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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA FLUMINENSE IFFLUMINENSE DIRETORIA DAS LICENCIATURAS DIRLIC LICENCIATURA EM LETRAS PORTUGUÊS E LITERATURAS Representações da posição-mulher em imagens de um livro didático de português: uma análise discursiva ANNA CAROLINA BAUR Linha de pesquisa: Estudos linguísticos e Educação. Orientador Prof. : Ronaldo Adriano Freitas Campos dos Goytacazes 2018

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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA

FLUMINENSE – IFFLUMINENSE

DIRETORIA DAS LICENCIATURAS – DIRLIC

LICENCIATURA EM LETRAS – PORTUGUÊS E LITERATURAS

Representações da posição-mulher em imagens de um livro didático de

português: uma análise discursiva

ANNA CAROLINA BAUR

Linha de pesquisa: Estudos linguísticos e Educação.

Orientador Prof. : Ronaldo Adriano Freitas

Campos dos Goytacazes

2018

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ANNA CAROLINA BAUR

Representações da posição-mulher em imagens de um livro didático de

português: uma análise discursiva

Monografia apresentada ao curso de Licenciatura em Letras – Português e Literaturas, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de licenciado em Letras. Orientador: Prof. Ronaldo Adriano Freitas

Campos dos Goytacazes

2018

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Dedico esse trabalho às minhas alunas, atuais e futuras, e às minhas sobrinhas/primas: Melissa Nunes Avelino, Sophya Terra Avelino e Flora Terra Avelino. Que sejam fortes e empoderadas.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço ao Instituto Federal Fluminense, por me propiciar

uma educação com tanta qualidade;

Agradeço aos meus professores, principalmente a Marília Siqueira, Analice

Martins e Ana Poltronieri, que contribuíram imensamente na minha construção de

professora e pesquisadora e que me ensinaram que essa construção é eterna;

Agradeço, principalmente, ao meu orientador, Ronaldo Adriano Freitas, por

me ensinar a amar e odiar a Análise do Discurso, nessa nossa eterna construção e

desconstrução de ideias. Obrigada pela paciência, carinho e profissionalismo com o

qual você me orientou;

Agradeço a minha tia-mãe Alciene Ferreira Avelino, que investiu a vida inteira

em mim, que me apoiou e apoia em todos os momentos, me ensinando a questionar

tudo e todos;

Agradeço ao meu companheiro de vida, Lucas Rangel de Oliveira, que me

aturou nesses meses de ansiedade e leituras que pareciam infinitas;

Agradeço ao meu grande amigo, Jefferson Fingolo, pelas pizzas e conselhos;

Agradeço, especialmente, a meus amigos Ana Clara Vetromille e Maycon

Dias Prado, por todas as discussões e provocações durante esses quatro anos de

faculdade. Sem vocês, eu seria outra.

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No meu nervosismo para esse discurso, e nos meus momentos de dúvida, eu dizia para mim fortemente, “Se não eu, quem? E se não agora, quando?”

(Emma Watson, ONU, 2014)

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RESUMO

O objetivo deste trabalho monográfico é analisar como a posição sujeito mulher é

retratada no livro didático PORTUGUÊS: Contexto, Interlocução e Sentido Vol. 2 – 2º

ano, das autoras Maria Luiza Abaurre, Maria Bernadete Abaurre e Marcela Pontara,

mais especificamente na Unidade 4, através de figuras (charges, quadrinhos e

anúncios) e quais os possíveis discursos que essas imagens carregam. Para isso,

será utilizada a fundamentação teórico-metodológica da Análise do Discurso, de

linha francesa (Pêcheux/Orlandi). Em um primeiro momento, observar-se-á o

conjunto de figuras que compõem a unidade como um todo; depois se analisará o

funcionamento de estereótipo e transformação/consolidação em 06 (seis) figuras

que foram selecionadas por pertencer à sequência discursiva delimitada.

PALAVRAS-CHAVE: Sujeito mulher. Estereótipo. Livro didático. Análise do

Discurso.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Calvin e seu pai .................................................................................... 3

Figura 02 – Anúncio Publicitário da Saúde Feminina - SD 1 .............................. 20

Figura 03 – Charge da Maitena - SD 2 .................................................................. 22

Figura 04 – O filho do duque – SD 3 ...................................................................... 24

Figura 05 – Café da Manhã de Hagar – SD 4 ........................................................ 25

Figura 06 – Almoço de Hagar – SD 5 .................................................................... 26

Figura 07 – Zé do Boné – SD 6 ............................................................................... 27

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LISTA DE TABELAS

Tabela 01 – Conceitos de formações imaginárias ............................................... 15

Tabela 02 – Objetos imaginários ........................................................................... 16

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 1

1.1 Metodologia 5

2 SUJEITO MULHER: UMA HISTÓRIA 6

3 ANÁLISE DO DISCURSO: FUNDAMENTOS E METODOLOGIA 10

4 ANÁLISE DO OBJETO 18

5 CONCLUSÃO 29

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 31

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa compreender as representações femininas dentro do

espaço educacional, mais especificamente suas representações no livro didático,

uma ferramenta utilizada nas salas de aula e normalmente pouco questionada pelos

alunos/alunas sobre sua validade ou seus múltiplos significados. Consideramos que

não existem posições discursivas isoladas de uma proposta de recepção, assim, o professor considera ao pensar o livro didático a imagem de aluno não leitor que irá trabalhar com o material educativo, como também o professor com formação precária que estabelece relações subalternas ao livro (CASSABI; MARTINS, 2003, p. 5).

A análise se dará pelas figuras contidas em um livro de língua portuguesa

destinado a alunos da segunda série do ensino médio, observando as

representações de “mulher” e como elas estabelecem significações com

“casamento/família”, sendo esse o critério para formar a sequência discursiva

delimitada.

A luta feminista por direito sociais, empoderamento feminino e libertação de

padrões de gênero pelas mulheres tem produzido frutos: “o feminismo pressionou os

limites da ordem estabelecida, é claro, mas também das formas de pensar o mundo

que a legitimavam” (BIROLI, 2014, p.8), mas é necessário que o questionamento

sobre a dominação masculina em nossa cultura continue, e, para isso, a educação é

uma ferramenta importante nessa luta.

Consideramos também que é pela língua que disseminamos e construímos as

representações de gênero. “As palavras simples do nosso cotidiano já chegam até

nós carregadas de sentidos que não sabemos como se constituíram e que, no

entanto, significam em nós e para nós” (ORLANDI, 2015, p. 20), dessa forma,

compreende-se que, por meio do discurso e da linguagem, reproduzem-se diversos

estereótipos1 e preconceitos machistas e discriminatórios.

Compreende-se, assim, que a escola tem um papel vasto na formação do

sujeito para a sociedade. É nela que são trabalhados os recortes da história e os

conhecimentos humanos acumulados vistos como necessários por uma camada da

sociedade. O combate à discriminação e a preconceitos sociais é uma maneira de

1 O conceito de estereótipo será retomado no capítulo 3.

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questionar a realidade que se enfrenta na sociedade, e, na escola, é possível

levantar esses assuntos e criar debates acerca deles, uma vez que os componentes

curriculares oferecem suporte teórico para esse tipo de atividade.

De acordo com a LDB, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,

Art. 1º. A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. § 1º. Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias. § 2º. A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social. (BRASIL, 2017).

A partir disso, analisar-se-á o livro didático que é utilizado no Instituto Federal

Fluminense (IFFluminense)2 Campus Campos Centro, pois o livro didático é o

primeiro material que a escola disponibiliza para seus alunos. Em muitos casos,

essa é a ferramenta por que o aluno/aluna se guia durante seus anos de escola.

