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X Simpósio Nacional da ABCiber Conectividade, Hibridação e Ecologia das Redes Digitais. 14 a 16 de Dezembro de 2017 – Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. INTELIGENCIA ARTIFICIAL: Repensando a mediação 1 Dora Kaufman 2 Resumo: Cunhado em 1956 por John McCarthy, o termo “Inteligência Artificial” (IA) deu início a um campo de conhecimento associado com linguagem e inteligência, raciocínio, aprendizagem e resolução de problemas. O avanço recente (Deep Learning) permite às máquinas executar tarefas tradicionalmente desempenhadas pelos seres humanos e outras que superam a capacidade humana. Estabelece-se uma matriz de inputs que introduz inéditas formas de mediação. Os algoritmos interferem diretamente nos processos cognitivos, na interação nas redes sociais, e na redistribuição de funções e de poder entre os agentes. Palavras-Chave: Inteligência Artificial. Algoritmos. Mediação. Comunicação ecológica. Abstract : Coined in 1956 by John McCarthy, the term "Artificial Intelligence" (AI) has initiated a field of knowledge associated with language and intelligence, reasoning, learning and problem solving. The recent breakthrough (Deep Learning) allows machines to perform tasks traditionally performed by humans and others that surpass human capacity. It sets up an array of inputs that introduces new ways of mediation. The algorithms directly interfere in cognitive processes, in the interaction on social networks, and the redistribution of functions and power among the agents. Keywords: Artificial Intelligence. Algoritms. Mediation. Ecological communication. Artigo apresentado ao Eixo Temático 15 – Inteligência artificial, hibridização homem-dispositivos, trans- 1 humanismo, wearables do X Simpósio Nacional da ABCiber. Pós-Doutoranda no TIDD-PUC/SP. Pós-Doutora pela COPPE/UFRJ. Doutora em Comunicação pela 2 ECA-USP, participa do Grupo de Pesquisa Atopos ECA/USP. E-mail: [email protected]

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Page 1: INTELIGENCIA ARTIFICIAL: Repensando a mediação1governance40.com/wp-content/uploads/2018/11/ArtigoABCIBER2017.pdf · Em julho de 2012, a mídia internacional noticiou amplamente

X Simpósio Nacional da ABCiber Conectividade, Hibridação e Ecologia das Redes Digitais.

14 a 16 de Dezembro de 2017 – Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

INTELIGENCIA ARTIFICIAL: Repensando a mediação 1

Dora Kaufman 2

Resumo: Cunhado em 1956 por John McCarthy, o termo “Inteligência Artificial” (IA) deu início a um campo de conhecimento associado com linguagem e inteligência, raciocínio, aprendizagem e resolução de problemas. O avanço recente (Deep Learning) permite às máquinas executar tarefas tradicionalmente desempenhadas pelos seres humanos e outras que superam a capacidade humana. Estabelece-se uma matriz de inputs que introduz inéditas formas de mediação. Os algoritmos interferem diretamente nos processos cognitivos, na interação nas redes sociais, e na redistribuição de funções e de poder entre os agentes.

Palavras-Chave: Inteligência Artificial. Algoritmos. Mediação. Comunicação ecológica.

Abstract: Coined in 1956 by John McCarthy, the term "Artificial Intelligence" (AI) has initiated a field of knowledge associated with language and intelligence, reasoning, learning and problem solving. The recent breakthrough (Deep Learning) allows machines to perform tasks traditionally performed by humans and others that surpass human capacity. It sets up an array of inputs that introduces new ways of mediation. The algorithms directly interfere in cognitive processes, in the interaction on social networks, and the redistribution of functions and power among the agents.

Keywords: Artificial Intelligence. Algoritms. Mediation. Ecological communication.

Artigo apresentado ao Eixo Temático 15 – Inteligência artificial, hibridização homem-dispositivos, trans-1

humanismo, wearables do X Simpósio Nacional da ABCiber.

Pós-Doutoranda no TIDD-PUC/SP. Pós-Doutora pela COPPE/UFRJ. Doutora em Comunicação pela 2

ECA-USP, participa do Grupo de Pesquisa Atopos ECA/USP. E-mail: [email protected]

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1. Comunicação Ecológica, do Bóson de Higgs às Redes Sociais Digitais

Em julho de 2012, a mídia internacional noticiou amplamente a “descoberta” do

“Bóson de Higgs” pelo CERN (Conceil Européen pour la Recherche Nucléaire), após

mais de 40 anos de investigações, confirmando a existência do chamado “campo de

Higgs” e validando as teorias do campo da física de partículas. O ponto de partida é o

reconhecimento de que a massa do elétron não é uma propriedade intrínseca, mas algo

que se forma em sua interação com as chamadas Partículas de Higgs. “Os elétrons

parecem ganhar massa por estarem se movendo não pelo espaço vazio, mas por uma lama

de partículas de Higgs. Ele fica mais pesado porque, quando é empurrado, também são

empurradas todas as partículas de Higgs que estão ao redor” (SMOLIN, 2004, p. 66). Há

uma referência explícita à ideia relacional e de interdependência: "o fato de o elétron ter

ou não massa depende de sua interação com as partículas de Higgs, o que por sua vez

depende da condição de o mundo conter o gás de partículas de Higgs, que por sua vez

decorre das condições globais de temperatura do universo" (KAUFMAN, 2017, p.27). A

evidência básica, presente na física desde o início do século XX, é que a vida neste

planeta é um sistema interconectado e interdependente.

Esse paradigma, dentre outros das ciências da natureza, influenciou as ciências

sociais e está na base da ideia ecológica da comunicação, em que a comunicação não é

mais percebida como um fluxo de informações. Di Felice (2017b) propõe substituir o

termo media, “que exprime inevitavelmente uma relação de instrumentalidade, pela

expressão ‘forma formante’ ou por ‘condição habitativa’, capaz de projetar-nos em uma

dimensão ecológica e não mais funcionalista dos processos de interação e

comunicação” (pp. 39-40). Segundo ele (DI FELICE, 2009, 2012, 2017a, 2017b), nas

conexões das redes digitais - indivíduo, mídia, informação, território, dispositivos, banco

de dados, etc. - as relações entre os atores não são realidades distintas. "Observa-se uma

interdependência e uma indistinção entre cada um dos autores, numa condição habitativa

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que redefine cada entidade a partir de sua conexão com as demais

entidades” (KAUFMAN, 2017, p.53).

