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0 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO A VEZ DO MESTRE IMPACTOS DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA NAS POLÍTICAS DE RECURSOS HUMANOS LUCIANA RUFINO VIEIRA DE SOUZA ORIENTADOR MARCO ANTÔNIO CHAVES RIO DE JANEIRO, RJ, AGOSTO/2002

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO A VEZ DO MESTRE

IMPACTOS DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

NAS POLÍTICAS DE RECURSOS HUMANOS

LUCIANA RUFINO VIEIRA DE SOUZA

ORIENTADOR

MARCO ANTÔNIO CHAVES

RIO DE JANEIRO, RJ, AGOSTO/2002

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO A VEZ DO MESTRE

IMPACTOS DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

NAS POLÍTICAS DE RECURSOS HUMANOS

LUCIANA RUFINO VIEIRA DE SOUZA

Trabalho Monográfico apresentado

como requisito parcial para a obtenção

do Grau de Especialista em

Reengenharia e Gestão de Recursos

Humanos.

RIO DE JANEIRO, RJ, AGOSTO/2002

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Agradeço à Deus e aos meus pais, e a

todos que contribuiram para a execução

desta pesquisa.

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Dedico este trabalho ao meu esposo e

a minha filha Carolina.

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SUMÁRIO

Introdução _____________________________________________________ 5

1- As Mudanças na Ordem Econômica Mundial _______________________ 7

2- Reestruturação Produtiva ______________________________________ 11

2.1- Principais Características da Reestruturação Produtiva ____________14

2.2- Crise e Reestruturação Produtiva _____________________________ 19

2.3- Reestruturação e o Mercado de Trabalho _______________________ 23

2.4- Os impactos da Reestruturação Produtiva nas Empresas __________ 26

Conclusão _____________________________________________________ 31

Bibliografia ____________________________________________________ 33

Anexo ________________________________________________________ 35

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INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo estudar os impactos da

reestruturação produtiva nas políticas de recursos humanos nas empresas, a partir

dos dados colhidos através da observação do recursos humanos da Empresa de

DLIMA CONSULTORIA CONTÁBIL E TRIBUTÁRIA S/C LTDA.

O tema reestruturação produtiva e seus impactos nas

políticas de recursos humanos vem sendo objeto de estudo de pesquisadores de

diversas áreas, como da administração, da sociologia, da engenharia, da

psicologia e da educação. A importância deste tema pode-se ser resumido em

função das visíveis transformações que vem ocorrendo, principalmente nos países

latino-americanos, com a incorporação de modernas tecnologias organizacionais,

gerenciais e industriais, e que tem ocasionado alterações no volume de empregos,

no perfil de qualificação dos trabalhadores, nos padrões de gestão da força de

trabalho, nas relações inter-firmas, entre outras.

Comenta-se, com freqüência, a respeito de haver uma

crescente preocupação, nas empresas, em redefinir as políticas de recursos

humanos, integradas ao conjunto das demais políticas e estratégias

organizacionais. O principal eixo deste redirecionamento consiste na

implementação de novas modalidades de gestão da força de trabalho, que

permitam a formação de um novo comportamento produtivo do trabalhador,

baseado na confiabilidade e no envolvimento do mesmo com os objetivos da

empresa. As principais estratégias adotadas apontam para o desenvolvimento de

programas participativos e para a ampliação do sistema de incentivos à

produtividade do trabalho.

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A reestruturação produtiva em nosso país veio em

resposta à necessidade de ajustamento frente aos padrões internacionais de

produtividade e de qualidade, elemento básico de competitividade nesse novo

cenário. Trouxe em seu bojo questionamentos como o da inadequação dos

princípios tayloristas/fordistas às novas condições do mercado, assim como

difundiu novos conceitos como de automação, flexibilidade, produção enxuta,

qualidade total, descentralização produtiva, etc., maioria derivados dos métodos

de gestão da indústria japonesa. Como resultado de tal reestruturação, os mais

otimistas vem até considerando a manifestação de um novo paradigma na

organização e gestão do trabalho, num processo de ruptura com o padrão até

então vigente.

Sendo assim, entende-se que o estudo desta situação

(sobre a redefinição das políticas de recursos humanos dentro dos processos de

reestruturação da produção) é de grande importância, pois através dele pode-se

colaborar com a reflexão acerca do tema, auxiliando na formação do

conhecimento de profissionais de RH e dos que pretendem neste campo

engendrar.

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1 - AS MUDANÇAS NA ORDEM ECONÔMICA MUNDIAL

No final da II Guerra Mundial as economias

industrializadas experimentam um longo período de crescimento, baseados no

modelo fordista-keynesiano, sob a hegemonia dos Estados Unidos (Harvey,

1993:119), mas que, no início dos anos 70, apresenta os primeiros e graves

indícios de esgotamento.

A rigor, já nos finais da década de 60, as economias

centrais começam a apresentar sinais de declínio do crescimento econômico,

evidenciando o início da saturação daquele padrão de acumulação. A queda das

taxas de lucro, as variações na produtividade, o endividamento internacional e o

desemprego são indícios daquele processo.

A partir do segundo pós-guerra, o mundo capitalista

presenciou um grande movimento de articulação entre as diversas economias, sob

a hegemonia do grande capital monopolista norte-americano, que imprimiu à

economia internacional o seu padrão de produção e de consumo. Essa

articulação se processou via internacionalização do capital, por meio das

empresas industriais trasnacionais, da mundialização do capital financeiro e da

divisão internacional dos mercados e do trabalho.