Desse modo, uma vez que esse livro retrata uma imagem e um discurso sobre o que

é mulher, mesmo que ela não seja o foco, vê-se como necessária uma pesquisa

mais profunda acerca desse modo de produção. Por isso, observar-se-á como esses

livros, que são resultado da escolha dos profissionais escolares e um investimento

do governo, retratam a mulher no século XXI.

O livro analisado será o PORTUGUÊS: Contexto, Interlocução e Sentido Vol.

2 – 2º ano, das autoras Maria Luiza Abaurre, Maria Bernadete Abaurre e Marcela

Pontara, e que foi escolhido por ser o livro utilizado no IFFluminense Campus

Campos Centro, instituição à qual estamos filiados. Escolhemos para análise a parte

do livro que trabalha a gramática, por compreender que ali está a representação

mais estrutural da língua.

Assim, percebe-se que, nesses capítulos, o foco não é a reflexão sobre os

processos de produção de sentidos, uma vez que a proposta é analisar os

conteúdos relacionados à forma da língua, dentro uma visão gramatical.

2 “O Instituto atua com uma verticalizada oferta de formação, com a formação inicial e continuada; os Cursos Técnicos, em sua maioria na forma integrada com o Ensino Médio; as Licenciaturas; os Cursos Superiores de Tecnologia e os Bacharelados, estendendo-se a oferta de formação até à Pós-graduação lato e stricto sensu.” http://portal1.iff.edu.br/conheca-o-iffluminense/apresentação. Acesso em 05 mar. 2018.

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O objeto a ser analisado será charges, tiras e anúncios que essa parte do

livro apresenta, focando nas representações de gênero e nos discursos sobre a

mulher sustentados nessa seleção e o caráter cômico que a maioria das figuras

apresentam, questionando as reproduções e/ou resistências que esses textos

carregam através do interdiscurso3.

Abaixo, retirado do corpus analisado neste trabalho, uma tirinha produzida por

Bill Watterson funciona como questionamento fundador para este trabalho, quando o

personagem indaga ao pai os porquês de as representações dos personagens

serem tão caricatas e não abrangerem a realidade dessas figuras e, sim, uma visão

estereotipada.

Figura 01 – Calvin e seu pai

Fonte: WATTERSON, 1995 apud ABAURE; ABAURRE, PONTARA, 2010, p. 526.

Esses quadrinhos funcionam sempre em uma contradição, em que criticam e

estabilizam os sentidos em suas representações. Enquanto o menino reclama das

formas de se retratarem as pessoas nos quadrinhos, ele mesmo é mostrado dessa

maneira, como ele diz na última fala, “E veja, todas as crianças são moleques

irritantes!”. Calvin é irritante pelo fato de contestar o já posto e atrapalhar o pai com

suas perguntas. O pai também é um modelo. O menino passa três quadrinhos

falando sobre os tipos de estereótipos preconceituosos, levando à uma

desautomatização da leitura desses quadrinhos, para, no final, o pai dizer que

modelos de comportamento politicamente corretos não são risíveis, colocando em

3 Conceitos como reprodução, resistência e interdiscurso e contradição, aqui, referem-se à teoria de Análise do Discurso. No capítulo três, esses conceitos serão retomados.

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xeque que, para que o quadrinho tenha graça, ele se utiliza de estereótipos,

exatamente como os dois são. “Dessa maneira, as charges se mostraram, para nós,

como uma possibilidade de equivocar uma estabilização de sentidos já dados,

permitindo-nos entrever uma produção de sentidos” (COSTA, 2011, p. 16).

É levando essa afirmação em consideração que esse trabalho se produz, na

necessidade de compreender quais são os interdiscursos que existem e que fazem

com que retratar mulheres, como diz o menino Calvin, no lugar de “choronas,

indecisas, megeras, reclamonas e peruas!”, carregue sentidos estabilizados; e como

esses quadrinhos funcionam tanto para cristalizar esses sentidos quanto para

repensá-los.

Este trabalho utilizará a fundamentação teórico-metodológica da Análise de

Discurso de linha francesa (Pêcheux/Orlandi). Procuramos avaliar como os

discursos e seus múltiplos sentidos são formados dentro desses livros didáticos e

que razões históricas nos levam a essas cristalizações de sentidos.

Problematizar as maneiras de ler, levar o sujeito falante ou o leitor a se colocarem questões sobre o que produzem e o que ouvem nas diferentes manifestações da linguagem. Perceber que não podemos estar sujeitos à linguagem, a seus equívocos, sua opacidade. Saber que não há neutralidade nem mesmo no uso mais aparentemente cotidiano dos signos. (ORLANDI, 2015, p. 7).

Quando nos percebemos cegos diante de certa realidade, queremos, de

alguma forma, clarear a visão para o que está posto, refazê-la e reconstruí-la com

outros tantos sentidos. Uma vez que “O feminismo combina a militância pela

igualdade de gênero com a investigação relativa às causas e aos mecanismos de

reprodução da dominação masculina” (MIGUEL, 2014 p.17), é pelo viés da Análise

do Discurso que nossa investigação se constrói ao longo deste trabalho.

Este trabalho se divide em: Introdução; Sujeito mulher, uma história, capítulo

em que investigaremos as condições históricas que possibilitam o nosso olhar sobre

o papel da mulher e suas relações com o casamento e a família e que sustentam

essa comicidade encontrada nas charges analisadas; o terceiro capítulo, Análise do

discurso: fundamento e metodologia, em que nos aprofundamos na linha de

pesquisa que apoia este trabalho e a perspectiva em que vemos os assuntos

abordados; e, por último, entramos nas Análises do Objeto e Conclusões, em que

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analisamos, de acordo com toda a teoria abordada, o objeto desta pesquisa e

apresentamos nossos resultados e conclusões.

1.1 Metodologia

A metodologia deste trabalho se baseia no quadro teórico-metodológico da

Análise de Discurso (AD) de corrente francesa. Como a AD se utiliza dos processos

sócio-históricos e das condições de produção do discurso, a pesquisa propôs uma

retomada histórica e uma análise baseada nessas ferramentas discursivas.

O objeto selecionado são imagens, entre elas, charges, tiras e anúncios que

compõem a unidade 4 do livro Português: Contexto, Interlocução e Sentido, das

autoras Maria Luiza Abaurre, Maria Bernadete Abaurre e Marcela Pontara.

Em primeiro momento, nossa observação se dá de modo generalizado e

quantitativo, no sentido de categorizar e contar a quantidade de imagens que

completam essa unidade para, em um segundo momento, aprofundarmo-nos nas

imagens que retratam a mulher em posição de família e casamento, que é o foco da

nossa análise.

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2 SUJEITO MULHER: UMA HISTÓRIA

Hesitei muito tempo em escrever um livro sobre a mulher. O tema é irritante, principalmente para as mulheres. E não é novo. A querela do feminismo deu muito o que falar: agora está mais ou menos encerrada. Não toquemos mais nisso... No entanto, ainda se fala dela. (BEAUVOIR, 2009, p.13).

O seguinte capítulo é uma fundamentação histórica acerca dos

questionamentos feitos nesta monografia. Vê-se necessária uma retomada histórica

do que é ser mulher e seus ligamentos com o casamento/família devido ao perfil

desta pesquisa ser intimamente relacionada aos processos de produção de sentido

e do sujeito.

consideramos que a relação do sujeito com os fatos históricos é uma relação de significação: “não há “fato” ou “evento” histórico que não faça sentido, que não peça interpretação, que não reclame que lhe achemos causas e consequências.” É nisso que consiste para nós a História, nesse fazer sentido, mesmo que possamos divergir sobre esse sentido em cada caso. (HENRY 1994 apud FONTANA; FERRARI, 2017, p. 11).

