integração regional africa adelinotorres
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Coleco Documentos de Trabalho n 26
Adelino Torres
Integrao regional em frica e multilateralismo:Integrao regional versus GATT?
Lisboa
1993
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CEsA Centro de Estudos sobre frica e do Desenvolvimento
Instituto Superior de Economia e Gesto da Universidade Tcnica de Lisboa
Os trabalhos reproduzidos nesta
srie so da exclusiva
responsabilidade dos seus
autores.
O CEsA no confirma nem infirma
quaisquer opinies neles
expressas.
O presente texto foi apresentado como comunicao ao I Encontro de
Economistas de Lngua Portuguesa, realizado na Faculdade de Economia da
Universidade do Porto entre 5 e 8 de Abril de 1993.
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INTEGRAO REGIONAL EM FRICA E MULTILATERALISMO: Integrao Regional
v rsus
GATT?
Adelino Torres1
A integrao regional em frica e a insero das economias africanas no
espao global pela via do multilateralismo constituem questes centrais para o
continente africano.
Porm, o processo de integrao regional2, iniciado em frica h cerca de
duas dcadas, tem-se mostrado decepcionante apesar de alguns progressos
pontuais (modestos) ao nvel da CEAO, ao mesmo tempo que a parte das
exportaes africanas nas exportaes mundiais tem vindo a decrescer, com a
consequente marginalizao do continente na economia internacional.
Muitos autores viraram-se ento para a alternativa proposta pela teoria
neoclssica e seu paradigma da extroverso. Todavia, no que se refere aos pases
africanos, esta opo comporta insuficincias tericas e, a curto e mdio prazos,
impossibilidades prticas que no parecem responder situao que o continenteatravessa, independentemente de ser ou no a mais desejvel.
O modelo sofreu entretanto uma eroso, e em diversas partes do mundo
anos regista-se, nos ltimos anos, um novo interesse pela regionalizao, sob as
suas diferentes formas, da "Zona de Comrcio Preferencial" "Unio Econmica" (ver
ilustrao grfica). Na Europa, no continente americano, na sia e na frica as
zonas preferenciais concentram as atenes dos homens polticos (Mercado nico,
NAFTA, Mercosur, transformao da SADCC em SADC, etc).
Face s dificuldades do Uruguay Round e s actuais insuficincias do GATT,
o recrudescer das reas regionais preferenciais pode ter trs resultados:
a) ou estas actuam como plataformas de reestruturao regional dando
tempo ao GATT para encontrar solues adequadas disparidade das
situaes, implementando, numa fase posterior, um multilateralismo
que d resposta aos problemas de mundializao das economias;
1 Universidade Tcnica de Lisboa/ISEG. Investigador do CEsA Centro de Estudos sobre frica e doDesenvolvimento (ISEG)2Neste trabalho empregamos indiferentemente as expresses "zonas preferenciais" ou "zonas de integrao"
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UNIES ADUANEIRAS
1 )
PREFERENTIAL TRADING CLUB
2 ) FREE-TRADE AREA OU ASSOCIATION)
3 )
CUSTOMS UNION
4 ) COMMON MA RKE T ECO NOM IC UNI ON
5 ) ECONOMIC UNION
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b)ou a consolidao dessas zonas ameaa constituir um passo irreversvel
para novos proteccionismos que no excluem guerras comerciais, com gravosas
consequncias para a economia mundial;
c)ou a frica se insere, a pouco e pouco, num vasto esquema de "integrao
vertical" conjuntamente com a Comunidade Europeia (CE), a exemplo do que foi
proposto pelo Governo Francs em 1991 para a Frana e pases da Zona Franco,
mas numa perspectiva mais alargada, quer dizer, uma integrao que inclua no
apenas aquele pas europeu e as naes francfonas do continente, mas o
conjunto da CE e dos pases da frica Ocidental e Austral numa primeira fase, e da
frica Central e Oriental numa segunda fase. Os pases mediterrnicos da frica do
Norte poderiam ser includos nesta integrao vertical euro-africana embora,
devido s especificidades da regio, este processo devesse ser estudado
separadamente.
