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Informativo 983-STF (01/07/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 983-STF Márcio André Lopes Cavalcante Julgamento ainda não concluído em virtude de pedido de vista. Será comentado quando chegar ao fim: MS 35506/DF. NOVIDADE EXCLUSIVA O Clipping das Sessões Virtuais é um trecho do Informativo original do STF no qual são divulgadas apenas as ementas dos acórdãos que foram proferidos pelo Tribunal em sessões ocorridas no Plenário Virtual. Esses julgados – que não são explicados no original – estão também nos Informativos do Dizer o Direito. Os julgados mais relevantes do Clipping das Sessões Virtuais serão sempre comentados nos Informativos do DOD, permitindo que você tenha uma atualização completa. Assim, quando encontrar essa expressão “(Info 983 – clipping)” ao lado do número do julgado, saiba que se trata de um acórdão não explicado no Informativo original, tendo sido divulgado apenas no Clipping, mas que o Prof. Márcio irá comentar para você. Prepare-se porque agora você irá ouvir muito falar no Clipping :) ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL PODER JUDICIÁRIO Não é compatível com a Constituição Federal a regra segundo a qual apenas os Desembargadores mais antigos possam concorrer aos cargos diretivos dos Tribunais de Justiça. SEGURANÇA PÚBLICA Não é possível que os Estados-membros criem órgão de segurança pública diverso daqueles que estão previstos no art. 144 da CF/88. DIREITO ADMINISTRATIVO SERVIDORES PÚBLICOS Constitucionalidade do art. 40, § 18 da CF/88 e do art. 9º da EC 41/2003. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão do Tribunal de Contas. DIREITO AMBIENTAL RESPONSABILIDADE CIVIL A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais DIREITO TRIBUTÁRIO IMPOSTO DE RENDA Não é possível estender, pela via judicial, a isenção prevista no art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88 aos trabalhadores em atividade.

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Page 1: Informativo comentado: Informativo 983-STF · 9. Violação do artigo 144 c/c o art. 25 da Constituição da República. 10. Ação direta de inconstitucionalidade parcialmente procedente

Informativo 983-STF (01/07/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 983-STF

Márcio André Lopes Cavalcante Julgamento ainda não concluído em virtude de pedido de vista. Será comentado quando chegar ao fim: MS 35506/DF.

NOVIDADE EXCLUSIVA O Clipping das Sessões Virtuais é um trecho do Informativo original do STF no qual são divulgadas apenas as ementas dos acórdãos que foram proferidos pelo Tribunal em sessões ocorridas no Plenário Virtual. Esses julgados – que não são explicados no original – estão também nos Informativos do Dizer o Direito. Os julgados mais relevantes do Clipping das Sessões Virtuais serão sempre comentados nos Informativos do DOD, permitindo que você tenha uma atualização completa. Assim, quando encontrar essa expressão “(Info 983 – clipping)” ao lado do número do julgado, saiba que se trata de um acórdão não explicado no Informativo original, tendo sido divulgado apenas no Clipping, mas que o Prof. Márcio irá comentar para você. Prepare-se porque agora você irá ouvir muito falar no Clipping :)

ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL

PODER JUDICIÁRIO ▪ Não é compatível com a Constituição Federal a regra segundo a qual apenas os Desembargadores mais antigos

possam concorrer aos cargos diretivos dos Tribunais de Justiça. SEGURANÇA PÚBLICA ▪ Não é possível que os Estados-membros criem órgão de segurança pública diverso daqueles que estão previstos no

art. 144 da CF/88.

DIREITO ADMINISTRATIVO

SERVIDORES PÚBLICOS ▪ Constitucionalidade do art. 40, § 18 da CF/88 e do art. 9º da EC 41/2003. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO ▪ É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão do Tribunal de Contas. DIREITO AMBIENTAL

RESPONSABILIDADE CIVIL ▪ A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da

imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais

DIREITO TRIBUTÁRIO

IMPOSTO DE RENDA ▪ Não é possível estender, pela via judicial, a isenção prevista no art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88 aos trabalhadores em

atividade.

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CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA ▪ É constitucional a contribuição social do segurado especial prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91. DIREITO FINANCEIRO ▪ Análise da constitucionalidade da Lei de Responsabilidade Fiscal.

DIREITO INTERNACIONAL

EXPULSÃO ▪ É proibida a expulsão caso o estrangeiro tenha filho brasileiro e ele esteja sob a sua guarda ou dependência

econômica ou socioafetiva, mesmo que isso tenha ocorrido após o fato ensejador do ato expulsório.

DIREITO CONSTITUCIONAL

PODER JUDICIÁRIO Não é compatível com a Constituição Federal a regra segundo a qual apenas os

Desembargadores mais antigos possam concorrer aos cargos diretivos dos Tribunais de Justiça

O art. 62 da Constituição do Estado de São Paulo, ao restringir o universo dos possíveis candidatos aos órgãos de cúpula do TJ/SP aos integrantes de seu órgão especial, é inconstitucional porque desrespeitou a autonomia administrativa dos tribunais, consagrada no art. 96, I, “a”, e no art. 99 da CF/88.

O art. 102 da LOMAN (LC 35/79) não foi recepcionado pela CF/88, considerando que não é compatível com a Constituição Federal a regra segundo a qual apenas os Desembargadores mais antigos possam concorrer aos cargos diretivos dos tribunais. Essa matéria, em razão da autonomia consagrada no art. 96, I, “a”, e no art. 99 da CF/88, deve ser remetida à disciplina regimental de cada tribunal.

STF. Plenário. ADI 3976/SP e MS 32451/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 25/6/2020 (Info 983).

Eleição dos órgãos diretivos do Tribunal de Justiça A Constituição do Estado de São Paulo tratou sobre a eleição para os cargos de Presidente, Vice-Presidente e Corregedor do Tribunal de Justiça. A Carta Estadual afirmou que somente poderiam concorrer a esses cargos os Desembargadores integrantes do órgão especial do TJ/SP, ou seja, os Desembargadores mais antigos. Veja:

Art. 62. O Presidente e o 1º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça e o Corregedor Geral da Justiça, eleitos, a cada biênio, pela totalidade dos Desembargadores, dentre os integrantes do órgão especial, comporão o Conselho Superior da Magistratura.

Essa regra da Constituição Estadual foi editada com base no art. 102 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN (LC 35/79):

Art. 102. Os Tribunais, pela maioria dos seus membros efetivos, por votação secreta, elegerão dentre seus Juízes mais antigos, em número correspondente ao dos cargos de direção, os titulares destes, com mandato por dois anos, proibida a reeleição. Quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, não figurará mais entre os elegíveis, até que se esgotem todos os nomes, na ordem de antiguidade. É obrigatória a aceitação do cargo, salvo recusa manifestada e aceita antes da eleição.

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Desse modo, a LOMAN também adotou esse critério de que o Presidente, Vice-Presidente e Corregedor do TJ deveriam ser escolhidos dentre os Desembargadores mais antigos. Essa previsão da CE/SP e da LOMAN é compatível com o texto atual da Constituição Federal? NÃO. O STF entende que os Tribunais de Justiça possuem autonomia para disciplinar a eleição dos seus cargos de direção (Presidente, Vice-presidente e Corregedor-geral de justiça) e que todos os seus membros podem concorrer às vagas. Essa autonomia decorre do art. 96, I, “a” e do art. 99, ambos da CF/88:

Art. 96. Compete privativamente: I - aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos; (...)

Art. 99. Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira.

O art. 62 da Constituição do Estado de São Paulo, ao restringir o universo dos possíveis candidatos aos órgãos de cúpula do TJ/SP aos integrantes de seu órgão especial, desrespeitou a autonomia administrativa dos tribunais, consagrada no art. 96, I, “a”, e no art. 99 da CF/88. STF. Plenário. ADI 3976/SP e MS 32451/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 25/6/2020 (Info 983).

Mas e o art. 102 da LOMAN? O STF decidiu que:

O art. 102 da LOMAN (LC 35/79) não foi recepcionado pela CF/88. STF. Plenário. ADI 3976/SP e MS 32451/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 25/6/2020 (Info 983).

A partir da promulgação da Constituição de 1988, houve uma alteração substancial no regramento da matéria, homenageando a autonomia dos tribunais e, em última análise, uma visão mais consentânea do federalismo, ensejando uma postura do Poder Judiciário deferente à competência normativa dos entes federados. Além disso, após a EC 45/2004, a eleição para os cargos de cúpula dos tribunais passou a ser regida pelos respectivos regimentos internos, não mais subsistindo a remissão à LOMAN. Pela redação dos arts. 99 e 102 da LOMAN, os cargos de cúpula dos tribunais somente poderiam ser ocupados por Desembargadores eleitos dentre os mais antigos, os quais, a seu turno, compunham o órgão especial. Ocorre que a EC 45/2004 estabeleceu uma nova lógica na CF/88, que não tem na antiguidade critério exclusivo. A composição do órgão especial passa a ser ditada não apenas pela antiguidade, mas também pela eleição dentre os pares do plenário das cortes. Não há, no texto da CF/88, distinção praticada entre os integrantes do órgão especial e os demais componentes da corte que justifique impedimento a que estes últimos concorram aos cargos de cúpula. Compare o texto da CF/88 com a redação da EC 45/2004:

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CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Redação originária Redação dada pela EC 45/2004

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: (...) XI - nos tribunais com número superior a vinte e cinco julgadores poderá ser constituído órgão especial, com o mínimo de onze e o máximo de vinte e cinco membros, para o exercício das atribuições administrativas e jurisdicionais da competência do tribunal pleno.

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: (...) XI - nos tribunais com número superior a vinte e cinco julgadores, poderá ser constituído órgão especial, com o mínimo de onze e o máximo de vinte e cinco membros, para o exercício das atribuições administrativas e jurisdicionais delegadas da competência do tribunal pleno, provendo-se metade das vagas por antiguidade e a outra metade por eleição pelo tribunal pleno;

Para o STF, a EC 45/2004, ao falar em eleição para os integrantes do órgão especial, afirmou, indiretamente, que a antiguidade não poderia ser o único critério para a escolha dos dirigentes do Tribunal, razão pela qual esta parte final do art. 102 da LOMAN não teria sido recepcionada.

SEGURANÇA PÚBLICA Não é possível que os Estados-membros criem órgão de segurança pública

diverso daqueles que estão previstos no art. 144 da CF/88

Não é possível que os Estados-membros criem órgão de segurança pública diverso daqueles que estão previstos no art. 144 da CF/88.

Os Estados-membros e o Distrito Federal devem seguir o modelo federal.

O art. 144 da Constituição aponta os órgãos incumbidos do exercício da segurança pública, sendo esse rol taxativo.

Assim, a Constituição Estadual não pode prever a criação de Polícia Científica como órgão integrante da segurança pública.

Vale ressaltar que nada impede que a Polícia Científica, criada pelo Estado-membro para ser o órgão responsável pelas perícias, continue a existir e a desempenhar suas funções, sem estar, necessariamente, vinculada à Polícia Civil. No entanto, deve-se afastar qualquer interpretação que lhe outorgue caráter de órgão de segurança pública.

STF. Plenário. ADI 2575/PR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 24/6/2020 (Info 983).

A Constituição do Estado do Paraná, em sua redação originária, previu o seguinte:

Art. 50. A polícia científica, com estrutura própria, incumbida das perícias de criminalística e médico-legais, e de outras atividades técnicas congêneres, será dirigida por peritos de carreira da classe mais elevada, na forma da lei.

Essa previsão é constitucional? SIM, mas é necessário que seja dada intepretação conforme.

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O STF afirmou que essa previsão é constitucional, mas desde que se interprete que esse órgão criado “Polícia Científica”, não tem caráter de órgão de segurança pública. E por que ele não pode ter caráter de órgão de segurança pública? Porque ele não está no rol do art. 144 da CF/88. O rol de órgãos encarregados do exercício da segurança pública está previsto no art. 144, I a V, da CF/88, sendo um rol taxativo. Esse modelo federal deve ser observado pelos Estados-membros e pelo Distrito Federal. Esse entendimento já foi adotado pelo STF no seguinte caso:

(...) Criação do Instituto-Geral de Perícias e inserção do órgão no rol daqueles encarregados da segurança pública. (...) 5. Observância obrigatória, pelos Estados-membros, do disposto no art. 144 da Constituição da República. Precedentes. 6. Taxatividade do rol dos órgãos encarregados da segurança pública, contidos no art. 144 da Constituição da República. Precedentes. 7. Impossibilidade da criação, pelos Estados-membros, de órgão de segurança pública diverso daqueles previstos no art. 144 da Constituição. Precedentes. 8. Ao Instituto-Geral de Perícias, instituído pela norma impugnada, são incumbidas funções atinentes à segurança pública. 9. Violação do artigo 144 c/c o art. 25 da Constituição da República. 10. Ação direta de inconstitucionalidade parcialmente procedente. STF. Plenário. ADI 2827, Rel. Gilmar Mendes, julgado em 16/09/2010.

Nada impede que a Polícia Científica, órgão responsável pelas perícias, continue a existir e a desempenhar suas funções, sem estar, necessariamente, vinculada à Polícia Civil. No entanto, ela (Polícia Científica) não pode ser considerada juridicamente órgão de segurança pública. Assim, por exemplo, os integrantes dessa “Polícia Científica” não têm, em tese, direito a porte de arma como policiais, não gozam da aposentadoria especial de policial etc. Em suma:

Não é possível que os Estados-membros criem órgão de segurança pública diverso daqueles que estão previstos no art. 144 da CF/88. Os Estados-membros e o Distrito Federal devem seguir o modelo federal. O art. 144 da Constituição aponta os órgãos incumbidos do exercício da segurança pública, sendo esse rol taxativo. Assim, a Constituição Estadual não pode prever a criação de Polícia Científica como órgão integrante da segurança pública. Vale ressaltar que nada impede que a Polícia Científica, criada pelo Estado-membro para ser o órgão responsável pelas perícias, continue a existir e a desempenhar suas funções, sem estar, necessariamente, vinculada à Polícia Civil. No entanto, deve-se afastar qualquer interpretação que lhe outorgue caráter de órgão de segurança pública. STF. Plenário. ADI 2575/PR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 24/6/2020 (Info 983).

