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Celso Perota

Vitória2007

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Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio, desde quedivulgadas as fontes.

© Copyright by Sebrae/ES, Vitória, 2007.

Presidente do Conselho Deliberativo EstadualLucas Izoton Vieira

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Perota, Celso

P426 Impactos do artesanato sobre o turismo no Espírito Santo / Celso Perota. – Vitória :Sebrae/ES, 2007.

56 p. : il., retrs. ; 24 cm.

ISBN 85-7333-404-5

1. Artesanato – Turismo – Espírito Santo (Estado). 2. Artesanato – Espírito Santo (Estado) –Aspectos socioeconômicos. I. Titulo.

CDU: 7.067.26:338.48(815.2)

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Este estudo foi concretizado com a colaboraçãoda turismóloga Francisca Armanda MacielLamas, que realizou o levantamento bibliográficoem documentos eletrônicos.

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LISTA DE SIGLAS EABREVIATURAS

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Bebarro - Feira do Barro

CFCP - Coordenação de Folclore e Cultura Popular do Museu do Folclore Edison Carneiro

Embratur - Empresa Brasileira de Turismo

Emcatur - Empresa Capixaba de Turismo

Funarte - Fundação Nacional de Arte

NPDA - Núcleo de Produção Mundial de Turismo

OMT - Organização Mundial de Turismo

ONG - Organização Não-Governamental

PNDA - Plano Nacional de Desenvolvimento do Artesanato

Sebrae - Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Sudene - Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 15

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 19

2 POLÍTICAS PARA O ARTESANATO .................................................................... 25

3 A EVOLUÇÃO DO ARTESANATO NO BRASIL E NO ESPÍRITO SANTO ............... 313.1 ARTESANATO NO ESPÍRITO SANTO ............................................................... 35

4 IMPACTOS DO ARTESANATO NO TURISMO ..................................................... 41

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 47

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 51

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ............................................................................... 55

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APRESENTAÇÃO

N o Brasil, a importância do turismo tem sido cada vez mais evidenciada nas políticas públicasem âmbito federal, estadual e municipal e compreendida como fonte de geração de postos detrabalho e de renda. Essa é uma das atividades que mais se desenvolve no mundo, evidenciada

pelo aumento de sua participação relativa dentro do setor de Serviços que, por sua vez, vem apresen-tando crescente influência no Produto Interno Bruto em países desenvolvidos.

Dada a diversidade de seu patrimônio natural e cultural, o Brasil é um dos maiores potenciais turís-ticos do mundo, o que tem despertado o interesse de visitantes e de empreendedores de diversossegmentos econômicos. Isso pode ser comprovado por inúmeros investimentos realizados no País.Felizmente, o Espírito Santo faz parte deste cenário não apenas pelo nosso potencial de atrativosnaturais e culturais mas, sobretudo, nos últimos tempos, pelos vários negócios que emergem, prin-cipalmente com as diversas atividades de setores prioritários da economia estadual.

Os mais distintos estudos dos mais diferentes órgãos e instituições que trabalham na identi-ficação de setores com as melhores condições de geração de renda e emprego sempre apontamo turismo como um dos mais importantes, seja pela capacidade de agregar valor ao produto turís-tico local, seja pela possibilidade de absorver quase que imediatamente grande parte da mão-de-obra da região. Eis o porquê de o turismo ser um dos principais segmentos da economia nesteprincípio de século.

Inúmeras publicações apontam que o fenômeno do turismo, transportando pessoas do seu local deorigem para um determinado destino, por motivo de negócios ou lazer, impacta uma ampla varie-dade de atividades econômicas e é também impactado por elas. Entre tais atividades são mais diretase evidentes: compra de equipamentos de hospedagem, de alimentos e bebidas, de entretenimento elazer, fabricação de móveis, utensílios e enxoval para equipamentos de hospedagem e de alimen-tação e bebidas, confecção de brinquedos para a indústria de entretenimento e lazer, distribuiçãode combustíveis, principalmente para aeronaves, ônibus de carreira e lazer, serviços de recepção aturistas e, até mesmo, serviços de câmbio.

Em particular, no caso do Espírito Santo, todo um cenário vem sendo transformado nos últimos anos.Essa transformação se associa à indústria de petróleo e gás, à expansão das usinas siderúrgicas, àfábrica de celulose, à extração e ao processamento de mármore e granito, ao desenvolvimento da

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agricultura (em especial da fruticultura), ao uso do espaço rural também para atividades de lazer eentretenimento, à expansão imobiliária etc. Isso sinaliza claramente que todo o movimento social,cultural, econômico e ambiental merece ser estudado, o que exige, por sua vez, uma reunião deinformações que nos permitirão uma leitura mais clara de tudo o que vem ocorrendo.

Sob este aspecto, é preciso que lancemos um olhar sobre o social e busquemos entender de queforma a atividade econômica do turismo impacta ou é impactada por toda essa onda virtuosaque abraça o nosso Estado.

Foi, pois, com este intuito que o Sebrae Espírito Santo convidou o especialista, Celso Perota, paradiscorrer sobre o tema do “Artesanato no turismo”, de forma que possamos disponibilizar a profes-sores, pesquisadores e estudiosos do assunto, ao poder público e à iniciativa privada uma fonte deconsulta e informação que venha nortear a intervenção em vários setores, à luz de uma perspectivade se ter o turismo como um indutor de um processo de desenvolvimento econômico e social.

O artesanato no Espírito Santo foi amplamente abordado neste estudo, buscando valorizar a impor-tância da sobrevivência das técnicas de trabalhos manuais relacionadas especialmente à Panela deBarro e ao lavor indígena, haja vista serem estes os principais ícones do tradicional artesanato capixaba.

Foi tratada como altamente positiva a união estratégica do artesanato com o trade turístico, esti-mulando a comercialização dos produtos que, por sua vez, promovem um incremento na produção ea exigência de uma maior diversificação na linha de produção.

Não menos importante foi a chamada para a identidade local que é passada ao visitante quando eleleva consigo um produto artesanal, sem contar que permite integrar o artesão, a cultura local, apreservação da memória popular e do Meio Ambiente à comunidade receptora.

Este estudo identifica como negativas a difusão e dispersão do artesanato autóctone misturado àvenda de produtos artesanais de diversas origens nos vários pontos de comercialização espalhadospelo Estado. Chama atenção, ainda, para a alteração das formas tradicionais de determinadosprodutos artesanais, pressionadas pela produção no intuito de atender a demanda, fabricando-os emsérie ou mesmo descaracterizando-os pela interferência de etnias distintas daquelas que dão origemao produto.

A despeito dos problemas relatados, o estudo aponta para o artesanato como um elemento impres-cindível na composição do produto turístico, que contribui significativamente para o setor no incre-mento do turismo cultural e particularmente na formação de roteiros turísticos.

A Direção

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INTRODUÇÃO1

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A constatação da relação entre o artesanato e o turismo é obvia porque o turista é um grandeconsumidor da produção artesanal. Porém, temos de considerar uma multiplicidade de olharessobre essa relação. Um desses olhares dirige-se ao turista cultural que consome artesanato,

pois sua característica é ter um alto nível de exigência, principalmente no que diz respeito à auten-ticidade e à identidade, fatores que conferem valor cultural aos objetos adquiridos.

