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Integração Regional na América Latina: o “processo real” e a visão da Aliança Social Continental São Paulo – agosto de 2005

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Integração Regional na América Latina: o “processo real” e a visão da Aliança Social

Continental

São Paulo – agosto de 2005

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Apoio: Ford Foundation

Integração Regional na América Latina: o “processo real” e a visão da Aliança Social Continental

Coordenação: Alexandre Barbosa

Equipe:

Ricardo Camargo Mendes Gheisa Victorino

Carla Tomazini Débora Miura

Assistência Administrativa:

Maria Lúcia Ottati

Esse relatório não reflete as idéias e posições de toda a equipe da Prospectiva

Consultoria.

Rua Diogo Moreira, 135 – 05423-010 São Paulo SP, Brasil Fone (11) 3816-3636 - Fax (11) 3816-010

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Sumário

Apresentação 4 1. Desigualdades Norte-Sul e o Papel da Integração Regional na América Latina: As Abordagens da CEPAL e da UNCTAD

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1.1 A Visão Estruturalista da CEPAL e a Criação da UNCTAD 5 1.2 As Teorias da Dependência 7 1.3 A Avalanche Neoliberal e a “Adaptação” da Cepal e da Unctad ao novo Cenário Internacional

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2. O “processo real” de integração regional na América Latina 11 2.1 Mercado Comum Centro-Americano (MCCA) 12 2.1.1 Evolução Histórica e Características Institucionais 12

2.1.2 O MCCA e os Acordos Comerciais Extra-Regionais 14 2.1.3 Características Econômicas do MCCA 18 2.1.4 Quadro Sintético 21

2.2 Comunidade e Mercado Comum do Caribe (Caricom) 22

2.2.1 Evolução Histórica e Características Institucionais 22 2.2.2 O Caricom e Outros Acordos Comerciais 24 2.2.3 Características econômicas 25 2.2.4 Quadro Sintético 28

2.3 Comunidade Andina de Nações (CAN) 29

2.3.1 Evolução Histórica e Características Institucionais 29 2.3.2 A CAN e os Acordos Comerciais com outros Blocos 31

2.3.3 Características Econômicas 34 2.3.4 Quadro Sintético 37

2.4 Mercado Comum do Sul (Mercosul) 38

2.4.1 Evolução Histórica e Características Institucionais 38 2.4.2 O Mercosul e os outros acordos comerciais 40

2.4.3 Características Econômicas 42 2.4.4 Quadro Sintético 45

2.5 Alternativa Bolivariana para as Américas 47

2.5.1 Princípios Norteadores da ALBA e contraposições 47 2.5.2 A possível materialização 48 2.5.3 Características econômicas 49

2.6 Quadro Comparativo entre os blocos 51 2.7 Outras Iniciativas de Integração Sul-Americana 54

2.7.1 Iniciativa para Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana (IIRSA)

54

2.7.2 Comunidade Sul-Americana de Nações 55

3. Análise do Documento da Aliança Social Continental e Contraste com o “Processo Real” de Integração

57

3.1 A Visão da Aliança Social Continental 57 3.2 O Contraste com a Integração de Mercado 60 Bibliografia 62

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Apresentação Este texto, realizado pela Prospectiva Consultoria por solicitação da Central Única dos Trabalhadores, está dividido em três tópicos básicos. Na primeira parte, discutem-se os principais marcos teóricos sobre a integração regional nos países periféricos, a partir de uma análise da evolução das idéias da Cepal e da Unctad. O segundo tópico versa sobre o processo real de integração, descrevendo as principais características de blocos como o Mercado Comum Centro-Americano (MCCA), Caricom, Comunidade Andina de Nações (CAN) e Mercosul, as suas semelhanças e diferenças, assim como iniciativas comuns desenvolvidas entre estes projetos de integração. Discute-se também a proposta alternativa protagonizada pela Alba e as suas diferenças conceituais e práticas em relação às iniciativas predominantes de integração. Finalmente, a terceira parte do presente trabalho realiza uma síntese da visão da Aliança Social Continental sobre a integração no âmbito do continente americano, a partir do documento “Alternativa para as Américas”, contrapondo-a com a dinâmica assumida pelo processo real de integração ao longo dos anos noventa. O objetivo central deste relatório foi o de contrastar a dinâmica concreta da integração regional com os princípios defendidos pela Aliança Social Continental. Desta forma, ele cumpre um papel relevante na medida em que estimula o movimento social organizado do continente americano a refletir sobre os rumos da integração, mas também sobre as possibilidades de intervenção em processos que não estão concluídos e nem se mostram inexoráveis. Parte-se do pressuposto de que a reflexão constitui etapa necessária e fundamental para qualquer ação propositiva sobre a realidade econômica e social da região.

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1. Desigualdades Norte-Sul e o Papel da Integração Regional na América Latina: As Abordagens da Cepal e da Unctad Esta introdução procura situar, em linhas gerais, a evolução teórica das interpretações promovidas, a partir da periferia, sobre o papel da integração regional. Serão enfatizadas especialmente as contribuições da Cepal e da Unctad, mas também os enfoques desenvolvidos a partir da teoria da dependência. As atividades teóricas e políticas empreendidas por estas duas entidades pertencentes ao sistema das Nações Unidas possuem uma interdependência clara, na medida em que o trabalho de Raúl Prebisch como secretário-executivo da Cepal adquiriu uma tal visibilidade internacional, que permitiu a este economista se transformar no primeiro secretário-executivo da Unctad, quando da sua criação em 1964. Vale ressaltar ainda que ambas as organizações foram adequando as suas diretrizes de atuação de acordo com as mudanças vividas pela economia internacional, seguindo caminhos distintos, ora se distanciando, ora voltando a se interpenetrar. A presente introdução teórica sobre o debate em torno da integração regional, do ponto de vista da periferia do sistema capitalista, seguirá a seguinte estrutura. Em primeiro lugar, apresentaremos a visão estruturalista da Cepal e o papel da Unctad durante a sua primeira década de intervenção pública, para depois discutirmos a expansão das teorias dependentistas ao longo dos anos setenta. Finalmente, buscaremos averiguar as transformações sofridas pela Cepal e pela Unctad no período pós-anos oitenta, quando se verifica o predomínio das políticas neoliberais na grande maioria dos países em desenvolvimento. 1.1 A Visão Estruturalista da Cepal e a Criação da Unctad Durante os anos sessenta, os principais teóricos cepalinos começaram a realizar uma auto-crítica sobre os principais documentos elaborados na década anterior. Celso Furtado (1991) menciona seminário de auto-crítica realizado no Ilpes, em junho de 1964, enquanto Prebisch (1964) segue na mesma toada, referindo-se, já em 1963, à insuficiência dinâmica do processo expansivo e ao entorpecimento gerado pela estrutura social. Percebia-se, por um lado, que o ritmo da industrialização substitutiva mostrava-se, além de insuficiente para solucionar os problemas sociais, inferior ao que havia sido prognosticado. Inicia-se uma discussão sobre a tendência à estagnação das economias latino-americanas e sobre a necessidade de se remover os obstáculos estruturais. Por outro lado, diagnostica-se que a industrialização tendia a intensificar, ao invés de reduzir, a tendência secular de desequilíbrios externos na região. É neste quadro geral que surge a conceituação da integração regional como peça-chave para se avançar no processo de industrialização, como também para atenuar a dependência dos países desenvolvidos. Os mecanismos de integração surgem como vitais para superar um quadro de estruturas industriais estanques e para agregar valor às exportações nos marcos de uma “substituição regional de importações”. Em síntese, ainda que sob um viés economicista, tratava-se de solucionar o problema da necessidade de economias de escala num contexto de mercados relativamente reduzidos (Cepal, 1969).

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Na verdade, a integração regional deveria fazer parte de um amplo leque de políticas ativas de comércio internacional. Segundo Prebisch (1964), para que os países latino-americanos pudessem prosseguir rumo à industrialização – e já que a contribuição de recursos internacionais possuiria no máximo um caráter temporário – deveriam estes estabelecer políticas para modificar a estrutura do comércio internacional, aumentando as exportações de produtos industrializados, sem prejuízo de mecanismos de controle das flutuações dos preços dos produtos primários, já que então se verificava um crescente protecionismo agrícola dos Estados Unidos e da Comunidade Européia. Ao final dos anos sessenta, e já procedendo a uma análise das experiências da Área de Livre-Comércio da América Latina e do Caribe (Alalc) e do Mercado Comum Centro-Americano (MCCA), Furtado (1986) avalia que o esforço integracionista teria frustrado as expectativas iniciais, na medida em que a própria dinâmica econômica destes países se encaminhara não tanto para a diversificação produtiva, mas antes engendrando uma “nova dependência”. Tal fica claro, no âmbito da Alalc, onde poucos progressos foram feitos na liberalização do comercio de bens industriais, devido à resistência do Brasil, México e Argentina. Na melhor das hipóteses, criaram-se condições para a “planificação econômica” dos consórcios internacionais, já que o livre-comércio por si só não permite se caminhar para a gestação de um “sistema econômico regional”. Ainda assim, vale ressaltar que se estabelecera então um mecanismo inovador de reciprocidade parcial para os países com atraso relativo. Na no caso do MCCA, os efeitos da integração teriam sido positivos ao permitir uma industrialização, “quase do nada”, a partir da demanda regional. Contudo, tal processo, ainda que relevante, não logrou reduzir a dependência em relação às exportações tradicionais, voltadas para os mercados externos. Os anos setenta veriam o ocaso do projeto integracionista, mas também da temática estruturalista da Cepal, na medida em que as ditaduras militares se expandiram no Cone Sul e o dinamismo econômico mostrou-se crescentemente vinculado à expansão das multinacionais, e em alguns casos, como o brasileiro, do poder de investimento estatal. Neste contexto, em 1969, o Grupo Andino adquiria vida própria, apostando numa integração, sem o peso dos países mais industrializados da região, e que previa a desgravação tarifária, a instauração de uma tarifa externa comum e a criação do primeiro órgão financeiro totalmente latino-americano, a Corporação Andina de Fomento (CAF). Mas também esta iniciativa ficou refém do boom petroleiro, que favoreceu a Venezuela, além de ter perdido o Chile em meados dos anos setenta. Contudo, apesar deste cenário político conturbado, presente na maioria dos países latino-americanos, pode-se dizer que o estruturalismo da Cepal havia se universalizado, com a criação da Unctad - e logo quando de sua primeira reunião em Genebra - do G-77 (hoje com 131 países). A Unctad surgia como a voz do Sul nos debates multilaterais, apesar de não ter sido capaz de alterar, de forma substancial, as relações de comércio entre o centro e a periferia. Estas continuaram se mostrando assimétricas – tendo as distâncias entre estas regiões econômicas inclusive se ampliado desde então, como admite a própria Unctad (2004a).

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De concreto, durante esta primeira fase da Unctad (Unctad, 2005), que engloba da sua criação até o final dos anos setenta, podemos mencionar a criação do Sistema Geral de Preferências, em 1968, que abre espaço para exportações de países em desenvolvimento para os países desenvolvidos, com vantagens tarifárias, especialmente no caso dos produtos industriais. E em segundo lugar, a realização de acordos internacionais para algumas commodities, com o intuito de estabilizar o preço das exportações. Ressalte-se ainda que, em 1971, a Unctad desenvolveu a metodologia para a definição dos países com menor grau de desenvolvimento, os quais requerem tratamento privilegiado em termos comerciais e financeiros. Ao final dos anos oitenta, depois de discussões iniciadas na década anterior, foi assinado, no âmbito da Unctad, o Sistema Geral de Preferências Comerciais (SGPC), que estabelece vantagens tarifárias entre 41 países signatários (todos provenientes de países em desenvolvimento). O SGPC, ao invés de substituir, deve ir além dos acordos regionais desenvolvidos entre estes países, estabelecendo a não-reciprocidade para os países mais pobres. O Mercosul passou a fazer parte deste sistema, atuando como bloco, em 1998. Observa-se, portanto, que a defesa do comércio intra-industrial entre os países da periferia passa a ser adotada na Unctad, assim como fora a integração regional dos países latino-americanos para estimular a industrialização. Prebisch (1981) partia do pressuposto de que não se podia imaginar o centro como absorvedor de todas as exportações industriais dos países periféricos. O comércio intra-periferia deveria ademais se concentrar não na especialização setorial, mas na especialização em certos produtos, os quais ocupariam certos nichos de mercado inclusive das economias centrais. 1.2 As Teorias da Dependência À medida que as formulações cepalinas deixavam de orientar as políticas econômicas dos países latino-americanos, que o poder político se tornava mais concentrado e autoritário, e que se verificava o reduzido alcance das medidas multilaterais desenvolvidas no âmbito da Unctad, a partir dos anos setenta, o cenário intelectual latino-americano apresentaria-se cada vez polarizado entre a visão liberal e a visão neo-marxista das várias facções de autores dependentistas. O núcleo comum da teoria da dependência pode ser resumido no título do livro de André Gunder Frank, “o desenvolvimento do subdesenvolvimento”, que partia da seguinte interpretação: subdesenvolvimento não é o mesmo que atraso ou resultado de um suposto insuficiente desenvolvimento capitalista, estando antes relacionado à própria expansão do capitalismo enquanto totalidade, por natureza polarizadora (Amin 1996). Diga-se aliás que a unidade histórica entre subdesenvolvimento e desenvolvimento surge antes em Celso Furtado, logo no início dos anos sessenta (Mallorquin, 2005). Pode-se também perceber que tanto o economista brasileiro como Prebisch vão se tornando “dependistas” à sua maneira ao longo dos anos setenta, principalmente quando ressaltam a reconfiguração da economia internacional, sob o comando das multinacionais, e o seu impacto disruptivo para a construção de sistemas econômicos nacionais e regionais.

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A diferença está no fato de que para os dois cepalinos trata-se de rever o atual sistema de dependência, que passa por mudanças sociais e políticas, que permitam o superar o modelo limitado de acumulação, centrado do consumo imitativo das minorias privilegiadas. Portanto, transformar o padrão de distribuição de renda para transformar o perfil produtivo e criar novas possibilidades de inserção social, ao mesmo tempo em que se alteram as relações externas (Prebisch, 1981). Para outros dependentistas, tais como André Gunder Frank, Ruy Mauro Marini e Theotônio dos Santos, a superação da dependência deveria levar inapelavelmente ao socialismo, cortando-se os laços que unem a periferia ao centro (Gunder Frank, 1996), os quais levariam a uma tendência inexorável de intensificação da exploração do trabalho, já que se caracterizam pela extração de excedente, especialmente sob a forma de mecanismos financeiros. A teoria da dependência, depois do rápido auge na primeira metade da década de setenta, seria profundamente questionada pelas interpretações econômicas neoliberais, protagonizadas pelos governos chileno e argentino, e que se transformaram em programas de estabilização e reformas estruturais para “reinserção” destas economias nos marcos de uma economia crescentemente globalizada. Cabe concluir que a discussão sobre propostas de integração econômica entre os países latino-americanos seriam questionadas pelos dois extremos teóricos. De um lado, os dependentistas enfatizariam que se tratava de organizar um mercado livre para a atuação das multinacionais, enquanto os neoliberais apontam para os desvios de comércio e para os resultados negativos em termos de alocação eficiente de recursos. 1.3 A Avalanche Neoliberal e a “Adaptação” da Cepal e da Unctad ao novo cenário internacional A década de noventa significou, de forma até então inaudita na América Latina, o predomínio de uma nova ideologia econômica, que embasaria as políticas de liberalização e desregulamentação realizadas pelos seus diversos países, ainda que com várias conotações e ritmos. Neste cenário, entidades como a Cepal e a Unctad reciclaram muitas de suas antigas formulações no sentido de poder interferir ou se adaptar a esta nova realidade internacional. No que diz respeito à Cepal, pode-se dizer que tem início uma reconsideração crítica quanto às experiências passadas de integração regional, e que pode ser sintetizada na defesa de uma nova proposta de “regionalismo aberto” (Cepal, 1998). A integração passa a ser vista como um mecanismo relevante, mas com um papel diferenciado, já que agora o objetivo não é mais substituir em escala regional as importações, mas o de permitir aos países latino-americanos uma inserção mais qualificada no cenário internacional.