As charges, as tiras e os anúncios escolhidos abordam o dia a dia de

mulheres e estão contidos no livro PORTUGUÊS: Contexto, Interlocução e Sentido

Vol. 2 – 2º ano. “A teoria política feminista é uma corrente profundamente plural e

diversificada, que investiga a organização social tendo como ponto de partida as

desigualdades de gênero.” (BIROLI; MIGUEL, 2014, p.7).

Dito isso, este trabalho se enquadra nessa perspectiva política por questionar

os lugares comuns em que o gênero feminino normalmente é representado e por

compreender como esse discurso de mulher se constitui pelo interdiscurso.

“Entendemos que a memória discursiva como espaço ideológico

estruturante/estruturado em que se realiza a interpretação, enquanto efeito

necessário da relação simbólica estabelecida entre o sujeito e o real da

língua e da história.” (FONTANA; FERRARI, 2017, p.11).

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Para a Análise do Discurso, o real é impossível, inalcançável. O sujeito só

consegue acessar a imagem que ele faz do real, e é através da linguagem, em um

plano simbólico, que ele faz esse percurso. Desse modo, então, a relação entre a

língua e a história se faz nos sentidos em que as palavras são atribuídas

simbolicamente, que acontecem no percurso da história.

O exercício aqui proposto é de pensar nessa conexão entre a mulher e o

casamento/família e o porquê de essa ser uma representação majoritária no nosso

objeto de estudo. Para embasar essa visão, usaremos Simone de Beauvoir, pelo

fato de ela ter estudado historicamente e sociologicamente a mulher ocidental e ser

uma das autoras mais importantes para o estudo da história da mulher. Essa autora

procurou, em suas obras, compreender de que maneira a mulher ocupou, ou a

fizeram ocupar, uma posição secundária e como se dá essa configuração social que

assujeita a mulher nesse papel.

Para a autora, em nossa cultura é o homem que se afirma através de sua

identificação com seu sexo, e esta autoafirmação, que o transforma em

sujeito, é feita sobre a sua oposição com o sexo feminino, transformado em

objeto, e visto através do sujeito. (ALVES; PITANGUY,1981, p. 52).

Caminhando pelo tempo percebemos que essa posição de sujeito mulher

parece não ter se alterado muito, “Ao afirmar que „os Deuses‟ criaram a mulher para

as funções domésticas, o homem para todas as outras” Xenofonte, no século IV A.C,

exprimia um tipo de argumentação naturalista que ainda demarca espaços para

ambos os sexos.” (ALVES; PITANGUY,1981, p. 12).

Esse tipo de fala é muito frequente no decorrer da história e serviu para

justificar o fato de a mulher ser mais um bem material do homem, quase como um

complemento. Beauvoir vai falar que essa posição que o gênero feminino ocupa,

quase que intrinsecamente, começou no momento em que o ser humano se fixa em

um local, torna-se dono e inventa a noção de propriedade privada:

A propriedade privada aparece; senhor de escravos e de terra, o homem torna-se também proprietário da mulher. (...) O trabalho doméstico desaparecia, então, ao lado do trabalho produtivo do homem: o segundo era tudo, o primeiro um anexo insignificante. (BEAUVOIR, 2009, p. 88-89).

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Beauvoir reflete sobre o lugar da mulher partindo da ideologia cristã e suas

influências políticas e estruturais na sociedade, definindo conceitos morais e

legislativos que regulavam os sujeitos.

Logo no início do cristianismo, eram as mulheres, quando se submetiam ao jugo da Igreja, relativamente honradas; testemunhavam como mártires ao lado dos homens; não podiam, entretanto, tomar parte do culto senão a título secundário; as “diaconisas” eram só autorizadas a realizar tarefas laicas: cuidado aos doentes, socorro aos indigentes (...) Os imperadores sofrem influência dos Padres da Igreja de modo mitigado; a legislação do Justiano

4 honra a mulher como esposa e mãe, mas escraviza-a a essas

funções. (BEAUVOIR, 1980, p. 177-118).

A moral religiosa combinada com os valores capitalistas traçaram um caminho

delimitado na história da mulher, como ainda fala Beauvoir (1980). Encontramos a

virgindade feminina antes do casamento como uma espécie de propriedade a ser

negociada, sendo uma base de moral cristã, que dá sustentação para uma cultura

capitalista – e tradicionalmente sexista – que não é necessariamente observada em

outras culturas que não se baseiam nos valores burgueses de família, capital e

herança.5

Essa nova concepção familiar culminou com a criação da família nuclear (pai, mãe e filho) tipicamente burguesa, que se constituiu a partir do contrato matrimonial e do matrimônio por amor. Coutinho observa, a partir das observações de Shorter, que ocorreu na época o que foi denominado a “Revolução Sentimental do Século XVIII”, ou seja, o aparecimento do amor materno, do amor conjugal e do sentimento doméstico de intimidade. Tal revolução teve como consequência a mudança das prioridades da vida e as formas de enlace entre os membros da família. O romantismo reinerante começa a ser utilizado como instrumento de submissão cultural da mulher à sua nova condição, que viria a ser intensificada, no Brasil, por meio de mídias, como folhetins. (RAMALHO, 2013, p. 37).

A partir desse quadro é possível perceber que a mulher, o casamento e a

família são unidos e faz sentido quando esses termos são ligados, já que “sempre”

se compreendeu a mulher dentro dessa rotina.

Não é apenas na casa que a mulher se faz, exercendo funções como

curandeira e artesã. A mulher sempre cuidou da terra e das posses do homem

quando este estava longe, caçando ou em guerras.

4 Justiano foi imperador bizantino no século VI. 5 Ver Beauvoir, 1980, p. 193-195.

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Há registros de mulheres exercendo tarefas ditas masculinas, como serralheria e a carpintaria, apesar de que se concentravam nas profissões “femininas” como tecelagem, a costura, os bordados. Participavam do comércio, ao lado de seus maridos e, frequentemente, permaneciam como comerciantes após a sua morte.” “Era a mulher, curandeira e parteira, secularmente encarregada da saúde da população(...)” (ALVEZ; PITANGUY, 1981, p. 17-22).

Nos dias atuais, as mulheres ocupam espaços de trabalho e posições de

poder, mas ainda estão atadas às tarefas domésticas e maternas, o que faz com

que a jornada da mulher seja mais frustrante por se dividir entre todas essas

obrigações. “As mulheres continuam a ter a responsabilidade exclusiva ou principal

na criação dos filhos e no trabalho da casa.” (BIROLI; MIGUEL, 2014, p.11).

Sujeito e sentido são constituídos juntamente, assim, ser mulher e ocupar

essa posição social vêm atrelados, como vimos, a casamento e família, em um

sentido que essas duas entidades se ligam à mulher.

As noções de memória discursiva e acontecimento discursivo permitem trabalhar essa determinação como constitutiva do funcionamento da linguagem. Sujeito e sentido se constituem simultaneamente, como efeitos, pela relação com a memória discursiva e as condições de produção de discurso.” (FONTANA; FERRARI, 2017, p. 10).