Defendemos, antes de mais, neste texto que o continente africano dever
reforar a vertente da integrao regional, sem nunca perder de vista a sua
incluso nas correntes comerciais da economia mundial. A regionalizao aparece
desta maneira como um meio transitrio, uma fase preparatria durante a qual as
economias africanas devero operar transformaes radicais, quer no plano
econmico quer no plano poltico. A integrao regional uma condio sine quanon do desenvolvimento africano, mas tudo leva a crer que se trata de uma
condio insuficiente a mdio e longo prazos.
A hiptese da "integrao vertical" supracitada na alnea c), parece-nos
particularmente estimulante, mas faltam ainda os estudos econmicos que a
fundamentem. Porm, h razes para pensar que o entrave fundamental ser
essencialmente poltico.
O texto evoca apenas algumas das questes que esto na base dos debates
entre o multilateralismo e a integrao regional. Para alm das dicotomias reais ou
aparentes, as eventuais solues tericas e prticas apresentam um grau de
complementaridade que merece ser aprofundado, no apenas ao nvel das
medidas tcnicas indispensveis mas sobretudo no plano dos conceitos inscritos
na teoria do conhecimento que lhes serve de referncia.
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Do fim da segunda guerra mundial at aos anos 80, os homens polticos
admitiam que, no plano internacional, os acordos regionais completavam as
negociaes multilaterais no quadro do GATT3, no havendo, na prtica,
contradio entre as duas vias4.
Ultimamente a Europa deu passos em frente tanto na sua integrao
econmica e monetria como poltica e social, o que no prejudicou as relaes
econmicas com o resto do mundo. Este registou igualmente uma forte expanso
em grande parte conseguida pelo abaixamento das tarifas aduaneiras resultante
das negociaes no GATT.
QUADRO 1
Comrcio intra-regional
em percentagem do total das exportaes
ZONAS DE INTEGRAO 1960 1987
Comunidade Econmica Europeia (CEE) 34,6 58,8
Unio Aduaneira e Econmica da frica Central (UDEAC) 1,6 0,9
Comunidade Econmica da frica Ocidental (CEAO) 2,0 7,7
Comunidade Econmica dos Estados da frica Ocidental (CEDEAO) 1,2 5,5
Comunidade Econmica dos Pases dos Grandes Lagos (CEPGL) 0,0 -
Unio Mano River (UMR) 0,0 -
FONTE: BANCO MUNDIAL, World Development Report 1991
Por seu turno, o continente africano enveredou desde os anos 70 pelas
chamadas "Comunidades Econmicas", com a criao da CEAO e CEDEAO na frica
ocidental e a formao de outros agrupamentos com objectivos similares5. Mas, no
essencial a integrao proclamada no teve efeitos significativos apesar de
algumas realizaes pontuais e limitadas, nomeadamente na CEAO. O comrcio
3KRUGMAN 19924Alis deve dizer-se que a prpria teoria do comrcio internacional no constituiu, durante muito tempo, uma prioridade querpara os homens polticos quer para os economistas tericos.Joo Dias, num trabalho recente, refere essa questo: "Embora grande parte dos economistas veja no comrcio externo, e emparticular nas exportaes, um instrumento indispensvel ao desenvolvimento econmico, o campo da teoria do comrciointernacional tem sido objecto das posies mais dispares, nomeadamente quanto sua relevncia e s vantagens deladecorrentes. Por exemplo, Keynes no lhe atribui particular importncia e autores como Raoul Prebisch e Gunnar Myrdalcontestam mesmo que dele decorra efeitos benficos". Cf. DIAS 1992, p. 178. Ver igualmente Manuel Carlos Lopes Porto,
Lies de Teoria da Integrao e Polticas Comunitrias,Coimbra, Almedina, 1Bvol. 1991, 233 p.5Para j no falar do agrupamento regional constitudo pelo Qunia, Uganda e Tanznia, na frica oriental, prematuramentedissolvido.
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intra-regional africano mantem-se a um nvel modesto, no tendo registado
melhorias nas ltimas trs dcadas (v. quadro 1).
No plano mundial, a partir dos anos 80 as duas vias comearam a divergir.