Em primeiro lugar, é importante definir o que é artesanato e os conceitos de turismo.

A questão etimológica da palavra artesanato ainda é estudada, mas sabemos que na antiguidade apalavra arte significava “fazer” e não criar. O “fazer” referia-se aos modos técnicos que as comu-nidades encontravam para sobreviver. No final da Idade Média, alguns artistas passaram a assinaras obras e, então, foram chamados de “artesãos”.

Atualmente, um dos conceitos mais usados de artesanato é o proposto pelo Conselho Mundial de Artesanatoque afirma: “Artesanato é toda a atividade produtiva que resulte em objetos e artefatos acabados, feitosmanualmente ou com a utilização de meios tradicionais ou rudimentares, com habilidade, destreza, qualidadee criatividade” (CONSELHO MUNDIAL DE ARTESANATO, apud SEBRAE/MG, [1991], p. 3).

Para entender essa definição, é necessário qualificar os variados universos dos artesãos, sobretudosua relação com o Meio Ambiente, a disponibilidade de matéria-prima e os objetivos de sua produ-ção. Fazendo essa qualificação, poderemos compreender os processos culturais de sua elaboraçãoe, com isso, defini-los como arte popular, artesanato ou trabalho manual e, principalmente, reco-nhecer sua autenticidade e, conseqüentemente, sua identidade étnica, local ou regional.

Contudo, o conceito antropológico do artesanato como objeto único, de representação étnica econtextualizado historicamente ainda permanece, sobretudo em países em desenvolvimento, comoo Brasil, onde se constatam, numa mesma área geográfica, significativos contrastes sociais etecnológicos, pois, para algumas pessoas ou comunidades, a produção de artesanato passa a ser ummeio de vida; para outras, uma complementação de renda, especialmente nas áreas em que a geraçãode emprego é menor que a força de trabalho.

O significado cultural do artesanato é identificado etnicamente como um “[...] testemunho, lem-brança, nostalgia, entre outros. Está no objeto uma tentativa permanente de recuperar sobrevivênciastradicionais e simbólicas [...]” (LODY, 2002, p. 2). A característica e o valor do artesanato devemser de plena identidade com a comunidade que o gerou, mesmo que algum artesão se destaque. Umdos exemplos mais significativos dentro do estudo do artesanato brasileiro é o da cerâmica que foiproduzida individualmente pelo mestre Vitalino, em Pernanbuco, e que, após sua morte, teve suasrepresentações em argila passadas para o domínio público. Hoje, há uma significativa quantidade

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de artesãos ou grupos de pessoas que estão reproduzindo os temas e as formas do mestre Vitalino,expressando, assim, uma cultura regional muito bem identificada e solicitada pelos turistas.

Mais recentemente, as correntes de pensamento ecológico, destacando-se as Organizações Não-Governamentais (ONGs), têm-se preocupado com a produção artesanal em relação ao desenvolvi-mento sustentável, o que chamam de “produção limpa”.

Para a ONG Greenpeace (apud TODABA PARTICIPAÇÕES, 2005), o artesanato socialmente correto é aquele

[...] produzido por pequenas comunidades extremamente pobres, que detêm o conhe-cimento de produção por meio de ensinamentos de gerações anteriores, utilizandomatérias-primas renováveis e corantes naturais (vegetais) [e que] devem utilizarmatérias-primas renováveis, não utilizar produtos tóxicos e poluentes, inclusive tin-tas naturais à base de água [...].

Uma das questões fundamentais dessas organizações é manter tais comunidades, que são denomi-nadas de “tradicionais” e produzem objetos utilitários para uso pessoal ou comunitário, não se preo-cupando com o valor comercial, porém, utilizando matérias-primas que se encontram presentes emseu meio e, portanto, ecologicamente corretos.

A definição técnica de turismo adotada pela Organização Mundial do Turismo (OMT) é que “[...] oturismo compreende as atividades que realizam as pessoas durante suas viagens e estadias paralugares distintos ao de seu entorno habitual, por um período de tempo inferior a um ano, coma finalidade de lazer, por negócios etc.” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO TURISMO, 2001, p. 38)

Já a Empresa Brasileira de Turismo (Embratur), dentro de uma visão econômica, define turismo como“[...] a atividade econômica representada pelo conjunto de transações turísticas (compra e vendade bens e serviços) [...]”.

Do ponto de vista teórico, o conceito de turismo proposto por Mathieson e Wall (1982, apudTHEOBALD, 2001, p. 32) é dos mais utilizados. Conceituam turismo como

[...] o deslocamento temporário de pessoas de seus locais normais de trabalho e resi-dência para determinados destinos, as atividades empreendidas durante a sua estadaem tais destinos e as instalações criadas para atender a suas atividades [...].

Mas a dimensão do conceito de turismo é bem maior. A movimentação de pessoas que não estãoem trabalho, em contextos diferentes do seu quotidiano, pode exercer e caracterizar uma variedadede atividades turísticas. O termo é amplo. Pode referir-se à visita de uma pessoa a um atrativo desua cidade ou a uma viagem a lugares totalmente desconhecidos ou a outros países.

Assim o turismo é um fenômeno muito complexo, não só por se apresentarquantitativamente como uma das maiores (se não a maior) indústria do mundo, masprincipalmente, por uma enorme diversidade de objetivos programáticos, além de as-pectos subjetivos que perpassam todos os relacionamentos envolvidos nas suas múlti-plas facetas [...] (GRÜNEWALD, 2003, p. 143).

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Dentro dessas múltiplas facetas, está o imaginário do turista, em relação ao local visitado, e suavontade de apreender recordações de uma viagem, por meio da aquisição de objetos simbólicos,artesanais ou de souvenirs. Nesse momento, uma peça artesanal pode representar a identidade dolocal para o turista e a sua satisfação em reter uma parte dessa cultura no seu acervo particular,mesmo que sua autenticidade e identidade possam ser questionadas.

No comércio turístico do mundo globalizado, é necessário verificar a procedência da produção doartesanato. Um exemplo disso é o do turista que compra um berimbau no Mercado Modelo deSalvador. Inconscientemente, ele está seguro de que adquiriu um objeto autêntico da Bahia, ou dacapital (Salvador), mas muitos dos berimbaus comercializados naquele Estado são produzidos noNorte do Espírito Santo. O mesmo acontece com a maioria dos souvenirs que tem seu local de produçãodiferente do lugar de comercialização.

Por isso, a relação entre artesanato e turismo deve ser vista criticamente, sobretudo quanto às for-mas de comercialização, pois essa dinâmica é desenvolvida pelo próprio fenômeno do turístico.

Introdução 2 3

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POLÍTICAS PARA OARTESANATO

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A lgumas ações dos governos federal, estadual e municipal estão colocando o artesanatocomo uma oportunidade de aumento de trabalho, paramelhorar a renda das comunidadese dos artesãos.