Desse modo, compreendemos como o discurso observado no corpus

funciona, uma vez que a mulher estar em determinadas funções é uma rotina e,

dessa forma, o leitor já está habituado a essas informações. Questionar os sempre-

ditos é uma forma de se colocar no mundo e , como professores, repensar o material

didático que é utilizado em nosso dia a dia é a forma com que esse trabalho se

dá.

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3 ANÁLISE DO DISCURSO: FUNDAMENTOS E METODOLOGIA

A Análise do Discurso é uma teoria que foi iniciada na França, na década de

60, pelo filósofo Michel Pêcheux, que propõe analisar o discurso. Faz-se necessário

compreender que discurso não é concebido como um enunciado fechado (com

começo, meio e fim), é “impossível analisar um discurso como um texto, isto é, uma

sequência linguística fechada em si mesma, (…) é necessário referi-lo ao conjunto

de discursos possíveis a partir de um estado definido das condições de produção”

(PÊCHEUX, 2010, p.78). Precisamos também levar em conta suas várias maneiras

de significar, não só com palavras ou textos, mas a relação com a exterioridade e as

condições de sua produção.

Eni Orlandi, uma das principais autoras utilizadas nesse trabalho, foi a

introdutora da Análise do Discurso no Brasil, no final dos anos 70. Hoje, atua como

pesquisadora do Laboratório de Estudos Urbanos da Unicamp, professora e

coordenadora do Programa de Pós Graduação em Ciências da Linguagem da

Universidade do Vale do Sapucaí e professora colaboradora do IEL da Universidade

Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Lingüística, com ênfase em

Teoria e Análise Lingüística, atuando principalmente nos seguintes temas: análise

de discurso, lingüística, epistemologia da linguagem e jornalismo científico.

Percebendo que “A linguagem serve para comunicar e para não comunicar”

(ORLANDI, 2015, p.20), essa concepção discursiva de linguagem nos leva a

observar as múltiplas relações de sujeitos e sentidos e seus muitos significados. A

mesma autora vai definir, a partir de Pêcheux, que o discurso é essa relação de

efeitos de sentidos entre os locutores.

O corpus deste trabalho são tiras, charges e anúncios que retratam a mulher

na posição “casamento/família”. Analisar essas imagens dentro da Análise do

Discurso é lê-las pela ótica da transformação/reprodução, uma vez que, quando

falamos em discurso, é preciso pensar no conjunto de discursos possíveis a partir de

um estado definido de condições de produção.

Para Orlandi (2015), com base nos estudos de Pêcheux, “não há discurso

sem sujeito e não há sujeito sem ideologia: o indivíduo é interpelado em sujeito pela

ideologia e é assim que a língua faz sentido” (p. 15). Desse modo, é através do

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discurso que se percebe a relação entre língua e ideologia e como a língua produz

os sentidos pelos e para os sujeitos.

Assim, a primeira coisa a se observar é que a Análise do Discurso não trabalha com a língua enquanto um sistema abstrato, mas como a língua no mundo, com maneiras de significar, com homens falando, considerando a produção de sentidos enquanto parte de suas vidas, seja enquanto membros de uma determinada forma de sociedade. (ORLANDI, 2015, p. 13-14).

O processo de análise começa na procura pelas condições de produção, uma

vez que, “discurso é sempre pronunciado a partir de condições de produção dadas”

(PÊCHEUX, 2010, p. 75), condições essas que compreendem particularmente os

sujeitos, a situação e a memória que é acionada em determinadas situações,

compreensão fundamental para entender como funcionam as formações discursivas.

Pensar historicamente a trajetória das mulheres dentro desse espaço

casamento/família é o começo dessa investigação das condições de produção

nessas imagens.

As condições de produção são todas as questões internas e externas que

mudam-alteram-constituem o sujeito e, consequentemente, os seus discursos. É

necessário, então, compreender também as origens das imagens analisadas, uma

vez que, quando produzidas, foram pensadas não para serem lidas no livro didático,

e isso muda o caráter do objeto. Um anúncio que foi publicado para uma revista

feminina tem um sentido totalmente diferente quando colocado em um livro didático.

A linguagem nunca é transparente. O processo discursivo “faz o sujeito ter a

impressão de transparência, é a tarefa do analista de discurso expor o olhar leitor à

opacidade do texto, como diz M. Pêcheux (1981), para compreender como essa

impressão é produzida e quais são seus efeitos” (ORLANDI, 2015, p. 50).

Para além de ser uma teoria, a AD é uma ferramenta de análise discursiva,

como diz o nome, que tem por objetivo compreender os funcionamentos históricos e

ideológicos desses sentidos tão difundidos e apropriados pelo sujeito em suas falas.

Isso se denomina formações discursivas e ideológicas, em que todo o sujeito é

constituído, de acordo com a AD. A opacidade do texto é um dos vestígios do que já

foi dito, mesmo esse discurso sendo produzido em outro local e é o que o analista

procura expor usando a AD: “não é simples a aplicação dela. É o confronto,

interrogação, face à análise de seu objeto.” (ORLANDI, 2012, p. 12).

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A AD tem como centralidade o questionamento dos sentidos cristalizados e

dos discursos sempre-ditos, “a repetição do mito idealista da interioridade, pelo qual

o “não-dito” não poderia ser diferente do „já-dito‟6 ou do „dizível‟ que o sujeito pode

encontrar por uma reflexão sobre si mesmo” (PÊCHEUX, 1997, p.172), o que leva o

sujeito a uma internalização tão profunda e automática da ideologia daqueles

sentidos que raramente é questionada e sempre é tomada como própria ou original.

Pêcheux vai chamar essa rotina de interiorização dos sentidos de

Esquecimentos, um processo mental do inconsciente, que faz com que o discurso

esteja sempre inserido nesse sentido pré-concebido, porque sempre se está

continuando um discurso de um lugar, e esse sujeito sempre parte de uma imagem

para a imagem que ele faz do outro com quem ele vai interagir. Ele vai diferenciar os

tipos de esquecimentos em dois: o primeiro sendo esse esquecimento que faz com

que o sujeito nunca saia da formação discursiva que o domina, e o segundo é o

esquecimento de que essa seleção de enunciados que ele escolhe já está

determinada pelo esquecimento nº 1:

É nesse reconhecimento que o sujeito se “esquece” das determinações que o colocam no lugar que ele ocupa - entendamos que, sendo o “sempre-já” sujeito, ele “sempre-já” se esqueceu das determinações que o constituem como tal. (PÊCHEUX, 1997, p. 170).

Concordamos em chamar de esquecimento nº 2 ao “esquecimento” pelo qual todo sujeito-falante “seleciona” no interior da formação discursiva que o domina, isto é, no sistema de enunciados, formas e sequências que nela se encontram em relação de paráfrase. (...) Nesse sentido o esquecimento nº 1 remetia, por uma analogia com o recalque inconsciente, a esse exterior, a medida em que - como vimos - esse exterior determina a formação discursiva em questão. (PÊCHEUX, 1997, p. 173).

Quando, no trecho acima, o autor fala de formação discursiva, é necessário

que expliquemos esse termo por ser muito caro para nós, uma vez que é por ele que

a AD compreende os processos de produção de sentido e as relações de ideologias

que são formadas pelo sujeito, além de nos fornecer uma possibilidade de se

observarem as regularidades do funcionamento do discurso. “Consequentemente,

podemos dizer que o sentido não existe em si mas é determinado pelas posições

ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-histórico em que as palavras são

produzidas” (ORLANDI, 2015, p. 40).