Pelo seu peso e características, a economia americana

assegurou uma dinamização generalizada de todo o conjunto das economias

avançadas no pós-1945. Entretanto, a economia americana, ao mesmo tempo em

que avança em direção a novos mercados produtores e consumidores, também

permitia, no seu mercado interno, a penetração de produtos alemães e japoneses,

alimentando a manutenção do ritmo de crescimento daqueles países. Ao

influenciar a concorrência intercapitalista, abria espaço para a penetração de suas

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empresas na Europa e nos países periféricos, incentivando, em conseqüência, as

disputas pela ocupação do mercado internacional com a Alemanha e o Japão.

Os dois movimentos possibilitaram o fortalecimento

tecnológico e financeiro das grandes empresas européias e japonesas. Estas

últimas, numa política industrial ofensiva, reagiram à penetração dos oligopólios

americanos no seu mercado, intensificando esforços de renovação tecnológica

nos setores em que a indústria americana já havia gerado inovações, embora não

pudesse utilizá-las sem depreciar massas de capital fixo récem-instaladas.

Por sua vez , o grande capital europeu, num movimento

de centralização e internacionalização, no interior da concorrência intercapitalista,

possibilitou a expansão da indústria européia nos países periféricos em bases

tecnológicas mais avançadas do que a empresa americana.

Uma das conseqüências mais significativas da

internacionalização, do ponto de vista político, residiu no fato de que as forças

produtivas ultrapassaram os limites do próprio Estado nacional, fato que foi

protagonizado pelo desenvolvimento das empresas transnacionais, que passaram

a produzir mais-valia simultaneamente em vários países, esquivando-se do

controle das políticas estatais regionalizadas. Na realidade, os limites da

intervenção estatal confrontaram-se com a ruptura dos limites nacionais operada

pelas empresas multinacionais, que se instalaram em todo o mundo.

No final da década de 60, o desempenho da economia

americana já revelava perda de dinamismo, em especial pelos gastos

armamentistas no auge da Guerra do Vietnã, enquanto as economias japonesa e

alemã se tronavam competidoras eficazes, alterando o cenário das relações

econômicas internacionais.

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Marcada pelos déficits orçamentários, a economia

americana se vê compelida a decretar a inconversibilidade do dólar relação ao

ouro, em 1971. Esse foi o ponto de partida para a crise econômica mundial do

capitalismo. “O dólar inflacionava-se ao ser emitido em maior quantidade para

cobrir o rombo orçamentário, o que depreciava as exportações dos países de III

Mundo, valorizava as exportações americanas e dava início ao processo de

inflação mundial” (Vizentini, 1992:12).

A desvalorização do dólar teve como conseqüência um

movimento especulativo conhecido como mercado da euromoedas, permitindo o

início de um período de grande expansão do capital financeiro. Isto provocou

graves repercussões internacionais, determinando um conjunto de ajustes

macroeconômicos ocidentais, na tentativa de implantar uma política

antinflacionária, o que por sua vez, implicou uma sincronização internacional do

ciclo industrial. Essa sincronização impulsionou iniciativas expansionistas,

alimentando a retomada do crescimento de todas as economias capitalistas no

período 1971-73, sob a liderança dos Estados Unidos (Belluzzo e Coutinho,

1982:12).

Foi neste contexto que o cartel dos exportadores de

petróleo aumentou significativamente os preços do produto, em 1973, o que de

fato acabou por ser uma manobra das transnacionais petrolíferas e dos EUA

contra as economias japonesa e alemã, que não produziam petróleo.

Se as bases da crise já estavam postas no período de

expansão, e foram responsáveis por uma situação de superacumulação de capital,

o aumento dos preços do petróleo foi apenas um catalisador do ciclo recessivo

que se instalou entre 1974-75.

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As repercussões da crise e das estratégias utilizadas

para superá-la foram extremamente desiguais. Enquanto os EUA se beneficiaram

pela pequena dependência do petróleo e pela entrada de petrodólares, as

economias periféricas foram penalizadas pelos preços dos produtos importados.

Já os países exportadores de petróleo também se beneficiaram pela sua

integração no bloco petrolífero.

De fato, é a reprodução da situação vivida nos inícios

dos anos 70 que leva a economia a enfrentar um novo ciclo recessivo no começo

dos anos 80. Isto é: inflação, expansão do mercado financeiro em detrimento do

setor produtivo, que apresenta baixa evolução da utilização da capacidade

instalada das empresas. Nesse sentido, os anos 80, a despeito da existência de

períodos de recessão e recuperação, podem ser pensados no leito do

desenvolvimento progressivo da crise, iniciada nos anos 70 e que se prolonga até

os dias atuais.

Nesses termos, dois movimentos sincronizados

caracterizam as iniciativas superadoras da crise econômica do capital: a

reestruturação da produção e dos mercados.

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2 – REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

Reestruturação produtiva é o termo que engloba o

grande processo de mudanças ocorridas nas empresas e principalmente na

organização do trabalho industrial nos últimos tempos, via introdução de

inovações tanto tecnológicas como organizacionais e de gestão, buscando-se

alcançar uma organização do trabalho integrada e flexível.

