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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO PAULO - CAMPUS SÃO CARLOS TECNOLOGIA EM PROCESSOS GERENCIAIS Ana Claudia Alcaide Vanderlene Moura Silva EMPRESAS TRADICIONAIS, EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS E NEGÓCIOS SOCIAIS: a função social em diferentes tipos de organização São Carlos SP 2016

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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA

DE SÃO PAULO - CAMPUS SÃO CARLOS

TECNOLOGIA EM PROCESSOS GERENCIAIS

Ana Claudia Alcaide

Vanderlene Moura Silva

EMPRESAS TRADICIONAIS, EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS E

NEGÓCIOS SOCIAIS: a função social em diferentes tipos de organização

São Carlos – SP

2016

ANA CLAUDIA ALCAIDE VANDERLENE MOURA SILVA

EMPRESAS TRADICIONAIS, EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS E NEGÓCIOS SOCIAIS: a função social em diferentes tipos de organização

Monografia apresentada ao Instituto Federal de São Paulo – campus São Carlos, como parte das exigências para a conclusão do Curso Superior de Tecnologia em Processos Gerenciais. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Rita de Cássia Arruda Fajardo

São Carlos – São Paulo

2016

ANA CLAUDIA ALCAIDEVANDERLENE MOURA SILVA

EMPRESAS TRADICTONAIS, EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDARIOSE NEGOCIOS SOCIAIS: a função social em diferentes tipos de organização

Monografia apresentada ao Instituto Federal deSão Paulo -campus São Carlos, oomo parte dasexigências paía a wnclusão do Curso Superiorde Tecnologia em Processos Gerenciais.Orientadora: Prof.a Dr,' Rita de Cássia ArrudaFajardo

Data de aprovação: 03 de dezembro de 2016.

'piÇa e t/§c, (I*\LdáOrientadora: PrsF. DÉ Rita de Cássia

IFSP - âmpus Sáo Carlos

Dr" Carlos Eduardo GuimarãesIFSP -campus São Caúos

: Prof Ma Renata Oliveira de CarvalhoIFSP - âfipus São Carlos

AGRADECIMENTOS

Agradecemos primeiramente aos nossos pais, irmãos e familiares, pela

compreensão, apoio e paciência, sem os quais nada seria possível.

Agradecemos também a todos os professores que ao longo do curso

contribuíram para a nossa formação e para a realização deste, que é apenas o

primeiro passo de muitos em nossa vida acadêmica e profissional.

Agradecemos de maneira especial a Professora Dr.ª Rita Fajardo, pela grande

ajuda, paciência e disponibilidade. Principalmente por nos orientar e direcionar

quando queríamos abraçar o mundo.

E acima de tudo, agradecemos a Deus por essa e todas as realizações ainda

por vir!

RESUMO

Por meio do princípio da função social, a Constituição Federal Brasileira de 1988,

vigente, apresenta a ideia de que para legitimar suas atividades as organizações

devem, além de não gerar prejuízos à sociedade, também promover seu benefício,

com o fim de reduzir as desigualdades e garantir a dignidade humana. Visto que

existem vários modelos de organização e que todas devem atender a uma função

social, considerando que seus resultados se beneficiam de uma sociedade harmônica,

e levando em conta que não foram encontrados estudos na área de gestão que

observam como esta é exercida em diferentes tipos de empresa, este trabalho buscou

estudar as Empresas Tradicionais, os Empreendimentos Econômicos Solidários e os

Negócios Sociais, com o objetivo de compreender, teoricamente, qual a função social

nos diferentes tipos de organização. Para isso, foi realizada uma pesquisa

bibliográfica e documental na qual conceitua-se o princípio constitucional da função

social, e são apresentados os modelos de empresas. Foram estudados os fatores

internos, observando-se como se estabelece a relação do tipo de organização com os

elementos administradores e funcionários. Já no que concerne aos fatores externos,

foram analisadas as relações com os consumidores e com o meio ambiente. Por uma

limitação da pesquisa, optou-se por não analisar o aspecto concorrencial, uma vez

que abrange fatores complexos e variáveis maiores e alheias ao que se objetiva

abordar neste trabalho. Assim, foi possível observar que os três tipos de organização,

embora possuam características diferentes, cumprem o princípio supracitado. Seja

adotando uma abordagem mais ampla de gestão, que engloba os diversos

stakeholders na estratégia de Responsabilidade Social Empresarial (RSE), como é o

caso das Empresas Tradicionais; promovendo a solidariedade e cooperação entre

seus membros e entre produtores e consumidores, como os Empreendimentos

Econômicos Solidários; ou explicitando na missão do negócio o compromisso em

beneficiar a sociedade e/ou meio ambiente, como fazem os Negócios Sociais.

Palavras-chave: Função Social. Responsabilidade Social Empresarial. Empresas

Tradicionais. Empreendimentos Econômicos Solidários. Negócios Sociais.

ABSTRACT

Through the principle of social function, the current Constitution of the Federative

Republic of Brazil, alleges that to legitimize their activities, as well as, reduce their

impact on society and the environment, organizations must behave ethically,

promoting improvements in order to ensure social conditions and the dignity of human

life. Seeing that there are several organizational models and all of them must fulfil a

social function - considering that their results benefit from a balanced society, and

taking into account that no studies were found in the area of management which

observes how it is practiced in different types of companies, the purpose of this study

was to study traditional organizations, social economic enterprises and social affairs,

in order to understand, theoretically, the social function in the different types of

institutions. For this purpose, a bibliographical and documentary research has been

made in which the constitutional principle of the social function is conceptualized, and

the models of companies are disclosed. The internal factors were analysed, and it was

observed how the relationship between the type of organization and the managers and

employees is established. Regarding external factors, it was assessed the connection

with consumers and the environment. Due to a limitation of the research, it was decided

not to analyse the competitive aspect, since it surrounds complex and variable factors

greater and unrelated to what is intended to address in this work. Thus, it was possible

to observe that the three types of organization - although have different aspects, they

fulfil the above-mentioned principle. Whether adopting a broader management

approach, which comprises the various stakeholders in the Corporate Social

Responsibility (CSR) strategy, as is the case of traditional companies; promoting

solidarity and cooperation among its members and between producers and

consumers, such as Solidarity Economic Projects; or explaining in the mission of the

business the commitment to benefit society and / or the environment, as Social

Business does.

Keywords: Social Function. Corporate Social Responsibility. Traditional Companies.

Enterprises Economic Solidarity. Social Business.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figuras

Figura 1– Áreas de atuação da função social empresarial ...................................... 18

Figura 2– Apresentação simplificada dos principais stakeholders .......................... 28

Quadros

Quadro 1– Nomenclaturas e definições acerca do modelo de Negócios Sociais

................................................................................................................................... 55

Quadro 2– Semelhanças e diferenças entre Negócios Sociais e o segundo e terceiro

setor........................................................................................................................... 56

Quadro 3– Função social e a relação com fatores internos nos diferentes tipos de

organização .............................................................................................................. 67

Quadro 4– Função social e a relação com fatores externos nos diferentes tipos de

organização .............................................................................................................. 68

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BP Base da Pirâmide

EES Empreendimento Econômico Solidário

ES Economia Solidária

FTFS Força-Tarefa Brasil de Finanças Sociais

ISO International Organization for Standardization (Organização Internacional

para Padronização)

MTE Ministério do Trabalho e Emprego

NS Negócio Social

ONG Organização Não Governamental

RH Recursos Humanos

RS Responsabilidade Social

RSE Responsabilidade Social Empresarial

SCJS Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário

SENAES Secretaria Nacional de Economia Solidária

SIES Sistema de Informações em Economia Solidária

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 9

1.1 OBJETIVOS DA PESQUISA ............................................................................... 9

1.2 JUSTIFICATIVA DO TEMA ............................................................................. 10

1.3 METODOLOGIA ............................................................................................... 11

1.3.1 Classificação da pesquisa ............................................................................ 11

2 FUNÇÃO SOCIAL EMPRESARIAL ........................................................................13

2.1 FUNÇÃO SOCIAL NO CONTEXTO DA ORDEM ECONÔMICA ...................... 13

2.2 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE ...................................14

2.3 FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA .....................................................................16

2.4 RELAÇÃO ENTRE REPONSABILIDADE SOCIAL E FUNÇÃO SOCIAL ..........19

3 EMPRESAS TRADICIONAIS ................................................................................. 25

3.1 AS EMPRESAS TRADICIONAIS ...................................................................... 25

3.2 DIMENSÕES DA FUNÇÃO SOCIAL ................................................................. 30

3.2.1 Relações internas: funcionários e administradores ...................................... 30

3.2.2 Relações externas: consumidores e meio ambiente .................................... 33

4 EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS .......................................... 39

4.1 OS EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS ............................... 39

4.2 DIMENSÕES DA FUNÇÃO SOCIAL ................................................................. 44

4.2.1 Relações internas: funcionários e administradores ...................................... 44

4.2.2 Relações externas: consumidores e meio ambiente .................................... 47

5 NEGÓCIOS SOCIAIS ............................................................................................. 53

5.1 OS NEGÓCIOS SOCIAIS .................................................................................. 53

5.2 DIMENSÕES DA FUNÇÃO SOCIAL ................................................................. 59

5.2.1 Relações internas: funcionários e administradores ...................................... 59

5.2.2 Relações externas: consumidores e meio ambiente .................................... 62

6 A FUNÇÃO SOCIAL NOS DIFERENTES TIPOS DE ORGANIZAÇÃO ................. 67

6.1 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ..................................................................... 69

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 73

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 77

9

1 INTRODUÇÃO

A humanidade tem enfrentado consequências negativas decorrentes dos atos

exploratórios praticados pelas organizações, principalmente durante as últimas

décadas. Em decorrência disso, o mundo corporativo está redefinindo os valores e

princípios norteadores de suas relações com a sociedade.

As empresas sempre exerceram grande influência econômica e social no meio

em que atuam. Segundo Pereira (2010), a empresa é importante instituição social,

uma vez que se relaciona com grande parte da população, seja como sócios,

funcionários ou consumidores, provendo bens e serviços, gerando emprego e

pagando tributos ao Estado.

De acordo com Ferraz (2007), as desigualdades sociais, a degradação

ambiental e o desemprego são marcas da sociedade contemporânea, ao mesmo

tempo em que a grande concorrência, o individualismo e a busca pelo lucro marcam

as relações sociais e econômicas do sistema capitalista atual.

Hoje, no entanto, o princípio da função social, exaustivamente assinalado na

Constituição Federal de 1988, como por exemplo, no Art. 5º, inciso XXIII e Art. 170,

inciso III, apresenta não apenas a ideia da empresa não gerar prejuízos à sociedade,

mas também de promover seu benefício, com o intuito de reequilibrar as relações

sociais desiguais (BRASIL, 1988).

Há diversos modelos de organização, não obstante, toda empresa deve

atender a sua função social. Nesse sentido, este trabalho buscou estudar as

Empresas Tradicionais, os Empreendimentos Econômicos Solidários e os Negócios

Sociais, visando responder ao seguinte problema: Qual a função social nos diferentes

tipos de organização?

1.1 OBJETIVOS DA PESQUISA

As empresas têm de fato grande importância para a sociedade em que estão

inseridas. Nas palavras de Zanoti, “a empresa, em suas complexas relações

contemporâneas, é um bem social, antes mesmo de ser um bem patrimonial de seus

cotistas ou acionistas” (ZANOTI, 2006, p. 207-208).

Considerando a relevância das atividades empresariais na sociedade

contemporânea, bem como a influência que exercem na comunidade em que atuam,

10

e, uma vez que existem diversos tipos e configurações de organizações, o objetivo

principal do presente estudo é compreender teoricamente qual a função social nos

diferentes tipos de organização no Brasil, mais especificamente como as Empresas

Tradicionais, os Empreendimentos Econômicos Solidários e os Negócios Sociais

exercem a função social.

Visando atingir o objetivo apresentado, foram propostos os seguintes objetivos

específicos:

a. Conceituar Função Social;

b. Apresentar as diferentes modalidades de empresas (Empresas Tradicionais,

Empreendimentos Econômicos Solidários e Negócios Sociais) e suas

respectivas relações internas e externas relacionadas à função social;

c. Discutir como esses diferentes tipos de organização exercem sua função

social.

1.2 JUSTIFICATIVA DO TEMA

A pesquisa realizada buscou compreender como os diversos tipos de

empresas exercem sua função social, princípio que exige que impactem positivamente

a sociedade, conciliando a busca pelo lucro ao benefício social.

O tema é de grande interesse das pesquisadoras, uma vez que é incontestável

a influência que as organizações exercem na comunidade em que se inserem e na

sociedade como um todo. De fato, a empresa deve ser vista como importante

instituição social, provedora de bens e serviços, de emprego e geradora de receitas

fiscais ao Estado. Por essa razão, é necessário compreender como estas instituições

tão importantes exercem sua função social, princípio que está presente na

Constituição Federal de 1988, como condicionante da legitimidade das atividades

empresariais.

Não obstante aos benefícios sociais que pode e deve trazer, a empresa

também se beneficia com uma sociedade harmônica, pois desta, provém seus clientes

e dos clientes sua receita. Também da comunidade vem seus colaboradores,

funcionários e fornecedores sem os quais não é possível desenvolver sua atividade

econômica.

A investigação é relevante academicamente uma vez que os estudos na área

de gestão, focados na função social da empresa, são praticamente inexistentes.

11

Observa-se vasta literatura a respeito deste tema, porém, na área de direito

empresarial. Essas publicações não mostram como as organizações exercem essa

função, tratam-na apenas como princípio constitucional que deve ser cumprido pelos

proprietários da empresa, a fim de legitimar o exercício de suas atividades.

Assim, uma vez que a empresa é importante instituição social; e que todas as

organizações devem cumprir o princípio constitucional da função social; considerando

que seus resultados se beneficiam de uma sociedade harmônica; e levando em conta

que não foram encontrados estudos na área de gestão que observam como a função

social é exercida em diversos tipos de empresa; o estudo realizado se faz relevante e

necessário para a compreensão acerca do tema função social em diferentes tipos de

organização.

1.3 METODOLOGIA

1.3.1 Classificação da pesquisa

A pesquisa realizada é de natureza aplicada. Segundo Prodanov e Freitas

(2013), a pesquisa aplicada envolve verdades e interesses locais, objetivando gerar

conhecimentos para a aplicação prática direcionados à problemas específicos.

Do ponto de vista de seus objetivos trata-se de uma pesquisa exploratória e

descritiva. De acordo com Gil (2010), as pesquisas exploratórias visam proporcionar

a familiaridade com o problema, objetivando torná-lo mais explícito ou ajudando na

construção de hipóteses. O autor observa ainda que a maior parte das pesquisas

acadêmicas, num primeiro momento, assumem caráter de pesquisa exploratória, pois

inicialmente é pouco provável que o pesquisador tenha uma definição clara do que

será pesquisado. Já, no que concerne as pesquisas descritivas, estas podem ser

elaboradas com a finalidade de identificar possíveis relações entre as variáveis.

A abordagem do problema é qualitativa, tendo como principal instrumento os

pesquisadores e sua análise indutiva. Conforme Prodanov e Freitas:

A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no processo de pesquisa qualitativa. Esta não requer o uso de métodos e técnicas estatísticas[...] os dados coletados nessas pesquisas são descritivos, retratando o maior número possível de elementos existentes na realidade estudada. (PRODANOV; FREITAS, 2013, p.70)

12

Do ponto de vista dos procedimentos técnicos, classifica-se a pesquisa como

bibliográfica e documental. Segundo Gil (2010), os dados necessários para a

elaboração de pesquisas bibliográficas são obtidos através de conteúdo já publicado,

constituído tradicionalmente de material impresso obtido em bibliotecas, mas também

disponíveis em outros tipos de fontes, como discos, fitas magnéticas, CDs, bem como

material disponibilizado na internet. De acordo com Prodanov e Freitas:

Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições de vários autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental baseia-se em materiais que não receberam ainda um tratamento analítico ou que podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa. (PRODANOV; FREITAS, 2013, p. 55)

Para a realização da pesquisa foram utilizados livros, artigos, dissertações e

teses disponíveis na internet e em bibliotecas, relacionados ao tema Função Social

Empresarial. Foram priorizadas as publicações de autores e pesquisadores

conhecidos e citados em outros trabalhos, bem como obras acessíveis.

Também foi utilizado material referente aos Negócios Sociais e

Empreendimentos Econômicos Solidários, além de obras que abordam os conceitos

e definições acerca da Responsabilidade Social e da evolução da concepção

tradicional de gestão, que permitiram a compreensão do tema como um todo. Para

complemento das informações foram utilizados sites de instituições idôneas,

pertinentes ao tema.

13

2 FUNÇÃO SOCIAL EMPRESARIAL

2.1 FUNÇÃO SOCIAL NO CONTEXTO DA ORDEM ECONÔMICA

Com a consolidação dos Estado-Nação, a partir da segunda metade do século

XVIII, os Estados passaram a buscar novas perspectivas sociais e econômicas, que

são idealizadas por meio de sua Carta Constitucional.

No Brasil, por meio da Constituição Federal de 1988, em vigor, surgiu uma nova

perspectiva em relação à ordem econômica, que passou a ser fundada na valorização

do trabalho humano e na livre iniciativa, objetivando assegurar a toda a sociedade

uma existência digna e redução das desigualdades sociais (ALMEIDA, 2003).

No Ordenamento Constitucional, existem prerrogativas tão importantes que são

elevadas a um patamar diferenciado de ‘normas-princípio’ ou simplesmente princípios,

de acordo com Luz (2015).

Estes princípios dentro de nossa ordem jurídico-constitucional, carecem do

discernimento de seu intérprete e aplicador, cabendo a realização de uma “análise

valorativa e ponderada, dentro dos padrões legais, morais, históricos, para que a

solução seja satisfatória e coerente à luz da ordem jurídica que ora se vivencia” (LUZ,

2015, p. 58).

Segundo explica Zanoti (2006, p. 84), “a Constituição Federal Brasileira, de

1988, em seu Título VII, denominado ‘Da Ordem Econômica e Financeira’, dedica

capítulo aos princípios gerais da atividade econômica”. Neste capítulo, são reunidos

os direitos e responsabilidades imprescindíveis à organização e ao funcionamento da

economia, definindo normas de conduta e limites para o exercício da atividade

econômica.