6 Trata-se do efeito do “sempre” já empregado na página 9.

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Sendo assim, as palavras se alteram dependendo das posições daqueles que

a empregam, e é na compreensão das formações discursivas que conseguimos

olhar esse quebra-cabeça de palavras e sujeitos e os resultados das suas

significações. Por esse motivo, o deslocamento das imagens analisadas altera os

seus próprios sentidos, pelo motivo de que o leitor que as lê não é mais o leitor que

foi pensado no momento em que o conteúdo foi produzido, e o também o leitor

agora vê aquelas imagens dentro de um outro contexto.

Uma maneira de compreender como se dá esse processo de produção de

sentido dentro desta monografia é pelo conceito de estereótipo. É com ele que

analisaremos todo o nosso objeto, uma vez que essas tiras e charges se utilizam de

figuras estereotipadas para conseguir o efeito de humor.

O estereótipo funciona como aquele lugar-comum, mas também como uma

forma de desconstrução desses sentidos,

O processo de estereotipia apresenta [...] por um lado, a repetição e o efeito do que é constantemente reiterado atuam no reforço ao senso comum, na sua confirmação; [...] por um lado, essas mesmas características dos estereótipos determinam efeitos inversos, concorrendo para uma desconstrução dos sentidos já alicerçados, provocando um gradual enfraquecimento do clichê ou deslizamento de sentido. (FERREIRA, 1993, p. 72).

Repetição e descontrução é o viés pelo qual perceberemos toda a sequência

discursiva selecionada, os sentidos outros causados por esse jogo da estereotipia.

Orlandi vai definir estereótipo como:

Ao meu ver, quando penso o estereótipo como ponto de fuga possível dos sentidos, penso-o como um lugar em que trabalham intensamente as relações da linguagem com a história, do sujeito com o repetível, da subjetividade com o convencional. Tudo perpassado pelo imaginário do discurso. (ORLANDI, 2007, p. 127.)

Para a Análise do Discurso, o discurso não é fechado, ele é um conjunto de

possíveis discursos a partir de um estado definido de condições de produção,

conceito que será melhor abordado adiante.

Levando em consideração esses possíveis outros discursos, pensamos

também nos pontos de resistência que esses quadrinhos criam e como estes

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significam em lugares diversos, compreendendo que inicialmente essas imagens

foram criadas para um determinado público e, quando se deslocam para o livro

didático, funcionam de maneiras diversas.

Podemos então afirmar que, para que os sentidos aconteçam, segundo

Orlandi, para que a língua faça sentido, é preciso intermédio da história, com a sua

opacidade. Assim, o indivíduo se relaciona com o conhecimento de outros discursos

já existentes e remetem seus sentidos ao já dito, através do interdiscurso.

Trata-se de considerar que, como qualquer outro discurso, o discurso sobre o ensino de língua portuguesa está sujeito aos sentidos que o antecedem: o interdiscurso, como define Orlandi (2009, p.32) “há um já dito que sustenta a possibilidade mesma de todo dizer”. A constituição dos sentidos se dá pelo interdiscurso o “eixo vertical onde teríamos todos os dizeres já ditos – e esquecidos – em uma estratificação de enunciados que, em seu conjunto, representa o dizível”. (FREITAS, 2015, p. 16).

O processo do discurso está intimamente ligado à paráfrase, esse “retorno

aos dizeres”, e à polissemia, “deslocamento, ruptura de processos de significação”,

segundo Orlandi. Todo o discurso se faz nessa tensão entre o mesmo e o diferente.

Investigar e compreender o que está dito, suas maneiras e seus modos de

funcionamento é de extrema importância para a Análise do Discurso, porque é deste

modo que conseguimos observar o mundo e suas significações. O que está posto

precisa ser desmembrado e analisado. E, como professores, é ainda mais

importante a reflexão acerca do nosso entorno.

Até agora, estabelecemos que o discurso não é o enunciado, nem a fala,

mas, sim, a língua em funcionamento e suas relações com as exterioridades, o que

nos leva às condições de produção:

Elas compreendem fundamentalmente os sujeitos e a situação. Também a memória faz parte da produção do discurso. A maneira como a memória “aciona”, faz valer, as condições de produção é fundamental. “(...) em sentido amplo, as condições de produção incluem o contexto sócio-histórico, ideológico. (ORLANDI, 2015, p.28-29).

Já foi dito que, para que o discurso seja produzido, o sujeito está sempre

levando em consideração com quem se está falando, projetando os sentidos que as

palavras podem produzir, “não são os sujeitos físicos nem os seus lugares empíricos

como tal, isto é, como estão inscritos na sociedade, e que poderiam ser socialmente

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descritos, que funcionam no discurso, mas suas imagens que resultam de

projeções.” (ORLANDI, 2015, p. 40), para a AD, isso são as formações imaginárias.

Pêcheux propõe que formações imaginárias são as imagens que os sujeitos

fazem de si mesmos, dos com quem falam, e do objeto discursivo, em relação às

forças de ideologia e cultura da sociedade em que estão contidos. Em 1969, em sua

primeira fase de estudos, elabora o seguinte quadro para exemplificar tal conceito:

Tabela 01 – Conceitos de formações imaginárias

Expressão que designa as

formações imaginárias

Significação da expressão Questão implícita cuja “resposta”

subentende a formação imaginária

correspondente

IA(A)

Imagem do lugar de A para o

sujeito colocado em A

“Quem sou eu para lhe falar

assim?”

IA(B)

Imagem do lugar de B para o

sujeito colocado em A

“Quem é ele para que eu lhe fale

assim?”

IB(B)

Imagem do lugar de B para o

sujeito colocado em B

“Quem sou eu para que ele me fale

assim?”

IB(A)

Imagem do lugar de A para o

sujeito colocado em B

“Quem é ele para que me fale

assim?”

Tabela feita pela autora de acordo com PÊCHEUX, 2010, p. 82.

Nesse quadro, podemos observar as diversas visões e antecipações que os

sujeitos levam em consideração, tanto consciente como inconsciente, no momento

das produções de discurso. Além desses reflexos de posições imaginárias, também

o autor vai tratar do objeto imaginário, no seguinte esquema:

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Tabela 02 – Objetos imaginários

Expressões que designam as formações

imaginárias

Significação da expressão Questão implícita cuja

“resposta” subentende a

formação imaginária

correspondente

A IA(R) “Ponto de vista” de A

sobre R

“De que lhe falo assim?”

B IB(R) “Ponto de vista” de B

sobre R

“De que ele me fala

assim?”

Tabela feita pela autora de acordo com PÊCHEUX, 2010, p. 83.

Um exemplo disso é, por exemplo a Figura 2 - Anúncio e laboratório, que foi

produzida para uma revista feminina por uma indústria farmacêutica. O sujeito que

criou o conteúdo pensou em um público-alvo específico, que é o leitor dessa revista

e a fim de vender uma marca. Já quando essa figura é colocada em um livro

didático, o sentido dela não é mais vender um produto, e, sim, exemplificar um

conceito gramatical. A posição aqui é trocada, e esse jogo de formações imaginárias

ganha outros possíveis sentidos.

Orlandi diz: “a imagem que o locutor faz da imagem que o seu interlocutor faz

dele, a imagem que o interlocutor faz da imagem que ele faz do objeto do discurso e

assim por diante” (ORLANDI, 2015, p. 40). Nesse mecanismo, o sujeito experimenta

o que o interlocutor produz, e o sentido das palavras funciona de acordo com essa

situação específica, que poderia ser outra de acordo com os pontos de vista dos

falantes.