Por um lado assistiu-se extenso dos blocos comerciais regionais. Por outro, o
GATT, especialmente depois das negociaes do Uruguay Round iniciado em 1986,
viu avolumarem-se os obstculos obteno de consensos entre as chamadas
Partes Contratantes. Em grande parte, diga-se, devido ambio e complexidade
dos dossiers que se props tratar.
Osblocos regionais
parecem afirmar-se. A CEE transforma-se no Mercado
nico, os Estados-Unidos, o Canad e o Mxico assinam o Acordo de Comrcio
Livre Norte-Americano, o Japo estende os seus investimentos e influncia na sia,
com probabilidades de favorecer o rpido nascimento de uma nova zona de
comrcio preferencial neste continente6, a Amrica Latina reformula as zonas de
integrao (MERCOSUR, por exemplo) e a frica rev com um entusiasmo renovado
(pelo menos ao nvel das intenes proclamadas) os problemas de integrao das
suas "Comunidades Econmicas".
Ao mesmo tempo, omultilateralismo
encontra dificuldades cada vez maiores.
O Uruguay Round, que deveria estar concludo em 1990, continua paralisado sem
encontrar respostas compatveis com o ambicioso programa que o GATT se tinhafixado7.
O resultado um aumento do proteccionismo em todo o mundo, o qual
coloca problemas preocupantes para a economia mundial8.
Paul Krugman9pe justamente em relevo o contraste entre o sucesso dos
acordos regionais (pelo menos na Europa e na Amrica do Norte) e o relativo
fracasso a que estamos a assistir nas tentativas de prosseguir e consolidar a
liberalizao do comrcio escala mundial. Tudo se passa, com efeito, como se
muitos dos homens polticos do Ocidente tivessem j perdido as esperanas nos
progressos do multateralismo no quadro do GATT e preferissem consagrar os seus
esforos s negociaes regionais e bilaterais. Note-se, de passagem, que no de
excluir que esse movimento traduza, pelo menos at certo ponto, uma reaco
6SCHLOSSSTEIN 19927CASTRO 19918V. por exemplo, para alm das publicaes do Banco Mundial, FMI e OCDE: TAMAMES 1991, BAGHWATI1991, CHALMIN1992...9KRUGMAN 1992
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perante os problemas novos - como os dossiers sobre os servios ou a propriedade
intelectual - que requerem solues inovadoras e consensos difceis de encontrar.
H quem entenda que o prosseguimento do multateralismo , em
definitivo, mais importante, e receie que os acordos regionais venham
comprometer um processo de liberalizao, considerado como a garantia mais
coerente da solidariedade que dever nascer da interdependncia e da
mundializao das economias.
Tendo em conta a realidade africana, a nossa hiptese que no existe
incompatibilidade, antes complementaridade, entre as duas estratgias desde que
a integrao regional no seja vista como um fim em si, mas como uma etapa de
transio para um multateralismo pleno. Por outras palavras, a integrao
regional em frica uma necessidade urgente, entre outros motivos devido
exiguidade dos mercados nacionais e porque urgente ultrapassar a actual no
complementaridade entre as economias. A proximidade geogrfica dos pases a
norte e a sul do Sanara inseridos nas diversas zonas j formalmente constitudas
um argumento suplementar em favor dessa orientao.
O problema no , portanto, de saber se os pases africanos se devem
empenhar exclusivamente numa integrao regional, ou se prefervel abandonar
esse projecto e preparar-se to somente para afrontar sem transio aconcorrncia internacional.
No se trata da dicotomia simplista: introverso versus extroverso. Posta
nesses termas, a escolha radical e exclusiva de uma dessas vias no teria sentido.
Alis o prprio GATT, no seu artigo 24, reconhece h muito o interesse de
uma integrao mais estreita das economias nacionais e permite que os
agrupamentos regionais tenham acesso regra geral de tratamento da NMF,
impondo apenas, como nica condio, que tais acordos, ao facilitarem o comrcio
entre os pauses interessados, no criem obstculos ao comrcio com os restantes
pases.
Admitimos que h compatibilidade entre a constituio de zonas de
comrcio preferencial em frica e a insero destes pases na economia mundial
multilateral, desde que o primeiro movimento seja entendido como uma etapa na
preparao das economias africanas para melhor enfrentar as condies deste
ltimo contexto.
