbanismo e arquitetura aplicado em outras realidades mundiais e brasileiras, além das condições para que em tese109 o poder municipal exercesse em profundidade uma gestão de caráter eminentemente público e qualificado em prol das populações mais humildes da cidade.

Referimo-nos aqui como ponto inicial, central e definidor desse corte a aprovação da Lei Federal 6766/79 110, Lei do Parcelamento do Solo Urbano no Brasil, que afinal até hoje é o instrumento principal, não único, pois existem a nosso ver outros complementares, especialmente as leis e resoluções referentes aos aspectos ambientais111 e as regulamentações, leis de zoneamento, códigos de obras e alguns planos diretores municipais, mas que ficaram, na prática administrativa, condicionados à interpretação que se fez da Lei federal 6766/79 a partir da sua aprovação, tendo como base ideológica o caráter e a forma de gestão aplicada a cada tempo e lugar, que dessa maneira originou concepções diversas na organização dos espaços físicos das cidades.

A fixação dos nossos aprofundamentos nesta tese, tendo em vista a produção social dos espaços a partir da aprovação da Lei 6766/79, leva em conta que essa Lei Federal permitia, a nosso ver, em sua concepção e estrutura, de forma aberta, dialética e contundente, que os municípios, as gestões municipais, levando-se em conta as

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suas características físicas, sociais, culturais, econômicas e principalmente políticas, exercessem de forma objetiva o controle e o planejamento do solo urbano. Como exemplos objetivos dessa possibilidade, queremos lembrar que está expresso nessa lei que fica a cargo dos municípios, portanto do poder municipal, a fixação das diretrizes de parcelamento do solo urbano112, compreendendo o sistema viário, as áreas públicas institucionais e áreas verdes para sistema de lazer113, bem como os critérios para cada região da cidade de estabelecer a densidade populacional admitida114, ainda que, após estabelecer o mínimo de áreas públicas exigidas nos parcelamentos de loteamentos e desmembramentos, deixa também a cargo do poder municipal a possibilidade de fixar maiores exigências de áreas públicas de acordo com os critérios de densidade estabelecida em cada região da cidade115. Ainda como exemplo, essa lei deixa mais uma vez a cargo do poder municipal a possibilidade de exigência complementar, além das áreas fixadas como áreas verdes para sistemas de lazer, as áreas consideradas como de preservação permanente ou non aedificandi116. Faz, ainda, menção a critérios técnicos específicos de adaptação dos projetos às condições topográficas no terreno, certamente como medida de alerta e controle de qualidade ambiental dos parcelamentos do solo117.

Pelos exemplos anteriormente expostos, vê-se logo e suficientemente as condições postas de forma objetiva para o cumprimento do controle do uso do solo por cada poder municipal. No entanto, como iremos aprofundar mais adiante, a forma aberta ou condicionada permitida a cada município de fazer uso e interpretação urbanística e legal dessa lei, a seu próprio gosto, permitiu que na prática ela fosse um instrumento que servisse muito mais aos interesses dos grupos organizados de especuladores urbanos da terra e dos governantes comprometidos com essas elites econômicas e políticas minoritárias do que com as populações urbanas mais necessitadas que formam a maioria absoluta de nossas cidades.

Não se poderá alegar sobre essa lei que naquele momento da sua discussão e aprovação ainda não existiam as condicionantes sociais, econômicas, políticas, culturais, físicas e mesmo ambientais que pudessem fazer crer que a maneira profunda como analisaremos a produção dos espaços produzidos em Bauru pudesse ser questionada, como se os paradigmas urbanísticos e os conhecimentos técnicos fossem absolutamente outros no tempo e no espaço. Não concordamos em absoluto com isso, até porque de antemão o que

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iremos demonstrar aqui se situa num conjunto de conhecimento que definimos como básico e de certa forma elementar de compreensão sobre necessidades, problemas e possibilidades de soluções que há muito vêm sendo discutidas no mundo, no Brasil e mesmo em Bauru, onde diversas questões, como por exemplo as condicionantes ambientais relacionadas à fragilidade do solo, que quando mal manejado para uso urbano causa grandes voçorocas, eram.........................................( Figura 4 - Voçorocas antes da lei 6766 /79).

conhecidas muito antes da aprovação da Lei 6766 /79118. Queremos salientar, ainda, que a Lei 6766/79 foi aprovada num

momento em que pelo País afora o fenômeno da intensa migração do campo para a cidade, especialmente para o sudeste brasileiro, já era muito claramente conhecido. Esse fenômeno de intensas migrações regionais, subordinado ao processo econômico e político de concentração de renda e investimentos industriais de forma polarizada no espaço brasileiro, gerou o crescimento acelerado das cidades, e especialmente foi responsável pela formação das grandes metrópoles

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brasileiras e em outros países da periferia do sistema capitalista mundial119, especialmente na América Latina.

O intenso crescimento desordenado das cidades, antes da aprovação da Lei 6766/79, encontrou um sistema de propriedade fundiária do solo urbano e periférico das cidades concentrado nas mãos de poucas pessoas, terras advindas de antigas propriedades rurais. Este fato provocou sucessivamente intensas especulações imobiliárias e crescimento do valor da terra na medida em que os investimentos, especialmente os públicos, em extensão de sistemas de infra-estruturas, foi-se ampliando, seja em energia e iluminação, seja em pavimentação e drenagem de águas pluviais e esgotos, seja em transporte coletivo, seja na construção de equipamentos escolares e de saúde, mas também pelas políticas públicas de construção de conjuntos habitacionais para atender as demandas também crescentes de moradia popular. O processo como geralmente se deu esse crescimento e parcelamento do solo obedeceu de forma privilegiada os interesses imediatos dos especuladores de terras e a formação de empresas de construções habitacionais, que visaram a captação de intensas mais valias nesse processo, sejam aquelas que encontraram no poder público um abrigo e aliado no seu desenvolvimento, sejam aquelas médias e pequenas que se aventuraram por conta própria em diversos empreendimentos privados.