Aqui, o ponto de vista é de uma sala de aula que olha para as figuras

apresentadas a partir de um lugar discursivo, passando por todos esses processos

para experimentar o que lhe está sendo proposto no livro. Apesar de o foco deste

trabalho não ser nas possíveis interpretações que esses sujeitos-alunos têm do

material, é importante destacar a maneira que a Análise do Discurso compreende os

sujeitos e os sentidos.

O jogo de transformação/reprodução acontece o tempo todo, e é nessa

contradição que se dá esse trabalho. As imagens analisadas são observadas a partir

do que as faz serem caricatas e contraditórias.

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É necessário destacar que esse trabalho foca a observação dessas imagens

e de que maneiras elas significam por meio do interdiscurso e dos meios de

produção pelos quais essas imagens se fazem.

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4 ANÁLISE DO OBJETO

O capítulo que se inicia propõe a análise de seis figuras retiradas do livro

PORTUGUÊS: Contexto, Interlocução e Sentido Vol. 2 – 2º ano e que retratam

mulheres e suas ligações com casamento/família. Cabe ressaltar que este trabalho

não se presta a julgamentos sobre o livro ou sua seleção. Nosso intuito é

compreender as possíveis formas de significar dessas imagens e como isso se

desdobra ao longo da unidade escolhida.

Compreendemos que a funcionalidade das tiras e charges de humor se

encontra no exercício de estereotipar certos eventos e personagens. É exatamente

nesse ponto que esses gêneros encontram uma forma de estabilizar os sentidos já

cristalizados, além de confrontá-los, mostrando, de formas exageradas, eventos

cotidianos. Nessa dualidade, consiste o ponto de reflexão em que esse trabalho se

produz, de observar esse possível discurso formado por imagens ao longo do livro

em questão. Aqui nos propomos, como diz Orlandi (2012), a pensar a contradição e

o movimento do mundo e focar em um dos possíveis discursos definidos a partir de

todas as condições de produção que já foram apresentadas.

Como já foi dito, as palavras possuem sentidos cristalizados quando nos

chegam, então as figuras selecionadas, juntas, corroboram para perpetuar os

estereótipos de mulher, mas também de resistir a eles. Para a análise do discurso,

“A interpretação não é livre de determinações: não é qualquer uma e é

desigualmente distribuída na formação social. Ela é garantida pela memória”

(ORLANDI, 2015, p. 44). É importante ressaltar que todas essas figuras escolhidas

não foram originalmente confeccionadas para fazerem parte de um material

pedagógico, portanto, o funcionamento dessas figuras se altera, pois se alteraram as

partes integrantes do discurso.

Foram observadas 124 figuras ao todo, sendo contabilizadas imagens que

integram da página 304 à página 556, sendo assim 252 páginas, que compõem a

unidade 4 – Gramática, com 10 capítulos cujas questões são voltadas para o uso e

regras da língua portuguesa. Dentre essas 124 figuras, encontramos tiras, charges,

caricaturas e anúncios, sendo a sua maioria de caráter cômico.

Os cálculos a seguir foram produzidos pela autora deste trabalho por meio de

um cálculo da quantidade de figuras e quantidade de páginas. É relevante destacar

o uso do recurso imagético no livro porque a presença de figuras é constante,

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compondo, em média, 49,2% das páginas da unidade, ou seja, em quase metade do

conteúdo desta unidade, o recurso imagético foi utilizado.

Observamos que 23 figuras são com pessoas em situação de trabalho formal7

e, entre os personagens, apenas três são mulheres, e seus cargos são: dois de

secretária e um de apresentadora de TV, respectivamente nas páginas 354, 355 e

367. Em contrapartida, as figuras nas quais as mulheres ocupam posições de

esposa e mãe, ou em situação de trabalho doméstico, temos 25 em um total de 31

figuras. Mulher em situações de casamento/família acaba sendo uma tônica, uma

vez que encontramos esse par quase sempre unido nas figuras da unidade

estudada.

Lembremos que omissão é uma maneira de falar, e o fato de mulheres não

serem retratadas em posições de trabalho formal é uma maneira de estabilizar os

lugares que são relacionados a esse gênero. Também podemos observar que, na

maioria das figuras, as mulheres estão em desalinho com a situação em que estão

vivendo, quase sempre estão irritadas e se sentem pouco valorizadas por seus

parceiros, como será observado nas figuras analisadas abaixo. Essa é uma maneira

de mostrar que essa situação em que elas vivem não é ideal ou feliz, criando uma

resistência.

A Figura 2 – Anúncio publicitário da Saúde Feminina, que será nossa SD 1

(Sequência Discursiva), seguindo a metodologia da análise do discurso, as figuras a

serem analisadas serão consideradas sequências discursivas - SDs e assim

enumeradas.

A SD1, a seguir, é um anúncio divulgado na Revista Nova, uma versão

brasileira da Cosmopolitan, que é destinada para o público feminino, sendo seus

assuntos principais: amor/sexo e vida/trabalho. A peça publicitária é de uma

fabricante de remédios americana chamada Wyeth, e, na descrição da figura,

intitula-se como “Lider Mundial em Saúde Feminina”.

7 É importante destacar que aqui trabalhamos com a ideia de trabalho formal e trabalho doméstico, compreendendo que os dois são trabalhos.

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Figura 02 – Anúncio Publicitário da Saúde Feminina - SD 1

FONTE: NOVA, 2003 APUD ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 323.

Na SD 1, podemos observar uma mulher de branco, com os braços

levantados para o céu em um dia ensolarado, transmitindo-nos uma sensação de

paz, que, aliás, para o anúncio, é uma das coisas mais importantes na vida – e é

feminina.

Essa figura vem bem no começo da unidade do livro e é colocada junto a um

texto que fala sobre as culpas do sexo feminino:

A prova de que o sexo feminino é o grande culpado das infelicidades do mundo aqui está: Automóvel é masculino; trombada é feminino. Fratura é feminino; curativo é masculino. Dor é feminino; comprimido é masculino. Doença é feminino; remédio é masculino. Miséria é feminino; dinheiro é masculino. Nascimento é masculino; morte é feminino. (NUNES, 1996 apud ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010. p. 106).

Assim, o exercício proposto foi o de mostrar para o aluno/aluna questões

relacionadas ao gênero feminino no sentido do gênero das palavras, misturando

esses dois tipos.

No anúncio, o livro foca nessas palavras, que são femininas no sentido

gramatical, mas anteriormente, como o sentido da propaganda era outro, essas são

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palavras relacionadas normalmente ao sexo feminino. A imagem A, que é da

propaganda sobre B, que é o leitor da revista, é de „‟quem sou eu para que lhe fale

assim?”, e, nesse momento, A é o especialista em saúde feminina e projeta uma

imagem de mulher, uma mulher pacífica e tranquila pelo fato de se cuidar. Mas, no

livro didático em questão, esses sujeitos são outros. A imagem de A agora é o

organizador do livro, e a imagem de B são os leitores desse livro, dessa forma, o

sentido se desloca e se transforma. Os alunos/alunas que estão consumindo esse

anúncio não o estão recebendo numa situação de compradores e sim dentro de uma

proposta pedagógica e isso faz diferença no olhar desse aluno-sujeito.

Todas essas palavras acabam colocando a mulher em um lugar ameno e

sereno, uma vez que ela é paz, não guerra; ela é felicidade, mas não feliz, ela é

sexualidade, mas não sexo, revelando que “a ênfase no prazer sexual/sentimental

feminino ameaça as bases da dupla moral para os sexos e da dominação masculina

na hierarquia de gênero” (VITA, 2013, p. 27). As palavras apresentadas no cartaz

não são de ato, são de passividade.