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Além de permitir o aproveitamento das economias de escala e de fornecer um trampolim para uma melhor inserção externa de setores de maior valor agregado, o regionalismo aberto contribuiria para aumentar o nível de investimentos externos na região e criar novas especializações produtivas entre os países da região (Cepal, 1998). Para esta “atualização” do pensamento cepalino, contribui sobremaneira a interpretação de Fernando Fajnzylber (1998), realizada no início da década de noventa, de que existe uma associação entre 4 fatores que levam a uma impossível conciliação entre crescimento e eqüidade na região. Segundo este autor, o perfil das exportações concentradas em commodities minerais, agrícolas ou industriais, a industrialização restrita ao mercado interno, o consumo conspícuo das elites e o baixo dinamismo do empresariado nacional (público e privado) levariam a uma inserção externa pouco dinâmica. Trata-se de engendrar uma nova articulação externa que injete dinamismo no sistema, estando pautada pela incorporação de progresso técnico e pela melhoria da distribuição de renda. Ainda que se possa dizer que a história latino-americana dos anos noventa seguiu rumos diferenciados, deve-se ressaltar a capacidade de adaptação da formulação cepalina no tocante à integração regional, inclusive se distanciando em muitos sentidos das proposições do Banco Mundial. Por outro lado, é também verdade que esta instituição abandonou várias das formulações dependentistas e estruturalistas que hoje apenas compõem parte de sua herança intelectual e história. Paralelamente, e mais para o final da década de noventa, quando a Cepal tentava assimilar a nova realidade internacional, desbastando parte do seu marco teórico, percebe-se um ressurgimento da Unctad, se não mais enquanto agência propositiva e capaz de interferir na dinâmica das relações Norte-Sul, ao menos no que diz respeito ao uma crítica da globalização realizada a partir da periferia, e recuperando vários dos enunciados do seu “passado” teórico. Tal posicionamento fica claro quando o seu ex-secretário-geral afirma que o Consenso de Washington, com o seu “acrítico triunfalismo de mercado” restringiu ao máximo os objetivos de crescimento e emprego, tendo chancelado uma ordem internacional instável em termos financeiros e cuja dinâmica comercial aprofunda a desigualdade Norte-Sul (Ricupero, 2000). E o peso da herança cepalina se faz sentir, quando se aponta que a “reciprocidade real significa levar em consideração a assimetria intrínseca às estruturas econômicas” que compõem a vasta e diversificada economia internacional. Quatro anos depois, durante a XI Reunião da Unctad, enfatiza-se a necessidade de complementaridade entre as esferas monetárias, financeiras e comerciais da economia global, ressalvando a necessidade de políticas nacionais de desenvolvimento que permitam uma inserção externa mais dinâmica (Unctad, 2004b). Contudo, em termos concretos, e face ao reduzido papel efetivo da Unctad na regulação dos fluxos internacionais de comércio, investimento e capitais, logra-se tão-somente avançar propostas que permitam ampliar o escopo e o alcance do SGPC, no sentido de se gestar uma nova “geografia do comércio”, que até o presente momento tem estado bastante vinculada à própria dinâmica das empresas multinacionais; e fornecer capacitação para os países mais pobres nas negociações internacionais, além de gerar políticas públicas que possam reduzir a exclusão digital destes países.

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Ainda assim, o esforço da Unctad tem apresentado frutos teóricos relevantes. No que diz respeito à relação entre comércio e pobreza (Unctad, 2004b), esta instituição vem contribuindo para uma visão mais completa da realidade social mundial. Em primeiro lugar, descarta qualquer análise que pretenda uma relação direta e automática entre estas duas “variáveis”, assumindo uma perspectiva “desenvolvimentista”. Além disso, retira das análises sobre pobreza o peso isolado das políticas nacionais, centrando foco nos vários tipos de inserção na economia internacional. Finalmente, a Unctad avalia como fundamentais para a erradicação da pobreza o ritmo de crescimento econômico e de acumulação de capital, o qual muitas vezes mostra-se inviabilizado pelas características da globalização financeira.

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2. O “processo real” de integração regional na América Latina Neste tópico serão analisados, de forma concisa, os projetos integracionistas que se desenvolvem na América Latina e suas características relevantes, a partir de uma estrutura que compreende as respectivas trajetórias históricas, desenhos institucionais, acordos externos com outros blocos e panoramas econômicos. Realiza-se também uma breve contraposição entre as várias experiências de integração, ao mesmo tempo em que se pontuam outras iniciativas regionais que congregam um ou mais dos blocos analisados. No que concerne à Alternativa Bolivariana para as Américas – Alba, desenvolve-se uma descrição dos seus principais pressupostos, que fundamentam a sua crítica aos modelos vigentes de integração, para finalmente se proceder a uma apresentação dos seus impactos concretos até o presente momento.

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2.1 MERCADO COMUM CENTRO-AMERICANO (MCCA) Formado por Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, e Nicarágua, o bloco reúne uma população de 36,6 milhões de habitantes, possuindo um PIB de US$ 73,4 bilhões, com exportações no valor de US$ 13,8 bilhões e importações alcançando os US$ 25,3 bilhões em 2004. O conjunto dos 5 países tende a ser deficitário em termos comerciais. Trata-se de economias com elevado grau de abertura, já que as suas importações tendem a ser maiores que o PIB em termos relativos, quando se compara com a América Latina e o conjunto do continente americano. Esta região possui também um PIB per capita inferior à media latino-americana, participando a sua população com cerca de 6,8% do total, contra uma participação no PIB de 3,6%. Em

milhões Total da América Latina e Caribe

Total do Continente Americano

População 36,6 6,76% 4,22% PIB (US$) 73.394 3,63% 0,5% Exportações 13.809 3,65% 1% Importações 25.291 6,91% 1,32% Fonte: Banco Mundial, dados de 2004. Para exportações e importações, dados de 2003. Elaboração: Prospectiva Consultoria 2.1.1 Evolução Histórica e Características Institucionais O MCCA surgiu em 13 de dezembro de 1960, quando foi assinado o Tratado Geral de Integração Econômica Centro-Americana na cidade de Manágua, Nicarágua, em meio a conflitos bélicos na região. Seu objetivo era criar a área de livre comércio entre os países da América Central, e ao mesmo tempo estabelecer uma tarifa comum aplicável aos países não membros. Quando da criação deste bloco, um Secretário Permanente para o tratado foi nomeado para proporcionar suporte institucional para o processo de integração. Houve também um acordo, assinado em 1964, que tinha o objetivo de harmonizar, em alguma época no futuro, as políticas monetárias e adotar uma moeda comum. O MCCA obteve avanços consideráveis em termos de expansão dos fluxos comerciais na década de 60, ao menos até o breve conflito entre Honduras e El Salvador (Guerra do Futebol, em 1969, que durou apenas 6 dias). A partir de então, Honduras impôs um embargo comercial contra El Salvador (que foi suspenso apenas em 1982) e passou a conduzir negociações bilaterais com outros países, porém a Costa Rica passou a cobrar impostos sobre as importações dos outros países do MCCA, o que contribuiu para o retrocesso do processo de integração comercial. A ascensão do governo socialista na Nicarágua e a instauração da guerra civil em El Salvador, ambos os eventos acompanhados da interferência militar norte-americana na região, trouxeram instabilidade política para o bloco, durante a década de 80, relegando a integração da América Central para o segundo plano e fazendo com que o comércio entre os países caísse drasticamente.

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Em 1990, num momento de arrefecimento das guerras civis regionais, os presidentes dos cinco países da América Central comprometeram-se com a revitalização do MCCA. Em outubro de 1993, os presidentes dos cinco países membros assinaram um protocolo (Protocolo da Guatemala) que emendou o Tratado Geral de 1960, consolidando o Subsistema de Integração Econômica Centro-Americano e se comprometendo a alcançar gradualmente a União Econômica Centro-Americana, com estrutura institucional composta por:

• Reunião de Presidentes • Conselho de Ministros de Integração Econômica • Conselho Intersetorial de Ministros de Integração Econômica • Conselho Setorial de Ministros de Integração Econômica • Comitê Executivo, com um representante de cada estado membro • Secretaria de Integração Econômica Centro-Americana (Sieca) • Secretaria do Conselho Agropecuário Centro-Americano (SCA) • Secretaria Executiva do Conselho Monetário Centro-Americano (Secma) • Secretaria de Integração Turística Centro-Americana (Sitca) • Comitê Consultivo de Integração Econômica

Mais especificamente, o Protocolo da Guatemala convoca os membros a concretizar a área de livre comércio do MCCA por meio da eliminação gradual de tarifas e de barreiras comerciais, concessão de tratamento nacional ao comércio intra-regional e adoção de um quadro legal regional que estabelece regras de origem, salvaguardas, práticas comerciais injustas, propriedade intelectual, serviços, medidas sanitárias e fito-sanitárias, e critérios e regras técnicas. Hoje, o MCCA mantém uma tarifa externa comum, um banco de desenvolvimento - Banco Centro-Americano de Integração Econômica - e o Instituto Centro-Americano de Administração Pública e todas as questões administrativas são expressas em resoluções, regulamentos, acordos e recomendações. Em âmbito mais amplo, foi assinado em 1991 com o Panamá um protocolo que estabeleceu o Sistema de Integração Centro-Americana, do qual Belize também é membro a partir de 2000. Tal Sistema conta com um Parlamento Centro-Americano e uma Corte Suprema de Justiça que garante a execução do protocolo, além de uma Secretaria Geral com mandato de 4 anos, eleita pela Reunião de Presidentes. 2.1.2 O MCCA e os Acordos Comerciais Extra-Regionais Adicionalmente, o Mercado Comum Centro-Americano vem negociando como bloco vários acordos comerciais com demais países da região, cujas linhas gerais - como se depreende abaixo - seguem o formato Nafta. Os acordos extra-regionais do MCCA avançam em relação à agenda comercial e incluem os chamados “novos temas” – comércio de serviços, propriedade intelectual e compras governamentais – transformando esta região num apêndice dos interesses norte-americanos e de suas empresas.

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América Central - Chile Assinatura: 18/10/1999 Vigência: Costa Rica-Chile: 15/02/2002 El Salvador-Chile: 03/06/ 2002 O tratado de livre comércio entre o Mercado Comum Centro Americano foi assinado em 18 de outubro de 1999, porém somente a Costa Rica e El Salvador ratificaram o processo de negociação, que entrou em vigência para cada país a partir de 15 de fevereiro de 2002 e 03 de junho de 2002, respectivamente. Trata-se de um acordo bastante abrangente, que estabelece a eliminação imediata das tarifas de todos os produtos, com algumas exceções. Engloba também uma rede de acordos bilaterais de investimento, acordos de serviços semelhantes ao Nafta e acordos menos substanciais de política da concorrência e compras governamentais. América Central – República Dominicana Assinatura: 16/04/1998 Vigência: Costa Rica-República Dominicana: 07/03/2002 El Salvador- República Dominicana: 04/10/ 2001 Guatemala- República Dominicana: 03/10/2001 Honduras- República Dominicana: 19/12/2001 Com o intuito de consolidar a proposta de integração econômica e comercial durante a Cúpula de Chefes de Estado e de Governos da América Central, Panamá, República Dominicana e Belize, realizada em Santo Domingo, de 5 a 7 de novembro de 1997, os países centro-americanos levaram adiante as negociações baseadas no “Marco General para las Negociaciones de un Tratado de Libre Comercio de Bienes, Servicios e Inversiones entre Centroamérica y República Dominicana”, acordado entre ambas partes em dezembro de 1997. Assinada a parte normativa em 16 de abril de 1998, o Tratado de Livre Comércio entre América Central e a República Dominicana teve os protocolos e anexos assinados na seguinte ordem cronológica: Costa Rica em abril de 1998, El Salvador e Guatemala em novembro de 1998 e Honduras e Nicarágua em fevereiro e março de 2000, respectivamente. O Tratado de Livre Comércio passou a vigorar nos países a partir das seguintes datas: El Salvador e Guatemala em 4 de outubro de 2001, Honduras em 19 de dezembro de 2001, Costa Rica em 7 de março de 2002 e Nicarágua em 03 de setembro de 2002. Assim como os demais acordos assinados pelos países centro-americanos, o acordo com a República Dominicana é bastante abrangente, incluindo a desgravação imediata de quase todas as linhas tarifárias e acordos de investimentos e serviços. Aborda de forma menos vinculativa os temas compras governamentais, propriedade intelectual e política a concorrência. América Central – Estados Unidos – República Dominicana (Cafta) Assinatura: 5/08/2004

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As relações comerciais entre os países centro-americanos e os Estados Unidos vêm sendo promovidas por meio de um esquema de preferências tarifárias unilaterais, sendo regidas pelos seguintes instrumentos comerciais: Sistema Geral de Preferências dos Estados Unidos; Iniciativa da Costa do Caribe e Lei de Associação Comercial Estados Unidos – Costa do Caribe. Por meio destes instrumentos comerciais, grande parte das exportações centro-americanas é comercializada com tarifa zero, ficando entre as exceções: produtos têxteis, atum, relógios e produtos de couro. Em janeiro de 2003 foram iniciadas negociações entre os Estados Unidos e os países da América Central para um Tratado de Livre Comércio entre as partes. As negociações foram finalizadas para El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua em novembro de 2004 e para Costa Rica em janeiro de 2005. Posteriormente, a República Dominicana foi incorporada ao Tratado. Em maio de 2005, o Tratado foi ratificado pelas assembléias legislativas de El Salvador, Guatemala e Honduras. Depois de muita controvérsia, o Congresso dos EUA aprovou, com uma margem muito estreita na Câmara dos Deputados, o acordo com os países centro-americanos em julho de 2005. Está pendente ainda a ratificação pela Costa Rica, Nicarágua e República Dominicana. Trata-se do acordo mais abrangente e vinculativo já assinado pelos EUA, aprofundando os moldes inaugurados com o Nafta. Além da desgravação tarifária de quase todos os produtos, o acordo dos EUA com os países centro-americanos engloba as diversas categorias de serviços, incluindo telecomunicações, entrega expressa, serviços de computação, turismo, energia, transporte, construção e engenharia, serviços financeiros, seguros, audio-visual e entretenimento, serviços profissionais, ambientais, entre outros. O Cafta vai além do Nafta também nas questões de compras governamentais e proteção ao investimento. Com o intuito de ser aprovado pelo Congresso dos EUA, foram incluídas ainda cláusulas trabalhistas e ambientais no acordo. O mecanismo de solução de controvérsias também segue o modelo do Nafta, permitindo que sejam abertos litígios investidor-Estado. América Central – Panamá Assinatura: 06/02/2002 Partindo de acordos bilaterais com cada um dos países da América Central, o Panamá e os países centro-americanos em 21 de março de 2000 iniciam negociações para a proposição de um Tratado de Livre Comércio. As negociações da parte normativa do Tratado foram concluídas em 16 de maio de 2001 e deu-se continuidade à negociação de anexos de forma bilateral.Até o momento, apenas El Salvador ratificou as negociações em 03 de outubro de 2002 e o Panamá em fevereiro de 2003. O acordo com o Panamá também segue o modelo do Nafta, garantindo acesso a mercados com tarifa zero imediato para a maioria dos produtos, além de acordos de serviços (incluindo telecomunicações e serviços financeiros), proteção a investimentos, política da concorrência e propriedade intelectual. Assim como nos outros acordos (exceto