A falta de legislação anterior mais rigorosa sobre o controle, normatização e fiscalização do parcelamento do solo urbano, aliada à intensa chegada de migrantes às cidades, aumentou cada vez mais o interesse especulativo privado do solo e o aliançamento do poder público nas diversas esferas municipais, estaduais e federais com esses interesses privados, gerou o que temos denominado na historiografia urbanística, sob um olhar um tanto quanto ingênuo e quase em tom de “mea-culpa”, de crescimento desordenado e desqualificado do espaço urbano. Que, no entanto, a nosso ver nada mais foi e é que a própria expressão física da lógica capitalista especulativa que se implantou de forma acelerada como nunca no mundo, em nosso País e em outros no pós-Segunda Guerra Mundial e início da segunda metade do século XX. Algumas expressões físicas dessa lógica especulativa urbana são a enorme quantidade de vazios urbanos formados no interior das cidades; a formação de periferias urbanas por meio de loteamentos sem qualquer infra-estrutura e que em grande parte eram loteamentos clandestinos120 que receberam

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“auto-construções”; a formação de grandes aglomerados de habitações populares “provi-definitivas”121; as “favelas”, que foram soluções encontradas pela população mais humilde em resposta à falta de solução do Estado e do mercado capitalista em solucionar a questão habitacional para todos122; a valorização dos espaços privados e desvalorização dos espaços públicos; a falta de estruturas viárias urbanas qualificadas voltadas para atender o transporte coletivo; o desprezo pelos espaços livres de lazer e esporte, a intensa verticalização de áreas centrais ou de áreas de interesse de valorização do capital especulativo123, entre outros.

Do ponto de vista das leis, antes da lei 6766/79, as que existiam124 eram insuficientes e ultrapassadas para contemplar o universo do fenômeno do crescimento intenso que ocorria nas cidades. Além disso, como já foi bastante estudado por diversos autores, nossa legislação urbanística de certa forma quase sempre foi elitista, segregadora e preconceituosa em relação à população mais humilde que chegava na cidade e quase sempre deixou os bairros mais humildes auto-construídos, as favelas e os cortiços numa situação de marginalidade125. Eles só foram sendo incluídos na lei quando foram se tornando organizados e abraçados pelas cidades, ou quando ficou demonstrada a incapacidade do sistema capitalista de resolver definitivamente essa questão.

Ainda são necessários alguns comentários gerais sobre os papéis das leis no Brasil. Por um lado há historicamente certo consenso entre alguns historiadores de que a formulação de leis no Brasil sempre foi uma forma de adiar o acirramento de contradições sociais entre classes e interesses sociais distintos, e de buscar de fato as soluções de reivindicações populares. Nesse sentido, quanto mais leis, quanto mais dividir e criar orgãos responsáveis por aplicação e fiscalização das mesmas, gerando conflitos entre eles, melhor, pois na prática se mantém os privilégios de poucos e fica de certa forma o dito pelo não dito 126. Por outro lado há aqueles que demonstram que as leis urbanísticas no Brasil quase sempre não vingaram e que, por exemplo, os Planos Diretores quase sempre foram usados pela elite econômica e o poder público como cortina de fumaça para desviar a atenção da população dos maiores problemas urbanos. E as leis “que pegaram”127, como a do zoneamento urbano, quase sempre serviram para apenas demarcar no espaço urbano as áreas privilegiadas para o investimento da elite econômica da cidade128.

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No Brasil, portanto, houve, entre os anos quarenta e a data da aprovação da lei 6766/79, um vertiginoso crescimento urbano promovido segundo regras de enorme descontrole das iniciativas privadas pelo poder público e com intensa participação do mesmo na promoção, omissão e comprometimento com os interesse privados imediatos. Essa hipótese carece de maior aprofundamento e pesquisa que não faremos nesta tese. No entanto, é evidente a constatação física do fato de que uma grande parte dos parcelamentos das cidades que mais cresceram nesse período ainda hoje representam uma parte muito importante do total de área da cidade e por isso são essas áreas as que mais possuem demandas por infra-estruturas, equipamentos públicos e problemas ambientais. Em Bauru o conjunto dessas áreas produzidas entre os anos quarenta e antes da lei 6766 e que ainda não estão totalmente ocupadas representa cerca de 40% da área total da cidade129. Sobre essas áreas incidem hoje a falta ainda de asfaltamento de ruas, a falta de galerias de águas pluviais, de esgotos sanitários e de eletricidade, e só vão sendo equipadas à custa de intensa pressão popular sobre os governos atuais, em muitos casos coordenada pelos próprios especuladores de terras130. Essas carências de infra-estruturas e a forma especulativa de assentamentos e desenho dos parcelamentos do solo urbano sobre essas áreas são responsáveis pela formação de várias erosões urbanas, que em muitos casos são verdadeiras voçorocas que levam todo ano, no período de chuvas intensas, uma considerável quantidade de recursos municipais. Este foi o caso da grande voçoroca do Parque Bauru, de 1993, também da voçoroca do córrego da Água do Sobrado, que interrompeu duas ruas, e ainda da erosão na Vila Industrial, que interrompeu a Av. Valdemar G. Ferreira e que foram responsáveis pelo decreto de calamidade pública de Bauru em fevereiro de 2001131.