Essa imagem, junto à falta de questionamento sobre como sexo feminino e

gênero feminino gramatical estão misturados, acaba apenas cristalizando essa

posição em que a mulher normalmente é colocada. O conjunto de imagens e

discursos na mesma vertente acaba reforçando esse estereótipo de mulher

pacificada e de guerra entre os sexos, uma vez que o diálogo entre os textos é o de

quais palavras femininas e masculinas são “boas” ou “ruins”.

Como o livro não traz nenhum direcionamento acerca de questionar esses

pontos, acaba cabendo ao professor fazer essas indagações e a desnaturalização

do que é gênero de pessoa e de palavra.

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Figura 03 – Charge da Maitena - SD 2

FONTE: :MAITENA, 2005 APUD PORTUGUÊS: Contexto, Interlocução e Sentido Vol. 2 – 2º ano, 2010,

p.526.

A SD 2 acima é da cartunista argentina Maitena Burundarena, criadora de

uma obra inteiramente voltada para os assuntos femininos, como ela mesmo diz ao

falar de seus livros: “(...) já estão no número 5 e todos tratam do mesmo assunto:

mulheres e suas relações com homens, filhos, casa, trabalho, mães, sogras e o

objeto de consumo supremo, os sapatos” (BLANCO, 2017).

Na charge, o homem é descrito como “superpreocupado” pelas outras

personagens e é desenhado com os olhos arregalados e cansados, enquanto as

mulheres ao fundo conversam sobre ele e o problema pelo qual ele está passando.

Segundo a fala das personagens, ele está apaixonado por uma mulher que é

lindíssima, e essa é a característica que a define, “mulher lindíssima”, mas ela tem o

defeito de ter um cérebro. Entre todos os problemas que a segunda mulher lista que

a mulher pode ter, como uma doença incurável ou um amante, a primeira diz que ter

cérebro é muito pior. Como todos os seres humanos possuem cérebro, o efeito do

sempre-dito, de que mulher não é inteligente, entra em funcionamento.

O humor dessa tira reside no fato de que homens normalmente não

procuram mulheres inteligentes e até desaprovam essa característica. Além disso,

também coloca a mulher inteligente como rara ou inexistente, uma vez que ele não

espera que ela o seja.

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A resistência desse quadrinho se dá exatamente na ideia de o homem se

desesperar com parceiras inteligentes e de que é um grande problema para ele.

Essa charge foi retirada, para o corpus do livro analisado, da Folha de São

Paulo, em que a imagem de A era o jornal que o publicou, e a imagem de B era o

leitor desse jornal, que consome esse tipo de conteúdo. Leitor que provavelmente

pertence a uma classe social mais escolarizada e encontra esse conteúdo numa

seção humorística.

Agora a imagem de A é o livro didático em questão, e a imagem de B são os

leitores dele. Quando ocorre esse deslocamento, os sentidos também se deslocam;

essas imagens alteram o discurso, tornando-se outro, de acordo com lugar

discursivo dos falantes. O aluno/aluna que lê essa charge não está em uma posição

descontraída, lendo por entretenimento e sim em uma situação de aprendizado com

finalidade pedagógica.

Os processos de produção de sentido que ocorrem nesse discurso passam

pelo senso comum de que a mulher inteligente não é bem quista pelo homem, por

ser uma possível ameaça.

Existe, nessa charge possibilidade de reprodução/transformação. Ter essa

imagem no corpus faz com que o padrão do que é ser mulher ideal, e ideal dentro do

senso comum, seja questionado.

Essa é uma das únicas figuras analisadas em que a proposta da questão traz

uma abordagem sobre o que está sendo dito e quais possíveis desdobramentos

essa ideia carrega. As questões que se seguem ao exercício são:

3. A Explicação dada para o motivo de preocupação do homem é curiosa: além de lindíssima, a mulher por quem ele se apaixonou “tem cérebro”. Dado todos os seres humanos têm cérebro, como deve ser entendida essa informação? a) Por que ter cérebro é considerado algo terrível? 4. O cartum, ao revelar o motivo da preocupação do homem apaixonado, promove a reflexão sobre uma imagem corrente em nossa sociedade a respeito das mulheres lindíssimas. Que imagem é essa? a) O que, no texto, leva o leitor a reconhecer essa ideia implícita? b) Ao tratar dessa questão, o texto problematiza uma visão masculina estereotipada sobre a possibilidade de relacionamento com mulheres inteligentes. Que visão é essa? (ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010. p. 336).

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Os sentidos da charge e a visão internalizada dessa posição-mulher são

problematizados pela questão. O mesmo não acontece com as imagens em que a

mulher é retratada em situações de casamento/família.

Figura 04 – O filho do duque – SD 3

Fonte: BROWNE, 1997 apud ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 339.

Hagar, o horrível, é um personagem criado pelo Chis Browne, um americano

que faz tiras que são traduzidas para mais de 45 países. Esse quadrinho foi retirado

pelas organizadoras do livro da Folha de São Paulo.

Aqui temos a menina que apresenta seu namorado para o pai. Mesmo ele

sendo “apenas o filho ocioso e imprestável de um rico barão”, o fato de ele ser rico o

qualifica para ser bem tratado pelo sogro, que compreende esse ser rico como uma

qualidade que se sobrepõe aos defeitos que ele possui.

Retomemos historicamente que, durante muito tempo, filhas mulheres eram

uma forma de escambo para seus pais, e essa visão, quando pensada dentro de

uma sociedade Viking, ganha comicidade, uma vez que é um evento que acontece

nos dias de hoje. Há uma memória que funciona na contradição entre o primitivo e o

atual.

No exercício do qual a SD 3 faz parte, a proposta é de, primeiro, reconhecer

os adjetivos que o rapaz usa para se definir e compreender o que no comportamento

do pai acontece e que não é esperado: “2. No último quadrinho, Hagar surpreende o

rapaz com sua reação. Por quê? a) Que expressão adjetiva, na apresentação que

Bob faz de si mesmo, determina a reação de Hagar? Justifique.” (ABAURRE;

ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 339).

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O pai em questão não está preocupado com os defeitos que o genro anuncia,

uma vez que contanto que ele seja rico, ele é perdoado. Historicamente, dentro do

casamento, percebemos que os homens têm a responsabilidade de cuidar

financeiramente do lar e a mulher da manutenção e cuidado tanto dos filhos quanto

do marido.

“O casamento sempre se apresentou de maneira radicalmente diferente

para o homem e para a mulher. [...] O encargo que a sociedade impõe à

mulher é considerado um serviço prestado ao esposo: em consequência,

ele deve à esposa presentes ou uma herança, e compromete-se a sustentá-

la…” (BEAUVOIR, 2009, p. 548-549).

Mostrar essa cena em um cenário primitivo é uma maneira de questionar essa

prática que existe ainda no cenário atual, o problema ocorre quando essa não é uma

das preocupações da questão e o fato do deslocamento dos sujeito faz com que

esse discurso de resistência que existe na SD 3, caia no senso comum e cristalize

ainda mais essa cena.

As próximas duas SDs também são do Hagar, mas agora mostram

situações de casamento, em que, nas duas, a mulher está servindo a comida ao seu

marido, e o desalinho entre os dois é visível. Como os personagens aqui são

retratados em uma civilização primitiva, não são cenas incomuns, mas o que faz a

adversidade é o fato de essa cena ainda ser uma verdade, no sentido de que a

mulher é ainda responsável quase que exclusivamente pela manutenção do lar, e é

esse o ponto de resistência dessas duas tiras.