Luz (2011), elenca os seguintes princípios constitucionais inerentes à atividade

econômica, que devem ser observados: livre iniciativa, valorização do trabalho,

soberania econômica e nacional, função social da propriedade, livre concorrência,

defesa do consumidor e tutela do meio ambiente.

Trata-se de uma Constituição norteada pelo regime capitalista, porém, com

mesclagens também de cunho social, que garante a livre concorrência e o livre

exercício da atividade econômica, regulada pelas leis de mercado, contudo, sem

desprezar o viés social. “Dessa forma, pode-se afirmar que, na Constituição de 1988,

há uma junção entre os interesses capitalistas (valorização da livre iniciativa) e

14

interesses sociais (valorização do trabalho e garantia de existência digna) ”

(PEREIRA, 2010, p. 33).

Assim, com o advento da Carta Magna de 1988, a atividade empresarial se

voltou também para as questões sociais, e não apenas econômicas como outrora,

como é possível se extrair das ponderações de Ferreira:

A empresa reconhecida como sujeito de direito surge de conformidade com a ordem econômica, como preconizada pela Carta Magna, mais humanizada, voltada em suas funções não só para o econômico, mas também devendo atender aos interesses sociais e éticos. (FERREIRA, 2005, p.75)

Em suma, "o exercício das atividades empresariais tem como diretriz máxima

os princípios constitucionais informadores da ordem econômica." (FERREIRA, 2005,

p. 75). Portanto, cabe aos empresários e gestores compreendê-los e respeitá-los.

Dentre os princípios supracitados, essenciais para o exercício das atividades

empresariais conforme preconiza a Constituição Federal de 1988, encontra-se o da

função social da propriedade, que será apresentado a seguir. Posteriormente será

dada ênfase na função social empresarial, derivada deste.

2.2 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

Como dito anteriormente, a Carta Magna de 1988 trouxe uma nova perspectiva

em relação à Ordem Econômica estabelecendo princípios norteadores, entre os quais

se encontra o da função social da propriedade.

Como explica Luz (2015), a expressão função social resulta da associação de

duas palavras que conjuntamente recebem novo significado, com a primeira palavra

sendo adjetivada pela segunda.

A palavra ‘função’ tem por significado fazer cumprir, executar uma obrigação

ou tarefa, atender a um fim. No contexto jurídico, a palavra é utilizada com o sentido

de real finalidade, sua razão de existir, funcionalidade (LUZ, 2015).

Já a segunda palavra que compõe a expressão, ‘social’, que adjetiva a palavra

função, traz a significação de que os fins devem ter os institutos jurídicos, devendo

atender aos interesses da coletividade, buscando harmonizar o social com o individual

(LUZ, 2015).

15

Mas, a função social, sobretudo, possui vagueza em seu significado, dando a entender que existem “várias funções” e várias seriam as possibilidades de atendimento da finalidade em prol do social. Portanto, a função é desenvolvida pelo titular do direito que deverá, então, exercê-la de forma a satisfazer interesses que não são só dele, mas de toda a coletividade. (LUZ, 2015, p. 92)

Em verdade, caberá ao titular do direito, para que este seja legitimado, como

por exemplo o direito à propriedade privada, fazer emprego do seu bem, buscando

também colaborar com a sociedade, cumprindo o que está no ordenamento jurídico.

O Estado garante ao proprietário a posse da propriedade privada (inciso II, do

Art.170), para que este disponha dos benefícios que a coisa venha a lhe proporcionar.

Contudo, desde que esta propriedade (privada) cumpra a sua função social (inciso III,

do Art. 170), com o propósito de assegurar a todos existência digna (BRASIL, 1988).

Portanto, “o conceito de propriedade é relativizado, pois a sua legitimidade

apenas é reconhecida na hipótese de ela cumprir a sua função social, de

conformidade com os preceitos da justiça social e da dignidade da pessoa humana”

(ZANOTI, 2006, p. 94). Assim, pode-se entender que o princípio da função social se

sobrepõe ao da iniciativa privada.

Dessa forma, a legislação contemporânea trouxe limites para a propriedade

privada, na qual “o conceito de propriedade perdeu o caráter absoluto-individual, e

adquiriu uma concepção relativo-social” (ZANOTI, 2006, p. 108).

Considerando-se a condição de que a propriedade atenda ao princípio

apresentado, cabe ao proprietário garantir que esta não seja apenas um mero

instrumento voltado aos próprios interesses.

O proprietário, atento a esta nova realidade, tem a responsabilidade de dar

aos bens privados uma utilidade coletiva. Em relação à propriedade dos

meios de produção, o mesmo argumento deve ser instrumentalizado, dando

aos bens a utilidade expectada pelo ordenamento. (ALMEIDA, 2003, p. 142)

É importante salientar que a doutrina da função social traz a relação entre

direito e dever. Desta forma, o titular do direito à propriedade deve não somente se

abster de atitudes negativas, como também proporcionar benefícios à sociedade por

meio de suas atividades. Nesse sentido Henrique Viana Pereira conclui:

Então, pode-se dizer que cumprir uma função social é atingir uma finalidade útil para a coletividade, e não apenas para as pessoas diretamente envolvidas. Ela determina uma limitação interna, no sentido de que legítimo será o interesse individual quando realizar o direito social, e, não apenas

16

quando não o exercer em prejuízo da coletividade. (PEREIRA, 2010, p. 62-63)

2.3 FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA

A função social da empresa deriva do princípio constitucional de função social

da propriedade, apresentado anteriormente. Conforme assevera Paulo de Assis

Ferreira da Luz (2011, p. 56):

A posse da propriedade é assegurada a todos indistintamente, valendo-se, pois, dos benefícios que a coisa venha a lhes proporcionar, conforme se garante, na própria Constituição Federal, em seu artigo 170, inciso II. Contudo, esta mesma propriedade (privada) está condicionada a ter seu uso adequado – a fim de atender sua função social, artigo 170, inciso III, da Constituição Federal, respeitando-se, pois, os preceitos da justiça social e dignidade da pessoa humana.

Conforme explica Luz (2015), a discussão sobre a atual delimitação da doutrina

da função social, passou a ser baseada em uma nova categorização de bens,

passando a ser analisados de acordo com sua destinação, sejam bens próprios para

consumo ou bens de produção.

Assim, quando os bens são para consumo de seus titulares, deverão ser vistos

como objetos de propriedade particular, e não empregáveis na capitalização de

riquezas (LUZ, 2015).

Já no que se refere aos bens de produção que podem ser vistos como fontes

de riquezas, à luz da doutrina da função social, o emprego desses bens deve agregar

valores e gerar benefícios em prol da sociedade, mas, não apenas isso. Devem ser

empregados também, no intento de gerar lucros aos seus proprietários, fomentando

a atividade empresarial, e, também colaborando para o desenvolvimento nacional,

meta que é almejada pela Constituição Federal do Brasil (LUZ, 2015).

Quando a atividade empresarial é conduzida apenas pelos objetivos

econômicos, e desconsidera a relevância social que a organização tem no meio em

que atua, fica exposta a um custo social alto decorrente de suas atividades, e com o

passar do tempo isso se reflete em sua lucratividade. Por outro lado, quando a

organização se preocupa com sua função social, há um impacto positivo sobre os

lucros, uma vez que o sucesso de toda atividade empresarial é dependente do

desenvolvimento econômico da sociedade em que está inserida. Neste sentido,

Henrique Viana Pereira observa:

17

[...]quanto menor a exclusão social e maior for o desenvolvimento econômico da sociedade em que um empresário atuar, com certeza, maior será seu lucro. Isso decorre do aumento do mercado consumidor, que é intimamente ligado à redução da pobreza e soluções de políticas sociais. A manutenção de um desenvolvimento equilibrado e sustentado é uma questão permanente no dia a dia do empresário. (PEREIRA, 2010, p. 21)

Luz (2015), também alerta sobre os prejuízos que podem ser causados pela

não observância dos deveres da empresa, haja vista as possíveis responsabilizações,

desde ordem civil, administrativa e até mesmo criminal.

Segundo explica Luz (2015), o exercício da atividade empresarial, no intento

de atender à função social, é dividido em áreas de atuação. A primeira das análises

se dirige às relações desenvolvidas no interior da empresa, como aquelas junto aos

seus funcionários, por exemplo. Outro ponto a ser analisado sob a mesma perspectiva

interna, é o que toca aos administradores da empresa.

Além dos critérios internos à mesma, comporta-se a análise das suas relações

com fatores externos à atividade econômica por ela desenvolvida. Essa análise se dá

em outras três vertentes: a concorrencial; a interação saudável com o meio ambiente;

e, a relação com os consumidores (LUZ, 2015). Essa divisão da função social

empresarial em áreas de atuação é melhor expressa na Figura 1 apresentada adiante.

Relacionados aos fatores internos observa-se, por exemplo, como se dão as

relações trabalhistas e se estas contribuem para a dignidade humana e busca do

pleno emprego. Também integra a perspectiva interna da análise, a postura do

administrador que deve conduzir as atividades empresariais de forma ética,

respeitando o direito dos sócios e da coletividade (LUZ, 2015).

Quando se verificam as relações com os fatores externos à atividade

desenvolvida pela empresa, a observação volta-se para a promoção da livre

concorrência, de forma que não haja abuso de poder econômico; também, é

considerado se a conduta empresarial é exercida de boa fé e respeita às máximas de

proteção aos consumidores; e por fim, como se dá a relação com o meio ambiente,

que em razão de ser comum a toda a humanidade necessita de proteção especial

(LUZ, 2015).

Já de acordo com o entendimento de Zanoti (2006), cumpre de forma concreta

a sua função social, a empresa que respeita plenamente a dignidade da pessoa

humana, representada por seus empregados, acionistas ou cotistas, consumidores,

fornecedores, meio ambiente, comunidade e Estado, até o limite dos direitos

18

positivados no ordenamento jurídico nacional.

Figura 1 – Áreas de atuação da função social empresarial

Fonte: elaboração própria, com base em Luz (2015).

Segundo ambas interpretações, em observância da função social, é correto

afirmar que o interesse empresarial é legitimo quando busca o bem coletivo, cabendo

ao empresário conciliá-lo aos próprios interesses. Assim:

[...] as atividades econômicas devem visar benefícios para a coletividade, observados critérios razoáveis de proporcionalidade e ponderação, sendo certo que a busca pelo lucro – durante o exercício de atividade econômica – é perfeitamente conciliável com a imposição do exercício da função social. (PEREIRA, 2010, p. 73)

Assim, “a interpretação em torno da função social da empresa representa um

conjunto de fenômenos importantes para a sociedade e indispensável para a

satisfação dos interesses coletivos (ALMEIDA, 2003, p. 151) ”.

De fato, as organizações devem cumprir uma série de obrigações, não apenas

junto aos seus sócios, mas também com o meio ambiente, com o Estado, com seus

funcionários, com os fornecedores, e com a comunidade na qual exerce suas

atividades. Para Luz (2011), não é por acaso que as empresas são vistas como ente

importantíssimo na colaboração da erradicação da pobreza, bem como na diminuição

das desigualdades regionais.

19

É importante salientar, que o princípio da função social da empresa implica não

somente no dever de o empresário exercer suas atividades de forma que não

prejudique a coletividade, mas também, em exercê-las em benefício de todos. Desta

forma, as decisões empresariais devem ser tomadas considerando o contexto social,

já que suas consequências, positivas ou negativas, afetam uma infinidade de pessoas.

A esse respeito, conclui Ferraz (2007, p. 53):

Portanto, uma propriedade improdutiva ou uma empresa improdutiva, que não proporciona empregos, não paga impostos, que não gera segurança e bem-estar aos indivíduos e não se importa com as necessidades coletivas, não cumpre sua função na sociedade. A Empresa depende de um contexto social para justificar sua existência.

Ademais quando as atividades empresariais são conduzidas ignorando a

funcionalidade social da empresa, constitui-se um desvio no exercício de suas

funções, que pode ser compreendido como desvio de finalidade (LUZ, 2015).

No entanto, para além da função social da empresa, encontra-se a

responsabilidade social empresarial, que trata de um conceito distinto, porém

relacionado. Dessa forma, faz-se necessário compreender qual a relação existente

entre ambas definições.

2.4 RELAÇÃO ENTRE REPONSABILIDADE SOCIAL E FUNÇÃO SOCIAL

Na atual conjuntura, em que as empresas são vistas como organismos

integrantes da sociedade e, que se percebe cada vez mais que suas ações interferem

de forma acentuada no contexto no qual operam, vem crescendo o interesse por parte

destas em minimizar suas possíveis ações negativas sobre a sociedade e beneficiá-

la de alguma forma. Para tal, as organizações vêm fazendo uso das chamadas

políticas de Responsabilidade Social Empresarial (RSE).

Segundo explicam Barbieri e Cajazeira (2012), os debates em torno da

Responsabilidade Social Empresarial, ocorrem desde o início da Era Moderna,

quando as empresas começaram a surgir. Porém, a partir da década de 1970, é que

a realização de trabalhos acadêmicos na área se tornou mais frequente.

Conforme Machado Filho (2011), não é possível observar um consenso sobre

o conceito de RSE, que muitas vezes pode ser confundida com “ações sociais”

reduzindo suas atividades a ações filantrópicas. “[...] Esse reducionismo é

20

inadequado, distorcendo a essência do que se espera de uma conduta socialmente

responsável das empresas” (MACHADO FILHO, 2011, p. 24).

Nesse sentido, Dias (2012) define a Responsabilidade Social (RS) da seguinte

forma:

A RS é um conjunto de ideias e práticas da organização que fazem parte de sua estratégia e que tem como objetivo evitar prejuízo e/ou gerar benefícios para todas as partes interessadas (stakeholders) na atividade da empresa (consumidores, empregados, acionistas, comunidade local, meio ambiente etc.), adotando métodos racionais para atingir esses fins e que devem resultar em benefícios tanto para a organização quanto para a sociedade. (DIAS, 2012, p. 20)

Ashley (2005), argumenta que a responsabilidade social de uma empresa deve

considerar determinados valores e normas culturais que regem a sociedade em que

está inserida. Segundo a autora, a própria noção de RS é um valor cultural cada vez

mais aceito e empregado ao redor do mundo, principalmente em decorrência da

mudança de concepção em relação ao papel que a organização exerce perante a

sociedade.

Segundo Carroll1 apud Barbieri e Cajazeira (2012), a definição de

responsabilidade social empresarial compreende as expectativas econômicas, legais,

éticas e filantrópicas que a sociedade tem em relação às organizações em dado

período.

É importante ressaltar que o conceito de RS difere da filantropia. Conforme

definem Barbieri e Cajazeira (2012), “a filantropia convencional pode ser entendida

como qualquer forma de aplicação de recursos fora dos objetivos precípuos do

negócio para apoiar ações e demandas da sociedade” (BARBIERI; CAJAZEIRA,

2012, p. 152). Assim, trata-se das ações sem vínculo com as atividades da empresa

ou com seu negócio. Nesse sentido, Ferraz esclarece:

A responsabilização social não significa simplesmente a disponibilização de recursos financeiros para as ações sociais, isso seria filantropia, de cunho beneficente. A responsabilidade social efetiva consegue despertar a conscientização das práticas sociais de forma contínua e habitual, de maneira que essa conduta passe a fazer parte do cotidiano da empresa, que passa a acompanhar os projetos sociais desenvolvidos, os seus efeitos e os resultados almejados em toda a sociedade. (FERRAZ, 2007, p. 56)

1 CARROL, A. B. A three-dimensional conceptual model of corporate performance. Academy of Management Review, v.4, n.4, 1979.

21

De acordo com Carroll2 apud Barbieri e Cajazeira (2012), foi a partir de um texto

de Milton Friedman, de 1962, que o debate sobre a RSE de fato ganhou dimensão.

Barbieri e Cajazeira (2012), explicam que Friedman, em seu texto,

argumentava que a responsabilidade social da empresa é gerar lucros dentro da lei.

O autor defendia que bastava para a organização, que por meio da produção de um

bem ou serviço, pudesse remunerar os fatores de produção (capital e trabalho),

gerando assim renda para a sociedade e pagando impostos aos governos. Para

Friedman, caberia ao governo aplicar o dinheiro pago pelas empresas na resolução

dos problemas sociais. Qualquer utilização dos recursos empresariais que não fosse

para gerar lucros, era condenada pelo autor.

Ainda nesse raciocínio, Barbieri e Cajazeira (2012), observam que para

Friedman a função dos dirigentes da empresa era maximizar o lucro para os

acionistas. Assim, se estes quisessem contribuir para a solução de problemas sociais,

deveriam utilizar seus recursos próprios e não os da organização, pois, para o autor

caberia às organizações apenas cumprir suas responsabilidades legais. Essa

concepção, passou a ser conhecida como abordagem do acionista ou stockholder.

A responsabilidade social segundo a abordagem do acionista, teve e continua tendo como um de seus pilares a separação entre a propriedade e a administração nas grandes empresas, notadamente nas sociedades anônimas. Um de seus objetivos é minimizar os conflitos entre os proprietários e os administradores quanto à alocação de recursos da empresa, tendo em mente a ideia de que estes são agentes dos proprietários e devem, portanto, aplicar os recursos da empresa com vistas a maximizar o retorno sobre o capital investido. (BARBIERI; CAJAZEIRA, 2012, p. 14)

Dessa forma, Milton Friedman argumentava que a responsabilidade social da

empresa é gerar lucros dentro da lei, e que, portanto, esta não deveria concentrar-se

em resolver os problemas sociais. A respeito dessa concepção, discorre Ferraz:

A “teoria acionista” de Friedman, conhecida como “Stockholder theory” decorreu do conceito de propriedade privada vigente na época do liberalismo clássico. Essa Teoria considerava que os gestores tinham apenas o dever de atuar de acordo com os interesses dos acionistas. (FERRAZ, 2007, p. 23)

No entanto, conforme explicam Barbieri e Cajazeira, “a legislação brasileira não

se rendeu totalmente ao princípio da primazia dos acionistas, e nem poderia fazê-lo

2 CARROL, A. B. A three-dimensional conceptual model of corporate performance. Academy of

Management Review, v.4, n.4, 1979.

