inclusão digital e inclusão social: a experiência dos roteiros didáticos digitais
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Inclusão Digital e Inclusão Social: a experiência dos roteiros didáticos digitais
Claudia Andréa Lafayette Pinto [email protected]
Rejane C. A. Rodrigues [email protected]
Nesse artigo analisamos uma importante experiência metodológica
desenvolvida para a Secretaria de Estado de Educação do Estado do Rio de Janeiro,
a elaboração dos Roteiros Didáticos Digitais. Inseridos em uma proposta mais
abrangente de ampliação das possibilidades de aprendizagem dos alunos do segundo
segmento do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, este novo recurso didático pode
representar do ponto de vista do ensino da Geografia uma importante alternativa
metodológica voltada a inserção consciente do cidadão brasileiro nas transformações
das realidades espaciais e sociais.
Os Roteiros Didáticos Digitais se constituem em uma proposta que objetiva a
complementação dos conteúdos trabalhados em sala de aula, incluindo a orientação
de atividades que tenham no uso da computação e de suas técnicas a ampliação das
possibilidades de aprendizagem. À preocupação com a apreensão dos conceitos e
teorias específicos a cada disciplina, são adicionadas atividades que focam o
desenvolvimento das habilidades de compreensão de textos, análise de gráficos e
tabelas, interpretação de imagens, além das habilidades necessárias à pesquisa e
seleção de conteúdos disponíveis na Internet.
As atividades realizadas no laboratório de Informática terão como base os
roteiros didáticos digitais, sendo o aluno assistido por um monitor local, um orientador
tecnológico ou por um professor. Os roteiros didáticos digitais têm como característica
a possibilidade de estudo autônomo pelo aluno, A informática aparece aqui como um
importante recurso para a inclusão digital e cidadã daqueles segmentos que têm
ficado ao longo das últimas décadas privados de novas possibilidades de um ensino
de qualidade. O uso do computador, como recurso de aprendizagem aparece como
instrumento de inclusão social, ampliando ainda as possibilidades de aprendizagem.
Assim, destacamos que o objetivo do trabalho é apresentar a experiência de
construção de roteiros didáticos digitais e analisar a importância desta metodologia
para o ensino da Geografia no ensino fundamental. Serão apresentados alguns
roteiros elaborados para como complemento às aulas desta disciplina, apresentadas
as estratégias propostas para sua elaboração e analisadas possibilidades criadas por
esta proposta metodológica.
Os Roteiros Didáticos Digitais como complemento ao ensino escolar
Com a participação de uma equipe formada por professores com elevada
qualificação e larga experiência no ensino fundamental e no ensino médio, foram
desenvolvidos 480 roteiros didáticos digitais construídos como atividades multimídia
mediadas por computador, com o objetivo de desenvolver competências e melhorar a
aprendizagem do aluno nas áreas de Português, História, Geografia, e Línguas
Estrangeiras (Inglês e Espanhol). Os roteiros deverão ser implantados nos laboratórios
de Informática das escolas públicas, aplicados do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental
e da 1ª à 3ª série do Ensino Médio.
Na base do projeto está uma proposta mais geral de Reorientação Curricular
organizada pela SEE/RJ. De acordo com o projeto os alunos continuarão participando
das aulas convencionais de suas escolas. As atividades realizadas no laboratório de
Informática terão como base os roteiros didáticos digitais, sendo o aluno assistido por
um monitor local, um orientador tecnológico ou por um professor.
Cada Roteiro trabalha um tema relacionado à unidade em que a aula está
inserida, sendo dividido em duas seções: material do professor (título, descrição, pré-
produção e pós-produção) e material do aluno (disparador, tarefa do aluno, produção
avançada e material de apoio).
A montagem da parte destinada aos professores os roteiros segue as
seguintes orientações: o título se constitui como uma pergunta intrigante, uma
provocação; na descrição são fornecidas informações suficientes para que o professor
possa escolher o roteiro que deseja, a partir de um catálogo; é indicada ainda a
competência ou a aptidão esperada do aluno para que o conteúdo possa ser
apreendido; na pré-produção são dadas sugestões para o professor, em sala, preparar
o “espírito” do aluno para se defrontar, muitas vezes sem a presença do professor,
com a atividade proposta pelos Roteiros; e, finalmente, na pós-produção, que pode ou
não aparecer no Roteiro, são feitas indicações de como aprofundar ou complementar
o assunto do Roteiro na sala de aula.