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DIREITO ADMINISTRATIVO

SERVIDORES PÚBLICOS Constitucionalidade do art. 40, § 18 da CF/88 e do art. 9º da EC 41/2003

É constitucional o art. 40, § 18, da CF/88, incluído pela EC 41/2003:

Art. 40 (...) § 18. Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos.

Também é constitucional o art. 9º da EC 41/2003:

Art. 9º Aplica-se o disposto no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias aos vencimentos, remunerações e subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.

STF. Plenário. ADI 3133/DF, ADI 3143/DF e ADI 3184/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 24/6/2020 (Info 983).

Reforma da Previdência de 2003 Como você já deve ter percebido, de tempos em tempos é realizada uma Reforma da Previdência, sendo a última operada pela EC 103/2019. Em 2003, também houve uma profunda reforma, materializada pela EC 41. Foram propostas diversas ADIs contra essa emenda. O STF já julgou algumas delas e, em 2020, foram apreciadas três ações que ainda estavam pendentes.

O que o STF decidiu?

O STF, por maioria, decidiu: • julgar constitucional o art. 40, § 18, da CF/88, incluído pela EC 41/2003; • julgar constitucional o art. 9º da EC 41/2003; • reconhecer que houve a perda superveniente do objeto quanto à impugnação dos incisos I e II do § 7º do art. 40 da CF/88, na redação dada pela EC 41/2003. Esse § 7º do art. 40 foi substancialmente alterado pela EC 103/2019, de forma que as ações ficaram prejudicadas neste ponto. STF. Plenário. ADI 3133/DF, ADI 3143/DF e ADI 3184/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 24/6/2020 (Info 983).

Art. 40, § 18

Art. 40 (...) § 18. Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41/2003)

A discriminação determinada pela norma, segundo a qual incidirá contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadorias e pensões que excederem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social, configura situação justificadamente favorável àqueles que já recebiam benefícios quando do advento da EC 41/2003, incluídos no rol dos contribuintes.

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Se por um lado, a contribuição devida pelos servidores da ativa seria calculada com base na totalidade dos vencimentos percebidos, por outro, inativos e pensionistas teriam o valor de sua contribuição fixado sobre base de cálculo inferior, pois dela seria extraído valor equivalente ao teto dos benefícios pagos no regime geral. Desse modo, haveria proporcionalidade, visto que os inativos, por não poderem fruir do sistema da mesma forma que os ativos, não seriam tributados com a mesma intensidade. Art. 9º da EC 41/2003

Emenda Constitucional 41/2003 Art. 9º Aplica-se o disposto no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias aos vencimentos, remunerações e subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.

O que diz o art. 17 do ADCT:

Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título.

O STF afirmou que esse art. 9º da EC 41/2003 não afronta a cláusula pétrea do direito adquirido. Na redação originária da CF, o teto remuneratório não poderia ser ultrapassado. Não há que se falar, portanto, em direito adquirido à percepção de verbas em desacordo com o texto constitucional. Ademais, o Ministro Gilmar Mendes aduziu haver risco na declaração de inconstitucionalidade, sem restrições, do art. 9º, porque poderia sinalizar a possibilidade de questionamentos em relação ao teto remuneratório constitucional e envolver dúvidas sobre sua sistemática. De acordo com o Ministro, a remissão ao preceito do ADCT não simbolizaria sua restauração pelo constituinte derivado. O art. 9º é norma expletiva, a enfatizar a existência do limite imposto pelo art. 37, XI, da CF/88 e evitar que o teto seja superado. Obs: o art. 37, XI é o dispositivo que estabelece o teto para o funcionalismo público. O ministro Edson Fachin relembrou que no julgamento do RE 609.381 (Tema 480 da repercussão geral) e do RE 606.358 (Tema 257 da repercussão geral), o STF afirmou que: • O teto fixado pela EC nº 41/2003 é de eficácia imediata e todas as verbas de natureza remuneratória recebidas pelos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios devem se submeter a ele, ainda que adquiridas de acordo com regime legal anterior (RE 609381/GO). Em outras palavras, com a EC nº 41/2003, quem recebia acima do teto fixado teve a sua remuneração reduzida para respeitar o teto. Essa redução foi legítima; • Computam-se para efeito de observância do teto remuneratório do artigo 37, XI, da Constituição da República, também os valores percebidos anteriormente à vigência da EC 41/2003 a título de vantagens pessoais pelo servidor público, dispensada a restituição de valores eventualmente recebidos em excesso e de boa-fé até o dia 18/11/2015 (RE 606358/SP). Assim, esse tema já havia sido` analisado em caráter definitivo no julgamento dos Recursos Extraordinários 609381 e 606358. Neles, o STF firmou entendimento de que o teto remuneratório não poderia ser ultrapassado, seja na redação originária da Constituição Federal ou em reformas ao texto constitucional.

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RESSARCIMENTO AO ERÁRIO É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário

fundada em decisão do Tribunal de Contas

Importante!!!

É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas.

STF. Plenário. RE 636886/AL, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 20/04/2020 (Repercussão Geral – Tema 899) (Info 983 – clipping).

Condenação proferida pelo Tribunal de Contas O Tribunal de Contas, constatando ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, poderá aplicar aos responsáveis as sanções previstas na lei (art. 71, VIII, da CF/88). Assim, o Tribunal de Contas poderá aplicar multas e também determinar que o gestor faça o ressarcimento de valores ao erário (imputação de débito). Esta decisão da Corte de Contas materializa-se por meio de um acórdão. Caso o condenado não cumpra espontaneamente o acórdão do Tribunal de Contas e deixe de pagar os valores devidos, esta decisão poderá ser executada? SIM. As decisões do Tribunal de Contas que determinem a imputação de débito (ressarcimento ao erário) ou apliquem multa terão eficácia de título executivo extrajudicial, nos termos do § 3º do art. 71 da CF/88. Logo, podem ser executadas por meio de uma ação de execução de título extrajudicial. Vale ressaltar que a decisão do Tribunal de Contas deverá declarar, de forma precisa, o agente responsável e o valor da condenação, a fim de que goze dos atributos da certeza e liquidez. A decisão do Tribunal de Contas precisa ser inscrita em dívida ativa? NÃO. A finalidade de se inscrever o débito na dívida ativa é gerar uma certidão de dívida ativa (CDA), que é um título executivo indispensável para o ajuizamento da execução. Ocorre que o acórdão do Tribunal de Contas já é um título executivo extrajudicial por força do art. 71, § 3º, da CF/88 c/c o art. 784, XII, do CPC/2015:

Art. 71 (...) § 3º As decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo.

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: (...) XII - todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.

Desse modo, não há necessidade de esse débito ser inscrito em dívida ativa. O próprio Tribunal de Contas poderá propor a execução de seu acórdão? NÃO. O art. 71, § 3º, da CF/88 não outorgou ao Tribunal de Contas legitimidade para executar suas decisões das quais resulte imputação de débito ou multa. A competência para tal é do titular do crédito constituído a partir da decisão, ou seja, o ente público prejudicado (STF. 2ª Turma. AI 826676 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 08/02/2011).

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Informativo 983-STF (01/07/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 9

Imagine agora a seguinte situação hipotética: João, presidente de uma associação de folclore, deixou de prestar contas de recursos que ele havia recebido do Ministério da Cultura, por meio de convênio, para serem aplicados em projeto cultural. Em razão disso, o Tribunal de Contas da União, no julgamento de Tomada de Contas Especial, condenou João a restituir aos cofres públicos os valores recebidos por meio do convênio. O condenado foi instado a cumprir a obrigação, mas não pagou os valores. A União ajuizou, então, execução de título executivo extrajudicial cobrando a quantia. Como já havia se passado mais que 5 anos, o Juiz Federal extinguiu a execução em razão da prescrição. A União recorreu sustentando a tese de que a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas seria imprescritível. O fundamento para isso seria a parte final do § 5º do art. 37 da CF/88:

Art. 37 (...) § 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.

A tese da União foi acolhida pelo STF? NÃO. O STF decidiu que:

É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas. STF. Plenário. RE 636886, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 20/04/2020 (Repercussão Geral – Tema 899) (Info 983 – clipping).

Regra é a prescrição A regra no Direito brasileiro é a prescrição, ou seja, em regra, as pretensões são prescritíveis. Isso se justifica em razão dos princípios da segurança jurídica e do devido processo legal. O princípio do devido processo legal, em seu sentido material, garante efetiva e real proteção contra o exercício do arbítrio, com a imposição de restrições substanciais ao poder do Estado em relação à liberdade e à propriedade individuais, entre as quais a impossibilidade de permanência infinita do poder persecutório do Estado. STF reconheceu, de forma excepcional, a imprescritibilidade em caso de ato doloso de improbidade O STF concluiu que somente são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato de improbidade administrativa doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92):

São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. STF. Plenário. RE 852475/SP, Rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, Rel. para acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 08/08/2018 (Repercussão Geral – Tema 897) (Info 910).

Em relação aos demais atos ilícitos, inclusive os atos de improbidade praticados com culpa, aplica-se o Tema 666, sendo prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública:

É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. Dito de outro modo, se o Poder Público sofreu um dano ao erário decorrente de um ilícito civil e deseja ser ressarcido, ele deverá ajuizar a ação no prazo prescricional previsto em lei. STF. Plenário. RE 669069/MG, Rel. Min Teori Zavascki, julgado em 03/02/2016 (Repercussão Geral – Tema 666).

Razões excepcionais que levaram o STF a decidir no Tema 897 não se aplicam para ressarcimento decorrente de decisões do Tribunal de Contas As razões que levaram o STF a estabelecer excepcional hipótese de imprescritibilidade, no tema 897, não estão presentes em relação às decisões do Tribunal de Contas que resultem imputação de débito ou multa.

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O Tribunal de Contas pode determinar o ressarcimento sem prescrição afirmando que o responsável pelo débito praticou um ato doloso de improbidade administrativa?

NÃO. No processo de tomada de contas, o Tribunal de Contas não julga pessoas, não perquirindo a existência de dolo decorrente de ato de improbidade administrativa. O que ele faz é o julgamento técnico das contas a partir da reunião dos elementos objeto da fiscalização e apura a ocorrência de irregularidade de que resulte dano ao erário, proferindo o acórdão em que se imputa o débito ao responsável, para fins de se obter o respectivo ressarcimento. Assim, o Tribunal de Contas, ao exercer suas atribuições: a) não analisa a existência ou não de ato doloso de improbidade administrativa; b) não profere decisão judicial, declarando a existência de ato ilícito doloso, não havendo contraditório e ampla defesa plenos, pois não é possível, por exemplo, que o imputado defenda-se afirmando a ausência de elemento subjetivo. Em que pese a importância das competências constitucionais dos Tribunais de Contas e a terminologia utilizada pela Constituição Federal, quando o art. 71, II, da CF/88 fala em “julgar”, não se trata de atividade jurisdicional. O termo julgar é utilizado no sentido de examinar e analisar as contas. A partir da decisão do Tribunal de Contas, pode-se propor ação de improbidade Vale ressaltar que, com base nas decisões do Tribunal de Contas, além da execução do acórdão, é possível que o ente prejudicado ou o Ministério Público proponham ação de improbidade administrativa para, garantido o devido processo legal, ampla defesa e contraditório, eventualmente, condenar-se o imputado, inclusive a ressarcimento ao erário. § 5º do art. 37 não se aplica ao caso Não há previsão constitucional expressa de imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas. Sendo a existência de prazo prescricional a regra, e as hipóteses de imprescritibilidade a exceção, estando todas expressas na Constituição Federal, não é possível a ampliação do significado da norma contida no §5º do art. 37 para abarcar nova hipótese de imprescritibilidade não prevista expressamente na norma. A análise do texto positivo permite confirmar que o §5º apenas garantiu a necessidade de uma lei em sentido formal para definir os prazos prescricionais para os atos descritos no dispositivo, afastando expressamente desta norma a ação de reparação ao erário, regida pela regra geral processual. Assim, não é possível inferir da norma presente no §5º do art. 37 da CF/88 que as ações de reparação ao erário fundadas em decisão de Tribunal de Contas são imprescritíveis.

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DIREITO AMBIENTAL

RESPONSABILIDADE CIVIL A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o

reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais

Importante!!!

É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental.

STF. Plenário. RE 654833, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 20/04/2020 (Repercussão Geral – Tema 999) (Info 983 – clipping).

Imagine a seguinte situação hipotética: Em 1990, João extraiu ilegalmente enorme quantidade de madeira de elevado valor no mercado (mogno, cedro e cerejeira), causando grave dano ambiental. Em 2020, ou seja, mais de 30 anos depois do fato, o Ministério Público ajuizou ação civil pública contra João pedindo a reparação dos danos ambientais causados. O réu defendeu-se afirmando que a pretensão estaria prescrita. O argumento do requerido encontra amparo na jurisprudência? NÃO.

É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental. STF. Plenário. RE 654833, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 20/04/2020 (Repercussão Geral – Tema 999) (Info 983 – clipping).

