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1 IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CULTURA POLÍTICA NO PARÁ: o caso do município de Inhangapi (Pa) Maria Antonia Cardoso Nascimento 1 Reinaldo Nobre Pontes 2 Severino da Silva Martins Júnior 3 RESUMO O artigo apresenta resultados preliminares da pesquisa sobre a avaliação da implantação do SUAS no município de Inhangapi (Pa) e a relação com a cultura política local. Buscou compreender a relação entre uma área com herança conservadora e seu novo perfil inaugurado pela Constituição cidadã, de política associada a direitos. A metodologia adota a dialética através de pesquisa documental, bibliográfica e de campo. A conclusão foi que os padrões da cultura política dominantes, com a presença de relações clientelistas e assistencialistas e do primeiro- damismo” , ainda resistem, mesmo que seja uma realidade os novos padrões republicanos e descentralizados do SUAS. ABSTRACT The article presents preliminary results of the research on the evaluation of the implantation of SUAS in the municipality of Inhangapi (Pa) and the relation with the local political culture. It sought to understand the relationship between an area with conservative heritage and its new profile inaugurated by the Citizen Constitution, a policy associated with rights. The methodology adopts the dialectic through documentary, bibliographical and field research. The conclusion was that the dominant political culture patterns, with the presence of clientelism and assistentialist re lations and the “First lady governance” , still resist, even if the new republican and decentralized patterns of SUAS are a reality. 1 Universidade Federal do Pará 2 Universidade Federal do Pará. [email protected] 3 Universidade Federal do Pará

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IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E

CULTURA POLÍTICA NO PARÁ: o caso do município de Inhangapi (Pa)

Maria Antonia Cardoso Nascimento1 Reinaldo Nobre Pontes 2

Severino da Silva Martins Júnior3

RESUMO O art igo apresenta resultados prel iminares da pesquisa sobre a aval iação da implantação do SUAS no município de Inhangapi (Pa) e a relação com a cultura polít ica local . Buscou compreender a relação entre uma área com herança conservadora e seu novo perf i l inaugurado pela Constituição cidadã, de polít ica associada a direitos. A metodologia adota a dialét ica através de pesquisa documental, bibl iográf ica e de campo. A conclusão foi que os padrões da cultura polít ica dominantes, com a presença de relações clientelistas e assistencialistas e do “primeiro-damismo” , ainda resistem, mesmo que seja uma real idade os novos padrões republicanos e descentral izados do SUAS. ABSTRACT

The art icle presents prel iminary results of the research on the evaluation of the implantat ion of SUAS in the municipal ity of Inhangapi (Pa) and the relat ion with the local polit ical culture. I t sought to understand the relat ionship between an area with conservative her itage and its new prof i le inaugurated by the Cit izen Constitut ion, a pol icy associated with r ights. The methodology adopts the dialect ic through documentary, bibl iograph ical and f ield research. The conclusion was that the dominant pol it ical culture patterns, with the presence of clientel ism and assistential ist re lat ions and the “First lady governance” , st i l l resist, even if the new republ ican and decentral ized patterns of SUAS are a real ity.

1 Universidade Federal do Pará

2 Universidade Federal do Pará. [email protected]

3 Universidade Federal do Pará

2

1) INTRODUÇÃO

O presente art igo expressa resultados prel iminares de pesquisa de

“AVALIANDO A IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA

SOCIAL NA REGIÃO NORTE E NORDESTE: signif icado do SUAS para o

enfrentamento à pobreza nas regiões mais pobres do Brasi l” , tendo como

part icularidade a escolha de Inhangapi, um dos seis municípios escolhidos

no estado do Pará para real ização da pesquisa, e tomando como foco o

estudo da cultura polít ica presente na gestão municipal do SUAS, objeto de

uma das dissertações de mestrado em desenvolvimento associado à

pesquisa acima mencionada.

A compreensão macroscópica da real idade da polít ica de assistência

social brasileira arranca da compreensão dialét ica gramsciana (GRAMSCI,

apud COUTINHO, 2011) de que se constitui em espaço contraditór io, onde

forças opostas se embatem em busca da hegemon ia. O referencial teórico do

estudo baseou-se nos sistemas de medições: Estado, democracia, polít ica

social, assistência social, cultura polít ica, assistencial ismo e clientel ismo,

tendo como referencias centrais para a análise, principalmente, CARNOY,

BARQUERO, COUTINHO, RAICHELES, TORRES e YASBEK.