O avanço recente da Inteligência Artificial (IA), particularmente o processo de

aprendizado profundo (Deep Learning), agrega novos elementos à essa ecologia de

interação e comunicação ao permitir às máquinas executar tarefas tradicionalmente

desempenhadas pelos seres humanos (reconhecimento visual, tomada de decisão,

reconhecimento de voz, tradução) e outras que superam a capacidade humana (manipular

e processar grandes bases de dados, denominado em inglês de "Big Data”). Estabelece-se

uma matriz de inputs que introduz inéditas formas de mediação.“Hoje nós não estamos

mais numa interação entre humano e técnica […] Estamos falando de interações entre

inteligências ” (DI FELICE, 2017a, p. 133). 3

Um dos primeiros a prever a possibilidade da Inteligência Artificial foi o

matemático britânico Alan Turing . Seu artigo "Computing Machinery and Intelligence", 4

de 1950, descreve o teste “The Imitation Game”, concebido para responder a pergunta

"Can Machines Think?”. Para Turing era claro que não se tratava de um “pensamento”

propriamente, contudo ele acreditava na possibilidade de construir uma máquina apta a

"jogar o jogo” de forma satisfatória. Essa máquina seria um tipo particular, denominado

por ele de "computador eletrônico” ou "computador digital”, destinada a realizar qualquer

operação passível de ser processada por um “computador humano” (TURING, 1950).

Surgiram várias objeções, contestadas por Turing no mesmo artigo, agrupadas em nove

categorias. Destacamos a quarta objeção “O Argumento da Consciência”, sugerido por

Definição de Inteligência (referência): "Individuals differ from one another in their ability to understand 3

complex ideas, to adapt effectively to the environment, to learn from experience, to engage in various forms of reasoning, to overcome obstacles by taking thought. Although these individual differences can be substantial, they are never entirely consistent: A given person's intellectual performance will vary on different occasions, in different domains, as judged by different criteria. Concepts of "intelligence" are attempts to clarify and organize this complex set of phenomena. Although considerable clarity has been achieved in some areas, no such conceptualization has yet answered all the important questions and none commands universal assent”. Intelligence: Knowns and Unknowns, https://www.mensa.ch/sites/default/files/Intelligence_Neisser1996.

Alan Mathison Turing (1912-1954) foi influente no desenvolvimento da ciência da computação e na 4

formalização do conceito de algoritmo e computação, importante na criação do computador moderno. Turing foi o responsável pela “quebra do código” alemão (Enigma) na Segunda Guerra Mundial.

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Geoffrey Jefferson em 1949, impondo condições prévias para a existência de um máquina

inteligente: Não até que uma máquina possa escrever um soneto ou compor um concerto por causa de pensamentos e emoções sentidas, e não por causa de símbolos, poderemos concordar que essa máquina é igual ao cérebro - isto

é, não só escreve, mas sabe o que escreveu. Nenhum mecanismo pode sentir (e não apenas um sinal artificial, um dispositivo simples) prazer em seu sucesso, queixa quando suas válvulas se fundem, seja aquecido por

lisonjas, seja miserável por seus erros, fique encantado pelo sexo, fique bravo ou deprimido quando não pode obter o que quer (TURING, 1950, p.

445).

Quase setenta anos depois, a Inteligência Artificial está compondo música,

escrevendo soneto, pintando quadro, criando arte, não necessariamente por causa de

pensamentos e emoções sentidas como vaticinou Jefferson . Definir pensamento, 5

emoção, sentimento, bem como consciência, não é uma tarefa simples nem consensual.

Na conferência Ethics of Artificial Intelligence, em 2016, na Universidade de Nova York,

perante o argumento de distinção entre humano e artificial atribuído à consciência por

alguns filósofos, o Prêmio Nobel de Economia Daniel Kahneman, psicólogo de

formação, contra-argumentou: “Sobre o que afinal vocês estão falando? como podem

considerar consciência ou ausência de consciência, se não avançamos em nada sobre o

entendimento do que seja consciência?”. Circunscrito a temática do artigo responder à

essas questões não é essencial; o propósito é descrever e refletir sobre os impactos das

tecnologias de IA na mediação, tomando como exemplo os algoritmos da rede social

Facebook. Antes, porém, uma breve introdução ao campo da IA.

Retornaremos à Turing, o que desejamos pontuar aqui é o seu papel como precursor das máquinas 5

inteligentes.

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2. Contextualizando o Campo da Inteligência Artificial (IA)6

Cunhado em 1956 por John McCarthy, o termo “Inteligência Artificial” (IA) deu

início a um campo de conhecimento associado com linguagem e inteligência, raciocínio,

aprendizagem e resolução de problemas (RUSSELL; NORVIG, 2009). A IA propicia a

simbiose entre o humano e a máquina ao acoplar sistemas inteligentes artificiais ao corpo

humano (prótese cerebral, braço biônico, células artificiais, joelho inteligente e

similares), e a interação entre o homem e a máquina como duas “espécies” distintas

conectadas (homem-aplicativos, homem-algoritmos de IA). Tema de pesquisa em

diversas áreas - computação, linguística, filosofia, matemática, neurociência, entre outras

-, remete à capacidade de raciocínio por máquinas, referenciado no funcionamento da

mente humana. A diversidade de subcampos e atividades, pesquisas e experimentações,

dificulta descrever o “estado-da-arte” atual da IA. Os estágios de desenvolvimento bem

como as expectativas variam entre os campos e suas aplicações, que incluem os veículos

autônomos, reconhecimento de voz, games, robótica, tradução de linguagem natural,

diagnósticos médicos, assim por diante. Atualmente, os sistemas inteligentes permeiam

praticamente todas as áreas de conhecimento.