Retomando-se um pouco da evolução da teoria geral da

administração pode-se observar que, até os anos 70, as organizações

caracterizavam-se por terem uma estrutura predominantemente formal,

hierarquizada, departamentalizada, com centralização de informações e de

decisões, estrutura esta criada com base nas grandes empresas industriais. A

relação entre as firmas era de concorrência, verificando-se poucos movimentos no

sentido de buscar-se a cooperação entre estas.

Já os padrões de produção de tais organizações

caracterizavam-se por aspectos como a produção em massa, principalmente de

bens de baixa diferenciação; a produção em linha de montagem, onde a produção

era programada em setor específico e "empurrada" para as vendas; a

mecanização do fluxo de produção; a presença de estoques; etc. Havia, assim,

uma padronização do maquinário e do equipamento, da mão-de-obra e das

matérias primas.

Além disso, como aponta LEITE (1994: 76), as formas

de consumo estavam apoiadas na "substituição da produção doméstica dos meios

de subsistência necessários à reprodução da força de trabalho, por meios

mercantis". Pressupõe também um repasse dos ganhos de produtividade para os

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trabalhadores, de forma que estes alimentem o consumo num mercado

inesgotável (maior demanda do que oferta).

A organização e a gestão do trabalho baseavam-se em

elementos como divisão das tarefas e, consequentemente, a especialização do

trabalhador, separação entre execução e produção (ficando a execução a cargo

dos níveis hierárquicos mais elevados), aumento do controle (buscando a

certificação de que o trabalho está sendo executado de acordo com os padrões

estabelecidos), entre outros. O trabalho passa a ser rotineiro, com pequeno grau

de envolvimento dos operários e a produção estimulada principalmente por

incentivos financeiros.

Esse conjunto de características configura o que ficou

conhecido como o paradigma taylorista/fordista, ou o modo de produção Fordista.

Mais do que um modo de produção, representa também uma forma de dominação

do capital, expropriando do trabalhador seu saber específico, desqualificando seu

ofício e desorganizando sua forma de luta política ao individualizar o operário no

interior da fábrica (RAGO, 1987).

Porém, com o acirramento da concorrência

internacional e a globalização da economia, a partir da década de 70 a nível

mundial e do início dos anos 90 no Brasil, este padrão de acumulação de capital

entrou em crise devido a fatores como a saturação do mercado de bens duráveis,

a perda do poder aquisitivo, a entrada de novos países produtores, a formação de

blocos regionais. Assim, começou-se a buscar novos padrões, novos modelos de

organizações, para fazer frente a estes novos desafios de competitividade através

dos quais as empresas poderiam sobreviver.

Além disso, a partir do final dos anos 60, a "organização

científica do trabalho" enquanto técnica de dominação do capital sobre o processo

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de trabalho deixou de ser eficaz em seu objetivo mais fundamental, o do aumento

da produtividade através da elevação constante dos ritmos de trabalho. A

resistência dos trabalhadores ao trabalho parcelado e repetitivo, ao ritmo

acelerado e aos baixos salários causados pela depreciação do valor da força de

trabalho, princípios norteadores desta forma de organização, que originaram

vários movimentos sociais, também influenciaram de forma marcante no

agravamento da crise existente (LEITE, 1994).

Neste quadro de crise, o Japão, especialmente, passou

a ser visto como potência industrial e, consequentemente, fonte de inúmeros

estudos. Posteriormente, o caso sueco na produção em média série e o caso

italiano também foram vistos como alternativas para o problema da qualidade e da

produtividade (HIRATA, 1992), assim como o alemão (BLACKWELL, 1995). Estes

modelos trouxeram novas estratégias de sobrevivência no mercado, por serem

capazes de produzir a baixos custos, com qualidade assegurada e flexibilidade de

oferta (diversidade e rapidez).

Destes estudos, observou-se que para que tais países

servissem de exemplo para outras economias, seria necessário não apenas

mudanças a nível tecnológico, mas principalmente exigiriam-se novas formas de

organização do trabalho e novos padrões de relações inter-firmas. Tornar-se-ia

imprescindível, então, uma ruptura com o padrão até então vigente, buscando-se

uma empresa mais flexível e integrada que elevasse a produtividade e fizesse

frente a um ambiente marcado pela imprevisibilidade e complexidade de mercado.

Urgem, assim, estruturas organizacionais mais planas, mais ágeis e mais enxutas

que possibilitem uma redução de custos e uma diferenciação das empresas frente

seus concorrentes, via ações como lançamento de novos produtos, aumento da

qualidade, rapidez na entrega e melhora do nível de serviço associado ao produto

(SALERNO, 1995).

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As empresas começaram então a passar, ou sentiram a

necessidade de passar, por um processo de reestruturação produtiva que tende a

dar origem a um novo padrão de acumulação de capital e de organização da

produção, padrão este que vem sendo chamado pelos estudiosos de pós ou neo-

fordismo, acumulação flexível, especialização flexível, modelo japonês, entre

outras nomenclaturas. Empresários buscam, então, competitividade através de

novas formas de ganhos de produtividade aliados à flexibilidade da produção,

visando adequar o aparelho produtivo às novas exigências de um mercado de

muita produção e pouco consumo, numa concorrência não só nacional mas

principalmente internacional, com produtos de qualidade e que estão em

constante inovação. A capacidade de inovar em produtos e processos passou a

ser elemento de diferencial estratégico para as empresas.

Entre as principais mudanças em curso encontram-se

as inovações de base técnica, organizacionais e de gestão da empresa e o novo

padrão de inter-relacionamento de firmas.