No que se refere ao material a ser acessado pelo aluno são consideradas os
seguintes aspectos: a presença de um “disparador”, uma imagem ou um pequeno
texto; a proposição de uma tarefa ao aluno, produção simples, organizada em
linguagem dialogal, o que deverá facilitar sua autonomia, e com o uso de ferramentas
simples; a produção avançada, a qual propõe ao aluno dar passos mais largos, com o
uso de ferramentas menos simples; e, uma parte opcional, o material de apoio, que
pode aparecer como um link do tipo “para saber mais”.
Cada Roteiro se constitui como uma atividade cujo objetivo principal é
desenvolver uma competência específica e de possibilitar o estudo autônomo pelo
aluno. Nesse sentido, em sua construção uma das preocupações centrais foi o uso de
orientações claras e objetivas, que estão na base tanto das indicações referentes às
ferramentas simples, quanto das ferramentas avançadas.
Os Roteiros são estruturados para ter continuidade em outro roteiro (conjunto
de 2 ou 3, conforme o pré-roteiro) e contam com o uso de animações, ilustrações,
clips de vídeos, sites etc, que podem estabelecer a interface com outras disciplinas.
Para sua execução, o tempo de atividade do aluno em cada Roteiro não ultrapassa 30
minutos.
A contribuição dos Roteiros Didáticos para a inclusão digital
A elaboração de Roteiros Didáticos Digitais e sua implantação nas escolas da
rede estadual do Rio de Janeiro, tanto no segundo segmento do Ensino Fundamental
como no Ensino Médio, apresenta como um dos objetivos gerais inserir o aluno no
meio digital, isto é, no uso do computador como ferramenta para a aprendizagem.
A inclusão digital se refere à democratização do acesso às tecnologias da
informação, de forma a permitir a inserção de todos na sociedade da informação.
Entre as estratégias inclusivas estão projetos e ações que facilitam o acesso de
pessoas de baixa renda na aquisição de computadores e no acesso à internet. Assim,
toda a sociedade poderá ter acesso às informações disponíveis em meio digital,
ampliando as possibilidades de assimilação e produção de conhecimento. A inclusão
digital está, portanto, inserida em um processo mais amplo que diz respeito à inclusão
social.
Sabemos hoje que a maioria da população brasileira encontra-se excluída do
acesso às tecnologias digitais. Embora a sociedade urbana tenha atualmente mais
facilidade em dispor de uma linha telefônica e de um provedor gratuito, os gastos são
grandes; além do computador pessoal em suas residências, há uma conta a ser paga
pelas pulsos telefônicos utilizados ou pelo acesso oferecido pelo provedor. De um
lado, a exclusão sócio-econômica desencadeia a exclusão digital, de outro a exclusão
digital aprofunda ainda mais a exclusão sócio-econômica.
Assim, um parceiro importante na inclusão digital é a educação. A educação é
um processo e a inclusão digital é um elemento essencial deste processo de ensino,
ampliando as possibilidades de uma educação continuada. A escola se constitui como
um caminho essencial para a inclusão digital possibilitando, a professores e alunos, a
construção coletiva do conhecimento. A criança e o jovem cuja renda familiar torna
inacessível a compra do equipamento de computação, pode encontrar na escola a
possibilidade de aprendizado e utilização dos recursos oferecidos por esta ferramenta.
Entretanto, de nada adianta o acesso às tecnologias se não houver acesso à
educação. O aluno não pode ter um papel “passivo”, como consumidor de informação,
mas tem que atuar com um produtor de conhecimento. Além disso, a inclusão digital
deve estar integrada aos conteúdos curriculares constituindo-se como parte do projeto
pedagógico. Esta é a base da proposta de construção dos Roteiros Didáticos Digitais.
A experiência de construção de Roteiros para o ensino da Geografia
No campo da Geografia, a metodologia proposta considera: a apropriação de
conceitos e teorias na análise dos processos geográficos; a identificação dos
resultados das diferentes ações humanas sobre o meio natural; o desenvolvimento de
habilidades ligadas à compreensão de textos literários, jornalísticos, análise de
gráficos e tabelas, interpretação de imagens etc; e o desenvolvimento de habilidades
para pesquisa e seleção de conteúdos disponíveis na Internet.