A produção especulativa dos espaços urbanos entre os anos quarenta e a aprovação da lei 6766/79 gerou um fenômeno, portanto, que precisa ser melhor aprofundado, seja no geral do Brasil, mas também especificamente em Bauru, onde temos a convicção formada pelos dados que já possuímos de que sobre essa produção de 40% do espaço urbano atual recairão as maiores demandas sociais e de investimentos públicos qualificadores e também os saneadores de problemas como os de erosões urbanas e de enchentes, para o futuro dessas próximas duas a três décadas do novo milênio. É, pois, uma dívida social, que só pode ser compreendida à luz dos interesses especulativos que influíram naquela produção e também do papel dos

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governos municipais que lhe deram aval e cobertura. Como aspectos salientadores e hipotéticos do que afirmamos anteriormente e que poderão servir de pistas para futuros estudos, nossos e de outros pesquisadores, queremos ressaltar dois fatos que já comprovam nossas argumentações. O primeiro, que é de ordem geral, é que esse fenômeno do descontrole jurídico e político da intensa produção desqualificada do espaço antes da lei 6766/79, na sua abrangência jurídica, foi reconhecido também pelo jurista Ely Lopes Meirelles, que cita o fato de ter havido “ uma verdadeira orgia para o parcelamento do solo urbano no Brasil”132. O segundo, e que é de ordem local de Bauru, diz respeito ao fato de ter havido naquele período, como nunca anteriormente, a oferta de loteamentos que nada mais eram que a aprovação, pela Prefeitura e cartório, de autorização aos proprietários de terras urbanas e outros especuladores imobiliários de locar e abrir ruas sem qualquer infra-estrutura dentro das matas nativas de cerrado ou terrenos anteriormente ocupados por lavouras ou pecuária. Vale enfatizar que alguns desses negociantes com a terra urbana de Bauru tornaram-se grandes políticos na cidade naquele período133, tornando-se inclusive prefeitos e sendo responsáveis diretos pelo conhecido “slogan” que denomina Bauru como a “CIDADE SEM LIMITES”134.

....( Figura 5 – foto loteamentos especulativos – Bauru Ilustrado, 1999)

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Ao que tudo indica, esse título possui diretamente um caráter do fenômeno físico e urbanístico concreto do intenso e ilimitado crescimento de oferta de loteamentos “dobrando morros e saltando córregos” que se deu por esses agentes imobiliários. De resto, a afirmação e crescimento político de pessoas em Bauru que eram capitalistas de terras urbanas, ou que receberam o seu desses, é um fato comprovado. Possui exemplos ainda hoje na Câmara Municipal e Prefeitura, mas também marca a própria constituição inicial da cidade no início do século vinte, quando o parcelamento do solo urbano a partir na esplanada da estação ferroviária, teve como interesse objetivo e preponderante a mercantilização do solo ao redor da via de passagem do trem e dos pontos de estações de abastecimento e armazenamento de produtos “à beira da linha”135.

A lei 6766/79, portanto, torna-se um marco fundamental para a compreensão do desejo de controle do parcelamento eficaz do solo urbano no Brasil. Sua formulação, discussão e aprovação certamente acelerou as práticas especulativas dos agentes imobiliários urbanos, provocando a necessidade de enxurradas de aprovações de loteamentos de última hora para o poder municipal, fato este que aconteceu em Bauru e que iremos aprofundar em outro capítulo. A saída encontrada no momento da transição pelo poder municipal já atesta o que iremos demonstrar em nossa tese. Ao invés da utilização imediata da Lei Federal 6766, após esta ser aprovada, suas formulações e implementação só vão ser parcialmente seguidas de fato com a aprovação da Lei Municipal de Parcelamento do Solo Urbano de Bauru, em 1982136. Esta é, inclusive, basicamente a reprodução da norma maior, porém com pioras expressivas sobre o seu caráter público e defesa dos interesses coletivos. Afirma em certos pontos o interesse privado sobre a propriedade urbana, desviando ou dando condições de manutenção desses interesses ou criando possibilidades de interpretações dúbias que afinal serviam muito mais a quem de fato possuía organização e interesses bem

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definidos sobre o que defender, e este sempre foi o caso dos especuladores urbanos. Esse vácuo de gestão entre a aprovação da lei 6766/79 e a aprovação da lei municipal de 1982 criou situações concretas de problemas em certos loteamentos da cidade e que serão analisados como marcos iniciais da nossa tese, comprovando o que estamos chamando de voçorocas do poder público.

Salientamos ainda que os problemas gerados pelo grande crescimento desordenado do solo urbano nos anos anteriores a 1979 eram debatidos e questionados em diversas esferas de conhecimento, como na geografia, na arquitetura e urbanismo e também no meio jurídico. Assim, um conjunto de conhecimentos sobre leis e sobre gestão urbanística foram produzidos, além de ações práticas localizadas em inúmeras cidades brasileiras137. Com esse perfil e para não nos alongarmos muito sobre esse assunto, gostaríamos de lembrar a discussão sobre a “Carta de Embu”138, que tratou desses assuntos numa visão de contraposição ao processo especulativo que aconteceu na cidade. Ressalte-se que nesse documento encontramos fixados instrumentos até hoje não implantados como norma no Brasil, como a instituição do “Solo Criado” e do IPTU Progressivo.

A lei 6766/79, portanto, é um instrumento complexo e sintético sobre as necessidades de intervenções que as cidades possuíam. Além disso, congrega um conjunto vasto de conhecimento e instrumentos de gestão que poderiam ser utilizados pelos poderes municipais. Assim, essa lei, por ter dado uma instrumentação formal de controle do espaço urbano, possibilitando na prática a análise e fixação de alguns dos seus instrumentos, que nos permite verificar caso a caso a sua interpretação pelos agentes produtores, controladores e fiscalizadores do espaço público, permitirá a comprovação que desejamos de qual é o papel assumido pelo poder municipal a partir da mesma.

Portanto, o recorte temporal de nossa tese inicia-se na aprovação da Lei 6766/79 e passa pela aprovação da Constituição Federal de 1988, que se não se aprofundou muito em seus capítulos sobre políticas urbanas, instituiu a possibilidade do uso social da propriedade urbana e a possibilidade de implantação do IPTU Progressivo, o Parcelamento Compulsório, a desapropriação com pagamento com título da dívida ativa, bem como a exigência para que as cidades acima de vinte mil habitantes executassem seus Planos Diretores Municipais139. Na prática, na maioria das cidades mais uma

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vez ficou o dito pelo não dito, ou a lei não pegou; em Bauru foi este o caso.