Por milhares de anos, tentamos entender como pensamos; isto é,

como um mero punhado de matéria pode perceber, compreender, prever e manipular um mundo muito maior e mais complicado do que ele mesmo. O campo da inteligência artificial, ou IA, vai ainda mais longe: tenta não apenas compreender, mas também construir

entidades inteligentes (RUSSELL; NORVIG, 2009, p. 1).

Existem inúmeras definições de Inteligência Artificial, reflexo das especificidades

intrínsecas a cada campo de conhecimento. Russell e Norvig (2009) listam oito delas

agrupadas em duas dimensões: (a) as relativas à pensamento, processos e raciocínio e (b)

as relativas à comportamento.

O conhecimento e informações da autora sobre IA têm origem (a) na leitura de extensa bibliografia, (b) 6

em cursos, simpósios, e conferências no Brasil e no exterior e (c) nas interações da autora com o cientista da computação Davi Geiger, Courant Institute / NYU.

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Historicamente, todas as quatro abordagens de IA tem seguidores, cada uma por pessoas diferentes com métodos diferentes. Uma abordagem centrada no ser humano, em parte, está associada a ciência empírica, envolvendo observações e hipóteses sobre o

comportamento humano. Uma abordagem racionalista, envolve uma combinação de matemática e engenharia. Os vários grupos tem tanto depreciado quanto ajudado uns aos outros. (Idem, p. 2)

Duas definições generalistas servem ao propósito do artigo. A primeira de John

McCarthy “É a ciência e a engenharia de fazer máquinas inteligentes, especialmente

programas de computador inteligentes” e a segunda de Russell e Norvig "O estudo e 7

concepção de agentes inteligentes, onde um agente inteligente é um sistema que percebe

seu ambiente e realiza ações que maximizam suas chances de sucesso” (RUSSELL;

NORVIG, 2009 - p.27).

Russell e Norvig (2009) aventam duas perguntas filosóficas: (a) pode a máquina 8

atuar de forma inteligente? e (b) pode a máquina realmente pensar? Retomando ao

“Teste de Turing”, seu objetivo era a máquina “convencer” o interrogador de que ela era

um ser humano. A dinâmica do teste consistia em colocar um observador numa sala se

comunicando por meio de teletipo com um computador em uma segunda sala e com um 9

humano em uma terceira sala, por um período específico; o computador é inteligente se e

somente se o observador não for capaz de perceber a diferença entre o computador e o

humano. Não ficam claras algumas variáveis do teste, tais como o tempo de duração, as

qualificações dos interrogadores e quais tópicos podem ser abordados (conteúdo das

perguntas). Entre os questionamentos, evidenciam-se (a) o fato dos envolvidos serem

alunos universitários, aumentando a probabilidade de respostas corretas, e (b) o fato de

Q. What is artificial intelligence? A. It is the science and engineering of making intelligent machines, 7

especially intelligent computer programs” Disponível em http://jmc.stanford.edu/artificial-intelligence/what-is-ai/index.html; último acesso em 29/jan/2018.

Publicado originalmente em 1994 e seguido de várias novas edições, adotado nas universidades 8

americanas como o livro de referência sobre IA.

Aparelho telegráfico, transmite diretamente um texto por meio de um teclado datilográfico, registrando a 9

mensagem, no posto receptor, sob a forma de letras impressas.

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Turing nunca ter mencionado a necessidade de prover a máquina de memória, de criar um

perfil, de capacitá-la a responder às perguntas. Reduzindo, em parte, suas ambições,

Turing chega a propor substituir a pergunta “As máquinas podem pensar?” por “Pode um

computador grande e rápido de uso geral ser programado para jogar o Jogo de Imitação?”

(MCDERMOTT, 2014).

O filósofo Ned Block (2009) aponta algumas idiossincrasias do teste. A primeira

está no fato da decisão derivar do comportamento discriminatório de um observador

humano: os resultados são função do seu conhecimento e formação, ou seja, se o

observador for um especialista em IA a probabilidade dele identificar corretamente a

máquina é significativamente maior do que de um leigo. Ademais, substituir o conceito

de inteligência pelo conceito de “passar no teste de Turing” parece a Block destituído de

sentido.

Se o propósito da substituição é prático, o teste de Turing não é um grande

sucesso. Se alguém quiser saber se uma máquina joga bem xadrez ou diagnostica pneumonia corretamente ou se é capaz de planejar estratégia numa partida de futebol, o melhor é observar os resultados da máquina em ação, e não submetê-la ao teste de Turing. (Idem, p. 378)

O foco no desempenho e não na competência seria outra falha: “É claro que o

desempenho é uma prova da competência, mas o núcleo de nossa compreensão da mente

reside na competência mental, não no desempenho comportamental” (BLOCK, 2009, p.

384).

O que temos discutido até agora é o primeiro tipo de definição de

inteligência, a definição da palavra, não a coisa em si. A definição de Turing não é o resultado de uma investigação empírica sobre os componentes da inteligência do tipo que levou à definição de água como H2O. […] Uma maneira completamente diferente de proceder é investigar a própria

inteligência como os físico-químicos investigam a água (Idem, p. 384)

Para Block (2009), na abordagem computacional, a discussão restringe-se a um

aspecto da mente, a inteligência. “Para os nossos propósitos, podemos pensar a

inteligência como uma capacidade para atender a várias atividades inteligentes, tais como

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a resolução de problemas de matemática, decidir ir ou não para a pós-graduação e

descobrir como é feito o spaghetti” (p. 392).

Os questionamentos ao “Teste de Turing” são pertinentes, vários elementos não

são devidamente esclarecidos e o teste carece de rigor científico. No entanto, ele preserva

seu mérito na medida em que introduz os meandros do campo da IA. As nove objeções e

as réplicas de Turing (TURING, 1950) ainda fazem sentido no estágio atual de

desenvolvimento da IA.