O Programa do Artesanato Brasileiro, criado no final da década de 1960, desenvolveu ações quevisavam à valorização do artesanato, do artesão brasileiro e, por conseguinte, de sua realidade culturale a promoção do artesanato no País e no exterior.

Esse Programa deu ensejo à criação do Programa Nacional de Desenvolvimento do Artesanato, insti-tuído pelo Decreto no 80.098, de 8 agosto de 1977. O Decreto no 83.290, de 13 de março de 1979,regulou a classificação de produtos artesanais e a identificação profissional do artesão. É importantecitar que esse programa estava veiculado, desde 1995, ao então Ministério da Indústria e Comércio edo Turismo que foi sucedido pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, fatoque deu maior incremento à venda de artesanato, principalmente no exterior.

Nesse período, estruturam-se, para o segmento artesanal, algumas políticas voltadas para a organi-zação e o fortalecimento de núcleos de produção (associações e cooperativas de artesãos), e paraà promoção e o incentivo à comercialização dos produtos artesanais. Assim, definiram-se algumasdiretrizes para o aumento da produção, tais como:

a) geração de emprego, ocupação e renda;b) estímulo à exportação;c) desenvolvimento e aproveitamento das vocações regionais e locais;d) fortalecimento dos arranjos produtivos locais;e) integração regional, nacional e internacional desses arranjos;f) implementação de diretrizes que estabeleceriam parcerias entre todos os órgãos dos gover-

nos e entidades privadas envolvidas com o artesanato.

Com isso, alguns Estados estabeleceram seus arranjos produtivos e criaram programas de incentivoao artesanato, abrindo espaços para produção, armazenamento e comercialização.

Apesar disso, muitos projetos ou subprojetos não tiveram os resultados esperados. Um dos fatoresdesse insucesso consistiu no desconhecimento da realidade cultural das comunidades envolvidas,porque alguns de seus objetivos eram abstratos para os artesãos ou comunidades de artesãos,principalmente quanto aos procedimentos e às ações. Exemplificam-no os núcleos artesanais daspopulações tradicionais que não se enquadraram no modelo e nas diretrizes do Programa de Arte-sanato Brasileiro, sobretudo no que diz respeito aos processos de produção e comercialização.

No governo do professor Fernando Henrique Cardoso, com a criação da Comunidade Solidária, oestudo e a divulgação do artesanato tomou outra dimensão. Juntamente com outras instituições –

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como a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), o Serviço de Apoio às Microe Pequenas Empresas (Sebrae), a Fundação Nacional de Arte (Funarte), mediadas pela Coordenaçãode Folclore e Cultura Popular (CFCP) do Museu do Folclore Edison Carneiro e de algumas ONGs –,desenvolveu-se o Projeto de Apoio às Comunidades Artesanais para Geração de Renda. Nesse pro-jeto, a preocupação primordial foi desenvolver ações nas comunidades tradicionais que produziam eproduzem artesanato em que o fazer artesanal é quotidiano, a fim de resgatar o profundo conhe-cimento das técnicas artesanais, recuperando as mais variadas identidades culturais e, assim, conhecerou reconhecer as mais diferentes vertentes do patrimônio cultural brasileiro.

Visava-se o resgate das atividades artesanais que expressassem a maneira de viver dessas comuni-dades associado à geração de renda e ao revigoramento das tradições e seus fazeres. Colocava-seo artesanato à disposição da sociedade, como produto “diferente”, “exótico”, para distingui-lo daquelesprodutos que repetem formas e padrões como os souvenirs que não têm criatividade e, conseqüen-temente, sem uma identidade étnica.

O projeto abrangeu uma dezena de comunidades de diferentes partes do Brasil, principalmente ascerâmicas do Candial, no Norte de Minas Gerais; as cerâmicas baianas, de Mangueira, de Lajas eRio Real; a cerâmica de Trucunhaém, de Pernambuco; a cerâmica do Vale do Jequitinhonha, emMinas Gerais; os santos e santeiros do município de Ibimirim, em Pernambuco; os brinquedos popu-lares de Itabaiana; todas as manifestações culturais do município de Serrita, que expressam a cul-tura do vaqueiro nordestino (desde a música, as vestimentas até a culinária); as bonecas do sertãoda Paraíba; a diversidade de formas de artesanato encontrada na Ilha dos Ferros, no vale do Rio SãoFrancisco; a renda minha de Natal, no Rio Grande do Norte; as rendeiras de Divina Pastora, deSergipe; as fibras do sertão da Bahia; as tranças do mar de Sauipe, na Bahia; as tradições vivas daslocalidades de D. Pedro II e Ilha Grande de Santa Izabel, no Piauí; os doces de Urucaia, no interiorde Minas Gerais; as tramas de tecer dos índios Tremembé, no litoral cearense; a arte popular deJuazeiro do Norte; e as tradições populares de São Mateus e Conceição da Barra, representadaspela cerâmica, pelos trançados e pela escultura de madeira e outras.

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A EVOLUÇÃO DOARTESANATO NOBRASIL E NOESPÍRITO SANTO

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U ma das características fundamentais da sociedade brasileira é a sua diversidade bioló-gica e cultural. As mais variadas matrizes biológicas fizeram do Brasil um grande laboratóriode miscigenação que, ao longo da história, produziu novos biótipos e, ao mesmo tempo,

mesclou experiências das mais variadas tradições culturais.

Mediante essa constatação, para estudar o artesanato brasileiro, dentro dessa dinâmica, é neces-sário criar alguns recortes nessa longa história, a fim de explicar uma série de situações que envol-vem os saberes tradicionais no Brasil.

Num primeiro recorte, a experiência das nações indígenas brasileiras, ao longo de sua fixação noterritório, conseguiu produzir um número considerável de artefatos necessários à sua vida quoti-diana, utilizando matéria-prima in natura que estava disponível – como a pedra, a argila, o osso, aconcha, as penas etc. – e era obtida sem qualquer dificuldade. Tal experiência aliava-se a umatecnologia patrimonial que proporcionava a produção de um grande número de instrumentos dediversas formas e funções. Esses artefatos sempre tiveram um significado simbólico nessas socie-dades igualitárias. Um estudo pormenorizado desses objetos indígenas, coletados por arqueólogos eantropólogos, ou por colecionadores, indica que as questões temporais são relevantes para se entendero significado de algumas peças, especialmente pela continuidade do uso de técnicas e formas nosperíodos históricos.