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o Cafta), os dois últimos temas têm conotação muito mais política do que vinculativa no acordo. América Central – México As negociações comerciais entre o México e a América Central para a assinatura de um Acordo de Livre Comércio se iniciaram em 1991, quando os presidentes dos seis países firmaram a Declaração de Tuxtla Gutiérrez, que contém o mandato para o estabelecimento de um Acordo de Complementação Econômica. Estas negociações posteriormente evoluíram para a assinatura e vigência dos Tratados de Livre Comércio com os seguintes países: Costa Rica – México Assinatura: 05/04/1994 Vigência: 01/01/1995 Primeiro país da América Central a negociar um Tratado de Livre Comércio com o México. O tratado foi ratificado por ambos países, entrando em vigor a partir de 1º de janeiro de 1995. Nicarágua – México Assinatura: 18/12/ 1997 Vigência: 01/07/ 1998 Nicarágua assinou em 18 de dezembro de 1997 um Tratado de Livre Comércio com o México que entrou em vigor em 1º de julho de 1998. El Salvador, Guatemala y Honduras – México Assinado em 29 de junho de 2000, o Tratado de Livre Comércio entre estes três países centro-americanos com o México que se encontra vigente desde 15 de março de 2001 no México, El Salvador e Guatemala. Em Honduras, este tratado passou a vigorar a partir de 1º de junho de 2001. O acordo dos países centro-americanos com o México segue também os moldes do Nafta, estabelecendo a desgravação de quase todo o universo tarifário, além de capítulos específicos para investimentos, serviços financeiros e telecomunicações. Os demais “temas novos” também são abordados, contudo não de forma vinculativa. América Central – Canadá Em 23 de abril de 2001, Costa Rica e Canadá assinaram um Tratado de Livre Comércio que está em vigor desde 1º de novembro de 2002. Os demais países centro-americanos iniciaram negociações em bloco para a efetivação de um Tratado de Livre Comércio com o Canadá, que atualmente se encontra em sua fase final de negociação. O acordo prevê a eliminação tarifária de quase todos os produtos, mas não prevê regras específicas para serviços, investimentos, propriedade intelectual e compras governamentais. Fazem parte do acordo com os canadenses capítulos específicos para cooperação ambiental e trabalhista. Costa Rica – Caricom

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Acordo assinado entre a Costa Rica e o bloco dos países do Caribe no dia 9 de março de 2004. Além de desgravação tarifária da maior parte dos produtos, o acordo estabelece marcos para serviços e investimentos e cooperação nas questões de compras governamentais e política da concorrência. Outros Acordos Além desses acordos de livre-comércio, há alguns acordos de complementação econômica assinados pelos países centro-americanos no âmbito da Aladi. Esses acordos têm alcance parcial, eliminando as tarifas aduaneiras apenas para alguns produtos selecionados. Segue a relação dos acordos: - Costa Rica-Colômbia – Acordo de Complementação Econômica 7 (2 de março de 1984) - Costa Rica-Venezuela – Acordo de Complementação Econômica 26 (21 de março de 1986) - El Salvador-Colômbia – Acordo de Complementação Econômica 8 (24 de maio de 1984) - El Salvador-Venezuela – Acordo de Complementação Econômica 27 (10 de março de 1986) - Guatemala-Colômbia – Acordo de Complementação Econômica 5 (1 de março de 1984) - Guatemala-Venezuela – Acordo de Complementação Econômica 23 (31 de outubro de 1985) - Honduras-Colômbia – Acordo de Complementação Econômica 9 (2 de setembro de 1985) - Honduras-Venezuela – Acordo de Complementação Econômica 16 (20 de fevereiro de 1986) - Nicarágua-Colômbia – Acordo de Complementação Econômica 7 (2 de março de 1984) - Nicarágua-Venezuela – Acordo de Complementação Econômica 25 (15 de outubro de 1986) Declarações de Tuxtla As declarações de Tuxtla compõem um mecanismo de diálogo e cooperação entre os países centro-americanos (Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Belize e Panamá) e o México. Assinada pelos chefes de Estado desses países em 1991, a Declaração de Tuxtla foi atualizada diversas vezes, de forma que a quinta (e mais recente) versão do documento foi assinada em junho de 2002. Trata-se de um mecanismo político e não vinculativo que aborda temas de relevância para esses países como direitos humanos (com foco na questão migratória), reforma do Conselho de Segurança da ONU, desarmamento, tráfico de drogas, relações com os países europeus, meio ambiente e promoção cultural. O mecanismo defende a implementação da Alca, desde que atenda aos interesses dos países signatários. 2.1.3 Características Econômicas do MCCA Entre 1994 e 2004, as exportações realizadas entre os cinco membros do Mercado Comum Centro Americano (MCCA) aumentaram três vezes, passando de US$ 1,3 bilhões em 1994 para US$ 3,4 bilhões em 2004 (gráfico 1). Percebe-se ainda que Guatemala, Costa Rica e El Salvador respondem por 85% das exportações intra-bloco.

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Gráfico 1 – Evolução das exportações intra-regionais do Mercado Comum Centro Americano – 1994 a 2004

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1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

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es)

MCCA

Fonte: Secretaria de Integración Econômica do MCCA Elaboração: Prospectiva Consultoria Observa-se, ainda, que o comércio intra-regional expandiu-se mais rapidamente que o extra-regional, tendo a participação do primeiro saltado de 16%, 1990, para a 26,9% em 2003. El Salvador caracteriza-se por sua maior dependência em relação ao MCCA, já que o peso do comércio intra-regional saltou de 30% para 60% entre 1990 e 2003 (gráfico 2). Por outro lado, o país que menos depende do MCCA é a Costa Rica, com apenas 13,6% de participação do comércio intra-regional no comércio total. Além disso, este país destaca-se por concentrar as exportações de maior valor agregado no comércio regional. Percebe-se portanto, que a pauta de exportações intra-regionais não é composta somente de commodities de baixo valor agregado. Entre os quinze produtos mais exportados pelo bloco em 2004, destacam-se medicamentos, máquinas, equipamentos elétricos, ferro e aço e combustíveis, que correspondem a 23,5% do total, o que equivale a US$ 750 milhões de dólares, segundo dados da Sieca. Gráfico 2 - Peso do comércio intra-regional em porcentagem sobre o comércio total, 1990

a 2003

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1990 1995 2000 2001 2002 2003*

Costa Rica El Salvador GuatemalaHonduras Nicaragua MCCA

Fonte:Cepal Elaboração: Prospectiva Consultoria

Ao analisar os principais destinos das exportações do MCCA, nota-se a importância dos Estados Unidos que abrange cerca de 31% das exportações do bloco, superando até mesmo o comércio intra-bloco que é responsável por 25,3% das exportações (gráfico 3). Percebe-se ainda a quase irrelevâncias exportações para os países da Aladi, inferior a 5% do total.

Gráfico 3 – Principais destinos das exportações do bloco em 2004

30.96%

11.43%

4.65%

6.89%

0.14%

25.30%

20.62%

EUA UE Aladi Ásia África MCCA Outros

Fonte:Secretaria de Integración Econômica do MCCA Elaboração: Prospectiva Consultoria Quanto aos fluxos de investimentos externos diretos para os países da América Central, estes apresentaram crescimento constante entre 1994 e 1997, totalizando uma média anual de investimentos de US$ 646 milhões neste período. Em 1998, houve uma

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considerável elevação de investimentos atingindo o patamar de US$ 2,6 bilhões, devido a investimentos em El Salvador. Entre 1999 e 2003, os investimentos se estabilizaram num patamar mais elevado, atingindo uma média anual de US$ 1,4 bilhões. A coincidência entre crescimento das exportações e elevação dos investimentos externos diretos na região no mesmo período (1994-2003) revela que as empresas multinacionais respondem por uma parcela considerável dos fluxos de comércio regionais. Além disso, a realização de acordos externos ao bloco pode ter servido de estímulo para as decisões de investimento de algumas destas empresas.

Gráfico 4 - Investimento externo direto no Mercado Comum Centro Americano, 1994 a 2003

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1500

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2500

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1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

US

$ (m

ilh

ões

)

MCCA

Fonte:Unctad Elaboração: Prospectiva Consultoria

Outro fator digno de menção refere-se ao papel do capital norte-americano no bloco. Das informações obtidas dos bancos centrais de três países para os quais havia dados disponíveis (El Salvador, Honduras e Costa Rica), observa-se que o investimento externo direto norte-americano corresponde a cerca de 36% do total no caso de El Salvador, a 60% em Honduras e a 56,6% em Costa Rica. No entanto, acredita-se que este percentual pode estar subestimado, já que a entrada de capitais via paraísos fiscais é muito utilizada por empresas norte-americanas. 2.1.4 Quadro Sintético Apesar do avanço recente da integração regional, medido em termos de participação do comércio intra-bloco, observa-se que os fluxos comerciais com os Estados Unidos são preponderantes. Paralelamente, a presença econômica norte-americana se faz sentir por meio dos investimentos das suas empresas multinacionais, as quais têm se aproveitado dos acordos de livre-comércio assinados com outros países e regiões, já que os mesmos seguem o formato “Nafta”.

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2.2 COMUNIDADE E MERCADO COMUM DO CARIBE (Caricom) O Caricom foi estabelecido com a assinatura do Tratado de Chaguaramas em Agosto de 1973, sendo o sucessor da Associação de Livre-Comércio do Caribe (Caribbean Free Trade Association - Carifta), fundada em 1968 e integralmente absorvida pela Comunidade. Os membros são: Antígua e Barbuda, as Bahamas, Barbados, Belize, Dominica, Granada, Guiana, Haiti, Jamaica, Montserrat, São Cristóvão e Névis, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Suriname, e Trinidad e Tobago. As Ilhas Virgens Britânicas, Ilhas Caimans e as Ilhas Turks e Caicos são membros associados. É importante ressaltar que, do total de membros do Caricom, 13 são ex-territórios britânicos, com exceção do Suriname e Haiti. O Caricom conta ainda com países observadores nas diversas instituições da Comunidade e em seus órgãos ministeriais. Alguns dos observadores são: Anguilla, Porto Rico, Aruba, Colômbia, México, Venezuela, Bermuda, República Dominicana, Cuba e Antilhas Holandesas. A importância econômica deste bloco mostra-se bastante limitada no contexto regional, perfazendo menos de 2% do PIB latino-americano e 0,25%, quando se considera o continente americano. O total das suas importações destaca-se por apresentar um valor de 4%, bem acima da sua participação regional em termos de PIB, população e exportações no total da América Latina Em

milhões Total da América Latina e

Caribe Total do Continente

Americano População 15,3 2,8% 1,75% PIB (US$) 38.022 1,88% 0,25% Exportações 8.379 2,21% 0,60% Importações 14.456 3,94% 0,75% Fonte: Banco Mundial, dados de 2004. Para exportações e importações, dados de 2003. Elaboração: Prospectiva Consultoria

2.2.1 Evolução Histórica e Características Institucionais Conforme já mencionado, o Caricom derivou da Associação de Livre-Comércio do Caribe e, assim, herdou suas duas principais instituições: o Secretariado Regional do Caribe (de 1968) e o Banco de Desenvolvimento do Caribe (de 1969). Em 1987, durante a 9º Conferência de Chefes de Governo, Barbados colocou em discussão a proposta de criação de uma instituição de caráter representativo, que tomou corpo na 10º Conferência de Chefes de Governo, em 1990, através de um Acordo Inter Governamental que regulava o estabelecimento de tal órgão. Em Maio de 1996, em Barbados, ocorreu a reunião inaugural da Assembléia Parlamentar da Comunidade do Caribe. De lá em diante, ocorreram outras duas reuniões, em 1999 (Granada) e 2000 (Belize). A estrutura organizacional do Caricom constitui-se de:

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• Conferência dos Chefes de Governo, órgão supremo da Comunidade e

responsável pela direção política e financeira da mesma e de suas relações com outros blocos, Estados e organismos internacionais.

• Bureau da Conferência de Chefes de Governo, responsável por iniciar propostas, mobilizar consenso e garantir a implementação das decisões.

• Conselhos de Ministros da Comunidade, formados por ministros designados por cada estado membro e responsável pelo planejamento estratégico das ações da Comunidade, nas áreas de integração econômica, cooperação funcional em áreas como educação, saúde, questões trabalhistas e relações exteriores. Os Conselhos são:

o Conselho de Comércio e Desenvolvimento Econômico o Conselho de Relações Exteriores e Comunitárias o Conselho de Desenvolvimento Social e Humano o Conselho Financeiro e de Planejamento

Esses órgãos principais são assistidos por mais de quinze outras instituições de caráter específico e prático, abarcando setores diversos que vão desde Resposta de Emergência a Desastres até Nutrição e Alimentação, passando por Telecomunicações, Agricultura e Pesquisa Médica. Ainda em termos institucionais, em 1999 foi criada a Corte Caribenha de Justiça (Suprema Corte), com vistas a tornar-se tribunal de última instância para as justiças nacionais dos países membros e, ao mesmo tempo, garantir a segurança jurídica no que diz respeito à aplicação e interpretação do Tratado de Chaguaramas (e sua versão revisada). A Corte foi instalada definitivamente somente em abril de 2005, em Trinidad e Tobago, e assim que aprovada internamente por todos os membros substituirá o “Judicial Committee of the Privy Council" que fica em Londres e há mais de 100 anos atua como Corte Suprema para os estados de origem britânica. O Tratado de Chaguaramas - cujo objetivo era promover a integração econômica por meio da circulação livre de mercadorias e a cooperação operacional em certas áreas - foi revisado, em 2001, para fazer da união aduaneira um mercado comum e uma união econômica: o Mercado e a Economia Comuns do Caribe (CSME), o qual prevê o livre movimento de todos os fatores de produção, incluindo mercadorias, serviços, tecnologia, capital e trabalhadores; a coordenação de políticas macroeconômicas e a harmonização das leis e das instituições. Um total de nove protocolos, o último deles assinado em 2000, emendou o tratado original e definiu as bases para o estabelecimento do Mercado e a Economia Comuns do Caribe (CSME). O Mercado Comum deve ser criado até janeiro de 2006 (Barbados, Jamaica e Trinidad e Tobago já estão completamente preparados) e a Economia Comum pode ser entendida como um esforço contínuo dos membros. O Caricom mantém uma tarifa externa comum (com exceções) e continuamente seus membros passam pelos necessários processos de ratificação do Tratado Revisado de Chaguaramas, a devida absorção do mesmo em sua legislação doméstica e outras adaptações prévias, para que seja atingida a meta do Mercado Comum em 2006. O bloco desempenha uma agenda externa que abarca desde a coordenação contínua das políticas externas dos membros até o posicionamento na OEA e na OMC (através da coordenação centralizada do Regional Negotiating Machinery - CRNM).