2.1 – Principais Características da Reestruturação Produtiva

A reestruturação produtiva teve um primeiro impulso no

Brasil no início dos anos 80, quando as principais empresas lançaram-se ao

mercado externo como forma de atenuar o impacto da recessão.

Foi, portanto, por conta da exigência dos seus clientes

internacionais que as empresas brasileiras passaram a adotar programas de

qualidade e a introduzir inovações tecnológicas e organizacionais no processo

produtivo. Daí se explica porque as inovações se concentraram nas empresas

exportadoras e nas plantas ou linhas dos produtos exportados nesse período.

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Além disso, as inovações tecnológicas foram

introduzidas no interior das empresas apenas parcialmente, em particular nas

etapas de produção que condicionam o ritmo de trabalho e naquelas responsáveis

pelo controle de qualidade no final do processo produtivo. A gestão autoritária do

processo de trabalho manteve-se inalterada, mas agora é associada à tentativa de

garantir a adesão passiva dos trabalhadores aos círculos de controle de qualidade

(CCQ), aos programas participativos etc.

Além dos setores exportadores, o setor bancário

também passou a utilizar internamente a dinâmica das inovações tecnológicas,

ainda que não estivesse sujeito a pressões externas e passaram a enfrentar no

cotidiano os desafios e os dilemas das inovações tecnológicas e, em especial, os

seus impactos sobre o nível de emprego ainda nos anos 80.

No entanto, somente a partir dos início da, década de

90 as inovações tecnológicas e organizacionais passaram a difundir-se para o

conjunto da economia, basicamente em razão da recessão conjugada à abertura

indiscriminada das importações, ambas promovidas pelo governo Collor. As

empresas, por sua vez, para reagir à crise e à maior concorrência, fizeram uso das

inovações tecnológicas de base microeletrônica com o objetivo de aumentar a

produtividade, reduzir custos de produção e melhorar a qualidade dos seus

produtos.

Ou seja, as exigências de qualidade e produtividade e a

pressão por redução de custos se generalizaram para um universo cada vez maior

de empresas, não ficando mais restritas às empresas exportadoras mas

estendendo-se também àquelas vinculadas mais diretamente ao mercado interno

(alimentos, têxtil, informática etc.). O comércio e até os serviços públicos

(hospitais, escolas etc.) também passaram a aplicar programas de qualidade,

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produtividade e redução de custos. Portanto, nos anos 90, os impactos das

inovações tecnológicas, organizacionais e gerências começaram a afetar um

número muito maior de trabalhadores.

Em razão dessas exigências, o maior desafio para as

empresas passou a ser a flexibilidade produtiva. As empresas procuram organizar

a produção e o trabalho de tal forma que uma planta industrial seja capaz de

produzir uma gama cada vez maior de produtos numa mesma linha de produção e

ter capacidade de enfrentar as oscilações do mercado.

Assim a introdução das inovações tecnológicas (CNCS,

CLPS, robôs, CAD/CAM, terminais de computadores etc.) é acompanhada e

subordinada à implementação de novas formas de organização da produção e do

trabalho (células ou ilhas de produção, grupos de trabalho participativos e

polivalentes etc.) e inúmeros programas de controle e desenvolvimento da

qualidade (TQC, Kaizen, CEPs, etc.).

Entretanto, a marca mais característica da

reestruturação produtiva no país é a predominância das inovações organizacionais

e gerenciais.

Ainda é pouca expressiva a incorporação das novas

máquinas e equipamentos de base microeletrônica. Na maioria dos casos de

reestruturação, as empresas alteram a organização da produção e do trabalho

mantendo as mesmas máquinas e equipamentos.

Entre as inovações organizacionais e gerenciais mais

difundidas estão a terceirização e o just-in-time. A adoção da terceirização pelas

empresas consiste em concentrar esforços naquilo que é a vantagem competitiva

da empresa e transferir o conjunto das atividades, seja de apoio ou mesmo de

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produção, para outras empresas, com o objetivo de reduzir custos e simplificar o

processo produtivo. A terceirização pode manter as mesmas atividades no interior

das empresas ou deslocá-las para as plantas das empresas que passam a ser

responsáveis pelo fornecimento dos serviços ou produtos.

O just-in-time interno, por sua vez, é um instrumento de

controle da produção cujo objetivo básico é atender o cliente da empresa com a

maior rapidez possível, reduzindo os estoques de matéria-prima, de bens

intermediários e finais.

Para tanto, utiliza-se um sistema de informações que

procura estabelecer o momento exato de articulação entre as várias etapas de

fabricação, o material exato para o processo de produção e a quantidade exata de

produção. Esse sistema pode tanto envolver somente as várias etapas de

produção no interior das empresas como também os fornecedores externos.

Em geral, o just-in-time está associado à

implementação das células de fabricação e tecnologias de grupo, pois ao operar

com níveis muitos mais reduzidos de insumos, ele acaba exigindo uma enorme

coordenação entre as diversas etapas de produção. As células ou ilhas de

fabricação são uma nova forma de organizar a produção, já que as máquinas são

ordenadas de acordo com o fluxo das peças e não mais pelo tipo de máquinas.