Veja abaixo um resumo dos principais argumentos. Regra geral e exceção No ordenamento jurídico brasileiro, a regra geral é a de que a pretensão de exigir a reparação dos danos seja submetida à prescrição. A imprescritibilidade, portanto, é exceção. Depende de fatores externos que o ordenamento jurídico reputa inderrogáveis pelo tempo. Tutela constitucional do meio ambiente recomenda a imprescritibilidade da pretensão Embora a Constituição e as leis ordinárias não disponham acerca do prazo prescricional para a reparação de danos civis ambientais, sendo regra a estipulação de prazo para pretensão ressarcitória, a tutela constitucional a determinados valores impõe o reconhecimento de pretensões imprescritíveis. Meio ambiente é patrimônio comum da humanidade O meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda a humanidade, para a garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras. Todas as condutas do Poder Público estatal devem ser direcionadas no sentido de integral proteção legislativa interna e de adesão aos pactos e tratados internacionais protetivos desse direito humano fundamental de 3ª geração, para evitar prejuízo da coletividade em face de uma afetação de certo bem (recurso natural) a uma finalidade individual. Reparação do meio ambiente é direito fundamental indisponível A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais.

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Votos vencidos Ficaram vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Dias Toffoli. STJ Vale ressaltar que, mesmo antes da decisão do STF, o STJ já possuía o entendimento de que a pretensão, neste caso, é imprescritível:

Em sua dimensão coletiva, a jurisprudência desta Corte superior entende que a pretensão de reparação do dano ambiental não é atingida pela prescrição, em função da essencialidade do meio ambiente. STJ. 3ª Turma. REsp 1641167/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/03/2018.

As infrações ao meio ambiente são de caráter continuado, motivo pelo qual as ações de pretensão de cessação dos danos ambientais são imprescritíveis. STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1421163/SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 06/11/2014.

O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, também está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de estar expresso ou não em texto legal. STJ. 1ª Turma. REsp 1.120.117-AC, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 10/11/2009.

DIREITO TRIBUTÁRIO

IMPOSTO DE RENDA Não é possível estender, pela via judicial, a isenção prevista no art. 6º, XIV,

da Lei 7.713/88 aos trabalhadores em atividade

Importante!!!

O art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 prevê que as pessoas portadoras de neoplasia maligna ou outras doenças graves e que estejam na inatividade não pagarão imposto de renda sobre os rendimentos recebidos a título de aposentadoria, pensão ou reforma.

Essa isenção é devida apenas às pessoas que recebem aposentadoria, pensão ou reforma e não é possível que o Poder Judiciário estenda o benefício aos trabalhadores que estão em atividade.

Os juízes e Tribunais não podem, mesmo a pretexto de estabelecer tratamento isonômico, conceder isenção tributária em favor daqueles não contemplados pelo favor legal, porque isso equivaleria, em última análise, a converter o Poder Judiciário em inadmissível legislador positivo.

A legislação optou por critérios cumulativos absolutamente razoáveis à concessão do benefício tributário, quais sejam, inatividade e enfermidade grave, ainda que contraída após a aposentadoria ou reforma.

STF. Plenário. ADI 6025, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 20/04/2020 (Info 983 – clipping).

Isenção de imposto de renda sobre os proventos da aposentadoria para doentes graves O imposto de renda é regido pela Lei nº 7.713/88. Esta Lei prevê que as pessoas portadoras de neoplasia maligna ou outras doenças graves e que estejam na inatividade não pagarão imposto de renda sobre os rendimentos recebidos a título de aposentadoria, pensão ou reforma (art. 6º, XIV). Em palavras mais simples: pessoas portadoras de doenças elencadas pela legislação não pagarão imposto de renda sobre os rendimentos que receberem a título de aposentadoria, pensão ou reforma.

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Para ter direito à isenção do imposto de renda é necessária a cumulação de dois requisitos pelo contribuinte: a) receber proventos de aposentadoria, pensão ou reforma; e b) estar acometido de uma das doenças arroladas no dispositivo legal. Veja a previsão legal:

Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma;

ADI O Procurador-Geral da República ajuizou ADI contra essa previsão. Na ação, o PGR alegou que o art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 seria inconstitucional porque concedeu a isenção do imposto de renda apenas para pessoas que recebem aposentadoria, pensão ou reforma. Segundo alegou o autor, a Lei deveria ter concedido o benefício também para os trabalhadores que estão em atividade e que forem acometidos pelas doenças arroladas no dispositivo legal. Assim, o objetivo do PGR não era retirar o art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 do ordenamento jurídico, mas sim estender esse benefício também para os trabalhadores em atividade. Na ação, o PGR pugnou pela prolação de decisão manipulativa de efeitos aditivos para, “reconhecendo a inconstitucionalidade parcial sem redução de texto do art. 6º, XIV da Lei nº 7.713/1988, declarar que, no seu âmbito de incidência, está incluída a concessão do benefício fiscal aos trabalhadores com doença grave que permanecem em atividade”. O STF acolheu o pedido do PGR? NÃO. Isenção tributária é ato discricionário O primeiro ponto ressaltado pelo STF foi o de que a concessão de isenção tributária configura ato discricionário do ente federativo competente para a instituição do tributo e deve estrito respeito ao princípio da reserva legal (art. 150, § 6º, da Constituição Federal). Assim, o Poder Público, com base em um juízo de conveniência e oportunidade, decide efetivar a política fiscal e econômica com a concessão do benefício. Critérios lógicos e racionais Vale ressaltar, no entanto, que, mesmo sendo um ato discricionário, a concessão da isenção deve observar critérios lógicos e racionais, não podendo ter um conteúdo arbitrário nem conceder privilégios estatais desarrazoados. Desse modo, não sendo cumpridos esses critérios, é possível até mesmo que a isenção tenha sua inconstitucionalidade declarada pelo STF. Poder Judiciário não pode conceder ou ampliar a isenção Em respeito ao princípio da separação de poderes, não é possível que se reconheça ao Poder Judiciário legitimidade para, interferindo no mérito do benefício, conceder ou ampliar benefícios fiscais em favor de

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contribuintes que não foram direta e expressamente contemplados pela lei que instituiu a isenção fiscal, até mesmo em atenção à legalidade estrita, estatuída no art. 150, § 6º, da Constituição Federal:

Art. 150 (...) § 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.

A ampliação de isenção tributária por via jurisdicional contraria a exigência constitucional de lei formal para a veiculação de benefícios fiscais, encontrando limites qualificados, também, no dogma da separação de poderes. Judiciário atuaria como legislador positivo Os juízes e Tribunais não podem, mesmo a pretexto de estabelecer tratamento isonômico, conceder isenção tributária em favor daqueles não contemplados pelo favor legal, porque isso equivaleria, em última análise, a converter o Poder Judiciário em inadmissível legislador positivo. Assim, se o Judiciário reconhecesse que o art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 violou a isonomia, somente poderia declarar a norma inconstitucional (e não estendê-la para outras categorias). Art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 não é inconstitucional Vale ressaltar, no entanto, que o STF entendeu que o art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 é plenamente constitucional, não violando nenhum princípio ou regra da Constituição Federal. Os critérios adotados pelo legislador para a concessão da isenção (inatividade + enfermidade grave) não representam qualquer ofensa à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), aos valores sociais do trabalho (art. 1º, IV, da CF) ou ao princípio da igualdade (art. 5º, caput, da CF). Excluir os trabalhadores em atividade não violou o princípio da isonomia A escolha do legislador foi razoável, tendo em vista que, conforme argumentou a PFN nos autos: “Via de regra, o trabalhador aposentado tem reduzido o seu rendimento, em relação àquele em atividade. Por essa razão, encontra maiores dificuldades financeiras para arcar com as despesas médicas decorrentes das graves doenças mencionadas no texto legal. Sua capacidade contributiva não é equivalente à do trabalhador ativo, mas de maior fragilidade, o que justifica e ampara a concessão do benefício. […] Se o doente ainda não está aposentado ou reformado e ainda exerce atividade laboral, ou seja, ainda tem capacidade de trabalhar, é legitimamente presumível que as condições físicas, psicológicas e mentais da pessoa portadora de uma das doenças listadas na atacada norma legal não estejam acentuadamente debilitadas. Encontra-se, portanto, esse doente em situação diferente daqueles que já estão aposentados ou reformados por força da idade ou da incapacidade laborativa.” Em suma:

O art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 prevê que as pessoas portadoras de neoplasia maligna ou outras doenças graves e que estejam na inatividade não pagarão imposto de renda sobre os rendimentos recebidos a título de aposentadoria, pensão ou reforma. Essa isenção é devida apenas às pessoas que recebem aposentadoria, pensão ou reforma e não é possível que o Poder Judiciário estenda o benefício aos trabalhadores que estão em atividade. Não é possível que o Poder Judiciário, atuando como legislador positivo, amplie a incidência da concessão de benefício tributário, de modo a incluir contribuintes não expressamente abrangidos pela legislação pertinente.

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A legislação optou por critérios cumulativos absolutamente razoáveis à concessão do benefício tributário, quais sejam, inatividade e enfermidade grave, ainda que contraída após a aposentadoria ou reforma. STF. Plenário. ADI 6025, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 20/04/2020 (Info 983 – clipping).

Voto vencido Ficou vencido o Min. Edson Fachin.

DOD Plus – Informações complementares

Súmula 627-STJ: O contribuinte faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda, não se lhe exigindo a demonstração da contemporaneidade dos sintomas da doença nem da recidiva da enfermidade.

Súmula 598-STJ: É desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial da isenção do Imposto de Renda, desde que o magistrado entenda suficientemente demonstrada a doença grave por outros meios de prova.

São isentos do imposto de renda os proventos percebidos de fundo de previdência privada a título de complementação da aposentadoria por pessoa física acometida de uma das doenças arroladas no art. 6º, XIV, da Lei 7.713/1988. STJ. 2ª Turma. REsp 1507320-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 10/2/2015 (Info 556).

O art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88 (Lei do IR) prevê que as pessoas portadoras de determinadas doenças ali elencadas não pagarão imposto de renda sobre os rendimentos que receberem a título de aposentadoria, pensão ou reforma. Para que haja a isenção é indispensável que o portador da doença grave esteja na inatividade, recebendo rendimentos de aposentadoria, pensão ou reforma. Assim, não haverá isenção se o contribuinte é portador de uma das moléstias elencadas, mas ainda não se aposentou, optando por continuar trabalhando. STJ. 2ª Turma. RMS 31637-CE, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 5/2/2013 (Info 516).

O termo inicial da isenção do imposto de renda sobre proventos de aposentadoria prevista no art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/1988 é a data de comprovação da doença mediante diagnóstico médico, e não, necessariamente, a data de emissão do laudo oficial. STJ. 1ª Turma. AgInt no AgInt no AREsp 1215565/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 16/12/2019.

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA É constitucional a contribuição social do segurado especial prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91

É constitucional, formal e materialmente, a contribuição social do segurado especial prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91.

STF. Plenário. RE 761263, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 15/04/2020 (Repercussão Geral – Tema 723) (Info 983 – clipping)

Contribuições para a seguridade social A CF/88 prevê, em seu art. 195, as chamadas “contribuições para a seguridade social” (ou simplesmente contribuições sociais).

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Consistem em uma espécie de tributo, cuja arrecadação é utilizada para custear a seguridade social (saúde, assistência e previdência social). Redação originária do art. 195, I, abrangia apenas o faturamento e o lucro Como vimos acima, o art. 195 da CF/88 previu as chamadas contribuições sociais. Veja a redação originária desse dispositivo:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I - dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro; (redação da CF/88 antes da EC 20/98)

Desse modo, pela redação originária, a empresa deveria pagar um percentual de contribuição social que incidiria sobre o valor por ela recebido a título de “faturamento” e de “lucro”. Exemplo hipotético: imaginemos que a empresa tenha tido um faturamento de R$ 200 mil e que a alíquota da contribuição fosse 10%. Logo, ela pagaria R$ 20 mil de contribuição social. Cobrança da contribuição social sobre a receita bruta antes da EC 20/98 O Governo, com base no art. 195, I, passou a exigir que o empregador rural pessoa física e o segurado especial pagasse contribuição social incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural. Isso com base no art. 25, I, da Lei nº 8.212/91, cuja redação era a seguinte:

Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física e do segurado especial referidos, respectivamente, na alínea “a” do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada a Seguridade Social, é de: I - 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; (Redação dada pela Lei nº 9.528/97). II - 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho. (Redação dada pela Lei nº 9.528/97).

Essa contribuição de que trata o art. 25 da Lei nº 8.212/91 é conhecida como FUNRURAL, sendo os valores arrecadados destinados a financiar os benefícios previdenciários pagos aos empregados rurais. Tese dos contribuintes: a redação originária do art. 195, I, não permite a cobrança com base na receita bruta Os contribuintes não aceitaram essa cobrança e alegaram que ela seria inconstitucional pelo fato de que a lei exige o pagamento com base na receita bruta e o art. 195, I, da CF/88 (na sua redação originária) somente autoriza a cobrança da contribuição sobre o faturamento e o lucro. • Art. 195, I, da CF/88 (na sua redação originária): afirmava a incidência da contribuição sobre o faturamento e o lucro. • Art. 25, I, da Lei nº 8.212/91 (redação dada pela Lei nº 9.528/97): previa que a contribuição incidiria sobre a receita bruta. Faturamento não é sinônimo de receita bruta: • Faturamento é a receita decorrente da venda de mercadorias ou da prestação de serviços. • Receita bruta, por sua vez, é a soma de todas as receitas, sejam elas operacionais (como as receitas de faturamento), sejam elas não operacionais (como as receitas financeiras).

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Ex: o valor que uma loja de sapatos obtém com a venda dos calçados é uma receita operacional e, portanto, está dentro do conceito de faturamento). Por outro lado, se essa empresa possui investimentos no banco, o valor que ela recebe decorrente disso é receita não operacional (e não se inclui na definição de faturamento). Portanto, ao cobrar a contribuição sobre a receita bruta (e não sobre o faturamento), isso faz com que o valor a ser pago pelo contribuinte seja maior.