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Do ponto de vista metodolgico, o problema assemelha-se de certa forma
ao das estratgias de industrializao dos anos 60-70. No essencial, a escolha dos
pases africanos fora ento para uma estratgia de "substituo das importaes", a
qual, levada s ltimas consequncias, acabou por se revelar desajustada. A
desiluso da resultante contribuiu parao descrdito da poltica de substituio de
importaes, mas essa reaco foi, a nosso ver, igualmente excessiva.
Com efeito, o que est em causa no a "substituio de importaes"10em si,
mas o facto de esta ter sido vista como umfim
(perspectiva pouco realista, ponto
de partida virtual de determinismos ideolgicos) e no como ummeio
meramente
transitrio (viso pragmtica ao mesmo tempo que coerente com os pressupostos
da teoria), antes de passar to rapidamente quanto possvel, para uma "estratgia
de promoo de exportaes"11.
Foi o procedimento dos pases asiticos12.
Quanto hiptese daintegrao vertical,
associando a Comunidade
Europeia e o continente africano, ela tem como ponto de partida a aprovao, em
1991, entre o governo francs e os pases da Zona Franco, da ideia de
transformao da Zona Franco numa verdadeira Unio Econmica e Monetria e
num grande Mercado nico.E. Berg nota que, por razes que lhe escapam, esta ideia no reteve ainda a
ateno da imprensa mundial apesar de se tratar de uma verdadeira viragem em
relao as propostas anteriores e de ser uma opo particularmente original13.
As grandes linhas dessa proposta so:
A)Transformar progressivamente a unio monetria (Zona Franco) numa
verdadeira Comunidade Econmica;
B)Instalar um Mercado nico, mas no atravs da liberalizao do
comrcio interno e da criao de tarifas exteriores comuns: esse processo revelou-
se demasiado violento para os Estados cujas receitas alfandegrias so uma das
principais fontes de rendimento.
10Ver DIAS 1992, pp. 179 e sgs11 V. por exemplo, CA. MICHALET, Le Dfi du Dveloppement Indpendant, Paris, Rochevignes, 1983, onde as vriasestratgias de industrializao so analisadas.12Pode consultar-se com proveito: Lus Soares de OLIVEIRA, Desenvolvimento Econmico Conseguido: o Modelo Sul-Coreano,Lisboa, Verbo, 1992,178 p.13Para mais pormenores ver BERG 1991 bem como: GU1LLAUMONT (P.et S.), "La Zone Franc un tournant: vers l'intgrationrgionale", Gopolitique Africaine (Paris), juillet/aout 1991; TRIBANDEAU (D.), "Faire de la Zone Franc une vritable Union",L'Argus,21 juin 1991.
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C)Na Zona Franco, os pases construiro a integrao econmica sobre as
bases da unidade monetria actual e devero: pr em prtica uma abordagem
regional para reabilitar os sistemas financeiros da frica ocidental; desenvolver
jurisprudncias, regulamentos e outras instituies comuns; coordenar os
problemas econmicos.
Vrios domnios de actividade foram sugeridos:
a)Reforma dos regulamentos e instituies nos Seguros, implicando uma lei
nica para o conjunto da Zona Franco e a criao de uma comisso de superviso;
b)Promulgao de um Direito modernizado e unificado no plano regional
para toda a Zona Franco, a comear pela UMOA;
c)Medidas para melhorar o sistema financeiro, encorajar a poupana e criar
um mercado financeiro regional mais consistente: reforma da Bolsa de Abidjan com
possibilidade de ser criada uma Bolsa Regional; emisso de instrumentos
financeiros libelados em Francos CFA; criao de Caixas de Aforro rurais; reforma
fiscal em matria de poupana (eliminao da dupla tributao, dedues na fonte,
etc).
d)Reforma da Segurana Social, com a criao de uma inspeco financeira
regional para vigiar a disciplina da gesto das Caixas.
e)
Criao de mecanismos financeiros e de servios comuns, de instnciasde controlo do sector pblico a nvel regional, (um Tribunal de Contas), de
organismos regionais de formao para a administrao econmica e de um
organismo regional de estatsticas e estudos econmicos.