A tendência mais recente das relações com os

fornecedores externos é a criação de pólos industriais e condomínios de

empresas. O polo industrial consiste na aproximação geográfica dos fornecedores

das empresas que utilizam uma gama muito variada de peças para a fabricação

de um determinado produto final. O condomínio industrial, por sua vez, envolve a

instalação dos fornecedores no terreno ou mesmo no interior da planta da

empresa-mãe.

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Duas formas de organização espacial da relação das

empresas com os seus fornecedores vê crescendo no setor automotivo, na

informática, na eletrônica de consumo e na chamada linha branca (televisão,

geladeira, freezer, fogão etc.).

As empresas, na reestruturação produtiva, não estão

optando somente por estabelecer novas relações produtivas e comerciais com

vistas a uma maior aproximação geográfica com os seus fornecedores. Essa

política é acompanhada pela globalização das compras – global sourcing – ou

seja, as chamadas empresas-mãe passam a importar grande parte dos insumos

(partes, peças e componentes) utilizados nos seus processos industriais.

Outra técnica organizacional bastante utilizada é a

redução dos níveis hierárquicos, cujo objetivo é aumentar a rapidez na aplicação

das decisões tomadas pelas empresas, o que é viabilizado principalmente por

meio de uma maior coordenação interna entre as suas várias áreas e

departamentos.

Muitas empresas, de diversos setores, vêm reduzindo

para menos da metade esses níveis, promovendo o desemprego de profissionais

até então dificilmente atingidos por demissões em virtude de períodos de recessão

econômica.

Essas mudanças têm gerado alterações na natureza do

trabalho e das funções e profissões. Os trabalhadores, além de responsáveis por

múltiplas funções de operação, limpeza, manutenção e controle de qualidade,

passam a ser submetidos a ritmos muito mais intensos de trabalho. O trabalho

tende a se concentrar mais na execução de operações de sistemas, máquinas e

equipamentos do que naquele associado á manipulação direta do material ou

insumo em processo de fabricação. Essas mudanças no trabalho exercido no

interior das empresas têm reforçado as características dos chamados operadores

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e eliminado diversas profissões, como por exemplo, o torneiro mecânico na

indústria metalúrgica e o inspetor de qualidade.

Não se pode esquecer, no entanto, que a polivalência

no Brasil, ao contrário de diversas experiências internacionais, não significa

necessariamente que o trabalho dos operários seja valorizado ou enriquecido. Na

maioria das vezes, o trabalhador passa a executar as mesmas atividades que

antes eram executadas por um número maior de trabalhadores, sem haver

alterações salariais e nem das condições de trabalho.

Essa situação reflete não só o descaso pelo trabalhador

enquanto ator fundamental no processo de geração de riqueza, mas também o

paradoxo do sistema educacional e de formação profissional do nosso país.

Assim, os baixos níveis de qualidade do ensino básico e o pensamento

empresarial em conceber a formação profissional como mero adestramento são

incoerentes com as novas prerrogativas de um trabalhador dotado de

conhecimentos universais e de uma qualificação profissional polivalente.

2.2 – Crise e Reestruturação Produtiva

Numa conjuntura da crise, a reestruturação produtiva é

uma iniciativa inerente ao estabelecimento de um novo equilíbrio instável que tem,

como exigência básica, a reorganização do papel das forças produtivas na

recomposição do ciclo de reprodução do capital, tanto na esfera da produção

como na das relações socias.

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De acordo com Mota (2000) “essa reorganização,

amplamente discutida na literatura especializada, expressa a estratégia utilizada

pelo capital em direção ao enfrentamento da crise econômica e pode ser mapeada

em dois amplos movimentos.

1º - o primeiro deles diz respeito aos requisitos necessários à

recomposição do processo global de acumulação e tem seu “locus” na

reestruturação produtiva, implicando também a reordenação geoeconômica das

fases do ciclo global da mercadoria.

Por sua vez, esse movimento é catalisado valendo-se

de intervenções:

a. no âmbito do reordenamento do quadro

hierárquico das nações, em função de sua riqueza e poder, como é o

caso da relação entre os países que formam o centro hegemônico e

deles com os países periféricos;

b. no mundo do trabalho, seja em função das

mudanças requeridas pela divisão sociotecnicas do trabalho, produto da

reordenação das fases do processo de produção e realização de mais-

valia, em nível mundial, seja por força de necessidades inerentes ao

processo técnico de trabalho, determinado pelas transformações

requeridas na reestruturação da produção e, ainda, pelo surgimento de

novas exigências que afetam a constituição e reprodução do

trabalhador coletivo.

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2º - o segundo movimento diz respeito aos mecanismos socios-políticos e

institucionais, necessários à manutenção do processo de reprodução social,

incidindo prioritariamente no âmbito da luta de classes e na relação entre ordem

econômica e projeto político. Situados no nível superestrutural, eles são mediados

pela ação política das classes e das instituições, na qual se inclui o Estado. Isto

é, dependem dos modos e das formas como as classes enfrentam politicamente

as mudanças requeridas pelo processo de reorganização da produção, no

contexto mais geral das relações sociais. Fato que demonstra não ser esta

apenas uma reforma econômica, mas um movimento que interfere na organização

social.”

A tese subjacente à reestruturação é a de que toda

crise no mercado mundial expressa desequilíbrios no âmbito da produção e da

circulação de mercadorias e “ocasiona esforços por parte do capital a fim de

superar tais contradições, reestruturando tanto na produção quanto os mercados”.