O período final do recorte temporal da nossa tese ficou determinado para o momento da realização, em dezembro de 1999, da discussão aberta sobre o Estatuto da Cidade e a aprovação da Carta das Cidades. Posteriormente houve a complementar discussão desses instrumentos durante a realização do 1.º Fórum Social Mundial em Porto Alegre, RS.

A fixação desse limite final se deu tendo em vista a possibilidade de fixação de novas condicionantes, elementos, instrumentos jurídicos e de gestão das cidades, que esperamos que saiam do papel e passem de forma profunda a nortear as ações coletivas e públicas em defesa de uma cidade mais justa, menos segregadora, que contemple as maiorias mais humildes, que cessem os privilégios e benefícios das minorias mais possuidoras e que de fato facilitem combater a especulação imobiliária e permitam implantar processos mais democráticos e participativos de gestão urbana, não nos deixem esquecer nunca e lutar sempre para o objetivo maior da socialização dos meios de produção da sociedade.

RECORTE ESPACIAL E A SELEÇÃO DOS ELEMENTOS PARA APROFUNDAMENTO NA TESE

Definido o recorte temporal para nossa análise, cumpre-nos agora delimitar de forma precisa o nosso recorte espacial e os elementos selecionados para o aprofundamento desta tese. Inicialmente queremos afirmar que os recortes feitos foram selecionados pelo fato de os mesmos representarem espacialmente a síntese de uma quase permanência ou constante na produção dos espaços no período de análise já tratado. A produção do parcelamento do solo urbano em Bauru posterior à lei 6766/79 é bastante grande, seja por meio dos parcelamentos privados voltados para populações de baixa renda140, seja por meio dos investimentos públicos, onde a COHAB – Companhia Habitacional de Bauru teve destaque fundamental na construção de conjuntos habitacionais horizontais muito grandes141, seja por meio de ações privadas com apoio da COHAB quando não se teve recursos do Sistema Financeiro da

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Habitação142 para construções próprias e a COHAB passou a fornecer seus serviços e conhecimentos em gerenciamento de relações com os mutuários, seja nos cadastramentos, seleção e cobrança de prestações dos financiamentos. Também ocorreu, por intermédio da promoção pelo poder público, no início da década de noventa, um verdadeiro engodo e trauma na cidade com a aprovação de parcelamentos denominados de “Lotes Urbanizados” que até hoje não foram terminados, ainda não serviram a ninguém, consumiram recursos públicos abusivos e que hoje terão que ser recuperados para em algum momento servirem à população. Acabaram por condenar o então prefeito a cinco anos de prisão143.

Outras ações mais pontuais e significativas também ocorreram, como foi o projeto de iniciativa do poder público desenvolvido para solucionar e abrigar famílias de favelados que estavam morando em situações de risco nas margens de córregos e rios da cidade; esse projeto, denominado de “Desfavelamento”, cujas diretrizes urbanísticas foram por nós traçadas em harmonia com as questões ambientais da cidade, valorizando os espaços públicos onde se assentariam as atividades integradoras e socializadoras do bairro, possui, entre outras qualidades, a utilização do mutirão popular e a participação de diversas entidades civis e públicas na gestão da sua execução, só prejudicada quando da troca de governo, que o quis sacrificar por motivos políticos144. Também o Projeto da Vila Tecnológica de Bauru, de nossa autoria urbanística, nascido para servir de difusão tecnológica na região e seleção de tecnologias adaptadas ao clima e às demais condições ambientais, sociais e culturais, trazia a possibilidade da participação e cooperação entre as universidades e a sociedade, mas também foi abortado pelo governo sucessor. Outros projetos diferenciados, inicialmente voltados para famílias com renda de até cinco salários mínimos, hoje estão ocupados por pessoas de renda acima daquela. São os projetos do Parque das Camélias e do Parque Flamboyants, que se diferenciam por serem os primeiros verticalizados até quatro pavimentos e que possuem uma concepção que resgatou da modernidade, mas de forma piorada, a idéia da unidade de vizinhança com alguns equipamentos comunitários de lazer e esporte. Posteriormente a esses surgiram outros semelhantes, como o Parque dos Sabiás, Andorinhas, Jd. Marilú e a Vila Inglesa.

É importante dizer que a produção referida anteriormente se destinou às famílias mais humildes da cidade de Bauru. Outras produções significativas ocorreram para abrigar aquelas de melhor

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capacidade econômica. Para estas últimas foram surgindo, na região da zona sul da cidade, seguindo um quadro de tendência ou modismo desse período, vários loteamentos e condomínios fechados de lotes que variavam entre 300 e 6000 metros quadrados145. Por outro lado, na mesma região sul da cidade, parcelada antes da lei 6766/79, em sua maioria, com parte significativa ainda não ocupada e que também apresenta os problemas ambientais de voçorocas urbanas, intensificou-se o processo de construções de condomínios de prédios verticais com coeficientes de aproveitamento entre 2,5 e 3,5 sobre a área do terreno. Este fenômeno de concentração no espaço da região da zona sul da cidade, dos parcelamentos e verticalização destinados à classe mais abastada da cidade, foi intencionalmente dirigido pela lei de zoneamento e pela lei municipal 2339/82 de uso e parcelamento do solo urbano de Bauru, o que comprova a tese da demarcação espacial para investimentos dessa classe social mais alta na cidade, a partir dos instrumentos legais, especialmente do zoneamento urbano146. Esse fenômeno segregador da classe social mais alta e de exclusão da maioria da população carente para as periferias urbanas ficou demarcado física e simbolicamente pelo que passou a ser por um lado visível na estrutura verticalizada da zona sul versus a imensa extensão horizontalizada das periferias de conjuntos habitacionais da COHAB e loteamentos de moradias auto-construídas. Simbolicamente, essa divisão espacial ficou marcada na cidade, a partir da influência de alguns comunicadores e representantes da elite econômica da cidade, pela idéia de que “ Bauru é uma cidade cercada por conjuntos habitacionais”147. A parte nobre da zona sul passou a ser chamada de “ A Ilha”148 , ou seja, esta é a parte de Bauru reconhecida pela elite e mesmo pelo poder público historicamente representante dessa elite, o restante é o “Mar”149, de maioria de gente humilde, que para essa elite econômica e social só parece incomodar, lhe gera tensão, lhe gera preocupação de segurança, lhe gera afinal a sua mais valia, mas que deve ser mantida à distância e sob o olhar vigilante da sua polícia.