Figura 05 – Café da Manhã de Hagar – SD 4

Fonte: BROWNE, 1999 apud ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 359.

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Figura 06 – Almoço de Hagar – SD 5

Fonte: BROWNE, 2001 apud ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 480.

De novo, as formações imaginárias precisam ser levadas em conta, uma vez

que na, SD 4, a imagem de A é da Folha de São Paulo, que publica para a imagem

de B, leitor desse jornal; e, na SD 5, a imagem de A é o jornal O Globo, e a imagem

de B é do leitor deste jornal, que está em uma situação de lazer ao ler a seção de

humor do jornal e pertence a uma classe mais escolarizada; em ambos os casos,

quando transplantados para o livro didático, a imagem de A é o livro didático, e a

imagem de B é o leitor deste livro, que o lê com uma finalidade pedagógica.

Os sentidos são sempre múltiplos, e a mesma resistência que existe nas SDs

4 e 5, no discurso de estereotipar um marido sempre sendo servido à mesa pela

esposa que por diversos motivos não o serve da maneira esperada, pode ser o

estereótipo da mulher “reclamona”, como aparece em Calvin e o pai, que

apresentamos na introdução deste trabalho.

A cena de uma mulher servindo seu marido, pode ser vista como natural e

assim perpetuar essa posição em que ela ocupa. Isso, junto à quantidade de vezes

em que a mulher é retratada nessa posição, pode acabar consolidando um discurso,

apesar do caráter de resistência da obra.

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Reside aqui esse diálogo entre reprodução do que é a posição da mulher

mas também uma transformação. Quando essas figuras são apresentadas pelos

alunos/alunas e não questionadas, esses retratos considerados cotidianos, de uma

esposa servindo seu marido, acaba passando batido, e aumenta o discurso de

normalidade dessas cenas.

Na SD 7, e última, fica a sensação de que a experiência de ser dona de casa

e arcar com todas as responsabilidades domésticas pelo casal, cria a sensação de

desequilíbrio entre o casal.

Figura 07 – Zé do Boné – SD 6

Fonte: SMITHE, 2002 apud ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 393.

A SD 6 do Zé do Boné, originalmente Anddy Capp, foi retirado do Jornal da

Tarde e retrata dois personagens, o Zé do Boné e Dona Flo, sua esposa. De acordo

com o Guia dos Quadrinhos8, Zé do Boné é um inglês suburbano malandro, sempre

com sua boina (daí o nome), que vive cercado de vícios: beber cerveja, fumar, jogar,

ver TV, assistir uma pelada (futebol), paquerar garotas etc. Sua mulher, Flo, tem que

aturar o simpático imprestável.

Na SD 6, o casal procura um conselheiro matrimonial, que faz uma pergunta

introdutória aos cônjuges sobre a divisão de tarefas domésticas, e a personagem

Dona Flo responde que eles dividem meio a meio, apesar de ela ter ficado com a

primeira metade da vida inteira, mostrando que esse casal vive uma rotina desigual

dentro do ambiente doméstico. Novamente, a mulher é retratada como a principal

cumpridora da manutenção do lar.

8 RIBEIRO, 2008, Site Guia dos Quadrinhos.

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Como nas SDs analisadas anteriores, há aqui o deslocamento das imagens

de A e B. A imagem de A, na SD 6, é do Jornal da Tarde, e a imagem de B é do

leitor desse jornal. No contexto deste trabalho, agora, a imagem de A é do livro

didático, e a imagem de B é do leitor desse livro.

A proposta do livro, na unidade analisada, cumpre uma agenda baseada no

caráter gramatical e não se questiona sobre os sentidos da tira.

Mais uma vez, os sentidos de transformação/consolidação podem ser

observados, e avaliar a dona Flo como mais uma das mulheres em desalinho com a

vida que leva é um discurso possível mas não é explorado pelo livro.

Retornamos então para a página 3 desta monografia, em que na figura 1-

Calvin e o Pai, Calvin diz que as mulheres são sempre retratadas como “choronas,

indecisas, megeras, reclamonas e peruas!”, podemos perceber que essa acaba

sendo uma tônica que se repete ao longo dessas figuras.

O estereótipo da mulher insatisfeita com as funções domésticas que exerce é

uma maneira de deslizamento dos sentidos cristalizados nos sempre-ditos e pode

funcionar como discurso de contestação dessa posição e meio de luta por forma de

questionamento, no reclamar, no não se conformar. É essa mulher que, em estado

de esposa, não se parece com a mulher da SD 1, pacificada.

A Análise do Discurso acontece na intersecção entre os vários discursos

possíveis, que, através das condições de produção, estabelecem efeitos de sentido,

de transformação e de estabilização. Não cabe aqui averiguar como esses discursos

alteraram o leitor do livro didático analisado, mas cabe, sim, estabelecer que esses

sentidos acontecem, paralelamente, e que podem ser observados ou não por esse

leitor, percebendo essas maneiras de significar a alterações ou estabilizações de

posição do sujeito mulher na sociedade.

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5 CONCLUSÃO

Pensar o papel da mulher historicamente e estudá-lo na prática atual,

seguindo a Análise do Discurso, é uma maneira de compreender o mundo em que

vivemos e como a posição em que o sujeito mulher é percebida.

Como foi dito na introdução, a intenção desse trabalho é observar como a

mulher é retratada no livro didático Português: Contexto, Interlocução e Sentido, por

meio de imagens contidas na Unidade 4, que abrange a parte gramatical do livro

adotado, dentro da sequência discursiva mulher e suas relações com

casamento/família.

Ao longo deste trabalho, analisamos como os estereótipos de mulher e suas

maneiras de transformação/consolidação criam discursos possíveis dentro da

imagem que fazemos do sujeito mulher.

Analisar discursivamente as posições que sujeito mulher exerce dentro do

material didático pode corroborar para uma prática menos discriminatória quanto ao

papel doméstico pelo fato de todas contestarem-no. “As mudanças nos arranjos

familiares podem ser expressivas de redefinições nas relações de gênero, com

deslocamentos nos papéis convencionais.” (BIROLI; MIGUEL; 2014, p. 11).

Notou-se que o livro traz, na sua grande maioria, a mulher desempenhando a

função de dona de casa, esposa ou mãe, com pouca representatividade de

mulheres em serviços formais.

O fato de que essas imagens carregam em si formas de resistir aos lugares

comuns pode não funcionar como discurso de resistência quando retirados de seus

contextos anteriores e, quando colocados no livro didático sem uma proposta de

repensar esses estereótipos, criam discursos que consolidam o sujeito mulher nessa

imagem cristalizada de esposa e dona de casa "reclamona”, fazendo com que a

comicidade das figuras passa de resistência à consolidação.

Cabe então ao professor, e aos envolvidos nas práticas pedagógicas,

complementar esses sentidos e revisitá-los, de uma forma que o aluno questione

tudo o que ele lê e vê.

Demonstramos então como a mulher e suas relações com a função dentro

do casamento é desigual e o quanto o livro didático acaba não se preocupando em

evidenciar com clareza essa desigualdade.

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“O destino que a sociedade propõe tradicionalmente à mulher é o do

casamento. Em sua maioria, ainda hoje, as mulheres são casadas, ou o foram, ou

se preparam para sê-lo, ou sofrem por não sê-lo.” (BEAUVOIR, 2009, p. 547).

Existe, como percebemos nos objetos analisados, resistência a essa proposição que

a sociedade faz de casamento, mas existe consolidação também. É entre esses

discursos que nossa análise se cumpre.

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