Teórica e metodologicamente af inamos nossa pesquisa incorporando

estudos realizados no âmbito da pesquisa mais ampla e afuni lando

conhecimentos em direção da part icularidade da cultura polít ica em âmbito

local, aspecto não explorado em profundidade por ela. Todas as formas de

pesquisas adotadas: documental, bibl iográf ica e de campo (entrevista com

gestor, e grupos focais com usuár ios e técnico/conselheiros) e os dados por

elas obtidas foram uti l izados e ampliados por nossa pesquisa de campo

complementar, na perspect iva de aprofundar e explorar anál ises mais

detidas na part icular idade escolhida.

Com a perspectiva de compreender a complexidade da relação e ntre

os sujeitos e processos envolvidos, f izemos uso do método crít ico-dialét ico ,

por entendermos como sendo, o que dá conta de melhor evidenciar os

aspectos (polít icos, econômicos, sociais e ideológicos) que se colocam como

determinantes em meio aos processos relacionais existentes.

3

A ordem de exposição possui c inco momentos: a introdução, em

seguida “o SUAS como polít ica públ ica e espaço de contradições ” ; o terceiro

item aborda a cultura polít ica na polít ica de assistência social em Inhangapi

(Pa) e por últ imo as conclusões do trabalho são apresentdas.

2. O SUAS COMO POLÍTICA PÚBLICA E ESPAÇO DE CONTRADIÇÕES E

CONQUISTAS

Historicamente a assistência social faz um giro qual itat ivo no campo

da polít ica social brasi leira depois da Const ituição Federal de 1988, mais

especif icamente com a aprovação em 1993 da Lei Orgânica da Assistência

Social (LOAS) como política social pública, a Assistência Social vem transitando, nesta

última década, para um campo novo: o campo dos direitos, da universalização dos acessos

e da responsabilidade estatal.

A LOAS criou uma nova proposta para a Assistência Social brasileira, iniciando um

processo que a tornou visível como política pública. Desse modo, a Assistência Social vem

gradativamente configurando-se como possibilidade de reconhecimento público da

legitimidade das demandas de seus usuários e espaço de ampliação de seu protagonismo.

Sem dúvida, uma mudança substantiva na concepção e na gestão da Assistência Social, um

avanço que permitiu que se iniciasse uma resistência ao chamado assistencialismo e à

tradição de invisibilidade e da condição de “política pobre para pobres”.

Como política de Estado, passou a ser um espaço de dupla dimensão: para a defesa

e atenção dos interesses e necessidades, particularmente dos segmentos mais

empobrecidos da sociedade e para a manutenção da dominação desses mesmos

segmentos, quando legitima antigos padrões políticos de controle dos pobres e perpetuação

da alienação (COUTO; YAZBEK; SILVA; RAICHELIS, 2014).

Em 2004 o CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social aprovou, após amplo

debate coletivo, a Política Nacional de Assistência Social em vigor, na perspectiva de

implementação do SUAS – Sistema Único de Assistência Social.

Esta Política busca incorporar as demandas presentes na sociedade brasileira no

que tange à responsabilidade política, objetivando tornar claras suas diretrizes na efetivação

4

da Assistência Social como direito de cidadania e responsabilidade do Estado.

No âmbito da formulação teórico-metodológico autores e pesquisadores identificam

uma área de tensão entre a luta e ampliação por direitos e administração de riscos sociais,

de inspiração liberal. Esta tensão encontra-se presente nos textos normativos da PNAS e do

SUAS com a incorporação de conceitos tais como, risco social e vulnerabilidade,

disseminados pelos organismos internacionais para o “enfrentamento da pobreza” no âmbito

das políticas de proteção social, tendo sido assimilado no discurso e nas práticas dos

agentes sociais responsáveis pela condução da Política de Assistência Social, sem a

necessária crítica dos fundamentos teórico-metodológicos que os orientam.