Apesar da presença recente de povos africanos no Brasil, sua contribuição foi significativa paraaumentar o acervo artesanal, por meio de seus instrumentos tradicionais ou adaptando-os emdecorrência do contato com as populações indígenas e européias. Igualmente, os africanos, em suamaioria, fizeram seus objetos trabalhando diretamente as matérias-primas in natura. As populaçõesde africanos faziam seus objetos trabalhando diretamente as matérias-primas in natura ou com materialpré-fabricado. Uma parte desses povos da África, principalmente a que veio do Norte daquele con-tinente, chegou ao Brasil com conhecimentos de metalurgia. Assim, vão produzir objetos de metal.As “pencas” (arranjos com formas de frutas de metal), ainda encontradas no Mercado Modelo deSalvador e os objetos feitos de prata (filigranadas), em algumas áreas de Minas Gerais e Goiás, sãoexemplos dessa técnica. A contribuição das inúmeras culturas africanas que chegaram ao Brasil ede seu artesanato é de grande importância, pois, os africanos, por sua condição de escravos, foramos que mais tiveram contato com portugueses e ibéricos, nas primeiras fases da colônia. Dessa for-ma, disseminaram entre a população ibérica seus objetos e suas técnicas de elaboração do artesanato.

Nesse mesmo recorte histórico, a aculturação entre elementos das culturas indígenas e africanasfoi sigificativa para a fixação de novos padrões culturais, particularmente na região litorânea. Doponto de vista biológico, é importante citar a fixação sexual das mulheres indígenas pelos homensafricanos, fato que contribuiu sensivelmente para uma rápida miscigenação biológica. Do ponto devista cultural, essa miscigenação pode ser vista na mudança de inúmeras formas socioculturais, nasnovas técnicas criadas, no conseqüente surgimento de novos produtos, além das inúmeras adaptações

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incorporadas por uma nova sociedade, a chamada cultura neobrasileira. Um exemplo marcante é aausência de musicalidade em nossas tribos indígenas em contraste com a grande profusão de sonsproduzidos pelos instrumentos de percussão dos africanos. No Espírito Santo, a sobrevivência de algunselementos folclóricos contribuiu para a preservação de objetos de origem africana que foram adotadospelos remanescentes indígenas do Estado. O complexo cultural do “congo” é um exemplo, pois o acervomaterial, composto por tambores, ganzá (casaca) e pelas estruturas musicais, são mesclas de recortesafricanos e ibéricos, por influência moura do Norte da África, elementos que foram rapidamenteaculturados pelos índios. Outro exemplo significativo é o “congo de Caieiras Velhas” que, depois deestruturado e devidamente aculturado, se incorporou ao patrimônio cultural daquela comunidade.

Os africanos, assim como as populações indígenas, possuíam uma organização social e econômicabaseada na divisão de trabalho por sexo que influenciava a produção de artefatos. Nessas comuni-dades e, posteriormente, nas populações tradicionais, a confecção da cerâmica sempre foi de domí-nio feminino. Isso ainda se observa na produção das panelas de barro em Goiabeiras e em algumascomunidades de descendentes africanos do Norte do Estado.

Num segundo recorte, é importante a constituição das denominadas populações tradicionais,constituídas, principalmente por remanescentes das comunidades indígenas e de afrodescendentesque foram aculturadas nos primeiros anos da colônia. Essas comunidades vêm sendo estudadas,especialmente, por antropólogos que se preocupam com a ecologia cultural. Tais populaçõesmantiveram seu modo de vida, seus saberes, sua tecnologia e a organização social das etnias deorigem, particularmente quanto ao modelo de economia de subsistência. Essas comunidades estãopresentes na cultura brasileira desde o século XVI até os dias atuais.

As populações tradicionais no Brasil são constituídas e caracterizadas por terem “[...] padrões decomportamento transmitidos socialmente, modelos mentais usados para perceber, relatar e inter-pretar o mundo, símbolos e significados socialmente compartilhados, além de seus produtos mate-riais [...]” (DIEGUES, 2002, p. 84), sempre mantendo uma relação sem conflito com o Meio Ambiente,não usando força de trabalho assalariada e acumulando minimamente o capital.

Diegues (2002, p. 89), quando define as sociedades tradicionais no Brasil, leva em consideraçãodez características fundamentais, dentre as quais, a de que “[...] a tecnologia utilizada é relati-vamente simples, de impacto limitado sobre o meio ambiente. Há reduzida divisão técnica e socialde trabalho, sobressaindo o artesanal, cujo produtor (e sua família) domina o processo de tra-balho até o produto final [...]”.

Levando em consideração essa característica e a de que as sociedades tradicionais não são estáticas– mas, sim, em constante mudança, porém em ritmo mais lento que as sociedades urbanas contem-porâneas, em função de fatores internos e externos –, a elaboração artesanal adquire um papelfundamental dentro da cultura e da estrutura econômica do grupo, pois a característica da produçãoartesanal é de ser de pequena monta, sem tempo determinado para a elaboração e sem compromissomercantil. Por isso, tem uma relação efetiva com a sustentabilidade, uma vez que esse tipo de pro-dução é harmônico com o Meio Ambiente e atende as necessidades básicas das comunidades.

Nassa fase, o conceito de artesanato ainda não estava formado e os fazeres tradicionais estavam liga-dos diretamente às necessidades de cada comunidade e ao modelo colonial implantado pelos portugueses.

3 4 Impactos do artesanato sobre o turismo no Espírito Santo

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A evolução do artesanato no Brasil e no Espírito Santo 3 5

A maioria das áreas de atuação do Projeto Artesanato para Geração de Renda, feito pela ComunidadeSolidária, abrangeu populações tradicionais.

Num terceiro recorte histórico, ocorre a produção artesanal feita pelos imigrantes no século XIX. Nesseperíodo, temos duas características fundamentais. A primeira diz respeito às necessidades diretamenteligadas à produção agrícola, quando foram elaborados objetos artesanais, produzidos com matéria-prima in natura com produtos pré-elaborados ou fabricados, como a confecção de vassouras, cestas,peneiras, esteiras, suportes para armazenar a produção, sacos para embalagem (principalmente de café).A segunda característica é a produção de objetos artesanais para atender as necessidades domésticas,sempre feitos por mulheres, utilizando matéria-prima pré-fabricada, principalmente tecidos. O artesanatocomercializado pelo turismo rural, nos dias de hoje, é fruto desse período, cujos técnicas e modelosforam preservados pelo uso contínuo que deles faz a população rural.

Um quarto recorte é o da produção artesanal criada pelo turismo ou a chamada indústria do trabalhomanual (industrianato) e da indústria dos souvenirs,

[...] produto artesanal tem sido substituído, nos últimos anos, por uma imensa invasãode estereótipos externos e desnaturalizados, que assolam e invadem as imagens, osobjetos e os diversos produtos, provocando absoluta descaracterização de identidade[...], [dos produtos artesanais]. Uma das preocupações nesse recorte é a descarac-terização do artesanato e a souvernização do produto artesanal, que pode [...] causaruma nova massificação dos produtos artesanais ao promover à produção de souvenirsdescaracterizados [...] (PINHO, 2002, p. 172, grifo do autor).

Atualmente, com a população urbana maior que a população do campo, os objetos artesanaisproduzidos na zona rural estão sendo vistos e entendidos dentro da própria dinâmica dessassociedades. Por isso,

[...] a coexistência contemporânea dos contornos do industrial e do pré-industrial, dacidade e do campo, do religioso e do lúdico, do trabalho e do lazer, do ‘popular’ e do‘culto’, em uma civilização formada por culturas as mais diversas, que se imbricamfortemente ao longo dos séculos e continuam a fazê-lo sob as mais variadas modali-dades [...] (FROTA, 2000, p. 23).