A fim de tornar mais clara a proposta desenvolvida selecionamos um dos
Roteiros organizados para a disciplina de Geografia, a ser aplicado com alunos do 1ª
ano do Ensino Médio.
Tela 1 – Material para o professor
Tela 2 – Material para o aluno
Tema:
Formação e
caracterização
do espaço
brasileiro
A conquista do espaço brasileiro
O termo pirataria remete a um mundo
em que homens com tapa-olho e
espada na cintura viviam de roubos
no mar - uma lembrança do passado
que sobrevive em filmes e histórias
infantis. No entanto, piratas ainda
existem na vida real, embora não
correspondam a essa imagem: eles
trocaram o mar pela floresta, detêm
grande conhecimento científico e, em
vez de ouro, roubam plantas e
animais para contrabandeá-los para o
exterior. São os biopiratas.
(Adaptado da Revista Ciência Hoje
das Crianças On Line, disponível em
http://cienciahoje.uol.com.br/.
Capturado em 01/11/2005)
Muitos personagens podem ser
evocados para falarmos do processo
de construção do espaço pela
humanidade - agricultores,
construtores, industriais, empresas,
Estado, dentre outros.
A eles vieram se juntar, mais
recentemente, alguns novos
personagens.
Os biopiratas são um deles, e o mais
interessante é que em suas atividades
revelam, de uma forma bastante
clara, a face contraditória da ação
humana na transformação do espaço
– ao mesmo tempo em que as
sociedades humanas constroem o
espaço geográfico elas também o
destroem.
Isto é uma longa história. Para
conhecê-la acompanhe a gente nesta
nova aventura. ?
Descrição: Apresenta a expansão territorial do
Brasil em mapas do século XVI ao século XX.
Competência: Leitura e interpretação de mapas
Pós-produção: A partir da linha do tempo construída pelos alunos, proponha uma pesquisa sobre a fundação de vilas e cidades acrescentando as
descobertas a linha do tempo.
Pré-produção: O professor deve apresentar aos alunos as principais
características dos ciclos econômicos porque passou o Brasil desde o
período colonial até os dias atuais.
Tela 3 – Material para o aluno
Esse mapa te parece familiar?
Fonte: Atlas Geográfico Escolar. IBGE/FNDE, Rio de Janeiro, 2002.
A conquista
do espaço
brasileiro
È o mapa do Brasil
com suas fronteiras
e limites de estados. Mas nem sempre ele
foi assim.
Hoje você é nosso convidado para fazer
uma viagem na
máquina do tempo e conhecer as
mudanças ocorridas
em nosso país.
Tela 4 – Material para o aluno
Observe que o território
brasileiro era delimitado pelo Tratado de Tordesilhas. Aqui
os navegantes portugueses se
depararam com um território
de grande exuberância
natural e escassa ocupação
populacional. Por isso, nas
primeiras décadas após sua
chegada, dedicaram-se
somente a extração do pau-
brasil.
Para garantir o controle das grandes extensões de terra
Portugal adotou em 1534 o
sistema de capitanias
hereditárias, com as
plantations de cana-de-
açúcar, concentradas no
litoral, e criação de gado nas
fazendas do sertão.
Venha! Entra na máquina do
tempo, vamos agora para o
século XVII.
provocadas pelo homem?
Tarefa Primeiro vamos ao século XVI (mapa 2).
Fonte:
Atlas Histórico Escolar. MEC/FENAME, 1973.
Tela 5 – Material para o aluno
Vamos lá, observe com atenção o mapa.
Fonte: Atlas Histórico Escolar. MEC/FENAME, 1973.
Separado desde 1640 da coroa
espanhola, os portugueses romperam os limites da linha de
Tordesilhas usando caminhos
formados pelos rios da bacia do
Amazonas e do Prata. O maior
impulso para a expansão
territorial do país foi, contudo,
a descoberta do ouro em 1690.
Muita gente foi direção aos
atuais estados de Minas Gerais,
Goiás e Mato Grosso.