A tese foi aceita pelo STF? Antes da EC 20/98, era inconstitucional cobrar o FUNRURAL incidente sobre a receita bruta? O art. 25, I, da Lei nº 8.212/91 (com redação dada pela Lei nº 9.528/97) era inconstitucional? SIM. Considerando que a receita bruta não figurava no rol do art. 195, I, da CF/88 (em sua redação originária) como uma base de cálculo possível para a incidência de contribuições sociais, o STF entendia que era inconstitucional cobrar FUNRURAL incidente sobre a receita bruta. Nesse sentido: STF. Plenário. RE 596177, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 01/08/2011 (repercussão geral). Ocorre que essa decisão só abrangeu o empregador rural pessoa física. Assim, com a decisão do STF, somente o empregador rural pessoa física ficou dispensado de pagar a contribuição do art. 25 da Lei nº 8.212/91. O segurado especial, contudo, continuou obrigado a pagar a referida contribuição. Por quê? Porque o fundamento constitucional para que os segurados especiais paguem essa contribuição não é o art. 195, I, da CF, mas sim o art. 195, § 8º que, desde a redação originária da CF, já admitia a cobrança. Confira:

Constituição Federal

Redação originária Redação dada pela EC 20/98

Art. 195 (...) § 8º O produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro e o pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, contribuirão para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos termos da lei.

Art. 195 (...) § 8º O produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais e o pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, contribuirão para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos termos da lei.

EC 20/98 Vale ressaltar, ainda, que, em 1998, a redação do art. 195, I, da CF/88 foi alterada pela EC 20/98. Um dos objetivos da mudança foi o de inserir expressamente a “receita” no art. 195, I, permitindo a cobrança da contribuição social com base na receita bruta. Vamos analisar a mudança que foi feita:

Redação originária da CF/88 Redação dada pela EC 20/98

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I - dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro;

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro;

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Dessa forma, a EC 20/98 teve o propósito de retirar o obstáculo que existia e permitir a cobrança da contribuição sobre a receita bruta. Lei nº 10.256/2001 Vimos acima que o STF declarou inconstitucional o art. 25, I, da Lei nº 8.212/91 (com redação dada pela Lei nº 9.528/97). Depois da mudança do art. 195, I, da CF/88 feita pela EC 20/98, o Governo editou a Lei nº 10.256/2001 com o objetivo de reafirmar, na legislação infraconstitucional, a possibilidade de ser cobrado o FUNRURAL com base na receita bruta. A redação atual do art. 25, I, da Lei nº 8.212/91, ficou assim:

Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de: I - 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; II - 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho. (Redação dada pela Lei nº 10.256/2001)

E agora, o art. 25, I, da Lei nº 8.212/91 (com redação dada pela Lei nº 10.256/2001) é constitucional para os empregadores rurais pessoas físicas? Atualmente, é constitucional cobrar o FUNRURAL incidente sobre a receita bruta dos empregadores rurais pessoas físicas? SIM.

É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela Lei nº 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção. STF. Plenário. RE 718874/RS, Rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 29 e 30/3/2017 (repercussão geral) (Info 859).

Com a EC 20/98, que incluiu a receita ao lado do faturamento como uma materialidade passível de ser tributada para fins de financiamento da seguridade social, passou a ser possível a instituição de contribuição patronal do empregador rural pessoa física com base na receita bruta proveniente da comercialização da produção. Assim, a Lei nº 10.256/2001 reincluiu a figura do empregador rural pessoa física na disciplina já existente e em vigor para o segurado especial — produtor rural que não tem empregados. E a contribuição paga pelos segurados especiais? Como vimos, essa contribuição já era constitucionalmente permitida antes da EC 20/98 e da Lei nº 10.256/2001 e continuou a ser possível depois. Foi o que o STF reafirmou:

É constitucional, formal e materialmente, a contribuição social do segurado especial prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91. STF. Plenário. RE 761263, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 15/04/2020 (Repercussão Geral – Tema 723) (Info 983 – clipping)

Veja a ementa oficial:

(...) 1. Em razão dos vícios de inconstitucionalidade apontados por esta CORTE nos REs 363.852 e 596.177, somente o empregador rural pessoa física foi excluído como sujeito passivo da contribuição previdenciária prevista no artigo 25 da Lei 8.212/1991, de modo que o tributo continuou a existir, com plena vigência e eficácia em relação aos segurados especiais.

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2. A base de cálculo compilada no artigo 25, I e II, da Lei 8.212/1991, editado para regulamentar o § 8º do artigo 195 da CF, fixando a alíquota de 3% (três por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da produção do produtor rural sem empregados, por observar a base de cálculo que foi definida pelo próprio texto constitucional, é plenamente constitucional em relação ao segurado especial. 3. É absolutamente legítima a previsão, em lei ordinária, da contribuição do segurado especial tendo por base a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção. Diferentemente do que sustenta o recorrente, tal exação tem por fundamento constitucional o § 8º, e não o § 4º do art. 195. 4. Recurso extraordinário desprovido, com afirmação de tese segundo a qual “É constitucional, formal e materialmente, a contribuição social do segurado especial prevista no art. 25 da Lei 8.212/1991. “ (RE 761263, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 15/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-161 DIVULG 25-06-2020 PUBLIC 26-06-2020)

DIREITO FINANCEIRO Análise da constitucionalidade da Lei de Responsabilidade Fiscal

Importante!!!

A Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF (Lei Complementar nº 101/2000) é formalmente constitucional, não houve qualquer vício na tramitação do projeto, tendo sido respeitado o devido processo legislativo.

No que tange ao aspecto material, o STF declarou a constitucionalidade dos arts. 4º, § 2º, II, e § 4º; 7º, caput e § 1º; 11, parágrafo único; 14, II; 17, §§ 1º a 7º; 18, § 1º; 20; 24; 26, § 1º; 28, § 2º; 29, I, e § 2º; 39; 59, § 1º, IV; 60; e 68, caput, da LRF.

Por outro lado, o STF julgou inconstitucionais o art. 9º, § 3º, o caput dos arts. 56 e 57 e o § 2º do art. 23.

Quanto ao § 1º do art. 23, da LRF, o STF declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, de modo a obstar interpretação segundo a qual é possível reduzir valores de função ou cargo que estiver provido.

Art. 9º, § 3º

Veja o que diz o § 3º do art. 9º:

Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subsequentes, limitação de empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias. (...) § 3º No caso de os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público não promoverem a limitação no prazo estabelecido no caput, é o Poder Executivo autorizado a limitar os valores financeiros segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.

Com relação ao § 3º do art. 9º, o STF entendeu que a norma prevista não guarda pertinência com o modelo de freios e contrapesos estabelecido constitucionalmente para assegurar o exercício responsável da autonomia financeira por parte dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público. Isso porque o dispositivo estabelece inconstitucional hierarquização subserviente em relação ao Executivo, permitindo que, unilateralmente, limite os valores financeiros segundo os critérios fixados pela Lei de Diretrizes Orçamentárias no caso daqueles outros dois Poderes e instituição não promoverem a limitação no prazo fixado no caput.

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A defesa de um Estado Democrático de Direito exige o afastamento de normas legais que repudiam o sistema de organização liberal, em especial, na presente hipótese, o desrespeito à separação das funções do Poder e suas autonomias constitucionais.

Caput dos arts. 56 e 57

Esses dispositivos preveem o seguinte:

Art. 56. As contas prestadas pelos Chefes do Poder Executivo incluirão, além das suas próprias, as dos Presidentes dos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Chefe do Ministério Público, referidos no art. 20, as quais receberão parecer prévio, separadamente, do respectivo Tribunal de Contas.

Art. 57. Os Tribunais de Contas emitirão parecer prévio conclusivo sobre as contas no prazo de sessenta dias do recebimento, se outro não estiver estabelecido nas constituições estaduais ou nas leis orgânicas municipais.

O STF considerou que houve um desvirtuamento do modelo previsto nos arts. 71 e seguintes da CF/88.

A Constituição determina que as contas do Poder Executivo englobarão todas as contas, receberão um parecer conjunto do Tribunal de Contas, e serão julgadas pelo Congresso.

No caso do Judiciário, do Ministério Público e do Legislativo, o Tribunal de Contas julga as contas, e não apenas dá um parecer prévio.

Art. 23, § 1º e art. 23, § 2º

Veja a redação dos dispositivos:

Art. 23. Se a despesa total com pessoal, do Poder ou órgão referido no art. 20, ultrapassar os limites definidos no mesmo artigo, sem prejuízo das medidas previstas no art. 22, o percentual excedente terá de ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes, sendo pelo menos um terço no primeiro, adotando-se, entre outras, as providências previstas nos §§ 3º e 4º do art. 169 da Constituição.

§ 1º No caso do inciso I do § 3º do art. 169 da Constituição, o objetivo poderá ser alcançado tanto pela extinção de cargos e funções quanto pela redução dos valores a eles atribuídos.

§ 2º É facultada a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária.

Quanto ao § 1º do art. 23, da LRF, o STF declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, de modo a obstar interpretação segundo a qual é possível reduzir valores de função ou cargo que estiver provido.

Quanto ao § 2º do art. 23, declarou a sua inconstitucionalidade.

É inconstitucional qualquer interpretação de dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal que permita a redução de vencimentos de servidores públicos para a adequação de despesas com pessoal.

É inconstitucional o § 2º do art. 23 da LRF, que faculta a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária, caso sejam ultrapassados os limites definidos na lei para despesas com pessoal nas diversas esferas do poder público. Essa possibilidade de redução fere o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos (art. 37, XV, da CF/88).

STF. Plenário. ADI 2238/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 24/6/2020 (Info 983).

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Lei de Responsabilidade Fiscal A Lei Complementar nº 101/2000 estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. Ela é popularmente conhecida como “Lei de Responsabilidade Fiscal”. Foram ajuizadas várias ações diretas de inconstitucionalidade contra esta Lei. Vamos analisar aqui algumas conclusões do STF a esse respeito. STF. Plenário. ADI 2238/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 24/6/2020 (Info 983). Alegação de inconstitucionalidade formal A LRF (LC 101/2000) foi editada com fundamento no art. 163 da CF/88, que diz o seguinte:

Art. 163. Lei complementar disporá sobre: I - finanças públicas; II - dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo Poder Público; III - concessão de garantias pelas entidades públicas; IV - emissão e resgate de títulos da dívida pública; V - fiscalização financeira da administração pública direta e indireta; VI - operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; VII - compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União, resguardadas as características e condições operacionais plenas das voltadas ao desenvolvimento regional.

Um dos argumentos dos autores da ação é o de que o art. 163 da CF/88 fala em “lei complementar” (no singular). Isso significa que uma só lei complementar deveria tratar de todos os assuntos listados nesse artigo. Ocorre que a Lei de Responsabilidade Fiscal trata de apenas alguns pontos e outras leis disciplinam o restante. Logo, teria havido uma violação ao art. 163 do texto constitucional.

Essa alegação foi acolhida pelo STF? NÃO. O fato de o art. 163 da CF/88 ter se referido à lei complementar no singular, e não no plural, não significa que todas as matérias elencadas nos incisos desse artigo tenham que ser disciplinadas por um mesmo diploma legislativo. O que a Constituição quis foi apenas dizer que esses assuntos devem ser tratados por uma lei com quórum diferenciado (lei complementar), podendo isso ocorrer por meio de uma ou mais leis complementares. Além disso, o STF afirmou que não houve qualquer vício na tramitação do projeto e que foi respeitado o devido processo legislativo.

DISPOSITIVOS CONSIDERADOS CONSTITUCIONAIS

O STF julgou improcedente, também, a apontada inconstitucionalidade material dos arts. 4º, § 2º, II, e § 4º; 7º, caput e § 1º; 11, parágrafo único; 14, II; 17, §§ 1º a 7º; 18, § 1º; 20; 24; 26, § 1º; 28, § 2º; 29, I, e § 2º; 39; 59, § 1º, IV; 60; e 68, caput, da LRF. Em outras palavras, todos esses dispositivos foram declarados constitucionais. Vamos verificar os principais argumentos invocados.

Art. 4º, § 2º, II e § 4º

Art. 4º A lei de diretrizes orçamentárias atenderá o disposto no § 2º do art. 165 da Constituição e: (...) § 1º Integrará o projeto de lei de diretrizes orçamentárias Anexo de Metas Fiscais, em que serão estabelecidas metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas,

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resultados nominal e primário e montante da dívida pública, para o exercício a que se referirem e para os dois seguintes. § 2º O Anexo conterá, ainda: (...) II - demonstrativo das metas anuais, instruído com memória e metodologia de cálculo que justifiquem os resultados pretendidos, comparando-as com as fixadas nos três exercícios anteriores, e evidenciando a consistência delas com as premissas e os objetivos da política econômica nacional; (...) § 4º A mensagem que encaminhar o projeto da União apresentará, em anexo específico, os objetivos das políticas monetária, creditícia e cambial, bem como os parâmetros e as projeções para seus principais agregados e variáveis, e ainda as metas de inflação, para o exercício subsequente.

Havia alegação no sentido de que tais exigências não poderiam ser feitas para os entes subnacionais (Estados, Distrito Federal e Municípios) porque isso violaria a autonomia prevista no art. 18 da CF/88. O STF não acolheu esse argumento e afirmou que a exigência prevista no art. 4º, § 2º, II, em relação aos entes subnacionais, de demonstração de sincronia entre diretrizes orçamentárias e metas e previsões fiscais macroeconômicas definidas pela União não esvazia a autonomia desses entes. Essa exigência é consentânea com as normas da Constituição Federal e com o fortalecimento do federalismo fiscal responsável. Da mesma forma, a exigência adicional do processo legislativo orçamentário estipulada no art. 4º, § 4º, não implica nenhum risco de descumprimento do art. 165, § 2º, da CF/88:

Art. 165 (...) § 2º A lei de diretrizes orçamentárias compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.

Art. 7º, caput e § 1º

Art. 7º O resultado do Banco Central do Brasil, apurado após a constituição ou reversão de reservas, constitui receita do Tesouro Nacional, e será transferido até o décimo dia útil subsequente à aprovação dos balanços semestrais. § 1º O resultado negativo constituirá obrigação do Tesouro para com o Banco Central do Brasil e será consignado em dotação específica no orçamento. (...)

