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jan|abr|2002 Cerrado, Mata Atlântica, Amazônia, Caatinga, Pantanal. Boas e más notícias unem esses ecossistemas brasileiros. A má notícia já nem é mais novidade: fauna e flora estão ameaçadas, espécies correm risco de extinção. A boa nova é que, por meio de um projeto financiado pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), instituições de pesquisa e representantes de organizações não-governamentais estão cons- truindo a Rede Nacional de Se- mentes de Espécies Nativas. O objetivo é criar um banco de dados online com informações sobre as espécies florestais nativas brasileiras, que fornecerá subsí- dios para as pesquisas na área e para ações de preservação ambiental. A rede nacional é dividida em oito redes regionais, determi- nadas de acordo com as carac- terísticas de cada ecos- sistema. São elas: Rede de Sementes do Cerrado (Dis- trito Federal, Tocantins e Goiás), Rede de Sementes Florestais Rio- São Paulo (Mata Atlântica), Rede Norte de Sementes Florestais Nativas da Amazônia (Pará, Amazonas, Rondônia, Acre e Roraima), Rede de Sementes Florestais da Caatinga (Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Pernambuco), Rede de Sementes Sul (também dedicada à Mata Atlântica, inclui regiões do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul), Rede de Sementes da Amazônia Meridional (Mato Grosso, Rondônia e Pará), Rede Mata Atlântica (Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia) e Rede de Sementes do Pantanal (Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Paraná). Cada uma das redes regionais deve receber recursos da ordem de 500 mil reais, distribuídos em dois anos. A meta é que, após es- se período, a rede nacional esteja efetivamente articulada e o pro- cesso de recuperação e preser- vação ambiental consolidado. Reflorestamento Uma das aspirações da rede na- cional é que ela possa agilizar o processo de produção e comércio de semente nativas, tendo em Sementes online Sementes online Valda Rocha Rede nacional envolvendo instituições de pesquisa e ONGs criará banco de dados sobre espécies florestais nativas brasileiras, com o objetivo de oferecer subsídios a ações de preservação ambiental Meio ambiente 41 Joana Albrecht jan|abr|2002

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Page 1: Indice e Sumario - Universidade Federal de São Carlos ...univerci/n_1_a1/meio_ambiente.pdf · A boa nova é que ,por meio de um projeto financiado pelo Fundo ... Rede de Sementes

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Cerrado, Mata Atlântica,Amazônia, Caatinga, Pantanal.Boas e más notícias unem essesecossistemas brasileiros. A mánotícia já nem é mais novidade:fauna e flora estão ameaçadas,espécies correm risco de extinção.A boa nova é que, por meio de umprojeto financiado pelo FundoNacional do Meio Ambiente(FNMA), instituições de pesquisae representantes de organizaçõesnão-governamentais estão cons-truindo a Rede Nacional de Se-mentes de Espécies Nativas. Oobjetivo é criar um banco dedados online com informaçõessobre as espécies florestais nativasbrasileiras, que fornecerá subsí-dios para as pesquisas na área epara ações de preservaçãoambiental.

A rede nacional é dividida emoito redes regionais, determi-nadas de acordo com as carac-

terísticas decada ecos-sistema. Sãoelas: Rede deSementes doCerrado (Dis-trito Federal, Tocantins e Goiás),Rede de Sementes Florestais Rio-São Paulo (Mata Atlântica), RedeNorte de Sementes FlorestaisNativas da Amazônia (Pará,Amazonas, Rondônia, Acre eRoraima), Rede de SementesFlorestais da Caatinga (Ceará,Paraíba, Rio Grande do Norte ePernambuco), Rede de SementesSul (também dedicada à MataAtlântica, inclui regiões do Paraná,de Santa Catarina e do Rio Grandedo Sul), Rede de Sementes daAmazônia Meridional (MatoGrosso, Rondônia e Pará), RedeMata Atlântica (Rio de Janeiro,Espírito Santo e Bahia) e Rede de

Sementes do Pantanal (MatoGrosso do Sul, Mato Grosso eParaná).

Cada uma das redes regionaisdeve receber recursos da ordemde 500 mil reais, distribuídos emdois anos. A meta é que, após es-se período, a rede nacional estejaefetivamente articulada e o pro-cesso de recuperação e preser-vação ambiental consolidado.