Portanto, é sobre a complexidade da produção do conjunto de espaços desse período que iremos tratar nesta tese. Logicamente iremos tratar dos assuntos selecionados escolhendo situações desse conjunto de espaços que sejam capazes de demonstrar o que queremos em cada capítulo.

Em contrapartida, queremos deixar claro que nossa pesquisa também não focará a produção dos espaços do início da formação

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urbana da cidade de Bauru, seus primeiros arruamentos, a fixação da esplanada ferroviária150, a urbanização do seu conhecido triângulo histórico impulsionado pela chegada da ferrovia em virtude da economia cafeeira e o estabelecimento em Bauru de um dos maiores entrepostos e entroncamento ferroviário do Brasil. Ou toda a sua lógica inicial de cidade mercantil, não apenas no que diz respeito ao que circulou de dinheiro por meio do comércio e serviços a partir do produto do café, mas, já de início, também a cidade nasceu e cresceu dentro de um desejo e interesse imobiliário privado predominante, de saída, sobre as terras em torno da estação e parada de abastecimento ali localizada. Fato importante e que será verdadeiro para outras inúmeras cidades do oeste do Estado de São Paulo estabelecidas na beira da linha, hoje médias ou pequenas, mas que compõem uma rede de cidades importantes151.

É importante notar a partir do enfoque dos estudos realizados e mencionados no parágrafo anterior e que aprofundaremos em nossa tese o que podemos considerar uma lógica histórica do caráter especulativo e mercantil sobre o solo urbano de Bauru, que vai nascer com a própria cidade - a “Capital da Terra Branca”152, vai se intensificar de forma absurda entre os anos quarenta e a aprovação da Lei Federal 6766/79, no período da “ Sem Limites”153, e vai permanecer e buscar driblar as leis de controle coletivo e público sobre a produção privada do espaço urbano no período que iremos analisar, o período das “Voçorocas”154, momento da tomada de consciência como acreditamos, sobre os problemas da produção capitalista dos espaços de Bauru, para uma posterior transformação da produção social dos espaços voltados para a maioria mais humilde da sua população. ......( Figura 6 – mapa de Bauru – produção de loteamento após 1979)

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Para a seleção dos elementos espaciais urbanísticos que mediarão o aprofundamento conceitual da tese em cada um dos seus capítulos, partimos da necessidade verificada ao longo da pesquisa e no seu final, durante a qualificação para o doutorado, na execução dos diversos trabalhos programados desenvolvidos e os trabalhos realizados para cada disciplina cursada no período de doutoramento, que por si só se constituem em pesquisas específicas, se vistas de forma individualizada, mas que na sua expressão de conjunto ofereceram diversas alternativas de enfoques e mesmo abriram a possibilidade de aprofundamento de outras pesquisas de caráter geral sobre a realidade da produção urbanística de Bauru. Ou seja, tínhamos no final um extenso diagnóstico que, num primeiro momento, foi sintetizado na possibilidade de realização de um grande trabalho, de mais fôlego que aquele que objetivamente teríamos condições para aprofundar na tese. De certa forma, insistíamos inicialmente em não deixar passar absolutamente nada do que estudamos e diagnosticamos durante as pesquisas. Porém, a partir da realização e do intenso debate executado na qualificação para doutorado, objetivamente fomos sabatinados por uma banca expressiva155, especialmente não sobre o conteúdo, mas sobre o método e a busca de uma maior expressão final daquilo que afinal era nosso enfoque principal da pesquisa, ou seja, o papel assumido historicamente pelo poder público municipal na produção do espaço urbano de Bauru. Resolvemos então trabalhar as informações e os materiais levantados da seguinte forma: Recortamos o trabalho do ponto de vista temporal a partir da aprovação da Lei 6766/79, pelos motivos já expostos anteriormente, contudo fazendo algumas considerações sobre outros trabalhos e percepções da produção integral dos espaços urbanos da cidade de Bauru desde o início da formação da cidade; do ponto de vista espacial, já citado, estaremos considerando a integralidade e complexidade dos espaços produzidos no período selecionado, até porque nossa tese, de forma crítica, precisa traçar paralelo, fazer

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comparações e estabelecer as devidas conexões pertinentes de suas análises, que afinal colocam certo grau de exploração da mais-valia sobre a produção social dos espaços de uma maioria de pessoas de classes sociais economicamente humildes, em contraponto também a outro grau dessa exploração sobre a produção dos espaços voltados para uma elite privilegiada.