Havia alegação de que esses dispositivos violariam o art. 167, VII, da CF/88:

Art. 167. São vedados: (...) VII - a concessão ou utilização de créditos ilimitados;

O STF afastou esse argumento. A previsão de transferência de resultados do Banco Central do Brasil (BCB) para o Tesouro Nacional é uma dinâmica que já estava prevista em outros dispositivos estranhos à LRF (arts. 4º, XXVII; e 8º, parágrafo único, da Lei nº 4.595/64; e art. 6º, II, da Lei nº 11.803/2008).

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O caput do art. 7º da LRF não concede crédito algum. Apenas determina uma consignação obrigatória a ser feita na lei orçamentária de cada ano, o que está longe de significar autorização para gastos ilimitados. Além disso, a norma não trata de despesas de funcionalismo ou de custeio do BCB. Essas são registradas no orçamento geral da União como as de qualquer outra autarquia, como decorre do art. 5º, § 6º, da própria LRF. O que justifica a transmissão de resultados do BCB diretamente para o Tesouro Nacional não são essas despesas, mas aquelas decorrentes da atuação institucional dessa autarquia especial na sua atividade-fim, que corresponde à execução das políticas monetária e cambial (art. 164 da CF/88). Art. 11, parágrafo único

Art. 11. Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação. Parágrafo único. É vedada a realização de transferências voluntárias para o ente que não observe o disposto no caput, no que se refere aos impostos.

Esse dispositivo instiga (incentiva) que os entes locais (Estados, DF e Municípios) exerçam plenamente suas competências fiscais tributárias, sob pena de não receberem transferências voluntárias. Tal previsão não conflita com a Constituição Federal. Na verdade, é congruente (compatível) com o princípio federativo, e desincentiva a dependência de transferências voluntárias. Não é saudável para a Federação que determinadas entidades federativas não exerçam suas competências constitucionais tributárias, aguardando compensações não obrigatórias da União. Art. 14

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições: I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias; II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

O art. 14 se destina a organizar estratégia, dentro do processo legislativo, de tal modo que os impactos fiscais de projetos de concessão de benefícios tributários sejam melhor quantificados, avaliados e assimilados em termos orçamentários. A democratização do processo de criação de gastos tributários pelo incremento da transparência constitui forma de reforço do papel de estados e municípios e da cidadania fiscal. O inciso II do art. 14 funciona como uma cláusula de incentivo à conciliação entre as deliberações gerais do processo orçamentário e aquelas relativas à criação de novos benefícios fiscais. Não é possível extrair do seu comando qualquer atentado à autonomia federativa. Arts. 17 e 24

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

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§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio. § 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa. § 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição. § 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias. § 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar. § 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição. § 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.

Art. 24. Nenhum benefício ou serviço relativo à seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a indicação da fonte de custeio total, nos termos do § 5o do art. 195 da Constituição, atendidas ainda as exigências do art. 17.

Os arts. 17, e parágrafos, e 24 representam atenção ao equilíbrio fiscal. A rigidez e a permanência das despesas obrigatórias de caráter continuado as tornam fenômeno financeiro público diferenciado, devendo ser consideradas de modo destacado pelos instrumentos de planejamento estatal. A internalização de medidas compensatórias, conforme enunciadas pelos dispositivos, no processo legislativo é parte de projeto de amadurecimento fiscal do Estado, de superação da cultura do desaviso e da inconsequência fiscal, administrativa e gerencial. A prudência fiscal é um objetivo expressamente consagrado pelo art. 165, § 2º, da CF/88. Art. 18, § 1º

Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência. § 1º Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de servidores e empregados públicos serão contabilizados como “Outras Despesas de Pessoal”. (...)

O art. 18, § 1º, ao se referir a contratos de terceirização de mão de obra, não sugere qualquer burla aos postulados da licitação e do concurso público. Impede apenas expedientes de substituição de servidores via contratação terceirizada em contorno ao teto de gastos com pessoal. Art. 20

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais: I - na esfera federal:

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a) 2,5% (dois inteiros e cinco décimos por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas da União; b) 6% (seis por cento) para o Judiciário; c) 40,9% (quarenta inteiros e nove décimos por cento) para o Executivo, destacando-se 3% (três por cento) para as despesas com pessoal decorrentes do que dispõem os incisos XIII e XIV do art. 21 da Constituição e o art. 31 da Emenda Constitucional no 19, repartidos de forma proporcional à média das despesas relativas a cada um destes dispositivos, em percentual da receita corrente líquida, verificadas nos três exercícios financeiros imediatamente anteriores ao da publicação desta Lei Complementar; d) 0,6% (seis décimos por cento) para o Ministério Público da União; II - na esfera estadual: a) 3% (três por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Estado; b) 6% (seis por cento) para o Judiciário; c) 49% (quarenta e nove por cento) para o Executivo; d) 2% (dois por cento) para o Ministério Público dos Estados; III - na esfera municipal: a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver; b) 54% (cinquenta e quatro por cento) para o Executivo.

No que diz respeito ao art. 20, o STF entendeu que a definição de um teto de gastos particularizado, segundo os respectivos Poderes ou órgãos afetados, não representa intromissão na autonomia financeira dos entes subnacionais. Reforça, antes, a autoridade jurídica da norma do art. 169 da CF/88, no propósito, federativamente legítimo, de afastar dinâmicas de relacionamento predatório entre os entes componentes da Federação. O STF rejeitou a alegação de que a autonomia do Ministério Público da União (MPU) teria sido afetada pela estipulação, na alínea “c” do inciso I do art. 20, de limite diferenciado para gastos com pessoal na esfera do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT). A LRF seguiu o modelo orçamentário tradicional para o MPDFT, estabelecendo os limites de despesa com seu pessoal de maneira especial, de modo a se ajustar a uma realidade de financiamento atípica, criada pela própria Constituição Federal, cujo art. 21, XIII, atribui à União o encargo de manter o MPDFT. Manteve-se, portanto, o vínculo orçamentário desse órgão com o Poder Executivo federal, não sobrecarregando e tampouco comprometendo a chefia do MPU no encaminhamento de seu próprio orçamento, respeitado o respectivo limite global relativo a todos os demais ramos. Art. 59, § 1º, IV

Art. 59 (...) § 1º Os Tribunais de Contas alertarão os Poderes ou órgãos referidos no art. 20 quando constatarem: (...) IV - que os gastos com inativos e pensionistas se encontram acima do limite definido em lei;

O STF também entendeu ser constitucional o art. 59, § 1º, IV. O art. 169, caput, da CF/88 encomenda à legislação complementar os limites de despesa com pessoal ativo e inativo. A norma apenas estipula um mecanismo de articulação administrativa, informando Poderes e órgãos autônomos sobre uma situação presumidamente temerária.

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Art. 60

Art. 60. Lei estadual ou municipal poderá fixar limites inferiores àqueles previstos nesta Lei Complementar para as dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito e concessão de garantias.

Quanto ao art. 60, considerou que a possibilidade de fixação por Estados e Municípios de limites de endividamento abaixo daqueles nacionalmente exigíveis não compromete competências do Senado Federal. Ao contrário, materializa prerrogativa que decorre naturalmente da autonomia política e financeira de cada ente federado. Art. 68

Art. 68. Na forma do art. 250 da Constituição, é criado o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, vinculado ao Ministério da Previdência e Assistência Social, com a finalidade de prover recursos para o pagamento dos benefícios do regime geral da previdência social.

O STF rejeitou, ainda, a alegada inconstitucionalidade do art. 68. O art. 250 da CF/88 não exige que a criação do fundo por ele mencionado seja necessariamente veiculada em lei ordinária, nem impede que os recursos constitutivos sejam provenientes de imposição tributária. DISPOSITIVOS CONSIDERADOS INCONSTITUCIONAIS

O STF julgou o pedido procedente com relação ao art. 9º, § 3º, ao art. 56, caput, ao art. 57, caput, e ao § 2º do art. 23, que foram declarados inconstitucionais. O STF julgou o pedido procedente para declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do § 1º do art. 23. Art. 9º, § 3º

Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subsequentes, limitação de empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias. (...) § 3º No caso de os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público não promoverem a limitação no prazo estabelecido no caput, é o Poder Executivo autorizado a limitar os valores financeiros segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.

Com relação ao § 3º do art. 9º, o STF entendeu que a norma prevista não guarda pertinência com o modelo de freios e contrapesos estabelecido constitucionalmente para assegurar o exercício responsável da autonomia financeira por parte dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público. Isso porque o dispositivo estabelece inconstitucional hierarquização subserviente em relação ao Executivo, permitindo que, unilateralmente, limite os valores financeiros segundo os critérios fixados pela Lei de Diretrizes Orçamentárias no caso daqueles outros dois Poderes e instituição não promoverem a limitação no prazo fixado no caput.

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A defesa de um Estado Democrático de Direito exige o afastamento de normas legais que repudiam o sistema de organização liberal, em especial, na presente hipótese, o desrespeito à separação das funções do Poder e suas autonomias constitucionais. Caput dos arts. 56 e 57

Art. 56. As contas prestadas pelos Chefes do Poder Executivo incluirão, além das suas próprias, as dos Presidentes dos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Chefe do Ministério Público, referidos no art. 20, as quais receberão parecer prévio, separadamente, do respectivo Tribunal de Contas.

Art. 57. Os Tribunais de Contas emitirão parecer prévio conclusivo sobre as contas no prazo de sessenta dias do recebimento, se outro não estiver estabelecido nas constituições estaduais ou nas leis orgânicas municipais.

O STF considerou que houve um desvirtuamento do modelo previsto nos arts. 71 e seguintes da CF/88. A Constituição determina que as contas do Poder Executivo englobarão todas as contas, receberão um parecer conjunto do Tribunal de Contas, e serão julgadas pelo Congresso. No caso do Judiciário, do Ministério Público e do Legislativo, o Tribunal de Contas julga as contas, e não apenas dá um parecer prévio. Art. 23, § 1º e art. 23, § 2º O STF julgou o pedido procedente para declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do § 1º do art. 23, e a inconstitucionalidade do § 2º do art. 23, todos da LRF. Veja a redação dos dispositivos:

Art. 23. Se a despesa total com pessoal, do Poder ou órgão referido no art. 20, ultrapassar os limites definidos no mesmo artigo, sem prejuízo das medidas previstas no art. 22, o percentual excedente terá de ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes, sendo pelo menos um terço no primeiro, adotando-se, entre outras, as providências previstas nos §§ 3º e 4º do art. 169 da Constituição. § 1º No caso do inciso I do § 3º do art. 169 da Constituição, o objetivo poderá ser alcançado tanto pela extinção de cargos e funções quanto pela redução dos valores a eles atribuídos. § 2º É facultada a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária. (...)

Confira agora o que dizem os §§ 3º e 4º do art. 169 da CF/88:

Art. 169 (...) § 3º Para o cumprimento dos limites estabelecidos com base neste artigo, durante o prazo fixado na lei complementar referida no caput, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios adotarão as seguintes providências: I - redução em pelo menos vinte por cento das despesas com cargos em comissão e funções de confiança; II - exoneração dos servidores não estáveis. § 4º Se as medidas adotadas com base no parágrafo anterior não forem suficientes para assegurar o cumprimento da determinação da lei complementar referida neste artigo, o servidor estável poderá perder o cargo, desde que ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal.

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IMPORTANTE Quanto ao § 1º do art. 23, da LRF, o STF declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, de modo a obstar interpretação segundo a qual é possível reduzir valores de função ou cargo que estiver provido. Quanto ao § 2º do art. 23, declarou a sua inconstitucionalidade, ratificando a medida cautelar. Salientou que, por mais inquietante e urgente que seja a necessidade de realização de ajustes nas contas públicas estaduais, a ordem constitucional vincula a todos, independentemente dos ânimos econômicos ou políticos. Portanto, caso se considere conveniente e oportuna a redução das despesas com folha salarial no funcionalismo público como legítima política de gestão da Administração Pública, deve-se observar o que está fixado na Constituição (art. 169, §§ 3º e 4º, da CF/88). Não cabe flexibilizar mandamento constitucional para gerar alternativas menos onerosas, do ponto de vista político, aos líderes públicos eleitos. De acordo com a jurisprudência do Tribunal, o art. 37, XV, da CF/88 impossibilita que a retenção salarial seja utilizada como meio de redução de gastos com pessoal com a finalidade de adequação aos limites legais ou constitucionais. A irredutibilidade do estipêndio funcional é garantia constitucional voltada a qualificar prerrogativa de caráter jurídico-social instituída em favor dos agentes públicos. A redução da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária é medida inconstitucional. Aduziu, por fim, que a irredutibilidade de vencimentos dos servidores também alcança aqueles que não possuem vínculo efetivo com a Administração Pública. Desse modo, o STF decidiu que:

É inconstitucional qualquer interpretação de dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal que permita a redução de vencimentos de servidores públicos para a adequação de despesas com pessoal. É inconstitucional o § 2º do art. 23 da LRF, que faculta a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária, caso sejam ultrapassados os limites definidos na lei para despesas com pessoal nas diversas esferas do poder público. Essa possibilidade de redução fere o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos (art. 37, XV, da CF/88). STF. Plenário. ADI 2238/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 24/6/2020 (Info 983).

DISPOSITIVOS QUE PRECISAM DE UMA INTERPRETAÇÃO CONFORME

O STF julgou o pedido parcialmente procedente, para dar interpretação conforme, com relação ao art. 12, § 2º e art. 21, II (atual art. 21, I, “b”), da LRF.

Art. 12. As previsões de receita observarão as normas técnicas e legais, considerarão os efeitos das alterações na legislação, da variação do índice de preços, do crescimento econômico ou de qualquer outro fator relevante e serão acompanhadas de demonstrativo de sua evolução nos últimos três anos, da projeção para os dois seguintes àquele a que se referirem, e da metodologia de cálculo e premissas utilizadas. (...) § 2º O montante previsto para as receitas de operações de crédito não poderá ser superior ao das despesas de capital constantes do projeto de lei orçamentária.