22

pelo conceito de função social da propriedade, que passou a ter status constitucional”

(BARBIERI; CAJAZEIRA, 2012, p. 17).

Por meio do princípio da função social, foram atribuídas à empresa

responsabilidades e obrigações perante à sociedade, e não somente junto aos

proprietários e acionistas como outrora, para que suas atividades sejam legitimadas.

O princípio constitucional supracitado, apresenta a perspectiva da atuação

funcional social da iniciativa privada e, em particular, da empresa, como meio para

promoção de justiça social e da dignidade da pessoa humana. Assim, segundo Luz

(2011, p. 12):

O papel da empresa, contextualizada à Constituição Federal de 1988, transcende o de outrora, posto que àquela é reconhecida relevância singular, como ente colaborador do crescimento e desenvolvimento social, não apenas na área econômica, mas também com repercussões sociais.

Em decorrência do princípio da função social da propriedade, deriva a função

social da organização. Da mesma forma, Pereira (2010), atenta para o fato de que a

responsabilidade social decorre da função social da empresa.

Conforme explica Luz (2015), o conceito de RSE difere da função social da

empresa, pois, ao contrário desta, não é obrigatória, e sim, ato voluntário para o seu

titular de exercício. Assim,

a responsabilidade social empresarial (ou da empresa) é compreendida como uma etapa de maior conscientização por parte dos titulares de empresas, com o fim de colaborar na busca da erradicação das desigualdades, bem como do alcance da justiça social. (LUZ, 2015, p. 149)

Dias (2012), explica que em termos práticos, o conceito de responsabilidade

social promove uma postura empresarial que integra elementos sociais e ambientais

que não necessariamente estão contidos na legislação, ou seja, trata de iniciativas

voluntárias além das exigências legais. "Essa é uma característica fundamental do

conceito; as iniciativas em questões de RS devem ir muito além da obrigação de

cumprir a legislação em matéria ambiental ou social" (DIAS, 2012, p. 96).

No entanto, Dias esclarece que " embora seja um compromisso de cunho

voluntário, a responsabilidade social envolve o cumprimento da legislação em todos

os níveis (municipal, estadual, nacional e internacional)" (DIAS, 2012, p.6).

De todo modo, uma empresa pode ser considerada atuante em termos de responsabilidade social se desenvolve iniciativas voluntárias, além das exigências legais; atua articulada com seus stakeholders; integra em sua

23

gestão preocupações sociais e ambientais, além das econômicas; adota transparência nas informações sobre os resultados positivos e submete a avaliação externa para confirmá-los. (DIAS, 2012, p. 23)

Assim, uma empresa socialmente responsável é aquela que exerce suas

atividades considerando o entorno social, econômico e ambiental em que atua,

integrando em sua cultura organizacional o conceito de RS, assumindo que a busca

por maior competitividade deve estar vinculada à perspectiva de desenvolvimento

sustentável (DIAS, 2012).

Pereira (2010), afirma que se torna cada vez mais visível a prática de atos com

reflexos sociais como estratégia para solidificar as empresas no mercado, visando

atrair mais consumidores e grupos de interesse, preocupados em adquirir e divulgar

produtos de uma organização que se importa com o bem-estar social. Também, por

meio dos atos de RS, não raras vezes, o empresário obtém benefícios fiscais.

“Atualmente, o Estado divide diversas responsabilidades com os empresários, os

quais somente exercerão atividades em prol da sociedade se enxergarem benefícios

nessas condutas (PEREIRA, 2010, p. 79-80) ”.

Luz também discorre a respeito dos benefícios para o empresário, de uma

postura socialmente responsável:

[...] significativa parte do empresariado busca levar esta postura, como instrumento autopromocional junto à coletividade e seus potenciais consumidores; logo, atrelar sua boa imagem a ações colaborativas do bem-estar social e erradicação das desigualdades seria também uma forma de cativar ou fidelizar seus clientes. (LUZ, 2011, p. 117)

Em síntese, o princípio constitucional da função social, que é foco deste

trabalho, é condicionante da legitimidade da propriedade, e por consequência, das

atividades empresariais. Além disso, é da função social que decorrem as práticas de

responsabilidade social, que tratam de um maior nível de conscientização em relação

ao papel da empresa nas questões sociais.

Há diversos modelos de organização, contudo, todos devem atender a uma

função social. No entanto, cada tipo de empresa atua de forma diferente em relação

à sua funcionalidade perante a sociedade, inclusive no que diz respeito à prática de

responsabilidade social.

Depois do exposto, serão apresentadas a seguir as definições acerca das

Empresas Tradicionais, dos Empreendimentos Econômicos Solidários e dos Negócios

Sociais, com vistas a observar as práticas e ideais propostos por cada um desses

24

modelos de organização com relação aos fatores internos e externos referentes ao

exercício de sua função social, conforme o modelo de áreas de atuação proposto por

Luz (2015), expresso na Figura 1.

No que tange aos fatores internos, será observado como se dá a relação da

empresa com os elementos administradores e funcionários. Já no que concerne aos

fatores externos, serão analisadas as relações com os consumidores e com o meio

ambiente. Por uma limitação da pesquisa, optou-se por não analisar o aspecto

concorrencial, uma vez que abrange fatores complexos e variáveis maiores e alheias

ao que se objetiva abordar neste trabalho.

25

3 EMPRESAS TRADICIONAIS

3.1 AS EMPRESAS TRADICIONAIS

A empresas que neste trabalho serão denominadas tradicionais tratam dos

empreendimentos que a princípio se encaixavam na concepção dos stockholders de

Milton Friedman. Como já exposto, o economista defendia que o único compromisso

social da empresa é auferir lucros e aumentar os benefícios econômicos. Dias (2012),

explica que para Friedman a organização não tinha nenhuma outra responsabilidade

que não fosse maximizar o valor de seu capital, o que em seu raciocínio, contribuiria

para a eficiência do sistema econômico. Qualquer utilização dos recursos

empresariais que não fosse para gerar lucros, era condenada pelo autor.

Para Friedman a empresa deveria ter o mínimo de responsabilidade social e

ser centrada, basicamente, nos interesses dos acionistas, dentro da lei, cabendo ao

governo preocupar-se com as causas sociais. Sobre essa visão tradicional

empresarial,

historicamente, as grandes empresas adotaram como princípio básico de sua atuação obter o máximo valor para seus acionistas e a maximização de seus benefícios, com o avanço do processo de globalização, essas perspectivas corporativas se intensificaram. (DIAS, 2012, p. 7)

Segundo Dias (2012), no mundo globalizado, as empresas são o motor

principal do progresso e desenvolvimento econômico. Na atual conjuntura, em que é

evidente o impacto provocado pelas organizações sobre a sociedade e o meio

ambiente, ocorre o aumento das exigências sobre o papel da empresa, que deve

passar de organização voltada para os interesses de seus acionistas, à orientada para

as diversas partes interessadas.

Assim, ao longo do tempo, a concepção tradicional de empresa foi sendo

modificada, superando a visão, até então dominante, preocupada com o máximo

benefício em curto prazo, organizada de forma vertical e hierarquicamente bem

definida, na qual a produtividade dependia basicamente da melhoria técnica dos

equipamentos e da otimização de procedimentos para assegurar mais eficiência na

realização de tarefas (DIAS, 2012).

Surge um novo conceito de empresa, consciente, que deve introduzir

mudanças em sua lógica de funcionamento, levando em consideração vários

26

aspectos, como o econômico, o trabalhista, a comunidade e o entorno em que se

situa.

Desse modo, embora na gestão empresarial tradicional a preocupação central tem sido sempre a salvaguarda dos interesses do acionista, hoje as empresas precisam situar-se no seu contexto social para obter uma posição duradoura na comunidade, com a obtenção de um equilíbrio de diferentes poderes. (DIAS, 2012, p. 7)

Eclodiu a preocupação com os demais grupos relacionados com a organização.

De acordo com Dias (2012), por meio de uma publicação de 1984, Edward R. Freeman

popularizou o termo stakeholder, propondo que as responsabilidades de uma empresa

não se dirigem apenas a seus acionistas e proprietários, mas também devem

abranger seus empregados, consumidores, fornecedores e todos os indivíduos que

são necessários para suas atividades ou podem influenciar, e ser influenciados, pela

organização. Progressivamente o conceito passou a ser utilizado para designar todas

as pessoas e grupos que possuem alguma relação com a empresa, seja direta ou

indireta, estando dentro ou fora dela (DIAS, 2012).

Sobre a difusão do conceito de stakeholder, de Freeman, em publicações nas

áreas de administração e responsabilidade social empresarial, elucidam Barbieri e

Cajazeira (2012, p. 26):

A emergência desse termo nessas áreas deve-se à constatação de que os interesses dos proprietários não são os únicos a serem considerados na condução das empresas. Desse modo, a teoria do stakeholder, das partes interessadas ou dos participantes da empresa, se contrapõe à do stockholder ou do acionista. São duas teorias rivais.

Dias (2012), argumenta que na última década do século XX as tendências

universais que estavam afetando a dinâmica das sociedades ficaram mais claras, o

que contribuiu para a redefinição das funções de seus atores e instituições. Entre

essas tendências, ocorreu o processo de reformulação do papel do Estado, que

“gradativamente vai perdendo o seu papel tradicional de executor e interventor,

assumindo uma função mais reguladora, transferindo responsabilidades e funções ao

mercado e à sociedade de um modo geral” (DIAS, 2012, p. 3).

Nesse contexto, no Brasil, a Constituição Federal de 1988 deu espaço especial

para os princípios imprescindíveis para a realização das atividades econômicas,

dentre os quais, estão a valorização do trabalho, a defesa do consumidor, a tutela do

meio ambiente e a função social da propriedade.

27

Machado Filho (2011), explica que integrada às dimensões econômica e legal,

a empresa possui uma dimensão ética. Entretanto, não há consenso entre os

acadêmicos, de distintas correntes de pensamento, sobre a natureza dessa dimensão.

Alguns compartilham a visão dos stockholders de Friedman; outros argumentam com

base na visão dos stakeholders, que os gestores têm a atribuição ética de respeitar e

promover o bem de todos os agentes afetados pela empresa, como clientes,

funcionários, acionistas ou cotistas (majoritários e minoritários), comunidade local,

além dos gestores que devem ser agentes a serviço desse grupo.

Ambas as visões convergem no sentido de que as empresas têm uma função social a cumprir na sociedade e, dessa forma, possuem atribuições éticas, mas a discordância fundamental, como já dito, é sobre a natureza das atribuições éticas, e também sobre quem se beneficiará com elas. É nesse contexto que se insere o debate da empresa socialmente responsável. (MACHADO FILHO, 2011, p.4)

Por meio do enfoque dos stakeholders que se consolidou na década de 1990

como visão dominante da RSE, estabeleceu-se uma nova visão de gestão, com a

constatação da complexidade dos ambientes internos e externos nos quais a empresa

se desenvolve, trazendo aos gestores um olhar mais amplo do desenvolvimento da

empresa e de suas relações. Assim, essa abordagem

no plano teórico, confere à empresa um novo status como “ator social”, fundamentando a necessidade de uma nova dimensão da estratégia da empresa: a gestão das questões sociais e políticas dentro dos marcos das finalidades tradicionais da empresa. (DIAS, 2012, p. 64)

Nesse sentido, as empresas foram dando espaço à concepção de Freeman,

que voltada agora para as diversas partes interessadas, passou a atender de forma

mais completa a função social da organização. Embora a responsabilidade social trate

de uma dimensão de maior consciência por ser de caráter voluntário, por meio desta

as Empresas Tradicionais deixaram a concepção dos stockholders e se voltaram para

sua função perante toda a sociedade. Dias (2012), apresenta de forma simplificada os

principais stakeholders de uma organização, na Figura 2 apresentada adiante.

Cada grupo envolvido com a empresa tem seus próprios interesses,

necessidades e motivações que devem ser considerados. Por exemplo, enquanto os

proprietários priorizam os lucros, os funcionários buscam melhor remuneração e

condições de trabalho; por sua vez, os consumidores desejam produtos de melhor

qualidade e menor custo, e assim por diante (DIAS, 2012).

28

Figura 2 – Apresentação simplificada dos principais stakeholders

Fonte: Dias (2012, p. 65).

“A organização se legitima socialmente na medida em que responde a

determinadas necessidades dos stakeholders” (DIAS, 2012, p. 61). Em exercício do

princípio da função social, as práticas empresariais devem ser conscientes e

considerar o interesse coletivo, evitando prejuízos e trazendo benefícios para todas

as partes interessadas. De acordo com Dias (2012), a abordagem de Freeman

apresentou uma ideia mais ampla da função social da organização, conforme pode-

se extrair de suas ponderações:

A abordagem dos stakeholders que se consolidou no final do século XX foi responsável pela consolidação da visão de que a empresa tem uma função social muito mais ampla que somente a busca de lucro para seus proprietários e acionistas. Sua compreensão permite às empresas compreender melhor o seu entorno e as necessidades de todos aqueles que de algum modo interatuam com a organização. (DIAS, 2012, p. 60)

Para Dias (2012) dois âmbitos da RSE devem ser analisados: o primeiro trata

dos aspectos internos e o segundo dos aspectos externos à empresa. “Esses dois

âmbitos da responsabilidade social servem como parâmetro de análise sobre o tipo

de consequências que a empresa deve considerar no momento de elaborar suas

estratégias e suas relações com seus stakeholders” (DIAS, 2012, p. 68). Em outras

29

palavras, essas duas dimensões dividem as partes interessadas em internas e

externas.

Todas as partes interessadas, não importando qual a dimensão da qual

participem, têm algumas necessidades que são comuns, entre as quais Dias (2012)

destaca:

Transparência no acesso às informações: é fundamental para todos que se

relacionam de alguma forma com a organização conhecer seus aspectos

essenciais e possíveis impactos sociais e ambientais tanto no presente como

no futuro.

Participação: o diálogo e a comunicação permanente são imprescindíveis para

estabelecer uma relação em que haja benefício mútuo.

Benefício mútuo: todos os grupos que se relacionam com a empresa esperam

obter algum benefício não apenas econômico, mas também social e ambiental.

Esse equilíbrio deve ocorrer de forma sustentável, considerando suas três

dimensões, econômica, social e ambiental, levando em conta as futuras

gerações.

Segundo explica Machado Filho (2011), no modelo das partes interessadas os

proprietários têm uma porção financeira da empresa, na forma de ações ou cotas, e

esperam retorno por isso. O tipo de proprietário varia desde uma empresa familiar, em

que pode ser o próprio gestor e funcionário, a um dos milhares de acionistas de uma

corporação, que possui uma pequena porção do capital da organização.

Já os funcionários dependem da empresa para manter seus empregos, e

esperam em troca de seu trabalho, salários, segurança e benefícios. Os fornecedores

são imprescindíveis para o sucesso do empreendimento, provendo matérias-primas,

determinantes na qualidade e preço final dos produtos. Os consumidores são vitais,

pois, trocam recursos com a organização por meio da aquisição de produtos e/ou

serviços. A comunidade local concede direito à empresa de se instalar recebendo em

troca os benefícios de taxas e contribuições, esperando que externalidades negativas

não sejam geradas ou sejam atenuadas (MACHADO FILHO, 2011).

Conforme apresentado, as Empresas Tradicionais embora tenham

compartilhado da visão de Friedman por muito tempo, considerando que sua principal

função é a geração de lucro para os proprietários, em decorrência das pressões

sociais e do Estado, passaram a se preocupar com sua ampla função social, por meio

do enfoque dos stakeholders, incluídos agora em sua estratégia de responsabilidade

30

social.

“Cada empresa, em cada localidade, tem diferenças de abordagem em relação

a como deve ser seu comportamento em relação às suas partes interessadas” (DIAS,

2012, p. 76). No entanto, o relacionamento com esses stakeholders têm alguns pontos

comuns, que serão apresentados a seguir. Assim, a análise dos fatores internos e

externos concernentes ao exercício da função social nas Empresas Tradicionais será

feita, observando o enfoque de Freeman sobre a RSE com as diversas partes

interessadas.

3.2 DIMENSÕES DA FUNÇÃO SOCIAL

3.2.1 Relações internas: funcionários e administradores

Segundo explica Zanoti (2006), até metade do século XX, o homem era

valorizado por aquilo que ele produzia, pelo retorno econômico que proporcionava ao

empregador. De acordo com sua atuação, este homem era periodicamente ‘premiado’

com o salário, e punido, se fosse necessário, com advertência, suspensão ou

demissão.

A partir da segunda metade do século XX, surgiu uma nova concepção em

relação ao homem, que deixou de ser visto como mero fator de produção, e passou a

ser tratado como ser humano que necessita receber mais do que um salário no final

de um determinado período (ZANOTI, 2006).

Agora, o trabalhador é reconhecidamente elemento fundamental para a

empresa que, por meio de sua força de trabalho, produz gerando riquezas e

movimentando a economia. Sobre a valorização do trabalho Henrique Viana Pereira

argumenta:

O trabalho deve ser sempre valorizado, eis que consiste em fonte de

sobrevivência do ser humano. Sendo assim, ao redor da valorização do

trabalho circunda interesse social, bem como está intimamente ligado à

dignidade da pessoa humana. (PEREIRA, 2010, p. 39)

Atrelado à função social está o princípio da valorização do trabalho humano,

como um pilar fundamental no exercício da atividade econômica.

A propósito, a Constituição Federal inseriu, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, a elevada importância à tutela ao trabalho,

31

como expressão básica da proteção à personalidade humana, e como forma de buscar o equilíbrio social e econômico, haja vista a inegável inferioridade do trabalhador, frente ao novo modo de produção instaurado dentro de uma economia globalizada (Art. 1º., inciso IV). (ZANOTI, 2006, p. 130)

Conforme Dias (2012), a dimensão interna da responsabilidade social está

relacionada com a função da empresa gerar riqueza e oferta de trabalho. Em termos

sociais, essas práticas afetam os trabalhadores em questões como o investimento em

recursos humanos, saúde e segurança no trabalho e a gestão e adaptação à

mudança.