A seguir alguns conceitos - chave que facilitam o entendimento posterior da

relação da Inteligência Artificial com a mediação na comunicação e nas redes sociais.

a) Máquinas inteligentes vs Cérebro

As chamadas máquinas inteligentes não reproduzem o funcionamento do cérebro,

cuja complexidade, e ainda relativamente pouco entendimento, inviabiliza qualquer

tentativa nessa direção. É mais correto dizer que a construção das máquinas de IA é

inspirada no cérebro humano. A parte do córtex do cérebro, espécie de “capacete” que

reverte o cérebro, é onde está a inteligência humana. O cérebro é composto de neurônios,

que por sua vez são formados por detritos que se conectam por meio de sinapses: cada

vez que os detritos dos neurônios se encontram provocam uma sinapse (conexão). Essa

configuração, por analogia, é a chamada Redes Neurais, ou “Coneccionismo", em que o

equivalente aos neurônios no computador são as unidades, ou seja, cada unidade do

computador equivale a um neurônio no cérebro humano. Se temos 100 “sinapses" num

computador, significa que temos 100 informações chegando e se conectando. As novas

unidades, localizadas num novo layer (“camadas"), recebem as informações, processam e

“cospem” o output para as unidades de um novo layer.

No processo de visão, por exemplo, a retina, um censor de luz, representa o

primeiro layer. A retina é impactada por feixes de luz, que são as primeiras informações

originadas no exterior. O mesmo se passa no ouvido com relação ao som, no olfato com

relação ao cheiro, e no tato com relação a sensibilidade. São informações elétricas e

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químicas, posteriormente enviadas para o cérebro. O aparelho perceptivo da visão é o

único dos sentidos em que o primeiro layer contém neurônios (logo, já é “cérebro”). Não

por coincidência é o mais sofisticado, correspondendo a 1/3 do cérebro, ou seja, esta

parcela do cérebro é dedicada à visão (a segunda atividade predominante no cérebro são

os movimentos). A luz inicialmente encontra o censor da retina, que é o primeiro layer,

em seguida segue para um novo layer, neste caso localizado na parte de trás do cérebro,

chamada de V1, continua se deslocando entre vários layers, até retomar para a parte

frontal do cérebro (vision path way). O cérebro tem 10 áreas, e cada área cerca de 140

milhões de neurônios.

O computador criado pela Microsoft há dois anos atrás, considerado o mais

avançado atualmente na tarefa de reconhecimento de imagem - Image res.Net - tem 152

layers, ou seja, as unidades vão se conectando e transmitindo informação a outras

unidades ao longo de 152 layers.

Fazendo um paralelo entre a visão humana e a câmara fotográfica, a nossa retina

corresponde ao sensor de imagem da câmara. Em ambos, o que desencadeia o processo é

a incidência de luz. O input da luz se transforma num número. Como isso é possível? A

luz é composta de fótons, então importa calcular quantos fótons “caíram" na minha retina

por unidade de tempo. Simplificando, o que permite diferenciar um objeto de outro é o

exatamente o numero de fótons que sensibilizam a retina. Se todos os inputs viram

números, temos um conjunto de números no primeiro layer. O processo é semelhante no

cérebro e nas máquinas inteligentes. Cada unidade (unit), que corresponde ao neurônio

humano, tem a decisão em relação ao que ela envia adiante para outro layer (ou não

envia), observando-se que o que sai não necessariamente é igual ao que entrou no layer

anterior significando certo grau de autonomia.

Cada unit recebe informações (inputs) de muitas units do layer anterior. No estado

de evolução atual da IA, o operador humano arbitra o número de layers. No futuro, existe

forte indicação neste sentido, as máquinas vão construir outras máquinas inteligentes

(sem arbitragem humana). O que define uma máquina inteligente são dois componentes:

o valor de cada conexão e a arquitetura, traduzido no número de layers. A figura abaixo

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ilustra uma arquitetura típica, com a delimitação de responsabilidades entre duas CPUs

(Central Processing Unit):

Fonte: 4824-imagenet-classification-with-deep-convolutional-neural-networks, p.5.

b) Machine Learning

Subcampo da IA, dá aos "computadores a capacidade de aprender sem serem

explicitamente programados. Arthur Lee Samuel, um pioneiro norte-americano no campo

de jogos de computador e inteligência artificial, cunhou o termo “Machine Learning" em

1959 (enquanto funcionário da IBM). Evoluindo a partir do estudo do reconhecimento de

padrões e da teoria de aprendizagem computacional na IA, o Machine Learning explora o

estudo e a construção de algoritmos que podem aprender e fazer previsões sobre dados -

esses algoritmos seguem instruções estritamente estáticas ao fazer previsões ou decisões

baseadas em dados, através da construção de um modelo a partir de entradas de amostra.

O aprendizado de máquina é empregado em uma variedade de tarefas de computação,

onde o projeto e programação de algoritmos explícitos com bom desempenho é difícil ou

inviável.

A técnica não ensina as máquinas a, por exemplo, jogar um jogo, mas ensina

como aprender a jogar um jogo. O processo é distinto da tradicional “programação”. Para

fazer uma máquina “aprender” algo, é possível utilizar diversas técnicas baseadas em

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princípios lógicos e matemáticos, mais ou menos complexos. O objetivo é fazer com que

um sistema apreenda informações dadas e execute uma tarefa visando o melhor resultado,

sem depender de interferência humana. É um método usado para conceber modelos e

algoritmos complexos que se prestam à previsão. Esses modelos analíticos permitem que

pesquisadores, cientistas de dados, engenheiros e analistas produzam decisões e

resultados confiáveis e replicáveis, e revelem "idéias ocultas" através da aprendizagem de

relacionamentos históricos e tendências nos dados.

c) Deep Learning

Na década de 1980, inspirados no cérebro humano, cientistas da

computação criaram um subcampo da ML (Machine Learning) propondo um processo de

aprendizado com base nas redes neurais, com resultados mais concretos nesta década. O

pioneiro foi Geoffrey Hinton, com a ideia de "Neural Networks" em artigo publicado na

Revista Nature de 1986 . Começou a florescer na década de 1990, em função (a) da 10

crescente disponibilidade de grande quantidade de dados (Big Data), (b) da maior

capacidade computacional e (c) da evolução dos algoritmos. O foco são problemas

solucionáveis de natureza prática, relacionados a uma tarefa concreta. "As redes

profundas ainda funcionam em domínios relativamente restritos, mas estamos vendo

resultados mais impressionantes todos os dias à medida que as redes aumentam e são

treinadas com mais dados” (ALPAYDIN, 2016, p.109).