Esta "integrao vertical" vista14 como uma nova maneira de abordar o
problema da cooperao econmica regional, muito diferente da "Integrao
horizontal" que se "limitava" a reunir Estados e agentes fisicamente prximos.
O mtodo francs visa instaurar laos mais estreitos entre um pas europeue os seus parceiros menos desenvolvidos da Africa, escreve E. Berg, considerando
que este projecto tem alguns trunfos: o sistema monetrio comum, o hbito da
cooperao econmica, a herana que todos partilham (lngua, instituies), um
problema que a reabilitao dos seus sistemas financeiros e o reforo dos
sistemas jurdicos e legislativos.
Todavia esta estratgia levanta incertezas e dvidas15:
14BERG 199115BERG 1991
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crescimento da economia mundial, embora os PED tenham deles beneficiado muito
menos do que inicialmente se esperava24.
Se assim fr, estaremos a assistir ao ressurgimento de um proteccionismo,
no j localizado ao nvel de cada pas, mas implantado em zonas geogrficas de
maior extenso? No sendo acautelados (a par dos interesses nacionais e
regionais) os grandes desgnios de solidariedade planetria implcitos no projecto
multilateralista, as consequncias desse proteccionismo podero ser gravosas, na
medida em que se quebraro sinergias da interdependncia global.
Redimensionados os espaos preferenciais, ver-se- surgir estrangulamentos
econmicos e linhas divisrias caracterstica de um neo-mercantilismo de mais
vastas repercusses do que o antigo mercantilismo do sculo XIX, gerador de
tenses e afrontamentos escala global.
, pois, urgente que o debate seja clarificado. Quer acerca das condies e
consequncias a que o novo proteccionismo poder conduzir, quer a propsito do
alcance e limitaes do liberalismo concebido pelos neoclssicos.
Uma outra interrogao tem a ver com a possibilidade de se obter uma
soluo "intermdia". Supondo que, evitando as solues extremas e conseguindo
os equilbrios suficientes, as duas vias, multateralismo e integrao regional, se
mantm paralelamente, ser possvel uma liberalizao a duas velocidades? E,nesse caso, poder-se- exigir que cada pas integrado numa zona preferencial
oferea a qualquer outro (do resto do mundo) as mesmas vantagens que
proporciona aos seus parceiros do agrupamento (KRUGMAN 1992)?
Estes enunciados justificam ateno.
Admitamos a hiptese que o mundo tanto mais prspero quanto maior for
a liberdade de comrcio multilateral. Admitamos ainda que, por definio, a criao
de uma zona de comrcio preferencial contraria o princpio da liberdade atrs
apontada.
Ser porm correcto concluir deste postulado, como fazem certos autores
liberais, que a criao de zonas preferenciais (grosso modo), inversamente
proporcional prosperidade do mundo?
Este raciocnio linear estabelece uma relao de causa a efeito que merece
discusso, apesar de o problema no ser novo.
24Ramon Tamames fala mesmo, a propsito dos pases em desenvolvimento que so membros do GATT, dos "convidados depedra"sem voz nem poder nesta instituio internacional (TAMAMES 1991)
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potenciais. Ademais, conveniente no esquecer que, em frica, o prprio
funcionamento de economias informais e de mercados paralelos que ignoram
fronteiras so tambm factores de "integrao"...
Um estudo relacionado com as "zonas naturais" sobre os pases do G7
mostrou que o comrcio entre os EUA e o Canad 13 vezes mais importante do
que se os pases no fossem vizinhos, e que as trocas entre 4 dos grandes pases
europeus 7 vezes mais importante do que seria se o elemento de proximidade
geogrfica no existisse (KRUGMAN 1992). Esses resultados, embora sejam
devidos em parte a acordos j em vigor, mostram tambm que a proximidade ainda
tem um grande papel.
Desta forma, o facto da geografia integrar de certo modo a faceta regional
nas trocas internacionais permite atenuar os receios de que os acordos
comunitrios conduzam necessariamente a uma situao do tipo "dilema do
prisioneiro", se, evidentemente, fizermos abstraco dos factores polticos cuja
imprevisibilidade pode dar origem a consequncias diferentes desta lgica (foi em
grande parte o caso da antiga Comunidade Econmica da frica de Leste).