Na esfera da produção, as medidas objetivam a

elevação da taxa de lucro, seja modificando os padrões tecnológicos, seja

aumentando a produção de mais-valia, seja superando obstáculos sociopolíticos

que afetam a produtividade da força de trabalho. No âmbito do mercado, as

iniciativas devem interferir na esfera da circulação, por meio da criação de novas

possibilidades de escoamento da produção (novos nichos de mercado) e da

redivisão dos tradicionais mercados consumidores.

Se, do ponto de vista da economia, a crise dos anos 80

caracteriza-se como produto do esgotamento do padrão de acumulação, baseado

na produção e no mercado de consumo de massa, do ponto de vista político, ela

se caracteriza como uma crise orgânica, na medida em que os esgarçamentos

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das ideologias e dos projetos societais operam refrações sobre as formas de

superação da crise.

Observa-se, pois que a reestruturação produtiva é

apenas uma expressão particular de um movimento geral e não a determinação

que funda uma nova ordem, como querem alguns estudiosos do assunto.

Historicamente, o processo de reestruturação industrial

deve ser entendido como uma conjuntura específica: as iniciativas dos

crescimentos dos anos 70, sob a hegemonia norte-americana, de que são

exemplos os impactos da política do fortalecimento do dólar, implementada pelos

Estados Unidos, e a crise do petróleo que afetou o preço das matérias-primas.

As referências principais da reestruturação produtiva

ficam por conta do Japão e da Alemanha, que conseguiram empreender suas

reestruturações promovendo acentuadas mudanças na divisão internacional do

trabalho, diferentemente dos Estados Unidos que desde o início da década de 70,

já não conseguiam difundir, para o mundo, seu padrão de produção e consumo.

O Japão, pressionado pela necessidade de fazer frente

à crise da política monetária e cambial patrocinada pelos Estados Unidos, além

dos impactos negativos produzidos pela crise do petróleo, é forçado a empreender

uma mudança na sua estrutura industrial. Para tanto, dedicou-se à

implementação de uma estratégia de transformação tecnológica, centrada na

eletrônica de ponta e na difusão de novas técnicas de informação e controle no

interior do aparelho produtivo. O resultado foi o aumento da produtividade e o

lançamento de novos produtos que permitiram alcançar um mercado mundial de

consumo de massa, criando as condições para resistir à instabilidade do dólar e

do mercado.

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Já a Alemanha, dentre os países da OCDE, comandou

a sua reestruturação também na concorrência intercapitalista, assumindo o

comando da reordenação do mercado europeu e enfrentando positivamente a

instabilidade do dólar.

Embora tendo perdido posição na reestruturação

industrial, os Estados Unidos não perderam a sua condição de potência. De um

lado, está o peso do dólar na economia internacional; de outro o processo de

construção de uma nova área de integração capitalista, formada pelo Canadá e

México, contando com a periferia latino-americana.

Todo esse processo de ajuste dos países centrais, no

entanto, deu-se, em grande parte, às custas dos países periféricos, como é o caso

da América Latina. Na década de 70, sob as injunções do movimento de

internacionalização do capital, esses países adotaram modelos de

desenvolvimento amparados no endividamento externo. Tal opção, realizada no

cenário político das ditaduras militares, que imperavam no Cone Sul do continente,

subordinou alguns países latino-americanos aos interesses econômicos e políticos

dos países centrais, aumentando, ainda mais, a desigualdade nas relações entre o

centro e a periferia.

2.3 – Reestruturação e o Mercado de Trabalho

Estudos demonstram que enquanto algumas empresas

apresentam um comportamento mais estável de emprego, pessoal mais

qualificado e uma preocupação com a qualidade, como é o caso das indústrias

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metal-mecânica no interior de São Paulo, outras apresentam práticas como a

subcontratação baseada em formas precárias de emprego, como a indústria de

confecção do Rio de Janeiro (GITAHY, 1994).

O denominador comum da reestruturação produtiva nas

várias empresas é a atitude predatória e ao mesmo tempo conservadora que

concebe o trabalho como custo e não como investimento, o que fica patente na

gestão autoritária das relações de trabalho, quando se questiona, por exemplo, o

direito à livre organização sindical dos trabalhadores.

O corte nas despesas salariais das empresas, por meio

da redução de salários e das demissões em massa, é uma das principais formas

de reajuste estrutural frente à necessidade de menores custos. As inovações

tecnológicas, ao pouparem mão-de-obra, também cumprem o mesmo papel. No

entanto, muito raramente a sua introdução vem acompanhada de discussão com

os respectivos sindicatos.

Essa visão conservadora do papel do trabalho no

processo produtivo no Brasil trouxe como resultado uma maior flexibilização do

mercado de trabalho na década de 90, chegando-se a registrar uma taxa de

rotatividade da mão-de-obra de 30% em 1993 - o que significa um terço dos

trabalhadores obrigados a trocar de emprego anualmente, na sua grande maioria

para ocupar postos criados no setor informal e sem as garantias da legislação

trabalhista.

Assim, a reestruturação industrial em curso no Brasil -

marcada por um forte conservadorismo empresarial e pela ausência de políticas

indutoras da competitividade social - tem agravado a concentração de renda, a

precarização e a informalização do mercado de trabalho que já estavam presentes

nos anos 80.