A gestão responsável de recursos humanos envolve a promoção do princípio

da não discriminação e apoia-se no mérito, além da promoção de um bom ambiente

de trabalho e da compatibilização com a vida pessoal do funcionário. Os elementos

para sua implementação devem ser, pelo menos:

Desenvolver uma organização flexível; identificar e formalizar as expectativas mútuas entre a empresa e seus trabalhadores; a obtenção de maior equilíbrio entre trabalho, família e lazer; investimento em programas de formação permanente de pessoal; garantia de igualdade de remuneração e de perspectivas profissionais para as mulheres; a busca de uma maior diversidade dos recursos humanos, com a aplicação de práticas responsáveis de contratação não discriminatórias, visando não dificultar o acesso de pessoas pertencentes a minorias étnicas, pessoas idosas, mulheres, pessoas com algum tipo de deficiência etc.; promover o máximo desenvolvimento das capacidades das pessoas, e avançar na qualidade do desempenho relativo à gestão do RH. (DIAS, 2012, p. 69)

A origem de políticas com limiar no diálogo e acordo com trabalhadores

configura uma concepção de Recursos Humanos (RH) como recursos morais, e não

apenas como meios para gerar benefícios aos proprietários e acionistas (DIAS, 2012).

O trabalho em si, já não pode ser visto apenas como um mero fator de

produção, devido a relevância social que a ele pertence, por se tratar de fonte de

sobrevivência do trabalhador, e também, meio para sua realização pessoal.

Dias (2012), explica que na questão dos recursos humanos há um padrão de

qualidade aceito mundialmente: a norma SA 8000, que visa garantir que os direitos

básicos dos trabalhadores sejam respeitados pela organização. Esta norma tem

enfoque no poder aquisitivo dos funcionários, sua estabilidade e suas possibilidades

de promoção, de segurança e higiene no trabalho.

Segundo o autor, no âmbito da saúde e segurança no trabalho há uma

predominância da legislação. Entretanto, a empresa pode utilizar-se de medidas

complementares como, por exemplo, adotar ações preventivas aos possíveis riscos

32

potenciais no exercício do trabalho além de cumprir estritamente a legislação que

regula o assunto, bem como propiciar maior conhecimento dos problemas aos

funcionários e dar-lhes maiores responsabilidades para adoção de soluções,

facilitando o acesso a manuais e outros materiais elucidativos (DIAS, 2012).

Ainda em relação aos funcionários, segundo o enfoque dos stakeholders, as

práticas responsáveis da empresa devem (DIAS, 2012):

Gerar condições para que flua o talento coletivo: implementando uma política

inovadora que converta as pessoas no principal ativo da organização, vendo-

as como importantes vantagens competitivas;

Melhorar as condições de trabalho: estabelecendo um compromisso

transparente com a melhoria das condições de trabalho e com o

desenvolvimento profissional e bem-estar de seus funcionários, demonstrando

que a empresa valoriza as pessoas e leva em consideração sua contribuição

para o sucesso do negócio;

Aumentar o envolvimento dos trabalhadores com a empresa: permitindo que a

organização obtenha algo a mais dos funcionários, na forma de ideias,

compromisso e lealdade, que em seu conjunto trarão maior eficiência. Da

administração dessas relações no ambiente de trabalho dependerá o êxito da

empresa;

Promover a formação: fomentando a formação profissional contínua;

Possibilitar comunicação-informação: proporcionando a todos os funcionários

as informações adequadas, completas, transparentes e compreensíveis sobre

a organização, a relação de trabalho existente, bem como em relação a seus

direitos e deveres, o sistema de gestão de RS e os seus resultados;

Realizar processo de contratação justo: adotando padrões justos de

recrutamento e seleção de novos empregados, levando em conta sua

capacidade para realizar o trabalho oferecido, sem nenhum tipo de

discriminação.

Já com relação aos acionistas e dirigentes, conforme Dias (2012), a empresa deve

visar:

Eficácia e eficiência na gestão: de forma que gere o máximo de benefício

econômico, social e ambiental de maneira sustentável;

Representação e governança: respeitando o direito dos acionistas quanto a

33

informação, direito de voto, representação e participação nos órgãos diretivos

da empresa;

Comunicação-informação: de modo que se informe a tempo e com veracidade

sobre as decisões da empresa e os resultados econômicos, sociais e

ambientais gerados.

Em suma, as Empresas Tradicionais, por meio da dimensão interna da

responsabilidade social, relacionada com a função da empresa de gerar riqueza e

oferta de trabalho, atendem ao princípio da função social. Assim, com as práticas de

RS a organização busca promover a gestão responsável de recursos humanos, a

melhoria das condições de trabalho, o desenvolvimento profissional e bem-estar de

seus funcionários, dentre outros benefícios anteriormente apresentados.

Além disso, por meio destas práticas de responsabilidade, também busca-se

construir uma gestão transparente, em que flua a informação e a comunicação entre

acionistas e dirigentes, e por meio da qual se busque o máximo de benefício

econômico, social e ambiental de maneira sustentável.

3.2.2 Relações externas: consumidores e meio ambiente

Com o processo de globalização, houve uma expansão do mercado

consumidor e também da variedade dos produtos ofertados pelas empresas. Com isso

as relações de consumo foram modificadas, e o consumidor, como parte frágil e

imprescindível para circulação de riquezas e desenvolvimento da economia, passou

a ter maior atenção. Por se tratar da parte vulnerável na relação de consumo, este

recebeu proteção específica e privilégios legais.

A propósito, a Constituição Federal elegeu a defesa do consumidor como um dos princípios assecuratórios de uma existência digna da pessoa humana, na qual deve se embasar toda atividade da ordem econômica, como preceituam os Arts. 5º. inciso XXXII e 170, inciso V. (ZANOTI, 2006, p. 169)

Além da previsão constitucional, há também outras leis e instrumentos

normativos tratando da defesa do consumidor, como por exemplo, o Código de Defesa

do Consumidor – Lei Federal 8078/90, o maior responsável pela defesa deste frente

ao fornecedor de bens ou serviços.

Diante disso, segundo Luz (2011), as relações consumeristas devem primar

pelo respeito aos princípios constitucionais, e ocorrer de conformidade com o Código

34

de Defesa do Consumidor. Assim, conforme explica Pereira (2010), o Estado deve

intervir na relação de consumo no intento de combater possíveis abusos de poder

econômico por parte dos fornecedores, e consequente desrespeito à função social da

empresa. Em suma:

Uma distância instransponível entre fornecedor e os consumidores não tem espaço no contexto do Estado Democrático de Direito brasileiro. Ademais, faz-se necessária a intervenção estatal visando o equilíbrio nas relações consumeristas, quando o exercício da empresa for abusivo, ou seja, quando não observar a função social. (PEREIRA, 2010, p. 84)

Nas palavras de Dias, “quanto ao respeito aos consumidores, a expectativa é

que as empresas procurem oferecer de modo eficaz, ética e ecologicamente correto

os produtos e serviços que os consumidores necessitam e desejam” (DIAS, 2012, p.

74). Dessa forma, as organizações podem se beneficiar de uma relação duradoura

com seus clientes.

Nesse sentido, Dias (2012) cita alguns pontos que devem ser observados pelas

empresas:

Promoção e publicidade: não devem ser utilizadas promoções ou

publicidades enganosas ou que incitem condutas ilegais, não ética ou que

tragam algum perigo para a sociedade.

Confidencialidade: manter sigilo na relação com os clientes e respeitar a

privacidade de seus dados.

Honestidade: adotar medidas adequadas com os clientes para assegurar

que não ocorram práticas que impeçam a liberdade de ambas as partes

atuarem sempre com honestidade e de acordo com os legítimos interesses,

não se utilizando de meios com a clientela como pagamentos, presentes,

entres outras coisas.

Atenção ao cliente: estabelecer procedimentos definidos para tratar as

queixas, sugestões e reclamações dos consumidores;

Comunicação-informação: propiciar informação transparente,

compreensível, verdadeira, completa e detalhada para os consumidores,

sobre: a origem e características dos produtos e serviços; prazos e

garantias; seguros e impostos; uso adequado dos bens oferecidos; riscos

para a saúde; segurança e meio ambiente; bem como seus direitos e

deveres.

35

Em relação às questões ambientais, conforme dispõe o artigo 225, da

Constituição de 1988, o meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos,

assim como é bem de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida (BRASIL,

1988). Por essa razão, impõe-se ao poder público e à coletividade preservá-lo para

as presentes e futuras gerações.

Segundo explica Zanoti (2006), em decorrência da necessidade de se

promover o desenvolvimento econômico presente sem comprometer as necessidades

das futuras gerações, surgiu a expressão desenvolvimento ecologicamente

sustentado. Assim, esse desenvolvimento sustentado deve prezar pela eficiência

econômica, a prudência ecológica e a justiça social, buscando bem-estar no momento

presente, respeitando, no entanto, as futuras gerações.

Ressalte-se que a defesa do meio ambiente está intimamente ligada ao direito – fundamental – à vida e, por isso, deve preponderar sobre quaisquer considerações de desenvolvimento econômico desenfreado. Dessa forma, a tutela do meio ambiente serve como orientação nas atividades empresariais, para o exercício do direito de propriedade, bem como em qualquer iniciativa privada. (PEREIRA,2010, p.47)

São consequências inerentes ao desenvolvimento econômico, por exemplo, a

emissão de gases poluentes, o desmatamento e a poluição ambiental. No entanto, a

Constituição determina que deve haver uma utilização racional dos recursos, evitando

prejuízos abusivos e desnecessários.

Diante disso, a atividade empresarial deve ser exercida através de condutas ecologicamente corretas, em busca de um desenvolvimento econômico ecologicamente sustentável. E, assim, de acordo com as diretrizes do Estado Democrático de Direito que dizem respeito à tutela ambiental, assegurando a todos existência digna. (PEREIRA, 2010, p.48)

Dias (2012), apresenta alguns procedimentos que podem ser adotados pelas

empresas na questão ambiental:

Reduzir os resíduos e emissões, administrando melhor as fontes e os recursos

utilizados;

Administrar racionalmente o consumo de água, eletricidade, gás e materiais

utilizados no geral;

Conhecer e cumprir as normas ambientais do setor;

Implementar a ecoeficiência e ecodesign nos processos produtivos, nos

produtos e nos serviços;

36

Reciclar os resíduos e colaborar para a reciclagem dos produtos fabricados;

Envolver toda a organização no respeito ambiental;

Implantar sistemas de gestão ambiental, como por exemplo, a ISO 14000.

De acordo com Dias (2012), as empresas devem promover a proteção do meio

ambiente adotando padrões de produção e consumo que mantenham as capacidades

de regeneração da Terra. Devem pautar-se pelo princípio de prevenção e precaução,

assumindo quando for o caso, a reparação dos danos ambientais causados. Assim, a

conduta empresarial deve ser responsável e assegurar condições de habitabilidade

sustentável para as gerações presentes e futuras, para todos os ecossistemas.

De um modo geral, a diminuição do consumo de recursos, dos resíduos e das

emissões poluentes diminuem o impacto sobre o meio ambiente. Isso também traz

vantagens para a empresa, na medida em que a utilização de menos recursos deve

significar maior eficiência e rentabilidade. Uma empresa que respeita o meio ambiente

é aquela que fornece, a preços competitivos, bens e serviços que satisfaçam as

necessidades humanas e melhorem a qualidade de vida, ao mesmo tempo,

preocupando-se com a redução progressiva dos impactos ambientais (DIAS, 2012).

Em síntese da teoria apresentada, visando o exercício da função social em

relação aos fatores externos, as Empresas Tradicionais também atuam por meio das

práticas de responsabilidade social.

Em relação aos consumidores, buscam oferecer de modo eficaz, ética e

ecologicamente correto, os produtos e serviços que os clientes necessitam e desejam,

não se utilizando de promoções ou publicidades enganosas ou que incitem condutas

ilegais. Além disso, visam adotar medidas adequadas para assegurar que não

ocorram práticas danosas com a parte frágil da relação consumerista, propiciar

informação transparente, compreensível e verdadeira, bem como estabelecer

procedimentos para tratar suas queixas, sugestões e reclamações, dentre outras

coisas, respeitando também outros instrumentos normativos como o Código de

Defesa do Consumidor.

Já no tocante à relação com o meio ambiente, as organizações tradicionais

cumprem o princípio da função social ao utilizar racionalmente os recursos, evitando

prejuízos abusivos e desnecessários, e, adotando procedimentos como: o

cumprimento das normas ambientais do setor; implementando a ecoeficiência e

ecodesign nos processos produtivos, nos produtos e nos serviços; reciclando os

37

resíduos e colaborando para a reciclagem dos itens fabricados; implantando sistemas

de gestão ambiental, como a ISO 14000, entre outras coisas. Também, ao pautar-se

pelo princípio de prevenção e precaução, assumindo quando for o caso, a reparação

dos danos ambientais causados.

38

39

4 EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS

4.1 OS EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS

Para Singer (2002), o capitalismo se tornou dominante há tanto tempo que a

sociedade tende a aceitá-lo como algo natural. O cenário competitivo em todos os

sentidos, faz com que as empresas busquem melhor produzir e melhor atender, para

assim, obter maiores lucros e manterem-se no mercado. Os que melhor produzem e

atendem os consumidores são os vencedores, os que não são capazes são os

perdedores.

Apesar dos benefícios que a competitividade de mercado traz para os

consumidores, que podem escolher o melhor produto pelo menor preço, a competição

na economia sofre críticas por causa de seus efeitos sociais. Nas palavras de Singer

(2002, p.8), na economia capitalista “os ganhadores acumulam vantagens e os

perdedores acumulam desvantagens nas competições futuras”. Assim, essa

polarização entre ganhadores e perdedores produz crescente desigualdade. Do ponto

de vista do autor:

Para que tivéssemos uma sociedade em que predominasse a igualdade entre todos os seus membros, seria preciso que a economia fosse solidária ao invés de competitiva. Isso significa que os participantes na atividade econômica deveriam cooperar entre si em vez de competir. (SINGER, 2002, p. 9)

A solidariedade na economia só é possível quando organizada igualitariamente

pelas pessoas que se associam para produzir e comercializar. Paul Singer (2002),

defende que a chave dessa proposta é a associação entre iguais em lugar da relação

entre desiguais.

Gonçalves e Sobrinho (2011), apesentam a Economia Solidária (ES) como

importante alternativa para a geração de renda e inclusão social, que por meio de um

empreendimento coletivo solidário, beneficia as pessoas que se encontram excluídas

do mercado de trabalho, visando o desenvolvimento de todos os membros por igual.

O termo Economia Solidária foi cunhado na década de 1990, quando

despontaram inúmeras atividades econômicas organizadas com base nos princípios

de cooperação, autonomia e gestão democrática. Nas atividades de ES a

solidariedade tem prioridade sobre o interesse individual, sentido expresso pela

40

socialização dos recursos produtivos e utilização de critérios igualitários (LAVILLE;

GAIGER, 2009).

Historicamente, a Economia Solidária surgiu em decorrência do capitalismo

industrial, em que a propagação do uso das máquinas e a crescente industrialização

causaram a escassez de trabalho, e com isso o empobrecimento dos artesãos. Nesse

contexto social os trabalhadores se organizaram em pequenos grupos, buscando

alternativas de geração de trabalho e renda, baseadas em laços solidários objetivando

o desenvolvimento de todos os membros (GONÇALVES; SOBRINHO, 2011).

Assim, a origem histórica da ES se deu por meio do “cooperativismo

revolucionário”, relacionado essencialmente com a crítica operária e socialista do

capitalismo. Segundo Singer (2002, p. 38), Robert Owen, Charles Fourier e Saint-

Simon, que foram os clássicos do Socialismo Utópico, proporcionaram inspiração

fundamental ao Cooperativismo: “[...] a partir da qual os praticantes da economia

solidária foram abrindo seus próprios caminhos, pelo único método disponível no

laboratório da história: o da tentativa e erro”.

Na primeira metade do século XX em decorrência das melhorias nas questões

trabalhistas, promovidas pelos sindicatos, houve um crescente desinteresse pela

Economia Solidária no Brasil.

Segundo Gonçalves e Sobrinho (2011), a partir da segunda metade dos anos

70, e nas décadas seguintes, em decorrência da transferência da produção industrial

mundial para países em que as conquistas do movimento operário nunca se

realizaram, houve a desindustrialização dos países centrais e mesmo de países

semidesenvolvidos como o Brasil, eliminando milhões de postos de trabalho formal,

gerando assim, desemprego em massa, e obrigando muitos funcionários a aceitar a

"flexibilização" de seus direitos. Resultante dessa realidade, ocorreu o renascimento

ou a "reinvenção" da Economia Solidária em grande parte dos países, que por meio

de Empreendimentos Econômicos Solidários, ou simplesmente EES, gerou trabalho

e renda para pessoas excluídas do mercado de trabalho.

No Brasil, os Empreendimentos Econômicos Solidários são relativamente

recentes. Ganharam força apenas na segunda metade da década de 1990, servindo

como instrumento de resposta ao cenário de desemprego e exclusão social presente

no país, assumindo em geral a forma de cooperativa ou associação produtiva, sob

diferentes modalidades autogestionárias (SINGER, 2002).

De acordo com Gaiger, o conceito de EES “ [...] compreende as diversas

41

modalidades de organização econômica, originadas da livre associação de

trabalhadores, nas quais a cooperação funciona como esteio para sua eficiência e

viabilidade” (GAIGER, 2009, p. 181).

A cooperação no trabalho, portanto, seria a alavanca que torna os EES superiores ao trabalho artesanal e individualizado dos pequenos produtores autônomos, bem como mais produtivos do que as empresas convencionais de mesmo porte. (GAIGER, 1999, p. 5)

De acordo com Gaiger (2009), a presença desses empreendimentos solidários

tem se verificado em setores da produção, prestação de serviços, comercialização e

crédito. Essas empresas adotam arranjos coletivos na posse dos meios de produção,

no processo de trabalho e na gestão, em proporção variável, minimizando as relações

assalariadas.

Sobre os EES, também expõe Andion (2005, p. 82):

Estas organizações atuam em setores diversos, tais como saúde, educação, transporte, lazer, desenvolvimento urbano, proteção do meio-ambiente, serviços domésticos, alimentação, defesa de direitos, etc. e têm como objetivo comum a promoção do interesse geral. Podem assumir também formas jurídicas e nomenclaturas diferenciadas, já que seu surgimento está ligado à formação institucional e à dinâmica presente em cada sociedade.