Os factores polticos no podem portanto ser esquecidos. Muitos autores
consideram mesmo que a questo de saber se as zonas de integrao regional so
ou no desejveis mais poltica do que de anlise econmica (Krugman 1992),na medida em que esta acaba por no ser suficientemente conclusiva, espartilhada
que est entre vantagens e inconvenientes a nvel local e global. A verdadeira
objeco formao de entidades regionais de ordem poltica: " o receio que os
acordos regionais perturbem o equilbrio delicado dos interesses sobre os quais
baseado o GATT". Este pressuposto veicula implicitamente a ideia de que, ao
procurar maximizar a prosperidade nacional, tais acordos podem contrariar a
solidariedade e a prosperidade mundiais.
A hiptese tem fundamentos lgicos. porm de recear que no consiga
convencer os pases em desenvolvimento que menos tm beneficiado com o
multilateralismo preconizado pelo GATT, onde afinal continuam a ter uma influncia
reduzida.
A verdade que se tem assistido, nos ltimos anos, a uma eroso
progressiva do multilateralismo e consequente diminuio de eficcia do GATT. A
impossibilidade de concluir em 1990 o ciclo das negociaes do Uruguay Round
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ilustra, segundo o FMI, o peso da rigidez estrutural do sistema comercial
internacional32.
Vrios factores explicam essa situao33:
Antes de mais, o declnio da preeminncia dos Estados Unidos, cuja parte
do produto bruto mundial diminuiu, resultante da perda de produtividade e relativo
atraso tecnolgico em relao a certos pases asiticos e europeus. Os EUA
perderam assim a possibilidade de oferecer concesses que coincidiam com os
objectivos do GATT.
Outro elemento que tem a ver com a complexidade dos problemas a que o
GATT est confrontado, reside no facto de o simples controlo nas fronteiras j no
ser adequado s modernas negociaes comerciais. Por exemplo, a parte - muitas
vezes preponderante - de valor acrescentado intelectual nos produtos industriais
no se ajusta aos critrios tradicionais de medio previstos nas velhas pautas
aduaneiras, instrumento relativamente transparente e controlvel de regulao do
comrcio34; por sua vez, o peso frequentemente decisivo do investimento directo
torna difcil a distino entre poltica comercial (domnio prprio do GATT) e poltica
de investimentos (rea que no coberta pelo GATT); enfim, certas intervenes
governamentais na economia (mesmo em pases dirigidos por liberais e
conservadores) dificulta a distino entre polticas internas e polticasinternacionais.
Finalmente, o novo proteccionismo que despontou nos anos 70 afastou-se
de antigos mtodos (como os direitos alfandegrios, a contingentao ou o controlo
de cmbios) sendo, por consequncia, mais difcil de apreender. o que acontece
com as restrices "voluntrias" de exportao, os acordos de organizao de
mercados, os obstculos burocrticos ao comrcio, etc. A regulamentao de tais
enviezamentos problemtica. No seu ltimo relatrio, o Fundo Monetrio
Internacional observava que "as barreiras comerciais levantadas pelos pases
industrializados tomam cada vez mais a forma de medidas no tarifrias selectivas
e discriminatrias que minam os prprios princpios do GATT". Em tais
circunstncias " absolutamente essencial que o Uruguay Round resulte num
32FMI 1992, p. 8133KRUGMAN 199234Grard Lafay, "Pour une prfrence communautaire",Le Monde (Paris), 16/3/93.
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acordo global (...). Na ausncia de um acordo significativo, de recear que o
proteccionismo se acentue e que o respeito das disciplinas do GATT diminua"35.
Por ltimo, assistimos ao aparecimento de novos intervenientes na
economia mundial, como o caso do Japo, da Coreia do Sul e outros pases
asiticos, que, sendo institucionalmente diferentes dos seus parceiros ocidentais,
aplicam regras distintas mesmo se, formalmente, aderem aos princpios do GATT.