Reflorestamento

Uma das aspirações da rede na-cional é que ela possa agilizar oprocesso de produção e comérciode semente nativas, tendo em

Sementesonline

Sementesonline

Valda Rocha

Rede nacional envolvendo instituiçõesde pesquisa e ONGs criará banco dedados sobre espécies florestaisnativas brasileiras, com o objetivo deoferecer subsídios a ações depreservação ambiental

Meio ambiente 41Jo

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vista o aumento da demandadecorrente do crescente nú-mero de sentenças judiciais quedeterminam o reflorestamentode áreas degradadas. “Atual-mente, o mercado de sementesnativas está desarticulado, comuma produção pequena. Poroutro lado, há grande interessepor parte dos produtores ruraisem aumentar essa produção”,afirma João de Deus Medeiros,coordenador da Rede Sul.

Segundo o gerente de reflo-restamento e recuperação deáreas do Programa Nacional deFlorestas do Ministério doMeio Ambiente, Hélio Pereira,sabe-se que são milhares asações em defesa do meioambiente impetradas peloMinistério Público Federal.“Porém, como a área ambientalé descentralizada, ainda sãoinexistentes levantamentosprecisos da quantidade deações em todo o Brasil”, explicaPereira.

Mata Atlântica

Um dado alarmante em relaçãoao nível de degradação ambientalno Brasil vem da região de MataAtlântica, cuja extensão já foi de1.270.000 km2. Hoje, restamapenas 7,3% dessa área, ou seja,92.710 km2. “A Mata Atlântica éuma das regiões mais favorecidaspelas determinações judiciais,mas o processo de início doreflorestamento é lento”, afirmaPereira. Justamente pelosprejuízos que sofreu, a Mata

Atlântica foi estabelecida comofoco de atuação em três das redesde sementes: Rio-São Paulo, Sul eMata Atlântica.

A Rede Rio-São Paulo écentralizada no Instituto Florestaldo Estado de São Paulo e naFundação Florestal da Secretariade Estado do Meio Ambiente(também em São Paulo), centrosde referência em coleta eprodução de sementes da Amé-rica Latina. Renato Farinazzo,coordenador da rede, explica quesão produzidas espécies exóticasornamentais (usadas em projetosde urbanização) e nativas (parareflorestamento deáreas devastadas).Por ano, a redeproduz cerca de seistoneladas de semen-tes, das quais aproxi-madamente cincosão de espéciesnativas. O Instituto ea Fundação Florestalchegam a produzirsementes de 130 a140 espécies nativas.

Segundo Farinaz-zo, a Secretaria deEstado do MeioAmbiente é respon-sável pela coleta desementes em todoo interior do Estadode São Paulo. Essassementes são dis-tribuídas para todoo Brasil. Já a rede desementes Rio-SãoPaulo vai trabalharespecificamente na

coleta e produção de sementesde espécies nativas do ParqueNacional da Bocaina, na regiãode Parati e Angra dos Reis, noEstado do Rio de Janeiro.

Na Rede Mata Atlântica, osparticipantes estabeleceramuma parceria entre a Rede Re-gional de Banco de SementesFlorestais do Rio de Janeiro, aUniversidade Estadual doNorte Fluminense (para aten-der a demanda do Estado doEspírito Santo) e a Univer-sidade Estadual de Santa Cruz(UESC), apoiando o Estado daBahia.

Espécies adequadas à extração demadeira são as mais produzidas na Rededa Amazônia Meridional.

Joana Albrecht

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Objetivo das análises édefinir o grau depureza das espécies;processo de escolhadas matrizes é rigoroso

Matrizes

Entre as atividades realizadaspelas redes regionais está acoleta e análise de amostras desementes. O objetivo dosexames é definir o grau depureza das espécies. O processode escolha das matrizes queserão utilizadas é rigoroso.

Maurício Sedrez dos Reis, doLaboratório de Fisiologia doDesenvolvimento e GenéticaVegetal da Universidade Federal

de Santa Catarina afirma que,nas florestas tropicais, porexemplo, em populações deuma dada espécie, grandesíndices de endogamia (cruza-mento entre indivíduos aparen-tados ou autofecundados) nãosão indicados para a retirada desementes, por terem menorpossibilidade de adaptação àsvariações ambientais. O profes-sor conta que, além da análisedas amostras, podem sercalculadas as diferenças entre osindivíduos da população daespécie, de modo a encontrar ograu de diversidade e definir aqualidade das sementes quepodem ser geradas. “Quantomaior a diversidade, maior ariqueza daquelas sementes e,

conseqüentemente, as pos-sibilidades de utilização comsucesso para recuperação ouprodução”, afirma Maurício.