As organizações de Economia Solidária, portanto, assumem formas flexíveis,

que variam de acordo com as estruturas legais dominantes e da configuração social

existente, " [...] mas todas elas surgem e se desenvolvem a partir da iniciativa da

sociedade civil organizada" (ANDION, 2005, p. 84). Assim, nesses empreendimentos

a propriedade dos bens de produção é coletiva, ao contrário das Empresas

Tradicionais.

Diniz (2007) explica que a maioria dos empreendimentos solidários

formalmente constituídos, adquirem personalidade jurídica como cooperativas, uma

vez que os ideais cooperativistas e os da Economia Solidária são correspondentes.

Além disso, esse modelo assegura “condições jurídicas mínimas para que a

autogestão democrática possa ser estabelecida, como a singularidade de voto,

independente do capital integralizado e a publicidade dos atos de administração”

(DINIZ, 2007, p. 41).

42

França Filho (2007), também elucida que os EES podem alinhar diferentes

experiências ou categorias, que mostram as diferentes práticas de Economia

Solidária.

Por exemplo, as finanças solidárias envolvem experiências de bancos populares, cooperativas de crédito e, mais recentemente, os bancos comunitários. Existem, também, as iniciativas que participam de uma categoria mais conhecida como comércio justo, além do segmento do chamado cooperativismo popular, expressão talvez majoritária no campo dos empreendimentos solidários. Deve-se incluir, ainda, iniciativas como os clubes de troca, que são formas muito específicas de práticas de economia solidária, constituindo uma categoria que poderíamos definir como uma “economia sem dinheiro”. (FRANÇA FILHO,2007, p. 163-164)

Conforme Gaiger (2009), tais empreendimentos inscrevem-se numa nova

racionalidade produtiva, baseada na solidariedade, que busca gerar resultados

materiais efetivos e ganhos extra econômicos. O trabalho associado, age em benefício

dos próprios produtores e apresenta uma noção mais ampla de eficiência, que inclui

a qualidade de vida dos trabalhadores e a satisfação de objetivos culturais e ético-

morais.

Assim, os EES rejeitam a contradição entre interesses econômicos e questões

sociais, atribuídos respectivamente ao mercado privado e ao Estado, bem como o

estabelecimento de fronteiras entre tempo de trabalho produtivo e tempo de satisfação

das necessidades. “Sua razão de ser consiste no atendimento às necessidades

materiais de seus membros, assim como às suas aspirações não-monetárias, como

reconhecimento, inserção social, autonomia, etc.” (GAIGER, 2009, p. 184).

Apesar da pluralidade de configuração dos Empreendimentos Econômicos

Solidários, Andion (2005) apresenta algumas características comuns a esse tipo de

organização:

A criação de uma organização deste tipo está sempre ligada a uma demanda

social ou problemática precisa. Assim, a riqueza coletiva que é gerada pelo

empreendimento não é medida pelos produtos e serviços por ele gerados, mas

pela sua constribuição à sociedade ou a coletivo mais restrito.

Essas organizações exprimem a capacidade de transformação, pelos

cidadãos, da realidade em que vivem. Assim, são caracterizadas como

espaços enraizados na esfera pública. Seus membros, negociam

cotidianamente para promover uma ação coletiva que vise o interesse geral.

43

Assim, operam a transição entre as esferas privada e pública, se constituindo

em comunidades políticas locais.

A proximidade e reciprocidade entre seus membros, redefinem as relações

econômicas existentes nesses empreendimentos. É possível perceber a

participação de diversos atores, voluntários ou assalariados, gestores ou

usuários, que atuam coletivamente na gestão desses grupos e na oferta e

demanda dos bens e serviços. Essa participação permite que se estabeleça

conjuntamente preço e qualidade, além da ampliação do acesso aos bens

produzidos.

A diferenciação no preço e formas de pagamento, se baseiam na mistura de

diferentes fontes de financiamento. Os recursos provenientes da venda de

produtos e serviços; recursos provenientes do financiamento do Estado e de

outras agências financiadoras; além dos recursos não-monetários, resultantes

do voluntariado, que se combinam, permitindo assim, mais flexibilidade e a

continuidade dessas organizações ao longo do tempo.

Andion (2005), aponta que a principal particularidade das organizações de

Economia Solidária, refere-se não somente a sua organização interna, mas ao fato de

que visam produzir observando as relações entre o sistema e o meio. Assim,

ultrapassam a problemática organizacional, podendo ser compreendidas como

intermediárias entre as esferas solidária, econômica e política. Observar essa tripla

configuração é essencial para compreender o papel que essas organizações

assumem onde atuam.

Desta maneira, essas organizações assumem, ao mesmo tempo, funções de espaços produtivos, geradores de bens, serviços e empregos; de espaços de proximidade, geradores de socialização; e de espaços públicos, geradores de reflexão e de ações políticas. (ANDION, 2005, p. 85)

Para compreender como os Empreendimentos Econômicos Solidários exercem

sua função social, serão analisadas a seguir suas relações com os aspectos internos

e externos relacionados ao exercício do princípio constitucional referido.

44

4.2 DIMENSÕES DA FUNÇÃO SOCIAL

4.2.1 Relações internas: funcionários e administradores

Há duas questões imprescindíveis para abordar em relação aos funcionários e

administradores dos Empreendimentos Econômicos Solidários. A primeira questão se

refere à forma organizativa dos EES, que praticam autogestão. A outra, trata de serem

uma alternativa para reinserção de desempregados e excluídos sociais à produção

econômica. Ambas questões serão melhor expressas adiante.

De acordo com Singer (2002), a desigualdade não é algo natural, mas sim

resultante da forma como se organizam as atividades econômicas. O capitalismo é

um modo de produção baseado no direito de propriedade individual aplicado ao capital

e no direito à liberdade individual. Assim, acaba por dividir a sociedade em duas

classes: a classe dos proprietários do capital e a classe que sobrevive vendendo sua

força de trabalho à outra.

A Economia Solidária baseia-se, ao contrário, na propriedade coletiva ou

associada do capital e no direito à liberdade individual. Dessa forma, une todos os

que produzem numa única classe de trabalhadores, que possuem por igual o capital

em cada sociedade econômica ou cooperativa. Assim, da solidariedade resulta a

igualdade. Conforme Singer “se toda economia fosse solidária, a sociedade seria

muito menos desigual” (SINGER, 2002, p.10).

Como explica Singer (2002), o maior diferencial das empresas solidárias trata

da forma democrática com que são administradas. Os EES praticam autogestão.

Nesse sentido se apresenta a seguinte definição:

É gestão que consiste na autonomia da coletividade dos membros da empresa de decidir sobre os destinos, os processos e os resultados do trabalho. Suas ideias gerais são: fim do assalariamento; organização do trabalho com base na gestão democrática; eliminação da hierarquia; decisões tomadas por democracia direta. (NÚCLEO DE GESTÃO; BARBIERI; RUFINO, 2007, p. 17)

Quando o EES é pequeno, todas as decisões são tomadas em assembleias,

que podem ocorrer sempre que houver necessidade. Quando a empresa solidária é

grande, devido à dificuldade de organizar uma discussão significativa entre um grande

número de pessoas, os sócios elegem delegados por seção ou departamento, que

são incumbidos de deliberar em nome de todos. As decisões rotineiras são de

45

responsabilidade de encarregados e gerentes, escolhidos pelos sócios ou por uma

diretoria eleita por estes. Conforme esclarece Singer:

Em empresas solidárias de grandes dimensões, estabelecem-se hierarquias de coordenadores, encarregados ou gestores, cujo funcionamento é o oposto do de suas congêneres capitalistas. As ordens e instruções devem fluir de baixo para cima e as demandas e informações de cima para baixo. Os níveis mais altos, na autogestão, são delegados pelos mais baixos e são responsáveis perante os mesmos. A autoridade maior é a assembleia de todos os sócios, que deve adotar as diretrizes a serem cumpridas pelos níveis intermediários e altos da administração. (SINGER, 2002, p. 18)

De acordo com Gaiger (1999), as micro e pequenas empresas dividem com os

EES as mesmas fatias de mercado, além de apresentar estruturas produtivas

semelhantes com modesto padrão tecnológico, poucos recursos para sua

reconversão, subordinação a empresas maiores e outros agentes econômicos,

atuação em pequena escala, etc. No entanto, se diferenciam dos EES por serem

negócios por conta própria, com mão de obra assalariada ou de cunho familiar, em

condições muitas vezes precárias.

Nas empresas solidárias o trabalho desempenha um papel central, como fator

produtivo preponderante dos empreendimentos. Por essa razão, a proteção aqueles

que detêm a capacidade de trabalho e se associam, torna-se vital. Assim, o trabalho

solidário é o maior trunfo que estabelece eficiência com efeitos diferenciais em relação

as formas de organização produtiva convencionais, garantindo, dessa forma,

vantagens para os EES, frente aos concorrentes (GAIGER, 1999).

Já Singer, afirma que “a autogestão tem como mérito principal não a eficiência

econômica (necessária em si), mas o desenvolvimento humano que proporciona aos

praticantes” (SINGER, 2002, p. 21). Explica, além disso, que “participar das

discussões e decisões do coletivo, ao qual se está associado, educa e conscientiza,

tornando a pessoa mais realizada, autoconfiante e segura” (SINGER, 2002, p. 21).

No entanto, para que a autogestão se realize de fato, é necessário que todos

os sócios se informem a respeito do que acontece na empresa e das alternativas

disponíveis. Ou seja, a prática da autogestão exige um esforço adicional dos

trabalhadores, pois, além de cumprir as tarefas inerentes a seu cargo, cada

trabalhador deve se preocupar com os problemas gerais da empresa solidária. “Esse

esforço adicional produz ótimos resultados quando se trata de envidar mais esforços

46

para cumprir um prazo, eliminar defeitos de um produto ou para atingir algum outro

objetivo que todos desejam “ (SINGER, 2002, p. 19).

Justamente por todos estarem informados do que acontece, se possibilita a

cooperação inteligente entre os sócios, que sabem o que está em jogo, e não veem

necessidade de competição para saber quem é o melhor (SINGER, 2002). Dessa

forma, o caráter participativo e autogestionário dos empreendimentos é que sustenta

o empenho dos trabalhadores, que além do mais são detentores do capital.

Na empresa solidária, os sócios não recebem salários, mas sim ‘retiradas’, que

variam conforme a receita obtida. Em assembleia é decidido coletivamente por eles

se essas retiradas devem ser iguais ou diferenciadas.

Há empresas em que a maioria opta pela igualdade das retiradas por uma questão de princípio ou então porque os trabalhos que executam são idênticos, ou quase. Mas a maioria das empresas solidárias adota certa desigualdade das retiradas, que acompanha o escalonamento vigente nas empresas capitalistas, mas com diferenças muito menores, particularmente entre trabalho mental e manual. Muitas empresas solidárias fixam limites máximos entre a menor e a maior retirada. (SINGER, 2002, p. 12)

Conforme explica Singer (2002), variam de empresa para empresa as razões

que levam a maioria dos cooperadores a aceitar certa desigualdade das retiradas. Em

alguns casos, a maioria acha natural que certos trabalhos sejam melhores

remunerados que outros em razão da hierarquia profissional a que foram

acostumados. Em outros, a maioria opta pela desigualdade de retiradas para manter

a colaboração de cooperadores mais qualificados, que poderiam ser melhor

remunerados em empresas capitalistas, e, que ajudam a cooperativa a alcançar

ganhos maiores, beneficiando todo conjunto de sócios, inclusive os com menores

retiradas.

De acordo com Singer (2002), essas situações foram teorizadas pelo filósofo

John Rawls, que defende que é tolerável alguma desigualdade, desde que esta sirva

para melhorar a situação dos menos favorecidos.

Nas cooperativas de Economia Solidária, o excedente anual ou sobras também

têm sua destinação decidida pela assembleia de sócios. Singer (2002), explica que

parte dessas sobras é colocada em um fundo de educação dos próprios sócios ou de

pessoas que poderão vir a formar cooperativas. Outra parte vai para fundos de

investimento, que podem ser divisíveis ou indivisíveis. O restante é distribuído entre

47

os sócios, em dinheiro, por meio de algum critério aprovado pela maioria, seja, por

igual, pelo tamanho da retirada, pela contribuição dada à cooperativa etc.

Singer afirma que, “a autogestão promete ser eficiente em tornar empresas

solidárias, além de economicamente produtivas, centros de interação democráticos e

igualitários (em termos), que é o que seus sócios precisam” (SINGER, 2002, p. 23).

Outra questão fundamental nos EES é o oferecimento de uma alternativa de

emprego e renda para os desempregados, excluídos sociais ou ameaçados de o

serem. Conforme exposto anteriormente, justamente a escassez de trabalho é que

propiciou o surgimento das primeiras cooperativas de Economia Solidária, em um

contexto em que a propagação do uso das máquinas e a crescente industrialização

desempregaram os artesãos. Posteriormente, de acordo com Morais (2010), também

o cenário de desemprego acentuado a partir da década de 1980, abriu espaço para o

ressurgimento das práticas de ES.

Singer (2002), também elucida essa questão, afirmando que grande parte dos

trabalhadores busca nas empresas solidárias um meio de se reinserir à produção

social e escapar da pobreza. Essa afirmação se sustenta com os dados do segundo

Mapeamento Nacional de Empreendimentos Econômicos Solidários do Sistema de

Informações em Economia Solidária. Dos 19.708 EES registrados, 9.106 deles (46,2%

do total), citaram a ‘alternativa ao desemprego’, como razão pela qual o

empreendimento foi criado (SIES, 2013).

De fato, os Empreendimentos Econômicos Solidários são capazes de

proporcionar por meio da geração de empregos, resgate da dignidade humana e da

cidadania das pessoas que se encontram excluídas do mercado de trabalho, e em

decorrência, sentem-se excluídas socialmente (GONÇALVES; SOBRINHO, 2011).

Desse modo, estas organizações apresentam uma função social clara em

benefício de seus membros, que são sócios-proprietários e trabalhadores,

substituindo a figura de administradores e funcionários de uma Empresa Tradicional,

que além do mais, administram o empreendimento por meio da gestão democrática e

da cooperação, e, dividem os excedentes de forma igualitária.

4.2.2 Relações externas: consumidores e meio ambiente

Segundo explica Morais, “ [...] é possível incorporar, entre as principais

características da Economia Solidária, a questão ambiental e a sustentabilidade como

48

partes inerentes de suas propostas e de seu modelo de desenvolvimento” (MORAIS,

2010, p. 67). Por meio da autogestão, cooperação e da relação com a sociedade, seja

local, regional ou nacional, é possível fomentar práticas autossustentáveis, que levem

adiante a produção de bens e serviços com responsabilidade socioambiental.

De acordo com Morais (2010), os valores da Economia Solidária podem

contribuir também com a necessidade de se repensar o padrão de produção e

consumo brasileiro, possibilitando uma mudança na atitude consumista, por meio do

comércio justo e solidário. Assim, a relação com os consumidores e com o meio

ambiente se entrelaçam na proposta das empresas solidárias.

Para Cotera e Ortiz “comércio justo é o processo de intercâmbio de produção-

distribuição-consumo, visando a um desenvolvimento solidário e sustentável”

(COTERA; ORTIZ, 2009, p. 60). Esse desenvolvimento possibilita melhores condições

em todos os níveis do processo, como por exemplo, “preço justo para os produtores,

educação para os consumidores e desenvolvimento humano para todos e todas,

respeitando os direitos humanos e o meio ambiente de forma integral” (COTERA;

ORTIZ, 2009, p. 60). Assim:

Pode-se definir o comércio justo como a relação de troca econômica e ética entre produtores responsáveis e consumidores éticos, orientados ao desenvolvimento humano integral solidário. Em sua base, está o trabalho por uma economia justa e solidária. (COTERA; ORTIZ, 2009, p. 60)

Cotera e Ortiz (2009), explicam que a proposta originária de comércio justo foi

no âmbito internacional, propondo que fossem substituídas as relações de assistência

entre países importadores do Norte e produtores do Sul, por relações de solidariedade

no nível das trocas econômicas. Posteriormente, “o conceito de comércio justo

ampliou- se, estendendo essa definição ao comércio praticado internamente nos

países, revalorizando o mercado local (e não só a exportação) ” (COTERA; ORTIZ,

2009, p. 60).

Deste conceito deriva o comércio justo e solidário, enquanto prática comercial

diferenciada pautada nos valores de justiça social e da solidariedade realizada por

Empreendimentos Econômicos Solidários (SENAES/MTE, 2013).

É cada vez mais reconhecida a multifuncionalidade do comércio justo e

solidário, que não deve ser analisado apenas como estratégia de comercialização,

mas também como meio para a promoção da produção local permanente e

49

sustentável, para a geração de empregos, para a mobilização de valores ético-

culturais, para estabelecer equidade entre homens e mulheres e entre gerações, bem

como para promover desenvolvimento a partir do espaço local. “O poder

transformador do comércio justo permite estabelecerem-se outros tipos de relações

entre produtores e consumidores, baseados na equidade, na cooperação, na

confiança e no interesse compartilhado” (COTERA; ORTIZ, 2009, p. 63).

Cotera e Ortiz (2009) apresentam como princípios do comércio justo:

a) Criar novas formas de trocas econômicas, baseadas na solidariedade, que

visam o desenvolvimento justo e sustentável dos territórios e seus

habitantes;

b) Trocas baseadas na cooperação, confiança, transparência na informação e

relações justas e duradouras;

c) Incorporação de custos sociais e ambientais à sustentabilidade das trocas,

os quais se supõe que sejam assumidos conscientemente pelos produtores

e consumidores;

d) Estabelecer uma relação mais direta e solidária entre produtores e

consumidores, não apenas como mecanismo para baratear o preço dos

produtos, mas também como um processo de socialização que visa

construir um mundo responsável e sustentável;

e) Humanizar o processo comercial, integrando-se a uma visão da economia

centrada na pessoa e não apenas como foco nas trocas mercantil e

monetária.

O comércio justo possui diversos objetivos, sendo o primeiro deles, a evolução

das práticas comerciais em direção à sustentabilidade e a incorporação dos custos

sociais e ambientais, trazendo conscientização para as pessoas e para as legislações

nacionais e internacionais. Por meio dessa consciência, o consumidor exerce o seu

poder de compra de forma ética, atuando em favor de trocas mais justas (COTERA;

ORTIZ, 2009).