Esse fenmeno particularmente evidente no Japo, pas aberto de jure, mas muito
proteccionista de facto. O problema foi levantado desde os anos 60 por um autor
sueco, profundo conhecedor do Japo. No seu livro, que provocou ento alguma
celeuma, inclusive no prprio Japo, Hakan Hedberg demonstrava que o chamado
"desafio japons" poderia vir a representar mais cedo ou mais tarde uma ameaa
para a economia mundial. Referindo-se por exemplo "moral da instalao",
Hedberg escrevia que "neste captulo a moral japonesa tem duas faces. Nenhuma
liberdade para as empresas estrangeiras em fabricar e exercer a concorrncia no
Japo, plena liberdade para as sociedades japonesas em instalar-se no estrangeiro.
Quando uma empresa de produo estrangeira requer o direito de entrada, essa
tentativa estigmatizada: 'mais um passo na invaso agressiva dos capitais
estrangeiros. Quando uma firma japonesa se instala no estrangeiro, 'um passo
positivo para os capitais japoneses'. Quando os direitos de instalao numqualquer ramo industrial so 'liberalizados', os japoneses esforam-se por impedir
qualquer produo unificada e lucrativa"36. Mais de duas dcadas depois da
publicao deste livro, dissipadas que esto algumas iluses liberais, o mal-estar
permanece, a tal ponto que os pases desenvolvidos pensam hoje que o Japo
contribuiu largamente para enfraquecer o GATT, razo pela qual muitos consideram
que a grande vantagem dos acordos regionais (CE, NAFTA etc.) que eles permitem
deixar o Japo de lado.
Esta convico talvez seja exagerada. Mas certo que existem
preocupaes motivadas pelo extraordinrio crescimento do investimento directo
japons na sia durante a ltima dcada e pelo receio que a dominao japonesa
nessa rea resulte na eliminao da concorrncia estrangeira, nomeadamente
americana37. Contudo, justo observar que este fenmeno em parte justificvel
pela vizinhana geogrfica, tal como acontece na Europa ou na Amrica do Norte.
35FMI 1992, pp. 77 e sgs36Hakan HEDBERG, The Japanese Challenge (1969), trad, fr., Le Dfi Japonais, Paris, Denoel, 1970, p. 211.37SCHLOSSSTEIN 1992
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No h, por enquanto, razes que levem a pensar que a aproximao entre o Japo
e os outros pases asiticos seja, partida, uma ameaa para as relaes
econmicas multilaterais.
verdade que os obstculos levantados ao pleno funcionamento do GATT
explicam o crescente recurso aos acordos regionais de comrcio-livre.
Isso tambm demonstra a importncia do elemento poltico. Devido
complexidade j apontada, os problemas decorrentes do comrcio internacional
podem ser mais eficazmente tratados a nvel regional do que no plano mundial.
Este contexto mais restrito pode oferecer melhores condies para ultrapassar os
acordos comerciais e avanar para a prpria coordenao das polticas nacionais
com abandono mtuo de soberanias, como acontece j na Europa dos 12. O
mesmo se poder talvez dizer da NAFTA com o pacto sobre regulamentao de
investimentos e outros mecanismos de integrao em vrios domnios (ambiente,
proteco dos direitos dos assalariados, etc.)38. A contrario, a "falta de vontade
poltica" dos governos africanos explica, para muitos analistas, grande parte da
morosidade do processo de integrao na frica ocidental e central.
Em todo o caso, certos autores pensam que os progressos do GATT no
teriam sido muito maiores na ausncia de acordos regionais, uma vez que omultilateralismo coloca problemas para cuja complexidade no parece haver, por
enquanto, solues razoavelmente satisfatrias. Com efeito, difcil encarar de
momento uma soluo mundial comparvel que foi realizada pela CE. No s
pela especificidade do Japo' e de outros pases asiticos, mas igualmente pelas
profundas disparidades existentes entre o nvel de desenvolvimento dos pases
industrializados e a situao dos pases do chamado Terceiro Mundo,
particularmente as jovens naes africanas.