Para a seleção de sementes,cada rede determinou asespécies prioritárias, consi-derando os riscos de extinção dovegetal e a demanda para oreflorestamento. Na Rede MataAtlântica, por exemplo, sãocadastradas 42 espécies nativas.

Os testes realizados expõemas sementes a diferentescondições de luz, temperatura eumidade, que buscam simularregiões geográficas (áreasabertas, como clareiras; matascom áreas sombreadas etc.). Apartir desse levantamento,

O objetivo principal do Fundo Nacional do MeioAmbiente (FNMA) é apoiar financeiramente programasque tenham como objetivo a recuperação e apreservação do meio ambiente. Dados do Ministério doMeio Ambiente (MMA) mostram que os mais de 700projetos subsidiados pelo Fundo em seus dez anos deexistência tiveram investimentos da ordem de 60milhões de reais.

Os projetos apoiados pelo FNMA podem pertencera instituições públicas federais, estaduais oumunicipais, bem como a instituições privadas sem finslucrativos, tais como organizações não-governamentais(ONGs), organizações da sociedade civil de interessepúblico (OSCIPs) ou organizações de base (associaçõesde produtores e de bairro).

As iniciativas devem contemplar uma das oito linhas

temáticas definidas pelo FNMA: extensão florestal,gestão integrada de áreas protegidas, manejo

sustentável da flora e da fauna, uso sustentável dosrecursos pesqueiros, educação ambiental, Amazônia

sustentável, qualidade ambiental e gestão integrada deresíduos sólidos.

As oito redes formadoras da Rede Nacional deSementes vão trabalhar inicialmente com duas linhas:

extensão florestal e manejo sustentável da flora e dafauna.

Mais informações sobre o FNMA podem ser obtidasno endereço www.mma.gov.br/port/FNMA.

Fundo Nacional do Meio Ambiente financiaprojetos em oito linhas temáticasFundo Nacional do Meio Ambiente financiaprojetos em oito linhas temáticas

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podem ser verificadas aspossibilidades de germinação.

Segundo Claudius Monte deSenna, chefe da DivisãoTécnica do Ibama (InstitutoBrasileiro do Meio Ambiente edos Recursos Naturais Reno-váveis) no Rio Grande do Norte,a armazenagem das sementesdeve ser feita em condiçõesambientais que favoreçam alongevidade. Por isso, em cadauma das sete unidades doIbama da região Nordesteexiste uma câmara seca, que émantida a uma temperatura de10 oC a 15 ºC e com umidaderelativa do ar de 15%. Essesvalores variam segundo ascondições climáticas de cadaregião.

Problemas

“A Rede de SementesFlorestais da Amazônia Meridi-onal é a oportunidade deestruturar a produção, o be-neficiamento, o armaze-namento e a comercializaçãode sementes”, afirma JoanaMaria Ferreira Albrecht,coordenadora da rede. Um dosprocedimentos que deve serrevisto, segundo Joana, é acoleta de amostras. Istoporque, no Mato Grosso, porexemplo, existe apenas umaárea de coleta de sementesnativas credenciada eregistrada pelo Ministério daAgricultura. Além disso, apesar

das árvores matrizes seremcaracterizadas, existe a falta deequipamentos e de infor-mações técnicas. A coleta éfeita em árvores isoladas àbeira de estradas, situadas emruas e praças ou derrubadas.

Joana afirma a necessidadede se respeitar um “planologístico” de coleta que leveem consideração diversosfatores: seleção e preparo daárea de coleta, método decoleta, quantidade e tipos deequipamentos necessários,número de árvores por espécie,áreas alternativas, número decoletores e supervisores decoleta, quantidade de veículos,embalagens e locais para oarmazenamento e recursosdisponíveis, entre outros. NoMato Grosso, a principalatividade econômica está rela-cionada com o setor madei-reiro, que representa 34% dototal das indústrias e emprega,direta ou indiretamente, 16%da população. Por isso, asespécies arbóreas maisadequadas à atividade, taiscomo copaíba, amescla, pinhocuiabano, jatobá, louro-preto,aroeira e gonçaleiro, são asmais produzidas.