Outro objetivo é promover a igualdade de gênero e entre gerações para

incentivar a participação humana integral, mediante relações equitativas, bem como

propiciar a expressão das culturas e valores locais, buscando o reconhecimento de

que os produtos não têm somente o valor de troca, mas também, expressam

características da realidade e da cultura de quem os produz (COTERA; ORTIZ, 2009).

50

Para que se desenvolva o comércio justo, é necessário que a relação entre

produtores e consumidores seja a mais direta possível, reduzindo-se a intervenção

dos intermediários convencionais. Além disso, a troca deve ser realizada a um preço

justo tanto para consumidores, quanto para que haja condições de desenvolvimento

sustentável dos grupos de produtores (COTERA; ORTIZ, 2009).

Segundo a Política Nacional de Economia Solidária (SENAES/MTE, 2013), a

certificação solidária trata dos requisitos e exigências específicas que atestam a

prática do comércio justo e solidário realizada por um EES, destacando determinados

atributos para que os produtos sejam reconhecidos pelo consumidor. Para ter adesão

ao serviço de certificação solidária no Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário

(SCJS), as empresas devem seguir alguns princípios:

Integração dos elos da cadeia produtiva: estimulando maior aproximação entre

todas as pessoas, empreendimentos e entidades a ela ligadas garantindo a

reflexão e debate acerca dos pressupostos do comércio justo e solidário.

Condições justas de produção, agregação de valor e comercialização:

garantindo circunstâncias dignas de trabalho e remuneração, o equilíbrio e

respeito nas relações entre os diversos atores, objetivando à sustentabilidade

econômica, socioambiental e a qualidade do produto ao longo de toda a cadeia

produtiva.

Apoio ao desenvolvimento local territorial e sustentável: promovendo, por meio

da comercialização a inclusão social, através de ações geradoras de trabalho

e renda, da manutenção e recuperação da biodiversidade.

Respeito ao meio ambiente. Restrição a utilização de substâncias nocivas à

saúde humana, ao meio ambiente e aos animais, e estimular produção limpa:

primando por práticas mais responsáveis e menos prejudiciais ao meio

ambiente.

Informação e proteção dos (as) consumidores (as): através da transparência

nas relações de produção, comercialização e consumo, com garantia ao direito

dos consumidores e educação para o consumo solidário.

Conforme já exposto, o comércio justo também visa a educação dos

consumidores para um consumo solidário.

51

Consumo solidário significa consumir bens ou serviços que atendam às necessidades e desejos do consumidor, visando: a) realizar o seu livre bem viver pessoal; b) promover o bem viver dos trabalhadores que elaboram, distribuíram e comercializaram aquele produto ou serviço; c) manter o equilíbrio dos ecossistemas; d) contribuir para a construção de sociedades justas e solidárias. (MANCE, 2002, p. 1)

Mance (2002), explica que este conceito sucedeu à noção de consumo crítico,

desenvolvido nas últimas décadas com origem nos movimentos ecológicos e de

defesa dos consumidores. Entretanto, esclarece que ambos conceitos diferem, pelo

fato que somente é chamado de solidário o consumo de produtos e serviços oriundos

de EES.

Em suma, o consumo solidário é aquele praticado não apenas objetivando o

próprio bem-estar, mas também o bem coletivo, preocupando-se com o trabalhador

que produziu o produto ou serviço, bem como com a preservação ambiental. Trata-

se assim do consumo que dá preferência aos produtos provenientes de

empreendimentos solidários em detrimento dos produtos de empresas que exploram

os trabalhadores e degradam o meio-ambiente. Este também contribui para a geração

de postos de trabalho, para preservar o equilíbrio dos ecossistemas e para melhorar

a renda de todos os participantes das redes solidárias, combatendo assim, a exclusão

social e a degradação ambiental (MANCE, 2002).

O consumo solidário dos produtos e serviços possibilita que os EES vendam

toda a sua produção, o que aumenta as possibilidades de reinvestimento coletivo dos

excedentes alcançados na implantação de outros empreendimentos, criando-se

assim novos postos de trabalho e possibilitando a produção de novos produtos ainda

não comercializados. Isso acaba por assegurar maior variedade e qualidade no

oferecimento de bens e serviços aos consumidores, bem como uma maior distribuição

de renda devido ao aumento de pessoas no processo produtivo, o que por sua vez

propicia um aumento na demanda por produtos finais, preservando-se assim o

equilíbrio dos ecossistemas (MANCE, 2002). Dessa forma:

A difusão desse consumo possibilitaria aos empreendimentos a venda de toda a sua produção e a geração de excedentes que, reinvestidos coletivamente, permitiriam montar novos empreendimentos autogeridos, remontando as cadeias produtivas e expandindo as redes, diversificando as ofertas e ampliando o seu número de consumidores. (MANCE, 2002, p. 4)

52

Assim, com a integração entre consumidores e produtores de forma

colaborativa, por meio da criação de redes de comercialização solidária, a ES

apresenta uma nova forma de se produzir e consumir, capaz de promover

desenvolvimento econômico, ambientalmente sustentável e socialmente justo,

contrapondo as relações comerciais e a concorrência tradicionais, de forma que todos

ganhem.

Em síntese, os EES promovem relações mais justas, transparentes e

duradouras entre produtores e consumidores por meio do comércio justo e solidário,

no qual as trocas econômicas baseiam-se na solidariedade e visam um

desenvolvimento que garanta a preservação do meio ambiente.

Por fim, destaca-se também o fato de que neste tipo de comercialização busca-

se uma elevação do processo de consciência dos consumidores, e, estimula-se a

prática de consumo solidário, que acaba por colaborar com a sustentabilidade do

empreendimento, garantindo a geração de emprego e renda.

53

5 NEGÓCIOS SOCIAIS

5.1 OS NEGÓCIOS SOCIAIS

De acordo com Ashoka Empreendedores Sociais (2006), em um contexto

marcado por desequilíbrios, pela exclusão social e pelo desemprego, algumas

empresas perceberam que as estratégias do negócio além de gerar recursos para a

própria organização poderiam beneficiar também o seu público.

Assim, nas últimas décadas a ideia de Negócio Social (NS) passou a fazer

sentido em organizações atuantes em diversas áreas. Conforme expõe a especialista

em Negócios Sociais, Vivianne Naigeborin, estes

são modelos que buscam desenvolver soluções de mercado que possam contribuir para superar alguns dos grandes problemas sociais e ambientais que o mundo enfrenta. Onde o lucro não é um fim em si mesmo, mas um meio para gerar soluções que ajudem a reduzir a pobreza, a desigualdade social e a degradação ambiental. (NAIGEBORIN, 2010, p. 1)

Nesse contexto, Naigeborin (2010) aponta que, juntamente com a tendência

dos NS, surgem os seguintes atores da sociedade:

1. Empreendedores e lideranças sociais: que encontram nestes modelos um

meio de garantir autonomia financeira em sua intervenção social, gerando

receitas para a organização e para o público beneficiário de suas ações.

2. Empreendedores de negócios e executivos: que realizados financeiramente

em seus negócios tradicionais decidem utilizar seus talentos para criar

negócios que combinam impacto social e lucro.

3. Empresas interessadas em desenvolver negócios com a base da

pirâmide: que desejam oferecer produtos para uma população ainda não

atendida pelo mercado.

4. Investidores de risco: que buscam nichos inovadores e investem visando

lucros e a geração de impacto social ou ambiental positivos.

5. Investidores filantrópicos: que desejam o retorno de sua doação, não pelo

lucro, mas para reinvestirem em causas sociais.

6. Empreendedores da nova geração: que se veem insatisfeitos com os

modelos tradicionais que separam as ações sociais positivas da ideia de

54

lucratividade, e criam modelos híbridos, integrando a geração de lucros ao

benefício social.

Por se tratar de um novo campo de negócios ainda em experimentação, é

possível encontrar várias nomenclaturas e definições acerca dos NS. A esse respeito,

Tiscoski, Rosolen e Comini esclarecem:

A diversidade de nomenclaturas e conceitos ao redor do tema pode ser explicada principalmente pela variedade de realidades em que estes empreendimentos sociais se formam, dados os contextos econômicos, sociais e políticos de cada região. Ademais, como o tema origina de diversos segmentos da sociedade, surgem também concepções particulares ligadas à visão de cada setor sobre o conceito. (TISCOSKI; ROSOLEN; COMINI, 2014, p. 2)

Nesse sentido, diversas organizações têm colaborado para a conceituação

desse novo modelo de negócio. Algumas dessas nomenclaturas e respectivas

definições podem ser observadas no Quadro 1, adiante.

Conforme esclarecem Tiscoski, Rosolen e Comini (2014), nos países

emergentes passaram a ser frequentemente utilizados os termos negócios sociais e

negócios de impacto social, que neste trabalho, serão empregados como sinônimos.

Conforme se extrai das seguintes ponderações:

A importância atribuída à solução de problemas sociais, principalmente envolvendo a pobreza, por meio da utilização de mecanismos de mercado fez com que o termo negócio social ganhasse mais espaço na realidade dos países em desenvolvimento. Assim, essa terminologia passa a ser mais frequente no Brasil e em outros países latino-americanos, além de outras variações como negócios com impacto social ou negócios socioambientais. (TISCOSKI; ROSOLEN; COMINI, 2014, p.5)

O termo Negócio Social ganhou notoriedade, por meio de Muhammad Yunus,

economista e banqueiro nascido em Bangladesh, em 1940, ganhador do Prêmio

Nobel da Paz em 2006. Yunus, após estudar na Universidade de Vanderbilt nos EUA,

retornou para seu país em 1972 como chefe do Departamento de Economia da

Universidade de Chittagong. Quatro anos depois, começou a fazer experiências

fornecendo pequenos empréstimos sem as garantias e exigências dos bancos

tradicionais e a juros muito menores. O projeto foi chamado de Grameen Bank e em

1983 tornou-se um banco oficial, que fornecia empréstimos aos pobres,

principalmente mulheres na zona rural de Bangladesh (YUNUS; JOLIS, 2006).

55

As mulheres ajudadas por Yunus viviam em um ciclo de miséria, presas a

agiotas locais. Por meio dos empréstimos concedidos a juros baixos, essas moradoras

da zona rural puderam pagar suas dívidas e começar pequenos negócios.

Posteriormente, os empréstimos eram pagos, gerando novas possibilidades de crédito

(YUNUS; JOLIS, 2006).

Inspirado pelo impacto positivo que podia ser gerado por uma pequena

quantidade de dinheiro, o professor Yunus fundou o Grameen Bank, com a finalidade

de oferecer microcrédito para pessoas que não teriam acesso a capital em bancos

comerciais tradicionais (YUNUS; JOLIS, 2006). Com o sucesso dessa experiência o

conceito de NS passou a ser difundido.

Quadro 1 – Nomenclaturas e definições acerca do modelo de Negócios Sociais

Nomenclatura Autor Definição

Negócios Sociais

Yunus

São empresas que têm a única missão de solucionar um problema social, são autossustentáveis financeiramente e não distribuem dividendos. O sucesso do negócio não é medido pelo lucro gerado em determinado período, mas sim pelo impacto socioambiental criado.

Negócios de Impacto Social

Sebrae

São organizações com o objetivo de causar impacto positivo em uma comunidade, ampliando as perspectivas de pessoas marginalizadas pela sociedade, aliada à possibilidade de gerar renda compartilhada e autonomia financeira para os indivíduos de classe baixa. Sua existência se justifica na busca para a solução de uma questão social, ambiental ou para ampliar um impacto socioambiental já produzido.

Negócios de Impacto Social

Artemisia

São empresas que oferecem, de forma intencional, soluções escaláveis para problemas sociais da população de baixa renda.

Negócios 2.5

INEI

São os empreendimentos ao mesmo tempo sociais e comerciais, cujo negócio tem fins lucrativos e, simultaneamente, busca o desenvolvimento social e ambiental sustentável.

Fonte: elaboração própria, com base em Yunus (2016); Sebrae (2016b); Artemisia (2016); INEI (2016).

Segundo Yunus (2016), os NS, assim como uma Organização Não

Governamental (ONG), possuem missão social e como uma Empresa Tradicional

56

geram receitas suficientes para cobrir seus custos. Assim, tratam-se de organizações

híbridas, que se situam no chamado setor 2.5, entre o segundo e terceiro setor. A

esse respeito, Oliveira e Vasconcellos (2011, p. 8) explicam que:

[...] setor 2.5 é aquele que engloba os negócios sociais ou inclusivos. É assim denominado por congregar entidades que possuem natureza jurídica lucrativa, típica do segundo setor, mas com finalidade de interesse público, este presente tanto no primeiro quanto no terceiro setores [...].

As diferenças entre os negócios de impacto social e os negócios do segundo e

terceiro setor é melhor expressa no Quadro 2 a seguir:

Quadro 2 – Semelhanças e diferenças entre Negócios Sociais e o segundo e terceiro setor

Semelhanças Diferenças

Segundo setor - Possuem a mesma natureza jurídica, ou seja, são organizações constituídas sob a forma de empresas (em geral, sociedades limitadas). - Ambos os setores não podem usufruir de isenções ou imunidades de tributos. - Devem buscar a autossuficiência dos recursos e se desenvolver, e, para tanto, precisam cobrar por seus produtos e serviços.

- O princípio da maximização dos lucros é substituído pelo princípio do benefício social, e, para tanto, é necessário reinvestir os lucros na expansão do negócio social, no desenvolvimento dos produtos/serviços, bem como na redução dos custos. - Devem buscar gerar pouco ou nenhum dividendo para os investidores.

Terceiro setor - Ambos visam à consecução de objetivos de interesse social, e, para tanto, devem reinvestir os lucros na expansão do negócio social. - Ambos devem buscar a eficiência gerencial característica do segundo setor para otimizar o benefício social de suas atividades.

- Em caso de sucesso do negócio social seus investidores podem receber o capital investido de volta, possibilitando que o mesmo recurso seja reinvestido e traga ainda mais benefício social. - O negócio social possui maior liberdade de atuação por estar inserido em um ambiente de menor regulação, todavia, não pode usufruir de imunidades e isenções de tributos reservadas às entidades do terceiro setor.

Fonte: Adaptado (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2011, p. 9).

É importante esclarecer que por se tratar de “um modelo ainda em construção

no Brasil, ainda não existe legislação específica para negócios sociais, e estas

iniciativas devem ser estruturadas sobre modelos jurídicos já existentes” (OLIVEIRA;

VASCONCELLOS, 2011, p. 9). De acordo com a Força-Tarefa Brasil de Finanças

57

Sociais (FTFS), no Brasil existem diferentes formatos de organizações utilizados pelos

NS. Destacam-se os seguintes:

1 – Organizações da sociedade civil com atividades de geração de receita e que podem receber doações, mas não podem distribuir lucros. 2 – Negócios Sociais com formato jurídico de empresa e que visam ao lucro, mas que reinvestem esses recursos inteiramente nos negócios. 3 – Negócios de Impacto que distribuem lucros a seus investidores. O retorno sobre o capital investido (filantrópico ou comercial) não é, portanto, um princípio para os Negócios de Impacto. Essa distribuição, deve, contudo, ser pactuada com o investidor. (FTFS, 2015, p. 8)

Apesar dessa diversidade de formatos há 4 princípios que caracterizam os

negócios de impacto social, independentemente da constituição jurídica da

organização:

1. Seu propósito de gerar impacto socioambiental positivo está explícito na

sua missão;

2. Conhecem, mensuram e avaliam o impacto gerado periodicamente;

3. Têm uma lógica econômica que permite a geração de receita própria;

4. Possuem uma governança que leva em consideração os interesses de

investidores, clientes e a comunidade. (FTFS, 2016)

De acordo com Yunus (2016), os NS apresentam os seguintes princípios:

O objetivo do negócio é a redução da pobreza ou mais problemas que

ameaçam as pessoas e a sociedade (como saúde, educação, acesso à

tecnologia e meio ambiente); não a maximização dos lucros;

São financeira e economicamente viáveis;

Investidores recebem de volta somente o valor investido;

Depois de recuperado o investimento, o restante do lucro fica na

empresa para ampliação e melhorias;

São ambientalmente conscientes;

Colaboradores recebem o valor de mercado e melhores condições de

trabalho.

Já a Artemisia (2016), organização pioneira na disseminação e no fomento de

negócios de impacto social no Brasil, lista as seguintes características principais

referentes a esse modelo:

58

Foco na baixa renda: são desenhados de acordo com as necessidades e

características da população de baixa renda.

Intencionalidade: têm a missão explícita de causar impacto social e são

geridos por empreendedores éticos e responsáveis.

Potencial de escala: podem ser disseminados por outros empreendedores,

organizações e políticas públicas.

Rentabilidade: não dependem de doações ou subsídios.

Impacto social relacionado à atividade principal: o produto ou serviço

oferecido gera de forma direta impacto social.

Distribuição ou não de dividendos: o negócio pode ou não distribuir

dividendos aos acionistas.

Dessa forma, percebe-se que são inerentes aos conceitos de Negócios Sociais

ou negócios de impacto social, a intencionalidade de gerar impacto socioambiental

positivo, o foco na população de baixa renda e a sustentabilidade financeira. No

entanto, as definições divergem quanto à distribuição ou não de dividendos. A esse

respeito, há duas correntes de pensamento, conforme exposto a seguir:

Muhammad Yunus, economista pioneiro em usar o termo, fundador do Grameen Bank e ganhador do prêmio Nobel da Paz em 2006, defende que os investidores só podem recuperar o capital investido, sem direito a lucro e dividendos. Segundo ele, o lucro deve ser totalmente reinvestido na empresa e destinado à ampliação dos benefícios socioambientais. Outra corrente mais ampla, representada por Stuart Hart e Michael Chu, professores estudiosos do tema das Universidades de Cornell e Harvard, nos Estados Unidos, defende a distribuição de lucro por entender que isso possibilita atrair mais investidores e permite a criação de novos negócios na velocidade necessária para superar os desafios sociais existentes no mundo. (SEBRAE, 2016a, p. 26)

A Força-Tarefa Brasil de Finanças Sociais destaca que a divisão ou não de

dividendos entre seus acionistas, depende tanto da missão do negócio de impacto

como de sua forma legal (FTFS, 2015).