No seu relatrio de 1992 o FMI reconhecia que os acordos regionais so
uma das caractersticas relevantes da evoluo do sistema comercial internacional
nos nossos dias e considerava que os progressos da integrao regional so
potencialmente posivitivos e podero apoiar o esforo de liberalizao,
assegurando uma melhoria do nvel de vida, desde que tais esforos no
comprometam a abertura do sistema comercial. "A experincia prova que os
acordos de comrcio regionais que tenham efectivamente abolido aos obstculos
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Quadro 5
SADC ex-SADCC)
ACORDOS RESULTANTES DO "TQUIO ROUND"
Situao em 31 de Dezembro de 1991
PASES
PARTESCONTRATANTES
PROTOCOLO DE
GENEBRA(1979)
Protocolo adicional ao
Protocolo de Genebra(1979)
Obstculos
tcnicos
Mercados
Pblicos
Subvenes e
medidascompensatrias
Carne bovina Produtos
leiteiros
Acordo sobre o
Valor emAlfndega(1)
Licenas
Deimportao
Aeronaves
civis
Anti-Dumping
Angola
Mocambique
Botswana2 A3
Lesotho2 A3
SwazUandia
Zimbabwe2 O O
Malawi2 A3
Tanzania2 O O O O
Zambia2
Namibia
FONTES:GATT, Activits du GATT en 1990, Guenbre 1991 (Annexe III)OCDE, Intgration des Pays en Dveloppement dans le Systme Commercial International.Paris, OCDE, 1992.
LEGENDAS:
(1) Incluindo o Protocolo. Desde a entrada em vigor (1 Janeiro 1981) as disposies do Protocolo fazem parte integrante do texto.(2) Pas que participa nas negociaes do GATT.(3) Reserva, condio e/ou declarao:
A: Aceite;S: Assinado (em instncia de aceitao);O: Observador
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Apesar de os pases do Terceiro Mundo no terem beneficiado, de um modo
geral, das vantagens do SGP inicialmente previstas44, os que tm condies para
suportar a concorrncia internacional recusam tambm abandonar o regime
especial e diferenciado e rejeitam o princpio da gradao. Para as instituies
internacionais, esses PED esto a subestimar as vantagens que teriam com uma
reduo recproca dos obstculos ao comrcio no quadro das negociaes
multilaterais, subavaliando igualmente os custos inerentes ao seu estatuto de
tributrios do SGP. Tal estatuto tanto mais desvantajoso para os pases em
desenvolvimento com capacidade de concorrncia internacional que, para a maior
parte deles, o SGP no cobre certos produtos crticos, como txteis, vesturio, ao e
calado. Assim, as mercadorias mais susceptveis de serem exportadas pelos PED
so justamente aquelas de que os pases industrializados mais se protegem.
Por outro lado, o sistema tambm no oferece nenhuma garantia a longo
prazo e, uma vez que as preferncias so acordadas unilateralmente aos PED, os
nveis e contingentes variam com a conjuntura, no dando a estes pases uma base
slida para alicerarem projeces econmicas fiveis, mesmo num futuro
prximo.
Nas discusses actualmente em curso no GATT est em jogo uma
alternativa fundamental: ou o Uruguay Round tem finalmente sucesso e o
multateralismo consolida a abertura de um verdadeiro espao mundial ou, pelo
contrrio, assiste-se exploso em mltiplas alianas regionais.
A resposta est no sucesso ou no fracasso do Uruguay Round e na
possibilidade de ser encontrada uma via intermdia entre o liberalismo extremo e a
autarcia organizada. Essa resposta constituir uma referncia decisiva para os
pases do Sul, nomeadamente africanos.
Cremos que a esperana da frica est justamente no caminho do
pragmatismo e do compromisso, onde a integrao regional poder construir os
fundamentos de uma mais rpida insero do continente na economia global.
44Trs anos mais tarde, em 1990, um relatrio do Secretariado Geral da UNCTAD indicava tambm que "...o SGP no atingiuos seus objectivos e tem uma influncia menor, embora positiva, sobre o crescimento e a industrializao dos pases em
desenvolvimento''. Ao citar os resultados de um estudo sobre a questo referente ao perodo 1980-1987, revelava que o SGPs teria permitido aumentar de 1% a 4% as exportaes mdias de produtos manufacturados dos PED para os pasesdesenvolvidos (Cf. UNCTAD 1990).
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