O debate sobre a pobreza e as respostas pela via de programas de transferência de

renda, ao lado do processo complexo de redefinição do perfil dos usuários da assistência

social, em função das transformações estruturais do capitalismo contemporâneo, merecem

detida análise, pois se constituem em ambíguos processo que atravessam a PNAS e

interferem nas respostas do Estado às necessidades de reprodução social da classe

trabalhadora.

A ampliação da demanda por serviços e benefícios da assistência social num

contexto de avanço da flexibilização, a informalização e a terceirização revelam

aprofundamento do desemprego estrutural, da precarização do trabalho e da insegurança

social (COUTO; YAZBEK; SILVA; RAICHELIS, 2014).

Após mais de uma década de implantação do SUAS, a nova institucionalidade

proposta convive ainda com referenciais da cultura patrimonialista e clientelista, reafirmando

a presença de um movimento persistente de resistências conservadoras a transformações

mais profundas no campo da assistência social.

Este cenário justifica o presente estudo.

3. O SUAS E A CULTURA POLÍTICA CLIENTELISTA EM INHNGAPI (PA)

3.1 INHANGAPI: TRAÇOS HISTÓRICO-SOCIAIS E A ASSISTENCIA SOCIAL

A ocupação do terr itór io que hoje constitui o município de

Inhangapi, data f ins de 1898, quando al i foi fundado um núcleo colonial que

5

recebeu a respectiva denominação, o termo Inhangapi é de origem Indígena

Tupi Guarani que signif ica “Caminho do Diabo”, recebendo esse nome em

virtude do local ser banhado pelo r io com esse nome.

Até 1900, a colônia era composta, somente, por imigrantes

nacionais em sua grande maior ia nordestinos, neste núcleo encontrava -se

117 famílias, que total izava 711 pessoas, deste total, 409 eram adultos e

302 menores 4, desse total, 346 eram do sexo mascul ino e 365 do sexo

feminino. O principal produto produzido no local era a farinha de mand ioca,

para isso foram instalados 12 fornos de cobre elemento que levou a

local idade prosperar .

O municíp io de Inhangapi localiza-se na mesorregião metropol itana

da capital paraense, e microrregião de Castanhal, sua dimensão terr itor ial é

de 471, 449 km². Possuindo uma população de 10.037 habitantes, sendo que

deste quantitat ivo 72,3% situam-se na zona rural e apenas 27,6% na zona

urbana. A densidade demográf ica do município era de 21,9 h ab/km², e a

est imat iva da população para (2015) 5 era de que est ivesse em torno de

11.053, apontando um crescimento acima da média estadual (Censo

2010/IBGE).

O Produto Interno Bruto (PIB), em 2012, era de 44,4 milhões de

reais, já o PIB per capta era de 4.273,27 reais, apresentando ainda o IDH-M

de 0,572. (IBGE/Censo 2010/Bolet im MDS 2010).

A polít ica de Assistência social em Inhangapi, município de

pequeno porte I , em nível básico de gestão, possui apenas ações no nível da

Proteção Social Básica, dispondo de apenas um CRAS (Centro de Referência

de Assistência Social) cof inanciado que criado em 2005, com a Capacidade

de atendimento de referência (famílias ano/NOB -SUAS) 500, tendo 2.500

Famíl ias referenciadas (ano/NOB-SUAS), com a previsão de um repasse

anual no valor de R$ 72.000,00.

O quadro funcional do CRAS se constitui de 05 prof issionais de

nível superior, sendo três assistentes sociais, uma psicóloga e uma

4 Terminologia utilizada tal qual encontrada no acervo da prefeitura

5 Período em que estava ocorrendo o levantamento de dados para a Pesquisa Nacional de Avaliação do SUAS.

6

pedagoga, 03 prof issionais de nível médio, e ainda 03 prof issionais com

formação não especif icada, essa equipe é responsável pela execução do

PAIF, por meio dos serviços de convivência e fortalecimento de vínculo.

Os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos tem

como valor de referência do ano de 2014 R$ 108.000,00, para uma

capacidade de atendimento de referência de 180/mês

Quanto ao Programa Bolsa Famíl ia (PBF) foi repassado pelo

governo Federal no ano de 2014 o valor de R$ 3.235.884,00, de acordo com

os registros junho de 2015. O município possui 2.382 famíl ias registradas no

Cadastro Único, com 1.669 famíl ias sendo benef iciadas. De junho de 2011 a

março de 2015, o município inscreveu no Cadastro Único e incluiu no PBF

316 famíl ias que estavam em situação de extrema pobreza.