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Ao considerarmos a instabilidade política e os conflitos sociais pelos quais passaram Guiana, São Cristóvão e Névis e Haiti, vale ressaltar que há uma Carta da Sociedade Civil no âmbito do bloco, que discorre sobre a garantia da governança nos países membros e trata de assuntos como direitos civis, liberdade de imprensa, processo democrático, diversidade religiosa e transparência. No entanto, dada a complexidade do tema, não se pode garantir a eficácia comprovada de tal documento e a ação coordenada dos membros do Caricom em tais questões. 2.2.2 O Caricom e Outros Acordos Comerciais Os acordos bilaterais desenvolvidos pelo Caricom com outros blocos e países caracterizam-se por tratarem de vantagens preferenciais em termos de acesso a mercado. Os acordos sobre investimentos e serviços não são tão abrangentes e vinculativos, com a exceção daquele realizado com a República Dominicana. Caricom - Costa Rica Em 9 de março de 2004, foi assinado o tratado de livre comércio entre a Costa Rica e os seguintes países do Caricom: Antígua y Barbuda, Barbados, Belize, Dominica, Granada, Guiana, Jamaica, San Cristóvão e Névis, Santa Lucia, São Vicente e Granadinas, Suriname e Trinidad e Tobago. A vigência deste tratado está na dependência do avanço das negociações e conclusão das formalidades jurídicas entre os países membros. Trata-se de um acordo bastante abrangente do ponto de vista de acesso a mercados para bens industriais e, em menor medida, bens agrícolas, tendo em vista as várias exceções. Há um capítulo específico para serviços que funciona como uma declaração de cooperação para o cumprimento das regras multilaterais do GATS. O capítulo de investimentos é um pouco mais abrangente, mas também não estabece compromissos específicos. Os temas política da concorrência e compras governamentais são mencionados, mas não foram criadas regras que vão além de declarações de boa vontadade das partes. Caricom - República Dominicana O tratado de livre comércio entre membros do Caricom e República Dominicana foi assinado em 22 de agosto de 1998, tendo entrado em vigor em dezembro de 2001. O acordo entre o bloco dos países caribenhos e a República Dominicana estabelece o livre fluxo de bens para a maior parte dos produtos que cumpram com regras de origem específicas em ambas as partes. Há também capítulos específicos para serviços e para investimento bastante abrangentes e vinculativos. Já para outros “novos temas” como compras governamentais e propriedade intelectual, não há comprometimentos específicos das partes, mas sim declarações de intenções. Caricom - Colômbia

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O acordo preferencial de comércio, assinado em 24 de julho de 1994, entrou em vigor em 01 de janeiro de 1995. Trata-se de acordo de complementação econômica nos moldes dos acordos da Aladi. Entre os produtos que acessam o mercado colombiano com tarifa zero incluem alimentos, produtos químicos e metais. Para os produtos colombianos é concedido acesso a mercados com tarifa zero para a maior parte dos produtos com exceção de alguns tipos de alimentos, produtos químicos e têxteis. Caricom - Venezuela O acordo preferencial de comércio e investimentos, assinado com a Venezuela em 13 de outubro de 1992, entrou em vigor em 1 de janeiro de 1993. Segue o mesmo modelo da Colômbia com o bloco de países caribenhos. De um lado, a Venezuela oferece uma lista de produtos que acessam o seu mercado com tarifa zero (ou com margem tarifária preferencial), incluindo produtos dos setores de alimentos, cosméticos, metais, máquinas e equipamentos e eletro-eletrônicos. Do outro lado, os países caribenhos apresentam uma lista de exceções ao pleno acesso a seu mercado, que inclui produtos dos setores de alimentos, químico e metais. 2.2.3 Características econômicas Entre o período de 1994 a 2000, o montante das exportações intra-regionais da Comunidade do Caribe quase dobrou, passando de US$ 1,7 bilhões em 1994 a US$ 3,3 bilhões em 2000.

Gráfico 1 – Evolução das exportações intra-regionais da Comunidade do Caribe – 1994 a 2000

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1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

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Fonte: Caricom. Elaboração: Prospectiva Consultoria

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Em 2000, os países do Caricom que apresentaram a maior participação no comércio intra-regional foram Trinidad e Tobago, Jamaica e Barbados, totalizando mais que 80% das exportações intra-regionais (gráfico 1). O percentual de 17,5% do peso do comércio regional sobre o comércio total do Caricom indica um peso moderado do comércio entre os países do bloco. Para alguns países como Belize, Jamaica e São Cristóvão e Névis, que apresentam percentuais na faixa dos 5%, há pouca dependência comercial do comércio intra-bloco.

Tabela 1 - Peso do comércio intraregional em porcentagem sobre o comércio total, 1990 a

2003

País 1990 1995 2000 2003* Caricom 12.3 15.1 21.2 17.5 Barbados 30.7 37.4 43.2 41.6 Belize 8 3.8 4.8 5.2 Guiana … 6.1 12.4 18.1 Jamaica 6.3 4.1 3.3 5.2 Suriname … … 10.7 17.6 Trinidad e Tobago … … 23.3 16 Antígua e Barbuda 64.8 … 8.4 25.2 Dominica 25.3 42.3 56.8 50.4 Granada 28.1 25.8 14.5 28.9 Montserrat 33.8 5.7 … … São Cristóvão e Névis 10.6 10.9 6.9 5.2 Santa Lúcia 17.1 16 25.4 23.4 São Vicente e Granadinas … … 42.5 62

Fonte: Cepal. Elaboração: Prospectiva Consultoria

Por outro lado, o grau de dependência do bloco aumenta consideravelmente no caso de Barbados, Dominica e Granada, que possuem respectivamente 41,6%, 50,4% e 28,9% de participação do comércio regional sobre o total (tabela 1).

Gráfico 2 - Principais produtos exportados pelo Caricom em 2000

53.01%

13.50%

12.20%

8.70%5.50% Combustíveis minerais

Alimentos

Produtosindustrializados

Produtos químicos

Bebidas e cigarros

Fonte: Caricom. Elaboração: Prospectiva Consultoria

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A pauta de exportação do Caricom não é muito diversificada (ver gráfico 2 acima), concentrando-se basicamente em produtos como combustíveis minerais com 53% do total das exportações, alimentos, 13,5%; produtos industrializados, 12,2%; produtos químicos, 8,7% e bebidas e cigarros, 5,5%.

Gráfico 3 – Principais destinos das exportações do bloco em 2000

0

1

1

2

2

3

3

4

4

5

EUA Mundo

(Bil

es)

US

$

Trinidad e Tobago

Jamaica

Fonte: Comtrade, Nações Unidas Elaboração: Prospectiva Consultoria

Analisando os destinos das exportações dos dois principais países exportadores do Caricom, Trinidad e Tobago e Jamaica, vimos que os Estados Unidos são responsáveis por 42% das exportações destes dois países, o que indica a forte predominância dos Estados Unidos no comércio regional.

Gráfico 3 - Investimento externo direto no Caricom, 1998 a 2003

0200

400600800

1000

120014001600

18002000

1998 1999 2000 2001 2002 2003

US

$ (m

ilh

ões

)

Caricom

Fonte: Unctad Elaboração: Prospectiva Consultoria

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O fluxo de investimentos externos diretos no Caribe mantém-se constante de 1998 a 2003, com pequena elevação em 2001, apresentando uma média anual durante o período de US$ 1,5 bilhão (gráfico 3). Jamaica e Trinidad e Tobago são os principais destinos dos investimentos externos na região. Também aqui se observa uma grande participação dos Estados Unidos, que chegam a representar 40% dos fluxos de capital para estes países, segundo dados de 1998 do Bureau of Economic Analisys, órgão ligado ao Departamento de Comércio dos EUA. 2.2.4 Quadro Sintético O Caricom, apesar do seu reduzido mercado, logrou ao longo dos anos noventa elevar a participação do comércio regional em relação ao comércio total de seus países. A região caracteriza-se pela elevada participação dos Estados Unidos tanto nos fluxos de capitais como de comércio. Entretanto, as relações bilaterais do bloco não caminharam de forma tão categórica para a assinatura de acordos amplos e vinculativos sobre temas como serviços, investimentos, propriedade intelectual e compras governamentais, além de não terem assinado acordo específico com o Nafta.

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2.3 COMUNIDADE ANDINA DE NAÇÕES (CAN) Constituída por Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, essa organização sub-regional reúne uma população de mais de 121 milhões de habitantes, possuindo um PIB de US$ 314 bilhões, com exportações no valor de US$ 53 bilhões e importações alcançando os US$ 40 bilhões em 2004. A Comunidade Andina de Nações possui quase um quarto da população latino-americana, além de representar cerca de 15% do PIB e das exportações regionais. Porém, quando este bloco é inserido no conjunto do continente americano, percebe-se que o seu PIB mal supera a casa dos 2%, enquanto suas exportações apenas encostam em 4%. em

milhões Total da América Latina e

Caribe Total do Continente

Americano População 121,173 22,38% 14% PIB (US$) 314.156 15,56% 2,14% Exportações 52.887 14% 3,84% Importações 39.815 10,88% 2,08% Fonte: Banco Mundial, dados de 2004. Para exportações e importações, dados de 2003. Elaboração: Prospectiva Consultoria

2.3.1 Evolução Histórica e Características Institucionais

A Comunidade Andina de Nações foi estabelecida em 1996, como sucessora do Grupo Andino, cujas origens remontam ao Acordo de Cartagena de 1969, também conhecido como Pacto Andino. O Chile foi um dos membros fundadores do Pacto Andino, mas se retirou em 1976, durante o governo Pinochet.

A intenção original do Grupo Andino era aumentar o comércio entre os membros e criar programas industriais conjuntos para indústrias como a petroquímica, a metalúrgica, e a automobilística. Houve um esforço no sentido de lançar uma moeda comum que nunca se concretizou. Um acordo do Grupo Andino de 1971, que limitava rigidamente o investimento estrangeiro nos países-membros, foi eliminado em maio de 1987, quando os membros assinaram o Protocolo de Quito, segundo o qual cada um deles poderia estabelecer as suas próprias normas.

A CAN é composta pelos órgãos e instituições do chamado Sistema Andino de Integração (SAI), cuja estrutura foi estabelecida pelo Protocolo de Trujillo, que reformou o Tratado de Cartagena em 1996 :

• Conselho Presidencial Andino, órgão máximo do Sistema, cujo presidente exerce mandato de um ano, sucessivo e em seqüência alfabética de países.

• Secretaria Geral, órgão executivo do Sistema, com sede permanente em Lima, Peru, e capacidade propositiva perante o Conselho de Ministros e a Comissão

• Conselho Andino de Ministros de Relações Exteriores, responsável pela formulação e execução da política externa da CAN

• Comissão, órgão normativo do Sistema, composto por um representante plenipotenciário de cada país membro

• Tribunal de Justiça, órgão jurisdicional com competência sobre os cinco países membros e formado por cinco magistrados representantes de cada um deles.

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• Parlamento Andino, órgão deliberativo do Sistema, cujos representantes são eleitos pelo Congresso Nacional de cada um dos membros. No caso de Venezuela e Equador, tais representantes já são eleitos por voto direto.

• Corporação Andina de Fomento (CAF), instituição financeira internacional, integrada por acionistas dos cinco países membros e da Argentina, Brasil, Chile, Costa Rica, Jamaica, México, Panamá, Paraguai, Trinidad e Tobago e 22 bancos privados da região andina. Esse braço financeiro da CAN apóia ações que visem o desenvolvimento sustentável dos países.

• Fundo Latino-americano de Reservas, instituição financeira que visa oferecer fundos e estabilidade à balança de pagamentos dos países membros.

• Conselho Consultivo Empresarial, composto por quatro delegados do meio empresarial de cada um dos países membros.

• Conselho Consultivo Trabalhista, órgão consultivo composto por representantes de organizações trabalhistas de cada país membro.

• Universidade Andina Simon Bolívar. • Convênios, instituições intergovernamentais que atuam no sentido de

complementar a integração entre o setor econômico-comercial e outros.

Em termos de evolução histórica da integração econômica, vale destacar que já em 1993 entra em vigor uma Zona de Livre Comércio entre Bolívia, Colômbia, Equador e Venezuela, seguido de uma Tarifa Externa Comum para esses países em 1995. O Peru ficou de fora desse processo, pois em 1992 suspendeu todos os compromissos assumidos junto aos outros países andinos. A incorporação do Peru à Zona Andina de Livre Comércio é feita de maneira gradual somente a partir de 1997, de forma que apenas em 2005 foram eliminadas todas as tarifas para todos os bens.

Em 1999, os Estados se comprometeram a estabelecer um Mercado Comum entre si até, no máximo, dezembro de 2005, quando termina o processo de desgravação tarifária por parte do Peru. Ao contrário do Mercosul e da maior parte das iniciativas de integração regional, a CAN não prevê uma lista de exceções no comércio de bens intra-bloco.

Há uma agenda bastante ambiciosa em serviços dentro do bloco. Os países membros da CAN se comprometeram a eliminar todas as formas de restrições às quatro formas de prestação de serviços classificadas pelo GATS1 até 2005. Dentro da agenda de serviços, é dado tratamento específico para os setores de telecomunicações e energia, considerados estratégicos para a integração regional.

Ainda que não tenham sido efetivados acordos que estabeleçam a livre circulação de trabalhadores dentro do bloco dos países andino, esse é um dos temas da agenda de integração regional. É dada importância política também para a integração de infra-estrutura, cuja agenda vai além da CAN, ao propor a Iniciativa para a Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-americana (IIRSA) com atenção especial para energia, telecomunicações e transportes.

A Comunidade Andina de Nações mantém atualmente uma tarifa externa comum, com algumas exceções, e respeitadas as diferenças no nível de desenvolvimento de seus países membros. No campo político e de segurança, foi aprovado em 2004 documento

1 Modo 1 – Transfronteiriço, Modo 2 – Consumo no exterior, Modo 3 – Presença comercial e Modo 4 Entrada temporária de prestadores de serviços estrangeiros.

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com diretrizes de uma Política de Seguranças Externa Comum, com vistas a consolidar uma Zona de Paz Andina, sem armas nucleares, químicas ou biológicas.

Os produtos originários dos países andinos já acessam os mercados dos Estados Unidos e da Europa com vantagens aduaneiras por meio de iniciativas como o Sistema Geral de Preferências, ou o Andean Trade Promotion and Drug Eradication Act (EUA).

Não obstante, a agenda extra-bloco da CAN tem se aprofundado na medida em que, além de assinar um acordo de livre comércio com o Mercosul, a Comunidade Andina de Nações negocia, desde 2003, acordos de livre comércio com a União Européia e com os EUA. Com o bloco europeu, vigora desde o fim de 2003 um acordo de diálogo político e de cooperação que estabelece os marcos do futuro acordo cujas negociações efetivas deverão começar em 2006.