Nesse contexto, particularmente nos ambientes urbanos, o conceito de artesanato teve de ser ampliadoe revisto, para contemplar as mais diversas formas de trabalho e a utilização de uma variada gamade técnicas e matérias-primas e, também, para entender, de uma forma holística, a relação do urbanocom o tradicional, o típico, o rural etc.

3.1 ARTESANATO NO ESPÍRITO SANTO

Todos os recortes mostrados neste estudo para análise da formação étnica brasileira encontram-se representados no Espírito Santo que recebeu e recebe hordas de imigrantes desde a pré-históriaaté os dias de hoje. É interessante observar o registro de uma imigração indígena no final doséculo XX, exatamente em 1967, quando índios falantes da língua guarani (Mbya) chegaram aoEstado e se instalaram no município de Aracruz. Por isso, é importante destacar as mais diversasmanifestações dessas etnias no Estado e como cada uma delas está contribuindo para o desenvol-vimento da produção e comercialização do artesanato.

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De nossas raízes indígenas, é importante caracterizar a sobrevivência das técnicas de confecção das pane-las de barro. O núcleo de produção, localizado no bairro de Goiabeiras, é um local que simboliza o ser“capixaba”. O chamado complexo da “Panela de Barro”, que é constituído pelas técnicas de elaboração dapanela e de sua utilização, complementa-se dentro do trade turístico em função do uso das panelas de barronos restaurantes de culinária típica do Espírito Santo e, também, pelo seu uso na elaboração e apresentaçãode pratos típicos em restaurantes de gastronomia de outras etnias. Esse é um artesanato de valor étnico, deresistência cultural, com uma identidade marcante e diretamente relacionada ao turismo, porque, apesar desua técnica de confecção ser centenária, são raros os impactos negativos produzidos pelo turismo.

Ao contrário, o artesanato produzido pelos índios Guaranis (Mbya), nas aldeias localizadas no muni-cípio de Aracruz, encontra-se em parte descaracterizado e são poucos os artefatos que tem funcio-nalidade e alguma ligação com a cultura local. Somente o trançado de fibras vegetais, como a cestaria,tem qualidade, porque – além da técnica de confecção ser de domínio do grupo – essas peças têmfuncionalidade e, por isso, representação étnica.

Os africanos, em sua maioria e pela condição de escravos, sempre estiveram mais próximos dapopulação portuguesa que os índios. Assim, adaptaram sua tecnologia de origem às necessidades deseu cotidiano de escravo, recriando ou readaptando algumas técnicas indígenas e portuguesas. Nacerâmica de Goiabeiras, encontra-se uma sensível influência africana, na presença das alças (qua-tro) localizadas na parte exterior das panelas. Outra adequação foi na produção de farinha de man-dioca, quando substituíram os tipitis indígenas por prensas mecânicas (bolandeiras), para a retiradado ácido cianídrico da massa ralada da mandioca e, posteriormente, introduziram o coco ralado naprodução do beiju (beiju de fati).

Na região de São Mateus, encontramos artesãos afrodescendentes que trabalham com fibras vegetaise argila. Na localidade de Areinha, nas proximidades do entroncamento da Rodovia BR-101 com aRodovia ES-421 (BR-101 – Conceição da Barra), numa pequena comunidade rural, há um núcleo deprodução de artesanatos feitos com cipó (chamado popularmente jacaré, traíra ou timbó), com umainfinidade de formas de cestas. Nas proximidades, no inicio da Rodovia ES-154, alguns artesãos estãoutilizando o sisal (Agave sisalana), que é encontrado dentro das plantações de eucalipto, para, comsua fibra, produzirem inúmeros objetos, destacando-se os espanadores. Além disso, no Mercado Muni-cipal de São Mateus podem ser encontradas algumas peças de artesanato feitas no interior dessemunicípio, em Conceição da Barra e em Pinheiros, notadamente miniaturas de barcos, peneiras e cestos.

Na Rodovia ES-423 (São Mateus – Guriri), no Km 4, na localidade de Pedra D’água, encontra-se aolaria da dona Antônia, uma das mais antigas ceramistas de tradição africana daquela região. Nolocal, existe um pequeno posto de venda dessa cerâmica. Apesar de sua origem baiana, dona Antôniasempre deu valor aos elementos locais e deu continuidade ao trabalho de outras ceramistas que jáexistiam na região, como dona Jacinta, cuja última olaria e cujo último ponto de venda foramregistrados até 1985, na favela do Pé Sujo, no município de São Mateus.

Na localidade de Barreiras, município de Conceição da Barra, composta por uma população tradi-cional miscigenada, cuja cultura constitui-se de reminiscência das comunidades indígenas, mescladascom elementos africanos e que produz uma série de peças artesanais, utilizando-se dos recursosnaturais, como cestas e esteiras de taboa (Typa domeniguensis), vassouras de mão de palma deguriri (Allagoptera arenaria), brinquedos de madeira, agulhas de rede, além de instrumentos musicais,

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1 Ticumbi, ou Baile de congo, é uma manifestação folclórica encontrada desde o Sul ao Norte do Espírito Santo até o vizinhoEstado da Bahia.

2 Atualmente, o vinho de jabuticaba tornou-se um dos principais produtos do agroturismo das regiões de Santa Teresa,Domingos Martins e Venda Nova do Imigrante.

como ganzá (casaca) e tambores, que são utilizados no Ticumbi1 de Conceição da Barra. Em Barreiras,a tradição do artesanato está intimamente ligada a outras tradições populares, principalmente aofolclore. Desse povoado, sai o cortejo do Ticumbi de Conceição da Barra, porque o santo de devo-ção (São Beneditinho) está sob a guarda de um morador da comunidade.

No século XIX, com a presença da imigração européia, a vida nas comunidades luso-brasileirasmodificou-se, porque, logo após a chegada dos imigrantes, aconteceu a abolição da escravatura.A mão-de-obra imigrante mudou a paisagem rural, com novas técnicas agrícolas, e, posteriormente,a urbana, introduzindo técnicas mais modernas de construção de casas e edifícios e outras paratrabalho em madeira, usando técnicas desenvolvidas pela Revolução Industrial.

Esses imigrantes, principalmente os procedentes do Norte da Itália e da Alemanha, trouxeram parao Espírito Santo uma série de instrumentos para trabalhar a terra na preparação da agricultura einstrumentos para trabalhar a madeira, principalmente na produção de mobiliário. Destaca-se aintrodução das técnicas de entalhes e de marchetaria na produção de móveis que serviram para adecoração dos prédios, principalmente os públicos. O trabalho em tecido também foi significativopara a elaboração de artesanato de consumo doméstico.