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Vale também mencionar que estudo realizado com 278

das maiores empresas de São Paulo revelou que a maior parte das restruturações

ainda não envolveu grandes investimentos, principalmente em treinamento e

qualificação da mão-de-obra. Assim, altos níveis de rotatividade, fruto

principalmente da insatisfação constante e da facilidade de contratação/demissão

dos funcionários (flexibilidade de mercado), continuam a caracterizar essas

empresas, ocasionando baixos índices de qualidade e produtividade (QUAGLIO,

1996).

De modo geral, RUAS (1994b:98) refere que os

impactos da reestruturação sobre o mercado de trabalho tem tomado as seguintes

formas: grande mobilidade da mão-de-obra; crescimento da participação do

trabalho informal; redução dos salários reais na maioria dos setores; aumento do

recurso à subcontratação do trabalho, com a participação do trabalho a domicílio;

maior seletividade das empresas na contratação de trabalhadores - em termos da

sua qualificação e atitudes - pela grande disponibilidade de mão-de-obra no

mercado.

Aumento de produtividade tem parecido não mais

significar novos empregos, visto que cada vez produz-se mais com menos

funcionários. Cabe destacar que principalmente o emprego industrial tem

reduzido-se (segundo dados da FIERGS, 80.090 postos de trabalho foram

fechados na indústria gaúcha), sendo que certa parte do contingente dispensado

tem deslocado-se para o setor terciário, assim como tem aumentado o número de

empregados terceirizados e até quarteirizados, estes últimos geralmente

caracterizando trabalho precário.

Desta forma, destaca-se a precarização das relações

de trabalho e o desemprego como fortes impactos da reestruturação. A

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precarização é tida na medida em que as relações formalizadas de emprego (com

registro na carteira de trabalho) são substituídas cada vez mais por relações

informais de compra e venda de serviços, fruto principalmente das terceirizações,

trabalho à domicílio (agora também em setores não tradicionais) e a contratação

por tempo limitado. Como aponta SINGER (1995), o trabalho formal está

transformando-se mais em exceção do que uma regra, enquanto que os

trabalhadores precários trabalham cada vez mais, cumprindo longas jornadas que

podem levá-los até a fadiga física ou mental.

SALERNO (1993) apresenta inclusive uma pesquisa

realizada pelo DIEESE com os efeitos da terceirização. Os mais importantes

dizem respeito aos menores salários e benefícios vigentes nas "terceiras", além de

problemas de higiene e segurança no trabalho, trabalho menos qualificado, falta

de registro em carteira e até jornada mais extensa em 5% dos casos. Além disso,

o autor salienta que a descentralização produtiva não implica necessariamente em

descentralização do capital, nem o fim da produção em massa. O modo de

produção taylorista-fordista parece ainda prevalecer nessas empresas.

Assim, pode-se falar em uma crescente divisão entre as

condições de trabalho dos que permanecem nas empresas "mães" e os terceiros.

Pode-se falar, também, em uma divisão crescente entre trabalhadores (entre

setores, grupos, trabalhadores com vínculo e sem vínculo, trabalhadores em

ambiente precário, etc.) e uma alteração na composição da força de trabalho.

2.4 - Os Impactos da Reestruturação Produtiva nas Empresas

No Brasil, a reestruturação produtiva, longe de substituir

as tradicionais e conservadoras relações de trabalho, vem reforçando-as com a

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introdução de novos e modernos padrões de produção. Seus resultados tem sido

elevados índices de desemprego e a precarização das condições de trabalho.

Este processo, ao contribuir para a fragilização da organização sindical, afeta as

conquistas históricas dos trabalhadores.

Neste contexto, a “flexibilização” do trabalho se dá com

base na racionalização da produção e na intensificação do ritmo de trabalho que,

na ótica das políticas de gestão, convertem-se em objeto de estratégias

empresariais para enfrentar o desafio da competitividade no mercado globalizado.

Assim, emergem novas formas de consumo da força de trabalho, medidas pelo

uso de novas tecnologias e pela disseminação de um outro éthos do trabalho.

O uso das novas tecnologias na melhoria da qualidade

dos produtos e na redução dos custos da produção, para tornar-se efetivo, exige a

constituição de uma nova cultura do trabalho. Por isso mesmo, a modernização

das práticas industriais, longe de “descartar” o trabalho em função de novas

tecnologias, requer a integração orgânica do trabalhador, através da mobilização

da sua subjetividade e cooperação.

É evidente, que para materializar o aumento da

produtividade há redução do trabalho vivo, que se expressa na diminuição dos

postos de trabalho, na precarização das condições de trabalho e na intensificação

do ritmo na execução das tarefas; mas, o verdadeiro cenário político da

reestruturação produtiva no Brasil é a construção de um consentimento passivo

dos trabalhadores.

O discurso empresarial que enfatiza a qualificação, as

múltiplas competências, a adaptabilidade, a participação e o envolvimento, é

também o mesmo que justifica a redução de postos de trabalho, a

empregabilidade e a adoção de padrões mais rígidos de controle do desempenho

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do trabalhador. Na confluência destas práticas criam-se as condições

necessárias para persuadir o trabalhador a dar o máximo de sua capacidade

psicofísica. Razão maior de conviverem velhas e novas formas de utilização da

força de trabalho, que conservam e reatualizam as exigências para potencializar a

produtividade e, conseqüentemente, os lucros.