A economia açucareira entrou em declínio, levando ao
surgimento de uma nova
capital. É isto mesmo, a Bahia
perdeu o papel de capital para o
Rio de Janeiro, em 1763.
Apesar da riqueza
proporcionada pelo ciclo do
ouro e dos diamantes, seu
tempo de vida foi curto.
Opa, então corre, chegamos ao
século XVIII (mapa 4).
Tela 6 – Material para o aluno
O vale do Amazonas foi conquistado pela ação das missões e a implementação da economia das drogas (canela, cravo, salsa-parrilha,
cacau etc). No sul, as conquistas territoriais eram garantidas com a fundação da Colônia do Sacramento e com a transferência de habitantes de baixa renda dos Açores para Porto Alegre e algumas áreas de Santa Catarina. A incorporação do território pelo
avanço dos portugueses, entradistas e bandeirantes, deu ao país um desenho muito parecido com o atual. Os novos limites do Brasil foram formalizados ainda no período imperial pelo Tratado de Madri, de 1750. A partir daí pouca coisa mudou em termos de desenho territorial. No
século XIX foram incorporados os territórios correspondentes ao estado do Acre e de algumas áreas em disputa, acrescentadas mais tarde aos estados de Santa Catarina, do Mato
Grosso e do Amapá.
Considerações Finais
Uma primeira consideração necessária de ser destaca diz respeito à
oportunidade aberta por esse tipo de análise de ampliação do debate sobre a
necessária distinção entre método e técnica. A técnica, no processo de ensino-
Tarefa: Agora é com você, com base no que você aprendeu nesta rápida viagem no tempo construa uma linha do tempo da expansão territorial no Brasil.
Material de apoio: Você se lembra? O Tratado de Tordesilhas não se limitava
às terras brasileiras. Este acordo firmado entre Portugal e Espanha em 1494 dividia todo o mundo a ser descoberto entre estes dois países. O meridiano de
50 graus delimitava o controle sobre as terras descobertas, cabendo à coroa
portuguesa as terras a leste do meridiano à coroa espanhola as terras a oeste.
Você já deve ter aprendido em suas aulas de geografia o significado da palavra plantations. São enormes propriedades dedicadas ao cultivo um único produto
destinado a mercados externos. Nesta época eram as plantations da cana que
dominavam o cenário nacional. Lembre-se que nesta época a idéia de sertão se confundia um pouco com o
sentido de interior.
Produção avançada: Na página da web
http://www.utispossidetis.hpg.ig.com.br/expansao.htm você pode encontrar outros mapas e informações que irão ajudá-lo a aprofundar seus conhecimentos
sobre o Brasil dos séculos XVI, XVII e XVIII, facilitando a compreensão do
processo de expansão territorial em nosso país.
aprendizagem, só tem sentido, quando associado ao uso de conceitos e teorias e a
escolha de um método base do processo de ensino. Assim, considerados método e
técnica, podemos destacar a importância e as possibilidades desta experiência
didática para o ensino da Geografia escolar.
Os Roteiros Didáticos Digitais se constituem como uma estratégia didática
que, além de ampliar o contato com o conteúdo disciplinar e expandir as atividades
que envolvem habilidades e competências, aproxima o jovem desta importante
ferramenta de acesso às informações.
Através dos roteiros digitais, os alunos estarão dando um passo para serem
‘um incluído digital’, no momento em que além do uso do computador e do acesso as
informações na internet, estarão aprendendo a construir e a desenvolver o conteúdo
curricular com estas novas tecnologias.
O ensino através dos roteiros digitais tem uma perspectiva de formação de
indivíduos que tenham uma atitude responsável e solidária perante o mundo
assegurando a cada um deles autonomia intelectual, pensamento crítico e conduta
ética nas relações humanas. Neste processo o estudante deve mobilizar os
conhecimentos adquiridos na escola, para aplicá-los à realidade. O desafio deste
trabalho é o de formar estudantes que desejem ingressar na aventura do
conhecimento. Para isso, nosso objetivo é fazê-lo querer aprender, gostar de
aprender.
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LACOSTE, Yves & KAYSER, Bernard. (1985) In Seleção de Textos: teoria e método.
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OLIVEIRA, Cesar A.C. Reflexões sobre o Ensino de Geografia e a Leitura do Espaço
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