Assim como os africanos, os imigrantes europeus do século XIX tiveram de fazer adaptações emsuas tecnologias em função do uso de novas matérias-primas. No caso da madeira, o jacarandá(Dalbergia nigra Fr. Allen), mesmo sendo muito duro, foi imediatamente aproveitado para fazer móveisentalhados. No setor da culinária, o uso da mandioca (Manioc esculenta) em substituição ao queijoparmesão e o da jabuticaba (Myrciaria cauliflora Berg) em substitução à uva (Vitis sp). Tais substi-tuições foram necessárias, nessas comunidades, para a continuidade de algumas tradições, principal-mente das que pertenciam à religião católica. A elaboração do vinho de jabuticaba2 foi necessária,em primeiro lugar, para o uso nos atos religiosos; depois, para o consumo doméstico.

No século XX, principalmente depois da década de 50, com a chegada dos primeiros turistas, algunsartefatos das tradições populares começaram a ser adquiridos pela população e por alguns “turistas”,mas de modo informal, sem o sentido mercantil.

Posteriormente, o artesanato começa a tomar novos contornos, com a intervenção do Estado. Numprimeiro momento, com a criação da Empresa Capixaba de Turismo (Emcatur), no final da década de60, quando foram realizados intercâmbios e algumas feiras que proporcionaram uma valorização doartesanato local, principalmente a Feira do Barro (Febarro). Um pouco mais tarde, a Prefeitura Municipalde Vitória constrói o Galpão das Paneleiras, lugar de produção e comercialização das panelas de barro.

No final da década de 60 e na de 70, quando surgiram as comunidades hippies, um dos elementos funda-mentais de sustentação desses grupos foi a produção de artesanato. Inicialmente, as peças artesanaiseram comercializadas nas praias e depois ganhararam espaço para a venda em locais mais sofisticadosdentro do comércio formal. Um dos elementos importantes dessa época foram os entalhes em madeira,principalmente na confecção de placas para identificação de casas, pousadas e hotéis. Algumas dessasplacas e a técnica ainda são encontradas, principalmente no Norte do Estado.

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Com o incremento do turismo, começaram a aparecer as novas formas de artesanato que não tinhamidentidade étnica, mas atendiam as expectativas do turista e as do mercado. Em alguns municípioslimítrofes com o Estado da Bahia, existe uma produção de “berimbaus”, artesanato que tem poucafunção cultural na comunidade produtora, mas com importância econômica, pois a sua produçãodestina-se ao mercado das cidades do recôncavo baiano, principalmente de Salvador. Um outroelemento significativo é a produção de arcos para violinos, feitos de pau-brasil (Caesalpina echinata).São peças artesanais que têm sua comercialização direcionada aos centros de vendas de violinos,mas um reduzido número de peças é consumido no local de produção.

Atualmente, no município de Venda Nova do Imigrante, alguns artesãos estão aproveitando a madeirade troncos de pés de café (Coffea arabica) erradicados na produção de um artesanato criativo, comuma série de peças para jardim, casas para ninhos de passarinho, suportes para vasos de plantas(cachepot), recipientes para revistas e uma série de brinquedos. Essa atividade, além da criatividade,mostra uma maneira de aproveitamento racional de matéria-prima sem causar danos ao Meio Ambiente.

Mais recentemente, o setor de artesanato vem sendo monitorado por uma série de entidades governamen-tais e não-governamentais e também pelos artesãos que se organizaram em cooperativas de produçãoe comercialização de artesanato regional, ou mesmo de artesanato temático, como é o caso das paneleirasde Goiabeiras. Assim, a comercialização do artesanato foi incrementada e tomou novas dimensões.

No que diz respeito a regularização da produção e comercialização, deve-se destacar a atuação do Sebrae/ES que colocou o artesanato como um importante meio para a geração de renda e de projeção cultural, comalgumas iniciativas para torná-lo conhecido, apoiado em uma sitemática que engloba também as políticaspúblicas para o turismo, com a sua regionalização e, dentro do Sebrae/ES, a definição das regiões porarranjos produtivos. Algumas ações foram propostas para certas regiões do Estado, principalmente a dointerior/Sul, região do Caparaó e região Norte do Estado (interior e litoral). Com a criação do Núcleo deProdução e Comercialização de Artesanato (NPDA), foi dada maior celeridade e dinamismo ao setor.

Até 2005 estavam concretizados os seguintes NPDAs (SEBRAE/ES, [2000?]):a) Barro – Paneleiras – Vitória;b) Cerâmica (Aces) – Vitória;c) Escamas de peixe – Vitória;d) Fibras de bananeira – Iconha;e) Fibras de palha de milho – Alegre;f) Indígena – Aracruz;g) Madeira (marchetaria) – Linhares;h) Madeira – Iriri, Anchieta;i) Mármore e granito – Venda Nova do Imigrante;j) Metal – Cariacica;k) Papier marché – Jacaraípe, Serra;l) Produtos do mar (conchas) – Piúma.

Estão em fase de instalação os núcleos:a) Cerâmica – São Mateus;b) Fibras de bambu – Dores do Rio Preto;c) Fibras de bananeira – Rio Novo do Sul;d) Fibras de bagaço de cana – Conceição da Barra;e) Madeira (instrumentos) – Serra.

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Os núcleos para serem instalados são:a) Fibras de bananeira – Alfredo Chaves;b) Fibras de bagaço de cana – Ibiraçu;c) Madeira (marchetaria) – Colatina;d) Mármore e granito – Vargem alta;e) Mármore e granito – Nova Venécia;f) Tecelagem – Ilha das Caieiras, Vitória;g) Couro de peroá – Meaípe;

O Sebrae ainda tem em estudo a instalação do NPDA Couro de pé de galinha, em Santa Maria de Jetibá.

A característica desses centros de produção e comercialização é ter na sua base de trabalho maté-rias-primas regionais. Em alguns Núcleos, algumas dessas matérias-primas nunca tinham sido utili-zadas e foi necessário encontrar e introduzir novas técnicas de confecção. Outro fator de granderepercussão consiste na utilização ou na reciclagem de matéria-prima, uma vez que essa produçãose encaixa dentro dos parâmetros da sustentabilidade e é de fundamental importância para a melhoriadas condições ambientais das localidades.

Como a produção do artesanato é dinâmica, novos artefatos foram criados, aproveitando matéria-prima regionaldisponível. Esses novos artefatos redefiniram os perfis de comercialização, agregando-se às condições dedemandas turísticas. O Núcleo que está em estudo para utilização de pele de pé de galinha pode ser um grandeacréscimo ao agronegócio em Santa Maria de Jetibá, agregando-o aos outros elementos comercializadosna Feira do Ovo, pois esse município é um dos maiores produtores brasileiros de produtos avícolas.

No entanto, a localização desses núcleos, algumas vezes, não atendem diretamente a demanda turís-tica, como é o caso do Núcleo de Iconha, que produz peças com fibras de bananeira, pois esse muni-cípio não tem atrativos turísticos significativos para uma presença constante de turista. Por isso, esseartesanato tem de ser vendido fora do seu local de produção. No inicio de 2005, grande parte dosartesãos não estava produzindo porque se encontrava vendendo seus artefatos nas diversas feiras deartesanato realizadas durante o verão nas cidades litorâneas.