2.3.2 A CAN e os Acordos Comerciais com outros Blocos Observa-se um conjunto de acordos com outros blocos, geralmente sob a modalidade de acordos preferenciais, não figurando os temas serviços e investimentos na sua grande maioria. Existe uma margem importante para realizar acordos bilaterais por parte de cada um dos países do bloco. O único acordo que segue o padrão Nafta é o assinado entre a Bolívia e o México. CAN – Mercosul Em 16 de abril de 1998, os cinco países andinos e os quatro países do Mercosul assinaram um acordo de escopo parcial que iniciava as negociações para a criação da área de livre comércio entre os dois blocos. As negociações se desenvolveram em duas etapas, primeiro, por meio de um Acordo de Preferências Tarifárias Fixas e posteriormente por um Acordo de Livre Comércio. Seguindo as etapas propostas inicialmente, em agosto de 1999 foi negociado e firmado entre a Comunidade Andina e o Brasil um acordo de preferências que seria estendido a Argentina em junho de 2000. Iniciada a segunda fase das negociações, em 16 de dezembro de 2003, foi assinado o Acordo de Complementação entre a Comunidade Andina e o Mercosul para a efetivação de uma zona de livre comércio entre as partes. Este acordo entrou em vigor em 1º de julho de 2004. Assinaram o acordo, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, Colômbia, Equador e Venezuela. Bolívia e Peru possuem acordos de livre comércio com o Mercosul desde 17 de dezembro de 1996 no caso do primeiro (ACE nº 36) e desde 25 de agosto de 2003 no caso do segundo país andino (ACE nº 58). O acordo de livre comércio entre a CAN e o Mercosul segue um marco jurídico padrão para todos os países dos blocos, mas estabelece cronogramas diferenciados de desgravação para cada um deles. Ao Paraguai e ao Equador é concedido tratamento preferencial e portanto a desgravação tarifária de alguns produtos chega a levar 18 anos. Na medida em que os cronogramas de desgravação do acordo CAN -Mercosul alcançarem as margens preferenciais estabelecidos por acordos bilaterais pré-existentes entre as partes membro dos dois blocos, esse perde automaticamente a validade.

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Apesar de o acordo mencionar que os blocos deverão trabalhar para estabelecer regras comuns de serviços e investimentos, não foram criadas regras específicas para essas temas. CAN – América Central e Caribe Desde março de 2000, a Comunidade Andina está negociando a assinatura de um acordo de complementação econômica com três países do Mercado Comum Centro Americano: Guatemala, El Salvador e Honduras, países que denominam o “Triângulo Norte”. No entanto, atualmente apenas Colômbia e Venezuela possuem acordos de alcance parcial com os três países centro-americanos, nos quais oferecem preferências para vários produtos, porém não recebem nenhuma preferência destes países. Outros Acordos Bolívia Bolívia-México Acordo de livre comércio assinado em 10 de setembro de 1994 (passou a vigorar em 1 de janeiro de 1995). Estabelece desgravação gradual até 2006 para quase a totalidade de linhas tarifarias. Cria também regras para serviços (incluindo cláusulas específicas para telecomunicações e serviços financeiros), investimentos, compras governamentais e propriedade intelectual seguindo os padrões estabelecidos pelo Nafta. Bolívia-Chile Acordo de Complementação Econômica 22, segue o padrão de abrangência parcial de linhas tarifárias. Assinado em 6 de abril de 1993, passou a vigorar no dia 1 de julho daquele mesmo ano. Colômbia, México e Venezuela (Grupo dos Três) Acordo de livre comércio assinado entre as três partes em setembro de 1990 e que passou a vigorar em 1 de janeiro de 1995. Estabelece a desgravação gradual de quase a totalidade das linhas tarifárias. Cria regras específicas para serviços, mas deixa de fora resoluções específicas sobre investimentos (fora do capítulo de serviços), compras governamentais e propriedade intelectual. Deixa de fora também vários produtos do setor automotivo. Em dezembro de 2004, foi assinado um novo acordo entre as partes (Acordo de Complementação Econômica 61) estabelecendo margens de preferência para o setor automotivo. Colômbia-Panamá Acordo de abrangência parcial número 29, assinado em 9 de julho de 1993. Entrou em vigor em 18 de janeiro de 1995. Cobre poucas linhas tarifárias dos setores de embalagens, têxteis, alimentos e bebidas, eletrônicos e produtos de uso doméstico. Colômbia-MCCA e Colômbia-Caricom Ver nas respectivas seções

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Colômbia-MCCA e Colômbia-Caricom Ver nas respectivas seções Equador-Chile Acordo de complementação econômica 32, assinado no âmbito da Aladi. Assinado em dezembro de 1994, passou a vigorar em 1 de janeiro de 1995 estabelecendo desgravação tarifária para algumas linhas tarifárias. Peru-Chile Acordo de Complementação Econômica 38 assinado no âmbito da Aladi em junho de 1998. Passou a vigorar em 1 de julho de 1998, estabelecendo a desgravação tarifária de diversos produtos. Venezuela-Chile Segue o modelo dos outros acordos de complementação econômica assinados pelo Chile no âmbito da Aladi. Assinado em 2 de abril de 1993, o acordo passou a vigorar em 1 de julho de 1993 estabelecendo a desgravação tarifária de alguns produtos. Venezuela-Trinidad e Tobago Acordo de alcance parcial assinado agosto de 1989. estabelece margens de preferência de 25% para poucos produtos dos setores de bebidas e alimentos, materiais para construção e eletrônicos. Venezuela-MCCA e Venezuela-Caricom Ver nas respectivas seções 2.3.3 Características Econômicas Conforme pode-se notar no gráfico 1, no período de 1994 a 2004, as exportações intra-regionais na Comunidade Andina mais do que dobraram, saltando de US$ 3,4 bilhões em 1994 para US$ 7,7 bilhões em 2004. Ainda assim, percebe-se que uma parte deste aumento está concentrada neste último ano, em decorrência da elevação dos preços do petróleo que trouxe impactos regionais por meio da expansão da economia venezuelana.

Gráfico 1 – Evolução das exportações intra-regionais da Comunidade Andina – 1994 a 2004

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0123456789

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

US

$ (B

ilh

ões

)

Comunidade Andina

Fonte: Comunidade Andina Elaboração: Prospectiva Consultoria Analisando-se os dados a partir de 1990, percebe-se que a importância do comércio intra-bloco sobre o comércio total da Comunidade Andina é crescente até 1995, estabilizando-se a partir de 2000 em um patamar próximo aos 10%, conforme pode ser observado no gráfico 2, o que indica uma elevada dependência de relações comerciais com outros blocos. Porém, o peso do comércio intra-regional apresenta variações entre os países. Neste caso, a Bolívia é o país que apresenta a maior dependência do bloco para o escoamento de suas exportações com 27%, seguido do Equador com 16,7%. Por outro lado, a Venezuela por possuir produtos estratégicos em sua pauta de exportação como é o caso do petróleo, por exemplo, é o país menos dependente da Comunidade Andina com 4,3% (gráfico 2). Gráfico 2 - Peso do comércio intra-regional em porcentagem sobre o comércio total, 1990

a 2003

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0

5

10

15

20

25

30

35

1990 1995 2000 2001 2002 2003*

Bolívia Colômbia Equador

Perú Venezuela Comunidade Andina

Fonte: Cepal Elaboração: Prospectiva Consultoria

Quando se analisa o comércio intra-regional, os Estados Unidos aparecem como o principal parceiro comercial dos países membros da Comunidade Andina, figurando como destino de 42% das exportações do bloco, seguido da União Européia, que é destino para 10,5% das exportações do bloco. O comércio intra-regional aparece em terceiro lugar, com 10,5%, enquanto Mercosul e o México representa apenas 5% do comércio regional (gráfico 3).

Gráfico 3 – Principais destinos das exportações do bloco em 2004

42.00%

10.50%12.00%

4.90%

3.90%

26.70%

EUA CAN UE 15 Mercosul+Mexico Ásia Outros

Fonte: Comunidade Andina Elaboração: Prospectiva Consultoria Em termos de investimentos diretos externos, a Comunidade Andina, entre os anos de 1994 a 1999, apresentou entradas anuais que oscilam de US$ 6,2 bilhões em 1994 ao pico de US$ 15,3 bilhões, verificado em 1997 (gráfico 4). De 1999 em diante, o valor médio de investimentos das multinacionais chegou a US$ 8 bilhões anuais.

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Ao longo do período analisado, os principais destinos destes investimentos foram a Colômbia e a Venezuela, responsáveis por 55% destes fluxos de capitais em 2004, os quais chegaram a US$ 7,7 bilhões.

Gráfico 4 - Investimento externo direto na Comunidade Andina, 1994 a 2003

02,0004,0006,0008,000

10,00012,00014,00016,00018,000

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

US

$ (m

ilh

ões

)

Comunidade Andina

Fonte: Unctad Elaboração: Prospectiva Consultoria O ingresso dos investimentos externos tanto na Venezuela como na Colômbia explicam parcialmente os resultados das exportações intra-regionais, já que o capital externo está sendo investido na região por meio da instalação de empresas multinacionais cujas vendas muitas vezes se direcionam para mercados externos ao bloco ou então se concentram no setor de serviços.

Gráfico 5 – Origem dos investimentos externos diretos na Comunidade Andina, 2003

0

200

400

600

800

1000

1200

EUA Can AméricaLatina

UE Ásia

US

$ (m

ilh

ões

)

Fonte: Comunidade Andina Elaboração: Prospectiva Consultoria

Da totalidade dos investimentos externos diretos recebidos pela Comunidade Andina em 2003, que foi de US$ 7,7 bilhões, ressalta-se a importância dos Estados Unidos e da União Européia, cujo percentual sobre os investimentos externos diretos totais correspondem respectivamente a 23,56% e 37,3%. Percebe-se também um importante movimento de capitais latino-americanos em busca da região.

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Analisando-se os países da Comunidade Andina separadamente, a Venezuela, apesar dos investimentos dos Estados Unidos corresponderem a US$ 18 milhões em 2003, foi o país que mais recebeu investimentos norte-americanos desde 1994, totalizando US$ 6,3 bilhões em 2003. Por outro lado, o Peru foi o país que menos recebeu investimentos norte-americanos durante o mesmo período, com um total de US$ 1,2 bilhões e um fluxo de US$ 15 milhões em 2003. 2.3.4 Quadro Sintético Em linhas gerais, depreende-se que a Comunidade Andina figura como o bloco da região cuja integração se expandiu de forma mais ampla, atingindo não somente aspectos econômicos, mas também institucionais. Além de já possuir uma área de livre-comércio e união aduaneira quase completas, e de contar com acordos regionais no setor de serviços (com a exceção de áreas estratégicas), o bloco dispõe de um Parlamento Andino, de Conselho Consultivos, Empresarial e Trabalhista, e de um organismo financeiro como a CAF. Adicionalmente, percebe-se que os acordos comerciais extra-regionais não seguem a modalidade Nafta, restringindo-se em grande medida a negociações de acesso a mercado. Finalmente, se em termos comerciais existe uma grande dependência do mercado norte-americano, esta não transparece, no mesmo grau, quando se analisa a origem dos capitais investidos na região.

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2.4 MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL) Formado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, o bloco reúne uma população de 226 milhões de habitantes, possuindo um PIB de US$ 776 bilhões, com exportações no valor de US$ 105 bilhões e importações alcançando os US$ 68,7 bilhões em 2003. Ainda que represente cerca de 40% do PIB latino-americano, o Mercosul responde por apenas pouco mais de 5% do PIB do continente americano. Quando se considera o peso populacional, entretanto, este bloco abarca ¼ dos habitantes das Américas, o que indica a elevada dimensão deste mercado potencial. em

milhões Total da América Latina e

Caribe Total do Continente

Americano População 226,1 41,7% 26% PIB (US$) 776.621 38,47% 5,3% Exportações 105.921 28% 7,7% Importações 68.747 18,78% 3,6% Fonte: Banco Mundial, dados de 2004. Para exportações e importações, dados de 2003. Elaboração: Prospectiva Consultoria

2.4.1 Evolução Histórica e Características Institucionais

Em 29/11/88, os Presidentes José Sarney e Raul Alfonsin assinaram, em Buenos Aires, o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento Brasil-Argentina, que previa a liberalização completa do comércio de bens e serviços entre os dois países em prazo máximo de dez anos, e tratava, também, das demais questões da agenda de um Mercado Comum. Após dois anos, foram incluídos no processo de integração Paraguai e Uruguai, no cenário que daria origem ao Mercosul.

O Mercosul foi estabelecido pelo Tratado de Assunção, assinado pelos quatro países membros em 26 de março de 1991, dando início ao processo de desgravação tarifária entre os países. Com o Protocolo de Ouro Preto, assinado em dezembro de 1994, o Mercosul adquire personalidade jurídica internacional e passa a funcionar como área de livre-comércio e união aduaneira incompletas. Isto porque ainda hoje vigoram listas nacionais de exceção para produtos sensíveis, além dos regimes de adequação à Tarifa Externa Comum. O prazo hoje estipulado para conclusão destas pendências comerciais é 2006. É pouco provável, no entanto, que haja ambiente político para a eliminação dessas exceções, sobretudo por parte dos setores privados argentinos. Além disso, não se caminhou no sentido de criação de um mecanismo de salvaguardas no Mercosul. O Mercosul possui uma estrutura institucional na qual, sempre por consenso, são os governos dos países membros que negociam, não havendo nenhum órgão de perfil supranacional. Tal estrutura é composta por:

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• Órgãos Decisórios:

o Conselho do Mercado Comum, órgão supremo que conduz politicamente o processo de integração, composto pelos Ministros de Relações Exteriores e Economia dos países membros. O Conselho cria Reuniões de Ministros, das quais participam os presidentes dos Estados.

o Grupo Mercado Comum, órgão executivo do Mercosul, que negocia acordos em nome do bloco com terceiros, além de outras funções. Suas resoluções são obrigatórias e é formado por quatro membros titulares e quatro membros alternos por país, designados pelos respectivos Governos, entre os quais devem constar obrigatoriamente representantes dos Ministérios de Relações Exteriores, dos Ministérios de Economia (ou equivalentes) e dos Bancos Centrais.

o Comissão de Comércio do Mercosul, responsável pela supervisão da aplicação dos instrumentos de política comercial comum acordados entre os membros, através de comitês técnicos e de salvaguardas.

• Órgãos de Representação Parlamentar • Órgãos Consultivos – Foro Consultivo Econômico-Social Este organismo faz recomendações ao Grupo Mercado Comum, sendo composto por igual número de representantes de cada país membro, que se dividem entre:

o Comissão Consolidação da União Aduaneira o Comissão Aprofundamento do Processo de Integração o Comissão Relações Externas do Mercosul o Comissão Aspetos Sociais de Integração o Comitê Misto: Comitê Econômico e Social Europeu (CES) – Foro Consultivo

Econômico Social do Mercosul (FCES)

• Órgãos de Apoio: Secretaria do Mercosul, composta por diversos setores e com sede fixa em Montevidéu, Uruguai, cuja direção é elegível a cada dois anos e o cargo é rotativo alfabeticamente de acordo aos Estados Partes.