Madeira

A exploração da madeirasempre foi um dos grandesproblemas enfrentados pelasinstituições envolvidas com a

preservação ambiental. Naregião Sul, por exemplo, oIbama liberou, entre 1999 e2000, a exploração de 233.000m3 de áreas de remanescentesnaturais na região metro-politana de Florianópolis. Istosignificou a derrubada de 60mil árvores de espéciesconsideradas em extinção,como a araucária, a canelapreta e a imbuia. “Atualmente,o Conama (Conselho Nacionaldo Meio Ambiente) é o únicoórgão responsável pelaliberação de áreas para aexploração. Essa medida,felizmente, deve evitar dadostão estarrecedores”, enfatizaJoão de Deus Medeiros,coordenador da Rede deSementes Sul.

Paralelamente às apro-vações deferidas pelo Ibama, oMinistério Publico Federalregistrou no biênio 1999/2000,na região metropolitana deFlorianópolis, que 68,8% dasações administrativas quederam entrada na Justiça fo-ram referentes à exploração deáreas remanescentes naturais.Dessas ações, 41% estãorelacionadas à vegetação darestinga, 16,3% aos man-guezais, 5,8% à Mata Atlânticae 5,7% à mata ciliar. “O Minis-tério Público dividiu osprocessos por espécies, mastodas as agressões dizemrespeito a apenas uma região:a Mata Atlântica”, afirmaMedeiros.

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Algumas das redes regionais de sementes prevêem oenvolvimento da comunidade das regiões estudadas. É ocaso da Rede Mata Atlântica, que tem como um de seusobjetivos transformar as sementes florestais em umproduto capaz de gerar alternativas de trabalho e de renda,visando a conservação e o uso e manejo sustentado dosrecursos naturais. Em decorrência dessa proposta, a redetem trabalhado com ações de capacitação, em especialdas pessoas que vivem em zonas de conservação.

Alguns participantes dos cursos oferecidos sãoselecionados como “colhedores cadastrados”. Osselecionados recebem uma carteira provisória comvalidade de três meses, durante os quais sua participaçãoé avaliada. Segundo a coordenadora da rede, Fátima PiñaRodrigues, após esse prazo, aqueles que realmenterealizam coleta, enviam sementes para análise, fazem osrelatórios e, em alguns casos, efetuam a marcação dematrizes, recebem a carteira de “colhedor credenciado”.Para esse processo, a rede conta com parceiros locais, comoprefeituras ou organizações não-governamentais.

O treinamento é necessário, pois, entre outros fatores,os métodos empregados na colheita muitas vezesrequerem técnicas específicas em decorrência da altura eda forma da árvore. Os colhedores aprendem a utilizarferramentas como esporas (que consiste no uso deacessórios como cinturões de segurança, capacetes ecorreias que circundam a árvore), bicicletas (aparelho quepermite maior mobilidade ao colhedor, utilizado emárvores com ramos apenas nas copas) e equipamento dealpinismo (cordas estáticas, fitas, mosquetões e cinto deescalada), entre outros.

Depois da colheita dos frutos, é iniciado o processo deremoção das sementes. As técnicas empregadasdependem do tipo de fruto. Quando são carnosos, oprocesso é manual. Os colhedores utilizam peneiras parafacilitar a retirada de toda a polpa (os frutos podem ser

previamente mantidos em água por 12 a 24 horas e, depois,macerados sobre as peneiras). Em seguida, as sementessão lavadas para que sejam separadas do material restante.O procedimento previne o desenvolvimento de fungos eo ataque de insetos às sementes, durante a secagem.

No caso dos frutos secos, o processo é mais simples. Aretirada da semente é feita após a secagem do fruto aosol ou em estufas. O objetivo da secagem é diminuir oconteúdo de água das sementes, o que reduz a respiração,conseqüentemente, a velocidade com que as sementesconsomem suas reservas, fundamentais para agerminação.

Projetos envolvemparticipação dacomunidade

Rede Mata Atlântica trabalha comcapacitação da comunidade quevive em zonas de conservação.

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Projetos envolvemparticipação dacomunidade

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