Nosso foco principal na demonstração da forma de apropriação capitalista daqueles poucos agentes donos dos meios de produção dos espaços urbanísticos vai verificar, nessa estrutura de produção, distribuição e consumo entre as classes sociais, o papel assumido pelo poder público municipal nesse jogo de interesses, que afinal nos pareceu um jogo de cartas marcadas. Por não ser este exatamente um trabalho de economia, esclarecemos que essa análise se dará de forma apenas suficiente e com caráter interpretativo, nem sempre a partir de documentos comprovatórios comuns, mas também a partir de um conhecimento concreto estruturado sobre práticas de projetos e de produção de espaços, desenvolvidas pelo autor ao longo de suas experiências e estudos. Não será nossa intenção, também, aprofundar todos os aspectos urbanísticos de cada um dos espaços produzidos no período, até porque não se trata de um trabalho específico sobre cada um desses espaços. O que faremos será analisar o conjunto dessa produção a partir da seleção de algumas questões ou categorias de espaços, ou assuntos urbanísticos relevantes, que afinal não são específicos de um espaço localizado, mas representam sinteticamente um conjunto de espaços maiores produzidos ao longo do tempo em Bauru e outras cidades brasileiras. Assim é que nosso trabalho selecionou quatro categorias macros para desenvolvimento da tese, que estão demarcados pelos títulos dos capítulos:

A primeira categoria, denominada de “lei, forma e gestão urbana” – Uma tríade do planejamento qualificado do espaço urbano - tratará uma questão de síntese objetiva sobre a relação entre o corpo da lei, ou aquilo que ela traz de conhecimento científico, vontade de transformação econômica, social e política da produção dos espaços urbanísticos, com as diversas formas variáveis de gestão política do espaço pelo poder público municipal, que está sujeito a mudanças de postura, de perfil ideológico, de jogo de interesses de classes e da sua relação com as forças produtoras, distribuidoras e consumidoras dos espaços produzidos. Ainda consideraremos a forma urbana, o desenho dos espaços urbanísticos, como uma categoria própria que estabelece fisicamente, na terra ou no solo, estas relações sociais, ou

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que serve para mediar estas tensões entre exploradores e explorados, entre aqueles que sabem usá-lo no sentido da expropriação de “mais- valia” e aqueles que são alienados pela própria estrutura da divisão social do trabalho, pelas formas segregadoras, centralizadas e tecnocráticas de gestão do espaço ou por políticas públicas baseadas apenas nos interesses de atender amigos, ou os seus mais iguais.

A segunda, terceira e quarta categorias de análises se referem diretamente à análise objetiva de questões físicas selecionadas da produção dos espaços urbanísticos da cidade. A segunda: “estrutura 85 - XAIDES, José. Trabalho programado 1 – Levantamento dos loteamentos privados e públicos

de Bauru, 2000. A “disputa” em questão transpareceu de forma clara, em nossas pesquisas, durante os trabalhos programados e ainda antes, quando da nossa ocupação do cargo de secretário de Planejamento de Bauru, quando verificamos o desprezo e as tentativas dos proprietários de terras, construtoras e mesmo a COHAB com as áreas e os equipamentos públicos, necessitando de uma posição forte e convincente do poder municipal nas suas defesas e para suas qualificações, o que não ocorreu como regra geral na história e ao contrário, pode ser classificado como exceção à regra dentro do período estudado.

86 - Marx, Karl. O Capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2.ªed., 1971.

87 - XAIDES, José. “ EROSÃO”. A escolha da palavra “ EROSÃO ” se deu aqui para criar uma metáfora significativa com todo o sentido da tese em torno da discussão da perda ou ausência do sentido público nas ações do Poder Municipal. A palavra é significativa por que Bauru é uma das cidades brasileiras que possui os maiores problemas de ocorrência de erosões do solo urbano. Erosão essa que por sua grande dimensão “ causada pelo desmoronamento oriundo de erosão subterrânea causada por águas pluviais que facilmente se infiltram em terrenos muito permeáveis, ao atingirem regiões de menor permeabilidade, denomina-se VOÇOROCA segundo:

HOLANDA FERREIRA, Aurélio Buarque de; Novo Dicionário Aurélio. São Paulo, Ed. Nova Fronteira, 1988.

SILVA, Manuel; CRUZ, Roberto & CAVAGUTI, Nariaqui; Efeitos de tipos de urbanização na formação de Voçorocas. 5.º Simpósio Nacional de Controle de Erosão, 22 a 25 de outubro de 1995-Bauru – SP, São Paulo, ABGE - IPT , 1995, pg. 213 a 215.

ALVES, José Xaides de Sampaio. As erosões urbanas de Bauru como conseqüência da forma de Planejamento e expansão dos loteamentos privados e públicos. 5.º Simpósio Nacional de Controle de Erosão, 22 a 25 de outubro de 1995-Bauru – SP, São Paulo, ABGE - IPT , 1995, pg.305 e 306.

88 . – Ibid.

89 - FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. Vol. 1 e 2. 5.ª ed. Porto Alegre, Globo, 1979. 750 p.

90 - SADER, Emir. O poder, cadê o poder ?. O marxismo na mérica Latina; uma antologia de 1909 aos dias atuais. Org. Michael löwy; São Paulo; Ed. Fund. Perseu Abramo, 1999, p.532 a 536.

91 - CASTRO, Fidel. Revolução socialista e democrática em Cuba. O marxismo na América Latina;

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da organização de loteamentos e conjuntos habitacionais”, buscará desvendar sob vários aspectos de que forma a organização desses espaços permitem a compreensão dos interesses em jogo, especialmente o econômico, e como o poder municipal tem assumido seus papéis no mesmo, além de aprofundar um estudo crítico objetivo sobre a estrutura da formação, causas e conseqüências da maioria das erosões urbanas de Bauru – a “cidade das voçorocas”, verificando como é que essas erosões se articulam com a exploração geral capitalista e especulativa do solo urbano em detrimento dos recursos

uma antologia de 1909 aos dias atuais. Org. Michael löwy; São Paulo; Ed. Fund. Perseu Abramo, 1999, p.263 e 264.

92 - IANNI, Octávio. A era do globalismo. 3.ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997.

304p.

93 - MARICAT0, Ermínia. Citação sobre a produção habitacional no Brasil , Trabalho apresentado na Conferência sobre Como Construir Cidades Sustentáveis, proferida no dia 29/01/2001 no FÓRUM SOCIAL MUNDIAL,1.º; 2001, Porto Alegre, Anais. Porto Alegre 2001.