O treinamento de uma rede neuronal artificial consiste em mostrar exemplos e

ajustar gradualmente os parâmetros da rede até obter os resultados requeridos,

denominado "aprendizagem supervisionada”: são fornecidos os resultados desejados

(output) e, por “tentativa e erro” (processo das máquinas não inteiramente conhecido/

dominado pelos humanos) chega-se ao resultado - meta.

Uma vez que temos dados - e hoje em dia temos dados "grandes" - uma

computação suficiente disponível - e agora temos centros de dados com

“Learning representations by back-propagating errors”, David E.Rumelhart, Geofrrey E. Hinton & 10

Ronald J. Williams, Nature, Vol. 323, October,1986. Disponível em https://www.iro.umontreal.ca/~vincentp/ift3395/lectures/backprop_old.pdf. Acesso em 29/jan/2018.

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milhares de processadores - apenas esperamos e deixamos o algoritmo de

aprendizagem descobrir tudo o que é necessário por si só. […] Descobrir essas representações abstratas é útil não só para a previsão, mas também porque a abstração permite uma melhor descrição e compreensão do problema (ALPAYDIN, 2016, p.108).

A rede geralmente tem entre 10-30 layers empilhados de neurônios artificiais.

Num reconhecimento de imagem, por exemplo, o primeiro layer procura bordas ou

cantos; os layers intermediários interpretam as características básicas para procurar

formas ou componentes gerais; e os últimos layers envolvem interpretações completas.

Na identificação de fotos nas redes sociais, a máquina percebe padrões e “aprende” a

identificar rostos, tal como alguém que olha o álbum de fotos de uma família

desconhecida e, depois de uma série de fotos, reconhece o fotografado. O

reconhecimento de voz, que junto com a visão computacional está entre as aplicações

mais bem-sucedidas, já permite a comunicação entre humanos e máquinas, mesmo que

ainda precária (Siri, Alexa, Google Now). Na cognição, onde estão os sistemas de

resolução de problemas, ocorreram igualmente importantes avanços.

No senso comum, Inteligência Artificial está associado aos filmes de ficção

científica com os robôs, em geral, ameaçando a espécie humana. A robótica, contudo, é

apenas um dos campos de aplicação da IA, e já estão disponíveis no mercado “robôs do

bem”. Na maior conferência de tecnologia da Ásia, Rise, em Hong Kong, na edição de

julho/2017, a Ubtech Robotics apresentou o Alpha 2 como o primeiro humanoide para a

família, capaz de lembrar compromissos, fazer pequenos reparos, cozinhar, configurar

alarmes, lembrar horários de medicamentos, fazer ligações telefônicas, checar mensagens

de voz, ler e enviar textos e emails. Seu antecessor, o Alpha 1 pode ser comprado na

Internet por R$ 1.541,45. O robô Sophia participou como palestrante na Rise sobre o

tema “o papel dos robôs no futuro da humanidade”. Produzido pela Hanson Robotics,

Sophia incorpora a beleza clássica de Audrey Hepburn, foi capa de revista feminina,

cantou em concerto, e debateu em fóruns de negócios.

d) Algoritmos

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Algoritmo é um conjunto de instruções matemáticas, uma seqüência de tarefas

para alcançar um resultado esperado em um tempo limitado. Os Algoritmos antecedem os

computadores – o termo remonta ao século IX ligado ao matemático al-Khwãrizmi, cujo

livro ensinava técnicas matemáticas a serem equacionadas manualmente. “Algorismus"

era originalmente o processo de calcular algarismos hindo-arábicos. Ed Finn (2017)

define um Algoritmo como “qualquer conjunto de instruções matemáticas para manipular

dados ou raciocínio através de um problema” [p.17] ou, numa definição pragmática, “os

algoritmos são adequados para um propósito, iluminando caminhos entre problemas e

soluções” (p.18). Brian Christian e Tom Griffiths (2016) extrapolam o conceito para além

do âmbito da matemática : “Quando você cozinha pão a partir de uma receita, você está

seguindo um algoritmo, o mesmo quando você tricota uma peça com base num

determinado padrão. […] Algoritmo faz parte da tecnologia humana desde a Idade da

Pedra” [p.4]. De forma mais pragmática, o Google define Algoritmo como “processos e

fórmulas computacionais que levam suas perguntas e as convertem em

respostas” (Algorithms - Inside Search - Google). Seja como for, o Algoritmo é hoje um

conceito fundamental na ciência da computação (e em nossas vidas).

O Algoritmo é a matemática da Inteligência Artificial. Ao combinar múltiplas

formas de cálculos estatísticos na análise de dados, permite desde compreender o

comportamento dos usuários das redes sociais, ou até mesmo identificar “suspeitos” a

serem eliminados por Drones militares, passando por determinar o grau de periculosidade

de criminosos e consequentemente a pena do condenado (Compas - Correctional

Offender Management Profiling for Alternative Sanctions). Os Algoritmos de Inteligência

Artificial interferem nos processos de contratação de empréstimo bancário e de

profissionais, nos diagnósticos médicos, e estão substituindo os humanos em inúmeras

tarefas, mecânicas e cognitivas.

3. Os Algoritmos de IA Alteram a Mediação (Interação e Comunicação)

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Como enfatiza Fernanda Bruno (2003) “seja pelo corpo, pelas capacidades

cognitivas, pelas estruturas simbólicas, pelos intermediários humanos ou pela tecnologia,

nossa experiência do mundo se dá por mediações” (p. 2). A crença nos primórdios da

Internet de um local sem centro de decisão, sem controle, sem filtragem ou seleção das

informações, ou seja, sem mediadores, não parece coerente nem com a diversidade das

interfaces digitais nem com a expansão contínua dos algoritmos. As características das

redes digitais - descentralizada, promotora da autonomia individual e da redistribuição do

poder, transparente, etc. - de certa forma induz a essa percepção equivocada, mas como

argumenta Bruno (2003)

A transparência da informação que vigora na Internet implica não uma supressão dos mediadores, mas uma mudança na sua ‘natureza’ e no seu modo de atuação. Talvez possamos afirmar que a Internet elimina ou transforma os mediadores tradicionais –

jornalistas ou homens de comunicação em geral, políticos, Estado, produtores culturais (editores, marchands, críticos de arte, indústria fonográfica etc) – mas não implica a supressão da

mediação ela mesma (pp.4-5).