Da mesma forma, a criação de produtos artesanais de mármore e granito é de extrema importância,em função da variedade de tipos e cores das rochas que são encontradas no Espírito Santo. A regiãodo vale do rio Itapemirim é destacadamente o centro dessa produção. A comercialização dos produtosem blocos e industrializados nas Feiras do Mármore e Granito está ajudando a divulgação dos produtosartesanais, que ganharam dimensão em função da criatividade dos artesãos. As bolas feitas com már-more ou granito chamam a atenção dos turistas, assim como os suportes de mesa, encaixes e puxa-dores para cortinas, jogos de mesa, tais como o xadrez, a dama etc.

Destacam-se os centros de elaboração e comercialização do artesanato tradicional como o das paneleirase o dos objetos feitos de conchas em Piúma. Essas duas categorias de artesanato têm sua venda feitadiretamente nos centros de produção. Porém, recebem um volume significativo de encomendas, principal-mente as paneleiras de Goiabeiras. Essas duas categorias trabalham com matérias-primas cada vezmais escassas. A mudança constante na linha de praia em Piúma, devido à erosão, não permite que asvalvas das conchas cheguem normalmente à praia. Além disso, a coleta aleatória pelos turistas duranteo verão está diminuindo drasticamente essa matéria-prima. No caso das paneleiras, a reserva de argilalocalizada no Vale do Mulembá, na ilha de Vitória, está com sua capacidade quase esgotada, o queconstitui um sério risco para a continuidade da tradição.

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IMPACTOSDO ARTESANATONO TURISMO

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O artesanato, tanto o tradicional quanto o contemporâneo, tem uma série de impactos nega-tivos e positivos no turismo.

Em primeiro lugar, a união do artesanato com o trade turístico e com os turistas, principalmenteem relação às formas de comercialização é positiva, porque o artesão precisa produzir e venderpara se manter. Isso se alia ao desejo do turista de comprar o artesanato e levar alguma recordaçãodo local que visitou. As recordações de uma viagem, “[...] como lembranças autênticas de umdeterminado local, têm um significado poderoso em nível das ideologias [...]” (LODY, 2002,p. 7). Nesse sentido, o artesanato deve ser representativo, diversificado; contemplar todas astendências culturais de uma comunidade; e procurar manter a autenticidade conferida cognitiva-mente ou aquela conferida pelos turistas.

Um segundo impacto positivo se relaciona com a identidade do local que o turista leva com a comprade um artesanato e que o integra à comunidade receptora, ao artesão e à cultura do local. Ao comprarum artesanato, o turista ajuda a preservar o seu próprio patrimônio cultural, porque quanto mais seproduz e se comercializa um artesanato mais a sua preservação estará assegurada.

Com isso, um terceiro impacto positivo dessa integração é remetido para a questão da preservaçãoda memória e do Meio Ambiente: “[...] acredito, assim, que os membros de comunidades étnicaspodem se inserir em atividades turísticas, formando, junto com outros membros da comunidade étnicae outros que não o são, comunidades turísticas [...]” (GRÜNEWALD, 2003, p. 153, grifo do autor).Um exemplo significativo no Espírito Santo é a integração turística que existe na Vila de Itaúnas,apesar da comercialização do artesanato local ser de pequena escala. Outro exemplo expressivo éo artesanato feito em Venda Nova do Imigrante, com o aproveitamento de troncos de pés de caféerradicados, pois, além de mostrar criatividade, aproveita matéria-prima renovável que tem umaligação direta com o sistema econômico que sustenta a região, portanto, remetendo a uma identi-dade daquela comunidade étnica (italiana).

Um quarto impacto importante consiste na promoção que o artesanato faz de um local ou evento. Énecessário que a comunidade receptora esteja sempre atenta ao desenvolvimento das atividades turís-ticas, para suprir a demanda dentro das realidades locais de produção e com a sua construção “identitária”.É importante assinalar que, depois da década de 1990, quando o “congo” deixou de ser apenas folcloree começou a ser consumido por parte da sociedade capixaba, alguns artesãos iniciaram a produção dechaveiros, utilizando o tema da casaca – com isso, tematizando o artesanato, pois a casaca é uminstrumento que identifica as manifestações folclóricas do congo no Espírito Santo. Portanto, os turistasque entram em contato com essa manifestação, são incentivados a comprar esse tipo de souvenir.

O quinto impacto refere-se ao conhecimento do turista na compra do artesanato quanto à sua função,às características, à matéria-prima ou às técnicas de confecção, porque são peças fora do sistema

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industrial e, segundo Lody (2002, p. 3), “[...] o valor artesanal, o feito com as mãos, o feitoum a um, o único, o especialmente criado por um autor conhecido ou não, marca o momentoirresistível da criação [...]”.

Uma conseqüência desse artesanato no turismo e do turismo no artesanato é o aumento da rendados artesãos e, conseqüentemente, a melhoria de sua condição de vida e das comunidades produ-toras, aumentando “[...] sua auto-estima e de todos os membros da comunidade envolvidos noprocesso, criando a consciência de que parte das soluções de seus problemas pode ser encontradana própria comunidade [...]” (CONSELHO DA COMUNIDADE SOLIDÁRIA, [1999]).

Apesar da importância do artesanato, atualmente alguns objetos têm sido produzidos sem as técni-cas e as matérias-primas tradicionais, mas, mesmo sem a autenticidade, esses artefatos são motivadorespara manter os valores dados pelos turistas. Um dos exemplos significativos é a produção e vendade casacas feitas de tubo de PVC.

A relação entre turismo e artesanato também pode causar uma série de impactos negativos.

Em primeiro lugar, o artesanato que não tem identidade com o local. Atualmente, com o processoda globalização, o artesanato tornou-se parte da vida moderna e, com isso, temos os impactoscausados pelos efeitos de sua comercialização. A difusão e a dispersão de artesanatos alóctonessão movimentos contemporâneos, pois são encontrados produtos artesanais ou souvenirs feitos emoutras cidades, Estados e até países em quase todas as áreas de fruição turística.

Outro efeito negativo é a questão da turistificaçäo do artesanato feito principalmente por pessoasdescomprometidas com a tradição, que alteram as formas tradicionais de confecção e utilizammatérias-primas fora dos respectivos contextos culturais. É necessário levar em consideração queesses valores alterados podem ter a sua etnicidade reiventada ou reavaliada, dependendo de quemcompra o artesanato. É o caso do artesanato indígena do município de Aracruz. Os índios Guaranis(Mbya) são alóctones, não têm identidade local e fazem artesanato turistificado. Mas esse fatopode tomar uma outra dimensão, quando o turista que comprar esse artesanato for estrangeiro,pois, em seu país, ele irá valorizá-lo como artesanato feito por índios brasileiros. Nesse caso, oartesanato terá uma outra contextualização dentro de um aspecto macro de definição etnográfica.