94 - JORNAL DA CIDADE. Combate à pobreza derrubaria preconceitos. JC nos Bairros, Bauru 27 de maio de 2001, p.3.

95 - CASTRO, Fidel. Revolução socialista e democrática em Cuba. O marxismo na América Latina; uma antologia de 1909 aos dias atuais. Org. Michael löwy; São Paulo; Ed. Fund. Perseu Abramo, 1999, p.263 e 264.

96 - BELLA, Bem Ahmed. Conferência Quais são os fundamentos da democracia e de um novo poder? Anais : Fórum Social Mundial, 1.º, 26 de janeiro de 2001, Porto Alegre.

97 - BETTO, Frei. O indivíduo no Socialismo. Revista Socialismo em Debate; São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo. 2000, p.40.

98 - JORNAL DA CIDADE. Combate à pobreza derrubaria preconceitos. Jc dos Bairros, Bauru 27 de maio de 2001, p.3.

99 - FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. Vol. 1 e 2. 5.ª ed. Porto Alegre, Globo, 1979. 750 p.

100 - XAIDES, José – Sobre a representação nos conselhos municipais. Como exemplo a ser questionado da falta de representatividade dos conselhos municipais, queremos citar o caso do COMDURB – Conselho municipal de desenvolvimento urbano de Bauru,aprovado por decreto pelo prefeito Nilson Costa no ano de 1999, empossado no ano de 2000 e que tem como presidenta cativa a própria secretária de Planejamento , Maria Helena Carvalho Rigitano. Não fazia parte desse conselho com mais de vinte e cinco representações nenhuma representação de associações de moradores ou lideranças de bairros carentes da cidade, em compensação todos os órgãos e secretarias municipais tinham conselheiros, como também as entidades de interesses imobiliários, construtoras e especuladores de terras. Este fato demonstra o caráter estamental e servil ao capital especulativo do referido conselho.

101 - BIONDI, Aloysio. O Brasil Privatizado., São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 1999.

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coletivos da população trabalhadora e as mais humildes. A terceira: “intervenções em áreas de vazios urbanos”, complementarmente à segunda, seja fisicamente na cidade, seja como espaço estruturado e pensado dentro da lógica capitalista especulativa da cidade, permitirá esclarecer e aprofundar, a partir de exemplos concretos de ações, os papéis da relação histórica entre os interesses públicos e privados na construção da cidade, que permitiu que até agora, com raras exceções no tempo e no espaço, a transferência sem pudor de recursos públicos sucessivos para o privado, sem muita cerimônia ou crítica. A quarta: 102 - GENRO, Tarso e SOUZA, Ubiratan de. Orçamento Participativo: A experiência de Porto

Alegre . 2 .ª ed. Porto Alegre: Ed. Fundação Perseu Abramo, 1997.

103 - LIBERDADE, M.G. Boletim Informativo Câmara Municipal de Liberdade. Momento Histórico da Democracia: 1.º Orçamento Participativo de Liberdade; Liberdade: agosto de 1999. P 1.

104 - CÂMARA MUNICIPAL DE LIBERDADE M.G – Presidente: Dr. Antônio Carlos de Sampaio Alves. Período 1998 a 2000.

105 - FRANCO, Raimundo e DIETERICH, Heinz. Contribuições das ciências naturais à possibilidade de democracia. In: PETERS, Arno...( et al.). Fim do capitalismo global: o novo projeto histórico . Tradução de Eliete Ávila Wolff. São Paulo: Xamã, 1998. P.75 a 94.

106 - MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Moscou: Edições Progresso, 1987, 70 p.

KONDER, Leandro e BETTO, Frei. O indivíduo no Socialismo. Revista Socialismo em Discussão. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo. 2000, 59 p.

107 - MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Moscou: Edições

Progresso, 1987, 70 p.

FEDOZZI, Luciano. Orçamento Participativo: Reflexões sobre a experiência de Porto Alegre. Porto Alegre: Tomo Editorial, 1999; p.23 a 27.

108 - PETERS, Arno...( et al.); Fim do capitalismo global: o novo projeto histórico. Tradução de Eliete Ávila Wolff. São Paulo: Xamã, 1998. 166 p.

109 - BRASIL, Lei Federal 6766/79: Lei do parcelamento do solo urbano e Lei Municipal 2339/82: Lei do Parcelamento do solo urbano de Bauru.

110 - Ibid.

111 - BRASIL, Leis, Normas e decretos do CONAMA e IBAMA .

112 - BRASIL, Lei Federal 6766/79: Capítulo III : Do Projeto de Loteamento, Art 6.º .

113 - Ibid.

114 - Ibid: Capítulo II : Dos Requisitos Urbanísticos para Loteamento, Art.4.º, Inciso I.

115 - Ibid.

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“voçorocas do poder público?!”, tratará de deixar expresso o que entendemos ela ter de mais expressivo e significativo para o conhecimento científico e social da realidade de Bauru e de outras cidades brasileiras, pois pretende ser, além de interpretativa, um elemento de reflexão crítica para o futuro, não um receituário para as ações públicas, mas uma contribuição significativa para os estudos e pesquisas sobre o espaço urbano. Nesse sentido, e apenas como uma forma possível para buscar mudar o rumo do trato urbanístico da realidade em defesa da causa pública maior e da participação popular 116 - Ibid. Art.5.º .

117 - Ibid. Art.4.º , Inciso IV.

118 - BAURU, 1.ª Plenária popular de Bauru sobre Enchentes, Erosões, Buracos e Asfalto. A Carta de Bauru. Junho de 2001.

119 - MARICATO, Ermínia . Metrópole na Periferia do Capitalismo. São Paulo, HUCITEC, 1996, 141 p.