Segundo o Sebrae (2016a, p. 24), “um negócio pode ou não distribuir

dividendos a acionistas, não sendo, porém, esse um critério para definir negócios de

impacto social”. No entanto, Naigeborin (2010, p. 8), ressalta que “em qualquer um

dos casos, o importante é assegurar que, em um negócio social a prioridade seja

sempre o impacto social e não a maximização do lucro”.

59

Em resumo, os Negócios Sociais têm como origem a intencionalidade das

organizações beneficiarem seu público além de si próprias e possuem como ideias

inerentes ao seu conceito o foco nas populações de baixa renda e redução da

pobreza, a sustentabilidade financeira e a intencionalidade de resolver problemas

socioambientais intrínseca à atividade principal. Destarte, a seguir serão

apresentadas as relações com fatores internos e externos dos NS, com o fim de

compreender mais claramente como essas organizações exercem a sua função

social.

5.2 DIMENSÕES DA FUNÇÃO SOCIAL

5.2.1 Relações internas: funcionários e administradores

Tendo em vista o levantamento teórico apresentado, “[...] é importante lembrar

que o campo de negócios sociais está em construção, o que significa que há poucas

referências e, por isso mesmo, muito ainda a ser aprendido e desenvolvido”

(NAIGEBORIN, 2010, p. 9). Isso justifica a dificuldade de se obter informações acerca

das relações internas nessas organizações.

Outra dificuldade se deve ao fato de que, “há também muitas dúvidas que

surgem em função da natureza jurídica que pode ser adotada por um negócio social:

associação, cooperativa, fundação e empresa” (SEBRAE, 2016a, p. 25). Obviamente,

em cada um desses casos a estrutura interna desses negócios é distinta. No entanto,

em todos os casos, os negócios com impacto social começaram a surgir como alternativas criativas de desenvolvimento, geração de emprego e renda, e incentivo ao empreendedorismo, ultrapassando as fronteiras da sustentabilidade para tornarem-se estratégias socioeconômicas de combate à pobreza. (ASHOKA EMPREENDEDORES SOCIAIS, 2006, p. 13)

De acordo com Oliveira e Vasconcellos (2011), as empresas de impacto social

de uma forma geral, são estruturadas sob o modelo de sociedade por ações

(sociedade anônima), ou sociedade por quotas de responsabilidade limitada, “formada

por duas ou mais pessoas que se responsabilizam solidariamente de forma limitada

ao valor de suas quotas pela integralização do capital social” (OLIVEIRA;

VASCONCELLOS, 2011, p. 10). As autoras, também esclarecem que “a estrutura

organizacional das empresas sociais é basicamente igual à das empresas hoje

60

existentes, e deve funcionar sob as mesmas regras comerciais de qualquer outro

negócio lucrativo“ (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2011, p. 11).

De acordo com Ashoka Empreendedores Sociais (2006), os NS podem tratar-

se também de organizações da sociedade civil, que igualmente visam impacto social

ou ambiental positivo, devem ser sustentáveis financeiramente e são voltadas para a

população de baixa renda. Nesses casos, nota-se que essas empresas se aproximam

da definição de Empreendimentos Econômicos Solidários, uma vez que primam pela

solidariedade e cooperação, propiciando a geração compartilhada de riqueza. Diferem

destes, no entanto, à medida que praticam heterogestão.

Em todo caso, seja qual for a configuração interna que apresente, as ideias dos

negócios de impacto estão intimamente ligadas ao objetivo de se incluir grupos de

baixa renda na cadeia produtiva de valor, seja como proprietários, sócios, parceiros,

funcionários, fornecedores ou distribuidores (SEBRAE, 2016a).

Sobre as relações de trabalho nesses negócios, de acordo com Ashoka

Empreendedores Sociais (2006), de uma forma geral, envolvem uma série de

dimensões como eficiência e produtividade, remuneração, volume e ritmo de

produção, ajuste entre oferta e demanda, capacitação de pessoas e valorização de

novas forças de trabalho.

Mas, para organizações da sociedade civil que trabalham com negócios sociais, parâmetros frequentemente subjetivos devem ser também considerados: o aumento da autoestima e da qualidade de vida, por exemplo, passam a ser indicadores da eficiência social do negócio, fundamental para sua medida de sucesso. (ASHOKA EMPREENDEDORES SOCIAIS, 2006, p. 62)

Algumas organizações de impacto social investem na capacitação de seus

funcionários, mesmo que estes não possuam experiência prévia no gerenciamento do

negócio. Outras, por sua vez, optam por contratar pessoas com experiência prévia,

no intento de acelerar e aperfeiçoar a realização do processo. Nesses casos, os novos

contratados são incumbidos de capacitar os demais funcionários. Em contrapartida, a

equipe já existente compromete-se em transmitir os valores e princípios do trabalho

da organização, de forma que se garanta o alinhamento do negócio com os propósitos

sociais que o originaram (ASHOKA EMPREENDEDORES SOCIAIS, 2006).

De qualquer forma, "sejam quais forem as relações de trabalho estabelecidas

entre a organização e a comunidade, é importante reforçar que elas devem se basear

61

em respeito, confiança e transparência" (ASHOKA EMPREENDEDORES SOCIAIS,

2006, p. 57).

Yunus (2016), aponta entre os princípios basilares dos NS que seus

colaboradores recebam como remuneração o valor de mercado, bem como as

melhores condições de trabalho. A esse respeito, Ashoka Empreendedores Sociais

(2006, p. 62) também esclarece:

Quanto ao aspecto de remuneração de produtores ou prestadores de serviço, há consenso entre a organizações de que a mão-de-obra deve ser valorizada, e muitas acreditam que o valor do trabalho deve ser determinado pela própria comunidade.

No caso dos negócios de impacto sob a forma de sociedade limitada, Oliveira

e Vasconcellos (2011, p.14) explicam que a organização “deve ter um procedimento

formal e transparente de aprovação de suas políticas de remuneração e benefícios à

equipe técnica”. As regras referentes à essas políticas devem ser divulgadas e

explicadas, e podem estar vinculadas aos resultados e metas “relacionadas, de forma

clara e objetiva, à geração de valor para as comunidades e causas onde a organização

atua, e à sustentabilidade organizacional” (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2011, p.14).

Com relação à estruturação da equipe que irá gerenciar o NS, esses

profissionais devem idealmente possuir conhecimento da área social, além de

habilidades comerciais (ASHOKA EMPREENDEDORES SOCIAIS, 2006). Também

se pressupõe que estes negócios sejam geridos por empreendedores éticos e

responsáveis (ARTEMISIA, 2016).

Ainda sobre a gestão dos empreendimentos, há uma tendência de seu formato

seja horizontal e inovador (SEBRAE, 2016a). No entanto, não é uma regra. Conforme

Naigeborin (2010, p. 8), “[...] o negócio social deve evitar criar estruturas

organizacionais muito complexas que tornem a tomada de decisões lenta e pouco

eficiente, inviabilizando seu desenvolvimento”.

No caso dos NS configurados como sociedade limitada, Oliveira e Vasconcellos

(2011), explicam que sua administração é exercida por uma diretoria, escolhida pela

maioria qualificada dos sócios.

O executivo principal – diretor da sociedade limitada, no caso – é a pessoa

responsável pela gestão da organização e atua como elo entre a equipe

técnica e o Conselho (se existente) ou sócios. A denominação da função pode

variar entre expressões como presidente executivo, secretário – geral ou

62

superintendente. O desempenho desta função implica prestação de contas

ao Conselho (ou sócios) e responsabilidade pela execução das diretrizes por

este fixadas. (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2011, p. 12)

Naigeborin (2010), ressalta que os NS não devem apenas servir a população

de baixa renda, mas também trabalhar com ela. Assim, “o campo dos negócios sociais

é fértil para o surgimento de novos modelos de governança, porque trabalha com um

novo pressuposto: que a criação de negócios deve distribuir poder entre mais – e

diferentes – pessoas” (NAIGEBORIN, 2010, p. 8). Além disso,

inovações no modelo de governança podem também ocorrer: no acordo de quotistas, no sistema de remuneração e distribuição de lucros, nos processos de tomada de decisão, na relação com clientes e stakeholders, nas políticas de transparência, etc. (NAIGEBORIN, 2010, p. 8)

Em síntese, por se tratar de um modelo ainda em construção, há pouca

literatura a respeito das relações internas nos Negócios Sociais. No entanto, em

qualquer configuração interna que se apresentem as ideias desses empreendimentos

estão intimamente ligadas ao objetivo de se incluir grupos de baixa renda na cadeia

produtiva de valor. Além disso, os NS buscam promover uma remuneração justa e

compatível com o mercado, melhores condições de trabalho, bem como podem

propiciar uma gestão democrática, horizontal e inovadora.

Os negócios de impacto social devem ter compromisso com uma governança

efetiva, e as decisões tomadas com transparência. Dessa forma, pressupõe-se que

sejam geridos por empreendedores éticos e responsáveis. Portanto, nota-se que

estas organizações possuem uma função social inerente à relação com funcionários

e administradores.

5.2.2 Relações externas: consumidores e meio ambiente

Conforme já apresentado, os NS tratam-se de novos modelos de negócio que

visam contribuir para superação de problemas sociais e ambientais, nos quais o lucro

é um meio para gerar soluções que ajudem na redução da pobreza, desigualdade

social e degradação ambiental (NAIGEBORIN, 2010). Assim, observa-se como

fundamental ao conceito a preocupação com os consumidores e meio ambiente.

No que tange aos consumidores, Oliveira e Vasconcellos (2011, p. 7)

esclarecem:

63

O negócio social é voltado, [...], para a base da pirâmide, ou seja, visa a fornecer produtos e serviços de qualidade a baixo custo, de modo a alcançar um consumidor que não possui recursos para arcar com os preços normais de mercado.

Os produtos e serviços desses negócios atendem as populações de baixa

renda. Além da classe C, as classes D e E (SEBRAE, 2016b). Conforme Prahalad

(2005), há mais de quatro bilhões de pobres no mundo vivendo com menos de US$ 2

por dia. Essa população constitui a base da pirâmide (BP) econômica mundial, e de

acordo com ele, essas pessoas podem ajudar a redefinir o que são ‘boas práticas de

negócios’.

Segundo Prahalad (2005), pensar em um negócio para a população de baixa

renda vai muito além de filantropia ou de responsabilidade social. Trata-se na verdade,

de uma forma de tornar os consumidores ativos, informados e participativos, em que

a BP deve ser um elemento fundamental da missão do negócio. Assim, “ a redução

da pobreza pode resultar da criação conjunta de um mercado centrado nas

necessidades dos pobres” (PRAHALAD, 2005, p. 8).

É preciso uma melhor forma de ajudar os pobres, que os envolva em uma parceria para inovar e atingir cenários ganha-ganha sustentáveis, dos quais sejam participantes ativamente engajados e em que, ao mesmo tempo, as empresas que os suprem de produtos e serviços obtenham lucros. (PAHALAD, 2005, p. 17)

Prahalad (2005), projeta que mais de quatro bilhões de pobres podem ser a

força de uma nova etapa global de prosperidade econômica. Para ele deve-se parar

de pensar nos pobres como vítimas e “[...] reconhecê-los como empreendedores

incansáveis e criativos e consumidores conscientes de valor” (PRAHALAD, 2005,

p.15).

Contudo, “para transformar a BP em um mercado consumidor, é indispensável

criar a capacidade de consumir. Sem dinheiro e com baixo nível de renda, o

consumidor da BP precisa ser acessado de maneira diferente” (PRAHALAD, 2005,

p.28).

Tradicionalmente cria-se capacidade de consumir entre os pobres lhes

oferecendo produtos ou serviços gratuitos. Segundo Prahalad (2005, p. 28), isso

remete a filantropia, o que “raramente resolve o problema de forma escalável e

sustentável”. Corroborando com essa ideia, Yunus e Jolis (2006, p. 282), dizem que “

64

a caridade não é absolutamente a solução para a pobreza. Ela apenas a perpetua,

retirando dos pobres a iniciativa”.

Nesse contexto, Rocha e Silva (2008), chamam atenção para o oferecimento

de crédito. Segundo eles “[...] o crédito é também uma forma de expressar identidade.

A ‘posse’ do crédito simboliza para o indivíduo e aos olhos dos demais quem ele é e

qual a sua inserção na hierarquia social” (ROCHA; SILVA, 2008, p. 93).

Assim, Prahalad (2005) sugere que levando em conta a capacidade de

consumo na BP é possível criar um mercado inteiramente novo. Nesse sentido,

expõe:

O processo tem de começar pelo respeito aos consumidores da Base da Pirâmide, como indivíduos. O processo de criação conjunta pressupõe que os consumidores são igualmente importantes como solucionadores conjuntos de problemas [...] A BP fornece uma oportunidade para turbinar o processo de mudança no relacionamento tradicional entre a empresa e o consumidor. (PRAHALAD, 2005, p. 8)

À vista disso, segundo Prahalad (2005, p. 9), “abordagens novas e criativas são

necessárias para converter a pobreza em uma oportunidade para todos os

interessados”.

Nesse contexto emergem os Negócios Sociais, que têm como público-alvo a

BP. Esses empreendimentos ofertam produtos e serviços de qualidade e com preços

acessíveis, que contribuem para o atendimento das necessidades básicas dessa

população em saneamento, alimentação, energia, saúde e habitação. Os produtos e

serviços oferecidos contribuem para a produtividade desses grupos, ajudando

indiretamente no aumento de suas rendas (SEBRAE, 2016a).

Naigeborin (2010), também explica que os produtos e serviços oferecidos pelos

Negócios Sociais possuem diferentes estratégias para melhorar a qualidade de vida

das pessoas mais pobres, seja atendendo às suas necessidades básicas em áreas

como habitação, alimentação, saúde, acesso a água potável, saneamento, energia

etc., ou porque trazem oportunidades de melhoria da situação socioeconômica desses

consumidores, como é o caso de produtos como telefones celulares, computadores e

serviços financeiros, venda de tecnologias e equipamentos a baixo custo, acesso a

crédito produtivo, etc.

Em sua cartilha sobre os negócios de impacto, o Sebrae (2016a) apresenta os

seguintes setores prioritários desses empreendimentos no Brasil, que podem

adequar-se de acordo com os estados e regiões geográficas nacionais: água e

65

saneamento básico, agricultura, artesanato, canais de distribuição, cultura, educação,

energia, habitação, meio ambiente, tecnologia de informação e comunicação, turismo,

saúde, serviços financeiros/ micro finanças.

Na questão de água e saneamento básico são, por exemplo, negócios que

desenvolvem e comercializam tecnologia de baixo custo para reaproveitamento e

reutilização doméstica de água escura, em comunidades afetadas pela estiagem

(SEBRAE, 2016a).

Os NS que trabalham na agricultura, por sua vez, formam pequenos

agricultores dentro das técnicas da agroecologia, promovendo a distribuição de cestas

de produtos orgânicos aos consumidores, fomentando uma eficiente cadeia produtiva

(SEBRAE, 2016a).

Na área da educação, os NS oferecem escolas e creches de qualidade com

preços acessíveis para a população de baixa renda (SEBRAE, 2016a).

Em questão de habitação, comercializam, por exemplo, tijolos ecológicos para

baratear o custo em obras de construção em comunidades carentes e envolvem o

público no processo de fabricação (SEBRAE, 2016a).

Relacionados ao meio ambiente há, por exemplo, negócios que atuam

prestando serviços a grandes empresas que desejam certificar suas operações e

obter licenças ambientais, que também capacitam técnicos para trabalharem com o

manejo sustentável em área de reservas ecológicas (SEBRAE, 2016a).

Já os negócios de impacto que prestam serviços financeiros, fornecem crédito

ágil e sem burocracia para pequenos empreendedores, formais ou informais,

excluídos da política do sistema financeiro, oferecendo também um trabalho de

fortalecimento da gestão desses pequenos empreendimentos (SEBRAE, 2016a).

Prahalad alerta para o fato de que as soluções para os pobres “[...] não podem

ter como base os mesmos padrões de utilização de recursos existentes nos países

desenvolvidos. As soluções devem ser sustentáveis e ecologicamente corretas”

(PRAHALAD, 2005, p.43).

A esse respeito, os NS possuem clara intencionalidade de minimizar os

problemas ambientais. Conforme ressalta Yunus (2016), um dos princípios

norteadores desses empreendimentos é serem ambientalmente conscientes. De

acordo com Oliveira e Vasconcellos este novo modelo de negócio permite,

66

avançarmos na persecução de um desenvolvimento sustentável, criando

arranjos produtivos e econômicos que efetivamente integrem o aspecto

econômico ao socioambiental, em benefício das presentes e futuras gerações

do planeta. (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2011, p.7)

Nesse mesmo sentido, a Força-Tarefa Brasil de Finanças Sociais esclarece

ainda que, “em seus documentos legais e de comunicação (interna e externa), todo

negócio de impacto tem de explicitar o compromisso com a missão social e ambiental

como parte de seu objetivo central” (FTFS, 2015, p. 7).

Assim sendo, conclui-se que os Negócios Sociais exercem de forma evidente

sua função social em relação aos consumidores e meio ambiente, uma vez que seus

ideais estão intimamente ligados à busca pela erradicação da pobreza e desigualdade

social, além da minimização de problemas ambientais. Seja oferecendo produtos e

serviços para a BP ou que por si próprios impactem positivamente o meio ambiente,

os NS têm intrínseca ao seu conceito a preocupação com os fatores externos.

67

6 A FUNÇÃO SOCIAL NOS DIFERENTES TIPOS DE ORGANIZAÇÃO

Os três tipos de organização apresentados tratam-se de modelos com

propostas diferentes, mas que são incumbidos igualmente de promover benefício para

a sociedade.

Desse modo, foram apresentadas as definições acerca das Empresas

Tradicionais, dos Empreendimentos Econômicos Solidários e dos Negócios Sociais,

observando as práticas e ideais propostos por cada um desses modelos de

organização, conforme a análise das relações internas e externas apresentada por

Luz (2015), a fim de compreender o exercício do princípio estudado. A síntese a esse

respeito é expressa nos Quadros 3 e 4.