A mediação não está confinada a comunicação e formas relacionadas de mídia,

mas permeia toda atividade humana e não-humana. Neste sentido, Grusin (2015) propõe

repensar o conceito de mediação, e introduz a ideia de “Mediação Radical” em que a

mediação não se interpõe entre um sujeito e um objeto preexistentes, mas traduz ou gera

experiências, e não ocorre exclusivamente entre humanos.

Como a transação e outros dados são agora coletados, minados e analisados em quase tudo o que os humanos e os não-humanos

fazem, a mediação de dados molda todos os tipos de ação institucional. E como os defensores da internet das coisas trabalham para um mundo no qual todos os seres humanos e não-

humanos estejam interligados e mediados, a ligação da mediação com a comunicação, tão essencial nos séculos XIX e XX e ainda relevante, precisam ser desfeitas ou abertas para que a mediação possa ser vista como um processo mais fundamental do que

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qualquer mídia ou comunicação jamais poderia sugerir ou

pretender (GRUSIN, 2015, p.138).

O tema da mediação é complexo e objeto de múltiplas abordagens (Simondon,

Hegel, Adorno, Benjamin, Peirce, McLuhan, Callon, Latour, Martin-Barbero, Santaella,

Di Felice). O foco do artigo não é o conceito de mediação; apenas como tentativa de

fortalecer os argumentos antes de entrar no tema - descrever e refletir sobre a

complexidade adquirida com a inclusão dos algoritmos de IA - pontuamos duas

contribuições (a) a introdução dos atores “não-humanos” ou mediação técnica e (b)

indivisibilidade dos atores no contexto das redes digitais.

Na década de 1980, um grupo de franceses liderados por Michael Callon e Bruno

Latour introduziu novos elementos na mediação consolidados na Teoria Ator-Rede

(TAR), como mediação técnica e a agência não - humana (LATOUR, DATA). No texto

On Technical Mediano: Philosophy, Sociology, Genealogy, Latour (1994) propõe quatro

definições para mediação, sendo a mediação técnica o tema da “Mediação como Caixas

Pretas Reversíveis”. Latour indaga por que é tão difícil mensurar, qualquer que seja a

precisão, o papel da mediação técnica. A resposta estaria no fato de que a ação que está se

tentando medir está sujeita a uma “caixa-preta”, a qual torna totalmente opaca a produção

conjunta dos atores. Qualquer objeto é uma “caixa preta”, que contém diversos outros

objetos e distintas montagens. Numa situação normal, esses objetos permanecem

“silenciosos”, invisíveis, transparentes, mas isso não significa que não exista movimento,

que eles não estejam mediando ações. Os algoritmos de Inteligência Artificial, ao “filtrar"

o fluxo de informações, interferem na mediação entre os usuários da web como agentes

“silenciosos” e invisíveis, coerente com o conceito de “Mediação Técnica” de Latour.

No âmbito das redes digitais, Di Felice (2009) enfatiza a mudança dos contextos

de sociabilidade no século XXI que se manifestam em ambientes híbridos, no interior dos

quais os atores são indivisíveis. As redes digitais alteraram não somente a estrutura física

e arquitetônica, mas o próprio significado de habitar. Para ele, a digitalização é um

"processo de conexão que faz com que uma matéria, sem perder a própria substância,

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sem perder a própria característica, adquira pelo processo de digitalização um conjunto

de outras possibilidades e de performances que inevitavelmente vão alterar a própria

substância material originária (DI FELICI, 2017, p.140).

Os Agentes Inteligentes, por exemplo, em simbiose com os humanos e outros

atores, agem como facilitadores ou mediadores da comunicação digital. “São seres

eletrônicos indispensáveis ao funcionamento da sociedade em tempo

real” (SANTAELLA, 2010b, p.108). Denominados inicialmente de “Knowbots” (robôs

do saber), “buscam informações em centenas de bases de dados, sites, bibliotecas,

revistas, jornais do ciberespaço, de acordo com instruções baseadas nos centros de

interesse de indivíduos ou grupos” (BRUNO, 2003, p.6). Essa mediação foi antecipada

em meados dos anos 1990 por Nicholas Negroponte (1995) como “aquilo que chamamos

de interfaces baseadas em agentes é o que vai emergir como maneira predominante de

computadores e pessoas comunicarem-se uns com os outros” (p.101).

No século XXI, interagimos no cotidiano com dispositivos mediados pela IA , 11

precisamente pelos algoritmos de IA que, como uma linguagem matemática, são

utilizados em distintos processos. Os chamados “hyper-parameters” são variáveis que

determinam a estrutura da rede e a forma como a rede foi treinada e, em geral, são

definidas por especialistas; existem os parâmetros estimados pelo processo de “Deep

Learning” (autonomia relativa), para citar duas configurações possíveis. Parte do sucesso

da Netflix, por exemplo, está em seu sistema de personalização, em que algoritmos

analisam as preferências do usuário (e de grupos de usuários com preferências

semelhantes) e, com base nelas, sugere filmes e séries. Acessamos sistemas inteligentes

para programar o itinerário com o Waze, pesquisar no Google e receber do Spotify

recomendações de músicas. A Siri, da Apple, o Google Now e a Cortana, da Microsoft,

são assistentes pessoais digitais inteligentes que nos ajudam a localizar informações úteis

com acesso por meio de voz. A mediação comunicacional extrapola os “suportes”

tradicionais, contemplando, dentre outros, os eletrodomésticos: o conceito de "geladeira

Propositalmente, substituímos o termo “máquina” por “dispositivo”, pela forte associação/conteúdo do 11

primeiro as “máquinas mecânicas”.