Art. 21. É nulo de pleno direito: I - o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda: (...) b) ao limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo; (Redação dada LC 173/2020)

O STF deu interpretação conforme ao art. 12, § 2º, para o fim de explicitar que a proibição de que trata o artigo não abrange operações de crédito autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta.

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A previsão de limite textualmente diverso da regra do art. 167, III, da CF/88 enseja interpretações distorcidas do teto a ser aplicado às receitas decorrentes de operações de crédito. De igual modo, deu interpretação conforme ao art. 21, II (atual art. 21, I, “b”), no sentido de que se entenda como limite legal nele citado o previsto em lei complementar. Observou que o art. 169, caput, da CF/88 remete à legislação complementar a definição de limites de despesa com pessoal ativo e inativo. Assim, “limite legal” = limite previsto em lei complementar.

DIREITO INTERNACIONAL

EXPULSÃO É proibida a expulsão caso o estrangeiro tenha filho brasileiro e ele esteja sob a sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva, mesmo que isso tenha ocorrido após o fato ensejador

do ato expulsório

Importante!!!

O § 1º do art. 75 da Lei nº 6.815/80 não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, sendo vedada a expulsão de estrangeiro cujo filho brasileiro foi reconhecido ou adotado posteriormente ao fato ensejador do ato expulsório, uma vez comprovado estar a criança sob a guarda do estrangeiro e deste depender economicamente.

STF. Plenário. RE 608898/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 25/6/2020 (Repercussão Geral – Tema 373) (Info 983).

O presente julgado trata sobre expulsão. Antes de analisar o que foi decidido, irei fazer uma breve revisão sobre o tema. Se seu tempo estiver curto, pode pular essa parte e ir diretamente para a explicação do julgado mais abaixo. NOÇÕES GERAIS SOBRE EXPULSÃO

Em que consiste A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado. A expulsão é tratada principalmente pelos arts. 54 a 60 da Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) e pelos arts. 192 a 206 do Decreto nº 9.199/2017. Hipóteses Poderá dar causa à expulsão a condenação com sentença transitada em julgado relativa à prática de: • crime de genocídio; • crime contra a humanidade; • crime de guerra; • crime de agressão; • crime comum doloso passível de pena privativa de liberdade, consideradas a gravidade e as possibilidades de ressocialização em território nacional. ++ (Juiz Federal TRF2 2018) A Lei de Migração expressamente prevê que o estrangeiro cuja presença atente contra a segurança nacional e ordem pública pode ser expulso. (errado)

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De quem é a competência para a expulsão? A Lei de Migração afirma que “caberá à autoridade competente resolver sobre a expulsão, a duração do impedimento de reingresso e a suspensão ou a revogação dos efeitos da expulsão” (art. 54, § 2º). O Decreto Presidencial nº 9.199/2017, que regulamenta a Lei de Migração, prevê que a competência para a expulsão é do Ministro da Justiça. O Poder Judiciário poderá avaliar a decisão de expulsão? SIM, é possível. No entanto, como o ato de expulsão é considerado discricionário, somente cabe ao Poder Judiciário analisar se ele foi praticado em conformidade ou não com a legislação em vigor (controle de legalidade), não podendo examinar a sua conveniência e oportunidade, ou seja, não poderá realizar o controle sobre o mérito da decisão. Assim, o ato administrativo de expulsão, manifestação da soberania do país, é de competência privativa do Poder Executivo, competindo ao Judiciário apenas a verificação da higidez do procedimento por meio da observância das formalidades legais. STJ. 1ª Seção. HC 333.902-DF, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 14/10/2015 (Info 571). Expulsão de estrangeiro refugiado A expulsão de estrangeiro que ostente a condição de refugiado não pode ocorrer sem a regular perda dessa condição. Assim, antes da expulsão, deveria ter sido determinada a instauração de devido processo legal, com contraditório e ampla defesa, para se decretar a perda da condição de refugiado, nos termos do art. 39, III, da Lei nº 9.474/97. Somente após essa providência, ele poderá ser expulso. STJ. 1ª Seção. HC 333.902-DF, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 14/10/2015 (Info 571). Não impede benefícios da execução penal O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime, o cumprimento da pena, a suspensão condicional do processo, a comutação da pena ou a concessão de pena alternativa, de indulto coletivo ou individual, de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro. O estrangeiro que cumpre pena no Brasil tem direito aos benefícios da execução penal (ex.: saída temporária etc.)? SIM. O fato de o reeducando ser estrangeiro, por si só, não é motivo suficiente para inviabilizar os benefícios da execução penal. O estrangeiro que cumpre pena no Brasil pode ser beneficiado com a progressão de regime? SIM. Não existe motivo para negar aos estrangeiros que cumprem pena no Brasil os benefícios da execução penal, dentre eles a progressão de regime. Isso porque a condição humana da pessoa estrangeira submetida a pena no Brasil é protegida constitucionalmente e no âmbito dos direitos humanos. Assim, em regra, é plenamente possível a progressão de regime para estrangeiros que cumpram pena no Brasil. O estrangeiro que cumpre pena no Brasil e que já tem contra si um processo de expulsão instaurado pode mesmo assim ser beneficiado com a progressão de regime

O STJ consolidou entendimento no sentido de que a situação irregular do estrangeiro no País não é circunstância, por si só, capaz de afastar o princípio da igualdade entre nacionais e estrangeiros, razão pela qual a existência de processo ou mesmo decreto de expulsão em desfavor do estrangeiro não impede a concessão dos benefícios da progressão de regime ou do livramento condicional, tendo em vista que a expulsão poderá ocorrer, conforme o interesse nacional, após o cumprimento da pena, ou mesmo antes disto. STJ. 5ª Turma. HC 324.231/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 03/09/2015.

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O benefício da progressão de regime não pode ser negado ao estrangeiro pelo simples fato de estar em situação irregular no país ou, mesmo, de haver decreto de expulsão expedido contra ele. STJ. 6ª Turma. HC 309.825/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 05/03/2015.

Progressão de estrangeiro com pedido de extradição já deferido

O apenado poderá progredir para o regime semiaberto, mesmo havendo uma ordem de extradição ainda não cumprida. Segundo decidiu o STF, o fato de estar pendente a extradição do estrangeiro não é motivo suficiente para impedir a sua progressão de regime. STF. Plenário. Ext 947 QO/República do Paraguai, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 28/5/2014 (Info 748).

É possível que seja concedida a progressão de regime para apenado estrangeiro que cumpre pena no Brasil e que aguarda o julgamento de pedido de extradição para outro país. No entanto, essa providência (progressão) será ineficaz até que o STF delibere acerca das condições da prisão para extradição. Em outras palavras, é possível que o juízo das execuções penais defira a progressão de regime ao apenado que aguarda o cumprimento da ordem de extradição, mas isso só poderá ser concretizado pelo juiz de 1ª instância depois que o STF concordar. Cabe ao STF deliberar acerca de eventual adaptação das condições da prisão para extradição ao regime prisional da execução penal. Assim, depois que o juízo da execução afirmar que os requisitos para a progressão estão preenchidos, deverá ainda o STF verificar se a concessão do regime semiaberto ou aberto ao extraditando não irá causar risco à garantia da ordem pública, da ordem econômica, à conveniência da instrução criminal, nem à aplicação da lei penal pública (art. 312 do CPP). STF. 2ª Turma. Ext 893 QO/República Federal da Alemanha, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10/3/2015 (Info 777).

Prazo de vigência da medida de impedimento No revogado Estatuto do Estrangeiro, a pessoa expulsa só poderia retornar ao Brasil caso o decreto de expulsão fosse revogado pelo Presidente da República. A situação mudou com a Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) e agora o impedimento de reingresso do estrangeiro é feito com prazo determinado:

Art. 54 (...) § 4º O prazo de vigência da medida de impedimento vinculada aos efeitos da expulsão será proporcional ao prazo total da pena aplicada e nunca será superior ao dobro de seu tempo.

Situações em que não se admite a expulsão Não se procederá à expulsão quando: I - a medida configurar extradição inadmitida pela legislação brasileira; II - o expulsando: a) tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva ou tiver pessoa brasileira sob sua tutela; b) tiver cônjuge ou companheiro residente no Brasil, sem discriminação alguma, reconhecido judicial ou legalmente; c) tiver ingressado no Brasil até os 12 anos de idade, residindo desde então no País; d) for pessoa com mais de 70 anos que resida no País há mais de 10 anos, considerados a gravidade e o fundamento da expulsão. ++ (Juiz Federal TRF2 2018) Pessoa com mais de 70 anos, residente no Brasil há mais de 10 anos, não pode ser expulsa em nenhum caso. (errado)

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++ (Juiz Federal TRF2 2018) Estrangeiro, com cônjuge ou companheiro residente no Brasil reconhecido judicial ou legalmente, pode ser expulso. (errado) Será considerada regular a situação migratória do expulsando cujo processo esteja pendente de decisão e houver alguma das situações acima descritas. Contraditório e ampla defesa No processo de expulsão serão garantidos o contraditório e a ampla defesa. Participação da DPU A Defensoria Pública da União será notificada da instauração de processo de expulsão, se não houver defensor constituído.

Pedido de reconsideração Caberá pedido de reconsideração da decisão sobre a expulsão no prazo de 10 dias, a contar da notificação pessoal do expulsando.

Saída voluntária A existência de processo de expulsão não impede a saída voluntária do expulsando do País. CASO CONCRETO JULGADO PELO STF

Imagine a seguinte situação hipotética: Jumaa, nacional da Tanzânia, mora no Brasil. Ele foi condenado, em nosso país, pela prática de crime. Houve o trânsito em julgado. O Ministro da Justiça, após processo administrativo, publicou portaria determinando a expulsão de Jumaa do Brasil. Enquanto aguardava os trâmites burocráticos para que fosse efetivada a sua expulsão, Jumaa envolveu-se amorosamente com uma brasileira e eles tiveram um filho. Diante disso, a Defensoria Pública da União impetrou habeas corpus em favor de Jumaa afirmando que ele não poderia mais ser expulso em razão de ter um filho brasileiro, que vive sob a sua guarda e dependência econômica e socioafetiva. Indaga-se: o fato de o estrangeiro ter um filho brasileiro pode servir para evitar a sua expulsão do território nacional? SIM. No entanto, não basta ter filho brasileiro. A Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) proíbe a expulsão caso o estrangeiro tenha filho brasileiro e ele esteja sob a sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva. Veja a redação da Lei:

Art. 55. Não se procederá à expulsão quando: (...) II - o expulsando: a) tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva ou tiver pessoa brasileira sob sua tutela; (...)

++ (Juiz Federal TRF2 2018) O estrangeiro que tiver filho brasileiro sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva pode ser expulso. (errado)

Existe até uma súmula bem antiga do STF tratando sobre o tema:

Súmula 1-STF: É vedada a expulsão de estrangeiro casado com brasileira, ou que tenha filho brasileiro, dependente da economia paterna.

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Informações prestadas pelo Ministro da Justiça O Ministro da Justiça apresentou informações no habeas corpus alegando que esse motivo (filho brasileiro) não poderia impedir a efetivação da expulsão, considerando que o nascimento da criança ocorreu depois da publicação da Portaria determinando a expulsão. Logo, a hipótese legal de inexpulsabilidade não é contemporânea em relação aos fatos que deram ensejo ao ato expulsório. Para reforçar sua argumentação, o Ministro da Justiça invocou o art. 75, § 1º da Lei nº 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro), que vigorava na época:

Art. 75 (...) § 1º Não constituem impedimento à expulsão a adoção ou o reconhecimento de filho brasileiro supervenientes ao fato que o motivar. (Atualmente revogado pela Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017).

Jumaa deve ser expulso? É possível a efetivação da expulsão de estrangeiro que teve filho brasileiro após o fato que deu ensejo à expulsão? NÃO. É vedada a expulsão de estrangeiro que tenha filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência, mesmo que o reconhecimento ou adoção tenham ocorrido após o fato ensejador do ato expulsório. Mas, e o art. 75, § 1º da Lei nº 6.815/80? O STF entendeu que esse dispositivo não foi recepcionado pela CF/88. A CF/88 protege a família e as crianças, assegurando-lhes cuidado especial, concretizado, pelo legislador, com a edição do Estatuto da Criança e do Adolescente. O sistema foi direcionado para a absoluta prioridade das crianças e adolescentes, como pressuposto inafastável de sociedade livre, justa e solidária. Por isso, não se pode autorizar a expulsão do estrangeiro, ainda que com fundamento na noção de interesse nacional, se esse ato de expulsão irá prejudicar a situação da criança, sob os ângulos econômico e psicossocial. A aplicação do § 1º do art. 75 da Lei nº 6.815/80 acarreta a quebra da relação familiar, sem considerar a situação econômica do menor e os vínculos socioafetivos desenvolvidos. A família, respaldo maior da sociedade e da criança, é colocada em segundo plano, superada pelo interesse coletivo em retirar do convívio nacional estrangeiro nocivo, embora muitas vezes ressocializado. Priva-se perpetuamente a criança do convívio familiar, da conformação da identidade. Dificulta-se o acesso aos meios necessários à subsistência, haja vista os obstáculos que decorrem da cobrança de pensão alimentícia de indivíduo domiciliado ou residente em outro País. Dessa maneira, impõe-se à criança ruptura e desamparo, cujos efeitos repercutem nos mais diversos planos da existência, em colisão não apenas com a proteção especial conferida a ela, mas também com o âmago do princípio da proteção à dignidade da pessoa humana. Além disso, o preceito da Lei nº 6.815/80 afronta o princípio da isonomia, ao estabelecer tratamento discriminatório entre filhos havidos antes e após o fato ensejador da expulsão. O relator ressaltou que os prejuízos associados à expulsão de genitor independem da data do nascimento ou da adoção, muito menos do marco aleatório representado pela prática da conduta motivadora da expulsão. Se o interesse da criança deve ser priorizado, é de menor importância o momento da adoção ou da concepção. Esse entendimento não esvazia a soberania nacional. O estrangeiro continua obrigado a comprovar ter filho brasileiro sob a própria guarda e dependente economicamente. Ou seja, exige-se do estrangeiro a demonstração de vínculo qualificado com o País, apto a autorizar, dentro das balizas legais, a sua permanência em território nacional.