Quadro 3 – Função social e a relação com fatores internos nos diferentes tipos de organização

EMPRESAS TRADICIONAIS

Funcionários Administradores

Por meio da implementação de políticas de RS, buscam:

Estabelecer uma gestão responsável dos recursos humanos;

Garantir que os direitos dos trabalhadores sejam cumpridos;

Cumprir a legislação no âmbito da saúde e segurança no trabalho, adotando também ações complementares;

Propiciar melhoria nas condições de trabalho, desenvolvimento profissional e bem-estar de seus funcionários;

Aumentar o envolvimento dos trabalhadores com a empresa garantindo informações transparentes e completas sobre a organização e as relações de trabalho, bem como sobre seus direitos e deveres.

Observando o enfoque dos stakeholders, devem promover:

Eficácia e eficiência na gestão, de forma que gere o máximo de benefício econômico, social e ambiental de maneira sustentável;

Respeito ao direito dos acionistas quanto a informação, direito de voto, representação e participação nos órgãos diretivos da empresa;

Informação aos acionistas e dirigentes, a tempo e com veracidade sobre as decisões da empresa e os resultados econômicos, sociais e ambientais gerados.

EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS

Funcionários Administradores

Trabalhadores são sócios-proprietários do negócio, caracterizando a propriedade coletiva do empreendimento;

Praticam a autogestão, eliminando a hierarquia, possibilitando que as decisões sejam tomadas de forma democrática, em que a coletividade dos membros da empresa decide sobre os destinos, os processos e os resultados do trabalho;

Veem o trabalhador como o fator produtivo preponderante, que desempenha um papel central;

Por meio da autogestão proporcionam desenvolvimento humano e a cooperação inteligente entre os sócios, que são detentores do capital e dividem os excedentes de forma igualitária;

Proporcionam por meio da geração de trabalho e renda, resgate da dignidade humana e da cidadania das pessoas que se encontram excluídas do mercado de trabalho.

(Continua)

68

(Conclusão)

NEGÓCIOS SOCIAIS

Funcionários Administradores

São alternativas criativas de desenvolvimento, geração de emprego e renda;

Baseiam as relações de trabalho no respeito, confiança e transparência;

As ideias desses negócios estão intimamente ligadas ao objetivo de se incluir grupos de baixa renda na cadeia produtiva de valor, inclusive como funcionários;

Promovem uma remuneração justa e compatível com o mercado, além de melhores condições de trabalho.

Buscam a eficiência gerencial característica do segundo setor, visando otimizar o benefício social de suas atividades;

Pressupõe-se que sejam geridos por empreendedores éticos e responsáveis, que veem o lucro não como um fim em si mesmo, mas como uma forma de aumentar o impacto socioambiental causado;

Tendem a propiciar uma gestão democrática, horizontal e inovadora;

Em qualquer configuração que adotem, têm compromisso com uma governança efetiva, as decisões são tomadas com transparência e considerando o interesse social.

Fonte: elaboração própria.

Quadro 4 – Função social e a relação com fatores externos nos diferentes tipos de organização

EMPRESAS TRADICIONAIS

Consumidores Meio ambiente

Considerando sua responsabilidade perante os consumidores, visam:

Oferecer de modo eficaz, ética e ecologicamente correto, os produtos e serviços que os clientes necessitam e desejam, não utilizando para isso promoções ou publicidades enganosas;

Estabelecer procedimentos para tratar queixas, sugestões e reclamações;

Manter a privacidade de seus dados;

Propiciar informação transparente, compreensível, verdadeira, completa e detalhada sobre uso adequado dos bens oferecidos, riscos para a saúde, segurança e meio ambiente, bem como seus direitos e deveres;

Respeitar também outros instrumentos normativos, como o Código de Defesa do Consumidor.

Adotando uma gestão socialmente responsável, buscam:

Utilizar racionalmente os recursos, evitando prejuízos abusivos e desnecessários;

Cumprir as normas ambientais do setor;

Implementar a ecoeficiência e ecodesign nos processos produtivos, nos produtos e nos serviços;

Reciclar os resíduos e colaborar para a reciclagem dos itens fabricados;

Implementar sistemas de gestão ambiental, como a ISO 14000;

Adotar o princípio de prevenção e precaução, assumindo quando for o caso, a reparação dos danos ambientais causados.

EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS

Consumidores Meio ambiente

Promovem relações mais justas, transparentes e duradouras entre produtores e consumidores, baseadas na equidade, na cooperação, na confiança e no interesse compartilhado;

Seus valores contribuem com a necessidade de se repensar o padrão de produção e consumo brasileiro, possibilitando uma mudança na atitude consumista, por meio do comércio justo e solidário;

A questão ambiental e a sustentabilidade são partes inerentes de suas propostas e de seu modelo de desenvolvimento;

Primam pela adoção de práticas autossustentáveis, que levam adiante a produção de bens e serviços com responsabilidade socioambiental;

As trocas econômicas baseadas na solidariedade visam o desenvolvimento que garanta a preservação ambiental;

(Continua)

69

(Conclusão)

EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS

Consumidores Meio ambiente

Buscam uma elevação do processo de consciência dos consumidores estimulando a prática de consumo solidário;

Garantem por meio da comercialização justa de seus produtos, preço justo para os produtores, educação para os consumidores e desenvolvimento humano;

Humanizam o processo comercial, integrando-se a uma visão da economia centrada na pessoa.

Por meio da comercialização solidária sustentável, na manutenção e recuperação da biodiversidade.

NEGÓCIOS SOCIAIS

Consumidores Meio ambiente

Atendem aos consumidores da base da pirâmide suprindo suas necessidades básicas em saneamento, alimentação, energia, saúde e habitação;

Contribuem para a produtividade da BP, ajudando indiretamente no aumento de suas rendas, ofertando produtos como: telefones celulares, computadores, serviços financeiros, venda de tecnologias e equipamentos a baixo custo, acesso a crédito produtivo, etc.

Aumentam a capacidade de consumo dessa população excluída do sistema financeiro tradicional, ofertando serviços de crédito e incentivando o empreendedorismo.

Possuem clara intencionalidade de minimizar os problemas ambientais;

Um dos princípios fundamentais para a criação desses empreendimentos é serem ambientalmente conscientes;

A preocupação com o meio ambiente é expressa de forma clara na missão do negócio;

Integram o aspecto econômico ao ambiental.

Fonte: elaboração própria.

6.1 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Por meio do levantamento teórico apresentado, constatou-se que as

publicações relacionadas à função social são voltadas para a área de direito

empresarial. No entanto, não se encontram trabalhos na área de gestão que tratam

do tema em diferentes modelos de organização. Dessa forma, o estudo realizado

demonstra a sua relevância.

O primeiro ponto a se observar é que os três tipos de organizações foram

escolhidos por possuírem características diferentes, inclusive no que diz respeito à

propriedade do negócio, com o objetivo de enriquecer a discussão.

Foram observadas as propostas e relações das Empresas Tradicionais, dos

Empreendimentos Econômicos Solidários e dos Negócios Sociais com os fatores

internos (funcionários e administradores) e externos (consumidores e meio ambiente)

as suas atividades, relacionados ao exercício de sua função social, conforme a análise

70

proposta por Luz (2015). Por uma limitação da pesquisa, optou-se por não analisar o

aspecto concorrencial, uma vez que trata de variáveis complexas, maiores e alheias

ao que se objetivou abordar.

Outro aspecto limitante apresentado pela pesquisa, trata da dificuldade de

uniformizar as informações, uma vez cada tipo de empresa atua de forma diferente

em relação à sua função perante a sociedade, inclusive no que diz respeito à prática

de responsabilidade social.

Além disso, constatou-se que no caso dos Negócios Sociais, por se tratarem

de um modelo ainda em construção, que pode configurar-se de diversas formas,

houve uma dificuldade maior em se obter informações acerca das relações internas

(com funcionários e administradores).

Nas Empresas Tradicionais a propriedade é privada. No entanto, o direito dos

proprietários está condicionado ao cumprimento do princípio constitucional da função

social, que implica em se buscar atender aos interesses das demais partes

interessadas.

As Empresas Tradicionais, por muito tempo basearam-se na concepção do

stockholder, de Milton Friedman, aceitando que a única função social da empresa era

gerar lucros para seus proprietários. Entretanto, em decorrência das pressões sociais

e do Estado, essa concepção tradicional foi sendo modificada, dando lugar ao enfoque

dos stakeholders.

Desse modo, estas atendem ao princípio supracitado, por meio das dimensões

interna e externa da RSE. Buscam assim, promover uma gestão responsável de

recursos humanos, a melhoria das condições de trabalho, o desenvolvimento

profissional e bem-estar de seus funcionários, dentre outros benefícios. Além disso,

por meio destas práticas de responsabilidade, também buscam construir uma gestão

transparente, em que flua a informação e a comunicação entre acionistas e dirigentes,

e por meio da qual se busque o máximo de benefício econômico, social e ambiental

de maneira sustentável.

Em relação aos consumidores, as Empresas Tradicionais buscam oferecer de

modo eficaz, ética e ecologicamente correto, os produtos e serviços que os clientes

necessitam e desejam, não se utilizando de promoções e publicidades enganosas ou

que incitem condutas ilegais. Visam também adotar medidas adequadas para

assegurar que não ocorram práticas danosas com a parte frágil da relação

consumerista, propiciar informação transparente, compreensível e verdadeira, bem

71

como estabelecer procedimentos para tratar suas queixas, sugestões e reclamações,

dentre outras coisas, respeitando também outros instrumentos normativos como o

Código de Defesa do Consumidor.

No tocante à relação com o meio ambiente, essas organizações cumprem o

princípio da função social ao utilizar racionalmente os recursos, evitando prejuízos

abusivos e desnecessários, e, adotando procedimentos como: o cumprimento das

normas ambientais do setor; implementando a ecoeficiência e ecodesign nos

processos produtivos, nos produtos e nos serviços; reciclando os resíduos e

colaborando para a reciclagem dos itens fabricados; implantando sistemas de gestão

ambiental, como a ISO 14000, entre outras coisas. Também, ao pautar-se pelo

princípio de prevenção e precaução, assumindo quando for o caso, a reparação dos

danos ambientais causados.

Já os Empreendimentos Econômicos Solidários, têm como característica

fundamental a propriedade coletiva do empreendimento e a autogestão do negócio.

Os trabalhadores são sócios-proprietários dos meios de produção e dos resultados

obtidos do processo produtivo, promovendo geração de trabalho e renda, garantindo

a dignidade e cidadania de seus integrantes, demonstrando dessa forma a

funcionalidade social que é inerente ao conceito de Economia Solidária.

Também fazem parte das suas propostas a questão ambiental e a

sustentabilidade. Esses empreendimentos primam pela adoção de práticas

autossustentáveis, que levam adiante a produção de bens e serviços com

responsabilidade socioambiental.

Além disso, os EES buscam a prática da comercialização justa e solidária,

promovendo relações transparentes e duradouras entre produtores e consumidores,

bem como estimulam o consumo solidário.

Os Negócios Sociais por sua vez, podem tratar-se tanto de sociedades por

ações, de responsabilidade limitada, como também de organizações da sociedade

civil. Isso apresenta a possibilidade de que a propriedade seja privada ou coletiva. No

entanto, em ambos os casos há uma funcionalidade em prol do social, seja decorrente

da obrigatoriedade constitucional ou da própria missão do negócio.

Os NS são modelos criados com intenção de minimizar alguns dos problemas

sociais e ambientais que o mundo enfrenta, por meio de um empreendimento no qual

o lucro não é um fim em si mesmo, mas um meio para aumentar os benefícios

socioambientais gerados.

72

Os produtos e serviços que oferecem são direcionados à população da base

da pirâmide econômica, que não é atendida adequadamente pelos modelos

tradicionais, suprindo suas necessidades básicas em saneamento, alimentação,

energia, saúde e habitação. Além disso, os produtos e serviços oferecidos contribuem

para a produtividade desses grupos, ajudando indiretamente no aumento de suas

rendas.

Seus ideais estão intimamente relacionados à inclusão de grupos de baixa

renda na cadeia produtiva de valor, seja como proprietários, sócios, parceiros,

funcionários, fornecedores ou distribuidores, tratando-se assim, de uma alternativa de

trabalho e renda para a população excluída do mercado de trabalho.

Possuem também compromisso com uma governança em que as decisões são

tomadas de forma transparente e preocupada com o interesse social. Dessa forma,

pressupõe-se que os Negócios Sociais sejam geridos por empreendedores éticos e

responsáveis.

Buscou-se, inicialmente, analisar a função social pela perspectiva

constitucional, que condiciona a legitimidade da propriedade privada e por

consequência, a da empresa, ao exercício do princípio referido.

No entanto, ao longo do trabalho verificou-se que mesmo quando a propriedade

do negócio é coletiva, como no caso dos Empreendimentos Econômicos Solidários e

em alguns Negócios Sociais, mostra-se evidente a funcionalidade social da

organização, que por meio de suas atividades busca também beneficiar a sociedade.

Depois do exposto, embora as Empresas Tradicionais, os Empreendimentos

Econômicos Solidários e os Negócios Sociais tenham características diferentes

(inclusive em relação à sua propriedade), conclui-se que os três tipos de organizações

apresentam, teoricamente, em comum a consciência de sua relevância social e de

que estão inseridos em um contexto do qual também depende o sucesso do negócio.

Não obstante aos benefícios sociais que podem e devem trazer, estes

empreendimentos também se beneficiam com uma sociedade harmônica, pois desta,

provém seus clientes e dos clientes sua receita. Também da comunidade vêm seus

colaboradores, funcionários e fornecedores sem os quais não é possível desenvolver

sua atividade econômica.

Além disso, no caso dos atos de responsabilidade social, a empresa também

se beneficia de uma melhor imagem perante seu público e não raras vezes obtém

benefícios fiscais.

73

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em um contexto de desequilíbrios ambientais e gritante desigualdade social, as

empresas têm buscado redefinir os valores norteadores de suas relações com a

sociedade.

A Constituição Federal do Brasil de 1988, vigente, instituiu como um dos

princípios básicos para o exercício da atividade econômica a função social da

propriedade privada, do qual deriva a função social da empresa, condicionante da

legitimidade de suas atividades.

Nesse sentido, o presente trabalho possibilitou observar teoricamente como as

Empresas Tradicionais, os Empreendimentos Econômicos Solidários e os Negócios

Sociais exercem sua função social. Foram tratados os ideais propostos por cada

modelo de organização estudado, não significando necessariamente que essa postura

é adotada na prática.

Observou-se que as Empresas Tradicionais, por muito tempo, consideraram

que a única função social da empresa era gerar lucros para seus proprietários. No

entanto, em decorrência das pressões sociais e do Estado, essa concepção

tradicional foi sendo modificada, dando lugar ao enfoque dos stakeholders.

Assim, a discussão acerca do cumprimento, por estas organizações, do

preceito estudado, depende da visão de gestão adotada, seja ela tradicional, baseada

na teoria do stockholder de Friedman, ou pautada na visão dos stakeholders, de

Freeman, considerada ao longo do trabalho, por atender de forma mais completa a

funcionalidade da organização em prol da sociedade, incluindo as diversas partes

interessadas na estratégia de RSE.

Os Empreendimentos Econômicos Solidários por sua vez, surgiram

historicamente no início do capitalismo. No Brasil suas experiências foram pontuais

até a década de 80 do século XX, momento em que ressurgiram como resposta ao

cenário de desemprego, proporcionando a geração de trabalho e renda, e assim, o

resgate da dignidade humana e da cidadania.

Dessa forma, estas organizações apresentam uma função social clara em prol

de seus membros ao pautar-se na autogestão, cooperação e solidariedade como

esteio para eficiência e viabilidade do negócio, que possui como uma de suas

características a propriedade coletiva dos meios de produção.

Também são inerentes às suas propostas e seu modelo de desenvolvimento

74

a questão ambiental e a sustentabilidade. Além disso, os EES contribuem

socialmente por meio do comércio justo e estímulo ao consumo solidário.

Já os Negócios Sociais, surgiram com a constatação de que as estratégias do

negócio além de gerar recursos para a própria organização poderiam beneficiar

também o seu público.

Estes podem caracterizar-se como sociedades por ações, de responsabilidade

limitada ou organizações da sociedade civil. A propriedade do negócio pode ser tanto

privada como coletiva. Em ambos os casos, observa-se a preocupação com sua

função social, seja em razão da obrigatoriedade constitucional ou do propósito do

negócio.

Seus ideais estão intimamente relacionados ao objetivo de se reduzir as

desigualdades sociais e problemas ambientais. Também oferecem produtos e

serviços que atendem às necessidades da base da pirâmide, bem como visam a

inclusão de grupos de baixa renda na cadeia produtiva de valor.

Assim, seja por meio de práticas de RSE inseridas na estratégia organizacional;

primando pela solidariedade dos trabalhadores entre si e também entre produtores e

consumidores; ou explicitando na missão do negócio o compromisso em solucionar

problemas sociais e ambientais; as Empresas Tradicionais, os Empreendimentos

Econômicos Solidários e os Negócios Sociais, exercem claramente sua função social

perante funcionários, administradores, consumidores e meio ambiente, justificando e

legitimando dessa forma suas atividades.

A presente pesquisa não teve a pretensão de ser conclusiva a respeito do tema.

Objetivou-se, na verdade, apresentar a relevância social das organizações, que

devem cumprir uma função social.

Em razão de uma limitação de tempo, não foi possível estudar como se dão

essas relações na prática cotidiana das organizações. Dessa forma, fica a sugestão

para continuidade da pesquisa em futuros trabalhos, por meio de estudos de caso, o

que possibilitará resultados práticos a partir da teoria apresentada.

Assim, pretendeu-se trazer a compreensão teórica acerca do tema função

social em diferentes tipos de organização, e considera-se que este objetivo foi atingido

dentro das limitações já colocadas.

Por fim, observa-se que a literatura a respeito deste tema é voltada para a área

de direito empresarial. Não foram encontrados estudos na área de gestão que

observam como a função social é exercida em diversos tipos de negócios, verificando-

75

se a existência de uma lacuna teórica. Nesse sentido, novos estudos poderão

contribuir grandemente para sua melhor compreensão.

Sugere-se também como tema para futuras pesquisas, maior aprofundamento

sobre as relações internas dos Negócios Sociais, que constituem um campo em

construção, que tem muito a ser desenvolvido.

76

77

REFERÊNCIAS

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