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inteligente" é de "family hub", ou seja, a geladeira ser um centralizador de informações da

família, com recursos simples como uma tela para fixar anotações e fotos, aos mais

sofisticados como a visualização no smartphone do seu interior.

A título de ilustração, vejamos como os algoritmos de IA da rede social Facebook

transformam a mediação entre seus usuários.

Mediação dos Algoritmos do Facebook

O Facebook AI Research (FAIR), criado em 2013, dedica-se ao desenvolvimento

do campo da Inteligência Artificial visando criar tecnologias que promovam novas

possibilidades de comunicação (mediações). O espectro das pesquisas abrange variados

tópicos - tais como teoria, algoritmos, aplicativos, infra-estrutura de software e de

hardware - e são compartilhados em publicações, software aberto, eventos e fóruns

acadêmicos. As tecnologias de IA estão presentes em distintos produtos e iniciativas do

Facebook, vamos nos ater aos impactos na mediação com os usuários no conteúdo

publicado no “Feed de Notícias”.

O Facebook utiliza algoritmos de IA no gerenciamento do que deve ou não ser

mostrado na timeline (ou Feed de Notícias) de seus usuários, ou seja, o que é publicado

em primeiro plano na tela principal do usuário. São disponibilizados diariamente cerca de

2 mil itens para cada usuário (mensagens, imagens, vídeos etc.). Dentre esse conjunto de

informações, os algoritmos do Facebook identificam as preferências e interesses do

usuário e selecionam de 100 a 150 itens a serem exibidos no Feed de notícias desse

usuário, com a intenção de facilitar sua experiência. A seleção assertiva de “conteúdos

relevantes” é processada por meio dos algoritmos de IA manipulando um conjunto de

dados gerados das interações do usuário na sua rede de relacionamento, tais como seus

“Likes”, suas publicações (posts), as publicações comentadas e o conteúdo dos

comentários, as publicações compartilhadas, as fotos publicadas e compartilhadas, as

conexões prioritárias, o tempo de permanência em determinado tipo de postagem, em

suma, todos os rastros da atividade do usuário na rede social. Com os dados coletados, os

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algoritmos buscam combinações e intersecções com base em quatro macro fatores: (a)

quem postou, considerando o nível de interação entre os usuários, (b) quando postou

(quanto mais recente maior a chance de aparecer no Feed de notícias), (c) tipo de

conteúdo, com base na pesquisa de suas preferências e interesses, e (d) engajamento com

o post, sua e de sua rede. Em paralelo, o Facebook segue um procedimento de

categorização, conferindo prioridade a (a) amigos e família, (b) postagens informativas,

(c) entretenimento, (d) convergências de opiniões e ideias, e (e) autenticação (elimina os

spam, boatos, etc.). Periodicamente, são implementadas alterações, em geral, testadas em

regiões pré-selecionadas (função das características do novo produto/sistemática) e

anunciadas previamente . 12

Em janeiro de 2018, o Facebook anunciou uma mudança na classificação das

mensagens no Feed de notícias, motivado, em parte, pela proliferação das Notícias Falsas

(“Fake News”) que tiveram grande impacto nas eleições americanas de 2016, e,

prioritariamente, para atender ao interesse de seus usuários. Pesquisas da própria rede

social (complementadas por pesquisas externas), indicaram que os usuários preferem (“se

sentem melhor”) interagir com conteúdos publicados por amigos e familiares . Os 13

algoritmos passaram a privilegiar as publicações de amigos e familiares em detrimento de

publicações jornalísticas, de empresas e vídeos virais, ou seja, promover conteúdo

originado de "interações significativas” e reduzir o "conteúdo passivo”.

Uma das principais razões pelas quais as pessoas vêm ao Facebook é ver o que está acontecendo em seus News Feeds. Nosso objetivo com News Feed

sempre foi mostrar às pessoas as coisas que eles querem ver. Quando as pessoas vêem conteúdo que é relevante para eles, tornam-se mais propensas a se envolver com News Feed. […] Como parte de uma pesquisa em andamento, perguntamos à centenas de milhares de pessoas como se sentem

sobre o conteúdo em seus News Feeds. As pessoas nos disseram que

Para acompanhar as mudanças e comunicados do Facebook: https://br.newsroom.fb.com.12

Pesquisa interna: grupo focal, 24 horas observando dois grupos de usuários, um concentrado em 13

publicações de amigos/família e outro, publicações em geral. Fonte: entrevista no Facebook Brasil, janeiro/2018.

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queriam ver mais histórias de amigos e páginas sobre as quais eles se

preocupavam e menos conteúdo promocional. 14

O risco é privar os usuários de conteúdo jornalístico de qualidade (além de

impactar os sites de notícias cuja audiência é maximizadas pelas redes sociais digitais ). 15

A principal crítica a esse sistema inteligente do Facebook (ou qualquer rede social

digital) é a formação de “bolhas”, ao promover a homogeneização das relações sociais.

Wendy Hui Kyong Chun introduz o conceito de “Homofilia” (gostar dos iguais) 16

associado aos algoritmos das mídias sociais como criadores de "clusters", ou seja,

mantém as pessoas em círculos sociais fechados, formado por iguais (pensamento,

vivência, histórico, etc.). Trata-se de um tema polêmico, pode-se considerar o sentido de

causa-efeito inverso: os algoritmos “entregam" o que os usuários desejam e, em geral,

eles preferem se relacionar com seus iguais (fenômeno que antecede as tecnologias

digitais, parte constitutiva da natureza humana, e mesmo dos animais). O fato observável

é que os amigos “conservadores" tendem a desaparecer do Feed de Notícias de um

usuário progressista (e vice-versa): os algoritmos do Facebook privilegiam os posts que

recebem mais “likes”e/ou são mais comentados e compartilhados.