No que se refere o Benef ício de Prestação Cont inuada (BPC) tendo

como referência os registros de março de 2015, 174 pessoas são

benef ic iadas, correspondendo um repasse no valor de R$ 1.486.369,94

O município não dispõe de outros benefíc ios complementares de

inic iat iva municipal, e o valor repasse do tesouro municipal pa ra o fundo da

Assistência, é de R$ 7.000,000.

Quanto ao pacto de aprimoramento do SUAS, o município alcançou

apenas a meta de colocar o Conselho Municipal de Assistência Social como

instância de controle do PBF.

3.2 O SUAS E A CULTURA POLÍTICA EM INHANGAPI: pr imeiras

aproximações

Abordar a categoria cultura polít ica no âmbito da assistência

social, demanda o esforço de compreendê -la como uma mediação que

perpassa a ação (relação) dos atores polít icos diretamente envolvidos no

contexto da referida polít ica , seja daqueles que exercem a função de

operacionalizá-la, seja daqueles que são demandatários em decorrência de

sua situação de vulnerabil idade social.

7

Nesse sentido, qual i f icar de forma prel iminar e sucinta a part ir de

algumas l iteraturas a categoria cultura polít ica, antes de tentarmos visual izá-

la no âmbito das relações estabelecidas na execução da polít ica de

assistência social no município em foco, constitui -se tarefa primordial, tendo

em vista que a anál ise que se sucederá, apontará se a cultura polí t ica

exercida na dinâmica de operacional ização da assistência social em

Inhangapi se dá a part ir de premissas democráticas.

Segundo Baquero (2001), a cultura polít ica de uma dada

sociedade, se constitui como o resultado de um padrão de orientações

cognit ivas, emocionais e valorat ivas que, para além de estáveis, as mesmas

tornam-se vivas e atuantes ao longo do tempo.

( . . . ) Nesse sent ido, o que importa destacar é que a cul tura pol í t ica ocupa um lugar centra l no cot id iano dos indivíduos, podendo servir tanto para regular a transmissão de valores políticos, quanto para legitimar o funcionamento das instituições políticas. A forma como se constrói e se difunde essa cultura está diretamente relacionada à como se reproduzem os comportamentos, as normas e os valores políticos de determinada comunidade (BAQUERO, 2001, p.102).

Encontramos em Gohn (1999, p.21) o conceito de cultura polít ica

como uma espécie de “der ivação” do conceito de cultura, equivalendo de

certa forma, a uma parcela dos fenômenos que ocorrem no universo

polít ico”, que se exprimem nas at itudes e/ou convicções que indivíduos ou

grupos compart i lham relacionados a um sistema polít ico.

O conjunto dessas def inições está ordenado ao conceito de cultura

polít ica, como sendo um campo de conexões onde se estabelecem por meio

de conjunturas diversas em lapsos temporais dist intos, “determinadas

característ icas em uma sociedade” (Brot to, 2015, p. 67). Contudo, a cultura

polít ica pode ainda signif icar, a manifestação de um po der inst ituído entre

“classes e segmentos sociais que se relacionam por meio de um cenár io

econômico, polít ico ou ideológico , materializando o interesse de classes e

segmentos sociai (SEIBEL; OLIVEIRA, 2006, p. 1).

Feitas essas breves considerações conceituais, anal isaremos a

incidência de uma cultura polít ica não democrática na polít ica de assistência

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social de Inhangapi sob alguns aspectos, dentre os quais destacam -se: 1) o

primeiro-damismo, 2) a relação da polít ica com um segmento confessional,

3) a relação subalterna do CMAS, e por f im, porém não somente, o 4) a

existência arranjos oligárquicos contemporâneos .

A pesquisa de campo foi determinante para identif icarmos algumas

situações afetas ao exposto acima, contudo, é importante fr isar que nossa

análise não se encontra acabada, portanto, o que expomos aqui, são visões

parciais que a pesquisa nacional de aval iação da implementação do SUAS,

nos permit iu.