Além do Tratado de Assunção, diversas outras normativas foram assinadas entre os países-parte visando aprofundar as regras regionais em questões de investimentos (Protocolo de Colônia, 1994), comércio regional de serviços (Protocolo de Montevidéu, 1997), propriedade intelectual (1995), defesa da concorrência (1995), entre outros. Ainda que os protocolos que criam regras regionais para serviços e investimentos tenham sido assinados por todas as partes integrantes do Mercosul, os Protocolos de Colônia e de Montevidéu ainda não foram ratificados pelos Congressos. Na reunião de Ouro Preto 2, em dezembro de 2004, mais uma vez se lançou a idéia de um Parlamento Mercosul, assim como de um Fundo de Reconversão Estrutural para o bloco. Entretanto, tais iniciativas cumprem mais o papel de mostrar a suposta vitalidade do processo integracionista, já que pouco se tem avançado no delineamento concreto das propostas.

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O grande tema do bloco nos últimos dois anos tem sido a proposta argentina de criação de salvaguardas permanentes, protegendo-a assim dos desníveis de competitividade em relação ao Brasil. Ao contrário, propostas que visem a integração das cadeias produtivas e a criação de políticas agrícolas e industriais comuns têm caído em descrédito. Em termos institucionais, portanto, o Mercosul se encontra menos avançado que o MCCA e a Comunidade Andina, já que o seu grande ímpeto esteve mais vinculado à expansão dos fluxos de comércio e investimento, que aliás sofreu uma inflexão negativa no pós-1998. Especialmente no período pós-1999, num contexto de aprofundamento das assimetrias econômicas relacionadas à desvalorização do real e ao agravamento da crise Argentina, as quais contribuíram para uma paralisia institucional do bloco, tem-se destacado a agenda externa do Mercosul. Além de acordos de complementação econômica com o Chile, Bolívia, Peru, Venezuela e Colômbia, que figuram como membros associados do bloco, os países do Mercosul vêm negociando acordos de livre comércio em bloco. Tanto nas negociações da Alca como no âmbito do acordo inter-regional Mercosul-UE, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai negociaram em bloco, mas divergências internas, além de controvérsias com os Estados Unidos e a Europa sobre a forma e o escopo de negociação, impediram a concretização dos acordos comerciais. Na OMC, cada país continua aplicando suas políticas de comércio internacional de forma autônoma. 2.4.2 O Mercosul e os outros acordos comerciais Mercosul-CAN Ver na seção CAN Mercosul-Bolívia Ver na seção CAN Mercosul-Chile Acordo de Complementação Econômica de número 35, assinado no âmbito da Aladi em 25 de junho de 1998 (entrou em vigor em 1 de outubro de 1996). Estabelece livre comércio para a maior parte das linhas tarifárias até 2012 entre os países do Mercosul e o Chile. Quase a totalidade dos produtos passaram a ter tarifas zero em 2004. O acordo faz indicação de vontade política para as partes constituÍrem regras para o comércio regional de serviços e investimentos. Mercosul-UE Acordo-quadro assinado entre o bloco dos países europeus e o Mercosul em 15 de dezembro de 1995. Estabelece os marcos gerais para a cooperação econômica e política entre os dois blocos, inclusive prevendo a negociação de um acordo de livre comércio abrangente entre eles. As negociações desse acordo avançaram até outubro de 2004 e desde então continua em impasse.

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Mercosul-Índia Acordo quadro assinado em 17 de junho de 2003 para a constituição de um acordo de complementação econômica entre as duas partes. Já foram trocadas listas de ofertas entre o Mercosul e a Índia (ambas as partes incluiram poucos produtos na pauta), mas o acordo ainda não foi ratificado por todas as partes envolvidas. Mercosul-México Dois acordos foram assinados entre o Mercosul e o México com o intuito de reduzir as tarifas de bens industriais entre as duas partes. O primeiro (ACE 54) assinado em 27 de setembro de 2002 estabecele ainda a intenção política de avançar as negociações (Acordo-Quadro). Em 5 de julho de 2004, foi assinado o ACE 55, que estabelece a desgravação tarifária para os capítulos do setor automotivo entre as duas partes. Acordos em negociação (4+1) Além dos acordos supracitados, o Mercosul vem negociando acordos de complementação econômica com a África do Sul, Canadá e Marrocos. Argentina-Uruguai Acordo de abrangência parcial entre os dois parceiros do Mercosul assinado em maio de 2003. Aprofunda as regras regionais do Mercosul para o comércio bilateral do setor automotivo. Brasil-Cuba Acordo de complementação econômica 43, estabelece margens de preferência para uma série de produtos dos setores químico, têxtil, máquinas e equipamentos, alimentos, materiais para construção, metais, eletro-eletrônicos, entre outros. Assinado no final de 1999, o acordo passou a ter validade no início de 2000. Em março de 2005 foram trocadas listas solicitando margem de preferência tarifária para outros produtos. Brasil-México Acordo de complementação econômica de número 53, assinado entre o Brasil e o México em 3 de agosto de 2002. Estabelece acesso preferencial de produtos dos setores de alimentos, químicos, máquinas e equipamentos e móveis em ambos os mercados. Brasil-Suriname Acordo de abrangência parcial assinado no final dos anos 1980s. Estabelece uma quota anual para importações de arroz provenientes do Suriname com tarifa zero no Brasil. Brasil-Guiana

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Acordo de alcance parcial assinado no âmbito da Aladi em junho de 2001, estabelece acesso ao mercado brasileiro com margens de preferência tarifária para produtos dos setores de alimentos, minérios, madeiras, papel celulose materiais para construção provenientes do da Guiana. A lista de produtos brasileiros que acessam o mercado da Guiana é mais extensa, incluindo, além desses setores, bebidas, autopartes, têxteis, máquinas e equipamentos, eletro-eletrônicos e cosméticos. Uruguai-México Acordo de complementação econômica de número 5, assinado no âmbito da Aladi em dezembro de 1999. Estabelece preferência aduaneira de 100% para a maior parte das mercadorias. Menciona também a intenção das partes avançarem as regras para serviços e investimentos. 2.4.3 Características Econômicas As exportações intra-bloco do Mercosul, depois de terem chegado ao seu pico em 1997, se reduziram de forma drástica em 1999, com a desvalorização do real, e mais uma em 2002, com a crise Argentina. Neste ano, o total exportado foi cerca de metade do registrado em 1997. Porém, com a recuperação econômica da Argentina, a partir de 2003, as exportações apresentaram um leve aumento atingindo cerca de US$ 11,6 bilhões (gráfico 1). Do total das exportações de 2003, Brasil e Argentina responderam por 88% das exportações intra-bloco.

Gráfico 1 – Evolução das exportações intra-regionais do Mercosul – 1994 a 2003

0

5

10

15

20

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1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

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Mercosul

Fonte: INDEC, SECEX, Secretaria Administrativa do Mercosul e Banco Central do Uruguai Elaboração: Prospectiva Consultoria

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Durante o período analisado, refletindo a queda das exportações intra-regionais, o peso do comércio entre os países do bloco sobre o comércio mundial também teve a sua importância reduzida (gráfico 2). A participação do comércio intra-bloco sobre o comércio total do Mercosul que, em 1990, era de 8,8%, encontrou o seu auge em 1995, com 20,6%. A partir de então, este percentual tem apresentado queda, situando-se em torno de 12% no ano de 2003. Os dois membros que apresentam maior dependência do bloco para as suas exportações são Paraguai e Uruguai, com o percentual em 2003 de 36,2% e 29,6% respectivamente. Por outro lado, Brasil é o país com menor dependência do bloco, com apenas 7,8% de participação do comércio intra-regional no comércio total no mesmo ano. Com uma pauta de exportações intra-regionais relativamente diversificada, em 2004, os principais produtos exportados pelo Brasil para o Mercosul foram: automóveis, máquinas, equipamentos elétricos, plásticos, ferro e aço, que correspondem a US$ 4,48 bilhões de dólares, segundo dados do Comtrade/ONU. Por outro lado, os demais países tendem a ter suas exportações para o Brasil relativamente concentradas em produtos agrícolas e de baixo valor agregado. Ainda assim, deve-se enfatizar que o Brasil responde por uma parcela importante das exportações industriais argentinas.

Gráfico 2 - Peso do comércio intra-regional em porcentagem sobre o comércio total, 1990 a 2003

0

10

20

30

40

50

1990 1995 2000 2001 2002 2003

Argentina Brasil Paraguai Uruguai Mercosul

Fonte: Cepal Elaboração: Prospectiva Consultoria O gráfico 3 apresenta a concentração das exportações do Mercosul, bastante dependente da União Européia (23,55%) e do Nafta (28,99%). As exportações do bloco para estes dois países, no ano de 2003, chegaram a ser quase 4 vezes superior ao montante das exportações intra-regionais, de 13,8% do total.

Gráfico 3 - Principais destinos das exportações do bloco em 2003

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27.91%

28.99%6.46%

8.25%

13.79%

14.60%UE

NAFTA

América do Sul (excl.Mercosul e México)

Ásia

Mercosul

Outros

Fonte: Mercosul Elaboração: Prospectiva Consultoria Ao se analisar o investimento externo direto no Mercosul, observa-se, em primeiro lugar, o seu papel importante – junto com as privatizações e a abertura do mercado – para se promover um salto provisório, no pós-1994, de entrada de capitais, geralmente concentrados no setor de serviços. Ressalte-se aliás que os investimentos externos industriais que chegaram neste período possuíam claramente o horizonte do Mercosul como mercado livre para as suas operações e transações comerciais. Entretanto, a partir de 1999, junto com a crise de Brasil e Argentina, e num contexto de escassez de recursos externos para a periferia - quadro que perduraria ao menos até 2003 - percebe-se um acentuado declínio do fluxo de investimentos para o bloco. Entre estes dois extremos, os fluxos de investimentos das multinacionais se reduziram em cerca de 80%, passando de US$ 52,8 bilhões para US$ 10,9 bilhões (gráfico 4). Com relação à distribuição setorial do investimento externo na região, há uma concentração nos setores de serviços e na indústria no caso do Brasil; na Argentina, há um predomínio no setor primário seguido do setor de serviços. Especialmente, no período 1999-2003, os investimentos externos industriais se concentram no Brasil, além da tendência observada de desativação de importantes filiais argentinas do setor automotivo e da indústria eletroeletrônica. No bloco, o Brasil é o país que mais recebe investimentos externos, respondendo por 68,95% dos investimentos externos no período 1994 a 2003.

Gráfico 4 - Investimento externo direto no Mercosul, 1994 a 2003

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1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

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ões

)

Mercosul

Fonte: Unctad Elaboração: Prospectiva Consultoria Em relação à origem dos investimentos recebidos pelo Brasil, no período 1996-2000, os Estados Unidos ocuparam a segunda posição, com 20,98% do total, entre os países que mais investiram no Brasil, ficando atrás da União Européia com 44,26% dos investimentos externos diretos. Na Argentina, também percebe-se uma crescente participação dos europeus no investimento externo direto, com uma participação de 49,09 % entre 1995 e 2000. Outro país que merece destaque são os EUA. Este país foi responsável por 22,06 % dos investimentos externos realizados na Argentina durante esse período. 2.4.4 Quadro Sintético Apesar de o Mercosul ter, principalmente no período mais recente, se contraposto aos anseios de expansão da Alca, segundo os moldes propostos pelos EUA, e de haver “endurecido” nas negociações com a UE; no plano interno, o bloco tem sofrido crescentes dificuldades econômicas e institucionais a partir de 1999. Trata-se de uma integração essencialmente ancorada na redução de tarifas e nas decisões de investimentos das multinacionais, tendo demonstrado pouca capacidade de ampliar e diversificar a agenda regional. As críticas do Banco Mundial e de outros organismos internacionais de que seja um bloco “fechado” revela-se improcedente, o que se depreende do pouco peso do comércio intra-regional e da influência predominantes dos investimentos externos, primeiro europeus e depois norte-americanos. Mais recentemente, o Mercosul tem ampliado as suas relações externas com demais países da América do Sul e outras economias emergentes. Por outro lado, na ausência de políticas regionais de complementaridade produtiva, e num quadro de paralisia institucional, não se pode prever que a prorrogação das negociações comerciais no âmbito da Alca e com a União Européia tenham implicado um fortalecimento do bloco.

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2.5 Alternativa Bolivariana para as Américas

A Alba (Alternativa Bolivariana para as Américas), projeto que propõe uma integração política e econômica da região latino-americana e caribenha sob novos moldes, foi lançado pelo presidente Chávez como uma alternativa à Alca (Área de Livre Comércio das Américas). Firmado entre os presidentes Fidel Castro e Hugo Chávez, na cidade de Havana no dia 14 de dezembro de 2004, amplia e modifica Convênio Integral de Cooperação entre Cuba e Venezuela, datado do dia 30 de outubro de 2000. Tal proposta surge no contexto de negociação da Alca, que se iniciou com a Cúpula das Américas, realizada em dezembro de 1994, quando 34 países da região – com a exclusão de Cuba - haviam decidido criar uma área de livre-comércio no continente americano. Por pressão norte-americana, este acordo deveria conter também a flexibilização da legislação de serviços, propriedade intelectual, investimentos e compras governamentais. Desta forma, a partir do momento em que se atenua o ímpeto para a aprovação da Alca, já que as negociações mantêm-se postergadas, a Alba surge como proposta que visa disputar a hegemonia de poder regional, ainda que o seu alcance se mostre, no presente momento, sobremaneira limitado. 2.5.1 Princípios Norteadores da Alba A Alternativa Bolivariana para a América Latina e o Caribe surge, como vimos, num quadro de sistemática oposição à Alca. Sua proposta embasa-se em um modelo de integração dito diferente e avesso à proposta de integração liberalizante dos fluxos de comércio, serviços e investimentos. A Alba defende a criação de mecanismos de cooperação entre as nações latino-americanas e propõe contrabalançar as assimetrias dos países do hemisfério frente às potências desenvolvidas. Muito diversa de uma proposta de integração e negociação de blocos sub-regionais, a Alba possui a prerrogativa de esboçar alianças estratégicas e posições comuns entre os países da região como um modo de angariar força política para questionar o modelo norte-americano de integração continental. Esta proposta busca repensar os atuais acordos de integração, com o objetivo de alcançar maiores níveis de desenvolvimento nacional e regional, enfrentando de forma decisiva heranças latino-americanas tais como a pobreza e a desigualdade social. A crítica realizada aos grandes acordos de integração é de que deveriam ser ancorados em propostas de desenvolvimento endógeno, pois a escassa diversificação da oferta regional faria com que a Alca redundasse no ainda maior enfraquecimento das estruturas produtivas latino-americanas. Além disso, os defensores da Alba repreendem o aumento de exportações e os investimentos alicerçados somente nas maquiladoras e na exploração massiva da força de trabalho. No seu entender, indubitavelmente, a Alca não poderá gerar um efeito multiplicador sobre as cadeias setoriais e sobre os setores agrícolas e industriais, pois somente os países com maior grau de industrialização e desenvolvimento se beneficiariam do livre-comércio.