Os contra-argumentos do Facebook são: 17

a) As mudanças são sempre implementadas com transparência e responsabilidade,

antecedidas de pesquisas sobre os desejos e as expectativas dos usuários, e anunciadas

previamente. O foco é sempre o usuário (“consumer-driven”);

b) O Facebook tem compromisso permanente com a diversificação das informações,

pontos de vista, visões, que circulam em sua plataforma;

Fonte: https://www.facebook.com/business/news/update-to-facebook-news-feed.14

Pesquisa do Pew Research Center, apurou que 67% dos americanos em 2017 acessaram notícias por 15

meio das mídias digitais, incluindo os usuários maiores de 50 anos.

Palestra proferida no Festival Transmediale, Berlim, fevereiro/2017.16

Fonte: entrevista com equipe do Facebook Brasil, janeiro/2018.17

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c) Os usuários da plataforma têm relativo controle sobre seu Feed de Notícias, por meio

de ajustes tais como “See First”, que decide quem e/ou que será privilegiado na

seleção.

4. Considerações Finais

O dilema conveniência versus privacidade permeia os debates entre especialistas,

acadêmicos e usuários da Internet, e tem sido destaque nos congressos e conferências . A 18

percepção predominante é a de que estamos cada vez mais dispostos a trocar nossos

dados pessoais, advindos da movimentação online ("rastros digitais”), por conveniência

— no sentido amplo: desde o acesso ao Facebook e ao Google e a tudo que essas

plataformas oferecem, até o compartilhamento nas redes sociais, ou em comunidades de

interesse, de questões específicas em busca de recomendação, solidariedade, troca de

experiências, passando pelo acesso do aplicativo Waze aos nossos itinerários (rotinas). 19

Parte do significado do termo “conveniência" advém de sua relevância (quanto mais

relevante, maior a percepção de utilidade e/ou conveniência).

Predominou, por exemplo, na Conferência RISE, o maior evento de tecnologia da Ásia, em sua versão 18

de julho/2017.

Não por acaso, cresce a exposição pública de temas até recentemente restritos ao âmbito privado 19

(referência sexual, atividade sexual, questões de gênero, saúde, e similares).

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Não por coincidência, a movimentação da web é cada vez mais baseada no

conceito de “relevância”. Em seus primórdios, a Internet e a web ofereciam a perspectiva

de "livro acesso” a toda e qualquer informação, se opondo a tradição da mídia com a

figura do “GateKeeper”. Recentemente, o avanço dos algoritmos representou uma

mudança no modo como a informação flui nas redes digitais, e como ela é personalizada

por filtragens de conteúdo. Para Eli Pariser (2011) houve um deslocamento do

Gatekeeper humano para o Gatekeeper algoritmo. O ativista político alerta que o

Facebook não é o único que usa algoritmos para priorizar os conteúdos relacionados à um

conjunto particular e individual de informações online, em um processo denominado por

ele de “Filter Bubbles”. O que as companhias de tecnologia - Facebook, Google -

mostram é o que o usuário quer ver, e não o que o usuário “deveria ver”. “Temos que

assegurar que a web nos dê acesso não só ao que é relevante, mas também ao que é

importante, desconfortável, desafiador e outros pontos de vista”. 20

A matemática americana Cathy O’Neil (2016) destaca a quantidade significativa

de poder do Facebook (assim como Google, Apple, Amazon, e outros conglomerados de

tecnologia), na manipulação dos dados gerados pela movimentação de seus usuários, com

interferência direta nos processos de mediação. Ela ilustra seu ponto de vista com o

produto “voter megaphone”, concebido para estimular os americanos à cumprir seu

“dever cívico” de votar . Durante as campanhas eleitorais de 2010 e 2012, os 21

pesquisadores do Facebook observaram a influência dos posts sobre o comportamento do

potencial eleitor, ou seja, a sensibilidade do potencial eleitor aos distintos conteúdos e

formatos da publicações nos Feeds de notícias da plataforma.

Nenhum pesquisador teve a oportunidade de acessar um laboratório humano dessa escala. Em poucas horas, o Facebook poderia colher informações de dezenas de milhões de pessoas, ou mais, medindo o impacto que suas

palavras e links compartilhados. E poderia usar esse conhecimento para

PARISER, TED “Tenha cuidado com os filtros bolhas on-line”, 2011, disponível em https://20

www.ted.com/talks/eli_pariser_beware_online_filter_bubbles?language=pt-br. Acesso em 29/jan/2018.

"Estudos demonstraram que a satisfação silenciosa da realização de um dever cívico é menos propensa a 21

mover as pessoas do que o possível julgamento de amigos e vizinhos”” (O’NEIL, 2016, p.180).

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influenciar as ações das pessoas, o que, nesse caso, foi a decisão de votar ou

não votar (O’NEIL, 2016, pp.180-181).

Não há consenso entre os experts sobre o futuro da Inteligência Artificial. Em

relação ao tempo de concretização de uma “máquina inteligente”, as pesquisas entre

especialistas indicam 10% de probabilidade até 2020, 50% de probabilidade até 2040 e

90% de probabilidade até 2075, supondo que as atividades de pesquisa continuarão sem

maiores interrupções (BOSTROM, 2014). Essas mesmas pesquisas apontam ser alta a

probabilidade da superinteligência ser criada em seguida a máquina inteligente no nível 22

humano. Para Kevin Kelly a vantagem obtida com a cognição de objetos inertes será

centenas de vezes mais perturbadora para nossas vidas do que as transformações obtidas

pela industrialização (KELLY, 2010). “A chegada do pensamento artificial acelera todas

as outras rupturas” (Idem, p. 30), e inaugura novas formas de mediação. Torna-se difícil

identificar quem ou o que está agindo, e em localizar, compreender e isolar o papel e a

função dos humanos e da tecnologia. O que caracteriza o “ser humano” tradicional

encontra-se alargado pelo acoplamento com tecnologias, impossibilitando a identificação

dos limites do que seja humano e não - humano; os limites do próprio corpo e da

cognição estão expandidos. Temos desde as “tecnologias vestíveis” (Wearable) até a

introdução de dispositivos de IA. Trata-se de inéditas mediações, de interações e diálogos

entre inteligências.

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excede em muito o desempenho cognitivo dos seres humanos em praticamente todos os domínios de interesse".

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