A pr imeira-dama como uma representante do Estado constitui-se

na maior ia das vezes, como responsável por manter vivo o processo da “não

polít ica”, uma vez que a mesma é co-responsável por dar legit imidade a uma

ordem polít ica estatal local , ao mesmo tempo em que contr ibui para a

esquiva do Estado de sua primazia quanto a gestão de polít icas de

assistência social, voltadas aos segmentos pauper izados da sociedade.

(TORRES, 2013, p. 38-39).

Investi a pessoa que ocupa a condição de primeira-dama na

gestão da polít ica de assistência social pode-se estar contr ibuindo, e as

mais das vezes sim, para a perpetuação de uma ideologia6, que reproduz

padrões muito ant igos de subalternidade dos pobres, além de conspirar

contra princípios republ icanos.

O segundo aspecto, por conseguinte, (a relação da polít ica com um

segmento confessional) 7 ident if icado no município de Inhangapi, entendemos

possuir int ima relação com o primeiro -damismo, pois a incapacidade por

parte da gestão, de compreender que a polít ica de assistência social vincula -

se or iginalmente ao processo de enfrentamento da precari zação das

condições de vida das grandes massas, provocadas pelos efeitos da

acumulação monopolista nas sociedades capitalistas, reverbera em prát icas

de ref i lantropização, clientel ismo e moral ização da questão social.

6 Justificando o status quo e legitimando os interesses da classe dominante, algo muito presente na esfera da

política pública, uma vez que, nem sempre os grupos sociais dominados interiorizam a ideologia dominante. 7 Foi identificado no decorrer da pesquisa de campo que as educadoras sociais no âmbito do Serviço de

Convivência e Fortalecimento de Vínculo – SCFV eram as freiras da paroquia local.

9

O terceiro aspecto está relacionado ao processo de

descentral ização polít ico-administrat iva da assistência social , no qual

destaca-se a parceria ou part ic ipação da sociedade civi l como instancia de

controle. Segundo D’Avila Fi lho (2004), o controle social, além de ser

caracter izado por ser órgão consult ivo, del iberat ivo e de f iscal ização, o

mesmo teria polit icamente três importantes papeis no processo de

incrementação da democracia:

a) garantir maior legitimidade às decisões e maior base de apoio à implementação de políticas governamentais; b) contribuir para a criação ou fortalecimento de uma espécie de cultura cívica ao aproximar os indivíduos do mundo público, ou desagregar a dicotomia sociedade-Estado, sem que ambos percam suas identidades; c) criar mecanismos de fiscalização da ação governamental, que passaria a ter novos canais para a prestação de contas (D’AVILA FILHO, 2004, p. 205).

Ao contrár io do que está disposto acima, ident if icamos no decorrer

da pesquisa de campo, um conselho, com expressividade polít ica, autonomia

e independência comprometida , pois enquanto mecanismo de controle, não

encontrava-se desvinculado de aspectos cl ientel istas, uma vez que no

inter ior do mesmo foi perceptível as relações de trocas, de “benef íc ios

patr imoniais, mater iais ou simbólicos” (D’AVILA FILHO , 2004, p. 215),

impossibi l i tando consciente ou inconscientemente, os conselheiros

reconhecerem a debi l idade da gestão.

Essa análise encontra sua fundamentação nas falas dos

respect ivos conselheiros, nas quais percebemos um conhecimento

f ragmentado da polí t ica de assistência social por parte dos representantes

da sociedade civi l , e onde constatou-se a f ragil idade dos vínculos

empregatíc ios dos representantes do poder públ ico, esses aspectos, dentre

outros, corroboram para que o CMAS se constitua em mero mecanismo

legit imador dos contornos polít icos desejados pelo Estado.

E por f im, porém, não menos importante, gostaríamos de fazer

referência, à existência arranjos ol igárquicos contemporâneos no município

de Inhangapi, como resquício de um modelo pós-colonial que exist iu no

Brasil nas primeiras décadas do nosso regime republicano compreendido

entre 1894 e 1930. Esse aspecto foi perceptível ao identif icarmos que um

10

grupo de pessoas de uma mesma famíl ia que se ut i l izavam de sua inf luência

polít ica e econômica para ocupar o poder público local . Entendemos que

esse aspecto abre precedentes para no exercício da condução da coisa

pública os pr incípios democráticos deixem de ser observados .