Para Mota (2000), “é neste ambiente que as empresas

vêm desenvolvendo um conjunto de iniciativas que apontam para novas

modalidades:

a) de consumo da força de trabalho relacionadas à introducão da

polivalência e da multifuncionalidade, possibilitadas pela substituição da

eletromecânica pela microeletronica, pela crescente informatização no

processo de produção e pela institucionalização de mudanças na

divisão sociotecnica do trabalho, que têm resultado no desenvolvimento

acelerado do processamento de dados e informações, tornando-o um

elemento constitutivo do processo de trabalho;

b) de controle da força de trabalho, onde se inscrevem os incentivos à

produtividade, bem como os programas participativos que buscam o

envolvimento do trabalhador com os objetivos da empresa, em ralação

às metas estabelecidas para a produção;

c) de reprodução material da força de trabalho onde estão escritas as

políticas de benefícios oferecidos pela empresa ou reguladas pelo

Estado”.

A análise de algumas medidas implementadas na

empresa estudada nos demonstra que o processo de reestruturação implicou em

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mudanças significativas no gerenciamento da força de trabalho, determinando

também novos perfis para as políticas de recursos humanos. Dentre as

mudanças, destacam-se:

- modificação nos critérios de contratação dos novos empregados, cuja a

exigência principal passou a ser o nível de escolaridade e qualificação

profissional;

- implementação de sistemas de avaliacão de desempenho, individual

e/ou grupal, cujos os indicadores são as metas de qualidade e

produtividade;

- criação de programas de treinamento voltado para a requalificação do

trabalhador, cujos conteúdos enfocam aspectos técnicos e

comportamentais, capazes de conformar um novo perfil da força de

trabalho;

- introdução de sistema de premiação e incentivo à participação;

- implantação de nova política salarial, fundamentada no princípio da

“remuneração variável”. Nesta política o salário do trabalhador

depende da sua avaliação de desempenho;

- ampliação dos benefícios e serviços sociais oferecidos pelas empresas

para os chamados trabalhadores estáveis.

Cabe destacar que a concessão dos benefícios está

diretamente vinculada não só ao exercício de uma atividade específica, mas à

qualidade da inserção do trabalhador nos setores estratégicos de produção. Para

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os trabalhadores “contratados temporariamente” ou “subcontratados”, além dos

salários serem mais baixos, o acesso aos benefícios também é mais restrito.

É fato, que mesmo para os trabalhadores

“privilegiados”, o acesso ao serviços e benefícios oferecidos pelas empresas não

constitui direitos contratuais, ao contrário, sua existência depende do aumento da

produtividade.

No contexto da reestruturação industrial há uma

vinculação entre os mecanismos de reprodução material da força de trabalho e as

exigências postas pelas novas formas de organização do processo industrial.

Hoje ocorre uma aquisição pela obtenção da confiabilidade dos trabalhadores e à

sua participação na implementação dos objetivos da organização.

O discurso gerencial, é de que os trabalhadores tomam

parte das decisões sobre os rumos da empresa, através dos programas

participativos e de sugestões. De fato, as gerências vêm investindo na

possibilidade de um consentimento passivo do trabalhador em relação às

necessidades da empresa.

O modelo de gestão de recursos humanos prega a

iniciativa individual e a motivação para empreender ações requeridas pela

empresa. Todavia, a responsabilidade em colocar a sua capacidade a serviço

dos objetivos empresarias é delegada a cada trabalhador individualmente. Ao

remeter essa responsabilidade ao trabalhador, torna-o co-responsável e partícipe

do processo de inovação e da melhoria da produtividade. Os trabalhadores assim,

são estimulados a tomar decisões no ato de produção.

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CONCLUSÃO

Percebe-se que, na opinião dos empresários e dos

estudiosos a reestruturação produtiva nas empresas tem sido vista como um

fenômeno irreversível. Com o acirramento da concorrência internacional, a

globalização da economia e a consequente crise da “organização científica do

trabalho”, profundas alterações na organização e na gestão do trabalho passaram

a ser exigidas nas organizações, num processo de mudança que significa

sobrevivência no mercado.

Hoje a reestruturação leva a estratégias diversificadas

de adaptação a esse novo quadro, algumas voltadas mais para a redução de

custos, principalmente com pessoal (terceirizações, salários, etc.), enquanto

outras voltadas mais para a qualidade, a inovação e a aprendizagem como

diferencias básicos.

Tendo em vista os aspectos observados, entende-se

que o processo de reestruturação aponta para a intensificação do controle sobre a

força de trabalho, em função das novas estratégias de gestão utilizadas, seja pela

propagação da participação e da parceria como formas de conjugar interesses e

atenuar conflitos, seja pela crescente intervenção empresarial no âmbito da

qualificação e na esfera da reprodução material da força de trabalho. São

exatamente estes os aspectos centrais das políticas de recursos humanos, que

passam a ser formadores da cultura de integração do trabalhador à empresa, sob

os preceitos de uma outra política de produção.

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Na realidade, é se levado a acreditar que o processo de

reestruturação produtiva implicou em mudanças na política de recursos humanos,

imprimindo a esta novos perfis.

Os modos de controle, ao serem menos coercitivos e

mais consensuais, imprimem também novos elementos à experiência do recursos

humanos nas empresas. Mais do que humanizar a produção, ou ajudar o

trabalhador a enfrentar o “despotismo” da fábrica, cabe ao recursos humanos

colaborar pedagogicamente na socialização de valores e comportamentos , que

deságüem na integração dos trabalhadores às novas exigências de produtividade.

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ANEXO

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