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A Alba também tece críticas às exigências de abertura de mercados agrícolas, como a redução de políticas protecionistas e o fim dos subsídios. Dado que a agricultura representa para a maioria dos países a principal fonte de renda nacional, esta seria um dos pontos nevrálgicos do acordo de livre comércio. A abertura agrícola acarretaria uma incursão de produtos agrícolas importados, os quais afetariam opções culturais, a forma de emprego territorial e a relação do ser humano com a natureza, além de depreciar a soberania territorial. Na prática, corria-se o risco de que os países latino-americanos liberalizassem os seus mercados agrícolas, sem lograr modificar as práticas protecionistas dos Estados Unidos. Dado que os produtos subsidiados deste país têm a faculdade de concorrer deslealmente nos mercados latino-americanos, a única saída eqüitativa, vista pelos formuladores da Alba, seria negociar o acesso aos mercados para os produtos agrícolas em foro multilateral, e somente quando os verdadeiros alcances das potências agrícolas do mundo fossem delimitados com a supressão dos subsídios e demais ajudas, poderia-se definir o formato e alcance das negociações agrícolas. Outro assunto controverso dentro dos projetos de integração no formato “Alca” é a defesa da propriedade intelectual das grandes corporações internacionais. Por esta abordagem, e por meio do estratagema dos chamados “assuntos relacionados ao comércio”, se estabelece um amplo regime obrigatório e global de proteção à propriedade intelectual, que desconsidera os países do Sul - defasados nas áreas cientifico-tecnológica e muitas vezes incapazes de proteger a sua diversidade genética e os conhecimentos tradicionais de camponeses e indígenas. Adicionalmente, critica-se toda e qualquer liberalização, desregulamentação e privatização de serviços, que restrinja a liberdade estatal para planejar e efetuar políticas públicas. Nos países em desenvolvimento, estas práticas trariam o sucateamento dos serviços públicos, além da transferência de ativos nacionais para empresas multinacionais. A solução para a melhoria dos serviços públicos, nesta vertente anti-privatização, seria realizar reformas fiscais e políticas de promoção ao crescimento econômico e de reserva de mercado em setores estratégicos. 2.5.2 A possível materialização Os governos de Cuba e Venezuela já firmaram 49 acordos de cooperação, que deram início à implementação da Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba). Um dos pontos principais do destes acordos diz respeito à saúde, com a formação de 30 mil médicos venezuelanos em Cuba. Ademais, o governo cubano também se comprometeu a realizar 20 mil cirurgias em venezuelanos de baixa renda com problemas de catarata. No que tange à educação, o governo cubano se dispôs a oferecer o seu apoio à educação popular. Nos últimos dois anos, educadores cubanos alfabetizaram 1 milhão e 400 mil pessoas na Venezuela. Quanto a projetos no setor energético e de investimentos, o governo venezuelano promulgou a instalação de uma sede da PDVSA (empresa petroleira da Venezuela) e do

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Banco Industrial da Venezuela em Havana. De modo equivalente, será criado um Banco de Cuba na Venezuela. Tendo em conta a volatilidade de preços do petróleo, Cuba ofereceu a Venezuela um preço de garantia não inferior a 27 dólares por barril, sempre em conformidade com os compromissos assumidos pela Venezuela dentro da Organização de Países Exportadores de Petróleo. Os dois países anunciaram ainda a criação da TV Sul - projeto de uma rede continental de televisão. Os memorandos e acordos de cooperação compreendem ainda projetos de ações nas áreas de transporte, desenvolvimento tecnológico, turismo, meio ambiente e produção agrícola. Observa-se portanto que a Alba procura inverter a lógica de integração a partir do mercado. Inicia-se a integração em áreas e setores onde a complementaridade é clara, partindo de especializações adquiridas pelas coletividades nacionais. O intercâmbio, ainda que possa se dar entre empresas e entes privados, é pautado por prioridades políticas, com metas graduais e acertadas ao nível do Estado. Se o avanço da complementaridade entre estes dois países não é nada desprezível, o intercâmbio recíproco mostra-se profundamente concentrado em alguns setores, e incapaz, por enquanto, de alterar ou disputar, em termos econômicos, a dinâmica da integração verificada nos demais países latino-americanos. Esta, como vimos na análise individual dos blocos, continua se expandindo, comandada pela expansão dos fluxos de comércio e investimentos, e partindo das vantagens competitivas existentes, o que se verifica inclusive nas relações dos demais países latino-americanos com Cuba e Venezuela. 2.5.3 Características econômicas Ainda que a Alba tenha sido lançada recentemente, percebe-se uma crescente vinculação de Cuba com a economia venezuelana. Entre os principais parceiros comerciais de Cuba, a Venezuela ocupa a primeira posição, apesar de que tal se deva, em grande medida, ao papel do petróleo no intercâmbio entre os dois países (tabela 1). Já no que diz respeito à Venezuela, percebe-se uma maior participação de Cuba nas importações de medicamentos deste país. Dados do Comtrade/ONU apontam que as importações venezuelanas de medicamentos de Cuba em 2003 atingiram a cifra de US$ 6,9 milhões, o que corresponde a um crescimento de 2.435% entre o período de 1998 a 2002, quando a média das importações de medicamentos venezuelanos daquele país eram de US$ 272 mil (tabela 2).

Tabela 1 – Principais parceiros comerciais de Cuba em 2003

PAÍSES 2003 (MP) POR CENTO TOTAL DE INTERCAMBIO

Total 5 531 721 100.0

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Venezuela 744 728 13,4 Espanha 703 320 12,7 R. P. China 590 761 10,6 Canadá 442 502 7,9 Holanda 357 310 6,4 Federação Russa 351 570 6,3 Itália 290 805 5,2 França 260 774 4,7 México 227 190 4,1 Estados Unidos 169 581 3,0

Fonte: Oficina Nacional de Estadísticas, Anuario Estadístico de Cuba 2002, Edición 2003

Tabela 2 - Importações venezuelanas de medicamentos cubanos (1998-2003)

Ano Valor em US$

1998 18.524 1999 214.165 2000 1.017.219 2001 48.487 2002 63.426 2003 6.906.442

Fonte: Comtrade/ONU

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2.6 Quadro Comparativo entre os blocos Apesar das enormes diferenças de tamanho e perfis sócio-econômicos entre MCCA, Caricom, Comunidade Andina e Mercosul, é possível notar a existência de alguns padrões nos processos de integração regional da América Latina. A primeira característica comum é a percepção de que a integração regional é um mecanismo importante para inserção internacional desses países. Essa importância dada ao regionalismo nos processos de internacionalização dos países latino-americanos fica bastante evidente nos acordos-quadro dos quatro blocos. Em todos eles, os países membros manifestam a intenção de aprofundar os processos de integração, criando mecanismos que vão além da livre circulação bens, como por exemplo o comércio regional de serviços, tratamento preferencial para investimentos, propriedade intelectual, livre circulação de trabalhadores e de capitais, políticas da concorrência comuns, convergência macroeconômica, mecanismos de consulta e cooperação, etc. Porém, o quanto cada um desses blocos efetivamente conseguiu avançar nos diferentes temas – assim como o modelo, o alcance e o formato da integração - varia bastante, como observou-se acima. Mesmo em relação ao comércio regional de bens, percebe-se diferentes graus de aprofundamento nos quatro blocos regionais latino-americanos. Enquanto os países do Mercosul, MCCA e Caricom ainda recorrem a mecanismos de listas de exceções, sobretudo para não minar o apoio político interno ao processo de integração, a CAN conseguiu avançar mais no objetivo de assegurar o livre comércio regional. Em relação ao comércio internacional de serviços e investimentos, três dos quatro bloco apresentam em seus acordos-quadro a intenção de criar regras e regimes em âmbito regional. O único que não faz menção explícita à criação de um regime comum interno para serviços e investimentos é o MCCA, cuja agenda externa avançou bastante nessas questões sobretudo a partir do acordo recém-firmado com os EUA (Cafta), forçando a harmonização de regras entre os países centro-americanos. Tanto o Caricom como a CAN avançaram menos em relação a esses temas em suas agendas externas, mas criaram regras efetivas intra-regionais. É no Mercosul que se percebe o maior distanciamento entre as manifestações políticas dos países membros e a realidade. Apesar de terem assinado acordos específicos para serviços e investimentos (Protocolo de Montevidéu e Protocolo de Colônia, respectivamente), nenhum deles entrou em vigor, dada a não ratificação pelo legislativo brasileiro. Ainda que alguns dos blocos tenham avançado significativamente na agenda externa dos chamados “novíssimos temas” como propriedade intelectual, compras governamentais, política da concorrência, cláusulas ambientais e trabalhistas, entre outros (mais uma vez o melhor exemplo é o Cafta), nenhum dos processos de integração regional latino-americano criou regras específicas para esses temas, ainda que em todos os acordos-quadro dos blocos regionais existam cláusulas específicas manifestando a intenção das partes em aprofundar as regras regionais para os “novíssimos temas”. A segunda característica comum aos quatro blocos regionais latino-americanos deriva diretamente da primeira característica (opção de internacionalização por meio de acordos regionais). Ainda que seguindo estratégias diferentes, todos os blocos avançaram

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bastante na agenda externa regional. Como foi mencionado acima, em alguns casos, essa agenda externa serviu como motor de propulsão para a criação de regras intra-regionais. A agenda externa dos blocos regionais latino-americanos pode ser subdividida em três categorias:

1. Acordos de livre comércio abrangentes e vinculantes 2. Acordos de livre comércio para bens 3. Acordos de escopo parcial

A primeira categoria de acordos segue basicamente o formato do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta) entre o México, Canadá e Estados Unidos. Quase todos os acordos assinados entre os blocos regionais (ou seus países membros) com o Chile e com o México seguem esse padrão. Além de desgravar todo o universo tarifário para bens industriais e, em menor medida, bens agrícolas, o modelo Nafta de acordos cria regras vinculantes para o comércio internacional de todas as categorias de serviços, inclusive serviços financeiros e telecomunicações. Cria também regimes específicos para investimentos, compras governamentais, propriedade intelectual e outros temas. Em alguns casos, são estabelecidos inclusive mecanismos de solução de controvérsias com a cláusula investidor-Estado, permitindo que empresas contestem a prática comercial dos governos (federais e estaduais). Os únicos acordos do México e do Chile que fogem desse padrão são justamente os acordos assinados com o Mercosul (ou com o Brasil individualmente). A segunda categoria listada é justamente o formato de acordo que o Mercosul busca negociar em sua agenda externa. Com algumas exceções, as partes se comprometem em desgravar as tarifas para o comércio de todos os bens industriais e agrícolas. Ainda que alguns acordos manifestem a intenção das partes em aprofundar os entendimentos sobre o comércio internacional de serviços e investimentos (em alguns casos também de propriedade intelectual, compras governamentais e política da concorrência), não são criadas regras efetivas com esse objetivo. Os acordos Mercosul-CAN e Mercosul-Chile são os melhores exemplos dessa categoria de acordos. Os acordos de alcance parcial podem ser classificados como uma terceira categoria de acordos na agenda externa dos blocos regionais latino-americanos. A maior parte desses acordos foi assinada bilateralmente pelos países membros dos blocos regionais ao longo da década de 1980, no âmbito da Aladi, sendo incorporados à lógica regional durante os anos 1990. Neste caso, os países membros se comprometem a oferecer margens de preferência tarifárias (na maior parte das vezes de 100%) para uma cesta de produtos. Frequentemente são feitas revisões para adicionar outras linhas tarifárias aos acordos. É por meio de acordos com essas características que o Mercosul, por exemplo, vem estreitando os laços comerciais com países em desenvolvimento.

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Além de já ter assinado acordos-quadros com a Índia e com o Egito, o Mercosul negocia margens tarifárias preferenciais com a África do Sul e Marrocos. Ao contrário do Mercosul, os demais blocos da região vêm procurando negociar acordos mais abrangentes nos últimos anos. Percebe-se que todos estes acordos partem da premissa de que a integração deve estar ancorada nas especializações produtivas dos vários países, sendo mediada pelos mercados, ou seja, através da ampliação do comércio e do investimento entre atores privados. Se for verdade, portanto, que os acordos de livre-comércio abrangentes e vinculantes seguem o padrão Nafta, enquanto os acordos de livre-comércio de bens e os acordos de escopo parcial buscam aprofundar a dimensão do mercado sub-regional, com propósitos específicos e muitas vezes se distanciando das motivações norte-americanas; todos eles se referem a uma “família” de acordos, que se diferenciam pelo seu escopo, alcance e natureza daquilo que é proposto no âmbito da Alba.

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2.7 Outras Iniciativas de Integração Sul-Americana Nos últimos anos, frente às dificuldades encontradas pelo Mercosul em cumprir seus objetivos institucionais e econômicos, e num contexto de ofensiva da proposta da Alca, voltaram-se as atenções para a perspectiva política da integração regional e a necessidade de estender o acordo de modo a compreender toda a América do Sul. Volta-se a discutir um possível revigoramento da integração regional, por meio da construção de um espaço supranacional, permitindo uma estratégia mais qualificada de inserção global dos países sul-americanos. Interessa, sobretudo, ilustrar o contraponto entre as tendências à regionalização em termos de livre comércio e a perspectiva de uma integração fundamentada em alicerces sócio-políticos mais sólidos. É necessário observar que as iniciativas regionais mais extensas podem combinar políticas macro-econômicas conjuntas com uma inclinação para a justiça e as questões sociais. Entretanto, se não se logram mudanças nas prioridades macroeconômicas, e as iniciativas sub-regionais não ganham em profundidade, a região pode ficar congelada nos atuais acordos de livre-comércio, torna-se mais poderosas as forças políticas regionais pró-Alca. 2.7.1 Iniciativa para Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana (IIRSA) A Iniciativa para Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana (IIRSA), resultado da primeira reunião de Presidentes da América do Sul, realizada em Brasília em 2000, possui o intento de unir fisicamente o continente, com projetos de infra-estrutura nas áreas de transportes, energia e comunicações. Seu principal objetivo é fomentar o crescimento econômico sustentável e o desenvolvimento social. Entre seus objetivos específicos está à dinamização do comércio bilateral, o estímulo ao desenvolvimento das regiões fronteiriças e o apoio à consolidação de cadeias produtivas, a fim de gerar competitividade nos grandes mercados mundiais por meio da criação de uma plataforma logística articulada.

Participam desta iniciativa 12 governos sul-americanos com o apoio técnico de três organizações internacionais multilaterais incumbidas de mobilizar financiamento para tal empreitada: Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Corporação Andina de Fomento (CAF) e Fundo Financeiro para Desenvolvimento da Bacia do Prata (Fonplata).

Nos últimos anos, mais de 335 projetos, agrupados em 40 grupos de projetos, com um montante total estimado em US$ 37 bilhões foram acordados. Seu rol de atuação é pautado por 10 eixos de integração e desenvolvimento definidos conforme os fluxos atuais e potenciais de concentração econômica. Outro foco está voltado para a superação dos gargalos reguladores, operacionais e institucionais que impedem a efetiva integração física.

No caso do Brasil, medidas para implementar a integração de infra-estrutura física vêm sendo realizadas desde o primeiro Plano Plurianual do governo Fernando Henrique, mantendo-se no atual governo.

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Assumindo a posição de líder regional para a efetivação da IIRSA, o interesse do Brasil na proposta da IIRSA tem sido explícito; tanto que, além das três instituições internacionais de financiamento, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também está crescentemente envolvido no financiamento destes projetos integracionistas.