Nesse sentido, consideramos oportuno fazer m enção à

compreensão de Fischer (1992), sobre o local e de suas relações de poder,

segundo a autora, o entendimento das relações de poder local precisam ser

compreendidas para além da cômoda associação ao poder polít ico, faz-se

necessário segundo a autora, compreendê- las e conceitua-las à luz das

mediações econômicas, sociais, culturais e simbólicas.

Nesse sent ido Fischer (1992) af irma:

(...) O local é, então, a singularidade, com história e memória próprias, com identidades e práticas políticas determinadas. “Como objeto de investigação o local não é, portanto, apenas fisicamente localizado, mas socialmente construído (FISCHER, 1992, p. 107).

Conforme fora mencionado anter iormente, os quatro aspectos

analisados, são dados prel iminares de uma pesquisa que tende desvelar

elementos ainda mais profundos quanto à ideia de assistência como polít ica

pública de direto, uma vez que a cultura polít ica impõe uma relação de poder

que mesmo que de forma velada e suti l potencial iza na contramão dos

princípios democrát icos a concepção de uma polít ica enquanto dádiva e

benesse do Estado.

CONCLUSÕES

A implantação do SUAS no Brasi l é muito recente, apen as dez anos.

Historicamente podemos dizer que as mudanças na área da assistência

social só começaram. É sabido e corrente, que nessa área pesa uma ant iga

cultura mundial sobre pobreza assist ida, já assaz estudada, que perpassa a

histór ia das religiões, em especial o catol ic ismo, e a história da intervenção

estatal na proteção ou controle dos pobres.

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O estudo desenvolvido nessa pesquisa incide sobre um ponto nefrálgico de

qualquer polít ica social vigente: a cultura polít ica que por ela perpassa. No

caso da polít ica em tela, f izemos um recorte de observar para o presente

trabalho um município de pequeno porte 1: Inhangapi (Pa). Na menores

comunidades polít icas as determinações mudancistas tendem a chegar e se

instala de forma mais lenta, em razão da força das “tradições”, o que leva à

facil idade de manter o pensamento conservador vivo e dominante.

Os resultados e anál ises prel iminares da pesquisa em curso que ora

apresentamos no presente art igo, corroboram com outras inic iat ivas

investigativas no campo da assistência social. A pesquisa revelou, nos seu

dados prel iminares, a presença de uma cultura conservadora cl ientel ista e

controladora. Já que a presença da esposa do prefeito na gestão da polít ica

de assistência social é dado revelador. Ademais da identif icação de relações

de controle de famíl ias nas esferas do estado e também da relação mesclada

entre Esado e igreja na administração dos serviços socioassistenciais, são

elementos que constatam oou indicam manutenção de prát icas tradicionais

mesmo em face de novos disposit ivos democráticos e de governança em

bases republ icanas.

REFERÊNCIAS

D’AVILA FILHO, Paulo M. [et al]. Acesso ao Poder: Clientelismo e democracia participativa, desconstruindo uma dicotomia. Civitas – Revista de Ciências Sociais, v. 4. n. 2, jul.- dez. p. 211-233, Porto Alegre: 2004;

BAQUERO, M. Cultura Política Participativa e Desconsolidação Democrática: reflexões sobre o Brasil contemporâneo, São Paulo em Perspectiva, v. 15, nº. 4, São Paulo, 2001;

COUTO, Berenice R; Yazbek, Maria C; SILVA, Maria O. S. e RAICHELIS, Raquel (orgs). O Sistema Único de Assistência Social no Brasil: uma realidade em movimento. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Cortez, 2014. COUTINHO, C. N. O leitor de Gramsci, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011

FISCHER, Tânia. Poder local: um tema em análise. Revista de Administração Pública. Rio

de Janeiro, v. 4, 1992, p. 105-113;

GOHN, Maria da G. Educação não-formal e cultura política: impactos sobre o associativismo do terceiro setor, São Paulo: Cortez, 1999;

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poder, São Paulo: Cortez, 2002;