O uso de matéria-prima reciclada é outro fator de preocupação. Ideologicamente, algumas comunidadeso usam com o argumento de estar contribuindo para a melhoria das condições ambientais, colocandorótulo de artesanato nos produtos feitos com esse tipo de matéria-prima. Atualmente, alguns programasde inclusão social vêm realizando algumas oficinas e, no final, a produção é exposta e comercializadacomo sendo artesanato. Muitas vezes esses produtos não contêm nenhuma característica que os identi-fiquem com a cultura local, apesar de sua importância social ser positiva.

O artesanato vendido sem significado cultural também tem um efeito negativo. Falta ao artesanato doEspírito Santo uma divulgação mais efetiva para mostrar o seu valor cultural e a sua identidade.Falta ao artesanato do Espírito Santo uma divulgação mais efetiva para mostrar o seu valor culturale a sua identidade. A ausência de guias, folders ou de outro tipo de divulgação pode levar o turista

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a equivocar-se quanto ao uso de algumas peças artesanais funcionais e alterar o seu uso. É comuma transformação de panelas de barro em recipientes para plantas, porque é a alternativa para umafamília de turista, não-litorânea ou ribeirinha, que não tem hábito freqüente de consumir peixes oufrutos do mar. Da mesma forma o é para os turistas que compram as mais variadas peças de cestariasutilitárias e as usam para guardar roupa suja ou como porta-revistas.

Outro fator de preocupação para o artesanato é a influência do turista na sua produção, ou seja, aintervenção de um turista ou de revendendores de artesanato que encomendam uma determinadapeça, dentro de uma concepção estética ou funcional e, por necessidade econômica, o artesãosubmete-se a essas exigências, quebrando a rotina de sua produção tradicional. As paneleiras deGoiabeiras mudam algumas de suas características técnicas, principalmente nas formas de seuvasilhame, em função da demanda das encomendas.

O uso de técnicas de confecção de panelas feitas em torno e de matérias-primas poluentes, tam-bém, são fatores de preocupação. As denominadas “fábricas de panelas de barro”, principalmenteas localizadas no município de Guarapari, não usam produtos naturais para a impermeabilização epinturas das peças e, sim, variadas técnicas tais como a utilização de fumaça de borracha ou tintassintéticas, de conteúdo altamente tóxico. Essas panelas muitas vezes são comercializadas comopanelas de barro do Espírito Santo e podem causar uma série de transtornos para a identidade cul-tural das panelas tradicionais, porque a denominação é a mesma. Nesse aspecto, um dado preocupanteé a dissiminação desses vasilhames pelo Estado e, também, pelo uso dessas panelas em alguns hotéise restaurantes do Estado que têm privilegiado essas “panelas” em detrimento das tradicionais. Talfato pode fazer com que os turistas se equivoquem na hora de adquirir uma panela de barro tradi-cional, porque não existem informações que possam distinguir essas duas formas de produção.

Outro impacto negativo é a forma de realização de feiras, principalmente daquelas feitas na tem-porada de verão, sempre denominadas de “Feira de Artesanato”. Algumas têm boa estrutura, masa maioria delas mostra um total desrespeito aos produtos locais. Muitas vezes, essas feiras sãoaproveitadas por pessoas sem identidade local e que as utilizam para vender produtos industria-lizados e fugir aos compromissos de pagamento de impostos aos municípios e ao Estado, porquenão há fiscalização para certificar se os objetivos da feira foram observados.

No verão de 2005, nas feiras montadas nos municípios de Guarapari, Piúma, Conceição da Barra eGuriri, município de São Mateus, foram raros os stands que expunham artesanato. Por outro lado,alguns stands comercializavam CD-ROMs e DVDs copiados fraudulentamente (piratas), inclusive,expondo esses produtos, apesar da proibição de sua comercialização. Por isso, essas feiras em vezde mostrar e valorizar a cultura local, gerar renda para os artesãos, para o município e para oEstado, são, na realidade, eventos descaracterizados turisticamente, sem compromisso com a culturalocal, e uma fonte de evasão de renda e de impostos.

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5 CONSIDERAÇÕESFINAIS

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O s impactos do artesanato no turismo não são tão visíveis quanto o efeito do turismo noartesanato. Por isso, é preciso conhecer profundamente as formas de produção e de comercia-lização do artesanato, para ver a sua extensão e importância para o turismo.

Diante da constatação de que o mundo está cada vez mais globalizado, de que as distâncias geográ-ficas estão ficando cada vez mais curtas pela rapidez dos meios de transporte e o conseqüente deslo-camento de turistas, as populações tradicionais e as produtoras de artesanato estão buscando firmarsuas identidades, projetando seus traços particulares, numa clara reação ao processo de homogeneização.Assim, o artesanato, como um objeto de expressão étnica, torna-se uma mercadoria valiosa para oconsumo, particularmente para o turista que busca destinos em que possa ter novas experiências ouadquirir expressões artísticas, principalmente o artesanato local e de cunho tradicional.

Dada a importância do artesanato, é necessário que sejam feitos projetos de fomento, partindo deentidades governamentais e não-governamentais, sempre levando em consideração os três fatoresfundamentais: o cultural, o econômico e o meio ambiental, a fim de adequá-los às condicionaisregionais e locais e à tipologia dos turistas.

Do ponto vista cultural, é preciso contextualizá-lo historicamente e considerá-lo dentro de sua reali-dade sóciocultural, valorizando suas atividades para revigorar os fazeres tradicionais dentro de umaexperiência e uma realidade histórica para formar novos artesãos, pois é a continuidade dessesfazeres tradicionais que permitirá a garantia da continuidade desses elementos culturais, preser-vando-os como patrimônio autêntico da comunidade.

Para que essa preservação seja garantida, é preciso que uma série de programas e de ações seja postaem prática conjuntamente, para que o artesanato seja valorizado e colocado à disposição dos turistas,de forma técnica e rápida. Ações como a de valorizar o artesanato, enquanto elemento patrimonial; depreservar sua autenticidade, com programas de preservação e de recuperação da memória e do saberde cada tradição artesanal; ações orientadas para um acesso direto às fontes de matéria-prima e,nesse sentido, fazer projetos e programas ideologicamente comprometidos com a sustentabildade, ade-quando-os às realidades ecológicas locais, além de dar uma divulgação compatível com a sua importância.

Do ponto de vista econômico, principalmente a comercialização, é necessário preparar e adequar a pro-dução do artesanato aos padrões de consumo atual, para garantir suas vendas em novos nichos de mercado,para que os produtos alcancem preços justos em função de sua importância cultural, artística ou funcional.As entidades públicas devem projetar ações orientadas para a promoção e valorização cultural e comercialdo artesanato em que o seu valor pecuniário seja fixado em razão de sua qualidade e autenticidade,eliminando, com isso, o senso comum de que artesanato é produto de baixo custo, feito com mão-de-obra barata, ou mesmo pela comparação com outros produtos, principalmente os industrializados.

A importância da colocação do artesanato no mercado para a facilitação de sua comercialização e a possibi-lidade de o artesão ver sua obra sendo comercializada, por um lado, melhoram a sua condição de vida e, poroutro, fazem com que a atividade artesanal criativa seja dignificada e, conseqüentemente, preservada.

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