120 - ROLNIK, Raquel. A cidade e a lei: Legislação, Política urbana e territórios na Cidade de São Paulo. São Paulo: Fapesp: Stúdio Nóbio, 1997.

121 - XAIDES, José. Habitações “Provi-definitivas”. Conceito que utilizamos para caracterizar aquelas habitações executadas para serem provisórias mas que acabam por se tornar

definitivas dentro de um longo espaço de tempo, como, por exemplo, certas favelas ou auto-construções modestas.

.122 - MARICATO, Ermínia . Metrópole na Periferia do Capitalismo; São Paulo, HUCITEC,

1996, 141 p.

123 - KOWARICK, Lúcio. A espoliação urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979, 202 p.

124 - CAMPOS FILHO, Cândido Malta. Cidades Brasileiras: seu controle ou o caos: O que os cidadãos brasileiros devem fazer para a humanização das cidades . São Paulo: Nobel, 1989, 143 p.

125 - ROLNIK, Raquel. A cidade e a lei: Legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo . São Paulo, Fapesp/ Studio Nóbio, 1997.

126 - BATAGLIA, Luísa. A institucionalização do descontrole sobre o espaço no Brasil. Tese de Doutorado da FAU-USP, 1991.

127 - VILLAÇA, Flávio. Sobre os Planos Diretores. In: CONFERÊNCIA DAS CIDADES, 1.ª, Dez. 1999, Brasília. Anais. Brasília : Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados, 1999.

128 - Ibid.

129 - BAURU. Plano Diretor Integrado de 1996. Bauru, P.M.B, 1996.

130 - DIÁRIO DE BAURU. Tidei vai desapropriar Pousada da Esperança II. Bauru: 23/02/1995, p.11.

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no processo de gestão urbana, é que apresentaremos em um Anexo Final os resultados e a metodologia que estamos empregando em Bauru para a realização de Planos Diretores Populares de Bairros156.

131 - JORNAL DA CIDADE. Bauru 8 de fevereiro de 2001.

132 - MEIRELLES, Ely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, 7.ª ed., São Paulo, Malheiros Editores,1994.

133 - Segundo nos relatou em julho de 2001, o editor do Bauru Ilustrado, Sr. Luciano Dias Pires, o ex-prefeito Nicola Avalloni Junior (Nicolinha), além de ter sido prefeito entre 1956 e 1959,

era dono de imobiliária e grande comerciante de terras em Bauru. Foi Nicolinha quem adotou o “slogan” e título de “Cidade Sem Limites” para Bauru, título esse originalmente de um poema do poeta Eusébio Guerra.

134 - Ibid.

135 - GUIRARDELO, Nilson. À beira da linha. São Paulo, 1999.Tese de Doutorado; Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo.

136 - BAURU. Lei Municipal 2339/82; Lei do parcelamento do solo Urbano de Bauru.

137 - SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 2.ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1995, 421p.

138 - Ibid. p. 238 a 241.

139 - BRASIL. Constituição Federal de 1988.

140 - BAURU. Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado de 1996.

141 - Ibid.

142 - BAURU. Conjuntos Andorinhas e Sabiás. 1995.

143 - JORNAL DA CIDADE. Izzo é condenado a 5 anos no caso Coesa. Bauru 5 de maio de 2001, caderno de política p.4.

144 - JORNAL DA CIDADE. Região Noroeste: progresso a passos lentos. JC nos Bairros, Bauru, 27 de fevereiro de 2000.

145 - BAURU. São exemplos desses loteamentos o Jardim Estoril e o Samambaia.

146 - BAURU. Lei de Zoneamento de Bauru de 1979.

147 - JORNAL DA CIDADE. Falta de planejamento cria “cerco” na cidade. Bauru, 30 de outubro de

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Notas:

1994.

148 - Ibid.

149 - Ibid.

150 - GUIRARDELO, Nilson. À beira da linha. São Paulo, 1999.Tese de Doutorado; Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo.

151 - Ibid.

152 - Segundo depoimento prestado em julho de 2001 pelo Editor do Bauru Ilustrado e diretor doInstituto Histórico Antônio Eufrásio de Toledo, Sr. Luciano Dias Pires, o “slogan” de Capital da Terra Branca nasceu em 1927 por meio do jornalista Shimidt Afonso, que visitou a cidade durante um congresso regional da Noroeste, quando foi vitoriosa a sugestão para a fundação do Asilo da Colônia Aimorés (hoje denominado de Instituto Lauro de Souza Lima). O termo dizia respeito às qualidades e cores do chão da cidade, formado por solo arenoso.

153 - Segundo nos relatou em julho de 2001 o editor do Bauru Ilustrado, Sr. Luciano Dias Pires, o ex-prefeito Nicola Avalloni Junior (Nicolinha) além de ter sido prefeito entre 1956 e 1959,

era dono de imobiliária e grande comerciante de terras em Bauru. Foi Nicolinha quem adotou o “slogan” e título de “Cidade Sem Limites” para Bauru, título esse originalmente de um poema do poeta Eusébio Guerra.

154 - XAIDES, José. Período das Voçorocas – Título dado por nós ao período de análise desta tese, quando da compreensão dos vários aspectos que demonstram a falta de um exercício pleno do papel público do Poder Municipal, no cumprimento da lei, na organização física ( desenho) e na gestão pública do planejamento da cidade de Bauru.

155 - SÃO PAULO. FAU-USP, 14 de agosto de 2000. Nossa banca de qualificação foi formada pelos seguintes membros: Prof. Doutor Murillo Marx – Orientador; Prof.ª. Doutora Maria Irene Szmrecsanyi e Prof. Doutor Carlos Alberto Inácio Alexandre.

156 - XAIDES, José. Planos Diretores Populares de Bairros desenvolvidos por nós em Bauru a partir do ano de 1998; serão aprofundados no Anexo Final desta Tese de Doutorado.

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