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Em suma:

O § 1º do art. 75 da Lei nº 6.815/80 não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, sendo vedada a expulsão de estrangeiro cujo filho brasileiro foi reconhecido ou adotado posteriormente ao fato ensejador do ato expulsório, uma vez comprovado estar a criança sob a guarda do estrangeiro e deste depender economicamente. STF. Plenário. RE 608898/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 25/6/2020 (Repercussão Geral – Tema 373) (Info 983).

O Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80) foi revogado pela Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017). Se os fatos acima explicados tivessem ocorrido na vigência da Lei atual, a solução seria a mesma? SIM. A Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) não repetiu nenhuma regra como a que existia no § 1º do art. 75 da Lei nº 6.815/80. Isso significa que houve um silêncio eloquente do legislador, que retirou essa ressalva, de forma que, atualmente, com maior razão, não seria possível a expulsão do estrangeiro. O STJ possui um precedente recente no qual o tema foi analisado sob a égide da Lei nº 13.445/2017:

Para a configuração das hipóteses legais de inexpulsabilidade não é exigível a contemporaneidade dessas mesmas causas em relação aos fatos que deram ensejo ao ato expulsório. STJ. 1ª Seção. HC 452.975-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 12/02/2020 (Info 667).

DOD Plus – informações extras

A solução para o caso concreto seria a mesma se estivéssemos diante de um pedido de extradição? NÃO. Segundo entendimento sumulado do STF, é possível extraditar estrangeiro mesmo que ele possua filho e mulher brasileiros:

Súmula 421-STF: Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditado casado com brasileira ou ter filho brasileiro.

EXPULSÃO EXTRADIÇÃO

O Estado manda embora um estrangeiro que tem comportamento nocivo ou inconveniente aos interesses nacionais.

O Estado entrega a outro país um indivíduo que cometeu um crime que é punido segundo as leis daquele país (e também do Brasil) a fim de que lá ele seja processado ou cumpra a pena por esse ilícito.

Ex.: o estrangeiro praticou um crime aqui no Brasil.

Ex.: um cidadão dos EUA lá cometeu um crime e fugiu para o Brasil.

É ato de ofício do Brasil. Depende de pedido formulado pelo outro país.

O brasileiro naturalizado não pode ser expulso do território nacional.

O brasileiro naturalizado pode ser extraditado por crime cometido antes da naturalização ou então mesmo depois da naturalização se o crime cometido foi o tráfico ilícito de entorpecentes.

É ato de competência do Presidente da República, podendo ser delegado ao Ministro da Justiça. A Lei de Migração afirma que “caberá à autoridade competente resolver sobre a expulsão” (art. 54, § 2º). O Decreto Presidencial nº 9.199/2017 atribui ao Ministro da Justiça a competência para a expulsão.

O pedido de extradição feito por Estado estrangeiro é examinado pelo STF. Autorizado o pleito extradicional pelo STF, cabe ao Presidente da República decidir, de forma discricionária, sobre a entrega, ou não, do extraditando ao governo requerente.

O expulso é mandado para o país de sua nacionalidade ou procedência, ou para outro que aceite recebê-lo.

A pessoa extraditada é mandada para o país que requereu a extradição.

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No revogado Estatuto do Estrangeiro, a pessoa expulsa só poderia retornar ao Brasil caso o decreto de expulsão fosse revogado pelo Presidente da República. A situação mudou com a Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) e agora o impedimento de reingresso do estrangeiro é feito com prazo determinado: Art. 54 (...) § 4º O prazo de vigência da medida de impedimento vinculada aos efeitos da expulsão será proporcional ao prazo total da pena aplicada e nunca será superior ao dobro de seu tempo.

Segundo o entendimento do Ministério da Justiça, nada impede o retorno ao Brasil de estrangeiro já extraditado, após o cumprimento da pendência com a Justiça do país requerente, desde que não haja também sido expulso do território nacional.

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) Não é compatível com a Constituição Federal a regra segundo a qual apenas os Desembargadores mais

antigos possam concorrer aos cargos diretivos dos Tribunais de Justiça. ( ) 2) Não é possível que os Estados-membros criem órgão de segurança pública diverso daqueles que estão

previstos no art. 144 da CF/88. ( ) 3) É imprescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas. ( ) 4) É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental. ( ) 5) É possível estender, com base no princípio da isonomia, a isenção prevista no art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88

aos trabalhadores em atividade. ( ) 6) É proibida a expulsão caso o estrangeiro tenha filho brasileiro e ele esteja sob a sua guarda ou

dependência econômica ou socioafetiva, mesmo que isso tenha ocorrido após o fato ensejador do ato expulsório. ( )

7) (Juiz Federal TRF2 2018) A Lei de Migração expressamente prevê que o estrangeiro cuja presença atente contra a segurança nacional e ordem pública pode ser expulso. ( )

Gabarito

1. C 2. C 3. E 4. C 5. E 6. C 7. E

OUTRAS INFORMAÇÕES

CLIPPING DAS SESSÕES VIRTUAIS DJE DE 22 A 26 DE JUNHO DE 2020

RE 636.886

RELATOR: MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 899 da repercussão geral, negou provimento ao recurso

extraordinário, mantendo-se a extinção do processo pelo reconhecimento da prescrição, nos termos do voto do Relator.

Foi fixada a seguinte tese: "É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal

de Contas". Os Ministros Roberto Barroso, Edson Fachin e Gilmar Mendes acompanharam o Relator com ressalvas.

Falaram: pela recorrente, a Dra. Izabel Vinchon Nogueira de Andrade, Secretária-Geral de Contencioso da Advocacia-

Geral da União; e, pela recorrida, o Dr. Georghio Alessandro Tomelin. Não participou deste julgamento, por motivo de

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Informativo comentado

Informativo 983-STF (01/07/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 37

licença médica no início da sessão, o Ministro Celso de Mello (art. 2º, § 5º, da Res. 642/2019). Plenário, Sessão Virtual

de 10.4.2020 a 17.4.2020.

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL. EXECUÇÃO FUNDADA EM

ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO

ERÁRIO. ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRESCRITIBILIDADE. 1. A regra de prescritibilidade no

Direito brasileiro é exigência dos princípios da segurança jurídica e do devido processo legal, o qual, em seu sentido

material, deve garantir efetiva e real proteção contra o exercício do arbítrio, com a imposição de restrições substanciais

ao poder do Estado em relação à liberdade e à propriedade individuais, entre as quais a impossibilidade de permanência

infinita do poder persecutório do Estado. 2. Analisando detalhadamente o tema da “prescritibilidade de ações de

ressarcimento”, este SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL concluiu que, somente são imprescritíveis as ações de

ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato de improbidade administrativa doloso tipificado na Lei de Improbidade

Administrativa – Lei 8.429/1992 (TEMA 897). Em relação a todos os demais atos ilícitos, inclusive àqueles atentatórios

à probidade da administração não dolosos e aos anteriores à edição da Lei 8.429/1992, aplica-se o TEMA 666, sendo

prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública. 3. A excepcionalidade reconhecida pela maioria do

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no TEMA 897, portanto, não se encontra presente no caso em análise, uma vez que,

no processo de tomada de contas, o TCU não julga pessoas, não perquirindo a existência de dolo decorrente de ato de

improbidade administrativa, mas, especificamente, realiza o julgamento técnico das contas à partir da reunião dos

elementos objeto da fiscalização e apurada a ocorrência de irregularidade de que resulte dano ao erário, proferindo o

acórdão em que se imputa o débito ao responsável, para fins de se obter o respectivo ressarcimento. 4. A pretensão de

ressarcimento ao erário em face de agentes públicos reconhecida em acórdão de Tribunal de Contas prescreve na forma

da Lei 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal). 5. Recurso Extraordinário DESPROVIDO, mantendo-se a extinção do

processo pelo reconhecimento da prescrição. Fixação da seguinte tese para o TEMA 899: “É prescritível a pretensão

de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas”.

RE 654.833

RELATOR: MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 999 da repercussão geral, extinguiu o processo, com julgamento

de mérito, em relação ao Espólio de Orleir Messias Cameli e a Marmud Cameli Ltda, com base no art. 487, III, b, do

Código de Processo Civil de 2015, ficando prejudicado o recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator, vencidos

os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Dias Toffoli (Presidente), que davam provimento ao recurso. O Ministro

Roberto Barroso acompanhou o Relator com ressalvas. Foi fixada a seguinte tese: "É imprescritível a pretensão de

reparação civil de dano ambiental”. Falou, pela assistente, o Dr. Antonio Rodrigo Machado de Sousa. Não participou

deste julgamento, por motivo de licença médica no início da sessão, o Ministro Celso de Mello (art. 2º, § 5º, da Res.

642/2019) Plenário, Sessão Virtual de 10.4.2020 a 17.4.2020.

Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 999. CONSTITUCIONAL. DANO

AMBIENTAL. REPARAÇÃO. IMPRESCRITIBILIDADE. 1. Debate-se nestes autos se deve prevalecer o princípio da

segurança jurídica, que beneficia o autor do dano ambiental diante da inércia do Poder Público; ou se devem prevalecer os

princípios constitucionais de proteção, preservação e reparação do meio ambiente, que beneficiam toda a coletividade. 2. Em

nosso ordenamento jurídico, a regra é a prescrição da pretensão reparatória. A imprescritibilidade, por sua vez, é exceção.

Depende, portanto, de fatores externos, que o ordenamento jurídico reputa inderrogáveis pelo tempo. 3. Embora a

Constituição e as leis ordinárias não disponham acerca do prazo prescricional para a reparação de danos civis ambientais,

sendo regra a estipulação de prazo para pretensão ressarcitória, a tutela constitucional a determinados valores impõe o

reconhecimento de pretensões imprescritíveis. 4. O meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda

humanidade, para a garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras. Todas as condutas do

Poder Público estatal devem ser direcionadas no sentido de integral proteção legislativa interna e de adesão aos pactos e

tratados internacionais protetivos desse direito humano fundamental de 3ª geração, para evitar prejuízo da coletividade em

face de uma afetação de certo bem (recurso natural) a uma finalidade individual. 5. A reparação do dano ao meio ambiente

é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição

dos danos ambientais. 6. Extinção do processo, com julgamento de mérito, em relação ao Espólio de Orleir Messias Cameli

e a Marmud Cameli Ltda, com base no art. 487, III, b do Código de Processo Civil de 2015, ficando prejudicado o Recurso

Extraordinário. Afirmação de tese segundo a qual É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental.

ACO 714

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

Decisão: Após a leitura do relatório e a realização das sustentações orais, o julgamento foi suspenso. Falaram: pelo autor,

o Dr. Lucas Dallamico, Procurador do Estado de Mato Grosso; pelo réu, o Dr. Ibraim Rocha, Procurador do Estado do

Pará; pelo interessado Município de Paranaíta, a Dra. Ana Paula Sbardelotto, Procuradora do Município; pelo interessado

Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso, o Dr. Bruno Cardoso; e, pela Procuradoria-Geral da República, a Dra.

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Informativo comentado

Informativo 983-STF (01/07/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 38

Raquel Elias Ferreira Dodge, Procuradora-Geral da República. Não participaram, justificadamente, deste julgamento, os

Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello.

Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 27.06.2019.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, julgou improcedente o pedido, revogando a liminar implementada, e condenou o

autor nas despesas processuais, arbitrando, em favor do réu, honorários advocatícios no valor de R$ 100.000,00 (art. 20,

§ 4º, do CPC de 1973), nos termos do voto do Relator. O Ministro Luiz Fux acompanhou o Relator com ressalvas. Não

participou deste julgamento, por motivo de licença médica, o Ministro Dias Toffoli (Presidente). Plenário, Sessão Virtual

de 22.5.2020 a 28.5.2020.

ESTADOS DE MATO GROSSO E DO PARÁ – DIVISAS – DELIMITAÇÃO. Alterada apenas a nomenclatura, conforme

conclusão pericial, não procede a alegação de mudança da linha divisória entre os Estados do Pará e de Mato Grosso.

ADI 5.406

RELATOR: MIN. EDSON FACHIN

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, julgou procedente o pedido formulado na ação direta, para declarar a

inconstitucionalidade: a) dos arts. 2º, caput, I a IV e § 2º, 21, 24, 25, caput, § 1º, § 2º, I a IV, §§ 3º a 6º, 26, 28, caput e

parágrafo único, 29, e Anexo II da Lei Complementar 274, de 30 de abril de 2014; b) dos arts. 2º, caput, I a IV e § 2º, 21,

24, 25, caput, § 1º, § 2º, I a IV, §§ 3º a 6º, 26, 28, caput e parágrafo único, 29, e Anexo II da Lei Complementar 275, de

30 de abril de 2014; c) do art. 1º, caput e §§ 1º e 2º, e dos arts. 2º e 3º, § 1º, I a V, e §§ 2º e 3º, e art. 4º, caput e parágrafo

único, e Anexo I da Lei Complementar 283, de 6 de junho de 2014; d) do Decreto 42.054, de 17 de agosto de 2015; e) do

Decreto 42.118, de 10 de setembro de 2015, todos do Estado de Pernambuco, nos termos do voto do Relator. Falaram:

pelo interessado Governador do Estado de Pernambuco, o Dr. Sérgio Augusto Santana Silva; e, pelo amicus curie

Federação Nacional dos Servidores e Empregados Públicos Estaduais e do Distrito Federal - FENASEPE, o Dr. Ricardo

Quintas Carneiro. Plenário, Sessão Virtual de 17.4.2020 a 24.4.2020.