Outro ponto digno de menção nesse programa é a expressiva participação reservada à iniciativa privada, em particular como fonte de financiamento, tomador de risco e gerenciador de várias de suas etapas. Embora não exclusivamente, passa a ser reservado ao Estado o papel de responsável pelas ações regulatórias e de planificação dos projetos. Sua participação direta no investimento, gestão e operação dos vários projetos estaria condicionada à necessidade de tornar viáveis empreendimentos. Parte-se do pressuposto que, de outra forma, os mesmos não seriam assumidos pelas empresas privadas.

A crítica a esta iniciativa é a de que estaria voltada para reforçar a integração de mercado, não priorizaria necessariamente o capital nacional, e permitindo o maior entrelaçamento entre capitais e fluxos de comércio de multinacionais, chancelando a opção pela Alca, ao invés de se contrapor a ela.

O projeto IIRSA sofre pois uma disputa de hegemonia, podendo dar vazão a várias modalidades de integração, o que depende da forma com que seja arquitetado e executado.

2.7.2 Comunidade Sul-Americana de Nações A concepção da Comunidade Sul-Americana de Nações, que une Mercosul, Comunidade Andina e o Chile, surge como opção para aprofundar a integração da economia regional, elevando o poder de barganha nas arenas hemisférica e internacional. Lançada em 9 de dezembro de 2004, dentro da III Reunião de Presidentes da América do Sul, na cidade de Cuzco, reúne os 12 países desta região e agrega recursos (PIB) contabilizados em US$ 1 trilhão de dólares. O estímulo ao fortalecimento democrático e aperfeiçoamento das instituições regionais; bem como o desenvolvimento de uma infra-estrutura física, em concomitância com o incremento dos fluxos comerciais seriam pressupostos traçados pela Comunidade Sul-Americana das Nações como linha principal para aprofundar a integração da América do Sul. No momento de sua criação, foram assinados 31 projetos de infra-estrutura para a região, propondo-se desta forma a concretizar a agenda estratégica da integração física e energética originária da Iniciativa para a Integração Regional Sul-Americana - IIRSA. Temas do desenvolvimento econômico e social da região como “as condições de segurança cidadã”; “o trabalho digno” e “o fenômeno migratório” estão previstos para serem abordados num conjunto de conferências a serem realizadas ao longo de 2005. Cabe ressaltar aqui o vetor político desta iniciativa, na qual se busca forjar uma identidade sul-americana e valores comuns no sentido de consolidar um bloco continental. Contudo,

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há que se atentar para a demanda de ações concretas e a real capacidade de viabilização desta possível união política. Tal como no caso da IIRSA, contudo, ainda não está claro o papel a ser jogado pela Comunidade Sul-Americana na geopolítica da integração regional. O seu lançamento causou certo temor, junto à diplomacia mexicana, de que seria mais uma iniciativa promovida pela “liderança” brasileira. Também o governo argentino tem se posicionado de forma reticente em relação a este projeto. Já o governo venezuelano tenta alterar o sentido da Comunidade, utilizando-a como um espaço para uma posição anti-“imperialista”. Tudo leva a crer que o seu desenlace dependerá do avanço das propostas de integração sub-regional, da expansão ou não de acordos de livre-comércio no modelo Nafta e da pugna entre forças políticas regionais, advogando cada qual o seu modelo mais viável de integração sul-americana. No presente momento, qualquer análise precipitada tende a ser superada por fatos novos, provenientes de um quebra-cabeça de acordos regionais ainda não plenamente decifrado, das condições macroeconômicas instáveis dos seus países, e, não menos importante, do desenlace político-eleitoral em algumas das nações que compõem a Comunidade nos próximos anos. 3. Análise do Documento da Aliança Social Continental e Contraste com o “Processo Real” de Integração Neste tópico, serão analisados, em primeiro lugar, os principais elementos que embasam a visão da Aliança Social Continental (ASC) sobre a integração no continente americano. Para realizar esta “análise”, se tomará por base dois documentos2 elaborados pela própria

2 Alternativa para las Américas, dezembro de 2002; e Nuestra Propuesta: Una Nueva Sociedad y un Nuevo

Mundo, maio de 2005.

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Aliança, os quais funcionam como uma declaração de princípios acordada entre um conjunto de movimentos sociais e intelectuais do continente. Em segundo lugar, se buscará contrastar estes princípios norteadores da ASC com as propostas concretas de integração, que vêm conformando uma nova realidade social e econômica para a região, a partir dos anos noventa, com o intuito de averiguar as contradições e complementaridades existentes entre estes dois mundos: o da integração real e o de uma proposta mais global de desenvolvimento, que estabelece condicionantes sociais e humanos para a integração econômica. 3.1 A Visão da Aliança Social Continental A característica central da proposta da Aliança está na refutação do modelo neoliberal de organização econômica e social, que, no entender dos seus membros, embasa boa parte dos acordos recentes de integração comercial e econômica entre os países. Realiza-se, simultaneamente, uma crítica mais ampla às políticas econômicas liberalizantes – predominantes com diversos graus e matizes em quase todos os países do continente – ainda que não se proponha esta entidade a desenvolver uma análise localizada e factual das características e impactos das mesmas. Parte-se do pressuposto que uma outra integração exige, além de uma revisão drástica dos princípios que regem a globalização indiscriminada, novos compromissos econômicos e sociais em âmbito nacional. O fortalecimento do mercado interno e ativação de políticas sociais consistentes, e tendendo à universalização, são encarados como condições para se discutir novas modalidades de integração. Neste sentido, o marco internacional - que aparece na visão hegemônica como saída inevitável e irreversível para a inserção econômica de países que não criaram parques industriais diversificados - assume um papel quase oposto na visão da Aliança: o de não criar constrangimentos para que se acionem políticas nacionais de desenvolvimento. O tipo de integração internacional promovido nos anos noventa teria, ao contrário, contribuído para deteriorar ainda mais os indicadores econômicos, sociais e ambientais destes países. O papel dos EUA na região é severamente questionado, não apenas por questões de assimetrias estruturais, mas essencialmente por sua política consciente de dominação por meio da generalização de tratados de livre-comércio. Como decorrência, critica-se todo e qualquer acordo assinado com esta potência. Ressalva-se ainda que outras potências e mesmo os países da região têm buscado implementar projetos de integração pautados pelos mesmos princípios ditos neoliberais. A proposta da ASC procura polarizar com as iniciativas que vêm predominando no continente americano nos últimos vinte anos. Ao contrário destas, que se caracterizariam pela lógica da competitividade, a Aliança opta pela lógica da cooperação. Na visão desta entidade, deve-se inverter a atual lógica que subordina a questão social ao comportamento de várias econômicas, como comércio e investimentos. Ao contrário, os investimentos e a expansão do comércio devem estar respaldados em processos de dinamização do mercado interno, distribuição de renda e preservação dos direitos humanos e ambientais.

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Mas aí voltamos ao ponto de partida: a necessidade de um novo modelo econômico, de Estado e de sociedade, que serve como premissa para um possível novo modelo de integração. Em nenhum momento, ao longo dos documentos aqui discutidos, se avalia como seria uma transição entre o modelo proposto e o vigente, até porque ambos assumem princípios profundamente diferentes, e até opostos, dificultando uma saída pela complementaridade. Ao final do documento mais sintético, de maio de 2005, a lógica alternativa, proposta pela Aliança, torna-se mais explícita, sendo possível se chegar a uma delimitação do que se entende por um projeto integracionista solidário e alternativo. Defende-se fundamentalmente a assinatura de acordos preferenciais que levem em consideração as desigualdades sociais e econômicas entre os países – não devendo ser estes necessariamente recíprocos. Estimulam-se ainda iniciativas tais como acordos de cooperação científica e técnica e de desenvolvimento industrial, implementadas ao nível setorial. Quando se analisa a integração no setor de serviços, ou tópicos cada vez mais importantes para os organismos multilaterais - tais como a políticas de compras governamentais e os acordos de proteção à propriedade intelectual - a Aliança assume uma postura crítica, buscando retirar estes temas de todo e qualquer acordo internacional. Trata-se de um “recuo” tático, já que no entender da entidade, tende a predominar, na maioria dos fóruns multilaterais, a visão das empresas multinacionais. Ressalve-se que este questionamento não significa tão-somente uma crítica econômica - que aponta para as diferenças de poder de mercado e para a necessidade de uma política econômica que estabeleça vantagens fiscais, de acesso ao crédito e às licitações públicas para as pequenas empresas de capital nacional ou cooperativas e empresas auto-gestionárias. Mas também uma crítica cultural, já que a tendência da padronização do consumo tenderia a “soterrar” as várias identidades latino-americanas. No que diz respeito ao setor serviços – especialmente em “áreas como educação e saúde ou de utilidade pública, tais como energia, água e outros” – deve-se buscar antes o acesso universal do que a eficiência econômica. São encarados estes serviços como monopólio natural, não devendo ser permitida a sua abertura para investimentos de capitais estrangeiros, por meio de processos de privatização. No caso da educação, por exemplo, o monopólio público está relacionado à formação da cultura e da identidade nacionais. A questão da propriedade intelectual aparece sob duas óticas. Em primeiro lugar, as regras definidas devem levar em consideração “os contextos sociais, culturais e econômicos específicos”, o que abre a possibilidade para quebra de patentes em casos de abuso do poder econômico dos grandes grupos multinacionais. Em segundo lugar, defende-se a proteção da biodiversidade, dos saberes indígena e das comunidades tradicionais. Quanto ao tema agrícola - um dos mais “espinhosos” no quadro das negociações internacionais recentes – a posição da Aliança pode ser resumida da seguinte maneira: defendem-se mecanismos que impeçam a deterioração dos preços das matérias-primas no mercado internacional, mas critica-se a concessão de subsídios agrícolas para os exportadores. O princípio norteador é o de que “a agricultura de exportação não pode

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ameaçar a segurança alimentar de um país. Paralelamente, devem ser estimulados processos de reforma agrária articulados a mecanismos específicos de crédito, assistência técnica, subsídios e isenção fiscal para os pequenos produtores. Questiona-se ainda a elaboração de padrões sanitários vinculados a tecnologias específicas (como transgênicos), devendo ser os mesmos discutidos com a presença de grupos sociais, além de promover a defesa da saúde e do meio ambiente. Ainda que não seja objeto de avaliação rigorosa dos textos analisados, depreende-se pelo que foi mencionado até agora que a Aliança defende a necessidade de uma revisão drástica dos princípios norteadores das atuais instituições multilaterais – FMI, Banco Mundial e OMC – e do sistema ONU; além da criação de fundos internacionais voltados para a educação, saúde e habitação e financiados com a taxação das transações financeiras internacionais. O documento de maio de 2005 atesta que não se propõe “um Estado protecionista tradicional, mas um Estado socialmente responsável, capaz de promover um projeto de desenvolvimento sustentável definido democraticamente”. O mercado interno ocupa aqui um papel de destaque, não devendo ser enfraquecido para permitir especializações produtivas típicas dos tratados de livre-comércio. Quanto aos acordos internacionais, estes devem ser ratificados em consulta direta à população – sem o que se afiguram como ilegítimos. Paralelamente, torna-se fundamental que sejam acompanhados por mecanismos de solução de disputas e de parâmetros que permitam comprovar a redução das desigualdades. Fica clara a recusa em se admitir mecanismos jurídicos, por pressão externa, que visem ao cumprimento dos acordos de integração, como é o caso das cláusulas social e ambiental. Cabe aos governos nacionais estabelecer o marco jurídico para o respeito aos direitos fundamentais e ambientais. O não-cumprimento dos dispositivos pode levar a uma negação dos benefícios para os violadores, por meio de processos públicos e transparentes, com a participação da sociedade civil. Desta forma, afirma-se a precedência da soberania nacional, chancelada pela participação da sociedade civil. As propostas de integração não podem e não devem, segundo a visão da ASC, promover uma cessão da soberania nacional; mas antes fortalecê-la por meio de acordos internacionais que estimulem a sua afirmação. 3.2 O Contraste com a Integração de Mercado No documento da Aliança, de dezembro de 2002, são realizadas algumas afirmações que permitem qualificar a possibilidade de se conciliar os seus princípios com os processos de integração regional em curso, comandados pela lógica do mercado. Vejamos algumas delas: “trabalharemos para impedir a aprovação de qualquer acordo elaborado segundo estas linhas. Vemos a derrota dos acordos de livre-comércio apenas como o primeiro passo”. Mais adiante, lê-se: “estamos convencidos de que a incorporação de um ou mais elementos no âmbito da Alca ou outro acordo comercial não resolveria os problemas essenciais do livre-comércio”.

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Admite-se, de um lado, que não há margem para reformar os acordos existentes. Por outro lado, a sua erradicação não é suficiente, sendo necessária a elaboração de alternativas concretas de integração. Procuraremos em seguida, de forma sucinta, desenvolver dois pontos complementares. Primeiramente, em que medida é possível “derrotar” os acordos de livre-comércio vigentes? Em segundo lugar, quais são as alternativas disponíveis se partirmos dos princípios estabelecidos de forma consensual pela Aliança? Como foi visto no segundo tópico do presente trabalho, a prorrogação das negociações no âmbito da Alca, sem prazo definido, não tem levado a um recuo no processo de expansão dos acordos regionais (intra e extra-bloco) hoje vigentes. Antes pelo contrário. Percebe-se uma efervescência negociadora em termos regionais, ainda que os blocos possuam diferenças entre si, além de divergências quanto à avaliação dos impactos decorrentes da assinatura de acordos que siga as linhas gerais do modelo Nafta. Em síntese, a provisória derrota do projeto Alca acabou por gerar uma ampliação das negociações entre os blocos regionais, ao mesmo tempo em que conferiu certo “tempo” para que possam se consolidar enquanto projetos internos de integração. Entretanto, como o caso do Mercosul revela de forma exemplar, o arrefecimento da Alca não significa necessariamente aprofundamento da integração regional, já que esta depende das condições macroeconômicas de seus países, mas também da disposição dos mesmos em construir marcos institucionais comuns minimamente consistentes e sólidos. Por outro lado, e na medida em que se assume que estes acordos regionais adotam uma integração de mercado, não sendo possível “melhorá-los” ou reformá-los, a adoção de uma alternativa integracionista depende da alteração substancial dos pressupostos que regem as políticas econômicas e sociais dos países da região. Esta transformação por sua vez exige uma nova correlação de forças políticas, capaz de gerir uma contra-hegemonia no âmbito de cada nação, que futuramente “contaminaria” a própria concepção e formato dos acordos regionais, levando a uma materialização das propostas da Alba num espaço geográfico ampliado. Donde se avalia que a expansão da Alba ou a gestação de uma integração nos moldes da proposta pela Aliança Social Continental depende de mudanças sócio-políticas, as quais deveriam atingir um conjunto de países da região. Estes seriam então capazes de engendrar uma nova modalidade de integração, comandada pelo Estado, onde o mercado atuaria apenas em função de objetivos prioritariamente políticos, e não mais como a premissa básica da integração. Ainda assim, tal movimento não parece ser extraído da realidade latino-americana da primeira década do século XXI. Se, de um lado, as políticas neoliberais não gozam do mesmo apreço que tinham no início dos anos noventa, as forças sociais e políticas alinhadas com a esquerda – que, em alguns países, têm inclusive assumido o poder – não parecem estar dispostas a romper com o atual modelo de integração internacional, e

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nem de realizar profundas mudanças nas linhas gerais da política econômica ou reformas radicais no âmbito das políticas públicas e sociais.

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