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS

COMPLEMENTARES 274, 275 E 283/2014 DO ESTADO DE PERNAMBUCO. REESTRUTURAÇÃO

ADMINISTRATIVA. SÚMULA VINCULANTE 43. OFENSA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. A Constituição

da República erigiu a exigência de concurso público para provimento de cargos públicos como verdadeiro pilar de

moralidade e impessoalidade no serviço público, assegurando à Administração a seleção dos melhores e mais preparados

candidatos e aos administrados chances isonômicas de demonstrar conhecimento e de buscar o acesso a esses cargos. 2.

A reestruturação de cargos, fundada em evolução legislativa de aproximação e na progressiva identificação de atribuições,

não viola o princípio do concurso público quando: (i) uniformidade de atribuições entre os cargos extintos e aquele no

qual serão os servidores reenquadrados; (ii) identidade dos requisitos de escolaridade para ingresso no cargo público; (iii)

identidade remuneratória entre o cargo criado e aqueles extintos. 3. É inconstitucional a lei estadual que, a pretexto de

reestruturar órgão público, propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu

provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido. 4. Ação direta julgada procedente.

ADI 6.025

RELATOR: MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado na ação direta, para declarar a

constitucionalidade do art. 6º, XIV, da Lei Federal nº 7.713/1988, com a redação da Lei nº 11.052/2004, nos termos do

voto do Relator, vencido o Ministro Edson Fachin. Falaram: pelos interessados, o Dr. José Levi Mello do Amaral Júnior,

Procurador-Geral da Fazenda Nacional; e, pelo amicus curiae Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB, o Dr.

Alberto Pavie Ribeiro. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica no início da sessão, o Ministro

Celso de Mello (art. 2º, § 5º, da Res. 642/2019). Afirmou suspeição o Ministro Dias Toffoli (Presidente). Plenário, Sessão

Virtual de 10.4.2020 a 17.4.2020.

EMENTA: CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA SOBRE PROVENTOS DE

APOSENTADORIA OU REFORMA. REQUISITOS LEGAIS CUMULATIVOS E RAZOÁVEIS.

IMPOSSIBILIDADE DE AMPLIAÇÃO DA ISENÇÃO POR DECISÃO JUDICIAL. RESPEITO AOS PRINCÍPIOS

DA SEPARAÇÃO DE PODERES E LEGALIDADE ESTRITA (ARTS. 2º E 150, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO).

CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 6º DA LEI 7.713/1988. IMPROCEDÊNCIA. 1. A concessão de isenção tributária

configura ato discricionário do ente federativo competente para a instituição do tributo e deve estrito respeito ao princípio

da reserva legal (art. 150, § 6º, da Constituição Federal). 2. A legislação optou por critérios cumulativos absolutamente

razoáveis à concessão do benefício tributário, quais sejam, inatividade e enfermidade grave, ainda que contraída após a

aposentadoria ou reforma. Respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), aos valores

sociais do trabalho (art. 1º, IV, da CF) e ao princípio da igualdade (art. 5º, caput, da CF). 3. Impossibilidade de atuação

do Poder Judiciário como legislador positivo, ampliando a incidência da concessão de benefício tributário, de modo a

incluir contribuintes não expressamente abrangidos pela legislação pertinente. Respeito à Separação de Poderes.

Precedentes. 4. Os poderes de Estado devem atuar de maneira harmônica, privilegiando a cooperação e a lealdade

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Informativo comentado

Informativo 983-STF (01/07/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 39

institucional e afastando as práticas de guerrilhas institucionais, que acabam minando a coesão governamental e a

confiança popular na condução dos negócios públicos pelos agentes políticos. 5.Ação Direta de Inconstitucionalidade

julgada improcedente.

MEDIDA CAUTELAR NA ADI 6.377

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

Decisão: O Tribunal, por maioria, indeferiu a liminar, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin,

Ricardo Lewandowski, Roberto Barroso e Rosa Weber. Plenário, Sessão Virtual de 1.5.2020 a 8.5.2020.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LIMINAR – PANDEMIA – CORONAVÍRUS –

PROVIDÊNCIAS – DIREITO DO TRABALHO E SAÚDE NO TRABALHO – CONSTITUIÇÃO FEDERAL –

MALTRATO – RELEVÂNCIA E RISCO – INEXISTÊNCIA. O implemento de medida acauteladora em ação direta

pressupõe não só relevância maior do pedido como risco de manter-se preceitos normativos com plena vigência,

entendendo-se este último como irreparável.

RE 596.701

RELATOR: MIN. EDSON FACHIN

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 160 da repercussão geral, deu provimento ao recurso

extraordinário para assentar a constitucionalidade do art. 3º, I, ‘a’, e do art. 4º, § 1º, I, ambos da Lei 10.366/90 do Estado

de Minas Gerais, reformar o acórdão recorrido e afirmar a exigibilidade de contribuições sobre proventos dos militares

inativos no período compreendido entre as Emendas Constitucionais 20/98 e 41/03, ficando invertidos os ônus

sucumbenciais e estabelecidas custas ex lege, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Dias

Toffoli (Presidente). Foi fixada a seguinte tese: "É constitucional a cobrança de contribuições sobre os proventos

dos militares inativos, aqui compreendidos os Policiais Militares e o Corpo de Bombeiros dos Estados e do Distrito

Federal e os integrantes das Forças Armadas, entre o período de vigência da Emenda Constitucional 20/98 e da

Emenda Constitucional 41/03, por serem titulares de regimes jurídicos distintos dos servidores públicos civis e

porque a eles não se estende a interpretação integrativa dos textos dos artigos 40, §§ 8º e 12, e artigo 195, II, da

Constituição da República". Falaram: pelo recorrente, o Dr. Breno Rabelo Lopes, Procurador do Estado; pelo recorrido,

o Dr. Filipe Guerra Jácome; pelo amicus curiae Associação de Militares da Reserva e Pensionistas da Marinha -

AMIRPEM, o Dr. José Bressan Martins Júnior; e, pelo amicus curiae União, o Dr. Paulo Mendes de Oliveira, Procurador

da Fazenda Nacional. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica no início da sessão, o Ministro

Celso de Mello (art. 2º, § 5º, da Res. 642/2019). Plenário, Sessão Virtual de 10.4.2020 a 17.4.2020.

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MILITAR INATIVO. REGIME PREVIDENCIÁRIO DISTINTO DOS

SERVIDORES CIVIS. INAPLICABILIDADE AOS MILITARES DO DISPOSTO NOS §§ 7º E 8º DO ART. 40, DA

CRFB. COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. POSSIBILIDADE. 1. A Constituição Federal, após

as alterações promovidas pelas Emendas Constitucionais 03/1993 e 18/1998, separou as categorias de servidores,

prevendo na Seção II as disposições sobre “Servidores Públicos” e na Seção III, artigo 42, as disposições a respeito “dos

Militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios”, dissociando os militares da categoria “servidores públicos”,

do que se concluiu que os militares, topograficamente, não mais se encontram na seção dos servidores públicos e

etimologicamente não são mais pela Constituição denominados servidores, mas apenas militares. 2. Há sensíveis

distinções entre os servidores públicos civis e os militares, estes classificados como agentes públicos cuja atribuição é a

defesa da Pátria, dos poderes constituídos e da ordem pública, a justificar a existência de um tratamento específico quanto

à previdência social, em razão da sua natureza jurídica e dos serviços que prestam à Nação, seja no que toca aos direitos,

seja em relação aos deveres. Por tal razão, é necessária a existência de um Regime de Previdência Social dos Militares

(RPSM) distinto dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS), sendo autorizado constitucionalmente o tratamento

da disciplina previdenciária dos militares por meio de lei específica. Precedentes do STF: RE 198.982/RS, Rel. Min. Ilmar

Galvão; RE 570.177, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). 3. A ausência de remissão, pelo Constituinte, a outros dispositivos

do art. 40 no texto do art. 42, §1º, bem como do art. 142, configura silêncio eloquente, como já concluiu a Corte em

relação à inaplicabilidade da regra do salário mínimo aos militares, por não fazerem os artigos 42 e 142 referência expressa

a essa garantia prevista no art. 7º, IV. É inaplicável, portanto, aos militares a norma oriunda da conjugação dos textos dos

artigos 40, § 12, e artigo 195, II, da Constituição da República, sendo, portanto, constitucional a cobrança de contribuição

sobre os valores dos proventos dos militares da reserva remunerada e reformados. Precedentes do STF: ADO 28/SP, Rel.

Min. Cármen Lúcia; RE 785.239-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli; ARE 781.359- AgR, Rel. Min. Roberto Barroso; ARE

722.381- AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes). 4. Fixação de tese jurídica ao Tema 160 da sistemática da repercussão

geral: “É constitucional a cobrança de contribuições sobre os proventos dos militares inativos, aqui compreendidos

os Policiais Militares e o Corpo de Bombeiros dos Estados e do Distrito Federal e os integrantes das Forças

Armadas, ainda que no período compreendido entre a vigência da Emenda Constitucional 20/98 e Emenda

Constitucional 41/03, por serem titulares de regimes jurídicos distintos dos servidores públicos civis e porque a

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Informativo comentado

Informativo 983-STF (01/07/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 40

eles não se estende a interpretação integrativa dos textos dos artigos 40, §§ 8º e 12, e artigo 195, II, da Constituição

da República.” 5. Recurso extraordinário a que se dá provimento.

RE 761.263

RELATOR: MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 723 da repercussão geral, negou provimento ao recurso

extraordinário, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Marco Aurélio, Ricardo

Lewandowski e Rosa Weber. Foi fixada a seguinte tese: “É constitucional, formal e materialmente, a contribuição

social do segurado especial prevista no art. 25 da Lei 8.212/1991”. Falaram: pelo recorrente, o Dr. Humberto

Bergmann Ávila, e, pela recorrida, o Dr. José Levi Mello do Amaral Júnior, Procurador-Geral da Fazenda Nacional. Não

participou deste julgamento, por motivo de licença médica no início da sessão, o Ministro Celso de Mello (art. 2º, § 5º,

da Res. 642/2019). Plenário, Sessão Virtual de 3.4.2020 a 14.4.2020.

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. SEGURADO ESPECIAL. ARTIGO 195,

§ 8º, DA CF/1988. RESULTADO DA COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO. ART. 25 DA LEI 8.212/1991, DESDE

SUA REDAÇÃO ORIGINÁRIA. RECEITA BRUTA. BASE DE CÁLCULO. REPERCUSSÃO GERAL

RECONHECIDA. 1. Em razão dos vícios de inconstitucionalidade apontados por esta CORTE nos REs 363.852 e 596.177,

somente o empregador rural pessoa física foi excluído como sujeito passivo da contribuição previdenciária prevista no artigo

25 da Lei 8.212/1991, de modo que o tributo continuou a existir, com plena vigência e eficácia em relação aos segurados

especiais. 2. A base de cálculo compilada no artigo 25, I e II, da Lei 8.212/1991, editado para regulamentar o § 8º do artigo

195 da CF, fixando a alíquota de 3% (três por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da produção do produtor

rural sem empregados, por observar a base de cálculo que foi definida pelo próprio texto constitucional, é plenamente

constitucional em relação ao segurado especial. 3. É absolutamente legítima a previsão, em lei ordinária, da contribuição do

segurado especial tendo por base a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção. Diferentemente do que

sustenta o recorrente, tal exação tem por fundamento constitucional o § 8º, e não o § 4º do art. 195. 4. Recurso extraordinário

desprovido, com afirmação de tese segundo a qual “É constitucional, formal e materialmente, a contribuição social do

segurado especial prevista no art. 25 da Lei 8.212/1991.”

ADI 3.432

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado na ação direta, nos termos do voto do Relator,

vencidos os Ministros Edson Fachin, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Falou, pela requerente, o Dr.

Cristiano Brito Alves Meira. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica, o Ministro Dias Toffoli

(Presidente). Plenário, Sessão Virtual de 22.5.2020 a 28.5.2020.

Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Art. 1º, da Emenda Constitucional nº 45/2004, na parte em que deu nova redação

ao art. 114, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal. 3. Necessidade de “mútuo acordo” para ajuizamento do Dissídio Coletivo.

4. Legitimidade do MPT para ajuizar Dissídio Coletivo em caso de greve em atividade essencial. 5. Ofensa aos artigos

5º, XXXV, LV e LXXVIII, e 60, § 4º, IV, da Constituição Federal. Inocorrência. 6. Condição da ação estabelecida pela

Constituição. Estímulo às formas alternativas de resolução de conflito. 7. Limitação do poder normativo da justiça do

trabalho. Violação aos artigos 7º, XXVI, e 8º, III, e ao princípio da razoabilidade. Inexistência. 8. Recomendação do

Comitê de Liberdade Sindical da Organização Internacional do Trabalho. Indevida intervenção do Estado nas relações

coletivas do trabalho. Dissídio Coletivo não impositivo. Reforma do Poder Judiciário (EC 45) que visa dar celeridade

processual e privilegiar a autocomposição. 9. Importância dos acordos coletivos como instrumento de negociação dos

conflitos. Mútuo consentimento. Precedentes. 10. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS

22 A 26 DE JUNHO DE 2020

Lei nº 14.016, de 23.6.2020 - Dispõe sobre o combate ao desperdício de alimentos e a doação de excedentes de alimentos

para o consumo humano.

OUTRAS INFORMAÇÕES

22 A 26 DE JUNHO DE 2020

Resolução STF 687, de 22.6.2020 - Dispõe sobre o funcionamento do Tribunal no mês de julho de 2020.

Decreto nº 10.404, de 22.6.2020 - Altera o Decreto nº 10.277, de 16 de março de 2020, que institui o Comitê de Crise

para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19.